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7/25/2019 Introdução a Volpi.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/introducao-a-volpipdf 1/3
MARIO
PEDROSA
lntrodução
a
Volpi
Mário
Pedrosa
não
merece
homenagens.
Seria
injusto
para
a sua
combatividade,
para
a
idéia
polêmica
e
rigorosa
que
faz
da
produção
da
arte,
homenageá-lo
de
alguma
forma. Obriga-
tório
é
ler
e
reler
seus
textos, estudar
as
suas
intervenções
corajosas, inteligentes
e
historica-
mente lúcidas,
E
o caminho
nesse
sentido é
longo:
desde
pelo
menos
os anos
40
a
sua
par-
ticipação no ambiente
cultural
brasileiro
foi
sempre decisiva e renovadora,
sobretudo
em
termos da
pólítica
cultural
que
lutou
para
fi-
xar, distante
tanto do
nacionalismo
estreito
e
anedótico
quanto
do
colonialismo
cultural do
qual permanecemos
infestados.
Pedrosa
pensa
a
arte num
quadro
amplo,
pol
í-
tica e
culturalmente. A
sua
defesa dás
lingua-
çns
e
do
projeto
construtivo
na década
de 50,
o seu
apoio
às
vanguardas
dos anos
60 e
70,
demonstram
a abertura histórica em
que
exer-
ce sua
observação
e
pratica
sua
teorização.
Conceitos
como
o de
"arte
pós-moderna"
foram
e
ainda
são instrumentos
eficazes de
luta
no
circuito
de
arte
brasileiro
e
sua ideologia
esteticista dom inante.
A
ausência
de Mário
Pedrosa
representa,
para
além
do
lugar-comum,
uma
falta.
Embora
compreensível, não
é
a atitude mais
produtiva
senti-la
nostalgicamente..
A manobra
positiva
é
procurar,
sempre
que
Íor
possível,
atualizar
sua
presença,
canalizar a energia
de
seus textos
e
de
seu
pensamento para
as
tarefas críticas
necessárias às circunstâncias
presentes.
A
re-
cente
edição
do
seu
livro
"Mundo.
Homem,
Arte
em
Crise"
(Editora
Perspectiva, coleção
Debates), organizado
por
Aracy Amaral,
uma
reunião
de
artigos
e ensaios
que
abrangem o
período
de
1959
a
1970,
permite
o
início
de
um
trabalho
nessa
direção.
Ao
publicar
"lntrodução
a
Volpi"
Malasartes
pretende
levar
adiante
essa
atualização
do
pensamento
de
Mário
Pedrosa. Pensamos
que
há interesse em ler
(e,
para
alguns reler)
o
que
disse
o
mais
importante
crítico
de arte
brasi-
leiro sobre
um
pintor-chave
da nossa
arte
mo-
derna,
no
momento em
que
este
fazia
sua
primeira
grande
exposiçâo
no Rio de Janeiro,
em
1959.
Com a
palavra
aquele
que
nunca
deveria
perdê-la
nesse
país,
Mário
Pedrosa.
Mário
Pedrosâ
-
AJB
7/25/2019 Introdução a Volpi.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/introducao-a-volpipdf 2/3
Dia
6
de
iunho,
quintilfeira,
o
Musgu
de Arte
Mo'
derna do
Rio
ÍranqueaÍá
ao
público
a
mostra
Íetros'
p""riu"
a"
Alfredo
Volpi,
aÍtista
que,
pela
autentici-
ããe
ae
tr"
experiência
e
pela
linguagem
pessoalÍssi-
nn, de
grande
foÍça
poética,
a
que
úegou,
sB
@loca
como
figura
de
primeira linha
da
arte
brasilsira
con'
umpora-nea.
Ceica
de
60
trabalhos'
de
1924 a
1957'
coÍÌStitu8m
o
corpo
dsssa
exposição,
enÍiquêcidô
com
Íotografias
de
murais
Ísalizados
em
residências
parti-
qrlare6,
p€lo
artista'
ainda no
tempo
em
que
era
,docorad-or
da
paredes,,.
ou
o
"decorador
do Çam-
buci",
como
o
chamaram
na época.
