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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO EMASSENTAMENTOS PRECÁRIOS: O CASO DO
GUARITUBA EM PIRAQUARA/PR
Fabiana Alves Monteiro
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia
Universidade Federal do Paraná
INTRODUÇÃO
Desde a década de 1950 a população urbana do Brasil, mais que dobrou,
passando de 36% a 84% no ano de 2010. (IBGE, 2014), processo este que se intensificou
sobretudo após 1970 e foi acompanhado de uma crescente periferização. Num curto
período de tempo boa parte da população rural tornou-se urbana e a falta de estrutura das
cidades para receber grandes contingentes de pessoas, aliada à especulação imobiliária, à
ineficiência do Estado em atender a população de baixa renda, além das sucessivas crises
econômicas, colaboraram para a inserção de parte dessas pessoas em áreas inadequadas,
ambientalmente frágeis e não raramente sem um mínimo de infra-estrutura.
As moradias precárias localizadas em áreas que comprometem qualidade do
meio ambiente é hoje um dos maiores problemas das grandes cidades brasileiras. Dados do
Censo de 2010 do IBGE apontam que cerca de 6% da população brasileira residem em 6.329
aglomerados subnormais, sendo que a maioria recebem até três salários mínimos. O que
reitera que a falta de moradia está estritamente relacionada a desigualdade social,
conforme atesta Santos (1996), ao afirmar que “ao longo do século, mas sobretudo nos
períodos mais recentes, o processo brasileiro de urbanização revela uma crescente
associação com o da pobreza, cujo locus passa a ser cada vez mais a cidade, sobretudo a
grande cidade”.(SANTOS, 1996, p. 10).
Se os anos noventa foram marcados por escassez de investimentos nas áreas
sociais, principalmente na provisão de moradia para as classes de baixa renda, na última
década tem-se presenciado um maior esforço do Estado para amenizar esse problema. No
entanto, muitas vezes essas iniciativas são impulsionadas por razões políticas e/ou
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econômicas, e se restringem a locais específicos, especialmente em áreas em que as
moradias irregulares prejudicam a qualidade do meio ambiente, ou comprometem a plena
lucratividade do mercado imobiliário.
Segundo discurso do Governo Federal a meta da nova Política habitacional que
vem se estruturando no Brasil é de reduzir o déficit habitacional brasileiro que em 2000 era
de 7.223 milhões unidades. (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2005). Dessa forma, desde o ano
de 2002 com a posse do presidente Luis Inácio Lula da Silva, foram criados/aprimorados
fundos e programas que dentre outras medidas, visam produzir moradias em larga escala
para a população de baixa e média renda, financiadas a longo prazo e também promover a
urbanização e a recuperação ambiental de áreas faveladas, envolvendo a remoção de
famílias das áreas de risco e a implantação/adequação de infraestruturas. E de fato, ao
longo desses anos houve uma redução no déficit habitacional, ainda que pequena, 5.792
milhões de domicílios em 2012, (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2014). Programas como o
Minha Casa Minha Vida (MCMV) tem facilitado o acesso da população de baixa renda a casa
própria e o Programa de Urbanização de Assentamentos Precários do PAC, melhorado as
condições de habitação e do meio ambiente em áreas faveladas. O que se pretende aqui, é
levantar algumas questões relacionadas a eficiência desses programas, especialmente o
último.
O recorte espacial desse artigo é a UTP do Guarituba, que desde o ano de 2007
vem sofrendo intervenção do Estado para resolver problemas relacionados às ocupações
irregulares, a ausência de infraestruturas e a degradação do meio ambiente. Nesse período
contabilizava segundo dados da COHAPAR (2007), um total de 44 mil habitantes, sendo que
estimava-se que 24.000 viviam irregularmente, em condição de exclusão social e com uma
infra-estrutura precária, numa área de mananciais que, apesar de sua importância para o
abastecimento de água da Região Metropolitana de Curitiba, foi degradada durante anos.
Piraquara no contexto da Região Metropolitana de Curitiba
O Município de Piraquara, localizado a leste de Curitiba possui uma população
de 93.279 habitantes, sendo 49,08% população urbana (IBGE, 2010)1. No entanto, já na
década de 1990 sua população estava nessa faixa, mas com a emancipação do seu distrito
Pinhais, em 1992, o município perdeu 71% da sua população e 21% do seu território.
1 O IBGE considera a população do Guarituba (44 mil), como sendo rural, contrariando o que foi estabelecido no novo zoneamento para o município, em 2006. (COHAPAR, 2007).
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(TERBECK, 2008). Ainda assim, segundo a autora, Piraquara apresentou no período entre
1996 e 2000 uma taxa de crescimento anual de 8,53%. Atualmente o município é dividido
nos distritos Sede e Guarituba, sendo que cerca de 92% do seu território configura-se como
Área de Proteção Ambiental, constituída por bacias de abastecimento público da RMC,
encontrando-se aí as APAs dos Rios Piraquara e Iraí e as UTPs do Itaqui e Guarituba, onde
os reservatórios existentes no município são responsáveis por cerca de 70% do
abastecimento de água da RMC. (PLANO DIRETOR, 2006). Lima (2000), afirma que foi a partir
de 1990 que houve uma proliferação das ocupações irregulares na Capital e no seu entorno,
como no caso de Piraquara, integrante da Região Metropolitana de Curitiba desde a sua
formação.
