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JÁ O SOL VAI NASCENDO

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JÁ O SOL VAI NASCENDO

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MANUEL ANTÓNIO

JÁ O SOL VAI NASCENDO POEMAS

EDIÇÃO NOVO TEMPO

Ao companheiro vasco

LÁGRIMAS DE LIBERDADE

Dia um do mês primeiro Em frente daquele portão Tombaram quatro irmãos Sem que houvesse razão.

Eram seis e trinta da tarde. Já no fim da manifestação Soaram tiros cobardes E vi meus irmãos no chão.

Vi uma menina caída As tripas tinha de fora Alguém para ela correu Veio uma bala cobarde Esse alguém também caíu.

Dia um do mês primeiro. Dia da Fraternidade. Tombaram quatro irmãos Caíram p’la liberdade.

Honremos os caídos Lutando de punho cerrado Para que não caiam mais meninas Nem irmãos sejam tombados.

VERMELHA SERÁ A BANDEIRA

O fogo ardente da paixão A mágoa triste da dor Que abrasa o meu coração É fruto de um clamor.

Sofrer é quanto nos resta Para encobrimos a dor Quando o mundo em que vivemos Não é o da nossa cor.

Quão triste a gente sofrer Para encobrirmos a dor Quando o mundo em que vivemos Não é um mundo de amor.

Mas vermelho será o mundo Quando um novo amanhecer. Vermelha será a bandeira De o novo renascer.

Mas vermelho será o mundo E vermelho será a cor. Vermelha será a bandeira Porque vermelho é o amor.

A FONTE DOS TRAIDORES

Bebei traidores bebei Bebei vossa água inquinada Nascendo em terra de outrem Para a vossa fui guiada Em noite de tempestade Que vós quisesteis calada Bebei traidores bebei Matai vossa sêde danada Bebendo em fonte alheia Nascendo em terra roubada Bebei traidores bebei Em fonte envenenada Quando secar a nascente Bebeis água salgada.

QUALQUER DIA QUALQUER DIA

Já lá vem o camponês Já o sol vai nascendo Ali vem o operário, O poeta já cá está, As armas já nós cá temos No amanhecer do dia, Venceremos venceremos, Haverá pão com fartura E trabalho para todos Teremos um novo dia Que nascerá para todos Já ninguém mais chorará Haverá alegria a rodos O amanhã será nosso Nosso é o novo dia No horizonte já raia O sol do nosso dia Já lá vem a liberdade De que o povo carecia O amanhã será nosso Qualquer dia qualquer dia…

O VENTO SOPRA DE LESTE

O vento sopra de leste Com ele traz a vitória É o vento de libertação É o vento vermelho da história.

O vento sopra de leste É vento que é de agora É vento que traz acção Porque é já chegada a hora.

O vento sopra de leste Varre toda a Podridão É vento que vem com pressa É vento que é meu irmão.

O vento sopra de leste Sopra e tem razão É vento que traz amor É o vento da libertação.

TEMPO DE ESPERAR

Eu espero! Eu sei esperar Há-de vir o que eu quero E já não ha-de tardar

Virá tarde,mas vem… Sei que posso confiar É a história quem mo diz Ninguém a pode parar.

Eu espero! Eu sei esperar Já esperei tanto tempo Em outro tempo de penar Posso esperar mais um pouco Até o novo tempo chegar.

Eu espero! Nãosou de desesperar É preciso dar tempo ao tempo Mesmo que o tempo seja de recuar,

Mas eu espero. Porque sei esperar Amanhã virá novo tempo Será o tempo de avançar.

Eu espero! Eu sei esperar Por aquilo que eu espero Há já milhôes a esperar

Eu espero! Vale a pena esperar Sei que vem o novo tempo O tempo de libertar.

TU NÃO PENSAS O QUE EU PENSO

Tu não pensas no que eu penso Tu pensas em coisas fúteis Coisas vãs e medíocres Coisas que não avançam no tempo

Tu não pensas no que eu penso Porque não podes pensar Tens um espírito mesquinho Grosseiro,rude,por cultivar Tu não pensas no que eu penso Teus pensamentos são de penar Só pensas coisas sem interesse Coisas que andam no ar Tu não pensas no que eu penso Eu penso coisas de amor Coisas sérias com valor Eu penso na liberdade Do povo trabalhador.

O sangue que corre nas ruas É o sangue mártir do povo Procurando a liberdade Procurando um mundo novo.

