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Revista SÍNTESE Direito Imobiliário ANO VI – Nº 36 – NOV-DEZ 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Simone Costa Saletti Oliveira CONSELHO EDITORIAL Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior, Luiz Henrique Sormani Barbugiani, Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Amanda Salis Guazzelli, Andréa Cristina Correia de Souza Renault Baêta dos Santos, Daniel Sobral dos Santos Longue, Dolglas Eduardo, Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, Flauzilino Araújo dos Santos, Mariana Mendes Brito, Maurício Vedovato, Murilo Barreto do Nascimento, Thalita Duarte Henriques Pinto ISSN 2236-1553

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Revista SÍNTESEDireito Imobiliário

Ano VI – nº 36 – noV-Dez 2016

ReposItóRIo AutoRIzADo

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087

DIRetoR executIVo

Elton José Donato

GeRente eDItoRIAl e De consultoRIA

Eliane Beltramini

cooRDenADoR eDItoRIAl

Cristiano Basaglia

eDItoRA

Simone Costa Saletti Oliveira

conselho eDItoRIAl

Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior, Luiz Henrique Sormani Barbugiani, Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho

colAboRADoRes DestA eDIção

Amanda Salis Guazzelli, Andréa Cristina Correia de Souza Renault Baêta dos Santos, Daniel Sobral dos Santos Longue, Dolglas Eduardo, Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza,

Flauzilino Araújo dos Santos, Mariana Mendes Brito, Maurício Vedovato, Murilo Barreto do Nascimento, Thalita Duarte Henriques Pinto

ISSN 2236-1553

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2011 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos de Direito Imobiliário.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 4.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço: [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista SÍNTESE Direito Imobiliário. – Vol. 1, n. 1 (jan./fev. 2011)- . – São Paulo: IOB, 2011- . v.; 23 cm.

Bimestral. v. 6, n. 36, nov./dez. 2016

ISSN 2236-1553

1. Direito imobiliário.

CDU 347.453 CDD 342.1242

Bibliotecária responsável: Nádia Tanaka – CRB 10/855

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Escolhemos o tema “Registro Eletrônico de Imóveis” para tratarmos nesta edição da Revista SÍNTESE Direito Imobiliário.

O registro de imóveis eletrônico tem como princípio a utilização da Tecnologia de Informação e de Comunicação (TIC) para desmaterialização de procedimentos registrais internos das serventias, bem como promover a interco-nexão destas entre si, com o Poder Judiciário, órgãos da Administração Pública, empresas e cidadãos na protocolização eletrônica de títulos e no acesso às in-formações e certidões registrais, de forma a aprimorar a qualidade e a eficiência do serviço público prestado por delegação.

Para o usuário-cidadão, o registro eletrônico consiste no acesso pela in-ternet de informações, na solicitação e recebimento de certidões, bem como na remessa eletrônica de títulos para as serventias.

Para discorrer sobre o assunto, contamos com a brilhante colaboração de ilustres juristas: Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, Flauzilino Araújo dos Santos, Maurício Vedovato, Thalita Duarte Henriques Pinto e Amanda Salis Guazzelli.

Na parte geral selecionamos um vasto conteúdo, para mantermos a qua-lidade desta Edição, com relevantes temas e doutrinas de grandes nomes do direito, tais como: Daniel Sobral dos Santos Longue, Andréa Cristina Correia de Souza Renault Baêta dos Santos, Mariana Mendes Brito, Dolglas Eduardo e Murilo Barreto do Nascimento.

E, por fim, destacamos a seção denominada “Clipping Jurídico”, em que oferecemos a você, leitor, textos concisos que destacam de forma resumida os principais acontecimentos do período, tais como Notícias, Projetos de Lei, Nor-mas Relevantes, dentre outros.

É com prazer que a IOB deseja a você uma ótima leitura!

Eliane BeltraminiGerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ....................................................................7

Assunto Especial

RegistRo eletRônico de imóveis

doutRinas

1. Protocolo Eletrônico no Registro Imobiliário (Algumas Considerações)Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza ............................................................9

2. Registro de Imóveis Eletrônico. Uma Reflexão Tardia?Flauzilino Araújo dos Santos ....................................................................22

3. Registro Eletrônico de Imóveis: um Avanço NecessárioMaurício Vedovato, Thalita Duarte Henriques Pinto e Amanda Salis Guazzelli .........................................................................................42

Parte GeraldoutRinas

1. A Execução Direta das Taxas Condominiais no NCPC e a Celeridade ProcessualDaniel Sobral dos Santos Longue .............................................................61

2. A Natureza da Atividade Notarial e de Registro e a Incidência do ISSQNAndréa Cristina Correia de Souza Renault Baêta dos Santos .....................64

3. Da Possibilidade de Lavratura de Escritura Pública de Cessão de Direitos Hereditários de Bem Imóvel Singularmente Considerado sem Anuência de Todos os HerdeirosMariana Mendes Brito ..............................................................................78

4. Regularização Fundiária: Extinção de Condomínio RuralDolglas Eduardo .......................................................................................88

5. Incidência de Alíquota Diferenciada do IPTU no Condomínio FechadoMurilo Barreto do Nascimento .................................................................92

JuRispRudência

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1212. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1303. Superior Tribunal de Justiça....................................................................136

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4. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1575. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios ..........................1606. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás ...................................................1777. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais .......................................1828. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná .................................................1889. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro ......................................19110. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul ...............................19911. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina .....................................20212. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ............................................207

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................210

Clipping Jurídico ..............................................................................................240

Bibliografia Complementar .................................................................................244

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................245

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Registro Eletrônico de Imóveis

Protocolo Eletrônico no Registro Imobiliário (Algumas Considerações)

EDuARDO PAChECO RIBEIRO DE SOuzATabelião e Registrador em Teresópolis, no Rio de Janeiro.

SUMÁRIO: 1 A Lei nº 11.977/2009 e o registro eletrônico; 2 O protocolo no registro imobiliário; 3 A apresentação telemática no direito comparado – Espanha e Portugal; 4 Questões a serem considera-das na regulamentação do protocolo eletrônico no Brasil.

1 A LeI Nº 11.977/2009 e o regIStro eLetrôNIco

A Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, que dispõe sobre o Programa Mi-nha Casa, Minha Vida – PMCMV, e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas, determina ainda outras providências, entre elas a instituição do registro eletrônico pelos serviços de registros públicos de que trata a Lei nº 6.015/19731.

A adoção de meios informáticos em todas as áreas de atuação profissio-nal é questão de tempo. A informatização passou a ser uma necessidade, e sua utilização nos serviços registrais e notariais antecedeu a qualquer determinação legal. Os sistemas informatizados já estão presentes em muitos registros públi-cos brasileiros há diversos anos, por iniciativa dos delegatários, que desenvolve-ram, às suas expensas, programas que atendem com segurança às necessidades dos serviços que prestam.

Também, nos tabelionatos, a utilização dos programas de computador é corriqueira.

Restava tão somente a determinação legal para que os livros e as fichas físicas que os substituem pudessem ser definitivamente aposentados, com o re-conhecimento expresso da validade do registro eletrônico.

1 “Art. 37. Os serviços de registros públicos de que trata a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, observados os prazos e condições previstas em regulamento, instituirão sistema de registro eletrônico.”

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10 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

O que hoje acontece é uma duplicação de esforços: os registros têm os arquivos eletrônicos, mas, por imposição legal, também os têm em suporte de papel.

Na esteira do reconhecimento do inexorável caminho que leva à substi-tuição dos meios físicos pelos meios eletrônicos, no que concerne aos serviços de protesto de títulos e outros documentos de dívida, o legislador já havia se rendido, definitivamente, aos sistemas informatizados pela Lei nº 9.492/1997, que regulamenta os serviços em foco.

O art. 32 da Lei nº 9.492/1997 permite a escrituração do livro de pro-tocolo por processo manual, mecânico, eletrônico ou informatizado; o § 2º do art. 34 admite que os índices de buscas sejam elaborados por sistema de fichas, microfichas ou banco eletrônico de dados; por fim, o § 2º do art. 35 dispensa a conservação de livros e documentos microfilmados ou gravados por processo eletrônico de imagens. Em síntese, os serviços de protesto estão integralmente informatizados, do início ao fim do procedimento, cuja partida se dá com a recepção das duplicatas por indicação por meio magnético ou de gravação ele-trônica (parágrafo único do art. 8º), tudo feito dentro dos padrões de segurança jurídica.

Na informatização dos serviços de registro imobiliário, inclusive quanto à sua interconexão com outros órgãos, a Arisp, Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo, é pioneira em diversas iniciativas e já disponibiliza diversos serviços que somente agora têm sua expressa previsão em lei. Em sín-tese, a Arisp se adiantou à própria lei e já pratica atos que serão ainda regula-mentados (a nova lei carece de regulamentação2).

O parágrafo único do art. 38 da Lei nº 11.977/2009 dispõe que os ser-viços de registros públicos disponibilizarão o fornecimento de informações e certidões em meio eletrônico.

As certidões digitais são uma realidade em São Paulo. Segundo a Arisp, a certidão digital

é a modalidade de certidão de matrícula do imóvel ou do registro de pacto ante-nupcial expedida no formato eletrônico, por meio de software aplicativo e ferra-mentas desenvolvidas especialmente para essa finalidade. A certidão digital tem a mesma validade jurídica de uma certidão tradicional em papel e faz prova em juízo ou fora dele, podendo ser utilizada para lavratura de escrituras públicas, de contratos de financiamento imobiliário, documentos públicos e particulares em geral.3

2 “Art. 45. Regulamento disporá sobre as condições e as etapas mínimas, bem como sobre os prazos máximos, a serem cumpridos pelos serviços de registros públicos, com vistas na efetiva implementação do sistema de registro eletrônico de que trata o art. 37.”

3 Informações disponíveis em <http://www.arisp.com.br/conteudo.aspx?idsecao=2&idsubsecao=1>. Acesso em: 18 set. 2009.

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �������������������������������������������������������������������������������������������������������������11

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem acolhido as iniciati-vas dos registradores e, ciente dos avanços tecnológicos, alterou as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral de Justiça por meio do Provimento CG nº 32, de 11.12.2007, publicado em 13.12.2007, para incluir novos artigos, entre eles o seguinte:

146-G. Os serviços de registro imobiliário poderão emitir e os tabelionatos de no-tas, receber e arquivar, na Comarca da Capital, certidões em formato eletrônico, com assinatura digital vinculada a uma autoridade certificadora, no âmbito da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), a serem transmitidas por Centrais de Serviços Eletrônicos Compartilhados, administradas pela Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (ARISP) e pelo Colégio Notarial do Brasil – Secção de São Paulo (CNB-SP), que arcarão com custos e responsabili-dades referentes às contratações, ao desenvolvimento, implantação e operação do respectivo sistema.

O Provimento Conjunto nº 1, de 02.06.2008, das 1ª e 2ª Varas de Re-gistros Públicos de São Paulo, disciplina a implantação, operação, orientação e supervisão do sistema de recepção de pedidos, emissão, transmissão e arqui-vamento, em meio digital, de certidões imobiliárias em formato eletrônico, no âmbito da Comarca Capital, de acordo com o determinado no Provimento CG nº 32/2007.

A Arisp também é pioneira no que se refere às informações em meio ele-trônico. O instrumento foi denominado “ofício eletrônico” e decorreu de uma parceria com o IRIB, Instituto de Registro Imobiliário do Brasil.

Segundo notícia no Boletim Eletrônico do IRIB4,

a Arisp já opera uma central de informações e transações eletrônicas interme-diando as demandas da Administração Pública e os cartórios de registro da Capi-tal de São Paulo. Através do ofício eletrônico (https://www.oficioeletronico.com.br/) as requisições de informações sobre a situação jurídica de executados em processos de execução fiscal e outras informações rogadas pela Receita Federal, Justiça do Trabalho dentre outras entidades, são processadas em tempo real e somente as ocorrências positivas são processadas para expedição de certidões.

Segundo o presidente da Arisp, Flauzilino Araújo dos Santos, “esse siste-ma possibilita que a autoridade pública tenha acesso online ao banco de dados light, composto pelos CPFs e CNPJs de proprietários e titulares de direitos sobre imóveis registrados a partir de 1976”5.

4 Boletim Eletrônico 2.511, de 29.06.2006. Disponível em: <http://www.irib.org.br/pdf/BE2511.pdf>. Acesso em: 18 set. 2009.

5 Boletim Eletrônico 2.902, de 11.04.2007. Disponível em: <http://www.irib.org.br/notas_noti/boletimel2902.asp>. Acesso em: 18 set. 2009.

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12 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

O Tribunal de Justiça de São Paulo admitiu a expedição de certidões digitais tendo em conta que as mesmas encontram apoio na Medida Provisória nº 2.200-2/2001 e utilizam o serviço do ofício eletrônico.

Como se vê, a Lei nº 11.977/2009 vem prever expressamente a expedi-ção de certidões em meio eletrônico pelos serviços de registros públicos, sem que isso possa representar uma novidade quanto à possibilidade de expedição. As certidões digitais já são uma realidade no país, antes mesmo da edição e regulamentação da lei em mira. Louve-se a atuação do Judiciário paulista, com seu entendimento de vanguarda, dando os primeiros passos na direção do regis-tro eletrônico, precedendo a Lei nº 11.977/2009.

Ainda no âmbito do registro eletrônico, a Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça de São Paulo expediu provimento regulamentando a penhora on-line6 (Provimento nº 6/2009). Dispõe o art. 1º do Provimento: “Fica implantado, com funcionamento a partir de 1º de junho de 2009, sistema eletrônico para averba-ções de penhoras no Registro de Imóveis, denominado penhora online, destina-do a utilização facultativa pelos Juízos”.

O sistema permite a remessa das determinações judiciais de penhora aos registros imobiliários por meio eletrônico.

Anote-se, para fim de esclarecimento, que, embora a lei e o provimento paulista se refiram à averbação da penhora, há entendimento de que o ato a ser praticado é de registro em sentido estrito. Basta o exemplo do que estou deter-minado na Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Na verdade, a Medida Provisória nº 2.200-2/2001, o art. 41 da Lei nº 8.935/19947 e o art. 16 da Lei nº 11.419/20068 já permitiam o registro eletrô-nico. Contudo, o espírito conservador dos órgãos de fiscalização acabava por tolher a sua implantação integral, impondo aos fiscalizados a obrigatoriedade de manutenção de todos os arquivos em suporte papel.

2 o protocoLo No regIStro ImobILIárIo

Prior in tempori, potior in jure. Anterior no tempo, mais forte no direito.

A anterioridade no registro imobiliário se verifica pelo lançamento do título no Livro 1, Protocolo (prenotação). O processo do registro tem início pelo

6 Art. 659, § 6o, do Código de Processo Civil: “Obedecidas as normas de segurança que forem instituídas, sob critérios uniformes, pelos Tribunais, a penhora de numerário e as averbações de penhoras de bens imóveis e móveis podem ser realizadas por meios eletrônicos (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006)”.

7 “Art. 41. Incumbe aos notários e aos oficiais de registro praticar, independentemente de autorização, todos os atos previstos em lei necessários à organização e execução dos serviços, podendo, ainda, adotar sistemas de computação, microfilmagem, disco ótico e outros meios de reprodução.”

8 “Art. 16. Os livros cartorários e demais repositórios dos órgãos do Poder Judiciário poderão ser gerados e armazenados em meio totalmente eletrônico.”

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �������������������������������������������������������������������������������������������������������������13

ingresso no Livro 1, seguindo-se: a qualificação do título; o ato de registro, se a qualificação for positiva; ou a apresentação de exigências, em caso de qualifi-cação negativa. Produz, o registro, seus efeitos desde a data da prenotação, pois “o registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo” (art. 1.246 do Código Civil).

Evidencia-se a relevância do protocolo em diversos dispositivos da Lei nº 6.015/1973, em especial os arts. 182, 183, 184 e 186. O número de ordem do título deve observar a “seqüência rigorosa de sua apresentação” (art. 182) e “o número de ordem determinará a prioridade do título, e esta a preferência dos direitos reais” (art. 186).

Depreende-se, portanto, que a segurança do sistema registral imobiliário tem como pilar básico o protocolo. O estabelecimento da preferência dos direi-tos reais, elemento indispensável para o tráfico imobiliário, decorre do correto lançamento dos atos no protocolo.

Serpa Lopes9, inquestionável autoridade no campo do Direito Registral, afirma:

Força é notar que o protocolo desempenha, no Registro Imobiliário, função de suma relevância. Representa, por assim dizer, a chave do direito de preferência, da gradação do vínculo hipotecário e o elemento indicativo da preeminência entre dois direitos opostos e transcritos. Pode-se dizer: é a data do protocolo e não a do registro a determinadora da prioridade de um direito, pois a primeira domina a segunda.

Diante de tamanha relevância para o funcionamento do sistema, há de se observar com rigor e atenção a escrituração do Livro 1, assegurando aos usuários do serviço o ingresso de seus títulos com estrita observância da ordem de apresentação. Anote-se que, em face das consequências geradas pela ordem de apresentação, não se aplicam aos usuários que acedem ao registro imobili-ário com o intuito de apresentação de títulos para registro, as prioridades que a lei confere a idosos, gestantes, deficientes, ou a quem quer que seja, quanto às filas.

O rigor na entrada dos títulos não pode ser desrespeitado por motivo algum, sob pena de ruir todo o sistema.

3 A ApreSeNtAção teLemátIcA No dIreIto compArAdo – eSpANhA e portugAL

Devemos considerar, para a regulamentação do registro eletrônico no Brasil, a experiência internacional. Vamos abordar os exemplos espanhol e por-tuguês, atendo-nos ao protocolo eletrônico.

9 LOPES, Miguel Maria de. Tratado dos registros públicos. Brasília: Brasília Jurídica, v. I, 1997.

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14 ���������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Em Portugal, a Portaria nº 1.535/2008, de 30.12.2008, expedida pelo Mi-nistério da Justiça em decorrência do Decreto-Lei nº 116/2008, de 04.07.2008, que aprovou diversas medidas de simplificação, desmaterialização e desforma-lização de atos e processos na área do registro predial, regulamenta no Capítulo III a promoção de atos do registro predial on-line.

Os títulos podem ser apresentados 24 horas por dia, 7 dias por semana, por meio do sítio www.predialonline.mj.pt, e o ingresso no Livro Diário (equi-valente ao nosso Livro 1, Protocolo) está regulamentado no art. 23º10.

A prevalência do direito assegura-se pela ordem de ingresso no protoco-lo, nos termos do art. 6º do Código do Registo Predial11. O Livro Diário, desti-nado à anotação cronológica dos pedidos de registro, é escriturado em suporte informático (art. 22º, a, do CRP).

São anotados no Diário não só os pedidos de registro on-line, posto que subsistem outras formas de apresentar os títulos a registro, como previsto no art. 41º-B do Código do Registo Predial: “Modalidades do pedido. O pedido de registo pode ser efectuado pessoalmente, por via electrónica, pelo correio, por telecópia e por via imediata”.

Diante da diversidade de bases em que podem ser elaborados os títulos sujeitos a registro, e das várias formas de apresentação ao registro imobiliário, o art. 60º do Código do Registo Predial regula a anotação da apresentação no Diário.

Verifica-se, portanto, que em Portugal temos títulos que podem ingressar no Livro Diário a qualquer dia, útil ou não, e a qualquer hora, enquanto outros só durante o horário de expediente. Há, portanto, tratamento diferenciado para os interessados no registro e na dependência do suporte em que se baseiam seus títulos.

Anote-se que mesmo na apresentação on-line, por meio do sítio do Insti-tuto dos Registos e do Notariado, há diferença de tratamento para os interessa-dos, pois, como a apresentação no Diário ocorre com a confirmação do paga-mento, o utente terá a prioridade de seu título assegurada se tiver disponível a forma de pagamento preconizada como ideal pelo sistema12.

10 “Art. 23º Ordem de anotação dos pedidos. 1. Os pedidos de actos de registo predial recebidos através do sítio referido no art. 2º são anotados no livro-diário pela ordem da respectiva recepção. 2. A apresentação do pedido de registo no Livro Diário ocorre com a confirmação do pagamento das quantias devidas pelo mesmo. 3. Para efeitos do disposto no nº 1, o Livro Diário permite anotar imediatamente os pedidos de registo online efectuados a qualquer hora e em qualquer dia da semana, incluindo sábados, domingos e feriados. 4. A hora da recepção dos pedidos de registo apresentados online tem por referência a hora do meridiano de Greenwich, assinalada nas certidões de registo pela aposição do acrónimo UTC (universal time, coordinated).”

11 “Art. 6º Prioridade do registo. 1. O direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pela ordem temporal das apresentações correspondentes.”

12 “Após a submissão do pedido de registo e a confirmação do pagamento pelo sistema informático, o pedido de registo dá entrada na conservatória. Aconselha-se o pagamento do registo por Visa para permitir a confirmação

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A questão da prioridade em Portugal torna-se ainda mais complexa se considerarmos que a competência territorial das conservatórias foi eliminada, ou seja, é possível apresentar os títulos em qualquer dos serviços de registro, independentemente da localização do imóvel.

Decorrência lógica da eliminação da competência territorial das conser-vatórias foi a criação de um livro Diário nacional, comum a todas as conserva-tórias, que é gerido por meio da plataforma informática, nos seguintes termos, segundo informações da Dra. Madalena Teixeira, conservadora naquele país:

a) Os registos apresentados ao balcão são lançados no livro diário, em suporte informático, pelo funcionário, que recolhe do pedido os elementos indicados no art. 61º do CRP, à excepção do número de ordem, data e hora da apresentação em UTC, que são automati-camente fixados pelo sistema informático – é logo dado número de apresentação, que é automaticamente indicado no talão/requisição entregue ao usuário no momento do atendimento;

b) os registos apresentados pelo correio, por via imediata e por telecó-pia são anotados no final do dia, nos termos definidos no art. 60º do CRP, sendo gerado, pelo sistema informático, um talão/requisição com todos os elementos previstos no art. 64º do CRP;

c) os registos apresentados por via electrónica têm regime especial porque a entrada no diário é toda ela gerida pela plataforma elec-trónica, e o número de apresentação e a data estão dependentes do pagamento das quantias. Só após a confirmação do pagamento são gerados, no sistema informático, estes elementos.

Na Espanha, a Lei nº 24/2001, de 27 de dezembro, dispôs, no Capítulo XI, sobre ações administrativas em matéria de segurança preventiva, e, na Seção VIII, sobre a incorporação de técnicas eletrônicas, informáticas e telemáticas à segurança jurídica preventiva. O art. 112 trata especificamente da apresenta-ção de títulos por via telemática nos registros de imóveis, mercantis e de bens móveis.

Assim como em Portugal, coexistem na Espanha os títulos em suporte eletrônico e os títulos em suporte papel. O item 4 do art. 112 da Lei nº 24/2001 dispõe que

los asientos de presentación realizados por esta vía, se practicarán por el orden que correspondan a su hora de recepción. Reglamentariamente se establecerán

imediata do pagamento. A confirmação do pagamento por Multibanco ou e-banking ocorre informaticamente 3 vezes por dia, cerca da 01:00h, das 10:00h e das 18:00h. Após a confirmação do pagamento, recebo uma mensagem de correio electrónico avisando-me de que o pedido de registo deu entrada, a identificação da conservatória à qual foi distribuído e respectivo número de apresentação.” (Informação disponível em <http://www.predialonline.pt/PredialOnline/faq_input.action>. Acesso em: 19 set. 2009, no serviço “perguntas frequentes”)

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los criterios y el procedimiento para que los asientos de presentación que traigan causa de títulos presentados por vía telemática, dentro o fuera de las horas de oficina, se practiquen de modo correlativo a la hora de su recepción teniendo en cuenta a su vez la hora de presentación de los demás títulos que tengan acceso al Registro, tanto los presentados en papel como los presentados por vía telemática.

Como se verifica, os títulos eletrônicos podem ser apresentados mesmo fora do horário de expediente, determinando a lei que regulamento estabeleça critérios para a definição da prática dos atos registrais de acordo com a hora de recepção.

A Lei nº 24/2005, de 18 de novembro, na Seção II do Capítulo II, Títu-lo II, denominada de impulso à utilização de meios telemáticos por parte dos usuários de serviços registrais e notariais, modificou parte da Lei nº 24/2001, assim como dispositivos da lei hipotecária.

A preocupação com a prioridade fez com que o legislador estabelecesse regras sobre o carimbo do tempo, por meio da modificação do art. 108 da Lei nº 24/2001.

Gonzalo Aguilera Anegón13, ao comentar as principais modificações da Lei nº 24/2005, afirma que,

para el cumplimiento del principio de prioridad registral, cada Registro tendrá una sola fuente de sellado de tiempo sincronizada para todos los títulos que pueden causar inscripción. Dicha fuente única de sellado de tiempo deberá garantizar que los títulos presentados telemáticamente, con independencia de su origen, se asientan correlativamente con expresión de la unidad de tiempo precisa a tal fin.

O art. 248 da Lei Hipotecária permite a apresentação de títulos fisica-mente, por correio, por telefax ou por via telemática. À exceção dos títulos apresentados fisicamente, nas demais formas de apresentação admite a lei es-panhola o ingresso fora do horário de expediente, estabelecendo critérios para lançamento no Livro de Entrada (há no sistema espanhol o Livro de Entrada, que fixa o horário do pedido de registro, e o Livro Diário, no qual são feitos os assen-tos de apresentação)14. Os títulos apresentados telematicamente fora do horário de expediente são lançados no Livro de Entrada de modo automático. O Livro de Entrada fixa a hora do requerimento e, portanto, a ordem em que devem ser feitos os lançamentos no Livro Diário.

13 ANEGÓN, Gonzalo Aguilera. Aspectos registrales y fiscales de la presentación telemática. Revista Aranzadi de Derecho y Nuevas Tecnologías, Espanha: Thomson/Aranzadi, 2008.

14 Fernando Canals Brage (El Registro de la propiedad telemático. Revista Aranzadi de Derecho y Nuevas Tecnologías, Espanha: Thomson/Aranzadi, 2008) diz: “Lo que resulta de todo punto obvio, aunque sea por el silencio legal, es que la constancia de un documento en el Libro de Entrada, como elemento básico de la solicitud, no implica ni prioridad, ni reserva de prioridad alguna. Es en el Libro Diario donde comienza en puridad la eficacia registral del documento”.

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Gonzalo Aguilera Anegón15 diz que a Lei nº 24/2001, apesar de suas mo-dificações, segue fazendo referências à expedição de normas posteriores, que não foram editadas dificultando sua aplicação. Ressalta alguns pontos, entre eles o seguinte, de nosso interesse neste estudo:

Falta de determinación de los criterios y procedimientos para la práctica de los asientos de presentación de modo correlativo y por su orden de los diferentes documentos presentados en los Registros Públicos según sus diferentes vías o mo-dos de acceso. En este sentido establece el artículo 112.4 de la Ley 24/2001, no modificado por la Ley 24/2005, que: “Los asientos de presentación realizados por esta vía, se practicarán por el orden que correspondan a su hora de recepción. Reglamentariamente se establecerán los criterios y el procedimiento para que los asientos de presentación que traigan causa de títulos presentados por vía telemá-tica, dentro o fuera de las horas de oficina, se practiquen de modo correlativo a la hora de su recepción teniendo en cuenta a su vez la hora de presentación de los demás títulos que tengan acceso al Registro, tanto los presentados en papel como los presentados por vía telemática”. Si bien este extremo puede entenderse solucionado, en parte, a través de la nueva redacción que la Ley 24/2005 da al ar-tículo 248 de la Ley Hipotecaria, lo cierto es que la aplicación de este artículo en lo que se refiere a la coordinación de las diferentes fuentes de acceso documental al Registro de la Propiedad, no deja de plantear múltiples problemas. (grifo nosso)

Como se vê, tanto na Espanha quanto em Portugal, temos títulos que podem ingressar a qualquer dia, útil ou não, e a qualquer hora, enquanto outros só durante o horário de expediente. Há o mesmo tratamento diferenciado para os interessados no registro, na dependência do suporte em que se baseiam seus títulos.

4 QueStõeS A Serem coNSIderAdAS NA reguLAmeNtAção do protocoLo eLetrôNIco No brASIL

A Lei nº 11.977/2009, como já mencionado no tópico 1, determinou, no parágrafo único do art. 38, que os registros públicos disponibilizarão serviços de recepção de títulos em meio eletrônico. Esse o ponto de nosso interesse, notadamente a questão da igualdade.

Em um país continental como o Brasil, com tanta diversidade política, econômica e social, quais as cautelas que devem ser tomadas para que a recep-ção de títulos em meio eletrônico não seja um fator que possa gerar desigual-dade no acesso ao registro imobiliário? A desigualdade no acesso ao registro fragiliza o sistema, que tem espeque na prioridade. Criada a desigualdade na entrada do título, todo o processo de registro estará comprometido.

15 ANEGÓN, Gonzalo Aguilera. Ob. cit., p. 51 e 52.

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A recepção de títulos em meio eletrônico é realidade inafastável, mas não podemos deixar de considerar que os títulos produzidos eletronicamente conviverão por muitos anos com os títulos formados em outros suportes.

A Lei nº 6.015/1973, em vigor desde 01.01.1976, instituiu o fólio real e determinou a matrícula dos imóveis por ocasião do primeiro registro na vigên-cia da nova lei (art. 228). Decorridos mais de 30 anos da Lei nº 6.015/1973, ainda há inúmeros registros no sistema anterior, lançados no antigo Livro 3, Transcrição das Transmissões.

Certamente o acesso aos meios informáticos e às novas tecnologias não será alcançado como em um passe de mágica em todo o País, possibilitando o protocolo eletrônico em condição de igualdade para todos os cidadãos. Segu-ramente teremos o ingresso, durante muito tempo, de maior número de títulos em suporte em papel do que em títulos eletrônicos, especialmente no interior.

As diversidades brasileiras podem ser constatadas pela reportagem dispo-nível no endereço http://www.youtube.com/watch?v=7Mvd-GCxh4o, realizada durante a inspeção do Conselho Nacional de Justiça na Comarca de Senador José Porfírio, no Estado do Pará.

O acesso à Comarca se deu por barco, em condições precárias, e cons-tata-se que o registro imobiliário ainda utiliza livros previamente encadernados, que sequer os substituiu por fichas, como autoriza o parágrafo único do art. 173 da Lei nº 6.015/1973. Motivaram a inspeção, segundo a Portaria nº 151/2009 da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, as “graves deficiências nos serviços notariais e de registro”, a grande extensão territorial do Estado do Pará e o “preocupante histórico de conflitos fundiários”. Indubitável que a informa-tização chegará aos mais distantes municípios brasileiros, como Senador José Porfírio, mas o processo se desenvolverá em condições totalmente diversas dos municípios próximos das regiões mais desenvolvidas social, política e econo-micamente.

O tema do protocolo eletrônico foi abordado com muita qualidade pelo registrador Luciano Lopes Passarelli no artigo “Protocolo eletrônico – Primeiras reflexões”16, no qual o autor trata das questões tecnológicas, altamente rele-vantes para que se preserve a segurança do sistema, fazendo ainda menção ao ponto de interesse deste trabalho, nos seguintes termos:

No âmbito do registro de imóveis, enquanto não houver alteração dos arts. 9º e 10 da Lei de Registros Públicos, penso que o sistema deverá disponibilizar a recepção de títulos por via eletrônica exclusivamente durante o horário de expe-diente. Isso porque, malgrado o artigo 9º refira que os “registros” praticados fora do horário do expediente são nulos, o corolário do registro é a protocolização

16 Disponível em: <http://registradores.org.br/protocolo-eletronico-primeiras-reflexoes/>. Acesso em: 21 set. 2009.

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do título, sendo desarrazoado interpretar que o título pode ser prenotado fora do horário regulamentar. Ademais, o art. 10 robustece essa idéia, já que alude aos títulos “apresentados no horário regulamentar”. Outro argumento acerca da impossibilidade de prenotação de títulos recepcionados eletronicamente fora do horário do expediente é que isso criaria uma patente desigualdade entre os usuá-rios com acesso às mídias eletrônicas e aqueles sem acesso, por hipossuficiência, que poderiam por isso restarem prejudicados no concurso do contraditório.

Entendo assistir razão ao autor mencionado. A regulamentação do pro-tocolo eletrônico deve restringir a sua utilização ao horário de expediente do registro imobiliário, estabelecendo condição de igualdade para os títulos em suportes diversos, que conviverão no sistema registral por muito tempo. Anote--se que há vários títulos que acedem ao registro imobiliário, previstos de forma enunciativa no art. 221 da Lei nº 6.015/1973, de natureza pública ou particular, não podendo o interessado, muitas vezes, optar pelo suporte em que será pro-duzido seu título (por exemplo, um título judicial ou um termo administrativo). Não estando sequer ao alcance do interessado a escolha entre a produção de um título eletrônico ou em suporte papel, não se pode permitir que, durante a noite ou em um feriado, ingresse um título por via eletrônica que terá prioridade sobre o título em suporte de papel já em mãos do interessado, mas impossibili-tado de apresentá-lo por não ser horário de expediente. Não podemos afirmar, apesar de toda a evolução, que em dado momento todos os títulos serão eletrô-nicos, e que todos terão acesso às mais modernas mídias, o que exige cautela na regulamentação do protocolo eletrônico.

Socorrendo-me uma vez mais dos conhecimentos da Dra. Madalena Teixeira, indaguei sobre a questão da preservação da igualdade em Portugal, diante da possibilidade de apresentação dos títulos em diversos suportes, por variadas formas e em horários distintos, ao que me respondeu nos termos a seguir:

Quanto à questão da (des)igualdade no acesso ao registo, que a utilização da via electrónica instala, colocou-se o mesmo problema quando da discussão em Portugal, e que tinha a ver com o facto de as vias – balcão, correio e telecópia – só poderem ser utilizadas até à hora de encerramento do atendimento ao público e a via electrónica poder ser utilizada 24 horas, acrescendo, assim, à incontorná-vel discriminação dos usuários em função da sua capacidade económica - aquisi-ção de computador – e do grau de educação conhecimento – manuseamento das tecnologias -, que, na verdade, está antes do Registo, a questão do horário, que introduz mais um factor de discriminação. Creio, no entanto, que os argumentos decisivos passam por considerar que, em abstracto, a todos os cidadãos é garan-tido o acesso às tecnologias; que um regime mais favorável na opção por esta via permite aliviar o balcão da conservatória, tornando o serviço mais célere e eficaz, ao mesmo tempo que se contribui para o desenvolvimento através da globaliza-ção das vias de relacionamento com o serviço; e reforça o estímulo à utilização

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das novas tecnologias e à optimização dos recursos do Cartão do Cidadão, que tem associado um certificado digital.

O problema foi, como se vê, objeto de debates em Portugal. Os váli-dos argumentos da Dra. Madalena Teixeira são inquestionáveis. Com efeito, abstratamente todos têm acesso à tecnologia, os balcões são favorecidos pela apresentação eletrônica e o estímulo à utilização das novas tecnologias é im-perativo. Contudo, temos que levar em conta que as condições em Portugal são extremamente diversas das do Brasil. O país é muito menor; na mesma proporção, as desigualdades sociais e econômicas são menores; e a realidade portuguesa, diante da Comunidade Europeia, é bastante distinta da nossa.

Assim, s.m.j., a experiência portuguesa deve ser por nós utilizada para a regulamentação da Lei nº 11.977/2009, considerando também as discussões envolvendo a questão da igualdade, ainda que para adotar solução diversa da acolhida naquele país.

No Estado de São Paulo, a preocupação com a recepção de documen-tos eletrônicos pelo registro imobiliário data de 2007, quando foi editado pela Corregedoria o Provimento nº 29/2007, que não tratou, no entanto, do detalha-mento de seu acesso ao protocolo. O mérito do ato normativo está na admissão, já em 2007, da recepção de documentos eletrônicos pelos serviços de notas e registros (“Art. 1º São suscetíveis de recepção em tabelionatos e ofícios de registro, para os fins necessários, os documentos eletrônicos oriundos do Poder Judiciário, com assinatura digital, vinculada a uma autoridade certificadora, no âmbito da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil”).

Quanto ao sistema da penhora on-line, regulamentada em São Paulo pelo Provimento nº 6/2009, como mencionado no tópico 1, há na regulamenta-ção dois dispositivos que se referem ao ingresso dos títulos no protocolo:

Art. 8º A partir da data de início de funcionamento do sistema, os Oficiais de Registro de Imóveis verificarão, obrigatoriamente, na abertura e no encerramento do expediente, bem como, pelo menos, a cada intervalo máximo de 2 (duas) ho-ras, se existe comunicação de penhora, para averbação, ou pedido de pesquisa e certidão, respondendo com a maior celeridade possível.

Art. 9º Realizar-se-á regular protocolo, observando-se a ordem de prenotação, para os efeitos legais.

Nota-se que os títulos podem ingressar no sistema informatizado fora do horário de expediente do registro imobiliário, posto que na abertura do expe-diente devem os registradores verificar se há comunicação de penhora, fazendo o mesmo a cada intervalo de duas horas. Verificada a existência de títulos, esses são prenotados. O sistema, como se vê, não prevê protocolo eletrônico, mas remessa dos títulos por via eletrônica. O ingresso no protocolo dá-se no momento em que o registrador constata a remessa, o que efetivamente não as-

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segura a prioridade, pois entre a remessa e a verificação podem ter ingressado no balcão títulos contraditórios. A prioridade estaria efetivamente garantida se, no momento da remessa, o sistema encaminhasse o título para o protocolo, coincidindo sua remessa com seu lançamento no protocolo.

O princípio da igualdade não deve ser considerado como uma abstrata igualdade de oportunidades ou igualdade formal. A isonomia deve ser material, ou seja, o legislador deve atentar para as diferenças entre as pessoas.

José Afonso da Silva17, ao tratar do sentido da expressão “igualdade pe-rante a lei”, afirma:

Esses fundamentos é que permitem, à legislação, tutelar pessoas que se achem em posição econômica inferior, buscando realizar o princípio de igualização, como salienta Pontes de Miranda, in verbis: “A desigualdade econômica não é, de modo nenhum, desigualdade de fato, e sim a resultante, em parte, de de-sigualdades artificiais, ou desigualdade de fato mais desigualdades econômicas mantidas por leis. O direito que em parte as fez, pode amparar e extinguir as desigualdades econômicas que produziu”.

Na Espanha, a Lei nº 11/2007, de 22 de junho, “Ley de Acceso Electró-nico de los Ciudadanos a los Servicios Públicos”, consagra a relação com a Administração Pública por meios eletrônicos como um direito dos cidadãos. Ao estabelecer os princípios que devem informar a utilização das tecnologias de informação, inclui o princípio da igualdade, nos termos seguintes:

Principio de igualdad con objeto de que en ningún caso el uso de medios elec-trónicos pueda implicar la existencia de restricciones o discriminaciones para los ciudadanos que se relacionen con las Administraciones Públicas por medios no electrónicos, tanto respecto al acceso a la prestación de servicios públicos como respecto a cualquier actuación o procedimiento administrativo sin perjui-cio de las medidas dirigidas a incentivar la utilización de los medios electrónicos. (art. 4º, b).

Verifica-se que, embora deva ser incentivada a utilização dos meios ele-trônicos, cumpre respeitar o princípio da igualdade, sendo inaceitáveis restri-ções ou discriminações para aqueles cidadãos que se relacionam com a admi-nistração por meios não eletrônicos.

Essa a contribuição para a discussão inicial do tema.

17 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

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Assunto Especial – Doutrina

Registro Eletrônico de Imóveis

Registro de Imóveis Eletrônico� Uma Reflexão Tardia?

FLAuzILInO ARAúJO DOS SAnTOSOficial do 1º Registro de Imóveis de São Paulo, Capital e Diretor de Tecnologia e Informática do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB), Licenciado em Estudos Sociais, Bacharel em Teologia, Bacharel em Direito e Mestre em Direito Civil. Foi presidente da Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (2005/2015) e integrou vários Grupos de Trabalho do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), voltados para a modernização dos serviços de registro de imóveis, entre eles o GT, cujas atividades resultaram na Recomendação CNJ nº 14/2014, que dispõe sobre o modelo para criação e implantação, nos cartórios, do Sistema de Registro Eletrônico Imobiliário (S-REI). Autor de vários artigos publicados na Revista de Direito Imobi-liário e do livro Condomínios e incorporações no registro de imóveis: teoria e prática (2012).

SUMÁRIO: Introdução; 1 O futuro do registro de imóveis; 2 O registro de imóveis eletrônico; 2.1 Vul-nerabilidade digital; 3 A nova publicidade registral; 4 Registradores são convocados para prestar ser-viços eletrônicos; 4.1 2001 – A primeira convocação; 4.2 2009 – A segunda convocação; 4.3 2015 – A terceira convocação; Considerações finais; Dedicatória; Pedido de desculpas; Reflexão final.

O modelo de “molecularização” é perfeitamente factível e isso com base em sistemas coordenativos, não concentradores. A internet é isso: há um código comum que permite o intercâmbio e a des-centralização da informação. É o único modelo possível para esta espécie de “noosfera” assustadora. Mas, sem um código comum a articular a linguagem das máquinas, nada disso seria possível. (Sérgio Jacomino)

INtrodução

O Sistema de Registro de Imóveis1 foi constitucionalizado como um dos pilares garantidores do Estado Democrático de Direito e a âncora para a concretização do direito de propriedade e de sua função social. A opção do

1 A Constituição da República estruturou o registro de imóveis como um sistema, na galáxia do Poder Judiciário. Um sistema (do grego σύστημα systēma, por meio do latim systēma) é um conjunto de elementos interdependentes de modo a formar um todo organizado. É uma definição que acontece em várias disciplinas, como biologia, medicina, informática, administração e direito. Vindo do grego, o termo “sistema” significa “combinar”, “ajustar” e “formar um conjunto”. Todo sistema possui um objetivo geral a ser atingido (Wikipédia, link reduzido. Disponível em: <https://goo.gl/jQI9RB>. Acesso em: 30 jan. 2016). O Sistema de Registro de Imóveis compreende o corpo de registradores de imóveis, suas entidades representativas, os órgãos judiciais fiscalizadores e o conjunto de princípios, leis, regulamentos e doutrinas que informam a atividade registral.

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constituinte nacional foi a de manter um serviço público exercido em caráter privado, conforme o art. 236 da Constituição Federal. Nesse modelo, a outorga administrativa da delegação do serviço público é somada ao seu exercício em caráter privado, de sorte que princípios empresariais autônomos próprios do setor privado são somados com critérios administrativos de prestação, regula-mentação e fiscalização de serviços públicos. O resultado é a prestação de um serviço público iluminado por valores, princípios e procedimentos empresariais inerentes à iniciativa privada.

Realmente, o registro de imóveis é um instrumento da sociedade brasilei-ra, na medida em que protege o cidadão no seu direito fundamental à proprie-dade, até mesmo em face do próprio estado, quando esse direito é ameaçado. Mas é, também, pela solidez alcançada como instituição jurídico-social, no plano normativo, doutrinário, jurisprudencial e alto grau de confiança popular. As pessoas confiam no registro de imóveis2!

Assim, pode ser dito que o registro de imóveis é um player importante na competitiva cadeia dos negócios imobiliários, por seu apoio ao funcionamento do mercado. O mercado imobiliário é um mercado econômico, mas é, tam-bém, um mercado de direitos. O registro de imóveis não cria o mercado, mas é uma ferramenta sem a qual este não pode desenvolver-se adequadamente, visto que contribui para sua expansão sustentável, relativamente aos itens que lhe correspondem: segurança jurídica e transparência dos negócios inerentes. A transparência decorrente da publicidade registral faz com que o mercado seja, como um todo, mais confiável e eficiente3.

O Sistema de Registro de Imóveis também labora positivamente para a concretização de aspirações constitucionais voltadas ao equilíbrio entre os in-teresses individuais e os da coletividade, garantindo primazia à dignidade da pessoa humana e a todas as consequências e aportes que seu respeito impõe nas relações com terras rurais e urbanas. Cabe ao registro de imóveis dar o devido suporte para viabilização de políticas públicas que envolvem a terra, tais como de direito à moradia digna, ao financiamento imobiliário, à regularização fun-diária, à proteção do meio ambiente, à reforma agrária, à demarcação de terras

2 Em pesquisa realizada pelo Instituto DataFolha, para aferir o grau de confiança e avaliação das instituições, diante da pergunta: “Você diria que confia muito, confia um pouco ou não confia (no Registro de Imóveis)?”, 96% dos entrevistados afirmaram confiar, assim distribuídos: confia muito, 70%; confia um pouco, 26%; não confia, 3%; e não sabe, 1%. Foram realizadas 873 entrevistas, no período de 15 a 18 de setembro de 2014, em 29 municípios, abrangendo capital, região metropolitana e interior do Estado de São Paulo.

3 Algumas questões essenciais do mercado imobiliário garantidas pelo registro de imóveis: liquidez de domínio e garantia de idoneidade financeira nos empreendimentos de loteamentos (Lei nº 6.766/1979) e incorporações imobiliárias (Lei nº 4.591/1964); controle efetivo da disponibilidade em alienações e onerações imobiliárias; propriedade do devedor hipotecante ou do devedor fiduciante, nos contratos de financiamento imobiliário; controle e manutenção do grau da hipoteca a favor do credor hipotecário ou da propriedade fiduciária em nome do credor fiduciário; controle da emissão de Cédulas de Crédito Imobiliário (CCIs), inibindo a circulação de crédito sem lastro no mercado; aplicação de mecanismos extrajudiciais céleres nas execuções extrajudiciais em contratos de alienações fiduciárias inadimplentes, para fins de retomada do imóvel e sua recolocação no mercado.

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devolutas, de indígenas e de quilombolas, à utilização de terras públicas, ao controle de aquisição de imóveis rurais por estrangeiros, à aplicação dos meca-nismos do Estatuto da Cidade, ao controle de áreas contaminadas, entre outras.

A realização dessas demandas do mercado e da cidadania exige que a publicidade registral, ato final e clímax de toda a atividade do registro de imóveis, seja estruturada mediante a utilização dos recursos tecnológicos da era digital, para que haja a universalização de acesso aos serviços registrais de forma remota, sem intermediários4, bem como a interoperabilidade de dados.

A ausência de uma rede e de uma plataforma que interligue todos os car-tórios de registro de imóveis do País e forneça serviços on-line para os cidadãos, as empresas, a Administração Pública e o Judiciário pode ser fatal para o futuro do registro de imóveis, com o consequente prejuízo para a sociedade e para todo o mercado financeiro e imobiliário.

O registro de imóveis brasileiro tem que evoluir da forma mais rápida possível ao compasso dos novos tempos e das demandas sociais, o que somente será possível mediante a implantação massiva das novas tecnologias em todas as unidades de registro de imóveis do País. Não basta ter ilhas de excelência na prestação dos serviços registrais, enquanto outras serventias ainda laboram sob estruturas que foram moldadas no século retrasado e não conseguem acompa-nhar as mudanças que a sociedade está demandando. Assim sendo, a interliga-ção de todas as serventias do País em rede, com disponibilização de serviços eletrônicos em plataforma nacional, não é uma opção a ser considerada pelos registradores e reguladores, mas, sim, uma missão a ser cumprida.

É lamentável que representantes de alguns setores operacionais da ativi-dade registral ainda resistam em ver e entender com outra perspectiva a atual estrutura da economia e da sociedade. Daqui a cinco anos, todos esses que “se acham”, mas são recalcitrantes à mudança e à inovação, estarão tremendamen-te arrependidos por terem lutado na fronte da velha economia contra a transição para os novos tempos.

Todos nós sabemos que os mecanismos de mercado atuam para selecio-nar processos mais eficientes e mais lucrativos, expulsando os competidores que utilizam processos antigos e menos eficientes. É um jogo do qual resultam

4 Escreve Jeff Jarvis (Nova realidade de negócios) que: “Os intermediários estão condenados. [...] Para todos os intermediários, o tempo está passando e a questão do valor está assomando. Toda vez que o Google faz uma conexão direta, o valor de um intermediário é diminuído. Você é intermediário? Se a Web está fazendo mais mal do que bem ao seu negócio, a resposta provavelmente é sim. Se você torna o mercado mais eficiente, se você resolve os problemas de abundância e confusão e agrega valor, ótimo. Mas, mesmo que você o faça, qualquer pessoa pode usar a internet para eliminá-lo. [...]. A Internet abomina a ineficiência, eliminando-a sempre...” (JARVIS, Jeff. O que a Google faria? – Como atender às novas exigências do mercado. Barueri/SP: Manole, 2010. p. 73).

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vencedores e perdedores, sem oportunidade de revanche. Ao vencedor, as ba-tatas; ao perdedor, as latinhas5.

Com o conceito de Internet das coisas se materializando aos poucos, exe-cutivos da Google publicam obra sobre os rumos da era digital e o modo como as nações e os empreendimentos funcionarão, cujas ideias devem merecer a nossa atenção.

Até 2025, a maior parte da população mundial terá saído, em uma geração, da quase total falta de acesso a informações não filtradas para o domínio de toda a informação do mundo através de um aparelho que cabe na palma da mão. Se o ritmo atual da inovação tecnológica for mantido, a maioria da população da Terra, estimada em oito bilhões de pessoas, estará online.

Em todos os níveis da sociedade, a conectividade vai se tornar cada vez mais acessível e prática. As pessoas terão acesso a redes de internet sem fio onipre-sentes, muitíssimo mais baratas do que as que existem hoje. Nós seremos mais eficientes, produtivos e criativos. No mundo em desenvolvimento, pontos públi-cos de Internet sem fio e redes de alta velocidade para conexão doméstica vão se somar, estendendo a experiência online até lugares onde hoje nem mesmo existem linhas telefônicas. Sociedades vão saltar toda uma geração de tecnolo-gia. Por fim, as parafernálias tecnológicas que nos maravilham hoje em dia serão vendidas em feiras de antiguidades, como aconteceu com o telefone de disco.

Na verdade, os próximos momentos de nossa evolução tecnológica prometem transformar diversos conceitos populares de ficção científica em fatos: carros sem motorista, movimentos robóticos controlados pelo pensamento, inteligência ar-tificial (IA) e sistemas completamente integrados de realidade aumentada que oferecem a possibilidade de sobreposição visual de informação digital em nosso ambiente físico. Tais desenvolvimentos vão incorporar e aprimorar nosso mundo natural.6

Esse é o nosso futuro! E o do registro de imóveis?

1 o Futuro do regIStro de ImÓVeIS

O futuro do registro de imóveis aponta para a modernização do Estado para fazê-lo mais eficiente, com o olhar posto no cidadão, tanto no respeito aos seus direitos quanto na satisfação de seus requerimentos. O desafio crescente e continuado dos registradores imobiliários consiste em alcançar patamares de excelência na prestação dos serviços públicos delegados, de forma a gerar be-nefícios tangíveis para a população, sob pena de serem excluídos do processo de governança fundiária.

5 MENEZES, Rogério. Ao perdedor, as latinhas. Revista Época, n. 148, de 19 mar. 2001.6 SCHMIDT, Eric; COHEN, Jared. A nova era digital: como será o futuro das pessoas, das nações e dos negócios.

1. ed. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2013. p. 12.

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Governança fundiária refere-se às iniciativas ou a ações que expressam a capacidade de uma sociedade organizada territorialmente para gerir os assuntos públicos a partir do envolvimento conjunto e cooperativo dos atores sociais, econômicos e institucionais.

Entre os atores institucionais, inclui-se, naturalmente, o Estado com seus diferentes agentes, que delegou o monopólio do controle do direito de proprie-dade imobiliária, e temas conexos para um corpo de registradores de imóveis devidamente organizados por circunscrições imobiliárias definidas, que são os curadores digitais das bases de dados decorrentes, as quais encerram valor es-tratégico para o País, conforme suportes normativos:

Lei nº 6.015/1973, art. 24: “Os oficiais devem manter em segurança, permanen-temente, os livros e documentos e respondem pela sua ordem e conservação”.

Lei nº 8.935/1994, art. 46: “Os livros, fichas, documentos, papéis, microfilmes e sistemas de computação deverão permanecer sempre sob a guarda e a responsa-bilidade do titular de serviço notarial ou de registro, que zelará por sua ordem, segurança e conservação”.

Conforme observou Sérgio Jacomino, “o modelo de ‘molecularização’ é perfeitamente factível e isso com base em sistemas coordenativos, não con-centradores”. Realmente, não há necessidade de um supercomputador que concentre todas as bases de dados de todos os cartórios do País, como era o modelo usado por empresas pioneiras no setor de serviços públicos. A rede de serventias registrais poderá ter máquinas espalhadas por data centers de todo o País, inclusive “na nuvem”, em conformidade com a opção de cada registrador e respeitada a legislação de regência, tendo, em comum, a interoperabilidade de dados estruturados e a centralização dos serviços em uma única plataforma.

Como prevê a legislação transcrita antes, os dados e as imagens perma-necem alocados em suas bases primárias, sob a guarda e a responsabilidade dos respectivos oficiais, que também respondem pela sua ordem e conserva-ção, e somente serão requisitados na infraestrutura compartilhada ou por Web Service7, mediante instância do usuário-cidadão, salvo aqueles enviados para processamento na própria plataforma.

Há perguntas que somente o registro de imóveis pode dar e que são cruciais para a formulação de políticas públicas e de estratégias empresariais, como, por exemplo: Qual é o tamanho do mercado imobiliário do País? Qual tem sido o impacto da crise econômica nos negócios imobiliários? Qual é a soma das áreas do território nacional titularizadas ou arrendadas por estrangei-

7 Web Service é a tecnologia ideal para proporcionar interoperabilidade entre os sistemas das serventias registrais, que podem manter seus servidores em seu data center, e os da plataforma de serviços na Internet. A comunicação entre os serviços é padronizada, possibilitando a independência de plataforma e de linguagem de programação. Por exemplo: um sistema desenvolvido em Java e rodando em um servidor Linux pode acessar, com transparência, um serviço feito em .Net, rodando em um servidor Microsoft.

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ros? Qual é a nacionalidade estrangeira que mais ocupa terras no Brasil? A rea-lidade é que esses e outros dados existem e poderiam ser processados de forma célere e segura se as serventias estivessem interconectadas em rede.

É preciso refletir que, diante das profundas transformações da economia e da sociedade no mundo inteiro, o registro de imóveis brasileiro precisa ser repensado, em busca de estratégias inovadoras que induzam à transformação da atividade registral dentro da nova dinâmica implementada pela sociedade da informação, de sorte que o registro imobiliário seja reinventado, mantendo-se, por óbvio, a sua estrutura mater; porém, apresentando-se como uma instituição jovem, renovada e antenada com o novo mundo. O objetivo é fortalecer a capacidade criativa do registro de imóveis e, consequentemente, a sua compe-titividade, identificando lacunas no mercado, a fim de oferecer novos produtos que sejam atrativos para os usuários e que possam ser consumidos em massa, eletronicamente, bem como pela comodidade do uso das novas tecnologias.

E por que manter sua estrutura mater?

Porque o Direito Registral Imobiliário brasileiro já atingiu um grau de ma-turidade perfeitamente consolidado na estrutura jurídica do País. Além disso, o registro de imóveis não é apenas mais um sistema jurídico que existe pelo impé-rio da lei. É uma instituição da sociedade brasileira que goza da aceitabilidade e da confiança da população e do mercado ao manter um ambiente hermético de segurança jurídica dos negócios imobiliários, com uma única porta de entrada: o Livro 1 – Protocolo.

O registro de imóveis pode ser comparado a uma casa-forte de onde o titular do direito inscrito defenderá comodamente os seus direitos, sob o amparo da legitimidade registral e da fé pública, sem se expor aos azares de ambientes juridicamente poluídos. Eis a razão porque perdura no tempo a advertência de Serpa Lopes, para que a porta de acesso ao registro esteja sempre aberta:

Um princípio devem todos ter em vista, quer oficial de registro, quer o próprio juiz: em matéria de registro de imóveis toda a interpretação deve tender para facilitar e não para dificultar o acesso dos títulos ao registro, de modo que toda propriedade imobiliária e todos os direitos sobre ela recaídos fiquem sob o ampa-ro do regime do registro imobiliário e participem dos seus benefícios.8

Todavia, há uma única porta de entrada, enquanto as demais portas e ja-nelas estão sempre fechadas. Então, por força da qualificação registral, o acesso é vedado àqueles que têm consigo sinais muito fortes do mundo de fora; é como se trouxessem os pés cheios de lama da rua ao pretenderem entrar na casa regis-tral. Por isso, negativamente qualificados são barrados, porque contaminariam o sistema de segurança jurídica dos negócios imobiliários.

8 SERPA LOPES, Miguel Maria de. Tratado dos registros públicos. 3. ed. São Paulo: Freitas Bastos, v. II, 1955. p. 346.

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O desafio apresentado aos registradores e reguladores é “eletronificar” esse patrimônio jurídico nacional9, com a devida segurança jurídica e tecno-lógica, a inclusão digital das serventias de pequeno porte e, ao mesmo tempo, mantê-lo selado.

O registrador Luciano Lopes Passarelli, que, logo após a edição da Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, apresentou excelente monografia sobre o princípio da publicidade na era do registro de imóveis eletrônico, cuja leitura fica sugerida, iniciou sua obra com a seguinte convocação: “A nova realidade já demanda que os estudiosos do Direito Registral Imobiliário se debrucem sobre a implantação desse novo paradigma”10.

Dentro dessa perspectiva, é necessário que o registro de imóveis, por seu corpo de registradores, estabeleça diretrizes organizativas para que tenha em todo o País a mesma forma de operacionalização, atentando a dois conceitos importantes: o de sistema e a ideia de unicidade.

Um sistema pode ser definido como um conjunto de elementos inter--relacionados que interagem entre si no desempenho de uma função, para um fim comum. Como sistema, o registro de imóveis brasileiro é uno. O que é fra-cionada é a sua operacionalização por meio das diversas unidades de serviços, denominadas cartórios ou ofícios.

Esse conceito está exposto no Provimento nº 47 da Corregedoria Na-cional de Justiça, que estabeleceu diretrizes gerais para o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), o qual estabeleceu que, no prazo de 360 dias, contados a partir de 18 de junho de 2015, os oficiais de registro de imóveis devem agrupar-se em Centrais de Serviços Eletrônicos Compartilhados, uma em cada Estado, tendo como requisitos normativos: (1º) que essas centrais prestem os mesmos serviços; e (2º) que elas sejam interoperáveis entre si (art. 3º, § 5º).

Nesse ponto, o provimento da Corregedoria Nacional de Justiça foi ab-solutamente perfeito ao disciplinar a forma de prestação dos serviços registrais pela Internet, pois o usuário não pode ser obrigado a ingressar em diferentes sítios da Internet para acessar o mesmo serviço público.

A ideia de unicidade tem como fundamento a lógica de o serviço público de registro de imóveis ser regulado por legislação de competência exclusiva da União (CF, art. 22, I e XXV), como política legislativa, com a finalidade de eliminar assimetrias regionais e manter o pacto federativo.

9 O registro de imóveis é um patrimônio jurídico nacional, porque conta com conjunto legislativo sólido e escoimado no tempo de imperfeições, ilegalidades e inconstitucionalidades; com pacífica jurisprudência e sólida doutrina a respeito dos principais direitos imobiliários registráveis; com um corpo de profissionais especializados em direito imobiliário, selecionados por concurso público de provas e títulos. Além disso, os cartórios (inclusive os de outras especialidades) constituem a maior rede jurídica de atendimento aos cidadãos e a empresas do Brasil.

10 PASSARELLI, Luciano Lopes. Teoria geral da certidão registral imobiliária: o princípio da publicidade na era do registro de imóveis eletrônico. São Paulo: Quinta Editorial, 2010. p. 13.

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Embora a fiscalização dos serviços registrais em seus aspectos técnicos e administrativos seja exercida pelo Poder Judiciário estadual, a criação do Con-selho Nacional de Justiça trouxe um novo enfoque sobre a posição dos servi-ços notariais e de registro, conferindo-lhes inequívoca conotação e caráter de “órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados”, reposicionando-os, de forma coletiva, na galáxia do CNJ, “sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos Tribunais” (CF, art. 103-B, § 4º, III).

A despeito dos avanços legais e da edição de resoluções, provimentos e recomendações pelo CNJ, o panorama brasileiro da regulação dos serviços registrais reclama padronização nacional mínima, mas suficiente para superar cenários de dificuldades e interrogações com as quais se defrontam os usuários--cidadãos, com relação aos contratos de financiamento imobiliário, loteamen-tos, incorporações imobiliárias e condomínios edilícios, regularização fundiá-ria, georreferenciamento de imóveis rurais, entre outros, em procedimentos e exigências que variam de lugar para lugar, advindos de normas editadas pelas Corregedorias de Justiça dos Estados e pelos juízes corregedores locais.

Em artigo paradigmático publicado em 11.12.2015 com o título “Registro de imóveis brasileiro. Necessidade urgente de uma atuação corporativa”, o re-gistrador Marcelo Augusto Santana de Mello lançou o seguinte repto:

A criação de uma entidade nacional com agências estaduais, com contribuição obrigatória e poder de regulamentação de rotinas registrais, resolveria todos os problemas de falta de uniformização da atividade registral. Certamente, a fiscali-zação do Poder Judiciário, contida no comando constitucional (art. 236, 103-B, § 4º, III), seria respeitada. Fiscalização não se confunde com autorregulação.

Tratar-se-ia de um começo para que exista a efetivação da autorregula-ção das atividades notariais e registrais, o que Luís Paulo Aliende Ribeiro, em seu doutoramento, entendeu possível e compatível com o sistema brasileiro (Regulação da função publica notarial e registral. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 184).

Consoante mencionado desde o início deste trabalho, o momento clama pela presença dos registradores brasileiros para investirem em necessárias políti-cas e gestões institucionais que visem à superação do cenário atual, requerendo a construção [1] de uma rede onde estejam interconectadas todas as unidades registrais do país e [2] de uma plataforma para prestação dos serviços regis-trais, consolidados na organicidade de procedimentos, organização, regulação e ação sistêmico-coletivas e inclusão digital das serventias de pequeno porte.

Um modelo que pretenda apresentar eficácia e eficiência na implantação de uma política registral compatível com a expectativa dos cidadãos, das em-

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presas, da Administração Pública e do Poder Judiciário precisa de um fluxo bem desenhado de ações que contemple:

I – objetivos estratégicos;

II – revisão e melhoria de processos e estruturas de trabalho11;

III – como tirar maior proveito das inovações tecnológicas;

IV – o compartilhamento dos benefícios12.

2 o regIStro de ImÓVeIS eLetrôNIco

O registro de imóveis eletrônico tem como princípio a utilização da Tecnologia de Informação e de Comunicação (TIC) para desmaterialização de procedimentos registrais internos das serventias, bem como promover a inter-conexão destas entre si, com o Poder Judiciário, os órgãos da Administração Pública, as empresas e os cidadãos na protocolização eletrônica de títulos e no acesso às informações e certidões registrais, de forma a aprimorar a qualidade e a eficiência do serviço público prestado por delegação.

Para o usuário-cidadão, o registro eletrônico consiste no acesso pela In-ternet de informações, na solicitação e no recebimento de certidões, bem como na remessa eletrônica de títulos para as serventias.

O sistema de registro eletrônico de imóveis deverá ser implantado e in-tegrado por todos os oficiais de registro de imóveis de cada Estado e do Distrito Federal, na forma e nos prazos previstos na Lei nº 11.977, de 7 de julho de

11 Não é segredo que algumas serventias ainda mantêm os seus processos no estilo do velho Decreto nº 4.857, de 1939, porque ainda se comportam como se estivessem no sistema da transcrição, a começar pela designação das funções dos prepostos: busqueiro, extratista, oficial maior. etc.

12 Os serviços e as respectivas tabelas de preços do registro de imóveis foram desenvolvidos sob os conceitos da velha economia. Nicholas Carr explica que “as novas companhias de serviços eletrônicos têm um tipo inusitado de comportamento que os economistas chamam de ‘retornos crescentes de escala’”. Diz ainda que “é uma dinâmica muito diferente daquela que predomina no mundo industrial, no qual as empresas estão sujeitas a retornos decrescentes de escala. À medida que um fabricante de mercadorias físicas aumenta sua produção, mais cedo ou mais tarde tem de começar a pagar mais por seus insumos – as matérias- -primas, os componentes, o material de escritório, os imóveis e os funcionários de que precisa para fabricar e vender produtos. Por seu turno, um produto digital pode ser multiplicado infinitamente por um custo que é praticamente zero” (A grande mudança: reconectando o mundo de Thomas Edison ao Google. São Paulo: Landscape, 2008. p. 126). É dentro desse conceito que o Google não cobra nada de seus usuários para manter uma conta de e-mail, nem o YouTube e o Vimeo daqueles que querem arquivar ou assistir um vídeo. O Skype permite que seus assinantes façam ligações telefônicas ilimitadas para outros assinantes por meio da Internet – ligações grátis – e cobra só alguns centavos de dólar a cada minuto por ligações feitas para linhas telefônicas tradicionais. O WhatsApp Messenger é um aplicativo gratuito multiplataforma de mensagens instantâneas e chamadas de voz para smartphones. Além de mensagens de texto, os usuários podem enviar, sem custos, imagens, vídeos, mensagens de áudio de mídia e, na nova atualização, podem ligar para qualquer contato de sua agenda que possua WhatsApp. Os registradores de imóveis do Estado de São Paulo debutaram nesse conceito em 2008 ao estabelecer o acesso on-line às imagens das matrículas imobiliárias (Matrícula On-line) por um custo correspondente a 1/3 do valor dos emolumentos de uma certidão, cujo serviço está disponível 24 horas por dia e sete dias por semana em no site http://www.registradores.org.br e apresenta alto índice de aceitabilidade e agradabilidade pelos usuários. A redução dos custos gerada pela tecnologia se mostrará mais efetiva no que se refere à intermediação, ao acesso e ao tempo dos serviços. Outros serviços devem ser estruturados dentro dessa mesma visão, como, por exemplo, a pesquisa para localização de bens.

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2009, e no Provimento nº 47, de 18 de junho de 2015, da Corregedoria Nacio-nal de Justiça.

2.1 Vulnerabilidade digital

Embora proporcionem mais praticidade, os documentos digitais trazem consigo alguns problemas de segurança da informação e outros decorrentes da velocidade da evolução tecnológica, ante a necessidade de garantir que sejam acessíveis e permaneçam autênticos em todo o seu ciclo de vida.

Segundo os pesquisadores Henrique Machado dos Santos e Daniel Flores, ambos do Grupo de Pesquisa Gestão Eletrônica de Documentos Arqui-vísticos e Grupo de Pesquisa Patrimônio Documental Arquivístico, da Universi-dade Federal de Santa Maria (RS), estudos revelam que os documentos digitais têm uma série de complexidades e especificidades. Apontam que, entre elas, a vulnerabilidade e a facilidade de alterar, reformatar e falsificar sem deixar qualquer vestígio poderão comprometer a sua autenticidade e o seu acesso no futuro. Citam que, além disso, é possível excluir diversos documentos de ma-neira silenciosa13.

Devido aos problemas decorrentes da rápida obsolescência tecnológica de hardware, software, formatos de arquivo, suporte e, também, outros, relati-vos ao ciclo de vida da assinatura digital14, que criam obstáculos à longevidade dos documentos digitais, até que avanços tecnológicos sobrevenham à escri-turação apenas em meio eletrônico, sem impressão em papel, deve ser restrita aos indicadores reais e pessoais, controle de títulos contraditórios, certidões e informações registrais, mantidos os Livros 1, 2 e 3, no suporte convencional em papel.

13 SANTOS, Henrique Machado; FLORES, Daniel. Documentos digitais. O desafio da preservação. Revista Ciência Hoje, SBPC, n. 330, v. 55, p. 29/31, out. 2015. Disponível em: <http://goo.gl/i7W7ts>. Acesso em: 30 jan. 2016.

14 O ciclo de vida de uma assinatura digital compreende os processos de: a) Criação – processo de criação de um código logicamente associado a um conteúdo digital e à chave criptográfica privada do signatário; b) Verificação ou validação – processo de verificação quanto à validade de uma ou mais assinaturas digitais, logicamente associado a um conteúdo digital; c) Armazenamento – processo que trata da guarda da assinatura digital. Compreende, pelo menos, cuidados para conversão dos dados para mídias mais atuais, sempre que necessário; d) Revalidação – processo que estende a validade do documento assinado, por meio da reassinatura dos documentos ou da aposição de carimbos do tempo, quando da expiração ou revogação dos certificados utilizados para gerar ou revalidar as assinaturas ou, ainda, quando do enfraquecimento dos algoritmos ou tamanhos de chave utilizados. A criação de assinaturas digitais com características apropriadas aos registros imobiliários, mesmo admitindo-se uma longevidade programada, ao fim da qual o documento seria reassinado, com sobreposição de um novo carimbo do tempo, exige a incorporação de elementos que permitam uma validação mais confiável em longo prazo, o que, em contrapartida, aumenta o tamanho do arquivo, o tempo gasto na geração da assinatura e os custos cumulativos. É de ser considerado que, no presente, alguns desses insumos não estão disponíveis, além do que a reassinatura não garante que a assinatura mantenha sua validade pelo tempo esperado. Os custos dificultariam a preservação e a validação dessas assinaturas em dispositivos com poucos recursos computacionais, bem como a preservação de grandes volumes de documentos eletrônicos, indefinida e permanentemente.

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Como ainda não há solução definitiva para esses problemas, persiste, pois, a ameaça da perda de documentos digitais, trazida pela obsolescência, o que torna a sua preservação permanente um desafio a ser vencido.

Para a implementação de Repositórios Arquivísticos Digitais Confiáveis (RDC-Arq), de conformidade com a temporalidade estabelecida na tabela ane-xa ao Provimento nº 50, de 28 de setembro de 2015, da Corregedoria Nacio-nal de Justiça15, devem ser levadas em consideração, além da Recomendação nº 14, de 2 de julho de 2014, da Corregedoria Nacional de Justiça16, as diretri-zes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Arquivos (Conarq), na Resolução nº 39, de 29 de abril de 201417, com as alterações introduzidas pela Resolução nº 43, de 4 de setembro de 201518.

Os documentos arquivísticos digitais em fase corrente e intermediária devem, preferencialmente, ser gerenciados por meio do Sistema Informatizado de Gestão Arquivística de Documentos – Sigad, a fim de garantir o controle do ciclo de vida, o cumprimento da destinação prevista e a manutenção da autenti-cidade e da relação orgânica, características fundamentais desses documentos.

Todavia, a existência de problemas de ordem prática não pode ser escusa para a premente instalação do registro eletrônico. Pelo inverso, com as ferra-mentas hoje existentes e os critérios e parâmetros já estabelecidos, é viável e necessária a execução dos serviços registrais eletrônicos como os anteriormente indicados.

3 A NoVA pubLIcIdAde regIStrAL

A publicidade registral exige a utilização de meios instrumentais voca-cionados e estruturalmente orientados para proporcionar a comunicação do usuário com o registro de imóveis e o conhecimento das situações registrais decorrentes.

Em um sistema de registro constitutivo, como sucede entre nós, em espe-cial por força do disposto no art. 1.245 do Código Civil, o ato de registro, fazen-do parte componente do suporte fático de que depende a validade do negócio, é essencial que a realidade registral para terceiros, ou seja, para o público, seja acessível, pois é para o público que os registros públicos existem.

Parece-nos que não basta, porém, que exista a possibilidade de conhe-cer previamente a eventual existência de títulos oponíveis erga omnes. É ainda necessário, para que a instituição tenha a relevância pretendida e seja eficaz no tempo, que os terceiros obtenham a garantia geral de acessibilidade do que está

15 Disponível em: <http://goo.gl/9RJ9gv>. Acesso em: 30 jan. 2016.16 Disponível em: <http://goo.gl/JhVFzW>. Acesso em: 30 jan. 2016.17 Disponível em: <http://goo.gl/89IG1V>. Acesso em: 30 jan. 2016.18 Disponível em: <http://goo.gl/TzpQfJ>. Acesso em: 30 jan. 2016.

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registrado, de forma simples e célere pela Internet, e desburocratizada, como sempre pretendeu o legislador pátrio19.

Na verdade, não se compreenderia sequer que a sociedade canalizasse recursos financeiros tão importantes para manter uma instituição – a registral – cuja utilização estivesse dissociada dos sistemas publicitários criados pelo desenvolvimento tecnológico da informação e comunicação. Nessa sequência, seria perfeitamente dispensável a manutenção da instituição registral, pelo me-nos no modelo atual, a qual pouco mais representaria do que um gargalo na cadeia dos negócios imobiliários, como não poucas vezes tem acentuado o próprio setor.

Por todos, o estudo “O custo da burocracia no imóvel”, lançado con-juntamente, em 19.03.2014, pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e pelo Movimento Brasil Competitivo (MBC), reconhece que, “ainda que existam gargalos em toda a cadeia, as principais causas são estruturas ineficientes nas prefeituras, cartórios e legislação que não favorece a segurança jurídica para o desenvolvimento de negócios”, como demonstram nas figuras a seguir20:

A inclinação por mudanças radicais no sistema já foi recentemente sina-lizada, mesmo em setores de regulação dos serviços registrais. O Grupo de Tra-balho Interministerial sobre os Serviços Notariais e de Registro, criado pelo De-creto Presidencial sem número, de 22 de outubro de 2008, publicado no DOU do dia seguinte, e legitimado pela Portaria nº 150, de 4 de fevereiro de 2009, do ministro da Justiça, com o objetivo de revisar a legislação atual e elaborar propostas para o aperfeiçoamento e a modernização dos serviços, concluiu pela mudança do sistema de delegação por concurso público, para concessão admi-nistrativa por licitação.

Uma simples pesquisa na Internet com as palavras-chave “Renavam de imóveis” revela o anseio comum de setores do Governo e da iniciativa privada por um número identificador único e nacional para cada imóvel, que o referen-cie dentro do sistema, como já ocorre com automóveis, bem como a concen-tração de todos os atos na matrícula imobiliária, mediante averbação, conforme prevê a Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015, garantindo, dessa forma, os direitos a terceiro de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel, inclusive para fins de evicção, bem como obrigando o interes-

19 A tradição no Direito brasileiro, ao tratar da publicidade registral, é que qualquer pessoa interessada pode requerer a certidão que lhe convier, e ao oficial não compete indagar do interesse do requerente e, se assim não fosse, uma das finalidades do registro de imóveis como veículo da publicidade imobiliária estaria prejudicada (Decreto nº 3.453, de 26.04.1865, arts. 80 a 89; Decreto nº 370, de 02.05.1890, arts. 77 a 86; Decreto nº 18.542, de 24.12.1928, arts. 19 a 25; Decreto nº 4.857, de 09.11.1939, arts. 19 a 25; e Lei nº 6.015, de 31.12.1973, arts. 16 a 21).

20 Disponível em: <http://goo.gl/QcttQu> (link reduzido). Acesso em: 30 jan. 2016.

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sado a proteger seu crédito ou direito de outra natureza e lhe dar publicidade imobiliária.

Segundo seus defensores, esse modelo simplificará o procedimento de venda e compra e financiamento de imóveis, ao concentrar todas as informa-ções sobre o bem e os titulares de direito inscritos, acessíveis em um único sítio na Internet, reduzindo riscos e custos operacionais, com reflexos na taxa de juros e nos prazos de financiamento.

Minuta de provimento da Corregedoria Nacional de Justiça que objeti-vava regulamentar o sistema de registro eletrônico de imóveis, de forma mais abrangente, e instituir uma central de serviços eletrônicos compartilhados dos registradores de imóveis, como delineado na citada Recomendação nº 14, co-locada em consulta pública em fevereiro de 2015, previa a implantação do código nacional de matrícula, de forma bastante simples21:

Art. 11. Os imóveis inseridos no Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) serão identificados pelo Código Nacional da Matrícula, unívoco em âmbito na-cional e formado pelos seguintes elementos:

I – o Código Nacional da Serventia (CNS) correspondente à unidade de registro onde está matriculado o imóvel, com cinco dígitos mais o dígito verificador, se-guido da expressão “MA”; e

II – o número de ordem existente a que se refere o art. 176, § 1º, inciso II, da Lei nº 6.015, de 1973, sem zeros à esquerda.

§ 1º Sendo o imóvel situado em mais de uma comarca ou circunscrição, será o fato identificado em campo próprio na escrituração eletrônica.

§ 2º O Código Nacional da Matrícula referente à matrícula encerrada ou cance-lada não poderá ser reutilizado.

Lamentavelmente, interesses subjacentes e ignorância sobre o assunto laboraram conjuntamente em resistência à regulamentação colocada em con-sulta pública pela Corregedoria Nacional de Justiça, apresentando volumosas objeções, que restou prejudicada. Sobreveio o Provimento nº 47, de 18 de ju-nho de 2015, da Corregedoria Nacional de Justiça, que estabeleceu diretrizes gerais, porém deixou para as Corregedorias-Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal e dos Territórios, no âmbito de suas atribuições, estabelecer as normas técnicas específicas para a concreta prestação dos serviços registrais em meios eletrônicos, ainda que vinculadas aos parâmetros do provimento nacio-nal. Quot capita, tot sensus!

21 Disponível em: <http://goo.gl/rCpjLo> (link reduzido). Acesso em: 30 jan.2016.

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4 regIStrAdoreS São coNVocAdoS pArA preStAr SerVIçoS eLetrôNIcoS

A administração eletrônica é um direito do consumidor dos serviços pú-blicos, sejam eles prestados de forma direta ou indireta, inclusive por delega-ção, assim como também o direito à informação do conteúdo dos arquivos dos órgãos respectivos. Os cidadãos estão elevados à condição de consumidores desses serviços, com direito a acesso remoto, segurança e previsibilidade e, com isso, diminuindo os riscos inerentes aos intercâmbios pessoais, degradando riscos e custos financeiros.