Mário
Pedrosa,
que Íoi o
encarregado
de
organizar
a
mostra,d€
üolpi,
escreveu
para
o
catálogo
do
Museu
uma-'ln'
troduÉo
a AlÍredo
Volpi",
que
é
o
melhor
caminho
para
se
chegar
à
humildade
e
gÍande
arte
desse
pintor'
F.G.
Esse
pintor
brasileiro,
AlfÍedo
Volpi,
é mais
do
que
paulistano,
é
do
Cambuci.
Não
nasceu
neste bairro,
Íressm
Luccs,
na ltália,
em
1 896.
Desde
os
1
8
meses,
pgrém,
gue
se
instalou com
a
famíliã
-
um casal
do
italianos,
com
très filhos
*
no
Cambuci,
que
dos
velhos
bairros
da
Paulicéia,
é
dos
raros
a terem
resis-
tido
ao
progrgsso.
E
por
isso
mesmo
conseÍva
eín
grsnde
parto
suâ
fisionomia
antiga.
O
pai,
pequeno
nogociante,
tentou
vários
negócios.
rrtas
tanto
am
Luçca
como
em
São
Paulo,
nunca
Í62
a
América.
O
menino
Alfredo,
aos
16
anos.
entrou para
a
"construção
civil".
como aprendiz
da
decorador
de
parades.
Depois
da
escola
primária,
seÚ
grimeiro
of
íçio
foi,
porém,
o
de
entalhador;
o
segun-
do de
Encadernador.
O
terceiro,
enfim,
Íoi agu€le
em
que
se
Íez. Ouando
se
iniciou
nele.
reinavaentreos
ÍnestÍes
da
pÍoÍissão
o estilo
"Íloral",
puro
"art
nou;
reau".
Era
em 1912'
AlÍÍedo
Volpi
Íoi
aprendiz
consciencioso,
desde
o
primeiro dia
em
que
começou
a carregar
para
os
mais
vElhos
os
potss
e bâldes
com água
e
cal,
os
pincáis,
as
escadas.
Aprendeu
a
misturar
as
tint6,
e
ouvia
aÈntamônte
a
lição
do
mestre,
quando
Íecomendava
oía
6
qngrossaf
a
tinta, ora
a toÍn#la
Ínâis
Íluida
para
o
óleo
esclrrtr
melhor.
Cedo
principiou
a lidsr 9om
o
muÍo,
a
prepaÍar
o
reboco.
a
caiâlo'
E,
Íealmente'
a
sra
academia,
foi
a
rude,
a boa,
escola
do
pintor
de
psredes; em
pouco
tempo,
o
iovem
Volpi
gÍa
promo'
vido
a
"decoradoÍ",
título
quB,
durante
muito
tempo'
errrégou
com
lggítimo orgulho,
e
que
o
permitia
oontratal,
e16 mesíno,
por
conta
própria,
as
empreita-
das.
Nesses
Íneios
autênticos
e símples,
em
quo
a
tra'
dit'o
impora
e ainda
ss
respeita
ã
maestria
do
bgm
oficio,
os
problgmss
estéticos
são
resolvidos
por
si
ÍÌEsmos:
cads
época
t6m seus
precei-tos
decorativos'
A
sua
era, como
iá
dissemos,
a
do
"art
nouveau"'
Os
tsmas
não variavam,
e tudo
dependia
de
quem
Íazia
a
encomenda;
se èra
italiano,
lá
se
sabo: a deco'
ração
tinha
de
sôr
renascentista;
mas
se era
Írancâs
ou
brasil€iro
tinha
de
sor
Luiz
XV,
enquanto
quo
06
turcos
não dispensavam
o
"mourisco".
Volpi,
bom
emproiteiro,
contsntâva
a
clientela,
à
riscâ.