No que diz respeito ao parcelamento do solo em Piraquara, dados da Comec
(2006) indicam que teve início em 1940, tendo seu auge na década seguinte. A partir dos
anos sessenta houve uma diminuição brusca no número de aprovações de lotes que se
acentuou na década seguinte, em função da implantação da Lei Federal N° 6766/79 de
Parcelamento do solo. A partir desse período o estado e os municípios passaram a legislar e
fiscalizar a ocupação em áreas de mananciais, servindo como um dos instrumentos a então
criada Comec. No entanto, na década de 1980 vários fatores vieram a contribuir para que o
município de Piraquara tivesse aumento populacional significativo, inclusive nas áreas de
mananciais, como a sua proximidade à Curitiba e a disponibilidade de lotes a baixo custo. O
Gráfico 12 apresenta a evolução do crescimento populacional em Piraquara a partir da
década de 1970.
2 Conforme já foi explicitado, a redução da população total de Piraquara entre 1991 e 2000 não significa que o município teve crescimento negativo nesse período, esse decréscimo deve-se ao desmembramento do Distrito de Pinhais em 1992.
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Gráfico 1 – População de Piraquara a partir de 1970.
Fonte: Organizado pela autora com base nos dados da COMEC – PDI (2006) e Censo do IBGE (2010).
Lima (2001, p. 100) afirma que entre 1991 e 1996 Piraquara chegou a crescer
10,86% a.a., o que significa que a cada ano, 2.102 novos habitantes passaram a integrar a
população do município. Como resultado, tem-se a formação de inúmeras ocupações
irregulares em seu território, especialmente na região chamada de Guarituba, dada a
disponibilidade de lotes a baixo custo, embora estes mesmos não forneciam infraestrutura
adequada e, também a sua maior proximidade com Pinhais e a capital.
Nesse período, tendo em vista proteger áreas como esta, foram tomadas
algumas medidas pelo poder público como a criação do Sistema Integrado de Gestão e
Proteção dos Mananciais da Região Metropolitana de Curitiba (SIGPROM/RMC), através da
Lei Estadual N° 12.248/98. E também das Áreas de Proteção Ambiental (APAs) do Rio
Pequeno, Irai e Piraquara e as Unidades Territoriais de Planejamento (UTPs) do Guarituba e
do Itaqui, cujo zoneamento e ocupação do solo buscava adequar as ocupações existentes e
ordenar as futuras.
O Guarituba
A região do Guarituba foi declarada Unidade Territorial de Planejamento (UTP)
em 1999, através do Decreto Estadual N° 809 e caracteriza-se por sua fragilidade ambiental,
sendo composta na sua maioria por solos hidromórficos, possuindo lençol freático
aflorante, o que favorece alagamentos e prejuízos à população residente. E, dada a sua
proximidade com o núcleo central constitui ainda hoje num grande foco de crescimento
populacional, apesar da precariedade da oferta de serviços e infra-estruturas.
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Em razão dessas características e da sua importância para o abastecimento de
água da RMC, a Cohapar realizou em 2006 um diagnóstico físico e socioeconômico que
serviu de subsídio à elaboração da proposta de intervenção que veio a ser implantada no
ano seguinte. Nesse diagnóstico, a Cohapar, em parceria com a Prefeitura Municipal, a
Sanepar e a SESP, realizou um cadastro social da população do Guarituba tendo por objetivo
identificar as características socioeconômicas dos moradores. Dessa forma a área de
intervenção foi dividida pela Prefeitura Municipal em 5 setores com um total de 8.212 lotes
distribuídos em 400 quadras. Para a realização do cadastro social foram entrevistadas 8.258
famílias sendo que 632 não atenderam ao convite de cadastramento.
Conforme Geraldi, Loyola e Rosack (2007), os dados apontavam que 6.387 lotes
encontravam-se ocupados por 8.890 famílias, o que correspondia a 30.233 pessoas; havia
867 lotes não ocupados; 328 lotes com edificações de comércio, serviços, e uso
institucionais; e 630 lotes com unidades de moradias em construção ou desocupadas. Do
total das ocupações, 800 famílias estavam instaladas em áreas inadequadas e impróprias
para moradias, havendo necessidade de relocação. O Quadro1 demonstra essa situação:
Quadro 1: Famílias com previsão de serem relocadas.Área FamíliasFaixa de Preservação Permanente do Rio Irai 142Ocupação irregular entre o canal extravasor e o Rio Irai 100Área de Restrição à Ocupação (enchente) 148Área de Restrição à Ocupação (ocupações irregulares) 52Área atingida por obras de macrodrenagem 255Área atingida por obras do sistema viário 103Total 800Fonte: Organizado pela autora com base em GERALDI, LOYOLA & ROSACK (2007).
O cadastro socioeconômico realizado pela Cohapar apontou também as
características socioeconômicas da população, como a situação ocupacional dos moradores,
demonstrada no Quadro 2.
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Quadro 2: Situação ocupacional das famílias cadastradas.Ocupação Número de pessoas %Com carteira assinada 2.956 35,8Sem carteira assinada 739 9Pensionistas e aposentados 630 7,6Autônomo com previdência social 210 2,5Autônomo sem previdência social 1.699 20,6Outros sem previdência social 53 0,6Desempregados 808 9,8Não informado 1.163 14,1Total 8.258 100Fonte: Organizado pela autora com base em GERALDI, LOYOLA & ROSACK (2007).
Também demonstrou que a maioria da população é constituída por adultos, na
faixa entre 21 a 60 anos, possuem baixa escolaridade e renda familiar de até 3 salários
mínimos (58%). As famílias se caracterizavam também por serem numerosas: 47,8% eram
constituídas por 3 a 4 pessoas, sendo que a maioria 36%, residia na região entre 5 e 10 anos,
33% a mais de 10 anos e 31% a menos de 5 anos. (GERALDI, LOYOLA & ROSACK (2007).
Através da análise dos dados é possível constatar que a população do Guarituba
é predominantemente de baixa renda e a região caracteriza-se como periférica, no sentido
usual da palavra, onde predomina um quadro de segregação espacial e degradação do meio
ambiente. As Figuras 1, 2 e 3 demonstram as condições do Guarituba antes da intervenção.