PARA TI NÃO TRABALHO EU

Para ti não trabalho eu Nem que me leves de rasto O teu trabalho não é o meu. O meu,é um trabalho basto

Para ti não trabalho eu Eu não sou teu criado Eu só trabalho para o povo Não quero ser explorado

Para ti não trabalho eu. Nem que me apontes as armas Trabalha tu se quiseres À minha custa não mamas.

Para ti não trabalho eu De isso tu não te gabas A mim tu não exploras Eu não quero as tuas pagas

Para ti não trabalho eu. De mim tu não fazes servo Antes só a pão e água Do que trabalhar como um negro

Para ti não trabalho eu. Meu reles opressor Trabalha tu se quiseres Burguês explorador.

EU NÃO ME POSSO CALAR

Eu não me posso calar Eu não me posso calar O meu povo vive oprimido Eu tenho que desabafar

Eu não me posso calar Calar para mim é sofrer Se calo falta-me o ar Eu antes quero morrer

Eu não me posso calar Vendo os meus irmãos sofrer Cansados de trabalhar Para os outros,e nada ter

Eu não me posso calar Nem que me tenham de prender. Isto um dia há-de acabar Nem que eu tenha de morrer

Eu não me posso calar Eu já não posso viver Quem comigo quer lutar O meu povo morre de tanto sofrer

Eu não me posso calar Tenho muito para dizer E não só o que quizer Eu não me posso calar

Falarei até morrer Enquanto ao povo trabalhador Não acabar o sofrer

Eu não me posso calar Mas eu não quero morrer Sem o meu povo se libertar Deste triste padecer

Eu não me posso calar Em tão imundo viver Sozinho sem ninguém ter. Eu não me posso calar

Com tão profundo sofrer Eu tenho de me revoltar Lutando contra o poder

Eu não me posso calar Nem assim posso viver Ajudai-me a libertar Ajudai-me a vencer

Eu não me posso calar Com semelhante viver Eu não me posso calar Até um novo renascer

Eu não me posso calar Dilacera-me o coração Eu não me posso calar Com tanta exploração.

DOMINGO TRISTE

Domingo, Domingo triste. De fim de tarde cinzento Cá fora estavamos nós E nossos irmãos lá dentro Haviam cavalos brancos A outros cavalos Fazendo de acento E haviam armas Em mãos inconscientes Domingo, Domingo triste De fim de tarde cinzento De repente, sem que a ninguém Desse tempo Ecos soaram no fim de tarde cinzenta Havia gritos e fugimentos Havia vultos no chão E uma menina linda Caída no pavimento Domingo, Domingo triste. De fim de tarde cinzento Que será vingado um dia Quando vier novo tempo.

DE MÃOS UNIDAS

A tua mão mais a minha As nossas mãos mais as deles Juntemos as nossas mãos E correremos com eles

As nossas mãos estão vazias Dêmos-lhe ocupação Juntando as nossas mãos Teremos o mundo na mão

A tua mão mais a minha As nossas mãos mais as vossas Levantemo-las bem alto Tão alto quanto se possa

As vossas mãos são as minhas Porque as minhas são as vossas Juntemos todas as mãos E o mundo será nosso.

AVANTE AVANTE

Avante avante Povo trabalhador Em frente é a direcção Caminhemos sem temor Procurando a libertação Procurando o novo mundo Um novo mundo de amor Para que deste fiquem as cinzas E nem só um opressor E nem só um traidor Para que floresça o maio O maio libertador.

QUANDO AMANHÃ ME LIBERTAR

Queria ser mais do que sou Mas infelizmente não sou Mas um dia hei-de ser Aquilo que devia ser e não sou.

Se não sou mais do que sou Foi porque algo não me deixou Mas um dia terei que ser Aquilo que quero ser e não sou.

Se ainda não sou livre Foi porque algo não me deixou Mas amanhã hei-de ser Aquilo que ainda não sou.

Mas amanhã irei ser Aquilo que quero ser e não sou Porque a terra em que nasci Já então se libertou.

QUE SE LEVANTEM AS PEDRAS DA RUA

Que se levantem as pedras da rua Que o operário traga o picão E o camponês a charrua É tempo de libertação

A hora é de mudança Para uma nova criação Que se mudem as pedras da rua Para que haja mutação

E quem se quiser mudar Sem que haja alteração Que se ponha a «cavar»

Quando não… Que se levantem as pedras da rua Para que trilhemos Uma nova direcção.

