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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 7 Capítulo I. O QUE É O JAZZ? ................................................................................. 11 1.1 ORIGEM ....................................................................................................................... 11 1.2 OS ESTILOS DO JAZZ ................................................................................................ 15 1.3 ELEMENTOS DO JAZZ ............................................................................................... 25 Capítulo II. O JAZZ NO BRASIL.............................................................................. 36 2.1 SIMILARIDADE ENTRE A MÚSICA NEGRA DO BRASIL E A DOS EUA: OS ANTEPASSADOS COINCIDEM......................................................................................... 36 2.2 INFLUÊNCIAS JAZZÍSTICAS NA MÚSICA BRASILEIRA ........................................... 41 CAPÍTULO III. JAZZ AMAZÔNICO .......................................................................... 55 3.1 MÚSICA PARAENSE ................................................................................................... 55 3.2 O JAZZ NO PARÁ ........................................................................................................ 58 3.3 BREVE BIOGRAFIA DOS COMPOSITORES.............................................................. 60 3.4 ANÁLISE DAS OBRAS ................................................................................................ 70 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 80 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 82 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ............................................................................ 867 ANEXOS ................................................................................................................... 92

Jazz Amazônico - Conjecturas

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 7 Capítulo I. O QUE É O JAZZ? ................................................................................. 11

1.1 ORIGEM.......................................................................................................................11

1.2 OS ESTILOS DO JAZZ ................................................................................................15

1.3 ELEMENTOS DO JAZZ ...............................................................................................25

Capítulo II. O JAZZ NO BRASIL.............................................................................. 36

2.1 SIMILARIDADE ENTRE A MÚSICA NEGRA DO BRASIL E A DOS EUA: OS

ANTEPASSADOS COINCIDEM.........................................................................................36

2.2 INFLUÊNCIAS JAZZÍSTICAS NA MÚSICA BRASILEIRA...........................................41

CAPÍTULO III. JAZZ AMAZÔNICO.......................................................................... 55

3.1 MÚSICA PARAENSE...................................................................................................55

3.2 O JAZZ NO PARÁ........................................................................................................58

3.3 BREVE BIOGRAFIA DOS COMPOSITORES..............................................................60

3.4 ANÁLISE DAS OBRAS ................................................................................................70

CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................... 80 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................... 82 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ............................................................................ 867 ANEXOS ................................................................................................................... 92

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INTRODUÇÃO

No decorrer da história e evolução musical, o homem sempre sentiu a

necessidade de classificar, catalogar, rotular sua produção musical. Esta

necessidade vem aumentando e ao mesmo tempo tornando-se mais complexa no

decorrer do tempo, principalmente nos dias atuais, em que cada vez mais cresce a

quantidade de produção na área musical em todo o mundo. Novos gêneros, novos

estilos, novas vertentes, enfim, são músicas que surgem por meio dos mais

diversos processos criativos, tanto por experimentação de uma pessoa ou grupo,

como por fusão de estilos pré-existentes, ou ainda, pela criação e difusão popular,

dentre outros.

O Jazz é hoje um dos principais gêneros musicais passíveis de fusões,

mixagens, enfim, é praticamente a forma de expressão das mais utilizadas no meio

musical mundial. Desde o seu surgimento até os dias atuais, vem passando por

diversas modificações e evoluções, o que acabou por romper as barreiras dos EUA,

tornando-se uma expressão musical global. Ao encontrar-se com as mais diversas

culturas, ele influencia e também é influenciado, resultando assim, em novas

sonoridades, o que significa dizer que o jazz está sempre sendo reinventado.

É possível perceber que, considerável parte da produção musical no Pará

também está composta sobre os parâmetros do jazz. Nas chamadas televisivas e

notas nos jornais sobre a programação cultural de Belém, é comum ouvir e/ou ler:

“Hoje, no Theatro da Paz às 20h, Amazônia Jazz Band, grupo que já tem seu

público cativo na cidade, promete um espetáculo com o mais puro jazz brasileiro e

internacional”, (O LIBERAL, 11/10/2006), ou “Hoje (30) tem show do grupo

Zarabatana Jazz, do músico Ziza Padilha, no projeto Quinta Instrumental Hilton...”

(AMAZÔNIA JORNAL, 30/11/2006). “Na quinta-feira, show de Minni Paulo e grupo MP3 com muito jazz, a partir das 22h30” (AMAZÔNIA JORNAL, 07/07/2004), ou

ainda, “Em seguida será a vez do show instrumental com o grupo Tynbres, regido

pelo maestro Tynnôko”. (O LIBERAL, 07/10/2005).

Pode-se supor também, que há uma crescente aceitação do público, que

sempre está presente nestes eventos e perceber-se que esta música está cada vez

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mais ganhando espaço dentro da produção artístico-musical da cidade.

Ao escutar esta música instrumental urbana produzida em Belém e

compará-la ao jazz de raiz (norte-americano), pode-se perceber, de maneira

empírica, que dentro desta produção musical, há algo de diferente, certa

peculiaridade, certo “ar amazônico”, mesmo que talvez, não pretendido pelos

compositores, enfim, algo que torna, sonoramente, esta produção diferente das

músicas instrumentais produzidas em outros lugares.

Mas, que diferenças são essas? Será que esta diferença percebida se dá

apenas por ser uma música executada por músicos paraenses, ou de fato, há

diferenças nos elementos musicais impressos nas composições dos que se

propõem a produzir jazz? E quais são essas diferenças? Quem são seus principais

representantes, atores e difusores?

Esta pesquisa é direcionada exatamente para a averiguação deste fato, no

sentido de descobrir se há uma peculiaridade nesta música que a enquadre como

uma nova vertente na música instrumental brasileira, sobretudo do estilo “Jazz

Brasileiro”, algo que poderia se chamar de “Jazz Amazônico”.

A pesquisadora entende como “Jazz Amazônico” uma música que tenha em

si elementos musicais da cultura norte-americana, mais especificamente o jazz, e

da cultura da música amazônica. Estes elementos deverão estar fundidos de forma

não superficial, resultando em uma sonoridade diferente, com elementos

intrinsecamente ligados e não apenas lado a lado como elementos distintos, que

estão somados. Isto é, seria uma mistura em que estes elementos estejam

intrinsecamente mesclados nas composições dos artistas da terra. Seria então,

uma música com peculiaridades regionais amazônicas em relação ao jazz de raiz.

Como ponto de partida à aceitação desta possível vertente do Jazz Brasileiro

como um dos estilos representantes da música paraense, a pesquisa partiu dos

estudos realizados acerca do pluriculturalismo no Brasil, por autores como Ana

Maria Machado (2004), George Zarur e Parry Scott (1998) e Laura de Mello e

Souza (2000). Esses autores tratam da característica peculiarmente brasileira de

conviver com muitas culturas misturadas. Quando se ouve falar em

multiculturalismo no Brasil, trata-se de um pluriculturalismo integrador, de um

interculturalismo e não de uma construção em que co-existam uma cultura

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hegemônica com várias outras, minoritárias fragmentadas e cheias de barreiras

entre si.

Na identidade brasileira, construída ao longo de cinco séculos, há uma busca

natural de confluências, assimilações, relações variadas, uma aceitação tradicional

do sistema de miscigenação cultural. Essa marcante característica da cultura

brasileira, de recusar a viver a diferença como fragmentação e o desejo de

incorporá-la como amálgama, tem sua origem, portanto, na mistura entre as etnias

e culturas tão díspares que marcaram o passado da colonização do Brasil.

Para a pesquisadora Laura de Mello e Souza (2000), o pluriculturalismo vem

se configurando como uma realidade cada vez mais persistente do século XXI, e o

Brasil, mesmo não sendo um país democrático socialmente, desigual, é um país

mestiço.

