Integração da Norma Penal - Damasio

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Capitulo da Doutrina de Damasio E. Jesus Penal - Parte Geral, sobre Integração da Norma .

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4. A INTEGRAO DA NORMA PENAL a) As lacunas da lei penal O legislador no consegue prever todas as hipteses que podem ocorrer na vida real. Esta, em sua manifestao infinita, cria a todo instante situaes que o legislador no lograra fixar em frmulas legislativas. Como dizia Del Vecchio, jus scriptum insuficiente para refletir a realidade que constantemente se renova, e para oferecer uma soluo a todas as exigncias novas da vida social. A impossibilidade para o esprito humano de formular previamente todos os casos possveis do futuro foi explicitamente declarada h sculos pelos juristas romanos. Mas, a noo dessa impossibilidade ainda mais viva na Idade Moderna, em conseqncia das rpidas transformaes das condies de vida, do aparecimento de novas formas de atividade e do despontar de problemas e contrastes novos; e muito difcil que esses problemas e contrastes possam sempre encontrar uma base segura para soluo nas leis j em vigor. Esse desnvel entre a previso legislativa e as ocorrncias da vida real provocou de Lacerda de Almeida o atribuir pernas curtas ao legislador. Devido a isso, inmeras situaes surgiro no previstas de modo especial pelo legislador. Esgotados os meios interpretativos, cumpre ao aplicador suprir a lacuna da lei, uma vez que no lhe permitido escusar-se de sentenciar ou despachar a pretexto de omisso da norma. O art. 126 do CPC determina que "o juiz no se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe- aplicar as normas legais; no as havendo, recorrer analogia, aos costumes e aos princpios gerais de direito". Surge, ento, o problema da integrao da norma, mediante os recursos fornecidos pela cincia jurdica. Possui realmente a lei, ensina Washington de Barros Monteiro, a faculdade de auto-integrao, a faculdade de completar- se a si mesma atravs de processos cientficos preexistentes, manipulados ou trabalhados pelo julgador. Esses processos so a analogia, os costumes e os princpios gerais de direito. Determina o art. 4.o da Lei de Introduo ao CC: "Quando a lei for omissa, o juiz decidir o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princpios gerais de direito". No h lacunas de direito. Como diz Garca Mynez, "al preguntarnos si existen realmente lagunas en el Derecho pensamos que la respuesta debe ser: el Derecho carece de lagunas; la ley las tiene necesariamente". A titude do intrprete em face da situao no prevista apontada pelo prprio direito, quando dispe que tais casos se resolvem pelos processos cientficos apontados. Quando o texto da lei reflete o caso, sem margem de dvidas, este resolvido por aquele; quando no tiver sido prevista de maneira expressa a situao de fato apresentada pela vida, ser todo o ordenamento jurdico, em sua integridade, que estar presente para decidir a questo. No existem, conseqentemente, lacunas do direito. Haver, quando muito, omisses de previso expressa. norma penal tambm apresenta lacunas que devem ser preenchidas pelos recursos supletivos para o conhecimento do Direito. Nem todos concordam com isso diante do princpio de reserva legal, sob fundamento de que tudo o que no vem descrito como conduta punvel permitido pelo Direito Penal, estando impedido o intrprete de usar os processos cientficos de integrao da norma penal, pois seria ela completa em si mesma. De observar-se, porm, como o fazia Jos Frederico Marques, que se a lei penal, quando define delitos e comina pena, no pode apresentar falhas e omissesuma vez que a conduta no prevista legalmente como delituosa sempre penalmente lcita, extenso campo sobra, mais alm das regras penais incriminadoras, no contedo dos preceitos que disciplinam fatos de outra natureza, tambm afetos regulamentao jurdica da norma penal. Assim, no possuem lacunas as normas penais incriminadoras, em face do princpio de reserva legal. As normas penais no incriminadoras, porm, em relao s quais no vige aquele princpio, quando apresentam falhas ou omisses, odem ser integradas pelos recursos fornecidos pela cincia jurdica.

b) Direito Penal e direito de exceo Direito excepcional aquele que, quebrando a unidade de um sistema de direito comum ou especial, derroga, para casos particulares, a regra que deveria ser normalmente aplicvel. tambm chamado direito estrito. H autores que negam a existncia de lacunas mesmo em relao s normas no incriminadoras, sendo proibida a sua integrao, uma vez que as leis que definem causas de excluso da antijuridicidade so excepcionais, devendo ser aplicadas de forma estrita. Afirmou Arturo Rocco, porm, que, se a norma penal tem natureza excepcional, no podem ser excepcionais as leis negativas desses preceitos: como exceo da exceo, estas assumem a condio de regra e norma de direito comum, do mesmo modo que a negao da negao a afirmao. O Direito Penal, porm, no um conjunto de regras de exceo. Sob outro aspecto, as normas negativas das incriminadoras no so, tambm, regras excepcionais. Seria errneo que todo um conjunto de regras jurdicas, com princpios prprios, regulados sistematicamente, pudesse ser de direito estrito. No Direito Penal nada h de excepcional, porque ele um complexo de regras legais que regem uma tpica exteriorizao de atividade anti-social, ou seja, a conduta punvel. No h entre o Direito Penal, de um lado, e o Direito Civil, de outro, qualquer desvio de natureza lgica que justifique a excepcionalidade do primeiro. Como dizia Jos Frederico Marques, citando Bettiol, o Direito Penal se acha sobre o mesmo plano que qualquer outro ramo do ordenamento jurdico, e seu objeto regulamentar as conseqncias jurdicas do crime, o qual, e do ponto de vista social um fenmeno patolgico (como o , p. ex., o inadimplemento das obrigaes), sob o aspecto jurdico necessita da mesma disciplina normal prpria do negcio ou ato administrativo ou civil. Estamos sob o plano de regras normais, e no de excees. As causas de excluso da antijuridicidade no constituem normas de exceo. Encontram-se definidas em normas legais da mesma forma que os preceitos que descrevem os crimes na parte especial dos cdigos. Tanto essas normas no tm natureza excepcional que o legislador teve o cuidado de inseri-las na parte geral dos cdigos, isto porque seu contedo se aplica a todos os crimes, sem distino. c) Integrao da norma penal: critrio de admisso Os preceitos da LICC se aplicam a todos os ramos do Direito. aplicvel, pois, ao Direito Penal, o seu art. 4.o, que afirma a integrao da norma jurdica pela analogia, costumes e princpios gerais de direito. Assim, as lacunas da norma penal podem ser supridas pelos processos cientficos determinados pelo legislador. A integrao s pode ocorrer em relao s normas penais no incriminadoras, porque, em relao s que descrevem crimes e impem sanes, vigora o princpio da legalidade. Conclui-se que a analogia, o costume e os princpios gerais de direito no podem criar condutas punveis nem impor penas: nesse campo, a norma penal no possui lacunas. Da dizer Jos Frederico Marques que onde o art. 4.o encontra aplicao plena e cabal em relao aos casos de licitude excepcional e de iseno de culpabilidade. As omisses do legislador, nesse terreno, autorizam o juiz a cobrir as falhas da lei com os processos de integrao jurdica.

JESUS, Damsio E. De. DIREITO PENAL- Parte Geral. 1 Volume. 21a edio, revista e atualizada, 1998.Editora Saraiva. obra completa. volume 1