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ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 24 A polêmica profética em Isaías 28,7-13 Fernando Cândido da Silva * Resumo O artigo faz uma exegese do texto de Isaías 28,7-13 objetivando a avaliação do debate profético que se encontra na perícope. Parece que a polêmica surge devido às divergências teológico-políticas em torno do destino da cidade de Jerusalém. Palavras-chave: profetas; Isaías; conflitos; Jerusalém. Abstract The article is an exegesis of the text of Isaiah 28,7-13 and wants to evaluate the prophetic debate in the pericope. It seems that the controversy arises because of the theological-political differences about the destiny of the city of Jerusalem. Keywords: prophets; Isaiah; conflicts; Jerusalem. Brigas e discussões. Polêmica. Acusações por toda parte! Esse é o contexto de nossa perícope. Enveredar em sua interpretação nos leva aos divergentes pensamentos teológico-políticos da Jerusalém do século VIII a.C. Como conduzir o povo? Que diziam profetas e sacerdotes de Jerusalém? Que dizia Isaías? A exegese do texto nos ajudará a entrever este debate. * Mestre em História pela Universidade Estadual Paulista e doutorando em Ciências da Religião na área de Literatura e Religião no Mundo Bíblico na Universidade Metodista de São Paulo, sob orientação do Prof.D.Dr Milton Schwantes. Este artigo é, em parte, fruto da pesquisa do mestrado sobre profetismo no Antigo Israel. Atualmente, o autor dedica-se na avaliação das múltiplas relações de poder inseridas na história da dinastia Omri presente na Obra Histórica Deuteronomista. Email do autor: [email protected]

IsaÃas 28 como polémica profética

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Isaias

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ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 24 A polmica proftica em Isaas 28,7-13 Fernando Cndido da Silva* Resumo O artigo faz uma exegese do texto de Isaas 28,7-13 objetivando a avaliao do debate proftico que se encontra na percope. Parece que a polmica surge devido s divergncias teolgico-polticas em torno do destino da cidade de Jerusalm.Palavras-chave: profetas; Isaas; conflitos; Jerusalm. Abstract The article is an exegesis of the text of Isaiah 28,7-13 and wants to evaluate the prophetic debate in the pericope. It seems that the controversy arises because of the theological-political differences about the destiny of the city of Jerusalem.Keywords: prophets; Isaiah; conflicts; Jerusalem. Brigasediscusses.Polmica.Acusaesportodaparte!Esseo contextodenossapercope.Enveredaremsuainterpretaonoslevaaos divergentespensamentosteolgico-polticosdaJerusalmdosculoVIIIa.C. Comoconduziropovo?Que diziamprofetasesacerdotesdeJerusalm?Que dizia Isaas? A exegese do texto nos ajudar a entrever este debate. * Mestre em Histria pela Universidade Estadual Paulista e doutorando em Cincias da Religio na rea de LiteraturaeReligionoMundoBbliconaUniversidadeMetodistadeSoPaulo,soborientaodo Prof.D.DrMiltonSchwantes.Esteartigo,emparte,frutodapesquisadomestradosobreprofetismono AntigoIsrael.Atualmente,oautordedica-senaavaliaodasmltiplasrelaesdepoderinseridasna histria da dinastia Omri presente na Obra Histrica Deuteronomista. Email do autor: [email protected] ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 25 Passemos tarefa, comeando com a traduo: 7 E tambm estes perderam o sentido com vinho e desviaram-se com licor. Sacerdote e profeta cambalearam com licor, foram devorados pelo vinho, extraviaram-se pelo licor; perderam a viso, vacilaram na sentena. 8 Pois todas (as suas) mesas esto cheias de vmito e excremento. No resta lugar (limpo)! 