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STBRS-PETE “5.000 5.000” Escatologia e o Apocalipse Pr. Chrístopher B. Harbin Edição: 12-09-2002 ©Copyright 2002 por Chrístopher Byron Harbin Todos os direitos reservados. Página 1 de 58 Escatologia: Estudo Teológico das Coisas Finais (Vida além-túmulo, Parousia, Ressurreição, Julgamento, Fim do Mundo e o Apocalipse) Um estudo preliminar das doutrinas centrais referentes às temáticas da escatologia e o Apocalipse, procurando uma aproximação maior com a base bíblica na elaboração de conceitos em resposta ao contexto evangélico riograndense e os tratamentos sistemáticos norteamericanos existentes no mercado evangélico brasileiro. Por questão da influência de interpretações populares do Apocalipse de João na definição de conceitos escatológicos, um breve comentário ao livro está incluido neste estudo. Material preparado para uso em aula de teologia sistemática com alunos do Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul. Apostila preparada por: Christopher B. Harbin Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul Edição impressa sem gráfica: janeiro 2006

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STBRS-PETE “5.000 5.000” Escatologia e o Apocalipse Pr. Chrístopher B. Harbin

Edição: 12-09-2002 ©Copyright 2002 por Chrístopher Byron Harbin Todos os direitos reservados. Página 1 de 58

Escatologia: Estudo Teológico das Coisas Finais (Vida além-túmulo, Parousia,

Ressurreição, Julgamento, Fim do Mundo e o Apocalipse)

Um estudo preliminar das doutrinas centrais referentes às temáticas da escatologia e o

Apocalipse, procurando uma aproximação maior com a base bíblica na elaboração de conceitos em resposta ao contexto evangélico riograndense e os tratamentos sistemáticos norteamericanos

existentes no mercado evangélico brasileiro. Por questão da influência de interpretações populares do Apocalipse de João na definição de conceitos escatológicos, um breve comentário

ao livro está incluido neste estudo. Material preparado para uso em aula de teologia sistemática com alunos do Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul.

Apostila preparada por:

Christopher B. Harbin

Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul

Edição impressa sem gráfica: janeiro 2006

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©Copyright 2002 por Christopher Byron Harbin.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta apostila pode ser reproduzida sem a autorização do autor. Citações breves para fins acadêmicos com referência bibliográfica são permitidas.

O autor pode ser contatado conforme abaixo:

[email protected]

http://www.teamgaucho.org/harbin

http://www.rocksbc.org

RR1 Box 80A

Pamplin, VA 23958

Seminário Teológico Batista do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS

55-51-3222-1254; 55-51-3222-2323

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Escatologia: Estudo das Últimas Coisas

“Quer concordemos que estas questões [de escatologia] são importantes, quer não, devemos examiná-las, pois aqueles que as discutem as consideram importantes” 1.

Anotações Gerais:

A escatologia compreende dois aspectos principais: a escatologia cósmica e a escatologia individual2. Pretende-se em primeira instância tratar algumas das questões de referência comunal e cósmica. Por outro lado, pretende-se dar mais ênfase aos aspectos individuais da temática. Neste estudo são os aspectos individuais que serão enfocados, pois são nestes elementos da temática que o indivíduo se vê em necessidade pessoal de estar relacionado devidamente com Deus. A escatologia reúne um apanhado de conceitos que sofreu muita transformação ao longo do trajeto revelacional do povo de Israel. As expectativas escatológicas foram em muito modificadas através do tempo, incluindo o caso de muitas correntes que nem mantinham conceitos propriamente escatológicos3.

Não existe um só conceito unificado e sistemático na Bíblia referente a questões de escatologia, mas vários conceitos com enfoques diferenciados. Estas diferenças se devem ao caráter progressivo da revelação em termos da escatologia. Ao mesmo tempo, pode-se delinear que há em várias passagens do Antigo Testamento, da literatura judaica até o primeiro século e do Novo Testamento uma consciência “de que Deus agirá de forma decisiva no futuro,” fazendo surgir um contexto diferente e novo4. Em muitos casos essas conceitualizações são expressas em termos de uma volta a um tempo primordial ou ideal, como no Éden5.

Deve-se lembrar que algumas passagens tratam assuntos tais como a ressurreição e julgamento desde perspectivas completamente distintas. Uma perspectiva trata o assunto de forma aorista, ou resumida como se tudo acontecesse num só instante—uma grande ressurreição e julgamento6. Outra perspectiva trata o conceito de forma a destacar a diferenciação temporal do indivíduo—ressurreição e julgamento para cada indivíduo no momento de sua morte física7. A diferença nessas perspectivas tem induzido alguns a tratarem um conceito de “estado intermediário” entre a morte e o “grande julgamento”. Tudo pode não passar de perspectivas diferentes de uma mesma coisa, sem qualquer “estado intermediário”. De qualquer forma, Paulo diz em Filipenses 1.23 que partindo desta vida ele está com Cristo. Mesmo que haja algum estado “intermediário”, portanto, tal não vem a ser diferente do que o estado “final”.

No estudo da escatologia, muito tem-se dito e publicado sobre o livro de Apocalipse. Grande parte dos posicionamentos referidos são simplesmente feitas em ignorância. Pode ser um tanto mais difícil determinar com precisão o que se pode dizer com certeza, mas deve ser um alerta para todo

1 ERICKSON, OCnE, 10. 2 D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”. 3 David L. Petersen em FREEDMAN, “Eschatology: Old Testament”. 4 George W. E. Nickelsburg em FREEDMAN, “Eschatology: Early Jewish Literature”. 5 D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”. Veja Isaías 11.6 como exemplo desta forma de expressão. 6 Uma grande ressurreição e um grande julgamento se vê retratado em passagens como Apocalipse 20.5-13. 7 Como se vê na parábola de Lázaro e o homem rico em Lucas 16. Os irmãos do rico estão vivos ainda na terra, enquanto Lázaro e o rico já receberam “juízo e sentença”.

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intérprete a vasta literatura que tem sido escrita e descartada, especialmente entre aqueles que querem definir com base nesta carta a predição da época e as condições do fim do mundo. Vários “intérpretes” já pronunciaram erroneamente a data certa do fim do mundo. As palavras de Jesus deveriam ser o suficiente para o cristão: “Vigiai, pois ninguém sabe quando será aquele dia, a não ser o Pai”. Certos assuntos não cabem ao ser humano definir. Afinal, foi para um relacionamente de fé que fomos convocados. Fé em Deus, não nas minhas definições e ilusões dogmáticas.

Problemas em tratar Escatologia:

Distância Pessoal: Um dos primeiros problemas a serem evitados no estudo de Escatologia, é de manter o assunto muito distante do indivíduo. Pode-se muito facilmente falar da segunda vinda de Cristo usando expressões no sentido de que Jesus pode voltar amanhã, porém não se ouve a necessidade de estar preparado. Em geral pensa-se: “Pode ser que Jesus venha amanhã, mas não é muito provável. Não é preciso dar muita importância ao assunto.” Neste contexto, o estudo da escatologia vem a ser um estudo bem confortável, pois trata-se de algo polêmico, intrigante, ambíguo e muito distante. Por outro lado, a Bíblia parece sempre abrir o assunto assinalando a necessidade de cada um estar preparado. É necessário lembrar que estas “últimas coisas” incluem aspectos que são refletidos no cotidiano.

Princípios de Interpretação: Outro problema a ser considerado ao estudar assuntos de escatologia (como também qualquer outro tema bíblico) concerne à necessidade de respeitar os princípios de interpretação bíblica. Além de sempre ler os versículos e as passagens dentro de seus respectivos contextos, é necessário lembrar que as passagens de ensino claro sempre tomam precedência no tratamento de um tema. Por exemplo, 1ª João é muito mais claro ao tratar do anticristo do que o livro de Apocalipse. Outro ponto a observar é o tipo de literatura que se está estudando ao tratar um texto. O estilo literário do Apocalipse não é igual a 1ª João e o tratamento dos livros deve respeitar essa diferença.

Leitura Contextual: Mais um problema a negociar é a necessidade de ler as passagens bíblicas em relação aos seus propósitos, não em sentido de responder curiosidades pessoais. A Bíblia foi escrita para tratar da necessidade do homem perante Deus, não para ensinar ciência, história, nem futurismo. No final de um estudo, nem todas as perguntas, dúvidas e questionamentos serão respondidos, pois a Bíblia não segue o propósito de responder às curiosidades humanas. Jesus mesmo disse, “Não vos compete saber os sinais e os tempos” (Atos 1.7). Deus exige do homem uma dependência e confiança sem se propor necessariamente a aplacar todas as dúvidas e preocupações humanas.

História: Outro problema a ser evitado está relacionado à história. Berstén e outros fazem distinção entre profecias que se cumpriram e outras que ainda não se cumpriram. O problema que deve ser tratado nesse contexto é o de compreender o que já sucedeu na história para então poder fazer uma melhor declaração entre aquilo que tem e não tem acontecido. Salienta-se aqui a passagem de Mateus 24.1-28 e o contexto da destruição de Jerusalém no ano 70 depois de Cristo8.

Cosmologia: É necessário compreender como o povo, especialmente os autores bíblicos entendiam o mundo em que viviam. Sua cosmologia implicava na sua terminologia aplicada a conceitos espaciais e geográficos, como também a certas referências escatológicas. Não é lícito forçar o texto bíblico a

8 LOWRY, 35, Jerusalém foi incendiado na manhã de 26 de setembro de 70.

Clayton Messias
Nota
Relacionamento
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refletir um conceito cosmológico do século vinte, quando os autores não compartilhavam esse conceito.

Vocabulário Especializado: Por outro lado, é indispensável que se trate o vocabulário bíblico conforme o uso dos próprios autores. Certas palavras ou frases eram usadas diferenciadamente da forma atual. O judeu dividia o tempo em duas partes: antes do Messías e depois do Messías. Por “últimos tempos” ou “tempos postreros”, a Bíblia designa a segunda etapa do tempo. Os últimos tempos, então, começaram com Jesus e referenciam o tempo desde aquela época até o final do tempo.

Supremacia Bíblica: É sumamente necessário que respeitemos que a palavra final referente a qualquer assunto teológico é a palavra bíblica. Não é lícito dar mais confiança a sonhos, palavras de profecia e visões do que ao próprio texto bíblico. Toda outra fonte deve ser submetida às indicações e às limitações apresentados no tratamento bíblico dos assuntos correspondentes. A Bíblia é a Palavra de Deus e Deus não se contradiz, ainda que a Bíblia exibe um desenvolvimento teológico no processo revelacional. Quando houver conflito entre a mensagem bíblica e a palavra ou evento profético, a dúvida recairá sobre a fonte extra-bíblica.

Respeitar Limitações: Também é necessário lembrar que existem limitações ao que pode ser conhecido em certas áreas. Atos 1.7 indica que não compete ao ser humano saber e entender a maioria das questões referentes a eventos futuros. Precisa-se aceitar que Deus simplesmente não revela detalhes a respeito de toda curiosidade humana. É necessário ler o texto bíblico reconhecendo o propósito do proprio texto, não jogando por cima do texto um propósito pessoal especulativo sobre o fim do mundo. O que realmente importa saber está exposto de forma clara: “Vigiai, pois não sabeis em que dia vem o vosso Senhor!”9.

Em consideração às limitações do intérprete bíblico referente a formas divergentes de compreender o mundo (ou seja, divergências entre as formas da antigüidade e as atuais), apresenta-se certas reflexões sobre a forma na qual os autores bíblicos refletiram sobre o mundo. Os textos bíblicos apresentam muito ensino com o uso de expressões que referenciam ou retratam os conceitos cosmológicos do povo e de seus vizinhos. Espera-se que este tratamento possa ajudar a compreender melhor as implicações dos termos usados na Bíblia.

Cosmologias Antigas10:

Em vários casos, será de ajuda na compreensão de um texto saber algo sobre o conceito cosmológico do povo hebreu na época bíblica. Este conceito, embora diferenciado, está relacionado aos conceitos cosmológicos dos povos ao seu redor. É importante conhecê-los especialmente ao lidar com narrativas concernentes à criação, ao dilúvio e tópicos escatológicos que retratam realidades celestias em terminologias da realidade física conhecida. Evidências deste conceito cosmológico serão encontradas em outras narrativas e textos ao descrever algo do mundo além-túmulo ou aspectos do universo criado por Deus.

O conceito hebraico do formato do universo deve ser considerado ao tratar de assuntos tais como a criação. Os hebreus tinham a mesma percepção “científica” do mundo dos outros povos de sua época, porém faziam suas distinções. Em matéria do formato físico-estrutural do universo, tinham

9 Mateus 24.42. 10 Observação: Esta seguinte porção do texto sobre as cosmologias antigas procede da apostila, Homilética da Teologia das Narrativas, na versão de julho de 2002.

Clayton Messias
Realce
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muito em comum com os outros povos. O texto bíblico usa termos como “abismo”11, “expansão” (em algumas traduções “firmamento”)12, “janelas dos céus”13 e outros termos que de certo soam um tanto estranhos no século presente. Estes termos demonstram a forma antiga de se refletir sobre o mundoa sua perspectiva do universo criado por Deus. Pode-se ver que certos assuntos atuais, como a preocupação de encontrar vida em outros planetas, não tem cabimento no texto bíblico pelo simples fato de que estas perguntas baseiam-se em outra cosmologia, muito distinta daquela dos hebreus14.

O gráfico apresentado a seguir ajuda na compreensão da perspectiva “científica” dos hebreus referente ao formato do universo, refletido especialmente em passagens como Gênesis 1-11 e de Jó 38-41, na qual Deus faz perguntas a respeito da criação do universo que Jó não consegue responder. Os elementos comuns entre os hebreus e os outros povos são diferenciados em seus termos representativos e especialmente na sua explicação religiosa. É importante lembrar que mesmo quando o conceito hebraico reflete certas noções tidas em comum com os outros povos, a ênfase das narrativas hebraicas é a de oferecer uma crítica nos pontos em que divergem deles pela revelação de Deus.

Este gráfico do conceito hebraico da estrutura do universo limita-se a uma fração mínima da cosmologia científica atual. Pode-se ver como a Bíblia utiliza certa terminologia que se refere ao conceito cosmológico de seus autores15. Pode-se ver no gráfico o título de “firmamento” (ou “expansão”) para o círculo dos céus que separa as águas acima do firmamento da zona que se denomina hoje por atmosfera. Estes termos ajudavam o povo a falar do mundo ao seu redor, mesmo que o seu conceito específico tenha sérios problemas em face da ciência atual. Entender a cosmologia

hebraica é de ajuda para compreender as implicações das narrativas que utilizam a terminologia do mesmo conceito. Quando o autor bíblico refere-se às janelas do céu, é bom saber que faz referência ao seu conceito de como a água acima do firmamento chega até a terra em forma de chuva.

11 Refletido em passagens como Gênesis 1.2; 7.11; 8.2; 49.25; Deut. 33.13; Jó 28.14; 38.16; 38.30; 41.31-32; Salmo 36.6; 42.7. 12 Refletido em passagens como Gênesis 1.6-8, 14-15, 17, 20; Salmo 19.1; 150.1; Ezequiel 1.22-26; 10.1; Daniel 12.3. 13 Refletido em passagens como Gênesis 7.11; 8.2; 2a Reis 7.2, 19; Malaquias 3.10. 14 Segue-se o quadro: “Cosmologia Hebraica”, conforme BANDSTRA, 56, KASCHEL, 159 e WEST, 81. 15 Gênesis 1.2,6-8,16-17, 7.11; Êxodo 20.4.

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A cosmologia é uma área da ciência que influi muito em vários aspectos da comunicação humana, pois muitos dos seus conceitos alteram a forma de conceber o que acontece em volta do indivíduo e a sua sociedade. A cosmologia hebraica aparece até no livro de Apocalipse, onde o “‘abismo sem fundo’ está vinculado a idéias concernentes à forma do mundo. A terra era concebida como um disco plano que flutuava em cima da água. O abismo refere-se às profundezas imensuráveis debaixo da terra, para os quais pensava-se existir uma fenda capaz de ser selada”16. Até o Novo Testamento, portanto, sente a influência desta cosmologia.

O conceito egípcio era estruturalmente bem parecido com o hebreu, mas representado nas pessoas de seus deuses17. Estes representavam para os egípcios as várias partes do cosmos. Enquanto trata-se na atualidade do mundo fenomenológico como objeto impessoal, “os antigos reagiam a ele como a uma ‘pessoa’”18. Assim, entre os egípcios, a mitologia e apresentação cosmológica defendiam que o panteão de deuses era parte do cosmos em termos físicos e representativos. Assim, o universo é tanto criação de seus deuses, como também os seus deuses compõem as partes do universo.

Não parece que houve muita diferenciação entre a obra resultante e o originador da mesma. No antigo conceito cosmológico egípcio, o deus-céu é o céu, o deus-terra é a terra, o deus-Nilo é o Nilo e o deus-ar é o ar. (Portanto, no relato das pragas do Egito19, Deus se revela como maior que os deuses do Egito, não apenas por dominar suas esferas de influência, mas, segundo a forma egípcia de ver as coisas, por dominar os seus próprios deuses!) Essa forma segue alguns aspectos da mitologia babilônica retratadas no seu épico, Enuma Elish20, porém é diferenciada em suas próprias expressões. Os relatos mitológicos dos egípcios referentes a este conceito cosmológico divergiam em muito das narrativas que se encontram no livro de Gênesis. Os primeiros relatam lutas e intrigas entre deuses que atuam tais como ou até piores do que os seres humanos. Esses deuses têm muito em comum com os deuses dos gregos, romanos, e babilônicos, porém pouco ou nada com YHWH (h w h y), Senhor de Israel.

O conceito babilônico (ou seja, mesopotâmico) do universo é parecido com os conceitos hebraico e egípcio em seus termos estruturais, mesmo que apresentando outro formato que centraliza a montanha da terra. Esta montanha era muito importante para os babilônicos, refletindo a idéia de que no seu ápice era a morada de seus deuses. O épico Enuma Elish21 amplia a perspectiva narrativa e histórica do conceito babilônico em termos de como o mundo chegou a ser formado. Este épico enfatiza mais o relacionamento com a perspectiva do panteão de deuses egípcios, pois ele relata o

16 ROBBINS, 221-222. 17 Aqui a deusa é retratada como suspensa pelo deus do ar, firmado no deus da terra. Veja WEST, 82. 18 LASOR, 24 e 32. 19 Êxodo 7-12, incluindo a morte do herdeiro de Faraó, que também se considerava um deus ou representante divino. 20 Enuma Elish é um poema babilônico, retratando a criação do mundo a partir da perspectiva babilônica de um panteão (veja HEIDEL, 1-60). 21 HEIDEL, 78-79.

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assassinato de alguns deuses e a construção das partes do cosmo com a utilização de seus corpos. O mesmo relato diverge do egípcio em que os deuses usados para essa “construção” já não existem, pois usou-se seus cadáveres na estrutura física do mundo.

A estrutura física resultante desta cosmologia, porém, apresenta-se bem semelhantemente à hebraica. Tem-se também uma reflexão da perspectiva cosmológica do Apóstolo Paulo, ao mencionar um homem que foi levado até “o terceiro céu”22. Esta citação reflete sua visão estrutural do universo. O quadro acima ilustra a cosmologia babilônica23. Nota-se que a perspectiva é a da terra ser uma espécie de ilha, com água na volta por todos os lados. Tal era o conceito geral dos hebreus e seus povos vizinhos24. Um detalhe faltando no quadro é o

túnel por debaixo da superfície da terra pelo qual o sol passava cada noite para chegar de novo a seu lugar de nascer25.

Nota-se nos relatos babilônicos uma série de conflitos, lutas e intrigas. Estas sucedem tanto entre os seus próprios deuses, como também entre os deuses e o caos do universo quando da criação do mundo habitado pelos homens. Desde a perspectiva babilônica, “a criação é realmente nada mais que a vitória sobre os poderes caóticos que ameaçam a vida dos deuses e das pessoas”26. Os deuses até conseguem vitória sobre o caos do universo, mas não há uma certeza de vitória entre si, já que existe entre eles uma disposição a intrigas. Também as suas narrativas referentes ao dilúvio revelam este mesmo caráter de incerteza, desconfiança, capricho e intriga.

Na cosmologia babilônica pensava-se que a criação do mundo era o resultado da junção dos oceanos de água salgada e de água fresca na pessoa dos deuses, Tiamat e Apsu. Estes nomes servem de igual modo para designar os oceanos referentes27. Foi na junção ou união destes deuses que a terra seca se formou28. O formato do mundo, portanto, era concebido de modo essencialmente igual, trocando o estilo e especificidade da atuação e identificação dos personagens divinos associados à criação.

Assim, as mitologias narradas por estes outros povos divergem muito das narrativas hebraicas do Gênesis. No texto bíblico encontra-se conflito, mas este conflito é procedente do homem, não dos céus entre um panteão de deuses. Em Gênesis, Deus cria a partir de uma decisão de sua livre e soberana vontade e até domina o “caos” ao começar sua obra criativa. A descrição do restante deste primeiro relato da criação mostra como Deus operou para impor ordem ao caos que já lhe obedecia e lhe serviu de base para o restante de sua criação. O narrador continua mostrando ainda a soberania divina sobre o caos na descrição do dilúvio, apresentando o conceito de YHWH ser muito acima do conceito dos outros povos referente a seus deuses.