4.1 2001 – a primeira conVocação

Algumas normativas foram promulgadas, como a Medida Provisória nº 2.200, de 28 de junho de 2001, que criou a ICP-Brasil – Infraestrutura de Chaves Públicas brasileira, para o desenvolvimento de um modelo que possi-bilitou o uso de assinaturas eletrônicas, a certificação digital e a validade legal dos documentos que tramitam por meio eletrônico.

Naquela primeira hora, o papel dos registradores de imóveis já era en-contrar no manto jurídico existente soluções para sua presença na era virtual, com o ingresso dos meios eletrônicos de comunicação na atividade registral para prestar informações e emitir certidões digitais.

Posteriormente, foi publicada a Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, que alterou o art. 659 do Código de Processo Civil, inclusive acrescendo--lhe o § 6º, categórico ao dispor que, com as necessárias garantias de segurança, “as averbações de penhoras de bens imóveis e móveis podem ser realizadas por meios eletrônicos”.

Nesse mesmo ano, foi ainda publicada a Lei nº 11.419, de 19 de de-zembro de 2006, prevendo o processo judicial sem papel, com autos digitais e comunicações eletrônicas.

Poder-se-á dizer que os registradores do Estado de São Paulo “fizeram a lição de casa”. O contexto não poderia ser mais apropriado. Em 10 de maio de 2005, foi inaugurado o Sistema de Ofício Eletrônico, com o objetivo de substi-tuir ofícios em papel por solicitações eletrônicas. O seu funcionamento incluiu o desenvolvimento do módulo de pesquisas para localização de bens, denomi-nado “Banco de Dados Light”, do Assinador Digital Registral ICP-Brasil, e de um aplicativo para emissão de certidões digitais (Certidão Express)22.

22 O sucesso do ofício eletrônico está à vista de todos: em pouco mais de dez anos foram feitas mais de 500 milhões de pesquisas e expedidas milhares de certidões digitais; pouparam-se mais de 4 bilhões de reais (até janeiro de 2016) dos orçamentos dos órgãos públicos e cartórios utilizadores do sistema; os processos ganham outra dinâmica e recuperam em momentos que tradicionalmente representam “tempo morto” do processo (nomeadamente no trânsito entre a solicitação do juiz ou autoridade e a resposta do cartório). Veja dados completos em <https://goo.gl/b0FVVI> (link reduzido) (Acesso em: 30 jan. 2016).

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Posteriormente, foram desenvolvidos outros aplicativos: Penhora Eletrô-nica de Imóveis (Penhora On-line), Central de Indisponibilidade de Bens, bem como os módulos da Central de Serviços Eletrônicos dos Registradores de Imó-veis, cujos sistemas são operados com a cooperação do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB).

Diante do êxito obtido com o ofício eletrônico, no Estado de São Paulo a Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) baixou a Portaria nº 147, de 5 de julho de 2007, instituindo grupo de trabalho com o objetivo de desen-volver funcionalidades tecnológicas voltadas à integração das bases de dados das serventias extrajudiciais com os órgãos do Poder Judiciário23. Depois de intensos trabalhos do GT, e já vislumbrando o funcionamento do ofício eletrô-nico em caráter nacional, homens apequenados saíram de seus nichos mortuá-rios escavados em catacumbas corporativas, apresentando-se como verdadeiros “guerreiros ninjas”. O ataque foi letal.

4.2 2009 – a segunda conVocação

A Medida Provisória nº 459, de 25 de março de 2009, que instituiu o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, trouxe em seu bojo um capítulo (II) dedicado à implantação do registro eletrônico. Na Exposição de Motivos, foram destacados dois itens sobre o tema, nos seguintes termos:

27. Atualmente, os registros realizados nos cartórios de imóveis não são, em sua grande maioria, eletrônicos, o que além de impor maior custo à guarda de infor-mações, dificulta ou inviabiliza a realização de consultas amplas sobre a situação do imóvel. Com vistas a preencher tal deficiência e obter a segurança mínima ne-cessária para a realização de negócios, os agentes econômicos, em processo de compra e venda de imóveis, solicitam um extenso conjunto de documentos, que, ao final, tornam a transação de compra e venda um evento caro e moroso para as partes, sem que isso lhes dê efetiva segurança quanto à ausência de futu-ros questionamentos judiciais sobre a validade da transação.

28. Neste sentido, o art. 41 define os requisitos mínimos de segurança que devem ser atendidos quando da apresentação, na forma eletrônica, de do-cumentos ao serviço de Registro de Imóveis ou quando da expedição

de tais documentos pelo mesmo serviço. Já o art. 42 regulamenta a inserção de atos registrais ocorridos em data anterior ao da vigência desta medida provisória, enquanto o art. 43 trata da manutenção de cópia digital de segurança dos dados. O art. 44, por sua vez, cria a obrigação de repasse das informações ao Poder Executivo.

23 Disponível em: <http://goo.gl/cojSWa> (link reduzido). Acesso em: 30 jan. 2016.

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Percorrido o processo legislativo, a MP foi convertida na Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, que dispôs em seu art. 39: “Os atos registrais praticados a partir da vigência da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, serão inseri-dos no sistema de registro eletrônico, no prazo de até 5 (cinco) anos a contar da publicação desta Lei”.

Considerando-se que a lei foi publicada no Diário Oficial da União de 08.07.2009, o termo final seria o dia 07.07.2014, para o qual havia legítima expectativa da parte de vários players do mercado imobiliário e também de se-tores do Governo. Lamentavelmente, esse prazo transcorreu in albis, porque se aguardava a edição de regulamento. Perderam os registradores de imóveis uma bela oportunidade de implantarem o registro de imóveis eletrônico, por meio de autorregulação. Aliás, conforme dispõe a lei em seu art. 37, os registradores têm o poder/dever de instituir o registro eletrônico.

4.3 2015 – a terceira conVocação

O Provimento nº 47, de 19 de junho de 2015, representa a terceira con-vocação que a sociedade brasileira fez aos registradores de imóveis, em mais uma tentativa para que seus serviços sejam prestados de forma eletrônica.

A norma administrativa em apreço marcou um novo prazo para esse de-siderato. Dispõe o art. 9º que “os serviços eletrônicos compartilhados passarão a ser prestados dentro do prazo de 360 (trezentos e sessenta) dias”.

Feita a contagem do prazo normativo estabelecido, verifica-se que o ter-mo final para que os serviços passem a ser prestados de forma eletrônica é o dia 15.06.2016, dia de “São Vito”, padroeiro dos epiléticos, bailarinos e autores. Também é invocado contra o perigo das tormentas, contra o excesso de sono, contra as mordidas de serpentes e todo dano que os animais, de qualquer espé-cie, possam causar aos homens.

Estaremos operando o registro eletrônico naquela data? E se não o fizer-mos? Haverá outra oportunidade? Há perigo de tormentas? Mordidas de ser-pentes? O que acontecerá se persistirmos em não operar de forma eletrônica? Quem controla esse prazo? Seria a Corregedoria Nacional de Justiça? Seriam as Corregedorias de Justiça dos Estados? Existe a ameaça de serviços substitutos?

A realidade é que essa contagem está sendo feita dia a dia pelo próprio mercado, que monitora a par e passo cada movimento do registro de imóveis. A economia, impulsionada pela expansão constante do capital, ávido por re-produzir elevadas taxas de crescimento econômico, o mais rápido possível, age como se não existissem fronteiras e que tudo lhe é submetido. Assim, o con-vencionalismo econômico, por entender que a economia se encontra “acima de tudo”, trata com hostilidade qualquer intercorrência que julgue falha – o que

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vale mais aos olhos da economia neoclássica é a força do mercado, fundada na dinâmica produção-consumo-distribuição.

Nada que contrarie essa lógica pode, então, ser aventada, porque as for-ças do mercado assim proíbem e acionam o seu rolo compressor. Para os que tentam se impor contra essa conduta, mesmo que em nome da segurança jurí-dica, os que respondem pelo mercado, imediatamente, lançam a crença de que o progresso tecnológico irá superar quaisquer limites que se contraponham à ideia do crescimento econômico, na forma e na velocidade idealizadas, mes-mo que para isso tenham que deslocar marcos outrora estabelecidos e assumir quaisquer riscos por eventual degradação da segurança.

Outrossim, a existência de serviços de registros similares no mercado, que analisados desempenham funções equivalentes ou parecidas com aquelas a cargo dos registradores de imóveis, é uma mola propulsora para a mudança, caso a prestação destes venham, com o tempo, tornar-se obsoleta ou desconec-tada das novas mudanças/tendências da prestação de serviços. Assim, o trato do registro de imóveis com o mercado pede diálogo, prudência e parceria, a fim de que o papel de cada setor fique bem claro e não haja ruídos internos decorren-tes de falta de comunicação24.

Para acompanhar a fluência do prazo fixado pela Corregedoria Nacional de Justiça para o funcionamento do registro de imóveis eletrônico em todo o País, veja o relógio de contagem regressiva, publicado no site http://www.srei.org.br.

Seria esta a última convocação?

coNSIderAçõeS FINAIS

Este texto é apenas um aceno na direção da construção de um arcabouço corporativo que tenha suporte legal para interligar todas as serventias imobiliá-rias, coordenar e operar o Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico em todo o território nacional.

É necessário que uma norma regulamente de forma inequívoca: [1] os requisitos mínimos que devem ser atendidos pelos softwares de registro de imó-veis eletrônico; [2] a vinculação de todas as serventias com o operador do Sis-tema Nacional de Registro de Imóveis Eletrônico; e [3] a previsão de um ponto único de contato para atendimento eletrônico de serviços, por meio da Internet, para qualquer cartório do Brasil.

24 Os registradores de imóveis brasileiros, por meio de suas entidades representativas, mantêm parcerias bem- -sucedidas com todos os players da cadeia do mercado imobiliário, desde a indústria da construção civil, até o setor financeiro e os reguladores.

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Experiências bem-sucedidas com o Sistema Bacen-Jud25 (penhora on-line), operado pelo Banco Central do Brasil, e o da Central Nacional de Indisponi-bilidade de Bens – CNIB26, operada pela Arisp/IRIB, recomendam fortemente a estruturação de operação única para o Sistema de Registro de Imóveis Eletrô-nico, com abrangência em todo o território nacional. Dentro desse propósito, o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.03.2015) prevê, em seu art. 837, que, “obedecidas as normas de segurança instituídas sob critérios uni-formes pelo Conselho Nacional de Justiça, a penhora de dinheiro e as aver-bações de penhoras de bens imóveis e móveis podem ser realizadas por meio eletrônico”. Aguarda-se, portanto, a edição de ato do CNJ que regulamente a operação eletrônica prevista no CPC, em caráter nacional, integrando registros de imóveis e Tribunais, para o tráfego de informações e certidões imobiliá-rias, bem como dos mandados judiciais e certidões destinados para averbações constritivas de sequestros, arrestos e penhoras.

O operador nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis deverá ter musculatura preparada para enfrentar desafios, tais como: [1] a interligação em rede de todos os cartórios de registro de imóveis do País, que deverão dis-ponibilizar serviços eletrônicos na Web, sob critérios uniformes; [2] a inclusão digital das serventias de pequeno porte, com ações que envolvam aplicativos, ambientes de backups, dispositivos para conexão, acesso à rede e o domínio dessas ferramentas; [3] a complementação de renda às serventias deficitárias; [4] a criação e manutenção de um polo tecnológico para pesquisa e desenvol-vimento de novas tecnologias aplicadas ao registro de imóveis; [5] a criação, a manutenção e o controle da plataforma dos serviços prestados eletronicamente; [6] a capacitação, o treinamento e o aprimoramento dos oficiais e seus prepos-tos no uso das novas tecnologias, mediante ensino a distância (EAD); e [7] a manutenção de uma plataforma de referência de comunicações e notícias.

O registro de imóveis brasileiro é uma instituição ágil e moderna, que sempre esteve na vanguarda da tecnologia. Verifica-se, todavia, assimetrias en-tre as várias unidades do sistema, em decorrência dos diferentes níveis de ca-pacidade de investimento financeiro nas serventias, que devem ser corrigidas, com vistas a suprir fragilidades e oferecer os mesmos serviços eletrônicos em todas as serventias do País.

25 O Sistema Bacen-Jud é um instrumento de comunicação eletrônica entre o Poder Judiciário e instituições financeiras participantes, com intermediação, gestão técnica e serviço de suporte a cargo do Banco Central. Por meio dele, os magistrados protocolizam ordens judiciais de requisição de informações, bloqueio, desbloqueio e transferência de valores bloqueados, que serão transmitidas aos bancos participantes para cumprimento e resposta.

26 A Central Nacional de Indisponibilidade de Bens – CNIB foi criada e regulamentada pelo Provimento nº 39/2014 da Corregedoria Nacional de Justiça e se destina a integrar as indisponibilidades de bens decretadas por magistrados e por autoridades administrativas, divulgando-as, em tempo real, para os tabeliães e registradores de todo o território nacional. Além de evitar a dilapidação do patrimônio do atingido pela indisponibilidade, a CNIB é uma importante ferramenta no combate ao crime organizado e na recuperação de ativos de origem ilícita.

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Por meio de suas entidades representativas, os registradores brasileiros já desenvolveram os insumos suficientes para substituir o suporte em papel por processos digitais em todas as unidades de serviço do território nacional, bem como dispõem de infraestrutura e comprovada aptidão técnica para interligá--las em rede compartilhada de atendimento (hardware, software e know-how).

Esses avanços deram aos registradores o domínio de todo o ciclo de vida do documento eletrônico e envolveram a constituição da Autoridade Certifica-dora Brasileira de Registro (AC-BR), o credenciamento de várias Autoridades de Registro (ARs) e as Instalações Técnicas (ITs) para emissão de certificados digitais ICP-Brasil, além da constituição da Autoridade de Carimbo do Tempo Registradores (ACT-R), da Entidade Emissora de Atributos Registradores (EEA-R), da Central Nacional do Documento Eletrônico (CNDE) e do desenvolvimento de várias ferramentas de suporte, tais como Assinador Digital Registral de Do-cumentos Eletrônicos, SDK (assinatura digital, carimbo do tempo e certificado de atributo – Cades e Pades), Certidão Express e Digitação Retroativa – RI, entre outros.

Todavia, pela falta de uma cultura de autorregulação, induzida por sua origem, quando era um serviço auxiliar do Judiciário, a incorporação massiva das novas tecnologias, que aplicadas responderão pelo registro de imóveis ele-trônico, ainda está na dependência da edição de ato normativo, que abranja a comunidade de registradores do País.

A introdução das tecnologias na área do registro de imóveis não é uma intervenção, de todo, pacífica, fácil e que se conclua com um final. É um pro-cesso contínuo, constante e ao qual, portanto, temos que nos adaptar.

Ainda assim, registra-se, com agrado, os esforços, o comprometimento e a persistência de um grande número de registradores de imóveis brasileiros, para que sejam removidas as barreiras de acesso à modernização da atividade27.

dedIcAtÓrIA

Dedico estas linhas a Manuel Mattos, que me ensinou, em 2005, que: “Desconhecer o que é a ‘economia digital’ e seus efeitos na continuidade dos negócios de qualquer segmento não deve ser motivo de vergonha para nin-

27 Exemplo do esforço da comunidade registral: no período de 16 a 30 de março de 2012, um grupo de registradores de imóveis e escreventes voluntários oriundos de vários Estados visitaram 22 cartórios do Estado do Pará, com o objetivo de compartilhar conhecimento com os profissionais do setor e traçar um diagnóstico da estrutura das serventias. O projeto foi de iniciativa do Comitê Executivo Nacional do Fórum de Assuntos Fundiários do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para melhorar os serviços e a segurança dos registros de imóveis urbanos e rurais no Estado, e contou com o apoio da Universidade Corporativa do Registro – UniRegistral. Na oportunidade, o juiz auxiliar da Presidência do CNJ Antônio Carlos Alves Braga Júnior registrou: “A disposição e a quantidade de profissionais aposentados e na ativa que se ofereceram para trabalhar como voluntários nos surpreendeu. É impressionante a vontade deles em contribuir para aperfeiçoar os serviços cartoriais no País” (Disponível em: <http://goo.gl/lCBVLg> (link reduzido). Acesso em: 30 jan. 2016).

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guém, pois se trata de um conceito verdadeiramente revolucionário, que exige olhar para as coisas por um novo ângulo. Insistir em desconsiderá-la, no entan-to, pode ser um erro estratégico crucial”.

[...]

Dedico, também, aos jovens registradores do Brasil, que vão reinventar o registro de imóveis deste País, valendo-se dessa maravilhosa invenção: a in-formática28.

Acredito que essa juventude digital mudará o modo como fazemos o registro acontecer29. Gostaria de saber aonde essa mudança nos levará, apesar de futura est proprium Dei. De qualquer forma, estou feliz por estar aqui neste exato momento e ser testemunha do nascimento desse novo ser: o registro de imóveis eletrônico.

pedIdo de deScuLpAS

Peço desculpas pela audácia de adentrar em temas próprios de novas gerações. E, como não raro é acontecer nesta nostálgica quadra da vida, minha memória retrocedeu ao início de minha carreira, na década de 1960, quan-do tínhamos a máquina de escrever manual, com cópias a carbono, a caneta tinteiro Parker 21, a proibição do uso de esferográfica, e eu, ajudando o meu tabelião a “conferir e consertar” as públicas-formas30 passadas por seus colegas. Como pensar, então, em registros sem papel, contidos apenas nas memórias de computadores?

reFLeXão FINAL

Computadores e softwares não fazem funcionar ou fracassar o registro de imóveis. O elemento-chave é o resultado da equação “pessoas + princípios jurídicos”.

28 Informática é um termo usado para descrever o conjunto das ciências relacionadas ao armazenamento, à transmissão e ao processamento de informações em meios digitais, estando incluídas nesse grupo: a ciência da computação, a teoria da informação, o processo de cálculo, a análise numérica e os métodos teóricos da representação dos conhecimentos e da modelagem dos problemas. A informática pode ser, também, entendida como ciência que estuda o conjunto de informações e conhecimentos por meios digitais.

29 O futuro do registro de imóveis é fascinante e cheio de novas verdades. Pensando no perfil das gerações Y e Z, que já ocupam posições de registradores e prepostos, esses nativos digitais e loucos por tecnologia vão adaptar tudo isso com uma facilidade enorme, em curto espaço de tempo.

30 Pública-forma é a transcrição por tabelião de notas, palavra por palavra, de documento original danificado “legível” para que este tenha valor de original e antecede a tecnologia da cópia reprográfica. É a cópia literal do documento. A pública-forma ocorria quando existia a dificuldade ou demora na extração de segunda via no órgão originário que lavrou o ato ou a necessidade de apresentação de cópia do documento com valor probante.

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Assunto Especial – Doutrina

Registro Eletrônico de Imóveis

Registro Eletrônico de Imóveis: um Avanço Necessário

MAuRíCIO VEDOVATOGraduação em Direito pela Universidade de São Paulo (1998), Mestrado em Ciências das Comunicações pela Universidade de São Paulo (2003), Mestrado em Direito e Política do Entretenimento e da Mídia pela University of California, Los Angeles (UCLA, 2011), Membro da Ordem dos Advogados do Brasil desde 1999, Embaixador no Brasil do Programa de Mes-trado da Faculdade de Direito da University of California, Los Angeles (UCLA LL.M. Program Ambassador).

ThALITA DuARTE hEnRIquES PInTOGraduação em Direito pela Universidade de São Paulo (2003), Membro da Ordem dos Ad-vogados do Brasil desde 2004, Membro da Mesa de Debates de Direito Imobiliário – MDDI, Professora nos Cursos de Especialização em Direito Imobiliário da GVLaw, da Fundação Getulio Vargas e da Escola Superior da Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil.

AMAnDA SALIS GuAzzELLIGraduação em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2009), Curso Técnico em Contabilidade pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2006), Mestrado em Di-reito Econômico e Financeiro pela Universidade de São Paulo (2013), Membro da Ordem dos Advogados do Brasil desde 2010.

SUMÁRIO: Introdução; I – Atual trâmite; II – Registro eletrônico de imóveis: caminho para aceleração da conclusão de operações imobiliárias; III – Importância da padronização dos sistemas de registro eletrônico de imóveis em nível nacional e da adoção de plataforma central única; IV – Relevância da atuação do CNJ na padronização dos procedimentos judiciais e extrajudiciais; V – Experiências no direito comparado: processos de informatização e padronização dos registros de imóveis em diversos países; VI – Experiência pátria: o processo judicial eletrônico; VII – Manutenção da autonomia das Corregedorias Estaduais; Conclusão; Anexo – Quadro Resumo.

INtrodução

A despeito de crises, internacionais e nacionais, o mercado imobiliário brasileiro teve significativo desenvolvimento nos últimos 10 anos. De fato, em razão de diversos fatores, houve uma expressiva dinamização das operações imobiliárias e seu acesso a cada vez mais pessoas nos últimos anos.

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Com o intuito de acompanhar os avanços sociais, importantes marcos legislativos têm sido introduzidos em nosso ordenamento em matérias relacio-nadas a esse mercado, entre os quais destacamos a previsão de implantação de registro eletrônico, trazida pela Lei Federal nº 11.977/2009.

A fim de acelerar o processo de informatização dos registros imobiliários, em 19 de junho de 2015 o Conselho Nacional de Justiça (“CNJ”) estabeleceu, por meio do Provimento nº 47, diretrizes gerais para implantação e integração do registro eletrônico de imóveis em todos os Estados e o Distrito Federal, com o intuito de viabilizar, no prazo de um ano, (i) o intercâmbio de informações e documentos entre os registros de imóveis, o Poder Judiciário, a Administração Pública e o público em geral; (ii) a recepção e envio de títulos em formato ele-trônico; (iii) a expedição de certidões em formato eletrônico; e (iv) a formação de repositórios registrais eletrônicos nos cartórios para armazenamento de do-cumentos eletrônicos.

O Provimento CNJ nº 47/2015, sem dúvida, é um grande avanço legisla-tivo nessa seara. Porém, para que os objetivos traçados pelo CNJ sejam, de fato, atingidos, entendemos ser necessária uma regulamentação que traga padroni-zação aos sistemas, bem como aos documentos eletrônicos, em nível nacional, com a definição de normas e padrões comuns, não apenas quanto a questões de segurança de tecnologia, como já tratado no referido provimento, como tam-bém quanto ao procedimento prático-jurídico do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (“SREI”).

Conforme abordado ao longo deste artigo, a adoção, em âmbito nacio-nal, de sistemas e documentos padronizados de registro eletrônico de imóveis, bem como de plataforma central única para integração de cartórios, pode ser um caminho efetivo para acelerar o registro de operações imobiliárias, reduzin-do o prazo médio desse procedimento de 30 para 5 dias.

Neste contexto e a partir da regulamentação prático-jurídica do SREI já feita pela Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo (“CGJ/SP”), e por experiências pátrias e estrangeiras quanto a processos de informatização, o presente artigo tem por objetivo trazer considerações e instigar reflexões quanto a possíveis medidas para conferir maior celeridade e menor onerosidade aos procedimentos de registro de operações imobiliárias, inclusive, mas não exclu-sivamente, dos instrumentos particulares de financiamento imobiliário, estimu-lando e facilitando a aquisição da casa própria.

I – AtuAL trÂmIte

Atualmente, o oficial de registro de imóveis (“registrador”) da circunscri-ção em que se situa o imóvel objeto da operação é o competente para a prática dos atos de registro, cabendo-lhe a análise dos títulos imobiliários e, ao final, por seu registro. Entre os títulos mais comuns, destacam-se aqueles que envol-

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vem diretamente a transferência ou oneração de bens imóveis, os quais podem, em sua maioria, ser formalizados: (i) mediante escritura pública, por meio de um Tabelionato de Notas (“Notário”) da escolha das partes, ou (ii) mediante instrumento particular, com força de escritura pública, a ser formalizado junto à instituição financeira da escolha do pretendente ao financiamento imobiliário.

Aliás, note-se que a previsão, com a publicação da Lei Federal nº 4.380/1964, de formalização de determinadas operações imobiliárias por instrumento particular de financiamento assinado juntamente à instituição fi-nanciadora, atribuindo-se a eles força de escritura pública para todos os fins de direito, já foi uma importante medida para desburocratizar, desonerar e, com isso, estimular o financiamento da aquisição da casa própria. Objetivo esse que tem sido alcançado na prática.

Consoante disposto no art. 188 da Lei Federal nº 6.015/1973, é de 30 dias o prazo para que o registrador conclua o registro de títulos em geral que tenham sido prenotados, sendo certo que as Leis Federais nºs 4.380/1967 e 10.931/1994, em seus arts. 61, § 7º, e 52, respectivamente, estipulam o prazo de 15 dias para registro quando se tratar de contratos de financiamento ban-cário.

Todavia, na prática, a realidade é outra. Segundo estudo da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (“Abecip”), o tempo médio para liberação do financiamento nos bancos é de 40 dias, dos quais 30 dias são atribuídos ao prazo para registro do título no CRI1. Vale acrescentar que esse prazo, em alguns casos, pode atingir até 90 dias, contrariando, direta ou indiretamente, a própria lei vigente.

A morosidade no registro dos títulos imobiliários, além de gerar insegu-rança social, implica, ainda, quando envolve operações de financiamento, uma série de custos adicionais na operação de alienação do imóvel, tanto para o comprador quanto para o vendedor, uma vez que a liberação dos recursos fi-nanciados ao vendedor só é realizada após o efetivo registro do correspondente título.

Nesse cenário, o comprador, por exemplo, se estiver morando em um imóvel locado, precisará arcar com o aluguel durante todo o prazo para libera-ção do financiamento, uma vez que, em regra, o vendedor somente transfere a posse direta do imóvel após o recebimento do preço do imóvel, o que, como dito, só ocorre após a conclusão do registro do respectivo contrato.

O vendedor, a seu turno, pode amargar um perda real no valor recebi-do pela venda do imóvel, já que, no período compreendido entre a assinatura do contrato de financiamento e a liberação do recurso, o preço do imóvel é

1 Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/arquivos/dwnl_1424698301.pdf>.

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corrigido monetariamente pelas regras da caderneta de poupança, ou seja, só se incorpora a correção ao valor devido a cada período completo de 30 dias, desprezando-se a correção parcial caso não seja completado cada período de 30 dias. Em tempos de alta inflação, em que a rentabilidade da poupança fica abaixo desta, a perda pelo uso desse critério de correção é ainda mais sensível.

Mais ainda, muitos são os casos em que o vendedor vende determinado bem para comprar outro e, nesse caso, o atraso no recebimento dos recursos não gera apenas uma perda real no valor recebido, mas acarreta também o des-cumprimento das obrigações assumidas pelo vendedor, sujeitando-o a encargos moratórios.

Assim, em uma venda e compra com financiamento bancário, quanto an-tes o registro for realizado, antes o vendedor irá receber o preço e quanto mais ágil esse procedimento for, mais ao alcance de todos estará o crédito imobiliário e a possibilidade de concretização do tão almejado sonho da casa própria.

De fato, em razão de demora desse trâmite, nem todos os vendedores aceitam vender seus bens quando a operação envolve financiamento imobiliá-rio, sabedores da demora que enfrentarão para receberem, ao final, o saldo do preço.

Vale ressaltar, ainda, que a morosidade na liberação dos recursos de fi-nanciamento imobiliário também prejudica sobremaneira o fluxo de caixa das incorporadoras. Grande parte das operações de comercialização de unidades habitacionais efetuada pelas incorporadoras envolve financiamento bancário, de modo que o atraso no recebimento desses recursos pode gerar uma série de consequências em cadeia, como inadimplência frente a seus credores ou maior endividamento por parte das incorporadoras, afetando, ainda mais, a economia em geral.

II – regIStro eLetrôNIco de ImÓVeIS: cAmINho pArA AceLerAção dA coNcLuSão de operAçõeS ImobILIárIAS

O processo de informatização dos registros imobiliários é medida fun-damental para o desenvolvimento e a maior eficiência do mercado imobiliá-rio, sendo benéfico tanto aos players desse mercado quanto à população em geral, uma vez que traz melhorias aos processos de gestão, segurança e guarda de dados, bem como na celeridade dos processos de transmissão e registro de informações relacionadas. O SREI é capaz de agilizar consideravelmente o procedimento de registro, tornando imediatas algumas etapas do processo e dis-pensando diligências físicas e a presença dos interessados no estabelecimento do cartório.

O aprimoramento das tecnologias utilizadas nos registros públicos forne-ce novas ferramentas para melhor alcançar os princípios e fins instituídos em

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lei, sem alterar a substância destes. Cumpre destacar que, de modo algum, pre-tende-se que a tecnologia substitua o papel do registrador. O registrador con-tinua sendo elemento-chave, dotado de fé pública, para verificar e certificar a conformidade legal dos documentos registráveis, sendo eles eletrônicos ou não.

Passados mais de cinco anos da publicação da Lei Federal nº 11.977/2009, diante da dificuldade de implantação do SREI, o CNJ expediu o Provimento nº 47/2015, a fim de estabelecer as diretrizes gerais para implantação do SREI nos Estados, tendo previsto alguns critérios de segurança da informação e a cria-ção de centrais únicas para cada Estado e o Distrito Federal, permitindo, com isso, o desenvolvimento de plataformas diferentes.

Paralelamente ao trabalho do CNJ, algumas Corregedorias-Gerais de Jus-tiça dos Estados (“CGJs”) têm se mobilizado para regulamentar e efetivamente promover o funcionamento do SREI. A CGJ/SP tem sido precursora no Brasil no que tange à implantação do SREI. Por meio dos Provimentos nºs 42/2012 e 11/2013, a CGJ/SP estabeleceu não só regras para padronização dos procedi-mentos eletrônicos a serem observados pelos CRIs, como também determinou a utilização de uma plataforma central única, a Central Registradores de Imóveis, gerida pela Associação de Registradores Imobiliários de São Paulo (“Arisp”), com a cooperação do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (“IRIB”).

Em relação aos demais Estados, a regulamentação do SREI ainda é inci-piente na maior parte deles. Cumpre mencionar que 8 Estados (Acre, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Sul, Rondônia e Santa Catarina) possuem regulamentação prevendo o desenvolvimento do SREI pela Central de Registradores de Imóveis.

Todos os CRIs do Estado de São Paulo estão interligados por meio do Por-tal Registradores de Imóveis (www.registradores.org.br). Diversos serviços são prestados, de forma eletrônica, para o público em geral, tais quais pedidos de certidões digitais de matrículas e de registros de pactos antenupciais, visualiza-ção on-line de matrículas, pesquisa eletrônica para localização de titularidade de imóveis, acompanhamento registral on-line e protocolo eletrônico de escri-turas públicas e de instrumentos particulares (e-Protocolo).

As certidões digitais solicitadas no portal são, via de regra, expedidas em, no máximo, duas horas consoante disposto no art. 7º do Provimento nº 11/2013. Contudo, a maioria dos cartórios atende aos pedidos de certidão em menor prazo, normalmente 15 minutos, a partir do recebimento da solicitação, de acordo com informação disponibilizada no Portal Registradores de Imóveis.

Os extratos das escrituras e dos contratos enviados pelo portal, em for-mato XML (eXtensible Markup Language), conforme definido a seguir, são re-gistrados no prazo máximo de 5 dias úteis; já as escrituras e os contratos envia-dos, em formato PDF/A, são registrado em 10 dias úteis, conforme informação

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veiculada no Portal Registradores de Imóveis, atendendo, assim, ao disposto no art. 5º do Provimento nº 11/2013.

Os méritos dos provimentos publicados pela CGJ/SP vão além de infor-matizar o registro de imóveis. Alguns procedimentos registrais foram regula-mentados de forma a simplificar e agilizar o processo como um todo. Assim, o procedimento eletrônico, além de eliminar o tempo e os recursos antes tomados com providências que demandavam diligências pessoais, também pode otimi-zar a análise da qualificação registral feita pelos CRIs, mediante o estabeleci-mento de sistemas padronizados.

No caso do financiamento bancário, passou a ser possível a apresenta-ção, para registro da transferência do imóvel e da garantia, de extrato de ins-trumento particular com efeitos de escritura pública (“extrato”) pelos agentes fi-nanceiros integrantes do Sistema Financeiro de Habitação (“SFH”) e do Sistema Financeiro Imobiliário (“SFI”), em substituição ao contrato.

Para tanto, a instituição financeira deve preencher um documento eletrô-nico, estruturado em XML, com o resumo das principais informações contidas no instrumento particular de financiamento, podendo anexar a ele o contrato digitalizado e os demais documentos relevantes, como o comprovante de reco-lhimento do imposto de transmissão imobiliária. O extrato deve ser assinado di-gitalmente pela instituição financeira, que se responsabiliza por todos os dados e declarações contidas no Extrato, tal como já se responsabiliza, atualmente, pelas informações do contrato em si.

O registrador, por sua vez, ao receber o extrato, otimiza o seu tempo, na medida em que não precisa analisar o contrato inteiro para buscar as informa-ções que são relevantes para o registro2.

Nesse sentido, inclusive, entendemos que as disposições referentes ao extrato deveriam ser aprimoradas para tornar obrigatória a anexação ao extrato de cópia digitalizada do contrato/escritura integral. Desse modo, assegurar-se--ia o arquivamento do documento no repositório confiável de documentos ele-trônicos – criado pela CGJ/SP por meio do Provimento nº 42/2012 –, tal qual ocorre atualmente com os documentos físicos, conferindo maior segurança aos trâmites registrários e permitindo a terceiros que detenham algum interesse ju-rídico vinculado a um imóvel a obtenção de certidões e cópias, dotadas de fé pública, do documento arquivado no repositório.

2 Em uma segunda etapa do processo de informatização do registro eletrônico, é possível até mesmo que se desenvolvam sistemas em que, mediante a prévia análise e autorização do registrador responsável, o extrato possa ser convertido facilmente em ato de registro. Nesse sentido, o sistema converteria o extrato em assento registral e o incluiria na respectiva matrícula imobiliária, sem que fosse necessário, por exemplo, o registrador digitar os dados do extrato no sistema para sua inclusão na matrícula imobiliária, facilitando ainda mais as atividades dos registradores e, por consequência, tornando esses serviços mais eficientes.

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Aos notários, de igual modo, faculta-se a utilização de XML para estrutu-ração de certidões e traslados digitais, para fins de procedimento registral imo-biliário. Tais documentos eletrônicos deverão conter apenas a assinatura com certificação digital do notário, seu substituto ou preposto autorizado.

O traslado eletrônico de títulos importa em uma maior segurança às ope-rações, visto que o envio é realizado de forma criptografada, com a assinatura eletrônica dos remetentes e respeitando os mais altos padrões de segurança de informação.

Como mencionado antes, o procedimento adotado no Estado de São Paulo centralizou, no notário, ou na instituição financeira, conforme o caso, a responsabilidade pela assinatura digital dos extratos e das certidões, dispensan-do-se, com isso, a necessidade de que todos os envolvidos no negócio precisem ter certificado digital, instrumento que, apesar de muito útil, ainda não está difundido entre a maioria da população e, portanto, poria em risco o amplo funcionamento do sistema3.

Outra iniciativa de regulamentação das normas técnicas aplicáveis aos serviços de registro em meio eletrônico é o Provimento nº 14/2016, publicado pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Alagoas (“CGJ/AL”). Dito pro-vimento, por exemplo, define que o instrumento particular prenotado de forma eletrônica deve ser necessariamente nato digital e conter as assinaturas digitais de todos os contratantes e testemunhas, bem como deve ser instruído com os documentos obrigatórios, os quais também devem ser natos digitais e assinados digitalmente pelos emissores. Como descrito anteriormente, a CGJ/SP também regulamentou os requisitos desse tipo de documento. E já é possível perceber distintos padrões técnicos entre ambas as regulamentações.

Por oportuno, ressalta-se que os requisitos estabelecidos pela CGJ/AL podem constituir um óbice à imediata realização de protocolo eletrônico. A exigência da assinatura digital de todos envolvidos no instrumento particular aumentará os custos de transferência dos imóveis, já que, atualmente, apenas pequena parcela da população brasileira possui certificado digital. Ademais, há que se considerar que nem todos os órgão emissores de certidões já o fazem de forma digital, o que acabaria por impedir o protocolo de forma eletrônica.

Portanto, deixar a definição completa dos sistemas ao critério exclusivo de cada um dos 27 Estados e o Distrito Federal, pode resultar em sérios entraves futuros, inclusive quanto ao eficiente e amplo acesso desse sistema à sociedade em geral, como se verá mais detalhadamente adiante.

3 Esse, aliás, é um dos pontos que, ao nosso ver e data vênia, merecem ser objeto de padronização em âmbito nacional, de forma a garantir a uniformidade e segurança do procedimento, sem, contudo, inviabilizar o seu largo uso.

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III – ImportÂNcIA dA pAdroNIZAção doS SIStemAS de regIStro eLetrôNIco de ImÓVeIS em NÍVeL NAcIoNAL e dA Adoção de pLAtAFormA ceNtrAL ÚNIcA

No Provimento CNJ nº 47/2015, o CNJ determinou que o SREI deverá ser implantado e integrado por todos os CRIs de cada Estado e do Distrito Federal. Foi estabelecido que as centrais de serviços eletrônicos coordenar-se-ão entre si para que se universalize o acesso ao tráfego eletrônico e sejam prestados os mesmos serviços em todo País.

Não obstante os avanços legislativos já obtidos quanto ao SREI, para que os objetivos traçados pelo CNJ sejam atingidos, faz-se mister destacar a impor-tância de uma regulamentação que traga padronização aos sistemas, bem como aos documentos eletrônicos, em nível nacional, com a definição de normas e padrões comuns, não apenas quanto a questões de segurança de tecnologia, como já tratado no mencionado provimento, como também quanto ao proce-dimento prático-jurídico do SREI, tal qual a CGJ/SP já fez, mas apenas quanto a esse Estado.

Ainda que sejam desenvolvidos e implantados sistemas autônomos em cada Estado, a uniformização é imprescindível para se garantir a segurança, efi-ciência, compatibilização e interoperabilidade de todos os sistemas, propician-do a troca de informações e documentos entre os CRIs e os demais interessados, sejam eles integrantes da Administração Pública, do Judiciário, das instituições privadas ou do público em geral. Confere-se, assim, maior racionalidade, eco-nomia e desburocratização no acesso aos serviços de registro público.

Sem isso, há possibilidade de adoção de padrões diversos em relação a inúmeros elementos eletrônicos, tais quais formato da estrutura dos dados, pa-drão de comunicação de dados, indexação de documentos, formato de buscas, entre outros. E, ainda, dentro de um mesmo padrão pode haver formas diversas de organizar os códigos.

A implementação, no limite, de 27 diferentes sistemas no País, com pa-drões diversos de sistemas e documentos eletrônicos, cria uma série de dificul-dades – e insegurança jurídica – não só aos operadores diretos do sistema, mas também a toda a sociedade.

Nesse ponto, a situação dos notários e das instituições financeiras é bas-tante elucidativa. Tanto os notários quanto os bancos que realizam a maior par-te das operações de financiamento imobiliário atuam em nível nacional. Sendo assim, no caso de múltiplos sistemas, os notários e os bancos precisariam de-senvolver tantas interfaces quantos fossem os diferentes sistemas existentes no País, a fim de comunicar e transmitir documentos eletrônicos ou digitalizados para os CRIs competentes, o que geraria custo excessivamente elevado, capaz de colocar em risco a efetiva utilização, na prática, do SREI.

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Ainda com relação ao intercâmbio de informações, destaca-se a poten-cial implantação do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais – Sinter. Instituído pelo Decreto nº 8.764/2016, trata-se de uma base de dados dinâmica que integrará dados fiscais, cadastrais e geoespaciais de imóveis urba-nos e rurais, para utilização dos órgãos públicos. O mencionado decreto prevê a interação entre os CRIs e as entidades da Administração Pública federal, por meio da disponibilização de documentos e prestação de informações. O desen-volvimento do Sinter ainda está em fase inicial. Os próximos passos envolverão a regulamentação técnica da base de dados a ser constituída. Esse assunto evi-dencia a importância do alinhamento entre os CRIs e especial atenção para que regulamentações de sistemas externos não interfiram no SREI.

Ademais, a falta de adequada padronização, em qualquer nível, possivel-mente irá acarretar sucessivas alterações nos softwares e sistemas envolvidos, tal qual já apurado pelo Tribunal de Contas da União (“TCU”) em caso relativo ao processo judicial eletrônico, como se verá mais detalhadamente no Capítulo VI, a seguir, gerando elevados custos. Mais do que isso, a falta dessa padroniza-ção em nível nacional fará com que essa ineficiência operacional e financeira ocorra de forma aleatória e diferente em cada um dos 27 entes federativos, multiplicando-se, de forma exponencial, os custos da falta de adequado plane-jamento e normatização dos sistemas.

De outro lado, a padronização dos sistemas e documentos eletrônicos acelera ainda mais o processo de registro, uma vez que facilita o procedimento de análise e qualificação registrária dos documentos pelo escrevente compe-tente. Exemplo disso é o extrato instituído pela CGJ/SP, conforme explicitado a seguir.

Entre as questões que, data vênia, parecem-nos merecer uma padroniza-ção em âmbito nacional, destacamos: (i) o padrão do extrato, com a indicação de quais campos e informações mínimos ele deve conter; (ii) a necessidade de certificado digital apenas para assinatura dos extratos e documentos pelas insti-tuições financeiras e notários, não obrigando, com isso, a assinatura digital dos contratos e das escrituras por todos os envolvidos; (iii) o formato da estrutura dos dados que, no Estado de São Paulo, por exemplo, é o padrão XML; (iv) o padrão de comunicação (como, por exemplo, Web Service), com suas especifi-cidades; e (v) o procedimento para pagamento de emolumentos.

Outro elemento de suma importância para permitir que o SREI possa alcançar os potenciais benefícios à sociedade, em especial o de permitir o fácil acesso e intercâmbio de informações e o de desburocratizar e agilizar os proce-dimentos de registro, é a implantação de uma plataforma central única, a fim de integrar eletronicamente os CRIs de todos os Estados, bem como disponibilizar serviços on-line para instituições públicas ou privadas e para os cidadãos, por meio de um portal único.

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Enfatiza-se que a plataforma central única não tem como objetivo a trans-ferência dos bancos de dados dos CRIs, mas sim a integração de hardwares e softwares, sincronizando-se com as diversas bases de dados dos CRIs. Assim, há troca de informações e atualização de dados, em tempo real, entre os CRIs e a plataforma. É dessa maneira, por exemplo, que opera a Central Registradores de Imóveis.

A concentração dos serviços em uma única plataforma estimula a pu-blicidade dos atos registrais, já que facilita o acesso ao CRI. Na Espanha, por exemplo, houve um aumento de cerca de 40% dos pedidos de certidões de imóveis nos anos seguintes à adoção de uma plataforma central única de regis-tro eletrônico de imóveis.

Ainda, por meio de uma plataforma única, é possível a extração e o acompanhamento de dados estatísticos sobre os serviços registrais em âmbito nacional. O estudo desses dados pode permitir a adoção de estratégias para melhor desenvolver e aprimorar nosso sistema de registros públicos.

A falta de definição de padrões, em nível nacional, e da adoção de plata-forma central única já na fase inicial de implantação dos sistemas irá acarretar, além dos problemas e das dificuldades supramencionados, uma enorme inefi-ciência operacional. De fato, a realidade observada em outros países quanto a esse tema e até mesmo no próprio Brasil, quanto a temas correlatos, como se verá adiante, mostram que, invariavelmente, tais medidas tornam-se neces-sárias e que a posterior adequação dos sistemas já operantes para atender à padronização e à adoção de plataforma central única geram gastos e atrasos excessivos, posto que demandam alterações substanciais nos softwares e siste-mas utili zados.

A falta de regulamentação, até o presente momento, já levou à tomada de iniciativas individualizadas de Estados, a fim de cumprir o disposto no Pro-vimento CNJ nº 47/2015. Cumpre destacar que, além do Estado de São Paulo, em outras 4 unidades da Federação já estão em funcionamento, parcial ou inte-gral, plataformas próprias para prestação de serviços eletrônicos de registro de imóveis, quais sejam, Distrito Federal (http://www.registrodeimoveisdf.com.br), Minas Gerais (https://www.crimg.com.br), Paraná (http://e-matricula.cri.org.br/index.php) e Tocantins (https://cartoriostocantins.com/).

Objetivando atenuar as consequências do desenvolvimento descentra-lizado do SREI, em 6 de abril de 2016 foi firmado Termo de Compromisso en-tre as organizações pioneiras4 na instituição de centrais de serviços eletrônico, para criação da Coordenação Nacional das Centrais de Serviços Eletrônicos Compartilhados. Trata-se de uma organização de natureza técnica, destinada

4 IRIB, Arisp, Anoreg/BR, Anoreg/DF, Anoreg/TO, Anoreg/AM, Anoreg/SE, Anoreg/MT, Cori/MG, CRI/PR, CRI/GO, Colégio Registral RS, Colégio Registral MS e Anoreg/PA.

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a coordenar todas as centrais de serviços eletrônicos, a fim de universalizar o acesso ao tráfego eletrônico de dados e títulos, bem como criar padrões de in-teroperabilidade para integração do SREI em nível nacional.

Ainda que tal iniciativa seja notável, vale mencionar que a ampla apli-cação das diretrizes e instruções que venham a ser futuramente definidas pela Coordenação Nacional das Centrais de Serviços Eletrônicos Compartilhados de-penderá da adesão voluntária de cada uma das entidades em âmbito estadual. A regulamentação dessas questões pelo CNJ superaria tal entrave.

IV – reLeVÂNcIA dA AtuAção do cNJ NA pAdroNIZAção doS procedImeNtoS JudIcIAIS e eXtrAJudIcIAIS

Desde o início de sua atuação, o CNJ vem desempenhando importante papel na orientação, coordenação, uniformização e harmonização dos servi-ços judiciais e extrajudiciais em geral, competência que lhe foi atribuída por força dos arts. 103-B, § 4º, e 236, § 1º, da Constituição Federal e do art. 38 da Lei Federal nº 8.935/1994. Neste contexto, diversos procedimentos têm sido padronizados, como o Cadastro Nacional de Adoção (Resolução nº 54/2008), o plantão judiciário em primeira e segunda instâncias de jurisdição (Resolução nº 71/2009), os cadastros nacionais de informações de ações coletivas, inquéri-tos e termos de ajustamentos de conduta (Resolução nº 2/2011), o Sistema Pro-cesso Judicial Eletrônico (“PJe”) (Resolução nº 185/2013) e a Central de Infor-mações de Registro Civil das Pessoas Naturais (“CRC”) (Resolução nº 38/2014).

Como se vê, a regulamentação pelo CNJ, em nível nacional, da padroni-zação do SREI e dos correlatos documentos eletrônicos, assim como da implan-tação de uma plataforma única para interligação dos CRIs, coaduna-se com a missão e os valores do CNJ, atribuindo aos procedimentos de registro de imó-veis maior credibilidade, celeridade, acessibilidade e modernidade.

iV.1 correição on-line

Outro aspecto importante da atuação do CNJ no desenvolvimento do SREI é a possibilidade de acompanhar e fiscalizar, de forma mais contínua, efetiva e eficiente, a atuação dos CRIs. A exemplo das normas que regulam o sistema da CRC, o CNJ pode estabelecer que o SREI possua um módulo de geração de relatório das atividades, viabilizando a correição on-line pelas CGJs e pelo CNJ.

A CGJ/SP, no Provimento nº 42/2012, instituiu, também, o sistema de correição on-line para o Estado de São Paulo. A Central de Registradores de Imóveis contém um módulo para acompanhamento contínuo, controle e fisca-lização pela CGJ/SP e Juízes Corregedores Permanentes dos CRIs. Os relatórios destinados à correição on-line devem ficar disponíveis no site do Ofício Eletrô-

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nico (www.oficioeletronico.com.br), o qual possui acesso restrito, e conter os principais dados dos protocolos realizados eletronicamente.

Com isso, serão detectáveis eventuais deficiências dos CRIs que não pres-tem serviço adequado e conforme à lei, em especial quanto aos prazos, e, por consequência, além de facilitar e otimizar as correições, provavelmente fará com que muitos CRIs corrijam, de imediato, suas deficiências.

V – eXperIÊNcIAS No dIreIto compArAdo: proceSSoS de INFormAtIZAção e pAdroNIZAção doS regIStroS de ImÓVeIS em dIVerSoS pAÍSeS

Observando-se as experiências no direito comparado, é possível identi-ficar que os países com maior sucesso na implantação e no funcionamento do sistema eletrônico optaram, desde o princípio, pela padronização e adoção de plataforma central única, como a Espanha e a Nova Zelândia.

Em contrapartida, países que não tiveram essa preocupação ao definir as normas para implantação do registro eletrônico enfrentam os mais variados problemas, afetando não apenas o uso do sistema pela sociedade, como tam-bém a sua utilização para fins de intercâmbio e levantamento de informações. É o caso da Alemanha, que, tendo sido uma das precursoras na informatização dos registros de imóveis, acabou criando um sistema sem ter, na época, outros exemplos a observar e que, com o tempo, precisou de significativos ajustes.

V.1 espanha

O sistema espanhol de registro eletrônico de imóveis está na vanguarda dos sistemas europeus. Em 2005, a Espanha promoveu uma reforma legislativa com intuito de impulsionar a produtividade econômica no país.

Um dos elementos centrais dessa reforma, implementados pela Lei es-panhola nº 24/2005, foi o aprimoramento do funcionamento da Administração Pública, na qual estão incluídos os serviços notariais e registrais, por meio da implementação obrigatória de sistemas eletrônicos para emissão, transmissão, comunicação e recepção de informações. Além disso, a referida lei determinou que todos os registradores estavam obrigados a se integrar à rede privada eletrô-nica, a ser disponibilizada e gerida pelo Colégio de Registradores de Imóveis e de Empresas da Espanha, ao qual atribuiu-se a responsabilidade pela segurança dessa rede de interconexão, bem como e pela definição dos parâmetros de suas características técnicas.

Como se vê, a Espanha adotou uma plataforma central única – que fun-ciona por meio do portal www.registradores.org – para o registro eletrônico de imóveis5, desde o princípio da regulamentação do tema no país. O sistema

5 A plataforma integra, também, o registro de empresas.

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permite que todo o procedimento registral seja realizado em ambiente eletrôni-co, tanto em seus aspectos internos (procedimentos do próprio cartório) quanto em seus aspectos externos (procedimentos relacionados com os usuários dos serviços de registro). Dessa forma, na Espanha é possível, por exemplo, proto-colizar eletronicamente documentos em qualquer cartório de registros de imó-veis, elaborar e assinar eletronicamente assentos registrais, receber notificação eletrônicas emitidas pelos cartórios, solicitar eletronicamente certidões e outros documentos, entre outros.

Nos anos de 2005 e 2006, seguintes à implantação do registro eletrônico de imóveis na Espanha, verificou-se um aumento médio de 40% nas solicita-ções de emissão de certidões de imóveis pelos usuários6.

Ademais, a padronização e centralização do sistema eletrônico espanhol propiciou um processo evolutivo mais eficaz em termos de aperfeiçoamento das ferramentas e da segurança destas e do ambiente eletrônico. Atualmente, os estudos nessa área estão direcionados para integração transfronteiriça dos siste-mas de registro de imóveis. O sistema espanhol já está apto para o intercâmbio de informações e documentos com toda a Europa7.

V.2 noVa Zelândia

O registro eletrônico de imóveis da Nova Zelândia também se destaca mundialmente. Já, em 2007, o Relatório Doing Business in 2007: Como Refor-mar, elaborado pelo Banco Mundial8, citava o modelo neozelandês como um dos mais eficientes do mundo. Isso porque a transferência da propriedade é confirmada em minutos para as partes envolvidas.

O sistema on-line de registro de títulos de propriedade opera na Nova Zelândia desde 2003, por meio de uma plataforma única central, a Land Infor-mation New Zealand, que disponibiliza os serviços eletrônicos no portal http://www.linz.govt.nz/. Esse sistema permite aos usuários realizar, de forma eletrô-nica, o registro da transferência de propriedade, da hipoteca e do seu cancela-mento.

A lei que regula o registro de imóveis na Nova Zelândia (o Land Transfer Act 1952) foi alterada em 2002 para instituir o registro eletrônico no País. Em 2007, o sistema se tornou obrigatório, substituindo de vez o registro no papel. A legislação prevê instrumentos específicos para serem apresentados na forma

6 Disponível em: <http://www.icab.es/archivos/242-57569-DOCUMENTO/Fildirecte209.pdf?download=1>.7 De acordo com a entrevista concedida pelo Diretor de Serviço de Sistemas de Informação do Colégio de

Registradores da Espanha, Sr. Luis Gallego, na Revista Registradores de España, n. 67, jan./mar. 2014. Disponível em: <http://www.registradores.org/wp-content/revista/registradores/67/>.

8 Disponível em: <http://portugues.doingbusiness.org/~/media/GIAWB/Doing%20Business/Documents/Annual- Reports/Foreign/DB07-FullReport-Portuguese.pdf>.

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eletrônica em um ambiente eletrônico. Tanto os documentos cujo registro é permitido quanto os detalhes destes são estabelecidos em regulamentos.

V.3 alemanha

O Código de Registro de Imóveis alemão (“GBO”), desde a sua publica-ção, em maio de 1994, previa a obrigatoriedade de os cartórios de registro de imóveis alemães possuírem um sistema informatizado de registro de imóveis, o qual inicialmente correspondia a um banco de dados dos imóveis e continha as informações relativas à descrição do imóvel e aos seus atuais e anteriores proprietários.

Conquanto coubesse ao governo federal alemão estabelecer as normas legais centrais para a implantação do referido banco de dados, a princípio essas se restringiram às exigências de segurança, não tendo sido estipulado, à época, um padrão para os sistemas de informatização. Coube, assim, a cada um dos 16 Estados alemães a decisão a respeito da implantação do banco de dados, bem como a escolha do sistema a ser utilizado.

Em 2009, foram implementadas alterações no GBO, pela Lei de Registro Eletrônico de Imóveis (“ERVGBG”), para regulamentar a possibilidade de pro-tocolo eletrônico de títulos para registro nas matrículas imobiliárias. Porém, os novos dispositivos não estabeleceram padrões técnicos para os sistemas e/ou para os documentos eletrônicos.

Diante deste contexto legislativo, o desenvolvimento do registro eletrôni-co de imóveis nos Estados alemães não foi uniforme. Ainda que haja um portal central destinado ao registro eletrônico de imóveis (http://www.grundbuch-por-tal.de/), ele não é único. Esse portal apenas direciona o usuário para a platafor-ma on-line mantida por cada Estado. Desse modo, há 16 plataformas de registro eletrônico de imóveis na Alemanha.

A despeito de ter sido facultado a cada Estado adotar o software de arma-zenamento e processamento de dados que melhor lhes conviesse, a maior parte deles (13 dos 16 Estados) optou por utilizar o software SolumSTAR e, posterior-mente, também o mesmo sistema de acesso on-line a serviços, o SolumWEB.

Os outros 3 Estados alemães que não utilizaram o SolumSTAR, por sua vez, adotaram um mesmo programa, o FOLIA/CES, sendo certo que, atualmen-te, apenas 2 deles permanecem utilizando esse software, tendo o outro Estado também aderido ao SolumSTAR.

Dessa forma, ainda que não em decorrência de uma orientação legis-lativa, mas sim por uma escolha própria de cada uma dos Estados alemães, os efeitos negativos da descentralização do sistema alemão acabaram sendo minimizados, já que o acesso a 14 das 16 plataformas pode ser feita por um único cadastro.

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Ademais, não se pode ignorar o fato de que o tipo de armazenamento dos dados em cada sistema é diferente, de forma que não há interoperabilidade entre eles.

Iniciou-se, em 2013, o processo de centralização da plataforma e de pa-dronização dos registros eletrônicos de imóveis na Alemanha, com a publicação da Lei de Introdução ao Banco de Dados de Registro de Imóveis (“DaBaGG”). Tal lei prevê a instituição de um banco de dados de registro de imóveis nacional e uniforme, conforme regulamentação própria do Ministério da Justiça. Além de centralizar as informações sobre os registros de imóveis, a intenção dessa lei é ampliar a base de dados dos imóveis na Alemanha (o registro conterá informa-ções sobre o proprietário do imóvel, os direitos de terceiros sobre o imóvel, os encargos e as restrições sobre o imóvel, entre outros), bem como aprimorar as ferramentas de busca com cruzamentos de dados (será possível, por exemplo, com os dados de uma servidão, buscar os imóveis sobre os quais ela está cons-tituída). O sistema será desenvolvido especialmente para atender os requisitos europeus de transações legais eletrônicas.

A DaBaGG estipula, ainda, a criação de programas de migração de da-dos dos Estados para o banco de dados centralizado. A migração dos dados deve ocorrer com base em acordos próprios a serem realizados com os gover-nos estaduais. Sendo assim, não há previsão para a conclusão dessa migração, a qual, certamente, demandará tempo e muito investimento para compatibilizar os sistemas hoje existentes e implantar a plataforma central. Cumpre mencionar que o sistema ainda não está em funcionamento – sequer parcial –, porém há um site dedicado ao projeto (http://www.grundbuch.eu/).

Como exemplo, pode-se citar o caso do Estado de Baden-Württemberg, que é um dos mais avançados em termos de registro eletrônico de imóveis na Alemanha. Em abril de 2012, iniciou-se uma abrangente reforma do seu banco de dados, objetivando a adaptação do sistema para a realização do protocolo eletrônico e para a futura migração de dados para o banco nacional. A previsão é de que essa reforma seja finalizada apenas em dezembro de 2017, ou seja, mais de 5 anos.

Daí porque se chama tanta atenção para a importância de que, no Brasil, essas medidas sejam tomadas o quanto antes, evitando-se que os Estados e o Distrito Federal implementem os seus sistemas, sem qualquer preocupação com a compatibilização e padronização de informações e procedimentos, em nível nacional.

VI – eXperIÊNcIA pátrIA: o proceSSo JudIcIAL eLetrôNIco

Por oportuno, vale destacar as dificuldades e os prejuízos enfrentados na implantação, no Brasil, do processo judicial eletrônico, inicialmente esta-belecido sem uma definição mais detalhada de parâmetros técnicos para os

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sistemas e/ou para os documentos eletrônicos a serem utilizados nos Estados e no Distrito Federal. A Lei Federal nº 11.419/2006 previu, em seu art. 8º, que os órgãos do Poder Judiciário poderiam desenvolver sistemas eletrônicos próprios.

Como consequência, os Tribunais de Justiça estaduais e a Justiça do Tra-balho desenvolveram sistemas bem diversos entre si e independentes. Atual-mente, existem mais de 40 sistemas de peticionamento eletrônico no País. Con-siderando as experiências dos usuários do processo judicial eletrônico desde a sua implantação, já se pode adiantar os problemas que serão enfrentados pelos usuários do registro eletrônico de imóveis, caso não ocorra, desde logo, a regu-lamentação da padronização.

Em primeiro lugar, esse modelo de informatização obriga os usuários a absorver o conhecimento específico das funcionalidades de cada sistema para utilizá-los, ou seja, a “curva de aprendizado” para utilização do sistema será multiplicada pelo número de sistemas em operação.

Além disso, pode haver dificuldades – ou até mesmo impossibilidade – na troca de informações e documentos entre os órgãos do Poder Judiciário. A própria Lei Federal nº 11.419/2006 já previa esse problema ao dispor, em seu art. 12, § 2º, que, na hipótese de os autos terem que ser remetidos a outro juízo ou instância que não disponham de sistema compatível, deverão ser impressos em papel e autuados como no processo convencional (em papel). Afasta-se, assim, a agilidade do processo eletrônico.

A falta de padronização dos sistemas do processo eletrônico obstaculiza também a obtenção de estatísticas e informações sobre o funcionamento do serviço em caráter nacional.

A falta da regulamentação da padronização na informatização do proces-so judicial resultou, ademais, em gastos desnecessários pelos órgãos judiciários. Consoante apurado pelo TCU, a falha dos gestores na definição do projeto bási-co do sistema de informatização do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região acarretou a majoração excessiva nos valores dos correspondentes contratos de serviços em milhões de reais9.

9 Conforme relatado na decisão do TCU, o projeto básico do sistema de informatização do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (“TRT1”) previa apenas a migração da plataforma antiga, da Unisys, para uma mais moderna, a Oracle. Todavia, foi necessário promover diversas alterações informais no referido projeto, as quais modificaram o seu escopo de forma significativa e acarretaram a completa redefinição da solução que constava no projeto básico.

O TCU analisou sete contratos firmados pelo TRT1 com quatro diferentes empresas. O atraso no desenvolvimento do sistema obrigou o TRT1 a aditar os contratos celebrados, com o intuito de estender os prazos de vigência, bem como realizar novas contratações com as mesmas empresas por inexigibilidade de licitação. A implantação do sistema, prevista para 31 de dezembro de 2005, iniciou-se apenas em 21 de novembro de 2007.

O Relator do processo assim conclui acerca dos fatos: “Logo, posso dizer que, na linha da jurisprudência deste Tribunal, a elaboração de projeto básico deficiente e a celebração de aditamentos que impliquem radical modificação do objeto contratado configuram grave infração a comandos contidos na Lei nº 8.666, 1993, e justificariam a apenação dos respectivos responsáveis, inclusive dos técnicos cuja atuação (por

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Fruto do desperdício de recursos públicos e dos outros problemas apon-tados antes, introduziu-se a posteriori, em nosso ordenamento, normas para padronização, em caráter nacional, desses sistemas. Com efeito, em 2013 o CNJ instituiu, por meio da Resolução nº 185, o PJe como modelo para uniformizar os sistemas operados pelos Tribunais. A resolução prevê que o PJe deve ser im-plantado em 100% dos órgãos julgadores até o ano de 2018.

VII – mANuteNção dA AutoNomIA dAS corregedorIAS eStAduAIS

É importante mencionar que a regulamentação da padronização do SREI e, até mesmo, a adoção de uma plataforma central única não afetam a auto-nomia das CGJs estaduais. As CGJs, quando for o caso, poderão editar normas complementares com o objetivo de disciplinar as peculiaridades locais ou re-gionais, na medida em que tais normas não sejam divergentes ou conflitantes com as regras de padronização nacionalmente estabelecidas.

Essa é a premissa, por exemplo, sobre a qual foi desenvolvida a Cen-tral de Registradores de Imóveis. O sistema foi desenvolvido para operar bases de dados independentes de cada Estado, porém sincronizadas. De um lado, respeitam-se as disposições legais que atribuem ao registrador o poder/dever de guarda e conservação de sua base de dados, imagens e sistemas informáticos; e, de outro lado, atende-se de forma massiva as demandas dos órgãos públicos e dos usuários privados, tudo em um único ambiente.

Os registradores continuam a ter autonomia e gestão sobre os seus res-pectivos cadastros/bases de dados e as CGJs estaduais, sobre a regulamentação destes, desde que de forma compatível com a regulamentação nacional acerca da padronização dos sistemas.

A implantação da CRC, organizada pela Associação Nacional dos Re-gistradores de Pessoas Naturais (“Arpen Brasil”), é exemplo de como é possível interligar as bases de dados registrais por meio de um portal único, sem afastar a autonomia das CGJs estaduais. Atualmente, as serventias de registro civil de 22 Estados já estão interligadas pela CRC.

coNcLuSãoPor todo o exposto, não há dúvidas que a implantação do SREI tem uma

grande potencialidade de reduzir custos, agilizar e desburocratizar as operações imobiliárias.

ação comissiva ou omissivo-comissiva) tenha contribuído para a consumação das irregularidades”. Apenas abrandou-se o rigor legal, no caso, pois os Ministros do TCU entenderam que, em 2004, “a sistemática de governança e gestão de tecnologia de informação ainda não estava bem delineada na administração pública federal, de modo que, em geral, as falhas na definição de projetos básicos ocorriam não pela má-fé ou pela desídia dos administradores, mas muito mais pela falta de expertise dos agentes envolvidos em sua elaboração”.

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O SREI adequadamente implantado beneficiará a toda a sociedade, des-de os próprios CRIs, os seus principais operadores, como os notários e as insti-tuições financeiras, a Administração Pública e, em especial, o usuário final, que poderá ter um acesso mais fácil e ágil às informações dos assentos registrários.

A otimização desse serviço, por sua vez, impulsiona a economia, na me-dida em que reduz o prazo dos registros e confere maior segurança aos ne-gócios. Frise-se que, no caso de aquisições envolvendo financiamento, isso é salutar para que o crédito imobiliário possa ser largamente utilizado, tornando cada vez mais acessível a toda a população a compra do imóvel próprio.

Também tem papel fundamental na organização, no intercâmbio e no acesso de informações, permitindo o levantamento de dados estatísticos mais completos e corretos, a realização de correições on-line, a busca mais célere de patrimônio imobiliário de executados em processos judiciais, entre inúmeros outros.

Tudo isso, sem, contudo, alterar a substância de nosso ordenamento. Tornar eletrônico o procedimento de registro não significa retirar ou diminuir a competência dos órgãos e entes já envolvidos nas operações.

No entanto, para que essa potencialidade se materialize, é imprescin-dível que a implantação do sistema se dê forma adequada e cuidadosa. Para que não enfrentemos as mesmas dificuldades, percalços e gastos da Alemanha, bem como aqueles já experimentados no Brasil no caso da implementação do PJe, é importante que as regras de padronização do SREI e dos documentos eletrônicos sejam regulamentadas em caráter nacional, garantindo eficiência e racionalidade na implantação e no desenvolvimento dos sistemas e um acesso mais facilitado e amplo a toda a sociedade.

Como se pode perceber, a falta de regulamentação adequada na implan-tação do SREI, além de prejudicar o acesso e intercâmbio de informações e documentos, implicará ineficiência, atrasos e custos desnecessários às institui-ções envolvidas, afetando, por consequência, a sociedade como um todo (para estimular a discussão, anexamos a este artigo tabela com aspectos objetivos da implantação bem ou mal regulamentada do registro eletrônico). Conforme relatado, já estão surgindo regulamentações descentralizadas em alguns Estados brasileiros, criando plataformas e requisitos técnicos próprios (e não coinciden-tes) para a prestação dos serviços eletrônicos.

Por outro lado, os modelos espanhol e neozelandês, bem como o exem-plo pátrio da CRC, demonstram que a padronização e centralização dos regis-tros eletrônicos, desde o início, podem ser bastante eficazes, permitindo que o objetivo de celeridade dos procedimentos registrais seja alcançado mais breve-mente e com menor dispêndio de recursos.

Nesse sentido e tendo em vista que o SREI já foi implementado e está fun-cionando de forma positiva no Estado de São Paulo, entendemos que um cami-

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nho interessante e eficiente para a padronização, em nível nacional, do sistema seria tomar por base a experiência do citado Estado e da Central Registradores de Imóveis, aperfeiçoando-se pontualmente aquilo que se mostre necessário.

ANeXo – QuAdro reSumo

PADRONIZAÇÃO DOS SISTEMAS DE REGISTRO ELETRÔNICO DE IMÓ­VEIS E ADOÇÃO DE PLATAFORMA CENTRAL ÚNICA

Aspectos Positivos da Implementa-ção de Forma RegulamentadaRedução dos custos e prazos para procedimentos de registro;Dispensa de diligências pessoais aos cartórios;Facilitação da comunicação de opera-ções imobiliárias aos CRIs;Interligação dos CRIs;Facilitação da prestação de serviços on--line dos CRIs para o público em geral;Compatibilização e interoperabilidade de todos os sistemas de registro eletrôni-co de imóveis (ainda que autônomos);Intercâmbio de informações e documen-tos entre os CRIs e os demais interessados (Administração Pública, Judiciário, insti-tuições privadas e público em geral);Facilitação do procedimento de análise e qualificação registrária dos documentos pelo registrador, otimizando o seu tempo;Maior publicidade aos atos registrais;Aumento na demanda por serviços registrais em razão da facilidade de seu acesso;Extração e acompanhamento de da-dos estatísticos sobre os serviços re-gistrais em âmbito nacional;Manutenção da autonomia dos re-gistradores e das CGJs estaduais;Implantação adequada e eficiente dos sistemas estaduais de registro eletrônico de imóveis;Realização de correição on-line pelo CNJ;Redução dos custos de transa-ção nas operações imobiliárias;Implantação mais célere do registro ele-trônico de imóveis, em nível nacional;Processo evolutivo mais eficaz em termos de aperfeiçoamento de ferra-mentas de segurança eletrônica;Facilitação e ampliação no aces-so ao crédito imobiliário;Fomento ao mercado imobiliário e à eco-nomia em geral, com notável melhora no fluxo de caixa das incorporadoras; eMaior segurança jurídica aos ne-gócios imobiliários.

Aspectos Negativos da Fal-ta de RegulamentaçãoMaior dificuldade de acesso aos sistemas eletrônicos pela sociedade em geral;Insegurança jurídica na operação de diversos sistemas de registro eletrônico de imóveis com padrões diferentes;Necessidade de os notários e os ban-cos precisarem desenvolver inúmeras interfaces para interação com os di-ferentes sistemas de registro eletrôni-co de imóveis existentes no País;Maior custo e burocratização para as operações imobiliárias;Possibilidade de sucessivas alterações nos softwares e sistemas envolvidos para even-tuais adequações e padronização futuras;Ineficiência operacional;Dificuldades – e até mesmo impossibili-dade – no intercâmbio de documentos e informações entre os CRIs e os demais inte-ressados (Administração Pública, Judiciário, instituições privadas e público em geral);Dificuldades – e até mesmo impossi-bilidade – no levantamento de dados estatísticos, em âmbito nacional;Maiores custos de transação nas operações imobiliárias;Impossibilidade de compatibilização e inte-roperabilidade entre sistemas autônomos; e“Curva de aprendizado” dos usuários para utilização do sistema será multipli-cada pelo número de sistemas de regis-tro eletrônico de imóveis existentes.

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Parte Geral – Doutrina

A Execução Direta das Taxas Condominiais no NCPC e a Celeridade Processual

DAnIEL SOBRAL DOS SAnTOS LOnGuEAdvogado em Araçatuba, com escritório especializado em Direito do Trabalho e Previdenciário.

Entre as inúmeras inovações instituídas pela Lei nº 13.105, de 16 de mar-ço de 2015, o chamado “novo CPC”, estão os incisos VIII e X do art. 784, que têm saltado aos olhos dos síndicos, administradores de condomínio, advogados em geral e, por que não, dos condôminos, pois coloca no rol de Títulos Execu-tivos Extrajudiciais as Taxas de Despesas de Condomínio, in verbis:

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:

[...]

VIII – o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio;

[...]

X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condo-mínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;

[...].

Vislumbra-se um avanço sem igual por todos aqueles que têm se aventu-rado nesta cobrança, uma vez que o antigo Código de Processo Civil de 1973, além de não qualificar a taxa de condomínio como um Título Executivo, ainda dispunha expressamente que a cobrança desta se dava somente por meio do extinto procedimento comum sumário (art. 275, II, b).

Diante disso, a cobrança frente à inadimplência das referidas taxas con-dominiais era realizada por meio de processo de conhecimento, extremamente moroso diante à possibilidade de interposição de inúmeros recursos, para so-mente então se obter sentença, garantindo seu cumprimento com a consequen-te penhora do bem.

À luz do art. 784 e incisos do NCPC, é possível a execução direta do título extrajudicial. E, consoante o texto legal, tal título é considerado encargo acessório de um crédito documentalmente comprovado, podendo se estender desde a taxa de condomínio, em si, até a sua forma acessória. É o exemplo das Chamadas de Capital, Fundo de Reserva, etc.

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Destarte, o condomínio poderá usar diretamente da ação de execução em vez de passar por todo o procedimento da ação de cobrança, podendo desde o início requerer a penhora de bens, ativos financeiros ou até mesmo a penhora do imóvel que gerou a referida taxa condominial.

Tal procedimento auxiliará inclusive na celeridade processual, uma vez que a defesa cabível a este tipo de ação são os embargos que, via de regra, não possuem efeito suspensivo, trazendo, com isso, mais celeridade e efetividade na forma de cobrança em tela.

Mister salientar que os créditos oriundos de contribuições ordinárias e extraordinárias, descritos no inciso X, não se referem somente às “taxas con-dominiais”, mas sim a todo o tipo de crédito aprovado em assembleia ou todo aquele descrito previamente nas convenções condominiais.

Verificamos que, além da celeridade, a segurança jurídica ficou mais abrangente com relação a tal instituto, uma vez que obriga síndicos e adminis-tradores de condomínios a regularizarem as assembleias ordinárias e extraor-dinárias, bem como as convenções condominiais, pois juridicamente elas são os meios judicialmente apropriados para a implantação de todas as despesas (ordinárias e extraordinárias). Isso se dá pelo fato de o inciso X dispor como condição o seguinte: “desde que documentalmente comprovadas”.

Tal condição pode aparentar ser um mero detalhe, porém há requisitos esparsos em leis que regem os condomínios. Exemplo disso é o art. 1.350 do Código Civil, que impõe ao condomínio uma assembleia anual para apresenta-ção e aprovação das contas, bem como os critérios de quota de rateio e, ainda, encargos moratórios aos inadimplentes.

Por esta forma, a importância da referida condição, descrita ao final do inciso X, se dá pelo fato de que a executividade ora esclarecida estará condicio-nada não somente à documentação, mas também à comprovação de que esta documentação esteja à luz e em conformidade com a lei que a rege.

Em resumo, vale expor uma situação prática: as duas formas mais co-muns de realizar a cobrança de taxas de condomínio se dão frente a valores fixos, os quais vêm de uma perspectiva mensal de gastos ou do rateio das des-pesas mensais entre os condôminos. Ora, se a convenção condominial dispõe previamente que a cobrança deve ser feita por rateio, mas é realizada em valo-res fixos, estará sujeita à não executividade, tendo em vista não respeitar o que fora previamente disposto. Acontece o mesmo com as cobranças de encargos moratórios anteriormente citados ou diferentes do previsto em lei: ambos os fatos prejudicam a execução direta do título.

Insta salientar, portanto, que os exemplos supramencionados prejudicam a execução direta do título, pois condicionados à correta documentação e apli-cação de suas normas. Entretanto, se o título estiver em desacordo com a com-

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provação documentada, mas se fazendo real a despesa, poderá esta ser cobrada por meio de ação de cobrança.

Nesse caso, vale uma dica: buscar o assessoramento jurídico prévio para que tanto as assembleias como as convenções sejam realizadas, desenvolvidas e elaboradas em acordo com as normas legais que as regem.

Desse modo, tendo em vista a grande quantidade dos “condomínios fe-chados”, entre outros fatores como a atual crise financeira enfrentada pelo País – a qual tem gerado o aumento da inadimplência –, a aparição das despesas condominiais como Títulos Executivos, possibilitando a celeridade na cobran-ça, bem como a garantia prévia, é vista com bons olhos não apenas pelos que cobram e administram, mas também pelos condôminos, uma vez que tais pre-ceitos exigem dos síndicos e administradores a devida regularização de todos os atos das assembleias, além da elaboração minuciosa das convenções condo-miniais, para que tais títulos sejam efetivamente executados e a celeridade se cumpra e tenha eficácia.

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Parte Geral – Doutrina

A Natureza da Atividade Notarial e de Registro e a Incidência do ISSQN

AnDRéA CRISTInA CORREIA DE SOuzA REnAuLT BAêTA DOS SAnTOSOficial Substituta do 4º Ofício de Registro de Imóveis de Belo Horizonte, Mestranda em Di-reito Empresarial, Especialista em Direito Notarial e Registral pela Faculdade Milton Campos, Especialista em Registro Imobiliário e Mercantil Iberoamericano pela Universidade Autônoma de Madrid e pelo Colégio de Registradores da Espanha, Pós-Graduanda em Direito Tributário pela PUC Minas.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Apontamentos sobre a natureza da atividade notarial e registral; 2 Aspectos relevantes do ISSQN para a atividade notarial e registral; 3 Base de cálculo incidente sobre os servi-ços notariais e registrais; Conclusão; Referências.

INtrodução

Em 31 de julho de 2003 foi publicada a Lei Complementar nº 116, que considerou como fato gerador do Imposto sobre Serviços de Qualquer Nature-za – ISSQN os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”1. Houve, então, uma discussão acerca do enquadramento de tais atividades para a fina-lidade de tributação, haja vista tratar-se de uma função pública, exercida por meio de delegação.

Assim, o primeiro aspecto a ser suscitado girou em torno da possibili-dade de o Município tributar uma atividade própria do Estado, considerando as limitações constitucionais ao poder de tributar. Tal questão foi superada ao argumento de que a atividade é exercida em caráter privado, razão pela qual estaria configurada a incidência do citado imposto.

A tributação inicialmente foi realizada considerando quantias fixas, con-tudo, ultimamente têm sido feitas alterações nas legislações municipais, deter-minando que a apuração seja realizada em percentuais sobre os valores rece-bidos a título de emolumentos. Essa modificação culminou com o surgimento de demandas judiciais, e a diversidade de decisões acarreta grande insegurança jurídica. Considerando este contexto, o presente artigo tem como objetivo fazer uma análise da natureza dos serviços notariais e de registro e das formas pos-síveis de tributação pelo ISSQN, para, ao final, concluir por aquela que seja a mais adequada a tal atividade.

