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 D.E. Publicado em 12/07/2007 APELAÇÃO CÍVEL Nº 2004.72.00.017141-4/SC RELATORA : Juíza LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH APELANTE : CLIN ICA DE MEDI CAS ASSOCIADAS S/S ADVOGADO : Renato Hadlich e outros APELADO : UNI ÃO FEDE RAL (FAZENDA NACIONA L) ADVOGADO : Simone Anacleto Lopes EMENTA TRIBUTÁRIO. IRPJ. LEI N.º 9.249/95. SERVIÇOS HOSPITALARES. DEFINIÇÃO. CONCEITO INDETERMINADO. PRESCRIÇÃO. 1. A teor dos artigos 15 e 20 da Lei n.º 9.249/95, os prestadores de serviço em geral devem recolher contribuição social sobre o lucro líquido e IRPJ sob a base de cálculo de 32%, enquanto os prestadores de serviços hospitalares o fazem sob a base de cálculo de 12% e 8%, respectivamente. 2. Adoção do entendimento doutrinário que defende a possibilidade de se trabalhar no campo tributário com o conceito indeterminado. 3. O termo "serviços hospitalares" é um conceito indeterminado não vinculado, pois não pode ser densificado mediante um simples procedimento de interpretação. Sua significação está no "halo conceitual" e é necessário um ato administrativo de valoração para dissipar a incerteza. 4. O  juiz, ao avaliar a disciplina complementar administrativa sobre "serviços hospitalares", deve, sem adentrar no mérito administrativo (teoria do desvio de poder) verificar se a competência discricionária foi exercitada dentro dos limites ditados pelo ordenamento jurídico, ou seja, se a Administração, em atuação discricionária densificadora (prognose) respeitou a totalidade dos princípios jurídicos, entendidos na sua devida dimensão. 5. Cabe, em especial, destacar a importância dos princípios do não-confisco, da capacidade contributiva e da isonomia na  parametrização da sindicabilidade judicial. 6. Se houve algum desrespeito aos princípios em sua amplitude (constitucionais, tributários, gerais de direito), repita-se, não poderá o Judiciário impor uma decisão diversa da que foi eleita pela autoridade administrativa, por sua vez, pode e deve tornar nulo os atos administrativos que denotem desvio de finalidade ou "erro manifesto de apreciação dos fatos", coibindo as arbitrariedades. 7. O primeiro controle  judicial de toda a reportada regulamentação administrativa sobre os "serviços hospitalares" diz respeito à observância do princípio do não-confisco, da capacidade contributiva e o da isonomia. Com as alterações do art. 15 da Lei 9.249/95, é possível afirmar que o setor de serviços ficou com o percentual (IRPJ e CSSL) maior porque, em regra, envolve menores custos que as atividades comerciais e industriais. Os serviços hospitalares foram excepcionados por motivo inverso, ou seja, porque são mais onerosos para o empresário, exigindo uma estrutura física e operacional de alto custo. 8. O que importa na aferição do que seja serviço hospitalar, portanto, é a essência da prestação sem consideração de elementos externos, como, por exemplo, local ou subordinação e uma estrutura que seja complexa e organizada de tal modo que possibilite a internação do paciente . 9.  De outro banda, o segundo controle judicial de toda a reportada regulamentação administrativa sobre os "serviços hospitalares" diz respeito à observância das determinações programáticas dos artigos 196 e 197 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, pelas quais, à toda evidência, o Estado deve reduzir custos às atividades inerentes ao Sistema Nacional de Saúde. 10. Para definir a natureza do serviço prestado é necessária a análise do conjunto probatório constante

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TRIBUTÁRIO. IRPJ. LEI N.º 9.249/95. SERVIÇOS HOSPITALARES.DEFINIÇÃO. CONCEITO INDETERMINADO. PRESCRIÇÃO.

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Publicado em 12/07/2007

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2004.72.00.017141-4/SCRELATORA : Juíza LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCHAPELANTE : CLINICA DE MEDICAS ASSOCIADAS S/SADVOGADO : Renato Hadlich e outrosAPELADO : UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO : Simone Anacleto Lopes

EMENTA

TRIBUTÁRIO. IRPJ. LEI N.º 9.249/95. SERVIÇOS HOSPITALARES.DEFINIÇÃO. CONCEITO INDETERMINADO. PRESCRIÇÃO.

1. A teor dos artigos 15 e 20 da Lei n.º 9.249/95, os prestadores de serviço emgeral devem recolher contribuição social sobre o lucro líquido e IRPJ sob a base de cálculo de

32%, enquanto os prestadores de serviços hospitalares o fazem sob a base de cálculo de 12% e8%, respectivamente. 2. Adoção do entendimento doutrinário que defende a possibilidade dese trabalhar no campo tributário com o conceito indeterminado. 3. O termo "serviçoshospitalares" é um conceito indeterminado não vinculado, pois não pode ser densificadomediante um simples procedimento de interpretação. Sua significação está no "haloconceitual" e é necessário um ato administrativo de valoração para dissipar a incerteza. 4. O

juiz, ao avaliar a disciplina complementar administrativa sobre "serviços hospitalares", deve,sem adentrar no mérito administrativo (teoria do desvio de poder) verificar se a competênciadiscricionária foi exercitada dentro dos limites ditados pelo ordenamento jurídico, ou seja, se

a Administração, em atuação discricionária densificadora (prognose) respeitou a totalidadedos princípios jurídicos, entendidos na sua devida dimensão. 5. Cabe, em especial, destacar aimportância dos princípios do não-confisco, da capacidade contributiva e da isonomia na

parametrização da sindicabilidade judicial. 6. Se houve algum desrespeito aos princípios emsua amplitude (constitucionais, tributários, gerais de direito), repita-se, não poderá oJudiciário impor uma decisão diversa da que foi eleita pela autoridade administrativa, por suavez, pode e deve tornar nulo os atos administrativos que denotem desvio de finalidade ou"erro manifesto de apreciação dos fatos", coibindo as arbitrariedades. 7. O primeiro controle

judicial de toda a reportada regulamentação administrativa sobre os "serviços hospitalares"diz respeito à observância do princípio do não-confisco, da capacidade contributiva e o daisonomia. Com as alterações do art. 15 da Lei 9.249/95, é possível afirmar que o setor deserviços ficou com o percentual (IRPJ e CSSL) maior porque, em regra, envolve menorescustos que as atividades comerciais e industriais. Os serviços hospitalares foramexcepcionados por motivo inverso, ou seja, porque são mais onerosos para o empresário,exigindo uma estrutura física e operacional de alto custo. 8. O que importa na aferição do queseja serviço hospitalar, portanto, é a essência da prestação sem consideração de elementosexternos, como, por exemplo, local ou subordinação e uma estrutura que seja complexa eorganizada de tal modo que possibilite a internação do paciente. 9. De outro banda, o segundocontrole judicial de toda a reportada regulamentação administrativa sobre os "serviços

hospitalares" diz respeito à observância das determinações programáticas dos artigos 196 e197 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, pelas quais, à toda evidência,o Estado deve reduzir custos às atividades inerentes ao Sistema Nacional de Saúde. 10. Paradefinir a natureza do serviço prestado é necessária a análise do conjunto probatório constante

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nos autos. 11. Precedente da 1ª Seção.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide aEgrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar

provimento ao apelo, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 26 de junho de 2007.

Juíza Federal Luciane Amaral Corrêa MünchRelatora

Documento eletrônico assinado digitalmente pelo(a) Juíza Federal Luciane Amaral CorrêaMünch, Relatora, conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura deChaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e Portaria do TRF4R nº 195 de 16 de dezembro de 2004(DJU de 24/12/2004 pg. 25). A autenticidade do documento pode ser conferida no sitehttps://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php informando o código verificador 1731391v5 e, sesolicitado, o código CRC 3947E43C.