A RAZÃO DO CONTRÁRIO

A razão do contrário Está no saber Que sabendo, sabe mais Do que o outro Que detem o poder Porque não sabe O que o outro sabe Se soubesse! Era o contrário a ter! Mas como poderia o contrário ter! Se só detem o poder quem não sabe Porque quem sabe, Sabe que por saber Não o pode ter Porquê? Porque o poder é coisa De gente de não saber Não sabendo o que faz Não faz o que o povo quer Para o fazer Era necessário saber E o contrário do contrário Da razão Não sabe Que quem sabe não tem… Porque o ter para ele É saber E não ter o poder. Eis pois a razão do contrário.

…E A PÁTRIA SERÁ MÃE

Dizem que a Pátria é mãe Assim eu não digo também Boa mãe é só aquela Que dá em partes iguais Tudo aquilo quanto tem

Dizem que Pátria é mãe Mas eu não compreendo isso Os filhos da mãe tem tudo E eu não tenho o preciso

Dizem que Pátria é mãe Quem o diz é quem mais tem Não repartindo com seus irmãos O que de sua mãe provem

Dizem que Pátria é mãe Dizem-no só por dizer Não se importando que a mãe Aos seus filhos nada dê de comer

Dizem que Pátria é mãe É verdade sim senhor Mas a Pátria só é mãe Do povo trabalhador.

Libertemos nossa Pátria Dos maus Filhos que ela tem Para que reparta com todos A riqueza que contém.

DOMINGO DE SOLIDARIEDADE

Domingo da fraternidade Domingo de sofrimento Domingo de solidariedade Domingo que fica no meu pensamento Dia lindo de sol Fazendo bom tempo Que alguém quis Tornar cinzento Que remorsos eu teria Se cometesse tão vil cobardia Agindo tão brutalmente Mais parecendo fera Do que gente Ah…Malvados!… Homens sem pensamento Inconscientes e danados Por lhes verem fugir o tempo O tempo em que nasceram Não poderá voltar jamais Não queremos ser ordenados Por semelhantes animais Domingo de solidariedade Que cimentou nossa frente Domingo da fraternidade Em que sangue do povo Foi derramado Para escrever com tempo O tempo da liberdade.

CRESCENDO EM ERVA DANINHA

A minha vida é um martírio Que eu não consigo superar O meu espírito é um tormento Que eu não consigo acalmar Passei fome passei frio Passei noites ao luar Porque não tinha um abrigo Onde eu pudesse estar Dormi em palheiros em matos Ouvindo mochos agoirar E tinha por companheiros A noite triste e o luar Mas a noite era agoirenta E era má conselheira Com ela teve que viver Eu não tinha onde ficar Quando eu, sono não tinha Ao rio torto ia parar Sentava-me à sua beira Ouvindo a água passar E uma vez, certa noite Vi uma pequena chegar Perguntei-lhe ao que vinha Também não tinha onde ficar Passamos ali a noite Ouvindo a água cantar Torrendo por rio abaixo

Sempre sempre sem parar Triste vida Triste Passado Que eu não posso olvidar Pois em mim ficou gravado Como ferida sem sarar Mas um dia certo dia Lutando contra a torrente Me consegui levantar Mas ainda hoje penso Quantos não tem onde ficar A minha vida é um martírio Que eu não posso calar O meu passado é um tormento Que eu não consigo esquecer Enquanto no mundo houver Homens e mulheres a padecer.

TU QUE NÃO VêS A VERDADE

Tu que não vês a verdade Pensas que tens razão Porque és inculto és bruto És um ser sem noção

Tu que não vês a verdade Vives na escuridão Não és capaz de compreender Onde está a razão

Tu que não vês a verdade Não vês onde está a traição Não sabes quem é teu inimigo E quem é teu irmão

Tu que não vês a verdade És um homem sem perdão Vives na obscuridade Não vês a exploração

A CACICADA

Para além daquelas montanhas Mora a desgraça O povo que a terra amanha Trabalha quase de graça

Trabalha a terra dos outros D’ela não tira proveito O que amanhã é para os outros Sempre sempre até cair no leito

É povo rude mas bom Vivendo explorado Trabalhando de sol a sol Pelos senhores é enganado

Prometem-lhe coisas vãs E um paraíso no além Roubam quanto podem A este povo de bem.