1 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp116.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

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1 ApoNtAmeNtoS Sobre A NAtureZA dA AtIVIdAde NotArIAL e regIStrAL

A atividade desempenhada pelos notários e registradores encontra res-paldo no art. 2362 da Constituição Federal de 1988, que prevê seu exercício em caráter privado por meio de delegação do Poder Público. A regulamentação do citado dispositivo legal ficou a cargo do legislador ordinário, a quem cumpria, nos termos do seu § 1º, disciplinar a atividade e a responsabilidade, bem como definir a fiscalização dos atos pelo Poder Judiciário.

Apenas em 18 de novembro de 1994 foi promulgada a Lei nº 8.935, conhecida como “Lei dos Notários e Registradores” ou, simplesmente, “Lei dos Cartórios”, que regulamentou o art. 236 da Carta Constitucional e conceituou os serviços notariais e de registro como sendo aqueles de organização técnica e administrativa que possuem como finalidade garantir a publicidade, autenti-cidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos praticados pelos notários e regis-tradores ou perante eles3.

A expressão “organização técnica e administrativa” é criticada pela dou-trina por transparecer uma ideia de que o titular dos serviços não estaria desen-volvendo uma atividade jurídica, mas apenas técnica e administrativa. Nesse sentido, Dip relata:

A referência ao caráter técnico da organização atribuída às notas e aos registros [...] traz ínsita a negativa de independência jurídica: o técnico no direito não decide, faz; não age, fabrica; não interpreta, executa; não é livre, cumpre ordens; [...] não atua com liberdade jurídica, porque, ao fundo, está sujeito ao ilícito de hermenêutica: ou pensa como pensam seus maiores ou [...] eis aí a falta pronta e grave!4

2 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.

§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.

§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.

§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.”

3 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8935.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 1º Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.”

4 DIP, Ricardo. Registro de imóveis (vários estudos). Porto Alegre: IRIB, Sergio Antonio Fabris Editor, 2005. p. 563.

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Tal postulado, conforme se verifica, não é verdadeiro, pois o ingresso na atividade é feito por meio de concurso público5, e um dos requisitos para a delegação é o diploma de bacharel em Direito; assim, o notário ou tabelião e o oficial de registro ou registrador são, sobretudo, profissionais do Direito.

Antes de prosseguir neste estudo, é imprescindível esclarecer que são tabeliães os titulares dos ofícios de notas e protesto de títulos; e registradores, os oficiais da serventia imobiliária, de títulos e documentos, civis das pessoas ju-rídicas, civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas e de distribuição de títulos. E ainda existem os tabeliães e oficiais de registro de contratos marítimos.

Quanto ao objetivo almejado com o desenvolvimento da atividade nota-rial e registral, temos, antes, de adentrar especificamente em cada finalidade, o panorama traçado por Souza:

A publicidade dos atos é relevante porque a eles se atribui autenticidade; a segu-rança é dependente e fim da publicidade e da eficácia; a eficácia, por seu turno, só se atinge em razão da autenticidade e da publicidade. Várias outras relações podem se feitas entre os fins dos serviços notariais e registrais, importando assi-nalar que, em síntese, o que se almeja é a segurança jurídica.6

Como se vê, os propósitos da atividade são conceitos que se interligam e se complementam.

A publicidade é o instrumento pelo qual os atos se tornam conhecidos e, por isso, oponíveis em relação a terceiros. De acordo com Balbino Filho, “a publicidade é a alma dos registros públicos. É a oportunidade que o legislador quer dar ao povo de conhecer tudo que lhe interessa a respeito de determinados atos. Deixa a par de todo o movimento de pessoas e bens”7. No mesmo sentido, temos a preciosa lição de Loureiro: “Pela publicidade registral se exteriorizam, de forma contínua e organizada, as situações jurídicas de natureza real, a fim de que seja assegurada a sua eficácia perante todos os demais membros da sociedade”8.

5 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8935.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 14. A delegação para o exercício da atividade notarial e de registro depende dos seguintes requisitos:

I – habilitação em concurso público de provas e títulos;

II – nacionalidade brasileira;

III – capacidade civil;

IV – quitação com as obrigações eleitorais e militares;

V – diploma de bacharel em Direito;

VI – verificação de conduta condigna para o exercício da profissão.”6 SOUZA, Eduardo Pacheco Ribeiro de. Noções fundamentais de direito registral e notarial. São Paulo: Saraiva,

2011. p. 23.7 BALBINO FILHO, Nicolau. Registro de imóveis: doutrina – prática – jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1999.

p. 9.8 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros públicos – Teoria e prática. 2. ed. São Paulo: Método, 2011. p. 205.

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Importante ressaltar que existem exceções à publicidade no registro civil das pessoas naturais nas questões atinentes ao nome9, e, no tabelionato de pro-testos, quanto aos títulos protestados e cancelados, só podendo suas certidões ser expedidas a pedido do devedor ou mediante ordem judicial10-11. Na ativida-de notarial, discute-se se a escritura de testamento, por ser instrumento público, pode ser obtida livremente antes do falecimento do testador. Entretanto, apesar de ser válido desde a sua elaboração, trata-se de um negócio jurídico com efi-cácia diferida, pois seus efeitos se dão apenas após a morte do testador, sendo, até então, essencialmente revogável.

A autenticidade visa a estabelecer uma presunção de verdade sobre o conteúdo do ato notarial ou registral12; trata-se de uma presunção relativa, juris tantum, emanada dos assentos, que não abrange o negócio que o originou ou lhe deu causa. Elucidando tal aspecto, ao estudar o registro de imóveis, Sarmen-to Filho nos ensina que “não há garantia absoluta para o adquirente do imóvel, podendo o seu registro ser anulado por algum vício na formação do negócio”13.

A segurança, por seu turno, está relacionada à estabilidade conferida às relações jurídicas que decorrem dos atos notariais e registrais. Conforme ensi-namentos de Amaral,

segurança jurídica significa a paz, a ordem e a estabilidade e consiste na certeza de realização do direito. [...] O direito tem, por isso, como um de seus valores fundamentais, para muitos o primeiro na sua escala, a segurança, que consiste, precisamente, na certeza da ordem jurídica e na confiança de sua realização.14

9 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015original.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 18. Ressalvado o disposto nos arts. 45 e 96, parágrafo único, a certidão será lavrada independentemente de despacho judicial, devendo mencionar o livro do registro ou o documento arquivado no cartório.”

10 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9492.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 27. O Tabelião de Protesto expedirá as certidões solicitadas dentro de cinco dias úteis, no máximo, que abrangerão o período mínimo dos cinco anos anteriores, contados da data do pedido, salvo quando se referir a protesto específico.

[...]

§ 2º Das certidões não constarão os registros cujos cancelamentos tiverem sido averbados, salvo por requerimento escrito do próprio devedor ou por ordem judicial.”

11 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9492.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 31. Poderão ser fornecidas certidões de protestos, não cancelados, a quaisquer interessados, desde que requeridas por escrito.”

12 Provimento nº 260/CGJ/2013 – Código de Normas dos Serviços Notarias e de Registro do Estado de Minas Gerais. Disponível em: <http://www.recivil.com.br/preciviladm/modulos/noticias/arquivos/Codigo_de_Normas Provimento_n_260.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 5º O serviço, a função e a atividade notarial e de registro se norteiam pelos princípios específicos de cada natureza notarial e registral, além dos seguintes princípios gerais:

[...]

III – da autenticidade, a estabelecer uma presunção relativa de verdade sobre o conteúdo do ato notarial ou registral;

[...]” 13 SARMENTO FILHO, Eduardo Sócrates Castanheira. Direito registral imobiliário. Curitiba: Juruá, 2013. p. 46.14 AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 18.

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A sua consecução se dá por meio da observância de diversos princípios, entre os quais a irretroatividade da lei, a coisa julgada e o respeito aos direitos adquiridos e visa, com a sua aplicação, a salvaguardar os cidadãos de ações abusivas, inclusive do próprio Estado.

A eficácia visa a garantir a produção dos efeitos desejados quando da realização de um ato notarial e registral. Segundo Souza,

significa a garantia de que o ato notarial ou de registro produzirá sua conse-quência própria, o estar apto a produzir efeitos jurídicos que dele se espera. Por exemplo, o registro nas aquisições entre vivos é constitutivo, transmitindo a propriedade imóvel e permitindo ao proprietário, ainda, a oponibilidade de sua situação a terceiros, já que produz o registro efeitos erga omnes.15

Essa finalidade guarda estreita relação com a publicidade dos atos, sem a qual se torna inócua.

Traçando um comparativo com o processo judicial em que seus efeitos são, em regra, restritos apenas às partes que participaram dele, Rodrigues sinte-tiza os objetivos da atividade ao estudar o sistema da publicidade registral, que considera possuir um “plus”, pois, irradia

publicidade ativa ao ato jurídico, de forma a que seja oponível perante terceiros (efeito erga omnes); dotando-o de autenticidade, que deriva do poder certificante – fé pública e presunção de verdade – inerente às atividades notarial e registral; promovendo e resguardando a segurança jurídica, valor axiológico perseguido pelo direito formal; e, por fim, mas não menos importante, atribuindo-lhe eficá-cia, vale dizer, a aptidão de produzir efeitos no mundo jurídico.16

Feitas essas considerações iniciais, verifica-se que algumas peculiarida-des podem ser facilmente constatadas em relação à atividade notarial e registral e são fundamentais para a compreensão de sua natureza. O primeiro aspecto a ser observado é que estamos diante de uma atividade estatal exercida de forma privada, por meio de delegação, que consiste no “trespasse da execução de ser-viços a particulares, mediante regulamentação e controle do Poder Público”17.

Mesmo considerando a delegação a forma escolhida pelo Estado-mem-bro de operacionalizar a atividade, restou definido pelo Supremo Tribunal Fe-deral, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.089, que, sendo desenvolvida em caráter privado, não pode a atividade estar abarcada na hipó-

15 SOUZA, Eduardo Pacheco Ribeiro de. Noções fundamentais de direito registral e notarial. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 23.

16 RODRIGUES, Marcelo Guimarães. Tratado de registros públicos e direito notarial. São Paulo: Atlas, 2014. p. 10.

17 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 357.

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tese de imunidade recíproca entre os entes, constitucionalmente previstas no art. 150, VI, a18.

Quanto à imunidade, conforme ensinamentos de Amaro, “a imunidade tributária é, assim, a qualidade da situação que não pode ser atingida pelo tri-buto, em razão de norma constitucional que, à vista de alguma especificidade pessoal ou material dessa situação, deixou-a fora do campo sobre que é autori-zada a instituição do tributo”19.

Como se pode depreender do exposto, a imunidade é uma definição constitucional de algumas situações que, mesmo estando no campo de compe-tência de um ente para a instituição de determinado tributo, não serão tributa-das. Exemplificando, é vedado ao Município, no âmbito de sua competência, instituir impostos sobre o patrimônio, a renda ou os serviços tanto da União quanto dos Estados e do Distrito Federal. Em resumo, temos a lição de Coêlho, segundo o qual “as pessoas políticas não possuem capacidade contributiva. Ao revés, são dotadas de competência para tributar, não porém umas às outras”20.

Para Carrazza, as imunidades das pessoas políticas decorrem do princi-pio federativo, porque, se uma pessoa política pudesse exigir impostos de outra, fatalmente acabaria por interferir em sua autonomia”21.

Assim, embora seja uma atividade pública, típica do Estado, o fato de ela ser desenvolvida em caráter privado por meio da delegação exclui a possibili-dade de a mesma estar acolhida pela imunidade mencionada antes.

Ademais, a atividade é desenvolvida pessoalmente pelo titular que rece-be a delegação quando é aprovado em concurso público de provas e títulos, não sendo vedada, portanto, a contratação em conformidade com a legislação do trabalho de funcionários, escreventes e auxiliares, para o desempenho das funções, sob o comando, as orientações e a responsabilidade do titular do ser-viço. Compete-lhe também o gerenciamento, que compreende, entre outros, o investimento em tecnologia, despesas com contratação e aperfeiçoamento, manutenção de imóvel para funcionamento.

18 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

VI – instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

[...]”19 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 151.20 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense,

2011. p. 254.21 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

p. 787.

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Ainda é do notário ou registrador a responsabilidade pelos danos causa-dos no desempenho das atividades próprias de serventia, pessoalmente ou por seus prepostos, a terceiros, sendo, entretanto, possível a ação de regresso no caso de seu dolo ou sua culpa. Uma única conduta pode gerar consequências em três esferas: administrativa, cível e criminal.

Cumpre elucidar que os cartórios indiscutivelmente não são pessoas ju-rídicas e o seu oficial não pode associar-se a outros com finalidade de melhor organizar a atividade. Tampouco constituem uma universalidade de bens, já que “perdendo o cargo, [...] os móveis e utensílios utilizados pelo tabelião nas instalações do cartório devem ser adquiridos ou indenizados pelo novo titular que o suceder”22.

Ademais, conforme julgamento da 4ª Turma do Superior Tribunal de Jus-tiça, restou afastada também a personalidade judiciária, processual ou aparente,

de fato, as pessoas formais, amparadas no art. 12 do Código de processo Civil constituem, no mínimo, uma universalidade de bens, como o espólio e as heran-ças jacente e vacante. No caso, o cartório não possui qualquer direito, dever ou bem capaz de ensejar a ocorrência de personalidade judiciária. [...] Desta forma, tanto as relações laborais [...], como os equipamentos e mesmo o aluguel do cartório são arcados diretamente pelo tabelião, que assume todas as obrigações e direitos pessoalmente.

Ao titular do tabelionato pertencem todos os bens ali existentes, que não são transmitidos no caso de extinção da delegação23.

Dessa forma, a personalidade processual conferida a alguns entes des-personalizados, como o espólio, a massa falida e as heranças jacente e vacante, não foi atribuída às serventias, como consequência pelo fato de o “cartório” não configurar sequer uma universalidade de bens.

Sintetizam brilhantemente Coêlho e Derzi (apud Alves et al., 2002, p. 97), “serventia não tem capacidade processual, não tem patrimônio, não tem per-sonalidade jurídica, a qual só se adquire com o registro dos atos constitutivos na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, de acordo com o Código Civil”24.

Como se pode depreender do exposto, a atividade notarial e registral é cercada de muitas peculiaridades que a torna especial e a difere das demais. São aspectos marcantes a outorga da delegação, a pessoalidade na prestação

22 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; DERZI, Misabel Abreu Machado. Base de cálculo do ISSQN incidente sobre os serviços notariais e de registro público. Vigência e aplicação do § 1º do artigo 9º do Decreto-Lei nº 406/1968, 18 de agosto de 2008, p. 25. Disponível em: <http://www.anoregsp.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=NjQ2&filtro=4/>. Acesso em: 10 jan. 2015.

23 Idem, p. 24.24 Idem, p. 25.

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dos serviços, a responsabilidade do titular, a sua autonomia no gerenciamento e a ausência de personalidade jurídica, judiciária ou processual.

2 ASpectoS reLeVANteS do ISSQN pArA A AtIVIdAde NotArIAL e regIStrAL

O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN ou Imposto sobre Serviços – ISS é de competência dos Municípios e do Distrito Federal, conforme o art. 156, III, da Constituição25, e tem como fato gerador a presta-ção de serviços conforme estipulação em lei ordinária municipal, dentro dos limites definidos em lei complementar federal. São excluídas, de antemão, as operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior26, pois, nesses casos, haverá tributação por meio do ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias) pelos Estados e pelo Distrito Federal.

Os elementos que compõem o conceito de prestação de serviços são elucidados por Carvalho: “É necessário acontecer o exercício, por parte de al-guém (prestador), de atuação que tenha por objeto produzir uma utilidade re-lativamente a outra pessoa (tomador), a qual remunera o prestador (preço do serviço)”27.

Nem todas as prestações de serviço estão abarcadas nas hipóteses que, ocorrendo, gerarão a incidência do ISSQN. Dessa forma, não estão abrangidos,

(i) o serviço público, tendo em vista ser ele abrangido pela imunidade (art. 150, a, da Carta Fundamental);

(ii) o trabalho realizado para si próprio, por ser despido de conteúdo econômico; e

25 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

[...]

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.”26 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em:

15 jan. 2015.

“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

[...]

II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

[...]”27 CARVALHO, Paulo de Barros. Parecer – Cobrança do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN)

dos prestadores de serviços notariais e registros públicos, p. 5. Disponível em: <http://www.anoregsp.org.br/ISSQN/Parecer_Cobran%C3%A7a_ISSQN_PaulodeBCarvalho.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2015.

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(iii) o trabalho efetuado em relação de subordinação, abrangido pelo vínculo empregatício.28

Em 31 de julho de 2003 foi publicada a Lei Complementar nº 116, que considerou, em sua lista anexa no item 21, como fato gerador do ISSQN, os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais”29. À época, houve, então, uma discussão acerca do enquadramento de tais atividades para a finalidade de tributação, haja vista tratar-se de uma função pública.

O primeiro aspecto a ser questionado girou em torno da possibilidade de o Município tributar uma atividade própria do Estado, considerando as limita-ções constitucionais ao poder de tributar. Tal questão, como já demonstrada, foi superada ao argumento de que a atividade é exercida em caráter privado, razão pela qual estaria configurada a incidência do citado imposto.

Entretanto, importante apresentar posicionamento contrário defendido por Meirelles, segundo o qual “a incidência do ISS sobre serviços públicos é discutível. Nada justifica seja onerado o custo de serviços que atendem a ne-cessidades essenciais da população e que, por isto mesmo, constituem encargo dos poderes públicos”30.

Destaca-se, ainda, que o contribuinte do imposto é o prestador dos ser-viços e as suas alíquotas devem estar limitadas entre 2%, nos termos do art. 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT31, e 5%, conforme preceitua o art. 8º da Lei Complementar nº 11632.

3 bASe de cáLcuLo INcIdeNte Sobre oS SerVIçoS NotArIAIS e regIStrAIS

Além das questões apresentadas que já foram superadas, a outra proble-mática acerca do ISSQN cinge-se à definição de sua base de cálculo, que deve ser apurada em conformidade com o explicitado na Lei Complementar nº 116. Referido diploma legal revogou expressamente alguns dispositivos do Decreto-

28 Idem, ibidem.29 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp116.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.30 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 412.31 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em:

15 jan. 2015.

“Art. 88. Enquanto lei complementar não disciplinar o disposto nos incisos I e III do § 3º do art. 156 da Constituição Federal, o imposto a que se refere o inciso III do caput do mesmo artigo:

I – terá alíquota mínima de dois por cento, exceto para os serviços a que se referem os itens 32, 33 e 34 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968;

II – não será objeto de concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais, que resulte, direta ou indiretamente, na redução da alíquota mínima estabelecida no inciso I.”

32 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp116.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

“Art. 8º As alíquotas máximas do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza são as seguintes:

[...]

II – demais serviços, 5% (cinco por cento).”

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-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, e do Decreto-Lei nº 834, de 8 de setembro de 1969, e também da Lei Complementar nº 22, de 9 de dezembro de 1974, da Lei nº 7.192, de 5 de junho de 1984, da Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, e da Lei Complementar nº 100, de 22 de dezembro de 1999, que anteriormente disciplinavam o referido tributo. Entretanto, perma-neceu em vigor o art. 9º do Decreto Lei nº 406, que dispõe:

Art. 9º A base de cálculo do impôsto é o preço do serviço.

§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o impôsto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.33

Dessa forma, estabeleceu duas possibilidades para a base de cálculo do ISS: o preço do serviço ou das alíquotas fixas ou variáveis quando da hipótese do § 1º, mencionado. Diversas legislações municipais reconhecem a aplicabili-dade do dispositivo legal citado, mantendo redação muito semelhante àquela.

A tributação no momento inicial foi realizada considerando quantias fi-xas; contudo, ultimamente tem sido feitas alterações nas legislações municipais determinando que a apuração seja realizada em percentuais sobre os valores recebidos a título de emolumentos, que “são a retribuição pecuniária por atos praticados pelo notário e pelo registrador, no âmbito de suas respectivas com-petências, e têm como fato gerador a prática de atos”34 pelos tabeliães e regis-tradores. Essa modificação culminou com o surgimento de demandas judiciais e a diversidade de decisões acarreta grande insegurança jurídica.

Algumas decisões se fundam em antigos posicionamentos, rebatidos por este estudo e, inclusive, já superados pela doutrina, conforme se verifica:

A prestação de serviços de registros públicos (cartorário e notarial) não se en-quadra no regime especial previsto no art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei nº 406/1968, pois, além de manifesta a finalidade lucrativa, não há a prestação de serviço sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, especialmente porque o art. 236 da CF/1988 e a legislação que o regulamenta permitem a formação de uma estrutura economicamente organizada para a prestação do serviço de regis-tro público, assemelhando-se ao próprio conceito de empresa.35

33 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0406.htm#art12>. Acesso em: 15 jan. 2015.

34 Disponível em: <http://www.fazenda.mg.gov.br/empresas/legislacao_tributaria/leis/l15424_2004.htm>. Acesso em: 15 jan. 2015.

35 REsp 1328384/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, J. 04.02.2013, DJe 29.05.2013. Disponível em: <http://www.anoreg.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=20470:stj-publica-acordao-do-re-1328384-referente-ao-iss-anoreg-br-ira-recorrer-da-decisao&catid=55&Itemid=125>. Acesso em: 24 jan. 2015.

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Em sentido contrário, considerando que a base de cálculo do tributo não deve ser o preço do serviço, temos:

Desta forma, os notários e registradores fazem jus a regime especial de recolhi-mento do ISSQN, com alíquota fixa, e não em percentual sobre toda a importân-cia recebida a título de remuneração pela totalidade do serviço prestado, evitan-do-se a sobrecarga tributária da categoria profissional em comento. Em suma, a base de cálculo do ISSQN sobre serviços notariais e de registros públicos não deve ser o preço do serviço (art. 7º, caput, da Lei Complementar nº 116/2003), mas aquela estabelecida na forma do art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei nº 406/1968.36

E, ainda:

APELAÇÃO AÇÃO DECLARATÓRIA – ISS – ISS incidente sobre prestação de ser-viços prestados por notários e oficiais de registro. Serviços delegados pelo Poder Público e exercidos em caráter privado. Sujeição ao imposto. Trabalho intelec-tual jurídico prestado em caráter pessoal, mesmo que com o auxílio de colabora-dores, o que permite a aplicação do art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei nº 406/1968 e o art. 287, parágrafo único, da Lei Complementar municipal nº 224/2008. Ativida-de que não é empresarial, mesmo quando há concorrência.37

A natureza da atividade notarial e registral, de fato, já foi matéria bastante controvertida e isso gerou posicionamentos conflitantes. Entretanto, atualmente os Tribunais têm se alinhado, e a mudança de posicionamento que foi elucidada demonstra evolução e decorre do crescente conhecimento acerca dessa área.

coNcLuSão

A natureza jurídica da atividade desempenhada pelos notários e registra-dores é fruto de suas peculiaridades. Trata-se de múnus público exercido por particulares, que arcam com todas as responsabilidades pelo seu desenvolvi-mento, podendo, para tanto, contratar auxiliares e escreventes, em consonância com a legislação do trabalho.

Compete ao titular do serviço o seu gerenciamento, pessoalmente, sem possibilidade da criação de uma pessoa jurídica, que compreende desde a ma-nutenção do local de funcionamento até os investimentos em tecnologia.

Prestam os oficiais um serviço e, como tal, devem ser tributados pelo ISSQN; contudo, verifica-se que a subsunção perfeita ocorre com o § 1º do art. 9º do Decreto-Lei nº 406, ainda em vigor, que considera sua base de cálcu-lo, suas alíquotas fixas ou variáveis, e não o preço do serviço.

36 Rcl 15784/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, J. 05.06.2013, DJe 07.06.2013. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23351584/reclamacao-rcl-15784-rj-stf>. Acesso em: 24 jan. 2015.

37 Apelação com Revisão nº 0.008.438-11.2009.8.26.0451. Disponível em: <http://ieptbmg.com.br/noticias/site-do-tjsp-tribunal-de-justica-do-estado-de-sao-paulo-27-05-14>. Acesso em: 24 jan. 2015.

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Assim, em consonância com o exposto, verifica-se que é desnecessário fazer qualquer tipo de analogia entre a atividade notarial e registral e qualquer outra, vez que existe na legislação o enquadramento perfeito, que permite a tri-butação considerando alíquotas fixas, haja vista sua natureza e o trabalho a ser desenvolvido pessoalmente pelo próprio contribuinte, demonstrando, por fim, ser tal forma de tributação é a mais adequada.

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Parte Geral – Doutrina

Da Possibilidade de Lavratura de Escritura Pública de Cessão de Direitos Hereditários de Bem Imóvel Singularmente Considerado sem Anuência de Todos os Herdeiros

MARIAnA MEnDES BRITOAdvogada, Especialista em Direito Imobiliário.

RESUMO: A cessão de direitos hereditários é o contrato mediante o qual se opera a transmissão de direitos provenientes de sucessão, enquanto não dados à partilha. O Código Civil de 2002 trouxe a cessão de direitos hereditários em seu art. 1.793. Sob a luz dos planos da existência, validade e eficácia, além de princípios constitucionais que oxigenam o ordenamento jurídico com o advento do Estado Social, pretende-se desenvolver a tese de possibilidade de lavratura da escritura pública de cessão de direitos hereditários pelo coerdeiro no caso de disposição de bem pertencente ao espólio, singularmente considerado, em contraposição à praxe cartorária.

PALAVRAS-CHAVE: Cessão; herança; imóvel; bem; singular.

ABSTRACT: The assignment of hereditary rights is the contract through which operates the broadcast rights from succession, while no apportionment. The Civil Code of 2002 brought the assignment of hereditary rights in article 1.793. In light of the plans of existence, validity and effectiveness, as well as constitutional principles that oxygenate the legal system with the advent of the welfare state, it is intended to develop the thesis of the possibility of drawing up the deed of assignment of hereditary rights by coheir in case of disposal of property belonging to the estate, singularly considered, as opposed to registry practice.

KEYWORDS: Assignment; estate; real estate; property; singular.

dA ceSSão de dIreItoS heredItárIoS

A cessão de direitos hereditários é o contrato mediante o qual se opera a transmissão de direitos provenientes de sucessão, enquanto não dados à par-tilha.

Em outras palavras, Maria Helena Diniz1 leciona:

A herança é um valor patrimonial, mesmo que os bens que a constituam ain-da não estejam individualizados na quota dos herdeiros, daí a possibilidade de transmissão por ato inter vivos, independentemente de estar concluído o inven-tário. É a hipótese em que se configura a cessão de herança, gratuita ou onero-

1 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das sucessões. 23. ed. Reformulada. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2009. p. 82.

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sa, consistindo na transferência que o herdeiro, legítimo ou testamentário, faz a outrem de todo o quinhão hereditário ou de parte dele, que lhe compete após a abertura de sucessão.

Para tanto, deve-se fazer a diferenciação entre a cessão de direitos here-ditários universal, em que se transferem todos os direitos do cedente ou a sua quota; a parcial, em que se transfere apenas parte dos direitos do cedente ou de sua quota; e a singular, em que é transferido apenas um bem pertencente ao espólio.

O Código Civil de 2002 trouxe a cessão de direitos hereditários em seu art. 1.793, a seguir colacionado:

Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.

§ 1º Os direitos, conferidos ao herdeiro em conseqüência de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.

§ 2º É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qual-quer bem da herança considerado singularmente.

§ 3º Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário, pendente a indi-visibilidade.

Nesse diapasão, o Código Civil atual, ao tratar sobre a cessão de herança, determina ser ineficaz a disposição pelo coerdeiro de bem pertencente ao es-pólio, singularmente considerado, antes da partilha. Sendo assim, ainda preser-vando o espólio a característica de universalidade de bens e direitos, é ineficaz a disposição sobre um bem específico, pois nenhum herdeiro tem a propriedade sobre bens singulares, mas todos possuem uma quota-parte dessa universalida-de de bens e direitos, ainda pendentes de especificação em ulterior partilha.

prAXe cArtorárIA

O efeito mais relevante da lavratura da escritura pública da cessão de direitos hereditários talvez seja a produção de efeitos em relação a terceiros, o que evita muitos percalços aos adquirentes.

O registro pelo Cartório da cessão de direitos é previsto pelo art. 129 da Lei de Registros Públicos e pelo art. 1.793 do Código Civil, nos seguintes temos:

Art. 129. Estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros:

[...]

9º) os instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e de dação em pagamento

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Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.

No entanto, no que diz respeito à cessão de direitos hereditários de bem singularmente considerado, os Cartórios de Registros de Imóveis, em sua maio-ria, não lavram a escritura pública quando não é realizada por todos os ceden-tes, a não ser que haja alvará judicial. Para exemplificar esse entendimento, se-guem trechos retirados de sítios eletrônicos de Cartórios de Registro de Imóveis:

Conforme §§ 2º e 3º do referido artigo, é ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmen-te. Assim, para ser lavrada uma escritura pública de cessão de direitos hereditá-rios de um bem singularmente considerado, um bem específico da herança, ha-vendo mais herdeiros, deve ser apresentada ao Tabelionato a autorização judicial específica para poder ser feira a escritura (Alvará Judicial). Já quando a cessão é de todo o acervo hereditário (integralidade do quinhão daquele herdeiro que está cedendo), não precisará de prévia autorização judicial.2

O texto do § 2º do art. 1.793 do Código Civil, a princípio, criou grande celeuma no mundo jurídico, no sentido de sabermos se é ou não imprescindível a expedição de prévio alvará judicial para a lavratura da escritura de cessão de direitos hereditários.

“É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerados singularmente”.

Entendo, s.m.j., que é dispensável a expedição de prévio alvará judicial, desde que haja unanimidade entre todos os interessados na sucessão, devendo todos ser maiores e capazes, e que sobre o bem cedido não haja qualquer res-trição3.

Diante disso, é possível observar que a praxe cartorária, salvo raras ex-ceções, entende que o § 3º do art. 1.793 do Código Civil veda a realização de cessão de direitos hereditários feitos por coerdeiro de imóvel singularmente considerado pertencente ao espólio. Isso posto, apenas permitem a lavratura de escritura pública nos casos em que todos os cedentes estão concordes com a alienação do bem singular, ou quando o coerdeiro cede somente sua cota, respeitado o direito de preferência previsto no art. 1.794 do NCC.

2 Cartório em Itaboraí/RJ. Disponível em: <http://www.tabelionatoitajai.com.br/cessatildeo-de-direitos.html#/>; Cartório no Rio de Janeiro/RJ. Disponível em: <http://www.cartorio15.com.br/conteudo/escrituras-relativas-a-imoveis>; Cartório em Amargosa/BA. Disponível em: <http://tabelionatodeamargosa.blogspot.com.br/2012_05_01_archive.html>.

3 Cartório do 6º ofício em Petrópolis/RJ. Disponível em: <http://cartorio6oficio.com.br/site/index.php?option =com_content&view=article&id=84:o-novo-codigo-civil&catid=37:artigos&Itemid=96>.

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dA INterpretAção do § 3º do ArtIgo 1.793 do cÓdIgo cIVIL de 2002

O § 3º do art. 1.793 enuncia que é ineficaz a cessão feita por coerdeiro, antes de autorização judicial, de imóvel pertencente ao acervo hereditário, pen-dente a indivisibilidade.

A finalidade dessa norma é impedir que o cessionário seja prejudicado com a cessão de um bem singular que, com a partilha, não caberá ao cedente.

Da redação do artigo, em uma simples interpretação literal, podemos concluir que, havendo autorização judicial, a cessão realizada por coerdeiro de um bem singular é eficaz, assim como a cessão feita por todos os herdeiros, sem necessidade de autorização judicial, e a cessão de bem singular feita por herdeiro único, eis que ao mesmo caberão todos os bens do espólio.

doS pLANoS de eXIStÊNcIA, VALIdAde e eFIcácIA do NegÓcIo JurÍdIco

Faz-se imperioso, para o presente trabalho acadêmico, distinguir os pla-nos de existência, validade e eficácia do negócio jurídico.

Esses planos devem ser analisados separadamente, pois para cada um existem requisitos específicos, ou seja, um negócio jurídico pode cumprir os requisitos de existência (elementos) – portanto, existe –, mas não atender aos requisitos do plano de validade (regularidade) – inválido, portanto.

Os requisitos de existência são: declaração de vontade, finalidade nego-cial e idoneidade do objeto. Ou seja, o agente deve manifestar sua vontade, ou ter conduta ou omissão que a lei declare como presunção de manifestação de vontade; ter como objetivo adquirir, modificar ou extinguir direitos; e o objeto deve ser idôneo – por exemplo, para constituição de uma hipoteca, é necessá-rio que o bem dado em garantia seja imóvel, navio ou avião (Gonçalves, 2008, p. 316).

Para validade de um negócio jurídico, o Código Civil traz expressamente os requisitos em seu art. 104:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I – agente capaz;

II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III – forma prescrita ou não defesa em lei.

O não cumprimento dos requisitos de validade do negócio jurídico pode ser penalizado pelo sistema jurídico como nulo (nulidade absoluta), não produ-zindo efeitos, ou anulável (nulidade relativa), produzindo efeitos até a declara-ção de nulidade.

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Segundo Carlos Roberto Gonçalves4:

Pode, também, o negócio jurídico existir, ser válido, mas não ter eficácia, por não ter ocorrido ainda, por exemplo, o implemento de uma condição imposta. O plano da eficácia é onde os fatos jurídicos produzem seus efeitos, pressupondo a passagem pelo plano da existência, não, todavia, essencialmente, pelo plano da validade.

Sendo assim, tanto pode existir um negócio jurídico inválido que produza efeitos quanto um negócio válido que não produza efeitos.

No caso da cessão de direitos hereditários de bem singular realizada por coerdei-ro, a lei impõe sua invalidade enquanto perdurar a condição de indivisibilidade do espólio, ou seja, enquanto não ultimada a partilha de bens. Por esse motivo, alguns operadores do Direito entendem que essa cessão possui uma condição que subordina os efeitos do negócio jurídico a evento futuro e incerto: a proprie-dade do bem cedido caber ao herdeiro cedente.

dA coNdIção

A condição é um elemento acidental do negócio jurídico, assim como o termo e o encargo. Difere-se dos demais por subordinar os efeitos do negócio a evento futuro e incerto (art. 121 do CC), ao contrário do termo (evento futuro e certo) e diferente do encargo (ônus a um beneficiário).

Carlos Roberto Gonçalves5 leciona:

Condição é o acontecimento futuro e incerto de que depende a eficácia do ne-gócio jurídico. Da sua ocorrência depende o nascimento ou a extinção de um direito [...].

[...] um ato negocial é condicional quando seu efeito, total ou parcial, depende de um acontecimento futuro e incerto.

Há dois tipos de condição: a resolutiva e a suspensiva. A condição reso-lutiva é aquela em que o negócio jurídico produz efeitos até o implemento da condição (art. 127 do CC), enquanto, havendo condição suspensiva, o direito não é adquirido se não verificado o evento (art. 125 do CC).

Portanto, a cessão de direitos hereditários de que trata o presente artigo é ato negocial sob condição suspensiva, ou seja, não produz efeitos até a partilha de bens, em que o bem cedido deverá caber ao herdeiro cedente ou ao próprio cessionário, eis que se sub-roga nos direitos do herdeiro.

4 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2008. p. 308.

5 Idem, p. 336.

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Na eventualidade do evento futuro e incerto não se verificar, o negócio será resolvido, e o coerdeiro cedente ficará obrigado a restituir o valor pago antecipadamente (art. 876 do CC).

Dessa forma, conclui-se que o § 3º do art. 1.793 do novo Código Civil, em uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico, não tinha como objetivo a vedação da realização da cessão de direitos hereditários de bem singular feita por coerdeiro sem autorização judicial, mas sim de subordinar os efeitos dessa cessão ao implemento da condição de que o bem seja transmitido ao herdeiro cedente.

dA poSSIbILIdAde de LAVrAturA dA eScrIturA pÚbLIcA

A negativa dos cartórios gira entorno exatamente da expressão “é ine-ficaz”, sem que haja uma interpretação com base nos conhecimentos doutri-nários sobre eficácia e nas normas relativas à condição. Portanto, os Registros de Títulos e Documentos apenas permitem a lavratura de escritura pública das cessões em que haja alvará judicial.

Ocorre que, de todo o anteriormente exposto, pode-se afirmar que há duas possibilidades inseridas no § 3º do art. 1.793 do CC: a primeira é de pro-dução de efeitos imediata, mediante alvará judicial; e a segunda, de suspensão desses efeitos até a partilha.

Este é o entendimento doutrinário, trazido brilhantemente por Maria Helena Diniz6:

Também não terá eficácia a disposição, sem prévia autorização judicial de qual-quer herdeiro, de bem componente do acervo hereditário considerado indivi-dualmente (p. ex., o apartamento 418 do Edifício Sol e Mar), pendente a indi-visibilidade (CC, art. 1.793, § 3º, do CPC, art. 992, I). Por isso, Mauro Antonini pondera que pelo § 3º do art. 1.793, ao prever a ineficácia da autorização judi-cial, será possível que a cessão se torne eficaz com ulterior autorização judicial, convalidando-a, ou, ainda, se feita a partilha, o bem concedido venha a compor o quinhão do cedente. Se algum co-herdeiro quiser alienar bens da herança, de-penderá da autorização do juiz, que preside o processo do inventário, que para, tanto, averiguará se há anuência dos demais co-herdeiros.

Corrobora com tal entendimento o julgado do REsp 546.077, cuja relato-ra é a il. Ministra Nancy Andrighi:

Quanto à alegação dos recorrentes de ser inviável o registro da cessão de direitos hereditários, de fato, enquanto não ultimada a partilha, o referido negócio não poderia ser levado a registro, pois só no momento da partilha é que se determina e especifica o quinhão de cada herdeiro e, automaticamente, o objeto da cessão.

6 DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 85.

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Enquanto não houver partilha dos bens, o cessionário detém apenas direito ex-pectativo, que só irá se concretizar efetivamente após a especificação do quinhão destinado ao herdeiro cedente. (REsp 546.077/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, jul-gado em 02.02.2006)

No mesmo sentido, entendimento jurisprudencial dos Tribunais Estaduais:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – SUCESSÕES – CESSÃO DE DIREITOS HEREDI-TÁRIOS SOBRE BEM SINGULAR DO ESPÓLIO – PEDIDO DE HABILITAÇÃO DO CESSIONÁRIO – Conforme o § 2º do art. 1.793 do Código Civil, a cessão de direitos hereditários será ineficaz, quando feita em relação a bem singular do espólio. Tal restrição legal indica que a falta dos requisitos legais tem reflexo no plano da eficácia do negócio. Ou seja, ainda que feita em relação a bem singular, a cessão de direitos existe e goza de presunção de validade. Disso se concluiu que, no momento em que o Código refere apenas a ineficácia do ne-gócio, projeta-se a possibilidade de que o contrato venha a ser eficaz, caso de implementada condições. E dentre as condições para futura eficácia do negócio está a concordância superveniente dos demais herdeiros, que não cederam seus direitos hereditários, a solvência do espólio para pagamento de dívidas ou a aco-modação do bem no quinhão do herdeiro cedente. Logo, a simples cessão de direitos hereditário sobre bem singular, por si só, não impede a habilitação do cessionário a fim de defender o seu direito. Recurso parcialmente provido.

(TJRS, Agravo de Instrumento nº 70052159977, 8ª C.Cív., Rel. Rui Portanova, Julgado em 19.06.2013, Diário da Justiça do dia 21.06.2013)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – INVENTÁRIO – DISPOSIÇÃO DE BEM SIN-GULAR PELA INVENTARIANTE E ÚNICA HERDEIRA SEM PRÉVIA AUTORIZA-ÇÃO JUDICIAL – OUTORGA DE PROCURAÇÃO PARA A VENDA DO BEM – PROMESSA DE COMPRA E VENDA CELEBRADA ENTRE A OUTORGADA E O AGRAVANTE. FALECIMENTO DA OUTORGADA SEM DAR QUITAÇÃO – PE-DIDO DE EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ PARA OUTORGA DE ESCRITURA DE COM-PRA E VENDA FORMULADO PELO PROMITENTE COMPRADOR – LEGITIMI-DADE DO PROMITENTE COMPRADOR DE BEM SINGULAR INTEGRANTE DO MONTE – TERCEIRO INTERESSADO – AUSÊNCIA DE PROVA DA QUITAÇÃO DO PREÇO – IMPOSSIBILIDADE DE CONVALIDAÇÃO DO NEGÓCIO – O ad-quirente de bem componente do monte é considerado terceiro juridicamente interessado em intervir no inventário. Legitimidade reconhecida. A ineficácia da cessão de bem singular componente do acervo hereditário enquanto pendente a indivisibilidade tem aplicação aos demais herdeiros. Como a inventariante, maior e capaz, era meeira e única herdeira dos bens do espólio de seu finado marido e alienou o imóvel no curso do inventário, não prevalece a vedação legal, permitindo-se a cessão de seu direito sobre toda a herança ou sobre coisa singular. Possibilidade de autorização judicial posterior, convalidando o negócio como forma de preservar os interesses de terceiro de boa-fé, desde que haja prova da quitação do preço e seja pago o imposto respectivo. Hipótese na qual

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o óbito da outorgada, sem dar o recibo de quitação ao promitente comprador, impede a convalidação do negócio. Conhecimento e desprovimento do recurso.

(Agravo de Instrumento nº 0020572-84.2014.8.19.0000, 22ª C.Cív., Des. Rogerio de Oliveira Souza, Julgamento: 19.08.2014)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – SUCESSÕES – CESSÃO DE DIREITOS HEREDI-TÁRIOS SOBRE BEM SINGULAR DO ESPÓLIO – PEDIDO DE HABILITAÇÃO DO CESSIONÁRIO – Conforme o § 2º do art. 1.793 do Código Civil, a cessão de direitos hereditários será ineficaz quando feita em relação a bem singular do espólio. Tal restrição legal indica que a falta dos requisitos legais tem reflexo no plano da eficácia do negócio. Ou seja, ainda que feita em relação a bem singular, a cessão de direitos existe e goza de presunção de validade. Disso se concluiu que, no momento em que o Código refere apenas a ineficácia do ne-gócio, projeta-se a possibilidade de que o contrato venha a ser eficaz, caso de implementada condições. E dentre as condições para futura eficácia do negócio está a concordância superveniente dos demais herdeiros, que não cederam seus direitos hereditários, a solvência do espólio para pagamento de dívidas ou a aco-modação do bem no quinhão do herdeiro cedente. Logo, a simples cessão de direitos hereditário sobre bem singular, por si só, não impede a habilitação do cessionário a fim de defender o seu direito. Recurso parcialmente provido.

(TJRS, Agravo de Instrumento nº 70052159977, 8ª C.Cív., Rel. Rui Portanova, Julgado em 19.06.2013)

Esse também é o parecer do 26º Tabelionato de notas de São Paulo/SP, um dos poucos no Brasil que adotaram essa corrente:

[...] a cessão de um bem individuado, dentre os que compõem o espólio, não é negócio jurídico inválido. Não é nulo, nem anulável. A censura da lei está no pla-no da eficácia. A cessão, neste caso, é ineficaz, não produz efeito, é inoponível aos demais herdeiros, dado que a herança é uma universalidade, e até a partilha, indivisível.

Todavia, a cessão que teve por objeto direito sobre bem determinado recobrir--se-á de eficácia, futuramente, se, na partilha, o aludido bem for efetivamente atribuído ao herdeiro cedente. A questão estará superada, e tudo se resolve. A eficácia opera ex tunc, até por imperativo da lógica e do bom senso.

(26º Tabelionato de Notas, São Paulo/SP. Disponível em: <https://www.26notas.com.br/blog/?p=1472>.)

Esse entendimento é o que melhor se adéqua à interpretação sistemática e teleológica das normas do novo Código Civil, atendendo também à realidade à qual se aplica, ampliando a efetividade da norma e a utilidade para os her-deiros cedentes.

Diante disso, é possível e necessária a lavratura da escritura pública de cessão de direitos hereditários, conforme exige o art. 1.793, caput, do Código

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Civil. O que se veda aos tabeliães é a lavratura de atos inválidos, e não de atos temporariamente ineficazes, como no caso em análise.

No entanto, é responsabilidade dos notários informar ao cessionário que os efeitos do ato negocial estão condicionados à partilha, em atendimento ao dever de informação, sob pena de serem responsabilizados por danos causados ao cessionário, conforme art. 22 da Lei nº 8.935/1994.

coNcLuSão

Atualmente, o Direito não é mais aplicado mediante uma interpretação puramente literal, sem que se busque uma melhor adequação às práticas sociais e aos princípios de direito. Por óbvio que os costumes não têm o condão de re-vogar, derrogar ou alterar o sentido de uma norma jurídica, mas orientam para a interpretação mais coerente, assim como os princípios de direito.

A interpretação sistemática no caso vertente é a mais adequada, visto que não analisa somente a norma em questão, mas o universo jurídico em que está inserido, que dá sentido às expressões utilizadas, a fim de que o intérprete possa fazer a adequada análise teleológica, ou seja, verificar a finalidade do legislador ao editar o comando legal.

De tudo examinado, primeiramente se pode concluir facilmente que é valida e eficaz a cessão onerosa ou gratuita, feita por um dos herdeiros, de seu quinhão hereditário ou fração ideal, conforme redação do caput do art. 1.793, o que independe de autorização judicial, sendo obrigatória a forma pública.

Em análise literal e lógica do mesmo dispositivo legal, a cessão de um bem singularmente considerado por todos os herdeiros é eficaz, desde que na forma prescrita.

Já a cessão feita pelo coerdeiro, de seu direito hereditário, sobre qualquer bem da herança considerado singularmente é ineficaz em relação aos demais herdeiros até que se homologue a partilha, passando a produzir todos os seus efeitos se o bem cedido vier a integrar o quinhão hereditário do cedente. Nesse caso, é dever do tabelião informar ao cessionário quanto à natureza condicional da cessão e seus efeitos futuros. Não há que se falar, portanto, em inobservância do direito de preferência dos demais herdeiros, visto que a cessão não produz efeitos em relação aos mesmos até a partilha.

Para produção de efeitos em relação aos demais herdeiros, a disposição, por qualquer herdeiro, de bem do acervo hereditário, pendendo a indivisibili-dade, depende de autorização judicial.

Sendo assim, é possível a lavratura de escritura pública de cessão de direitos hereditários de bem imóvel singularmente considerado feita por coer-deiro, o que facilitará a herdeiro cedente que tenha recursos para adimplir com

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custas e impostos do processo de inventário, além de trazer maior segurança aos cessionários e, consequentemente, benefícios ao mercado imobiliário.

reFerÊNcIASBRASIL. TJRJ, Acórdão em Agravo de Instrumento nº 0015876-39.2013.8.19.0000, Rel. Des. Adolpho Andrade Mello, Data do Julgamento: 27.08.2013, Publicação: 06.09.2013.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 26. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2009.

______. Curso de direito civil brasileiro: direito das sucessões. 23. ed. Reformulada. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: parte geral. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, v. I, 2008.

SOUZA, Silvio Capanema. A cessão de direitos hereditários. Questões Relevantes. Palestra proferida no I Encontro de Notários e Registradores na Região dos Lagos, Cabo Frio/RJ, out. 2008. Disponível em: <http://www.institutoalbergaria.com.br/new/eventos.php>. Acesso em: 25 set. 2014.

Disponível em: <http://www.tabelionatoitajai.com.br/cessatildeo-de-direitos.html#/>. Acesso em: 13 jun. 2015, às 10:03.

Disponível em: <http://www.cartorio15.com.br/conteudo/escrituras-relativas-a-imo-veis>. Acesso em: 13 jun. 2015, às 10:15.

Disponível em: <http://tabelionatodeamargosa.blogspot.com.br/2012_05_01_archive.html>. Acesso em: 20 ago. 2015, às 13:08.

Disponível em: <http://cartorio6oficio.com.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=84:o-novo-codigo-civil&catid=37:artigos&Itemid=96>. Acesso em: 20 ago. 2015, às 13:25.

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Parte Geral – Doutrina

Regularização Fundiária: Extinção de Condomínio Rural

DOLGLAS EDuARDOAdvogado (OAB/MG 125.162), militante nas áreas Empresarial, Obrigações, Responsabilida-de Civil, Contratos, Família, Sucessões, Consumidor e Trabalhista, Graduado em Direito pelo Unipam, Especialista em Direito Empresarial pela Estácio de Sá, Pós-Graduado em Gestão Pública pela UFU, Pós-Graduando em Direito Civil e Processo pelo Instituto Elpídio Donizetti.

A extinção de condomínio rural é um problema que afeta milhares de proprietários rurais em todo o Brasil.

A maioria das situações se dá em razão de imóveis recebidos por heran-ça, na qual os herdeiros fazem o inventário, registram o formal de partilha e mantêm o registro do imóvel em comum.

Com o passar dos anos, os herdeiros vão morrendo, vendendo suas par-tes, e o registro permanece em comum; eles só se dão conta do problema quan-do vão realizar algum trâmite em órgãos públicos, e se exige a anuência de todos os demais condôminos.

Além disso, é indiscutível que a pluralidade de proprietários sobre um imóvel é fonte de conflitos. E é diante dessas situações que se busca a extinção do condomínio rural.

A legislação brasileira prevê três possibilidades para a extinção do con-domínio, quais sejam: (1) por escritura de divisão amigável; (2) por ação judicial de divisão; e (3) por escritura de estremação.

eScrIturA de dIVISão AmIgáVeL de coNdomÍNIo

A extinção do condomínio rural pode ser feita por escritura, desde que todos os coproprietários sejam maiores e capazes e expressamente concordem com a divisão1.

Entre os trâmites para a lavratura da escritura, exigem-se2: (1º) a averba-ção do georreferenciamento do imóvel; (2º) a conferência se as áreas resultantes

1 NCPC: “Art. 571. A demarcação e a divisão poderão ser realizadas por escritura pública, desde que maiores, capazes e concordes todos os interessados, observando-se, no que couber, os dispositivos deste Capítulo”.

2 Provimento nº 260/CGJMG/2013: “Art. 177. É dever do tabelião de notas orientar a parte interessada a proceder à averbação do georreferenciamento no Ofício de Registro de Imóveis anteriormente à lavratura da escritura pública nos casos exigidos em lei, constando a advertência na escritura pública. § 1º Para lavratura da escritura, o tabelião de notas deverá conferir se as áreas resultantes são compatíveis com as áreas originais, bem como se restará caracterizada transmissão de parte ideal, a ser formalizada previamente com recolhimento de ITBI ou ITCD, conforme a transmissão seja onerosa ou gratuita. § 2º Serão exigidos, ainda, se já averbada a reserva legal, memoriais descritivos de sua distribuição entre as áreas resultantes, sem que

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são compatíveis com as áreas originais; e (3º) os memoriais descritivos acompa-nhados da Anotação de Responsabilidade Técnica ou do respectivo Registro de Responsabilidade Técnica do profissional responsável.

Há que se ressaltar ainda que somente será possível a divisão se as áreas partilhadas forem superiores à fração mínima de parcelamento3.

Cumpridos os requisitos, lavrar-se-á a escritura de divisão, que, registra-da, extinguirá todo o condomínio, fixando a propriedade individual de cada um.

Ação de dIVISão de coNdomÍNIo

Uma outra hipótese para extinção do condomínio rural é a ação judicial de divisão.

A legislação brasileira assegura a qualquer dos condôminos o direito de exigir judicialmente a divisão de imóvel comum4. Por ser um procedimento um pouco mais demorado, tal hipótese somente se justifica quando inexistir acordo entre os todos condôminos quanto à divisão.

Frise-se que também na ação de divisão somente será possível a divi-são se as áreas partilhadas forem superiores à fração mínima de parcelamento. Quando insuscetível de divisão e não houver acordo quanto à venda amigável, o imóvel será vendido judicialmente, partilhando-se o valor apurado5.

O procedimento da ação de divisão encontra-se definido nos arts. 588 a 598 do novo Código de Processo Civil.

Proferida a sentença e registrado o auto de partilha, extinguir-se-á todo o condomínio, fixando a propriedade individual de cada um.

seja deslocada a área averbada, salvo com autorização do órgão ambiental competente. Todos os trabalhos técnicos deverão estar acompanhados da respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica – ART ou do respectivo Registro de Responsabilidade Técnica – RRT do profissional responsável. § 3º As áreas resultantes da divisão de imóvel rural deverão ser equivalentes ou superiores à fração mínima de parcelamento – FMP”.

3 Fração mínima de parcelamento: é a menor área em que um imóvel rural, num dado município, pode ser desmembrado. Corresponde ao módulo de exploração hortigranjeira da Zona Típica de Módulo (ZTM) a que o município pertencer. Ao ser parcelado o imóvel rural, para fins de transmissão a qualquer título, a área remanescente não poderá ser inferior a FMP (disponível em: <http://www.incra.gov.br/o-que-e-fracao- -minima-de-parcelamento-fmp>. Acesso em: 5 jul. 2016).

4 Código Civil: “Art. 1.320. A todo tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa comum, respondendo o quinhão de cada um pela sua parte nas despesas da divisão”.

5 Código Civil: “Art. 2.019. Os bens insuscetíveis de divisão cômoda, que não couberem na meação do cônjuge sobrevivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor apurado, a não ser que haja acordo para serem adjudicados a todos”.

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eScrIturA de eStremAção6

Uma terceira hipótese para extinção de condomínio é a escritura de es-tremação, quem tem como objetivo regularizar uma situação consolidada de fato.

6 Provimento nº 260/CGJMG/2013: “Art. 1.012. Nas circunscrições imobiliárias possuidoras de condomínios rurais pro diviso que apresentem situação consolidada e localizada, a regularização de frações com abertura de matrícula autônoma, respeitada a fração mínima de parcelamento, será feita com a anuência dos confrontantes das parcelas a serem individualizadas. § 1º Para as situações consolidadas até a vigência deste Provimento, deverá ser comprovado pelo requerente o período de 5 (cinco) anos de ocupação retroativa, e, para aquelas consolidadas após a vigência deste Provimento, o período de 10 (dez) anos para que seja procedida a regularização, respeitando-se em todos os casos a fração mínima de parcelamento. § 2º A identificação do imóvel a regularizar obedecerá ao disposto nos arts. 176, II, 3, e 225 da Lei dos Registros Públicos.

Art. 1.013. A instrumentalização do ato para fins de localização da parcela será feita mediante escritura pública declaratória, ou por instrumento particular nos casos do art. 108 do Código Civil. § 1º É obrigatória a intervenção na escritura pública ou no instrumento particular de todos os confrontantes da gleba a localizar, sejam ou não condôminos na área maior. § 2º O município, o Estado e a União, ou seus órgãos representativos, serão notificados pelo oficial de registro em todos os procedimentos em que o imóvel (parcela) a ser localizado fizer divisa com vias públicas (estrada, rua, travessa, corredor, etc.), arroio, rio, lago, etc. § 3º Quando utilizado o instrumento particular, as assinaturas deverão ter suas firmas reconhecidas. § 4º Na impossibilidade de obtenção da anuência de qualquer confrontante no ato notarial, ou no instrumento particular, será ele notificado pelo oficial de registro a manifestar-se no prazo de 15 (quinze) dias, seguindo-se o procedimento previsto no art. 213, §§ 2º a 6º, da Lei dos Registros Públicos.

Art. 1.014. Tratando-se de simples localização de parcela, será desnecessária a retificação da descrição do imóvel, desde que da escritura pública conste referência expressa à apresentação dos seguintes documentos: I – título de domínio; II – CCIR; III – prova de quitação do ITR; IV – certidão das benfeitorias expedida pela Prefeitura Municipal; V – planta e memorial descritivo. Parágrafo único. Os documentos mencionados neste artigo serão encaminhados com a escritura pública e, ainda, com a ART do CREA ou RRT do CAU relativos ao profissional responsável, devidamente quitados.

Art. 1.015. A escritura pública declaratória ou o instrumento particular serão protocolizados no Ofício de Registro de Imóveis da circunscrição de localização do imóvel, devendo o oficial de registro verificar sua regularidade em atenção aos princípios registrais. § 1º O oficial de registro localizará a gleba, lavrando ato de registro, a exemplo do que ocorre com as escrituras de divisão, do que resultará a abertura da respectiva matrícula para a parcela localizada. § 2º Tratando-se de localização cumulada com retificação de descrição da gleba, o oficial de registro praticará 2 (dois) atos: a averbação desta e o registro daquela.

Art. 1.016. A adoção do procedimento previsto neste Provimento não exclui a possibilidade de efetivação de escritura pública de divisão ou ajuizamento de ação de divisão, restando ao interessado a opção, respeitadas as circunstâncias de cada caso.

Art. 1.017. Na eventualidade da incidência de cláusulas, ônus ou gravames sobre a parcela objeto da localização ou retificação, serão observadas as providências abaixo: I – no caso de hipoteca, não será necessária a anuência do credor hipotecário, devendo o oficial de registro, todavia, comunicar-lhe a realização do registro da localização da parcela; II – no caso de penhora, não será necessária prévia autorização judicial para o registro e/ou retificação, devendo o oficial de registro, todavia, comunicar o fato ao juízo, mediante ofício; III – no caso de penhora fiscal em favor do INSS, havendo o devedor ofertado o imóvel em garantia da dívida, não será admitida a localização da gleba sem a expressa anuência daquela autarquia federal, uma vez que a medida determina a indisponibilidade do bem, na forma do art. 53 da Lei nº 8.212/1991; IV – no caso de anticrese, é indispensável a anuência do credor anticrético; V – no caso de propriedade fiduciária, a localização da parcela será instrumentalizada em conjunto pelo credor e pelo devedor; VI – no caso de usufruto, a localização será obrigatoriamente firmada pelo nu-proprietário e pelo usufrutuário; VII – no caso de indisponibilidade por determinação judicial ou ato da Administração Pública federal, não será admitido o processamento, uma vez que consiste em ato de disposição; VIII – na hipótese de estar a parcela sob arrolamento, medida de cautela fiscal, possível o registro da localização, devendo o oficial de registro, todavia, comunicar o fato imediatamente ao agente fiscal; IX – no caso da incidência de outros ônus, cláusulas e gravames não expressamente previstos neste artigo, será aplicada a regra qualificatória inerente às escrituras públicas de divisão.

Art. 1.018. A necessidade ou não de prévio georreferenciamento da parcela a ser localizada será determinada de acordo com as normas da legislação federal”.

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O primeiro aspecto a se observar para a escritura de estremação é que o imóvel já deve estar dividido de fato há algum tempo, com a área de cada condômino devidamente delimitada e separada dos demais, de modo que cada condômino exerça a sua posse com exclusividade, sem intervenção dos demais.

O diferencial da escritura de estremação é que não é necessária a parti-cipação de todos os condôminos, nem a regularização de todo o imóvel, mas tão somente da parte do condômino interessado que exerce a posse exclusiva de sua parte.

A escritura de estremação é sem dúvida o procedimento mais simples para extinção do condomínio, sendo necessária somente a contratação de um profissional habilitado para elaboração do mapa e do memorial descritivo, com anotação de responsabilidade técnica.

É necessário ainda que se cumpram os seguintes requisitos: (1) que a área a ser separada, bem como a restante do condomínio, seja superior à fração mínima parcelável; (2) que o proprietário esteja na posse do imóvel há no míni-mo cinco anos; e (3) que todos os confrontantes da gleba estejam de acordo e reconheçam o tempo de posse.

A estremação poderá ser instrumentalizada por escritura pública declara-tória ou por instrumento particular, quando a gleba tiver valor igual ou inferior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País.

Concluído, a escritura será protocolada no Registro de Imóveis, e, sendo verificada a regularidade, o oficial de registro localizará a gleba, lavrando ato de registro, abrindo nova matrícula para a parcela localizada.

reFerÊNcIASBRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil.

______. Lei nº 13105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.

CORREGEDORIA-GERAL de Justiça do Estado de Minas Gerais. Provimento nº 260, de 18 de outubro de 2013. Provimento nº 260/CGJ/2013. Disponível em: <http://www8.tjmg.jus.br/institucional/at/pdf/cpr02602013.pdf>. Acesso em: 5 jul. 2016.

DINIZ, Lauro (Minas Gerais). Federação de Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais. Escritura de estremação. Disponível em: <http://www.sistemafaemg.org.br/Conteudo.aspx?Code=9401&Portal=2&ParentCode=9400&ParentPath=None&ContentVersion=R>. Acesso em: 5 jul. 2016.

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Parte Geral – Doutrina

Incidência de Alíquota Diferenciada do IPTU no Condomínio Fechado

MuRILO BARRETO DO nASCIMEnTOAdvogado.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O Imposto Predial e Territorial Urbano e sua regra-matriz; 1.1 Os critérios da hipótese do IPTU; 1.1.1 Critério material; 1.1.2 Critério espacial; 1.1.3 Critério temporal; 1.2 Critérios do consequente do IPTU; 1.2.1 Critério pessoal; 1.2.2 Critério quantitativo; 2 A extrafiscalidade do IPTU e a função social da propriedade; 2.1 A fiscalidade e extrafiscalidade do IPTU; 2.2 O princípio da função social da propriedade na Constituição Federal de 1988; 2.3 Do cumprimento da função social pelos imóveis insertos no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol; 2.4 O condomínio fechado: o Poder Público não paga a conta; 3 A alíquota diferenciada do IPTU e vedação ao confisco tributário; 4 A alíquota diferenciada e a jurisprudência atual; Conclusão; Referências.

INtrodução

O presente trabalho versa sobre a aplicabilidade da alíquota diferenciada do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para imóveis localizados dentro dos chamados condomínios fechados.

O primeiro capítulo dedica-se ao estudo da regra-matriz de incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano, estudando os componentes preconiza-dos por Paulo de Barros Carvalho, objetivando destrinchar cada elemento que compõe a exação em estudo, buscando entender a origem e fundamentação da alíquota, elemento que é um dos critérios do consequente da norma tributária sob análise.

O capítulo segundo dedicar-se-á ao estudo da fiscalidade e extrafisca-lidade do tributo, principalmente a extrafiscalidade e o seu elo com a função social da propriedade em se tratando do IPTU. Para tanto, verificar-se-á a gê-nese do princípio da função social da propriedade na Constituição Federal, analisando, em sequência, se os lotes de terrenos não edificados e se os muros, insertos no condomínio fechado, cumprem sua função social. Em tal oportuni-dade, passaremos brevemente pelo direito material civil e administrativo, com vistas a entender esse novo fenômeno de moradia das metrópoles brasileiras, o condomínio ou loteamento fechado, que é marcado por sua autossuficiência em relação ao Poder Público.

O capítulo terceiro dedica-se ao estudo de casos provenientes da juris-prudência nacional, que demonstram correlação ao tema em voga, objetivando constatar a maneira como os Tribunais Superiores têm entendido a alíquota diferenciada nos mais diversos tributos, constatando, em seguida, que a dife-

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renciação ou seletividade de alíquotas é instrumento de extrafiscalidade de um tributo e, por tal razão, deve ser aplicado com a finalidade de induzir ou coibir determinado comportamento decorrente da Carta Maior. Constatada que a alí-quota diferenciada não é imposta ao contribuinte com a finalidade de promover o cumprimento de determinado preceito constitucional, não há como sustentar sua legalidade.

Por fim, será possível concluir que a aplicação de alíquotas diferencia-das, praticada pelo Município de Rio das Ostras, em relação aos lotes de terreno não edificados e murados do condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol, é realizada de forma a não obedecer aos comandados constitucionais para a sua validade.

1 o ImpoSto predIAL e terrItorIAL urbANo e SuA regrA-mAtrIZ

O Imposto Predial e Territorial Urbano é exação prevista na Carta Maior, precisamente em seu art. 156, inciso I. Os arts. 32 e seguintes do Código Tribu-tário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966) tratam da matéria em âmbito infraconstitucional.

De acordo com Costa (2014), a Constituição da República Federativa do Brasil é a principal fonte do Direito Tributário no território nacional, eis que disciplina o sistema tributário e abriga os contornos da relação tributária que se estabelecerá entre o Fisco, representado pelos entes tributantes, e o contribuinte de cada exação que é delineada no Texto Constitucional.

A supracitada doutrinadora acrescenta, ainda, que essa preocupação do poder constituinte originário é peculiar ao Sistema Tributário Nacional, citando como exemplos as Constituições da Argentina (1853), da Espanha (1978), da França (1958) e da Itália (1947), que dedicam apenas dois ou três artigos ao trato da matéria tributária.

Como consequências lógicas dessa peculiaridade, tem-se a rigidez para a modificação da estrutura básica do Sistema Tributário Nacional e a restri-ta liberdade outorgada aos legisladores ordinário e complementar. A primeira, refere-se ao fato de a Constituição brasileira ser rígida, tendo em vista que con-templa um processo especial para sua modificação, muito mais complexo do que o processo legislativo para a produção de uma norma ordinária. Tal rigidez, dessa forma, transmite-se ao Sistema Tributário Nacional, que somente poderá ser modificado, em sua estrutura essencial, por meio de emenda constitucional.

A segunda consequência decorre, de certa forma, da primeira. Como a Constituição disciplina a estrutura básica do Sistema Tributário Nacional, o legislador infraconstitucional fica com sua liberdade para legislar restrita, pois tem que se atentar para as balizas predeterminadas no Texto Maior.

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Com o Imposto Predial e Territorial Urbano foi um pouco diferente, vez que o poder constituinte deixou em aberto, ao legislador ordinário municipal, um grande campo para sua atuação. É que o constituinte permitiu ao ente tribu-tante municipal: i) criar um único imposto cujo campo de incidência abranja, assim, os imóveis edificados como os não edificados; ii) instituir dois impostos, um cujo campo de incidência se limite aos imóveis edificados e outro gravando os imóveis sem edificação.

Se o legislador municipal optar pela criação de um único imposto, pode-rá, ainda, escolher umas das seguintes alternativas: i) a exação será obtida pela aplicação, sobre o valor venal do imóvel, de uma única alíquota; ii) a exação será obtida pela soma da aplicação de uma alíquota sobre o valor do terreno e de uma alíquota sobre o valor das edificações. Acaso o legislador municipal opte pela criação de dois impostos, pode, dessa forma, adotar: (i) uma só alí-quota para os dois impostos como (ii) definir alíquotas diferenciadas para um e outro. Ademais, ante a criação de dois impostos, seria possível, inclusive, em caso de ser o imóvel edificado, a aplicação de uma alíquota sobre o valor do terreno e outra sobre o valor da edificação.

Conforme se verifica, apesar de a Constituição de 1988 delinear os con-tornos da relação tributária, a margem constitucional conferida ao legislador in-fraconstitucional pelo legislador constituinte, em se tratando do Imposto Predial e Territorial Urbano, é largo o bastante para abarcar as mais variadas opções pelo legislador municipal.

Nesse sentido, assevera Aires F. Barreto:

Vários são os impostos sobre os quais a Constituição dispôs de forma minudente. Esse caminho, todavia, não foi perfilhado em relação ao IPTU. É razoavelmente amplo o espectro de opções cometido ao legislador ordinário do IPTU. Nada obstante os contornos traçados pela Constituição não possam ser ultrapassados, o perímetro constitucional é suficientemente largo para abrigar os mais variados caminhos engendrados pelo legislador municipal. (2013)

A título de exemplificação, eis que haverá item próprio para o tratamento da matéria, em se tratando do Imposto Predial e Territorial Urbano do Municí-pio de Rio das Ostras/RJ, o legislador ordinário municipal optou pela criação de dois impostos: um para imóveis edificados e outro para imóveis não edificados, adotando alíquotas diferenciadas para um e outro. É o que se extrai a partir da leitura do art. 56 do Código Tributário Municipal de Rio das Ostras (Lei Muni-cipal nº 508, de 2000).

O legislador, ao criar uma norma, objetiva, por meio dela, transmitir uma mensagem que não é possível compreender apenas com a chamada interpreta-ção literal. Acaso a literalidade prevalecesse como método de interpretação do direito, seríamos forçados a admitir que os meramente alfabetizados, quem sabe

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com o auxílio de um dicionário jurídico, estariam aptos a identificar a substân-cia das mensagens legisladas (Carvalho, 2013).

Ora, as normas jurídicas são as significações que a leitura do texto des-perta em nosso espírito e nem sempre coincidem com os artigos em que o legis-lador distribui a matéria no campo escrito da lei. O texto escrito é simplesmente a porta de entrada para o processo de apreensão da vontade da lei que não pode ser confundida com a intenção do legislador.

No processo interpretativo da norma, o hermeneuta terá que socorrer-se de diversos textos legislativos, bem como buscar por entre os diferentes diplo-mas normativos a integridade existencial da mensagem legislada que pode ser alcançada por meio das significações construídas a partir dos enunciados pres-critos pelo legislador, estruturadas na forma hipotético-condicional.

Tomazini (2009) aduz que toda estrutura normativa é composta por duas proposições: hipótese (H) e consequente (C). A função da primeira é descrever uma situação de possível ocorrência, que funciona como causa para o efeito jurídico almejado pelo legislador. A segunda tem a função de delimitar um vínculo relacional entre dois sujeitos, que se consubstancia no efeito almejado. Essas duas proposições são ligadas por um conectivo condicional, cuja função é estabelecer o liame entre a causa e o efeito ao imputar a relação prescrita no consequente normativo, caso verificada a situação descrita na hipótese.

A esse fenômeno de que permite ao intérprete decompor a norma jurídi-ca, devassando suas significações, Paulo de Barros Carvalho denomina regra--matriz de incidência:

Ora, a regra-matriz de incidência tributária é, por excelência, uma norma de conduta, vertida imediatamente para disciplinar a relação do Estado com seus súditos, tendo em vista contribuições pecuniárias. Concretizando-se os fatos des-critos na hipótese, deve-ser a consequência, e esta, por sua vez, prescreve uma obrigação patrimonial. Nela, encontraremos uma pessoa (sujeito passivo) obri-gada a cumprir uma prestação em dinheiro. Eis o dever-ser modalizado. (2013)

Importante salientar que a regra-matriz de incidência pode ser aplicada para deflagrar qualquer norma. Trataremos, no presente trabalho, acerca da re-gra-matriz em matéria tributária, pelo que, nas linhas que seguem, para melhor elucidação do tema, demonstrar-se-á a regra-matriz de incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano.

1.1 os critérios da hipótese do iptu

Ainda de acordo com Tomazini (2009), na hipótese normativa o legis-lador seleciona notas que os acontecimentos sociais têm que ter para serem considerados fatos jurídicos. A hipótese não contém o evento, tampouco o fato

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jurídico. Ela descreve uma situação futura e estabelece critérios que identificam sua ocorrência no tempo e no espaço.

Considerando que todo fato é um acontecimento determinado por coor-denadas de tempo e espaço e que a função da hipótese é oferecer as coordena-das que permitam reconhecer um acontecimento quando ele ocorra, Carvalho (2013) elegeu três critérios identificadores do fato, em se tratando da hipótese de incidência: i) critério material; ii) critério espacial; e iii) critério temporal. Vejamos, separadamente, cada um deles.

1.1.1 critério material

Carvalho (2013) aduz que, no critério material, há referência a um com-portamento de pessoas, físicas ou jurídicas, condicionado por circunstâncias de espaço e tempo (critério espacial e temporal).

O referido doutrinador faz crítica de elevada importância no que se re-fere ao fato de muitos autores depararem com grandes dificuldades para pro-mover o isolamento do critério material e acabam por desenhar, como critério material, todo o perfil da hipótese tributária, confundido o núcleo da hipótese normativa com a própria hipótese.

A partir da análise dos arts. 32 e seguintes do Código Tributário Nacional, é possível identificar o critério material do Imposto Predial e Territorial Urbano como: ser proprietário, titular do domínio útil ou possuidor de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil.

De acordo com Gonçalves (2014), tarefa árdua é conceituar a proprie-dade, vez que o art. 1.228 do Código Civil brasileiro limita-se a enunciar os poderes do proprietário, deixando de oferecer uma definição para o instituto. O referido autor, considerando os poderes insertos no artigo citado, o define como “o poder jurídico atribuído a uma pessoa de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, em sua plenitude e dentro dos limites estabelecidos na lei, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha” (2014).

Para melhor compreensão do conceito de domínio útil, necessário se faz saber o que é enfiteuse. O art. 2.028 do Código Civil vigente proíbe a consti-tuição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando as que ainda existem, após a entrada em vigor do referido diploma legal, às disposições do Código Civil anterior, ou seja, o de 1916.

Segundo Gonçalves (2014),

dá-se a enfiteuse, aforamento ou emprazamento “quando por ato entre vivos, ou de última vontade, o proprietário atribui a outrem o domínio útil do imóvel, pa-gando a pessoa, que o adquire, e assim se constitui enfiteuta, ao senhorio direto uma pensão, ou foro, anual, certo e invariável” (CC/1916, art. 678).

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Na enfiteuse, o proprietário da coisa é chamado de senhorio direto, en-quanto a pessoa a qual é transferido o domínio útil sobre a coisa é nominada de enfiteuta e terá, sobre a coisa, um poder muito amplo. O senhorio direito praticamente conservará apenas o nome de dono e alguns poucos direitos, que se manifestam em ocasiões restritas (Gonçalves, 2014).

Insta salientar que apesar de o Código Civil vigente ter proibido a cons-tituição de enfiteuse e subenfiteuses, manteve, contudo, o direito adquirido às enfiteuses em vigor, bem como substituiu o instituto pelo direito de superfície inserto nos arts. 1.369 do Diploma Civil atual.

Sobre o tema, esclarece Gonçalves:

O Código Civil de 2002 aboliu a enfiteuse, substituindo-a pelo direito de su-perfície gratuito ou oneroso. Considera-se vantajosa a substituição porque este último permite melhor e mais ampla utilização da coisa. Se o proprietário de uma área de terras não tiver recursos para explorá-la, poderá cedê-la a alguém em superfície para, na referida gleba, por exemplo, construir e explorar um hotel. Alguns países, todavia, mantêm em seus códigos a superfície ao lado da enfiteu -se, distinguindo-lhes as finalidades, como o faz o Código Civil italiano, ou não as distinguindo, como ocorre com o Código Civil português. Pelo novo instituto, uma pessoa cujo terreno não seja apropriado para a construção que pretende erigir pode, por exemplo, permutar o uso do solo, temporariamente, mantendo a propriedade deste, com outra pessoa que possua terreno que atenda às suas necessidades, cedendo, por outro lado, a esta, que nele tem interesse, o direito de superfície de seu imóvel. (2014)

Da intepretação do brilhante conceito apresentado por esse doutrinador, em sua obra Direito das coisas, é possível extrair que o direito de superfície é a permissão que o proprietário outorga a outrem, por tempo determinado e mediante escritura pública devidamente registrada, para construir sobre o seu terreno.

Para fins tributários, notadamente os efeitos do Imposto Predial e Territo-rial Urbano, o beneficiário do direito de superfície é contribuinte em potencial da exação em comento, porquanto retira do bem as utilidades que ele é capaz de produzir.

Quanto à posse, André Puccinelli Júnior (2014) conceitua o instituto:

Posse é uma situação fática com carga potestativa que, em decorrência da rela-ção socioeconômica formada entre um bem e o sujeito, produz efeitos que se re-fletem no mundo jurídico. O seu primeiro e fundamental elemento é, portanto, o poder de fato, que importa na sujeição do bem à pessoa e no vínculo de senhoria estabelecido entre o titular e o bem respectivo.

O art. 1.196 do Código Civil brasileiro aduz que se considera possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes

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inerentes à propriedade. Por sua vez, o art. 1.228 do mesmo diploma legal dis-põe acerca dos poderes de propriedade: usar, gozar e dispor da coisa, além do direito de reavê-la do poder de quem injustamente a possua ou detenha.

Segundo Puccinelli (2014), o art. 1.196 do Código Civil brasileiro é a tradução literal da teoria objetiva preconizada por Ihering, que define a posse como sendo a exteriorização da propriedade, de forma que alguém que aparen-tar ser proprietário terá posse.

Partindo de tal premissa, Tomazini (2014) conclui que, embora o locatá-rio e arrendatário de imóvel exerçam posse sobre o imóvel, esses não são con-tribuintes do Imposto Predial e Territorial Urbano, eis que a posse que exercem não é ad usucapionem, ou seja, os atos de mera permissão ou tolerância não induzem posse com ânimo de dono. Salienta, contudo, a autora que há possibi-lidade de o arrendatário e locatário serem contribuintes do IPTU, uma vez que nos contratos que regulam a transferência da posse (contrato de arrendamento e contrato de locação) é possível transferir também a responsabilidade tributária.

Como último conceito relevante, contudo, não menos importante, ainda dentro do critério material da hipótese, resta devassar bem imóvel por natureza e bem imóvel por acessão física, tendo em vista que é a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem móvel por natureza ou por acessão física, com definido na lei civil, o critério material da hipótese da norma jurídica em análise.

O art. 79 do Código Civil vigente define bem imóvel com o solo e tudo quanto lhe incorporar natural ou artificialmente. Ricardo Alexandre (2014) as-severa, contudo, que não há na lei civil vigente a definição de bens imóveis por natureza. É que à época da edição do Código Tributário Nacional estava vigente o Código Civil de 1916, no qual havia definição para bem imóvel por natureza. Conclui o autor que é possível usar tal conceito emprestado no Código Civil de 1916, revogado, no qual há a definição de serem bens imóveis por natureza o solo com a sua superfície, os seus acessórios e adjacências naturais, compreen-dendo as árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo.

Por sua vez, são bens imóveis por acessão física tudo quanto o homem incorporar permanentemente ao solo, como a semente lançada à terra, os edifí-cios e as construções, de modo que não se possa retirar sem destruição, modifi-cação, fratura ou dano (Alexandre, 2014).