Informações adicionais da assinatura:

Signatário (a): LUCIANE AMARAL CORREA MUNCH Nº de Série do Certificado: 42C50813

Data e Hora: 27/06/2007 17:13:30

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2004.72.00.017141-4/SCRELATORA : Juíza LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCHAPELANTE : CLINICA DE MEDICAS ASSOCIADAS S/SADVOGADO : Renato Hadlich e outrosAPELADO : UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)ADVOGADO : Simone Anacleto Lopes

RELATÓRIO

CLÍNICA DE MÉDICAS ASSOCIADAS S/S, ajuizou a presente ação de ritoordinário, objetivando o reconhecimento de ser prestadora de serviços hospitalares e sujeita aoIRPJ, com base de cálculo reduzida de 8% e CSLL à 12%. Foi dado à causa o valor de R$

7.517,28 (sete mil, quinhentos e dezessete reais e vinte e oito centavos).

Instruído o feito, sobreveio sentença de improcedência do pedido, ao argumentode que a verificação da condição da parte autora, de equiparada à hospitalar, demandariadilação probatória que não ocorreu no presente feito, inclusive por ter havido pedido de

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julgamento antecipado da lide (fls. 48/50). A parte autora foi condenada ao pagamento dehonorários de R$ 500,00, considerando-se a pouca complexidade da causa e a ausência de

produção probatória, nos termos do artigo 20, §3º, do CPC.

A parte autora apelou, sustentando possuir como objeto social a prestação de serviços médicos, atendimento clínico em geral e prestação de serviços médicos em geral.Alegou estar abrangida pelo conceito de serviço hospitalar, podendo utilizar-se da base de

cálculo reduzida. Requereu a reforma integral da sentença proferida.

Apresentadas as contra-razões, vieram os autos para julgamento. É o relatório.

VOTO

Mérito

A autora afirma que presta serviços de natureza hospitalar, fazendo, portanto, jus ao benefício fiscal (base de cálculo minorada nos casos de IRPJ, para aferição do lucro presumido) oferecido às instituições que prestam serviços dessa natureza.

Sobre a lei correspondente

A Lei n.º 9.249, de 26 de dezembro de 1995, dispõe, in verbis:

"Art. 15. A base de cálculo do imposto , em cada mês, será determinada mediante a aplicação

do percentual de oito por cento sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o

disposto nos arts. 30 a 35 da Lei n.º 8.981, de 20 de janeiro de 1995. § 1º Nas seguintes atividades, o percentual de que trata este artigo será de: I - [...] III - trinta e dois por cento , para as atividades de:a) prestação de serviços em geral, exceto a de serviços hospitalares;b) [...]" (destacamos)

"Art. 20. A base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, devida pelas pessoas jurídicas que efetuarem o pagamento mensal a que se referem os arts. 27 e 29 a 34 da Lei no8.981, de 20 de janeiro de 1995, e pelas pessoas jurídicas desobrigadas de escrituração

contábil, corresponderá a doze por cento da receita bruta, na forma definida na legislaçãovigente, auferida em cada mês do ano-calendário, exceto para as pessoas jurídicas queexerçam as atividades a que se refere o inciso III do § 1o do art. 15, cujo percentual corresponderá a trinta e dois por cento.[...]" (destacamos)

Para solução da lide, importa esclarecer o sentido que se deve dar à expressão"serviços hospitalares" , designada pela Lei n.º 9.249/95. Trata-se de conceito indeterminadoe, portanto, carece de objetividade.

Sobre o conceito indeterminado e o seu controle judicial

A delimitação de um conceito indeterminado tem relação direita com a forçaque se dá ao princípio da legalidade e à tipicidade por ele veiculada.

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A doutrina se divide, basicamente, em duas correntes para explicar o conteúdo eamplitude do princípio da legalidade em matéria tributária. De um lado temos a corrente que

pode ser chamada de majoritária (Alberto Xavier, Sacha Calmon, Misabel Derzi), a qualcompreende o princípio da legalidade de forma estrita, onde a tipicidade teria um "sentidoimpróprio". De lado oposto (Ricardo Lobo Torres, Marco Aurélio Greco), a legalidade é vistacomo um conceito mais aberto, fluído, onde a tipicidade teria "sentido próprio". Cumpre

esclarecer que a tipicidade "em sentido impróprio" (tipicidade como ela não é, ou seja, umconceito fechado com notas irrenunciáveis) tem a clara finalidade de dar maior densidade ao princípio da legalidade. No "sentido próprio", por ser aberta e fluída, é um redutor dalegalidade.

Mizabel Derzi, notória tributarista mineira, advoga em sua doutrina, ao fim e aocabo, a insubsistência dos conceitos indeterminados no Direito Tributário: " Não se admitemas ordens de estrutura flexível, graduável e de características renunciáveis que são os tipos(...) com essas afirmações, novamente insistimos, não se está a negar a existência de uma

zona cinzenta ou da chamada zona de penumbra de Carrió, no Direito Tributário, tampoucoasseverando a ausência de conceitos indeterminados ou carentes de especial valoração. Essa

formas, quando presentes, são um ponto de difícil caracterização e uma transição entre oconceito determinado e o tipo propriamente dito. (Direito Tributário, Direito Penal e Tipo.SP, Ed. Revista dos Tribunais, 1988, p. 248).

A concepção de Mizabel Derzi proclama que o tipo é aberto, mas o expulsa, juntamente com o conceito indeterminado, do campo tributário, onde prevalece apenas oconceito determinado fechado, ou, então, os converte em conceitos determinados. Engessa-se,

portanto, no conceito fechado a possibilidade de aplicação do direito tributário.

Ricardo Lobo Torres, por sua vez, admite a plena funcionalidade do conceitoindeterminado no campo tributário:

" Supera-se também a crença algum tanto ingênua na possibilidade de permanente

fechamento dos conceitos tributários, como se nesse ramo do direito houvesse a perfeita

adequação entre o pensamento e linguagem e se tornasse viável a plenitude semântica dos

conceitos. O direito tributário, como os outros ramos do direito, opera também por conceito

indeterminados, que deverão ser preenchidos pela interpretação complementar da

Administração, pela contra-analogia nos casos de abuso de direito e pela argumentação

jurídica democraticamente desenvolvida.O problema dos conceitos indeterminados está no cerne da metodologia jurídica. A sua maior ou menor abertura depende da própria natureza e estrutura do tributo a que aplica.Os impostos antigos, apoiados nas categorias do direito privado, como sejam os impostosimobiliários, oferecem conceitos relativamente fechados, pois incidem sobre os direitos daliberdade (propriedade privada).Os impostos mais modernos, construídos no laboratório tributário e distanciados decategorias do Código Civil, como o imposto de renda e o imposto de circulação demercadorias e serviços, por exemplo, exibem amplas zonas de penumbra em seus conceitoscardeais. Até hoje não se conhece em toda a sua extensão a virtualidade do conceito de lucroou de acréscimo de patrimônio no imposto de renda. Discute-se a propósito do fato gerador

do ICMS, havendo ainda defensores das idéias de 'circulação jurídica' e de 'circulaçãoeconômica' das mercadorias.(...)

No Brasil, o positivismo tem procurado minimizar a importância da interpretação

administrativa com defesa da existência da 'tipicidade fechada', que é contradictio in

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terminis, e da legalidade absoluta. O art. 99 do Código Tributário Nacional expressa a adesãoa esse raciocínio, ao estabelecer: 'o conceito e o alcance dos decretos restringem-se aos dasleis em função das quais sejam expedidos, determinados com a observância das regras deinterpretação estabelecidas nesta lei'. Quer dizer: o próprio CTN procura fechar e limitar aatividade regulamentar da Administração, estabelecendo regras para a interpretação das leistributárias (arts. 107 a 112) de modo pretensamente unívoco e seguro. Só que tais normas deinterpretação carecem elas próprias de interpretação, tornando-se inócuas e vazias, donderedunda que a interpretação administrativa ainda encontra amplo campo para a sua

efetivação." - grifos meus.(Legalidade Tributária e Riscos Sociais in Revista de Dialética de Direito Tributário, n.º 59,SP: Dialética, p. 95-99).