22 2ª Coríntios 12.2. 23 Segue-se o quadro: “Conceito Babilônico do Universo” – WEST, 83. 24 BANDSTRA, 55. 25 SASSON, 40-41. 26 BRONGERS em WOUDE, 116. 27 BANDSTRA, 51. 28 COOGAN, 9.

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O conceito estrutural da forma do universo, então, era mantido basicamente em comum com os outros povos ao seu redor, porém as considerações teológicas que os hebreus mantiveram referente a essas estruturas físicas é algo completamente diferente. Como participavam dos conceitos cosmológicos dos seus vizinhos, a sua ciência geofísica e geográfica era muito diferente daquela aceita no século vinte. Estas diferenças devem ser levadas em consideração para uma melhor compreensão de textos tão antigos.

Mesmo com as diferenças enormes entre conceitos da estrutura do universo de hoje e dos povos do mundo antigo, as considerações teológicas destes que apresentam conceitos divergentes são aplicáveis aos dias de hoje, sem qualquer necessidade de alteração. O texto bem pode falar com um linguajar geográfico ao considerar a vida além do túmulo, sem alterar o significado do ensino teológico da expressão.

Hoje ainda se fala com o mesmo tipo de linguagem sobre o viver com Deus “nos céus”, mesmo que se saiba que Deus não mora num lugar fixo acima das núvens. Ainda se faz referência a um inferno que se localizaria abaixo da crosta da terra, mesmo que não mais se pense no inferno como uma habitação debaixo da superfície da terra. Estas formas de expressão remontam a cosmologias bem diferentes da atual. O problema maior para o intérprete é descobrir a intenção teológica do texto, não considerar a validade científica do pensamento do povo e do autor.

Não se deve cometer o mesmo tipo de erro que a igreja enfrentou na época de Galileu Galilei, opondo-se a novos posicionamentos científicos para “proteger” os vínculos que se haviam construído entre questões de fé e conceitos científicos. Aceitando o propósito bíblico básico como sendo teológico, recorre-se à Bíblia para embasamento de questões de fé e prática, não de conceituações intelectuais referentes ao mundo criado por Deus. A Bíblia interessa-se mesmo em explicar “Quem” criou, não o método, nem o formato da criação.

As narrativas bíblicas pretendem demonstrar a identidade de YHWH em relação e contraste com o homem, não pretendem ensinar ciência. O importante das narrativas, então, não é uma veracidade detalhada de suas considerações científicas e descritivas do universo, mas o seu ensino referente a YHWH e Seus desígnios para a humanidade. É interessante lembrar que as narrativas não contam toda a história da interação de YHWH com o Seu povo. Como o autor do Evangelho de João coloca, há muitas coisas que poderiam ter sido escritas referente aos acontecimentos históricos entre Deus e o seu povo, mas estas foram escritas com propósito específico. Assim como o Evangelho de João foi escrito para suscitar a fé real, também é este o propósito das narrativas bíblicas em geral—“para que, crendo, tenhais vida em seu nome”29.

Bultmann, estudioso do Novo Testamento, referiu-se à cosmovisão expressa no Novo Testamento em termos parecidos com a descrição anterior.

Examinando a cosmovisão do NT, [Bultmann] achou que boa parte dela era mítica em sua natureza. Por mito quis dizer a descrição de realidades do outro mundo em linguagem figurada tirada deste mundo. Os escritores do Novo Testamento concebiam da totalidade da realidade como sendo um universo em três andares. O andar superior é o céu, habitado por Deus e os anjos; o do meio é a terra, habitado por seres humanos; e o inferior é o inferno, a base de operações do diabo e dos seus assistentes demoníacos. Mesmo na terra nem tudo é o resultado de forças puramente naturais. Poderes sobrenaturais intervêm no fluxo “natural” dos eventos. Os milagres ocorrem com considerável freqüência. Os maus espíritos podem tomar posse do homem, causando

29 João 20.30-31.

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doenças. Deus ou Satanás podem inspirar os pensamentos do homem e guiar suas ações, eles podem receber visões de origem divina30.

A forma estrutural do universo, então, é mantida basicamente em comum com os outros povos ao redor dos hebreus, porém as considerações teológicas que os hebreus mantiveram referente a tais estruturas físicas é algo completamente diferente. A interpretação da estrutura e suas implicações divergem em muito, porém a armação física é compreendida de forma quase idêntica.

Geografia/Mundo Físico:

Mapa de Hecataeus, c. 520 a.C.

Não se dispõe hoje de mapas do mundo provindo do povo hebreu, porém existem alguns provenientes de outros povos ao seu redor. Em tese, estes refletem algo da perspectiva dos povos mediterrâneos, incluíndo os hebreus, referente à organização e ao tamanho da superfície da terra. Sua perspectiva cosmológica era diferente da atual, como também era diferente a sua perspectiva cartográfica. Distâncias e medidas na Bíblia não refletem as precisões da pesquisa científica atual.

O Pentateuco teria chegado à sua forma atual na época do exílio do povo hebreu, entre os séculos sexto e quarto a.C.31. O mapa de Hecataeus, grego que viveu por volta de 520

a.C.32, ajuda a posicionar uma referência mundial relativamente parecida com a que o povo hebreu poderia ter conhecido por volta desta época. Esta perspectiva é provavelmente mais desenvolvida do que aquela que os hebreus teriam ao seu dispor. Os hebreus dificilmente teriam conhecimento de um mundo maior do que o aqui representado. Como o povo hebreu não era um povo marítimo, é bem provável que sua perspectiva do tamanho do mundo fosse razoavelmente menor do que a perspectiva refletida por Hecataeus.

Mapa de Strabo, c. 18 d.C.

Estudando o mapa de Hecataeus, é necessário lembrar que o centro do mundo para os hebreus seria o crescente fértil e mais precisamente a Palestina, não as montanhas do norte da Grécia (o Monte Olympo sendo central nas mitologias gregas e

30 ERICKSON, OCnE, 30. 31 BARR, James em MAYS, 68. 32 BAIN.

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também neste mapa). Assim, poderia-se tomar uma perspectiva de tamanho deste mapa e vinculá-lo com o mundo conhecido por Strabo, grego do primeiro século depois de Cristo. Strabo reflete descobertas das conquistas de Alexandre após a época de Hecataeus.

O povo hebreu na época do Antigo Testamento provavelmente conhecia algo da metade a dois terços do mundo representado por Strabo. Provavelmente desconhecia a maior parte da Europa e a parte da África denominada como Líbia ao oeste do Egito, também como o extremo leste do mapa que representa a Índia. Sabia-se a respeito da Índia, porém é provável que o conhecimento fosse pouco. Já no Novo Testamento, o conhecimento do mundo refletido por Strabo estaria acessível para os mais estudados, como Paulo e Lucas.

Estes dois mapas em conjunto mostram um grande aumento no conhecimento grego do mundo como resultado das conquistas de Alexandre. Com o crescimento do conhecimento grego, viria também um crescimento entre os judeus, especialmente com o evento da Diáspora, no qual os judeus entraram em contato com os ensinos gregos de uma forma muito mais abrangente. O povo hebreu provavelmente não teve muito contato com as terras ao oeste da Palestina até esse período após o exílio babilônico e o Antigo Testamento chegar à sua forma atual.

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Escatologia, Conceitos Essenciais:

“Reinar de Deus”:

No estudo da eclesiologia foi revisto algo da importância do conceito do Reino de Deus. Como o conceito é também de muita importância na escatologia, será tratado aqui de forma mais dirigida às temáticas escatológicas.

Para a escatolgia, a categoria principal na Bíblia é o Reino de Deus, seu “governo em ação”33. Em razão disto, usaremos a frase o “reinar de Deus”34 em lugar do costumeiro “Reino de Deus”. Jesus declarou que esse reinar já se fazia real dentro dos parâmetros da historia35, mesmo que muitos tratem do reinar de Deus em sentido futuro. O Reinar “não é somente algo que se acerca no ministério de Jesus, mas que realmente chega numa data futura”36. Esta data pode ser entendida como o evento de pentecostes, entre outras opções. Nos evangelhos sinópticos, Jesus é apresentado anunciando não somente a iminência, mas a própria chegada do reinar de Deus37. Logo, não deve ser concebido apenas em termos da vida após a morte, pois reflete o reinar de Deus na vida do cristão no “aqui e agora”.

O Reinar de Deus é uma temática especial dos evangelhos sinópticos, porém, principalmente do livro de Mateus, onde se encontra a terceira parte das referências neotestamentárias ao Reinar de Deus/dos céus38. “Havia urgência, porque o reino estava vindo, e o único aspecto especialmente ressaltado foi o arrependimento”39. Muitas vezes a palavra de Jesus refere-se à crise centralizada no ingresso ao reinar de Deus40, como nos capítulos 13 a 16 de Lucas. No ensino de Jesus, nada tem valor ao ser comparado com o reinar de Deus41. Jesus convocava à renúncia de todo laço que impediria o indivíduo de seguir o seu exemplo de submissão total a Deus, o que o levou à cruz42.

É comum certa confusão referente ao Reinar de Deus, especialmente em termos de seu tempo. Como já tem sido visto, Jesus trata o reinar de Deus em tempo presente. Simultaneamente, Jesus trata o reinar em tempo futuro. A ênfase é na realidade presente, mesmo que seja mais comum tratar a temática em expectativa futura:

[Mateus 12.28 e Lucas 11.20] aparentemente indicam que o reino não apenas está perto, mas que realmente já chegou. Não há contradição, no entanto. Ambas as coisas são verdade. O reino está perto no sentido de que não está consumado; está presente no sentido de que o poder de Deus que o caracteriza começou a manifestar-se nas palavras e ações de Jesus e continua a fazer o mesmo na igreja43.

O tratamento bíblico do reinar de Deus da perspectiva após o ministério de Jesus visa menos futuricidade do que recebe durante o seu ministério sobre a terra. Ao mesmo tempo, permanece a

33 MILNE, 259. 34 D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology” e MOODY, 516. 35 MILNE, 260. 36 Brooks em HEMPHILL, 26. 37 D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”. 38 Brooks em HEMPHILL, 23. 39 ERICKSON, OCnE, 22. 40 D. E. Aune em FREEDMAN, “Eschatology: Early Christian Eschatology”. 41 ERICKSON, OCnE, 22. 42 NOLLAND, 762. 43 Brooks em HEMPHILL, 28-29

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expectativa de um complemento à realidade do reino já inaugurada nas vidas dos crentes. Tal expectativa, porém, encontra a sua expressão na base do que Jesus já tem realizado.

“A confissão cristã não é apenas de que Cristo virá ao final da história, mas que Cristo já veio; não apenas que a salvação espera o crente no futuro escatológico, mas que a salvação já é experimentada, numa forma antecipatória, porém real, no aqui e no presente, no meio de problemas e não apenas ao seu fim…. O presente é moldado não apenas pelo passado, mas também pelo futuro de Deus”44.

“No Novo Testamento, o reino de Deus é principalmente o seu reinar nas vidas daqueles que se submetem à sua autoridade”45. O ingresso ao reino é agora, não no porvir. No momento em que se abre a vida para depender de Deus completamente, há ingresso no seu reinar. Em termos políticos, esse reinar “não é deste mundo”46, porém não há necessidade de pensar que seja apenas um conceito futurístico.

Ao tratarmos a questão do reinar de Deus, deve-se salientar alguns aspectos da temática do céu, por questão de ser complemento do ensino referente ao reinar de Deus—o reinar de Deus após a morte física.

Os termos bíblicos para céu, “m y m c e ouranovs são usados basicamente de três maneiras na Bíblia”: referindo-se à estrutura do universo, como sinônimo de Deus e como o local da morada de Deus47. Olhando para Lucas 15.18, pode-se ver claramente que esta referência é feira especificamente a Deus48, não àquela espansão estrutural acima das núvens, pois o filho havia pecado contra Deus, não contra uma localidade. Pode-se ver que o reino do qual Jesus ensina em Mateus 5.3 e em Lucas 6.20 é o mesmo. Logo, o chamado “reino de Deus” e o “reino dos céus”, são expressamente a mesma coisa.

Entre o uso do termo como morada de Deus e sinônimo de Deus, existe um relacionamento que nos interessa em referência à temática do reinar de Deus. Há um vínculo entre o estar sob o reinar de Deus e o estar presente com Deus. Essa presença com Deus é elemento essencial da temática de “céu”, como também do reinar de Deus.

Usa-se também o termo descanso para tratar considerações referentes à vida no céu, mesmo que tenha conotações presentes49. “Descanso, como o termo é usado em Hebreus, não é apenas uma cessação de atividade, mas a experiência de alcançar um alvo de importância crucial”50. Quando falamos em descanso em termos celestiais é necessário lembrar deste aspecto da utilização do termo.

“Schweitzer não gostava [das referências ‘segunda vinda de Jesus’ e sua ‘volta’],… [pois] não era termo de Jesus… Schweitzer considerava que Jesus colocava sua morte numa conexão temporal-causal com a vinda escatológica do reino”51. O termo bíblico para a chamada segunda vinda é “parousia”—aparecimento. É designação de Jesus ser revelado em glória52.

44 BORING, 33. 45 Brooks em HEMPHILL, 21. 46 João 18.36. 47 ERICKSON, CT, 1226. 48 NOLLAND, 784 trata este uso do termos especificamente na categoria de perífrase. 49 HAGNER, NIBCH, 69-73. 50 ERICKSON, CT, 1229. 51 ERICKSON, OCnE, 21. 52 Veja comentários sobre a1a e 2a Tessalonicenses na página 24.

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Fim do Mundo/Últimos Dias:

É valioso lembrar que o uso de frases como “o fim do mundo” e “os últimos dias” nem sempre referem-se à destruição do mundo físico. Os judeus dividiam o tempo em duas partes—antes e depois do messías53. Logo, com o dia de Pentecostes em Atos 2, já se pode falar destes últimos tempos, conforme Paulo, em 1a Coríntios 10.11. Em conjunto com estas frases, encontra-se em certas passagens a frase “última hora”. Esta refere-se de forma parecida, se não igual, ao conceito últimos dias. Pode ao mesmo tempo espelhar uma compreensão de ser um tempo imediatamente antes da vinda de Jesus em glória, porém tal compreensão deve ser vista no contexto dos quase dois mil anos após estes textos terem sido escritos, sem que Jesus tenha vindo em sua glória. Autores bíblicos de textos como Apocalipse e 1a João esperavam que Jesus voltasse a qualquer minuto, porém estavam errados nos seus cálculos. Tal fato deve servir de alerta àquele que busca definir o quando da parousia54 e o fim do mundo—ninguém sabe.

Ressurreição e Juizo:

Os conceitos de ressurreição e juizo estão ligados de pelo menos duas formas: a ligação de seqüência temporal dos conceitos e o seu tratamento bíblico por via de duas perspectivas distintas. A ligação temporal é produto de uma das perspectivas que trata a ressurreição como o evento que introduz o julgamento. As duas perspectivas bíblicas divergentes sobre os conceitos visam a duas ênfases primárias das temáticas, o individual e o universal.

Na perspectiva individual, os autores bíblicos tratam de enfatizar que cada indivíduo passa pela ressurreição e o julgamento na hora de sua morte. Essa perspectiva realça tanto a experiência individual como a instantaneidade da experiência. A perspectiva universal normalmente trata o evento de ressurreição ou julgamento como um evento compartilhado de forma simultânea entre todos da raça humana de todos os tempos. Poderia-se designar as perspectivas como pontilhar seqüêncial (olhando a história como uma série de pontos individuais) e aorista sumária (olhando desde o futuro para trás sem diferenciar questões temporais), descrevendo os mesmos acontecimentos de perspectivas diferentes. Por outro lado, pode-se interpretar o aspecto pontilhar seqüêncial como sendo a experiência normativa, passando para o aorista sumário num final cósmico cataclismático.

Assim, Hebreus 9.27 trata da perspectiva pontilhar seqüêncial: cada um morre e segue para o seu julgamento. Mateus 25 trata de forma aorista sumária: virá o dia de prestar contas, e todos os servos aparecerão perante o Senhor para serem julgados. Paulo parece vincular as duas perspectivas em Tessalonicenses: não chegaremos antes dos que dormiram primeiro, mas os encontraremos na região celestial. Não há necessidade de cogitar um estado intermediário como alguns têm feito. Lucas 16 parece ensinar que o juizo é imediato na hora da morte, enquanto João 5 denota o juizo como tendo ocorrido mesmo antes da morte do indivíduo.

53 ROBBINS, 222. 54 Vinda ou chegada em glória do Messías, já que os termos segunda vinda e volta de Cristo não são bem assentados no texto bíblico.

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Inferno:

Como o conceito “céu” tem vínculo estreito com o estar presente com Deus, o conceito inferno vincula-se diretamente ao oposto. Várias figuras são usadas para descrever essa realidade, mas o essencial é de estar completamente desvinculado de Deus para sempre. Há passagens que tratam o inferno como ardendo em fogo, enquanto outras passagens descrevem com o ranger de dentes, refletindo um frio interminável. Lembra-se que são figuras para descrever uma realidade que não se reduz à linguagem humana. Outras formas descritivas também são usadas, como de ser deixado do lado de fora da festa nupcial ou banquete. Qualquer que seja o detalhe, é um estado consciente de separação de Deus.

Escatologia, Textos Bíblicos Essenciais:

Passemos agora a tratar alguns textos chaves para a compreensão das temáticas da escatologia. As passagens a seguir não são todas as passagens relevantes, mas são as mais centrais para tratar essas temáticas.

1ª Coríntios 3.10-4.5:

“Aquele que constrói banalmente a igreja de Deus sofrerá a perda de recompensas especiais que Deus tem preparado para serviço bem prestado. Sua salvação não está envolvida. Ela é um presente da graça de Deus, recebido pela fé. No entanto, tal salvação teria sido de muito mais agrado se houvesse resultado em boas obras, em materiais dignos, contribundo para a construção da igreja de Deus”55.

Por contrastar ouro, prata e mármore com madeira, palha e joio, Paulo fala de “um palácio por um lado, e uma barraca de lodo por outro”56, segundo os materiais em uso comum na época. Os materiais dignos para a construção sobrevivem ao fogo mencionado. Se Cristo for o alicerce, a estrutura erguida por cima deveria ser digna da qualidade do seu fundamento. Não se deve construir de qualquer maneira, mas com qualidade57. Em algum ponto o material utilizado na construção será visto e provado58.

Não há como escapar desta prestação de contas a Deus59, pois nesta menção do fogo é feita em conjunto a menção do “Dia”—uma referência escatológica—essa junção refletindo o dia de juízo escatológico. Nestes termos, a igreja primitiva ouvia uma mensagem de boas novas pelo interesse e a autoridade de Deus exercida sobre o que se passava entre o seu povo ou sua igreja60. O interesse de Deus está presente na sua igreja e no labor desse seu campo. Esse interesse virá a ser revelado de forma mais efetiva no juízo ao qual Paulo aqui se refere. No entanto, muitos trabalham no campo, mas haverá um prestar de contas. Esta prestação aqui referida não está necessariamente vinculada com a salvação, mas com a recompensa do justo fiel.

55 BERQUIST, 26. 56 Lighfoot em ROBERTSON, WPNT IV, 97. 57 BERQUIST, 25-26. 58 FEE, 141. 59 ROBERTSON, WPNT IV, 97. 60 SOARDS, 73.

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A figura do juízo aqui não é a questão da separação entre os fiéis e os infiéis, “é a tragédia de uma vida infrutífera, de um ministro que trabalhou tão pobremente no alicerce verdadeiro que o seu trabalho subiu em fumaça… É a figura de uma vida desperdiçada…. Não há almas no céu como resultado de seu labor por Cristo, enriquecimento de caráter, nem crescimento em graça”61. A questão básica aqui é de que importa para Deus a qualidade do investimento que cada qual faz no desenvolvimento do reinar de Deus62.

Quando Paulo trata a questão do corpo do cristão como templo, ele emprega o termo nao;" (naós), que designa mais precisamente o santuário em si, do que o templo como um todo. O uso aqui pode designar a parte interna do templo, o santuário63, onde se visualizava a mera presença de Deus. Um santuário, ou templo, era para o povo da época uma manifestação visível da presença do deus ali cultuado64, neste caso, YHWH (h w h y). É neste contexto que Paulo retrata a vivência interna do “Sopro de Deus” no cristão, como parte desse templo. Vale ressaltar que o termo pneu`ma (pneuma) é usado nos parâmetros do termo hebraico jwr (ruach), o qual designa não apenas o conceito de espírito, mas o próprio fôlego65. A intimidade da vivência interna do pneu`ma tou` qeou ̀(sopro de Deus) é igual ao respirar do homem no seu viver diário, ressaltando assim a importância e a proximidade do corpo como sendo a “nave”66 do templo de YHWH.

O conceito de “o dia” é especificamente uma referência judicial67. Nesse dia, o juiz seria Deus, não algum ser humano que usaria de parcialidade no seu juízo. Este juiz julgaria conforme os reais méritos, não por alguma perspectiva falha ou parcial68. Este julgamento, portanto, é motivo de alegria para Paulo, pois o seu julgamento e o seu futuro está nas mãos de Deus, não dos homens. Deve-se lembrar que Paulo termina num ponto positivo, mostrando que o prestar contas ao Senhor deveria ser um motivo de alegria para o cristão69.