Ana Maria Machado (2004), coloca que esse somatório brasileiro, que

diferentes artistas têm chamado de "antropofagia cultural" (termo dos modernistas

de 1922) ou de "geléia geral brasileira" (termo dos tropicalistas de 1968, que

consiste em “deixar vir o que vier”, no chamado "mistura-e-manda") é um processo

cultural que vem sendo expressamente defendido em nossa sociedade por artistas

e pensadores e, só um olhar que incorpore isso pode entender a religiosidade

brasileira, por exemplo, ou a música, ou o idioma falado, ou até mesmo o que se

come. Talvez seja esta, para alguns, a principal contribuição que o brasileiro pode

dar ao mundo. A miscigenação brasileira não é apenas étnica, mas também

cultural, e os países europeus, como a França, têm dificuldades em conviver com o

tema da mestiçagem.

O sociólogo Gilberto Freyre (apud SOUZA, 2000), coloca que tais

características tornam a cultura brasileira plural e aberta a outras culturas.

Em se tratando da cultura musical na cidade de Belém, Vicente Salles (1961),

concorda que a produção musical da cidade sempre recebeu influências de

diversas outras culturas musicais, tornando-as parte da sua. O que possibilita dizer

que talvez, na contemporaneidade, o Jazz possa ser uma delas.

Roberto Muggiati (1999) percebe o jazz não como um estilo de música, mas

como uma linguagem, uma forma de tocar. Eric Hobsbawn (1990) teoriza o Jazz

como área mais ou menos autônoma dentro da indústria cultural, considerando-o

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como reservatório de idéias para sua renovação, o que possibilita, portanto, sua

fusão com outras culturas musicais.

Assim, pode-se concordar que é possível, aceitável e compreensível a busca

e averiguação de uma provável fusão do jazz com a música amazônica.

Para a efetivação deste trabalho, foi utilizada a pesquisa bibliográfica e de

campo, assim como a analítica:

• Bibliográfica, através de leituras sobre jazz, música paraense, cultura brasileira,

música popular, música instrumental, compositores paraenses, enfim, tudo que

norteia o objeto e encaminhamento da pesquisa;

• De campo, com a realização de entrevista com três compositores paraenses, por

escolha intencional, levando em consideração a atuação ativa na produção

musical jazzista de Belém, praticando este tipo de música de forma solidificada;

• Analítica, pela observação e análise dos históricos de vida, as relações com o

jazz, e análise de uma música de cada compositor, com o intuito de encontrar os

elementos presentes em suas obras.

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CAPÍTULO I. O QUE É O JAZZ?

Muito já se escreveu sobre o Jazz e sobre a dificuldade de defini-lo, portanto,

não se pretende aqui, trazer uma definição fechada e absoluta do que é o Jazz,

mas sim, tentar identificar as diferentes nuances dos elementos que o compõem.

1.1 ORIGEM

Há muitos que afirmam que o jazz “não é o que se toca, mas sim o modo

como se toca” (MUGGIATI, 1999, p.12). No entanto, pode-se afirmar com certa

confiança que existem sim, elementos característicos que o define como um

fenômeno musical em si.

Surgido nos EUA, em 1900, o jazz é resultado de todo um processo que

“iniciou de um ato de violência, com o negro arrancado da África para trabalhar em

outra terra, do outro lado do oceano, a partir do século XVII” (idem, p.14). Este

trauma da escravidão marcou sucessivas gerações tornando-se um fator importante

no aparecimento do jazz, como veremos adiante.

A expressão musical deste povo era mais acentuada através do canto, devido

ao fato de haver um caráter natural da linguagem africana, de estar fortemente

ligada à acentuação e a inflexão das palavras, somado ao fato de que, nas viagens

para a América, os negros iam praticamente com a roupa do corpo, portanto, não

levavam seus instrumentos musicais. Este forte caráter vocal passou para o Jazz,

quando os negros entraram em contato com os instrumentos europeus na América,

em especial os instrumentos de sopro, por estarem mais ligados à imitação da voz

humana.

Na verdade, o canto não exercia um papel maior como forma de

manifestação musical, e sim, como uma forma de reconhecimento e catarse1, que

se traduzia inicialmente pelas “work-songs” (canções de trabalho) que,

1 Catarse é a purificação das almas através da descarga emocional provocada pelo drama, um conceito teorizado por Aristóteles. Segundo o filósofo, para suscitar a catarse era preciso que o herói passasse da dita para a desdita, ou seja, da felicidade para a infelicidade. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Catarse)

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ritmavam os trabalhos dos negros, cadenciando batidas de martelos, marretas ou machados, o levantamento de cargas etc (...) em certos casos descrevendo a tarefa específica (...) Elas tranqüilizavam os senhores e os capatazes: o trabalho corria em ordem e os negros pareciam contentes, no seu devido lugar “. (MUGGIATI, 1999. p. 19 e 20)

Depois pelas “gospel songs”, uma espécie de fusão dos hinos protestantes

com as “work-songs”, em que o pregador é o solista e a congregação responde.

Segundo Muggiati (1999, p. 20), “os negros transformaram estes hinos de origem

européia em verdadeiros cânticos sincopados, ao ritmo vivo de palmas e batidas de

pés”,

E do mesmo modo, se traduziam pelos “spirituals”: “entoados mais lenta e

solenemente, são solos inspirados em trechos da Bíblia adequados à condição do

negro, que se identificava com o povo oprimido de Israel em sua luta pela

libertação” (idem).

Em uma área mais profana, entre os gêneros que dominaram a segunda

metade do séc. XIX e contribuíram para a formação do jazz, estavam os “minstrel

shows” onde era apresentado “uma espécie de resumo do acervo musical negro e

uma paródia da vida americana, lembrando um pouco os mirabolantes enredos das

escolas de samba” (idem, p. 21). Destes shows surgiu o “Cakewalk”, que

inicialmente era uma sátira à maneira afetada de andar dos brancos e depois,

transformou-se em uma dança de sucesso, evoluindo mais tarde para o que se

tornou um dos primeiros “booms” (estouros) musicais antes mesmo do séc. XX: o do

“ragtime”, que “foi uma das primeiras abordagens negras da música de Liszt e

Chopin e da literatura pianística da época, submetida a uma concepção original,

fortemente sincopada” (idem). E especialmente, um gênero que se tornou um dos

principais elementos do jazz e também marcou toda a música popular do séc. XX, o

“Blues”.

O Blues, surgido a partir da segunda metade do séc. XIX, é geralmente

definido através de diversas características técnicas, tais como:

1. Parte cantada, com 12 compassos, seguindo o esquema A-A-B;

2. Utilização de uma escala peculiar.

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No entanto, esses compassos, por serem muito irregulares, deixam lugar a

uma resposta do instrumento, o que foi uma das grandes contribuições ao jazz,

tanto em sua forma vocal e, em especial, em sua forma instrumental. Pois o

“bluesman” (músico que cantava, tocava e compunha blues), não utilizava o violão

tão somente para se acompanhar, utilizava também como resposta a sua voz,

fazendo assim, com que a exatidão métrica, as notas tocadas corretamente ou a

melodia do conjunto contassem menos que as inflexões tiradas do instrumento, a

sonoridade e a intensidade da emoção do músico no momento em que toca. O que

é conhecido por “feeling”.

Herzhaft (1989, p. 13) afirma: “essa interação entre o canto e a parte

instrumental é uma outra característica do blues (e estendeu-se a toda música

negra americana): o instrumento prolonga ou imita a voz humana”.