Ficou
dessas
decorações
de
empreitada,
ao
gosto
da
época
e
do
freguês,
quase
nada;
o
pÍogresso Íulminan'
tà
dê
São
Paulo derrubou
a maioria
da casas
onde
se
ènconlravaln,
antigas
vilas
6
palacetes,
nas
guais
o
dono,
iá
ern
viss
de
prosperidade,
tazia
questão
de
ter paredet decoradas.
a
caráter. Hoie,
no
h'rgar dessas
velhas
câsas
quâ5ê
núnca
belas
mas
quáse
sempre
con'
Íortáveis
e
invariavelmente
êsp8çgsas,
erguem-se
ar'
ranha-céus,
secos
e
som
fant6ia,
nos
quais
o
espaç
é
utilizado
com
usura'
Descobrimos,
no
entanto'
no
seu
wlho
Cambuci,
uma
antiga
casa,
à Ílorentina'
çuia
sub
à"
iantat
foi
por
ele decorada
com
motivos
clás'
i',"or,
gtt*'roÍnunos;
nêla há
tambóm
um
tsto
sobÍe
urnì'Ã*uu,
à maneira
barroca.
com
anioi
em
scor'
zo
no céu
ou
debruçsdos
em
parapeito'
Anos depois,
guando
Volpi
lá
consciento
da
existân'
cia
da outra
pintura,
começava
a
distinguir€e
como
ointor de
cavalete,
um
franoâs,
despeitado.
o
xingou
de
"o
decorador
do
Cambuci"'
Mas
no
seu
sabor
de
coisa
popular autêntica,
o tÍtulo
ó
Íealmente
nobre'
Com
&eito.
antes
do
tsr
o
noms iÍradiado
para
Íora
do
bairro,
i"to
ó,
pelo
centÍo
cosÍnopolita
da
Cidade'
p€lo
Rio
e
pelo
BÍasil,
e
mesrno
psla
estÍania,
se
iornou
Volpi
uma
celebridade
de
seu
Cambuci'
Tinha
16
anos
guando
oomeçou
a
pintar
em caa,
para
si
mesmo.
Sua
primoira
noção
de
"pinturabelas-
àres"
Íoi a
de
pintar
nõo
mais
de enomenda
nas
paredes
alheias,
mas
8m
sau
quarto,
sobre
pequenas
ielas
vagabundas.
para
divertir'so.
E
soÍreu,
sDtão,
as
primeir*
"influências":
o
menino
saÍa a
passear
pelas
ruas
adiacentss
ou
os
baiÍros
viztnhos,
em @rtas
port"s
ou
portões
parava
parô
aPrsciar
as
paisaqens
das entradás
das
casas,
dos
tarraços
e
alpendres'
Fo-
ram.
assim,
os
pintoros
anônimos
daqualas
sntradas
seus
primeiros mestres'
Aliás,
com
ele
nunca Íoi
diÍerente:
até
na
última
Íase
gpomátrica'Çoncrstista.
o
artista
so ÍecuEa
a
Separar
o
óue
é escola
do que
não ó escola, o que
ó
erudito do
que
não
ó
erudito,
o
guo
ss
aprends
por
ensino
do
que
se
aprende
sam sabeÍ
como;
com
a
vida.
digamos'
Mesmo
sobro
as
formas
e temas
geométricos de
sua
pintura
mais
recente,
gle
nos
diz:
"Nunca
so sab€
de
onde
vêm os elemonto6".
Vêm
de toda
parte,
e
se
de
cataventos
taz
triângulos, cúpulas
ele
transforma
em
círculos,
e
relângulos
eÍam
antes
bandeirinhas
de
papel,
Para
esse
homom
saudável,
iovial,
alegre, com
muitos
Íilhos adotivos,
uma
brava
mulher
e
uma
Íilha
faceira, cachorÍos
e
gatos
gue
lhe entram
familiar-
Ínente
pslo portãozinho
a dsntro,
la
na
sua
rua
tran-
quilâ,
ô
vida
6
realmentg'a
mestra
suprema'
É vão
procurar
na
sua
obÍa
inÍluência
de
mestres
imignes,
modemos
ou
antigos.
Nunca seguramento
abrú
uma
revista
de
arte estrangeira
Para
estudar
a
reprodução
ds
um
Picaso,
Matisse,
Renoir,
Van
Gogh
ou
Gauguin.
É
que
nunca precisou de
ir
buscar
nos
outros
as
soluções
en@ntradas
não
em
si mesmo
(não
é
pretenciosol
mas
em
roda de
si,
nos sgres
Eimples
que
o côrcam,
nas
crianças
que,
nos diz ele,
"nos
surpreendem
sempre".
nas
coisas
e
nos aÍazeres
cotidianos.
gurante
carto
tempo,
teve
como companheiro
e
ami-
go
um
pintor
popular
de
ltanhaém,
o Souza,
em cuias
paisagpns
Volpi
aprendeu
talvoz
a
soparâr
o sssancial
do
acessôrio, um
tom do outro.