A flexibilização do princípio da legalidade e a funcionalidade do conceitoindeterminado no campo tributário também são defendidas por José Casalta Nabais:

Mas, por outro lado, a reserva da lei fiscal, como reserva material integral de lei formal queé - o que impõe uma tipicidade fechada ou taxativa - exclui que a lei deixe à Administraçãoqualquer margem de livre decisão, traduza-se esta na utilização pela lei de cláusulas geraisou de conceitos indeterminados ou na concessão de faculdades discricionárias.Todavia, esta afirmação, freqüentemente repetida pelos autores, não pode hoje ser entendida em termos absolutos, devendo ser antes temperada ou moderada. Nesse sentido,convém desde logo chamar a atenção para o facto de, hoje em dia, já não se exacta, outotalmente exacta, a conclusão a que chegava Alberto Xavier em 1972 tendo por base aConstituição de 1933, segunda a qual no direito administrativo geral não haveria nada de

semelhante ao princípio da tipicidade que, no direito fiscal, exprime o princípio da reservamaterial integral de lei formal. É que, a diversos sectores da reserva de lei formal (máxime,da reserva parlamentar), entre os quais sobressai naturalmente o relativo aos 'direitos,liberdades e garantias' fundamentais, é actualmente dispensada uma reserva de lei que, emtermos materiais ou substanciais, não anda longe da que tradicionalmente tem sido reclamadae consagrada para os elementos essenciais dos impostos. Porém, não obstante a isso, a

generalidade da nossa doutrina não e xclui, quanto a essas outras matérias rese rvadas à lei,

a possibilidade de concessão de uma certa margem de livre decisão à Administração,

embora se preocupe em elaborar tópicos que possam fornecer um critério de resposta ao

problema do nível admissível dessa margem de liberdade, já que facilmente se compreende

que esse nível não pode ser idêntico ao aceitável em geral nos domínios que não caiem

numa reserva material de lei formal, e em compensar essa abertura normativa pela

subordinação das correspondentes actuações administrativas aos princípios gerais

(constitucionais), como os da proporcionalidade e imparcialidade. Ou seja, permite-se um

certo afrouxamento das exigências formais (reserva de lei), compensando-o com maiores

exigências materiais (proporcionalidade e imparcialidade) , o que vai de encontro ao modernoentendimento do Estado de direito como um Estado de direito material, que constantementeapela para a afirmação de princípios materiais. Pois bem, não vemos obstáculos a que estasidéias valham em princípio também relativamente à reserva fiscal: na verdade, as diferençasentre esta e as outras reservas materiais de lei formal estão longe de ter o peso e relevo quea concepção tradicional do princípio da legalidade fiscal, excessivamente formalista etributária do positivismo, nos sugere.

Em segundo lugar, a tipicidade fechada do direito fiscal não tem impedido, não obstante asconstantes afirmações em contrário, que com freqüência encontremos a atribuição legal demargens de livre decisão à Administração fiscal (...)Finalmente, as exigências de operacionalidade e flexibilidade do sistema fiscal e dos

impostos singularmente considerados, agora definitivamente erigidos em instrumento de

política econômica e social do Estado, reclamam, por inelutáveis imperativos de ordem

prática - pela própria 'natureza das coisas' - um certo afrouxamento da densidade

normativa, imposta pelo (entendimento tradicional do) princípio da reserva material da lei

formal relativamente aos elementos essenciais dos impostos e a conseqüente admissibilidade

de atribuição legal à Administração de uma certa margem de livre decisão adequada à

aplicação flexível das leis fiscais, ou seja, de uma liberdade de decisão consentânea com o

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cabal desempenho da função administrativa neste domínio do direito fiscal socialmente

conformador ." -grifos meus.(Contratos Fiscais. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 248-251).

Entendo que é possível trabalhar no campo tributário com o conceitoindeterminado. Cabe, então, identificar qual o tipo (e amplitude) do controle judicial sobre osatos administrativos utilizados na sua densificação.

A discussão sobre os conceitos indeterminados teve o seu surgimento no séculoXIX, na Áustria, com a produção de duas correntes antagônicas: a Teoria da Univocidade,defendida principalmente por Tezner, e a Teoria da Multivalência de Bernatzik.

Para primeira, no preenchimento dos conceitos indeterminados, excluir-se-iaqualquer possibilidade de atuação discricionária da Administração, visto só existir uma únicasolução correta, possível apenas de ser encontrada através da interpretação jurídica da lavrado poder jurisdicional. Por sua vez, a segunda, apregoando o contrário, abraça a possibilidadede várias decisões certas dentro dos conceitos indeterminados, que possibilitariam uma

atuação discricionária livre de controle jurisdicional.

Entendo que deva ser adotada como parâmetro à atuação judicial no controle einterpretação dos conceitos indeterminados uma posição intermediária entre a Teoria daUnivocidade e da Multivalência, mesmo que tendenciosa a esta última.

Por um lado, deve ser considerada viável a utilização da uma certa faculdadediscricionária da autoridade administrativa, em razão da constatação da presença inegável deum pluridimensionalismo nos conceitos indeterminados, o qual nem sempre é dissipado pelo

processo de simples interpretação já que a eleição de uma das opções válidas contida nanorma, diante do caso concreto, pode vir a precisar de uma ação intelectiva de criação.

De outro lado, não se deve adotar a concepção de discricionaridade como aliberdade livre das amarras da lei, já que a evolução da doutrina pátria concebe-a dentro delimites principiológicos do ordenamento jurídico, tais como a razoabilidade,

proporcionalidade e o interesse público. Nesse sentido, toda atividade administrativa (tanto nacompetência vinculada ou na discricionária) somente pode ser entendida dentro da moldurados limites principiológicos previstos constitucionalmente, visto somente, assim, ser possívelo alcance da "boa administração", ou seja, da persecução da ação que melhor atenda ao

interesse público, portanto, nada tem a ver com a idéia de liberdade livre de limites, a qualtende a facilitar uma atuação arbitrária, sem compromisso com a finalidade normativa.

Nesse sentido, o festejado professor Juarez Freitas (Os atos administrativos dediscricionaridade vinculada aos princípios. Boletim de Direito Administrativo, SP: NDJ, AnoXI, nº6, 1995, p.328) afirma que:

O administrador, em realidade, jamais desfruta de liberdade legítima e lícita para agir emdesvinculação com os princípios constitucionais do sistema, ainda que sua atuação guarde -eis o ponto focal - uma menor subordinação à legalidade estrita do que na concretização dos

atos ditos plenamente vinculados. Em outras palavras, qualquer ato discricionário que setorne lesivo a qualquer um dos princípios pode e deve ser anulado.

Adiante, refutando o extremismo de Tenzer e Bernatzik - sem implicar em um acovardamento- passa-se, nas linhas subseqüentes, a apresentar razões que levaram a optar por um

posicionamento mais ameno neste trabalho.

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Para tanto, deve-se recorrer, inicialmente, além da construção doutrinária de Azzariti aoapontar distinção entre discricionaridade e interpretação, a premissa na qual este autor italiano alicerçou seu entendimento, ou seja, ao pensamento de que, mesmo variando em umaescala de grau de complexidade lógica, no momento de concretização do Direito ou mesmode mera compreensão, não existirá enunciado normativo que não prescinda de umanecessária interpretação.

Assim, quando se deparar com um conceito indeterminado, o administrador

deve sempre aplicar a norma ao caso concreto dissipando a incerteza e perquerindo a melhor solução que perfaz a finalidade normativa. Para tanto, a princípio, através de um processocomplexo de interpretação, deve-se tentar conduzir o conceito indeterminado à uma das zonasde certeza negativa ou positiva.