Outra grande contribuição do blues ao jazz é a escala, que nasceu da

adaptação da escala diatônica ocidental pelo sistema africano, em que as melodias

se organizavam em um sistema pentatonal (escala formada por cinco notas), que

coincidiam com as notas da escala diatônica maior, ignorando o terceiro e o sétimo

grau, notas estas, estranhas ao ouvido africano. Assim, quando colocado em

contato com uma música de tom maior diatônico, o africano ficava confuso, sem

saber mais onde se encontrava, e todas as vezes que se aproximava da terça e da

sétima em qualquer acorde, ele os distorciam, com violentos efeitos de vibrato, até

que incorporaram às suas escalas, notas alteradas por sustenidos ou bemóis. Estas

notas, conhecidas como “blues note”, ou seja, nota blues, são as que fazem com

que a escala blues oscile constantemente entre o modo maior e o modo menor,

gerando um clima característico que acaba por comandar toda música negra

americana autêntica, em especial o jazz.

De uma dessas escalas saiu toda a tradição do jazz americano. Essa escala, que é a maior adicionada de terceiras e de sétimas menores, foi algumas vezes chamada de ‘escala blues. (HERZHAFT, 1989, p. 12).

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Ex. escala blues de Dó:

As notas em parênteses são as “blues notes”. Esta escala é executada sobre

um acorde maior ou dominante.

Nesta mesma época, surgiram também as “brass bands” (bandas de metais),

que se desenvolveram notavelmente em Nova Orleans.

Durante a Guerra da Secessão (1861-65), as bandas marciais

desempenhavam um papel importante, e com a Revolução Industrial, os

instrumentos foram aperfeiçoados e barateados,

As fábricas iam em busca de um novo e florescente mercado e a grande procura tornava os preços muito acessíveis (...) cornetas, trompetes, trombones e bombardinos custavam nos Estados Unidos entre 10 a 15 dólares. (MUGGIATI, 1999. p. 25).

Instrumentos de segunda, mais baratos ainda, abarrotavam as lojas de

penhores, devido ao grande número e à alta rotatividade das bandas, que

constantemente eram formadas e desfeitas.

Assim, os instrumentos de sopro foram parar nas mãos dos músicos negros,

que formaram as “brass bands”, e tiveram sua época de ouro entre 1880 e 1910.

Estas bandas estavam vinculadas aos vários tipos de organizações que dominavam

a vida de Nova Orleans, como associações de classes, entidades beneficentes e

sociedades funerárias, e foram fundamentais para a criação do jazz.

Roberto Muggiati afirma que se pode perfeitamente armar a equação:

Ragtime + brass bands + blues = Jazz

Desta forma, após quase três séculos, o resultado do primeiro grito de

libertação dos negros em estado bruto, no século XVII, foi se modificando e

assumindo novas formas na medida em que o negro absorvia a cultura americana,

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acontecendo o mesmo com a música trazida da África, provocando, a partir do

momento em que entrou em choque com a tradição européia, o surgimento de uma

nova música, surgida no século XX: o Jazz.

1.2 OS ESTILOS DO JAZZ

O Jazz, ao longo da história, foi passando por evoluções estilísticas. Estas

evoluções são divididas, pelos teóricos, em três períodos, conhecidos como “Jazz

Tradicional”, “Jazz Moderno” e “Jazz Pós-Moderno”.

Os estilos são:

• Jazz Tradicional

1890 – Ragtime (ex. faixa nº 1)2: Surgido em Sedália, no Estado de Missouri.

Há controvérsias entre os autores ao considerar ou não o ragtime (ragged

time = ritmo rasgado, destruído) o primeiro estilo de jazz, como, por exemplo, o

autor Muggiati, já citado, que apresenta o ragtime fazendo parte da pré-história do

jazz, diferente de autores como Joachim E. Berendt, que o consideram como já

sendo o primeiro estilo de jazz.

O “rag”, como já foi dito, possui em geral, as características da música para

piano do século XIX. Muitas vezes tem a forma-trio3, típica do minueto, ou então,

congrega, ordenadamente, diferentes formas da época.

No “ragtime” não havia improviso, elemento básico do jazz, mas em seu ritmo

estava marcante o swingue (balanço) tão característico da música negra.

No “rag” de uma maneira geral, estão ligados, mais do que qualquer outro estilo do jazz, a tradição musical européia e o sentido rítmico do negro. Quase se poderia dizer que o “rag” é uma música branca com toque negro. (BERENDT, 1987, p. 20)

2 Música: “Pine Apple” de Scott Joplin (nasc. 1868) do CD “Piano Rags”. CD com os exemplos em áudio está anexo ao trabalho. 3 Seção média do minueto, tradicionalmente escrita a três partes (ABA). (http://br.geocities.com)

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1900 – New Orleans (ex. faixa nº 2)4: Como o próprio nome sugere, este

estilo nasceu na cidade de New Orleans, considerada a capital do jazz.

New Orleans, nesta época, era reconhecidamente uma cidade que

congregava um grande número de emigrantes franceses, espanhóis, ingleses,

alemães, eslavos, entre outros de menores proporções, que traziam as tradições

musicais de suas nações. Tradições estas que se cruzavam no “Storyville” (bairro de

diversões da cidade), nos diversos estabelecimentos de todas as categorias e

classes sociais, sem distinções ou preconceitos.

Desse entrelaçamento de raças e diferentes tipos de atividades musicais se

formou o “New Orleans”, estilo caracterizado por três linhas melódicas que se

contraponteiam, executadas por uma “corneta” (pistão), um trombone e uma

clarineta, sendo o instrumento líder, o pistão. Baseado nas improvisações do pistão,

o trombone orienta o seu contraponto, e a clarineta ornamenta o toque de ambos

com ligeira condução melódica. Estes três instrumentos são apoiados pela base

rítmica do contrabaixo ou tuba, bateria, banjo ou guitarra e piano.

O ritmo original do “New Orleans” se aproxima muito do ritmo de marcha

européia, na qual a acentuação cai no primeiro e no terceiro tempos do compasso.

Depois, passou a ser no segundo e quarto tempo.

O fraseado, em geral, lembra mais a articulação vocal do que a instrumental,

“os músicos quase falam com seus instrumentos” (BERENDT, 1987, p. 24).

1910 – Dixieland (ex. faixa nº 3)5: Na cidade de Nova Orleans o jazz não era

praticado apenas pelos negros, havia também conjuntos de brancos desde o

princípio. E este jazz, produzido por brancos, ficou conhecido como “dixieland jazz”,

para distinguir do estilo “New Orleans”, tendo como principal nome Papa Jack Laine,

que foi o primeiro branco a obter sucesso com suas orquestras, e foram elas

também, que conferiram ao jazz, no início, maior notoriedade.

Este jazz é às vezes considerado menos expressivo do que o dos negros,

porém, tecnicamente mais bem trabalhado.

4 Música “Pappy’s B Flat Bues”. Autor não informado. Interpretado por “New Orleans jazz band” do CD “Wild man Blues”. 5 Música: “One-Step” de “Dixie Jass Band” do CD “The Original Dixieland Jazz Band”.

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As melodias eram menos rebuscadas, as harmonias mais ‘limpas’ e a sonoridade menos original. Ouvia-se menos aqueles sons estridentes, assim como o vibrato constante ou um tanto glissandi. Quando esses elementos apareciam na execução, eram usados mais como artifício interpretativo – portanto, conscientemente. (BERENDT, 1987, p. 24).

No entanto, com o tempo, as orquestras de brancos passaram a contar com

músicos negros e vice-versa e, assim, a barreira existente entre os dois tipos de

música foi se dissolvendo.

1920 – Chicago (ex. faixa nº 4)6 : Com a entrada dos EUA na primeira Guerra

Mundial, Nova Orleans se transformou num porto de guerra, e “Storyville” foi fechada

por decreto oficial.

Com isso, centenas de músicos ficaram desempregados e, em busca de

trabalho, se transferiram para outras cidades, sobretudo para Chicago.

Em torno dos grandes músicos e cantores de jazz, se formava em “Southside”

(bairro negro de Chicago) uma vida musical muito intensa, e como conseqüência

dessa intensa atividade musical, desenvolveu-se aquilo que passou a ser chamado

de “estilo Chicago”.