Esta passagem de 1a Coríntios, revela que o julgamento vindouro é mais do que uma símples separação entre os fiéis e os infiéis. Remonta também a alguma diferenciação entre a qualidade do investimento de cada cristão na construção da igreja, ou seja, no reino de Deus. Nesta diferenciação, não existe motivo de se gloriar por haver em qualquer caso “merecido” a salvação, mas parece ser um ensino coerente com a passagem de Mateus 25.14-30, onde aos servos fiéis são dados novas responsabilidades, ou seja, oportunidades de continuar o seu serviço a Deus. O reinar de Deus continua, e o cristão ainda permanece como servo ou mordomo do Senhor do reino.

Lucas 14.1-16.31:

A parábola de Lázaro e o homem rico é uma das passagens mais marcantes referente ao estado do ser humano após a morte. Aqui se evoca imagens bem ilustrativas de recompensa e juízo. É interessante notar que Jesus referiu esta parábola aos fariseus e não aos saduceus. Os saduceus não pensavam existir uma vida além-túmulo no sentido de céu e inferno, apoiando-se aos conceitos mais tradicionais do judaismo do Seol como o lugar de todos os mortos, sem diferenciação. Esta parábola, como todo o texto maior desde o capítulo quatorze, parece estar bem dirigida aos fariseus, os quais

61 ROBERTSON, WPNT IV, 98 62 SOARDS, 74. 63 BAUER, 533-534 e SOARDS, 74. 64 BERQUIST, 27. 65 Veja “O Sopro de Deus” em Homilética da Teologia das Narrativas, p. 18. 66 O termo é provavelmente proveniente do grego nao;" (naós) desta passagem. 67 SOARDS, 87. 68 BERQUIST, 32. 69 SOARDS, 89.

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tinham expectativas messiânicas e escatológicas bem desenvolvidas. Este ensino, portanto, tem uma audiência específica. Parece que o tratamento do reino dado por Jesus para os saduceus teria uma ótica e ênfase diferente.

Tem sido comentado que Jesus parece colocar mais ênfase no ensino referente ao inferno do que propriamente no ensino referente ao céu. Deve-se lembrar, porém, que o inferno não é o contraponto ou oposto do céu, mas do reino. Nestes termos, o ensino de Jesus é bem dirigido à inclusão dos saduceus. O reino já chegou e começa no aqui e agora. Esta vida no reino é a “vida das eternidades”, o qual começa aqui e continua para sempre. Como a vida do reino é deixar que Deus reine no indivíduo e no corpo, o céu é a continuação do reinar de Deus, mesmo após a morte. A morte não interfere no reino, apenas modifica a esfera de sua atuação. O ser humano continua após a morte no seu relacionamento com Deus, seja como for o mesmo—na intimidade do reinar de Deus ou na eterna separação de Deus, o inferno.

Para tratar bem a parábola de Lázaro e o homem rico, é necessário ver alguns assuntos do contexto maior desde o início de Lucas 14. Em geral, uma parábola é dirigida a alguem para evocar uma resposta70. Assim, é necessário compreender do contexto a quem a parábola estava sendo dirigida e com que motivo foi empregada por Jesus. Também algumas questões clarificativas devem ser colocadas de antemão.

O contexto maior começa fazendo uma diferenciação entre a ótica ou prática dos fariseus e a forma de vida do reino que Jesus pregava. Desde pelo menos o capítulo 14, Jesus vem lançando uma série de críticas aos religiosos do seu dia. Com esta crítica, Jesus vem enfatizando o tipo de vida do reinar de Deus—a “vida das eternidades”—pelo seu caráter ou sua qualidade. No gráfico a seguir, pode-se ver algo da crítica colocada por Jesus em oposição aos líderes religiosos dos judeus do seu tempo. Como tem sido comentado em outra parte, a crítica de Jesus “questiona a confiança daqueles que tomam por certo que estarão presentes no grande banquete escatológico. …São os pobres, os coxos e os cegos que estão se encaminhando ao banquete, enquanto muitas das pessoas mais óbvias da lista de convidados estão mais preocupadas com outros assuntos”71.

Ref: Designação Crítica de Jesus

14.1-6 Negligenciando os pobres e necessitados

14.7-14 Buscavam o melhor para si; faziam bem para que o bem fosse feito em retorno

14.15-24 Os grandes não querem ir ao banquete, criam desculpas, pois não querem a renúncia.

14.25-35 Necessidade de renúncia/contar o custo

15.1-2 Murmuravam por Jesus aceitar pecadores

15.3-7 Festa pela ovelha: 1/100

15.8-10 Festa pela moeda: 1/10

15.11-32 Festa pelo filho: ½

16.1-9 Infiel sabe utilizar infidelidade em ganância própria, não o fiel

16.10-13 Fiel em pouco, também em muito

70 FEE e STUART, 124. 71 NOLLAND, 758.

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16.14-18 Fariseus gananciosos e infiéis à lei

16.19-31 Reversão completa no juízo

O termo “Hades” (adh") é a expressão grega utilizada na Septuaginta para traduzir o termo hebraico, l w a v (Seol), este designando o lugar de continuidade nebulosa dos mortos72. No Antigo Testamento, o termo mais significativo para referir-se ao mundo dos mortos é esse termo, “Seol, uma palavra de origem incerta, porém usada 65 vezes no Antigo Testamento”73.

O conceito do Seol veio sofrendo modificações ao longo do processo revelatório de Deus com o povo de Israel. Eclesiástes nem compreende qualquer vida além do túmulo, enquanto por outro lado vários textos começam a sugerir imagens dessa existência ou continuidade. Quando inicialmente surge o conceito de uma vida além-túmulo, concebe-se em geral um lugar de silêncio74. O termo essencial é Seol, porém outros termos são empregados para expressar esse conceito. Abadon (@wdba) por si significa destruição, mas é usado no Antigo Testamento também em referência ao Seol75, o reino dos mortos76. Mesmo assim, o significado é impreciso por causa de termos que são muitas vezes vínculados ao seu contexto, gerando a idéia de lugar daqueles que dormem, conforme as sombras dos mortos que se acordam um pouco para receber o rei da Babilônia77. Em Jó 26.6 e 28.22, o Abadon é a personificação do lugar de destruição, ou seja, dos mortos78. O tehom (µwht—profundezas, ou abismo) e o deserto são também símbolos, para os hebreus, referentes ao lugar dos mortos79.

Moody coloca a passagem de Isaías 14.9-15 como sendo a descrição mais vívida do conceito do Seol80. Ao ler a seguinte passagem, deve-se lembrar o gráfico do conceito hebraico do universo81:

“O Seol desde o profundo se turbou por ti, para sair ao teu encontro na tua vinda; ele despertou por ti os mortos, todos os que eram príncipes da terra, e fez levantar dos seus tronos todos os que eram reis das nações. Estes todos responderão, e te dirão: Tu também estás fraco como nós, e te tornaste semelhante a nós. Está derrubada até o Seol a tua pompa, o som dos teus alaúdes; os bichinhos debaixo de ti se estendem e os bichos te cobrem. Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! Como foste lançado por terra tu que prostravas as nações! E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono; e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do norte; subirei acima das alturas das nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo. Contudo levado serás ao Seol, ao mais profundo abismo.”82

“O contraste entre o temor e desespero que se agarrava às almas dos homens no Seol, e a esperança jubilosa que surgia pela expectativa da ressurreição, é vividamente expressa no Apocalipse de Isaías (24-27). Isaías 26.14 diz com respeito aos ímpios: ‘Os falecidos não tornarão a viver; os mortos não ressucitarão; por isso os visitaste e destruíste, e fizeste perecer toda a sua memória’. No mesmo capítulo aparece a primeira referência clara à ressurreição da vida. Dos justos declara-se (v. 19): ‘Os teus mortos viverão, os seus corpos ressuscitarão; despertai e exultai, vós que habitais no pó;

72 MOODY, 493 e NOLLAND, 557. 73 MOODY, 492. 74 WATTS, 209. 75 MOODY, 493. Jó 26.5-6 “As sombras abaixo tremem, as águas e seus habitantes. O Seol é nu perante Deus, e o Abadon não tem coberta” (citação bíblica da versão Imprensa Bíblica Brasileira, de acordo com os melhores textos). AUNE (B., 534), portanto, coloca o Abadon como sinônimo de Seol, o reino dos mortos. 76TATE, 403. 77 WATTS, 209. 78 AUNE, B., 534. 79 MOODY, 493. 80 ibid., 495. 81 Veja a página 6 desta apostila. 82 Versão da IBB, de acordo com os melhores textos.

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STBRS-PETE “5.000 5.000” Escatologia e o Apocalipse Pr. Chrístopher B. Harbin

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porque o teu orvalho é orvalho de luz, e sobre a terra das sombras fá-lo-ás cair’. A ressurreição dos mortos depende do poder e da realidade de Deus e o relacionamento correto do homem para com Deus”83. Em Apocalipse 20.14-15, a morte e o Hades são jogados em conjunto no lago de fogo. Seu poder sobre o ser humano é aniquilado84, mostrando em concordância com outras passagens que até “o Seol fica sob o domínio de Deus”85.

Ao retratar o nosso conceito de inferno com o emprego de termos como Seol e Hades, deve-se lembrar as limitações do conceito expresso com esses termos por suas conotações geofísicas. Lembrando o conceito hebraico do formato físico do mundo, o Seol era o mundo subterrâneo ou parte dele. Com o complemento do ensino de Jesus e o emprego de outras metáforas para o inferno86, vale lembrar que a verdade do ensino não está ligada ao espaço físico, mas à sua realidade relacional. “O inferno não é tanto um lugar de tormento físico, como é a horrível solidão de uma separação total e completa do Senhor”87.

A ótica normativa do povo apegava-se a um conceito de retribuição. O justo recebia recompensa material enquanto o injusto sofria a falta de bens materiais e saúde. Conseqüentemente, era comum pensar nos ricos serem aqueles que eram abençoados por Deus e dignos para participação no reino messiânico por vir. Ao nomear o mendigo na parábola, porém, Jesus contradiz grandemente esta questão, especialmente em contraste à falta de nome para o rico.

O nome dado ao mendigo, Lázaro, tem como significado o mesmo de Eliezar (rz[la)—“Deus ajuda” ou “Deus, Ajude!”. O nome é uma transliteração grega de uma forma variante do mesmo nome hebraico88. A própria questão de que ao mendigo é dado um nome, denota a distinção real entre o valor de sua vida em comparação com a do rico, a quem é dado importância pela sociedade. O rico atua em desprezo ao mendigo, porém Deus vem à sua ajuda.

Em toda a passagem, Lucas retrata Jesus oferecendo uma série de críticas referentes às práticas farisaicas do seu tempo, as quais serão tratadas como um todo na parábola de 16.19-31. Aqui vemos as críticas da negligência para com os pobres, da reivindicação de direitos, do fazer bem aos que podem dar retorno, da falta de aceitabilidade de renúncia própria e a infidelidade às demandas da lei em relação ao próximo. Todo o ensino de Jesus nos últimos três capítulos de Lucas encontra um resumo aqui nesta parábola.

Nesta parábola, mesmo que seja uma figura lingüística ao todo, Jesus coloca algumas informações sobre a vida futura em sentido de ensino veraz. Não se deve dar ênfase demais aos elementos referentes ao mundo além-túmulo aqui descrito. Se o teor básico coerente com a crítica lançada contra os fariseus desde o capítulo 14 fosse inverídico, não haveria por que oferecer a parábola. É, portanto, uma passagem que contém informação sobre a vida além-tumulo, mesmo que esse enfoque seja parcialmente restrito em função de ser uma parábola. Alguns dos ensinos referentes à vida além-túmulo nesta passagem incluem os seguintes:

• Há consciência do estado além-túmulo;

• Há memória desta vida na vida futura;

• Há um juízo imediato (mesmo que intermediário) envolvendo algum conceito retribuitivo;

83 MOODY, 504, citações bíblicas da versão Imprensa Bíblica Brasileira, de acordo com os melhores textos. 84 ROBBINS, 230. 85 MOODY, 493. Veja também a referência que Moody faz a 1a Samuel 2.6 e Amós 9.2. 86 Veja Mateus 25.30, onde o servo inútil é colocado para fora no frio, onde existe “o ranger de dentes”. 87 ERICKSON, CT, 1241. Ênfase minha. 88 NOLLAND, 828.

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• Mesmo que o retrato seja de um estado intermediário, vê-se um juízo já pronunciado;

• Há conforto além-túmulo para os fiéis oprimidos neste mundo;

• Não há reversões do juízo de Deus após a morte;

• A informação necessária para receber o “descanso” na vida além-túmulo está clara o suficiente na “lei e nos profetas”89;

• Deus se preocupa com aqueles descartados pela sociedade;

• Não há retorno para esta vida terrestre após a morte;

• Confiança em Deus é o único mérito de Lázaro (expresso no seu nome);

• A situação de vida neste mundo é de muito menos valia quando se passa ao mundo além-túmulo.

Uma pergunta que provém do estudo da parábola pode bem ajudar a redefinir as prioridades do quotidiano. Que diferença faz a minha presente circumstância ou forma de atuar em termos da minha vida daqui a dez mil anos? Em certo sentido, é esta a pergunta de Jesus aos fariseus através desta e outras palavras de ensino. Em outra passagem se registra as palavras de Jesus em reação à preocupação de ter um corpo inteiro na ressurreição (para tal queriam guardar qualquer parte do corpo que fosse amputado para ser incluído com o resto do corpo no sepultamento). Nesse contexto, Jesus diz que é melhor arrancar e jogar o olho fora90 se fizer a diferença no ingressar no reinar de Deus. Muito melhor viver no reino coxo, cego, ou aleijado do que perder o reino por completo.

João 3.16-21; 5.5-25:

João lança que o homem “já está julgado”, mas Jesus veio para o livrar da condenação. “E o julgamento é este, que os homens amaram mais as trevas do que a luz, pois a suas obras eram más”. O julgamento e a condenação já estavam realizados e atuantes na humanidade, como também são até hoje. Não havia de se esperar a chegada de um dia de juízo, mas apenas a efetivação da sentença. No período antes da morte do indivíduo, porém, existe a possibilidade de ser inocentado por Cristo. Em outras passagens trata-se de um juízo vindouro, mas aqui de outra perspectiva, a qual trata o julgamento como fato já no passado. Esta temática será repetida em 5.24-25.

Em João 5.5-14, Jesus vincula a cura do paralítico com questões de fé e pecado. Jesus não curou a todos, mas curou a este. Logo, a cura deste paralítico vincula-se com o ensino de Jesus referente ao morto ambulante91. Já há condenação e juízo, o homem apenas está aguardando cumprir a sentença, mas existe a possibilidade de ser inocentado, mesmo que já tenha sido julgado culpado.

Essa não é a única perspectiva bíblica sobre o julgamento, mas deve ser vista como corretiva a um conceito dogmático demais referente ao procedimento específico além-túmulo da realidade.

89 Jesus expressa aqui continuidade do plano redentor de Deus. Em concordância com Gênesis 15.6, Romanos 4.3, Gálatas 3.6 e Hebreus 11.1-14, a salvação é e sempre foi pelo relacionamento de fé—uma confiança e dependência completa de Deus. 90 Mateus 5.29. 91 João 5.24-25.

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Mateus 23.29-24.44:

O capítulo 23 de Mateus fornece a base segundo a qual se pode compreender as palavras de Jesus no capítulo 24. Pela pergunta dos discípulos em Mateus 24.3, é óbvio que eles pensavam que as três coisas (destruição de Jerusalém, parousia92 de Jesus e fim do mundo) aconteceriam juntas93. Guerras, fomes e terremotos citados por Jesus em Mateus 24 eram sinais comunmente associados com a aproximação do “fim” na literatura apocalíptica judaica da época94. Jesus diz que estas coisas não são sinais de nada! Diz que acontecerão, mas os discípulos não devem preocupar-se até verem a abominação desoladora predita por Joel. Muitos tratam esta passagem como uma coletânea de ensinos dados por Jesus, não sendo necessariamente tão homogênea95. Há, no entanto, uma lógica de argumentação que indicaria um discurso direto e coerente, mantendo em vista as expectativas apocalípticas do dia e as três perguntas a serem respondidas por Jesus.

Mateus 24.29-31 reflete a linguagem apocalíptica de Isaías 13.10, 34.4; e Ageu 2.696, como também de Joel 2.10, e da expressão de um commentário livre sobre Daniel 7.8-27, 8.9-26, 9.24-27, e 11.21-12.1397. “O termo eleitos em Mateus 24 deve ser compreendido de acordo com o seu uso em outras partes das Escrituras, em que significa ‘crentes’”98.

Mounce coloca em questão a referência do capítulo 24.3-31 à destruição de Jerusalém, considerando que a linguagem de vários versículos trata da vinda de Cristo99. Todos os sinais a serem vistos são enganosos, pois não remontam ao fim, a não ser o fim de Jerusalém100. Os versículos 29-31 tratam da parousia de Jesus. Ao mesmo tempo, esse tratamento é dado a fim de esclarecer a questão de que os falsos cristos são exatamente isso—falsos. O enfoque da passagem não chega a tratar a parousia diretamente, mas o faz em termos de um excursus101. Assim Mateus 24.23-28 trata a questão dos falsos cristos, mesmo que o versículo 27 entregue o ensino específico sobre a vinda de Jesus. O tema que está sendo tratado não é a parousia, mas os falsos cristos que estavam para surgir. Em Mateus 24.27, o essencial no que corresponde à vinda de Jesus, “é de que a volta do filho do homem será claramente visível a todas as pessoas, em todos os lugares”102.

Propõe-se a seguinte divisão temática para a passagem:

23.1-39 “Censura aos escribas e fariseus” 23.37-24.2 “Jesus fala sobre a destruição de Jerusalém e do templo” 24.3 “Perguntas dos discípulos” 24.4-28 “Resposta: Destruição de Jerusalém e do templo” 24.29-25.46 “Resposta: Vinda do Filho do Homem/Fim”.

Nas palavras de Jesus, não existe sinal nenhum referente ao fim do mundo nem da parousia. Jesus mesmo diz aqui o que Paulo repete em 1ª Tessalonicenses, e João em Apocalipse 16.15, que ele virá como o ladrão inesperado durante a noite. Jesus diz propriamente que nem ele sabe quando será essa vinda. Como, então, poderia ele dar um sinal da vinda cujo tempo desconhecia?

92 Termo do grego para a vinda de Jesus em glória. 93 MORRIS, 596. 94 MOUNCE, 234. 95 ALBRIGHT, 286 e 288. 96 MOUNCE, 237-238. 97 ALBRIGHT, 289. 98 ERICKSON, ITS, 522. 99 MOUNCE, 237. 100 RIENECKER, 390-391. 101 Um excursos é um texto parentético que visa a tratar uma temática levantada antes de voltar à linha de argumentação geral do texto. 102 MOUNCE, 238.

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“…Durante os séculos que precederam ao advento de Jesus, houve um número cada vez maior de judeus que viviam fora da Palestina”103, o que se chama de Diáspora ou Dispersão104. “…Já no século primeiro as colônias judaicas em Roma e em Alexandria eram numerosíssimas. Em quase todas as cidades do Mediterrâneo oriental havia pelo menos uma sinagoga”105. Logo, em Atos 2, é apresentado que o evangelho foi pregado a todas as nações (etnias—e[qnh) no dia de Pentecostes, entendendo que estes judeus espalhados levaram o evangelho de volta para as suas cidades, dispersos por todo o mundo conhecido.

Os judeus haviam parado de oferecer sacrifícios a YHWH (hwhy) em favor do Imperador, assim rompendo o trato que tinham com Roma. Esse trato foi a forma encontrada para apaziguar as relações deles com Roma: os judeus sacrificavam em prol do império, o que os preservava da necessidade de sacrificar aos deuses romanos e à imagem do imperador106. Buscando a resolução do impasse dos judeus nos anos finais da década de 60, no ano 70 Tito entrou em Jerusalém para fazer o sacrifício mandatório107, em resposta ao rompimento do acerto com Roma. O templo foi queimado por completo em reação por parte dos judeus ao procedimento Romano em oferecer sacrifício a César sobre o altar do Templo108. Em conseqüência da revolta, toda Jerusalém foi destruída. A destruição deu-se tão completamente que entre os anos 302 e 312, o governador Romano da Palestina nem havia ouvido falar de Jerusalém109.

Conforme Josefo descreve o caso, não era intenção de Roma destruir Jerusalém, mas tornou-se realidade em conseqüência da reação judaica em oposição ao sacrifício feito sobre o altar. “[Os romanos] tiveram durante todo o tempo da guerra grande misericórdia do pobre povo, ao qual era proibido fazer o que quissesse por aqueles [judeus] tumultuadores e sediciosos… por não [querer] destruir a cidade [de Jerusalém], somente para que os que eram autores de tal grande guerra tivessem tempo para se arrependerem”110.