POEMA 25

O sol que eu não vi O dia que não ficou A luz que eu perdi A noite que não findou

O dia que eu não vivi O inverno que não passou O calor que eu não senti A primavera que não chegou

A vida que eu não vivi A flôr que murchou A liberdade que eu senti A paz que não chegou

A verdade que eu não vi O amor que não chegou O querer que eu senti O ódio que não passou

A fartura que eu não vi A miséria que ficou A tristeza que eu senti A liberdade que não chegou

A vida que eu perdi O Abril que findou O Abril que há-de vir A revolução que não chegou A revolução que há-de vir.

A NOITE NÃO ACABOU

A noite não acabou Oiço vozes de lamento A tristeza não findou Ainda cá está o tormento

A noite não acabou Não findou o sofrimento O Povo não se calou Já se ouve o seu lamento

A noite não acabou O Povo tem-na no pensamento Ninguém dela se olvidou Em tanto ano de sofrimento

A noite não acabou Mas acabará a tempo Porque o povo ainda se não libertou E não quer mais padecimento A noite não acabou E com ela o mau tempo A tempestade não passou Mas amanhã virá bom tempo

Porque o sol vai nascer Acabando a escuridão Pois o povo vai viver Um novo tempo de acçao

A noite não acabou Mas acabará a tempo De nascer um novo dia Em que não haverá sofrimento.

O CAMINHO DA VERDADE

Não me importa o que tu pensas Só me importa o que sou O que tu dizes de mim, não conta Na tua cantiga eu não vou Eu sigo o meu caminho E tu segue o que quiseres Qualquer que seja o teu caminho Virá sempre dar ao meu O meu caminho é o do futuro O teu, é um caminho escuro.

SE

Se luto eu me liberto Se calo sou oprimido Se me humilho vivo de rasto Se não luto sou vencido Se me baixo sou calcado Se fujo sou perseguido Se não falo sou calado Se não luto sou vencido Se recuo sou cobarde Se não enfrento sou repelido Se temo sou conquistado Se não luto sou vencido Se não cumpro sou falhado Se não avanço estou perdido Se não viver lutando Se não viver de punho erguido.

OS POBRES DE ESPÍRITO

Vós que julgais ser felizes Vivendo uma vida farta Sois a escória do mundo Sois dele a parte ingrata

Vós que julgais ser ricos Só porque tendes dinheiro Sois tão só pobres de espírito Porque este está primeiro

Está acima de tudo Mesmo do vosso dinheiro Porque o espírito não se vende É algo que é verdadeiro

Que importa a vossa riqueza Se o vosso espírito é doentio Amanhã quando morreres Será um espírito bravio

Que vagueará pelo mundo Doentio e sem perdão À procura da verdade Que roubou ao seu irmão

Amealhando riqueza À custa da exploração Deixando aos outros miséria Por isso não tem perdão.

PORCO MUNDO

Porco mundo o da nobreza Porco mundo de gente porca Este mundo das altezas O mundo da alta roda

É um mundo de excelências De iminências e grandezas É um mundo de condolências De ganâncias, ambições e avarezas

E julgam-se grandes senhores Autoritários e mandões Julgam ser criadores De todas as criações

Mas nunca fizeram nada Não têm criatividade Vivem esmolando os que produzem São uma esmola da humanidade.

EM TERRA DE ABUTRES

Eu estou roubado Roubaram o que era meu Quem o tem está calado Mas quem não cala sou eu

Roubaram o que era meu A terra o pão a liberdade E quando levanto a voz O ladrão sobre mim dispara

Eu estou roubado Quero o que é meu Quero o que me foi tirado Por quem se julga mais do que eu

Eu estou roubado Ninguém é mais do que eu Eu não fico calado Até que se liberte meu irmão e eu.

Eu que nasci nada tenho Nem mesmo o que era meu Roubaram a minha parte Só deixaram o meu (eu) A parte que me compete Por eu ao mundo ter vindo Os abutres a levaram Antes mesmo, de ter nascido.

TEMPESTADE QUE NÃO PASSA

A noite vai longe O temporal não passa A chuva cai a cantaros O vento empurra quem passa A lua está encoberta A noite não passa A noite vai longa A escuridão não acaba O homem procura a luz Que a tempestade apaga Mas a noite há-de acabar O sol há-de nascer A tempestade há-de passar O homem há-de vencer Há-de transformar o mundo Com um novo pensamento A tempestade vai passar Amanhã virá bom tempo.