FíequontôÍìente,
nas
prôias
do
ltanhaém
pintavam
iuntos,
o
Souza
e
o
Vol'
pi.
Souza
era
um
simples,
morreu
como
@Íloçou:
um
pintoÍ
popular.
Hoie
ss
diz
,pÍimitivo".
Volpi,
tambóm
continuou
a ser
o
guo
sompro
loi
-
artgsão
@nsciente
e simples,
mesmo
agoia.
quando
sua
figu'
ra
cros@
ê está
sm
vias
de
tornar-se
a
primgira
da
pintura
braÊilãiÍa
qontemporânea
e
6
de
qualquer
mo'
do. a
que
iogou
mais longo a
Íunda:
atings
a
uÍna
transcendèncÈ
âinda
não alcançada
na
arte
brasileira'
E
ele
chega
aps
extrsmos
da
racionalização
ab6tratô,
à
pintura
dita
"concretista",
sem
perder
a
graça,
e,
33
rob
o
s"u
pincel,
os
tsmas
geomêtÍicos mais
rigorosos
são
sensibilizados
por
uma c'or
que
funciona
pela
prescrição.
pela
pureza,
pela
vibração
luminosa,
em-
Lora umedecida
por
um
toque
de
lirismo
pessoal
in'
coníundível.
Ouando,
por
volta
de
1912,
começou
a
pintar
"para
si
me8Ínoi',
rugia
sm
Paris o
cubismo.
Em
1922,
por
ocsiõo
da
Semana
de
Arte
Modernâ,
no
Teatro
Mu-
nicipal
de
São
Paulo.
Volpi
iá
tinha
dez anos
de ta'
Íimüa
pictórica.
Nas
rodõ
suburbanas
da
capítal,
iá
brilhâva,
poÌám'
Talvoz
por
isso
mesmo,
não
tomou
conhaciÍúnto
do
a@ntecimento,
por
mais escanda
losas
quq
tivssssm
sido
as
maniÍ6sta9ões
pelas
quais.o
"modernismo" faz
sua
entrada
na pacsta São Paulo
dê
então.
a
meEna,
entÍetanto,
que
Mário de
Andra-
de chamara,
num
aÍrobatamênto
literário,
da
"Pauli-
céia
Dgsvairada"'
Nem
Volpi,
o
decorador
suburbano,
sabia da
€xistência
daqueles
grandss nomês @smo-
polit6
e
intelectuais,
nem
êles
sabiam
da
glória
ple-
Leia de cambuci.
Só
mais
tadê.
Mário
de
Andrade
e
Volpi
se
conhgceram,
se
estimaram,
e beberam
iuntos
até o
"Porra",
Para
Volpi
não
havia
duas
pinturas
nem
divisões
en-
tã
modernistas
e
passadistas:
a
pintura
era uma
só'
E
quando,
na
primeira
mostra
em
qu€
aParscgu
@m
Júirot,
itt clássificaram
al
tslas
ds
"impr€ssioni5tas",
admirou-se.
Tsw,
seguramente,
o
espanto
do
Mr'
Jourdain
quando
lhe
disseÍom
qu6
Íazia
prosa'
O
fato
sê
passou no
velho
Palácio
das
lndústrias'
Expt'seram
@m
ele
alguns
companheiros
de
profissão, todos
da
"construt'ã
civil"'
lsso
foi
em 1924'
DostÍêstraba'
lhos
apro6entados,
um
"Moça
Costurando"
-
foi
adquirido
pelo
atual
possuidor.
Custou
400
mil
réis'
Voipi,
o
mesrre
decorador,
Era
também
reconhecido
como
pintor.Tinha
ontão 28
anos.
A
partir
dessa
data,
ue
vido
começou
a dividiÍ'se
em
duas
partes:de
um
lado,
o
profissional,
o
mestredecorador
de
paredes;
do
outro.
o
artista
individual,
o
pintor
de cavalete'
O
m$treartÍfice
tomou consciência
de
ser
também
"artista".