9 A quem instruir o conhecimento? E a quem ensinar a lio? Aos desmamados do leite, aos desmamados do peito, 10que (dizem): tsav latsav tsav latsav qav laqav qav laqav zeer sham, zeer sham. 11 Pois, com lngua balbuciante e com idioma estrangeiro ele falar para este povo. 12 Ele disse para eles: Este o descanso d repouso para o cansado e este o repouso! Mas no quiseram escutar. 13 E (por isso) a palavra de Iahweh ser para eles: tsav latsav tsav latsav qav laqav qav laqav zer sham, zer sham, Para que caminhem e caiam de costas, e se destrocem, e caiam na armadilha, e acabem presos. Aspectos formais Nossa percope comea algo novo, no entanto, no est desvinculada do captuloedaseoqualpertencenaobraisaiana.Oscaptulos28-33 parecem formar um bloco textual estruturado por exclamaes de ais. Alguns deseuscaptulossoiniciadosporesselamentofnebre(28,1;29,1.15;30,1; 31,1; 33,1). ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 26 Almdisso,comodemonstraHans-WinfriedJngling,apalavraaino constitui o nico sinal de estruturao: Como nos captulos 1-12, tambm em 28-35 a alternncia entre textosdedesgraaedecondenaovlidospara Jerusalm/Judconstitutivaparaaestrutura.Numritmoque muda diversas vezes, textos que anunciam um futuro desolador substituemaquelescujaperspectivaparaofuturopositiva (Jngling, 2003, p.387). Portanto,seem28,7-13temosalgoespecfico,precisoreconhecertambm que estes versculos servem aos propsitos da seo: Iahweh trouxe os assrios contra Jerusalm para expulsar da cidade sua liderana corrupta e substitu-los por uma figura real que inaugurar um reinado de justia e paz (Sweeney, 1996, p.354). Aqui, orculos crticosdeIsaasdosculoVIIIsorelidosnaticaexlica/ps-exlica,sendootexto claramente de carter compsito.Maisespecificamente,ocaptulo28falasobreojulgamentodeIahweh, primeiro no Reino do Norte (v.1-4) e, ento, sobre Jud e sua liderana. Sendo assim, o captulo pode ser dividido em quatro unidades (v.1-4 (5-6); v.7-13; v.14-22 e v.23-29) que esto estruturadas pela alternncia de temas de julgamento e promessa da seguinte forma: Catstrofe para Efraim (ai): v.1-4 Restaurao: v.5-6 Catstrofe para Jerusalm: v.7-13+v.14-22 Preservao: v.23-29 Alm desta conexo redacional de julgamento-salvao, os versculos do captulo 28 esto ligados temtica e formalmente. O tema o da incompetncia doslderesdeEfraimeJudqueresultarnojulgamentopormeiodaAssria. Curiosa a ligao entre os lderes do Reino do Norte nos v.1-4 e os profetas e sacerdotesdosv.7-13:todoselesestodesqualificadosparaoscargosque ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 27 ocupamporserembbados(xikorefrayim,v.1:bbadosdeEfraim; bayyayin xag baxxekar ta, v.7: perderam o sentido com vinho e desviaram-se com licor). Jascaractersticasformaisqueamarramasunidadesso:afrmula bayymhah,naqueledia,nov.5;vegam-elleh,etambmestes,nov.7; laken,portanto,nov.14.Osv.23-29,pormaisindependentesquepaream, servemdeclmaxparatodoocaptulo,ao apontarparaopropsitodasaes de Iahweh, tal como esboado nos v.1-22. Comessasindicaes,nota-sequeapercopeutilizadanesteestudo paracompreenderumconflitoprofticonosculoVIIIa.C.possuiuma importncialiterriadentrodoconjuntodaobraisaiana:acrticaaoslderes poltico-religiosos,especialmente,deJud,quenoconduzemopovocomo deveriam. Internamente, podemos dividi-la em denncia (v.7-8) e ameaa (v.11-13). No meio est a fala dos nebm (v.9-10). A ironia dos profetas no centro da poesiatemseuresultadonaspontas!Isaasacusaeameaatambm ironizando. Vejamos, ento, como o debate se desenvolve. tsav latsav uma palavra proftica (lugar & contedos) DiferentementedocontemporneoprofetaMiquias,Isaasnofalaa