Conforme registra Germana de Oliveira Moraes (Controle Jurisdicional daadministração pública. São Paulo: Dialética, 1999, p. 58), a construção teórica das zonas doconceito deu-se a partir da comparação, elaborada por Philipp Heck (1914), do conceito a um

ponto de luz intenso que, ao iluminar objetos, revela alguns iluminados com menor ou maior

intensidade, como também revela um rodeado de um halo, de cores pálidas, além de uma totalobscuridade, onde não há incidência de feixes luminosos. Portanto, sendo o autor levado aconcluir que "sempre que temos uma noção clara do conceito, estamos no domínio do núcleoconceitual. Onde as dúvidas começam, começa o halo do conceito".

Portanto, se, com a utilização apenas da tarefa interpretativa, houver aidentificação do conceito dentro de uma zona de certeza, concluí-se que, de logo, impõe-se aúnica decisão eficaz para o alcance da finalidade normativa. Tem-se a ausência de qualquer autonomia volitiva, não havendo espaço para apreciações criativas, devendo a autoridadeadministrativa aplicá-la, visto se encontrar dentro do campo da vinculação. .

Germana de Oliveira Moraes adverte que, nos conceitos indeterminados, acondução a uma única solução válida juridicamente, dá-se por força da indeterminaçãoderivada ora da imprecisão da linguagem, ora da contextualidade da linguagem, envolvendouma avaliação atual, porém, não-prospectiva das circunstâncias de fato presentes econcomitantes à incidência da norma.

Neste aspecto, Celso Antônio Bandeira de Mello (discricionaridade -fundamentos, natureza e limites. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n.122,

p.1-20,out./dez. 1975, p.15) adverte que:

Esta significação mínima, esta delimitação positiva e negativa, no caso do Direito, nos é fornecida não apenas pela conotação usual ou pela denotação corrente das palavras. Ela édelimitada também por elementos que devemos arrecadar no conjunto das normas jurídicas eque servem para circunscrever mais energicamente a eventual amplitude do conceitoabrigado por uma dessas palavras ou locuções do significado fluido. Em outras termos: acompreensão contextual delas tem, no mundo jurídico, balizas mais sólidas e mais estritas.

Extrai-se os seguintes exemplos de Germana de Oliveira Moraes (ob. cit., p.164):

Situa-se na zona de certeza positiva, o caso em que a análise dos fatos leva à conclusãoinafastável que a eles se ajusta com toda certeza o conceito, v.g., que está satisfeito orequisito legal de satisfação da 'necessidade ou utilidade pública' no ato de desapropriação deum imóvel para fins de edificação de uma escola pública no município que não dispõe denenhum estabelecimento de ensino. Por outra, situa-se na zona de certeza negativa, na

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hipótese de concluir-se que os fatos, com toda certeza, não se amoldam no conceito de'utilidade pública' previsto no artigo 5° do Decreto-lei 3.365/41 do Brasil, se a desapropriaçãodo imóvel particular se faz com vistas à construção de um aeródromo em município serranoonde não existem condições geográficas propícias à prática do esporte de aviação.

A condução do conceito indeterminado a um dos campos de certeza, por simplesinterpretação, sem recursos de atos volitivos vincula a autoridade administrativa, como afirmao professor Celso Antônio Bandeira de Mello ("Relatividade" da competência discricionária.

Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n.212, p. 49-56, abr./jun. 1998), nãoestando ela autorizada a fazer distorção, flexibilização, restrição ou ampliação da durezanuclear que apresenta, assim não se poderá distanciar da intelecção dada pelo senso comum,ou do sentido reconhecido corrente em dado tempo e lugar.

Razão pela qual, nos casos em que a indeterminação dá-se por força daimprecisão da linguagem, ou quando envolve uma avaliação da situação concreta em funçãodas circunstâncias de tempo, de lugar, sem contudo, demandar qualquer ação criativa oureconstrutiva subjetiva da Administração, o controle jurisdicional será sempre pleno, visto

o poder de interpretar a norma jurídica fazer parte integrante da função jurisdicional.

Desta forma, conforme afirma Germana de Oliveira Moraes (ob.cit., p.166), "asconseqüências do controle jurisdicional compreendem sempre, para além da invalidação doato impugnado, a substituição por outro."

Por sua vez, se a tarefa interpretativa for insuficiente, residindo o conceito nazona de penumbra no halo de cores pálidas, frente a persecução da boa administração, persisteo dever de conduzir o conceito indeterminado a uma das zonas de certeza, razão pela qualsubsistirá ao administrador o encargo de sopesar com exclusividade as circunstâncias do caso,utilizando-se de uma intelecção pautada em critérios estritamente administrativos, adentrando,

pois, no campo da discricionaridade administrativa.

Cabe aqui uma advertência. Tradicionalmente, entendia-se que a competênciadiscricionária era insindicável pelo Poder Judiciário, pois, diante do juízo de conveniência eoportunidade do administrador público, não poderia o juiz nele adentrar, sob pena de ferir o

princípio da separação dos poderes. Tal entendimento foi o responsável por inúmerosdesmandos por parte do Poder Executivo, através de verdadeiras arbitrariedades.

Todavia, a doutrina e a jurisprudência desenvolveram teorias, verdadeirastécnicas de controle, pelas quais o Poder Judiciário pode, sem adentrar no méritoadministrativo, verificar se a competência discricionária foi exercitada dentro dos limitesditados pelo ordenamento jurídico. Salienta-se, com o apoio de Juarez Freitas (ob.cit., p.325),que toda a Administração, em atuação discricionária ou não, fica adstrita não apenas ao

princípio da legalidade, mas sim, à totalidade dos princípios jurídicos, entendidos na suadevida dimensão.

Calcada nestes limites principiológicos, tem-se, portanto, possível e oportuna asindicabilidade jurisdicional, visto nenhuma lesão ou ameaça de direito poder ser excluída daapreciação do Poder Judiciário. Contudo, não poderá o Judiciário impor uma decisãodiversa da que foi eleita pela autoridade administrativa. Por sua vez, pode e deve tornarnulo os atos administrativos que denotem desvio de finalidade.

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Cabe apenas registrar, ainda, a avançada posição francesa que considera possível adentrar-se no próprio mérito do ato administrativo para coibição dos excessos.Como comenta Germana de Oliveira Moraes, fundando-se nessa premissa, tanto a doutrinaquanto a jurisprudência francesas passaram a coibir de forma mais enérgica as arbitrariedadesna seara da discricionaridade, mas principalmente no âmbito do juízo de prognose, através dateoria do "erro manifesto de apreciação dos fatos", possibilitando ao poder jurisdicionaladentrar no mérito e coibir as arbitrariedades postas dentro desse. O professor Sérvulo Correia

(apud MORAES, ob. cit., p.86) salienta que, no Direito francês:

Sem prejuízo da importância ainda hoje concedida à figura do desvio de poder como base docontrolo jurisdicional da discricionaridade, a jurisprudência tem vindo a prospectar novoscaminhos. O controlo do 'erro manifesto de apreciação' na 'qualificação dos fatos' corresponde a um exame de proporcionalidade (sob a vertente da aptidão do meio ou'Geeignetheit') da prognose levada a cabo pela Administração sobre conceitos indeterminadosque referem pressupostos do acto, quando o não seja da proporcionalidade de uma decisão noexercício da 'discricionaridade de decisão', isto é, de opção de agir e não agir. E a técnica dobilan coût-avantages é expressamente reconhecida como aplicação da lei de

proporcionalidade (SIC)

Assim, o juiz poderia, baseando-se na construção francesa do "erro manifesto deapreciação dos fatos", melhor perseguir e fulminar as arbitrariedades que se escondem atrásda prognose desproporcional ou desarrazoada. Por sua vez, não poderia segui-la até o seudesfecho, adentrando na prognose para substitui-la por uma emanação própria, visto nãoexistir garantias de ser mais ou menos inatingível de vícios arbitrários, razão pela qualpoderia adentrar apenas para perquerir a sua coerência lógica e a proporcionalidadeentre a prognose e a decisão a ser praticada, limitando-se, ao verificar o erro, apenas ainvalidar o ato, não sendo possível impor qual medida a ser seguida.