O império enfrentava guerras e dificuldades de todos os lados por volta da época da destruição de Jerusalém. A introdução descritiva histórica de Tácito é bem ilustrativa: “Começo a obra de escrever sobre uma época que é rica em tragédias, sangrenta por causa de batalhas, dilacerada por revoltas”111. Houve terremotos na Ásia nos anos 60. A morte de Nero em 68 foi seguida por um período de muita instabilidade, mais guerras e até três imperadores num período de dois anos. Em 62, os partos estavam em revolta, em 68 havia revolta na Galícia, na Germânia em 69, na Judéia de 66 a 70. Vesúvio erruptou em 79, cobrindo Pompeii e cidades vizinhas e enviando uma núvem sobre grande parte do império. Houve fomes nos anos 90112. “…E maior que quantas [guerras] jamais temos ouvido de cidades contra cidades e povos contra povos…”113. Também se sabe pelas cartas de Paulo e de Atos que houve fomes na Judéia durante o período de seu ministério, como a fome nos dias de Cláudio no ano 46114.

“Molestavam aos romanos os galos que são vizinhos [dos judeus]; não descansavam os germânicos; o universo estava cheio de discórdias depois da morte de Nero; havia muitos que, por ocasião dos

103 GONZÁLEZ, 20. 104 cf. 1ª Pedro 1.1. 105 GONZÁLEZ, 20. 106 AUNE, A., 170. 107 GONZÁLEZ, 58. 108 JOSEFO, 17. 109 FREND, 2, citando Eusébio. 110 JOSEFO, 13. 111 Tácito em RIENEKER, 391. 112 BORING, 10. 113 JOSEFO, 11. 114 RIENECKER, 390.

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tempos e de tão grandes revoltas, pretendiam agarrar para si o império; e os exércitos todos, pela esperança de maior lucro desejavam tumultuar tudo”115.

Mateus 25.14-46:

A apresentação aqui do juízo não deve ser vista como uma figura completa de todo aspecto da salvação, pois tem como objetivo ressaltar a evidência de que o ser humano será julgado116. Não se deve pensar aqui em dinheiro, mas em potencial a ser aplicado sob o reinar de Deus117.

Alguns interpretam a passagem para dizer que a salvação é merecida pelas obras, mas deve-se lembrar a implicação aqui de que todos somos servos de Deus. Nesse contexto, Jesus descreve a realidade da diferença de atitudes entre fiéis e infiéis. Graça é tão importante em Mateus, como em qualquer outro texto neotestamentário118. Mesmo assim, deve-se lembrar que todos são vistos aqui como servos de Deus—uns são fiéis, outros são infiéis. Tal como na parábola dos lavradores maus, todos eram servos, mesmo aqueles que foram depostos dos seus cargos. Não vem ao caso tratar a forma de alcançar a salvação, muito menos salvação mediante obras, mas, como Jesus já designara no final de capítulo 24, o infiel mostra-se infiel por suas ações, enquanto o fiel pratica fidelidade. As ações revelam o caráter da pessoa e a qualidade do seu relacionamento com Deus.

A segunda parábola aqui reflete outra vez conceitos de Mateus 16.27, onde cada qual recebe juízo ou recompensa de acordo com a sua atuação no reino119. O ministério das ovelhas obviamente não é uma ação com fins de alcançar mérito, pois não se percebe o mérito de suas ações. É simplesmente uma forma natural de viver o evangelho de Cristo120.

Interessante no tratamento da parábola dos talentos, é que o talento era uma medida de peso, equivalente a uns vinte quilos. Provavelmente refere-se a prata ou ouro, mas a designação não é específica nesse sentido. Se fosse um talento de ouro, o preço de mercado atual colocaria o talento no valor de mais ou menos 3.100 salários mínimos mensais. Ao que fora fiel com os cinco talentos, no entanto, é designado como tendo sido fiel em pouco (15.500 salários, o que seria em 2002 uns R$3,1 milhões, dobrado em R$6,2 milhões)—agora este será colocado sobre muito! Aqueles dez talentos não são de muito valor, mas o Senhor colocará este servo fiel sobre muito mais—o suficiente para que ele veja a insignificância do primeiro encargo. Uma implicação desta parábola é de que o céu não é uma “aposentadoria legal”, como no conceito de muitos. É a oportunidade de continuar a servir ao Senhor de forma ainda mais significativa. Em nenhuma instância essa vivência é para aqueles que não querem servir—é para aqueles que querem ser úteis no reino de Deus e que tem mostrado tal por meio de serviço prestado.

1ª João 2.18-4.6:

“É a última hora”. Para João, não existe nenhum intervalo antes dessa última hora chegar. Ela já estava presente para ele no primeiro século. O judeu dividia o tempo em duas etapas—antes e depois

115 JOSEFO, 12. 116 MORRIS, 634. 117 HAGNER, WBCM, 737. 118 MORRIS, 637. 119 HAGNER, WBCM, 741. 120 MORRIS, 639.

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do Messias. Logo, após a ressurreição de Jesus os cristãos já presenciavam os últimos tempos ou a última hora—essa segunda etapa do tempo. Jesus modificou a expectativa judaica, pois não estabeleceu um reino político, mas já começara o seu reinar nos cristãos do primeiro século. Agora o cristão anela uma terceira etapa de tempo, marcado pela vinda em glória (parousia) de Jesus.

O Anti-Cristo já está presente—na época de João! Realmente, o texto trata de “anti-cristos”, ou seja, muitos que atuam em luta contra Cristo. Não se trata aqui de um anti-cristo singular, mas de muitos anti-cristos, já na época do próprio João. Conseqüentemente, a sua descrição do tempo em termos de ser a última hora já entrou em vigor há quase dois mil anos atrás. Já é a última hora, como vem sendo desde o primeiro século. Quer dizer, já vivemos na época após a vinda do Cristo, esperando a sua vinda em glória.

João afirma que não há mistério escondido para os fieis, pois o evangelho já fora pregado a eles. Essa declaração contradiz diretamente os ensinos gnósticos prevalentes já no primeiro século. Tal grupo ensinava a necessidade de aceitar uma doutrina escondida e especial, e que a salvação era através de um correto conhecimento da doutrina escondida. João responde que não há novidade, mas apenas a mensagem gloriosa do evangelho eterno de Jesus Cristo. Não há segredos a serem descobertos, mas uma mensagem aberta para todos que quiserem assumir o compromisso com Cristo.

Logo, em termos escatológicos, também não há ensinos secretos a serem decifrados. A mensagem do evangelho é clara—ninguém sabe quando Jesus virá em glória, mas é verdade que virá. Ninguém pode discernir os tempos, predizendo os eventos futuros escatológicos, mas pode-se saber do próprio evangelho as verdades referentes àqueles eventos. Não compete ao cristão conhecer os detalhes, mas compete a ele conhecer o Salvador e obedecê-lo em fidelidade.

1ª Tessalonicenses 4.13-5.11; 2ª Tessalonicenses 2.1-3.5:

O termo “dormir” é comumente usado como um eufemismo para morte, sendo este o uso aqui121. Deve-se tomar cuidado para respeitar esse uso do termo. 1ª Reis 2.10 diz que Davi dormiu com os seus pais e foi sepultado, 1ª Reis 11.43 diz que Salomão dormiu com os seus pais e foi sepultado. De 1ª Reis a 2ª Crônicas, existem 36 ocorrências deste uso do termo dormir. Atos 7.60 diz que Estevão adormeceu, mas 8.1 diz que Saulo consentia na sua morte! É também neste emprego do termo que Jesus o usa em João 11.11-14, mesmo que os próprios discípulos não tivessem compreendido de início.

Paulo aqui em 1a Tessalonicenses 4.13-14 contrapõe a esperança do cristão em contraste à falta de esperança no mundo pagão. Para o cristão e o judeu havia esperança de ressurrreição, mas então não havia entre os pagãos122. Aqueles que estavam "em Cristo" antes de suas mortes, continuam "em Cristo" após a mesma.

121 BRUCE, 95 e WATTS, 209, em discussão do Seol e Abadon como lugar dos mortos, vinculado ao conceito do lugar dos que dormem. 122 BRUCE, 96.

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Apocalipse, Introdução Geral e Histórica:

Qualquer interpretação textual é uma hipótese que precisa ser analisada, criticada e comprovada ou descartada. “As provas de uma hipótese interpretativa estão primeiramente no seu poder para trazer vida ao texto, fazer compreensível por que o autor fez o esforço para escrever o texto e (em grau um pouco menor) por que os primeiros leitores apreciaram o texto pelo menos o suficiente para não o jogar fora”123. O leitor deve, portanto, analisar as colocações destes comentários interpretativos como hipóteses a serem consideradas e avaliadas. Espera-se definir algumas linhas interpretativas que fazem jus ao texto, para que o mesmo possa ter aplicação para a vida do leitor.

Há várias perspectivas gerais no mercado referente à ótica interpretativa geral que se deve trazer ao livro de Apocalipse. Em grande parte, essas opções interpretativas dependem das presuposições com as quais os intérpretes começam suas leituras124. A grande maioria dessas posições ignoram o contexto histórico do próprio autor e as igrejas às quais a carta foi originalmente dirigida. “Quando se perde de vista o fundo histórico de que o livro proveio e o seu propósito na época em que foi escrito, pode-se oferecer qualquer teoría de interpretação”125. Apresenta-se nesta apostila, algo do fundo histórico para ajudar o leitor a situar a carta na condição vivida pelo autor da carta e pelas igrejas às quais foi dirigida.

Se o livro de Apocalipse foi transmitido até a época presente, deve ser pelo fato de que os cristãos da época ouviram nesta profecia a mensagem de Deus para suas vidas. Isto os impeliu a preservar o texto para gerações futuras. Assim, espera-se que, com o estudo do contexto histórico do autor e dos ouvintes originais, o propósito do autor possa ser resgatado, para que o livro de Apocalipse comunique mais claramente ao leitor atual.

O texto central do livro de Apocalipse encontra-se nas próprias palavras de Deus referidas desde o trono em 21.5-8126. Em todo o livro, estas são as únicas palavras registradas como saindo diretamente da boca de Deus. Nas palavras desta passagem, encontra-se o tema do livro, localizado precisamente no clímax literário de Apocalipse, numa forma bem sucinta e direta—“sê fiel até a morte”.

Um destaque a ser feito referente ao livro é o uso da língua grega. O grego utilizado em Apocalipse é distinto do grego do resto do Novo Testamento, sofrendo muita influência semítica, provavelmente ambos do aramaico e do hebraico127. As regras gramaticais normativas do grego são parcialmente dispensadas, sendo utilizado um estilo gramatical peculiar a este livro. As modificações de regras gramaticais gregas obedecem normas de gramática semítica. A influência semítica também é clara pelo fato de haver cerca de 500 alusões às Escrituras128.

No texto traduzido de Apocalipse, essas modificações de gramática não poderão ser apreciadas em geral. No entanto, haverá no grego certas distinções que podem ser relevantes na interpretação de uma passagem. Um exemplo é de distinguir entre um personagem já conhecido e um novo personagem que entra em cena. A mesma regra indica no capítulo 21 que os novos céus e a nova terra são completamente novos, não apenas uma reformulação das existentes.

123 GUNDRY, 254. 124 ALTER, 414 e 564. 125 HALE, 445. Esta introdução ao Novo Testamento é um dos melhores recursos gerais em Português para oferecer um resumo das preocupações básicas da carta. 126 AUNE, A., lxxxi. 127 AUNE, A., clxii. 128 BORING, 27.

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STBRS-PETE “5.000 5.000” Escatologia e o Apocalipse Pr. Chrístopher B. Harbin

Edição: 12-09-2002 ©Copyright 2002 por Chrístopher Byron Harbin Todos os direitos reservados. Página 26 de 58

Autoria e Contexto Histórico:

O livro de Apocalipse foi escrito com a intenção de ser lido em voz alta como uma obra completa. A idéia era que fosse lido no contexto do culto cristão. Fazer tal leitura não deve ser visto como opcional para o intérprete, pois esse drama não pode ser compreendido através do estudo de versículos individuais. O ensino sobre alguma das seções do livro deve compreender a sua função como parte da obra completa129.

O livro de Apocalipse é em gênero de literatura apocalíptica, a qual obedece regras interpretativas um tanto diferentes do que se usa para a maioria das outras classes literárias da Bíblia. Entre as várias distinções da literatura apocalíptica, duas devem ser vistas em tensão: a ênfase escatológica e a significância histórica130. Não se pode colocar todo o ensino do livro em termos de relevância escatológica e perder a questão de seu significado no seu contexto histórico.

O Apocalipse tem o caráter de uma carta pastoral dirigida às igrejas da Ásia Menor que enfrentavam uma crise religiosa e política. Mesmo que seja de difícil interpretação, deve ser lida, pois tem uma mensagem para a igreja de hoje, como tinha para a igreja da época131. A mensagem para hoje deve ser coerente com a mensagem que tinha para os destinatários originais. Como João teve um propósito ao escrever a carta, procura-se descobrir esse propósito e conseqüentemente a relevância do livro132.

Desde sua concepção, o livro de Apocalipse tem sido controverso, porém foi ao mesmo tempo incluído no cânon das escrituras133. Lutero negou estatus canônico funcional a Apocalipse, por entender que não era teologicamente adequado, mas o reteve no seu cânon134. Foi um dos poucos escritos dos crentes do primeiro século que sobreviveu e foi incluído no cânon neotestamentário135.

Há discórdia entre os estudiosos referente à pessoa do autor de Apocalipse. Muitos afirmam que o autor foi o Apóstolo João, seguindo posicionamentos tradicionais136. A discussão, porém, não é necessariamente convincente, vendo todas as provas oferecidas por todos os lados. É tão provável que tenha sido João, o Apóstolo, como é provável que fosse escrito por qualquer outro João que considerava-se profeta de Cristo, conhecido dos cristãos da Ásia Menor como sofrendo exílo na ilha de Patmo. As fontes de tradições nas quais Carson e outros se apóiam não parecem ter o peso necessário para demandar aceitação, mesmo durante o segundo século137.

Alguns têm procurado ver por detrás da carta uma história de transmissão e redação editorial entre várias fontes, mas o estilo e coerência lingüística e simbólica não deixam espaço para esta consideração. O Apocalipse deve ser visto em termos de uma unidade composicional, não uma obra de aglomerações de passagens acopladas138. A carta foi escrita por um só autor, mas é difícil definir

129 BORING, vii e 5. 130 HALE, 426. 131 BORING, 1. 132 ROBBINS, viii. 133 BORING, 2 e HALE, 423. 134 BORING, 3 e GEORGE, 85. 135 BORING, 4. Lembre-se de que mais de quarenta evangelhos foram redigidos, porém apenas quatro deles foram incluídos no cânon do Novo Testamento. Mesmo que o Apocalipse tenha sido “maltratado” por muitos ao longo dos séculos, merece o destaque de pertencer ao cânon, pois o povo de Deus ouviu em suas palavras a Palavra de Deus e por isso o guardou até hoje. 136 veja CARSON, 520-525. 137 BORING, 34-35 e AUNE, A., xlvii-lvi. 138 FIORENZA, 347.

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a pessoa específica. Conforme estudo literário e lingüístico, é muito difícil que tenha sido escrita pelo evangelísta139.

Seguindo Robbins140, deixamos a questão de autoria específica em aberto aqui com a definição de Aune: “o autor de Apocalipse… era provavelmente um judeu palestino que emigrou à província romana da Ásia, possivelmente em conjunto com a primeira revolta judaica, que se deu em 66-70 d.C. Ele se designava como profeta cristão e sua composição como um livro profético, e era conhecedor das congregações da Àsia, às quais endereçou… o seu livro”141.

O livro de Apocalipse foi mais provavelmente escrito no final da época do Imperador Domiciano (86-96) durante um período de perseguição dos crentes142, perseguição esta que se deu ao final de seu reinado, começando no ano 95143. Entende-se que João escreveu, alertando para uma possível eventualidade de intensificação da perseguição144, como também profetas do Antigo Testamento davam espaço para arrependimento–i.e. Jonas–sendo as suas mensagens de interpretação de eventos, não de predições, especialmente em termos do sentido da história145.

No contexto histórico após a guerra na Palestina entre judeus e romanos entre 66 e 70, houve uma grande migração judáica de refugiados para a região da chamada Ásia Menor146. Esta migração se deu antecipadamente às guerras na judéia que levaram à destruição de Jerusalém sob Tito no ano 70147. “…A perseguição sob Nero foi de enorme importância, não tanto por sua magnitude, mas por ter sido a primeira de uma larga série, de crueldade sempre crescente”148. Após uma tentativa de culpar os judeus, “…Nero fez aparecer como culpados [do incêndio de Roma] os cristãos, uma gente odiada por todos por suas abominações, e os castigou com mui refinada crueldade”149. Como Nero era odiado por muitos, não apenas pelos cristãos, surgiu o mito após o seu suicídio em 09 de junho de 68 de que não morrera ou que havia ressucitado dos mortos, mito este que circulou no império amplamente no final do século150.

Após a destruição de Jerusalém no ano 70151, houve muito conflito sobre a nova identificação e definição do que era ser judeu. Nesse período de busca por identidade, a igreja encontrava-se ao mesmo tempo numa época após a morte da maioria dos apóstolos e no começo da elaboração de uma nova estrutura e uma identidade própria à parte do vínculo com o judaismo152.

Um dos pressupostos da cidadania grega era que todos tinham o dever de participar do culto religioso sobre o qual a cidade era fundada153. No contexto do culto ao imperador Domiciano, recusa era punível com morte154. A importância dada a tais cultos gerava muito conflito com as isenções especiais oferecidas às comunidades judaicas. Neste contexto surgia grande parte da perseguição aos judeus por parte das comunidades gentílicas. Os judeus, por sua vez, podiam acusar os cristãos de

139 ALTER, 414. 140 ROBBINS, 17. 141 AUNE, A., lvi. 142 BORING, 1, 10, GONZÁLEZ, 4 e ROBBINS, 18. 143 CAIRNS, 74. 144 AUNE, A., lxv. 145 BORING, 25-26. 146 BORING, 9 e GONZÁLEZ, 20. 147 JOSEFO, 17. 148 GONZÁLEZ, 52. 149 Tácito citado em GONZÁLEZ, 55. 150 AUNE, A., lxi. 151 LOWRY, 35. 152 BORING, 9. 153 AUNE, A., 170. 154 ROBBINS, 24.

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não serem judeus, porém revindicando as condições especiais dos judeus. Nos capítulos 2 e 3 do Apocalipse, os perseguidores parecem ser judeus, não romanos155.

Perseguição:

“Este livro magnificente [Apocalipse] foi escrito para comfortar os santos num período de grande dificuldade”156. É, portanto, uma palavra de conforto para a igreja atual ao passar dificuldades.

Muito tem sido referido sobre a perseguição geral aos cristãos por Domiciano. Ao mesmo tempo, outros eruditos entendem que tais afirmações não têm base firme o suficiente para serem apoiadas. Claramente havia perseguição, mas não foi generalizada e sistemática como alguns querem afirmar. Muitos sofreram perseguição na era de Domiciano e após, porém não da forma sistemática nazista157. Pode-se dizer que João viu o que se entende ser a primeira etapa de algo que prontamente tornar-se-ia numa perseguição universal e sistemática, sendo no seu imediato uma situação religiosamente constrangedora158. Sem intervenção divina, a progressão dos eventos levaria a um nível de perseguição até então desconhecido.

Um historiador social romano define os parâmetros da perseguição da seguinte forma: “Desconhece-se qualquer perseguição da parte do governo romano até 64, e não havia perseguições gerais até a de Décio. Entre 64 e 250, havia apenas perseguições locais e isoladas; e até se o número total de vítimas era considerável (como creio que era), a maioria dos casos de perseguições deve geralmente ter sido bem breve”159.

“Em meio à perseguição, o Apocalipse mostra uma atitude muito mais negativa contra Roma do que o resto do Novo Testamento. Paulo havia ordenado aos romanos que se submetessem às autoridades, que haviam sido ordenadas por Deus. Mas agora o vidente de Patmos descreve Roma em termos nada elogiosos, como ‘A grande rameira … ébria do sangue dos santos, e do sangue dos mártires em Jesus’ (Ap. 17.1,6). E Pérgamo, a capital da região, é o lugar ‘onde está o trono de Satanás’ (Ap. 2.13)”160. Na cidade de Pérgamo, como também em Êfeso e Smyrna, havia um templo dedicado a César nos dias de João161.

Em 107 d.C., Inácio de Antioquia, um notável líder da igreja de sua época, escreveu referente a perseguição sob prisão, sendo levado a Roma para ser julgado. “Estou começando a ser discípulo … O fogo e a cruz, multidões de feras, ossos quebrados (…) tudo eu hei de aceitar, contanto que eu alcance a Jesus Cristo”162. A perseguição era real, mas Roma não estava procurando diligentemente matar todos os cristãos do império.

Os cristãos do primeiro século no império romano eram comunmente vistos como faltosos em patriotismo, não sendo religiosos e às vezes tachados de ateus, por não terem ídolos, enquanto os povos do império eram extremamente politeístas163. Era difícil para os judeus e, logo, para os

155 AUNE, A., lxiv-lxv 156 ROBERTSON, 458. 157 GONZÁLEZ, 60-67. 158 BORING, 17-23. 159 Saint Croix citado em AUNE, A., lxxvii. 160 GONZÁLEZ, 60. 161 BORING, 19-20. 162 Inácio de Antioquia, citado em GONZÁLEZ, 61 e 66. 163 BORING, 11.