partirdaroa.Suaspregaessoorientadaspelohabitusdavdico-jerosolimitano.1Todavia,imprescindvelobservarqueoprofetacitadino,no decorrerdesuacarreiraproftica,temessehabitusreestruturado.Oqueisso querdizer?QuesuapregaodiferetantodeMiquiasquantodosgrupos articuladosrealeza: sualeituradasociedade criticadesdeopontodevista 1 Com o conceito de habitus desejo enfatizar que as categorias de percepo do mundo social so o produto da incorporao das estruturas objetivas do espao em que os indivduos vivem. Sendo assim, com habitus davdico-jerosolimitano quero dizer que Isaas l sua realidade social desde as tradies da escolha de Davi e de Sio. Para o conceito de habitus em Pierre Bourdieu, indico seu ensaio O conhecimento pelo corpo, em Meditaes Pascalinas, p.157-198. ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 28 de Jerusalm (Schwantes, 2003, p.208). esse o fio que conduzir a anlise da percope de 28,7-13. Ov.7inicia-secomaexpressovegam-elleh,oquecausacerta confuso no que se refere aos atores do conflito proftico. E tambm estes umaformaliterriautilizadaparaligarosv.7-13aosanteriores.Umacoisa apenas certa: os acusados dos v.1-6 no so os mesmos dos v.7-13.NoprimeiroblocosoosbbadosdeEfraim,ouseja,oslderesdo ReinodoNortedeIsraelosenvolvidos.Importantedestacaraligaode contedoentreascenas,asaber,vegam-ellehsotobbadosquanto lideranadoNorte.Isaasdenunciaaprticadabebedeiraentreestesde maneira bastante lcida: bayyayin xag basxxekar ta. Afinal, quem so estes que, a semelhana dos lderes israelitas, no cumprem devidamente seu papel devidobebidaalcolica?nov.7queIsaasexplicitaosacusadosda percope: khen venab, sacerdote e profeta. Marvin Sweeney acredita que o contexto sugere que esses sacerdotes e profetas so do Reino do Norte de Israel, mas que com o subseqente material dos v.14-22 torna-se claro que a liderana judata est tambm includa (1996, p.365). J Walter Brueggemann no tem dvida: tambm estes no v.7 refere-se aossacerdoteseprofetasemJerusalm,comodistintosdoslderesdoNorte; emtodocaso,arefernciaclaramenteparaoutrosquenosoaqueles condenadosnosv.1-4(1998,p.222).Peloqueparece,Isaasacusacolegas jerosolimitanos. Como o faz? Ossubstantivosutilizadosnov.7jforamexplicitados.yayinexekar, vinhoelicoroquecausaarunaparasacerdoteseprofetas.Todavia, Isaasutilizaalgunsverbosquereforamsuadenncia:xgh(3vezes)eth(2 vezes), bem como bl nifal (1vez). So estes verbos que caracterizam os efeitos dabebida.Extraviaram-seeperderam-se,foramdevoradospelovinhoepelo licor.Notequeossacerdoteseprofetasnopossuemmaisraciocnioe,ao seremextraviados,estosuscetveisacometererroapserro.Em comparaocomolivrodeJeremias,podemospercebercomoaquesto ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 29 entendida de modo diverso. Em Jeremias, a crtica aos profetas passa pelo nvel da mentira e no da bebedeira. Alis, curioso o texto de Jr 23,9: quem surge como bbado Jeremias e no seus adversrios!Retomando o problema em Isaas, o erro de sacerdotes e profetas no v.7 aparececomoxagbaroehpaqpelliyyah.Isaasacreditaqueaoestarem corrodos pela cachaa, os profetas no possuem mais vises e os sacerdotes nodomaissentenas.Aimpressoquesetemquetudoocorre simultaneamente.Devidobebedeira,oslderesreligiososjnocumprem maissuasobrigaes.Ainspiraodosprofetascessoueossacerdotesno conseguemmaisensinaraleiaopovo.Aestruturaquisticaevidente: sacerdote-profeta; viso-sentena. possvel que este estado de bebedeira esteja associado instituio da marzeah,conhecidanaantigaCanaeIsrael.2Trata-sedaconclusodeuma aliana. Acredito que se for assim, o texto data provavelmente do perodo entre 705 e 701 a.C. em que Ezequias aproveita-se da fragilidade do imprio assrio comaascensodeSenaqueribparaformarumacoalizoantiassria.Ov.8 