Voltando ao caso do autos, é necessário analisar-se, primeiramente, em que tipode conceito indeterminado enquadra-se o termo "serviços hospitalares".

A doutrina classifica os conceitos indeterminados em duas categorias: conceitosindeterminados vinculados e conceitos indeterminados não vinculados. Os primeiros, sãoaqueles cuja mera interpretação identifica o signo em uma das zonas de certeza positiva ounegativa, por conseguinte, conduzindo a uma única solução jurídica, em razão daindeterminação resultar apenas de uma imprecisão da linguagem, devendo então ser feito umtrabalho de contextualização desta. É exemplo disso a notória decisão do Supremo Tribunalde Justiça que entendeu estar a cabina de caminhão compreendida dentro da idéia de casa, emrazão das peculiaridades da profissão de caminhoneiro, ser uma verdadeira extensão do seular.

Por outro lado, têm-se conceitos não vinculados quando, após o processo deinterpretação, a significação do conceito se situa no "halo conceitual", sendo necessário umato de valoração efetuado pela autoridade administrativa para se dissipar a incertezaque os envolvem, visto comportar várias intelecções juridicamente aceitas, sem contudo,uma invalidar a outra.

Pelo exposto, percebe-se que o termo "serviços hospitalares" é um conceitoindeterminado não vinculado, pois não pode ser densificado mediante um simples

procedimento de interpretação. Sua significação está no "halo conceitual" e é necessário um

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ato administrativo de valoração para dissipar a incerteza.

Veja-se, somente para ilustrar a dificuldade de significação a respeito do termo,cito duas questões: Primeira, que tipo de serviço hospitalar é abrangido? A resposta podevariar desde o serviço médico típico (cirurgia, clínica), passando pelos serviços médicosauxiliares (exames, v.g.) até o de comércio hospitalar (plano de saúde, lancheria, acomodaçãoem quartos, etc.). Segunda, o local da prestação do serviço deve ser somente o hospital? A

resposta também pode razoavelmente variar, para abranger, por exemplo, clínicas,laboratórios e "UTIs móveis".

Destarte, o juiz, ao avaliar a disciplina complementar administrativa sobre"serviços hospitalares", deve, sem adentrar no mérito administrativo (teoria do desvio de

poder) ou, ainda, adotando a teoria francesa do "erro manifesto de apreciação dos fatos" (ou proporcionalidade), adentrando no mérito, verificar se a competência discricionária foiexercitada dentro dos limites ditados pelo ordenamento jurídico, ou seja, se a Administração,em atuação discricionária densificadora (prognose) respeitou a totalidade dos princípios

jurídicos, entendidos na sua devida dimensão.

Cabe, em especial, destacar a importância dos princípios do não-confisco, dacapacidade contributiva e da isonomia na parametrização da sindicabilidade judicial.

Como bem trabalha Fabio Brun Goldschimidt (O princípio do não-confisco no Direito Tributário. São Paulo: RT, 2003, p. 21), inicialmente, é necessário relacionarmos o princípio do não-confisco com o da capacidade contributiva, na tentativa de demonstrar quetoda a tributação que se situar além ou aquém da capacidade contributiva terá inegavelmenteefeito de confisco, pois aniquilará direitos fundamentais, especialmente os de propriedade, de

existência digna, de livre exercício de profissão e livre iniciativa. Num segundo momento, énecessário estabelecermos um vínculo entre o princípio da isonomia e do não-confisco,quando o administrador introduz (prognose densificativa do conceito indeterminado) umatributação mais elevada para determinado contribuinte que se situa na mesma situação relativade patrimônio/renda de outro ou, às avessas, quando ele não diferencia contribuintes que estãoem situações diferentes de patrimônio/renda.

Destarte, se houve algum desrespeito aos princípios em sua amplitude(constitucionais, tributários, gerais de direito), repita-se, não poderá o Judiciário impor uma

decisão diversa da que foi eleita pela autoridade administrativa, por sua vez, pode e devetornar nulo os atos administrativos que denotem desvio de finalidade ou "erro manifesto deapreciação dos fatos", coibindo as arbitrariedades.

Sobre os atos administrativos correspondentes

Vários atos administrativos foram editados para dar densidade ao conceito deserviços hospitalares, ora de "forma ampla", ora de "forma restrita".

A Instrução Normativa n.º 306, de 12 de março de 2003 (revogada pela IN/SRF

n.º 480, de 15 de dezembro de 2004), dispunha, in verbis:

"Art. 23. Para os fins previstos no art. 15, § 1º inciso III, alínea "a", da Lei n.º 9.249, de 1995, poderão ser considerados serviços hospitalares aqueles prestados por pessoas jurídicas,diretamente ligadas à atenção e assistência à saúde, que possuam estrutura física condizente

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para a execução de uma das atividades ou a combinação de uma ou mais das atribuições deque trata a Parte II, Capítulo 2, da Portaria GM n.º 1.884, de 11 de novembro de 1994, do

Ministério da Saúde, relacionadas nos incisos seguintes: I - realização de ações básicas de saúde, compreendendo as seguintes atividades:a) ações individuais ou coletivas de prevenção à saúde tais como: imunizações, primeiroatendimento, controle de doenças transmissíveis, visita domiciliar, coleta de material paraexames, etc.;b) vigilância epidemiológica por meio de coleta e análise sistemática de dados, investigação

epidemiológica, informação sobre doenças, etc.;c) ações de educação para a saúde, mediante palestras, demonstrações e treinamento in loco,campanhas, etc.;d) orientar as ações em saneamento básico por meio de instalação e manutenção demelhorias sanitárias domiciliares relacionadas com água, dejetos e lixo;e) vigilância nutricional por meio das atividades continuadas e rotineiras de observação,coleta e análise de dados e disseminação da informação referente ao estado nutricional, desdea ingestão de alimentos à sua utilização biológica;

f) vigilância sanitária, por meio de fiscalização e controle que garantam a qualidade aos produtos, serviços e do meio ambiente. II - prestação de atendimento eletivo de assistência à saúde em regime ambulatorial,

compreendendo as seguintes atividades:a) recepcionar, registrar e fazer marcação de consultas;b) realizar procedimentos de enfermagem;c) proceder a consulta médica, odontológica, psicológica, de assistência social, de nutrição,de fisioterapia, de terapia ocupacional, de fonoaudiologia e de enfermagem;d) recepcionar, transferir e preparar pacientes;e) assegurar a execução de procedimentos pré-anestésicos e realizar procedimentosanestésicos nos pacientes;

f) executar cirurgias e exames endoscópios em regime de rotina; g) emitir relatórios médico e de enfermagem e registro das cirurgias e endoscopiasrealizadas;

h) proporcionar cuidados pós-anestésicos;i) garantir o apoio diagnóstico necessário. III - prestação de atendimento imediato de assistência à saúde, compreendendo as seguintesatividades:a) nos casos sem risco de vida (urgência de baixa e média complexidade):1. triagem para os atendimentos;2. prestar atendimento social ao paciente e/ou acompanhante;3. fazer higienização do paciente;4. realizar procedimentos de enfermagem;5. realizar atendimentos e procedimentos de urgência;6. prestar apoio diagnóstico e terapêutico por 24 hs;

7. manter em observação o paciente por período de até 24 horas.b) nos casos com risco de vida (emergência) e nos casos sem risco (urgência de altacomplexidade):1. prestar o primeiro atendimento ao paciente;2. prestar atendimento social ao paciente e/ou acompanhante;3. fazer higienização do paciente;4. realizar procedimentos de enfermagem;5. realizar atendimentos e procedimentos de urgência;6. prestar apoio diagnóstico e terapia por 24 horas;7. manter em observação o paciente por período de até 24 horas.