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cristãos mostrarem que criam em Deus, quando os vizinhos pensavam que ídolos eram integrais a qualquer forma de culto.

Na época de 112 d.C., o governador da província ao norte da Ásia (Bitínia), escreveu uma carta ao Imperador Trajano, referente ao tratamento devido aos cristãos. Como se vê na carta e na resposta, não há exatamente uma perseguição institucional e programática, mas uma falta de compreensão da fé cristã num contexto muito constrangedor para o crente da época164. Havia perseguição, sim, mas não como aquela por Nero em 68. Esta carta de Plínio e sua resposta encontra-se traduzida abaixo165.

Tenho feito como regra, Senhor (reclamado como título pelo imperador, porém usado pelos cristãos apenas para Deus e Jesus), para referir-lhe tudo sobre o qual tenho dúvidas. Pois quem melhor poderia orientar-me as hesitações ou instruir minha falta de conhecimento?

Nunca estive presente na interrogação de cristãos, pelo qual não sei até que ponto tais investigações devem ser estendidas, nem quais punições são apropriadas. Também tenho estado incerto se idade é implicada, ou se os muitos jovens devem ser tratados igualmente como os adultos, se arrependimento e renuncia do cristianismo é suficiente, ou se os acusados devem ser considerados criminosos por haverem sido cristãos, mesmo se depois renunciarem, e se pessoas devem ser punidas simplesmente pelo nome “cristão”, mesmo se nenhum ato criminoso tenha sido cometido, ou se somente crimes associados com o nome devem ser punidos.

No entanto, tenho atuado com aqueles denunciados como cristãos da seguinte forma: tenho perguntado se eram cristãos. Aqueles que responderam afirmando, tenho perguntado uma segunda e terceira vez sob ameaça de morte. Se persistissem em sua confissão, eu os mandei executar, pois seja o que for que eles estejam asseverando, parece-me que a obstinação e a tenacidade devem ser punidas de qualquer forma. Outros que têm a mesma delusão, mas que foram cidadãos romanos, tenho designado a serem enviados a Roma.

No trascurso das investigações, como normalmente acontece, acusações são trazidas contra círculos maiores de pessoas, e os seguintes casos especias têm surgido:

Um letreiro anônimo foi colocado, acusando um grupo grande de pessoas por nome. Aqueles que negaram ser cristãos agora ou no passado, pensei necessário soltar, já que invocaram os nossos deuses de acordo com a fórmula entregue e por oferecerem sacrifícios de vinho e incenso perante a tua imagem que eu fiz trazer para tal propósito, junto com estátuas de nossos deuses. Também os fiz maldizer a Cristo. É dito que cristãos verdadeiros não podem ser forçados a fazer qualquer dessas coisas.

Outros acusados assim no início admitiram que haviam sido cristãos numa época, mas que haviam renunciado, alguns há três anos, alguns há mais tempo, alguns há tanto como vinte e cinco anos atrás166. Todos esses adoraram a tua imagem e as estátuas de nossos deuses e amaldiçoaram a Cristo. Eles verificaram, no entanto, que toda a sua culpa ou erro consistia no fato de que num certo dia antes da alvorada eles acostumavam-se a reunir e cantar um hino a Cristo como o seu deus e jurarem-se com um juramento para não praticar qualquer crime, mas para abster-se de todo roubo, assalto e adultério, para não quebrar a sua palavra depois de dada, e para não recusar a pagar as suas dívidas legais. Depois íam pelos seus próprios caminhos, e juntavam-se mais tarde para comerem uma ceia em comum, mas era comida ordinária e normal. Eles suspenderam até esta prática em acordo com um edito pelo qual eu havia proibido associações políticas, de acordo com as tuas instruções. Considerei ainda mais necessário obter através de tortura uma confissão da verdade de duas escravas, as quais chamavam diaconisas. Não encontrei nada mais que uma superstição vulgar e excessiva.

Assim, eu parei de ouvir outras acusações, para procurar conselho de ti. O assunto me parece necessitar bom conselho, especialmente em consideração ao grande número dos acusados, pois muitos de toda idade e classe, de ambos os sexos, estão em perigo de serem julgados agora e no futuro. A praga desta superstição tem se espalhado não apenas nas cidades, mas também pelas aldeias e pelos campos, porém eu creio que pode ser parada e uma solução providenciada. De qualquer forma, está agora bem claro que os templos anteriormente quase desertos estão pouco a pouco recebendo mais e mais visitantes, e os muito negligenciados festivais sagrados estão mais uma vez sendo observados, e a carne sacrifical, para a qual compradores eram difíceis de encontrar, está mais uma vez sendo comprada. Disso pode-se ver facilmente que tipo de melhoria pode ser feita com as massas quando se dá lugar para arrependimento.

164 Constrangedor o suficiente para causar a morte do cristão que se recusasse a sacrificar ao imperador (ROBBINS, 24). 165 BORING, 13. 166 A data especificada aqui estipula a época de Domiciano e o contexto da redação do livro de Apocalipse.

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(Resposta do Imperador Trajano)

Meu Segundus! Tens escolhido a forma correta em questão dos casos dos que têm sido acusados perante ti como cristãos. Nada existe que poderia ser considerado como uma norma universal referente a tais casos. Cristãos não devem ser procurados, mas se forem acusados e entregues, devem ser punidos, mas apenas se não negarem ser cristãos e demonstrá-lo pelo ato apropriado, ou seja, o culto aos nossos deuses. Mesmo se um é suspeito por causa de conduta prévia, ele ou ela deve ser inocentado em vista de arrependimento.

Acusações anônimas não podem ser consideradas em qualquer tribunal, pois seria um precedente perigoso, e não se dá com os nossos tempos167.

O contexto vivido pelas igreja na Asia Menor era muito constrangedor, enfrentando certa perseguição da parte do Império Romano168. João escreveu Apocalipse não sob uma perseguição sistemática, mas frente a uma perseguição que esperava crescer em intensidade. Ele compreendia estar vivendo as primeiras fases de uma perseguição que poderia se transformar em algo de escala universal169. Havia perseguição, mas não no sentido de aniquilação sistemática. O cristão podia ser executado por não cumprir com sacrifício ao Imperador170. Sabe-se que muitos foram executados nessa época, acusados de ateísmo, resultado da recusa de adorar os deuses de Roma e o Imperador. Essa adoração ao imperador o posicionava como um deus, blasfêmia tanto para judeus como cristãos. Na época em que vivia sob o Imperador Domiciano, todas as declarações oficiais do governo começavam da seguinte forma, “Nosso Senhor e Deus Domiciano ordena…”171.

Na sua época, Nero não era bem-quisto no império. Por questão de Nero haver acusado os cristãos de queimar Roma e haver executado muitos de formas grotescas, a sua figura era vista incrustadamente na consciência cristã como uma fera selvagem. Após o seu suicídio, houve rumores de que não havia realmente morrido ou que retornara dos mortos e estaria voltando com os exércitos partos para uma nova conquista172. Certas atitudes do Imperador Domiciano fizeram com que muitos o associassem ao mito de Nero redivivo.

O Imperador Domiciano insistia que todos que o endereçassem por escrita ou palavra o entitulassem “Senhor e Deus”173.

“…Domiciano começou a perseguir [os judeus] e a exigir o pagamento da oferta [antes dada ao Templo em Jerusalém]. Quando alguns judeus negavam-se a fazê-lo ou mandavam o dinheiro ao mesmo tempo que deixavam bem claro que Roma não havia ocupado o lugar de Jerusalém, Domiciano começou a persegui-los e exigir o pagamento da oferta. Já que ainda não estava totalmente limitada a relação do judaísmo com o cristianismo, os funcionários imperiais começaram a pressionar todos os que praticavam ‘costumes judaicos’ ”174.

Com a necessidade política de reverenciar o imperador como um deus, havia uma série de opções limitadas para os cristãos em termos de sua resposta, opções para as quais João aponta no livro de Apocalipse. Essas opções eram: 1-desistir de Cristo, 2-mentir sobre Cristo, 3-lutar contra o império romano, 4-mudar a lei, 5-adaptar-se às normas do império, ou 6-morrer. Esta última opção é a única que João diz ser uma possibilidade fiel cristã175. Desse posicionamento, pode-se ver facilmente por

167 Pliny the Younger, Letters X.96-97 em BORING, 14-15. 168 ROBBINS, 24. 169 BORING, 17. 170 ROBBINS, 24. 171 BORING, 18. 172 COLLINS, 126. 173 BORING, 21. 174 GONZÁLEZ, 58. 175 BORING, 21-23.

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que o conceito “aquele que perseverar até o fim” permeia toda a carta de Apocalipse176 e por que João pode falar de todos os fiéis sendo mortos em testemunho177.

“Os profetas como os apocalípticos eram homens que falavam para a sua própria geração”178. Menos de oito por cento das profecias no Antigo Testamento tinham a ver com uma época após a do próprio profeta179. Nesses mesmos termos, João dirige Apocalipse às igrejas de sua época, mesmo que a sua mensagem seja válida também às igrejas da atualidade.

Considerações Escatológicas referentes ao Apocalipse:

“Como o mal não se originou com a história, não desaparecerá completamente dentro da história, porém além dela, na inauguração do mundo por vir”180. À luz do Novo Testamento, diria-se que esse “mundo por vir” já foi inaugurado em certo sentido, pois é o mundo do Reino anunciado por Jesus. Ao mesmo tempo, o Novo Testamento afirma que há outro mundo além desta “nova época” (ou seja, “tempos finais”, “tempos posteriores” ou “últimos tempos”), um mundo que poderia-se chamar de não material, o qual designa-se por “céus” ou “reinar dos céus/Deus”.

No livro de Apocalipse, o final do mundo vem “à conclusão de cada série de sete. O sexto selo181, por exemplo, reflete a dissolução do cosmo”, dificultando a compreensão de que possa haver mais duas séires de desastres na seqüência da história. Logo, o livro parece tratar recapituladamente impressões variadas da realidade sendo apresentadas em diversas imagens evocativas182. Não se deve forçar o texto a apresentar uma progressão de eventos que culminam no final do livro através de uma seqüência direta. Tampouco deve-se fazer da carta apenas uma predição de eventos históricos183.

Conforme também na introdução de Apocalipse, “Quando Cristo é chamado ‘o primogênito de toda a criação’ (Cl. 1.15), e ‘o primogênito dos mortos’ (1.18), é a sua soberania sobre a criação e a morte que está sendo proclamada. O famoso jogo de palavras de Paulo esclarece isto: ‘O primogênito (prototokos184) dos mortos, para que em tudo seja pre-eminente (proteuon185)’ (Cl. 1.18)”186. Jesus havia ressucitado outras pessoas dos mortos, mas é Jesus que se mostrou vitorioso sobre a morte187. O termo “primogênito recorda a crença hebraica de que o lugar [de importância] era do pimogênito (Êx. 4.22; Jr. 31.9; Sl. 89.27)”188.

Quando o livro menciona o escurecer do sol, deve-se lembrar da erupção de Vesúvio no ano 79. A erupção causou a impressão de que a terça parte das estrelas desapareceram por causa da nuvem que cobriu grande parte do império romano na época189.

Há muitas formas de interpretação popular de Apocalipse procurando prever os eventos de juízo do final do mundo—uma para cada gosto. Muitas das mesmas já sofreram grandes reformulações por se

176 i.e. 2.7, 11, 17, 26; 3.5, 10, 12, 21; 7.14-15; 12.11; 13.10; 14.12-13; 17.14; 18.20; 20.4; 21.3-7; 22.3-4, 14. 177 1.5, 17-18; 2.10; 12.11; 13.15; 14.13; 20.4. 178 ROWLEY, 15. 179 FEE e STUART, 154. 180 LEVENSON, 50. 181 Apocalipse 6.12-17. 182 BORING, 32. 183 RISSI, 3. 184 prwtovtoko" 185 prwteuvwn 186 MOODY, 504-505. 187 ROBBINS, 35. 188 MOODY, 571. 189 BORING, 10.

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basearem em especulativas políticas, não em revelação, não em inspirição interpretativa divina, nem num bom conhecimento dos fatos históricos da carta sendo lida. Deve-se levar em conta que Jesus diz que ninguém pode discernir de antemão a data do fim, e é imprescindivelmente necessário submeter a vida ao senhorio de Cristo para estar pronto quando vier o fim. Tal ensino é muito mais claro do que as interpretações variadas no mercado. É também o tema mais negligenciado entre as opções populares.

O Apocalipse não é uma carta dirigida especificamente à igreja que vive imediatamente antes do fim do mundo. É uma carta para a igreja de todas as épocas. O fim está próximo de todos, pelo menos no sentido da morte física do indivíduo. Várias formas de opressão à mensagem do evangelho estão presentes em toda parte do mundo desde o primeiro século até o atual. A mensagem escatológica do livro de Apocalipse é presente e atual como era nos dias do autor e das igrejas da Ásia Menor a quem foi escrita a carta. Estas igrejas preservaram Apocalipse não por predizer o futuro, mas por ajudá-las a enfocarem a realidade da vitória de Cristo, o Cordeiro imolado de Deus. Gerava esperança e confiança em Deus, assim ajudando o cristão a permanecer fiel em toda e qualquer circumstância. Esta é a mensagem atual da carta—a vitória é do Cordeiro, mesmo que os inimigos possam figurar como enormes e poderosos. O Cordeiro imolado venceu e tem nas mãos as chaves das cadeias da morte. Vive e concede vida a todos que confiam nEle.

Literatura Apocalíptica e Linguagem Pitoresca:

Após larga discussão dos posicionamentos dos eruditos, Aune defina Apocalipse como sendo uma obra apocalíptica, porém apocalíptica Cristã, fazendo distinção da judaica190, proposta que se aceita neste trabalho. Uma diferença grande entre a apocalíptica judaica e a cristã é a de que o cristão olha não apenas para um evento salvífico futuro, como fazia o judeu. Ele olha para a obra de Cristo, pois a vinda de Cristo tem modificado tudo, e conseqüentemente a apocalíptica cristã reflete a transformação contida na vinda de Cristo, mesmo antecipando a sua vinda final em glória191.

Autores de literatura apocalíptica dirigiam suas obras às suas próprias gerações com um senso de urgência. Zelavam por oferecer uma resposta de orientação àqueles que procuravam entender a opressão e o sofrimento que experimentavam. Comumente “prediziam” certos eventos da história, como se a escrita fosse proveniente de épocas anteriores, assim oferecendo uma interpretação dos eventos descritos. João, porém, não “prediz” eventos nesse sentido, mas interpreta a natureza da história192. O autor de Apocalipse se vê como profeta, referindo uma mensagem de aplicação da palavra de Deus para a vida do indivíduo193. Ele vincula aspectos de urgência apocalíptica com o senso profético de sua mensagem. A proposta básica da carta é de dar a entender a razão do sofrimento, sendo a literatura apocalíptica uma expressão de fé na fidelidade de Deus, frente a circunstâncias que a punham em dúvida194.

Para entender o que é um apocalipse, é necessário compreender algo do estilo literário geral. Como forma literária, um apocalipse apresenta certos parâmetros específicos. Oferece-se a seguinte definição em termos de forma, conteúdo e função.

190 AUNE, A., lxx-xc. 191 BORING, 44. 192 RISSI, 4-5. 193 ROBBINS, 20. 194 BORING, 41-43.

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STBRS-PETE “5.000 5.000” Escatologia e o Apocalipse Pr. Chrístopher B. Harbin

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1) Forma: um apocalipse é uma narrativa prosa em primeira pessoa, com uma estrutura episódica consistindo de visões revelatórias comunmente mediadas ao autor por um revelador sobrenatural, estruturadas de forma que a mensagem revelatória constitui-se num clímax literário, bordado pela narração das circunstâncias da suposta experiência reveladora. 2) Conteúdo: a comunicação de uma perspectiva transcendente, normalmente escatológica, de experiências e valores humanos. 3) Função: a) legitimizar a autorização transcendente da mensagem, b) por mediar uma reatualização da experiência revelatória original através de uma variedade de ferramentas literárias, estruturas, e imagens, que funcionam para ‘ocultar’ a mensagem que o texto propõe ‘revelar’, tal que c) os receptores da mensagem sejam motivados a continuar procurando, ou se necessário modificar seu pensamento e atuação em conformidade com perspectivas transcendentes195.

Em outras palavras, a forma apocalíptica utiliza uma narrativa como um esqueleto para retratar revelação em termos de visões. Estas visões geralmente vêm através de algum tipo de mensageiro sobrenatural, levando a um clímax literário. O tratado comunica valores ou experiências humanas de uma perspectiva que trancende o ponto de vista humano natural. A função do tratado é de legitimizar a autoridade da mensagem ao convocar o ouvinte a participar da experiência revelatória, simultaneamente escondendo e ilustrando aquilo que se propõe revelar através de diversos recursos literários. Assim, visa a incentivar o ouvinte a investigar e modificar suas atitudes em conformidade com a mensagem referida pelo autor.

Já que o livro de Apocalipse é em estilo literário um apocalipse, a sua linguagem deve ser respeitada como linguagem apocalíptica. Como outras obras apocalípticas, a sua forma de expressão é pitoresca em contraste à linguagem proposicional. Em vez de pregar de forma direta, o livro pinta um quadro da segurança “de que Deus é o Senhor da criação e da história”196. Esta linguagem não é tão específica como a linguagem proposicional com a qual se costuma tratar. João pode até falar de estradas pavimentadas com ouro que são ao mesmo tempo transparentes, sem que haja contradição, nem distorção de sua mensagem pelo uso de símbolos que seriam conflitantes em outro tipo de literatura197.

Esse estilo de comunicar é distinto das normas utilizadas atualmente. Existe, porém, certas formas pelas quais a sociedade atual aproxima-se ao uso do estilo apocalíptico de comunicação. Tais formas de linguagem não vêm a ser iguais à apocalíptica, mas apresentam certos fatores importantes em comum, que servem de uma ponte para ajudar na compreensão do conceito. A exemplo desse fato, certo estilo de programação da televisão pode ser útil para compreender como se pode comunicar certas verdades por meio de uma linguagem que diverge da norma estabelecida de linguagem analítica e precisa.

É comum ver nos desenhos animados algum personagem como o coiote ser atropelado por um trem. Enquanto ele é aplastado, um curativo lhe é aplicado e em três segundos ele encontra-se completamente sarado, pronto para mais uma vez abordar o papa-léguas! Não importa quantas vezes a dinamite explode na sua boca, balas chegam a furar a sua barriga, sofre quedas desde mil metros de altura, é atropelado por caminhões ou é engolido por alguma fera, numa questão de segundos ele já está em plena forma para novamente caçar o papa-léguas.

Esta forma de comunicação não é proposicional, mas pitoresca. O espectador diverte-se com a contagem e as imagens da caçada interminável, sem se preocupar com a incompatibilidade das cenas narradas. As imagens comunicam ao telespectador, mas não dentro dos padrões de linguagem de precisão científica. Comunicam através da impressão emocional gerada no indivíduo, não como relato clínico de um evento. Neste caso nem sempre há muita mensagem a compartilhar, mas há uma

195 AUNE, A., lxxxii. 196 LINDVALL, 173. 197 GUNDRY, 254.

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comunicação—a comunicação do desafio além do alcance e a determinação para prosseguir com um alvo estabelecido, mesmo inalcançável.

Os quadrinhos e caricaturas políticas nos jornais e nas revistas atuais também comunicam através de imagens exageradas e retratos distorcidos da realidade, porém comunicam verdades de possível compreensão do leitor. Assim também, a linguagem apocalíptica aborda questões de revelação por meios não-clínicos, retratos às vezes incoerentes e imagens chocantes, não por meio de uma linguagem fria, clínica, científica e proposicional. Para ajudar a diferenciar os dois tipos de linguagem, apresenta-se um quadro com base no trabalho de Boring para contrastar as maiores diferenças entre estas formas de comunicação198.