exploramelhoraquesto.Introduzidopork,oversodemonstraoresultado horrendo dacomemoraodosprofetasesacerdotes. Almde nocumprirem suas funes,encontram-senumambienteimundo.No finaldamarzeah,suas mesas esto repletas de vmito (q) e bosta (tsh)3! Sacerdotes e profetas no controlam mais suas capacidades fsicas e emocionais. Paraopropsitodesteartigoprecisoressaltartambmaperspectiva dosoponentesdeIsaas.Afinal,estamostratandodeumdebateenoum monlogo!Osadversriossoprofetasque,ligadosaossacerdotes,esto bbados por comemorarem o contrato de aliana antiassria. Sendo assim, se a interpretaoestiveracertada,osnebmsoobviamentepessoasque 2PropostadeSweeney,Isaiah1-39,p.369.Todavia,oautorentendeacomemoraodopactoentreo Reino do Norte e o Egito. 3LuisAlonso-Schkel,Dicionriobblicohebraico-portugus,p.553,propeessatraduoparaa expressovocalizadacomotseah(Dt23,14;Ez4,12).Mantenhoessesentidoparatsoah,aoinvsde traduzir simplesmente por lixo ou imundice, com o intento de reforar o estado lastimvel dos profetas e sacerdotes. ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 30 pronunciam seus orculos a partir do habitus davdico-jerosolimitano. Defendem arealezadavdicaealiberdadedeJerusalmdasgarrasassriase,porisso, dosuporteideolgicoaEzequiasemsuasalianaspolticascompovos vizinhos. MasnoestIsaastambmorientadoporessehabitus?Peloque demonstrasuapregao,arespostadeveserafirmativa.Entretanto,aolongo de sua vida, o profeta modificou pontos importantes de sua viso de mundo. De fato,indivduosnoestoimobilizadosemestruturas.Aalianapolticade Ezequias um desses pontos de discordncia. Isaas no parece acreditar que estasejaasoluoparaprfimdominaoassriae,assim,criticadonos prximos versos. Aqueminstruiroconhecimento?Eaquemensinaralio?so questes endereadas a Isaas. Interessante que no v.7, o profeta diz que seus adversriosnocumpremseupapel.Poisbem,agorasoosprofetas(e sacerdotes)queironizamaspregaesdeIsaas.Paraquemserviros criticas isaianas? Os nebm respondem: para crianas desmamadas que ainda nemsabemler.Ov.10parecefazerrefernciaaisso.Oefeitodetsavlatsav tsavlatsavqavlaqavqavlaqavzeerxamzeerxamestmaisrelacionadoao som do que ao contedo. como se as palavras crticas de Isaas fossem, na verdade,ob-a-baquedeveserensinadoscrianas.Maisumsarcasmopor detrsdojogocomsons:enquantoIsaasrepetecoisasbsicasdafjavista, profetasesacerdotesultrapassamessasinformaeselementares (Brueggemann, 1998, p.225). Napolmicadapercope,Isaasdenunciaosnebm(juntamentecom sacerdotescf.Mq3,11)erepreendidoironicamente.Oslderesreligiosos parecem estar bbados, da acusarem o profeta como que contando uma piada! Chega, por fim, o momento da ameaa que se desenvolve no decorrer dos v.11-13. O v.11 iniciado por k, o que sugere a explicao da sentena proftica. ProfetasesacerdotessojulgadosporzombaremdaspalavrasdeIsaas,isto ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 31 , por acreditarem que suas profecias so ininteligveis. Ento, assim o seja. comlnguabalbucianteecomidiomaestrangeiroqueelefalaraestepovo. Comosesabe,aAssriaoimpriodominantenoperodoe,portanto,muito provavelmente o idioma estrangeiro conota uma invaso assria. Isaas trabalha comessapossibilidadeemoutrostextos,como5,26;8,6;10,5s.27.Sendo assim, de nada adianta a coalizo formada por Ezequias na tentativa de barrar os assrios. E muito menos a festana promovida pelos nebm (e kohanm), em umsuporteideolgicoaorei.Curiosaaquiaexpressohaamhazzeh.O carter depreciativo evidente: este povo no escapar da dominao assria; este povo trata-se no apenas dos envolvidos na polmica proftica, mas dos lderes polticos do sculo VIII a.C. (cf. Mq 2,11). No v.9, os adversrios de Isaas ironizavam sua