CANTAI CANTAI TRAIDORES

Cantai cantai traidores Vossas cantigas fúteis Cantai lérias de amor E outras coisa inúteis

Cantai cantai traidores Vossos cantos enganadores Cantai coisas sem valor Ocultando ao Povo a dor

Cantai cantai traidores Vossas cantiguinhas medíocres Para servir os senhores Que vieram como abutres

Cantai cantai traidores Cantiguinhas sem sabor Cantando coisas de águas doces Para enganar os trabalhadores

Cantai cantai traidores Vossas árias sem calor Olvidando o suor Do Povo trabalhador

Cantai cantai traidores Até que vosso canto se acabe Cantai cantai traidores Até que o Povo vos corte a trave.

SE NÃO HOUVESSE ARMAS

Se não houvesse armas Não haveria opressão Porque o povo ordenava A sua libertação

Se não houvesse armas Não haveria senhores Porque o povo é quem mandava Não haveria agressores

Se não houvesse armas Não haveria classes Porque o povo é quem mandava E só haveria as bases

Se não houvesse armas Haveria de tudo para todos Porque o povo é quem mandava Mandando felicidade a rodos

Se não houvesse armas O mundo teria razão Porque o povo é quem mandava Na sua libertação.

QUAL

Qual paz qual harmonia Qual ordem qual bênção Se uns vivem em palácios E outros em barracões Qual igualdade qual justiça Qual amor qual Se uns vivem oprimidos E outros da exploração Qual direito qual perdão Qual vida qual salvação Se uns vivem na abundância E outros não têm pão Qual qual qual Sim, qual vida Esta? Não! Não haverá paz no mundo Não haverá harmonia Nem ordem nem bênção Nem amor nem direitos Nem perdão Nem haverá salvação Enquanto no mundo Houver exploração Haverá convulções sociais Haverá porque tem que haver Enquanto o homem não encontrar A vida que quer viver.

OS MANDÕES

Tu que mandas, que és mandão Não devias mandar nada Quem manda não tem razão Quem tem razão é meu irmão

Tu mandas porque és mandão Não porque saibas mandar Mas porque tens o poder na mão À custa da opressão

Tu que mandas que julgas ser O dono desta criação És tão sòmente um malandro Que vive da exploração

Eu te digo estas coisas A ti, que não és meu irmão Porque meu irmão trabalha Mas tu não

Tu que és um mandão Que julgas ser um senhor És tão sòmente um ladrão Não passasde um opressor

Tu que mandas serás mandado E não serás opressor Quando amanhã se libertar O povo trabalhador.

QUEM LUTA, LUTA POR BEM

Quem luta, luta por bemLuta por algo na vidaQuem não luta não mereceVir a viver tal vida

Quem luta, luta por bemLuta de punho erguidoLuta pelos que nada têmPara que a vida tenha sentido

Quem luta, luta por bemLuta por um mundo novoMesmo quando mal entendidoLuta pelo bem do povo

Quem luta, luta por bemLuta só pela verdadeAma o povo a que pertenceLutando pela liberdade.

NO HORIZONTE RAIA A AURORA

No horizonte raia a aurora Já o sol vai nascendo Porque é já chegada a hora O povo já se vai erguendo

Já o sol vai nascendo Já se acaba a escuridão O povo vai-se aquecendo Ávido de libertação

Porque é já chegada a hora De uma nova criação O povo vai acabar Com a sua exploração

O povo já se vai erguendo Porque é já chegada a hora Já o sol vai nascendo No horizonte raia aurora.

IMPIEDOSAMENTE

Que venha um raio de lume Ou que venha uma inundação Para que se acabe o mundo E com ele a podridão Não, não e não Não mandes meu Deus Tamanha castigação Lembra-te das criancinhas Essas têm perdão São inocentes, não têm tentação Mas varre o resto do mundo Deixa ficar só o que é são Não tenhas pena do homem Esse maldito não tem perdão Guerras ódios vinganças Avareza ganância exploração Fome peste miséria Tudo tudo, só amoré que não Ò Deus que estás nas alturas O teu lugar é cá em baixo Aqui é que mora a desgraça É aqui, é aqui em baixo Tu que vês tanta podridão Naqueles que nada são Tu vê se tens compaixão Daqueles que ganham o pão Trabalhando para nada terem

Ò Deus tens que vir cá ver O que é este sofrer De um povo que vive a padecer Vem meu Deus,vem Que os puros cá estão para te agradecer Vem e traz contigo o perdão Dos que vivem a sofrer Mas condena sem paixão Aqueles que vivem da exploração Roubando aos outros tudo E até o amor Pois esses são a traição Do povo trabalhador.