Linguagem Proposicional Linguagem Pitoresca/Apocalíptica

Utiliza retratos falados para apontar a realidade suprema por trás de e além de si

Supõe que toda linguagem refere-se em descrição a algo objetivo

Supõe que palavras não podem comunicar realidade, mas apontam em direção à realidade suprema

Supõe que subjetividade é desprezível A subjetividade das imagens retratam o sentido da realidade objetiva

Utiliza símbolos para apontar as realidades por trás do que pode ser descrito objetiva e diretamente

Evoca imagens que não podem ser visualizadas, mas o impacto das mesmas pode ser sentido

Não é linguagem de código, pois código é linguagem literal e objetiva para aquele que tem a “chave”

Os símbolos são usados para comunicar o que não pode ser comunicado de outra forma

Os símbolos não podem ser reduzidos à linguagem objetiva sem perda de sentido

Identificando o referente particular de uma imagem, não delimita a significância da simbologia empregada

O leitor perde a riqueza e o poder da retórica apenas substituindo “Babilônia” por “Roma”

Quando usa símbolos, os utiliza como código específico

A interpretação necessáriamente deve ir além da decodificação de imagens

É linguagem de participante de culto (litúrgica)

Não deve ser tomado como premisas de argumento lógico ou doutrinário

É linguagem de lógica

É linguagem de confissão e adoração

Não exibe interesse em consistência lógica (várias visões nem podem ser visualizadas)

Utiliza consistência lógica como critério para definir a verdade

Certos detalhes descrtios funcinam como cenário, não como alegoricamente importantes

198 BORING, 51-59.

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A mensagem é comunicada através de símbolos, mesmo sem afirmar toda implicação possível nos termos da linguagem proposicional

Cada imagem expressa uma verdade no que diz, não pelas inferências que possam ser traçadas

Infere o tratamento de um todo através da sua simbologia

Não trata assuntos de acordo com lógica linear

As visões e símbolos comunicam pela impressão evocativa que apresentam ao serem tratados como um todo

Trata o todo com uma mistura (amalgama) de imagens simultâneas

Trata uma coisa de cada vez

Uma imagem isolada não tem condições de apresentar a realidade toda sendo apontada

Pressupõe que linguagem “clara” é limitada demais para expressar certas verdades transcendentes

Preza clareza como indicador de verdade

Preza imagens como indicadores de verdades que não podem ser objetivadas por causa da finitude humana

Não funciona para transmitir verdades objetivas sobre o mundo celestial

Contrasta “mito” com “verdade”, entendendo-o como falso

Utiliza linguagem mitológica como veículo de verdades

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Apocalipse, Comentário Textual:

Esboço do Livro:

Existe mais de um conceito sobre a forma mais apropriada para dividir o livro de Apocalipse. É bem viável entender que o livro tenha sido escrito em sete atos de uma peça para ser apresentada no teatro de Êfeso. Aproveitaremos para os fins deste estudo o esboço oferecido por Boring no seu comentário sobre Apocalipse por sua utilidade em facilitar a compreensão do panorama geral do livro e sua divisão de blocos maiores de pensamento199.

I. Deus fala à Igreja na Cidade (1.1-3.22).

A. O Título Sumário (1.1-3).

B. O Começo da Carta (1.4-8).

C. A Presença do Cristo Ressurreto (1.9-20).

D. As Mensagens às Sete Igrejas (2.1-3.22).

II. Deus Julga a “Grande Cidade” (4.1-18.24).

A. A Sala do Trono Celestial (4.1-5.14). 1. A Sala do Trono do Universo (4.1-6a). 2. O Deus Criador de Tudo (4.6b-11). 3. A Redefinição Cristológica de Vencer (5.1-7) 4. A Vitória e o Louvor Universais (5.8-14).

B. A Adoração Celestial—Abrindo o Rolo Selado (6.1-8.1). 1. Os Primeiros Quatro Selos—Os Quatro Cavaleiros (6.1-8). 2. O Quinto Selo—O Clamor dos Mártires (6.9-11). 3. O Sexto Selo—O Cosmo Treme na Chegada de Deus (6.12-17). 4. Interlúdio—A Igreja Militante e Triunfante (7.1-17). 5. O Sétimo Selo—Silêncio (8.1).

C. A Adoração Celestial—Tocando as Sete Trombetas (8.2-11.19). 1. As Orações da Igreja na Adoração Celestial (8.2-5). 2. As Primeiras Trombetas—A Intensificação dos Problemas Finais (8.6-12). 3. A Quinta Trombeta—O Primeiro Ai (9.1-12). 4. A Sexta Trombeta—O Segundo Ai (9.13-21). 5. Interlúdio—A Igreja dos Profetas e Mártires (10.1-11.13). 6. A Sétima Trombeta—O Reino Vem Como Salvação e Ai (11.14-19).

D. A Exposição das Forças Malignas (12.1-14.20). 1. Atrás das Cenas do Drama (12.1-13.18).

199 ibid., ix-xi.

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2. A Verdade Sobre a Salvação e o Julgamento (14.1-20).

E. As Últimas Sete Pragas (15.1-16.21). 1. A Celebração de Vitória na Adoração Celestial (15.1-8). 2. As Sete Taças da Ira de Deus (16.1-21).

F. A Queda de Babilônia e o Lamento (17.1-18.24). 1. Roma é Babilônia (17.1-18). 2. Celebração/Lamento da Queda de Babilônia (18.1-24).

III. Deus redime a “Cidade Santa” (19.1-22.21).

A. Coros de Aleluia Louvam a Vitória de Deus (19.1-10).

B. Sete Visões do Fim (19.11-22.5). 1. Parousia (19.11-16). 2. Batalha Final (19.17-21). 3. Satanás Amarrado (20.1-3). 4. Milênio (20.4-6). 5. Derrota de Gogue e Magogue (20.7-10). 6. Julgamento Final (20.11-15). 7. Nova Jerusalém (21.1-22.5).

C. Conclusão da Visão (22.6-20a).

D. Conclusão da Carta (22.20b-21).

Apocalipse 1.1-3.22:

João confiava que as coisas que descrevia estavam prestes a acontecer200. Vale lembrar que a sua fé enfatizava a certeza da mensagem, não o seu tempo201. Em termos de haver um cumprimento histórico físico visível e final na terra, a confiança e espectativa de João estavam erradas. A realidade da mensagem da profecia, no entanto, mantém sua vitalidade expressa pela preservação do texto através dos séculos, pois quem teria guardado e reproduzido a grande custo o que não lhe valesse nada?

A bênção referida sobre a divulgação desta profecia não compreende uma mágica auditiva, mas refere-se aos que lêem e ouvem no sentido de colocar em prática a mensagem proferida202. Deve-se lembrar que foi escrita para ser lida na sua íntegra em situação pública. Para quem lê a carta em sua totalidade, a experiência e o impacto é bem diferente do que para aquele que lê apenas partes do texto203.

Na descrição de Jesus em 1.13 a frase “filho do homem” lembra Daniel 7.12 e a autodescrição favorita de Jesus204. Essa frase era comumente compreendida como uma referência messiânica205. Cristo aparece nesta visão expressamente para ditar as cartas para as sete igrejas, fato que delimita

200 ibid., 72-73 e ROBBINS, 29. 201 ROBBINS, 29-30. 202 BORING, 68 e ROBBINS, 31-32. 203 FIORENZA, 345 trata esse assunto entre os estudos e posicionamentos eruditos sobre a carta, onde também há o mesmo problema. 204 GOLDINGAY, xxvii-xxix e ROBBINS, 43. 205 GOLDINGAY, 170.

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esta passagem como uma unidade de pensamento206. Esta visão de Cristo, portanto, é o início e parte integral da passagem das cartas às igrejas.

Os termos descritivos de Jesus nesta introdução servem mais do que nada para revelar a sua grandeza e poder207. As estrelas não controlam o destino dos homens e não precisam ser temidas, pois estão na própria mão de Cristo. Os imperadores romanos reivindicavam para si o governo do universo. João, porém, diz que Cristo é o Soberano, não o imperador208.

É o mesmo Jesus descrito no capítulo 1 que bate à porta em Apocalipse 3.20, não o Jesus das pinturas religosas tão comuns209. Jamais deveria-se ver aqui aquele Jesus manso, meigo e suave, implorando com toda ternura. Cada carta a uma das igrejas individuais relembra aspectos da descrição de Jesus oferecida no capítulo primeiro.

Além dos conflitos com o governo romano, as mensagens às igrejas nos capítulos dois e três refletem a existência de conflito entre liderança cristã como entre os cristãos e os judeus em geral210. As cartas foram dirigidas aos santos da época. Tratam assuntos específicos dos contextos que cada igreja enfrentava—numa cidade o templo dedicado ao Imperador, noutra a heresia dos Nicolaitas, etc. O contexto de uma igreja atual pode ser espelhado nas dificuldades enfrentadas por uma ou outra dessas igrejas, porém, deve-se lembrar que a associação reflete uma nova apropriação da mensagem que fora endereçada originalmente às igrejas na Asia Menor.

Apocalipse 4.1-18.24:

Nesta porção de Apocalipse, há uma mudança no tratamento com perspectiva de lidar com o tema do julgamento da “Grande Cidade”. Assim, o enfoque muda desde as igrejas na Ásia para o mundo ao seu redor. João trata a vitória já ganha junto com a vitória que está sendo antecipada, utilizando uma série de imagens e descrições para tratar desta vitória singular211. Lembra-se que não se trata de novos eventos, mas de múltiplas perspectivas ou retratos dos mesmos acontecimentos e das mesmas verdades.

Apocalipse 4.1-5.14:

Compreender quem é Deus é um ponto de partida referencial para compreender a necessidade e a responsabilidade humana. O ser humano frente a Deus tem obrigação de oferecer uma certa resposta ao Criador. A devida adoração a Deus está vinculada à necessidade humana de responder em compromisso e ação, seguindo as implicações da identidade divina em contraste ao dever humano de testemunhar em fidelidade. No capítulo 4, existe uma convocação para confiar na grandeza e soberania de Deus212.

206 BORING, 63. 207 ROBBINS, 45-47. 208 BORING, 84. 209 WILLIS. 210 COLLINS, 120. 211 BORING, 99. 212 ROBBINS, 82.

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João afirma primeiramente que Deus reina supremo no cerne de tudo, pois o trono do universo não está vazio213. Na simbologia de João, o trono representa a autoridade de Deus, e Deus estando entronizado revela a Sua supremacia214. Deus é o soberano, governando até mesmo a história caótica do mundo215. João não descreve a Deus, mas o trono não está vazio. Deus pode não ser visto por João, mas a sua presença e ação estão claras nos trovões e relâmpagos ao redor do trono216.

O mar aqui tem um caráter de tranqüilidade perante Deus217. Na concepção judaica, o mar é símbolo da ameaça contra a própria criação, um termo que aqui resume toda agência maligna218. Muitas vezes o mar aparece num contexto de ameaça à criação e à soberania de Deus, procurando levar o mundo de volta ao caos de Gênesis 1.2. “Os perigos das profundezas (abismo) designam a ameaça de destruição, a perda de todo significado e a falha de não funcionar de acordo com o propósito de Deus. Este caos é ‘sem forma e vazio’, sem a estrutura de significado e vazio de todo propósito”219. Aqui, porém, o mar já não existe mais como uma ameaça, pois na presença de Deus está plácido que nem um cristal220.

Deve-se levar em conta que as descrições celestiais no livro de Apocalipse não são detalhes supérfluos no relato, mas contém teor importante para a elaboração do sentido do livro. Há quem diga que a descrição da Nova Jerusalém, ou seja, a celestial, é a descrição culminante da obra completa221. No mínimo, estas descrições devem indicar ao leitor a preocupação de João em descrever a realidade suprema por detrás dos eventos na terra. É a realidade celestial que importa para João, não as aparências terrestres.

As criaturas ao redor do trono representam toda classe de criatura que respira—animais selvagens, animais domésticos, humanos e pássaros—toda a criação222. João lembra aqui as figuras de Ezequiel 1.10223. João aqui reflete um conceito de representatividade já expresso entre os judeus. “O homem é exaltado entre as criaturas, a águia entre as aves, o touro entre os animais domésticos, o leão entre os animais selvagens; todos eles receberam domínio”224. Estes, porém, estão cheios de olhos, vendo tudo ao seu redor, porém, expressando sempre que Deus é santo, ou seja único e digno de louvor. Assim, João aponta para o contraste entre estes seres e o imperador que reclama título divino sem enxergar a soberania e grandeza do Criador!

O termo grego usado para expressar a grandeza de Deus, como “Todo poderoso” tem mais literalmente o sentido de “tudo-reinando” ou “o que reina sobre tudo”225. Sendo incontestavelmente soberano, Deus compartilha o seu reinar com outros, ou melhor, delega de sua autoridade. Deus não reina de forma unilateral e não teme por qualquer motivo de insegurança. O seu trono e o do cordeiro são o mesmo226.

213 BORING, 102-103. 214 ROBBINS, 85. 215 RISSI, 5. 216 BORING, 104. 217 ROBBINS, 89. 218 COLLINS, 122, 124. 219 MOODY, 492. 220 BORING, 105. 221 READER, 433. 222 BORING, 107 e ROBBINS, 88. 223 ROBBINS, 89 – veja também Ezequiel 1.6, 10, 18, 22, 26; 10.12, 20 e 22. 224 Midrash Shemoth, R. 23 citado em BORING, 107. 225 ROBBINS, 90 com apoio de BAUER, 449, 608-609. pantokravtwr—pantos equivale a “tudo”, enquanto krator equivale a “poder” ou “reinar”. Pelo menos deve-se pensar em “poder para reinar” quando se traduz por “todo poderoso”. RISSI (5) toma a mesma posição no seu artigo. 226 BORING, 106.

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O livro na mão daquele no trono tem um emprego polivalente. É um rolo escrito em dois lados, mesmo que a norma fosse do papiro ser escrito num só lado227, sugerindo assim que não havia mais para ser acrescentado228. Reflete vários conceitos a uma—o livro da lei, o livro dos profetas, o rolo dado a Ezequiel, as chamadas tábuas do destino, o livro da vida, os livros celestiais onde os feitos dos homens são registrados para julgamento e os testamentos que eram selados com sete selos229. Outrossim pode-se compreender este rolo como sendo a história num sentido abrangente230, o plano redentor de Deus na história231.

João insiste no fato de que Deus é Criador de tudo que existe e de que Deus atua na criação. A perseguição sofrida não desanima a sua fé, nem o leva a ignorar a existência dos problemas reais que enfrenta. A sua fé no Criador o leva a uma esperança escatológica, dando-lhe uma perspectiva além da situação constrangedora que enfrenta232.

As referências da descrição do leão digno expressam a continuidade com o trono e reinado de Davi. Este é o herói de Deus, o Messías tão esperado233 qur executa o plano redentor divino234. A imagem evoca claras referências de expectativas messiânicas do grande guerreiro como o próprio Davi. A colocação referente à raiz de Davi evocava o mesmo conceito de um messias guerreiro. Tal era a expectativa do povo de Israel referente ao messias e também o anseio escatológico do povo cristão. João olha com toda esta expectativa ao lugar onde o Leão deve aparecer, mas o que enxerga é um cordeiro que fora sacrificado! O que aconteceu com o leão tão esperado? O cordeiro imolado tomou o seu lugar235.

É necessário enxergar que João diz explicitamente que não existe Leão. Em lugar do Leão esperado, temos o Cordeiro imolado. Amor sacrificial não era uma estratégia provisória de Jesus, mas a sua estratégia definitiva. Não é leão para uns e cordeirinho para outros, nem leão em traje de cordeiro236. Onipotente e onisciente, o Cordeiro exerce um reinado redentor237, não agindo em caráter de leão feroz. João apresenta o Cordeiro de Deus, devidamente poderoso, mas expressa a sua vitimização sobre o altar em contraste com o leão esperado. João profere algo no sentido de “quando a tradição diz ‘leão’, leia ‘cordeiro’ em seu lugar”. Este cordeiro tem pleno poder—visível nos seus sete chifres—mas não utiliza do seu poder segundo a expectativa referente ao Leão238.

O cordeiro é vencedor! Ele triunfa, porém, a sua conquista é definida em morte. Vencer para João equivalia a morrer! O amor auto-sacrificial vence sobre a força que o ser humano procura para vencer239. A conquista vem através da morte em fidelidade, ambos para Jesus e também para o cristão. Para o crente, a definição de vencer foi modificada pela cruz de Cristo240. Deve-se lembrar que este cordeiro não está despido de poder, pois tem sete chifres—símbolos de autoridade, aqui autoridade completa241. A sua autoridade não provém simplesmente do Cordeiro ser divino, mas pela

227 HALE, 37-38. 228 ROBBINS, 92. 229 BORING, 104. 230 John R. Miles “Lamb” em FREEDMAN. 231 RISSI, 7. 232 BORING, 107. 233 O’BRIEN, 178. 234 RISSI, 6. 235 BORING, 108 e O’BRIEN, 178. Boring trata o termo ajrnivon em sentido de cordeirinho, mas BAUER (108) não aceita o diminutivo para a época do primeiro século. O termo ajrnivon, já estava sendo usado no sentido genérico de cordeiro ou ovelha, ignorando-se a origem da forma como expressão diminutiva. 236 BORING, 109. 237 RISSI, 6. 238 BORING, 110. 239 ROBBINS, 94. 240 BORING, 111. 241 ROBBINS, 95.

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sua atuação dentro dos parâmetros da história242. Mesmo a entrega do rolo ao Cordeiro indica algo da inseparabilidade do Cordeiro de Deus Pai243. Em especial, o contexto simbólico do rolo vem da mão direita de Deus, a mão direita espelhando autoridade.

Mesmo assim, o poder do Cordeiro é diferente. É um poder que não se limita à força no estilo da autoridade humana. Ser judicialmente inocentado é o sentido do termo “vencer” no contexto de Apocalipse. Certamente é um paradoxo, pois é de se esperar que o cristão seja julgado perante o tribunal romano e condenado, porém, tal condenação equivale a ser inocentado no tribunal celestial244.

Baseado na redefinição apresentada, o louvor dado é um novo cântico, pois é louvor ao cordeiro imolado, não ao leão. A redefinição causa uma mudança na própria expectativa do cristão, podendo enxergar com olhos diferentes o plano de Deus e a sua atividade entre o seu povo. Temos aqui o cerne da cristologia de João. A vitória de Cristo já se deu no ato histórico de sua morte, não havendo mais necessidade de outra batalha, pois sua vitória no passado foi decisiva para sempre245. O cordeiro é o Cristo, e sua vitória é tanto absolutamente distinta em forma, como também é mais completa e irrevogável. A vitória do Cordeiro dita um paradigma completamente novo para a vida, incluindo definições de poder, vitória e realidade máxima. É o mesmo tipo de mudança de paradigma que Jesus teve que dar aos discípulos. O importante não é a estrutura política externa, mas o reinar de Deus no interior do indivíduo.

Apocalipse 6.1-8.1:

Os eventos acompanhantes da quebra dos selos espelham conceitos judaicos e cristãos referentes às tribulações que se pensava vir para introduzir o fim246. “Os quatro cavaleiros retratam o juízo de Deus sobre a arrogância e a rebelião humana”. Os partos eram os únicos cavaleiros montados do primeiro século, e o cavalo branco era a sua marca registrada247.

Os mártires mencionados seriam cristãos, não mártires pré-cristãos, como alguns têm asseverado248. A morte desses mártires os coloca na mesma categoria do cordeiro imolado, o termo grego sendo igual ao da descrição do cordeiro249. Havia uma idéia já no judaismo, a qual se passou ao cristianismo primitivo, de que um número predeterminado de fiéis deveria ser morto antes que Deus colocasse o mundo sob juízo250.

O crente chega ao céu da mesma forma que Jesus—por meio de sofrimento e morte. Mesmo assim, a injustiça não chega a ser a palavra final, mesmo que não se compreenda a razão pela qual Deus não termina com a injustiça de imediato. Existe, no entanto, o apelo a que Deus se revele251.

No relato dos prodígios, inclui-se um custo excessivamente elevado para os grãos, sendo que a especificação é de um aumento aproximado de oito a dezesseis vezes o preço normal. O vinho e o

242 RISSI, 7. 243 John R. Miles “Lamb” em FREEDMAN. 244 A. Y. Collins, O Apocalipse, citado em BORING, 111. 245 RISSI, 8. 246 AUNE, B., 424. 247 BORING, 122. 248 AUNE, B., 424 e BORING, 122. 249 BORING, 124. 250 AUNE, B., 424. 251 BORING, 125.

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azeite não sofrem modificação, pois uma seca não necessaraiamente afeta em muito a produção desses produtos agrícolas. As implicações da situação é de desastre para os necessitados e vida normal para os abastecidos, pois vinho e azeite seriam artigos de consumo especial252.

A ira tratada no capítulo 6 é a ira do Cordeiro253. Esta ira espera para que o número dos salvos se complete. Deus age em longanimidade no sentido da parábola do joio e do trigo254. Deus espera para resgatar também a outros. Para tanto, Deus espera com paciência, pois a ira, ou seja, o juízo, virá no tempo devido. Aqui a espera é para atingir um número pré-determinado de eleitos255.

Espera-se ver a destruição do mundo no capítulo 7, porém o que se apresenta é a igreja triunfante. No contexto dos cristãos da Ásia Menor, eles precisavam de uma nova perspectiva referente à igreja, para reconhecer que eram parte de algo muito maior e mais glorisoso do que a sua experiência ditava. Nessa nova perspectiva, os cristãos fiéis são preservados em meio a uma grande perseguição256.

A lista das tribos de Israel nesta passagem é diferente de qualquer outra lista proveniente da época257. João considera a igreja como sendo a continuação de Israel, especialmente considerando que já não havia 12 tribos identificáveis na época do primeiro século258. Onde foi a tribo de Dã? Por que a tribo de Manassés e também de José, se Manassés era filho de José? Segundo a bênção de Jacó aos filhos de José, Manassés receberia uma porção dupla, enqanto a tribo de Dã era vista em geral como uma tribo rebelde. A reunião das tribos dos quatro ventos espelha uma idéia cristã do primeiro século da restauração de Israel em termos das doze tribos259.