Figuras 1, 2 e 3 : Condições de moradia no Guarituba.
Fonte: COHAPAR (2009).
Ainda em 2006 um novo Plano Diretor para o município de Piraquara foi
contratado pela Unidade de Gerenciamento do Projeto de Saneamento Ambiental do
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Paraná (UGP ParanáSan), como parte das compensações ambientais provocadas pela
implantação da Barragem Piraquara II. Na proposta do zoneamento do município o
território da UTP do Guarituba foi incorporado ao perímetro urbano, dada as suas atuais
características e necessidades. Também foi proposto um novo zoneamento para a UTP do
Guarituba em razão da contínua degradação do meio ambiente e do aumento da densidade
populacional na área.
Com o objetivo de complementar as propostas do Plano Diretor de Piraquara a
Comec realizou nesse mesmo ano o Plano de Desenvolvimento Social, Urbano e Ambiental
para a UTP do Guarituba sendo que “este plano propôs alguns ajustes no zoneamento da
UTP e definiu propostas nas áreas de desenvolvimento voltadas à regularização e
atendimento de infra-estrutura básica” (LIMA, CAMPOS & TERBECK, 2008, p. 276).
Figuras 4 : Localização do Município de Piraquara e do Guarituba na RMC.
Fonte: COMEC (2006).
A POLÍTICA HABITACIONAL DO BRASIL APÓS O ANO DE 2002
Conforme já foi explicitado, desde o ano de 2002 vem se consolidando no Brasil
uma nova forma de lidar com a questão habitacional, onde fundos e programas foram
criados e/ou adaptados para atender as populações de mais baixa renda, que constituem a
maior parte do déficit habitacional brasileiro. Sendo que estes mecanismos também têm
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como propósito atender a classe média, através principalmente do financiamento a longo
prazo de casas populares e ao mesmo tempo manter o desenvolvimento do setor
imobiliário e reaquecer as atividades do ramo da construção civil.(CARDOSO, ARAGÃO &
ARAUJO, 2011).
Embora seja imaturo tecer conclusões sobre esse processo que ainda está se
estruturando, é possível dizer que importantes transformações ocorreram no campo da
habitação nesse período, como a criação do Ministério das Cidades, a aprovação da Política
Nacional da Habitação, do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e do Fundo
Nacional de Habitação de Interesse Social. Dessa forma, segue aqui algumas breves
considerações a respeito dessas transformações.
Nesse cenário, um dos primeiros marcos foi a aprovação em 2001 do Estatuto da
Cidade, que segundo Ferreira (2012) foi de fundamental importância, pois,
(...) regulamentou importantes instrumentos para e que os poderes públicos
municipais enfrentassem o mau uso da terra urbana, a retenção especulativa, a
informalidade da posse, ou ainda facilitassem o seu acesso pelas camadas de mais baixa
renda. A própria criação do Ministério das Cidades, em 2003, e a implantação dos conselhos
e fundos nacionais, estaduais e municipais de habitação foram outros avanços consideráveis
na política habitacional brasileira, mesmo que, atualmente, a criação de grande parte deles
seja meramente formal ou esteja em fase de implementação. (FERREIRA, 2012, p. 53).
O Ministério das Cidades
Um das primeiras iniciativas do governo Lula no plano da habitação, segundo
Bonduki (2008), foi a criação do Ministério das Cidades em 2003, que é composto por quatro
secretarias nacionais: Secretaria Nacional da Habitação, do Saneamento, Mobilidade Urbana
e Programas Urbanos. Inspirado no Projeto Moradia, teve como meta uma busca pelo
equacionamento global da questão habitacional do Brasil e conforme o autor, o projeto foi
conduzido de modo a ouvir especialistas, administradores públicos e militantes envolvidos
com essa problemática e acolher todas as propostas existentes no país, que buscassem
encaminhar essa questão. Além de reunir as propostas “foi elaborada uma análise da gestão
pública na área da habitação e da disponibilidade de recursos existentes e passíveis de
mobilização”. (BONDUKI, 2008, p. 90).
O autor ressalta ainda que o Ministério das Cidades, conforme sua proposta tem
a função de coordenar toda a política urbana e habitacional do país, estruturando e
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implementando o Sistema Nacional da Habitação, elaborando o PNH e estabelecendo as
regras gerais de financiamento habitacional. Sendo um órgão coordenador, gestor e
formulador da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, envolvendo as políticas
voltadas a cidade e resgatando para si a coordenação política e técnica das questões
urbanas. (BONDUKI, 2008, p. 96).
Ainda em 2003, o Ministério das Cidades promoveu a realização de Conferências
Municipais, Regionais e Estaduais, onde foram debatidos os problemas das cidades e
apresentadas sugestões com o intuito de elaborar políticas a serem adotadas pelo órgão.
Neste mesmo ano foi realizada a Conferência Nacional das Cidades, que resultou na criação
do Conselho das Cidades e a aprovação das diretrizes para a nova Política Nacional de
Desenvolvimento Urbano. (BRASIL, 2004, p. 12).
A Política Nacional da Habitação (PNH)
A Política Nacional de Habitação desenvolvida nesse período, segundo suas
premissas, tem por objetivo promover as condições de acesso à moradia digna a todos os
segmentos da população, especialmente o de baixa renda. Tem como componentes
principais a integração urbana de assentamentos precários, a urbanização, regularização
fundiária e inserção de assentamentos precários, a provisão da habitação e a integração da
política de habitação à política de desenvolvimento urbano, que definem as linhas mestras
de sua atuação. (BRASIL, 2004, pp. 29-30).