Músicos amadores e jovens estudantes brancos se entusiasmavam tanto com

aquela música vinda de New Orleans, que tentavam imitá-la a todo custo. No

entanto, a imitação não era perfeita, e a complicada estrutura contrapontística foi

abrandada. Assim, a melodia fluía mais tranqüilamente e quando sobreposta, era

feita de maneira mais simples e “clara”, sobressaindo com isso, o toque individual. É

a partir daí que o solo instrumental passa a ganhar maior importância. O instrumento

também vai adquirindo importância especial, e o saxofone ganha notoriedade após o

período “pianístico” do ragtime.

6 Música: “Black Bottom Stomp” de Jelly Roll Morton (nasc. 1890) do CD “Jazz of the 1920’s Greatest Hits”.

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1930 – Swing (ex. faixa nº 5)7 : Até o fim da década de 20, tudo que foi feito,

era chamado de “Two Beat Jazz” (beat – batida, tempo forte), portanto, o compasso

do “two beat jazz” se compõe de duas batidas fortes.

No entanto, no fim dos anos 20, esse esquema rítmico parecia esgotado,

criando-se no Harlem e, sobretudo em Kansas City, por volta de 1928/1929, um

novo toque, formando-se assim, a segunda caravana de música e músicos da

história do jazz, desta vez de Chicago para Nova Iorque, onde surgiria o “swing”.

Costumou-se chamar esse novo toque, o “swing”, de “Four beat jazz”, relacionando-

o com o “Two beat jazz”, pois os quatro tempos do compasso passam a levar uma

batida regular, em que o segundo e o quarto tempo são levemente mais acentuados.

Nesta época, desenvolveram-se dois pólos opostos: a formação de grandes

conjuntos, as “big bands”, e a valorização do toque individual, ou seja, construiu-se

uma música cada vez mais coletiva e cada vez mais individual. Muitas vezes

combinavam-se as duas tendências, a grande-orquestral e a solista, como o pistão

de Luis Armstrong que “tinha uma plasticidade toda especial quando acompanhado

pela orquestra” (BERENDT, 1987, p. 29)

O “swing” acabou tornando-se uma palavra-chave para o jazz, pois, além de

seu significado estilístico, que identifica a música dos anos 30, ela quer dizer

também balanço, bossa.

• Jazz Moderno

1940 – “bebop” (faixa nº 6)8: No fim dos anos 30, o “swing” transformara-se

no maior sucesso comercial de todos os tempos, a própria palavra “swing” passou a

ser usada como etiqueta-símbolo de sucesso, aplicada em propagandas dos mais

diversos produtos, passando, esta música, a adquirir um caráter bastante comercial

e com dezenas de clichês bem previsíveis, o que tendia a frear a evolução constante

do jazz.

Para que algo novo acontecesse, foi preciso que instrumentistas se juntassem

novamente, em pequenos locais, após os shows de trabalho, para formar novos 7 Música: “Swing, Brother, Swing” de Count Basie (nasc. 1904) interpretado por Billie Holiday (nasc, 1915). No CD “The Best of Billie Holiday. 8 Música: “Donna Lee”, de Charlie Parker (nasc. 1920), interpretado por Charlie Parker. (CD não informado).

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grupos, tocar e improvisar uma música que escapasse àqueles padrões

estereotipados, nas chamadas “jam session”9. Isso aconteceu em Kansas City, e em

alguns pontos de encontros de músicos no Harlem, especialmente em um lugar

chamado “Minto’s Playhouse”, surgindo assim, uma música que “se caracterizava

por sua incrível flexibilidade e a sua condução melódica extremamente nervosa, com

frases tão ágeis que pareciam apenas fragmentos” (BERENDT, 1987, p. 31). Esta

música marcou o início do Jazz Moderno.

Os músicos jovens incluiam harmonias audaciosas e duplicavam os ritmos,

como por exemplo, tocar em 8/4 quando o tema estava em 4/4. O intervalo de quinta

diminuta se tornou o intervalo melódico mais importante e característico do “bebop”,

surgindo daí, deste intervalo, a palavra que nomeia o estilo (“bebop”), devido a

onomatopéia que os músicos faziam ao cantarem este intervalo (inicialmente

“rebop”), assim como se utiliza “la rá lá lá” para vocalizar uma canção sem texto.

Neste estilo, inclusive, nasceu uma escala característica, a “escala “bebop””,

que se caracteriza por ter uma nota a mais, nas quatro escalas mais utilizadas:

Escala utilizada no acorde de dominante (esta escala normalmente é tocada

numa intenção descendente):

Escala utilizada no acorde maior:

Escala utilizada no acorde menor:

9 Significa tocar sem saber o que vem à frente, de improvisação. Essa prática também é conhecida no Brasil como "dar uma canja".A origem do termo é controversa. Pode vir do inglês “jam” que significa geléia, em alusão à mistura de estilos que esta prática proporciona. Alguns também acreditam que vem das inicias da expressão “Jazz after midnight” - Jazz depois da meia-noite, pois a maior parte destas sessões acontecem bem tarde, quando o público pagante já se retirou. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Jam).

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Escala utilizada no acorde meio-diminuto:

O “bebop” teve como mais importantes músicos, o pianista Thelonius Monk, o

guitarrista Charlie Cristian, o pistonista, Dizzy Gillespie e o sax-alto Charlie Parker,

que é considerado a personalidade genial do jazz moderno.

Em seu início, esta música foi fortemente contestada pelo grande público,

pelos músicos mais velhos e pelos aficionados pelo jazz tradicional, “no início do

‘bebop’, muitos ouvintes e críticos a ele se referiam como o ‘fim do jazz’ ou o ‘fim da

música’” (BERENDT, 1987, p. 32)

1950 – Cool, Hard bop (ex. faixas nº 7 e 8)10: Na década de 50, o jazz sofreu

um momento de tensão, em que tendia entre duas vertentes: uma tendência

classicista, e uma tendência que era liderada por músicos jovens, em sua maioria,

negros, que faziam um “bebop” mais avançado.

O estilo mais classicista, foi chamado de Cool Jazz (jazz calmo; tranqüilo),

sendo os seus precursores, o jovem trompetista de 18 anos, Miles Davis, os

pianistas John Lewis e Tadd Dameron.

Essa música tinha um clima diferente, que entrava em contradição ao nervoso

e agitado “bebop”. Era uma música aparentemente mais tranqüila e meditativa, com

conduções melódicas longas e lineares. Muitas vezes, era vista como uma música

fria, intelectual e sem emoção, devido ao seu ar mais introspectivo e contido. No

entanto influenciou bastante o jazz moderno e músicos atuais, como por exemplo, o

músico e produtor Quincy Jones.

10 Cool - Música: “Summertime” (nasc. 1898) de George Gershwin, interpretada de forma “cool” por Miles Davis (nasc. 1926), em o CD “Porgy and Bess” (1958). Hard bop – Música: “Ah So!” de Horace Silver (nasc. 1928), interpretado por Horace Silver Quintet, (CD não informado).

Page 16: Jazz Amazônico - Conjecturas

21

O outro pólo da música desta época, que ficou conhecido como “Hard Bop”,

se caracterizava por ser um “bebop” mais evoluído, com harmonias mais avançadas

e com instrumentistas que revelavam um domínio técnico extremamente apurado,

tendo como um dos principais representantes, o sax-tenorista John Coltrane em sua

fase inicial.

1960 – Free Jazz (faixa nº 9)11: No início dos anos 60, passou a ocorrer no

jazz, o mesmo fenômeno que ocorrera na música de concerto européia, 50 anos

antes, que foi a entrada no campo da atonalidade12, resultando em uma música

duramente agressiva, coberta de grande paixão. Muitas vezes, essa grande paixão,

em parte, tornava-se extra-musical, pois estava também, diretamente ligada à

espiritualidade do músico.