Miríade (dez mil) e mil são os termos numéricos maiores que existem na Biblia. A idéia partilhada é de um número vasto. A expressão 144,000 (cento e quarenta e quatro mil) seria equivalente à frase ‘uma grande multidão que não podia ser contada’. Mil também pode espelhar uma conotação militar, gerando a idéia de um batalhão260. Este conceito militar tem apoio no uso geral do censo por motivos militares261. Mesmo assim, o Apocalipse nunca coloca o cristão na frente da batalha. O cristão fiel é apenas um espectador da vitória alcançada por Deus na figura do Cordeiro imolado262.

O sangue do cordeiro derramado é o sangue de aliança. Ao banhar-se no sangue do Cordeiro (ou seja, ao ser espargido com o sangue, o qual faz parte da apresentação do sacrifício), o individuo se acerca para estabelecer ou aceitar a aliança proposta. Este sangue da aliança promete vitória àqueles que se assemelham ao Cordeiro na entrega de suas vidas263. Deve-se lembrar os eventos veterotestamentários da promulgação de alianças, essencialmente no evento do êxodo. O êxodo é provavelmente o contexto joanino para compreender o sacrifício de Cristo. É um sacrifício de ratificação de uma nova aliança em resgate de um povo oprimido—no caso, todos que se equivalem ao sacrifício oferecido.

252 AUNE, B., 397-398. 253 BORING, 127. 254 Mateus 13.24-30. 255 AUNE, B., 391. 256 BORING, 127-128. 257 AUNE, B., 479. 258 BORING, 129 e HALE, 8-9. O cativeiro assírio havia feito com que as tribos do norte perdessem a sua identidade e se misturassem com os demais povos. 259 AUNE, B., 436. 260 BORING, 130-131. 261 AUNE, B., 436. 262 RISSI, 15. 263 John R. Miles “Lamb” em FREEDMAN.

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O culto na perspectiva do Apocalipse não vem a ser um evento desenvolvido para agradar ao indivíduo que presta o culto. Culto como entretenimento, cura ou até ensino não chega ao padrão do culto em Apocalipse, por causa do enfoque no indivíduo. O culto aqui é direcionado expressamente a Deus, no reconhecer a distinção enorme entre o Criador e a criatura. Deve-se lembrar, neste contexto de culto, do trono vazio no lugar santíssimo do templo de Jerusalém e também da imagem celestial do trono vazio264. Culto aqui parece ser espontâneo, não uma formalidade, nem rotina planejada. Essa expressão flui de um agradecimento a e reconhecimento de Deus.

É de interesse notar que o rolo não poderia ser lido até que o sétimo e último selo fosse aberto, mesmo que alguma descrição pudesse estar visível265. É em 8.1 que esse útlimo selo é aberto. Chegando ao final tão esperado, encontramos apenas silêncio266. Existe toda uma expectativa, mas João não relata nenhum detalhe referente ao fim, a não ser este. Haverá um pouco mais a ser descrito no seguinte ciclo, mas aqui tudo acaba e há apenas meia hora de silêncio.

No culto, no templo em Jerusalém, havia silêncio especificamente na hora do sacrifício e não em outras partes. Aqui é a única passagem do livro onde um sacrifício é feito, sendo um sacrifício de incenso, visto que o Cordeiro já fora sacrificado e vive267. É portanto no sacrifício do Cordeiro (imolado na cruz) que o livro se abre e pode-se ler e compreender os mistérios do rolo de sete selos.

Este é, portanto, um conceito-chave para o livro. O Leão esperado é o Cordeiro imolado. Sua é a vitória decisiva, porém completamente distinta da expectativa judaica adotada por muitos cristãos. O amor que se entrega em fidelidade pelos demais é invencível perante a força física ou militar. Este tipo de amor é o cerne da “vida das eternidades”—o reinar de Deus—pregado por Jesus no Sermão do Monte e caracterizado em seu ministério terrestre. Para João, esta forma de viver tem uma abrangência que vai muito além da compreensão humana da realidade. Esse amor é mais poderoso do que qualquer esforço militar, pois venceu e vence a própria morte, o próprio medo que dá autoridade à força física.

Apocalipse 8.2-11.19:

A ótica geral de João é de que o cristão deveria prestar mais atenção para a realidade espiritual do que para o mundo material. É no reinar de Deus na vida do indivíduo que se vê a realidade tal qual ela é. A oração faz ponte entre o mundo presente e o eterno. As orações dos santos não resultam no resgate das circunstâncias, mas no resgate do próprio mundo e da história humana nos confins da inauguração do Reino. “Através do seu culto e sua oração, a igreja é ligada intimamente com o mundo real, o mundo de Deus”268.

Em última análise, tudo procede do único e soberano Deus. Todas as pragas descritas nesta passagem têm origem em Deus, pois tudo está sob o Seu controle. O ciclo das pragas aqui é basicamente o mesmo de antes, porém, há uma intensificação na expressão dos eventos. Como existe um vínculo com o evento do Êxodo do Egito (o qual teve início com um ciclo de pragas)269, pode-se esperar que, ao final das pragas, vejamos a efetivação do Êxodo do povo do seu Egito—“O Êxodo

264 LINDVALL, 174-175. 265AUNE, A., xcviii. 266 BORING, 132. 267 WICK, 512-513. 268 BORING, 133. 269 AUNE, B., 499. Não há dependência aqui no texto de Êxodo, mas sim existe uma alusão pela normativa referência de pragas em sentido de anúncio ou “abre-alas” de eventos de intervenção e juízo divino.

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real está prestes a acontecer”270. Depois do Êxodo, o povo entrou na terra prometida—aqui a terra celestial.

As estrelas ou o fogo caindo do céu em 8.8 e 8.10 não espelham agência maligna, mas intervenção divina no resgate dos justos. Deve-se notar que a atuação dos elementos celestiais aqui surge em oposição ao mar e às águas, que são em geral símbolos de agência maligna271. Não há, portanto, nenhuma alusão a anjos caídos no sentido popular atual, mas à atuação divina em juízo. No contexto, anjos teriam sido vistos como acima das nações do mundo, portanto, poderia-se conceber em termos de serem retirados de suas posições por juizo divino.

Os povos da época e anterior viam as estrelas como sendo deuses272. Aqui fazem parte do juízo e as pragas de Deus—não sendo deuses, mas agentes do juízo divino. Há novamente um certo vínculo com as pragas no Egito, em que atacavam a soberania dos deuses egípcios. João outra vez nega não apenas a divindade do imperador, mas também a soberania dos deuses de Roma.

Nero declarava ter um relacionamento especial com o deus Apolo273 e Domiciano gostava de usar para si o mesmo nome, Apolo, ao qual o termo “Apolyon” referencia. Havia também o uso comum do gafanhoto como símbolo desse mesmo deus274. Apolo era importante o suficente para Roma que, pelo menos em uma moeda dos anos 35-36 trazia a figura do templo de Apolo275. Os gafanhotos aqui são agentes do juízo de Deus, como também ocorreu nas pragas no Egito. Apolyon é o rei sobre estes gafanhotos, mas o que consegue fazer é apenas efetivar o juízo de Deus sobre os homens. Com todo o seu poder, ele é ainda agente do único Deus.

Os cristãos são “selados com a marca da segurança divina, mesmo que tenham que morrer”276, pois a sua segurança independe de sua morte física. Esse selo dá ao cristão a possibilidade de permanecer fiel por causa da proteção divina sobre a sua vida277. Como a morte não interrompe o seu vínculo com Deus, o que enfrenta a morte não sofre dano real, mas aparente.

A oportunidade para arrependimento frente ao anúncio de juízo é uma possibilidade em todo contexto profético de Israel. Há sempre uma possibilidade real de modificação do juízo de Deus manifesto na palavra do profeta se o povo se arrepender278, conforme pode-se ver no anúncio de Jonas a Nínive e em 2a Crônicas 7.14. “Tal como os cristãos fiéis se recusam a arrependerem-se no sentido romano, o mundo romano recusa-se a arrepender-se no sentido cristão”279. Nesse contexto, o juízo seguramente vem.

Pode ser que em parte a descrição dos cavalos como tendo cabeças de leões retome a figura do cristão sendo ameaçado de morte na arena com os leões, conforme prática romana já nos dias de Nero280. Assim, a figura reflete outra vez o contraste entre o arrependimento exigido pelos pagãos e por Deus. Deus tem a liberdade para modificar os planos de juízo estabelecidos em resposta à criatura arrependida281. Mesmo que Deus esteja disposto a colocar em pausa o juízo, o ser humano

270 BORING, 135. 271 AUNE, B., 520-521. 272 BORING, 136. 273 AUNE, B., 535. 274 BORING, 138. 275 FIORENZA, 365. 276 BORING, 143. 277 RISSI, 14. 278 Veja o livro de Jonas e o contraste entre “Ninive será subvertida” e “eu sabia que és Deus compassivo e misericordioso, longânimo e grande em benignidade, e que te arrependes do mal”, Jonas 3.4 e 4.2. Implícita está a mensagem de arrependimento ao qual o povo aderiu. 279 BORING, 138. 280 Inácio de Antioquia, citado em GONZÁLEZ, 61 e 66. 281 BORING, 141 com base em Jer. 9.5; 18.8, Jonas 3.9.

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geralmente não se prontifica para o arrependimento. Como em Êxodo 7-14, não se espera necessariamente que os inimigos de Deus se arrependam282, mas existe a disposição divina para aceitar o arrependimento, já que o juízo reflete o amor do Cordeiro no caráter de seu sacrifício e da sua vitória283.

YHWH (hwhy) revela tudo aquilo que é realmente necessário para o seu povo poder viver uma vida de fé real, mas não oferece detalhes especulativos. Mesmo o profeta, aqui, não pretende saber tudo, a não ser o que é necessário ser revelado284. Essa colocação também é coerente com uma gama de literatura revelatória em que se guardava um elemento em segredo nos padrões de 2a Coríntios 12.4 e Daniel 12.4, pois nem tudo deve ser revelado ao ser humano285.

O termo profetizar deve ser definido como falar e atuar por Deus286. Considera-se que o profeta dava testemunho morrendo, mantendo-se firme nas suas declarações. Nesta passagem, portanto, os termos “profeta” e “testemunha” são usados de forma idêntica. Os profetas/mártires representam a igreja completa como um todo, não uma parte dela287. As duas testemunhas provavelmente relembravam os dois ramos de oliveira de Zacarias 4.2-14288. O testemunho do cristão é dado através de seu martírio289. A roupa das testemunhas aqui é a única indicação do conteúdo de sua profecia, esta sendo uma mensagem de arrependimento290. Porém, a profecia não é ouvida e os profetas são mortos. Mesmo assim, a morte das duas testemunhas não é sem significado, pois é na sua morte que completam o seu testemunho. “A fera não tem a última palavra”291. Como o par de fiéis representa mais do que nada o testemunho do povo fiel como um todo, é o seu Senhor que triunfa sobre o sofrer e a morte292.

Por causa das conotações do termo “besta” no português, a melhor tradução do termo aqui seria “fera”. O termo besta é usado seguindo o uso do termo em inglês, beast, historicamente sendo sinônimo de “fera” na época de João Ferreira de Almeida. A montadora asiática, Kia, teve certos problemas com o emprego deste mesmo termo como nome para um dos seus veículos, não compreendendo as associações do termo feitas no Brasil. Querendo tratar do veículo simbolicamente como animal de carga, não percebeu as associações mais fortes designando aspectos negativos do animal selvático. No português mais arcaico, as conotações do termo equivalem mais ao uso do grego, designando a idéia do animal selvagem indomado, porém, potente. Aparecendo o termo “besta” nas traduções atuais do Apocalipse, portanto, leia-se “fera” ou “animal selvagem”. Esta fera está colocada por João em contraste ao dragão. O dragão espelha a fera das águas, em contraste à fera que atua sobre a terra.

A fera reflete conceitos das quatro feras de Daniel e, como elas, procede do mar. Reflete igualmente os monstros das mitologias de combate do mundo antigo, como o Mar (Yamm), Leviatã e Tiamat293. Essa mitologia de combate provinda do Oriente Próximo Antigo era temática comum de obras apocalípticas, retomando o conceito da criação do mundo como resultado de batalha cósmica contra o

282 AUNE, B., 545. 283 RISSI, 12 e 15. 284 BORING, 141. 285 AUNE, B., 562-563 e 575. 286 O profeta profere ou professa a palavra de Deus, conforme os termos bíblicos que colocam o profeta como porta-voz de Deus. 287 BORING, 144-145. 288 AUNE, B., 579. 289 BORING, 153. 290 AUNE, B., 611. 291 BORING, 147. 292 AUNE, B., 603. 293 COLLINS, 125.

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monstro do caos aquático e relacionando a história mitológica com os eventos da história atual. As duas linhas de pensamento eram misturadas, cada qual modificando a compreensão da outra294.

“Com o soar da sétima trombeta em 11.15-19, chegamos (novamente) ao final! …Cronologicamente os eventos não podem proceder mais adiante: já andamos pelas pragas finais (duas vezes!) e estamos novamente no final”295. O Apocalipse não está organizado de forma cronológica, mas por conceitos de temática teológica296. Seus ciclos de sete etapas se repetem três vezes, sempre com o final cataclismático chegando na sétima etapa. No intervalo dos capítulos doze a quatorze, a luta com os inimigos de Deus é vista por ainda outra ótica.

“A figura final da série não apresenta apenas a chegada do reino de Deus, mas também anuncia a ira de Deus, a destruição daqueles que destróem a terra”297. O produto final deste juízo é a cena celebrativa ao redor do trono, o reconhecimento da soberania de Deus. No soar da sétima trombeta, o reinar do mundo foi transferido ao reinar eterno de Deus298. Não há qualquer descrição de ruína do mundo aqui, mas uma retribuição àqueles que estavam destruindo a terra.

Apocalipse 12.1-14.20:

Os capítulos 12 a 14 são uma unidade que mantém um caráter especialmente dramático, “no qual todas as personagens e ações são exageradas e maiores do que a vida”299. Nos primeiros versículos temos a apresentação dos principais personagens da peça300. Aqui se descreve dois grupos polarizados em extremo, sem qualquer comunalidade301. Todos os personagens aqui estão postos em contraste um ao outro, a exemplo da prostituta e da noiva302.

Escrevendo de uma perspectiva judáica, Levenson aponta que “a presente ordem das coisas encontra-se antes, não após o triunfo de Deus: o Leviatã ainda está solto, e a soberania absoluta do Deus absolutamente justo está pela frente”303. Por outro lado, a expressão cristã é um tanto diferente. Cristo não está apenas por vir na consumação dos séculos, mas já veio. A salvação plena é esperada pelo crente em sua expectativa escatológica, mas já é a sua experiência no meio dos problemas que vivencia304. Neste capítulo, pode-se ver a vitória alcançada, porém, ainda esperada305. A João é dado ver a realidade de outra perspectiva, como também o servo do profeta Eliseu pôde contemplar a realidade além do seu olhar amedrontado. Sua esperança é ao mesmo tempo futura e presente, sendo realidade por conseqüência da fidelidade da promessa de Deus.

Em Apocalipse 12.9, encontra-se menção do dragão, a serpente, o adversário (diabolos), o Satanás (Satana", transliteração do termo hebraico para adversário, @fv), todos aparecendo com o artigo definido. No texto grego de Apocalipse, o autor parte de regras gramaticais normativas do grego,

294 Bernard McGinn em ALTER, 568. 295 BORING, 150. 296 FIORENZA, 350. 297 BORING, 149. 298 AUNE, B., 646. 299 BORING, 150. 300 AUNE, B., 661. 301 BORING, 152. 302 FIORENZA, 359. 303 LEVENSON, 48. 304 BORING, 33. 305 veja em contraste com 21.1-8.

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utilizando o artigo definido, quando considera que o leitor/ouvinte já conhece o referenciado, porém, não é utilizado em listas quando um mesmo referente é indicado306.

O chamado Leviatã (@tywl—um monstro marinho da mitologia da criação como resultado de uma batalha cósmica) é normalmente apresentado como sendo primordial. “Enquanto Jó 40-41 declara explicitamente que Beemote é uma obra de Deus, nenhuma vez tal afirmação é feita referente a Leviatã na passagem muito mais longa concernente a ele”307. Geralmente, ele é visto como um monstro marinho dominado por Deus na era primeva, porém ainda reflete poder e atuação ao ser acordado ou incitado308.

Interpretando os personagens principais do capítulo doze em termos de respresentações de agências centrais à mensagem e relato do evangelho, teria-se que dizer que 1) a mulher representa os servos de Deus, seja Israel, Maria, o povo de Israel, a igreja, ou por outra agência; 2) o dragão representa agência oponente a Deus, seja em Herodes, Satanás, Leviatã, judeus perseguidores dos cristãos, governo Romano, ou outros personagens; 3) Miguel, do hebraico (l a k y m—“quem como Deus?”) miychael309 representa Jesus junto com seus servos310.

Poderia-se tentar interpretar este capítulo num sentido futurístico, porém já existe uma corrente interpretativa forte que restringe a referência específica aos acontescimentos do ministério de Jesus, os quais tem implicações ainda futuras. Como a intenção específica do autor é retratar que a vitória fora ganha em Cristo, o essencial para o cristão é apegar-se à vitória alcançada e permanecer fiel311. Mesmo que a vitória já tenha sido ganha, a guerra continua e é necessário que o cristão se apegue a Cristo, o vitorioso312. O combate descrito aqui é colocado como sendo consumado nos céus, mas ainda não havendo chegado a ser finalizado na terra, em termos de obediência completa a Cristo como vitorioso313. Os inimigos de Deus ainda atuam no mundo, mas não há razão para o cristão ceder a vitória que foi alcançada por Cristo.

Havia, no conceito mitológico greco-romano, a lenda do nascimento do deus Apolo que se assemelhava ao relato de João nestes capítulos. Um cidadão romano podia pensar da narração em termos dos seguintes personagens: “A mulher é a deusa Roma, a rainha dos céus; o filho é o imperador, que mata o dragão e estabelece a era dourada; o dragão representa o poder da escuridão, ‘nossa velha maldade’”314. João, porém, toma o relato e o retoca com novos personagens e novo simbolismo, mostrando outra perspectiva da verdadeira realidade do contexto político-religioso romano, sendo uma polêmica contra o culto imperial romano315.

“[João] afirma que Deus não é diretamente responsável pelo mal, mas que Satanás não tem poder independente no mundo”316. Mesmo que o inimigo conquiste alguma vitória, nada pode fazer para anular a vitória decisiva efetivada na cruz317. O inimigo utiliza como sua arma o medo da morte, porém, o poder da morte já foi anulada pelo Cordeiro imolado que vive.

306 AUNE, A., clxiii e clxv. 307 LEVENSON, 49. 308 CLINES, 86-87. 309 l a k y m -- “Quem é como Deus?”, tomado na literatura judaica como defensor especial do povo judeu conforme BAUER, 524 e Harris, 68, 693 e 832. Este Miguel aparece três vezes no Antigo Testamento e duas vezes no Novo (Daniel 10.13, 21; 12.1; Judas 9; Apocalipse 12.7). 310 BORING, 152-157. 311 Apocalipse 22.5-8. 312 FIORENZA, 359. 313 COLLINS, 124. 314 Vergílio, Eclogue IV.15 em BORING, 151. 315 SCHERRER, 599. 316 BORING, 154. 317 RISSI, 9.

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O dragão, a fera, e o profeta falso são uma unidade318. “Identificando o dragão com Satanás, o Diabo, a antiga serpente, João mostra que ele pretende simbolizar todas as forças contra Deus desde o Éden”319. Essa totalidade inimiga é derrotada. Em meio à história da humanidade, os inimigos de Deus são conquistados pela redenção divina em Cristo320. Como Jesus falava do reinar de Deus já ter inicio por ter recebido toda autoridade321, aqui João espelha essa vitória completa alcançada e demonstrada na sua ressurreição.

“Na época de João, a quarta fera de Daniel era comumente interpretada pelos judeus como representando o Império Romano”322. Deve-se lembrar, no entanto que João não retrata o Império Romano em sua totalidade com a figura da fera, mas certos elementos da mesma, como na pessoa de Nero323. A fera respresenta toda agência inimiga, não se limitando a Roma.

“João não apresenta reivindicações milagrosas para os verdadeiros profetas, cujo testemunho é dado através do sofrimento, não em milages triumfantes”324. No caso do culto imperial, havia caso do uso de sinais “milagrosos” para sustentar o suposto poder das imagens, como trovões e relâmpagos325. “A fé verdadeira não é provada, nem invalidada pela manifestação de poder milagroso, nem pela sua falta”326. Jesus não confiava naqueles que creram por causa dos sinais que ele operava, nem deveria o crente crer em outro por causa da operação de feitos milagrosos.

A Bíblia simplesmente não explica a origem de Satanás. Isaías 14 é muitas vezes colocado como explicando a sua origem, porém Isaías não pretende mais do que dirigir a palavra de Deus ao rei da Babilônia. É interessante notar que nesta passagem de Apocalipse não há nenhum referente em si ao texto de Isaías 14327. O texto aqui trata que o fato da vitória de Cristo na terra efetivamente expulsa Satanás de qualquer posição que teria no céu328. Havia relatos da expulsão de Satanás do céu entre os judeus, mas não em textos que foram creditados com autoridade para serem incluídos na Bíblia329.