Tem-se, assim, a deflagração do critério material da hipótese de incidên-cia do Imposto Predial e Territorial Urbano.

1.1.2 critério espacial

Tomazini (2009), em sua tese de doutorado orientada por Paulo de Barros Carvalho, dispõe que critério espacial é a expressão, ou enunciado, da

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hipótese que delimita o local em que o evento, a ser promovido à categoria de fato jurídico, deve ocorrer.

Verifica-se, então, que o critério material é a expressão da hipótese que delimita o núcleo do acontecimento a ser promovido à categoria de fato jurídi-co. Concluímos que, em se tratamento do Imposto Predial e Territorial Urbano, o critério material desdobra-se em ser proprietário, titular de domínio útil ou possuidor de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil.

Ocorre que esse critério material não pode ocorrer em qualquer lugar para efeitos de tributação do IPTU, mas sim em lugar delimitado na própria norma para que esse evento (ser proprietário, titular de domínio útil ou possui-dor de bem imóvel) seja adequado juridicamente do ponto de vista tributário. É justamente essa a finalidade do critério espacial: delimitar o local em que o evento deve ocorrer.

Nesse sentido, preconiza o art. 32 do Código Tributário Nacional que o critério material tem que ocorrer na zona urbana do Município. Em outras pala-vras, é preciso ser proprietário, titular de domínio útil ou possuidor de bem imó-vel por natureza ou acessão física, dentro dos limites da zona urbana municipal.

O § 1º do mesmo dispositivo deixa a cargo do legislador municipal a definição de zona urbana, estabelecendo, contudo, a necessidade de presença de pelo menos dois melhoramentos que indica como necessários para configu-ração de zona urbana. São eles: meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais, abastecimentos de água, sistema de esgotos sanitários, rede de iluminação pública, escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de três quilômetros do imóvel considerado.

O § 2º do mesmo dispositivo ainda permite que a lei municipal consi-dere como área urbana as urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora da zona urbana.

1.1.3 critério temporal

Compreendemos o critério temporal da hipótese tributária como o grupo de indicações, contidas no suposto da regra, e que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passan-do a existir a obrigação jurídica, entendida como o liame jurídico que amarra devedor e credor, em função de um objeto – o pagamento de certa prestação pecuniária (Carvalho, 2013).

O tempo determinado para fixação do critério temporal do IPTU é o dia primeiro dia de janeiro de cada ano. Todavia, deve se observar que não há em-pecilhos para que os Municípios fixem data diferente em razão da autonomia tributária. Podendo, dessa forma, a lei municipal, de acordo com a faculdade

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prevista no art. 144, § 2º, do CTN, estipular o momento em que se dá a concre-tização da hipótese de incidência por ficção jurídica.

Conforme se depreende, a hipótese da norma tributária, o IPTU, consiste em ser proprietário, titular de domínio útil ou possuidor de bem imóvel por na-tureza ou acessão física, localizado na zona urbana municipal, no primeiro dia do ano civil. Em havendo a hipótese, logicamente haverá uma consequência que falaremos nas linhas que seguem.

1.2 critérios do consequente do iptu

A função do consequente é definir os critérios do vínculo a ser interposto entre duas ou mais pessoas em razão da ocorrência do fato jurídico. No conse-quente, o legislador seleciona as notas que devem ter as relações intersubjetivas a serem instauradas com a verificação do fato jurídico.

Segundo Carvalho (2013):

[...] o consequente, como prescritor, nos dá, também, critérios para a identifica-ção do vínculo jurídico que nasce, facultando-nos saber quem é o sujeito porta-dor do direito subjetivo; a quem foi cometido o dever jurídico de cumprir certa prestação; e seu objeto, vale dizer, o comportamento que a ordem jurídica espera do sujeito passivo e que satisfaz, a um só tempo, o dever que lhe fora atribuído e o direito subjetivo de que era titular o sujeito pretensor. (2013)

Para identificarmos o aparecimento de uma relação jurídica, dois são os critérios necessários: critério pessoal e critério quantitativo. Analisemos cada um deles isoladamente.

1.2.1 critério pessoal

Critério pessoal é o conjunto de elementos, colhidos na hipótese da nor-ma, e que nos aponta quem são os sujeitos da relação jurídica a ser instaurada quando da verificação do fato jurídico tributário: de um lado, sujeito ativo ou credor; do outro, sujeito passivo ou devedor (2013).

O sujeito ativo do Imposto Predial e Territorial Urbano é ente federativo competente para sua instituição, o Município. Tal conclusão é possível a par-tir da leitura do art. 119 do Código Tributário Nacional. O sujeito passivo da exação em voga está explícito no art. 34 do Código Tributário Nacional, que dispõe que é contribuinte o proprietário do imóvel, o titular do domínio útil ou seu possuidor.

1.2.2 critério quantitativo

O conjunto de informações que o intérprete obtém da leitura atenta dos textos legais, e que lhe faz possível precisar, com segurança, a exata quantia

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devida a título de tributo, é aquilo que chamamos de critério quantitativo do consequente das normas tributárias. Há de vir sempre explícito pela conjugação de duas entidades: base de cálculo e alíquota, e sua pesquisa esperta inusitado interesse, posto que é de suma relevância para desvelar peculiaridades ínsitas à natureza do gravame (2013).

Da explicação supra, é possível extrair que esse grupo de informações, composto pela base de cálculo e alíquota, é que precisará com segurança a exa-ta quantia devida a título de imposto, ou seja, o quanto o sujeito ativo poderá cobrar do sujeito passivo.

O art. 33 do Código Tributário Nacional brasileiro dispõe que a base de cálculo do IPTU é o valor venal do imóvel, não se considerando o valor dos bens móveis mantidos em caráter permanente ou temporário no imóvel. Para Sabbag (2014), valor venal é o preço à vista que o imóvel alcançaria se coloca-do à venda em condições normais no mercado imobiliário.

Sobre a alíquota, convém aduzir:

Sabe-se que a alíquota, a par da base de cálculo, é uma grandeza dimensional do fato gerador. Revela-se por meio de índice de percentagem, que permitirá a afe-rição do quantum tributário a pagar. Naturalmente, avoca a inafastável previsão em lei, em homenagem ao princípio da legalidade tributária (art. 97, IV, do CTN), cuja mitigação se dá apenas nos casos dos tributos extrafiscais (II, IE, IPI, IOF, Cide-Combustível e ICMS-Combustível). O IPTU, no plano das alíquotas, por não fazer parte do rol retrocitado, não pode se distanciar da estrita legalidade. (2014)

Não há na Carta Maior dispositivo prevendo um “teto” da percentagem a ser aplicada sobre a base de cálculo. A não limitação encontra baldrame na diversidade das características regionais, a exigir tratamento de acordo com as peculiaridades socioeconômicas das milhares de comunas brasileiras. Nem por isso pode ser desmedida a estipulação desse percentual, de sorte a tornar o imposto confiscatório (Barreto, 2009).

Assim, a alíquota a ser aplicada por cada Município, em sua respectiva jurisdição, deverá estar prevista em lei, não podendo, contudo, ser desmedida, sob pena de confisco.

2 A eXtrAFIScALIdAde do Iptu e A FuNção SocIAL dA proprIedAde

No capítulo anterior, falamos acerca da regra-matriz de incidência da exação tributária, notadamente a regra-matriz do Imposto Predial e Territorial Urbano, perpassando pelos entornos da relação e competência tributária do tributo em comento. Ainda em solo de competência tributária, necessário se faz discorrer acerca da fiscalidade e, principalmente, da extrafiscalidade do tributo, especificamente a extrafiscalidade quando o assunto é IPTU, tendo em vista sua importância para o tema em pauta.

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2.1 a fiscalidade e extrafiscalidade do iptu

Regina Helena Costa (2014) assevera que a fiscalidade do tributo é ca-racterística decorrente da necessidade de abastecimento dos cofres públicos. Em outras palavras, significa dizer que o tributo é compreendido como mera ferramenta de arrecadação de fundos para custear as despesas estatais. A mes-ma autora, por outro lado, ao tratar da extrafiscalidade do tributo, dispõe que essa consiste no emprego de instrumentos tributários para o atingimento de finalidades não arrecadatórias, mas, sim, incentivadoras ou inibitórias de com-portamentos, com vista à realização de outros valores, constitucionalmente contemplados.

É extremamente amplo o conteúdo potencial da extrafiscalidade, vez que a Constituição da República Federativa do Brasil contempla um número muito grande de valores e objetivos a que subordina o Estado brasileiro (Costa, 2014). A título de exemplo, a supracitada autora cita o art. 1º da Constituição da Re-pública Federativa do Brasil, que preconiza os fundamentos do Estado (sobe-rania, cidadania, dignidade da pessoa humana, etc.); o art. 3º, que fala acerca dos objetivos fundamentos da República (construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento social, etc.); o art. 170, que dispõe acerca dos princípios gerais da ordem econômica, em que se tem claramente definido a soberania nacional, a propriedade privada, a função social da propriedade, a livre concorrência e outros.

Quando o Município de Rio das Ostras preconiza um tipo específico de alíquota para cada situação que dispõe nos incisos do art. 56 do Código Tributário de Rio das Ostras, está o mesmo fazendo valer o fenômeno da extra-fiscalidade do tributo, o que instiga questionar: Qual objetivo constitucional o Município riostrense visa que o contribuinte dê cumprimento quando o mesmo estabelece alíquotas diferenciadas para as hipóteses elencadas no art. 56 do Código Tributário Municipal (CTM)? Ou melhor, qual comportamento o ente tributante municipal quer estimular ou desestimular no contribuinte do Imposto Predial e Territorial Urbano?

No inciso I do art. 56 do Código Tributário Municipal de Rio das Ostras, verifica-se que, se o imóvel é edificado, a alíquota do IPTU é de 0,5% (zero vír-gula cinco por cento). No inciso II, os imóveis não edificados sofrem a alíquota de 3,0% (três por cento), ou seja, o Município demonstra querer muito que o imóvel constante de sua zona urbana seja edificado e siga o plano de diretrizes de desenvolvimento municipal, vez que eleva a alíquota do imposto em 500% (quinhentos por cento).

Quando o imóvel não é edificado, mas é murado e com calçada, a alí-quota, que era de 3,0% (três por cento), cai para 1,0% (um por cento), conforme preconiza o inciso III do art. 56 do CTM. Nessa hipótese, o ente tributante muni-cipal está, em outras palavras, dizendo que o imóvel pode não estar edificado,

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mas a existência de muro e calçada não é tão prejudicial como nos casos em que tais benfeitorias inexistem.

Da leitura do dispositivo legal supradito é possível extrair que o legislador municipal quer que o contribuinte do IPTU edifique o imóvel de sua proprieda-de, mure-o, construa calçada, faça uso do imóvel, construa em sua propriedade, preserve-a limpa, sem trazer ônus para o Município com limpeza e de tal forma não sirva de depósito de lixos decorrente da ausência de muros.

Impende ressaltar que se o objetivo do ente tributante divergir das fina-lidades expressas antes, o mesmo estaria violando os limites da competência tributária delineada na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Isso porque, agindo diferente, o Município estaria utilizando a extrafiscalidade do tributo com a nefasta finalidade de arrecadar mais, ilegalmente, para os co-fres públicos.

O aumento em 500% (quinhentos por cento) da alíquota para a hipótese de o imóvel não ser edificado, sem muro e sem calçada é fato que demons-tra falta de razoabilidade do legislador municipal ao estabelecer as diferentes alíquotas para as variadas situações concretas que elenca no art. 56 do CTM. Por exemplo, caso o imóvel não seja edificado, sem muro e sem calçada, mas pertencente a loteador, a alíquota será de 1,0% (um por cento). Pergunta-se: Queria o legislador, nessa hipótese, estimular ou desestimular a qual comporta-mento previsto no Texto Constitucional?

Certamente o legislador municipal não fez uso correto da ferramenta da extrafiscalidade do tributo quando fixou alíquota de 3,0% (três por cento), vez que o imóvel nas mesmas condições em que se tem a origem da referida alí-quota, quando pertencente a loteador, tem uma redução de 400% (quatrocen-tos por cento) em seu percentual, revelando o uso inapropriado da ferramenta constitucional em voga. Contudo, não é esse o objetivo do presente trabalho. Pleiteia-se analisar o fundamento pelo qual o legislador municipal estabeleceu a alíquota de 3,0% (três por cento) e verificar se a mesma se aplica aos lotes de terreno constantes do condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol.

Ora, o ente tributante municipal, quando estabelece uma alíquota eleva-da para imóveis não edificados, está, na verdade, a dizer, em outras palavras, para o contribuinte: construa, faça uso da propriedade, dê-lhe função social que a alíquota da exação será menor, o que leva-nos a discorrer sobre o que vem a ser função social da propriedade.

2.2 o princípio da função social da propriedade na constituição federal de 1988

O direito de propriedade é garantia fundamental expressa no art. 5º, inci-so XXII, da CRFB de 1988. Contudo, esse é restringido pelo princípio da função social da propriedade (inciso XXIII do mesmo dispositivo legal). Tavares (2012,

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p. 703-704) assevera que, em função disso, inexiste possibilidade de compre-ender a propriedade como direito puramente privado, havendo necessidade de compatibilizar a propriedade entre os preceitos constitucionais. Em seus dize-res, a função social da propriedade é imposição legal que deve ser obedecida pelo proprietário. Carrazza assevera que

a Constituição quer que, além de obedecer ao princípio da capacidade contri-butiva, o IPTU tenha alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel, de forma a assegurar o cumprimento da função social da proprieda-de (nos termos do plano diretor). Em outras palavras, além de obedecer a uma progressividade fiscal (exigida pelo § 1º do art. 145, c/c o inciso I do § 1º do art. 156, ambos da CF), o IPTU deverá submeter-se a uma progressividade ex-trafiscal (determinada pelo inciso II do § 1º do art. 156 da CF). Somente a pro-gressividade extrafiscal depende da edição do plano diretor, que indicará qual a melhor localização e o uso mais adequado do imóvel urbano [...]. (2002, p. 94)

Sobre o tema, sustenta Novelino (2014):

A garantia do direito de propriedade é restringida pelo princípio da função social da propriedade (CF, art. 5º, XXIII), sobre a qual a Constituição dispõe no Título VII, que trata da “ordem econômica e financeira”. [...] A função social da pro-priedade urbana é cumprida quando esta atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (CF, art. 182, § 2º). Instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana, o plano diretor é obrigatório para cidades com mais de 20 mil habitantes (CF, art. 182, § 1º).

Quando a propriedade atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade insertas no plano diretor municipal, tem-se que a mesma cumpriu com sua finalidade social. São esses os dizeres do art. 182, § 2º, da CRFB de 1988. O plano diretor do Município de Rio das Ostras está inserto na Lei Com-plementar Municipal nº /2006, que em seu art. 7º dispõe:

Art. 7º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exi-gências fundamentais de ordenação da cidade expressas nesta lei atendendo no mínimo, aos seguintes requisitos:

I – o atendimento às necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social, ao acesso universal aos direitos fundamentais individuais e sociais e ao desenvolvimento econômico e social;

II – a compatibilidade do uso da propriedade com infraestrutura, equipamentos e serviços públicos disponíveis;

III – a compatibilidade do uso da propriedade com a preservação da qualidade do ambiente urbano e natural;

IV – a compatibilidade do uso da propriedade com a segurança, bem-estar e a saúde de seus moradores, usuários e vizinhos.

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Em resumo, a propriedade cumpre sua função social, nos termos do pla-no diretor do Município, quando atende às necessidades dos cidadãos no que se refere à qualidade de vida, à justiça social e ao acesso universal aos direitos fundamentais. Cumpre também sua finalidade social quando é utilizada de for-ma compatível com a infraestrutura, os equipamentos e os serviços públicos dis-poníveis; quando preserva a qualidade do ambiente urbano e natural; quando usa a propriedade com vistas à segurança, ao bem-estar e à saúde dos morado-res, usuários e vizinhos (art. 7º da Lei Complementar nº 4/2006).

Resta apurar se os imóveis não edificados constantes do condomínio fe-chado Alphaville Rio Costa do Sol não estão cumprindo com sua função social para serem enquadrados no art. 56, inciso II, do Código Tributário de Rio das Ostras.

2.3 do cumprimento da função social pelos imóVeis insertos no condomínio fechado alphaVille rio costa do sol

Definido o que é cumprimento da função social da propriedade segundo a Carta Maior e o Plano Diretor do Município, resta analisar se os lotes de ter-renos não edificados, insertos no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol, estão cumprindo com sua função social.

O ente tributante entende que os lotes de terrenos não edificados, por não estarem murados, deixam de cumprir sua função social, atraindo, assim, a incidência de alíquota no percentual de 3% (três por cento) prevista no art. 56, inciso II, do Código Tributário Municipal. Tal entendimento não merece prosperar, vez que o Município, com seu notório intuito arrecadatório, esquece que tais imóveis só não são murados por proibição expressa constante da legis-lação e dos regulamentos internos da Associação de Moradores do Condomínio Fechado Alphaville Rio Costa do Sol aprovados pelo Município quando da cria-ção e regulamentação do loteamento.

Fato interessante é que o próprio regulamento do condomínio, que traz a vedação supramencionada, estabeleceu, de igual forma, cláusula prevendo sua obrigação de buscar junto às autoridades municipais ato administrativo per-mitindo o fechamento do perímetro de toda a área residencial do loteamento. Vejamos a cláusula do regulamento da associação, que prevê o fechamento de todo o perímetro residencial do loteamento:

Cláusula Vigésima Terceira. A Alphaville se compromete a tomar as providências necessárias e cabíveis para obter das autoridades governamentais competentes ato administrativo, ou mesmo para celebrar contrato administrativo que possibi-lite o fechamento do perímetro da área residencial do loteamento (“Ato Adminis-trativo” ou “Contrato Administrativo”), de forma a permitir o controle de acesso ao interior da área residencial do loteamento [...].

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O condomínio Alphaville Rio Costa do Sol cumpriu com o convencio-nado, posto que, por meio do Decreto nº 732/2012, o Prefeito do Município de Rio das Ostras, consoante Processo Administrativo nº 2083/2012, publicado no Jornal oficial do Município na Edição nº 612 de 28.12.2012 a 03.01.2013, outorgou a permissão para fechamento do loteamento Alphaville Rio Costa do Sol, nos termos seguintes:

O Prefeito do Município de Rio das Ostras, Estado do Rio de Janeiro, consoante o Processo Administrativo nº 2083/2012, decreta:

Art. 1º Fica outorgada a permissão de fechamento do loteamento denomina-do “Alphaville de Rio das Ostras”, conforme previsto na Lei Complementar nº 24/2011.

Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Os efeitos decorrentes da outorga supramencionada encontram-se pre-vistos na Lei Complementar Municipal nº 24/2011, visto que, em seu artigo 6º e parágrafos, transfere para o permissionário (associação de moradores do condomínio fechado) o domínio das áreas públicas constantes do loteamento, bem como transfere a manutenção e conservação de vias e iluminação públi-cas; coleta, remoção e destinação final do lixo domiciliar; e limpeza das vias públicas internas do perímetro fechado.

Dando cumprimento à obrigação assumida por meio do Decreto citado, a Associação Alphaville Rio Costa do Sol, que é mantida mediante contribuição do particular (proprietários de lotes de terreno), promoveu o fechamento do perímetro do loteamento, arcando com os custos referentes à manutenção e conservação das vias; manutenção da iluminação pública; coleta, remoção e destinação final do lixo domiciliar, arcando também com os custos inerentes à segurança de todo o perímetro residencial do condomínio fechado, por meio da contratação de segurança particular que controla o acesso às áreas do lote-amento.

O que se quer demonstrar é que, apesar de o lote de terreno em questão não ser murado (o que só ocorre por existência de convenção contratual dos associados do condomínio fechado), tal lote é parte integrante de um objeto maior, qual seja, o próprio condomínio fechado que tem todo o seu perímetro residencial murado com autorização administrativa do próprio Município. Não se pode comparar um lote de terreno integrante de um condomínio fechado e com um terreno baldio do perímetro urbano riostrense. Isso porque esse terreno baldio certamente não possuiria os mesmos melhoramentos que os imóveis in-sertos no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol sofreram, tais como: segurança particular, coleta e remoção de lixo, iluminação pública e ruas pavi-mentadas e com meio fio, tudo feito e mantido às custas dos particulares, sem qualquer participação do ente tributante municipal.

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Exigir desse contribuinte o pagamento da alíquota de IPTU no percentual de 3% (três por cento), utilizando um critério de seletividade de alíquotas que está, em verdade, ligado à extrafiscalidade que é, justamente, quando o tributo não visa a arrecadar, mas sim induzir ou coibir determinado comportamento por parte do contribuinte, significaria onerar excessivamente esse contribuinte, que, na qualidade de proprietário de imóvel localizado nessa nova modalidade de moradia, contribuiu com a redução das despesas públicas municipais, além de não ter tido qualquer conduta merecedora de punição mediante instrumento extrafiscal.

2.4 o condomínio fechado: o poder público não paga a conta

O loteamento onde está inserido o imóvel sob análise é uma modalidade especial de moradia que vem surgindo como nova realidade no cenário urba-nístico de nosso País. Meirelles (2000) apresenta definição precisa acerca do loteamento:

“Loteamentos especiais” estão surgindo, principalmente nos arredores das gran-des cidades, visando a descongestionar as metrópoles. Para esses loteamentos não há, ainda, legislação superior específica que oriente a sua formação, mas nada impede que os Municípios editem normas urbanísticas locais adequadas a essas urbanizações. E tais são os denominados “loteamentos fechados”, “lotea-mentos integrados”, “loteamentos em condomínio”, com ingresso só permitido aos moradores e pessoas por eles autorizadas e com equipamentos e serviços ur-banos próprios, para autossuficiência da comunidade. Essas modalidades mere-cem prosperar. Todavia, impõe-se um regramento legal prévio para disciplinar o sistema de vias internas (que em tais casos não são bens públicos de uso comum do povo) e os encargos de segurança, higiene e conservação das áreas comuns e dos equipamentos de uso coletivo dos moradores, que tanto podem ficar com a Prefeitura como com os dirigentes do núcleo, mediante convenção contratual e remuneração dos serviços por preço ou taxa, conforme o caso. (2000, p. 468/469)

Como bem esclarece Hely Lopes Meirelles, esse novo tipo moradia é marcado por sua autossuficiência, vez que sua aprovação está condicionada à implantação de toda a sua infraestrutura que é integralmente suportada pelo particular, sem que haja participação do Poder Público. Ruas pavimentadas, calçadas, rede de esgoto, energia elétrica, segurança, tudo integralmente man-tido pelo particular sem qualquer participação do ente tributante municipal.

Nesse ponto, é forçoso admitir que se tivesse que haver a aplicação de alíquota diferenciada do IPTU, com base no critério da extrafiscalidade-seletivi-dade, a alíquota do IPTU nos imóveis insertos no condomínio fechado deveria ser minorada, tendo em vista que os melhoramentos supracitados não foram suportados pelo Poder Público, mas sim pelo próprio particular.

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Impende, ainda, destacar que o Município de Rio das Ostras reconhe-ce essa nova modalidade de moradia, que está em constante crescimento no mercado imobiliário urbanístico atual, tendo em vista que outorgou a permis-são para sua instalação e o consequente fechamento de todo o perímetro resi-dencial. Todo esse conjunto de ideias é no sentido de afirmar que não assiste razão ao Município quando vem onerar o contribuinte desses imóveis com a incidência da alíquota de 3,0% no cálculo do IPTU, quando entende que tais imóveis não estão cumprido com sua função social por não estarem murados, comparando-os, assim, a lotes de terrenos baldios.

Não é plausível o entendimento do ente tributante, posto que todo o lo-teamento é fechado, ou seja, toda a extensão do condomínio é murada, vigiado por segurança particular, com coleta e remoção de lixo, iluminação pública, ruas calçadas, tudo mantido às custas do contribuinte que paga a conta. Cum-pre frisar que um lote de terreno não murado, em outro bairro do perímetro urbano riostrense, certamente poderia ser utilizado com depósito de lixo, bem como não ofereceria segurança aos seus vizinhos, deixando, assim, de cumprir com a função social da propriedade.

Todavia, não é essa a realidade do lote de terreno nas mesmas condições, mas inserto no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol, vez que o está inserido dentro de um condomínio fechado que possui toda a sua extensão terri-torial murada, sendo vigiado por segurança particular, com coleta e remoção de lixo, iluminação pública e ruas calçadas, evidenciando, assim, que o Município está se utilizando da extrafiscalidade com a finalidade deturpada de arrecadar.

Sendo assim, e possível afirmar que a cobrança da alíquota de IPTU no percentual de 3% (três por cento) pelo Município, em se tratando de lotes de ter-reno insertos no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol, constitui-se em violação ao próprio direito fundamental de propriedade (art. 5º, inciso XXII, da CF/1988), bem como em afronta ao princípio do não confisco, conforme será explanado nas linhas que seguem.

3 A ALÍQuotA dIFereNcIAdA do Iptu e VedAção Ao coNFISco trIbutárIo

O princípio da vedação ao confisco é limitação legal preconizada pelo poder constituinte originário, prevista no art. 150, inciso IV, da CRFB de 1988, que aduz que, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios utilizar tributo com efeito de confisco. Novelino (2014) esclarece ser o confisco a ex-propriação de um bem particular pelo Estado, sem contraprestação pecuniária. Em direito tributário, Costa (2014) conceitua o instituto:

O confisco, em definição singela há muito por nós proposta, é a absorção total ou substancial da propriedade privada, pelo Poder Público, sem a correspon-dente indenização. Em nosso ordenamento jurídico, diante da grande proteção

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conferida ao direito de propriedade, o confisco é, portanto, medida de caráter sancionatório, sendo admitida apenas excepcionalmente.

Tal princípio objetiva vedar que a tributação exija do contribuinte uma colaboração maior do que pode para com as despesas públicas, bem como que o Estado retire a totalidade ou parcela considerável da propriedade do cidadão contribuinte, sem qualquer retribuição econômica ou financeira. A esse respei-to, brilhante o ensinamento de Amaro (2014): “[...] não se quer, com a vedação ao confisco, outorgar à propriedade uma proteção absoluta contra a incidência do tributo, o que anularia totalmente o poder de tributar. O que se objetiva é evitar que, por meio do tributo, o Estado anule a riqueza privada” (p. 169).

No caso em apreço, a exação tornou-se desproporcional, posto que o ente tributante municipal, com a cobrança da elevada alíquota de 3% (três por cento), está, na verdade, realizando a transferência de riqueza do contribuinte para o Estado de forma confiscatória, obstando, assim, que o contribuinte exer-cite seu direito de propriedade sobre o próprio patrimônio. A exação chegou ao ponto em que alguns contribuintes, proprietários de lotes de terrenos insertos no condomínio Alphaville Rio Costa do Sol, se viram forçados a parar de arcar com o seu adimplemento, pensando, inclusive, em se livrarem do próprio bem por não ter meios de suportar os encargos financeiros aplicados equivocadamente pelo ente tributante que se utiliza da extrafiscalidade do tributo para arrecadar.

Nesse ponto, impende destacar que o ente tributante não participou da instalação do loteamento fechado onde estão inseridos os lotes de terreno não murados, tendo em vista a autossuficiência desse novo tipo de moradia: o con-domínio fechado. Tampouco suportou, o ente tributante, as melhorias que tor-naram o condomínio fechado parte do perímetro urbano municipal. O Municí-pio de Rio das Ostras não arcou com a pavimentação das ruas, com a segurança particular que vigia toda a área do loteamento, com a coleta e remoção de lixo, com iluminação pública e outros melhoramentos, que denotam o cumprimento da função social da propriedade, ocorridos nesses imóveis não edificados e não murados, para querer exigir a alíquota no percentual de 3,0% (três por cento), melhorias essas.

Manter a alíquota no percentual que o ente tributante municipal vem co-brando significa violar o princípio da vedação ao confisco, bem como violar o próprio direito fundamental de propriedade dos proprietários de lote de terreno não edificados e murados do condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol.

4 A ALÍQuotA dIFereNcIAdA e A JurISprudÊNcIA AtuALO presente trabalho, agora, dedica-se à análise de jurisprudência pátria

com a finalidade de demonstrar que a alíquota diferenciada de um imposto é decorrente do caráter extrafiscal do tributo, devendo sua finalidade voltar-se ao cumprimento de uma finalidade expressa no Texto Constitucional. Em se tratan-

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do do IPTU, a finalidade da aplicação do instituto das alíquotas diferenciadas está voltado para o cumprimento da função social da propriedade. A instituição de alíquotas diferenciadas sem essa finalidade é o mesmo que criar imposto inconstitucional.

O julgado a seguir é proveniente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no qual a demanda versa sobre ação autônoma de embargos à execu-ção fiscal, discutindo-se legitimidade de cobrança de ITR. Parte da controvérsia gira em torno da legalidade na instituição de alíquotas diferenciadas para o Imposto Territorial Rural. A 3ª Turma daquele egrégio Tribunal entendeu que a instituição de alíquotas diferenciadas é legítima, desde que em razão da função social da propriedade, eis que a mesma decorre do caráter extrafiscal da exação e existe legitimidade para tanto desde a gênese da Constituição da República Federativa do Brasil. Senão vejamos:

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – ITR – VTN – LEGITIMIDADE DA COBRAN-ÇA EM TAIS MOLDES, LEI Nº 8.847/1994 – ÔNUS CONTRIBUINTE INATENDI-DO – AUSÊNCIA DE ELEMENTOS A COMPROVAREM MÁCULA NA EXIGÊN-CIA – LEGITIMIDADE DO ORDENAMENTO – EXTRAFISCALIDADE – REGIME DE ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS AO ITR, EM RAZÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE, LEGITIMADO DESDE A GÊNESE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL VIGENTE – IMPROCEDÊNCIA AOS EMBARGOS – 1. Destaque-se a impertinência das razões recursais no que tange ao debate envolvendo a com-petência da Justiça Federal para a apreciação de contribuições sindicais, por-quanto, como apontado pelo próprio insurgente, houve interposição de exceção de incompetência para discussão correlata, assim toda e qualquer irresignação a encontrar-se restrita àqueles autos, assim sem qualquer relação com os embargos à execução fiscal, por evidente. 2. Para definição do valor da terra-nua, base de cálculo do tributo em tela, a Lei nº 8.847/1994 determina que a competência é da Secretaria da Receita Federal – SRF, ouvido o Ministério da Agricultura e as Secretaria Estaduais de Agricultura, § 2º, art. 3º. Frise-se que, embora ouvidos estes, a SRF decidirá o valor fixado, pois não se vincula ao indicado por referi-dos entes. 3. Franqueia o ordenamento, por intermédio do § 4º, art. 3º, da Lei nº 8.847/1994, possa a parte contribuinte evidenciar outra seja a efetiva base de cálculo de seu imóvel, em sede de ITR, o consagrado valor da terra-nua. 4. Gradativas e fundamentais se revelam deveriam ter sido as condutas mínimas da parte contribuinte: para tanto e elementarmente, então, capital assim proceda o sujeito passivo da obrigação tributária com consistência, oferecendo elementos de convicção, dotados de suficiência para afastar o cálculo fazendário que, por sua parte, a considerar o mínimo valor aplicado aos imóveis rurais da região. 5. Em esfera jurisdicional, incumbe ao autor o ônus de provar suas afirmações, decorrendo dos autos não atendeu a parte contribuinte a tão elementar mister, consoante os arts. 283 e 333, inciso I, CPC. 6. Ônus postulante mínimo não restou atendido, como de seu fundamental interesse e consoante os autos, hábil a desfazer o trabalho fazendário identificador da base de cálculo guerreada, ao passo que o laudo apresentado em seara administrativa não atendeu aos requisi-tos da ABNT, deixando de apontar os métodos avaliatórios e fontes pesquisadas.

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7. Como decorre da letra da própria Lei nº 8.874/1994, por meio do § 2º de seu art. 3º, então a reger a espécie, nenhum vício se extrai, em sede de estrita legalidade tributária, pois o próprio Legislativo cometeu ao Executivo a missão da apuração, caso a caso, do valor equivalente à base de cálculo em concreto, para cada imóvel, evidentemente que para isso lançando os critérios inspirado-res. 8. Na clássica distinção entre base de cálculo normativa, positivada pelo legislador, e a base de cálculo real, atinente a cada contribuinte, pôs-se em seu legítimo papel o legislador, não se extraindo qualquer desando pelo Executivo, assim incumbido da elementar apuração do ITR devido em função de cada imó-vel. Precedentes. 9. Sempre fundamental se recordar, naturalmente oscile sua co-brança, ante o fenômeno da extrafiscalidade que comete a dito tributo, oriundo da própria Lei Maior, cujo § 4º de seu art. 153, então assim redigido, claramen-te ordena tributação consoante a maior ou menor função social do bem rural. 10. Não se há de se falar em demasia pelo Executivo, ante a criteriosa tarefa apuratória, ademais irrebatida com a elementar carga probatória, pela parte con-tribuinte. 11. Cuidando o critério quantitativo da alíquota de componente em grau de lei, não de Constituição, vênias todas, inciso IV do art. 97, CTN, tanto quanto desde a promulgação da Lei Maior vigente já autorizado o Sistema a fazer incidir, em sede de ITR, cobrança de modo a desestimular a propriedade improdutiva, por evidente, tal cenário objetivamente legitima a previsão de co-brança em distintos percentuais de alíquotas daquela exação, ao longo de todo o histórico de referidas fontes formais do tributário, não unicamente em função da “mudança” de redação que teria sido promovida com a divisão do retratado § 4º em incisos. 12. A mensagem constituinte sempre foi a de uma variação alíquota exatamente em função seja do bom (produtivo), seja do mau (improdutivo) uso da terra, em escancarada extrafiscalidade desde a gênese da Magna Carta vigente positivada, assim nenhum óbice repousando no cunho progressivo de tributação. Precedentes. 13. Em relação aos valores de contribuição sindical, firmou a r. Sentença: “Portanto, está correto o embargante ao defender que o cálculo se dará conforme o valor do capital social atribuído a cada estabelecimento (fazenda). Mas não está, todavia, ao efetuar esse cálculo com base no valor do capital social e, ao final, dividir o montante proporcionalmente a cada fazenda em percentuais, pois o cálculo deve ser feito por cada estabelecimento. Assim, ainda que a soma de todos seja maior que o mesmo cálculo se baseado no capital social total da empresa, não logrou o embargante demonstrar que estivesse incorreto o valor lançado pela embargada para cada estabelecimento com base no capital social deste”. 14. A exegese do quanto assentado pelo r. sentenciamento tem por base o equívoco do contribuinte na divisão do montante a ser pago proporcionalmente a cada fazenda, assim a eiva está na forma de cálculo, por tal motivo sem sentido nem substância o brado recursal ao norte da realização de aritmética a respeito, afinal há contas, contudo com vícios. 15. Improvimento à apelação privada. Pro-vimento à apelação fazendária e à remessa oficial, reformada a r. sentença, para julgamento de improcedência aos embargos, a título sucumbencial incidente o encargo do Decreto-Lei nº 1.025/1969, Súmula nº 168, TFR, em prol da União. (TRF 3ª R.,Ap-Reex 11915/SP, 0011915-09.2009.4.03.6112, 3ª Turma, Rel. Juiz Conv. Silva Neto, J. 05.06.2014)

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Interessante notar que, no que pese haver legitimidade para a instituição de alíquotas diferenciadas de um tributo desde a gênese da Constituição, esta não é facultada ao legislador ordinário de forma desmedida, eis que a alíquo-ta diferenciada é um instrumento da extrafiscalidade do tributo, e, como visto alhures, a extrafiscalidade do tributo tem lugar quando o legislador objetiva promover o cumprimento de determinada finalidade constitucional, ou seja, objetiva que o contribuinte cumpra ou se abstenha determinado valor previsto na Carta Maior. Aplicando o legislador ordinário subespécie da extrafiscalidade com finalidade diversa promulgada pelo instituto, estará o mesmo criando exa-ção inconstitucional.

O aresto a seguir é da lavra do Supremo Tribunal Federal. No mesmo discute-se a incidência de alíquotas diferenciadas em se tratando do imposto Cofins-Importação. Na oportunidade, a Ministra Cármem Lúcia aduziu que a adoção de alíquotas diferencial tinha baldrame na extrafiscalidade do tributo, objetivando, justamente, evitar que a entrada de produtos estrangeiros desone-rados tenha efeitos predatórios sobre aqueles produzidos no País.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO – TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÕES PARA O PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL – PIS-IMPORTAÇÃO E PARA O FINAN-CIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL – COFINS-IMPORTAÇÃO – LEI Nº 10.865/2004 – JULGADO RECORRIDO EM HARMONIA COM A JURISPRU-DÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – PRECEDENTE – RECURSO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO – Relatório. 1. Recurso extraordinário interposto com base no art. 102, inciso III, alínea a, da Constituição da República contra o seguinte julgado do Tribunal Regional Federal da Quarta Região: “TRIBUTÁRIO – COFINS – IMPORTAÇÃO – MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA – § 21 DO ART. 8º DA LEI Nº 10.865/2004 – INCONSTITUCIONALIDADE – NÃO OCORRÊNCIA – 1. As alterações promovidas pela MP 563/2012, convertida na Lei nº 12.715/2012 e posteriores (MP 612/2013, convertida na Lei nº 12.844/2013), assim como as alterações da MP 540/2011, convertida na Lei nº 12.546/2011, objetivaram a simetria tributária entre os produtos nacionais e os importados. Ressalte-se que o adicional em questão também tem natureza extrafiscal, visando evitar que a entrada de produtos estrangeiros desonerados tenha efeitos predató-rios sobre aqueles produzidos no país, razão pela qual possível a adoção de alí-quotas diferenciadas para manter a igualdade de tratamento tributário entre os produtos importados e os nacionais sem que haja qualquer violação ao princípio constitucional da igualdade e aos tratados internacionais de comércio. 2. Não há óbice para a exigência do adicional de alíquota da Cofins-Importação, indepen-dentemente de regulamentação, isto porque não havia dispositivos legais referen-tes ao mencionado adicional que exigissem regulamentação. 3. Não ofende a Constituição Federal o tratamento dado pela legislação ordinária para a não cumulatividade do PIS e da Cofins, com regras de deduções e estornos próprios, limitando ou condicionando o benefício a certos eventos. 4. Embora o § 9º do art. 195 da Constituição Federal nada tenha referido a respeito do inciso IV, tal fato não obsta a redução ou o aumento da alíquota da Cofins-Importação, uma vez que tal dispositivo constitucional não é uma norma imperativa ou cogente,

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representando uma faculdade para que as legislações das contribuições da segu-ridade social possam, se assim desejar o legislador, trazer alíquotas e bases de cálculo diferenciadas, tendo como alguns dos critérios, para essa discriminação, a função da atividade econômica do contribuinte ou a utilização intensiva da mão de obra. 5. Sentença mantida”. 2. A recorrente alega ter o Tribunal de ori-gem contrariado os arts. 150, inciso II, 170, inciso IV, e 195, §§ 9º e 12, da Cons-tituição da República, argumentando que “a Cofins-Importação e a Cofins-Inter-na são tributos completamente diversos. Apresentam semelhanças apenas no que tange à designação e à destinação. [...] Nesta senda, em havendo o § 9º do art. 195 da CF se referido tão somente a um único inciso do caput do mesmo artigo, não há que se aventar qualquer possibilidade de se tratar de rol exemplifi-cativo; trata-se de rol evidentemente taxativo. [...] Não se pode cogitar que o si-lêncio do constituinte tenha sido um mero esquecimento, devendo ser interpreta-do pelo que realmente é: uma deliberada opção pela não inclusão das contribuições incidentes sobre a importação dentre aquelas passíveis de terem diferenciais de alíquota e/ou base de cálculo. [...] Afirmar que a Cofins-Importa-ção é uma Cide em razão daquela possuir efeitos indutores no setor econômico significa dizer que todo tributo é uma Cide, porquanto todo tributo possui tais efeitos indutores (intervêm lato sensu). Nada mais desarrazoado. Assim sendo, é fundamental que se atente para o fato de que o legislador possui outras ferramen-tas possíveis para alcançar o mesmo fim (equiparação de operações internas e de importação), como o Imposto de Importação, ou o IPI-Importação, cujas alíquo-tas possuem permissão para variar por razões regulatórias. Logo, o fim extrafiscal de promover a isonomia entre produtoras nacionais e importadoras não justifica que se utilize o meio vedado pela CF”. Examinados os elementos havidos no processo, Decido. 3. Razão jurídica não assiste à recorrente. 4. Inicialmente, cumpre ressaltar a ausência de identidade entre o objeto deste recurso e o do Recurso Extraordinário nº 633.345-RG/ES, Relator o Ministro Marco Aurélio, pa-radigma da repercussão geral. Embora a recorrente argumente pela “não inclusão das contribuições incidentes sobre a importação dentre aquelas passíveis de te-rem diferenciais de alíquota”, aquele julgado discute especificamente o seguinte tema: “COFINS E PIS – IMPORTAÇÕES – ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS – RE-CURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA – Possui repercussão geral a controvérsia alusiva à constitucionalidade da previsão, no art. 8º, incisos I e II, § 9º, da Lei nº 10.865, de 2004, de alíquotas mais onerosas quan-to ao regime monofásico de importação de autopeças – 2,3% para a Contribuição ao PIS-Importação e 10,8% para a Cofins-Importação –, apesar de a norma ter estabelecido a observância das alíquotas gerais – 1,65% e 7,6% – relativamente à importação dos mesmos bens por pessoas jurídicas fabricantes de máquinas e veículos” (DJe 22.09.2014, grifos nossos). 5. No julgamento do Recurso Extraor-dinário nº 559.937, Relatora a Ministra Ellen Gracie, Redator para o acórdão o Ministro Dias Toffoli, o Supremo Tribunal Federal decidiu: “Tributário. Recurso extraordinário. Repercussão geral. PIS/Cofins-Importação. Lei nº 10.865/2004. Vedação de bis in idem. Não ocorrência. Suporte direto da contribuição do im-portador (arts. 149, II, e 195, IV, da CF e art. 149, § 2º, III, da CF, acrescido pela EC 33/2001). Alíquota específica ou ad valorem. Valor aduaneiro acrescido do valor do ICMS e das próprias contribuições. Inconstitucionalidade. Isonomia. Au-

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sência de afronta. 1. Afastada a alegação de violação da vedação ao bis in idem, com invocação do art. 195, § 4º, da CF. Não há que se falar sobre invalidade da instituição originária e simultânea de contribuições idênticas com fundamento no inciso IV do art. 195, com alíquotas apartadas para fins exclusivos de destinação. 2. Contribuições cuja instituição foi previamente prevista e autorizada, de modo expresso, em um dos incisos do art. 195 da Constituição validamente instituídas por lei ordinária. Precedentes. 3. Inaplicável ao caso o art. 195, § 4º, da Consti-tuição. Não há que se dizer que devessem as contribuições em questão ser neces-sariamente não-cumulativas. O fato de não se admitir o crédito senão para as empresas sujeitas à apuração do PIS e da Cofins pelo regime não-cumulativo não chega a implicar ofensa à isonomia, de modo a fulminar todo o tributo. A sujei-ção ao regime do lucro presumido, que implica submissão ao regime cumulativo, é opcional, de modo que não se vislumbra, igualmente, violação do art. 150, II, da CF. 4. Ao dizer que a contribuição ao PIS/Pasep-Importação e a Cofins-Impor-tação poderão ter alíquotas ad valorem e base de cálculo o valor aduaneiro, o constituinte derivado circunscreveu a tal base a respectiva competência. 5. A referência ao valor aduaneiro no art. 149, § 2º, III, a, da CF implicou utilização de expressão com sentido técnico inequívoco, porquanto já era utilizada pela legislação tributária para indicar a base de cálculo do Imposto sobre a Importa-ção. 6. A Lei nº 10.865/2004, ao instituir o PIS/Pasep-Importação e a Cofins-Im-portação, não alargou propriamente o conceito de valor aduaneiro, de modo que passasse a abranger, para fins de apuração de tais contribuições, outras grandezas nele não contidas. O que fez foi desconsiderar a imposição constitucional de que as contribuições sociais sobre a importação que tenham alíquota ad valorem se-jam calculadas com base no valor aduaneiro, extrapolando a norma do art. 149, § 2º, III, a, da Constituição Federal. 7. Não há como equiparar, de modo absoluto, a tributação da importação com a tributação das operações internas. O PIS/Pa-sep-Importação e a Cofins-Importação incidem sobre operação na qual o contri-buinte efetuou despesas com a aquisição do produto importado, enquanto a PIS e a Cofins internas incidem sobre o faturamento ou a receita, conforme o regime. São tributos distintos. 8. O gravame das operações de importação se dá não como concretização do princípio da isonomia, mas como medida de política tributária tendente a evitar que a entrada de produtos desonerados tenha efeitos predatórios relativamente às empresas sediadas no País, visando, assim, ao equilíbrio da ba-lança comercial. [...] Por fim, quanto ao princípio maior da isonomia, observo que esse foi invocado, já na exposição de motivos da Medida Provisória nº 164, que originou a lei em discussão, como fundamento de validade à tributação em causa, a qual buscaria equalizar, mediante tratamento tributário isonômico, a tributação dos bens produzidos no país com os importados de residentes e domi-ciliados no exterior, ‘sob pena de prejudicar a produção nacional, favorecendo as importações pela vantagem comparativa proporcionada pela não incidência hoje, existente, prejudicando o nível de emprego e a geração de renda no País’. No entanto, também entendo que o gravame das operações de importação dá-se como medida de política tributária de extrafiscalidade, visando equilibrar a ba-lança comercial e evitar que a entrada de produtos desonerados tenha efeitos predatórios relativamente às empresas sediadas no País e não como concretiza-ção do princípio da isonomia, como, aliás, bem lembrou a ilustre Relatora” (gri-

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fos nossos). Ao votar, asseverei: “O art. 195 da Constituição da República definiu as fontes de financiamento da seguridade social de forma expressa, mas não ta-xativa. Incluiu, como uma dessas fontes, as contribuições sociais ‘do importador de bens ou serviços do exterior, o que quem a lei a ele equiparar’ (art. 195, IV, acrescido pela Emenda Constitucional nº 42/2003). Por não apresentar rol taxati-vo de fontes de financiamento da seguridade social, o art. 195, § 4º da Constitui-ção da República prevê que ‘a lei poderá instituir outras fontes destinadas a ga-rantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I’” (grifos nossos). O julgado recorrido harmoniza-se com essa orienta-ção jurisprudencial. 6. Pelo exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 557, caput, do Código de Processo Civil e arts. 21, § 1º, e 327, § 1º, do Re-gimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 23 de feve-reiro de 2015. Ministra Cármen Lúcia, Relatora. (STF, RE 863297/RS, Relª Min. Cármen Lúcia, J. 23.02.2015, DJe-037 Divulg. 25.02.2015, Publ. 26.02.2015)

Conforme se verifica no julgado supracolacionado, a aplicação de alí-quotas diferenciadas decorre da extrafiscalidade do tributo, devendo, para tan-to, estar fundada no cumprimento de determinado preceito constitucional e não ser aplicado com a finalidade exclusiva de arrecadar para os cofres públicos, como tem feito o Município riostrense.

Julgado interessante é o a seguir, da lavra do eg. Superior Tribunal de Jus-tiça, em que se discute a legalidade de aplicação de alíquotas diferenciadas do IPI. O Tribunal concluiu que a instituição de alíquotas diferenciadas do IPI, ou até mesmo a isenção do tributo, em algumas regiões, é permita na própria Cons-tituição Federal, a qual autoriza o tratamento desigual entre partes desiguais. A fixação de alíquotas diferenciadas promove, no caso do IPI, equilíbrio socioe-conômico entre as regiões, o que é finalidade prevista na Constituição Federal.

TRIBUTÁRIO – RECURSO ESPECIAL – DECRETO-LEI Nº 399/1938 – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULA Nº 282/STF – AÇÚCAR DE CANA – IPI – DIFERENCIAÇÃO DE ALÍQUOTAS DE ACORDO COM A REGIÃO PRODU-TORA – POSSIBILIDADE – FUNÇÃO EXTRAFISCAL – DISCRICIONARIEDADE DO PODER PÚBLICO – 1. Mandado de segurança com pedido de liminar im-petrado por Copersucar - Cooperativa dos Produtores de Cana, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo Ltda. e outra contra o Delegado da Receita Federal em Porto Alegre, em que se discute a ilegalidade do Decreto nº 2.501/1998, que estabelece alíquotas diferentes de IPI sobre o açúcar, de acordo com o Estado brasileiro. Sentença julgando improcedente o pedido, sob o fundamento de que o Poder Executivo está autorizado a fazer uso do IPI com fins extrafiscais, de acordo com a política econômica. Interposta apelação pelas impetrantes, o TRF da 4ª Região negou-lhe provimento por entender que há previsão de seletividade do IPI no art. 153, § 3º, I, da CF e no Decreto-Lei nº 1.199/1971, a ser analisada sob a ótica da discricionariedade da Administração Pública. Ademais, afirma, que caso se entendesse pelo desacordo da norma impugnada com o texto cons-titucional, a conseqüência seria a sua nulidade e não a extensão do benefício a outros contribuintes e que não há prova de qualquer desvio de finalidade, ex-cesso ou desvio de poder quando da concessão dos incentivos fiscais aos Esta-

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dos beneficiados. Em sede de recurso especial, a Copersucar alega violação do art. 4º do DL 1.199/1971 e do Decreto-Lei nº 399/1938, em razão da necessi-dade de observância das condições exigidas pelo DL 1.199/1971 para a mu-dança de alíquota do IPI, não havendo como se legitimar a adoção do IPI como instrumento de intervenção direta no domínio econômico, em razão do fim da política intervencionista no setor sucroalcooleiro e da inexistência de qualquer política governamental específica em relação ao mesmo. Aduz, ainda, que o DL 399/1938 definiu o açúcar como essencial à vida, sendo ele integrante da cesta básica, que o Decreto nº 2.501/1998 demonstra desvio de finalidade, porque prejudica a livre concorrência e que conforme a Súmula nº 97 do extinto TFR, a motivação é imprescindível à validação do ato. Contra-razões sustentando a constitucionalidade do tema. 2. Ausência do necessário prequestionamento. A norma legal dita violada, DL nº 399/38, não foi abordada no âmbito do voto do aresto a quo. Súmula nº 282 do STF incidente na espécie. 3. Finda a política nacional de unificação do preço do açúcar de cana, deixou de vigorar a alíquota zero, de forma que o Poder Executivo poderia fixar alíquotas distintas, de acordo com o interesse nacional, nos lindes da legislação vigente. 4. A isenção ou fixa-ção de alíquotas diferenciadas para a promoção do equilíbrio sócio-econômico entre as regiões está prevista na própria Constituição Federal, a qual autoriza o tratamento desigual entre partes desiguais. 5. Cabe ao Governo, de forma dis-cricionária, escolher os rumos da política sucroalcooleira, utilizando-se, caso necessário, do IPI, tributo com função extrafiscal, não sendo possível ao Poder Judiciário imiscuir-se nesta seara sem a demonstração cabal de vícios de legali-dade. 6. Recurso especial conhecido em parte, e, nessa, desprovido. (STJ, REsp 704917/RS, 2004/0164480-0, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, J. 24.05.2005, DJ 27.06.2005, p. 267)

No mesmo sentido, os julgados a seguir provenientes do eg. Tribunal Região Federal da 1ª Região.

TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL – ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL – IM-POSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – AÇÚCAR DE CANA – DE-CRETO Nº 420/1992 – ALÍQUOTA DIFERENCIADA – OFENSA AO PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE E DA IGUALDADE NÃO CONFIGURADA – FINALIDADE EXTRAFISCAL – INSTRUÇÃO NORMATIVA SRF Nº 67/1998 – POLÍTICA NA-CIONAL DE PREÇO UNIFICADO – SENTENÇA MANTIDA – 1. O Supremo Tri-bunal Federal reconheceu a constitucionalidade do art. 2º da Lei nº 8.393/1991 e do Decreto nº 420/1992, sob o fundamento de que o IPI possui natureza extra-fiscal e, por essa razão, a diferenciação tributária promovida por essa exação não configura ofensa aos princípios constitucionais da isonomia e da seletividade. Precedentes. 2. A Portaria MF nº 189, de 5 de julho de 1995, estabeleceu que per-maneceriam submetidas às alíquotas de 18% e de 9% apenas as saídas do açúcar do tipo cristal standard, porque vinculado à política nacional de preços unifica-dos, nada mencionando sobre os demais tipos de açúcares. Em 14.06.1998, foi publicada a Instrução Normativa SRF nº 67/1998 que, no seu art. 3º, convalidou o procedimento adotado pelos estabelecimentos industriais que deram saída de cana do tipo demerera, cristal superior, cristal especial extra e refinado granulado no período de 6 de julho de 1995 a 16 de novembro de 1997 sem lançamen-

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to, em nota fiscal, do IPI. 3. Acerca da classificação fiscal do açúcar vendido pela parte autora, confirma-se a bem construída e fundamentada sentença não apenas pelo tempo desde que proferida (2006/2015), mas, notadamente, porque escudada em laudo judicial, devidamente aquilatadas pelo destinatário primeiro da prova (o julgador primário), mais próximo dos fatos, que concluiu que “o açúcar comercializado é do tipo açúcar cristal superior, que se enquadra [...] fora da política nacional de preços unificados e, consequentemente, submetida à alíquota zero de IPI”. 4. Não se sujeitando o açúcar cristal superior à política nacional de preços a partir da Portaria nº 189/1995, ilegítima a incidência do IPI à alíquota de 18%, como exigido pelo Decreto nº 420/1992 no período de 6 de julho de 1995 a 16 de novembro de 1997. 5. Verba honorária mantida conforme fixada na sentença recorrida, nos termos do art. 20, §§ 3º e 4º do CPC. Custas em reembolso, se houver. 6. Apelação e remessa oficial não providas. (TRF 1ª R., AC 00239710519984013400, 7ª Turma, Rel. Juiz Fed. Conv. Antonio Claudio Macedo da Silva, J. 08.09.2015, Data de Publicação: 18.09.2015)

PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGURANÇA – ISONOMIA DE ALÍ-QUOTA DO IPI PARA MÓVEIS DE MADEIRA E AÇO PARA COZINHA – NÃO DEMONSTRADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE – EXTRAFISCA-LIDADE DO IPI – ART. 153, §§ 1º E 3º, I DA CF – PRECEDENTES – 1. Dispõe a Constituição Federal em seu art. 153, § 1º que a União poderá alterar as alíquotas do IPI. Portanto, institui a Constituição quanto ao IPI, uma atenuação ao princí-pio da legalidade estrita em matéria tributária (art. 150, I da CF) autorizando o Poder Executivo, por razões extrafiscais, a alterar as alíquotas daquele tributo. 2. A União, contudo, não se encontra livre para alterar as alíquotas, pois precisa atender “as condições e os limites estabelecidos em lei” (reserva relativa de lei). No caso do IPI, nos termos do art. 4º do Decreto-Lei nº 1.119/1971 e Decreto nº 3.581/2000. 3. Possível formalmente a redução da alíquota por meio de norma infralegal, importa verificar também a legitimidade da redução quanto ao aspecto material. Nesse sentido, caberia ao impetrante demonstrar que o produto pro-duzido em aço é tão essencial quanto ao produto produzido em madeira, como entendeu a União, ao reduzir a alíquota do IPI deste produto de 10% para 5%. Porém, não foi demonstrado de plano a essencialidade do produto produzido pela impetrante em relação ao produto tido como paradigma e sendo a pretensão manejada por meio de mandado de segurança, não há possibilidade de dilação probatória 4. Pode-se concluir, portanto, que não restou de demonstrada que a redução estabelecida pela União quanto aos móveis de madeira são ilegais ou inconstitucionais, nem restou demonstrada também qualquer prejuízo ao impe-trante em face desta redução que pudesse ser remediado por meio de mandado de segurança. Em resumo, agiu a União no exercício da prerrogativa de alterar a alíquota do IPI em função da essencialidade do produto. 5. Nesse sentido é a jurisprudência desta Corte: “3. O Poder Executivo pode alterar alíquota de IPI se dentro dos parâmetros legais (§ 1º do art. 153 da Constituição). Precedente do STF. [...] O Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do art. 2º da Lei nº 8.393/1991 e do Decreto nº 420/1992, sob o fundamento de que o IPI possui natureza extrafiscal e, por essa razão, a diferenciação tributá-ria promovida por essa exação não configura ofensa aos princípios constitucio-nais da isonomia e da seletividade. Precedentes. 7. Apelação das impetrantes

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improvida” (AC 0000603-84.2000.4.01.3500/GO, 8ª Turma, Rel. Des. Federal Leomar Barros Amorim de Sousa, Rel. Juiz Fed. Conv. Cleberson José Rocha, e-DJF1 p. 576 de 22.10.2010). 6. Apelação desprovida. (TRF 1ª R., AMS 4727/MG, 2001.38.01.004727-0, 1ª Turma Suplementar, Rel. Juiz Federal Alexandre Buck Medrado Sampaio, J. 18.06.2013)

Conforme se infere dos arestos colacionados, a alíquota diferenciada de um tributo é decorrente do seu caráter extrafiscal, devendo obedecer sua finali-dade: incentivar ou desestimular o contribuinte a cumprir determinado preceito constitucional. Se aplicada a seletividade de alíquotas com finalidade diversa, o tributo será inconstitucional.

coNcLuSãoComo visto, a aplicação de alíquotas diferenciadas é ferramenta ou es-

pécie do gênero extrafiscal do tributo. A extrafiscalidade do tributo consiste no emprego de instrumentos incentivadores ou inibidores de comportamentos, com a finalidade de fazer cumprir valores previstos da Constituição da Repúbli-ca Federativa do Brasil.

Verificou-se que o fundamento para a aplicação de alíquotas diferen-ciadas no Imposto Predial e Territorial Urbano tem como escopo promover o cumprimento da função social da propriedade, eis que um lote de terreno não edificado e desprovido de muros somente trará prejuízos para os cofres públi-cos, tendo em vista a possibilidade de o mesmo servir como depósito de lixos e facilitar a proliferação de insetos e doenças que um terreno baldio pode oca-sionar.

Em se tratando do IPTU riostrense e sua aplicação com alíquotas diferen-ciadas, notadamente para os lotes de terreno insertos no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol, tem-se que exigir a alíquota no percentual de 3,0% para os imóveis não edificados e desprovidos de muro é o mesmo que comparar esses imóveis insertos em um condomínio fechado a um terreno baldio inserto em outra parte do perímetro urbano riostrense.

Não é plausível o entendimento do ente tributante, posto que todo o condomínio é fechado, ou seja, contém muro em toda a sua extensão territorial, bem como é vigiado por segurança particular, possui coleta e remoção de lixo, iluminação pública, ruas calçadas, tudo mantido às custas do contribuinte que paga a conta sem qualquer participação do Poder Público, eis que essa nova modalidade de moradia, o condomínio ou loteamento fechado, é marcada por sua autossuficiência em relação ao Poder Público por não depender dele para sua instalação e manutenção.

A ausência de muros nesses lotes de terreno não configura um descum-primento da função social da propriedade, tendo em vista que esses lotes de ter-reno sofreram melhorias que um lote de terreno baldio não sofreu. Outrossim,

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o muro existente em toda a extensão territorial do próprio condomínio fechado aproveita aos lotes de terreno insertos em seu perímetro, vez que evita que os lotes fiquem expostos a se tornarem possíveis depósitos de lixo ou que ve-nham onerar o Poder Público. Saliente-se, inclusive, que esses lotes de terreno possuem segurança particular, calçada, ruas pavimentadas e outras melhorias que denotam o cumprimento da função da propriedade, evidenciando ser in-sustentável a aplicação do IPTU na alíquota de 3,0%, por violar o princípio da igualdade, ou seja, está o Município riostrense tratando os desiguais de forma igualitária.

Impende acrescer que, sendo inconstitucional a aplicação da alíquota de IPTU no percentual de 3,0%, não significa dizer que os contribuintes, pro-prietários de imóveis insertos no condomínio fechado Alphaville Rio Costa do Sol, estão isentos da exação. Pelo contrário, a alíquota de 1,0% (um por cento) se demonstra mais consentânea com a situação desses imóveis, pois, apesar de eles não possuírem muros em suas respectivas extensões, o condomínio fecha-do no qual estão inseridos é totalmente murado e controlado por segurança par-ticular, pelo que se entende correta a alíquota de 1,0% (um por cento) prevista no art. 56, inciso III, do Código Tributário Municipal.

reFerÊNcIASABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 14724: Informação e docu-mentação. Trabalhos Acadêmicos – Apresentação. Rio de Janeiro: ABNT, 2002.SELLMANN, Milena Zampieri. A violação do direito de propriedade em razão da incidência cumulativa da progressividade fiscal e diferenciação de alíquotas no IPTU. Disponível em: . Acesso em: 6 nov. 2015.ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 7. ed. São Paulo: Método, 2013.AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11. ed. Atual. Misabel de Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2006.BARRETO, Aires Fernandino. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais. São Paulo: Max Limonad, 1998.______. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais. 2. ed. rev. São Paulo: Max Limonad, 1999.RIO DAS OSTRAS (RJ). Decreto nº 732/2012. Outorga permissão de fechamento de loteamento. Publicação, Jornal Oficial do Município, ed. 612, de 28.12.2012 a 03.01.2013, Rio das Ostras, 2012.______. Código Tributário Municipal. Dá nova redação ao Código Tributário do Muni-cípio de Rio das Ostras e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em: 7 nov. 2015.BRASIL. Código Tributário Nacional. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, aos Estados e aos Municí-pios. Disponível em: . Acesso em: 7 nov. 2015.

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120 ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA

______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: . Acesso em: 7 nov. 2015.BARRETO, Aires Fernandino. Curso de direito tributário municipal. São Paulo: Saraiva, 2009.CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010.______. Imposto sobre a renda: perfil constitucional e temas específicos. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2013.______. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 8. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2010.COMPARATO, Fábio Konder. Função social da propriedade dos bens de produção. RDM 63. São Paulo: Revista dos Tribunais.COSTA, Regina Helena. Curso e direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009.COSTA, Regina Helena. Imposto de renda e capacidade contributiva. In: VELLOSO, Carlos Mário da Silva; ROSAS, Roberto; AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do (Coord.). Princípios constitucionais fundamentais: estudos em homenagem ao Professor Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Lex, 2005. p. 873-882.CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de direito constitucional. 7. ed. Salvador: JusPodivm, 2013.DERZI, Misabel de Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988.GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das coisas. Coleção Sinopses Jurídicas. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2007.HARADA.,Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2014.MACHADO, Hugo de Britto. Curso de direito tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2008.MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2485

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.598.649 – GO (2016/0118572‑8)Relator: Ministro Herman BenjaminRecorrente: Goiás Transmissão S.A.Advogado: Alexandre dos Santos Pereira Vecchio e outro(s) – GO021085ARecorrido: Água Mineral do Cerrado Ltda. – MEAdvogados: Lacordaire Guimarães de Oliveira – GO008269

Francielli Amaral Aguiar e outro(s) – GO037347

ementa

AdmINIStrAtIVo – proceSSuAL cIVIL – NomeAção de perIto – corretor de ImÓVeIS – FALtA de preQueStIoNAmeNto – SÚmuLA Nº 211/StJ – dIVergÊNcIA JurISprudeNcIAL Não demoNStrAdA – coNteXto FátIco dIFereNte – INeXIStÊNcIA de VIoLAção do teXto do dISpoSItIVo LegAL

1. A apontada divergência deve ser comprovada, cabendo a quem recor-re demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, com indicação da similitude fática e jurídica entre eles. In-dispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos acórdãos recorrido e paradigma, realizando-se o cotejo analítico entre ambos, com o intuito de bem caracterizar a interpretação legal divergente. O desres-peito a esses requisitos legais e regimentais (art. 541, parágrafo único, do CPC e art. do RI/STJ) impede o conhecimento do Recurso Especial com base na alínea c, III, do art. 105 da Constituição Federal.

2. Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que não existe divergência jurisprudencial, quando o contexto fático dos acórdãos confrontados apresenta disparidade, como in casu. Enquanto o acórdão paradigma consigna que é indispensável a realização de perí-cia por engenheiro habilitado nas ações de desapropriação, no decisum confrontado a hipótese é diferente, pois o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás decidiu que o corretor de imóveis poderá realizar avaliação de imóvel rural em se tratando de servidão administrativa.

3. O STJ possui entendimento de que resolução e decisões administrati-vas não se enquadram no conceito de lei federal, o que inviabiliza sua discussão na via excepcional.

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4. A indicada afronta do art. 424, I, do CPC não pode ser analisada, pois o Tribunal de origem não emitiu juízo de valor sobre esse dispositivo le-gal. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando o artigo tido por violado não foi apreciado pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento. Incide, na es-pécie, a Súmula nº 211/STJ.

5. O Tribunal local, conforme se depreende pela leitura dos trechos do acórdão recorrido supratranscritos, foi enfático em salientar: “não há nos autos constatação de que a perícia de avaliação requererá maiores co-nhecimentos específicos e especializados em engenharia e agronomia”. Portanto, não existiu violação ao texto do art. 145, § 1º, do CPC, que determina a escolha de perito judicial, entre profissionais de nível univer-sitário, quando a prova depender de conhecimento técnico ou científico.

6. Recurso Especial não conhecido.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Jus-tiça: “A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).” Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães (Presidente) e Francisco Falcão vota-ram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 20 de outubro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Herman Benjamin Relator

relatório

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator):

Cuida-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição da República, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás assim ementado (fl. 252, e-STJ):

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE INSTI-TUIÇÃO DE SERVIDÃO ADMINISTRATIVA, COM PEDIDO LIMINAR – DESA-PROPRIAÇÃO DE PARTE DE FAZENDA PARA FINS DE UTILIDADE PÚBLICA – TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – NOMEAÇÃO DE CORRETOR DE IMÓVEIS PARA A REALIZAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL – POSSIBILIDADE

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ������������������������������������������������������������������������������������������������123

I – É perfeitamente admissível a nomeação de corretor de imóveis para realizar perícia judicial de avaliação de imóvel rural, sendo desnecessária a nomeação de profissional engenheiro civil ou agrônomo para a prática de tal atividade, mesmo em se tratando de servidão administrativa.

II – Ausência de fato novo. Inexistindo fato novo a embasar a pretensão de re-consideração da decisão agravada regimentalmente, a manutenção da decisão recorrida é medida impositiva.

Agravo regimental conhecido e desprovido.

A parte recorrente alega, além de divergência jurisprudencial, violação dos arts. 145, § 1º, e 424, I, do CPC e do art. 5º da Resolução nº 218/1973 do Confea. Afirma que o corretor de imóveis não possui competência para avaliar imóvel rural para fins de instituição de servidão administrativa (fl. 298, e-STJ).

Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fls. 272-282, e-STJ).

Contrarrazões apresentadas às fls. 321-327, e-STJ.

Parecer do Ministério Público pelo não conhecimento do Recurso Espe-cial (fls. 345-346, e-STJ).

Voto

O Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin (Relator): Os autos foram recebi-dos neste Gabinete em 12.08.2016.

A irresignação não merece acolhida.

A apontada divergência deve ser comprovada, cabendo a quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confron-tados, com indicação da similitude fática e jurídica entre eles. Indispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos acórdãos recorrido e paradig-ma, realizando-se o cotejo analítico entre ambos, com o intuito de bem carac-terizar a interpretação legal divergente. O desrespeito a esses requisitos legais e regimentais (art. 541, parágrafo único, do CPC e art. 255 do RI/STJ) impede o conhecimento do Recurso Especial com base na alínea c, III, do art. 105 da Constituição Federal. Confiram-se os precedentes:

TRIBUTÁRIO – COBRANÇA DE TAXA DE ÁGUA E DE SERVIÇO DE ESGO-TAMENTO SANITÁRIO – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS NºS 282 E 283 DO STF – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO-CONFIGURADO – [...]

3. Não se conhece do dissídio jurisprudencial quando não atendidos os requisitos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ. 4. Recurso especial não conhecido. (REsp 649.084/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 15.08.2005)

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124 ��������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – ADMISSIBILIDADE – SE-GURO DE AERONAVE – NEGATIVA DE COBERTURA – INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA E REEXAME DE PROVA – SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – DISSÍDIO JU-RISPRUDENCIAL – AUSÊNCIA SIMILITUDE FÁTICA – [...]

2. A divergência jurisprudencial, nos termos do art. 541, parágrafo único, do CPC e do art. 255, § 1º, do RISTJ, exige comprovação e demonstração, esta, em qual-quer caso, com a transcrição dos julgados que configurem o dissídio, a eviden-ciar a similitude fática entre os casos apontados e a divergência de interpretações, o que não restou evidenciado na espécie.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg-REsp 1007376/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., DJe 20.08.2013)

Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que não existe divergência jurisprudencial, quando o contexto fático dos acórdãos confrontados apresenta disparidade, como in casu. Enquanto o acórdão para-digma consigna que é indispensável a realização de perícia por engenheiro habilitado nas ações de desapropriação, no decisum confrontado a hipótese é diferente, pois o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás decidiu que o corretor de imóveis poderá realizar avaliação de imóvel rural em se tratando de servidão administrativa. Nesse sentido:

TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE RENDA SOBRE JUROS DE MORA – VERBAS TRABALHISTAS RECONHECIDAS EM DECISÃO JUDICIAL – AUSÊNCIA DE SI-MILITUDE FÁTICA ENTRE OS ACÓRDÃOS COLACIONADOS COMO DIVER-GENTES

1. Para que se configure o dissídio jurisprudencial é indispensável que os jul-gados confrontados revelem soluções jurídicas distintas extraídas das mesmas premissas fáticas.

2. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido tratou de matéria relativa à inci-dência do imposto de renda sobre os juros de mora decorrentes de verbas re-muneratórias de empregado celetista pagas em atraso, fora do contexto de res-cisão do contrato de trabalho, nos termos do art. 16, parágrafo único, da Lei nº 4.506/1964. Já o acórdão paradigma, cuidou de situação em que não incide imposto de renda sobre os juros de mora decorrentes de verbas trabalhistas reco-nhecidas em decisão judicial, no contexto da rescisão do contrato de trabalho.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg-EREsp 1.221.886/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª S., DJe 03.09.2013)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – ADMINISTRATIVO – IN-VIABILIDADE DO PREQUESTIONAMENTO FICTO – SÚMULA Nº 211/STJ – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO – MERA TRANSCRIÇÃO DE EMENTAS – AUSÊNCIA DE CÓPIAS INTEGRAIS DOS JULGADOS [...]

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3. Para comprovação da divergência jurisprudencial, o art. 255, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça exige que sejam mencionadas as circunstâncias que identifiquem ou assemelham os casos confrontados, bem como juntadas cópias integrais dos julgados ou, ainda, indicado o repositório oficial de jurisprudência, não bastando a simples transcrição de ementas. Prece-dentes.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg REsp 641.247/AL, Relª Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJ/PE), 6ª T., DJe 29.04.2013).

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – REVISÃO CRIMINAL – ART. 621, I, DO CPP – QUESTÃO FEDERAL SURGIDA NA PROLAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO – FALTA DE PREQUESTIONAMENTO – DIVERGÊN-CIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA – AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA – [...]

4. O dissídio jurisprudencial, para que seja caracterizado, exige que, em situa-ções fáticas idênticas, tenha havido a divergente interpretação do mesmo dispo-sitivo de lei federal, o que não ocorre no caso concreto, em que não há a referida similitude, uma vez que o julgado recorrido e o paradigma avaliaram questões de fato diferentes.

5. Agravo regimental improvido.

(AgRg-REsp 1066014/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., DJe 26.04.2013)

O STJ possui a compreensão de que resolução e decisões administrativas não se enquadram no conceito de lei federal, o que inviabiliza sua discussão na via excepcional. Cito precedentes:

PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – ISENÇÃO CONDICIONADA – ALEGAÇÃO DE EFETIVAÇÃO, NA ORIGEM, DE INTERPRETAÇÃO EQUIVO-CADA DO CONTEÚDO NORMATIVO DE DECRETO REGULAMENTAR – ATO NORMATIVO QUE NÃO SE ENQUADRA NO CONCEITO DE LEI FEDERAL – RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO

1. O Superior Tribunal de Justiça não tem a missão constitucional de uniformi-zar a interpretação de dispositivos de decreto regulamentar, pois esta espécie de diploma normativo não se enquadra no conceito de “lei federal” para fins de interposição de recurso especial (precedentes citados: REsp 1.121.275/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 17.04.2012; AgRg-REsp 1.328.290/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 11.09.2012; e REsp 778.338/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 12.03.2007).

2. Recurso especial não conhecido

(REsp 1.241.207/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 25.10.2012)

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PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – AUSÊNCIA DE COMANDO PARA INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO – SÚMULA Nº 284/STF – VIO-LAÇÃO A DECRETO – INVIABILIDADE

1. A norma inserida no art. 4º do Decreto nº 2.536/1998, por não disciplinar a eficácia (retroativa ou não) ou a natureza (declaratória ou constitutiva) do ato de concessão do Cebas, não possui aptidão para infirmar os fundamentos do acór-dão do Tribunal de origem. Aplicação da Súmula nº 284/STF.

2. Ademais, o STJ possui entendimento de que o comando legal inserido em decreto não se enquadra no conceito de lei federal, o que inviabiliza a discussão quanto à sua inteligência em Recurso Especial.

3. Agravo Regimental não provido

(AgRg-REsp 1.274.513/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 12.04.2012)

PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR – ENERGIA ELÉTRICA – INTERRUPÇÃO REITERADA DO FORNECIMENTO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CON-CESSIONÁRIA – MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS – REEXAME DE PROVAS – SÚMULA Nº 7/STJ – VIOLAÇÃO – PORTARIA DA ANEEL – IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO – FALTA DE IMPUGNAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL – SÚMULA Nº 283/STF – AUSÊNCIA – PREQUESTIONA-MENTO – SÚMULA Nº 182/STJ – [...]

4. É inviável o exame de ofensa às Resoluções nºs 61/2004 e 456/2000 da Aneel, uma vez que decretos, portarias, circulares e resoluções não estão compreendi-dos no conceito de lei federal e, portanto, não permitem a abertura da instância especial.

[...]

6. Agravo Regimental conhecido em parte e, nessa parte não provido.

(AgRg-AREsp 370.831/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 06.12.2013)

A indicada afronta do art. 424, I, do CPC não pode ser analisada, pois o Tribunal de origem não emitiu juízo de valor sobre esse dispositivo legal. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando o artigo tido por violado não foi apreciado pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento. Incide, na espécie, a Súmula nº 211/STJ. A propósito cito:

PROCESSO CIVIL – ENERGIA ELÉTRICA – FRAUDE NO MEDIDOR – OFENSA AO ART. 535 DO CPC – AUSÊNCIA – FALTA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULA Nº 211/STJ – ANÁLISE DE CONTRARIEDADE À RESOLUÇÃO – IM-POSSIBILIDADE – REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICA – DESCABIMENTO

1. O fundamento utilizado pelo aresto recorrido para afastar a cobrança da ener-gia elétrica indevidamente consumida foi o de que, mesmo não tendo sido eli-dida a presunção de irregularidade do medidor, a revisão do faturamento está

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prejudicada, porquanto, após a substituição daquele, o consumo manteve-se praticamente inalterado.

2. A falta de prequestionamento dos arts. 3º da LICC; 20 e 21, da Lei nº 9.427/1996 e 31 da Lei nº 8.987/1995 justifica a incidência da Súmula nº 211/STJ.

3. Ainda que assim não fosse, não há como se examinar se houve contrariedade aos dispositivos legais indicados, pois, para tanto, faz-se necessário emitir juízo de valor sobre o conteúdo da própria resolução, isto é, acerca dos procedimentos utilizados para a cobrança da tarifa referente à energia indevidamente consumi-da, o que não é permitido no apelo nobre, uma vez que se trata de ato normativo não enquadrado no conceito de lei federal, constante da alínea a do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.

Precedentes.

4. Por fim, tem-se que o aresto combatido está assentado nos elementos fático--probatórios da demanda e o seu reexame é vedado na presente instância recur-sal, consoante disposto no enunciado da Súmula nº 7/STJ.

5. Agravo regimental não provido (AgRg-AREsp 68.440/MG, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., DJe 19.12.2011).

PROCESSUAL CIVIL – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO – SÚMULA Nº 284/STF – OFENSA A RESOLUÇÃO – IM-POSSIBILIDADE DE EXAME NA VIA ELEITA – REVISÃO – MATÉRIA FÁTICO--PROBATÓRIA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ – AUSÊNCIA DE PRE-QUESTIONAMENTO – SÚMULA Nº 211/STJ – REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS – APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DO CÓDIGO CIVIL – RECURSO ESPECIAL – ALÍNEA C – NÃO-DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA – [...]

3. É inadmissível Recurso Especial quanto à questão não apreciada pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição de Embargos Declaratórios (arts. 3º, 6º, § 3º, II, e 29, I, da Lei nº 8.987/1995; e arts. 2º, 3º, XIX, e 17, da Lei nº 9.247/1996). Inci-dência da Súmula nº 211/STJ.

4. A Ação de Repetição de Indébito de tarifa de água e esgoto se sujeita ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil, podendo ser vintenário, na forma estabelecida no art. 177 do Código Civil de 1916, ou decenal, de acordo com o previsto no art. 205 do Código Civil de 2002.