O jazz passou a incorporar, inclusive, o ruído como parte do som musical. No

entanto, essa concepção de atonalidade no jazz, é diferente da conhecida na música

européia de concerto, pois era uma música completamente espontânea e não-

acadêmica.

O processo de distanciamento do sistema tonal, o que era o lado mais

europeu do jazz, favoreceu a sua abertura a outros tipos de música e culturas

internacionais, consideradas exóticas.

Sabemos que o jazz nasceu do encontro do negro com o branco, e a maior

parte da contribuição branca, era a tradição musical européia, representados

especialmente na organização harmônica do jazz tradicional, e na parte rítmica, que

se assentava em dois elementos básicos: o “metro” - “pulsação, espécie de pilares

situados em distância iguais e regulares, sobre os quais se formam as diversas

fórmulas rítmicas” (Berendt, 1987, p. 38) e o “beat” – fórmulas rítmicas apoiadas na

regularidade do “metro”. Porém, ao afastar-se do tonalismo, o músico de jazz

passou a substituir os elementos básicos deste seu “pólo branco”, por elementos

folclóricos de culturas extra-européias: hindu, japonesa e particularmente, árabe.

11 Música: “Of What” autoria e interpretação de Cecil Taylor (nasc. 1929). CD não informado. 12 Significa ausência de tonalidade. A música atonal evita qualquer tonalidade ou modo, fazendo livre uso de todas as 12 notas da escala cromática. A atonalidade tornou-se a própria essência do estilo dos compositores expressionistas.

Page 17: Jazz Amazônico - Conjecturas

22

Berendt chega a afirmar que “Os músicos do novo jazz transformaram a música do

mundo em swing” (BERENDT, 1987, p. , 41).

À medida que o free jazz tomava forma, os elementos rítmicos também foram

se desintegrando. Com o tempo, os pontos de apoio rítmicos foram desaparecendo,

passando, as estruturas rítmicas, a ser autônomas, não raro se contraponteando e

assim, destruindo qualquer idéia de seqüência ou desenvolvimento rítmico linear.

No fim da década de 60, os músicos de jazz, passaram a também atuar com

os mais representativos músicos das culturas exóticas, como da índia, Bali, Japão,

do flamenco espanhol e inclusive, do Brasil.

1970 – “fusion” (faixa nº 10)13: Os anos 70 não marcam o aparecimento de

um estilo revolucionário, trata-se de um estilo que se desenvolve, organicamente, a

partir do anterior, em que caminha num sentido de abrandamento do “free jazz”.

Esta música é conhecida muitas vezes como “electric jazz”, “jazz-rock” ou

“fusion”, sendo uma mistura entre o jazz e o rock, em que a influência do rock sobre

o jazz, destaca-se principalmente, em três setores: na eletronização do instrumental,

no setor rítmico e no tratamento do solo.

Na eletronização, os músicos passaram a utilizar, além de instrumentos como

piano elétrico e guitarra, instrumentos e equipamentos mais diferentes na época,

como guitarras eletrônicas de dois braços, diversos tipos de sintetizadores,

destorcedores de som em geral, harmonizadores automáticos de melodia (tais como

“Varitone” e “Multivider”) entre outros. No setor rítmico, houve um abrandamento do

que se praticava no “free jazz”, devido ao fato de que o rock se baseava em modelos

rítmicos muito simples e com pouca variação. No tratamento do solo, houve uma

tendência de coletividade, em que todos solavam ao mesmo tempo não havendo,

portanto, uma base rítmica e harmônica que acompanhasse o solista.

• Jazz Pós-Moderno (faixa nº 11)14

13 Música: “Between Nothingness & Eternity” do grupo Mahavishnu Orchestra (criado em 1971) em o CD “A classic Jazz-Rock Album”. 14 Música: “Mugshot” de Russell Malone. (CD não informado).

Page 18: Jazz Amazônico - Conjecturas

23

A partir dos anos 80, enquanto o “fusion” parecia dominar o mercado, outros

estilos desenvolviam-se. Chega-se a falar em uma crise no jazz, pois cada vez

mais rápido, vem assumindo novas formas, encontrando novas soluções,

cedendo lugar a uma multiplicidade de novas formações e influências. Há os que

começaram a tomar emprestado da música clássica do século XX, bem como da

música africana e de outras formas da música internacional, elementos

composicionais mais sofisticados do que a forma “tema-solos-tema”.

Outros rejeitam a complexidade e as dissonâncias do jazz moderno e

preferem tocar um estilo muito mais simples. No outro extremo estão músicos que

se engajaram numa frenética forma de livre improvisação às vezes chamada

"energy music".

Tais desenvolvimentos do jazz ocorreram mais acentuadamente, a partir do

momento que o jazz ultrapassou a barreira dos EUA.

Nem todos os desenvolvimentos do jazz ocorreram nos Estados Unidos. Muitos músicos europeus estenderam algumas das idéias do free jazz de Ornette Coleman e Cecil Taylor, e dispensaram ainda mais as formas tradicionais. Outros se voltaram a uma música mais introspectiva. (SABATELLA, 2006 no site http://www.jazzbossa.com)

Fazendo-se presente nos mais diversos lugares do mundo.

A lista desta verdadeira internacional do jazz seria interminável, incluindo ainda o Japão (grande centro de jazz atualmente), a Índia (com seu famoso festival, o Jazz Yatra) e os países do bloco soviético (autêntico celeiro de virtuoses). (MUGGIATI, 1999, p. 110)

Ou seja, a tendência da atualidade é que coexistam as diversas formas e

estilos de jazz, tanto os estilos novos, quantos os antigos. Dentre estes meios,

encontramos também o “latin jazz”, “Third Stream”, “West Coast”, “Acid Jazz”,

“Smooth Jazz”, “Jazz Brasileiro”, etc.

Page 19: Jazz Amazônico - Conjecturas

24

O jazz chegou aos dias atuais como uma forma de música em que todos os

elementos característicos, no decorrer de sua evolução, sofreram um processo de

diluição e integração, formando um novo bloco sonoro:

Nota-se no jazz de hoje a assimilação da estrutura e das características atonais do free jazz, assim como a presença de elementos do jazz tradicional, da música européia de vanguarda, de música e culturas exóticas, do romantismo europeu, do blues e do rock. (BERENDT, 1987, p. 46).

Sem contar com aqueles estilos que não receberam, ou recebem,

denominação, visto muitos jazzistas modernos se rebelarem contra os rótulos.

Alguns não gostam sequer de ver seu trabalho catalogado como jazz ou qualquer

outra coisa: “As possibilidades são tão amplas – argumentam – que o termo mais

adequado para o que fazem talvez fosse o de ‘música improvisada

contemporânea’” (MUGGITATI, 1999, p. 110, grifo nosso).

Mas, como reconhecer o jazz na atualidade se a tendência é que, cada vez

mais, em sua evolução, ele vá se mesclando, absorvendo grande parte da cultura

musical em que se aproxima?

Muggiati partilha da mesma interrogação: “E onde fica o jazz em tudo isso?

O que existe, por exemplo, entre a improvisação coletiva dos pioneiros de Nova

Orleans e o forró progressivo de Hermeto Pascoal, nascido em Lagoa Canoa, nas

Alagoas?” (idem). E nos dá uma “luz”:

Na verdade, muito mais do que a gente imagina. E esta é a chave da impressionante perenidade do jazz [ou música improvisada]: sua capacidade de tudo absorver, sem deixar de ser fiel à sua essência” (idem).

Vono (1989, p. 152), também afirma:

Page 20: Jazz Amazônico - Conjecturas

25

O jazz tem a peculiaridade de absorver inovações sem alterar suas características fundamentais e perder suas raízes. Um verdadeiro instrumentista de jazz pode tomar emprestado qualquer elemento estético sonoro que desejar, sem que sua música deixe de ser jazz.