Quem me dera um paraíso Onde eu pudesse viver Para deixar este mundo Que nada tem de apetecer.

ESTA VIDA NÃO VALE A MORTE

A vida não vale a morte Quando se vive esta vida Porque esta vida é a morte E a morte é que é a vida

Quem morre neste viver Não devia ter nascido Pois viveu para morrer De morte sem sentido

Quem morre para viver A chama que queremos ver renascer Não chega sequer a morrer Quem morre por este renascer Merecia viver a vida Que os outros irão viver.

TEMPO DE NOVA GESTAÇÃO

O tempo tudo leva Tudo que nasce morre Da terra vem, à terra volta Até que a terra fique cansada Até que a própria terra seja morta Tudo se acabará um dia Os mistérios que o mundo contém Virão à luz do dia As forças ocultas da natureza Resolver-se-ão qualquer dia E no mundo ficará o vácuo Até que futuros milénios Façam uma nova criação E venha uma nova humanidade Para que se cumpra Uma nova gestação.

…PORQUE ISTO NÃO É VIVER

Para além da morte Que é esta vida Há uma vida para viver Porque esta não é vida Porque isto não é viver

Viver para sofrer Num mundo de podridão Não vale a pena viver É uma vida sem razão

Razão há noutra vida Que havemos de viver Quando esta for vencida E a outra renascer

Nesta vida de humilhação Não vale a pena viver Uns vivem da exploração E outros a padecer

É uma vida sem sentido Imunda só de prazer Para aqueles que exploram Que nada sabem fazer

É uma vida de martírio Para os que vivem a sofrer Vítimas da opressão De criança até morrer

É uma vida de podridão De vício de ódio de dor Mas amanhã há-de vir Uma nova vida de amor

Não haverá explorações E não haverá mais dor Porque então se libertou O povo trabalhador

E do suor fará pão Do sangue fará amor Levantando sua nação Trabalhando com amor.

DEIXA FALAR O MUNDO

Deixa falar o mundo Deixa dizer o que disserem Em nada te importes com isso Seja o que Deus quiser

Segue teu caminho De passo firme mulher Vence o teu passado Não queiras um futuro qualquer

Trilha o bom caminho Lutando p’lo teu povo Vive de Punho erguido À procura de um mundo novo.

Nos teus olhos vejo o mundo Tudo em ti é pureza Mas amanhã quando cresceres Crescerás num mundo de tristeza

AMA TEU IRMÃO

Ama teu irmão Como a ti mesmo Ele será teu companheiro Ireis os dois para o além Ainda que um de vós vá primeiro O outro irá também De nada valerá o vosso dinheiro Porque a morte está primeiro Pensa pois em teu futuro Companheiro Ama teu irmão Qualquer que seja teu dinheiro.

OUVE MEU DEUS, OUVE

Ò Deus que estás nas alturas Deus ouve o meu lamento Acaba com este mundo E com tamanho sofrimento

Cria um novo mundo Aonde só haja pureza Não queiras mais podridão Faz um mundo de beleza

Deixa só ficar os puros Os das boas intenções Acaba com os exploradores Finda com esses ladrões

Essa porca burguesia Que degrada as gerações Na mira de maior lucro Só vive de ambições

Ouve meu Deus, ouve Eu te peço mil perdões Mas limpa a peste do mundo Limpa dele os opressores Dos mártires trabalhadores Deixa só o que é são Acaba com os exploradores.

Libertai-vos desta vida Não padeceis pela vida fora Trabalhai por um novo mundo Criando uma vida nova Libertai os oprimidos E prendei os que explorem Libertai a vossa Pátria Dai poder a todo homem.

DEVES A CARNE À TERRA

O arado resolve a terra O homem transforma o mundo A mulher dá a criação E a terra leva tudo

Quem é que controla o mundo E até onde pode ir o homem As forças ocultas da natureza Ou os mistérios do Mundo.

Ouve tu ò vagabundo És pó só pó Não queiras controlar o mundo Nem ser mais do que o teu igual Não és mais do que um mortal Vive e deixa viver teu irmão

Porque o teu fim é o mesmo Talhada está tua direcção Partirás para o além Tal como teu irmão

O que cá tens mais do que ele De nada te valerá Deves a carne à terra Ela tudo comerá

O que tens não é teu Para os outros ficará Não explores o teu irmão Para o além com ele irás.