pregao perguntando a quemeledeveriainstruir.Arepostaficaimplcita:Noagente.Osprofetase sacerdotes no querem ser o pblico de Isaas. Mas, afinal, o que o profeta est pregando?Atomomentovimossuacrticapolticaexternajudata, especialmenteaosquedosuporteaela.Isaasreprovaabebedeirados profetasesacerdotes,umatodecomemoraopelaalianaantiassriaesta festa s traz a runa para os lderes religiosos que no conseguem cumprir suas funes.Esseoprimeiroaspectorechaadopelosadversriosnosv.9-10. Entretanto, o v.12 parece clarear outra perspectiva isaiana que no agrada aos seus colegas jerosolimitanos. Esteodescansodrepousoparaocansado(ayep)eesteo repouso! so palavras de Iahweh... muito provavelmente um orculo que Isaas profetizou que, no entanto, no foi muito bem recebido como demonstra o v.12, velabxema.Aexpressomasnoexatamentearejeiodos oponentes de Isaas exposta nos v.9-10. Como em Mq 2,10, Isaas trata de um tema fundamental, a saber, o do lugar de descanso. Utiliza a mesma expresso hammenhah(+verbonohifil),emparalelocomhammargeah.Nolivrode Miquias,apreocupaocomolugardedescansonascedointeressepela justiasocial.AcreditoqueemIsaas,otemadevepossuirmaisoumenosa ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 32 mesma caracterstica. Sobre isso, Sicre comenta: o cansado deve ser o povo, quesofreasmudanasdepolticadasautoridades.Ouserefereapessoas oprimidas por situao social injusta (1990, 317). Ospoderososjerosolimitanosrecusaram-seaescutar(xm)aspalavras de Iahweh. Aqui, possvel pensar no fato de que no pode haver escuta sem umareaoempensamentos,palavrasouobrasaocontedodoquefoi escutado.QuandoIsaasdizquenoquiseramescutar,dizquenoagiram comodeveriam,isto,noabrigaramospobresdacidade(cf.Is1,10-20!). DiferentementedeMiquias,olugardedescansoemIsaasspodeser Jerusalm (14,32). Ao invs de defenderem o que realmente importa, profetas e sacerdotes se preocupam em legitimar as opes polticas da realeza. Quando deveriam abrir as portas de Jerusalm para os cansados, esbanjam em festas. EsteversopareceapontarparaosuportesocialdeIsaas.Porque pregariaparaospobres?Somadoaevidenciade8,11-20,ficaevidentequeo profetaagregaaoseuredorumgrupodeoposioemlutacomoscrculos oficiais da capital. Seu habitus definitivamente reestruturado! Em 8,11, Isaas advertidoanoandarnocaminhodestepovooqueocolocacontraas opiniescorrentesdapoca.Oprofetaprega,defato,paraosexcludosde Jerusalm(1,17:yatm,almanah;3,14-15:an,amm,anym;5,23: tsaddqm; 10,1-4: dallm, any amm, almant, yetmim; 28,12: ayep; 29,19-21:anaviyim,ebynadam,tsaddq)4econtraaestruturapoltico-social apoiada pelos nebm. Perderamaviso,vacilaram nasentenarezanossov.7.Acreditoque Isaasestejaapontandoexatamenteparaesteaspectosocialdasfunes proftico-sacerdotais.Bbadosesbanjadores,profetasesacerdotesno cumprem com o dever mais elementar do javismo a defesa dos mais fracos da sociedade:Quedireitotendesdeesmagaromeupovoemoerafacedos 4 Os que aparecem na pregao de Isaas so: rfo, viva, pobre, fraco, indigente, cansado. Estes sujeitos sociais so reconhecidos tambm como justos, meu povo e pobres de seu povo, ou seja, pobres de Iahweh. Mais informaes em Milton Schwantes, Das Recht der Armen, p.99-112. ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 33 pobres?