Portanto, podemos afirmar que há elementos no jazz que, em parte

considerável de sua trajetória, esteve e continua presente, o que nos possibilita

reconhecê-lo em suas diversas facetas.

Tais elementos serão analisados e discutidos no tópico a seguir:

1.3 ELEMENTOS DO JAZZ

Existem no jazz, diversos elementos que o caracterizam, no entanto, três

deles são fundamentais e os mais importantes para o definirem: a Improvisação, o

Swingue e a sua Sonoridade e Fraseado:

O jazz se diferencia da música européia [ocidental], pelos três seguintes elementos básicos:

1) Através de uma relação especial com o sentido de tempo, caracterizado em parte pelo conceito de swingue;

2) pela espontaneidade e vitalidade de sua criação e execução instrumental e vocal, onde a improvisação ocupa um papel de extrema importância;

3) pela sua sonoridade e seu fraseado, onde se espelham as características e a contribuição individual do intérprete.

Esses três elementos atuam na intimidade do jazz e o transformam contínua e organicamente. (BERENDT, 1987, p. 150)

Análise dos elementos diferenciais:

• Improvisação

O conceito de improvisação é algo bem simples e amplo, caracterizando-se

por acontecer em tempo real, no momento da execução, uma espécie de

composição ou variação em cima de uma base que serve como guia, podendo ser

uma progressão harmônica, uma tonalidade ou intervalos melódicos.

Page 21: Jazz Amazônico - Conjecturas

26

A improvisação não é uma invenção moderna, é realizada no jazz da mesma

maneira que os músicos e compositores ditos “de concerto” ou “eruditos” já faziam

há séculos atrás, como por exemplo, Bach e seus filhos que, ao tocarem uma

chacona ou ária, realizavam inúmeras variações em torno do esquema harmônico

e, quando tocavam uma melodia, ela era ornamentada da primeira à última nota.

Esta técnica de ornamentação, tão praticada no barroco, é também muito utilizada

pelo músico de jazz.

Os acordes e a forma das músicas servem como esqueleto para a

improvisação do instrumentista do jazz, bem como o baixo-cifrado15, o “organum16”

e o “cantus firmus17”, eram utilizados pelos compositores “eruditos”.

No entanto, sabe-se que na música de concerto, esta prática foi se

perdendo. Do fim do século XIX pra cá, esta tradição praticamente desapareceu na

chamada “música erudita” em conseqüência, inicialmente, de uma atitude anti-

romântica, que gerou o fantasma da “rigidez interpretativa”, da “fidelidade ao texto

original”. Berendt (1987, p. 116) afirma:

Este pretenso “rigor interpretativo” é absolutamente falso, pois Haendel ou Vivaldi, quando escreviam suas sonatas e concertos, apenas notavam na partitura as notas básicas da obra, em torno da qual o solista improvisava, acrescentando um sem-número de ornamentos e fiorituras.

No jazz, esta tradição do improviso foi reavivada com bastante êxito, tanto

que se tornou um de seus elementos básicos mais caracterizantes e necessários:

“A improvisação é a própria alma do jazz” (SCHÜLLER, 1968, p. 80).

Toda improvisação jazzística é baseada num tema (com exceção do “free” e

do jazz dos anos 70). As formas mais comuns são: “Forma-canção” - esquema “A A

B A” com 32 compassos (tema inicial, repetição, segundo tema e volta do tema

15 Mesmo que baixo contínuo - Uma linha melódica grave, com cifras acima ou abaixo das notas, indicando as harmonias que seriam completadas pelo talento do executante do contínuo. Esteve muito em voga durante os Séculos XVII e XVIII. 16 Designação que se deu à primeira tentativa de polifonia, realizada a duas vozes, soando em 4ªs e 5ªs paralelas. 17 Melodia fixa, de valores regulares, sobre a qual se desenvolvem várias linhas melódicas.

Page 22: Jazz Amazônico - Conjecturas

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inicial – cada parte com 8 compassos) e a “forma blues” (12 compassos cantados,

divididos em 3 estrofes de 4 compassos, intercalados por um solo instrumental).

Apesar de serem as mais comuns, há muitas outras formas utilizadas, em

especial, no jazz produzido na atualidade.

A maneira mais antiga de se improvisar no jazz, é exatamente a

ornamentação da melodia. Mais recentemente, surgiu a maneira de improvisar,

orientada pelo “chorus”18, em que o improviso praticamente não tem nada a ver

com a melodia original, completamente livre, ligando-se apenas ao esquema

harmônico.

Muitas vezes um improviso em uma música, fica até mais conhecido que a

própria melodia tema desta música.

As ligações da melodia improvisada com a harmonia se dão de diversas

maneiras: Uma delas, a mais básica, é improvisar utilizando as notas da tonalidade

da música. No entanto, como em jazz há muitas modulações (mudanças de

tonalidades) em uma mesma música, é necessário que o músico esteja atento a

essas mudanças, acompanhando os novos campos harmônicos surgidos. Muitas

vezes, o músico que faz a base, como forma de brincadeira ou desafio, utiliza

algumas inversões ou omite certas notas dentro um acorde (chamados de

"fragmentos de acordes"), com o intuito de confundir e dificultar para o músico

solista.

Outra forma de improviso, é compor a melodia com as notas de cada acorde

tocado, ou da escala deste acorde, dependendo de sua função. Por exemplo: em

cima de uma acorde de Fm7 (fá menor com sétima) podem ser utilizadas as notas

do próprio acorde (fá, láb, dó e mib), arranjadas da maneira que convir para o

músico ou, se exercer uma função de tônica, poderão ser tocadas qualquer nota da

escala de fá menor (fá, sol, láb, sib, dó, réb e mib) mas, se exercer função de

subdominante, então serão tocadas qualquer nota da escala deste acorde, no

modo dórico (fá, sol, láb, sib, dó, ré e mib).

Outra forma de se improvisar é sobrepondo acordes, como por exemplo,

utilizar em cima de um acorde de D (ré maior), o acorde de E (mi maior), o

18 A palavra “chorus”, em se tratando de arranjo, significa a extensão da música tocada uma única vez, do início ao fim.

Page 23: Jazz Amazônico - Conjecturas

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resultado será que o músico irá tocar as chamadas "extensões" do acorde base

(estrutura): ré, fá#, lá – extensões (superestrutura): mi (nona), sol# (décima primeira

aumentada) e si (décima terceira ou sexta, dependendo da indicação da sétima do

acorde base).

As tríades sobrepostas podem ser maiores, menores ou diminutas, sempre

dependendo da função do acorde base, e estar, em relação a este acorde, na

distância de segundas (como no exemplo), terças ou quartas. Podendo também,

utilizar pentatônicas a partir das notas de tensão, enfim.

Outras técnicas são utilizar recursos como, apojatura, retardo, "approach"

(aproximação cromática) improvisação "in-outside" - dentro e fora (em um jogo de

tensionar e relaxar a melodia na harmonia), etc.

Enfim, cada músico, após diversas experimentações, passa a criar sua

própria linguagem ao improvisar, que se dá pela escolha das escalas usadas

(modais ou não) em cima da harmonia escolhida, pela forma utilizada e pelos graus

e intervalos priorizados.

Page 24: Jazz Amazônico - Conjecturas

29

• Ritmo, swingue

A maior revolução do jazz foi no âmbito rítmico e em sua sonoridade,

diferente do que muitos acreditam, ser na parte harmônica. “A contribuição

revolucionária do jazz à música do nosso século se deu através do ritmo e da

sonoridade” (BERENDT, 1987, p. 135). “O ritmo e a inflexão são os elementos que

mais obviamente distinguem o jazz do restante da música ocidental”. (SCHÜLLER,

1968, p. 20).