TUDO PASSA COM O TEMPO

Se a vida não te corre bem Não te apoquentes com isso Deixa correr o mundo Aguenta o tempo que for preciso

Conserva teu espírito sereno Mesmo que o tempo seja de amargura Um dia virá bom tempo Terás tempo de fartura

Se alguém se rir do teu padecimento Despreza tamanho julgamento Quem se rir é pobrezinho É um farrapo sem concerto

Conserva sempre a tua força moral E bem são teu pensamento Procura onde houver Bálsamo para o teu sofrimento

Levanta bem alto a cabeça Não tenhas desfalecimento Esta vida é um mártirio Mas tudo passa com o tempo

AMA TEU FUTURO

Tu que bebes para esquecer És tão somente um falhado Bebes até te perder Bebendo até cair para o lado

Refugias-te na bebida Porque vives complexado Pensas encontrar aí A cura do teu passado

Não te humilhes homem Não queiras viver de rasto Levanta-te daí Esquece o passado

O teu passado não conta Com o tempo foi enterrado O que conta é o teu futuro Ama-o e fá-lo amado.

NÃO DESESPERES NUNCA

Não desesperes nunca Cala teu sofrimento Concentra teu espírito Espera pelo bom tempo

Não desesperes nunca Nem nunca te descontroles Domina teu pensamento Até que o espírito te console

Não desesperes nunca Contempla a natureza Nela encontrarás a força Que vencerá tua tristeza

Não desesperes nunca Porque a vida é um tormento A tempestade passará Amanhã virá bom tempo

Não desesperes nunca Não tenhas maus pensamentos Lembra-te dos teu irmãos Que têm mais sofrimento

Não desesperes nunca Enfrenta a adversidade com ardor Espera pelo novo tempo E terás um tempo de amor

Não desesperes nunca Vai ao fundo de ti mesmo Lá encontarás uma réstia de força Para vencer teu sofrimento

Não desesperes nunca Seja qual for teu sofrimento Acredita eu estou contigo Contigo está meu pensamento

Não desesperes nunca Seja qual for o motivo De teu padecimento Este mundo são dois dias E tudo vai com o tempo.

E PARA TI ESTE POEMA

Tu que sofres dia e noite Deitado nesse teu leito É para ti este poema Como amor para ti foi feito

Meu irmão acredita,não estás só Eu não sofro como tu Mas estou contigo O meu sofrimento é outro

Meu bom irmão,meu bom amigo Tu não devias sofrer Deus devia estar contigo Se calhar até está,meu bom amigo

Mesmo que não dês por isso Tu não estás só Pelo menos eu estou contigo Não chores nunca meu irmão

Aguenta teu padecimento Até que Deus se lembre de ti E te dê o bálsamo para o teu sofrimento

Recebe de mim um abraço Que se alivie tua dôr Que acabe teu sofrimento Para viveres com amor.

QUEIRAS TU TE LIBERTAR

Tu pensas coisas ruins Julgas ter o que não tens Vives obcecado Temendo o mal que não conténs

Tu não sofres do que julgas Sempre assim foi, sempre será Hás-de morrer um dia Mas não daquilo que pensas Que contigo está

Não vivas pois deprimido Pensando em coisa má A tua ideia não faz sentido O teu espírito é que bom não está

O teu mal é de espírito A tua carne está sã Trilha um novo caminho Que isso te passará

Senão tens em que pensar Que não seja em coisas más Há muito para fazer Queiras tu te libertar.

DAI

Dai pão ás criancinhas Dai casa a quem não a tem Dai reforma aos que não podem E tirai aos que tudo têm

Dai de beber aos que têm sede De comer aos que têm fome Os que podem aos que precisam Ajudai os que não podem

Dai saúde aos que padecem Não tirais aos que não têm Auxiliai os que desfalecem Tirando aos que vivem bem

Dai amor aos que têm ódio Dai verdade aos que mentem Dai justiça aos injustos E aos maus dai-lhes o bem

Levantai os que caíram Segurai os que escorregam Dai ar aos soterrados E sol aos que invernam

Dai conforto aos deprimidos Dai gosto aos saturados Amparai os deprotegidos Dai confiança aos desesperados

Educai os malcriados Corrigi os incorrectos Ensinai os que não sabem Para que sejam espertos

Dai trabalho aos que não têm Dai igualdade a todo o homem Libertai os oprimidos E prendei os que explorem

Libertai a vossa Pátria Dai poder a todo o homem Quem trabalha que ordene Quem não trabalha não come.