A convicção de João em Apocalipse é de que “Alinhar-se com o culto romano é entregar-se ao inimigo que já está derrotado”330. Que o inimigo fora expulso reflete a vitória de Deus331. A vitória já foi decisiva e de nenhuma forma carece de outra batalha escatológica final332. Preocupações de uma batalha cataclismática final eram comuns na época de Jesus, mas deve-se lembrar que em Mateus 24 ele diz que guerras e rumores de guerras não são sinais que apontam para qualquer coisa.

Todos levam alguma marca, seja a da fera, seja a de Deus, mas o levam sobre si de forma aberta e óbvia333. A marca ou selo do cristão reflete a sua proteção sob o nome ou autoridade do Cordeiro334. As marcas são formas de identificação externa tão óbvias como as estrelas de Davi que Hitler obrigou os judeus a vestirem na época da Segunda Guerra Mundial. Aqui, ambos os lados estão designados

318 Apocalipse 16.13 e BORING, 154. 319 BORING, 155. 320 RISSI, 10. 321 Mateus 28.18. 322 BORING, 155. 323 RISSI, 11. 324 BORING, 157. 325 SCHERRER, 607-608, 610. 326 BORING, 161; Êxodo 7.11, 22; 8.7; Deuteronômio 13.1-5; Mateus 7.21-23; Marcos 13.22; 2ª Coríntios 10-13; 2ª Tessalonicenses 2.9. 327 WATTS, 212. 328 BORING, 158. 329 AUNE, B., 695. Aqui, a expulsão é escatológica, enquanto na literatura judaica era em geral uma questão primordial, assim refletida em textos como Adão e Eva 12-16, Evangelho de Bartolomeu 52-55, Qu’ran 7.11-17 e Apocalipse de Moisés 39. 330 BORING, 159. 331 AUNE, B., 699. 332 RISSI, 8 e 15. 333 BORING, 161. 334 RISSI, 14.

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por símbolos externos visíveis para todos identificarem—muito diferente do que a realidade vivenciada pelo cristão que não tem como distinguir visivelmente o fiel do infiel.

O número seis leva certos conceitos simbólicos, incluindo os de imperfeição, juízo, falta e de ser incompleto335. A repetição tríplice do número reflete a totalidade ou nível da qualidade de imperfeição designada.

Apocalipse 15.1-16.21:

O esquema desta passagem prepara o cenário para o lamento da queda de Babilônia a seguir, refletindo novamente a série de pragas, aqui descritas em termos de taças da ira divina336. O lamento retoma a linguagem e figura dos lamentos dos profetas do Antigo Testamento como Isaías e Ezequiel que entre outros profetizaram sobre a queda de reis e nações. Como João se designa profeta, aqui o papel de profeta é desenvolvido na linhagem dos profetas veterotestamentários.

A linguagem de João é uma linguagem de extremos. Existe o “nós” e o “eles”, mas somente estas duas categorias, sem qualquer mistura. Em contraste com os filmes populares apocalípticos da atualidade, a ênfase não recai sobre o que acontece com os que não pertencem a Deus. João interessa-se mais com a condição eterna dos que pertencem ao Cordeiro337. No tratar dos ímpios, o texto reflete a justiça de Deus na retribuição em vingança da morte dos servos de Deus338.

As pragas descritas nesta ocasião são expostas em sua intensificação suprema. Trata mais uma vez das mesmas coisas, mas de forma ainda mais drástica339. O conceito do rio Eufrates tornar-se seco seria em muito extraordinário, sendo o único rio do Oriente Médio que jamais secava340. A praga descrita provavelmente deveria trazer à memoria as pragas do evento do Êxodo e a passagem do povo pelo mar de varas ao sair do Egito.

Toda a cena de uma batalha é preparada aqui, mas não há batalha nenhuma. Faça o que quiser, o inimigo não consegue alterar os planos redentivos de Deus341. Todas as suas tentativas, artimanhas e planos não chegam a constituírem um desafio real ao Cordeiro e o trono celestial. Os planos do inimigo resultam em esforço perdido.

Referente ao Armagedom (“monte de Megido”), deve-se dizer de início que nunca foi explicado de forma satisfatória o local referido342. É interessante notar que não existe nenhum monte em Megido. O monte mais próximo a Megido é o Monte Carmelo, mas é duvidoso que os cristãos da Ásia Menor tivessem conhecimento disso. Alguns apontam para uma modificação mínima para associar o termo ao “monte da congregação”, mas em realidade não há como definir com precisão um ponto geográfico de referência. O essencial da menção de João é em termos da iminência de um grande confronto final entre Roma e seus inimigos343. Mesmo assim, porém, a tal batalha referida não acontece! Em lugar da batalha esperada, a sétima taça é derramada e o mundo acaba num enorme terremoto.

335 BORING, 162. 336 AUNE, B., 903. 337 BORING, 173. 338 AUNE, B., 903. 339 BORING, 174-175 340 AUNE, B., 890-891. 341 RISSI, 12. 342 AUNE, B., 898. 343 BORING, 177.

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Em lugar de batalha escatológica temos apenas o juízo divino. Esse juízo ou julgamento deve ser visto espelhando outra vez o sacrifício do Cordeiro, um derramar do grande amor de Deus344. Foi este o evento de vitória e também de juízo, tal como retratado no silêncio do sétimo selo345.

Na descrição da cena aparece em mais de uma ocasião a idéia da possibilidade de arrependimento ignorado pela humanidade. Esse arrependimento é o alvo da ira do Cordeiro, não aniquilação e destruição346. João se coloca aqui nos moldes das palavras de Jesus ao chorar sobre Jerusalém e a sua eventual destruição347.

Apocalipse 17.1-18.24:

João é levado ao deserto para ver a cidade, pois o deserto é lugar de refúgio para o povo de Deus. As imagens de João não são codificações alegóricas que podem ser decifradas com uma simples chave. O simbolismo das imagens relaciona-se com várias coisas de uma só vez348. Lembra-se que o pano de fundo para Apocalipse inclui o Antigo Testamento inteiro, bem como o evangelho de Jesus Cristo, as expectativas judaicas do messias e o fim do mundo e o contexto vivido por João e as igrejas na Ásia Menor.

A deusa romana principal, Dea Roma, era cultuada na maioria das cidades mencionadas nas cartas às sete igrejas349. Retratando Roma, João faz referencia ao governo, às práticas religiosas, à deusa Roma com o seu culto, ao império romano, ao culto a César, como também Nero e às lendas referentes a ele350. Roma tinha deuses, cujos nomes não eram publicados, para que não fossem invocados a deixar Roma e irem para outro lugar. Comumente pensava-se que o nome secreto da deusa Dea Roma fosse Amor (Roma escrita ao inverso, retratando conceitos de Vênus/Afrodite, a suposta mãe de Aeneas, tido como ancestral dos romanos). João trata a deusa Roma como uma prostituta, provavelmente aproveitando conceitos vulgares da época e expondo-os em crítica351.

As reflexões de João sobre a fera e os oito reinados de sete reis reflete as colocações de Daniel 7. Há considerável dificuldade em identificar reis específicos da cronologia Romana, mas parece ter algo a ver com Nero de volta dos mortos352. No entanto, não há como especificar a lista de sete reis, para que se entenda que a fera é Nero. O mais correto, provavelmente, seria aceitar o número como designando todos os reis de Roma353. Por outro lado, é possível que João não se interesse em que todos os imperadores romanos estejam representados, já que nem todos refletiam um caráter impróprio em relação ao judaismo e o cristianismo. De qualquer forma, a preocupação de João era de mostrar o caráter do imperador. Seu interesse não era dizer quem ele era, mas o que ele era354.

344 RISSI, 12 e 15. 345 WICK, 512-513 conforme referido anteriormente, o silêncio do momento de sacrifício parece ser espelhado no silêncio aqui. 346 RISSI, 12. 347 Mateus 23.37-38. 348 BORING, 179. 349 AUNE, C., 959. 350 BORING, 179-180. 351 AUNE, C., 926-927. Era comum entre a população romana uma distorção da lenda de Rômulo e Remo sendo por uma lupa, termo latin para designar a fêmea do lobo, mas também usada para indicar uma prostituta (929). 352 BORING, 182 e COLLINS, 126. 353 AUNE, C., 960. 354 BORING, 183.

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Apocalipse 19.1-10:

Deus derrotou o inimigo, e é por isto digno de louvor. Esta passagem é uma passagem de culto a este grande Deus, a iminência das bodas do Cordeiro sendo o cerne deste culto 355. A fumaça tem um vínculo com a fumaça dos altares e incenso que era oferecido como sacrifício a Deus. A norma da figura é que Deus preza o cheiro suave do sacrifício, mas aqui o cheiro vem do juízo de Roma, o qual parece ter o aspecto de cheiro suave, agradável a Deus.

Apocalipse 19.11-22.5:

Outra vez não há nenhuma necessidade de uma grande batalha escatológica, pois o inimigo já foi derrotado. Sem qualquer ação de combate da parte de Cristo ou dos santos, toda a aglomeração inimiga se desfaz356. Em contraste com a suposição popular de conhecer o nome secreto da deusa Roma, ninguém sabe o nome secreto do Cordeiro, a não ser o próprio Cordeiro. Logo, ninguém tem controle sobre a sua intervenção.

A ênfase na parousia do Cordeiro nesta passagem é em termos da função judicial do evento da chegada de Cristo357, não de um arrebatamento do povo de Deus ao céu. A vinda de Cristo em glória espelha o dia de prestar contas, no qual não há forma de fugir da justiça e do juízo de Deus.

“O capítulo 20 [de Apocalipse] é a continuação dos eventos de vitória relatados no capítulo 19, sendo a parte conclusiva da visão”358. O juízo está completo, abrindo espaço para a descrição da nova realidade da noiva, o povo do Cordeiro.

“Platão, sem a luz da Santa Escritura, mas refletindo sobre o eterno, falou de ‘a cidade cujo lar encontra-se no ideal’, o padrão que é ‘reservado no céu para aquele que o queira contemplar e assim contemplando constituir-se como o seu cidadão’”359. De modo bem semelhante, Agostinho trata de duas cidades “compostas de dois amores: a cidade terrenal por amor a si, em desprezo a Deus, e a cidade celestial pelo amor a Deus, em desprezo a si”360.

“O termo ‘abismo sem fundo’ está vinculado a idéias concernentes à forma do mundo. A terra era concebida como um disco plano que flutuava por cima de água. O abismo refere-se às profundezas imensuráveis embaixo da terra, pois pensava-se existir uma fenda capaz de ser selada”361 . Obviamente as expressões aqui não devem ser tidas como literais, pois é impossível e inconcebível amarrar um ser espiritual com cadeias e selar uma fenda na terra com um cadeado. A chave para a porta do abismo designava o conceito de autoridade sobre o abrir e fechar a fenda ao abismo362, poder sobre a morte e o mundo além túmulo.

“A figura do amarrar de Satanás é compatível com a expressão em Efésios que o nomeia como ‘príncipe do poder do ar, o espírito que agora opera nos filhos da desobediência’. Ele é restringido, porém não destruído. Dentro de sua esfera restringida, ele ruge furiosamente (1a Pedro 5.8). Para

355 AUNE, C., 1040. 356 RISSI, 8. 357 AUNE, C., 1069. 358 ROBBINS, 221. 359 Republic IX, 592, tr. Shorey citado em MOODY, 576. 360 Agostinho, The City of God. XIV, 28 citado em MOODY, 576. 361 ROBBINS, 221-222. 362 AUNE, B., 527.

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os cristãos, Satanás foi completamente amarrado, e eles não precisam temer a sua decepção ou o seu poder”363. A igreja está protegida do inimigo, pois mesmo que a fera mate o cristão, a morte apenas o conduz à presença de Deus364.

Como a chave do abismo designava autoridade sobre o mesmo, a chave das cadeias expressa autoridade sobre a limitação do poder do dragão, refletido ao mesmo tempo pelas cadeias. O dragão ainda pode ser forte e poderoso, mas a abrangência do seu poder tem sido reduzida365.

A vitória já foi ganha pelo Cordeiro, mesmo que o inimigo se prepare para a batalha366. “O poder protetor de Deus é tão extraordinário que não há nem a aparência de uma batalha, quando Deus deseja destruir as forças do mal”367. A soberania de Deus é completa, não tão pequena que forneceria a possibilidade de uma batalha. Conforme a soberana vontade de Deus, querendo, ele executa sua vontade, sem importar aqueles que se oponham. Sua vitória é final e absoluta—incontrovertida e já realizada pelo Cordeiro.

Na literatura Apocalíptica, Gog e Magog são símbolos para as nações idólatras que atuam em oposição a Deus368, sendo usados poucas vezes nessa literatura mas encontrados também em Ezequiel 38.22369. Logo, João demarca aqui a confiança de que a vitória de Cristo será revelada como completa, até o ponto de toda agência maligna ser totalmente eliminada. Quando Gog e Magog vem para atacar os santos, o seu exército se alinha pela extensão completa da terra, o que pareceria indicar que o lugar de vivência dos santos não está delimitado a uma localidade geográfica. Em lugar disso reflete de certa forma que o campo sitiado refere-se aos santos espalhados por todo âmbito da terra. Estes santos são o acampamento dos fiéis, a própria “cidade querida” que não se limita a uma definição local370.

“Em escritos apocalípticos, os números tem sentidos simbólicos em lugar de numéricos. O número dez era o número de um homem completo. Mil é o cubo de dez, que simboliza um período de tempo compreendendo toda a humanidade”371. “Neste livro de símbolos, qual é a duração de mil anos? Todo tipo de teorias são propostas, porém nenhuma delas realmente satisfaz”372. “Não temos mais direito de tomar os mil anos literalmente do que temos para tomar o monstro de dez cabeças e sete chifres literalmente”373.

À luz de Apocalipse 20.6-8, obviamente “o milênio, o que quer que seja, não significa um vasto período no qual Satanás não tem seguidores sobre a terra, pois estas hostes vastas erguem-se imediatamente sob seu comando”374. É mais viável ver o reinar com Cristo como a colocação de forma positiva do amarrar o inimigo375. Não há referente de localidade para o exercício deste reino376. Reina-se com Cristo, mas o local não é especificado. Esta passagem pode referir-se tanto a um local terreno, como também pode caracterizar o que chama-se de céu. O essencial é o aspecto de estar junto a Cristo, o seu reinado efetivo na vida do cristão.

363 ROBBINS, 223. 364 RISSI, 15. 365 ROBBINS, 222. 366 RISSI, 15. 367 ROBBINS, 227. 368 ibid., 226. 369 AUNE, C., 1099-1100 e 1104. 370 GUNDRY, 256-257. 371 ROBBINS, 222. 372 ROBERTSON, 457. 373 Torrance citado em ROBBINS, 222. 374 ROBERTSON, 461. 375 ROBBINS, 224. 376 Swete citado em ROBERTSON, 460.

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Quem participa da primeira ressurreição, não participa da segunda morte. O termo segunda ressurreição, não é utilizado377. O sentido de “primeira” parece expressar a unicidade e importância da ressurreição.

Na passagem de Apocalipse 20.15, não existe cogitação nenhuma para os conceitos de sono da alma, estado intermediário, uma segunda chance após a morte, nem mesmo para uma aniquilação dos infiéis378. O julgamento divino é decisivo, tal como a decisão do ser humano em aceitar ou rejeitar a obra redentora do Cordeiro imolado.

A partir do capítulo 21, encontra-se uma extensa descrição da Nova Jerusalém. Esta não é figura da localidade de vivência dos santos, mas é figura dos santos em si—“a morada de Deus nos santos, em vez de sua morada na terra”379. A cidade é a santa380 noiva381 do Cordeiro. Deve-se tomar cuidado para não forçar demais os símbolos descritivos, mesmo assim, fornecem detalhes importantes para a compreensão temática do livro.

Na literatura Ugarítica382, o mar figura como um monstro. “Seus aliados, os inimigos de Baal, incluem o dragão, a serpente tortuosa, Shilyat com sete cabeças. Aparecendo na Bíblia sob o nome Leviatã. Lotan é o aliado da Morte. O Mar e a Morte representam forças monstruosas, hostís à raça humana e atemorizantes à assembléia divina”383, conforme conceitos de oposição entre o mar e YHWH (hwhy)384.

O mar no conceito hebraico era visto muitas vezes como um símbolo, ou até a personificação, de agência maligna, em rebelião contra Deus. Este conceito encontrava-se vinculado a um combate escatológico entre as forças do mal e YHWH. O mais próximo a um mito de combate no contexto cristão é o que se encontra nesta passagem nos termos “de ‘um novo céu e uma nova terra’ onde ‘o mar ja não existe’”385. Esta agência inimiga não está apenas amarrada, mas passa da existência no novo contexto da Nova Jerusalém. Não há mais implicância da fera, do dragão, de ninguém.

Havia sido já expresso, a exemplo em Isaías 65.17-25, o conceito de que toda a criação precisava ser transformada para que o reino eterno messiânico pudesse ter um contexto novo e perfeito386. As descrições seguintes da nova cidade, ou da noiva, são expressamente esse novo contexto de vida no reino eterno de união com o Cordeiro. As questões da falta de lágrimas e choro devem ser lidas em comparação com outras passagens que apresentam o choro divino. O ensino é válido em termos de uma mudança drástica do contexto de vida do cristão, mas não deve ser forçado ipsis literis acima de outros textos ausentes de figuras e linguagem simbólicas387. As frases de Apocalipse 7.17 e 21.4 servem mais com o sentido de colocar a reversão do lamento e choro do povo em contraste a Tiago 4.9, nos termos de Jesus em Mateus 5.4.

377 ROBBINS, 225. 378 ROBERTSON, 465. 379 GUNDRY, 256. 380 Apocalipse 21.2. 381 Apocalipse 21.3. 382 Língua de um povo vizinho dos hebreus que exprime certos conceitos tidos em comum entre os hebreus e os seus vizinhos. O nome vem da cidade de Ugarit, na costa mediterrânea ao noroeste de Israel. A cidade foi destruída por volta de 1650 a.C., época não muito distante da de Abraão. 383 COLLINS, 124. 384 AUNE, C., 1119. 385 LEVENSON, 33. 386 AUNE, C., 1133. 387 Veja Mateus 23.37, onde Jesus retrata inúmeras ocasiões de estar entristecido por causa da rebeldia do povo. Deus chora assim pela falha humana como o pai que anseia o retorno do filho, regozijando na sua volta (Lucas 15.20-32). A alegria descrita é apenas possível onde há tristeza na separação original. Hebreus 5.7 se refere à angústia de Jesus no Getsemane.

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As figuras de Apocalipse 21.5 retomam à linguagem de Isaías 25.8, na restauração feita pela iniciativa de YHWH388. Tudo é novo e agora reflete em coerência o propósito original da criação. Tudo é novo, e o reinar de Cristo tem agora um início mais real, o fiel herdando a vida como ela deveria ser.

A lista de ações pecaminosas aqui provavelmente reflete mais o conceito dos cristãos que foram infiéis, já que os de fora têm sido categoricamente cortados da vivência no contexto da Nova Jerusalém. A mensagem de João retrata que os de dentro que escaparam da morte por participar nos sacrifícios oficiais do culto romano, adoraram à fera, incluindo-se na prática adúltera de prostituição aos ídolos e com a prostituição nos templos, tiveram medo da perseguição em lugar de confiança em Cristo, efetivamente participando da morte dos fiéis389.

O formato cúbico da cidade espelha o cubo do lugar santíssimo do templo e do tabernáculo390. Em lugar da Nova Jerusalém ser um grande templo de Deus, ela é o lugar santíssimo da mera presença de Deus. A igreja, a noiva do Cordeiro, está repleta da glória e da presença de Deus.

Apocalipse 22.6-21:

Adore apenas a Deus—não se deve adorar nem mesmo ao seu mensageiro, e especialmente não adore a César! Outra vez repete-se a mensagem básica da carta—ser fiel Àquele que é digno. César reclama culto a si, mas os próprios mensageiros celestiais (mais altos do que César) não reclamam o direito de serem adorados. Apenas Deus é digno de adoração.

Conclusão:

O livro de Apocalipse é obra de temas escatológicos, porém de alcance imediato e atual. O enfoque não é sobre predições futurísticas, mas sobre a realidade alcançada por Cristo, o Cordeiro de Deus que venceu por completo o inimigo. A mensagem geral do livro leva o leitor a perceber que mesmo que o inimigo pareça governar o mundo à sua volta é Deus em Cristo Jesus que executa a Sua vontade de forma incontrovertida. As aparências são enganosas, mas o cristão não se deve deixar ser levado pelas aparências. A realidade é outra.

Há atuação maligna em volta do ser humano, mas a vitória do Cordeiro posiciona ao cristão fiel como vitorioso. Há, portanto, que lembrar e colocar em prática o mandamento de Jesus, dirigido de forma tão clara inúmeras vezes: “Quem é, pois, o servo fiel e prudente, que o senhor pôs sobre os seus serviçais, para a tempo dar-lhes o seu sustento? Bem-aventurado aquele servo a quem o seu senhor, quando vier, achar assim fazendo”391. Vigia e sê fiel!

388 WATTS, 333. 389 GUNDRY, 258. 390 AUNE, C., 1187 e GUNDRY, 261, ambos referindo a 1a Reis 6.20. 391 Mateus 24.45-46.

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