5. Orientação reafirmada pela Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.113.403/RJ, submetido ao rito do art. 543-C do CPC.

6. A divergência jurisprudencial deve ser comprovada, cabendo a quem recorre demonstrar as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confron-tados, com indicação da similitude fática e jurídica entre eles. Indispensável a transcrição de trechos do relatório e do voto dos acórdãos recorrido e paradigma, realizando-se o cotejo analítico entre ambos, com o intuito de bem caracterizar a interpretação legal divergente. O desrespeito a esses requisitos legais e regi-

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mentais (art. 541, parágrafo único, do CPC e art. 255 do RI/STJ) impede o conhe-cimento do Recurso Especial, com base na alínea c do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.

7. Agravo Regimental não provido (AgRg-AREsp 37.894/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 06.03.2012).

O Tribunal goiano consignou (fl. 246, e-STJ):

Vale salientar que não há nos autos constatação de que a perícia de avaliação requererá maiores conhecimentos específicos e especializados em engenharia ou agronomia, razão pela qual entendo não haver necessidade do acompanhamento de profissionais das referidas áreas de atuação, uma vez que a avaliação imobili-ária não requer experiência científica complexa própria daquelas especialidades, devendo o corretor de imóveis atentar para os requisitos exigidos por lei e para as ponderações traçadas pelo magistrado condutor do feito.

Trata-se originariamente de Ação de Instituição de Servidão Administra-tiva com o escopo de imitir a recorrente na posse de imóvel rural pertencente à recorrida (Água Mineral), para que fosse possível a implementação de linhas de transmissão de energia elétrica no local do litígio. Como houve discordân-cia quanto ao valor do imóvel, foi nomeado corretor de imóveis como perito judicial.

A recorrente (Goiás Transmissão) impugnou a escolha do expert, por se tratar de profissional sem nível universitário. Em seu entendimento, apenas o engenheiro agrônomo possui capacidade técnica para avaliar e emitir laudo técnico em áreas rurais.

Para melhor deslinde da controvérsia transcrevo o art. 145, § 1º, do CPC, verbis:

Art. 145. Quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científi-co, o juiz será assistido por perito, segundo o disposto no art. 421.

§ 1º Os peritos serão escolhidos entre profissionais de nível universitário, devida-mente inscritos no órgão de classe competente, respeitado o disposto no Capítulo VI, Seção VII, deste Código

O Tribunal local, conforme se depreende pela leitura dos trechos do acórdão recorrido supra transcritos, foi enfático em salientar: “não há nos autos constatação de que a perícia de avaliação requererá maiores conhecimentos específicos e especializados em engenharia e agronomia”. Portanto, não existiu violação ao texto do art. 145, § 1º, do CPC, que determina a escolha de perito judicial, entre profissionais de nível universitário, quando a prova depender de conhecimento técnico ou científico.

Por tudo isso, não conheço do Recurso Especial.

É como voto.

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certidão de Julgamento segunda turma

Número Registro: 2016/0118572-8 REsp 1.598.649/GO

Números Origem: 00034463332014809000 201493442635 34426333

Pauta: 20.10.2016 Julgado: 20.10.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Assusete Magalhães

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Simões Martins Soares

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

autuaçãoRecorrente: Goiás Transmissão S.A.

Advogado: Alexandre dos Santos Pereira Vecchio e outro(s) – GO021085A

Recorrido: Água Mineral do Cerrado Ltda. – ME

Advogados: Lacordaire Guimarães de Oliveira – GO008269 Francielli Amaral Aguiar e outro(s) – GO037347

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Intervenção do Estado na propriedade – Servidão administrativa

certidão

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães (Presidente) e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2486

Superior Tribunal de JustiçaAgInt no Agravo em Recurso Especial nº 548.529 – SC (2014/0155404‑3)Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas CuevaAgravante: FG Empreendimentos e Incorporações Ltda.Advogado: Leandro Guerrero Guimarães – SC018924Agravante: Luiz Antônio de SouzaAgravante: Valeria Ana do Nascimento de SouzaAdvogados: Roberto Ferreira Rosas – DF000848

Vladimir de Marck – SC008746 Beatriz Fedumenti Goes e outro(s) – SC003597 João José Ramos Schaefer – SC016700 Nelson Luiz Schaefer Picanço – SC015716 Carlos Alberto Dellagiustina – DF022096

Agravante: Magno Participações e Investimentos Ltda.Advogados: Everaldo Luís Restanho – SC009195

Alexandre Reis de Farias – SC009038Agravado: Lucca Revestimentos Cerâmicos Ltda. – Massa falidaRepr. por: Agenor Daufenbach Junior – AdministradorAdvogado: Daniela de Oliveira Rodrigues – SC016776Interes.: Condomínio Residencial Praia BravaAdvogado: Rafael de Assis Horn e outro(s) – SC012003Interes.: Itanhém S/AAdvogado: Ana Paula Reis de Farias – SC019267Interes.: Mineração de Lucca Ltda. – MEAdvogado: Everaldo Luís Restanho e outro(s) – SC009195Interes.: Comercial Sul Catarinense de Materiais de Construção Ltda.Advogado: Everaldo Luís Restanho e outro(s) – SC009195Interes.: FG Empreendimentos e Incorporações Ltda. – MEAdvogado: Leandro Guerrero Guimarães – SC018924

ementa

AgrAVo INterNo No AgrAVo em recurSo eSpecIAL – FuNdAmeNtoS dA decISão AgrAVAdA – AuSÊNcIA de ImpugNAção – Art. 1.021, § 1º, do cpc/2015 – SÚmuLA Nº 182 do SuperIor trIbuNAL de JuStIçA

1. Não pode ser conhecido o recurso que não infirma especificamente os fundamentos da decisão agravada, por força do disposto no art. 1.021, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015. O conteúdo normativo do referido dispositivo legal já estava cristalizado no entendimento jurispru-dencial do Superior Tribunal de Justiça na redação da Súmula nº 182/STJ.

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2. Agravo interno não conhecido.

acórdão

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, deci-de a Terceira Turma, por unanimidade, não conhecer do agravo, nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino vo-taram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 18 de outubro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva Relator

relatório

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (Relator): Trata-se de agravo interno interposto por FG Empreendimentos e Incorporações Ltda. (fls. 3.912/3.951, e-STJ) contra decisão que conheceu do agravo para não co-nhecer do recurso especial em virtude da aplicação das Súmulas nºs 7, 13 e 568/STJ e nºs 282 e 283/STF e porque não restou demonstrada a violação do art. 535 do Código de Processo Civil/1973.

Alega a agravante que,

“[...] corretos ou não, os fatos expressamente mencionados pelo acórdão devem ser considerados para a análise do direito aplicável à espécie, sem a necessidade de reanálise de provas e documentos dos autos. O reexame da matéria fática se configura quando a parte sustenta que os fatos são inverídicos, inexistentes ou ocorridos de forma diversa, o que então se exigiria o reexame da matéria fática, mediante análise de provas e documentos dos autos.

[...] repita-se exaustivamente, a pretensão da recorrente jamais foi a de reexami-nar a matéria fática, as provas ou os documentos dos autos. Mas, ao revés, sua pretensão foi a de adotar os fatos considerados e expostos no acórdão como in-controversos para, a partir daí, demonstrar que as consequências jurídicas impos-tas na decisão recorrida violam os dispositivos de lei federal invocados (arts. 82 e 130 da Lei nº 11.101/2005).

[...]

A decisão monocrática ora recorrida entendeu que não houve violação do art. 50 do Código Civil, tendo em vista a existência de entendimento dessa Corte pela desnecessidade de ação autônoma para se aplicar a desconsideração da perso-nalidade jurídica em processo falimentar, nos casos em que se configurar fraude, abuso de direito e a confusão patrimonial.

Ocorre que esta premissa e os precedentes colacionados não condizem com o presente caso. O que sustenta a recorrente é que a ação revocatória foi proposta

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com fulcro no art. 130 da Lei nº 11.101/2005 e não no art. 50 do Código Civil. E sequer no seu curso foi dada as partes o direito ao contraditório e ampla defesa quanto à aplicação do referido instituto.

O âmago da discussão não está na propositura ou não de ação autônoma.

O que se questiona, inicialmente, é que a desconsideração da personalidade jurídica é instituto absolutamente diverso e incompatível com a ação revocatória. Naquele busca-se a extensão dos efeitos de certos e determinados negócios jurí-dicos celebrados em nome de pessoas jurídicas aos seus sócios e administrado-res. Tem como pressuposto o abuso da personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial.

Na ação revocatória visa-se recuperar bens desviados pelo falido às vésperas da falência, em conluio com terceiros para prejudicar credores, mediante a descons-tituição de atos jurídicos.

Enfim, são pressupostos e consequências absolutamente diferentes.

[...] aplicar a desconsideração da personalidade jurídica no curso de uma ação revocatória, sem que seja objeto da ação e sem requerimento da parte, para determinar consequência diversa da ação desconstitutiva, representa lesão, ao mesmo tempo, do art. 130 da lei falimentar e do art. 50 do Código Civil.

Como se não bastasse, os requisitos da desconsideração da personalidade jurí-dica não se verificam no caso em tela. Como efeito, embora tenha sido mencio-nado no acórdão, é impossível e incompatível a confusão patrimonial alegada envolvendo os bens objeto deste recurso.

[...] assim, que o que se postulou recurso especial não é a necessidade de ação autônoma para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica.

O que se sustenta é algo absolutamente diverso: que a desconsideração não se coaduna com a ação revocatória e que os pressupostos não estão presentes no caso em tela.

É, portanto, inaplicável ao caso a Súmula nº 568 do Superior Tribunal de Justiça, devendo a arguição de violação do art. 50 do Código Civil deve ser enfrentada por essa Corte, em decisão colegiada, no julgamento do recurso especial confor-me as razões de recurso já lançadas.

[...] a desconsideração não pode ser aplicada de ofício, sem qualquer requeri-mento da parte, conforme exige a lei. E, como o objeto da presente ação revo-catória é a desconstituição de negócios jurídicos, mas não a responsabilidade de terceiros pela desconsideração da personalidade jurídica, o v. acórdão extrapo-lou os limites da lide, em manifesta lesão ao art. 128 do Código Civil,

[...] a violação foi praticada pelo e a partir do acórdão recorrido. Coube a re-corrente tão somente interpor o apelo extremo pela violação do dispositivo em questão, violação esta, repita-se, inaugurada na decisão de segunda instância, objeto do recurso especial.

Neste sentido, deve a decisão monocrática ser reformada, para que o recurso especial seja conhecido e a matéria em questão enfrentada pelo colegiado, com o intuito de, ao final, reformar o v. acórdão recorrido” (fls. 3.919/3.939, e-STJ).

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Ademais, insiste na negativa de vigência do art. 535 do Código de Pro-cesso Civil de 1973 e na inaplicabilidade da Súmula nº 13/STJ.

Ao final, pugna pela reforma da decisão agravada.

Impugnação às fls. 4.012/4.016 (e-STJ).

É o relatório.

Voto

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva (Relator): O agravo inter-no não comporta conhecimento.

A decisão impugnada conheceu do agravo para conhecer parcialmente do recurso especial em virtude da aplicação das Súmulas nºs 7, 13 e 568/STJ e nºs 282 e 283/STF e porque não restou demonstrada a violação do art. 535 do Código de Processo Civil/1973.

Nas razões do presente recurso, contudo, não foram apresentados argu-mentos capazes de afastar a incidência da Súmula nº 283/STF. Nesse cenário, incide o disposto no § 1º do art. 1.021 do Código de Processo Civil de 2015.

Imperioso mencionar, ainda, que o óbice previsto no dispositivo legal em epígrafe já estava contido na Súmula nº 182 desta Corte, conforme se observa do seguinte precedente:

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – RECURSO ESPECIAL INEPTO – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ES-PECÍFICA À DECISÃO AGRAVADA – SÚMULA Nº 182/STJ – [...]

A ausência de impugnação específica aos fundamentos da decisão agravada atrai a incidência da Súmula nº 182 do STJ.

Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg-AREsp 408.643/DF, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., Julgado em 06.11.2014, DJe 14.11.2014).

Ante o exposto, não conheço do agravo interno.

É o voto.

certidão de Julgamento terceira turma

Processo Eletrônico AgInt-AREsp 548.529/SC

Número Registro: 2014/0155404-3

Números Origem: 20070279276 20100677369 20100677369000100 20100677369000200 20100677369000201 20100677369000300 20100677369000400 201401554043

Pauta: 06.10.2016 Julgado: 18.10.2016

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Relator: Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Mário Pimentel Albuquerque

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

autuaçãoAgravante: Luiz Antônio de Souza

Agravante: Valeria Ana do Nascimento de Souza

Advogados: Roberto Ferreira Rosas – DF000848 Vladimir de Marck – SC008746 Beatriz Fedumenti Goes e outro(s) – SC003597 João José Ramos Schaefer – SC016700 Nelson Luiz Schaefer Picanço – SC015716 Carlos Alberto Dellagiustina – DF022096

Agravante: Magno Participações e Investimentos Ltda.

Advogados: Everaldo Luís Restanho – SC009195 Alexandre Reis de Farias – SC009038

Agravante: FG Empreendimentos e Incorporações Ltda.

Advogado: Leandro Guerrero Guimarães – SC018924

Agravado: Lucca Revestimentos Cerâmicos Ltda. – Massa falida

Repr. por: Agenor Daufenbach Junior – Administrador

Advogado: Daniela de Oliveira Rodrigues – SC016776

Interes.: Condomínio Residencial Praia Brava

Advogado: Rafael de Assis Horn e outro(s) – SC012003

Interes.: Itanhém S/A

Advogado: Ana Paula Reis de Farias – SC019267

Interes.: Mineração de Lucca Ltda. – ME

Advogado: Everaldo Luís Restanho e outro(s) – SC009195

Interes.: Comercial Sul Catarinense de Materiais de Construção Ltda.

Advogado: Everaldo Luís Restanho e outro(s) – SC009195

Interes.: FG Empreendimentos e Incorporações Ltda. – ME

Advogado: Leandro Guerrero Guimarães – SC018924

Assunto: Direito civil – Empresas – Sociedade

agraVo interno

Agravante: FG Empreendimentos e Incorporações Ltda.

Advogado: Leandro Guerrero Guimarães – SC018924

Agravante: Luiz Antônio de Souza

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Agravante: Valeria Ana do Nascimento de Souza

Advogados: Roberto Ferreira Rosas – DF000848 Vladimir de Marck – SC008746 Beatriz Fedumenti Goes e outro(s) – SC003597 João José Ramos Schaefer – SC016700 Nelson Luiz Schaefer Picanço – SC015716 Carlos Alberto Dellagiustina – DF022096

Agravante: Magno Participações e Investimentos Ltda.

Advogados: Everaldo Luís Restanho – SC009195 Alexandre Reis de Farias – SC009038

Agravado: Lucca Revestimentos Cerâmicos Ltda. – Massa falida

Repr. por: Agenor Daufenbach Junior – Administrador

Advogado: Daniela de Oliveira Rodrigues – SC016776

Interes.: Condomínio Residencial Praia Brava

Advogado: Rafael de Assis Horn e outro(s) – SC012003

Interes.: Itanhém S/A

Advogado: Ana Paula Reis de Farias – SC019267

Interes.: Mineração de Lucca Ltda. – ME

Advogado: Everaldo Luís Restanho e outro(s) – SC009195

Interes.: Comercial Sul Catarinense de Materiais de Construção Ltda.

Advogado: Everaldo Luís Restanho e outro(s) – SC009195

Interes.: FG Empreendimentos e Incorporações Ltda. – ME

Advogado: Leandro Guerrero Guimarães – SC018924

certidão

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, não conheceu do agravo, nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a).

Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Re-lator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2487

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.300.702 – SC (2012/0006838‑9)Relator: Ministro Benedito GonçalvesR. p/Acórdão: Ministro Napoleão Nunes Maia FilhoRecorrente: Celestino Luiz Eich e outroAdvogado: Jair Dal Ri e outro(s) – SC012533Recorrido: Departamento Estadual de Infra‑Estrutura – DeinfraProcurador: Jorge Luiz Silveira e outro(s) – SC004929

ementa

proceSSuAL cIVIL e AdmINIStrAtIVo – recurSo eSpecIAL – Ação de INdeNIZAção por deSAproprIAção INdIretA pArA ImpLANtAção de rodoVIA ASFALtAdA – eSbuLho AdmINIStrAtIVo ocorrIdo em 1994 – demANdA AJuIZAdA em 2006 – utILIZAção dA regrA de trANSIção eStAbeLecIdA No Art. 2.028 do cc/2002 ApLIcANdo A meSmA LÓgIcA JurÍdIcA Que orIgINou A SÚmuLA Nº 119/StJ, A repArAção orIuNdA de deSAproprIAção INdIretA preScreVe em 15 ANoS, NoS termoS do Art. 1.238, cAput do cc/2002 – INApLIcáVeIS Ao poder pÚbLIco AS hIpÓteSeS de redução do prAZo coNtIdAS No pArágrAFo ÚNIco – beNeFÍcIo eXcLuSIVo do pArtIcuLAr pArA FINS de uSucApIão – reSpeItoSA dIVergÊNcIA Ao emINeNte reLAtor, pArA dAr proVImeNto Ao recurSo eSpecIAL e FIXAr o eNteNdImeNto Que NAS AçõeS de deSAproprIAção INdIretA ApLIcA-Se o prAZo preScrIcIoNAL de 15 ANoS determINAdo No cAput do Art. 1.238 do cc/2002.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Pri-meira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sérgio Kukina, por maioria, vencido o Sr. Ministro Relator, dar pro-vimento ao recurso especial, estabelecendo que nas ações de desapropriação indireta aplica-se o prazo prescricional de 15 anos determinado no caput do art. 1.238 do CC/2002, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que lavrará o Acórdão.

Votaram com o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho (voto-vista) os Srs. Ministros Sérgio Kukina (Presidente) (voto-vista), Regina Helena Costa e Gurgel de Faria (RISTJ, art. 162, § 4º, segunda parte).

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ������������������������������������������������������������������������������������������������137

Brasília/DF, 15 de setembro de 2016 (data do Julgamento).

Napoleão Nunes Maia Filho Ministro Relator

certidão de Julgamento primeira turma

Número Registro: 2012/0006838-9 Processo Eletrônico REsp 1.300.702/SC

Números Origem: 20110203394 20110203394000100 20110203394000200 43060016968

Pauta: 19.03.2015 Julgado: 19.03.2015

Relator: Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Darcy Santana Vitobello

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuaçãoRecorrente: Celestino Luiz Eich e outro

Advogado: Jair Dal Ri e outro(s)

Recorrido: Departamento Estadual de Infra-Estrutura – Deinfra

Procurador: Jorge Luiz Silveira e outro(s)

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Intervenção do Estado na propriedade – Desapropriação Indireta

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“Adiado por indicação do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

certidão de Julgamento primeira turma

Número Registro: 2012/0006838-9 Processo Eletrônico REsp 1.300.702/SC

Números Origem: 20110203394 20110203394000100 20110203394000200 43060016968

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Pauta: 19.03.2015 Julgado: 24.03.2015

Relator: Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Francisco Rodrigues dos Santos Sobrinho

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuaçãoRecorrente: Celestino Luiz Eich e outro

Advogado: Jair Dal Ri e outro(s)

Recorrido: Departamento Estadual de Infra-Estrutura – Deinfra

Procurador: Jorge Luiz Silveira e outro(s)

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Intervenção do Estado na propriedade – Desapropriação indireta

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“Adiado por indicação do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

relatório

O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por Celestino Luiz Eich e outro, com arrimo nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão oriundo do Tribunal de Jus-tiça do Estado de Santa Catarina, cuja ementa está consignada nos seguintes termos:

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – IMPLANTAÇÃO DE RODOVIA ASFALTADA – PRESCRIÇÃO – PRAZO REDUZIDO PELO CÓDIGO CIVIL DE 2002 DE VIN-TE PARA TRÊS ANOS – REGRA DE TRANSIÇÃO DO ART. 2.028 – APLICAÇÃO DO ART. 206, § 3º, V – EXTINÇÃO DO PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO

O prazo de prescrição da pretensão de indenização por desapropriação indireta, que era de vinte anos pelo Decreto-Lei nº 3.365/1941, passou a ser de três anos pelo Código Civil de 2002. Segundo a regra de transição do art. 2.028 deste últi-

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mo, “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.

“Se no caso concreto incidir a regra de transição do Código Civil de 2003 acer-ca da prescrição e o prazo a ser aplicado for o de três anos estabelecido no art. 208, § 3º, IV, deste ordenamento, o dies a quo da contagem será a data de iní-cio da sua vigência, ou seja, 11.01.2003.” (TJSC, AC 2008.023191-5, de Dionísio Cerqueira, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros) (fl. 257)

Os ora recorrentes opuseram embargos declaratórios, às fls. 269-272, que foram rejeitados pelo Tribunal a quo (fl. 275).

Noticiam os autos que os ora recorrentes ajuizaram ação de desapro-priação indireta contra Departamento Estadual de Infra-Estrutura (Deinfra), ao argumento de que autarquia ré se apossou de área inserida em imóvel de sua propriedade.

O Juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente a pretensão dos autores e condenou o réu ao pagamento de indenização, no valor de R$ 8.424,81 (oito mil reais e quatrocentos e vinte e quatro reais e oitenta e um centavos).

Irresignadas, ambas as partes apelaram ao Tribunal de Justiça catarinense (fls. 216-221 e 223-230), o qual, por sua Quarta Turma de Direito Público, deu provimento à remessa necessária e considerou prescrito o direito de pleitear indenização por desapropriação indireta.

No bojo do recurso especial, os recorrentes alegam violação do art. 1.238 do Código Civil vigente, ao argumento de que o prazo prescricional para plei-tear indenização por desapropriação indireta é de quinze anos. Acrescentam que o acórdão impugnado adotou entendimento divergente daquele sedimen-tado por outros Tribunais pátrios.

O recorrido apresentou contrarrazões ao recurso especial, às fls. 311-315, e preliminarmente alegou o não cumprimento do requisito do pre-questionamento.

No mérito, pugnou pela mantença do acórdão impugnado e argumentou transcorrem mais de vinte anos entre a desapropriação e o ajuizamento da ação indenizatória.

O recurso especial recebeu crivo positivo de admissibilidade no Tribunal a quo, razão pela qual os autos ascenderam ao STJ (fls. 319-320).

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso espe-cial (fls. 330-334).

É o relatório.

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Voto-Vencido

O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Preliminarmente, o re-curso especial deve ser conhecido quanto ao seu cabimento pela alínea a do permissivo constitucional, na medida em que o tema prazo prescricional para pleitear indenização por desapropriação indireta foi debatido pelo acórdão im-pugnado e foram cumpridos os demais requisitos de admissibilidade recursal.

O Tribunal de Justiça catarinense proveu a pretensão recursal do Depar-tamento Estadual de Infra-Estrutura (Deinfra) e a remessa oficial, para aplicar o prazo trienal e declarar prescrito o direito dos autores, ora recorrentes, de plei-tearem indenização por desapropriação indireta, conforme se infere do seguinte excerto do voto condutor do acórdão recorrido:

No caso dos autos, os autores informaram que no ano de 1982 o Estado de Santa Catarina se apossou de cerca de 6.175 m2 do terreno a eles pertencente, para a implantação da Rodovia SC 386. Assim, como a presente demanda foi protocoli-zada somente em dezembro de 2006, a pretensão indenizatória dos autores teria sido alcançada pela prescrição vintenária.

Ocorre que, por meio do Decreto nº 4.471, de 13 de maio de 1994, publicado no Diário Oficial do Estado em 17 de maio de 1994, o Estado de Santa Catarina declarou “de utilidade pública para fins de aquisição por doação ou desapropria-ção, amigável ou judicial, os imóveis atingidos pela faixa de domínio com até 60 (sessenta) metros de largura, as rodovias a seguir especificadas, bem como as jazidas de material a serem utilizadas na construção dessas rodovias, embora situadas fora da faixa de domínio” (art. 1º).

Dentre as Rodovias mencionadas no Decreto nº 4.471/1994 consta a SC-386, que é a que passou pelo imóvel dos autores.

Destaca-se que, em que pese não haver cópia nos presentes autos, nesta data foram julgadas as Apelações Cíveis nºs 2010.077892-2 e 2011.018196-4, ambas da Comarca de Descanso, que tinham por objeto também a indenização por desapropriação indireta em razão da pavimentação na SC-386, em que foram juntadas cópias do Decreto nº 4.471/1994.

Não há dúvida de que a publicação de decreto de desapropriação interrompe a prescrição da pretensão indenizatória de área já anteriormente ocupada, como tem orientado este Tribunal:

“A superveniente publicação do decreto de desapropriação acarreta a interrupção da prescrição vintenária da indenização de área já ocupada em época antecedente” (TJSC, Apelação Cível nº 2007.040159-5, de Descanso, Rel. Des. Newton Janke, em 27.03.2009).

Portanto, no caso o prazo vintaneiro de prescrição recomeçou a correr a partir de 13 de maio de 1994.

Contudo, em virtude da superveniência do Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406, de 10.01.2002), é preciso examinar as regras de direito intertemporal para se

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saber se houve ou não a prescrição da pretensão dos autores, eis que a ação foi proposta quando já estava em vigor o novel Estatuto Privado, que trouxe profun-das alterações nos prazos de prescrição.

Para as pretensões em geral, tanto de direito pessoal, quanto de direito real, o Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406/02), em vigor desde 12.01.2003 (cf. Nelson Nery Júnior), reduziu o prazo de prescrição de 20 (vinte) para 10 (dez) anos, sem discriminação. Diz o art. 205: “a prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”. Ficou muito bem claro, aí, que esse novo prazo somente se aplica às pretensões para as quais a lei não haja fixado prazo menor.

O art. 206, § 3º, inciso V, o Código Civil de 2002 estabeleceu o prazo de 3 (três) anos para a prescrição da “pretensão de reparação civil”.

Com essa disposição fica claro que para as pretensões de reparação civil, incluin-do o pleito de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, como é o caso dos autos, o prazo prescricional foi reduzido para três (3) anos.

O art. 2.028 do Código Civil de 2002 determinou que “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.

Na ensinança de Antonio Jeová Santos “quando a lei nova abrevia o prazo e ain-da não se passou a metade do tempo da prescrição prevista na legislação anterior e diante do contido no art. 2.028 do CC, a solução é contar novo prazo a partir do novo Código.

“[...] se o ilícito ocorreu em 2001, à luz do prazo estabelecido no Código de Beviláqua, a ação de reparação de danos poderia ser interposta em 20 anos. A vítima poderia esperar todo esse tempo. Agora, com a redução do lapso temporal, ele terá apenas três anos para buscar no Judiciário a reparação do dano que padeceu.

Só que esses três anos passam a ser contados a partir de 12.01.2003, data da vigência do Código Civil de 2002. Em nada aproveita o tempo decorrido antes de a nova lei ter entrado em vigor.

Esta é a lição formada pela doutrina nacional e a lógica assim impõe para impedir que a pessoa que não se preocupou em defender seu direito, porque confiava no largo prazo de uma lei, não seja surpreendida por lei nova que abreviou o tempo da prescrição” (Direito intertemporal e o novo Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 106).

Por isso, ao contrário do fixado pela sentença, o prazo a ser aplicado é o do art. 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil de 2002, em face da aplicação da regra de direito intertemporal do art. 2.028 do mesmo Estatuto.

Aliás, nesse sentido vem decidindo este Tribunal, atualmente:

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“CIVIL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESA- PROPRIAÇÃO INDIRETA – PRESCRIÇÃO TRIENAL – CC, ART. 206, § 3º, INC. V – DIES A QUO – DATA DA ENTRADA EM VIGOR DO NOVO CÓDIGO CIVIL

A pretensão deduzida na ação de indenização por desapropriação indireta não se sujeita ao regramento contido no Decreto-Lei nº 3.365/1941 ou no Decreto nº 20.910/1932 para efeito de contagem do prazo prescricional, e sim à legislação civil.

O lapso temporal, no caso, é trienal, por força do disposto no inc. V do § 3º do art. 206 do Código Civil, e o dies a quo se dá com a entrada em vigor da novel legislação” (Apelação Cível nº 2011.006466-8, de Joaçaba, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, Julgado em 06.04.2011).

Colhem-se ainda os seguintes julgados que seguem na mesma trilha: 2011.005429-6, 2011.005044-9, 2011.005869-6, 2010.056157-8, 2010.066490-8, 2010.046082.

O Superior Tribunal de Justiça, embora ainda não tenha se pronunciado espe-cificamente sobre a prescrição nas ações de desapropriação indireta, corrobora o entendimento de que para as ações indenizatórias por ato ilícito (como o é o apossamento administrativo) o prazo prescricional foi reduzido para três anos e deve ser aplicado:

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – ATO ILÍCITO – PRESCRIÇÃO – PRAZO – CONTAGEM – MARCO INICIAL – REGRA DE TRANSIÇÃO – NOVO CÓDIGO CIVIL

1. Se pela regra de transição (art. 2028 do Código Civil de 2002) há de ser aplicado o novo prazo de prescrição, previsto no art. 206, § 3º, IV do mesmo diploma legal, o marco inicial de contagem é o dia 11 de janeiro de 2003, data de entrada em vigor do novo Código e não a data do fato gerador do direito. Precedentes do STJ.

2. Recurso especial conhecido e provido para, afastando a prescrição, no caso concreto, determinar a volta dos autos ao primeiro grau de jurisdição para julgar a demanda.” (STJ, REsp 838414/RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, J. 08.04.2008, DJU 22.04.2008)

Então, como a ação foi ajuizada somente em 20.12.2006, foi atingida pela pres-crição trienal, que se deu em janeiro de 2006, uma vez que o prazo começou a correr com a entrada em vigor do Código Civil de 2002 que, nos termos do seu art. 2.044, foi em 12.01.2003 (cf. NERY JÚNIOR, Nelson. Novo Código Civil e legislação extravagante anotados. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 658, nota 1 ao art. 2044).

A prescrição pode ser pronunciada pelo Juiz, de ofício (art. 219, e §§ 1º e 5º, do Código de Processo Civil), ou a requerimento da parte a quem aproveita, em

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qualquer grau de jurisdição (art. 193, do Código Civil de 2002, equivalente ao art. 162, do Código Civil de 1916).

Ante o exposto, dá-se provimento ao recurso do Deinfra para reconhecer a prescrição e julgar extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, inciso IV, do Código de Processo Civil (fls. 261-265).

Pois bem, na vigência do Código Civil de 1916, o STJ sedimentou o en-tendimento segundo o qual “[a] ação de desapropriação indireta prescreve em 20 anos” (Súmula nº 119/STJ). Esse entendimento se consubstanciou a partir do prazo então previsto pelo art. 550 do Código Civil de 1916 (já revogado), por força da analogia relativamente ao usucapião extraordinário.

Art. 550. Aquele que, por vinte anos sem interrupção, nem oposição, possuir como seu, um imóvel, adquirir-lhe-á o domínio independentemente de título de boa fé que, em tal caso, se presume, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual lhe servirá de título para a transcrição no registro de imóveis.

Daí a edição da Súmula nº 119/STJ (“a ação de desapropriação indireta prescreve em 20 anos”).

Tal raciocínio se deu em razão de que a ação expropriatória indireta ostenta natureza real, bem como que, enquanto não transcorrido o prazo para aquisição da propriedade por meio do usucapião, subsistiria a pretensão de rei-vindicar o correspondente preço do bem objeto do apossamento administrativo.

Porém, deve ser exposto que o Código Civil vigente, em seu art. 1.238, reduziu o prazo do usucapião extraordinário para quinze anos, prevendo tam-bém, no parágrafo único do indigitado dispositivo, a redução desse prazo para dez anos, na hipótese de o possuidor estabelecer sua moradia habitual no imó-vel ou realizar obras ou serviços de caráter produtivo, conforme se infere da seguinte transcrição:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele reali-zado obras ou serviços de caráter produtivo.

Sob esse ângulo, convém assinalar que a alteração implementada pelo Código Civil de 2002 também deve ser aplicada ao prazo prescricional do di-reito de ajuizar ação indenizatória por desapropriação indireta, o qual era vin-tenário sob a égide da legislação revogada e, frente à inovação legislativa supra, passa a ser decenal, tendo em vista que a desapropriação indireta é levada a

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efeito em razão da realização obras pelo Poder Público ou por força da destina-ção de utilidade pública ou de interesse social atribuída ao imóvel.

O cômputo do novel prazo de prescrição aquisitiva, definido no parágra-fo único do art. 1.238 do Código Civil vigente, deve ser realizado com a obser-vância da regra de transição a que alude o art. 2.028 do diploma em questão, no sentido de que “[s]erão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.

Aplicando a regra de transição, sobreleva notar que, no caso em foco, o prazo prescricional foi interrompido por força da publicação do Decreto Ex-propriatório nº 4.471, em 13.05.1994 (fl. 262), bem como que não transcorreu metade do prazo vintenário até a entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11.01.2003), razão pela qual deve ser aplicado o novel prazo decenal. Dessa forma, observa-se não ter transcorrido o prazo decenal entre a entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11.01.2003) e o ajuizamento da ação indenizatória.

À guisa de exemplo, colhem-se os seguintes julgados da Segunda Turma do STJ:

ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – PRAZO PRESCRICIONAL – AÇÃO DE NATUREZA REAL – USUCAPIÃO EXTRA-ORDINÁRIO – SÚMULA Nº 119/STJ – PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA – CÓDIGO CIVIL DE 2002 – ART. 1.238, PARÁGRAFO ÚNICO – PRESCRIÇÃO DECENAL – REDUÇÃO DO PRAZO – ART. 2.028 DO CC/2002 – REGRA DE TRANSIÇÃO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – ART. 27, §§ 1º E 3º, DO DL 3.365/1941

1. A ação de desapropriação indireta possui natureza real e, enquanto não trans-corrido o prazo para aquisição da propriedade por usucapião, ante a impossibi-lidade de reivindicar a coisa, subsiste a pretensão indenizatória em relação ao preço correspondente ao bem objeto do apossamento administrativo.

2. Com fundamento no art. 550 do Código Civil de 1916, o STJ firmou a orienta-ção de que “a ação de desapropriação indireta prescreve em 20 anos” (Súmula nº 119/STJ).

3. O Código Civil de 2002 reduziu o prazo do usucapião extraordinário para 10 anos (art. 1.238, parágrafo único), na hipótese de realização de obras ou serviços de caráter produtivo no imóvel, devendo-se, a partir de então, observadas as regras de transição previstas no Codex (art. 2.028), adotá-lo nas expropriatórias indiretas.

4. Especificamente no caso dos autos, considerando que o lustro prescricional foi interrompido em 13.05.1994, com a publicação do Decreto expropriatório, e que não decorreu mais da metade do prazo vintenário previsto no código revo-gado, consoante a disposição do art. 2.028 do CC/2002, incide o prazo decenal a partir da entrada em vigor do novel Código Civil (11.01.2003).

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5. Assim, levando-se em conta que a ação foi proposta em dezembro de 2008, antes do transcurso dos 10 (dez) anos da vigência do atual Código, não se confi-gurou a prescrição.

6. Os limites percentuais estabelecidos no art. 27, §§ 1º e 3º, do DL 3.365/1941, relativos aos honorários advocatícios, aplicam-se às desapropriações indiretas. Precedentes do STJ.

7. Verba honorária minorada para 5% do valor da condenação.

8. Recurso Especial parcialmente provido, apenas para redução dos honorá-rios advocatícios (REsp 1.300.442/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 26.06.2013).

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – PRECLUSÃO – MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA – SÚMULA Nº 282/STF – PRESCRIÇÃO – NECESSI-DADE DE OBSERVÂNCIA DOS NOVOS PRAZOS DEFINIDOS NO CÓDIGO CIVIL VIGENTE

1. Descabe a esta Corte analisar tese que não foi debatida na instância de origem. Incidência da Súmula nº 282/STF.

2. Seguindo a linha de entendimento de que a prescrição da ação de indeniza-ção por desapropriação indireta regula-se pelo prazo da usucapião, devem ser considerados os novos prazos da prescrição aquisitiva definidos no Código Civil vigente (art. 1.238 e ss.), observadas as regras de transição (art. 2.028 e ss.).

3. Transcorrido menos da metade do tempo estabelecido no Código Civil de 1916, aplica-se o novo prazo prescricional definido no Código Civil atual, con-tado a partir de sua vigência.

4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido (REsp 1.386.164/SC, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe 14.10.2013).

RECURSO ESPECIAL – DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – OMISSÕES E CON-TRADIÇÕES NÃO VERIFICADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO – PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA – AÇÃO DE NATUREZA REAL – SÚMULA Nº 119/STJ – DECRETO Nº 20.910/1932 E REDUÇÃO DO PRAZO NO ATUAL CÓDIGO CIVIL – APLI-CAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – REGRA DE TRANSIÇÃO – HONORÁ-RIOS ADVOCATÍCIOS – PERCENTUAL – SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA E COM-PENSAÇÃO – PREQUESTIONAMENTO

1. Estando claro no acórdão recorrido que os juros compensatórios e os lucros cessantes, inacumuláveis, não se confundem, tem-se que aqueles, mais amplos que estes, não ficam prejudicados pela ausência de comprovação, no caso con-creto, de que o terreno em questão garantia alguma renda à autora” na atualida-de. Inexiste contradição, portanto, nesse ponto.

2. Quanto ao exame da “prescrição sob o enfoque do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, combinado com o parágrafo único do art. 10 da Lei nº 3.365/1941, este acrescido pelo art. 1º da MP 2138-56/2001, todos em con-

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junto com o art. 269, IV, do CPC; assim como do art. 1.238 do CC/2002, com-binado com o art. 269, IV do CPC, inexiste omissão, pois o Tribunal de origem aplicou a Súmula nº 119/STJ, a qual é resultante da interpretação dos dispositivos pertinentes à matéria, e, ainda, acórdão proferido já na vigência do atual Código Civil.

3. Descaracterizada, igualmente, omissão sobre o tema “da compensação dos honorários advocatícios com base no art. 21 do CPC, combinado com o art. 27, § 1º, do Decreto-Lei nº 3.365/1941”, considerando-se que o Tribunal de origem não precisaria, mesmo, enfrentar questão não trazida oportunamente nos recur-sos próprios.

No caso em debate, (i) a sentença não examinou a obrigatoriedade de compen-sação dos honorários, tendo, tão somente, condenado o réu, Estado do Piauí, na importância equivalente a 3% (três por cento) “sobre o valor da indenização, uma vez que não houve qualquer oferta oficial”; (ii) a apelação do Estado do Piauí não teceu qualquer consideração sobre os honorários e o apelo da autora, Construtora Poty Ltda., postulou, simplesmente, a majoração da referida verba; (iii) as contrarrazões apresentadas pelo Estado do Piauí ao recurso da autora, as quais não possuem efeito de apelação, não poderiam inovar, invocando a “sucumbência recíproca” na forma do art. 21 do Código de Processo Civil para efeito de impor compensação.

4. A jurisprudência desta Corte é pacífica em considerar que o prazo prescri-cional, para a ação de desapropriação indireta, de natureza real, é de 20 (vinte) anos (prazo da prescrição aquisitiva previsto Código Civil de 1916), orientação essa consolidada na antiga Súmula nº 119, publicada pela Primeira Seção em 08.11.1994.

5. No tocante ao art. 1.238 do Código Civil em vigor, que reduziu o prazo do art. 550 do Código Civil de 1916, não se aplica ao caso em debate, considerando o disposto no art. 2.028 do Código Civil em vigor, segundo o qual serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entra-da em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada. No caso concreto, o ato de apossamento por parte do Estado se deu em 1988 e o Código Civil de 2002 entrou em vigor em 11.01.2003, verificando-se aí um interregno superior a 10 (dez) anos, ou seja, mais da metade do prazo de 20 (vinte) anos previsto para a prescrição aquisitiva prevista no Código Civil de 1916. Aplicável, portanto, o prazo antigo, previsto na Súmula nº 119/STJ, o que afasta a prescrição, considerando que a ação foi proposta em 11.09.2003.

6. O percentual arbitrado a título de verba honorária, mais alto (5% – no acórdão) ou mais baixo (3% – na sentença), não tem nenhuma relação ou influência dos institutos da sucumbência recíproca e da compensação, essa nem mesmo impos-ta em primeiro ou em segundo graus.

Na compensação, ressalte-se, apura-se o que cada parte ganhou e perdeu para fixar o valor dos honorários advocatícios dos respectivos advogados na propor-ção da vitória obtida por cada um. Em seguida, para concluir a compensação,

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subtrai-se do maior valor o menor. Terá direito a essa diferença a parte que tiver vencido a maior parte da demanda.

7. Quanto à pretendida redução dos honorários “a zero”, descabe ser postulada e deferida nesta instância especial porque: (i) a apelação do Estado do Piauí não abordou o tema da verba honorária; (ii) as contrarrazões apresentas pelo ente público à apelação da autora não cuidaram da “alíquota zero” nem poderiam inovar por não ser recurso; (iii) o acórdão da apelação se limitou a aumentar os honorários para 5% – tema exclusivo da apelação da autora; (iv) os embargos de declaração do Estado inovaram ao fazer “breve” menção aos “honorários zero”, pois ninguém apelou a esse respeito; (v) o Tribunal de origem rejeitou, correta-mente, os embargos, tendo em vista que se limitou a decidir as questões postas nas apelações. Com isso, a pretendida alíquota zero carece do indispensável pre-questionamento, reiterando que esse tema não precisaria mesmo ser enfrentado por não constar das apelações.

8. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido (REsp 944.351/PI, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., DJe 15.04.2013).

Isso posto, dou provimento ao recurso especial, afasto a ocorrência de prescrição e determino a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a fim de que aquela Corte aprecie o mérito do recurso de apelação.

certidão de Julgamento primeira turma

Número Registro: 2012/0006838-9 Processo Eletrônico REsp 1.300.702/SC

Números Origem: 20110203394 20110203394000100 20110203394000200 43060016968

Pauta: 16.06.2015 Julgado: 16.06.2015

Relator: Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sérgio Kukina

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Dilton Carlos Eduardo França

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuaçãoRecorrente: Celestino Luiz Eich e outro

Advogado: Jair Dal Ri e outro(s)

Recorrido: Departamento Estadual de Infra-Estrutura – Deinfra

Procurador: Jorge Luiz Silveira e outro(s)

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Intervenção do Estado na propriedade – Desapropriação indireta

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certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Após o voto do Sr. Ministro Relator dando provimento ao recurso especial, pediu vista antecipada o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Aguardam os Srs. Ministros Sérgio Kukina (Presidente), Regina Helena Costa e Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região).

Voto-VIStA (mINIStro NApoLeão NuNeS mAIA FILho)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA PARA IMPLANTAÇÃO DE RODOVIA ASFALTADA – ESBULHO ADMINISTRATIVO OCORRIDO EM 1994 – DEMANDA AJUIZADA EM 2006 – UTILIZAÇÃO DA REGRA DE TRANSIÇÃO ESTABELECIDA NO ART. 2.028 DO CC/2002 APLICANDO A MESMA LÓGICA JURÍDICA QUE ORIGINOU A SÚMULA Nº 119/STJ, A REPARAÇÃO ORIUNDA DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA PRESCREVE EM 15 ANOS, NOS TERMOS DO ART. 1.238, CAPUT DO CC/2002 – INAPLICÁVEIS AO PODER PÚBLICO AS HIPÓTESES DE REDUÇÃO DO PRAZO CONTIDAS NO PARÁGRAFO ÚNICO – BENEFÍCIO EXCLUSIVO DO PARTICULAR PARA FINS DE USUCAPIÃO – RES-PEITOSA DIVERGÊNCIA AO EMINENTE RELATOR, PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL E FIXAR O ENTENDIMENTO QUE NAS AÇÕES DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA APLICA-SE O PRAZO PRESCRICIONAL DE 15 ANOS DETERMINADO NO CAPUT DO ART. 1.238 DO CC/2002.

1. Conforme relatado pelo eminente Ministro Benedito Gonçalves, tra-ta-se de Recurso Especial interposto por Celestino Luiz Eich e Outro contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, assim ementado:

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – IMPLANTAÇÃO DE RODOVIA ASFALTADA – PRESCRIÇÃO – PRAZO REDUZIDO PELO CÓDIGO CIVIL DE 2002 DE VINTE PARA TRÊS ANOS – REGRA DE TRANSIÇÃO DO ART. 2.028 – APLICAÇÃO DO ART. 206, § 3º, V – EXTINÇÃO DO PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO

O prazo de prescrição da pretensão de indenização por desapropriação indireta, que era de vinte anos pelo Decreto-Lei nº 3.365/1941, passou a ser de três anos pelo Código Civil de 2002. Segundo a regra de transição do art. 2.028 deste últi-mo, serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Se no caso concreto incidir a regra de transição do Código Civil de 2003 acer-ca da prescrição e o prazo a ser aplicado for o de três anos estabelecido no

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art. 208, § 3º, IV, deste ordenamento, o dies a quo da contagem será a data de início da sua vigência, ou seja, 11.01.2003 (TJSC, AC 2008.023191-5, de Dionísio Cerqueira, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros).

2. Da leitura da inicial, verifica-se tratar de ação que busca a indenização material em razão de desapropriação indireta para a construção de rodovia as-faltada, a cargo do Departamento de Infra-Estrutura de Santa Catarina – Deinfra.

3. Defende a parte Autora, ora Recorrente, basicamente, que o acórdão recorrido violou o art. 1.238 do CC/2002, porquanto o prazo prescricional apli-cável aos casos de Desapropriação Indireta seria o de 15 anos e não de 3 anos como determinado no decisum impugnado.

4. Há muito a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça consagrou que, nas ações de desapropriação indireta, o prazo prescricional é equivalente àquele previsto para a usucapião extraordinária, sendo ele de 20 anos, na vi-gência do Código Beviláqua (art. 550), pacificado nesta Corte Superior com a edição da Súmula nº 119/STJ, segundo a qual a ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos.

5. Com a entrada em vigor do Código Civil de 2.002, o prazo da usuca-pião extraordinária foi reduzido para 15 anos de acordo com art. 1.238, caput, podendo, ainda, para fins de aquisição imobiliária, ser minorado para 10 anos nos casos em que o possuidor tenha estabelecido no imóvel sua moradia habi-tual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. Vejamos:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de titulo e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele reali-zado obras ou serviços de caráter produtivo.

6. Especificamente no caso dos autos, os ora Recorrentes ajuizaram em 2006 demanda objetivando receber a justa indenização em razão de esbulho administrativo praticado pelo Departamento Estadual de Infraestrutura – Deinfra no ano de 1994 quando da implantação da Rodovia SCT-386 que une os Muni-cípios Catarinenses de Mondaí e Iporã do Oeste.

7. Decorridos menos da metade do prazo prescricional estabelecido no Código Beviláqua, deverá ser observado o lapso temporal determinado pelo CC/2002, conforme determina a regra de transição do art. 2.028 do CC/2002.

Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

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8. Como não há um prazo prescricional específico previsto no CC/2002 para as desapropriações indiretas, deve-se aplicar a lógica jurídica cristalizada na Súmula nº 119/STJ ou seja, aplicar por analogia o prazo da usucapião extra-ordinária.

9. Nesse sentido, o Código Civil de 2002 reduziu o prazo do usucapião extraordinário de 20 anos para 15 anos (art. 1.238), devendo-se, a partir de en-tão, observadas as regras de transição previstas no Codex (art. 2.028), adotá-lo nas expropriatórias indiretas.

10. Ocorre que, diferentemente do que até aqui se discorreu, o eminente Relator adotou em seu voto o entendimento da 2ª Turma de que nos casos de usucapião extraordinário o prazo prescricional seria de 10 anos, conforme dis-põe o parágrafo único do art. 1.028 do CC/2002, razão pela qual este Colegiado tem a oportunidade de analisar a demanda à luz desse entendimento, podendo anuir ou dela discordar.

11. Verifica-se que ainda não houve pronunciamento desta 1ª Turma quanto ao tema.

12. Com a devida vênia, algumas considerações devem ser feitas sobre a controvérsia.

13. A interpretação do direito não é tarefa das mais simples, e está sujeita à constantes divergências. E para possibilitar a interpretação dos textos jurídicos criou-se uma ciência, a hermenêutica. A hermenêutica jurídica tem por objeto o estudo e sistematização dos processos e a melhor interpretação do Direito, tornando sua aplicação mais fácil e eficiente.

14. O art. 5º da LINDB dispõe que na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Esse dispo-sitivo consagra o método teleológico de interpretação, que visa compreender o significado da norma identificando qual o interesse ou valor que ela quer proteger, e o resultado que pretende produzir.

15. Reforçando essa orientação, os arts. 1º e 8º do NCPC estabelecem que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código, e que ao apli-car o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

16. Há no ordenamento jurídico as normas gerais e as exceções. As pri-meiras abrangem um universo amplo de situações, enquanto as segundas tratam de situações particulares, específicas.

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17. Exatamente por tratar de situações específicas, as exceções devem estar previstas na lei de forma clara, devendo ser interpretadas de forma restrita, para abrangerem somente os casos nelas literalmente contemplados, e produzir somente as consequências expressamente previstas.

18. O art. 1.238 do CC/2002 estabeleceu em seu caput para a usucapião extraordinária o prazo prescricional de 15 anos, como regra geral, e no pará-grafo único reduziu esse prazo para 10 anos nas hipóteses onde o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

19. Com efeito, o referido parágrafo único do mencionado dispositivo legal consagra, claramente, uma exceção, quando permite a minoração do pra-zo aquisitivo com a finalidade de privilegiar o direito constitucional à moradia (art. 6º da CF/1988) e o princípio fundamental da República instituído no art. 1º, IV da CF/1988.

20. Ressalte-se que o direito à moradia e a livre iniciativa são questões afetas ao particular e não ao Poder Público.

21. A 2ª Turma, ao julgar caso semelhante, adotou o prazo prescricional do parágrafo único do art. 1.238 do CC/2002 por entender que a desapropria-ção indireta pressupõe a realização de obras pelo Poder Público ou sua desti-nação em função da utilidade pública ou do interesse social, com fundamento no atual Código Civil, o prazo prescricional aplicável às expropriatória indiretas passou a ser de 10 (dez anos) (REsp. 1.300.442/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 26.06.2013).

22. Veja-se que a egrégia 2ª Turma deu interpretação extensiva à exce-ção do parágrafo único, posto que ali, o Legislador Civil não contemplou a uti-lidade ou o interesse social, não sendo, portanto, possível ao intérprete fazê-lo, dadas as regras da hermenêutica, já citadas.

23. Ora, quer me parecer que a redação do dispositivo contém silêncio eloquente a impedir sua aplicação em benefício do Poder Público.

24. Entretanto, conforme é sabido, considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade, portanto, fica claro que a regra estabelecida no parágrafo único do art. 1.028 do CC/2002 busca resguardar especificamente o particular.

25. Do mesmo modo, tem-se que produtivo é tudo aquilo que visa um ganho decorrente de uma atividade econômica para suprimento próprio ou de terceiros. Assim, não há como considerar que uma obra social ou assistencial executada pelo Poder Público tenha caráter produtivo.

26. Desse modo, com a devida vênia, entendo que deve esta Corte Su-perior firmar entendimento de que a ação indenizatória por desapropriação in-

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direta prescreve no lapso temporal de 15 anos determinado no caput da norma supra mencionada, não se aplicando as exceções do parágrafo único dirigidas ao particular nas hipóteses de desapropriação indireta. Entendimento diverso conferiria ao Poder Público privilégio que a mens legis direciona apenas e tão somente ao particular, para fins de aquisição da propriedade imobiliária.

27. Salienta-se, por oportuno, que no caso dos autos o prazo prescri-cional de 15 anos deve ser computado de modo a não ultrapassar os 20 anos estabelecidos no Código anterior, nos termos do Enunciado nº 299 do CJF e do RE 51.706/MG, de relatoria do Ministro Luiz Gallotti.

28. Ante o exposto, ouso divergir, respeitosamente, do eminente Relator para dar provimento ao Recurso Especial e estabelecer que nas ações de desa-propriação indireta aplica-se o prazo prescricional de 15 anos determinado no caput do art. 1.238 do CC/2002. É o voto.

certidão de Julgamento primeira turma

Número Registro: 2012/0006838-9 Processo Eletrônico REsp 1.300.702/SC

Números Origem: 20110203394 20110203394000100 20110203394000200 43060016968

Pauta: 02.06.2016 Julgado: 07.06.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sérgio Kukina

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Nívio de Freitas Silva Filho

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuaçãoRecorrente: Celestino Luiz Eich e outro

Advogado: Jair Dal Ri e outro(s)

Recorrido: Departamento Estadual de Infra-Estrutura – Deinfra

Procurador: Jorge Luiz Silveira e outro(s)

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Intervenção do Estado na propriedade – Desapropriação indireta

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

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Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho dando provimento ao recurso especial por fundamento diverso, pediu vista o Sr. Ministro Sérgio Kukina. Aguarda a Sra. Ministra Regina Helena Costa.

Voto-Vista

O Senhor Ministro Sérgio Kukina: Trata-se de recurso especial interposto com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, que reconheceu a prescrição da ação de desapropriação indireta, diante do decurso do prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, V, do CC/2002.

A parte recorrente aponta violação ao caput do art. 1.238 do CC/2002 e traz julgados para configurar o dissídio jurisprudencial, sustentando que a ação de desapropriação indireta tem natureza real e, por isso, a ela se aplica o prazo prescricional previsto para a ação de usucapião.

O Ministério Público Federal, no parecer às fls. 330/334, opinou pelo provimento do recurso especial.

O eminente relator, Ministro Benedito Gonçalves, ao apreciar as razões de inconformismo, em síntese, concluiu que se aplica à pretensão indenizatória por desapropriação indireta o mesmo prazo a que se submete a aquisição de domínio mediante usucapião extraordinário, o qual, com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, foi reduzido de 20 anos (Súmula nº 119/STJ) para 10 anos, conforme dicção do art. 1.238, parágrafo único, do CC/2002.

Dessa forma, ao examinar o caso concreto, teve que o prazo prescricio-nal foi interrompido em 13.05.1994, com a publicação do Decreto Expropria-tório nº 4.471/1994. Como no momento de entrada em vigor do novo Código Civil não havia decorrido mais da metade do prazo vintenário, aplicou a regra de transição prevista no art. 2.028 do CC/2002, e o novo prazo do art. 1.238, parágrafo único, do CC/2002 (10 anos).

Assim, ajuizada a ação indenizatória por desapropriação indireta em 2006, o Relator afastou a prescrição reconhecida no acórdão recorrido e deter-minou o retorno dos autos para que o Tribunal a quo prossiga no julgamento das apelações manejadas pelo autor e pelo Deinfra – Departamento Estadual de Infra-Estrutura de Santa Catarina.

O Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, após tomar vista dos autos, em substancioso voto, divergiu do Relator somente no que diz respeito ao prazo a ser utilizado, entendendo que a desapropriação indireta deve se submeter ao lapso prescricional das ações de usucapião extraordinário, previsto no caput do art. 1.238 (15 anos), afastando o prazo de 10 anos estabelecido no parágrafo único do mencionado dispositivo.

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Feito esse breve relato, passo ao voto-vista, desde já ressaltando que, após o exame da matéria, meu voto converge com o entendimento inaugurado pelo Ministro Napoleão.

Realmente, a prescrição para o ajuizamento da ação de desapropriação indireta era vintenária, nos termos da Súmula nº 119/STJ, em face da natureza real da pretensão, sendo aplicável o preconizado no art. 550 do CC/1916, que regulava a aquisição do domínio por usucapião extraordinário.

Com a entrada em vigor do novo Código Civil, em 11.01.2003, tal prazo foi reduzido, passando a questão a ser regida pelo art. 1.238, assim redigido:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele reali-zado obras ou serviços de caráter produtivo.

Como é possível perceber do texto transcrito, nos casos em que o possui-dor do imóvel tenha ali sua moradia habitual, ou realizou obras ou serviços de caráter produtivo, o prazo é de dez anos, ficando elastecido para 15 anos nos demais casos.

Diante da regra estabelecida, a Segunda Turma desta Corte já teve en-sejo de afirmar que, “considerando que a desapropriação indireta pressupõe a realização de obras pelo Poder Público ou sua destinação em função da utili-dade pública ou do interesse social, com fundamento no atual Código Civil, o prazo prescricional aplicável às expropriatórias indiretas passou a ser de 10 (dez anos)” (REsp 1300442/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., Julgado em 18.06.2013, DJe 26.06.2013).

O voto apresentado pelo ilustre Relator, Ministro Benedito Gonçalves, segue essa mesma respeitável linha de compreensão.

Entretanto, tenho que a exceção trazida no parágrafo único do art. 1.238 do CC/2002 não pode reger o pleito indenizatório decorrente do prejuízo cau-sado pelo Poder Público, quando promove o ilícito apossamento de imóvel particular, mesmo que o propósito seja a satisfação de necessidades coletivas.

Como bem ressaltou o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, o legislador teve por bem reduzir o prazo do usucapião para dez anos com o objetivo de proteger o possuidor que estabelece sua moradia habitual no imóvel, ou que nele tenha realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Esse encurtamento do prazo, orientado a beneficiar o exercente da posse sobre a área usucapienda, dirige-se exclusivamente ao particular, não podendo

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ser estendida a mesma benesse para a Administração Pública que, na desapro-priação indireta, age de forma ilegal e abusiva, promovendo o arrebatamento do bem à míngua do pagamento da prévia e justa indenização, como exigido pelo art. 5º, XXIV, da Constituição Federal.

Adequado, pois, que se continue a guardar simetria com o maior pra-zo então positivado ao tempo do Código Beviláqua (20 anos, cf. art. 550, ob-servado na Súmula nº 119/STJ), que vem agora refletido no art. 1.238, caput, do Código Reale, sempre considerada a natureza real da ação expropriatória, inclusive na sua modalidade indireta, consoante longeva jurisprudência (a tanto, menciono, ilustrativamente, os Emb. de Div. no Recurso Extraordinário nº 63.833/ES, Rel. Min. Eloy da Rocha, Tribunal Pleno, J. 18.05.1972, RTJ 61/384; mais recentemente, no STJ, AgRg-Ag 1.220.426/RS, 1ª T., Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 27.05.2011).

Ante todo o exposto, pedindo respeitosa licença ao Relator para dele divergir, acompanho a dissensão inaugurada pelo Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, dando provimento ao recurso especial do particular expropriado, em ordem a estabelecer que o prazo prescricional para ação de indenização por desapropriação indireta é o regido pelo caput do art. 1.238 do CC/2002, ou seja, quinze anos.

É como voto.

certidão de Julgamento primeira turma

Número Registro: 2012/0006838-9 Processo Eletrônico REsp 1.300.702/SC

Números Origem: 20110203394 20110203394000100 20110203394000200 43060016968

Pauta: 15.09.2016 Julgado: 15.09.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Relator para Acórdão: Exmo. Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sérgio Kukina

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Alcides Martins

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

autuaçãoRecorrente: Celestino Luiz Eich e outro

Advogado: Jair Dal Ri e outro(s) – SC012533

Recorrido: Departamento Estadual de Infra-Estrutura – Deinfra

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Procurador: Jorge Luiz Silveira e outro(s) – SC004929

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Intervenção do Estado na propriedade – Desapropriação indireta

certidão

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sérgio Kukina, a Turma, por maioria, vencido o Sr. Ministro Relator, deu provimento ao recurso especial, estabelecendo que nas ações de desapropriação indireta aplica-se o prazo prescricional de 15 anos determinado no caput do art. 1.238 do CC/2002, nos termos do voto-vista do Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que lavrará o acórdão.

Votaram com o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho (voto-vista) os Srs. Ministros Sérgio Kukina (Presidente) (voto-vista), Regina Helena Costa e Gurgel de Faria (RISTJ, art. 162, § 4º, segunda parte).

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2488

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Cível – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0018002‑39.2006.4.02.5101 (2006.51.01.018002‑3)Relator: Sergio SchwaitzerApelante: Diran Dias Sodre e outroAdvogado: Ronaldo Gotlib Costa e outroApelado: CEF – Caixa Econômica FederalAdvogado: Leonardo Gonçalves AlmeidaOrigem: 27ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00180023920064025101)

ementa

proceSSuAL cIVIL e cIVIL – SIStemA FINANceIro de hAbItAção – eXecução eXtrAJudIcIAL – AdJudIcAção do ImÓVeL peLo AgeNte FINANceIro – Não preJudIcIALIdAde dA Ação reVISIoNAL – reVISão de coNtrAto de mÚtuo hIpotecárIo – VALIdAde dAS cLáuSuLAS coNtrAtuAIS Que preVeem A tAbeLA prIce como SIStemA de AmortIZAção e A AtuALIZAção dA dÍVIdA peLo ÍNdIce de remuNerAção doS depÓSItoS de poupANçA – obrIgAtorIedAde dA coNtrAtAção de Seguro

I – A ultimação da execução extrajudicial do imóvel, com sua adjudica-ção pelo agente financeiro, não prejudica a ação revisional do financia-mento, a qual, caso seja efetivamente constatada a cobrança indevida dos encargos contratuais, expande seus efeitos para a anulação do pro-cedimento expropriatório.

II – Afigura-se nula a sentença que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, com relação aos pedidos de revisão do contrato de financia-mento habitacional.

III – No entanto, inexistindo qualquer alegação de ausência dos requi-sitos subjetivos e formais de validade do contrato de mútuo hipotecário sob exame, limitando-se os apelantes a impugnarem o seu objeto, não há como ser modificado o sistema de amortização contratado, tampouco alterado o índice de atualização da dívida.

IV – Não se observa irregularidades na imposição do seguro habitacional pelo agente financeiro, eis que tal obrigatoriedade encontra amparo no Decreto-Lei nº 73/1966, que regula as operações de seguros e resseguros editadas pelo Sistema Nacional de Seguros.

V – Recurso provido.

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acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas.

Decide a Sétima Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator, constante dos autos, que fica fazendo parte integrante do presente jul-gado.

[Assinado eletronicamente] Sergio Schwaitzer Relator

Voto

Em que pesem os relevantes fundamentos esposados pela magistrada a qua em sua sentença, este Relator entende que a ultimação da execução extra-judicial do imóvel, com sua adjudicação pelo agente financeiro, não prejudica a ação revisional do financiamento, a qual, caso seja efetivamente constatada a cobrança indevida dos encargos contratuais, expande seus efeitos para a anu-lação do procedimento expropriatório, visto que, nessa hipótese, o mesmo se revela decorrente de infração contratual, e, como tal, eivado de nulidade.

Observa-se, pois, que a sentença ora recorrida apresenta-se passível de anulação, mostrando-se aplicável a norma inserta no art. 1.013, § 3º, I, do NCPC (correspondente ao art. 515, § 3º, do CPC/1973), eis que a causa encontra-se em condições de imediato julgamento.

Os autores propuseram a presente demanda objetivando a revisão de seu contrato de financiamento habitacional, requerendo (I) a declaração de nuli-dade da cláusula que estabelece a Tabela Price como critério de amortização, substituindo-a pelo Método Hamburguês e calculando-se os juros de forma sim-ples; (II) declaração de nulidade da cláusula que prevê a atualização do saldo devedor de acordo com os índices de correção das cadernetas de poupança, substituindo-o pela equivalência salarial; (III) o reconhecimento da abusividade da cobrança de seguro por configurar “venda casada”; e (IV) a compensação de todo o indébito apurado mediante abatimento do saldo devedor.

Faz-se necessário, primeiramente, asseverar que a obrigação em comen-to deriva de vínculo contratual, originado da declaração de vontade e do con-sentimento das partes, as quais manifestaram a vontade livre de se submeterem às cláusulas avençadas.

Dessa forma, a liberdade de contratar, legitimamente exercida pelos ora litigantes, refletiu o poder de fixar o conteúdo do contrato. Trata-se do princípio

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da autonomia da vontade, o qual, entretanto, não se constitui absoluto, vez que as obrigações contratuais se submetem às restrições decorrentes da prevalência da ordem pública, cujos princípios limitam a liberdade dos pactos privados.

Conforme relatado, inexiste qualquer alegação de ausência dos requisitos subjetivos e formais de validade do contrato de mútuo hipotecário sob exame, limitando-se os apelantes a impugnar o seu objeto, valendo-se, outrossim, da teoria da imprevisão, segundo a qual superveniente onerosidade excessiva para uma das partes permitiria que esta recusasse o adimplemento de sua prestação.

Nessa linha de argumentação, não há como ser modificado o sistema de amortização contratado, tampouco alterado o índice de atualização da dívida.

Quanto à alegada abusividade da contratação do seguro, insta desta-car que tal prática encontra amparo no Decreto-Lei nº 73/1966, que regula as operações de seguros e resseguros editadas pelo Sistema Nacional de Seguros, mostrando-se, portanto, obrigatória a existência de cobertura securitária dos bens dados em garantia de empréstimos ou financiamentos de instituições fi-nanceiras públicas (art. 20, d e f do Decreto-Lei nº 43/1966).

Uma vez rechaçados os argumentos que embasam a revisão contratual, não há que se falar, portanto, em repetição ou compensação de indébito.

Face ao exposto, dou provimento à apelação, para anular a sentença e, prosseguindo no julgamento, na forma do art. 1.013, § 3º, I, do NCPC, julgar improcedente o pedido autoral.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixa-dos em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 20, § 4º, do CPC/1973, apli-cável ao caso ante a prolação da sentença em momento anterior à entrada em vigor da Lei nº 13.105/2015.

É como voto.

[Assinado eletronicamente] Sergio Schwaitzer Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2489

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos TerritóriosPoder Judiciário da UniãoÓrgão: 4ª Turma CívelClasse: ApelaçãoNº Processo: 20150110114786APC (0003297‑21.2015.8.07.0001)Apelante(s): Denilton da Silva Teixeirense, Fatima Carneiro Teixeirense, Brasília Parque Construção e

Incorporação S/AApelado(s): os mesmosRelator: Desembargador James Eduardo OliveiraAcórdão nº 980353

ementa

dIreIto cIVIL e do coNSumIdor – INcorporAção ImobILIárIA – promeSSA de comprA e VeNdA – reSoLução por INIcIAtIVA do promIteNte comprAdor – deVoLução doS VALoreS pAgoS – cLáuSuLA peNAL – AbuSIVIdAde – redução eQuItAtIVA – ArrAS – reStItuIção – JuroS de morA – termo INIcIAL – cItAção – correção moNetárIA – hoNorárIoS AdVocAtÍcIoS – SeNteNçA prepoNderANtemeNte coNdeNAtÓrIA – SucumbÊNcIA recÍprocA – dIVISão proporcIoNAL dAS cuStAS e hoNorárIoS AdVocAtÍcIoS

I – A legislação consumerista admite e convive com o instituto da cláu-sula penal, porém sanções que expandem para o campo do abuso e do desequilíbrio colidem com os preceitos de ordem pública abrigados nos arts. 6º, inciso V, 51, inciso IV e § 1º, e 53 da Lei nº 8.078/1990.

II – Não pode ser consentida a prevalência de cláusula penal que impõe ao consumidor responsável pela dissolução da promessa de compra e venda a perda desproporcional das prestações pagas.

III – A retenção de 15% dos valores pagos pelo adquirente, ao mesmo tempo em que penaliza o descumprimento do contrato, possibilita à in-corporadora o ressarcimento dos potenciais prejuízos sofridos, máxime porque, ante o efeito retroativo da resolução, ela permanece com o imó-vel negociado e é favorecida com a respectiva valorização.

IV – As arras estão compreendidas na retenção a que tem direito à incor-poradora e não podem ser usadas como mecanismo autônomo e distinto de indenização.

V – A devolução da quantia a que faz jus o consumidor deve ser acresci-da de juros de mora a partir da citação.

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VI – O Índice Nacional da Construção Civil – INCC constitui índice se-torial que não deve ser aplicado para corrigir monetariamente valores a serem restituídos ao promitente comprador por força da resolução da promessa de compra e venda.

VII – A sentença que condena a promissária vendedora à restituição dos valores pagos pelos promitentes compradores tem natureza condenatória e, por isso, atrai a incidência do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil de 1973.

VIII – Havendo sucumbência recíproca em níveis não equivalentes, as custas processuais e os honorários advocatícios devem ser proporcional-mente distribuídos.

IX – Recurso dos Autores desprovido. Recurso da Ré provido em parte.

acórdão

Acordam os Senhores Desembargadores da 4ª Turma CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, James Eduardo Oliveira – Relator, Romulo de Araujo Mendes – 1º Vogal, Arnoldo Camanho – 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador Sérgio Rocha, em proferir a seguinte de-cisão: Negar provimento ao recurso dos autores e dar parcial provimento ao re-curso da ré, unânime, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 26 de outubro de 2016.

Documento Assinado Eletronicamente James Eduardo Oliveira Relator

relatório

Denilton da Silva Teixeirense e Fátima Carneiro Teixeirense interpõem Apelação contra a sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara Cível de Brasília que, na Ação de Rescisão Contratual proposta em desfavor de Brasília Parque Construção e Incorporação S/A, julgou procedentes em parte os pedidos para decretar a rescisão das promessas de compra e venda e condenar a Ré a restituir aos Autores 90% dos valores pagos.

Os Autores sustentam que seus pedidos – rescisão contratual e limitação das cláusulas penais a 10% dos valores pagos – foram inteiramente acolhidos na sentença, motivo pelo qual a Ré deve arcar integralmente com os ônus da sucumbência.

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Requerem o provimento do recurso para que os ônus da sucumbência sejam atribuídos integralmente à Ré.

Preparo às fls. 165/166.

Em contrarrazões, a Ré argumenta que houve sucumbência recíproca porque os Autores decaíram dos pedidos de declaração de nulidade das cláusu-las 18.2 e 18.3 dos contratos celebrados.

A Ré (Brasília Parque Construção e Incorporação S/A) também interpõe Apelação alegando (i) que deve prevalecer a cláusula penal licitamente esti-pulada; (ii) que são cumuláveis arras confirmatórias e cláusula penal; (iii) que, inexistindo mora de sua parte, os juros de 1% ao mês devem incidir a partir do trânsito em julgado; (iv) que deve ser aplicado o INCC nos valores a serem de-volvidos; (v) que a sentença não é condenatória e por isso deve ser observado o disposto no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil de 1973; e (vi) que, ante a sucumbência recíproca, as verbas de sucumbência devem ser distribuídas proporcionalmente.

Pugna pelo provimento do recurso para que sejam mantidas as cláusulas contratuais ou permitida a retenção de 15% dos valores pagos com incidência de juros de mora a partir do trânsito em julgado.

Preparo recolhido às fls. 185/186.

Em resposta, os Autores afirmam (i) que os juros moratórios fluem desde a citação; (ii) que deve ser aplicado na hipótese o INPC; (iii) que a sentença tem natureza condenatória e assim os honorários devem ser calculados sobre o valor da condenação; e (iv) que houve deferimento implícito do pedido de res-ponsabilização da Ré pelo pagamento de taxas e tributos referentes aos imóveis a partir da respectiva devolução.

Os recursos foram recebidos no duplo efeito (fl. 188).

É o relatório.

Inclua-se em pauta.

Votos

O Senhor Desembargador James Eduardo Oliveira – Relator:

I – recurSo dA rÉ

Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhe-ço do recurso.

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1 resolução do contrato: cláusula penal

Os contratos de incorporação imobiliária, a despeito de se subordinarem à Lei nº 4.591/1964, conjugam os elementos subjetivo e objetivo da relação de consumo e por isso também se sujeitam aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, sem prejuízo da aplicação suplementar do Código Civil. Consoan-te vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – O Código de Defesa do Consumi-dor atinge os contratos de compra e venda nos quais a incorporadora se obri-ga a construir unidades imobiliárias mediante financiamento. (AgRg-Ag-REsp 120.905/SP, 3ª T., Rel. Min. Ricardo Villas Boas Cueva, DJe 12.05.2014)

O Código de Defesa do Consumidor incide nos contratos de compra e venda em que a incorporadora se obriga à construção das unidades imobiliárias, mediante fi-nanciamento. (REsp 555.763/DF, 3ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 22.03.2004, p. 305)

Os contratos de promessa de compra e venda em que a incorporadora se obriga à construção de unidades imobiliárias, mediante financiamento, ensejam relação de consumo sujeita ao CDC, porquanto a empresa enquadra-se no conceito de fornecedora de produto (imóvel) e prestadora de serviço (construção do imóvel nos moldes da incorporação imobiliária). (STJ, REsp 334.829/DF, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJU 04.02.2002, p. 354)

Em igual diretriz, assentou esta Corte de Justiça:

A promessa de compra e venda que enlaça em seus vértices pessoa jurídica cujo objeto social está destinado à construção e incorporação de imóvel inserido em empreendimento imobiliário e pessoa física destinatária final de apartamento ne-gociado se qualifica como relação de consumo, pois emoldura-se linearmente na dicção dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, devendo os dissensos derivados do negócios serem resolvidos à luz das premissas normativas firmadas por esse estatuto legal. (20130110307473APC, 1ª T., Rel. Des. Teófilo Caetano, DJe 07.10.2013)

É claro que a simples submissão do litígio à legislação consumerista não profetiza a invalidade da cláusula penal. Todavia, não se pode olvidar que san-ções abusivas ou desproporcionais estipuladas para a hipótese resolutiva não são toleradas pela Lei de Proteção ao Consumidor.

Como ponto de partida, não se pode simplesmente reputar nula de pleno direito a penalidade de perda parcial das prestações pagas, intercalada em promessa de compra e venda de imóvel, mesmo porque o art. 53 da Lei nº 8.078/1990 impõe tal invalidade somente à cláusula de decaimento total.

Essa primeira abordagem normativa, entretanto, não impede o reconhe-cimento da abusividade de cláusula penal e a sua consequente adaptação à singularidade da hipótese, levando em conta que constitui direito básico do consumidor – portanto, aplicável em qualquer circunstância – a modificação de

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prescrições convencionais que atentam contra os princípios da equivalência e da proporcionalidade abrigados nos arts. 6º, incisos IV e V, 51, inciso IV e § 1º, e 53, caput, da Lei nº 8.078/1990, verbis:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais co-ercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações des-proporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

[...]

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;

§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:

I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;

II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contra-to, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;

III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

[...]

Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante paga-mento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consi-deram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.

Vê-se que a legislação de proteção ao consumidor admite e convive com o instituto da cláusula penal, porém sanções que expandem para o campo do abuso e do desequilíbrio colidem com preceitos de ordem pública. Como pon-dera com propriedade Paulo Roque Khouri:

Ultimamente tem sido comum, nos contratos de adesão, a imposição de uma cláusula penal, em caso de inadimplemento do consumidor, que não implica perda total, mas perda de um bom percentual do valor pago. Mesmo esta cláu-sula, ainda que não implique a perda total das prestações pagas, pela regra do art. 51, IV, poderia ser considerada nula, por contrariar a boa-fé e gerar o dese-quilíbrio contratual. (Direito do consumidor, 2. ed., Atlas, p. 111)

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O próprio art. 413 do Código Civil, abaixo reproduzido, avaliza a in-tercessão judicial para a redução da cláusula penal que se mostrar despropor-cional:

Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obri-gação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

Reconhece-se, pois, à cláusula penal o importante papel de estímulo e de punição ao contratante que descumpre a convenção, mas não se pode admitir a sua degeneração em enriquecimento sem causa ou violação de direitos elemen-tares do consumidor. Logo, dentro do espírito de cooperação contratual e das finalidades do instituto, cabe ao juiz abrandá-la sempre que se revelar excessiva e desproporcional dentro do cenário contratual. Na síntese de Teresa Negreiros:

A interpretação da cláusula penal à luz do princípio da boa-fé impede que este instituto, distanciando-se da sua finalidade econômico-social, se transforme em instrumento de enriquecimento de um dos contratantes em detrimento do outro. (Teoria do contrato – Novos paradigmas, Renovar, 2002, p. 136)

À luz dessa interpretação sistemática, a cláusula penal que estabelece a perda do sinal e de 25% dos valores pagos pelo adquirente, abaixo transcrita, padece de abusividade insofismável e, por esse motivo, pode ser temperada pela intervenção judicial apropriada aos contornos da lide:

18.2 Sem prejuízo das demais disposições contratuais, rescindido o presente ins-trumento, por iniciativa ou por qualquer motivo imputável aos adquirentes ficará retido, para fazer frente às despesas operacionais, administrativas publicitárias, cartoriais e tributárias da promitente vendedora, e em hipótese alguma será resti-tuído aos adquirentes, o sinal constante da cláusula 6.1.1, bem como o percentu-al de 25% (vinte e cinco por cento) calculado sobre o valor pago, de acordo com critério jurisprudencial da Seção de Direito Privado do STJ.