A Política Nacional de Habitação é composta de quatro instrumentos: o Sistema
Nacional de Habitação (SNH), o Desenvolvimento Institucional, o Sistema de Informação,
Avaliação e Monitoramento da Habitação e o Plano Nacional de Habitação.
O Sistema Nacional de Habitação (SNH)
É o principal instrumento da Política Nacional da Habitação, estabelece as bases
do desenho institucional que se propõe democrático e participativo, prevê a integração
entre os três níveis de governo e com os agentes públicos e privados envolvidos com a
questão, define as regras que asseguram a articulação financeira de recursos onerosos e
não onerosos, necessária a implantação da Política Nacional da Habitação. (BRASIL, 2004, p.
29). É dividido em dois subsistemas: Subsistema de Habitação de Interesse Social (SHIS) e
Subsistema Nacional de Habitação de Mercado (SHM).
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O Subsistema de Habitação de Interesse Social (SHIS)
Foi baseado no primeiro projeto de iniciativa popular apresentado ao Congresso
Nacional em 1991, resultado da mobilização nacional dos Movimentos Populares de
Moradia de diversas entidades e do Movimento Nacional da Reforma Urbana. Tem como
principal objetivo a garantia do acesso à moradia digna para a população de baixa renda
que compõe a quase totalidade do déficit habitacional do país e para tanto, conta com
recursos onerosos e não onerosos. (BRASIL, 2004, p. 66). Bonduki afirma que o grande salto
do SHIS “ocorreu com a Resolução 460 do Conselho Curador do FGTS, que tornou possível
uma massiva aplicação de recursos deste, que é o principal fundo para investimento
habitacional, em subsídios habitacionais, cujo montante atingiu, em 2006 e 2007, 1,8 bilhões
de reais anuais”. (BONDUKI, 2008, p. 99). Sendo que, através desse subsídio e com outras
alterações em programas existentes, foi ampliado o atendimento as classes de baixa renda.
O Subsistema Nacional de Habitação de Mercado (SHM)
É composto pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo, (SBPE) e pelas
transações de capitalização das empresas do setor da construção, via Fundos de
Investimento Imobiliário (FII) e SFI. Conta ainda com recursos captados pelos bancos, fora do
âmbito do SBPE, que começam a ser destinados a produção/financiamento habitacional.
Seu objetivo é reorganizar o mercado privado da habitação, “tanto na ampliação das formas
de captação de recursos, quanto no estímulo à inclusão dos novos agentes, facilitando a
promoção imobiliária”. (BRASIL, 2004, p. 53).
Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS)
O FNHIS foi criado a partir da adaptação do projeto que previa a criação de um
Fundo Nacional de Moradia, parte das reivindicações dos movimentos populares por
habitação e virou Lei Federal N. 11.124 de 2005, a mesma que instituiu o SNHIS. Tem como
objetivo centralizar e gerenciar recursos provenientes do Orçamento Geral da União (OGU),
destinados ao subsidio, para realização de programas estruturados no âmbito do SNHIS.
Na sua aprovação, Bonduki (2008) afirma que foi eliminada a possibilidade do
FNH agregar no seu interior um mix de recursos onerosos (FGTS) e não-onerosos (fiscais),
como propunha o Projeto Moradia, dessa forma o FNHIS tornou-se assim um fundo de
investimento contanto basicamente com recursos orçamentários. Dessa forma o FNHIS
permitiria o repasse de recursos a fundo perdido para os estados e municípios principais
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executores das políticas. Sendo que entre 2006 e 2009 foram alocados no FNHIS recursos da
ordem de R$ 4,4 bilhões, beneficiando mais de 4.400 projetos. (CARDOSO, ARAGÃO &
ARAUJO, 2011, pp. 2-3). Segundo os autores o FNHIS definiu aos estados e municípios a
necessidade de elaborar seus Planos Estaduais de Habitação de Interesse Social (PEHIS) e
Planos Locais de Habitação de Interesse Social (PLHIS), como condição para repasse de
recursos, levando a uma nova estruturação do Sistema de Habitação em todos os níveis e
motivou o início de um planejamento de setor habitacional.
Bonduki, por sua vez, coloca que, a partir da aprovação do SNHIS do FNHIS em
2005, ocorreram alterações significativas na área de financiamento habitacional, tanto no
subsistema de habitação de mercado como no de interesse social.
Houve uma substancial elevação dos investimentos, de todas as fontes de
recursos, ampliação do subsídio, foco mais dirigido para a população de baixa
renda, destinação crescente de recursos ao poder público e ampla captação de
recursos de mercado, gerando o que muitos consideram um novo boom
imobiliário. (BONDUKI, 2008, pp. 99-100).
Plano Nacional de Habitação – PlanHab
Coordenado pela Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, se
constitui como um dos principais instrumentos para a implementação da nova Política
Nacional de Habitação - PNH, estando previsto na Lei 11.124 de 2005, que instituiu o
Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS).
Segundo o Ministério das Cidades o processo participativo foi um dos pilares
constitutivos do PlanHab, onde foram organizados diversos debates regionais e setoriais,
envolvendo especialmente o acompanhamento direto dos representantes do Conselho das
Cidades e do Conselho Gestor do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
(CGFNHIS). Dessa forma, o PlanHab é parte de um processo de planejamento de longo prazo
para o setor habitacional, necessitando de revisões periódicas e articulação com outros
instrumentos de planejamento orçamentário-financeiro do Governo Federal, permitindo
que suas metas de produção física e de avanços institucionais possam estar associadas ao
planejamento dos recursos necessários para sua cobertura e tendo o ano de 2023 como
horizonte final para a elaboração de estratégias e de propostas. (BRASIL, 2013).