Mas
foi
vãriÍicando,
talvez
com
melancolia,
qus
o
aÍtíÍio9
e
o
artista
iá
não
podiam
coabitar
d'entro
de
si mesÍno,
como
até
sntão.
É
que
os
Públi'
co3
a
quo
sorviam.
um
s
outro,
eram
irreconciliáveis'
0
decorador
de
parodeE
tÍsbalhava
para
homens
sim-
pl€6,
embor6
enriquecidos
ou
remediados,
muitos
dgles
antigos
artesãos
ou
pequsnos
comerciantes,
em
$raÍnaioria,
emigrados,
ao
passo
que
o
"novo"
pintoÍ
dê cavôleto
tinha
de satisfazeÍ
a
uma
cligntala
srisca,
toda
diíerônte, ora
d6
gonts
modesta,
ora
de snobs
ricos,
de
iôtelsctuais
sabichões
ou de
amadores
exi-
$ntês.
de
gosto
apurado
è individualista.
Nestos
do-
minavam
os
"ismos",
naqueles
a tradição'
O
artista
que
é
hoie
Volpi
se
foÍmou e
desenvolveu
dentro do mundo
ãrtesanal
da São
Paulo do
começo
do
#culo.
Ouando.
por
si
mesmo,
foi
consagrado
rneEtr6,
estâva
s€nhor
d0 todas
as
técnicas
das
pinturas
de
paredes
6
de
cavalete.
sem
ter
pàssado
sequer
por
uma
Êscola.
e
muito
menos
por
gualquer
a@domia
de
"BelasArtes".
Giíou'se,
como
artista,
na
indústria
de
construção
civll.
e com e$a
evoluiu
do
puro
artosana'
to
manual,
de
pedrairos
e mestresde-obra,
ao
nívsl
da arquit8tura
moderna
em
que
os
que
tratam
@m
pintoregartistas são
arquitetos,
quer
dizsr,
artistas
também,
A
arte de
Volpi
guarda
todas
as
marcas.dêsa
evolu'
ção,
Nos
longos anos
de trabalho
honesto
e
eÍiciente
na
profissão,
passou,
naturallÌrênte.
som
saber coÍno'
7/25/2019 Introdução a Volpi.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/introducao-a-volpipdf 3/3
;
.i
1ì
por
todas
as fases
da pintura
moderna,
do
impressio-
nismo
so expressionismo,
do
fauvismo
ao cubismo,
até o
abstÍacionismo. Se
na
sua fase
atual, de
onde
ficam
o
amor
aos
velhos materiãis
e
talvez a
preferên-
cia
final
pela
têmpera
(sem
Íalar
no apego ao
muro
em si),
iá
não
ss adapta
a
sua
arte, aos estilos
artesa-
nais
da construção
civil
de sua
mocidade,
prova
ela,
oontudo.que
a
verdadeira
escola de
um
pintor
não
são
as
academias
de belasartes nem
as
escolas espe-
cializadas
(afastadãs
do
mundo do
trabalho e
da
pro-
duçãol, mas
o
prôprio
aprendizado industrial
do dia.
Em sua evolução
de
pintor,
Volpi refez
a
do artista
qu6.
ao
sair
da
ldade
Média
e
do Renascimento,
ápoca das
corporações,
passou
à ldade
Moderna,
de
@m6rcio
livre,
em
que
as
corporações
se
dissolì/er8m,
I
definitiva se tornou
6
5eparação
entre
"b€las"
artes
I
ârtas
industriais.
Conseguiu,
no
entanto, ele
chegar
ao
ápice
da
evolu-
ção modorna,
a
partir
do
ofício
do decorador de pare-
des. Dãí tãlì/oz
lhô
tonha sido dado
guardaÍ
a
purgza,
a
inçnuidade
artÍsÌica, a
faturã
manual
dramatica-
ínente
precária
de sua matéria,
mesmo
nas
mais abs-
trâülg
ou "concretistas"
composições da última fase.
Sgus
instrumentos
de trabalho, seu$
materíais são
os
mۃmos,
entr€tanto,
da
produção
artesanal.
Com
thÊ,
pode
lerrar
sua
experiência até
o
fim.