Nessa ordem de ideias, a retenção de 15% dos valores despendidos pelos Autores, ao mesmo tempo em que os penaliza pelo descumprimento do con-trato, possibilita à Ré o ressarcimento dos potenciais prejuízos sofridos, máxime porque, ante o efeito retroativo da resolução, ela permanece com o imóvel negociado e é favorecida com a respectiva valorização. Nessa diretriz é ex-pressiva a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consoante ilustram os seguintes julgados:

DIREITO CIVIL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESCISÃO – INADIMPLÊNCIA DO COMPRADOR – DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS – CABIMENTO – RETENÇÃO DE PARTE DOS VALORES PELO VENDEDOR – INDENIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS SUPORTADOS – CABIMENTO – ARRAS – SEPARAÇÃO – 1. A rescisão de um contrato exige que se promova o retorno das partes ao status quo ante, sendo certo que, no âmbito dos contratos de promessa de compra e venda de imóvel, em caso de rescisão motivada por inadimplência

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do comprador, a jurisprudência do STJ se consolidou no sentido de admitir a retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas, como forma de indenizá--lo pelos prejuízos suportados, notadamente as despesas administrativas havidas com a divulgação, comercialização e corretagem, o pagamento de tributos e taxas incidentes sobre o imóvel e a eventual utilização do bem pelo comprador. 2. O percentual de retenção – fixado por esta Corte entre 10% e 25% – deve ser arbitrado conforme as circunstâncias de cada caso. [...] (REsp 1224921/PR, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 11.05.2011)

DIREITO CIVIL – RECURSO ESPECIAL – CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – DISTRATO – DEVOLUÇÃO ÍNFIMA DO VALOR ADIMPLIDO – ABU-SIVIDADE – RETENÇÃO DE PERCENTUAL SOBRE O VALOR PAGO – SÚMULA Nº 7 DO STJ – 1. “O distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato” (art. 472 do Código Civil), o que significa que a resilição bilateral nada mais é que um novo contrato, cujo teor é, simultaneamente, igual e oposto ao do contrato primitivo. Assim, o fato de que o distrato pressupõe um contrato anterior não lhe desfigura a natureza contratual, cuja característica principal é a convergência de vontades. Por isso, não parece razoável a contraposição no sentido de que somente disposições contratuais são passíveis de anulação em virtude de sua abusividade, uma vez que “onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de Direito”. 2. A lei consumerista coíbe a cláusula de decaimento que determine a retenção do valor integral ou substancial das prestações pagas por consubstanciar vantagem exagerada do incorporador. 3. Não obstante, é jus-to e razoável admitir-se a retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas como forma de indenizá-lo pelos prejuízos suportados, notadamente as despe-sas administrativas realizadas com a divulgação, comercialização e corretagem, além do pagamento de tributos e taxas incidentes sobre o imóvel, e a eventual utilização do bem pelo comprador. 4. No caso, o Tribunal a quo concluiu, de forma escorreita, que o distrato deve render ao promitente comprador o direito à percepção das parcelas pagas. Outrossim, examinando o contexto fático-pro-batório dos autos, entendeu que a retenção de 15% sobre o valor devido seria suficiente para indenizar a construtora pelos prejuízos oriundos da resilição con-tratual. Incidência da Súmula nº 7 do STJ. 5. Recurso especial não provido. (REsp 1.132.943/PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 27.09.2013)

É bem de ver que, após entendimento inicial de que o percentual 10% seria suficiente para a recomposição patrimonial do promitente vendedor, a orientação desta egrégia 4ª Turma acabou se firmando no sentido de que o percentual de 15% se revela mais adequado na hipótese em que o contrato é desfeito por ação ou omissão a ele imputável, como se vê dos julgados abaixo elencados:

APELAÇÃO CÍVEL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE UNIDADE IMO-BILIÁRIA – PENA CONVENCIONAL – VALOR EXCESSIVO – REDUÇÃO – DE-VER DO MAGISTRADO – FIXAÇÃO EM PATAMAR RAZOÁVEL – TERMO INI-CIAL DE INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS – DATA DA CITAÇÃO – 1. O art. 913, do CC, impõe ao magistrado o dever de reduzir o valor da cláusula penal quando a pena convencional se mostrar excessiva.2. É razoável a reten-ção, pelo promitente-vendedor, de até 15% (quinze por cento) do valor total

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pago, a título de cláusula penal, na rescisão da promessa de compra e venda, para o ressarcimento de despesas administrativas do contrato, tais como as feitas com a divulgação, a comercialização, a corretagem, o pagamento de tributos e taxas incidentes sobre o imóvel. 3. Os juros de mora sobre o valor a ser restitu-ído ao promitente-comprador, no caso de rescisão do contrato de promessa de compra e venda, são contados da data da citação, nos termos do disposto nos arts. 405, do CC, e 219, do CPC/1973. Tal regra se aplica mesmo na hipótese em que a resolução do contrato decorre de iniciativa do promitente-comprador, sem culpa do promitente-vendedor, e é determinada a devolução dos valores pagos com incidência de cláusula penal em percentual diverso do contratado. 4. Apelo parcialmente provido. (APC 20140111089113, Rel. Des. Arnoldo Camanho de Assis, 4ª T., DJe 27.06.2016)

APELAÇÃO CÍVEL – DISTRATO – CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓ-VEL – RETENÇÃO – ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL – ADEQUA-ÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 – A relação jurídica, no con-trato celebrado entre as partes, se submete ao Código de Defesa do Consumidor. 2. O promitente comprador tem o direito de arrependimento e pode rescindir o contrato de promessa de compra e venda de imóvel realizado. Contudo, o desfazimento contratual deve zelar por incidência de cláusula penal e em valor compatível à lei consumerista. 3. Rescindida a promessa de compra e venda e verificada a abusividade nos patamares contratuais previstos, é de se adequar a cláusula de retenção ao percentual de 15% (quinze por cento) do valor das prestações pagas pelo adquirente. Precedentes jurisprudenciais. 4. Recurso par-cialmente provido. (APC 20150410073248, Rel. Des. Romeu Gonzaga Neiva, 4ª T., DJe 16.06.2016)

PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESILIÇÃO PELO ADQUI-RENTE – RESTITUIÇÃO DE VALORES – TERMO INICIAL DOS JUROS – PER-CENTUAL DE RETENÇÃO – CLÁUSULA PENAL E ARRAS – HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA – 1. Em caso de resilição unilateral por iniciativa do adquirente, assiste-lhe o direito de reaver o que pagou, com juros moratórios contados da citação, menos o equivalente a 15% dessa importância, que poderão ser retidos pelo vendedor a título de cláusula penal. 2. É inadmissível, sob pena de bis in idem, a cumulação de arras com cláusula penal. 3. Quando há condenação, os honorários de sucumbência devem ser fixados conforme o CPC/1973, art. 20, § 3º. (APC 20130111828590, 4ª T., Rel. Des. Fernando Habibe, DJe 18.05.2016)

Cumpre destacar que a mera previsão contratual de ressarcimento de prejuízos decorrentes da resolução contratual não alforria o fornecedor (pro-missário vendedor), sob o enfoque dos princípios da transparência, lealdade e boa-fé que permeiam as relações de consumo, do dever de especificar no ins-trumento contratual os custos específicos a serem ressarcidos e de comprovar o pagamento respectivo.

Sob essa perspectiva, e considerando que a Ré não comprovou os su-postos prejuízos ocasionados pela dissolução contratual, tais como gastos com publicidade, recolocação do imóvel no mercado, impostos, taxas e outros, a

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retenção de 15% do valores pagos pelos Autores não pode ser considerada insuficiente para cobrir eventuais custos decorrentes da ruptura da promessa de compra e venda.

Acaso o painel probatório indicasse outra realidade fática oriunda da ex-tinção da relação contratual, em princípio poderia ser estabelecido percentual de perda mais expressivo em benefício da Ré. Contudo, inexistindo nos autos demonstração de consectários extraordinários ou pelo menos mais significati-vos do ponto de vista econômico, a resolução do contrato por ato ou omissão imputável aos Autores (promitentes compradores) não justifica penalidade su-perior. Consoante deliberou o Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL – DIREITO CIVIL – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESOLUÇÃO – RETENÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO – POSSIBILIDADE – PERCENTUAL – 10% A 25% SOBRE AS PARCELAS APORTADAS – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 – AGRAVO QUE NÃO IMPUGNA O FUNDAMENTO CENTRAL DA DECISÃO AGRAVADA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 182/STJ – [...] 2. Esta Corte Superior, à luz de precedentes firmados pela Segunda Seção, entende que “o compromissário com-prador que deixa de cumprir o contrato em face da insuportabilidade da obriga-ção assumida tem o direito de promover ação a fim de receber a restituição das importâncias pagas” (EREsp 59870/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, 2ª S., Julgado em 10.04.2002, DJ 09.12.2002 p. 281). 3. Porém, o percentual a ser retido pelo vendedor, bem como o valor da indenização a ser paga como contraprestação pelo uso do imóvel, são fixados à luz das particularidades do caso concreto, razão pela qual se mostra inviável a via do recurso especial ao desiderato de rever o quantum fixado nas instâncias inaugurais de jurisdição (Súmula nº 07). 4. Tendo em vista que o valor de retenção determinado pelo Tribunal a quo (10% das parcelas pagas) não se distancia do fixado em diversas ocasiões por esta Corte Superior (que entende possível o valor retido flutuar entre 10% a 25%), o recurso especial não prospera. 5. Recurso não provido. (AgRg-REsp 1110810/Distrito Fe-deral, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 06.09.2013)

DIREITO CIVIL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESCISÃO – INADIMPLÊNCIA DO COMPRADOR – DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS – CABIMENTO – RETENÇÃO DE PARTE DOS VALORES PELO VENDEDOR – INDENIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS SUPORTADOS – CABIMENTO – ARRAS – SEPARAÇÃO – 1. A rescisão de um contrato exige que se promova o retorno das partes ao status quo ante, sendo certo que, no âmbito dos contratos de promessa de compra e venda de imóvel, em caso de rescisão motivada por inadimplência do comprador, a jurisprudência do STJ se consolidou no sentido de admitir a retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas, como forma de indenizá--lo pelos prejuízos suportados, notadamente as despesas administrativas havidas com a divulgação, comercialização e corretagem, o pagamento de tributos e taxas incidentes sobre o imóvel e a eventual utilização do bem pelo comprador. 2. O percentual de retenção – fixado por esta Corte entre 10% e 25% – deve ser arbitrado conforme as circunstâncias de cada caso. [...] (REsp 1224921/PR, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 11.05.2011)

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Esse (15%), portanto, é o percentual que torna a cláusula penal compa-tível com a legislação de proteção ao consumidor e com as singularidades do caso concreto.

2 arras

Consistem as arras – ou sinal – em quantia em dinheiro ou outra coisa fungível que é entregue por um a outro contratante a fim de assegurar o cum-primento do contrato.

As arras têm, ordinariamente, caráter confirmatório, na medida em que são estipuladas para fazer obrigatório o contrato. Só se revestem de caráter pe-nitencial quando for pactuado o direito de arrependimento por qualquer das contratantes. E a elas a lei reserva perfil estritamente indenizatório, com a pecu-liaridade de que não podem ser cumuladas com indenização suplementar, na linha do que prescreve o art. 420 da Lei Civil.

O direito de arrependimento, cerne das arras penitenciais, não emerge dos termos do contrato, dada a necessidade de pactuação escorreita e isenta de incerteza. Consoante explana Fabrício Zamprogna Matiello:

Caso as partes estipulem arras, mas não prevejam qual a modalidade que estão introduzindo no contrato, entender-se-á que são confirmatórias, pois a adição de arras penitenciais depende de expressa e inequívoca dicção dos interessa-dos. Com isso, nenhum dos celebrantes poderá arrepender-se, pois tal direito é inerente à espécie penitencial e não está posta naquela outra. (Curso de Direito Civil, v. 2, LTr, 2008, p. 289)

Dispõe, efetivamente a cláusulas 6.1 de ambos os contratos:

6. FORMA DE PAGAMENTO DO PREÇO DA UNIDADE IMOBILIÁRIA:

6.1 Pagamento à vista:

6.1.1 01 (uma) parcela de [...], paga através do cheque [...], contra o Banco [...], a título de Sinal, sob os efeitos dos arts. 417 a 420 do Código Civil Brasileiro (Arras ou Sinal).

Nos termos imprecisos com que foi gravada, fazendo simples menção a dispositivos legais, essa cláusula contratual não evidencia a convenção de arras penitenciais. Logo, devem ser consideradas confirmatórias, atraindo, por con-seguinte, a regência normativa do art. 418 do Código Civil, que tem a seguinte redação:

Art. 418. Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, juros e honorários de advogado.

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Sob esse enfoque, a princípio, a Ré teria direito à retenção das arras na forma prescrita no referido preceito legal, dada a responsabilidade dos Autores pela inexecução do contrato. Sob a perspectiva desse mandamento legal, ensi-na Washington de Barros Monteiro:

As consequências do inadimplemento da obrigação, na hipótese de terem sido prestadas as arras, são duas: a) se o descumprimento for imputável a quem deu as arras, este as perderá em benefício de quem as recebeu; b) se a inexecução for imputável a quem recebeu as arras, deverá devolvê-las em dobro, acrescidas de juros e honorários de advogado. (Curso de Direito Civil, v. 4, 32. ed., Saraiva, Atualizado por Carlos Alberto Dabus Maluf, p. 359)

No entanto, as arras acabam perdendo o seu escopo jurídico relacionado ao quantum indenizatório quando o contrato estabelece cláusula penal para determinada hipótese resolutiva. É que ambas, no contexto da crise contratual, desempenham o mesmo papel de definição das perdas e danos.

Levando em conta o predomínio da cláusula penal no terreno da temá-tica indenizatória, na medida em que incorpora a vontade dos próprios contra-tantes a respeito dos prejuízos a serem indenizados, as arras passam a integrar o pagamento e deixam de servir de parâmetro para essa finalidade. Daí por que estão compreendidas na retenção a que tem direito a Ré e não podem ser usadas como mecanismo autônomo e distinto de indenização. Nessa diretriz, assentou o Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO DO CONSUMIDOR – RESCISÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL – CLÁUSULA QUE CONDICIONA A RES-TITUIÇÃO DAS PARCELAS PAGAS AO TÉRMINO DA OBRA – ABUSIVIDADE – PRECEDENTES – SÚMULA 83/STJ – ARRAS CONFIRMATÓRIAS – VENDEDOR QUE DEU CAUSA AO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL – IMPOSSIBILI-DADE DE RETENÇÃO – DEVOLUÇÃO DO VALOR DO SINAL, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA – 1. Revela-se abusiva, por ofensa ao art. 51, incisos II e IV, do Código de Defesa do Consumidor, a cláusula contratual que determina, em caso de rescisão de promessa de compra e venda de imóvel, a restituição das parcelas pagas somente ao término da obra, haja vista que poderá o promitente vendedor, uma vez mais, revender o imóvel a terceiros e, a um só tempo, auferir vantagem com os valores retidos, além do que a conclusão da obra atrasada, por óbvio, pode não ocorrer. Precedentes. 2. As arras confirma-tórias constituem um pacto anexo cuja finalidade é a entrega de algum bem, para assegurar ou confirmar a obrigação principal assumida. Por ocasião da res-cisão contratual, o valor dado a título de sinal (arras) deve ser restituído ao reus debendi, sob pena de enriquecimento sem causa. (STJ, AgRg-REsp 997.956/SC, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 01.08.2012)

COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – RESCISÃO – ARRAS – INCLUSÃO NOS VALORES – No percentual retido a título de indenização, relativa à vanta-gem econômica auferida com a fruição do bem e aos prejuízos causados ao pro-mitente vendedor, já se inclui a eventual devolução de sinal ou arras. (STJ, EDcl-

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-REsp 132.955/DF, 3ª T., Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU 14.06.2004, p. 216)

RECURSO ESPECIAL – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA – RESILIÇÃO PELO PROMITENTE-COMPRADOR – RETENÇÃO DAS ARRAS – IM-POSSIBILIDADE – DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS – PERCENTUAL QUE DEVE INCIDIR SOBRE TODOS OS VALORES VERTIDOS E QUE, NA HIPÓTESE, SE COADUNA COM A REALIDADE DOS AUTOS – MAJORAÇÃO – IMPOS-SIBILIDADE, NA ESPÉCIE – RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO – 1. A Colenda Segunda Seção deste Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o promitente--comprador, por motivo de dificuldade financeira, pode ajuizar ação de resci-são contratual e, objetivando, também reaver o reembolso dos valores vertidos (EREsp 59870/SP, 2ª S., Rel. Min. Barros, DJ 09.12.2002, p. 281). 2. As arras confirmatórias constituem um pacto anexo cuja finalidade é a entrega de algum bem, em geral determinada soma em dinheiro, para assegurar ou confirmar a obrigação principal assumida e, de igual modo, para garantir o exercício do di-reito de desistência. 3. Por ocasião da rescisão contratual o valor dado a título de sinal (arras) deve ser restituído ao reus debendi, sob pena de enriquecimento ilícito. 4. O art. 53 do Código de Defesa do Consumidor não revogou o disposto no art. 418 do Código Civil, ao contrário, apenas positivou na ordem jurídica o princípio consubstanciado na vedação do enriquecimento ilícito, portanto, não é de se admitir a retenção total do sinal dado ao promitente-vendedor. 5. O percentual a ser devolvido tem como base de cálculo todo o montante vertido pelo promitente-comprador, nele se incluindo as parcelas propriamente ditas e as arras. 6. É inviável alterar o percentual da retenção quando, das peculiarida-des do caso concreto, tal montante se afigura razoavelmente fixado. 7. Recurso especial improvido. (REsp 1056704/MA, 3ª T., Rel. Min. Massami Uyeda, DJe 04.08.2009)

Vale acrescentar que a operação jurídica que estabelece o percentual de retenção em favor do promissário vendedor abrange todos os valores pagos pelo promitente comprador, inclusive as arras, de maneira que não há como submetê-las a tratamento diverso ou independente. Na linha do que decidiu este Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE UNI-DADE IMOBILIÁRIA – RESCISÃO CONTRATUAL – DESISTÊNCIA VOLUNTÁ-RIA DO ADQUIRENTE – DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS – CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA – REDUÇÃO – ARRAS CONFIRMATÓRIAS – RETEN-ÇÃO – I – Havendo desistência contratual, as partes devem retornar ao status quo ante, assistindo à compradora desistente o direito de obter a restituição de toda a quantia repassada à promissária vendedora, abatendo-se somente porcentagem a título de cláusula penal compensatória, que deve incidir sobre o valor desem-bolsado pela compradora e em percentual não superior a 10% (dez por cento). II – As arras confirmatórias pagas como sinal, visando assegurar o negócio jurídi-co, devem integrar a base de cálculo da restituição, sob pena de se caracterizar o enriquecimento ilícito da promitente vendedora. III – Deu-se parcial provimento ao recurso. (APC 20120111364927, 6ª T., Rel. Des. José Divino de Oliveira, DJe 18.11.2014)

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CONSUMIDOR E CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – RESCISÃO CONTRATUAL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – CLÁUSULA PENAL – MI-TIGAÇÃO – BASE DE CÁLCULO – ARRAS CONFIRMATÓRIAS – RETENÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – 1. A cláusula penal compensatória serve como medida de ressarcimento previamente ajustada para a hipótese de inexecução do contrato, a fim de desestimular o inadimplemento e como meio de reforçar o princípio da segurança jurídica. 2. Na hipótese de onerosidade excessiva, em homenagem à natureza e à finalidade do negócio, deve ser reduzida equitativamente a cláusu-la penal, devendo incidir sobre o valor da quantia efetivamente desembolsada pelo promitente-comprador. 3. O valor compensatório na hipótese de rescisão contratual deve ser proporcional e razoável às circunstâncias do caso concreto, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do promitente-vendedor. 4. Dian-te do ajuste da incidência da cláusula penal para a hipótese de desfazimento do negócio, a retenção das arras confirmatórias importa em dupla penalidade ao promitente-comprador e consequente enriquecimento sem justo motivo do promitente-vendedor. 5. Recurso desprovido. (APC 20070111321645, 3ª T., Rel. Des. Mario-Zam Belmiro, DJe 19.10.2011)

Conclui-se, assim, que deve prevalecer a fórmula de restituição que com-preende no percentual de 15% de retenção as arras.

3 termo inicial dos Juros moratórios

Em se tratando de responsabilidade contratual, os juros de mora fluem de acordo com os arts. 405 do Código Civil e 219 do Código de Processo Civil.

O fato de a resolução ter sido operada por iniciativa dos promitentes compradores não altera essa conclusão.

A uma, porque a resolução, mesmo que oriunda do fracasso obrigacional do promitente comprador, não deixa de ser considerada um direito subjetivo, pois de outro modo não seria admitido o desfazimento do contrato. Em prece-dente que reflete o consenso jurisprudencial sobre o tema, decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL – PROMESSA DE COMPRA E VENDA – DESISTÊNCIA – POS-SIBILIDADE – DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS – RETENÇÃO DE 25% A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO – 1. O entendimento firmado no âmbito da Segunda Seção é no sentido de ser possível a resilição do compromisso de compra e ven-da, por parte do promitente comprador, quando se lhe afigurar economicamente insuportável o adimplemento contratual. 2. É direito do consumidor, nos termos da jurisprudência cristalizada da Corte, a restituição dos valores pagos ao pro-mitente vendedor, sendo devida a retenção de percentual razoável a título de indenização, o qual ora se fixa em 25% do valor pago. (STJ, REsp 702.787/SC, 4ª T., Rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJe 08.06.2010, p. 593)

Nessa ordem de idéias, se o promitente comprador, a despeito do inadim-plemento, faz jus à resolução do contrato, o promissário vendedor que deixa de

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restituir os valores devidos dá causa ao ajuizamento da demanda e, por força do art. 405 do Código Civil, considera-se em mora desde a citação.

A duas, porque a resolução opera retroativamente e, por isso, as partes voltam à situação patrimonial existente ao tempo da celebração do contrato. Vale dizer, do ponto de vista cronológico, o promitente comprador tem direito à repetição desde a contratação.

A três, porque a própria Ré admite que não se opôs à resolução e que o conflito de interesses derivou da discordância quanto ao montante da devolu-ção. E quanto a esse aspecto, revelou-se desprovida de embasamento jurídico a resistência baseada em cláusulas contratuais ilícitas.

Portanto, a mora do promissário vendedor não advém exatamente da violação do contrato, mas dos efeitos ex tunc da resolução e da natureza con-tratual da responsabilidade civil. Ele é reputado em mora desde a celebração do contrato porque é a partir de então que se deve, do ponto de vista jurídico, haver as recomposições patrimoniais decorrentes da resolução.

Ademais, a fixação do trânsito em julgado como termo inicial de inci-dência dos juros de mora, conforme pretende a Ré, poderia ocasionar a adoção de medidas processuais ou interposição de recursos com finalidade meramente protelatória, de forma a atrasar a marcha processual e prejudicar ainda mais o consumidor, credor da quantia a ser restituída.

A devolução da quantia a que faz jus a Autora deve, portanto, ser acres-cida de juros de mora a partir da citação.

4 correção monetária

A Ré sustenta que a correção monetária do valor a ser restituído deve ser feita com base no Índice Nacional da Construção Civil – INCC, e não pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC, na forma determinada na sentença.

O INCC constitui índice setorial que reflete a evolução dos custos da construção e em razão disso não pode ser aplicado além ou fora do período de construção, em completa dissonância com a sua destinação legal.

Inafastável, destarte, a abusividade da cláusula 18.3 que estabelece a incidência desse índice setorial para hipótese distinta daquela inerente à sua aplicação. Essa é a orientação que desponta da jurisprudência sedimentada des-te Tribunal de Justiça, como ilustra o seguinte julgado:

À míngua de previsão contratual acerca do índice de correção monetária para a restituição dos valores pagos pelo promitente comprador, deve ser aplicado o INPC, pois é o que melhor reflete a perda do poder aquisitivo da moeda. O INCC não incide, na espécie, porque tem por finalidade recompor o custo de determi-

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nado setor econômico, distinguindo-se, portanto, da atualização monetária. (APC 20080111056783, 5ª T., Rel. Des. Angelo Canducci Passareli, DJe 06.08.2012)

Incensurável, assim, a sentença quanto ao índice a ser usado na atualiza-ção monetária da verba condenatória.

5 Ônus da sucumbência: parâmetros

Sob o argumento de que a sentença tem natureza constitutiva, a Ré ques-tiona a fixação dos honorários de sucumbência em montante equivalente a 10% (dez por cento) do valor da condenação.

O dispositivo da sentença foi redigido nos seguintes termos:

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido para:

1. Decretar a rescisão dos contratos de promessa de compra e venda 412 e 413 entabulados entre as partes, bem como dos respectivos aditivos, referentes às salas 315-D e 207-D, no SGAN 915, Lote F, Asa Norte/DF (fls. 20/26; 27/33; 35/38), produzindo efeitos a contar do deferimento da antecipação de tutela (fl. 58-v – 05.02.2015);

2. Condenar a requerida à devolução de 90% dos valores despendidos a título das prestações pagas em financiamento de compra e venda pela autora relativos aos imóveis acima discriminados, quantificados em R$ 216.429,00 (duzentos e dezesseis mil quatrocentos e vinte e nove reais), atualizados monetariamente pelo INPC a contar do efetivo desembolso de 90% de cada parcela, e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação.

Extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.

Cálculos na forma do art. 475-B. Cumprimento de sentença nos termos do art. 475-J, do CPC.

Em face da sucumbência recíproca, porém não equivalente, quanto aos valores demandados, condeno a autora ao pagamento de 20% das custas e dos honorá-rios em favor do patrono da parte adversa, ficando a parte ré condenada em 80% das custas e dos honorários fixados.

Fixo os honorários em 10% do valor da condenação, tudo nos termos do art. 21 do CPC, compensando-se os valores devidos a título de honorários, resultando em 6% do valor da condenação em favor do patrono da parte autora.

Não há, assim, como encobrir o caráter condenatório da sentença. Na esteira do que decidiu esta Corte de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR – CONTRATO DE PROMESSA DE COM-PRA E VENDA – IMÓVEL – ILEGITIMIDADE PASSIVA DA INTERMEDIADO-RA – LEGITIMIDADE PASSIVA DA INCORPORADORA E DA CONSTRUTORA – TEORIA DA APARÊNCIA – RESOLUÇÃO DO CONTRATO – VIABILIDADE – RETENÇÃO SOBRE O VALOR DE VENDA DO BEM ATUALIZADO – ABU-SIVIDADE – RESTITUIÇÃO DEVIDA – CUMULAÇÃO COM A RETENÇÃO DE

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ARRAS – INVIABILIDADE – CORREÇÃO MONETÁRIA – HONORÁRIOS AD-VOCATÍCIOS – [...] 2. A relação jurídica estabelecida por contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel entre a empresa construtora/incorporadora do empreendimento e o futuro proprietário do imóvel é de consumo, pois se amol-da aos requisitos qualificadores de tal relação, expostos nos arts. 1º a 3º da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor). [...] 8. Considerando-se a exis-tência de condenação, haja vista que os requeridos foram condenados à devolu-ção dos valores despendidos pelos autores, deve ser aplicado o art. 20, § 3º, do CPC. (APC 20130111890519, 3ª T., Rel. Des. Flávio Rostirola, DJe 14.11.2014). (grifo nosso)

Adequada, portanto, a fixação dos honorários advocatícios nos moldes do § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil de 1973.

II – recurSo doS AutoreS

Os Autores formularam na petição inicial os seguintes pedidos:

A – a citação da ré para, querendo, contestar a presente ação, sob pena de revelia;

B – a concessão de liminar para declarar rescindidos os contratos de nºs 412 e 413, suspendendo-se a cobrança de parcelas vincendas decorrentes dos contra-tos, proibindo-se a ré de inclusão dos nomes dos autores nos serviços de proteção ao crédito, e que esta se responsabilize pelo pagamento de eventuais taxas de condomínio, impostos e demais tributos relativos aos bens;

C – a procedência da presente ação (i1) para confirmar a liminar requerida em todos os seus termos; (2) para o fim de ser declarada a nulidade das cláusulas 18.2 e 18.3, limitando-se, se for o caso, a cláusula penal ao equivalente a não mais de 10% (dez por cento) sobre o valor até então pago pelos autores nos dois contratos; (3) para o fim de ser declarada a nulidade da cláusula 18.3, determi-nando-se a devolução imediata da integralidade dos valores pagos pelos autores, em parcela única, atualizada pelo IGPM a partir da data do pagamento de cada parcela, acrescida de juros moratórios, no importe de 1% (um por cento) ao mês, a contar da data da citação; e

D – seja a ré condenada a arcar com o pagamento das custas e honorários advo-catícios, no percentual de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.

A sentença deu parcial provimento aos pedidos para:

1. Decretar a rescisão dos contratos de promessa de compra e venda 412 e 413 entabulados entre as partes, bem como dos respectivos aditivos, referentes às salas 315-D e 207-D, no SGAN 915, Lote F, Asa Norte/DF (fls. 20/26; 27/33; 35/38), produzindo efeitos a contar do deferimento da antecipação de tutela (fl. 58-v – 05.02.2015);

2. Condenar a requerida à devolução de 90% dos valores despendidos a título das prestações pagas em financiamento de compra e venda pela autora relativos aos imóveis acima discriminados, quantificados em R$ 216.429,00 (duzentos e dezesseis mil quatrocentos e vinte e nove reais), atualizados monetariamente

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pelo INPC a contar do efetivo desembolso de 90% de cada parcela, e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação.

Não obstante a omissão da sentença quanto à nulidade das cláusulas 18.2 e 18.3 dos contratos, é possível concluir por sua admissão tácita, na linha da regra hermenêutica contida no art. 489, § 3º, do Código de Processo Civil, segundo o qual “a decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé”.

Decerto, o reconhecimento da abusividade da cláusula penal e a limita-ção da retenção em 15% traz embutida a admissão da invalidade das referidas cláusulas contratuais.

Seja como for, os pleitos fundamentais – resolução contratual e resti-tuição dos valores pagos – foram atendidos em parte e por isso não há como escapar à existência de sucumbência recíproca, embora em patamares distintos.

Tanto na causa de pedir como no pedido os Autores sustentam, com pri-mazia, o direito à restituição de todos os valores pagos. Basta dizer que, no item C 2 do pedido, deixam claro a dedução de pedido subsidiário, materializada na expressão “se for o caso”.

Houve, destarte, decaimento parcial dos pedidos que justifica a distribui-ção proporcional dos encargos da sucumbência.

isto posto

I – Conheço e nego provimento ao recurso dos Autores.

II – Conheço e dou provimento em parte ao recurso da Ré para aumentar o percentual de retenção dos valores pagos pelos Autores para 15%.

O Senhor Desembargador Romulo de Araujo Mendes – Vogal

Com o relator

O Senhor Desembargador Arnoldo Camanho – Vogal

Com o relator

decisão

Negar provimento ao recurso dos autores e dar parcial provimento ao recurso da ré, unânime.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2490

Tribunal de Justiça do Estado de GoiásGabinete do Desembargador Alan Sebastião de Sena ConceiçãoApelação Cível nº 244081‑17.2013.8.09.0051 (201392440815)Comarca de GoiâniaApelante: Samara Francisca TrindadeApelados: Lucirene Rocha de Abreu e outroRelator: Des. Alan Sebastião de Sena Conceição

ementa

ApeLAção cÍVeL – Ação de deSpeJo c/c reScISão de coNtrAto de LocAção, cobrANçA de ALuguÉIS, pedIdo de tuteLA ANtecIpAdo, bem como pLeIto recoNVeNcIoNAL – dANoS mAterIAIS e morAIS – Não ocorrÊNcIA – hoNorárIoS AdVocAtÍcIoS – redução

1. O não pagamento dos alugueres no prazo fixado no contrato cele-brado, bem como de outros encargos dele decorrentes, inclusive o de alterar a destinação do imóvel alugado ao fim a que se destinava, sem a concordância expressa dos locadores, enseja a rescisão pleiteada. 2. Não gera indenização por danos morais e/ou materiais se os requisitos exigidos para tanto não ficaram demonstrados, pois a suposta conduta ilícita praticada pelos reconvindos não foi em desacordo às cláusulas do pacto firmado. 3. Reduz-se a verba honorária fixada se estabelecida em desconformidade com os princípios da razoabilidade e proporcio-nalidade. Apelação cível conhecida e parcialmente provida. Sentença parcialmente reformada.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as retro in-dicadas.

Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, em sessão pelos inte-grantes da Primeira Turma Julgadora da Quinta Câmara Cível, à unanimidade de votos, em conhecer do recurso e lhe dar parcial provimento, nos termos do voto do relator.

Votaram com o relator, que também presidiu a sessão, o Diác. Dr. Delintro Belo de Almeida Filho (substituto do Des. Geraldo Gonçalves da Costa) e o Des. Francisco Vildon José Valente.

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Representou a Procuradoria-Geral de Justiça o Dr. Wellington de Oliveira Costa.

Goiânia, 10 de novembro de 2016.

Alan Sebastião de Sena Conceição Relator

Voto

Presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso, dele conheço.

Como relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença (fls. 371/377) proferida nos autos da “Ação de Despejo c/c Rescisão de Contrato de Locação, Cobrança de Aluguéis, Pedido de Tutela Antecipada, bem como no Pleito Reconvencional”, na qual o magistrado singular julgou procedentes os pedidos constantes da peça inicial, a fim de: a) declarar rescindido o con-trato de locação celebrado entre as partes, retroagindo os seus efeitos à data do ajuizamento da demanda; b) determinar o despejo dos réus ou quem esti-ver ocupando o imóvel alugado, fixando o prazo de 15 dias para a respectiva desocupação contado da intimação do comando judicial; c) fixar em 3 meses de aluguel (vigente à época da propositura da ação – R$ 6.000,00) o valor da caução, caso os autores optem por executar provisoriamente o despejo; e d) condenar os réus, de forma solidária, a pagarem aos requerentes os aluguéis no período descrito na inicial, bem como aqueles que vencerem no curso da lide até a data efetiva de entrega do imóvel que serão atualizados monetaria-mente pelo “INPC” a partir do vencimento de cada obrigação e acrescidos de juros de mora no patamar de 1% ao mês contados da citação e, no tocante ao pleito reconvencional, julgou-o improcedente.

Ao final, impôs ainda aos réus/reconvintes a responsabilidade pelo pa-gamento das custas processuais e honorários advocatícios, sendo estes fixados, quanto ao pedido inaugural, no percentual de 15% sobre o valor atualizado da respectiva condenação e, no que se refere à reconvenção, na importância de R$ 8.000,00 (oito mil reais), com base no § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil.

O inconformismo da apelante está alicerçado no fato de que os apela-dos omitiram de forma intencional fatos tidos por eles como relevantes e que, se fossem do seu conhecimento, sem dúvida, não teriam alugado o imóvel de sua propriedade, circunstância essa que, consoante pontua, impossibilitou de fazer uso dele ao objetivo a que se destinava, porquanto não lhe fora fornecido o alvará exigido pelo ente público municipal, considerado imprescindível ao seu funcionamento e, ainda, quanto à verba honorária arbitrada, segundo pro-

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clama, estabelecida em desconformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Pois bem. Eis os fatos que estão a exigir a devida apreciação. Examino-os sob o enfoque devolvido pelo apelo.

Por oportuno, convém salientar que os autores alugaram aos réus, no mês de novembro de 2011, o imóvel de sua propriedade situado à Avenida Portugal, esquina com a T-8, no Setor Marista, nesta Capital, com o prazo de vigência previsto para o ano de 2016, e que se destinava exclusivamente à “promoção de eventos e festas”, ficando proibido à locatária, entretanto, sublocá-lo ou usá-lo de forma diferente daquilo que estava previsto no pacto celebrado, sob pena de ensejar a rescisão contratual.

Como se percebe, a tese defendida, com muito brilhantismo pela ape-lante, está alicerçada no fato de que os autores omitiram, de forma intencional, fatos qualificados de revelantes e que, se fossem de seu conhecimento, não teriam assinado o contrato de locação ora questionado, elencando, em resu-mo, pendências do imóvel com o ente público municipal no que se refere ao pagamento do “IPTU” e também com empresas públicas de prestação de servi-ços como a “Celg” e a “Saneago”, respectivamente, condicionantes essas que impossibilitaram a expedição do “competente alvará de funcionamento de seu estabelecimento comercial”.

Destarte, e o que se observa do “2º Aditivo Contratual ao Contrato de Locação Comercial com Fiador” (fls. 19/29) é que não obstante as alegações alinhavadas pela apelante, por sinal, inconsistente, tais obrigações, além do pa-gamento dos aluguéis no prazo estabelecido, também era de responsabilidade da locatária, inclusive a quitação dos tributos concernentes aos serviços dispo-nibilizados pelas empresas públicas e, especificamente, o de obter o alvará de funcionamento do estabelecimento comercial junto aos órgãos competentes.

Daí, não se afigura como crível que os réus, ainda que fossem inexpe-rientes e desacostumados nesse tipo de negócio jurídico, simplesmente, para efeito de argumentação, quando de sua celebração, estavam acompanhados de profissional devidamente qualificado, o fiador, o que nos levam a deduzir que as cláusulas nele inseridas tenham sido prévia e amplamente discutidas, assim, não se pode admitir que tenham sido pegos de surpresa com os termos daquilo que foi livremente acordado.

Aliás, e como bem pontuado pelo culto julgador monocrático, o descum-primento de cláusulas do contrato de locação celebrado tornou-se uma prática constante dos locatários, não se limitando, tão somente, ao não pagamento dos alugueres e outros compromissos financeiros assumidos, mas e, principalmente, o de utilizar o imóvel alugado de forma diversa ao objetivo a que se destinava, porquanto, consoante noticiam os documentos (fls. 348/352), a locatária sublo-cou-o e alterou sua finalidade, sem a devida autorização de seus proprietários.

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A título de ilustração, e devido a sua pertinência, reproduzo fragmentos da bem-lançada sentença (fls. 373/374), in verbis:

“O aditivo contratual de locação comercial acostado às fls. 78/80 compro-va que os locatários assumiram os débitos anteriores, mediante pagamento de R$ 25.000,00 aos locadores.

No referido aditivo as partes ajustaram que a não compensação do cheque de nº 0038, conta-corrente nº 18497-7, do Banco Itaú, no valor de R$ 15.000,00, implicaria, dentre outras providências, na assunção pelos locatários dos débitos anteriores: de aluguéis, IPTU, Celg e Saneago.

E os requeridos não comprovaram o pagamento da referida cártula, pelo contrá-rio, no e-mail por eles apresentados à fl. 160 consta informação de que o cheque foi devolvido.

Não bastasse isso, não foi comprovada a quitação dessa quantia por qualquer outra maneira, ônus que lhe incumbia à parte requerida.

No que tange à assertiva de que o imóvel locado apresenta defeitos estruturais, nenhuma prova foi produzida pela parte requerida nesse sentido, existindo de concreto mesmo apenas as alegações lançadas na peça de defesa.

Assim, o que se constata é que a culpa pela não expedição do Habite-se e do alvará de funcionamento não pode ser atribuída aos requerentes, eis que os re-queridos assumiram contratualmente o ônus de quitar os débitos tributários exis-tentes não somente após a realização do contrato de locação, mas até mesmo os débitos anteriores.

Não bastasse isso, observo que no imóvel locado foi constituída uma empresa do ramo diverso do estabelecido contratualmente (Hanna’s Artefatos de Madeiras).”

Nessa quadra, diante do que ficou demonstrado, através dos elementos de provas coligidos, não resta dúvida que os réus infringiram diversas cláusulas constantes do contrato de locação e, com a sua conduta, motivou o pedido de rescisão em apreço, daí porque, a meu sentir, impossível tributar aos autores qualquer responsabilidade pelo rompimento do pacto firmado, o que significa dizer, que não se pode acolher a pretensão da reconvinte, concernente à in-denização por danos materiais e morais, porquanto os requisitos exigidos para a configuração do ilícito praticado em desacordo com a ordem jurídica não ficaram comprovados.

Ademais, quando das razões alinhavadas pelo recurso interposto, a ape-lante não trouxe nenhuma justificativa plausível a conferir credibilidade à sua versão no sentido de que os autores tenham, de forma intencional, alterado a verdade dos fatos, com o objetivo de induzi-la a equívoco e, assim, firmar o pacto celebrado que, na sua ótica, seria danoso e perverso aos seus interesses, ônus que lhe competia, nos termos do que dispõe o inciso I do art. 333 do Có-digo de Processo Civil/1973.

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Enfim, o não pagamento dos alugueres no prazo fixado pelo contrato ce-lebrado, bem como de outros encargos dele decorrentes, inclusive o de alterar o objetivo do imóvel ao fim a que se destinava, sem a devida concordância dos locadores, implica no descumprimento de cláusulas nele inseridas a justificar, sem dúvida, o pedido de rescisão ora questionado.

Agora e, nas linhas seguintes, enfrento a questão relacionada ao descon-tentamento da apelante com os honorários advocatícios fixados, qualificados de exagerado e estabelecidos, como sustenta, em desconformidade com os princí-pios da razoabilidade e proporcionalidade.

Com efeito, o que se verifica da sentença sob censura é que o culto diri-gente processual não apresentou nenhum dos motivos que o levou a arbitrar à verba honorária no patamar tido como exorbitante pela apelante, o que, no meu entendimento, tornar-se-ia necessário.

Assim, como a presente demanda não envolve maiores indagações, com a apresentação de teses jurídicas complexas, nem tampouco grande decurso de tempo, e tendo em vista ainda a simplicidade da natureza da causa, já que se trata de uma ação de rescisão de contrato de locação, cumulada com cobrança de aluguéis, na qual houve o pleito reconvencional, entendo por bem reduzir o montante da verba honorária fixada no pleito exordial ao percentual de 10% so-bre o valor da condenação e, no tocante à reconvenção, minorar para o importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais), principalmente devido à grave crise econômico/financeira que atravessa o país.

Ante o exposto, e sem maiores considerações sobre o tema em debate, conheço do apelo e lhe confiro parcial provimento, a fim de reduzir a verba honorária fixada, nos termos do estabelecido em linhas pretéritas, ficando, no mais, mantida a sentença objurgada por estes e seus próprios e jurídicos funda-mentos.

É o voto.

Goiânia, 10 de novembro de 2016.

Alan Sebastião de Sena Conceição Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2491

Tribunal de Justiça do Estado de Minas GeraisApelação Cível nº 1.0024.02.861001‑2/004Comarca de Belo HorizonteRelator: Des.(a) Domingos CoelhoRelator do Acordão: Des.(a) Domingos CoelhoData do Julgamento: 21.11.2016Data da Publicação: 24.11.2016Apelante(s): Condomínio Edifício NápolesApelado(a)(s): Flavia Isabel Grijo de Mello

ementa

ApeLAção cÍVeL – Ação reIVINdIcAtÓrIA c/c decLArAtÓrIA de NuLIdAde – coNdomÍNIo – proprIedAde de áreA comum – ALterAção de coNVeNção de coNdomÍNIo pArA coNceder dIreIto A um doS coNdômINoS de áreA comum

A alteração da convenção de condomínio realizada unilateralmente pela Construtora e empresa de engenharia responsável pela obra, sem con-sentimento dos demais condôminos, de parte de área comum para um dos imóveis, encontra-se eivado de vícios que o inquinam de nulidade o registro dessa alteração devendo ser devolvido ao condomínio a parte cedida.

acórdão

Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em deram provimento ao recurso.

Des. Domingos Coelho Relator

Voto

Cuida-se de recurso de apelação interposto por Condomínio do Edifício Nápoles em face da r. sentença de fls. 206/207, que julgou improcedente o pe-dido inicial nos autos da ação reivindicatória c/c ação declaratória de nulidade absoluta que move contra Flavia Isabel Grijo de Mello.

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Irresignado alega o Apelante que se aplica ao caso o art. 43, inciso IV da Lei nº 4.591/1964, a exigir que após a venda das unidades autônomas, ao incor-porador e/ou construtor seja vedado modificar o projeto no que toca as partes comuns do condomínio; que a re-ratificação promovida pelas construtoras se deu sem a participação de quaisquer legitimados, condição que macula o ato de inarredável; que as construtoras não poderiam alterar as partes comuns do condomínio sem que todos os interessados tivessem se manifestado acerca das alterações; que a Súmula nº 260 do STJ não tem aplicação a hipótese dos autos.

Contrarrazões às fls. 222/225.

Recurso próprio, tempestivo, regularmente processado e preparado. Dele conheço eis que presentes os pressupostos para sua admissibilidade.

A controvérsia no caso restringe em verificar se foi legal o ato de re--ratificação realizado pela Construtora do Edifício Nápoles, sem a participação dos demais condôminos, alterando as partes comuns do condomínio.

Verifica-se dos autos que houve uma re ratificação da convenção de Condomínio do Edifício Nápoles realizada e assinada unicamente por Probus Engenharia e Comércio Ltda. e Construtora Andrade Soares Ltda. (fl. 23), alte-rando a área de uso comum do edifício, prevendo a inclusão da área descober-ta permeável (jardim) de 65,60m² como área privativa do apartamento 101A, sendo que esta unidade passou a apresentar, área total privativa de 137,03m².

Contudo, resta inequívoco nos autos que antes da referida alteração da convenção de condomínio, das 28 unidades autônomas, 8 já haviam sido ven-didas, conforme constou na r. sentença e faz prova os documentos colaciona-dos aos autos.

Logo, prende-se a questão em saber se foi observado o quórum neces-sário, vez que os adquirentes dos imóveis não se manifestaram acerca da alte-ração.

Cediço que o terreno sobre o qual se levanta o prédio constitui direito de todos os condôminos às partes comuns da edificação sendo inseparáveis de sua propriedade exclusiva e serão suscetíveis de utilização por qualquer condômi-no. Em outras palavras, ao registrar a convenção de condomínio, a Construtora e empresa de Engenharia, destinaram as partes de uso comum sobre o qual se assentava o prédio a uso e posse comum de todos os condôminos e não lhe era possível querer reverter tal destinação de parte desta área comum para uso exclusivo de apenas um imóvel sem anuência dos demais adquirentes.

Desta forma, tenho que o expediente da re ratificação constitui agressão à lei e aos interesses dos adquirentes do imóvel, por isso, não pode prevalecer, conforme dispõe o art. 43, inciso IV da Lei nº 4.591/1964 que assim dispõe:

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“Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos, determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as seguintes normas:

IV – é vedado ao incorporador alterar o projeto, especialmente no que se refere à unidade do adquirente e às partes comuns, modificar as especificações, ou desviar-se do plano da construção, salvo autorização unânime dos interessados ou exigência legal;”

Em comentário ao referido artigo, Caio Mario da Silva Pereira em Condo-mínio e Incorporações, Editora Forense, Rio, p. 226:

“Quem contrata uma incorporação tem de guardar fidelidade ao prometido, e não pode, unilateralmente, fugir dos termos avençados. A recomendação é a bem dizer ociosa, pois que é própria de todo contrato bilateral. Tais foram, porém, os abusos, que a lei considerou necessário acentuá-lo, pondo-o como obrigação específica do incorporador.

As alterações se legitimam, porém, se forem aprovadas pelo voto unânime dos adquirentes, ou provierem de exigência legal.

Cumpre, entretanto, ressalvar que a determinação da autoridade administrativa, devendo embora cumprir-se por assentar na lei, não exime o incorporador de res-ponsabilidade, quando haja prometido ou ajustado condições que contratariam as normas legais ou regulamentares, que por dever de ofício lhe cabia conhecer.”

Esta é a lição do acatado Prof. João Batista Lopes para quem, “definida, na convenção, a destinação das unidades autônomas e o uso das partes co-muns, somente a unanimidade dos condôminos poderá alterá-la, pena de ofen-sa a direitos adquiridos” (Condomínio. Problemas fundamentais da propriedade horizontal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990).

Ainda, a doutrina de Carlos Maximiliano, em Condomínio, 4. ed., fl. 47: “Para alterar ou substituir o destino de coisa comum ou agir em contrário ao mesmo, necessita, um coproprietário, do assentimento de todos os outros”.

Desta forma, conforme acima manifestado, quando foi realizada a alte-ração da convenção condominial, a Construtora e empresa de engenharia não eram mais os únicos proprietários do imóvel, pois já haviam sido alienados 8 apartamentos, existindo, portanto, um condomínio entre todos os detentores de unidades autônomas.

Sabido que a área comum da propriedade imóvel objeto de condomínio poderá ser utilizada por todos os condôminos indistintamente, sendo defeso a qualquer deles exercer direito individual sobre a coisa, salvo se existir autoriza-ção de todos os interessados, o que não ocorreu no caso.

Estabelece o art. 3º da Lei nº 4.591/1964 que o terreno em que se levan-tam a edificação ou o conjunto de edificações e suas instalações “constituem

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condomínio de todos, e serão insuscetíveis de divisão, ou de alienação des-tacada da respectiva unidade”. In casu, a área objeto de litígio encaixa-se na citada previsão da lei de condomínio, uma vez que se encontra no térreo do edifício, portanto, era indiscutivelmente área comum que não podia ser afetada à propriedade de apenas um dos condôminos, sem anuência e concordância dos demais, porquanto, houve aumento na fração ideal de terreno da unidade cuja área privativa foi aumentada; consequentemente, diminuição em todas as demais, as quais contribuíram com parcelas de suas próprias frações ideais para a formação da fração ideal daquela unidade.

Assim, não obstante, tenha sido efetivada a alteração da convenção de condomínio, bem como tendo a alteração sido devidamente registrada junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente (fl. 05), não ha dúvida da irregulari-dade de todos esses procedimentos que não observou o que determina a legis-lação aplicável à espécie, com anuência de todos os interessados e proprietários de imóveis do condomínio.

In casu, reconhece-se que a construtora e empresa de engenharia não poderiam alterar a destinação da área em discussão, uma vez que a mesma não lhe pertencia, fazendo parte da propriedade comum e, como cediço, tendo havido a venda anterior de outras unidades, formou-se o condomínio, e os refe-ridos condôminos deveriam ter se manifestado acerca da alteração, o que não ocorreu, conforme faz prova o documento de re ratificação constante à fl. 23.

Silvio Rodrigues, ao dissertar sobre as regras do condomínio, pontifica que “a coisa comum deve ser usada de acordo com o seu destino e com a sua natureza, vedadas, portanto, ao condômino, sem anuência dos demais, não apenas as modificações que alterem a substância da coisa, como as que mudem a maneira como ela é tradicionalmente explorada (Cód. Civ., art. 628).” (in Di-reito das coisas, 7. ed., p. 191)

Mais adiante, o citado doutrinador ressalta que: “As áreas de uso comum não podem ser utilizadas com exclusividade por nenhum condômino, pois per-tencem a todos. Portanto, não pode a convenção ou assembleia, se não há unanimidade, reservar uma parte qualquer das áreas comuns ao uso exclusivo de um ou de alguns dos condôminos” (obra citada, p. 218) (Grifei).

Trago à baila:

“Retificações e alterações da instituição de condomínio.

Tanto o registro da incorporação imobiliária quanto o da instituição de condomí-nio, bem como da convenção de condomínio, podem ser retificados ou alterados por causas supervenientes. Embora o caráter definitivo que deve revestir especial-mente a individuação das unidades autônomas, fatores os mais distintos podem determinar a necessidade de modificação do status quo. O art. 43, IV, da Lei nº 4.591/1964, proíbe ao incorporador alterar o projeto sem aprovação unânime daqueles que vierem a ser atingidos. Também o art. 10 dessa lei prevê situações

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em que é defeso ao condômino, unilateralmente, praticar atos relacionados com alterações no prédio. Cremos que a regra geral a ser aplicada para todos os casos de retificação ou alteração dos registros de incorporação, de instituição e da con-venção de condomínio, deva ser a de exigir-se a mesma convergência de vonta-des que foi requisitada para a formação do ato que se pretenda modificar. Sempre que presente o interesse dos demais integrantes do condomínio, devem estes se manifestar. Cumpre ao Registro de Imóveis verificar, à luz dos direitos registrados, se estão presentes todas as partes necessárias, independente de questionamentos sobre validade ou eficácia da retificação” (http://www2.colegioregistralrs.org.br/publicacoes/doutrinaCompleta?id=1356 1, A transformação da área comum no condomínio edilício em área privativa por Mário Pazutti Mezzari – Registrador de Imóveis, V Encontro Estadual de Notários e Registradores).

Em artigo publicado por Luiz Antônio Scavone Junior, Advogado, Ad-ministrador pela Universidade Mackenzie, Mestre e Doutor em Direito Civil pela PUC-SP, Professor e Coordenador do Curso de pós-graduação em Direito Imobiliário da EPD, Professor de Direito Civil e Mediação e Direito Arbitral nos cursos de graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da FAAP, autor de diversas obras e, entre elas: Direito Imobiliário – teoria e prática (Ed. Forense), assim dispôs:

“Independentemente da espécie de obra, ou seja, acréscimo, obra útil ou, ainda, voluptuária, se implicar em alteração substancial da destinação ou do uso das partes comuns demandará a unanimidade.

[...]

Portanto, a alteração do plano inicial da edificação existente na época da institui-ção do condomínio, além da destinação das áreas comuns reclamam anuência unânime dos condôminos e seus consortes (incluídos os compromissários com-pradores, com título registrado), porquanto o princípio majoritário não pode su-primir, no todo ou em parte, ou alterar o direito dominal (real) dos comunheiros. A unanimidade dos interessados vem preceituada na Lei nº 4.591/1964 (art. 43, IV[1]), que regula as incorporações, impondo a impossibilidade de alteração das áreas comuns projetadas desde a construção do imóvel submetido a este regime.

De qualquer forma, esta é uma regra geral. Não pode haver qualquer alteração da destinação ou uso sem a aprovação unânime dos condôminos.

A alteração de projeto registrado de incorporação de edifício em condomínio exige, portanto, consenso unânime dos interessados, tal como resulta de impera-tivo legal e de remansosa jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário nº 71.285/PR, 2ª T., 18.10.1974. Min. Antonio Neder – in Revista Trimestral de Jurisprudência, v. 71, p. 425-430; Recurso Extraordinário nº 89.869-9-RJ, 2ª T., 08.06.1979, Min. Cordeiro Guerra – in Revista de Direito Imobiliário, v. 5, p. 65-67; Recurso Extraordinário nº 94.861/PR, 1ª T., 24.11.1981, Min. Rafael Mayer – in Revista de Direito Imobiliário, v. 9, p. 55-57).”

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Destarte, não há como prevalecer a decisão, porquanto a Convenção é nula de pleno direito por ofensa a legislação, devendo a parte do imóvel ser devolvida ao Condomínio.

Mercê de tais considerações, dou provimento ao recurso para reformar a r. sentença e julgar procedente o pedido inicial, declarando nula a re ratifi-cação da convenção de condomínio realizada e registrada no Cartório de Re-gistro de imóveis, devendo a ré devolver ao condomínio a propriedade da área descoberta de jardim de 65,80m², localizada a esquerda do edifício, visto da rua, compreendida pela divisa do passeio e muro de arrimo da garagem entre o apartamento 101A e o muro de divisa. Determino que se oficie ao Cartório do 3º Ofício de Registro de Imóveis para que proceda ao cancelamento da re ratificação, averbação nº 2.2937, devendo a parte do imóvel objeto da re rati-ficação ser devolvida ao condomínio, procedendo-se as devidas alterações no registro dos imóveis.

Condeno a apelada no pagamento das custas recursais, processuais e honorários advocatícios em 20% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do Código de Processo Civil.

Des. José Flávio de Almeida – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. José Augusto Lourenço dos Santos – De acordo com o(a) Relator(a).

Súmula: “Súmula: deram provimento ao recurso.”

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2492

Tribunal de Justiça do Estado do ParanáProcesso: 0036439‑25.2015.8.16.0014/0 (Acórdão)Segredo de Justiça: NãoRelator(a): Fernanda de Quadros Jorgensen GeronassoÓrgão Julgador: 1ª Turma RecursalComarca: LondrinaData do Julgamento: 23.11.2016 00:00:00Fonte/Data da Publicação: 24.11.2016

ementa

recurSo INomINAdo – Ação ANuLAtÓrIA de coNtrAto de LocAção c/c INdeNIZAção por dANoS mAterIAIS e morAIS – ImÓVeL Que Não tINhA AutorIZAção dA muNIcIpALIdAde – AuSÊNcIA de ?hAbIte-Se? – reScISão do coNtrAto – deVIdo – dANoS mAterIAIS comproVAdoS – LucroS ceSSANteS INdeVIdoS – Não comproVAdo – dANoS morAIS – Não coNFIgurAdo – SeNteNçA pArcIALmeNte reFormAdA

Recurso conhecido e parcialmente provido.

Trata-se de ação anulatória de contrato c/c perdas e danos, ajuizada por Mauricio Antonio Boschi em face de Evonir Moraes Botura.

Narra o reclamante que celebrou com o reclamado contrato de locação não residencial, mas posteriormente verificou que suas dependências não esta-vam em condições de ser ocupada, requerendo a rescisão do contrato, com de condenação do reclamante ao pagamento de danos materiais a título de danos emergentes, lucros cessantes e indenização por danos morais.

Em contestação o reclamado formulou pedido contraposto para conde-nação do reclamante ao pagamento dos aluguéis.

Sobreveio sentença julgando parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a reclamada ao pagamento de R$ 1.500,00 em favor do reclaman-te. Julgou improcedente o pedido contraposto.

Inconformado o reclamante interpôs recurso inominado, requerendo a total procedência dos pedidos formulados na exordial. (evento 55.1)

O recurso foi recebido e as contrarrazões apresentadas.

É o relatório.

Passo ao voto.

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Inicialmente, defiro o pedido para concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.

Satisfeitos os pressupostos viabilizadores da admissibilidade do recurso, razão pela qual, merece conhecimento.

Incontroverso o contrato de locação não residencial firmado entre as partes e, em razão da ausência de liberação do “habite-se” o imóvel constava irregular junto a municipalidade, o que impediu a efetivação do contrato de locação.

O juiz sentenciante fixou a título de indenização por danos materiais a importância de R$ 1.500,00, valor incontroverso, despendido para instalação de um portão no imóvel.

Pela recorrente houve, ainda, o pleito para pagamento de danos emer-gentes, relativos aos aluguéis de dezembro a janeiro e pintura do imóvel.

Assim, considerando que o imóvel não foi usufruído pelo recorrente de-vido à ausência de liberação do “habite-se”, devido se torna a restituir do valor pago de R$ 1.750,00 a título de aluguel (evento 1.5), bem como os valores desembolsados com a pintura do imóvel, o que se comprovou pelos recibos colacionados ao feito (evento 1.6 e 1.7)

Quanto aos lucros cessantes, as provas produzidas não foram suficientes para comprovar o valor que deixou de ganhar com a não fruição do contrato de locação, vez que a testemunha ouvida em audiência de instrução e julgamen-to? Sr. Luiz Henrique, não apresentou informações claras a respeito dos valores auferidos antes e depois da locação do imóvel.

Da mesma forma, não procede a indenização por danos morais, pois não comprovado a ofensa à honra e à imagem do reclamante capaz de justificar a indenização pretendida, pois o mero descumprimento contratual não caracteri-za situação a ensejar a indenização.

Ante o exposto, voto pelo parcial provimento do recurso interposto, ape-nas para condenar o reclamado, para condenar o reclamado ao pagamento de R$ 2.200,00, R$ 350,00 e R$ 1.750,00, com correção monetária corrigida pelo índice do INPC-IGPI a contar do desembolso, e juros de mora de 1% a.m. con-tados da citação; no mais, mantenho a sentença monocrática.

Logrando parcial êxito no recurso, fica a recorrente condenando ao paga-mento de honorários advocatícios fixados no valor 15% sobre o valor da conde-nação. Custas devidas na forma do art. 4º da Lei nº 18.413/2014. Entretanto, por ser a parte autora beneficiário da Justiça Gratuita, resta suspensa a obrigação, nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/1950.

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do dISpoSItIVo

Ante o exposto, esta 1ª Turma Recursal resolve, por unanimidade dos votos, em relação ao recurso de Mauricio Antonio Boschi, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito – Provimento em Parte nos exatos termos do voto.

O julgamento foi presidido pelo(a) Juiz(a) Leo Henrique Furtado Araújo, sem voto, e dele participaram os Juízes Fernanda de Quadros Jorgensen Geronasso (relator), Fernando Swain Ganem e Aldemar Sternadt.

Curitiba, 21 de novembro de 2016.

Fernanda de Quadros Jorgensen Geronasso Juíza Relatora

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2493

Tribunal de Justiça do Estado do Rio de JaneiroDécima Nona Câmara CívelEmbargos de Declaração no Agravo nº 0042197‑43.2015.8.19.0000Embargante: Município do Rio de JaneiroEmbargado: Ministério Público do Estado do Rio de JaneiroEmbargado: Carlos Alberto RamosEmbargado: Maria das Graças da Silva OliveiraJuízo de Origem: Central de Assessoramento Fazendário – Comarca da CapitalRelator: Desembargador Lúcio Durante

embArgoS de decLArAção – AgrAVo de INStrumeNto – Ação cIVIL pÚbLIcA – LoteAmeNto IrreguLAr – ImpActo AmbIeNtAL – rISco ecoLÓgIco

Decisão agravada que indeferiu a Antecipação dos Efeitos da Tutela.

Ministério Público que pleiteou, em sede de Antecipação de Tutela, que os Réus fossem instados a: (1) identificar todas as construções irregulares existentes ao longo do loteamento situado à Estrada do Curumaú, nº 920, Jacarepaguá, através de apresentação de planta locando a posição exata das construções, dentro do prazo de 30 (trinta) dias; (2) o cadastramento das famílias a serem removidas para outro local apropriado e próximo, desde que de acordo com as normas ambientais, urbanísticas e edilícias vigentes, dentro do prazo de 30 (trinta) dias; (3) o desfazimento das cons-truções já concluídas, as em curso e as que surgirem ao longo do tempo até solução final da presente demanda, dentro do prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias, sendo certo que toda as famílias deverão ser previamente cadastradas e reassentadas, observando-se as normas legais pertinentes; (4) a apresentação de Projeto de Reflorestamento do topo do morro, em razão da vegetação retirada para dar lugar às construções irregulares, com respectivo cronograma de execução, objeto de pedido de demolição, dentro de 30 (trinta) dias. Requereu, ainda, para garantir a eficácia da determinação judicial, a fixação de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por dia de descumprimento, nos termos do § 1º do art.14 do Código de Processo Civil.

Decisão agravada que considerou não estarem presentes os requisitos para o deferimento da Antecipação dos Efeitos da Tutela, uma vez que não há prova inequívoca da inércia do ente e a comprovação do perigo de dano.

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Loteamento instalado no local, há muitos anos, com casas em local de risco e em área de preservação permanente. Possibilidade de intervenção do Poder Judiciário para garantir a concretização das normas constitucio-nais, fazendo cessar a inércia dos entes públicos.

Presenças dos requisitos para a concessão parcial da Antecipação da Tu-tela, diante da continuidade de agressão ao meio ambiente e do risco para os moradores.

Acórdão Embargado que concedeu parcialmente a tutela; afastando o item que versava sobre a demolição imediata das casas; dilatando o pra-zo para implementação das medidas para 180 (cento e oitenta) dias e fi-xando multa coercitiva diária em R$ 1.000,00 (mil reais), com incidência no descumprimento de cada um dos itens deferidos (1, 2 e 4) da tutela, até o valor máximo de R$ 900.000,00 (novecentos mil reais).

Oposição de Embargos de Declaração pelo Município do Rio de Janeiro. Alegação de existência de omissões no Acórdão Embargado que não te-ria levado em conta que a responsabilidade do Município, no caso, é subsidiária. Afirmou, ainda, o Embargante que não houve omissão por parte da Municipalidade.

Acórdão Embargado que apreciou todas as questões relevantes aponta-das pela parte.

Omissão do Município que é evidente e permitiu o desenvolvimento do loteamento irregular.

Medidas autorizadas que apenas servirão para um mapeamento da área, das famílias residentes na localidade, e de qual será o custo com a res-tauração do meio ambiente (Projeto), o que deve ser efetuado pelo Mu-nicípio que, com sua omissão, permitiu que o loteamento irregular se desenvolvesse, com danos ao meio ambiente e com risco para as pessoas que ali residem.

Inocorrência das hipóteses previstas no art. 1.022 do NCPC/2015. Inexis-tência de omissão e/ou contradição no Acórdão Embargado.

Rejeição dos Embargos.

Vistos, discutidos e examinados estes autos dos Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento em epígrafe,

Acordam, os Desembargadores que integram a 19ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em

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conhecer e negar provimento aos Embargos Declaratórios, nos termos do voto do Relator.

relatório

Trata a hipótese de Embargos de Declaração opostos pelo Município do Rio de Janeiro contra Acórdão desta E. Câmara (fls. 79e/90e), que deu parcial provimento ao Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ora Embargado, contra a decisão proferida pelo juí-zo da Central de Assessoramento Fazendário – Comarca da Capital, nos autos da Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ora Embargante, em face de Carlos Alberto Ramos, do Município do Rio de Janeiro e de Maria das Graças da Silva Oliveira, que indeferiu a Antecipação de Tutela requerida.

É o teor da decisão agravada:

“Fundamenta a parte autora seu requerimento no disposto no inciso I do art. 273 do CPC, ou seja, a tutela de urgência, que exige o requisito do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Para a concessão da mesma, a lei exige o ‘juízo de verossimilhança’ fundado em ‘prova inequívoca’. O juízo de verossi-milhança ou de probabilidade, como é sabido, tem vários graus, que vão desde o mais intenso até o mais tênue, e a prova inequívoca não é o mesmo que fumus boni juris do processo cautelar. O juízo fundado em prova inequívoca, uma pro-va que convença bastante, que não apresente dubiedade, é seguramente mais intenso que o juízo assentado em simples ‘fumaça’, que somente a visualização de mera silhueta ou contorno sombreado de um direito. No presente caso, não há como se deferir tal requerimento. É que, em primeiro lugar, não há a prova inequívoca como mencionada na petição inicial, uma vez que, passados 06 (seis) anos da instauração do inquérito civil, não há esta prova no sentido da inércia do Município do Rio de Janeiro. Em segundo lugar, não há dano irreparável ou de difícil reparação caso a medida pleiteada seja concedida ao final, mormente pelo fato de que o mencionado inquérito civil demorou 06 (seis) anos para ser concluído. Face ao exposto, indefiro o requerimento de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. Citem-se.”

O Acórdão Embargado deu parcial provimento ao recurso para conce-der a Antecipação de Tutela no que tange aos itens: (1) identificar todas as construções irregulares existentes ao longo do loteamento situado à Estrada do Curumaú, nº 920, Jacarepaguá, através de apresentação de planta locando a posição exata das construções, dentro do prazo de 180 (cento e oitenta) dias; (2) o cadastramento das famílias a serem removidas para outro local apropria-do e próximo, desde que de acordo com as normas ambientais, urbanísticas e edilícias vigentes, dentro do prazo de 180 (cento e oitenta) dias e (4) a apresen-tação de Projeto de Reflorestamento do topo do morro, retirada para dar lugar

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às construções irregulares, com respectivo cronograma de execução, objeto de pedido de demolição, dentro de 180 (cento e oitenta dias) dias. Fixou, ainda, multa coercitiva diária, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), devendo esta incidir no descumprimento de cada um dos itens deferidos (1, 2 e 4) da tutela, até o valor máximo de R$ 900.000,00 (novecentos mil reais).

Em suas razões recursais, alega o Embargante, Município do Rio de Janeiro, em resumo, que o Acórdão foi omisso em vários pontos, tais como a impossibilidade de se agir na área de forma mais contundente, por questão de segurança pública, em razão da atuação de milícias no local.

Não houve, ainda, análise sobre a questão da inexistência de responsa-bilidade do Município em relação aos danos ambientais ou, no máximo, de sua responsabilidade subsidiária, nos termos do artigo 3º, IV c/c 14, § 1º, ambos da Lei nº 6.938/1981, o que implicaria na improcedência dos pedidos de Anteci-pação de Tutela.

Alega o Embargante que as obras do loteamento clandestino foram cons-tatadas em 2009, tendo sido extraídos diversos editais de Embargo e notifica-ções por execução de obras sem licença, sendo que em 2012 foram lavrados os Editais de Demolição nºs 07/0055/2012 e 07/0004/2012 (fls. 454/458) afixados no local, sendo que os Editais não foram cumpridos e a demolição administrati-va não se mostrou possível diante da atuação de grupos de milícias na área em comento e as ameaças sistemáticas aos fiscais, conforme atestado pelo Inea no documento de fls. 446/447 (dos autos principais).

Afirma que não houve conduta ou omissão ilícita do ente municipal e que, por isso, inexiste também relação ensejadora de responsabilização civil, restando fulminada a pretensão do Ministério Público de condenar o Município a qualquer obrigação de fazer ou de pagar.

Ressalta o Embargante que a responsabilidade somente pode ser atribuída aos outros Réus e não ao Município e que este, por zelar pela ocupação orde-nada do solo, requer, inclusive, o seu ingresso no polo ativo de demanda, tendo em vista a convergência de interesses com o Ministério Público, mas que ainda que se entenda pela impossibilidade de mudança de polo, o pedido deve ser julgado improcedente em face do Município.

Aduz que a atribuição de responsabilidade ao Município só se justifica, em casos como este, se comprovado o descumprimento injustificável do dever de fiscalização, o que não é o caso, pois as medidas de fiscalização, notificação e autuação foram devidamente adotadas pelo Poder Público, pelo que os ocu-pantes tinham ciência de que as atividades que desenvolviam no local tinham implicações ambientais.

Torna a ressaltar que a atuação eficaz do Município foi impedida pela atuação dos grupos de milícias, sendo que a suposta omissão no dever de fis-

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calizar apresenta-se como causa mais do que remota do suposto dano alegado, que uma vez informado ao Poder Público foi objeto de ações de fiscalização.

Sustenta o Embargante que a interpretação que presume a responsabili-dade do Poder Público pelo dano, exclusivamente pelo seu dever de fiscalizar, levaria ao absurdo de se entender que o Poder Público, por seus entes federa-dos, será sempre o segurador universal no que toca o dano ambiental, o que é inaceitável, uma vez que nas hipóteses em que a atividade poluidora tem como causador direto um particular a responsabilidade da Administração Pública, ainda que solidária, é subsidiária.

Alega que, com relação à remoção e reassentamento, o Município tem inúmeras prioridades recentes, no que tange à sua política habitacional, existin-do ainda uma grande quantidade de pessoas a serem reassentadas em razão das chuvas torrenciais eu atingiram o Estado em 2010.

Salienta o Embargante que o Município conseguiu reduzir em 2% a área favelizada da cidade e que tal resultado só foi possível diante das políticas pú-blicas desenvolvidas e que inverter as prioridades administrativas tem efeito deletério, pois pessoas que realmente precisam ser reassentadas. Há também efeito deletério em transferir do particular para o Poder Público a reparação de danos por eles causados ao meio ambiente, pois com isso se sinaliza para a so-ciedade que ninguém precisa ter nenhum tipo de pudor em relação à destruição ambiental, pois se algum dano for causado, o Estado será chamado para efetuar a reparação.

Requer, assim, o provimento dos Embargos de Declaração para que se-jam supridas as omissões apontadas, com o intuito, ainda, de prequestionamen-to e interposição de recursos às Cortes Superiores.

É o Relatório.

Voto

Todas as questões relevantes trazidas pela Embargante foram devidamen-te enfrentadas, não ocorrendo no Acórdão Embargado quaisquer das hipóteses previstas no art. 1.022 do NCPC/2015, inexistindo omissões a serem sanadas.

Com efeito, o Colegiado ressaltou que o recurso foi interposto ainda sob a égide do antigo Código de Processo Civil, pelo que a tutela foi apreciada nos termos do art. 273 do CPC/1973 e que não é o momento de se avaliar o mérito da demanda e qual a responsabilidade do ente e/ou dos particulares envolvidos.

Por outro lado, as medidas autorizadas apenas servirão para um mapea-mento da área, das famílias residentes na localidade, e de qual será o custo com a restauração do meio ambiente (Projeto), o que deve ser efetuado pelo Municí-

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pio que, com sua omissão, permitiu que o loteamento irregular se desenvolves-se, com danos ao meio ambiente e com risco para as pessoas que ali residem.

Consigne-se que a alegação de que o Município não agiu por ser a área dominada por milícias é inaceitável, uma vez que poderia ter ajuizado medida judicial e requerido auxílio de forças policiais, sendo certo, ainda, que, quando se trata de proteção ao meio ambiente, quanto mais rápida a atuação e pre-venção, menor os danos, e que, com certeza, é muito mais fácil retirar poucas famílias de um local, do que dezenas, ainda mais depois de já estarem morando no local há anos.

Cumpre neste ponto destacar trechos do Acórdão Embargado, in verbis:

“[...] Inicialmente, ressalte-se que o presente recurso de Agravo foi interposto sob a égide do antigo Código de Processo Civil, pelo que a decisão agravada apre-ciou o requerimento da Tutela com base no art. 273 do CPC/1973.

O Enunciado Administrativo nº 02 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admis-sibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.’

Não cabe, neste momento processual, qualquer apreciação quanto ao mérito da demanda originária, mas tão somente perquirir a presença dos elementos auto-rizadores da tutela antecipada vindicada pelo Autor, ora Agravante, a qual foi indeferida pelo Juízo a quo.

Dispõe o art. 273 do CPC/1973 (em vigor à época em que prolatada a decisão) que o Juiz, a requerimento da parte, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação, bem como haja fundado receio de dano irrepa-rável ou de difícil reparação ou fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do Réu.

Como se pode extrair dos autos do presente recurso, se trata de loteamento ir-regular que, segundo informado, ocupou, em parte, área de preservação perma-nente, com risco ecológico.

A Antecipação de Tutela foi requerida, inaudita altera pars, nos seguintes termos: que fossem identificadas todas as construções irregulares existentes ao longo do loteamento situado à Estrada do Curumaú, nº 920, Jacarepaguá, através de apre-sentação de planta locando a posição exata das construções, dentro do prazo de 30 (trinta) dias; que fosse realizado o cadastramento das famílias a serem removi-das para outro local apropriado e próximo, desde que de acordo com as normas ambientais, urbanísticas e edilícias vigentes, dentro do prazo de 30 (trinta) dias; que fossem desfeitas as construções já concluídas, as em curso e as que surgi-rem ao longo do tempo até solução final da presente demanda, dentro do prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias, sendo certo que todas as famílias deverão ser previamente cadastradas e reassentadas, observando-se as normas

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legais pertinentes e, por fim, que fosse apresentado Projeto de Reflorestamento do topo do morro, em razão da vegetação retirada para dar lugar às construções irregulares, objeto de pedido de demolição, com respectivo cronograma de exe-cução, dentro de 30 (trinta) dias. Foi requerido, ainda, para garantir a eficácia da determinação judicial, a fixação de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por dia de descumprimento, nos termos do § 1º do art.14 do Código de Processo Civil.

No caso em tela, o Magistrado a quo negou a concessão da Antecipação dos Efei-tos da Tutela por entender que não há prova inequívoca da inércia do Município e por inexistir prova de dano irreparável ou de difícil reparação, uma vez que o inquérito civil levou seis anos para ser concluído.

Evidente a omissão não só do Município, mas do Estado, que deixaram de adotar medidas céleres para evitar a consolidação e a expansão do loteamento irregular.

É cediço que se admite a concessão de Antecipação de tutela em face da Fa-zenda, mormente quando se trata de salvaguardar direitos fundamentais, como a saúde, a vida, a moradia, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como princípios como o da dignidade da pessoa humana.

Os requisitos para a concessão da tutela se encontram presentes, estando o fumus boni iuris lastreado na documentação acostada que demonstra a lesão ao meio ambiente, à área de preservação permanente. Da mesma forma, presente o periculum in mora pela continuidade de agressão ao meio ambiente, com resul-tados funestos, por vezes irreversíveis, e risco para os moradores, bem como pela perpetuação do desrespeito a direitos protegidos pela Constituição, de forma que justificada a intervenção do Poder Judiciário nas políticas públicas para garantir a concretização das normas constitucionais, fazendo cessar a inércia do ente público.

[...]

Não se justifica, contudo, a concessão da Antecipação da Tutela no que tange ao item 3: ‘(3) o desfazimento das construções já concluídas, as em curso e as que surgirem ao longo do tempo até solução final da presente demanda, den-tro do prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias, sendo certo que toda as famílias deverão ser previamente cadastradas e reassentadas, observando-se as normas legais pertinentes’. De fato, se revela prematura a determinação de demolição das casas, sem uma maior dilação probatória, para se aquilatar se é esta a melhor medida a ser adotada, até porque não há um levantamento recente da área, com a discriminação de quais casas estão efetivamente em área sujeita a deslizamentos e as que estão simplesmente em situação irregular, pelo que descabida a determinação de imediata demolição, sem que se verifique quais as famílias que estão em risco iminente. Ressalte-se, ainda, que a medida implicaria em enorme impacto financeiro, em um estado notoriamente combalido nas suas finanças, onde devem ser priorizadas as necessidades mais emergenciais.

No que tange aos prazos fixados para o cumprimento dos itens 1,2 e 4, entende--se que o prazo postulado – 30 (trinta) dias – para a efetivação das medidas é por demais exíguo, pelo que deve ser dilatado para 180 (cento e oitenta) dias. Por fim, com relação ao valor da multa e sua forma de incidência, tem-se que deve

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a multa diária ser fixada no valor de R$ 1.000,00, devendo esta incidir sobre o descumprimento de cada um dos itens de forma isolada, limitada esta ao valor máximo de R$ 900.000,00 (novecentos mil reais), sendo certo que o Magistrado a quo poderá adotar outras medidas se a fixação das astreintes se revelar ineficaz.

Consigne-se, por fim, que o Projeto de reflorestamento deve ser idealizado, mes-mo com o deferimento parcial da Tutela, pois ele se direciona à área do topo do morro e já se terá uma ideia do custo e do tempo que se levará para a recompo-sição do meio ambiente. [...]”

Cumpre salientar que o Acórdão abordou todas as questões relevantes suscitadas pelas partes nas razões recursais e contrarrazões, não havendo, por essa razão, que falar em prequestionamento porque os Tribunais Superiores consideram-no presente quando enfrentada pelo julgador a questão jurídica suscitada, não exigindo menção expressa do dispositivo legal que o Recorrente reputa violado.