Nas execuções em grupo, os diferentes instrumentos exercem diferentes

funções, formando o “grupo melódico" e o "grupo rítmico-harmônico". No grupo

melódico, em geral, encontram-se os instrumentos de sopro, que tocam as

melodias. No grupo “rítmico-harmônico”, encontramos o baixo, a bateria, o piano e a

guitarra (estes dois últimos, quando estão fazendo solo, atuam no primeiro grupo).

Neste grupo, as diferentes faixas rítmicas se contraponteiam, mas sempre se

orientam por um movimento regular básico, chamado "beat" - uma batida ou célula

rítmica básica. O “beat” no jazz, nasceu da fusão do sentido rítmico africano com a

concepção de metro e associação em compassos da música européia.

Nos diversos estilos do jazz, predominaram células rítmicas básicas que os

assinalavam. Nos estilos New Orleans, dixieland, Chicago e swing, essas células

eram caracterizadas pelas inflexões do bombo. Já no “bebop” e no cool jazz, pelo

prato.

No estilo New Orleans e no ragtime, como na marcha, as acentuações

rítmicas caem nos tempos 1 e 3, tempos fortes do compasso, como mostra o

exemplo19 a seguir:

19 Nos exemplos rítmicos mostrados, cada pentagrama reproduz apenas de maneira simplificada as figuras rítmicas básicas de cada estilo, executadas pela bateria. As notas com haste para baixo representam a figura rítmica do bombo (ou bumbo); as notas representadas com um “x”, com haste para cima, no terceiro espaço do pentagrama, representam a figura rítmica da caixa; as notas representadas com “x”, no primeiro espaço suplementar superior, são executadas no prato. O símbolo “>” marca as acentuações rítmicas do compasso.

Page 25: Jazz Amazônico - Conjecturas

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A partir do dixieland e do Chicago, embora os tempos 1 e 3 continuem sendo

os tempos fortes, o baterista passa a acentuar os tempos 2 e 4, assim, se sentem

as batidas 1 e 3 mas se ouvem as batidas 2 e 4:

No swing, o baterista marca com o bombo regularmente os quatro tempos do

compasso e, com as baquetas, acentua o segundo e o quarto tempo:

No “bebop” o prato é constantemente tocado, com ou sem acento, porém,

com os outros acessórios da bateria, sobretudo com o bombo, o executante realiza

figuras rítmicas não simétricas:

O “bop” foi o primeiro acontecimento rítmico importante no jazz, pois, em sua

estrutura, resumia todo o balanço do jazz tradicional, mas, abria a porta, devido os

seus ritmos cruzados, para uma nova concepção contrapontística, permitindo uma

complexidade rítmica que os próprios músicos estranhavam no início, como conta

Miles Davis (apud BERENDT, 1987, p. 145):

Nós tocávamos, certa vez, um blues; no décimo primeiro compasso, ‘Bird’ (Charlie Parker) começava a improvisar. A seção rítmica permanecia tocando da mesma maneira e, de repente, os ritmos pareciam defasados, ou seja, como se o acento estivesse no 1 e 3 e não no 2 e 4. Quando isso acontecia, Max Roach gritava ao pianista para não ir atrás de ‘Bird’ mas continuar como estava tocando, pois exatamente esse contraponto de acentuações é o que queríamos conseguir. Nós queríamos era virar o

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ritmo de cabeça para baixo. Quantas vezes nós deixamos, na época, o ouvinte confuso por causa desse efeito.

O cool jazz não foi tão adiante em relação ao “bebop”, sendo um misto de

swing e bop.

No free jazz, a célula rítmica básica desapareceu, não havendo mais

agrupamentos que se repetem regularmente, sendo que “cada célula rítmica

executada é independente e sob ela flui uma nervosa e rápida pulsação (...) essa

pulsação penas unifica o contraponto geral – rítmico ou melódico -, mas não tem

característica própria – não é um ‘beat’” (BERENDT, 1987 p. 144).

Quanto ao swingue, é comum encontrarmos nos livros didáticos sobre jazz,

ou partituras de músicas jazzistas, a seguinte indicação: "tocar com swing" ou

"colcheias swingadas", significando que duas colcheias deverão ser tocadas como

uma tercina, ligando os dois primeiros tempos. No entanto, o swingue é observado

no jazz, de uma forma muito mais ampla, como algo que engloba o ritmo, o

fraseado, o ataque das notas, enfim, algo além do que está ou pode ser escrito na

partitura.

José Duarte (2006) (na coleção Lat’s Jazz no site http://www.publico.clix.pt)

diz: "Esta é a dialética do swing, por assim dizer: dar flexibilidade a um ritmo, dar

‘balanço’ a uma frase, e contudo, manter a precisão, preservar o foco da música,

evitando que ela perca o caráter incisivo".

Para André Francis (apud DUARTE, 2006) "tocar com swing, swingar,

significa trazer à execução de uma peça certo estado rítmico que determine a

sobreposição de uma tensão e de um relaxamento.”

Portanto, o swingue é uma forma de execução em que a duração das notas é

ligeiramente reduzida ou prolongada, com o ataque fora do tempo, o que resulta em

um significativo aumento da flexibilidade e vitalidade da música.

Já para o baixista Charles Mingus (apud DUARTE, 2006), em sua

autobiografia, "Saindo da sarjeta", explica o swingue da seguinte forma:

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32

Vamos partir de uma música, na qual os tempos estão precisamente definidos. Em seguida delimitar um "halo"20, uma pequena região ao redor da posição original de cada nota: a nota, agora, pode cair em qualquer ponto dessa região, a critério do executante. A música como um todo, portanto, oscila caprichosamente dentro dessas regiões de “incerteza”. É importante que o âmbito dessas pequenas regiões não ultrapasse aquele ponto no qual o ritmo deixa de ser “swingado” para se tornar impreciso. Como se determina esse ponto? Os bons músicos de jazz têm uma intuição desenvolvida a tal ponto que mantêm esse jogo de precisão e imprecisão perfeitamente sob controle, o tempo todo - e o resultado, todos nós conhecemos: o deleite de escutar uma interpretação cheia de swing.

• Sonoridade e fraseado

A sonoridade e o fraseado do jazz formam quase um só complexo. A

sonoridade se refere à forma que o músico utiliza seu instrumento, como toca, sopra

ou canta, e o jazz possui sua sonoridade própria. “O jazz emprega cores

instrumentais e vocais próprias” (HOBSBAWM, 2004, p. 43). Essas “cores do jazz”

surgem pela técnica peculiar e não convencional em que os instrumentos são

tocados. Tais características desenvolveram-se pelo fato de os primeiros músicos

de jazz serem totalmente autodidatas.

Com o tempo as peculiaridades sonoras foram se tornando menos

acentuadas, sendo mais característica no jazz tradicional.

Com o tempo, a sonoridade do jazz assimilou técnicas de execução atuais e passou a operar com instrumentos modernos, se aproximando, assim, da sonoridade da música de concerto européia de hoje. (BERENDT, 1987, p. 151).

Porém, ainda notam-se peculiaridades, pois os músicos sempre buscam formas

novas de tocar ou de usufruir seus instrumentos, não havendo, portanto, formas

ilegítimas de utilizá-los.

20 1 - Uma atmosfera ou qualidade de glória, majestade, santidade. (http://romulo-gnomo.zip.net). 2 - do Lat. halos < Gr. Halos: disco; círculo luminoso que se observa às vezes no disco do Sol e dos planetas; auréola. (http://www.priberam.pt/dlpo/definir_resultados.aspx)

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Os músicos de jazz são ainda grandes experimentadores, explorando até as últimas conseqüências os recursos técnicos de seus instrumentos, tentando, por exemplo, tocar trompete com a flexibilidade de um instrumento de madeira, ou trombone com registro de trompete. (HOBSBAWM, 2004, p. 44).

Tendo inclusive ampliado as possibilidades técnicas de diversos instrumentos.