ALENTEJO ALENTEJO

Alentejo alentejo Alentejo eu te adoro Sempre sempre que te vejo De alegria eu choro

Ò povo alentejano Ò povo trabalhador Tu que amas a terra Que a trabalhas com ardor Ò povo trabalhador Do alentejo querido A vida para ti é um ardor O latifúndio teu inimigo

Lanças à terra a semente Que germina o pão divino As tuas terras são de oiro Oiro é o teu trigo

Ò alentejo alentejo Alentejo de calor Eu choro quando te vejo Choro mas choro de amor.

NOVO TEMPO

O globo gira O homem avança O mundo polui A terra cansa

O homem entra em degradação Não dominando sua civilização Matando sua própria criação

O globo gira O homem avança O mundo polui A terra cansa

O homem vive de esperança Esperando algo de novo Cansado de tanta herança Sem herdar o mundo novo

O globo gira O homem avança O mundo polui A terra cansa

O globo parará um dia… O homem morrerá O mundo contaminado agonia. A terra queimar-se-á(?)

O dia já vai nascendo Já ao longe raia a aurora O povo já vai sabendo Que é já chegada a hora

Já ao longe raia a aurora Já se vê o renascer De um mundo que é de agora De um mundo que vai nascer.

COMPREENDER AS COISAS QUE NÃO COMPREENDO

Hoje estou cansado Queria saber mais do que sei Queria Aprender, Saber compreender Coisas que não compreendo O meu cérebo está cheio De pensamentos Que tristeza eu tenho De não poder dominar Meu pensamento A culpa não é minha É do meio em que nasci Pois eu não pude dar saber Ao meu crescimento Como eu gostaria de saber mais De compreender As coisas que não compreendo Hoje estou cansado Queria saber mais Mas não sei Terei de me contentar Com aquilo que aprendi Na terra em que nasci Prenderam meu pensamento Maldito seja o sistema Que atrofiou meu crescimento.

NESTA MORTE VOU VIVENDO

Eu estou morrendo Agoniando em desespero Esperando o novo dia Que ao longe vai nascendo

Novo dia que eu não vivo Porque eu estou morrendo Vivendo nesta agonia Nesta morte vou vivendo

Mas amanhã será dia Acabará meu sofrimento A morte é um alívio Acabará meu tormento

Mas eu não quero morrer Sem nascer o novo dia Eu ainda quero viver Um pouco dessa alegria

Desse amor de enternecer Dessa felicidade de vida Dessa chama do querer Eu quero viver tal vida

Por isso eu digo Que não me importa morrer Para quen nasça o novo dia Que nós queremos viver.

NINGUÉM MO PODE TIRAR

O meu espírito é um tormento Em constante mutação É um espírito irrequieto Que eu procuro acalmar Pois amanhã quando eu morrer É a única coisa que comigo vai ficar

É a única coisa que tenho E que é minha,só minha De isso me posso gabar Porque sei que o meu espírito Ninguém mo pode tirar Podem-me roubar a carne O sangue ou o órgão que calhar Mas o meu espírito não mo roubam

Ninguém mo pode tirar Podem-me prender ou roubar Podem-me torturar E até me podem matar Mas o meu espírito é meu Ninguém mo pode tirar Poderá vaguear pelo mundo Ao inferno ir parar Mas o meu espírito é meu Só meu Ninguém mo pode tirar.

DELIRANDO

Préssinto que vou morrer Já se aproxima o além Vou-me acabar para o mundo Vou para um mundo de bem

Deste não levo saudades Deste só tenho desdem É um mundo de malvados Onde não existe o bem

Vou-me para todo o sempre A este mundo não voltarei Este é um mundo de malditos Vou para um mundo de bem

Vou e não tenho medo Nada tenho a temer Temo é neste mundo Nele só tenho a perder

Vou e não voltarei Não voltarei jamais Já não volto a penar Eu não sofrerei mais.

Não me importa o que penses Dos poemas que eu fiz São poemas para o povo Com amor os escrevi Mal ou bem, não interessa O que importa é o que senti Ao escrever estes poemas Que saíram de dentro mim São pedaços de mim mesmo Dos martírios que eu vivi Amo-os, porque são meus Compreendo-os foram feitos para ti São poemas de verdade Mesmo que assim não entendas (ou porque mal escrevi) Não procurei emendas Estão como eu os transmiti.

1976 –––––––––– Composto e impresso na Coopag-r.da preciosa,478–porto