IV - prestação de atendimento de assistência a saúde em regime de internação,

compreendendo as seguintes atividades:a. internação de pacientes adultos e infantis:1. proporcionar condições de internar pacientes, em ambientes individuais ou coletivos,conforme faixa etária, patologia, sexo e intensividade de cuidados;2. executar e registrar a assistência médica diária;

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3. executar e registrar a assistência de enfermagem, administrando as diferentesintervenções sobre o paciente;4. prestar assistência nutricional e distribuir alimentação a pacientes (em locais específicosou no leito) e a acompanhante (quando for o caso);5. prestar assistência psicológica e social;6. realizar atividades de recreação infantil e de terapia ocupacional;7. prestar assistência pedagógica infantil (de 1º grau) quando o período de internação for

superior a 30 dias.

b. internação de recém-nascido até 28 dias:1. proporcionar condições de internar recém-nascidos normais patológicos, prematuros eexternos que necessitam de observação;2. executar e registrar a assistência médica diária;3. executar e registrar a assistência de enfermagem, administrando as diferentesintervenções sobre o paciente;4. prestar assistência nutricional e dar alimentação aos recém-nascidos;5. executar o controle de entrada e saída de recém-nascido.c. internação de pacientes em regime de terapia intensiva:1. proporcionar condições de internar pacientes críticos, em ambientes individuais ecoletivos, conforme grau de risco (intensiva ou semi-intensiva), faixa etária, patologia e

requisitos de privacidade;2. executar e registrar assistência médica intensiva;3. executar e registrar assistência de enfermagem intensiva;4. prestar apoio diagnóstico laboratorial, de imagens e terapêutico durante 24 horas;5. manter condições de monitoramento e assistência respiratória 24 horas;6. prestar assistência nutricional e distribuir alimentação aos pacientes;7. manter pacientes com morte cerebral, nas condições de permitir a retirada de órgãos paratransplante, quando consentida.d. internação de pacientes queimados:1. proporcionar condições de internara pacientes com queimaduras graves, em ambientesindividuais ou coletivos, conforme faixa etária, sexo e grau de queimadura;

2. executar e registrar a assistência médica ininterrupta;3. executar e registrar a assistência de enfermagem ininterrupta;4. dar banhos com fins terapêuticos nos pacientes;5. assegurar a execução dos procedimentos pré-anestésicos executar procedimentosanestésicos;6. prestar apoio terapêutico cirúrgicos, como rotina de tratamento (vide alínea "f", inciso V);7. prestar apoio diagnóstico laboratorial e de imagem ininterrupto;8. manter condições de monitoramento e assistência respiratória ininterrupta;9. prestar assistência nutricional de alimentação e de hidratação dos pacientes;10. prestar apoio terapêutico de reabilitação fisioterápica aos pacientes.V - prestação de atendimento de apoio ao diagnóstico e terapia, compreendendo as seguintes

atividades: patologia clínica;imagenologia;métodos gráficos;anatomia patológica;desenvolvimento de atividade de medicina nuclear;realização de procedimentos cirúrgicos e endoscópicos, tais como:recepcionar e transferir pacientes;assegurar a execução dos procedimentos pré-anestésicos e executar procedimentosanestésicos nos pacientes;executar cirurgias e exames endoscópios em regime de rotina;

emitir relatórios médicos e de enfermagem e registro das cirurgias e endoscopias realizadas; proporcionar cuidados pós-anestésicos; garantir o apoio diagnóstico necessário. g. realização de partos normais e cirúrgicos;h. desenvolvimento de atividades de reabilitação em pacientes externos e internos;

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i. desenvolvimento de atividades hemoterápicas; j. desenvolvimento de atividades de radioterapia;k. desenvolvimento de atividades de quimioterapia;l. desenvolvimento de atividades de diálise;m. desenvolvimento de atividades relacionadas ao leite humano."

A IN/SRF n.º 480, de 15 de dezembro de 2004, por sua vez, "restringindo" oconceito de serviços hospitalares, passou a dispor, in verbis:

"Art. 27. Para os fins previstos nesta Instrução Normativa, são considerados serviçoshospitalares somente aqueles prestados por estabelecimentos hospitalares.

§ 1º Para os efeitos deste artigo, consideram-se estabelecimentos hospitalares, aquelesestabelecimentos com pelo menos 5 (cinco) leitos para internação de pacientes, que

garantam um atendimento básico de diagnóstico e tratamento, com equipe clínicaorganizada e com prova de admissão e assistência permanente prestada por médicos,que possuam serviços de enfermagem e atendimento terapêutico direto ao paciente,durante 24 horas, com disponibilidade de serviços de laboratório e radiologia, serviçosde cirurgia e/ou parto, bem como registros médicos organizados para a rápidaobservação e acompanhamento dos casos.

§ 2º Para efeito de enquadramento do estabelecimento como hospitalar levar-se-á,

ainda, em conta se o mesmo está compreendido na classificação fiscal do Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), na classe 8511-1 - Atividades de Atendimento Hospitalar. § 3º São considerados pagamentos de serviços hospitalares, para os fins desta Instrução Normativa, àqueles efetuados às pessoas jurídicas: I - prestadoras de serviços pré-hospitalares, na área de urgência, realizados por meiode UTI móvel, instaladas em ambulâncias de suporte avançado (Tipo "D") ou emaeronave de suporte médico (Tipo "E"); e

II - prestadoras de serviços de emergências médicas, realizados por meio de UTI móvel, instaladas em ambulâncias classificadas nos Tipos "A", "B", "C" e "F", que

possuam médicos e equipamentos que possibilitem oferecer ao paciente suporte

avançado de vida." (destacamos)

O Ato Declaratório Interpretativo SRF n.º 18/2003, por sua vez, "restringindo ainda mais" oconceito de serviços hospitalares, dispõe, in verbis:

"Art.1º. Para fins do disposto no art. 15, § 1º, inciso III, alínea "a" da Lei n.º 9.249, de26 de dezembro, considera-se serviços hospitalares os prestados pelosestabelecimentos assistenciais de saúde constituídos por empresários ou sociedadesempresárias." "Art.2º . Para fins do disposto no art. 1º, independentemente da forma de constituiçãoda pessoa jurídica, não serão considerados serviços hospitalares ainda que com oconcurso de auxiliares ou colaboradores, quando forem:

I - prestados exclusivamente pelos sócios da empresa; ou II - referentes unicamente ao exercício de atividade intelectual, de natureza científicados profissionais envolvidos.

Parágrafo único. Os termos auxiliares e colaboradores de que trata o caput referem-sea profissionais sem a mesma habilitação técnica dos sócios da empresa e que a esses

prestem serviços de apoio técnico ou administrativo."

Atualmente, a IN/SRF n.º 539, de 2005, ao alterar a Instrução Normativa SRFn.º 480, dispõe, verbis:

"Art. 27. Para fins do disposto nesta Instrução Normativa, são considerados serviçoshospitalares aqueles diretamente ligados à atenção e assistência à saúde, de que trata o subitem 2.1 da Parte II da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) da Agência Nacional deVigilância Sanitária n.º 50, de 21 de fevereiro de 2002, alterada pela RDC n.º 307, de 14 denovembro de 2002, e pela RDC n.º 189, de 18 de julho de 2003, prestados por empresário ou

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sociedade empresária, que exerça uma ou mais das: I - seguintes atribuições:a) prestação de atendimento eletivo de promoção e assistência à saúde em regimeambulatorial e de hospital-dia (atribuição 1);b) prestação de atendimento imediato de assistência à saúde (atribuição 2); ouc) prestação de atendimento de assistência à saúde em regime de internação (atribuição 3);

II - atividades fins da prestação de atendimento de apoio ao diagnóstico e terapia (atribuição4).

§ 1° A estrutura física do estabelecimento assistencial de saúde deverá atender ao disposto noitem 3 da Parte II da Resolução de que trata o caput, conforme comprovação por meio dedocumento competente expedido pela vigilância sanitária estadual ou municipal.