(Is3,15).Ficaclaro,portanto,queaestratgiapolticaeainjustia, para Isaas, andam de mos dadas. Pornocuidaremdospobrescitadinoseapoiaremaspolticas insensatas do rei quem sofre com essas mudanas , por fim, o povo com a cobranadostributosprofetas(esacerdotes)recebemapalavradeIahweh: tsav latsav tsav latsav qav laqav qav laqav zeer xam zeer xam. Isaas ironiza a acusaodeseusadversrios,aoutilizarsuasprpriaspalavras.Peloque parece,oprofetapodeteremmentealnguabalbucianteeoidioma estrangeirodov.11.ApalavradeDeuscondenatria.Osassriosesto falando... de nada servir as alianas com os povos vizinhos. Dentro da seo da obra isaiana em que nossa percope est situada, o textode30,15podeesclarecermelhoravisodeIsaassobrearevolta antiassria:Com efeito, assim diz o Senhor Iahweh, o Santo de Israel: na converso e na calma estaria a vossa salvao, na tranqilidade e na confiana estaria a vossa fora, mas vs no o quisestes! Assim, Isaas polemiza com os nebm festeiros porquefundasuaposionoemconsideraesdeestratgiaoude Realpolitik,masemconsideraesdeordemteolgica.Para Isaas,Juddeveentregar-seinteiramenteaIahweh,onico quepodeconceder-lheobem-estar.Estaentregaabsolutaa Iahwehexcluitotalmenteaconfianaemqualqueroutra realidade (Gonalves, 1990, p.17). AtomadadeposiodeEzequiasesuacortetraradesgraapara Jerusalm e toda Jud. Almdessainterpretao,podeserqueIsaas,emsuaironiadov.13 (tsavlatsav...),pensemesmoemcrianasprofetizando.Suaprefernciapor ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 34 estatemticabemconhecida(3,4;7,14;8,18;9,5).nafragilidadedas crianas que se encontra a verdade de Iahweh.5 O orculo de julgamento para os nebm exatamente o b-a-ba que desprezaram.Porfim,utilizandotrsverbosnonifal(xbr,yqx,lkd),Isaasencerrasua acusao deixando explcito o final catastrfico das atitudes insensatas, no s dekhenvenab,mastambmdehaamhazzeh.Importantenotarqueouso dosverbosnonifalcomsuanuanabasicamentereflexivademonstraque os culpados so os prprios lderes jerosolimitanos. Os trs verbos denotam um ataquemilitar:alideranajerosolimitanaserdestroada,caindonaarmadilha assria, ao tornarem-se prisioneiros. Infelizmente os profetas e sacerdotes tero que parar de festejar. Alguns anos mais tarde, Senaquerib, de fato, invade Jud. Em suas prprias palavras: encerreiEzequiasnointeriordeJerusalm,suaresidnciareal,comoaum pssaro na gaiola. Levantei fortificaes contra ele e castigava os que tentavam sairpeloportodacidade(Pritchard,1969,p.288).Oseventoshistricos fizeram com que as profecias de Isaas vencessem a polmica proftica. Concluso Em sntese, Isaas de Jerusalm. Sua polmica com os nebm baseia-senodestinodacidadeeseushabitantes,sobretudo,osmenosfavorecidos. Enquanto profetas e sacerdotes comemoravam na marzeah a aliana antiassria promovidaporEzequias,ignoravamasadmoestaesdeIsaasporconfiana em Iahweh e respeito aos pobres da cidade.Nosso profeta cr na escolha de Sio, todavia no deixa de anunciar um castigo para a cidade, devido postura equivocada de sua liderana poltica e, nocasodenossapercope,especialmente,deseuslderesreligiosos. Efetivamente,odebatenosebaseianaquestodefalsoprofetismo.O 5 Sobre crianas enquanto agentes profticos no livro de Isaas, cf. o belo artigo de Milton Schwantes, O messias criana observaes sobre Isaas 6,9 e 11, p.8-19. ISSN: 1980-9824 | Volume IV - Ano 2 | Novembro de 2008 35 leitmotivdoconflitoprofticoemIsaasestnadivergnciadeprojetosscio-polticos para a cidade de Jerusalm. Referncias bibliogrficas ALONSO-SCHKEL,Luis.Dicionriobblicohebraico-portugus.SoPaulo, Paulus, 2004. BOURDIEU,Pierre.MeditaesPascalinas.RiodeJaneiro,BertrandBrasil, 2001. BRUEGGEMANN, Walter. Isaiah 1-39. Louisville, Westminster John Knox Press, 1998. ELLIGER,Karl& WilhelmRUDOLPH(editores).BibliaHebraicaStuttgartensia. Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. GONALVES,Francolino.SenaqueribnaPalestinaeatradiobblica. Didaskalia, Lisboa, v.20, n.01, 1990, p.05-32. JNGLING, Hans-Winfried. O livro de Isaas. In: Erich ZENGER (organizador). Introduo ao Antigo Testamento. So Paulo, Loyola, 2003, p.380-398. 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