Os
jovens
quo
holo
o
acompanham
têm de
partir
de outro
pla-
no, bsm
mais
complicado:
o
da indústÍia
moderna,
@m seus
in$rum€ntos
mecânicos,
seus materiais no-
vos,
sintéti@s
ou
plásticos, para
comeles
alcançar
umâ
visualidade
de
para
lá
das
puras
superfÍçies
volpianas.
dos ssus
xadrezes
ardentes
e
das diagonais
Íascinantgs
do
seu
"concretismo"
sui-generis.
Nesss
mostra atual,
pÍocurou-se
dar o
sentido de
conjunto da obra,
a
Íim
de qu6
rossaltem as
suas
diwrsas
Íases. Partindo
do uma espóciè de impressio-
nisÍÍro ingênuo,
s€gue-s€
uma
modalidado
de
expres.
sionismo em
que
a
representação
das coisas começa
a
ser
subordinada
às necessidaiJes
de
estruturar
a
com-
posição.
Outra
experiência
se
deÍine
por
certa
predi-
leção
pelos
temãs
sociais.
As
figuras são
então
como
pesadamente
argamasmdas
à
Cézanne,
e
o
claro-escuro.
que
quas6
predomina,
acaba desapare-
csndo,
pou@
a
pouco, para
dar lugar
a
um
jogo
de
tons
cromáticos
que
começam a construir a
composi-
ção,
As
paisagens
impressionistas,
ou
de
atmosfera,
as
Íiguras
temáticas
perdem
o
modelado e
uma
pintu-
ra
do
planos
coloridos
surge,
Enxotôndo,
afinal,
o
modelado,
as
coÍes
se
tornam
a
peÍsonagem
principal
de
suas
telas.
No entanto, aqui o acolá,
tons sombrios
e
misteriosos, uma atmosÍeÍa
carregada
de c€rtas
paisagens
antigas, lembram
o
nosso Goeldi
das
casas
mal
.assbmbradas
e
dos
corvos.
É
curiosa
ossa
afinide
de
de
atmosfera
de
certos momsntos
de Volpi.
com
o
gravador
nsto
de Munch,
Pouco
a
pouco,
depois de
ligeira
experiência de
uma
pintura ainda
ná
base
do volumo,
o
artista
bane
quaF
quer
sugestão
de terceira
dimensão. ao verifícar
que
o
"volume
destrói as cores", Dentro
do
macacão de
artesão,
o
colorista brota
cada
vez
mais
exigente.
Seus
planos
libertam-so
das convenções ilusiónísticas
e
se concretizam
realmente
6m
planos
na
superfÍcio.
A
sério
de
casas
principia
e
o
leva
até
o
abandono
total
de
qualquer
sugestão
figurativa.
Nas marinhas,
o ar e o
éu dssaparecem
sm
faixas
coloridas,
os
ts-
lhados
das casas
viÍam triângulos,
hdeiras e
ruas trang
formam-so
em retângulos,
ianolas
am
quadrados.
As
linhas
que
antes
contornavam,
com
üm desleixo sim-
plório
mas de disfarçada elegáncia,
as
áreasde
cor ou
as
figuras,
agora,
autônomas, tondem
ao traço, s um
grafismo
saboroso,
de ingônuo sabor
primitívo
ÍÌtãs
ao
meEno tempo de extremo roquinte,
apàcs
como
numa
caligraÍia
d0
"mâl
traçadas
linhas".
Volpi
dis-
farça
seu
extremo
apuÍo aÍtosanal: a nenhum mêstro
da
pintura
brasileira o supera
na
maestria técnica: sl8
é capaz
ds
pintar
em
todos
os
gêngros
€
estilos,
e
os
vBlhos recursos
da
píntura
acadêmÈa
lhes
são Íamilia.
res.
Tanto
é capaz de
nos
dar um nu
perÍeìtamento
académico,
como
nos surpreender com
uma madona,
de
admirável
fatura
e
precisão
técnica.
ao
puro
gosto
pr&renascimento
italiano.
Este
insular
do Cambuci
também
é um
criador da mítica
mulata
brasileira,
que
Di Cavalcanti
inaugurou na
nossa
pintura.