§ 2° São também considerados serviços hospitalares, para fins do disposto nesta Instrução Normativa, os seguintes serviços prestados por empresário ou sociedade empresária: I - pré-hospitalares, na área de urgência, realizados por meio de UTI móvel, instaladas emambulâncias de suporte avançado (Tipo "D") ou em aeronave de suporte médico (Tipo "E");

II - de emergências médicas, realizados por meio de UTI móvel, instaladas em ambulânciasclassificadas nos Tipos "A", "B", "C" e "F", que possuam médicos e equipamentos que

possibilitem oferecer ao paciente suporte avançado de vida."

Por fim, cabe ressaltar que a Resolução-RDC n.º 50, de 21.02.2002, da Diretoriada ANVISA, em seu anexo, parte II, (programação físico funcional dos estabelecimentos desaúde - organização físico-funcional) elenca uma série de atividades que podem ser tomadas

por serviços hospitalares.

Sobre o controle judicial dos atos administrativos correspondentes

Como já fora dito, cabe ao Poder Judiciário avaliar a disciplina complementar administrativa para verificar se a competência discricionária foi exercitada dentro dos limitesditados pelo ordenamento jurídico, ou seja, se a Administração, em atuação discricionáriadensificadora (prognose) respeitou a totalidade dos princípios jurídicos, entendidos na suadevida dimensão.

Nesse sentido, o primeiro controle judicial de toda a reportada regulamentaçãoadministrativa sobre os "serviços hospitalares" diz respeito à observância do princípio do não-confisco, da capacidade contributiva e o da isonomia.

Como já se manifestou nesta Turma o eminente Des. Federal Antonio AlbinoRamos de Oliveira (AC N.º 2005.72.00.005710-5/SC, DJU 21/06/2006), a Lei 9.249, de

26/12/95, veio alterar a legislação do Imposto sobre a Renda e da contribuição social sobre olucro das pessoas jurídicas. Sabidamente, esses tributos vêm sendo recolhidos mensalmente, pelo chamado sistema de "bases correntes", complementado pela declaração anual de ajuste.O art. 15 da Lei 9.249/95 dispõe sobre a determinação da base de cálculo do recolhimentomensal do imposto. Cuida-se ali de base de cálculo estimada, já que não tem apoio no lucroreal. O legislador, mediante critérios não explicitados, fixou qual percentual da receita brutada empresa corresponderia a seu lucro. Assim, na revenda de combustíveis foi estimado um

percentual de apenas 1,6% (art. 15, § 1º, I), o que se explica por ser razoavelmente conhecidaa chamada "margem de lucro" desse setor da economia. Para o setor de transporte, foi adotado

o percentual de 16%, abrindo-se exceção para o transporte de carga, que ficou nos 8%, presumivelmente por seus maiores custos. E o percentual mais alto - 32% - foi reservado paraas atividades de prestação de serviço, abrindo-se exceção apenas aos serviços hospitalares,

para os quais foi mantido o percentual de 8%. Numa primeira leitura, é possível afirmar que osetor de serviços ficou com o percentual maior porque, em regra, envolve menores custos que

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as atividades comerciais e industriais. E dessa premissa se tira que os serviços hospitalaresforam excepcionados por motivo inverso, ou seja, porque são mais onerosos para oempresário, exigindo uma estrutura física (prédio, móveis, equipamentos, etc.), humana(médicos, enfermeiros, etc.) e operacional (prestação de serviços intensivos e ininterruptos) dealto custo.

Assim, a regulamentação administrativa da IN/SRF n.º 480/04, do Ato

Declaratório Interpretativo SRF n.º 18/2003 "desbordam da legalidade" quando exigem que osserviços sejam prestados no espaço físico de um hospital.

Basta que se trate de serviços que apoiem ou complementem aquelesprestados pelo hospital, conforme o entendimento anterior da Administração expresso naInstrução Normativa n.º 306, de 12 de março de 2003. O que importa na aferição do que sejaserviço hospitalar, portanto, é a essência da prestação sem consideração de elementosexternos, como, por exemplo, local ou subordinação.

Nas palavras do Min. Teori Albino Zavascki (REsp n.º 763.147/RS, DJ24.04.2006 p. 370), a 1ª Turma do STJ vem entendendo que o enquadramento de determinadoserviço médico como sendo ou não serviço hospitalar , para fins de incidência do imposto derenda, depende da própria natureza do serviço prestado, e não da instituição que o oferece.

Ressalta-se que esse exagero foi, em parte, abrandado pela a Instrução Normativa n.º 539, de 25/04/2005, que afastou aquelas exigências, praticamente retornando àsregras anteriores.

Cabe destacar, ainda, terem sido prestigiados, em recente julgado da Colenda

Primeira Seção deste Regional (Embargos Infringentes em Apelação Civel nº2005.70.00.016081-7, j. 04/06/2007, Rel. Des. Federal Joel Ilan Paciornik) os marcosconceituais densificativos quanto à estrutura e organização do serviço hospitalar previstosna IN 539/05. Com efeito, na esteira de recentíssimos precedentes do Egrégio STJ, nossacolenda Primeira Seção decidiu dever o estabelecimento caracterizar-se por atividadespreponderantemente hospitalares, contendo uma estrutura complexa e organizada de talmodo que possibilite a internação do paciente.

Já no tocante às atividades relacionadas como serviços hospitalares, a IN539/2005, na medida em que remete à Resolução-RDC n.º 50, de 21.02.2002, da Diretoria daANVISA, excedeu a natureza regulamentar ao exigir que os serviços ali relacionados fossem

prestados em prédios e instalações configurados conforme os preceitos da ANVISA.

Veja-se, aquelas normas administrativas, no que se refere às especificaçõestécnicas dos prédios, ambientes e equipamentos, não têm relevância para o Direito Tributário.Dizem respeito ao controle sanitário. Nesse sentido, basta ler o art. 1º da Resolução-RDC n.º50, de 21/02/2002, para concluir que ali não se teve a preocupação de definir o que sãoserviços hospitalares, e sim de estabelecer regras para os projetos físicos dosestabelecimentos de saúde.

E sequer é possível invocar essa regulamentação para aferir a regularidade dofuncionamento das unidades já existentes, pois ela dispõe para o futuro. Esse entendimentoé confirmado, aliás, nos arts. 1º e 2º da Resolução RDC n.º 189, de 18/07/2003, que veio

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alterar a Resolução RDC 50/2002: Art. 1º Todos os projetos de arquitetura de estabelecimentos de saúde públicos e privadosdevem ser avaliados e aprovados pelas vigilâncias sanitárias estaduais ou municipais

previamente ao início da obra a que se referem os projetos. Art. 2º A Licença Sanitária de Funcionamento destinada a construções novas, áreas a seremampliadas e/ou reformadas de estabelecimentos já existentes e dos anteriormente nãodestinados a estabelecimentos de saúde, de serviços de saúde públicos e privados ficacondicionada ao cumprimento das disposições contidas nesta Resolução e na Resolução

ANVISA RDC n.º 50 de 21 de fevereiro de 2002. (...)

Art. 19. Projetos que já se encontram em trâmite de análise seguirão as normas anteriores aesta Resolução. Projetos já aprovados e com obra já iniciada terão seu trâmite conformerotina anterior a esta Resolução.

Operou em desvio de poder o administrador, assim, ao vincular,genericamente, o conceito de serviços hospitalares a um regulamento sobre projetos deconstrução, ampliação ou reforma de unidades de saúde.

Ademais, o eminente Des. Federal Antonio Albino Ramos de Oliveira (AMS N.º2005.70.00.015459-3/PR, Segunda Turma, D.J.U. de 21/6/2006) já afirmou que, "se formosadmitir tais restrições, é bem possível que grande parte dos grandes hospitais, hoje emfuncionamento, mas construídos em épocas pretéritas, fiquem ao desabrigo da alíquotareduzida, fixada pelo legislador para a prestação de serviços hospitalares. Afastadas, porém,essas indevidas limitações, a INS 539/2005 dá guarida à pretensão da autora, uma vez quesuas atividades se encontram nela arroladas.".