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O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
Lançado em 2007, foi divulgado pelo Governo Federal como um plano
estratégico de resgate do planejamento e de retomada dos investimentos em setores
estruturantes do país, atuando em três eixos: infraestrutura logística; infraestrutura
energética e infraestrutura social e urbana, onde se insere o Programa de Urbanização de
Assentamentos Precários e posteriormente o Programa Minha Casa Minha Vida. Previa
investimentos de R$ 106,3 bilhões na área habitacional entre 2007 e 2010, sendo R$ 17
bilhões não onerosos, destinados a ações integradas de urbanização, melhorias
habitacionais e saneamento ambiental em assentamentos precários. Conforme informações
do Ministério do Planejamento, o PAC ajudou a dobrar os investimentos públicos (de 1,6%
do PIB em 2006 para 3,27% em 2010), além de promover a geração de empregos. Em 2011
entrou na segunda fase, tendo como objetivo acelerar o ritmo de crescimento da economia,
aumentar a geração de emprego e a renda e diminuir as desigualdades sociais e regionais e
manter os fundamentos macroeconômicos (BRASIL, 2014).
Bonduki coloca que apesar de boa parte do PAC estar voltado para obras de
infraestrutura para a produção, os setores da habitação e saneamento também foram
privilegiados, através de aplicações em urbanização de assentamentos precários. (BONDUKI,
2008, p.103). E conforme boletim divulgado recentemente, através desse programa, 3.151
empreendimentos foram contratados entre 2007 e 2009, somando R$ 20,5 bilhões, com
média de execução de 65%. A partir de 2011, foram contratadas 432 novas ações em
assentamentos precários, totalizando R$ 12,6 bilhões em investimentos, para beneficiar 590
mil famílias, em 345 municípios de 26 estados. Atualmente 1.496 empreendimentos foram
concluídos, beneficiando 129 mil famílias. (BRASIL, 2014, p.160).
No entanto, Cardoso, Aragão & Araújo afirmam que o PAC Habitação causou um
deslocamento na centralidade do FNHIS na Política Habitacional, onde o PAC passou a
submeter todos os programas governamentais com o impacto no crescimento econômico,
inclusive o FHNIS. E, ao contrário deste, os recursos do PAC não são submetidos a
mecanismos de controle social ou a critérios institucionais de redistribuição, “sendo a sua
alocação prerrogativa exclusiva da Casa Civil da Presidência da República”. (CARDOSO,
ARAGÃO & ARAUJO, 2011, p. 4).
O Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV)
Foi criado em 2009 através da Lei Federal N. 11.977, em resposta a crise
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econômica mundial e para aquecer o setor da construção civil, tendo por objetivo promover
a construção de unidades habitacionais para famílias com renda mensal de até 10 salários
mínimos (cerca de 60% é voltado para famílias com renda de até 6 salários mínimos).
A meta inicial do Governo Federal era a construção de 1 milhão de moradias até
2014, divididas em três grupos: o 1º com renda mensal de até 3 salários mínimos; o 2º com
renda de até 6 salários mínimos; e o terceiro com renda mensal de 6 a 10 salários mínimos.
Já em 2011, o programa passou para a sua segunda fase (MCMV2), onde a meta passou a
ser de 3 milhões de moradias até 2014, sendo que os municípios com menos de 50 mil
habitantes, que até então não eram atendidos pelo programa, passaram a ser beneficiados.
(BRASIL, 2013). Atualmente, 3,4 milhões de moradias foram contratadas, sendo que dessas,
1,7 milhões foram entregues a população. (BRASIL, p. 160, 2014).
Conforme Cardoso, Aragão & Araújo, a criação do PMCMV influenciou os
programas desenvolvidos no âmbito do FHNIS no que se refere à eliminação de repasses de
recursos para ações de provisão habitacional, onde o FNHIS passou a concentrar os seus
recursos nas ações de urbanização de assentamentos precários. Colocam ainda os autores,
que o papel dos estados e municípios passa a ser o de organizar a demanda, através de
cadastros imobiliários encaminhados a CAIXA, para a seleção dos beneficiários e o de criar
condições para facilitar a produção, através da desoneração tributária e da flexibilização da
legislação urbanística dos municípios. E, em alguns casos, estados e municípios podem
ainda viabilizar o atendimento a demanda de baixa renda através da doação de terrenos
públicos, mas ainda assim, o promotor do empreendimento deixa de ser o setor público e
passa ser o setor privado.
Considerando o desenho adotado para o programa, fortemente ancorado na
participação do setor privado, o PMCMV entrou em choque com os princípios do
SNHIS: pautado no papel estratégico do setor público, ignorou em larga medida
premissas e debates acumulados em torno do Plano Nacional de Habitação de
Interesse Social – PlanHab, então amplamente discutido desde 2007. Um dos
impactos mais imediatos sobre os programas desenvolvidos no âmbito do FNHIS
diz respeito à eliminação dos repasses de recursos para as ações de provisão
habitacional. (CARDOSO, ARAGÃO & ARAUJO, 2011, p. 5).
Além disso, muitas das criticas que se tem feito a respeito do Programa MCMV,
por autores como Cardoso e Ferreira, estão relacionadas às dimensões desses
empreendimentos e a sua localização, a maioria nas franjas dos núcleos centrais das
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grandes cidades, ou mesmo em áreas distantes, periféricas e sem infraestrutura adequada,
situação encontrada por todo o país. Inclusive os meios de comunicação tem destacado
também a demora na conclusão de algumas obras e a qualidade duvidosa dessas moradias.
Possíveis causas para essa situação dizem respeito à falta de controle e de fiscalização dos
órgãos responsáveis, logo que fica a critério de empresas privadas a definição do padrão da
moradia, a localização dos empreendimentos e sua dimensão, ainda que exista definido um
número máximo de moradias por empreendimentos.