Osfi-
lhos
do
possuidor
de
"Figura
entre cortinas",
batizã-
ram-nai numa
evocação sugestiva, de
a
"Nega Fulô",
Muitos ainda
Íalam
dele como
de um "primitivo".
Se com
isso
querem
dizer
que
suas
aÍinidades
vão
para
os
"primitivos"
italianos, de acordo,
Mas
é o
que
âcontece
também com
toda
a sensibilidade con-
temporânoa,
gué
a Rafael
prefere
Giotto e,
à Capela
Sistina,
os
mosaicos de
Ravena,
Nem
pintor
"ingênuo" nem
"primitivo";
o
que
lhe
é
caracterÍstico
é a humildade
artesanal, Íruto
de uma
proÍunda
sabedoria
pictórica.
É,
porém,
puro
e sim-
ples
como um
autêntico
homem
do
povo.
Por
isso,
ao mesmo
tempo
gue
constrói uma cidade
Íantástica,
com
o
poder
evocativo da
pintura
metafÍsica, nos
encanta
çom
cataventos, bonecos,
joões-molengos,
do
sabor
inÍantil,
Nâo
se
diga, entretanto,
que
em
sua
pintura
só
existem tons alegres e
ioviais,
ingênuos ou
populares;
em
certas
telas,
como
"Bãrco", como
"Cadeirinha",
o
poder
de iólamento
mágico
do obje-
to
rende
uma atmosÍera
quase
tão densa
quanto
um
Van Gogh. É inútil
continuar a
destacar, aqui
e
acolá,
qualidades
ou
surpresas
na
obra do
pintor,
que
é varia-
da
e intensa
como
um rio.
Em 1950.
Volpi, em companhia
de dois
amigos
pin-
tores,
vai à
ltália,
praticamente. pela
primeira
vez.
Tinha
54 anos, Já
era
artista
perfeitamente
Íormado,
e sabendo
o
que
queria.
Lá encontrou
confirmação
para
o
que
estava
tentando fazer em
sua
terra,
Em
Veneza
Íicaram
35 dias. Mas enquanto os companhei-
ros
dali
não
arredaram
pé.
a
pintar
ao
ar
livre
passa
çns
célebres
da
cidade,
como
a
"Ponte
de
Rialto",
Volpi
deu
15
ou
'16
oscâpâdelas
a
Pádua,
para
con-
templar
o Giotto da Capela
do
Scrovegno. Em Arezzo.
descobriu Piero della Francesca. Mas,
confessa
ainda
hoie
com
ospanto
que,
numa
exposição
sacra
que
ali
so
fez.
4
ou
5
telas
de
Magaritoni
o
fizeram
esquecer
o
próprio
Pierol Assim,
Volpi
o
"primitivo", o
popu-
lar,
ao
próprio
Piero,
patriarca
do
Renascimento,
prefere
um
artista
de muito
msnos
nomeada,
ainda
bizantino,
isto
é, ainda
menos condescendente com
os
prazeres
dê uma matéria
sensorial,
ainda
menos
detalhista
e
realista na
sua
representação
exteÍior,
do
que o Íormidável
criador
da
lgreia
de
S, Francisco de
Arezzo.
Antes
de
ir
para
a
ltália,
sua
pintura
iá
estava
mudan-
de
para
uma
rigorosa
bidimensionalidade,
isto
é,
uma
pintura,
som
modolado,
de
puro
tom. Suas
incli-
nações
de muralista
voltaram
de
lá reforçadas,
No
en-
tanto,
a
não
s€r
a
pequena
e
convincente expe-
riência
da capolinha
do
"Cristo
Operário",
da Êstrada
do
VerguEiro,
de São
Paulo, por
iniciativa
de
um
Írade
dominicano, até
hoie
não
as
aproveitaram
os
nossos arquitetos
modernos.
O
preiuízo
não
é,
entre-
tanto,
para
o
pintor.
A
posteridade.
porém,
lhes
po-
derá
tomar satisfação
por
sssa
omissão
escandalosa.
Cariocas, meus irmãos,
aqui
ostá
Volpi. Agradec€mos
ao
Museu
de
Arte
Moderna
a ela
apresentação.
A
postoridade
vai
guardar
o nome
dele.
É o
mestre de
sua
ópoca.