Por fim, caber a análise das limitações trazidas pelo inciso I do art. 2º do AtoDeclaratório Interpretativo da SRF n.º 18/2003. Entendo que elas ferem o princípio daisonomia, ao discriminarem o médico que, concomitantemente com sua profissão, desenvolveatividade econômica organizada.

De fato, incidindo o tributo desigualmente entre contribuintes de igualcapacidade contributiva, há quebra da isonomia. Assim, devem ser proibidas distinçõesarbitrárias, consideradas tais as que não se baseiem na capacidade contributiva.

Como nos diz Fabio Brun Goldschimidt (O princípio do não-confisco no DireitoTributário. São Paulo: RT, 2003, p. 213-214), para que se sustente que determinado tributoincidente sobre certa atividade está extraordinariamente elevado, devemos compará-lo com

aquele pago em outra situação semelhante. E a inconstitucionalidade (por afronta também aoart. 150, VI) apresentar-se-á não somente quando as duas exigências forem diferentes, semque exista razão para tanto, mas também quando, admitida a possibilidade de tratamentodiferenciado, verificar-se, mediante o confronto das exigências, que o tamanho da diferençade tratamento não é razoável.

Portanto, é abusiva a discriminação do administrador entre as sociedadesempresariais com exclusiva mão-de-obra dos médicos sócios e as que contam com mão-de-obra de terceiros, porque, além de estabelecer uma diferença irrazoável quanto ao médico que

presta o serviço hospitalar, não há referência direta à natureza do serviço hospitalar, referindo-se a algo secundário, isto é, à organização na qual tal serviço está envolvido.

De outro banda, o segundo controle judicial de toda a reportada regulamentaçãoadministrativa sobre os "serviços hospitalares" diz respeito à observância das determinações

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programáticas dos artigos 196 e 197 da Constituição da República Federativa do Brasil de1988, pelas quais, à toda evidência, o Estado deve reduzir custos às atividades inerentes aoSistema Nacional de Saúde. Veja-se o teor de tais artigos:

"Art. 196 - A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais

e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso

universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação." (destacamos)

"Art. 197 - São de relev ância pública as ações e serviços de saúde , cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado." (destacamos)

Nesse sentido, registro que a Segunda Turma deste Regional já vem adotando a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Veja-se o que registra o eminenteMin. Castro Meira no voto condutor do REsp 831731/RS, Segunda Turma, DJ 16.06.2006:

Por certo, o mencionado dispositivo legal além de não vincular o conceito de "serviçoshospitalares" ao local em que são prestados, mas sim à sua finalidade, sejam próprios,

suporte ou auxiliares daqueles prestados no âmbito hospitalar, merece uma interpretaçãoteleológica, pois objetiva reduzir os custos do tratamento da saúde, ante ser "direito de todose dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à reduçãodo risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços

para sua promoção, proteção recuperação", consoante dispõe o artigo 196 da Constituição da República.

Destarte, o conceito de serviços hospitalares também está ligado à finalidadepara os quais são prestados (proteção da saúde). É inegável o caráter finalístico da Lei n.º9.249/95: objetiva reduzir os custos do tratamento da saúde.

Em suma:a) é possível trabalhar no campo tributário com o conceito indeterminado;

b) se a tarefa interpretativa do conceito indeterminado for insuficiente, residindoele na zona de penumbra, no halo de cores pálidas, frente a persecução da boa administração,

persiste o dever de conduzi-lo a uma das zonas de certeza, razão pela qual subsistirá aoadministrador o encargo de sopesar com exclusividade as circunstâncias do caso, utilizando-

se de uma intelecção pautada em critérios estritamente administrativos, adentrando, pois, nocampo da discricionaridade administrativa. Neste caso, é possível e devida a sindicabilidade

jurisdicional, visto nenhuma lesão ou ameaça de direito poder ser excluída da apreciação doPoder Judiciário. Contudo, não poderá o Judiciário impor uma decisão diversa da que foieleita pela autoridade administrativa, mas deve tornar nulo os atos administrativos quedenotem desvio de finalidade;

c) o termo "serviços hospitalares" é um conceito indeterminado não vinculado, pois não pode ser densificado mediante um simples procedimento de interpretação. Sua

significação está no "halo conceitual" e é necessário um ato administrativo de valoração paradissipar a incerteza;

d) o juiz, ao avaliar a disciplina complementar administrativa sobre "serviçoshospitalares", deve, sem adentrar no mérito administrativo (teoria do desvio de poder),

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verificar se a competência discricionária foi exercitada dentro dos limites ditados peloordenamento jurídico, ou seja, se a Administração, em atuação discricionária densificadora(prognose) respeitou a totalidade dos princípios jurídicos, entendidos na sua devida dimensão.Cabe, em especial, destacar a importância dos princípios do não-confisco, da capacidadecontributiva e da isonomia na parametrização da sindicabilidade judicial, bem como asdiretrizes programáticas dos arts. 196 e 197 da CF/88.

Sobre a análise da prova

Havia uma divergência na jurisprudência da Primeira Seção deste Regionalsobre o tipo de prova do serviço hospitalar a ser perquirida em juízo.

A primeira linha de entendimento sustentava ser suficiente para definir anatureza do serviço prestado o contrato social, conforme entendimento antigo do e. STJ.

Nesse sentido, salientava o eminente Des. Federal Antonio Albino Ramos deOliveira que não há como presumir que a empresa requerente esteja prestando serviçodiferenciado (não-hospitalar), mas, se houver prestação de serviços outros que não os queconstam do seu contrato social, não fica a Fazenda impedida de autuá-la e exigir o impostode renda calculado de acordo com os percentuais próprios desses outros serviços. Masquanto a esses serviços, cuja prestação consta no seu contrato social (e que é suporte do seu

pedido), não há como afastar a natureza hospitalar .

Um segundo entendimento, de outra banda, defendia ser necessária também aanálise da questão fática, isto é, o juiz deveria ir além do contrato social e dos documentoscomerciais apresentados para verificar se necessário, caso a caso, todas as provas trazidas

pela parte que afirma desempenhar serviços hospitalares.

Conforme já noticiado acima, tal controvérsia restou pacificada no recente julgamento dos Embargos Infringentes em Apelação Civel nº 2005.70.00.016081-7, j.04/06/2007, Rel. Des. Federal Joel Ilan Paciornik, haja vista ter a Colenda Primeira Seçãodeste Regional optado pela citada segunda corrente de entendimento.

Assim, o julgador deve observar conjuntamente os conceitos densificadores deserviço hospitalar estabelecidos na Resolução-RDC n.º 50, de 21.02.2002, da Diretoria daANVISA (quanto ao contrato social e tipo de atividade desenvolvida) e na IN 539/05 (quantoà estrutura complexa e organizada de tal modo que possibilite a internação do paciente).

Sobre o caso concreto

A parte autora juntou seu contrato social (fl 26 - artigo 3º), no qual consta ter por objeto a prestação de serviços médicos e clínica oftalmológica.

Não pretendeu produzir provas, requerendo o julgamento antecipado da lide (fl.50).

Assim, entendo que a parte autora não se desincumbiu do ônus de provar quedesenvolve atividades equiparadas às hospitalares, uma vez que limitou-se à juntada de seucontrato social, do qual não há como afirmar que as atividades desenvolvidas demandaminternação.

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Desta forma, voto por negar provimento ao apelo da parte autora, nos termos dafundamentação supra.

Juíza Federal Luciane Amaral Corrêa MünchRelatora

Documento eletrônico assinado digitalmente pelo(a) Juíza Federal Luciane Amaral CorrêaMünch, Relatora, conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura deChaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e Portaria do TRF4R nº 195 de 16 de dezembro de 2004(DJU de 24/12/2004 pg. 25). A autenticidade do documento pode ser conferida no sitehttps://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php informando o código verificador 1731390v12 e,se solicitado, o código CRC 86A23B21.

Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUCIANE AMARAL CORREA MUNCH

Nº de Série do Certificado: 42C50813Data e Hora: 27/06/2007 17:13:26