A intervenção no Guarituba
O projeto implantado no Guarituba foi operacionalizado através do PAC –
Urbanização de Assentamentos Precários/Projetos Prioritários de Investimentos (PPI),
voltado para a intervenção em favelas, sob responsabilidade do Ministério das Cidades. Tem
como finalidade de executar ações integradas e complementares de urbanização,
regularização fundiária, produção de moradias, recuperação ambiental e trabalho social. A
implementação das intervenções é amparada por ações e programas geridos pelo
Ministério das Cidades, cuja operacionalização é realizada pela CAIXA. (BRASIL, 2007).
Segundo o Ministério das Cidades, a seleção de projetos que hoje compõem o
PAC - Urbanização de Assentamentos Precários foi realizada de duas formas e momentos
distintos: a primeira, no início de 2007, voltada aos grandes complexos de favelas, e a
segunda, anual, voltada à seleção dos assentamentos de menor porte, por meio de seleção
pública. Isso implicou em duas estratégias e critérios distintos. Num primeiro momento
foram selecionados, por meio de pactuação federativa, os projetos prioritários de
investimentos com foco em grandes assentamentos, que exigem maior volume de recursos
e com grande complexidade de execução. Sendo que os critérios adotados foram os
seguintes:
√ Grande porte, assim consideradas aquelas intervenções que envolvem
investimentos superiores a R$ 10 milhões;
√ Articulação e integração no território, cujas áreas de abrangência e execução
envolvam mais de um agente institucional – estado e município ou mais de um município;
√ Mitigação de danos ao meio ambiente, causados por assentamentos
irregulares em áreas de mananciais, de preservação ambiental e/ou de preservação
permanente;
√ Eliminação de gargalos na infra-estrutura logística do país, tais como aquelas
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que impedem ou prejudicam o funcionamento de rodovias, hidrovias, ferrovias, portos,
aeroportos, energia, água tratada e esgoto;
√ Mitigação de impacto decorrente de grandes instalações de infra-estrutura
nacional, que polarizam e dinamizam atividades socioeconômicas na área de influência do
empreendimento;
√ Aproveitamento do patrimônio da União; e
√ Complementação de obras já iniciadas. (BRASIL, 2014).
Para as seleções anuais, os recursos foram direcionados ao atendimento de
assentamentos de menor porte, desde que a área de intervenção fosse ocupada por, pelo
menos, 60% (sessenta por cento) das famílias com renda até 3 salários mínimos, ocupada há
mais de cinco anos; ou que estivesse localizada em situação que configure risco,
insalubridade ou fosse objeto de legislação que proibisse sua utilização para fins
habitacionais.
No Paraná, o PAC – UAP/PPI está sendo implantando através da Cohapar desde
2007, quando o seu então presidente, Rafael Greca, apresentou ao Ministério das Cidades e
a Caixa Econômica Federal, 54 projetos de urbanização em aglomerados urbanos no Paraná
e alguns deles foram aprovados e incorporados ao PAC. Em agosto deste ano o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva veio a RMC anunciar os recursos do PAC que seriam destinados a
obras de habitação e saneamento em sete municípios do Paraná, sendo quatro na RMC:
Campo Magro, Colombo, Pinhais e inclusive Piraquara, onde o projeto foi anunciado como
sendo o maior em áreas de mananciais do país. Os outros três municípios beneficiados
nesse período com os recursos do PAC foram: Foz do Iguaçu, Londrina e Maringá. Essa
primeira etapa do PAC da Habitação no Paraná previa para esses quatro municípios da RMC
investimento de R$ 161,7 milhões, para atender a 48 mil famílias que residiam em áreas de
risco. (COHAPAR, 2014).
O projeto implantado no Guarituba previa a construção de 953 moradias, sendo
803 financiadas pelo PAC e 150 com recursos do FNHIS, sendo que o Guarituba está entre os
47 projetos do PAC escolhidos pelo Ministério das Cidades para receber recursos adicionais
da ordem de R$ 4,2 milhões. O total de investimentos previstos é R$ 98 milhões, incluídos a
contrapartida do Estado e do Município (COHAPAR, 2007).
Este projeto, denominado de Plano de Recuperação Ambiental e Urbanização do
Guarituba foi elaborado pela Cohapar juntamente com a Prefeitura Municipal, sendo que a
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proposta de intervenção para a área engloba políticas, programas e projetos de várias
secretarias do Governo do Estado do Paraná como a Comec, Sanepar, Copel, Suderhsa,
Mineropar, Sedu/Paranacidade e IAP. Seguiu as premissas do programa Direito de Morar,
criado na gestão do governador Roberto Requião (2002-2010), que por sua vez, segue as
diretrizes básicas do SNHIS e do Programa de Urbanização de Assentamentos Precários do
Governo Federal. A proposta de intervenção envolve três áreas: 1) Área destinada à
implantação de loteamento para reassentamento da população; 2) Área destinada à
implantação do Parque Guarituba; 3) Área destinada à implantação de equipamentos
comunitários.
Sobre a intervenção no Guarituba, Almeida afirma que “trata-se de uma
reurbanização ambiciosa, pois esbarra em situações de difícil solução, apresentando
aspectos físicos desfavoráveis, condições de moradias não adequadas e condições
sócioeconômicas não-solucionáveis”. (ALMEIDA, 2010, p. 142).
A Cohapar definiu o padrão habitacional implantado como o de casas
germinadas, casas individuais e sobrados com 40m², com dois quartos, sala, cozinha e
banheiro. O valor previsto da prestação paga pelo mutuário é de R$ 82,91, durante 120
meses.