Nesse sentido os seguintes arestos do Colendo STJ:

“Não obsta o conhecimento do recurso a falta de menção, pelo acórdão, de de-terminado dispositivo legal, se a questão jurídica foi enfrentada” (STJ, 3ª T., REsp 106.671/SP, Rel. Min. Adhemar Maciel, J. 01.12.1997, não conheceram, v.u., DJU 02.02.1998, p. 96).

“Para que o requisito de admissibilidade do prequestionamento esteja satisfeito, é dispensável a menção expressa, por parte do tribunal a quo, do dispositivo legal tido como violado pelo recorrente especial.

Basta que a Corte de Apelação tenha apreciado e solucionado a questão federal agitada no recurso excepcional” (RSTJ 102/170).

(citados por Theotonio Negrão in Código de Processo Civil e Legislação Proces-sual em vigor, Editora Saraiva, 31. ed., p. 1733)

Do teor das razões expendidas verifica-se que o Embargante pretende dar a seu recurso efeitos nitidamente infringentes, eis que se limita a expressar seu inconformismo com o julgado, alinhando os motivos pelos quais entende que o Acórdão deva ser reformado, não sendo, entretanto, os Embargos de Declara-ção, sede adequada para tal providência.

Isto posto, voto no sentido da rejeição dos Embargos de Declaração.

Rio de Janeiro, 22 de novembro de 2016.

Lúcio Durante Desembargador Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2494

Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do SulAgravo de Instrumento nº 70071673578CNJ: 0377551‑17.2016.8.21.7000Décima Quinta Câmara CívelComarca de Capão da CanoaAgravante: Roselaine Faustino de SousaAgravado: Ulisses Antonio TeixeiraAgravado: Loreci BrennerAgravado: Fabiano Monteiro da RosaAgravado: Francisco Papa

AgrAVo de INStrumeNto – corretAgem – Ação de mANuteNção de coNtrAto de comprA e VeNdA – tuteLA ANtecIpAdA

A antecipação de tutela tem como requisito para a sua concessão a pre-sença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o pe-rigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Ausência, no caso dos autos, de tais elementos, razão pela qual é de ser mantida a decisão hostilizada.

Negado provimento ao agravo de instrumento.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Quinta Câmara Cí-vel do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao agravo de instrumento.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des. Vicente Barroco de Vasconcellos (Presidente) e Des. Otávio Augusto de Freitas Barcellos.

Porto Alegre, 23 de novembro de 2016.

Desª Ana Beatriz Iser, Relatora

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relatório

Desª Ana Beatriz Iser (Relatora):

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Roselaine Faustino de Sousa contra decisão que, nos autos da ação de manutenção de contrato de compra e venda manejada em face de Ulisses Antonio Teixeira e outros, indefe-riu o pedido de antecipação de tutela formulado pela parte autora.

Requer a reforma da decisão para que seja determinada a suspensão das cobranças mensais, bem como a proibição de protesto e cadastramento nega-tivo da requerente.

Ausente citação na origem.

É o relatório.

Votos

Desª Ana Beatriz Iser (Relatora):

Para a concessão da antecipação dos efeitos da tutela pretendida pela parte é necessária prova inequívoca capaz de convencer o julgador acerca da verossimilhança do direito invocado, sendo requisito para a sua concessão a presença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Sobre o tema, comentam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero1:

A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica – que é aquela que surge da confrontação das obrigações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo pro-vável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refu-tação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder tutela provisória.

No caso dos autos, não verifico a presença de tais requisitos.

Na lição de Teori Albino Zavascki2, “atento, certamente, à gravidade do ato que opera restrição a direitos fundamentais, estabeleceu o legislador, como pressupostos genéricos indispensáveis a qualquer das espécies de antecipação da tutela, que haja prova inequívoca e verossimilhança da alegação”.

Neste sentido:

1 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 312.

2 Antecipação da tutela, 5. ed., fl. 79

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ������������������������������������������������������������������������������������������������201

AGRAVO INTERNO – NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS – REVISIONAL DE CONTRATO – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – I – Conforme a jurisprudência do STJ, a abstenção de inscrição ou de manutenção em cadastros de inadimplentes depende do preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: 1) existência de ação do devedor contestando a existência integral ou parcial do débito; 2) de-monstração da existência de alegações fundadas na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; 3) depósito do valor incontroverso ou prestação de caução idônea. II – Na hipótese dos autos, os requisitos acima elencados não foram preenchidos, motivo pelo qual deve ser mantida a deci-são agravada. Negaram provimento ao agravo interno. Unânime. (TJRS, Agravo nº 70068556778, 16ª C.Cív., Rel. Ergio Roque Menine, Julgado em 09.06.2016)

Também sobre o tema, João Batista Lopes3 menciona que “o cotejo entre prova inequívoca e verossimilhança da alegação leva à conclusão de que, para obtenção da tutela antecipada, é suficiente a prova segura dos fatos, de que exsurja a probabilidade do direito pretendido”.

Forçoso reconhecer-se que as alegações trazidas pela parte autora de-mandam produção probatória, não havendo, neste incipiente momento proces-sual, elementos aptos a permitir a existência da verossimilhança de sua argu-mentação, nada impedindo que a parte autora, estando o juízo a quo cercado de mais subsídios, renove o pleito antecipatório de tutela.

Destarte, aguardar a instrução probatória é a medida mais prudente na situação em tela, a fim de que se perquira o direito postulado pela parte autora.

Por tais razões, voto pelo desprovimento do agravo de instrumento.

Des. Vicente Barroco de Vasconcellos (Presidente) – De acordo com o(a) relator(a).

Des. Otávio Augusto de Freitas Barcellos – De acordo com o(a) relator(a).

Des. Vicente Barroco de Vasconcellos – Presidente – Agravo de Instru-mento nº 70071673578, Comarca de Capão da Canoa: “Negaram provimento ao agravo de instrumento. Unânime.”

Julgador(a) de 1º Grau:

3 Tutela antecipada no processo civil brasileiro, 3. ed., Ed. RT, p. 70

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2495

Tribunal de Justiça do Estado de Santa CatarinaAgravo de Instrumento nº 0151132‑42.2015.8.24.0000 (2015.067386‑1)Relator: Desembargador Stanley Braga

AgrAVo de INStrumeNto – AçõeS de ImISSão de poSSe e ANuLAtÓrIA de LeILão eXtrAJudIcIAL – coNeXão recoNhecIdA NA orIgem, com A coNSeQueNte remeSSA doS proceSSoS À VArA de dIreIto bANcárIo, dA comArcA de ItAJAÍ – ImpoSSIbILIdAde – decISão Que, umA VeZ mANtIdA, ImpLIcArá em prorrogAção dA competÊNcIA – INcompetÊNcIA AbSoLutA dA VArA de dIreIto bANcárIo pArA coNhecer dA Ação de ImISSão de poSSe – precedeNteS – NeceSSIdAde, AdemAIS, de Se reuNIr oS FeItoS, dIScutÍVeL – hIpÓteSe em Que Se recomeNdA A SuSpeNSão dA ActIo por preJudIcIALIdAde eXterNA (Art. 265, INc. IV, A, do cpc/1973, com correSpoNdeNte No Art. 313, INc. V, do NoVeL cpc) – INVIAbILIdAde dA ANáLISe do pLeIto de ImISSão de poSSe em cAráter proVISÓrIo, À mÍNguA de proNuNcIAmeNto, por orA, do JuÍZo SINguLAr A reSpeIto – recLAmo preJudIcAdo, No poNto – AgrAVo, No mAIS, coNhecIdo e proVIdo.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 0151132-42.2015.8.24.0000, da comarca de Balneário Piçarras 1ª Vara em que são agravante Romualdo Rago Fonseca e outro e agravados Edson Liberato Nowicki e outro.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pela Exma. Sra. Desª Denise Volpato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Monteiro Rocha.

Florianópolis, 22 de novembro de 2016.

Desembargador Stanley Braga Relator

relatório

Cuida-se de Agravo de Instrumento interposto por Romualdo Rago Fonseca e Viviani Soares Fonseca contra a decisão do Juízo de Direito da 1ª Vara, da comarca de Balneário Piçarras, que, em autos de ação de imissão de posse aforada em desfavor de Edson Liberato Nowicki e Angela Aparecida

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ������������������������������������������������������������������������������������������������203

Grande Novicki, reconheceu a conexão da actio com ação anulatória de leilão extrajudicial ajuizada pelos ora agravados.

Esclareceram os recorrentes, de início, que adquiriram o imóvel objeto da demanda em leilão extrajudicial promovido pelo Banco Bradesco S.A.

Disseram que a hasta não padece de nenhum vício, mas que, não obstan-te isso, os agravados ajuizaram a citada anulatória, que acabou por ser reunida com a possessória, ao entendimento de que conexas.

Contrapuseram-se a tal conclusão, ao argumento de que não há, em absoluto, identidade entre as causas de pedir. Argumentaram que pretendem adentrar no imóvel que adquiriram licitamente, enquanto que os agravados bus-cam a revisão do contrato de financiamento celebrado com o Bradesco S.A.

Postularam, assim, a concessão da tutela antecipada recursal e, ao final, o provimento em definitivo do reclamo.

Mantidos os efeitos do decisum até o pronunciamento da Câmara, a parte adversa, intimada, deixou transcorrer in albis o prazo para o oferecimento da contraminuta, conforme certificado à fl. 68.

Este é o relatório.

Voto

dA AdmISSIbILIdAde

Presentes os pressupostos legais, o recurso é conhecido.

Destaca-se que a decisão hostilizada foi proferida na vigência do Código de Processo Civil de 1973, e, por conseguinte, será analisada à luz dos ditames do texto revogado.

do JuLgAmeNto

preliminares

Não foram suscitadas preliminares.

mérito

Ab initio, registre-se que o agravo contém pedido de imissão imediata dos recorrentes na posse do imóvel, matéria, contudo, não abordada na decisão combatida, e, que, nesse passo, é insuscetível de apreciação nesta instância, sob pena de supressão de um grau recursal.

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Dito isso, há dizer que a aquisição do imóvel sub judice pelos agravantes em leilão extrajudicial promovido pelo Banco Bradesco S.A. é fato incontrover-so (fl. 36), como também o é a propositura de ação anulatória pelos ora recorri-dos, como consta da decisão de fl. 48.

O Julgador a quo, no intuito de evitar decisões conflitantes, reconheceu a conexão entre as ações e determinou a sua reunião para julgamento conjunto.

Mais à frente, como corolário lógico da reunião dos processos, deter-minou a remessa da ação de imissão de posse à Vara de Direito Bancário da comarca de Itajaí

Os irresignados, como relatado, batem-se pela reforma do primeiro decisum, e, com a devida vênia do entendimento esposado pelo Magistrado, logram êxito, como se passa a demonstrar.

E, para tanto, convém primeiramente trazer a lume elucidativo excerto de julgado da relatoria da Desembargadora Denise Volpato, in verbis:

[...] impende ressaltar que a conexão, nos termos dos arts. 103, 104 e 105, do Código de Processo Civil, consiste em hipótese legal de modificação competên-cia consubstanciada na reunião dos processos em decorrência de similitude entre uma demanda e outra anteriormente ajuizada, bastando para tanto coincidir um ou mais elementos da ação, quais sejam: i) partes; ii) causa de pedir; e iii) pedido.

A reunião dos feitos conexos é faculdade do Juiz, sempre que se mostrar con-veniente para manutenção da integridade da ordem jurídica, ao evitar decisões conflitantes, ou ainda, preservar a garantia fundamental de razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), por configurar, muitas vezes, a reunião das causas conexas em prestação jurisdicional mais célere e eficiente.

Assim, não sendo imperativo legal, mas mera faculdade do julgador, a conexão não se afigura causa de fixação de competência por prevenção, mas tão somente de modificação de competência. Tem-se como pressuposto, pois, a distribuição dos feitos conexos a juízos diferentes, mas ambos com competência.

[...]

Comentando o tema, lecionam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:

“Forma de alegação da conexão. Deve ser alegada em preliminar de contes-tação (CPC, art. 301, VII). Caso o réu não a alegue na contestação, poderá qualquer da partes fazê-lo posteriormente, podendo o MP arguir a conexão, bem como deve o juiz conhecer dessa matéria de ofício (CPC, art. 301, § 4º). A exceção de incompetência é meio inidôneo para arguir-se a conexão de causas e requerer-se a reunião de processos. Como a conexão é causa de mo-dificação da competência, a competência de ambos os juízos é pressuposto para que se caracterize” (in Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 436) (Agravo de Instrumento nº 2015.005401-6, de Joinville, J. 16.02.2016, grifo nosso).

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ������������������������������������������������������������������������������������������������205

No caso vertente, a competência para julgar a ação anulatória é, indiscu-tivelmente, da Vara de Direito Bancário, da comarca de Itajaí.

É que, por força da Resolução nº 21/2013, delegou-se à Vara Regional de Direito Bancário, instalada naquela comarca, a competência para processar e julgar causas que envolvam instituições financeiras subordinadas à fiscalização do Banco Central do Brasil.

Ocorre que não há dizer o mesmo da ação de reintegração de posse, me-lhor dizendo, imissão de posse, e, conforme emerge do precedente retro, bem como de reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “a eventual existência de conexão entre demandas não é causa de modificação absolu-ta, impossibilitando, a reunião dos processos” (ARg-CC 131.832/SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, J. 08.06.2016).

Ou, mutatis mutandis:

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL E AÇÃO ANULATÓRIA – CONEXÃO – NÃO APLICAÇÃO – EXISTÊNCIA DE VARA ESPECIALIZADA EM RAZÃO DA MATÉRIA – COMPETÊNCIA ABSO-LUTA

“A reunião de ações, por conexão, não é possível quando implicar em alte-ração de competência absoluta” (AgRg-Ag 1385227/MS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 26.10.2012).

Agravo regimental não provido (ARg-REsp 1463148/SE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 08.09.2014).

Ainda a respeito, igualmente mudando o que deve ser mudado:

A competência da Unidade de Direito Bancário da comarca da Capital, por ter natureza funcional, é absoluta, pelo que não se admite a sua prorrogação para, por força de conexão, abranger causas estranhas ao seu âmbito competencial (Conflito de Competência nº 2007.012537-2, da Capital, Rel. Des. Trindade dos Santos, J. 29.05.2008).

Fosse possível afastar o óbice sob enfoque, sublinhe-se que, ainda assim, não seria caso, a rigor, de se confirmar a conexão, pois, como já consignado em hipótese similar, ou seja, em que se discutia, dentre outras matérias, a ne-cessidade de se reunir ação anulatória e ação de reintegração de posse, embora forçoso reconhecer a existência de interesses comuns entre ambos, são “ab-solutamente diversos seus objetos e causas de pedir” (Agravo de Instrumento nº 2013.020026-0, de Joinville, Rel. Des. Jorge Luis Costa Beber, J. 18.06.2015).

Nesse mesmo norte: “não há que se falar de conexão dos processos. Isso porque eventual ação que tenha por objeto discussão sobre o contrato de finan-ciamento imobiliário, incluindo vícios e nulidades, deve ser tratada naqueles autos [anulatória], não tendo o condão de afastar a imissão na posse por seu

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regular proprietário na forma determinada, por meio de arrematação” (TJSP, Agravo de Instrumento nº 2151690-86.2016.8.26.0000, de Praia Grande, Rel. Des. José Joaquim dos Santos, J. 27.09.2016).

O que se tem admitido, em tais hipóteses, é a suspensão da ação de imissão de posse por conta do aforamento de ação com o propósito de anu-lar a alienação do imóvel, por consubstanciar prejudicialidade externa (Agra-vo de Instrumento nº 0127271-27.201.8.24.0000, de Itajaí, Rel. o Signatário, J. 20.09.2016), mormente se o adquirente figura, por igual, na ação anulatória, como se dá na espécie.

Atente-se para o fundamento legal: art. 265, inc. IV, a, do CPC/1973, com correspondente no art. 313, in. V, a, do novel CPC.

À conclusão, tem-se por imperativa a reforma do interlocutório, ressalva-da a advertência supra.

Nesses termos, dá-se provimento ao recurso.

Este é o voto.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2496

Tribunal de Justiça do Estado de São PauloRegistro: 2016.0000838125Apelante: Dilmar Henrique SantosApelada: Congregação Cristã do BrasilComarca: Caieiras – 2ª VaraRelator Ruy CoppolaVoto nº 35.342

ementa

Direito de vizinhança. Obrigação de fazer cumulada com reparação de danos. Infiltrações no imóvel da autora causadas pela própria geografia de seu terreno, mais baixo que o do imóvel vizinho, que não contém construção, e tampouco sofreu qualquer alteração que pudesse piorar o escoamento natural das águas pluviais. Proprietário do imóvel superior que não tem a obrigação legal de fazer obras de escoamento ou canali-zação de águas. Ação julgada improcedente. Sentença mantida. Recurso improvido.

acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0000378-46.2011.8.26.0106, da Comarca de Caieiras, em que é apelante Dilmar Henrique Santos (Assistência Judiciária), é apelado Congregação Cristã no Brasil.

Acordam, em 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Caio Marcelo Mendes de Oliveira (Presidente sem voto), Kioitsi Chicuta e Francisco Occhiuto Júnior.

São Paulo, 17 de novembro de 2016.

Ruy Coppola Relator Assinatura Eletrônica

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Vistos.

Trata-se de ação de obrigação de fazer, cumulada com reparação de da-nos, ajuizada por Dilmar Henrique Santos contra Congregação Cristã do Brasil, que a respeitável sentença de fls. 188/188v, cujo relatório fica fazendo parte integrante do presente, julgou improcedente.

Recurso tempestivo e isento de preparo, diante da gratuidade deferida à fl. 26.

Contrarrazões às fls. 203/208.

É o Relatório.

A irresignação não procede.

Isso porque, não obstante a constatação de que as águas pluviais prove-nientes do imóvel da ré, ora apelada, venham causando infiltrações no imóvel do autor-apelante, é certo que tal fato decorre da própria topografia de seu terreno, e não de qualquer construção ou alteração perpetrados pela recorrida no seu imóvel.

Vistoriando os imóveis em questão, a perita nomeada pelo juízo consta-tou que o terreno da ré não possui qualquer edificação, estando em seu estado original, sem qualquer movimentação de terra, sendo certo que o escoamento das águas para o imóvel do autor decorre do perfil natural do terreno, localiza-do em declive acentuado.

Por essa razão, a análise técnica concluiu que “não há prejuízo causado pelo Requerido ao imóvel do autor. O Autor, quando edificou sua propriedade deveria ter se utilizado das soluções de Engenharia para que tal situação [infil-trações] fosse evitada” (cf. fl. 161).

Verifica-se que, para a procedência dos pedidos formulados na exordial, caberia ao autor demonstrar que a ré promoveu obras que implicassem em alte-ração no escoamento natural das águas pluviais, com dano ao seu prédio, que está localizado em área inferior.

Isso porque, nos termos do art. 1.288 do Código Civil, “o dono ou o pos-suidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que correm naturalmen-te do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu fluxo; porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo dono ou possuidor do prédio superior”.

Discutindo a questão, Hely Lopes Meirelles nos ensina que:

“O proprietário do terreno inferior não pode se escusar de receber as águas plu-viais ou correntes que desçam naturalmente do terreno superior. Mas há de rece-bê-las em seu estado natural. Não pode o vizinho superior piorar a condição do escoamento, alterando o desaguadouro, confinando as águas, ou nelas adicio-

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nando outras que não as compunham anteriormente. Qualquer modificação feita pelo proprietário superior que agrave a situação do prédio inferior, relativamente ao escoamento, quantidade ou qualidade das águas, pode ser impedida pelo pre-judicado, que tem direito a exigir, por via cominatória, que se desfaçam as obras prejudiciais, se restabeleça a situação anterior de escoamento e se lhe indenizem os danos consumados” (in Direito de construir. 9. ed. Malheiros Editores, 2005, p. 72).

Na espécie dos autos, como já foi dito, a ré-apelada não realizou qual-quer modificação no seu terreno, de modo que incumbe ao autor-apelante, e não a ela, promover as obras necessárias para evitar que o escoamento natural das águas pudesse ocasionar danos ao seu imóvel.

O proprietário do imóvel superior não tem a obrigação legal de fazer obras de escoamento ou canalização de águas pluviais, como pretende o ape-lante.

Nesse sentido:

“DIREITO DE VIZINHANÇA – OBRIGAÇÃO DE FAZER – DANOS MATERIAIS – Fundamento no art. 1288 do Código Civil. Imóvel do autor que está situado em nível inferior aos imóveis de propriedade de ambos os corréus. Pedido inicial formulado no sentido de que os corréus realizem obras de escoamento das águas pluviais para a frente de seus terrenos. Obrigação de recebimento das águas que correm naturalmente do prédio superior, que impede a pretensão do autor. Pedido subsidiário de rateamento das despesas que deve ser indeferido. Impro-cedência da ação. Recurso do autor desprovido” (TJSP, Apelação nº 3001147-04.2013.8.26.0471, Rel. Des. Claudio Hamilton, 25ª CDPriv. – J. 19.05.2016).

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

Ruy Coppola Relator

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Parte Geral – Ementário2497 – Ação anulatória de adjudicação – pauliana e revocatória

“Processo civil. Apelação cível. Ação anulatória de adjudicação c/c pauliana/revocatória. Alegação de nulidade da sentença proferida em comarca diversa em razão de suposta fraude no trâmite. Via eleita inadequada. Querela nullitatis. Incompetência deste juízo sentenciante. Fraude contra cre-dores. Ação pauliana. Requisitos não comprovados. Fraude à execução. Não configurada. Recurso conhecido e não provido. 1. Cuida-se de apelação cível, cujo objetivo é de modificar os termos de sentença proferida nos autos da ação anulatória de adjudicação c/c pauliana/revocatória, pela qual o juízo da 24ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE, julgou improcedente o pedido for-mulado na proemial, o que fez com respaldo no art. 269, IV, do Código de Processo Civil/1973. 2. Cumpre salientar que é incabível o ajuizamento de ação anulatória c/c pauliana/revocatória para o reconhecimento de nulidade de adjudicação por suposta fraude no trâmite do processo anterior, que tramitou perante o juízo da comarca de Elizeu Martins/PI, vez que este é o juízo revestido de competência para conhecer questão de anulabilididade dos efeitos de sua sentença. 3. No vertente caso, considerando-se que a matéria de fundo trazida à baila é a suposta fraude ocorrida no trâmite do processo perante a comarca de Elizeu Martins/PI e, por consequência, a anulação de adjudica-ção decorrente deste, tenho por inadequada a via eleita, visto ser aquele o juízo competente para conhecer da ação. A competência para processar e julgar a querela nullitatis insanabilis, portanto, é o juízo a quo que proferiu a sentença em processo supostamente fraudulento, em virtude de que, quando cabível, está no plano da existência e não se confunde com as questões atinentes ao plano da validade, sanáveis por meio de ação rescisória por expressa disposição legal. Precedentes do STJ e TJCE. 4. Quanto à ação pauliana, menciona-se a necessidade de preenchimento dos requisitos para a proposição: a) o scienta fraudis, que pode ser entendido como o dever de ciência do credor quanto à insolvência do devedor fraudulento, ou seja, ter conhecimento de que a alienação ou transferência tenha levado o devedor à insolvência; b) o crédito deve ser anterior ao ato fraudulen-to; c) o eventus damni, que pode ser pode ser entendido como todo ato prejudicial ao credor, por tornar o devedor insolvente, ou por ter sido praticado em estado de insolvência, sendo uma conduta concreta; e, d) o consilium fraudis, que é o comprovado intuito malicioso de prejudicar, a má-fé do agente, sendo uma conduta abstrata. No entanto, os referidos requisitos não foram comprovados. 5. Outrossim, nos autos do processo, menciona-se de fraude a credores, na modalidade ação pau-liana; contudo, os recorrentes trazem à baila fundamentos de fraude à execução. Na fraude à exe-cução já existe ação intentada contra este capaz de reduzi-lo a insolvência e este atua ilicitamente ao alienar ou onerar o bem, causando prejuízo a seus credores, bem como ao devido processo legal. Já na fraude contra credores, o devedor insolvente aliena ou onera bens em detrimento de seus credores, antes que estes intentem qualquer espécie de ação. Assim, este juízo ad quem está impossibilitado de apreciar a fraude à execução mencionada pela parte recorrente pelos funda-mentos acima expostos, vez que se configuraria caso de apreciação e julgamento extra petita. 7. Recurso conhecido e não provido.” (TJCE – Ap 0165247-71.2012.8.06.0001 – Rel. Teodoro Silva Santos – DJe 23.11.2016 – p. 51)

2498 – Ação de adjudicação compulsória – contrato de promessa de compra e venda de imóvel – princípio da dialeticidade

“Processual civil. Ação de adjudicação compulsória. Contrato de promessa de compra e venda de imóvel. Preliminar de não conhecimento do recurso. Princípio da dialeticidade. Rejeição. Bem dado em garantia hipotecária pela construtora. Ineficácia da hipoteca em relação ao terceiro/adqui-rente. Súmula nº 308 do STJ. Liberação do gravame. 1. O recurso de apelação deve guardar relação de pertinência ou de especificidade com as razões da decisão impugnada, em homenagem ao princípio da dialeticidade. 2. Conforme os ditames da Súmula nº 308 do Superior Tribunal de Jus-tiça, editada com a finalidade de evitar-se que as construtoras, que se capitalizam com recursos de

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instituições financeiras, prejudiquem os compromissários compradores das unidades imobiliárias, com a hipoteca sobre o bem adquirido, decidiu o STJ que o mencionado gravame garante a divida da construtora enquanto o bem permanecer na sua propriedade; depois de transferido por compro-misso de compra e venda, a hipoteca perde a eficácia em relação ao adquirente do imóvel. 3. Cele-brado o compromisso de compra e venda entre a construtora e o adquirente, não mais possui aquela o poder de dispor do imóvel e, em consequência, não mais poderá gravá-lo com hipoteca, devendo ser declarada nula, por abusiva (CDC, art. 51, inc. IV), a cláusula-mandato inserida no instrumento de promessa de compra e venda, que prevê a possibilidade de o promissário-comprador autorizar a construtora (promissário-vendedor) a instituir, em favor de terceiro (agente financeiro), hipoteca sobre o imóvel. 4. Apelação não provida.” (TJDFT – Proc. 20130110605127APC – (971927) – 4ª T.Cív. – Rel. Cruz Macedo – J. 18.10.2016)

2499 – Ação de adjudicação compulsória de imóvel – decisão monocrática negando provimento – insurgência dos autores

“Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação de adjudicação compulsória de imóvel. Decisão monocrática negando provimento ao reclamo, mantendo hígida a inadmissão do recurso especial. Insurgência dos autores. 1. Nos termos da jurisprudência consolidada desta Corte, a revi-são do valor arbitrado a título de honorários advocatícios só é possível em recurso especial quando o valor fixado nas instâncias locais for exorbitante ou ínfimo, de modo a afrontar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Ausentes tais hipóteses, incide a Súmula nº 7/STJ, a impedir o conhecimento do recurso. 2. No caso, diante das premissas estabelecidas pelo Tribunal local, a majoração dos honorários advocatícios arbitrados exigiria, necessariamente, novo exame do acer-vo fático-probatório constante dos autos, providência vedada no âmbito do recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 782.096 – (2015/0235648-7) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 07.11.2016 – p. 1420)

2500 – Ação de anulação de escritura pública c/c partilha de bem imóvel – imóvel registrado em nome da avó – transferência a um terceiro – divisão posterior às três netas – dispensa de futuro inventário

“Apelação cível. Ação de anulação de escritura pública c/c partilha de bem imóvel. Negócio cele-brado sob a égide do Código Civil de 1916. Imóvel que estava registrado em nome da avó das liti-gantes, que o transferiu a um terceiro, para que posteriormente fosse dividido entre suas três netas, com intuito de dispensar futuro inventário. Posse que era exercida pela genitora da autora e da ré, a qual permitiu que o bem fosse transferido diretamente a uma das filhas, para que esta realizasse a respectiva venda, promovendo a divisão dos valores com as irmãs. Encargo que teria sido descum-prido pela ré. Édito de improcedência. Insurgência da demandante. Desconstituição da sentença que se impõe. Litisconsórcio passivo necessário. Proprietários anteriores (avó paterna e terceiro) e atuais adquirentes que deverão responder à pretensão, justo que o eventual acolhimento implicará no retorno do imóvel ao espólio da avó paterna. Exegese dos arts. 114 e 115, do atual CPC. Decisão cassada. Retorno dos autos à origem. Apelo prejudicado. 1. ‘[...] É obrigatória a citação dos terceiros adquirentes, na qualidade de litisconsortes necessários, na ação pauliana que visa a desconstituir a doação de imóvel realizada entre pais e filhos com fraude a credores, cuja sentença poderá afetar diretamente o negócio de compra e venda anteriormente celebrado. 5. Agravo Regimental impro-vido’ (STJ, AgRg-EDcl-REsp 1.113.776/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., J. em 15.09.2011). 2. ‘[..] Imóvel objeto do contrato vendido a terceiro. Litisconsórcio necessário. Cancelamento do negócio jurídico e do registro. Interesse do novo adquirente caracterizado. Citação necessária. Conquanto o pedido de anulação seja referente ao contrato antecedente, o cancelamento da escritura e regis-tro desta venda afeta, ainda que reflexamente, o direito dos terceiros adquirentes, uma vez que a

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compra e venda posterior ficará sem base de sustentação no registro imobiliário, regido que é pelo princípio da sequencialidade ou continuidade, no que se faz necessária sua citação para, querendo, defender a validade do negócio em tela. Sentença desconstituída. Recurso prejudicado’ (TJSC, Ape-lação Cível nº 2009.067023-7, de Armazém, Rel. Des. Henry Petry Junior, J. 08.11.2012).” (TJSC – Ap 0004905-19.2008.8.24.0036 – Rel. Des. Jorge Luis Costa Beber – J. 13.10.2016)

2501 – Ação de cobrança de taxas condominiais – legitimidade passiva – obrigação propter rem – responsabilidade do proprietário até o registro da compra e venda

“Apelação cível. Direito civil e processo civil. Ação de cobrança de taxas condominiais. Legitimi-dade passiva. Obrigação propter rem. Responsabilidade do proprietário até o registro da compra e venda. 1. A obrigação de pagar taxas condominiais relativas à unidade imobiliária de condomínio possui natureza propter rem, podendo recair a responsabilidade pelas suas despesas tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias do caso concreto. 2. Não realizado o registro da compra e venda do imóvel no Cartório de Imó-veis nem havendo prova da ciência inequívoca da alienação ao Condomínio, aquele que cons-ta como proprietário do bem, na matrícula do imóvel, é responsável pelo pagamento das taxas condominiais. Precedente. 3. Apelação conhecida e provida. Sentença cassada.” (TJDFT – Proc. 20150710157454APC – (962642) – 1ª T.Cív. – Relª Simone Lucindo – J. 02.09.2016)

Comentário Editorial SínTESECuida-se de apelação cível interposta contra a r. sentença proferida no bojo desta ação de cobrança de débitos condominiais na qual a d. sentenciante acolheu a tese de ilegitimidade passiva da ré, ao argumento de que o imóvel fora alienado a terceira pessoa, e extinguiu o feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC/1973, vigente à época da prolação da sentença (atual art. 485, IV, do CPC/2015).

Em suas razões recursais o autor/apelante defendeu a legitimidade passiva da construtora/incorporadora ré para arcar com os débitos condominiais cobrados. Nesse sentido, sustenta, inicialmente, que é a requerida que figura como proprietária do imóvel junto ao registro de imó-veis, conforme certidão de ônus juntada aos autos. Acrescenta que não possuía conhecimento da compra e venda celebrada entre a construtora e terceira pessoa estranha ao presente feito. Concluiu, por fim, que não havendo registro da compra e venda do imóvel junto ao Registro de Imóveis, e não havendo prova inequívoca de que o condomínio tinha ciência da venda do bem, aquele que consta na matrícula do imóvel como proprietário (no caso dos autos a requerida) é responsável pelo adimplemento das despesas de condomínio. Requereu, assim, o provimento do apelo e a reforma da r. sentença proferida.

O TJDFT conheceu da apelação e deu-lhe provimento.

O Relator assim afirmou:

“Dessa forma, não demonstrada a ciência inequívoca do condomínio quanto à transferência do imóvel, é cabível que a cobrança seja dirigida à apelada, porque é ela que figura como proprietária do imóvel, de acordo com o registro imobiliário juntado aos autos quando da interposição da ação.

Nesse contexto, reconhecida legitimidade passiva da parte apelada para figurar no polo pas-sivo da ação de cobrança de débitos condominiais, já que o imóvel continuava registrado em seu nome, deve a r. sentença que extinguiu o feito ser cassada.”

O Jurista Fernando Henrique Guedes Zimmermann assim disciplina sobre as despesas de condomínio:

“O Código Civil de 2003 inovou ao dispor no § 1º do art. 1.336 que a multa em caso de atraso no pagamento das despesas condominiais será de até dois por cento sobre o valor do débito. Antes da vigência do atual Código, referida multa tinha por limite máximo a cota de vinte por cento sobre o valor devido pelo condômino inadimplente. Diante da inovação legal, ampla

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������213

batalha jurídica tem sido travada nos tribunais, sem, no entanto, haver uma posição definida quanto a qual deverá ser o valor aplicado na prática. O problema reside no fato de o atual código não ter revogado, de forma expressa, a Lei nº 4.591/1964, que era a que dispunha, de forma exclusiva, sobre os condomínios em edificações e incorporações imobiliárias. Com efeito, até a edição do Novo Código Civil, era patente a aplicação do § 3º do art. 12 da supra-citada lei, o qual estipulava a multa de até 20% sobre o débito. Com a nova disposição legal, limitando a multa em 2%, restou uma lacuna quanto às situações em que deve ser a nova lei aplicada. O novo patamar está no bojo do código, no entanto, tem-se que a lei anterior não foi revogada. É sabido que lex posterior derogat priori, razão pela qual devem ser aplicados os critérios da lei mais recente às convenções condominiais entabuladas a partir da data em que entrou em vigência o Novo Código Civil. No entanto, nas convenções já existentes, a matéria é nebulosa. A convenção já existente é ato jurídico perfeito, protegida nos termos do inciso XXXVI do art. 5º da Constituição Federal. Além disso, tem-se que a Lei nº 4.591/1964 não foi expressamente revogada, tal como se observa do art. 2.045 do Novo Código. Analisando--se somente sob esse ponto de vista, é de concluir-se que, nestes casos, pode ser aplicada a multa de 20%, se a convenção assim o permitir. No entanto, quer nos parecer que não é este o caso. Mesmo não tendo sido revogada expressamente, não deve ser utilizado disposto na Lei nº 4.591/1964. Quando o Código foi publicado, o legislador não fez qualquer ressalva quanto à aplicabilidade do art. 1.336, razão pela qual deve-se entender ter aplicação imediata, in-clusive nas convenções já firmadas. Além disso, certo é que, mesmo não tendo sido revogado expressamente, o disposto no § 3º do art. 12 da Lei nº 4.591/1964 é diametralmente oposto ao conteúdo do § 1º do art. 1.336. A integralidade de uma lei não ter sido revogada é uma coisa, mas manter os efeitos de dispositivo contido em lei antiga, desconsiderando a lei nova é inadmissível. O que não foi regulado pelo atual Código pode e deve manter vigência, mas as partes expressamente disciplinadas pela lei nova revogam as disposições anteriores. Vale dizer ainda que ato jurídico perfeito é aquele que já se consolidou no espaço e no tempo. A parte da convenção que dispõe sobre a aplicação da multa somente será aplicada em caso de inadimplemento do condômino, razão pela qual depende ainda de evento futuro e incerto. Pode-se dizer, portanto, que esta parte da convenção não está consolidada no tempo, depende da ocorrência do inadimplemento. Resta concluir que a convenção é um ato jurídico perfeito, mas não em cláusulas que dispõem sobre eventos futuros, como é o caso da multa. Logo, ocorrendo o inadimplemento após a entrada em vigor do Novo Código, deve-se aplicar a multa de 2% tão somente. E isto se dá em razão de não poder existir dois dispositivos disciplinando a mesma matéria, especialmente se ambos somente diferem nos parâmetros utilizados para a aplicação de multa. É certo que a lei não foi revogada expressamente, mas também é certo que a lei mais nova revoga a anterior, e em especial, existindo dois artigos com os mesmos dizeres, diferindo somente em sua explanação quantitativa (quantum devido), deve o mais novo prevalecer. Frise-se também que a convenção é um ato jurídico perfeito, desde que não contenha cláusulas que extrapolem a data de sua celebração, como é o caso da multa, que somente será devida quando o inadimplemento ocorrer, isto é, a qualquer tempo. Como bem se observa, a qualquer tempo é diferente de agora. Logo, a convenção que prevê a multa de 20% por inadimplemento continha cláusula voltada para o futuro. Não se pode afirmar se tratar tal cláusula de ato jurídico perfeito, eis que seus efeitos se projetam para frente, não sendo perfeito o que ainda não ocorreu. Dispõe a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu art. 6º, § 1º, que ‘reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou’. A imposição de multa não se consuma até que o condômino torna--se inadimplente, o que pode ocorrer a qualquer momento. Como se vê, se o inadimplemento ocorrer após a entrada em vigor do Novo Código, tem-se que o ato somente se consumará nesta data, portanto, não é ato jurídico perfeito já consumado sob a égide da lei anterior. Desta forma, qualquer inadimplemento condominial ocorrido após a entrada em vigor do Novo Códi-go deve ser pautado pelas novas disposições legais, devendo ser aplicada a multa no patamar de 2%.” (Condomínio edilício – Redução da multa de 20% para 2%. Disponível em: http://online.sintese.com)

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João Batista Lopes, em seu livro Condomínio, nos ensina que:

“A pontualidade no pagamento das despesas de condomínio constitui dever dos condôminos e fator importante para a boa administração do edifício.

Em razão disto, o condômino impontual fica sujeito a sanções estabelecidas na convenção de condomínio, entre elas multa de até 20% sobre o débito, juros de 1% ao mês e atualização monetária.

[...]

A ação de cobrança deve ser intentada pelo condomínio e não pelo síndico, que é órgão exe-cutivo daquele.

Ainda que desprovido de personalidade jurídica, o condomínio possui capacidade judiciária a teor do nº IX do art. 12 do CPC e quem o representa é o síndico como estabelece o mesmo arti-go.” (LOPES, João Batista. Condomínio. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 113-114)

2502 – Ação de dano infecto – paralisação da obra

“Agravo de instrumento. Ação de dano infecto. Paralisação da obra que se mantém, diante da pro-babilidade do direito de que sua continuidade possa agravar os danos na residência dos agravados. Contudo, dispensada a prestação de caução, pois não há comprovação de que ela se faça neces-sária. Recurso parcialmente provido.” (TJSP – AI 2197654-05.2016.8.26.0000 – Guaratinguetá – 25ª CDPriv. – Rel. Hugo Crepaldi – DJe 23.11.2016)

2503 – Ação de imissão na posse – natureza petitória – bem imóvel – cessão de direitos

“Apelação cível. Ação de imissão na posse. Natureza petitória. Bem imóvel. Cessão de direitos. Di-reito de possuir não demonstrado. Forma originária de aquisição possessória ausência. 1. A ação de imissão de posse não se confunde com as ações possessórias, eis que tem caráter petitório. 2. A ação de imissão na posse é instrumento processual colocado à disposição daquele que, fundamentado no direito de propriedade, busca exercer a posse da qual nunca foi titular. 3. Demonstrado nos autos que o autor já teve a posse do imóvel, há de se reconhecer que a ação de imissão de posse não é a via adequada para a pretensão. 4. Havendo sucumbência recursal, cabível a majoração da verba honorária. 5. Recurso conhecido e desprovido.” (TJDFT – Proc. 20150110883228APC – (979552) – 6ª T.Cív. – Rel. Carlos Rodrigues – J. 17.11.2016)

2504 – Ação de nunciação de obra nova ajuizada sob a égide do CPC/1973 – obra concluída no curso do processo – conversão em demolitória – aumento de muro – direito de vizinhan­ça e de construir

“Civil e processual civil. Ação de nunciação de obra nova ajuizada sob a égide do CPC/1973. Obra concluída no curso do processo. Conversão em demolitória. Aumento de muro. Direito de vizinhança e de construir. Inexistência de dano ou prejuízo ao imóvel confinante. Inteligência dos arts. 1.297, 1.306 e 1.307 do CC. Recurso conhecido e provido. 1. A ação de nunciação de obra nova estava regulada no CPC/1973, especificamente nos arts. 934 a 940, e podia ser ajuizada pelo proprietário ou possuidor, a fim de impedir que a edificação de obra nova em imóvel vizinho lhe prejudicasse o prédio, suas servidões ou fins a que é destinado. 2. Convertida a nunciação em de-molitória, em razão da conclusão da obra no curso do processo, fato é que as questões indicadas pelo perito acerca da irregularidade das edificações realizadas pelas partes em seus próprios lotes e do próprio loteamento em si, não são objeto da controvérsia e nem podem servir de amparo à demolição da fileira de tijolos que aumentou o muro divisório, com o objetivo legítimo de viabi-lizar mais segurança aos confinantes. 3. A lei civil autoriza os confinantes aumentar a altura do muro divisório, desde que às expensas do construtor, que arca com os riscos inerentes à obra. Se inexiste prejuízo ao imóvel confinante, a demolição não possui amparo na lei. Inteligência dos

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arts. 1.297, 1.306 e 1.307 do CC. 4. Recurso de apelação conhecido e provido.” (TJDFT – Proc. 20150310174070APC – (970806) – 2ª T.Cív. – Relª Desª Sandra Tonussi – J. 13.10.2016)

2505 – Ação pauliana – fraude contra credores – doação do único imóvel – devedora insolvente

“Apelação cível. Ação pauliana. Fraude contra credores. Doação do único imóvel. Devedora in-solvente. Anterioridade do crédito. Requisitos preenchidos. Recurso conhecido e não provido. Para a configuração de fraude contra credores é necessário que o exequente comprove a existência do eventus damni, consubstanciado na comprovação de que a alienação do bem diminuiu o patri-mônio do devedor e do consilium fraudis, a intenção de reduzir o patrimônio do devedor até a sua insolvência. Recurso conhecido e não provido.” (TJMS – Ap 0801737-29.2013.8.12.0005 – 2ª C.Cív. – Rel. Juiz Jairo Roberto de Quadros – DJe 21.11.2016)

2506 – Ação pauliana (ou revocatória, do jurisconsulto paulus) – locação imobiliária comercial escrita – anulação de negócio jurídico

“Ação pauliana (ou revocatória, do jurisconsulto paulus). Locação imobiliária comercial escrita. Anulação de negócio jurídico (contrato de compra e venda de dois imóveis dados em garantia locatícia). Alegada fraude. Homologação judicial de acordo, na 2ª Vara Cível de Praia Grande. R. sentença que extinguiu a ação, com resolução de mérito, apenas com relação aos acordantes, no que não se inclui o recorrente. Não vislumbrados os prejuízos aventados. Intelecção do art. 252 do Regimento Interno deste Tribunal. Nega-se provimento ao apelo do corréu.” (TJSP – Ap 0011706-53.2013.8.26.0477 – Praia Grande – 27ª CDPriv. – Rel. Campos Petroni – DJe 07.11.2016)

2507 – Adjudicação compulsória de imóvel – audiência de conciliação – exclusão de litiscon­sorte

“Agravo de instrumento. Adjudicação compulsória de imóvel. Audiência de conciliação. Exclu-são de litisconsorte. Como a decisão que designou audiência de conciliação não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 1.015 do NCPC, é inadmissível o recurso de agravo de instrumento. No que tange à exclusão do litisconsorte (Banco Santander) do polo passivo, viável o recurso nessa parte, contudo, a parte agravante não logrou comprovar dano concreto grave que adviria da exclusão do Banco Santander neste momento processual.” (TRF 4ª R. – AI 5022328-25.2016.4.04.0000 – 4ª T. – Rel. Cândido Alfredo Silva Leal Junior – J. 26.10.2016)

2508 – Arras – compra e venda – imóvel – rescisão c/c restituição de quantia paga – retenção

“Processo civil. Civil. Consumidor. Contrato de compra e venda. Imóvel. Rescisão c/c restituição de quantia paga. Arras. Retenção. Inviável. Art. 417. CC. I – O entendimento desta Corte é uníssono quanto à incidência do Código de Defesa do Consumidor nas hipóteses em que há pessoa jurídica envolvida na cadeia de produção do bem colocado à disposição dos consumidores. II – Se a pro-mitente vendedora não entregou o imóvel no prazo acordado, faculta-se ao comprador a rescisão do contrato de promessa de compra e venda firmado entre as partes. E, como a rescisão se deu por culpa exclusiva da promitente vendedora, ressurge a faculdade de retorno das partes ao status quo ante, devendo o faltoso restituir todos os valores pagos pelo adquirente, em parcela única, consoan-te verbete de Súmula nº 543, do STJ. III – As arras são utilizadas na fase de negociação do contrato ou entrega do objeto, como forma de desestímulo à desistência do negócio. Após a efetivação do contrato ou entrega do objeto, conforme iniciais ou incidentais, havendo rescisão contratual, máxime quando há pagamento das prestações por período considerável, não há que se falar em retenção destas, principalmente quando a rescisão se deu por culpa da construtora. IV – Negou--se provimento ao recurso de apelação cível.” (TJDFT – Proc. 20160110376769APC – (980618) – 7ª T.Cív. – Relª Leila Arlanch – J. 18.11.2016)

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2509 – Arras confirmatórias – compromisso de compra e venda – inadimplência do adquirente – rescisão

“Direito civil, imobiliário e direito do consumidor. Compromisso de compra e venda. Inadimplên-cia do adquirente. Rescisão. Consequência. Cláusula penal. Retenção. Parcelas do preço. Adimple-mento no curso do negócio. Devolução. Imperativo legal. Decote de despesas administrativas. Pos-sibilidade. Cláusula penal. Modulação. Sinal. Natureza. Arras confirmatórias. Compreensão como princípio de pagamento. Retenção. Impossibilidade. Sentença mantida. Interesse de agir. Rescisão do contrato. Culpa do adquirente. Modulação da cláusula penal. Tutela invocada hábil a alcançar o objeto pretendido. 1. O distrato do contrato de promessa de compra sob o prisma da desistência ou inadimplência do promissário adquirente não obsta nem encerra óbice para que, formalizado o distrato, resida em juízo com o escopo de debater as cláusulas contratuais que nortearam o desfazi-mento do vínculo, notadamente a cláusula penal convencionada, à medida que, conquanto resol-vido o negócio, seus efeitos se irradiaram, legitimando que o convencionado seja debatido e, se o caso, modulado, notadamente porque o eventual acolhimento da pretensão é passível de produzir o resultado almejado no espectro fático. 2. A promessa de compra e venda de imóvel em constru-ção que enlaça em seus vértices pessoa jurídica cujo objeto social está destinado à construção e incorporação de imóvel inserido em empreendimento imobiliário e pessoa física destinatária final de apartamento negociado qualifica-se como relação de consumo, pois se emoldura linearmente na dicção dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, devendo os dissensos derivados do negócios serem resolvidos à luz das premissas normativas firmados por esse estatuto legal. 3. O efei-to imediato da rescisão do compromisso de compra e venda motivada por iniciativa da promitente vendedora ante o inadimplemento do promissário comprador é a restituição dos contratantes ao estado em que se encontravam antes da entabulação do negócio, modulados os efeitos do distrato em conformidade com a inadimplência do adquirente, que ensejara a frustração do negócio, deter-minando que seja responsabilizado por eventuais prejuízos advindos de sua conduta ao alienante. 4. De acordo com o preceituado pelo art. 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em franca desvantagem ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou equidade, presumindo-se exagerada, na forma do disposto no § 1º, inciso III, desse mesmo dispositivo, a vantagem que se mostra excessiva-mente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. 5. O Superior Tribunal de Justiça, sob a ótica da legislação de consumo, há muito firmara entendimento segundo o qual o compromissário com-prador de imóvel que não mais reúne condições econômicas de suportar os encargos do contrato tem o direito de rescindir o contrato, sendo legítima a retenção de parte do valor pago a título de despesas administrativas realizadas pela promitente vendedora em percentual oscilante entre 10% e 25% do valor pago, o qual deverá ser fixado à luz das circunstâncias do caso, sendo legítimo ao Juiz agastar o percentual contratualmente previsto quando se mostrar oneroso ou excessivo para o consumidor. 6. Rescindida a promessa de compra e venda antes da entrega do imóvel negociado e não tendo a construtora experimentado outros prejuízos derivados da inadimplência além das despesas administrativas que tiveram com a formalização e distrato do contrato, a multa rescisória avençada em percentual incidente sobre o valor do negócio afigura-se onerosa e abusiva por vili-pendiar a comutatividade do contrato e, desvirtuando-se da sua destinação, transmudar-se em fonte de incremento patrimonial indevido, legitimando que seja revisada e fixada em 10% do valor das prestações efetivamente pagas pelo adquirente. 7. A modulação dos efeitos da rescisão da promessa de compra e venda por ter emergido da iniciativa da promitente vendedora ante o inadimplemento do promissário comprador consubstancia simples consequência do desfazimento do negócio, es-tando debitado ao juiz o dever de, aferindo a excessividade da cláusula penal, revê-la até mesmo

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de ofício, pois, afinado com os princípios da boa-fé objetiva e com a função social do contrato que se qualificam como nortes da novel codificação, o novel legislador civil estabelecera a mitigação da cláusula penal como medida imperativa, e não como faculdade ou possibilidade (NCC, art. 413). 8. As arras confirmatórias consubstanciam pacto acessório cuja finalidade é a entrega de algum bem volvido a assegurar ou confirmar a obrigação principal assumida, e, traduzindo obrigação acessória destinada a confirmar a celebração do negócio jurídico, sendo da mesma espécie que a prestação principal – como no caso de promessa de compra e venda de imóvel em construção –, transmuda-se em início de pagamento para efeito de amortização da dívida (CC, art. 417), resultando que, rescin-dido o negócio, o valor pago a título de sinal pelo promitente comprador deve integrar o montante que lhe deve ser restituído por estar compreendido na parte do preço solvido, observado o direito de retenção do percentual equivalente à cláusula penal, como consectário da rescisão. 9. Apelação conhecida e desprovida. Unânime.” (TJDFT – Proc. 20150110872714APC – (977540) – 1ª T.Cív. – Rel. Teófilo Caetano – J. 16.11.2016)

2510 – Compra e venda de imóvel na planta – atraso na conclusão – devolução integral dos valores pagos – arras – valor

“Civil. Apelação. Rescisão contratual. Compra e venda de imóvel na planta. Atraso na conclusão. Devolução integral dos valores pagos. Arras. Valor. 1. Considerando que a rescisão do ajuste se deu em razão do inadimplemento da construtora, que não efetuou a entrega do imóvel na data aprazada, fica esta obrigada a restituir ao comprador todas as quantias desembolsadas, vedada a dedução de qualquer percentual. 2. Reforma-se a sentença recorrida apenas para estabelecer o valor correto das arras. 3. Recurso parcialmente conhecido e provido em parte.” (TJDFT – Proc. 20150110708018APC – (978285) – 2ª T.Cív. – Rel. Mario-Zam Belmiro – J. 09.11.2016)

2511 – Compromisso de compra e venda – comissão de corretagem – incorporação imobiliária

“Agravo interno no agravo em recurso especial. Compromisso de compra e venda. Comissão de corretagem. Incorporação imobiliária. Venda de unidades autônomas em estande de vendas. Cor-retagem. Cláusula de transferência da obrigação ao consumidor. Validade. Dever de informação que não foi evidenciado no caso concreto. Agravo improvido. 1. Esta Corte, no julgamento do recurso representativo da controvérsia, firmou o entendimento no sentido da validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem (REsp 1599511/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª S., Julgado em 24.08.2016, DJe 06.09.2016). 2. No caso dos autos, conforme bem consignado no acórdão recorrido, faltou o devido dever de informação ao consumidor quanto à incidência da cobrança da comissão de corretagem nos moldes exigidos na tese fixada no recurso representativo da controvérsia, sendo, portanto, impossível a cobrança do encargo pelo promissá-rio-comprador. 3. Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 867.282 – (2016/0062936-7) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 06.10.2016 – p. 2088)

2512 – Compromisso de compra e venda de bem imóvel – indenização por danos morais e ma­teriais – revisão do quantum

“Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Compromisso de compra e venda de bem imóvel. Indenização por danos morais e materiais. Revisão do quantum indenizatório. Súmulas nºs 5 e 7 do STJ. Agravo interno não provido. 1. O acolhimento da pretensão recursal, a fim de afastar as conclusões do aresto estadual no tocante aos danos morais sofridos pela parte agravada, demandaria reexame de todo âmbito da relação contratual estabelecida e incontornável

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incursão no conjunto fático-probatório dos autos, o que esbarra nas Súmulas nºs 5 e 7 do STJ. 2. A revisão da indenização por dano moral apenas é possível quando o quantum arbitrado nas instân-cias originárias se revelar irrisório ou exorbitante. Não estando configurada uma dessas hipóteses, não cabe examinar a justiça do valor fixado na indenização, uma vez que tal análise demanda incursão à seara fático-probatória dos autos, atraindo a incidência da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-EDcl-Ag-REsp 922.237 – (2016/0136430-0) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 29.08.2016 – p. 3843)

Comentário Editorial SínTESECuida-se de agravo interno interposto contra decisão deste relator, que negou seguimento a seu agravo em recurso especial, em razão da ausência de omissão no acórdão estadual; pela incidência das Súmulas nºs 5 e 7 do STJ, uma vez que a reforma do acórdão estadual deman-daria reexame da relação contratual estabelecida e incursão no conjunto fático-probatório dos autos; pela incidência da Súmula nº 83 do STJ, uma vez que o valor fixado a título de danos morais não se mostra excessivo, tendo sido fixado de acordo com os parâmetros adotados por este Sodalício em casos semelhantes.

Nas razões do presente agravo, a parte repisou os fundamentos lançados no recurso especial, no tocante a ofensa dos arts. 393, 186 e 927 do Código Civil, 14, § 3º, II, do CDC, sob a alegação de que a instância ordinária não teria valorado corretamente a prova produzida nos autos. Reiterou a alegação de inexistência de dano moral, porquanto teria ocorrido mero des-cumprimento do contrato.

Alegou, por fim, que havendo manutenção da indenização fixada, defende que seja reduzida, pois a quantia estabelecida mostra-se excessiva.

O STJ negou provimento ao agravo, asseverando que a parte agravante não trouxe nas razões do presente agravo interno argumentos aptos a modificar a decisão agravada, razão pela qual deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.

O ilustre Jurista José Carlos Arouca assim disciplina sobre o dano moral:

“Dano moral, como conceituado por Pinho Pedreira, é todo e qualquer dano extrapatrimonial, afastando ‘as definições que o identificam com os sofrimentos que pode experimentar uma pessoa e que se expressam por meio da dor física ou moral, do menoscabo de sentimentos, da pena moral, das inquietações, dos padecimentos não suscetíveis de apreciação “econômica’”. Não há, também, como vinculá-lo a direitos personalíssimos’.

O dano moral, no ensinamento de Carlos Alberto Bittar, qualifica-se ‘em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se, portanto, como tais, aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da persona-lidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração pessoal)’.

O dano moral deriva do simples fato da violação, tornando-se, pois, desnecessária a prova do reflexo. A indenização, por conseguinte, será fixada mediante arbitramento, na forma do art. 606, II, do CPC.

A reparação, seguindo-se a teorização de Bittar, deve levar em conta a situação da vítima, a posição do lesante, seu patrimônio, a gravidade do fato, seus reflexos. Mas, além disso, deve ter efeito inibitório de repetição de práticas semelhantes.

[...]

Não foi fácil determinar parâmetros para a aferição do dano e sua valoração. Num primeiro momento, lembra Beatriz Della Giustina, a falta de meios, mas principalmente de precedentes e um pouco de coragem para avançar, apelou-se para o Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965), servindo-se mesmo de dispositivos legais do antigo Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/1962), arts. 81 a 88, que enumera as formas delituosas que podem produzir o dano moral (arts. 289 e ss.), com o objetivo de assegurar sua reparação quando ocasionados

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por propaganda eleitoral injuriosa ou deletéria (art. 243, §§ 1º e 2º), para a Lei de Imprensa, nº 5.250/1967, que, regulando a liberdade de manifestação do pensamento e de informações, dispõe no art. 49, I: ‘Aquele que no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar: I – os danos morais e materiais nos casos previstos no art. 16, II e IV, no art. 18 e de calúnia, difamação ou injúria’. Estabelece, ainda, nos arts. 53 e 54, clara distinção entre indenização por dano moral e indenização por dano material. O art. 53, I a III, por sinal, dispõe como deverá o Magistrado proceder no arbitramento do quantum indenizatório.

Na vigência do Código Civil de 1916, acenava-se ao art. 1.533 para o arbitramento da in-denização, ‘de maneira equitativa, prudente, não abusiva, atentando para a capacidade de pagar do que causou a situação, de modo a compensar a dor sofrida pelo lesionado e inibir a prática de outras situações semelhantes’. Na opinião de Sérgio Pinto Martins, ‘uma forma de pagamento, completa, seria a aplicação analógica da indenização dos arts. 477 e 478 da CLT, do pagamento de um salário por cada ano de serviço trabalhado pelo empregado, considerando-se ano o período igual ou superior a seis meses’, lembrando a regra do art. 948 do antigo Código Civil, o qual explicita que ‘nas indenizações por fato ilícito prevalecerá o valor mais favorável ao lesado’. Refere-se, mais, à decisão do TRT da 8ª Região, sendo Relator o Juiz José Maria Quadros de Alencar, que condenou o infrator ao pagamento de um piso e meio da convenção coletiva, pelo período em que ficou desempregado. E, dentre outras hipóteses, o fornecimento de carta de referência, publicação de nota na imprensa local dando conta do rompimento do contrato de trabalho sem que para tanto tivesse contribuído o empregado.

O Código Civil vigente, no art. 946, remete à Lei processual a fixação do valor das perdas e danos, se a obrigação for indeterminada. A indenização, todavia, na forma do art. 944, ‘mede--se pela extensão do dano’.

O art. 1.533 do diploma anterior foi substituído pelo art. 946: ‘Se a obrigação for indetermina-da, e não houver na Lei ou no contrato disposição fixando a indenização devida pelo inadim-plente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a Lei processual determinar’.

Para Orlando Teixeira da Costa, ‘na fixação do valor, o julgador, normalmente, subordina-se a alguns parâmetros procedimentais, considerando a extensão espiritual do dano, a imagem do lesado e a do que lesou, a intenção do autor do ato danoso, como meio de ponderar o mais objetivamente possível direitos à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem da pessoa’.

De nossa parte, lembramos Graciliano Ramos, que, sem pensar no tema, mas em função dos males causados pelo homem, distinguia o capitalista abastado e o proletário sem nada; o intelectual com grande capacidade de discernimento e o inculto, com formação rudimentar. A reparação do dano deve ter presente o perfil do ofendido e do ofensor, isto é, do empregado e do empregador, e, na hipótese colocada, no poderio econômico da empresa, no seu porte, a gravidade do ato ofensivo, a profundidade do dano causado e sua repercussão, interna, no âmbito da empresa, e externa, no meio em que se situa o trabalhador, familiar e social.” (Dano moral. Disponível em: online.sintese.com)

2513 – Compromisso de venda e compra e outros pactos – instrumento particular – tutela ante­cipada – pressupostos – dilação probatória

“Agravo de instrumento. Instrumento particular de compromisso de venda e compra e outros pac-tos. Tutela antecipada. Pressupostos. Dilação probatória. Agravo improvido. 1. Com efeito, para a concessão da tutela antecipada o art. 273 do Código de Processo Civil/1973 exige que estejam presentes a prova inequívoca que convença o julgador acerca da verossimilhança das alegações e o fundado receio de dano irreparável e de difícil reparação. 2. Trata-se de Instrumento Particu-lar de Compromisso de Venda e Compra e Outros Pactos de Unidade Autônoma do ‘Residencial Terra Di Monterosso’. 3. Narram os autores que firmaram contrato particular de compromisso de compra e venda de unidade de apartamento integrante do Residencial Terra Di Monterosso, de

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propriedade da empresa Terra Di Monterosso Incorporadora Ltda., cujo pagamento foi parcial-mente financiado com a corré Caixa Econômica Federal, ficando estipulado o pagamento de um sinal de R$ 75.952,00, além de 23 parcelas mensais no valor de R$ 1.200,00 e uma última parcela de financiamento, (nº 24), no valor de R$ 276.000,00. Asseverou que, quando da assinatura deste contrato, efetuaram o pagamento do sinal e a taxa de corretagem. 4. Requer o direito à rescisão con-tratual independentemente de descumprimento contratual por qualquer das partes, e na flagrante abusividade da cláusula contratual que estabeleceu a retenção de 30% dos valores pagos a título de despesas administrativas e da cláusula referente ao prazo de devolução, bem como o indeferimento da tutela antecipada ensejará prejuízos econômicos irreversíveis aos agravantes. 5. A questão em deslinde depende de dilação probatória, assim, nada impede possa ser deferida a antecipação de tutela, posteriormente, quando surgir a prova inequívoca. 6. Agravo de instrumento improvido.” (TRF 3ª R. – AI 0005220-95.2016.4.03.0000/SP – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Valdeci dos Santos – DJe 06.10.2016 – p. 1027)

2514 – Corretagem – cheque para pagamento – compra de imóvel – negócio não concluído – comissão indevida

“Apelação civil. Consumidor. Negociações preliminares para compra de imóvel. Cheque para pa-gamento de corretagem. Negócio não concluído. Comissão indevida. Negativação do nome do su-posto devedor. Dano moral. Recurso provido. 1. A compra e venda do imóvel não foi aperfeiçoada, de modo que o corretor não logrou êxito na intermediação do negócio entre apelante e apelado, não tendo concretizado o negócio principal. Assim, todo esforço despendido pelo corretor não terá qualquer compensação se o negócio não for concretizado. 2. A incorporadora não apresentou prova de que a venda foi concretizada, pois ausente instrumento de promessa de compra e venda, demonstrando, por via reflexa, o desfazimento do negócio na fase pré-contratual. 3. A cobrança indevida, com inscrição do suposto devedor no cadastro de proteção ao crédito, enseja o pagamen-to de indenização por dano moral. 4. Recurso provido.” (TJAC – Ap 0712058-36.2013.8.01.0001 – (17.123) – 1ª C.Cív. – Relª Desª Maria Penha – DJe 17.11.2016 – p. 9)

2515 – Corretagem – comissão – ação de cobrança

“Agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil (CPC/1973). Ação de cobrança de comissão de corretagem. Negativa de prestação jurisdicional. Inocorrência. Comissão de cor-retagem considerada devida pelo tribunal de origem em face do reconhecimento de atuação da recorrida na mediação do negócio. Arbitramento do valor em razão da natureza do negócio e dos usos locais, diante da ausência de previsão legal e contratual. Revisão da conclusão do Tribunal a quo. Impossibilidade. Reexame de fatos e provas. Súmulas nºs 5 e 7/STJ. Agravo desprovido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 479.890 – (2014/0040209-8) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 10.11.2016 – p. 1446)

2516 – Corretagem – comissão – princípios do contraditório e da ampla defesa – ausência

“Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Direito processual civil. Prequestiona-mento. Ausência. Princípios do contraditório e da ampla defesa. Comissão de corretagem. Reper-cussão geral. Inexistência. Precedentes. 1. É inadmissível o recurso extraordinário se os dispositivos constitucionais que nele se alega violados não estão devidamente prequestionados. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. O Supremo Tribunal Federal assentou a ausência de repercussão ge-ral dos temas trazidos nestes autos. Vide: (i) ARE nº 748.371/MT, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 01.08.2013, Tema nº 660; (ii) RE 823.319/SP, Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 21.10.2014, Tema nº 769; e (iii) RE 892.961/SP, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 26.08.2016, Tema nº 834. 3. Agravo regimental não provido. 4. Majoração da verba honorária em valor equiva-

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lente a 10% (dez por cento) do total daquela já fixada (art. 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC), observada a eventual concessão do benefício da gratuidade da justiça.” (STF – AgRg-RE-Ag 983.438 – Minas Gerais – 2ª T. – Rel. Min. Dias Toffoli – J. 07.10.2016)

2517 – Desapropriação indireta – bem de uso comum – indisponibilidade – suposta aquisição pelos recorridos – indenização – ilegitimidade ativa

“Administrativo. Imóvel. Parcela afetada ao uso público. Ruas. Bem de uso comum. Indisponibilida-de. Suposta aquisição pelos recorridos. Impossibilidade. Indenização por desapropriação indireta. Ilegitimidade ativa. Limites da sub-rogação de direitos e ações contra o Estado (art. 349 do Código Civil). 1. Hipótese em que: a) entre 1969 e 1977 foram construídas ruas sobre parte do imóvel urbano; b) a proprietária promoveu Ação de Indenização em 1978, que foi extinta sem julgamento de mérito por sentença transitada em julgado em 1986; c) em 1998 firmou-se, entre a proprietária e os recorridos, contrato de permuta cujo objeto é parcela do imóvel original, por onde passam as ruas; e d) os adquirentes propuseram a presente Ação Indenizatória em 2002. 2. A Corte estadual entendeu que a falta de registro da permuta no cartório de imóveis não afasta a legitimidade ativa dos autores. Refere-se a eles como novos proprietários e legítimos possuidores. 3. Diferentemente do que afirmou o TJPR, os recorridos não são proprietários nem possuidores do terreno ocupado pela rua, pois isso é impossível. Quando o Município afetou parcela do imóvel ao uso público entre 1969 e 1977, construindo vias, houve inequívoca incorporação do bem ao patrimônio público. Esse é o efeito principal da chamada desapropriação indireta. Não por outra razão, a antiga proprietária chegou a promover Ação Indenizatória, já que descabe reivindicação (art. 35 do DL 3.365/1941). 4. A permuta firmada pela proprietária em 1998, mais de 20 anos após a incorporação do bem ao patrimônio municipal por desapropriação indireta, não incluiu, por óbvio, a parcela afetada ao uso comum, porque inviável. 5. Ninguém pode dispor do que não lhe pertence, muito menos alienar, como se seu fosse, parte do patrimônio da coletividade, presente e futura. Além disso, consideran-do as peculiaridades, os valores e a principiologia específica do Direito Público, a sub-rogação de direitos e ações (art. 349 do Código Civil) depende, além da boa-fé objetiva, da concordância ex-pressa do Estado, exceto quando houver dispositivo legal inequívoco em sentido contrário. À luz do princípio da moralidade administrativa, inaceitável que se tenha por legítimo o comércio de litígios contra o Poder Público, porta aberta para toda a sorte de corrupção e favorecimento daqueles que gozam de privilégios decorrentes de valiosas conexões políticas ou mecanismos espúrios de pressão contra a Administração. 6. Pela mesma razão, não é sequer possível reconhecer a posse do imóvel pelos recorridos. O legislador brasileiro definiu posse como o exercício de algum dos poderes ine-rentes à propriedade (art. 1.196 do CC), o que se mostra incompatível com a pretensão de particular em relação a logradouro público. 7. Saliente-se que a presente demanda trata de permuta realizada mais de 20 anos após a afetação do bem ao uso comum do povo. Desarrazoado reconhecer direitos em favor dos recorridos, ou mesmo a condição de possuidores. 8. A jurisprudência mais recente do STJ, em situação análoga, afasta a pretensão indenizatória daquele que adquire imóvel ou móvel após imposição de limitação administrativa ou afetação como bem público. Confira-se: ‘Se, quando da realização do negócio jurídico relativo à compra e venda de imóvel, já incidiam restrições ad-ministrativas. Subentende-se que, na fixação do respectivo preço, foi considerada a incidência do referido gravame. Não há de se permitir a utilização do remédio jurídico da ação desapropriatória como forma de ressarcir prejuízo que a parte, conquanto alegue, à toda evidência, não sofreu, visto ter adquirido imóvel que sabidamente deveria ser utilizado com respeito às restrições anteriormente impostas pela legislação estadual’ (EREsp 254.246/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 1ª S., DJ 12.03.2007, p. 189). 9. Ademais, não consta que a antiga proprietária tenha cedido aos recorridos direitos à indenização eventualmente subsistentes (direitos pessoais, não reais), caso ainda não prescritos. Nesse sentido, reconhecê-los em favor dos autores da presente ação implica, além de

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dilapidação do patrimônio público, inaceitável enriquecimento sem causa. 10. Recurso Especial provido.” (STJ – REsp 1.246.853 – (2011/0068623-1) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 17.11.2016 – p. 1372)

2518 – Direito de vizinhança – alegação de construção irregular de muro – indenização por danos materiais e morais

“Recurso inominado. Ação de indenização por danos materiais e morais. Direito de vizinhança. Alegação de construção irregular de muro. Preliminar de nulidade da sentença não acolhida. Pena de confissão devidamente decretada. Parte acionada que compareceu à audiência de conciliação, juntando contestação oral somente em audiência de instrução e julgamento. Sentença que não apreciou as alegações produzidas pela acionada, pois feita em momento inoportuno. Não configu-ração de cerceamento de defesa. Sentença mantida. Negado provimento ao recurso.” (TJBA – RIn 0002575-52.2014.805.0041-1 – 4ª T. – Relª Juíza Eloisa Matta da Silveira Lopes – DJe 04.11.2016 – p. 824)

2519 – Direito de vizinhança – construção do réu que ocasionou danos no imóvel do autor – nexo de causalidade comprovado

“Apelação cível. Ação indenizatória. Direito de vizinhança. Construção do réu que ocasionou da-nos no imóvel do autor. Nexo de causalidade comprovado. Análise sistêmica das provas dos autos. Ônus da prova. Redução do valor dos danos morais. Sucumbência recíproca não caracterizada. 1. O juiz não está adstrito às conclusões da perícia técnica, podendo se pautar em outros elementos de prova aptos à formação de seu livre convencimento, estando autorizado a concluir pela existên-cia do nexo de causalidade entre dano e a conduta de quem o deu causa com base no conjunto probatório produzido nos autos e nas particularidades do caso concreto. 2. Incumbe ao réu o ônus de provar fatos desconstitutivos do direito do autor. In casu, o apelante não cuidou de trazer aos autos provas dos fatos que alega em suas razões, mormente no que se refere a possível falsidade ou irregularidade dos recibos apresentados pelo autor, razão pela qual não procede referida alegação. 3. Considerando-se a existência do nexo de causalidade entre os danos ocasionados ao autor e a conduta do apelante, e sendo evidente que o constrangimento pelo qual o apelado passou ultrapas-sa as barreiras do mero dissabor, resta caracterizado o dano moral. 4. Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao nível socioeconômico dos contendores. No caso, o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) é suficiente para compensar o dano moral experimentado pelo apelado, espe-cialmente pelo fato de que o réu, embora pessoa jurídica de direito privado, não reúne condições econômicas para suportar o pagamento de indenização de maior valor. 5. Nos termos da Súmula nº 326 do STJ, ‘na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca’. Da mesma forma, a condenação a título de danos materiais em montante inferior ao postulado na exordial não tem relevância para fins de sucumbência. Apelo parcialmente provido.” (TJGO – AC 201190330040 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Zacarias Neves Coelho – DJe 10.11.2016 – p. 107)

2520 – Direito de vizinhança – negativa de prestação jurisdicional – não ocorrência – antecipa­ção de tutela

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Direito de vizinhança. Negativa de prestação jurisdicional. Art. 535 do CPC/1973. Não ocorrência. Antecipação de tutela. Prova inequívoca dos fatos e verossimilhança das alegações. Reforma do julgado. Reexame de provas. Inviabilidade. Sú-mula nº 7/STJ. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende

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cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2. A reforma do julgado deman-daria o reexame do contexto fático-probatório, procedimento vedado na estreita via do recurso es-pecial, a teor da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 721.133 – (2015/0126650-9) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 26.08.2016 – p. 812)

Comentário Editorial SínTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão desta relatoria que conheceu do agravo para negar seguimento ao recurso especial com base nos seguintes fundamentos:

(i) ausência de violação do art. 535 do Código de Processo Civil/1973, e

(ii) a alteração do julgado, no que diz respeito à concessão da tutela antecipada, exigiria o reexame de provas, inviável na estreita via do recurso especial (Súmula nº 7/STJ).

Inconformada, a agravante interpôs o presente regimental, no qual sustentou a omissão do acórdão estadual e a ausência de óbice da Súmula nº 7/STJ. Aduz que não há prova inequívo-ca que convença da verossimilhança das alegações, bem como do perigo de dano irreparável ou de difícil reparação

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Maria Helena Diniz ensina:

“Há restrições à propriedade que surgem ante a necessidade de conciliar o seu exercício por parte de proprietários confinantes, pois a vizinhança, por si só, pode dar origem a conflitos.

Entre os limites impostos à propriedade, está uma seção específica para os limites pertinentes ao ‘direito de construir’ – arts. 1.299 a 1.313 do CC/2002.

O art. 1.299 determina que o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.

O proprietário que erguer qualquer construção, com infringência dos regulamentos administra-tivos e dos direitos de vizinhança, estabelecidos no Código Civil, causando dano a alguém, terá inteira responsabilidade pelo fato, sendo obrigado a reparar o prejuízo.” (Curso de direito civil brasileiro. Direito das coisas. 17. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2002. p. 226-227)

O direito de vizinhança é distinguido pela proximidade, ou, melhor, pela pouca distância que existe entre os proprietários dos imóveis ou condôminos. Diante disso, qualquer prejuízo que venha a ser causado ao outro tem que ser reparado de forma a não causar mais problemas ou perturbações no seu direito.

Sobre este direito, vejamos os esclarecimentos de Eusébio Carvalho:

“A propriedade é um direito fragmentado e a função social incide em cada regime proprietário. Contudo, é importante ficar claro que a intensidade da sua funcionalização pode até variar de propriedade para propriedade, mas nunca irá abandonar os princípios constitucionais garanti-dores da dignidade da pessoa humana.

A função social da propriedade não é uma limitação ao direito de propriedade, e sim um de seus elementos constitutivos, interagindo diretamente no conceito. Nesse sentido, André Osório Godinho, em brilhante trabalho doutrinário, assevera que:

‘Outra diferença reside no fato de que as limitações apenas atingem o exercício do direito, mas nunca sua substância, e que só se justificam se uma nova concepção do direito de propriedade é aceita.