Passada a fase de desapropriação dos terrenos necessários à implantação do
Projeto e a abertura de licitações para o empreendimento, a construção das casas do
Conjunto Residencial Madre Teresa de Calcutá (AR1), com total de 694 casas, teve início de
fato em setembro de 2009 e foi concluída em 2014. Atualmente a segunda fase do Projeto
encontra-se em processo de consolidação, embora a conclusão das obras tenha sido
prevista para o fim do ano de 2011.
RESULTADOS
Cabe agora analisar os resultados obtidos até o momento e discutir se o projeto
e capaz de atender as expectativas da população que há mais de uma década ansiava por
melhorias na sua qualidade de vida. Discutindo a efetividade do programa, Almeida coloca:
A relocação das famílias assentadas em áreas de risco ambiental, no caso do
Guarituba, para terrenos próximos à ocupação inicial proporciona uma
diminuição do impacto social às famílias relocadas. Porém não altera algumas
situações que contrariam a ocupação em mananciais como a densidade
inadequada para regiões de Proteção Ambiental. (...) a proposta de intervenção
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poderá solucionar a questão fundiária e a complementação da infra-estrutura
urbana básica para a região do Guarituba. Faltam, no entanto subsídios desse
programa que atendam a proposta da redução da pobreza, sendo esta uma
limitação evidenciada por esta intervenção urbana. (ALMEIDA, 2010, p. 143).
Com base nas informações disponibilizadas pela Cohapar, pela Prefeitura
Municipal de Piraquara e por jornais de circulação no Paraná, é apresentada a seguir uma
análise das principais transformações na área desde o inicio do processo, em ordem
cronológica, principalmente no que se refere à melhoria da infra-estrutura, da recuperação
da qualidade do meio ambiente, da regularização fundiária e das transformações na vida da
população, evidenciando quais foram/são as principais dificuldades para o pleno êxito do
projeto.
Quadro 4 : Ações previstas e resultados efetivos no Guarituba no período de 2005-2014. Ano Atividades Previstas Resultados 2005
–
Mobilização para a implantação do Projeto; Cadastramento das famílias beneficiadas e requisição ao Ministério Público para liberação da área.
2006
–
Elaboração do Projeto e ações de regularização fundiária; Previsão de investimentos: 52 milhões, sendo R$ 50 milhões repassados pela Caixa a fundo perdido; Licitações para realização das obras de macrodrenagem3.
2007
Assinatura do Contrato;
Em maio o projeto é apresentado à população pelo presidente da Cohapar;Incorporação ao PAC; Valor total estimado para a obra: R$ 97,8 milhões (incluindo a contrapartida do Estado e do Município).
2008
Licença Ambiental;Ajustes no Projeto de Trabalho Social; Ajustes no Projeto de Engenharia;Licitação: Valas da Secagem da AR1 e AR2.
Tem início em janeiro as ações de regularização fundiária, sendo entregue a posse dos lotes para 700 famílias; E das ações de desapropriação e compra dos terrenos para a instalação da AR1 e AR2;Neste ano, no entanto não foram feitos grandes avanços, alguns proprietários de terrenos atingidos pelas obras entraram com recursos e entravaram as ações de desapropriações.
Execução: Valas da Secagem da AR1 e AR2;Envio SPA Global para CAIXA; Liberação da
A Cohapar divulga que 37 quadras de lotes serão abertas para a construção das casas da AR1 e que para evitar o alagamento serão necessários 100 mil m³ de terra, volume equivalente a 7 mil caminhões de porte médio para a elevação do terreno em cerca de 90 cm.
3 Segundo declaração posterior do então Governador do Estado, Roberto Requião a Cohapar, neste período as obras foram inviabilizadas, porque as empresas de terraplanagem se negaram a fazer o aterro por menos de R$ 3 milhões.A alternativa adotada por ele então, foi de dispensar essas empresas e passar a responsabilidade ao Departamento de Estradas de Rodagem (DER), que assumiu as obras e a fez por R$ 1 milhão de reais. (COHAPAR (2009).
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Ano Atividades Previstas Resultados2009
AR2 para Obras de Secagem; Edital: Assistência Técnica; Edital e Licitação: Terraplanagem da AR1 e AR2; Execução: Terraplanagem da AR1 e AR2; Licitação das 803 casas da AR1 e AR2;
Execução pela Sanepar de 1.116 ligações de água e 17.871 metros de rede de esgoto, num investimento de R$ 1,79 milhões, sendo que a companhia teria feito um acordo com a Prefeitura e o Estado, não tendo o mesmo cronograma e orçamento do Projeto; Elaboração pela SUDERSHA do projeto macrodrenagem (investimentos de R$ 3,6 milhões e microdrenagem em R$ 21,5 milhões; Execução de 1.887 m, de asfaltamento, dum total previsto de cerca de 50 Km em asfalto ou paver;Instalação de postes de iluminação e rede de energia elétrica, pela Copel; É autorizado o início da construção das casas da AR1.
2010
Execução das 803 casas da AR1 e AR2;Entrega das 803 casas para o mês de setembro; Execução 2° etapa.
A Cohapar justifica-se pelo atraso das obras;Em outubro, cerca de 100 famílias, o equivalente a cerca de 400 pessoas invadiram a Área de Restrição à Ocupação do Guarituba, em um terreno particular e no início de dezembro as 350 famílias que haviam invadido a área foram despejadas.
2011
–
Com a mudança na gestão do Estado, houve novas discussões para agilizar as obras; Incorporação à segunda fase do PAC e no eixo MCMV.
2012
–
Entrega das primeiras 212 casas do Residencial Madre Teresa de Calcutá (AR1); Em setembro foram entregues mais 10 casas e em novembro mais 241, totalizando 4634.
2013 Conclusão do projeto. – 2014
Entrega de 104 moradiasno mês de julho e do Parque Acará em Agosto.
Entrega de mais 231 unidades. Até o mês de julho deste ano, 694 unidades habitacionais haviam sido entregues a população.
Fonte: COHAPAR (2007-2014); Décimo balanço do PAC (2014).
Um dos impasses para a implantação do programa, além da própria dimensão e
complexidade do Guarituba, foi o processo licitatório. Conforme Almeida, em maio de 2009
foi aberto o edital para licitação da construção das casas da AR1, entretanto, nenhuma
empresa compareceu. Em julho, houve uma nova tentativa e apenas uma empresa se
candidatou, fracassando o processo novamente. A autora aponta que uma das
possibilidades desse fracasso foi o baixo valor oferecido para a construção das casas, R$
21,5 milhões, além da dificuldade em construir em solo turfoso, com lençol freático
4 As moradias foram entregues através de um sorteio para as famílias que tinham previsão de serem relocadas. Nessa ocasião houve alguns protestos por parte de moradores, insatisfeitos com o tamanho da casa, no entanto, as opiniões se dividiram, houve também quem saísse a favor do projeto, afirmando que a casa poderia ser ampliada com o tempo, conforme relato da COHAPAR (2012).
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aflorante. Cabe dizer também que o Guarituba, é ainda foco de novas ocupações
irregulares. Em seus 31,59 km², coabitam áreas de extremo adensamento populacional e
inúmeros lotes vazios, muitos em localizados em áreas urbanizadas e servidos de
infraestruturas e de mobiliário urbano. Tanto que no ano de 2010 o Guarituba foi destaque
nos noticiários, pois centenas de famílias invadiram um terreno particular as margens da
rodovia PR 415, numa Área de Restrição a Ocupação, na esperança de serem beneficiadas
pelo Programa. No entanto, com a promessa de serem contempladas após a conclusão do
projeto, previsto então para 2012, as 350 famílias foram despejadas meses depois do local
pela Polícia Militar. Meses antes o jornal Gazeta do Povo já havia denunciado que o
Guarituba continuava sendo alvo de novas ocupações irregulares, baseando-se em
informações da equipe de regularização fundiária do município. A estimativa era de que a
população estaria crescendo cerca de 8% ao ano e que cerca de mil famílias (o equivalente a
4 mil pessoas) haviam chegado ao Guarituba desde 2007 e, grande parte delas se instalado
de forma irregular. (GAZETA DO POVO, 2010)5.
As Figuras a seguir destacam as transformações que tem ocorrido no Guarituba
e, que até o momento tem-se restringido a implantação/adequação de infraestruturas e a
relocação das famílias que moravam em áreas de risco para os Conjuntos AR1 e AR2,
localizados as margens das duas principais vias de acesso. Nota-se que especialmente na
AR1 houve mudanças significativas, através da construção de muros e dos chamados
“puxadinhos”, e inclusive, alguns deles servem como estabelecimentos comerciais, conforme
a figura 7.
Figuras 5, 6 e7: Conjunto Residencial Madre Teresa de Calcutá (AR1).
Fonte: A autora (2014).
5 Reportagens publicadas nos dias 20/03/2010 e 13/10/2010, disponíveis no arquivo digital do Jornal: www.gazetadopovo.com.br.
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Figuras 8, 9 e 10: Conjunto Residencial Fazenda Guarituba I (AR2).
Fonte: A autora (2014).
Ainda que seja cedo para se chegar a uma conclusão a respeito do projeto
implantado no Guarituba, até porque o mesmo não foi concluído, é possível perceber
algumas transformações que beneficiaram a população, especialmente aquela que foi
relocada. Também houve algumas melhorias nas condições do meio ambiente e da
infraestrutura do local e a implantação de alguns equipamentos sociais, mesmo que estes
não atendam a todos os moradores. Todavia, em geral o Guarituba continua apresentando
aspecto periférico, no seu significado tradicional e dada a sua dimensão e as características
socioeconômicas da população, pode se dizer que não serão apenas essas medidas que irão
reverter um quadro de pobreza e exclusão social que está na sua origem.
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INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO EM ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS: O CASO DO GUARITUBA EM PIRAQUARA/PR
Eixo temático: 4 – Problemas socioambientais no espaço urbano e regional.
RESUMO
O presente trabalho trata das recentes intervenções do poder público em assentamentos
precários e tem como objetivo analisar se estão ocorrendo melhorias significativas no meio
ambiente e na vida da população dessas áreas. Para tanto, analisa o caso da região do Guarituba,
localizada em área de mananciais de abastecimento público, no município de Piraquara/PR, onde,
no momento da intervenção predominava a irregularidade das ocupações, a insuficiência de
infraestruturas, a precariedade das moradias e a degradação do meio ambiente. A região,
relegada durante décadas à própria sorte, passou a partir de 2005, sofrer intervenção do estado e
do município e, em 2007 foi incorporada ao Programa de Aceleração do Crescimento – PAC: Eixo
Urbanização de Assentamentos Precários. Dessa forma, primeiramente são apresentados os
principais fatores responsáveis pela formação do Guarituba e as características gerais da Nova
Política Habitacional instituída no Governo Lula que vem influenciando nas recentes
transformações da região. A partir disso, são analisadas as propostas originais do projeto de
intervenção, contrapondo o que foi previsto aos resultados até o momento, evidenciando os
vários impasses ocorridos durante a sua execução, o que tem colaborado para que a intervenção
seja uma das que mais se arrasta no Paraná, não apresentando ainda resultados significativos.
Conclui dessa forma demonstrando que, apesar da região ser alvo da intervenção do Estado,
ainda sofre com ocupações irregulares, sendo que os equipamentos sociais previstos/implantados
são insuficientes para atender toda a população e que o aspecto geral de pobreza e exclusão
pouco se alterou.
Palavras-chave: Intervenção; Política Nacional da Habitação; Guarituba.
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