A função social atinge a própria essência do direito de propriedade, modificando o seu conteú-do e criando as condições propícias para a legitimidade das restrições impostas ao domínio. A função social também não representa um ônus para o proprietário pois, na realidade, a mesma visa simplesmente fazer com que a propriedade seja utilizada de maneira normal, cumprindo o fim a que se destina.’” (Direito à propriedade – Do discurso à realidade. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil,nº 24, p. 19, jul./ago. 2003)

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2521 – Doação de bem imóvel pelo devedor – fraude à execução – impossibilidade de reconhe­cimento

“Apelação cível. Embargos de terceiro em sede de execução fiscal. Doação de bem imóvel pelo devedor. Impossibilidade de reconhecimento de fraude à execução. Doação realizada em 1998, antes da citação do devedor na execução fiscal. Fraude contra credores. Hipótese de anulabilidade do negócio jurídico. Reconhecimento que exige ação pauliana ou revocatória. Impossibilidade de reconhecimento da fraude em embargos de terceiro. Inteligência da Súmula nº 195, do Superior Tribunal de Justiça. Existência de fraude. Acolhimento de tese defensiva. Sucumbência afastada. Aplicação do princípio da causalidade. Recurso conhecido e parcialmente provido. 1. Quando há fraude à execução ‘Seu ataque dispensa manejo de ação especificamente destinada ao desfazimen-to dos efeitos prejudiciais da alienação ou oneração. A lei simplesmente nega reconhecimento ao ato, perante a execução fraudada. Verificada – no curso da execução logo atingidos pela constrição executiva, independentemente de provimento desconstitutivo da eficácia do ato fraudulento. Nisso há essencial diferença em relação à fraude contra credores, em que o bem alienado só será submeti-do à execução contra o disponente devedor quando for bem sucedida a ação pauliana’ (WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil. Eduardo Talamini. 11. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 144). 2. Súmula nº 195, do STJ: ‘em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores’. 3. ‘[...] a decisão proferida nos embargos de terceiro é incidenter tantum. Não faz coisa julgada (CPC, art. 469, III). A intenção do embargado (credor) é a simples rejeição dos embargos. Evita-se a sucumbência nos embargos’ (OLIVEIRA, Lauro Laertes de. Da ação pauliana. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 88).” (TJPR – AC 1574283-7 – 2ª C.Cív. – Rel. Juiz Subst. Luciano Campos de Albuquerque – DJe 22.11.2016 – p. 518)

2522 – Dúvida registral – compra e venda – suscitação

“Apelação cível. Suscitação de dúvida registral. Negativa de registro de escritura pública de com-pra e venda. Sentença de procedência. Apresentação da certidão negativa de débito emitida pelo Instituto Nacional do Seguro Social. Documento vencido no momento da lavratura do instrumento. Impossibilidade de registrar a compra e venda na matrícula do imóvel sem a certidão atualizada. Art. 552 do código de normas do foro extrajudicial deste tribunal. Recurso desprovido.” (TJPR – AC 1518340-5 – 11ª C.Cív. – Rel. Des. Mario Nini Azzolini – DJe 04.10.2016 – p. 333)

2523 – Dúvida registral – mandado de segurança – recusa de registro

“Embargos de declaração. Mandado de segurança. Dúvida registral. Recusa de registro por ino-bservância ao art. 32 da Lei nº 4.591/1964, o qual determina o arquivamento de documentação necessária por parte da incorporadora, antes de iniciar a venda das unidades autônomas. Mantida a decisão do Conselho Superior da Magistratura. Negada a segurança. Alegada omissão do v. Acór-dão. Vício inexistente. Pretensão de mero reexame de questões já decididas. Via eleita inadequada. Mero inconformismo com o julgamento não enseja a via dos declaratórios. Hipóteses de cabimento previstas no art. 1.022, incisos I, II e II, do Novo Código de Processo Civil. Embargos rejeitados, mas conhecidos para prequestionamento.” (TJSP – EDcl 2084698-46.2016.8.26.0000 – São Paulo – O.Esp. – Rel. Péricles Piza – DJe 21.11.2016)

2524 – Hipoteca – cancelamento – garantia real – incorporadora falida

“Agravo interno no recurso especial. Civil. Processual civil. Cancelamento de hipoteca. Garantia real constituída pela incorporadora falida sobre imóvel para, em aditamento, resguardar contrato de dação em pagamento. Execução. Imóvel penhorado para garantia do juízo. Mesmo imóvel objeto de contrato de compra e venda com terceiro. Quitação. Boa-fé. Ação de adjudicação compulsória julgada procedente. Trânsito em julgado. Aplicação da Súmula nº 308/STJ. Agravo interno impro-

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vido. 1. Decidida integralmente a lide posta em juízo, com expressa e coerente indicação dos fun-damentos em que se firmou a formação do livre convencimento motivado, não se cogita violação do art. 535 do CPC/1973, ainda que rejeitados os embargos de declaração opostos. 2. ‘A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel’ (Súmula nº 308/STJ). 3. O referido Enunciado sumular pode ser aplicado ao agente financiador de construção de empreen-dimentos imobiliários ainda que não seja instituição financeira e não se trate daqueles contratos regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação. 4. O terceiro que adquire o imóvel de boa-fé e cum-pre o contrato de compra e venda, quitando o preço avençado, não pode ser prejudicado por outra relação jurídica estabelecida entre o financiador, credor hipotecário, e o construtor inadimplente. No caso, deve o financiador tomar todas as cautelas necessárias antes da celebração do contrato ou, em caso de não cumprimento da avença, buscar outros meios judiciais cabíveis para alcançar o adimplemento do negócio jurídico garantido pela hipoteca. 5. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-REsp 1.432.693 – (2013/0165651-1) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 06.10.2016 – p. 2118)

2525 – Locação – dano infecto

“Processual. Locação. Dano infecto. Demanda de obrigação de fazer cumulada com pedido inde-nizatório. Julgamento de procedência parcial. Apelação da locatária-autora intempestiva. Recurso não conhecido. Locação. Dano infecto. Realização de obras pelos réus-locadores, em cumprimento a tutela antecipada deferida ao longo do processamento. Circunstância que não determina a perda do objeto da demanda. Sentença de mérito que deve se pronunciar normalmente quanto ao objeto do pedido, mantendo ou revogando a tutela provisória. Determinação, por outro lado, de comple-mentação das obras realizadas pelos réus, tendo em vista imperfeições apontadas em laudo pericial. Apelação do corréu Tarciso que não enfrenta esse aspecto, limitando-se a afirmar a execução das obras. Ausência de interesse recursal por não abordar o cerne da decisão. Pretensão, por fim, de ver ampliada a condenação em obrigação de fazer, restrita a ele, aos demais litisconsortes passivos. Ausência ainda uma vez de interesse recursal. Inexistência de litígio entre o apelante e os outros réus. Prejuízo, em tese, para a autora, não para o próprio réu. Ausência de proveito concreto para sua esfera jurídica no tocante ao objeto do recurso assim posto. Apelação não conhecida.” (TJSP – Ap 0081362-85.2010.8.26.0224 – Guarulhos – 29ª CDPriv. – Rel. Fabio Tabosa – DJe 05.10.2016)

2526 – Nunciação – obra nova – dano – comprovação – danos morais – ônus da prova

“Nunciação. Obra nova. Dano. Comprovação. Danos morais. Ônus da prova. A nunciação de obra nova tem por objeto a paralisação do seu andamento, a fim de evitar prejuízo ao prédio vizinho. Havendo comprovação de que a obra nova afronta o direito de vizinhança, é cabível seu embargo. Para a configuração da responsabilidade indenizatória é necessário que se verifique a presença simultânea de três elementos essenciais, quais sejam: a ocorrência induvidosa do dano; a culpa, o dolo ou má-fé do ofensor; e o nexo causal entre a conduta ofensiva e o prejuízo da vítima. O ônus da prova incumbe ao autor, nos termos do art. 333, I, CPC, que deverá demonstrar cabal-mente a configuração dos elementos três ensejadores da responsabilidade civil subjetiva. Ausentes os requisitos configuradores da responsabilidade civil, não deve ser reconhecida a obrigação de indenizar.” (TJMG – AC 1.0439.12.001608-4/002 – 14ª C.Cív. – Relª Evangelina Castilho Duarte – DJe 14.10.2016)

2527 – Penhora – imóvel do casal – garantidor, cônjuge e patrono da executada

“Agravo interno no recurso especial. Embargos de terceiro. 1. Penhora. Imóvel do casal. Garanti-dor, cônjuge e patrono da executada. Mesma pessoa. Ciência inequívoca do feito. Suprimento de

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citação. Ausência de prejuízo. Falta de impugnação aos fundamentos do acórdão recorrido. Súmula nº 283/STF. 2. Crédito revertido em benefício da sociedade conjugal. Modificação. Reexame fático--probatório. Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo desprovido. 1. Não tendo havido impugnação expressa dos fundamentos do acórdão recorrido, sobretudo no tocante à ausência de prejuízo diante da ciência inequívoca e concordância com os atos executórios por mais de 15 (quinze) anos, mostra-se inviá-vel o processamento do especial, ante o óbice da Súmula nº 283 do STF. 2. Não se revela possível modificar o julgamento proferido pelo Tribunal de origem – que, analisando as peculiaridades do caso, concluiu que o crédito obtido pela executada, esposa do ora agravante, foi revertido para o âmbito familiar ou para suprir necessidades da residência – tendo em vista a necessidade de reexa-me do conjunto fático-probatório dos autos, conforme o que dispõe a Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-REsp 1.587.491 – (2016/0070283-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 30.08.2016 – p. 3407)

Comentário Editorial SínTESEDepreende-se dos autos que o embargante opôs embargos de terceiro contra o Banco do Brasil S.A., alegando que, não obstante a penhora do imóvel de matrícula nº 5.191, nos autos da Execução nº 0000610-50.1999.8.12.0015, não foi intimado acerca da constrição. Escla-receu que é procurador da executada, tendo indicado o bem como garantia da execução, no entanto, o embargado não atentou para a sua qualidade de cônjuge e de terceiro garantidor da dívida executada.

O Juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido.

Em apelação do embargante, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul negou provimento ao apelo em acórdão assim ementado:

APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS DE TERCEIRO – IMÓVEL DE CASAL PENHORADO EM AÇÃO DE EXECUÇÃO – TERCEIRO GARANTIDOR QUE SE CONFUNDE COMO CÔNJUGE E PROCU-RADOR DA EXECUTADA – FUNÇÕES EXERCIDAS PELA MESMA PESSOA – PROCURADOR QUE SUBSCREVEU O OFERECIMENTO DO BEM À PENHORA E TERMO DE PENHORA E DEPÓSITO – CIÊNCIA INEQUÍVOCA DO CONTEÚDO DO FEITO EXECUTIVO – SUPRIMENTO DE CITAÇÃO E INTIMAÇÃO – PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ PROCESSUAL – LEGALIDADE DA PE-NHORA E DA EXECUÇÃO – PRETENSÃO DE EXCLUSÃO DE MEAÇÃO – DÍVIDA CONTRAÍDA PARA INVESTIMENTO EM ATIVIDADE PROFISSIONAL LIBERAL DA ESPOSA – NÃO AFAS-TAMENTO DA PRESUNÇÃO DE QUE A DÍVIDA FORA CONTRAÍDA EM BENEFÍCIO COMUM – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – RECURSO NÃO PROVIDO.

Nas razões do recurso especial o embargante alegou que, nos termos do art. 655, § 1º, do CPC/1973, “quando o bem constrito recair sobre a garantia hipotecária ou real, em prol da dívida de outrem, é necessário que o garantidor integre o polo passivo da demanda, a fim de que possa exercer pleno direito de defesa”. Ressaltou que o fato de atuar como procurador da executada não supre sua citação ou sua intimação para compor o polo passivo da lide.

Afirmou, ainda, que “o próprio contrato que originou a execução demonstra que o crédito ad-quirido pela executada não se converteu em beneficio da família”, nos termos dos arts. 1.643 e 1.644 do CPC/1973.

Daí o presente agravo interno, no qual Geraldo Albuquerque aduz que o fato de atuar como procurador, não supre sua citação ou sua intimação para compor o polo passivo da lide, assim “resta evidente que o processo de execução deve ser considerado nulo, isso porque a jurispru-dência, doutrina e a legislação são unânimes em determinarem a exigibilidade da citação do terceiro garantidor para que o mesmo componha a lide no polo passivo”.

Afirma a inaplicabilidade da Súmula nº 7/STJ, ressaltando que “o débito da Executada teve origem em contrato de abertura de crédito fixo, valor esse que a executada utilizava-se para cobrir despesas de seu consultório médico e da clínica que pretendia abrir à época dos fatos.

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Em momento algum, o crédito foi revertido para o âmbito familiar ou para suprir necessidades de sua residência. Dessa forma, a meação do Agravante deve ser respeitada nessa Execução”.

O STJ negou provimento ao presente agravo interno.

Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:

“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenhora-bilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respectivos incisos, quais sejam:

a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;

b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;

c) crédito decorrente de pensão alimentícia;

d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;

e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;

f) aquisição do imóvel com produto de crime;

g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civi-lista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanência, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)

2528 – Promessa de compra e venda – comissão de corretagem – tese – ciência dos promitentes­­compradores – contratação expressa

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Contrato de promessa de compra e venda. Co-missão de corretagem. Tese fixada no REsp 1.599.511/SP. Ciência dos promitentes compradores. Contratação expressa. Incidência das Súmulas nºs 5 e 7, do STJ. Agravo desprovido. 1. ‘Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem’ (REsp 1599511/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª S., Julgado em 24.08.2016, DJe 06.09.2016). 2. Tendo a Corte a quo consignado que os adquirentes do imóvel estavam completamente cientes da contratação da comissão de corretagem e que o serviço foi efetivamente prestado, torna-se inviável infirmar as con-clusões do acórdão recorrido, ante a incidência das Súmulas nºs 5 e 7, do STJ. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 834.382 – (2015/0324316-8) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 07.11.2016 – p. 1330)

2529 – Seguro habitacional – possibilidade de utilização de recursos do FCVS – legitimidade

“Seguro habitacional. Possibilidade de utilização de recursos do FCVS. Legitimidade da Caixa Eco-nômica Federal. Competência da justiça federal para examinar a existência de interesse jurídico. Sú-mula nº 150/STJ. Precedentes. 1. Nas ações envolvendo seguros de mútuo habitacional no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional (SFH), a CEF detém interesse jurídico para ingressar na lide. De-

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vendo os autos serem remetidos à justiça federal para dirimir a questão (AgRg-AREsp 603.135/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 05.04.2016, DJe 13.04.2016). 2. O Tribunal de origem, de posse do acervo fático-probatório, consignou que o contrato em debate pertence ao ramo 66, bem como é possível haver o comprometimento do FCVS. Caso em que deve ser seguida a orientação firmada por esta Corte superior, na qual determina a remessa dos autos à justiça fede-ral. Agravo interno improvido. (STJ – AgInt-REsp 1.548.463 – (2015/0198979-0) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 17.08.2016 – p. 1411)

Comentário Editorial SínTESECuida-se de agravo interno interposto contra decisão monocrática de minha relatoria que apre-ciou recurso especial interposto com o objetivo de reformar acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que negou provimento ao recurso de apelação do recorrente nos termos da seguinte ementa

“SFH – SEGURO – APÓLICE PÚBLICA – CONTRATO LIQUIDADO – 1. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de recurso especial representativo de controvérsia, firmou enten-dimento no sentido de que, nas ações que envolvem contrato de seguro adjeto a contrato de mútuo habitacional, a Caixa Econômica Federal detém interesse jurídico para ingressar na lide somente nos contratos vinculados à Apólice Pública (ramo 66).

2. O contrato de seguro tem vigência simultânea com o contrato de mútuo. Extinguido o con-trato de mútuo, automaticamente, extingue o seguro que o acompanha.”

Aduziu o agravante que não se observa interesse da CEF para ingressar no feito, o que afasta a necessidade de deslocamento para Justiça Federal.

Pugnou, por fim, caso não seja reconsiderada a decisão agravada, pela submissão do presente agravo à apreciação da Turma.

A agravada, instada a manifestar-se, sustentou que esta Corte superior possui entendimento reiterado de que “se os contratos reclamados têm comprometimento com o FCVS, ou seja, vinculados à apólice pública (ramo 66), a CEF tem interesse no feito”.

O STJ negou provimento ao agravo.

Oportuno trazer as lições de Rubem M. Cunha sobre o Sistema Financeiro de Habitação:

“Ocorre que, anteriormente à edição da Lei nº 4.595, já existia a Lei nº 4.380, de 21.08.1964, que, dentre outras medidas, instituiu o sistema financeiro para aquisição da casa própria.

Essa lei sofreu alterações ao longo do tempo e foi recepcionada pela CF de 1988. Como ela trata também de parcela significativa do SFN, entendo que, em grande parte, ela foi recebida como lei materialmente complementar.

Verifique-se, a propósito, o que se contém no art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 4.380:

‘O Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito fixará normas que regulam as re-lações entre o sistema financeiro da habitação e o restante do sistema financeiro nacional, especialmente quanto à possibilidade, às condições e aos limites de aplicação de recursos da rede bancária em letras imobiliárias, emitidas, nos termos desta lei, pelo Banco Nacional da Habitação.’

Ou seja, a própria lei básica, que criou o SFH, declara que ele integra o sistema financeiro nacional, sendo que a relação entre ambos seria regulada pelo Conselho da antiga Sumoc, predecessora do atual CMN.

Depois disso, o DL 2.291, de 21.11.1986, confirmou:

‘Art. 7º Ao Conselho Monetário Nacional, observado o disposto neste Decreto-lei compete:

I – exercer as atribuições inerentes ao BNH, como órgão central do Sistema Financeiro da Habitação, do Sistema Financeiro do Saneamento e dos sistemas financeiros conexos, subsi-diários ou complementares daqueles;

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������229

II – deferir a outros órgãos ou instituições financeiras federais a gestão dos fundos administra-dos pelo BNH, ressalvado o disposto no art. 1º, § 1º, alínea b; e

III – orientar, disciplinar e controlar o Sistema Financeiro da Habitação.’

A nossa atual Constituição apanhou assim os dois sistemas e se hoje a doutrina e jurisprudên-cia aceitam com tranquilidade a ideia de que a Lei nº 4.595 foi recebida como materialmente complementar, não há por que não considerar também assim grande parte da Lei nº 4.380 e suas alterações legislativas anteriores à Carta vigente.

Então, aquelas atribuições já destacadas (Lei nº 4.595, art. 4º, VI), o Banco Central, isto é, o CMN, as exerce também no sistema financeiro da habitação – e agora, não há mais uma, mas pelo menos duas leis materialmente complementares virtualmente maltratadas por leis, medidas, provisórias, resoluções, etc., etc., tal como vem ocorrendo com o próprio sistema financeiro nacional.

Como decifrar essa esfinge?

É imprescindível que o intérprete identifique, na lei que contenha dispositivos materialmente complementares, aqueles que são efetivamente complementares, tal como aprendemos a fazer com o CTN perante a Carta outorgada em 1967. A partir daí, deve-se analisar as alterações legislativas (leis, Decretos-leis) anteriores à CF de 1988. Essas leis podiam alterar, e efeti-vamente alteraram, as Leis nºs 4.380 e 4.595, e passaram a ser elas também tidas como materialmente complementares à CF. Aquelas e estas, após a CF, somente podem ser alteradas por leis complementares.

Examino alguns casos concretos.

É de observar-se, p. ex., que o art. 5º da Lei nº 4.380, de 21.08.1964, estabelece para toda a duração do contrato a permanência da relação original entre a prestação mensal de amorti-zação e o salário do tomador do empréstimo. Para isso, a lei estabeleceu que, relativamente aos funcionários públicos, cujos vencimentos eram reajustados em lei, fosse levada em consi-deração a percentagem nela estabelecida. Quanto aos mutuários não funcionários públicos, o índice que seria levado em consideração era o do salário mínimo.

Pode ser que os critérios tenham mudado ao longo do tempo, índices foram mudados ‘n’ vezes, mas o princípio aí insculpido, esse somente poderá ser alterado por lei complementar.

Como o STF já decidiu que não há direito adquirido a determinado índice, isto não é matéria objeto de lei complementar.

Até que ponto a Lei nº 8.692, de 28.07.1993, que criou o Plano de Comprometimento de Renda – PCR, está de acordo com esse sistema de equalização renda/prestação?

Dispõe ela em seu art. 2º que os contratos de financiamento habitacional celebrados em conformidade com o Plano de Comprometimento de Renda estabelecerão percentual de no máximo trinta por cento da renda bruta do mutuário destinado ao pagamento dos encargos mensais. Nos encargos mensais estão incluídos amortização, juros e seguros.

Há, é certo, diferenças conceituais. Pela Lei nº 4.380 não se pode alterar a relação original entre a prestação mensal de amortização e o salário do mutuário. Já aqui, admite-se reajustar o valor do encargo mensal até o percentual máximo de renda estabelecido no contrato, sem considerar a relação inicial.

O princípio já havia sofrido alteração com a introdução da equivalência salarial como critério de reajustamento das prestações pelo DL 2.164, de 19.09.1984 (art. 9º), o qual, entretanto, permitia utopicamente uma folga de pelo menos sete pontos percentuais em favor do mutuário se o salário aumentasse no mesmo período mais que a variação da UPC.

Entendo que essa modalidade não vulnera o princípio básico na medida em que preserva a ca-pacidade de pagamento do mutuário e também garante a sobrevivência do sistema financeiro da habitação, embora passe a onerar inteiramente os acréscimos de rendimentos que vierem a ser obtidos pelos mutuários.

Outro exemplo.

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Já o mesmo não se pode dizer quanto aos financiamentos da chamada faixa livre. Criação do legislador complementar – CMN (Res. 1.446/1988) –, a chamada faixa livre abriga financia-mentos habitacionais com encargos convencionados entre as partes (Circular nº 1.278, de 05.01.1988, do Banco Central).

Dizer encargos convencionados entre as partes é dizer, todos sabem, que o mutuário ingressa no território, este sim livre, dos banqueiros.

Nos financiamentos dessa faixa (20% e 65% dos recursos captados em poupança), o princípio da correlação entre a renda do mutuário e os encargos assumidos desaparece. Ficam assegu-rados apenas os ganhos dos banqueiros, com o retorno dos recursos aplicados garantido pela hipoteca do imóvel.

Mais um caso.

Outra incongruência a comprometer o princípio de manutenção da relação renda/prestação é a aplicação da famigerada TR (Taxa Referencial de Juros) no reajuste das prestações mensais e do saldo devedor. Embora seu emprego, como taxa de juros, tenha sido condenado há muitos anos pelo STF, é mantida impavidamente pela tecnocracia oficial, fazendo com que a Justiça mais se sobrecarregue de processos repetitivos.

A criatividade veio no bojo de mais um plano econômico. O art. 18 da Lei nº 8.177, de 01.02.1991, determinou a aplicação da TR, então criada, nas cadernetas de poupança e nas prestações e saldos devedores do SFH.

Hoje, a jurisprudência caminha firmemente no sentido da devida correção de rumos. Veja-se, a propósito, recente julgamento do TRF da 1ª Região (DJ, Seção 2, de 17.05.1996, p. 31863):

‘[...] 8. Contrariamente ao que vinha entendendo esta Turma, não pode a TR reajustar os sal-dos devedores; o INPC é o índice adequado, já que corresponde à variação do poder aquisitivo da moeda.’

Mais outro exemplo.

Também comprometendo grande parte dos financiamentos da chamada ‘faixa livre’, e talvez muitos outros, a Lei nº 4.380 (art. 6º, alínea e), em absoluta consonância com o § 3º do art. 192 da CF em vigor, estabelece que os juros convencionais não excedem de 10% ao ano. Então, a decisão do STF, que tem esse dispositivo como de eficácia contida, dependente de regulamentação através da lei complementar de que cuida o caput do referido artigo constitu-cional, vale para o restante do SFN e não para grande parcela dos empréstimos habitacionais.

Só outro caso.

O § 3º do art. 5º da Lei nº 4.380 dá uma garantia importante ao tomador de recursos do SFH:

‘Cada reajustamento entrará em vigor após 60 (sessenta) dias da data de vigência da alteração do salário mínimo que o autorizar e a prestação reajustada vigorará até novo reajustamento.’

Isso, segundo me parece, é norma geral, equiparável a direito individual, de natureza quase alimentar, porque concede uma folga para o mutuário recompor seu orçamento, e é importante para a segurança na aplicação do reajustamento da prestação. É direito do participante do sistema, qualquer que seja a data de seu ingresso no mesmo.

Não poderia vir a Lei nº 8.004, de 14.03.1990, e atravessar:

‘Art. 17. O reajustamento das prestações dos mutuários enquadrados no Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional – PES/CP levará em consideração também o reajuste de salário concedido no próprio mês da celebração do contrato, ainda que a título de antecipação salarial.’

Algumas conclusões.

O Tribunal de Contas da União constatou:

‘3. É lamentável que os dados coletados, uma vez mais, demonstrem o descalabro do SFH, com consequente prejuízo para a política operacional do Governo e para a população como um todo.

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4. Mais do que nunca, nesse momento em que a Nação principia a retomada dos rumos do desenvolvimento e o novo Governo pretende imprimir profundas mudanças de ordem social, econômica e financeira, faz-se necessário alertar o Executivo de que não bastam ao bom andamento do Estado a supressão da concessão de benefícios e o aumento da arrecadação, fazendo-se necessária a conjugação desses esforços com uma política de austeridade no con-trole da aplicação dos recursos públicos.’ (Do voto do Ministro Luciano Brandão no Proc. TC 25.637/92-4, Revista TCU, v. 26,nº 63, p. 1, jan./mar. 1995)

Acrescentaria que aquele descalabro decorre também do vezo tecnocrático em relação às normas da boa técnica jurídica, com o que se contornam dispositivos legais e princípios tidos como empecilhos aos desígnios oficiais.

No entanto, quando se ferem direitos individuais, entra em cena indefectivelmente o Poder Judiciário e correções de rumo necessariamente ocorrerão, mesmo quando tidas como deci-sões absurdas.

Nesse sentido, deve ser estendido o alerta ao Poder Executivo, de que fala o Ministro Luciano Brandão, até porque isso vem em prol da tão desejada contenção de despesas, na medida em que se alivia a Justiça de milhares de processos repetitivos decorrentes de normativos ilegais ou mal-elaborados.

Também ao Poder Legislativo pode-se imputar a responsabilidade por esse caos, não só porque não legisla com boa técnica, mas porque o faz a reboque das medidas provisórias do Poder Executivo e, principalmente, não elabora a lei complementar que deve regulamentar o sistema financeiro nacional.

Na verdade, porém, o SFH está em extinção. Seu maior inimigo é o entendimento extrema-mente duvidoso – porque já vem de longa data e nunca deu resultados – de que salário digno gera inflação.

Salários comprimidos não podem sustentar o sistema, que exige juros estratosféricos, correção integral, e outros acessórios convenientes.

De outra parte, não se pode simplesmente pensar em transferir para o contribuinte, debitando--se à conta do Tesouro Nacional, os erros, os rombos e as mazelas do sistema. O contribuinte também possui os seus direitos e o exercício dos mesmos conduzirá a mudanças de rumo das políticas oficiais.

De sua parte, o Poder Judiciário deverá continuar aplicando de forma correta e científica as leis, considerando o sistema hierárquico e constitucional das mesmas. Isso é garantia de segu-rança social e jurídica. É direito dos cidadãos. E é fator educativo da maior importância para o restabelecimento, inclusive de modo preventivo, do ordenamento jurídico, resgatando tradição de técnica esmerada, já longínqua, de nosso Direito.” (Sistema Financeiro da Habitação (SFH) – Estrutura legislativa. Disponível em: online.sintese.com)

2530 – SFH – certidão de inteiro teor de divórcio em substituição à certidão de casamento com a averbação do divórcio – possibilidade

“Processual civil. Mandado de segurança. SFH. Certidão de inteiro teor de divórcio em substituição à certidão de casamento com a averbação do divórcio. Possibilidade. Princípio da razoabilidade. Sentença mantida. 1. Ressalto, inicialmente, que o exame dos referidos pedidos, por força do de-ferimento da medida liminar pleiteada, não implica a perda de objeto do writ, mas, ao contrário, o reconhecimento do pedido, de modo a ensejar a concessão da segurança. 2. No caso em questão, verifico que o inconformismo do impetrante decorreu da negativa da Caixa Econômica Federal – CEF em aceitar a certidão de inteiro teor da ação de divórcio em substituição à certidão de casamen-to com a devida averbação de divórcio, para análise da concessão de financiamento residencial. 3. ‘No caso em tela, reconheço verossimilhança do direito alegado, tendo em vista que o impetrante apresentou perante o impetrado as informações da ação de divórcio no sentido de que foi senten-ciada favoravelmente à dissolução da sociedade conjugal à revelia da ré, ex-cônjuge, separada de

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fato há 24 anos. A averbação do divórcio no cartório de registro só não teria ocorrido em face dos prazos inerentes ao trâmite do processo judicial’, como bem fundamentou o MM. Juiz de base. 4. Recurso conhecido e não provido. (TRF 1ª R. – RN 0003252-13.2014.4.01.3603 – Rel. Des. Kassio Nunes Marques – J. 24.10.2016)

2531 – SFH – cobertura securitária – ocorrência de sinistro – invalidez permanente – prescrição ânua

“Agravo interno no recurso especial. Contrato de mútuo. SFH. Cobertura securitária. Ocorrência de sinistro. Invalidez permanente. Prescrição ânua. Decisão monocrática que deu provimento ao apelo extremo da ré, reconhecendo a prescrição da pretensão autoral. Insurgência da autora. 1. Marco inicial para contagem da prescrição fixado pelo acórdão recorrido, em consonância com a legislação de regência e a jurisprudência desta Corte. Pretensão de revisão que esbarra no óbice da Súmula nº 7 do STJ. Precedentes. 2. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-REsp 1.368.619 – (2013/0040116-1) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 10.10.2016 – p. 1688)

2532 – SFH – contrato – arrematação do bem por terceiros – falta de interesse na revisão con­tratual

“Civil. Processo civil. SFH. Contrato. Arrematação do bem por terceiros. Falta de interesse na revi-são contratual. Extinção do feito sem resolução de mérito. Sentença reformada. 1. O cerne da con-trovérsia gira em torno da revisão de contrato de financiamento para aquisição de casa própria pelo Sistema Financeiro da Habitação, em que o contrato se encontra rescindido em razão do não paga-mento das prestações, tendo havido adjudicação do bem. 2. A arrematação do imóvel por terceiros c a prova de que o bem foi previamente retomado pelo agente financeiro, de forma que o contrato de financiamento está extinto, operando-se a quitação da dívida, pelo que perde, o mutuário, o interesse processual na revisão contratual. 3. Reforma da sentença para julgar extinto o processo sem resolução do mérito, verificada a inexistência de interesse processual na providência requerida nestes autos, sob o aspecto da utilidade em se apreciar as questões do contrato de mútuo habita-cional, já rescindido. 4. Agravo retido improvido. 5. Apelação conhecida e provida.” (TRF 2ª R. – AC 0004820-70.2012.4.02.5102 – 6ª T. – Rel. Guilherme Calmon Nogueira da Gama – DJe 10.11.2016 – p. 295)

2533 – SFH – contrato de financiamento – ocupação por terceiros – imissão de posse

“Direito civil. Sistema financeiro da habitação. Contrato de financiamento. Ocupação por terceiros. Imissão de posse improcedente. Rescisão contratual. Dano material e dano moral. Lucros cessan-tes. Sentença parcialmente reformada. 1. A controvérsia do presente feito, relativamente a imóvel financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, cinge-se em saber se a rescisão do contrato com a CEF gera o pagamento de reparação a título de danos morais e o pagamento de lucros cessantes, perquirindo a legislação para o pagamento da correção monetária. 2. Hipótese na qual os mu-tuários adquiriram um imóvel financiado por contrato, com a CEF, estando o bem ocupado por terceiros. Frente ao reconhecimento do usucapião pelos ocupantes, a posse dos novos proprietários foi obstada. 3. Responsabilidade civil da ré evidente, eis que omitiu aspecto essencial ao desfecho do negócio jurídico entabulado, qual seja, a informação clara acerca da existência da ocupação longa do imóvel por terceiros, nota esta fundamental para que o autor pudesse avaliar a extensão do empecilho que poderia vir a impedir o seu pleno exercício direito de propriedade e até mesmo desistir do negócio jurídico. 4. A descrição dos fatos ensejou o que a doutrina exige para a confi-guração do dano, ou seja, sentimento de angústia, de trauma, de abalo, de tormento, de sofrimento psíquico. Daí é que, comprovado o efetivo dano, a ação comissiva ou omissiva do agente e o nexo de causalidade entre ambos, mostra-se devida a imputação de responsabilidade civil à parte da ré,

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fixando-se o valor em R$ 10.000,00 (dez mil reais). 5. Para que haja a determinação de pagamento de valores a título de lucros cessantes, deve haver a comprovação dos mesmos nos autos onde é feito o pedido. 6. A correção monetária deve obedecer o Manual de Cálculos da Justiça Federal. 7. Afastada a sucumbência recíproca, fixa-se a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, valor este razoável e compatível com a causa em análise. 8. Apelação conhe-cida e parcialmente provida.” (TRF 2ª R. – AC 0007172-33.2014.4.02.5101 – 6ª T. – Rel. Guilherme Calmon Nogueira da Gama – DJe 28.10.2016 – p. 481)

2534 – SFH – execução extrajudicial – revisão contratual – contrato de mútuo com alienação fiduciária em garantia

“SFH. Execução extrajudicial. Revisão contratual. Contrato de mútuo com alienação fiduciária em garantia. 1. Agravo retido conhecido e desprovido, tendo em vista que a incidência do CDC não desonera a parte autora do ônus de comprovar suas alegações, especialmente quando apontada a ocorrência de nulidades ou violação dos princípios que regem os contratos desta natureza, o que não ocorreu no caso concreto. Quanto à perícia contábil, verifica-se que, em razão do tema e dos documentos já anexados aos autos, não há que se falar em produção de outras provas no caso, ob-servada a previsão contratual do SAC como sistema de amortização, o que afasta a necessidade de perícia, e a previsão expressa no sentido de não aplicação do PES no recálculo do encargo mensal. 2. Apelação conhecida apenas quanto às teses apresentadas na petição inicial (sobrestamento do feito em razão dos RE 627.106/PR e RE 556.520/SP, aplicabilidade do CDC ao caso, utilização do FGTS para pagamento de prestações vencidas e vincendas, exclusão do seguro, exclusão da taxa operacional mensal, falta de notificação da execução extrajudicial, averbação da demanda no RGI e indenização por danos morais), configurando as demais teses inovação recursal. 3. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido. A parte autora objetiva a suspensão ou anulação da execução extrajudicial do imóvel objeto de contrato de financiamento imobiliário, bem como a revisão contratual. 4. Quanto ao pedido de sobrestamento do feito até o julgamento definitivo do RE 627.106/PR e RE 556.520/SP pelo STF, inexiste determinação de suspensão dos julgamentos dos processos com o tema objeto de repercussão geral. E, enquanto não julgado pelo STF (há pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes em ambos os recursos), vale o entendimento anterior pela constitucionalidade do procedimento de execução extrajudicial previsto no Decreto--Lei nº 70/1966. Ademais, o pedido de declaração de nulidade do procedimento de execução extrajudicial foi formulado com referência ao Decreto-Lei nº 70/1966, embora o contrato firmado entre as partes tenha sido garantido por alienação fiduciária, conforme cláusula décima quarta. A intimação deveria ser efetuada para que a apelante purgasse a mora, dando-se início ao proce-dimento de consolidação da propriedade, com base na Lei nº 9.514/1997, e não no Decreto-Lei nº 70/1966. Além disso, a petição inicial é genérica, inexistindo, como destacado na sentença, ‘considerações ou fundamentos na inicial sobre eventual falta de notificação’. 5. Quanto à alegação de ser o título ilíquido, o que impediria a execução, novamente se verifica a impugnação ao proce-dimento de execução extrajudicial com base no Decreto-Lei nº 70/1966, situação diversa dos autos, já que se trata de procedimento de consolidação de propriedade referente a contrato com alienação fiduciária em garantia, nos termos da Lei nº 9.514/1997. 6. A questão do levantamento do saldo de conta vinculada ao FGTS já foi reiteradamente analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, que tem jurisprudência pacífica no sentido de que se deve possibilitar a utilização dos saldos para o paga-mento de prestações em atraso de financiamentos imobiliários, sejam eles contratados no âmbito do SFH ou fora dele. Entretanto, no caso dos autos, houve o vencimento antecipado da dívida ante o atraso superior a 60 dias no pagamento das prestações (encargos em aberto desde agosto de 2011), de acordo com expressa disposição contratual (cláusula décima sétima, ‘a’), e o procedimento de consolidação da propriedade foi iniciado, o que impede qualquer discussão quanto ao pagamento

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da dívida (com ou sem recursos do FGTS). 7. No mais, os argumentos levantados contra os crité-rios da CEF (seguro, taxa operacional mensal, averbação da demanda no RGI e indenização por danos morais) são desprovidos de amparo, conforme vários precedentes sobre a matéria. 8. Agravo retido conhecido e desprovido. Apelo parcialmente conhecido e, na parte conhecida, desprovido.” (TRF 2ª R. – AC 0001289-49.2014.4.02.5152 – 7ª T.Esp. – Rel. José Antonio Lisbôa Neiva – DJe 09.11.2016 – p. 595)

2535 – SFH – indeferimento de prova oral – cerceamento de defesa – não caracterização

“Civil. Processual civil. Apelação cível. SFH. Indeferimento de prova oral. Cerceamento de defesa não caracterizado. Negócio jurídico não concluído. Ausência de contrato de mútuo. Proposta de reserva de unidade habitacional. Comissão de corretagem devida pelo consumidor. Legalidade. Danos materiais e morais. Inexistência de responsabilidade civil. Honorários recursais. Não cabi-mento. Recurso não provido. 1. Não há falar em cerceamento de defesa, no caso. Em observância ao art. 130 do Código de Processo Civil, deve prevalecer a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da realização de determinada prova, de acordo com as peculiarida-des do caso concreto. Precedente. 2. O dano material atinge o patrimônio daquele contra o qual é praticado o ato ilícito e divide-se em dano emergente (aquilo que a vítima efetivamente perdeu) e lucro cessante (perda do ganho esperado, no caso, pela paralisação da atividade lucrativa). 3. Os valores desembolsados a título de comissão de corretagem não ensejam ressarcimento, sendo válida a cláusula que transfere ao consumidor a obrigação de pagá-los, desde que informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem. Prece-dente obrigatório. 4. No caso, a proposta juntada aos autos discrimina a quantia a ser paga a título de reserva da unidade autônoma e o preço desta última, cumprindo a condição exigida pelo prece-dente dotado de força vinculante. Inexiste a responsabilidade civil do apelado, portanto, porquanto ausente o ato ilícito. 5. Dano moral, de acordo com a melhor doutrina e com o entendimento sedi-mentado nas cortes superiores, é a lesão a direito da personalidade. Em outros termos: corresponde a toda violação ao patrimônio imaterial da pessoa no âmbito das suas relações de direito privado. Não se confunde, no entanto, e nem poderia, sob pena de banalização do instituto, com aconte-cimentos cotidianos que, apesar de incomodarem, não têm aptidão para atingir, de forma efetiva, direitos da personalidade. Tais acontecimentos têm sido tratados, com acerto, pela jurisprudência, como ‘meros aborrecimentos’, inafastáveis na sociedade contemporânea, devendo ser suportados por seus integrantes, ou punidos administrativamente, para que o instituto do dano moral não perca seu real sentido, sua verdadeira função: compensar o lesado pela violação à sua personalidade. 6. No caso concreto, além de não trazerem elementos que conduzissem à conclusão pela ilicitude do comportamento da ré, os apelantes não demonstraram a ocorrência de lesão a seus direitos da personalidade. Na verdade, apenas passaram por aborrecimento cotidiano, pois se ofenderam com o fato de que o imóvel foi adquirido por outros compradores. Precedentes. 7. Considerando que o recurso foi interposto sob a égide do CPC/1973 e, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a 18.03.2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do CPC/2015. 8. Preliminar afastada. Apelação não provida.” (TRF 3ª R. – AC 0000292-27.2013.4.03.6105/SP – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Hélio Nogueira – DJe 18.11.2016 – p. 174)

2536 – SFH – seguro – vícios construtivos – mora da seguradora – pagamento da indenização – multa decendial

“Agravo interno. Agravo em recurso especial. SFH. Seguro. Vícios construtivos. Mora da segura-dora. Pagamento da indenização. Multa decendial. Limitada ao valor da obrigação principal. 1. O

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������235

Tribunal de origem, ao concluir que a multa decendial é devida pela seguradora, mas limitada ao valor da obrigação principal, decidiu em consonância com precedentes desta Corte. Incidência da Súmula nº 83/STJ. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 927.423 – (2016/0149956-2) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 07.11.2016 – p. 1451)

2537 – Usucapião – área do imóvel superior à inscrita – retificação

“Agravo de instrumento. Usucapião. Área do imóvel superior à inscrita. Pretensão de que correta fosse a retificação. Desprovimento. O registro imobiliário confere a propriedade do imóvel nos limites que descreve. Se a posse é sobre área maior que a titulada, por erro, cabe retificação; porém justifica-se a usucapião se há aquisição de propriedade sobre área muito maior que a registral e há oposição, se essa posse é negada e se alega invasão de limites dos imóveis confinantes.” (TJSC – AI 0144415-14.2015.8.24.0000 – Rel. Des. Domingos Paludo – J. 25.08.2016)

Comentário Editorial SínTESEO agravo é movido por confinante de imóvel usucapiendo, cuja área estaria sendo invadida parcialmente pelo agravado. O correto, defende, seria o manejo de ação de retificação do registro.

A ação de usucapião é apropriada para a obtenção da propriedade sobre área que desborde do título de propriedade que o agravado ostenta, mormente se há oposição de algum dos lindeiros, como na espécie.

A ação de retificação cabe em casos de incorreções registrais, ainda que sobre a área, mas sem propósito de aquisição de propriedade sobre áreas enormes, como no caso, e, logicamente, desde que não haja oposição.

O TJSC negou provimento ao agravo.

Citamos, a seguir, trecho da doutrina de Carlos José Cordeiro:

“Professor Orlando Gomes diz que a tese da autonomia da usucapião é consagrada nas mo-dernas legislações, e traça com clareza a distinção entre os dois institutos. Assim, do ponto de vista da finalidade, a prescrição é um modo de extinguir pretensões, enquanto o usucapião é modo de adquirir direitos reais. A base dos institutos também é diversa; na prescrição, é a inércia do sujeito de direito; no usucapião, é a posse continuada. Diverso é o aspecto da apli-cabilidade; o usucapião restringe-se aos direitos reais. A prescrição, por fim, tem um sentido negativo, de extinção, enquanto que o usucapião é positivo, como força geradora. E conclui: ‘Não há que falar, por conseguinte, em prescrição aquisitiva’.

No mesmo sentido, aponta Eduardo Espínola, reconhecendo que há regras comuns às duas espécies de prescrição, aquisitiva (suposto usucapião) e extintiva, porém há entre elas diferen-ças substanciais: a prescrição aquisitiva tem essencialmente por base a posse, e assim exige a boa-fé; a prescrição extintiva, em regra, dispensa a posse, não exige por parte do devedor o requisito da boa-fé; a prescrição aquisitiva pode ser fonte de uma ação ou de uma exceção em proveito do adquirente; a extintiva, sendo praticamente um meio de refletir a ação, se apresen-ta sempre como exceção; o campo da prescrição aquisitiva não é tão vasto como o da extintiva: a primeira limita-se à aquisição da propriedade e dos direitos reais; a extintiva abrange todo o domínio do direito civil, aplicando-se a todas as classes de relações jurídicas.

Dessa forma, entende-se não se poder, sob a análise científica, considerar a usucapião como uma espécie de prescrição aquisitiva, uma vez que diversos são os seus regimes, somente tendo incidência comum o decurso do tempo, como forma de contato entre os dois institutos. Essa afirmativa acompanha o posicionamento do Professor Nélson Luiz Pinto, que, citando Lafayette, assevera ‘ter a prescrição conotação negativa, isto é, nascer da inércia, tendo por efeito dissolver a obrigação e paralisar o direito correlato, e, consequentemente, não gerar direitos. A usucapião, ao contrário, é positivo, porque no seu modo de atuar predomina a força geradora; o proprietário perde o domínio não só por sua inércia, mas também porque o adquire

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236 ������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO

o possuidor. Assim, o não uso do direito de propriedade não importa sua extinção, por ser imprescritível, enquanto existir o seu objeto (propriedade). De sorte que a única possibilidade que se apresenta é a da aquisição por outrem, denominada usucapião, quando, então, o objeto passará a outro titular’.

Pode-se, assim, esclarecido que a usucapião é uma forma de aquisição da propriedade, dentre

os vários conceitos oferecidos pela doutrina, apresentar, segundo Nélson Luiz Pinto, ‘o que

mais se aproxima do nosso ordenamento jurídico’, de lavra de Modestino: ‘O usucapio este

adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definit, ou, o modo de ad-

quirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso de tempo, com os requisitos

estabelecidos na lei’.

Observa-se, dessa última conceituação, bem como das outras arroladas, que dois são os

elementos básicos, essenciais, para a aquisição por usucapião: posse e tempo. Exigindo-se,

ainda, o animus domini. Ressalte-se que outros elementos podem se fazer presentes nas

várias espécies de usucapião (ordinário, extraordinário e especial), tais como o justo título e a

boa-fé, os quais serão analisados no momento oportuno.

[...]

Feitas as considerações iniciais sobre a usucapião e ressaltada a importância do instituto, cabe

revelar que o direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usucapião

extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do

CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respectivamente nas moda-

lidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei

nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF, no art. 191; e usucapião especial urbano,

introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.

Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a

distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de outro tema monográ-

fico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir,

exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua concessão, coisa hábil, posse, lapso

de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título.

Por aí, percebe-se que para ocorrer a usucapião em geral, faz-se necessário o concurso de cer-

tos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direitos

que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à

qualificação da posse (especiais).

A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dissecados os

requisitos da usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos,

‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos referentes

à usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’.

Os requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de forma a

abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência da usucapião, concebendo-se, assim, a

aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.

Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para possuir.

Nesse engate, entende Lenine Nequete que são capazes de possuir tanto as pessoas físicas

quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito público e, inclusive, os

incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou

testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.

Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se permite a

alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que

seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que

pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usuário,

o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto, etc.’.

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������237

Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes, e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos ab-solutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião.

Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacional, etc.

Antônio Ferreira Inocêncio relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com a usucapião. Assim, tem-se:

‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens;

b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, II);

c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III);

d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, parágrafo único, e 168, IV).’

Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicável o usucapião.

Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao proprietário intentar a usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usucapião.

A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utilidade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’.

Os requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aquisição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comércio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.

Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles, ‘haver coisas naturalmente insuscetíveis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar, a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.

Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que quando a inalienabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião.

Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos objetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação.

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A propósito, ensina Wolff que ‘sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que

faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propiedad, la superficie, las

servidumbres’.

Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens

públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340 do STF, pois

que ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não

podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretório Excelso foi acompanhada

pelo atual texto constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.

A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível, sendo indispensável para os imóveis

que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas características, extensão e

confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatível com a indetermi-

nação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.

Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usucapião

sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica. Vale dizer,

também, que embora na usucapião de imóvel exija-se certeza e determinação, tem-se admi-

tido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quando a

posse do todo é exercida conjuntamente.” (CORDEIRO, Carlos José. Usucapião. Juris SÍNTE-

SE, Porto Alegre: IOB/Thomson, nov./dez. 2005. 56 CD-Rom)

2538 – Usucapião – bem de família – reexame de fatos e provas – impossibilidade

“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Imóvel que foi reconhecido por decisão judicial como objeto de usucapião e como bem de família. Reexame de fatos e provas. Impossi-bilidade. Matéria infraconstitucional. Ausência de ofensa constitucional direta. Agravo regimental não provido. 1. Inviável o processamento do recurso extraordinário quando para seu deslinde seja necessária a análise de legislação infraconstitucional aplicável. 2. Para divergir da conclusão ado-tada pelo tribunal a quo, seria necessário o reexame de fatos e provas. Óbice da Súmula nº 279, do STF. 3. Agravo regimental, interposto em 04.04.2016, a que se nega provimento, com previsão de aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, CPC.” (STF – AgRg-RE-Ag 912.990 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Edson Fachin – J. 28.10.2016)

2539 – Usucapião – imóvel urbano – alegação de se tratar de terras devolutas – titularidade do terreno não comprovada

“Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de usucapião. Imóvel ur-bano. Alegação de se tratar de terras devolutas. Titularidade do terreno não comprovada. Alegada violação ao art. 535, II, do CPC/1973. Inexistência de vícios, no acórdão recorrido. Inconformismo. Agravo interno improvido. I – Agravo interno interposto contra decisão monocrática publicada em 02.06.2016, que, por sua vez, julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/1973. II – Não há falar, na hipótese, em violação ao art. 535, II, do CPC/1973, porquanto a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que o voto condutor do acórdão recorrido apreciou fundamentadamente, de modo coerente e completo, as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida. III – Ademais, consoante a jurisprudência desta Corte, não cabem Declaratórios com objetivo de provocar prequestionamento, se ausentes omissão, contradição ou obscuridade no julgado (STJ, AgRg-REsp 1.235.316/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 1ª T., DJe de 12.05.2011), bem como não se presta a via declaratória para obrigar o Tribunal a reapreciar provas, sob o ponto de vista da parte recorrente (STJ, AgRg-Ag 117.463/RJ, Rel. Min. Waldemar Zveiter, 3ª T., DJU de 27.10.1997). IV – Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 890.109 – (2016/0077167-9) – 2ª T. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 17.11.2016 – p. 1316)

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2540 – Usucapião extraordinária – prazo prescricional

“Usucapião extraordinária. Prazo prescricional. 1. Ainda que a CEF alegue que a citação da ação de imissão de posse do apelado se deu em 16.09.1998, interrompendo, assim, o prazo prescricional necessário para a constituição do domínio, tal fato não deverá ser considerado no caso em tela. 2. Há prova nos autos de que a autora e seu marido passaram a residir no imóvel de matrícula nº 554 desde o ano de 1976, o que foi corroborado com o depoimento de testemunhas residentes no bairro, de forma inquestionável. 3. Todas estas testemunhas apontam a ocupação do bem pelo casal, onde cultivavam mandioca para consumo próprio, desde a data do abandono do proprietário original, Sr. Ney Costa. 4. Documentos comprobatórios da referida posse, como pagamento de taxas e demais dívidas incidentes sobre o bem imóvel foram apresentados nos autos. 5. A sentença afastou, de igual forma, fundamentadamente, eventuais vícios existentes no exercício da posse dos autores apelados, como violência, clandestinidade ou precariedade. 6. Vê-se, destarte, que a ação de imissão de posse intentada contra os autores fora levada a cabo quando estes já haviam comple-tado o lapso prescricional aquisitivo previsto no art. 1.238 do Código Civil, dado o longo exercício de posse contínua. 7. Além disso, a referida sentença de imissão de posse foi julgada improcedente, exatamente por ter reconhecido o direito de posse legítima dos apelados sobre o bem imóvel em tela. Sendo assim, o reconhecimento do domínio da área pela apelada há de ser mantido. 8. Re-curso desprovido.” (TRF 3ª R. – AC 0006343-29.2005.4.03.6107/SP – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Cotrim Guimarães – DJe 17.11.2016 – p. 505)

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Clipping JurídicoIndisponibilidade de bens só pode ser decretada quando o débito for superior a 30% do patrimônio da empresa

A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região deu provimento ao agravo de instru-mento interposto por uma empresa contra decisão da Vara Única de Lavras que decretou a indisponibilidade dos seus bens até o limite do crédito tributário constituído. Consta nos autos que o juízo de origem deferiu a medida cautelar fiscal sob o fundamento de que os débitos consolidados da empresa ultrapassariam 30% do patrimônio da mesma. A agravante, entretanto, negou que o total dos débitos ultrapassassem esse valor, alegando que o juiz se baseou, equivocadamente, em uma Declaração de Rendimentos da Pessoa Jurídica de outro ano-base. No voto, o Relator do processo, Desembargador Federal Marcos Augusto de Sousa, destacou que a União limitou-se a alegar que a medida foi postulada com fundamento no art. 2º, inciso II, da Lei nº 8.397/1992 (Lei de Medida Cautelar), justificando a decisão pelo des-cumprimento das exigências legais relativas ao arrolamento de bens cometido pela empresa. Para o magistrado, no entanto, foi comprovado que a dívida tributária da agravante é inferior a 30%, o que inviabiliza o deferimento da medida postulada. Além disso, o desembargador res-saltou que não há elemento de convicção quanto ao descumprimento do inciso VII do mesmo dispositivo legal e que a decisão merecia reforma para determinar o desbloqueio dos bens da em-presa afetados por ela. A decisão foi unânime. Processo nº 0003346-32.2016.4.01.0000/MG. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Box em garagem não faz parte de apartamento e pode ser penhorado separadamente

Box em garagem de condomínio pode ser levado à penhora separadamente do imóvel. Na última semana, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou pedido de um morador de Caxias do Sul (RS) acionado em uma execução fiscal movida pela Caixa Econômica Fede-ral. Ele requeria a impenhorabilidade da vaga, mesmo tendo registro próprio no cartório, sob a alegação de que fazia parte de seu apartamento, imóvel impenhorável por ser bem de fa-mília. Os embargos à execução da sentença da ação vencida pelo banco foram ajuizados em novembro do ano passado. Segundo autor, além de servir de vaga de estacionamento, o box serviria também como depósito de objetos da família, que não podem ser acondicionados no apartamento, tais como bicicletas e cadeiras. Logo, a legislação garantiria a posse à sua famí-lia. A 3ª Vara Federal do Município rejeitou a solicitação do morador. Conforme a sentença, a vaga de garagem com matrícula individualizada não é amparada pela proteção conferida ao bem de família. Também acrescentou que a possibilidade de penhora persiste mesmo quando a vaga de garagem guarda vinculação com imóvel. O autor recorreu ao Tribunal. O Relator do caso na 3ª Turma, Desembargador Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, manteve o entendimento. Segundo o magistrado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é pacífica quanto a esse entendimento. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

Isenção de IR em ganho de capital na venda de imóvel vale para quitar segundo bem

O entendimento da Segunda Turma foi formado após analisar um recurso interposto pela Fazenda Nacional contra decisão favorável obtida por um contribuinte de Santa Catarina na Justiça Federal. A isenção do Imposto de Renda (IR) sobre ganho de capital nas operações de alienação de imóvel, prevista no art. 39 da Lei nº 11.196/2005, também é válida para os casos de venda de imóvel residencial com o objetivo de quitar, total ou parcialmente, débito

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – CLIPPING JURÍDICO �������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������241

remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo con-tribuinte. Com essa decisão, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou ilegal a restrição estabelecida no art. 2º, § 11, I, da Instrução Normativa nº 599/2005 da Recei-ta Federal, que excluía da isenção fiscal a possibilidade de o contribuinte utilizar o ganho de capital para quitar financiamento de imóvel já adquirido. O entendimento da Segunda Turma, especializada em direito público, foi formado após analisar um recurso interposto pela Fazen-da Nacional contra decisão favorável obtida por um contribuinte de Santa Catarina na Justiça Federal. • Ganho: Em março de 2013, o contribuinte vendeu por R$ 285 mil um apartamento em Foz do Iguaçu (PR), comprado por R$ 190 mil, e obteve, assim, um ganho de capital de R$ 95 mil. Em seguida, utilizou esse montante na quitação das obrigações assumidas com a compra de um apartamento em Itajaí (SC), acreditando que não teria de pagar imposto sobre o ganho de capital. Como a Receita Federal tinha entendimento de que essa operação não dava direito à isenção, o contribuinte ajuizou mandado de segurança na Justiça Federal e ob-teve decisão favorável. A Receita recorreu, então, ao STJ. O recurso foi relatado pelo Ministro Herman Benjamin, da Segunda Turma. Benjamin aceitou os argumentos apresentados pela Receita Federal, mas a maioria da Turma acabou seguindo a divergência aberta pelo Ministro Mauro Campbell Marques, que apresentou voto vista favorável ao contribuinte. Para ele, a restrição imposta pela instrução normativa “torna a aplicação da norma quase impossível”. • Sem liquidez: No voto divergente, o ministro salientou que a grande maioria das aquisições imobiliárias é feita mediante financiamento de longo prazo, porque a regra é que a pessoa física não tem liquidez para adquirir um imóvel residencial à vista. “Outro ponto de relevo é que a pessoa física geralmente adquire o segundo imóvel ainda ‘na planta’ (em construção), o que dificulta a alienação anterior do primeiro imóvel, já que é necessário ter onde morar. A regra, então, é que a aquisição do segundo imóvel se dê antes da alienação do primeiro imóvel”, afirmou o ministro. Segundo ele, a finalidade da norma é alcançada quando se permite que o produto da venda do imóvel residencial anterior seja empregado, no prazo de 180 dias, na aquisição de outro imóvel, “compreendendo dentro desse conceito de aquisição também a quitação do débito remanescente do imóvel já adquirido ou de parcelas do finan-ciamento em curso firmado anteriormente”. • Círculo virtuoso: Mauro Campbell Marques ressaltou que, se o objetivo da norma é dinamizar a economia, “indubitavelmente, o aumento da liquidez no mercado proporcionada pela isenção do capital empregado no pagamento de contratos a prazo e financiamentos anteriores estimula os negócios de todos os atores desse nicho: compradores, vendedores, construtores e instituições financeiras”. “Não se pode olvidar que o pagamento, pelas pessoas físicas, dos financiamentos anteriores em curso às instituições financeiras permite que estas tenham capital para emprestar às construtoras, a fim de serem construídas as novas unidades habitacionais, e também permite que tenham capital para emprestar a novos adquirentes de imóveis. Fomenta-se, assim, um círculo virtuoso. Esse o objetivo da norma”, justificou. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Aval em cédula de crédito comercial não exige autorização do cônjuge

Em julgamento de recurso especial, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de-cidiu que a garantia do aval em cédula de crédito comercial dispensa a outorga do cônjuge prevista no art. 1.647, III, do Código Civil de 2002. O caso envolveu empréstimo garantido por nota de crédito comercial avalizada por um homem sem a outorga uxória (consentimento de sua esposa). Houve a penhora de imóvel do casal, e, contra a execução do bem, a mulher

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interpôs embargos de terceiro. Para a esposa, como a hipoteca é modalidade de garantia real de dívida, o bem não poderia ser dado em garantia porque seu marido não tinha a livre dis-posição do imóvel, uma vez que precisava de sua autorização. A sentença negou os pedidos de cancelamento da penhora e de reconhecimento de nulidade do aval, mas determinou que fosse reservado à esposa metade do valor do bem penhorado, em caso de alienação. O Tri-bunal de Justiça manteve a decisão. • Tratamento adequado: No STJ, o Relator, Ministro Luis Felipe Salomão, reconheceu que alguns julgados do Tribunal declararam ser inválido o aval prestado sem a outorga do cônjuge, mas ressalvou que “a questão não vem recebendo trata-mento adequado no âmbito desta Corte Superior”. Segundo Salomão, “o aval, como qualquer obrigação cambiária, deve corresponder a ato incondicional, não podendo sua eficácia ficar subordinada a evento futuro e incerto, porque dificultaria a circulação do título de crédito, que é sua função precípua”. • Lei especial: O ministro destacou o art. 903 do Código Civil, que estabelece que os títulos de crédito serão regidos por esse código, desde que não exista disposição diversa em lei especial. Salomão defendeu, então, que a regra do art. 1.647 só alcança os títulos de crédito inominados. “Com o advento do CC de 2002, passou-se a existir uma dualidade de regramento legal: os títulos de crédito típicos ou nominados continuam a ser disciplinados pelas leis especiais de regência, enquanto os títulos atípicos ou inominados subordinam-se às normas do novo código, desde que se enquadrem na definição de título de crédito constante do art. 887 do CC”, explicou Salomão. O relator examinou os títulos de crédito comercial, então, sob as disposições da Lei Uniforme de Genebra (LUG) e do Decreto nº 2.044/2008. Como nenhuma das normas condiciona o aval à outorga do cônjuge, foi negado provimento ao recurso. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Venda com fraude a credor não compromete negócio subsequente do mesmo bem

A anulação da venda de um imóvel em razão do reconhecimento de fraude contra os credores não implica a desconstituição automática da venda subsequente do mesmo bem. Esse foi o entendimento unânime da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Conforme narram os autos, uma empresa em situação de falência alienou o imóvel em que funcionava para uma compradora, que posteriormente promoveu uma segunda venda do imóvel. A mas-sa falida ajuizou ação revocatória contra a primeira e a segunda compradoras, argumentando que a venda do imóvel foi efetivada em fraude aos credores. A sentença declarou a ineficácia das duas alienações e considerou que o imóvel deveria retornar ao ativo da empresa para posterior arrecadação pelos credores. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) confirmou a sentença e afirmou que a primeira venda ocorreu em período “suspeito para os efeitos de fraude contra credores”, quando a empresa já possuía vários protestos em seu nome, ficando configurada a fraude. Com relação à segunda compradora, o TJRJ entendeu que não havia necessidade de se demonstrar sua má-fé, não se manifestando sobre a existência ou não de fraude em relação a ela. • Prova exigida: No STJ, o Ministro Moura Ribeiro, Relator do recur-so, explicou que o art. 53 do Decreto-Lei nº 7.661/1945 prevê a possibilidade de revogação do ato praticado pelo falido com a intenção de prejudicar os credores, desde que seja pro-vada a fraude. Já o art. 55, parágrafo único, inciso III, alínea a, da mesma norma dispõe que a ação revocatória pode ser proposta contra o terceiro adquirente se este tiver conhecimento da intenção do falido de prejudicar os credores. O ministro afirmou que, revogada a primeira venda em razão da existência de fraude, “este efeito apenas alcança as partes que agiram em conluio contra os credores da massa falida”. Dessa forma, para que a segunda venda seja

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desconstituída, é necessária a prova de má-fé da compradora, “pois devem ser resguardados os interesses dos terceiros de boa-fé, já que aqui não se trata de uma simples declaração de ineficácia de negócio jurídico”, afirmou o ministro. Moura Ribeiro esclareceu que o STJ não poderia se manifestar quanto à existência ou não de má-fé da segunda compradora, pois isso exigiria o exame das provas do processo, inviável em recurso especial. Assim, foi determinado o retorno dos autos para que o TJRJ, a partir do entendimento fixado pela Terceira Turma, veri-fique a eventual existência de fraude na segunda transação com o imóvel. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Prazo para purga da mora na ação de despejo deve considerar juntada do mandado de citação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a contagem do prazo para purgação da mora na ação de despejo tem início no momento da juntada do mandado de citação aos autos. A decisão foi tomada após a análise de ação de despejo na qual se questio-nava a tempestividade de depósito realizado por locatário para evitar rescisão do contrato de locação. Em seu voto, o Ministro Relator, Villas Bôas Cueva, explicou que o questionamento a respeito do início do prazo para a purga da mora veio com a vigência da Lei nº 12.112/2009. Essa lei modificou o art. 62, II, da Lei nº 8.245/1991, estabelecendo um prazo de 15 dias, contado da citação, para a purga da mora. No entanto, apesar da nova redação do dispositivo legal, para o magistrado, é necessário que o artigo seja interpretado em conjunto com o Códi-go de Processo Civil de 1973. “O art. 62, II, da Lei nº 8.245/1991, em sua redação atual, por estabelecer prazo para a prática de ato processual, deve ser interpretado em conjunto com o disposto no art. 241, II, do CPC/1973, segundo o qual começa a correr o prazo, quando a citação ou intimação for por oficial de Justiça, da data de juntada aos autos do respectivo mandado devidamente cumprido”, afirmou o ministro. • IPTU: Embora tenha sido conside-rado tempestivo o depósito do recorrente, a Turma desproveu o recurso, pois entendeu que o valor não contemplava as parcelas relativas ao Imposto Predial (IPTU), conforme exposto pe-las instâncias ordinárias. “Conquanto efetuada a purga da mora no tempo devido, verificou-se posteriormente a insuficiência do valor depositado, não se chegando a outro resultado senão à procedência da ação de despejo”, concluiu o relator. O locatário alegou que não era de sua responsabilidade o pagamento do tributo, por não estar previsto no contrato de locação. Os ministros não acolheram a alegação e mantiveram o resultado do julgamento do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, visto que, nos autos, ao contrário do que afirmou o recorrente, havia informação sobre cláusula que obrigava o pagamento do imposto. • Reabertura de prazo: Na mesma ocasião, o órgão colegiado decidiu que “não faz nenhum sentido intimar o locatário para fins de purgação complementar da mora se já houve manifestação negativa de sua parte, em contestação, quanto à intenção de efetuar o pagamento de determinadas parcelas”, haja vista a preclusão lógica. O relator esclareceu que, “se a parte optou por con-testar parte do débito exigido, praticou ato incompatível com a vontade de purgar a mora, ao menos em relação aos valores questionados na contestação”, não se admitindo, pois, a rea-bertura de prazo para complementação do depósito, nos moldes do inciso III do art. 62 da Lei nº 8.245/1991. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Fechamento da Edição: 06�12�2016

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Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

ArtIgoS doutrINárIoS

• A Expressão “Mais ou Menos” no Registro Imobiliário João Pedro Lamana Paiva Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

• Bem de Família no Novo Código Civil e o Registro de Imóveis Ademar Fioranelli Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

• A Caução em Bens Imóveis na Lei nº 8.245/1991 e seu Acesso ao Registro de Imóveis

Erik Esswein Muller Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

• A Estatização dos Serviços de Registros de Imóveis Marcos Sousa e Silva Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET disponíveis em: online.sintese.com

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Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto especial

DOUTRINAS

Assunto

RegistRo eletRônico de imóveis

• Protocolo Eletrônico no Registro Imobiliário (Algumas Considerações) (Eduardo PachecoRibeiro de Souza) ..................................................9

• Registro de Imóveis Eletrônico. Uma Reflexão Tardia? (Flauzilino Araújo dos Santos) .................22

• Registro Eletrônico de Imóveis: um Avanço Ne-cessário (Maurício Vedovato, Thalita DuarteHenriques Pinto e Amanda Salis Guazzelli) .........42

Autor

amanda salis guazzelli, thalita duaRte henRiques pinto e mauRício vedovato

• Registro Eletrônico de Imóveis: um Avanço Ne-cessário ...............................................................42

eduaRdo pacheco RibeiRo de souza

• Protocolo Eletrônico no Registro Imobiliário (Algumas Considerações) .......................................9

Flauzilino aRaúJo dos santos

• Registro de Imóveis Eletrônico. Uma Reflexão Tardia? .................................................................22

mauRício vedovato, thalita duaRte henRiques pinto e amanda salis guazzelli

• Registro Eletrônico de Imóveis: um Avanço Necessário ...........................................................42

thalita duaRte henRiques pinto, mauRício vedovato e amanda salis guazzelli

• Registro Eletrônico de Imóveis: um Avanço Ne-cessário ...............................................................42

Índice geral

DOUTRINAS

Assunto

condomínio

• A Execução Direta das Taxas Condominiais no NCPC e a Celeridade Processual (DanielSobral dos Santos Longue) ...................................61

escRituRa

• Da Possibilidade de Lavratura de Escritura Pú-blica de Cessão de Direitos Hereditários de Bem Imóvel Singularmente Considerado sem Anuência de Todos os Herdeiros (Mariana Mendes Brito) ......................................................78

iptu

• Incidência de Alíquota Diferenciada do IPTU no Condomínio Fechado (Murilo Barreto do Nascimento) ........................................................92

RegistRo

• A Natureza da Atividade Notarial e de Regis-tro e a Incidência do ISSQN (Andréa CristinaCorreia de Souza Renault Baêta dos Santos) ........64

RegulaRização FundiáRia

• Regularização Fundiária: Extinção de Condo-mínio Rural (Dolglas Eduardo) .............................88

Autor

andRéa cRistina coRReia de souza Renault baêta dos santos

• A Natureza da Atividade Notarial e de Registro e a Incidência do ISSQN ......................................64

daniel sobRal dos santos longue

• A Execução Direta das Taxas Condominiais no NCPC e a Celeridade Processual .........................61

dolglas eduaRdo

• Regularização Fundiária: Extinção de Condomínio Rural ....................................................................88

maRiana mendes bRito

• Da Possibilidade de Lavratura de Escritura Pú-blica de Cessão de Direitos Hereditários de Bem Imóvel Singularmente Considerado sem Anuên-cia de Todos os Herdeiros ...................................78

muRilo baRReto do nascimento

• Incidência de Alíquota Diferenciada do IPTU no Condomínio Fechado ..........................................92

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Assunto

ação ReivindicatóRia

• Apelação cível – Ação reivindicatória c/c de-claratória de nulidade – Condomínio – Pro-priedade de área comum – Alteração de con-venção de condomínio para conceder direito a um dos condôminos de área comum (TJMG) ................................................................2491, 182

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246 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

ação RevocatóRia

• Agravo interno no agravo em recurso especial – Fundamentos da decisão agravada – Au-sência de impugnação – Art. 1.021, § 1º, do CPC/2015 – Súmula nº 182 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) .........................................2486, 130

coRRetagem

• Administrativo – Processual civil – Nomeação de perito – Corretor de imóveis – Falta de pre-questionamento – Súmula nº 211/STJ – Diver-gência jurisprudencial não demonstrada – Con-texto fático diferente – Inexistência de violação do texto do dispositivo legal (STJ) ............2485, 121

• Agravo de instrumento – Corretagem – Ação de manutenção de contrato de compra e venda – Tutela antecipada (TJRS) ..........................2494, 199

desapRopRiação

• Processual civil e administrativo – Recurso especial – Ação de indenização por desapro-priação indireta para implantação de rodovia asfaltada – Esbulho administrativo ocorrido em 1994 – Demanda ajuizada em 2006 – Uti-lização da regra de transição estabelecida no art. 2.028 do CC/2002 aplicando a mesma ló-gica jurídica que originou a Súmula nº 119/STJ, a reparação oriunda de desapropriação in-direta prescreve em 15 anos, nos termos do art. 1.238, caput do CC/2002 – Inaplicáveis ao poder público as hipóteses de redução do prazo contidas no parágrafo único – Benefício exclusivo do particular para fins de usucapião – Respeitosa divergência ao eminente relator, para dar provimento ao recurso especial e fixar o entendimento que nas ações de desapropria-ção indireta aplica-se o prazo prescricional de 15 anos determinado no caput do art. 1.238do CC/2002 (STJ) .....................................2487, 136

despeJo

• Apelação cível – Ação de despejo c/c rescisão de contrato de locação, cobrança de aluguéis, pedido de tutela antecipado, bem como plei-to reconvencional – Danos materiais e morais – Não ocorrência – Honorários advocatícios –Redução (TJGO) ......................................2490, 177

diReito de vizinhança

• Direito de vizinhança. Obrigação de fazer cumulada com reparação de danos. Infiltra-ções no imóvel da autora causadas pela própria geografia de seu terreno, mais baixo que o do imóvel vizinho, que não contém construção, e tampouco sofreu qualquer alteração que pudes-se piorar o escoamento natural das águas plu-viais. Proprietário do imóvel superior que não tem a obrigação legal de fazer obras de esco-amento ou canalização de águas. Ação julga-da improcedente. Sentença mantida. Recursoimprovido (TJSP) ......................................2496, 207

incoRpoRação imobiliáRia

• Direito civil e do consumidor – Incorporação imobiliária – Promessa de compra e venda – Re-solução por iniciativa do promitente comprador – Devolução dos valores pagos – Cláusula pe-nal – Abusividade – Redução equitativa – Arras – Restituição – Juros de mora – Termo inicial – Citação – Correção monetária – Honorários advocatícios – Sentença preponderantemente condenatória – Sucumbência recíproca – Divi-são proporcional das custas e honorários advo-catícios (TJDFT) .......................................2489, 160

locação

• Recurso inominado – Ação anulatória de con-trato de locação c/c indenização por danos materiais e morais – Imóvel que não tinha au-torização da municipalidade – Ausência de “habite-se” – Rescisão do contrato – Devido – Danos materiais comprovados – Lucros ces-santes indevidos – Não comprovado – Danos morais – Não configurado – Sentença parcial-mente reformada (TJPR) ...........................2492, 188

loteamento

• Embargos de declaração – Agravo de instru-mento – Ação civil pública – Loteamento ir-regular – Impacto ambiental – risco ecológico(TJRJ) ........................................................2493, 191

posse

• Agravo de instrumento – Ações de imissão de posse e anulatória de leilão extrajudicial – Co-nexão reconhecida na origem, com a conse-quente remessa dos processos à vara de direito bancário, da comarca de Itajaí – Impossibilidade – Decisão que, uma vez mantida, implicará em prorrogação da competência – Incompetência absoluta da vara de direito bancário para conhe-cer da ação de imissão de posse – Precedentes – Necessidade, ademais, de se reunir os feitos, discutível – Hipótese em que se recomenda a suspensão da actio por prejudicialidade externa (art. 265, inc. IV, a, do CPC/1973, com corres-pondente no art. 313, inc. V, do novel CPC) – Inviabilidade da análise do pleito de imissão de posse em caráter provisório, à míngua de pro-nunciamento, por ora, do juízo singular a respei-to – Reclamo prejudicado, no ponto – Agravo,no mais, conhecido e provido (TJSC) .......2495, 202

sFh

• Processual civil e civil – Sistema financeiro de habitação – Execução extrajudicial – Adjudi-cação do imóvel pelo agente financeiro – Não prejudicialidade da ação revisional – Revisão de contrato de mútuo hipotecário – Validade das cláusulas contratuais que preveem a Tabela Price como sistema de amortização e a atualiza-ção da dívida pelo índice de remuneração dos

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RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ���������������������������������������������������������������������������������������������������������247 depósitos de poupança – Obrigatoriedade dacontratação de seguro (TRF 2ª R.) ...........2488, 157

EMENTÁRIO

Assunto

ação anulatóRia

• Ação anulatória de adjudicação – pauliana erevocatória ..............................................2497, 210

ação de adJudicação compulsóRia

• Ação de adjudicação compulsória – contrato de promessa de compra e venda de imóvel – prin-cípio da dialeticidade ..............................2498, 210

• Ação de adjudicação compulsória de imóvel – decisão monocrática negando provimento – in-surgência dos autores ..............................2499, 211

ação de anulação

• Ação de anulação de escritura pública c/c par-tilha de bem imóvel – imóvel registrado em nome da avó – transferência a um terceiro – di-visão posterior às três netas – dispensa de fu-turo inventário .........................................2500, 211

ação de cobRança

• Ação de cobrança de taxas condominiais – le-gitimidade passiva – obrigação propter rem – responsabilidade do proprietário até o registroda compra e venda ..................................2501, 212

ação de dano inFecto

• Ação de dano infecto – paralisação da obra ................................................................2502, 214

ação de imissão na posse

• Ação de imissão na posse – natureza petitória – bem imóvel – cessão de direitos ..............2503, 214

ação de nunciação de obRa

• Ação de nunciação de obra nova ajuizada sob a égide do CPC/1973 – obra concluída no curso do processo – conversão em demolitó-ria – aumento de muro – direito de vizinhança e de construir ...........................................2504, 214

ação pauliana

• Ação pauliana – fraude contra credores – do-ação do único imóvel – devedora insolvente ................................................................2505, 215

• Ação pauliana (ou revocatória, do jurisconsulto paulus) – locação imobiliária comercial escrita– anulação de negócio jurídico ................2506, 215

adJudicação compulsóRia

• Adjudicação compulsória de imóvel – audiên-cia de conciliação – exclusão de litisconsorte ................................................................2507, 215

aRRas

• Arras – compra e venda – imóvel – rescisão c/c restituição de quantia paga – retenção ................................................................2508, 215

• Arras confirmatórias – compromisso de com-pra e venda – inadimplência do adquirente – rescisão ...................................................2509, 216

compRa e venda

• Compra e venda de imóvel na planta – atraso na conclusão – devolução integral dos valores pa-gos – arras – valor ....................................2510, 217

compRomisso de compRa e venda

• Compromisso de compra e venda – comis-são de corretagem – incorporação imobiliária ................................................................2511, 217

• Compromisso de compra e venda de bem imó-vel – indenização por danos morais e materiais – revisão do quantum ..............................2512, 217

• Compromisso de venda e compra e outros pactos – instrumento particular – tutela anteci-pada – pressupostos – dilação probatória 2513, 219

coRRetagem

• Corretagem – cheque para pagamento – compra de imóvel – negócio não concluído – comissão indevida ..................................................2514, 220

• Corretagem – comissão – ação de cobrança ................................................................2515, 220

• Corretagem – comissão – princípios do contra-ditório e da ampla defesa – ausência .......2516, 220

desapRopRiação

• Desapropriação indireta – bem de uso co-mum – indisponibilidade – suposta aquisição pelos recorridos – indenização – ilegitimidade ativa ........................................................2517, 221

diReito de vizinhança

• Direito de vizinhança – alegação de construção irregular de muro – indenização por danos ma-teriais e morais ........................................2518, 222

• Direito de vizinhança – construção do réu que ocasionou danos no imóvel do autor – nexo de causalidade comprovado .........................2519, 222

• Direito de vizinhança – negativa de prestação jurisdicional – não ocorrência – antecipaçãode tutela ..................................................2520, 222

doação

• Doação de bem imóvel pelo devedor – fraude à execução – impossibilidade de reconheci-mento ......................................................2521, 224

dúvida RegistRal

• Dúvida registral – compra e venda – suscitação ................................................................2522, 224

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248 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 36 – Nov-Dez/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

• Dúvida registral – mandado de segurança – re-cusa de registro ........................................2523, 224

hipoteca

• Hipoteca – cancelamento – garantia real – in-corporadora falida ...................................2524, 224

locação

• Locação – dano infecto ............................2525, 225

nunciação de obRa nova

• Nunciação – obra nova – dano – comprovação – danos morais – ônus da prova ...............2526, 225

penhoRa

• Penhora – imóvel do casal – garantidor, cônjuge e patrono da executada ...........................2527, 225

pRomessa de compRa e venda

• Promessa de compra e venda – comissão de cor-retagem – tese – ciência dos promitentes-com-pradores – contratação expressa ..............2528, 227

seguRo

• Seguro habitacional – possibilidade de uti-lização de recursos do FCVS – legitimidade ................................................................2529, 227

sFh

• SFH – certidão de inteiro teor de divórcio em substituição à certidão de casamento com aaverbação do divórcio – possibilidade .....2530, 231

• SFH – cobertura securitária – ocorrência de si-nistro – invalidez permanente – prescrição ânua ................................................................2531, 232

• SFH – contrato – arrematação do bem por ter-ceiros – falta de interesse na revisão contratual ................................................................2532, 232

• SFH – contrato de financiamento – ocupação por terceiros – imissão de posse ...............2533, 232

• SFH – execução extrajudicial – revisão con-tratual – contrato de mútuo com alienação fi-duciária em garantia ................................2534, 233

• SFH – indeferimento de prova oral – cercea-mento de defesa – não caracterização .....2535, 234

• SFH – seguro – vícios construtivos – mora da se-guradora – pagamento da indenização – multa decendial .................................................2536, 234

usucapião

• Usucapião – área do imóvel superior à inscrita – retificação .............................................2537, 235

• Usucapião – bem de família – reexame de fatos e provas – impossibilidade .......................2538, 238

• Usucapião – imóvel urbano – alegação de se tratar de terras devolutas – titularidade do ter-reno não comprovada ..............................2539, 238

• Usucapião extraordinária – prazo prescricional ................................................................2540, 239

CLIPPING JURÍDICO

• Aval em cédula de crédito comercial não exige autorização do cônjuge .....................................241

• Box em garagem não faz parte de apartamen-to e pode ser penhorado separadamente ...........240

• Indisponibilidade de bens só pode ser decreta-da quando o débito for superior a 30% do pa-trimônio da empresa ..........................................240

• Isenção de IR em ganho de capital na venda deimóvel vale para quitar segundo bem ................240

• Prazo para purga da mora na ação de despe-jo deve considerar juntada do mandado de ci-tação .................................................................243

• Venda com fraude a credor não comprometenegócio subsequente do mesmo bem ................242