Nem os classicistas mais ferrenhos irão negar que o jazz ampliou grandemente as possibilidades técnicas de todos os instrumentos que usou, com exceção dos pequenos instrumentos de cordas. (...) Portanto, desejamos considerar o jazz (...) como uma música que tem, em si mesma, realizações. (idem, p. 148).

Além da forma de tocar os instrumentos, um outro ponto igualmente

importante, que confere a sonoridade característica do jazz, é o uso sistemático de

determinadas estruturas verticais. Como já mostrado anteriormente, diferente do

que muitos acreditam, harmonicamente o jazz não revolucionou tanto assim, ou

seja, as estruturas harmônicas, com exceção da escala blues, que o jazz utiliza já

eram utilizadas em outros gêneros e formas de fazer música, em especial na música

de concerto.

No contexto da sonoridade, é importante abrir um parêntese para falar mais

profundamente sobre a harmonia.

Segundo Berendt (1987), como já dito, a harmonia do jazz não apresentou

algo revolucionário, com exceção do free jazz, pois os padrões existentes nesta

harmonia já eram conhecidos nos domínio da música de concerto moderna. As

únicas características harmônicas realmente particulares do jazz são as “blues

notes”. O que ocorre é que, algumas alterações de acordes, empregadas pelos

músicos jazzistas, nem sempre eram comuns nas músicas de concerto.

Às vezes, a harmonia era caracterizada pelo baixo, mas ao longo da extensão do acorde, havia nas notas mais agudas, tantas notas alteradas (dissonantes), que quase causavam a impressão de diferentes harmonias superpostas. (BERENDT, 1987, p. 135, 136.)

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Muito utilizada também é a chamada “harmonia quartal”(que também não

‘nasceu’ no jazz, mas faz parte de sua sonoridade característica), em que os

músicos formam seus acordes em intervalos de quartas (justas ou aumentadas),

resultando em uma sonoridade diferente da “harmonia triádica” (acordes formados

por intervalos de terças sobrepostas). Podemos dizer que o que caracteriza a

sonoridade da harmonia no jazz é a sofisticação utilizada, tanto em passagens

tensas como suaves, que se dá pelo uso e formas de utilização das extensões, e

também pela forma que os músicos armam as estruturas verticais, ou seja, as

relações intervalares que acontecem na formação de acordes, além das prioridades

ou omissões de notas, substituições de acordes ou notas do acorde, etc.

Um exemplo de um grande músico, que teve sua sonoridade bem marcante,

não pela harmonia utilizada, mas pela forma de construir os acordes, é o pianista

Bill Evans, que foi um dos pioneiros na instauração de formas de acordes,

conhecidas como “forma A” e “forma B21”, que acabaram tornando-se modelo e

referência para os grandes pianistas tanto do jazz quanto da música popular em

geral.

A principal característica da harmonia em Evans, está no uso de “voicing” variados, complexos e originais, demonstrando grande imaginação e versatilidade. Os “voincings” de três e quatro notas acabaram tornando-se parte integrante do vocabulário jazzístico. (GIMENES, 2003, p. 33).

Porém, existem pontos na evolução harmônica do jazz que se deram

paralelamente à música de concerto européia, embora acontecessem mais

atrasados - sem um estudo acadêmico por parte dos músicos - elas ocorreram pela

própria prática e pelo mesmo empirismo e experimentalismo que levou os “eruditos”

às suas soluções.

Em se tratando do fraseado, essa foi a característica que mais se emancipou,

assumindo características próprias.

21 Exemplo da forma A nos acordes menores: b3, 5, b7 e 9, e Forma B: b7, 9, b3 e 5. Nos acordes dominantes: forma A: 3, 6, b7 e 9 , Forma B: b7, 9, 3 e 6.

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O fraseado se dá pelas escolhas das notas que formam as frases numa

música, podendo ser o tema e as melodias que compõem a música e

especialmente, as notas e escalas que formam o improviso.

Como já explicado no item “improviso”, o que caracteriza o fraseado peculiar do

jazz, são as escalas aplicadas em cima da harmonia. Muitas vezes, o músico utiliza

escalas exóticas ou artificiais em cima de uma harmonia tonal, por exemplo. Além

de fazer diversas combinações de arpejos de um tipo de acorde em cima de outro

diferente, ou, assim como há a harmonia quartal, utiliza o fraseado em quartas,

enfim, são diversas as combinação que caracterizam o fraseado peculiar do jazz, e

em especial, do músico que o faz.

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36

CAPÍTULO II. O JAZZ NO BRASIL

Depois de explanado sobre o que viria a ser o jazz, parte-se agora em busca

de maiores informações e compreensões sobre o Jazz no Brasil, para depois, poder

visualizar melhor o jazz no Pará.

Será também observada a história do jazz no Brasil, a similaridade entre a

música brasileira e o jazz norte-americano, o que permite uma aproximação entre

eles, e averiguar os resultados deste contato.

2.1 SIMILARIDADE ENTRE A MÚSICA NEGRA DO BRASIL E A DOS EUA: OS ANTEPASSADOS COINCIDEM

As tentativas de traçar a história do jazz no Brasil foram poucas, portanto sua

trajetória ainda não é conhecida em sua plenitude ou totalidade.

Segundo Carlos Calado , isso se dá devido ao forte caráter xenofóbico22 que

marcou boa parte da crítica musical brasileira ou mesmo pesquisadores durante um

bom tempo:

Ao invés de estudar a fundo essa importante influência [do jazz], optava-se por denunciá-la como nociva e ponto final (...) Assim, com raras exceções, a história da música popular foi escrita através desse crivo xenofóbico e “reacionário” (...) onde o que não harmonizasse com essa estreita visão da cultura era simplesmente desprezado. (CALADO, pp. 221-223).

No entanto, há registros de execuções jazzísticas no Brasil detectados desde

a década de 20, acontecendo ou por transposição direta de temas originais norte-

americanos ou pelas influências nas diversas formas da música popular brasileira.

Mário de Andrade, já percebia tal influência no maxixe: 22 Xenofobia quer dizer aversão a outras raças e culturas. Muitas vezes é característica de um nacionalismo excessivo. A xenofobia é um medo intensivo, descontrolado e desmedido em relação a pessoas ou grupos diferentes, com os quais o indivíduo que apresenta xenofobia habitualmente não entra em contacto.

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37

Os processos do jazz estão se infiltrando no maxixe. Em recorte, infelizmente não sei de que jornal, guardo um samba macumbeiro, “Aruê de Chango” de João da Gente que é documento curioso por isso. E tanto mais curioso que os processos polifônicos e rítmicos de jazz que estão nele não prejudicam em nada o caráter da peça. É um maxixe legítimo. De certo os antepassados coincidem... (ANDRADE, 1962, p. 25, grifo nosso).

E demonstrando um pensamento não simplista em relação à cultura, não via

essas influências como necessariamente prejudiciais:

Está claro que o artista deve selecionar a documentação que vai lhe servir de estudo ou de base. Mas por outro lado não deve cair num exclusivismo reacionário que é pelo menos inútil. A reação contra o que é estrangeiro deve ser feita espertalhonamente pela formação e adaptação dele. Não pela repulsa. (idem, p. 26).

Mas, como a cultura musical de um País estrangeiro pôde adaptar-se tanto,

ao ponto de influenciar boa parte de nossa cultura musical? Descendem da mesma

linhagem!

Mário de Andrade, ao dizer que “os antepassados coincidem”, parece referir-

se às raízes comuns dessas manifestações musicais: as origens negro-africanas de ambas.

Calado (1990, p. 223), afirma:

Indo além da mera análise econômica ou ideológica. Antes mesmo de se caracterizar o maxixe como brasileiro, ou o jazz como norte-americano, não se pode deixar de ter em mente o papel da cultura negra africana na formação de ambos. É natural que, provenientes de origens comuns, essas manifestações musicais possam aproximar-se ou mesmo fundir-se sem chegar a perder sua identidade.

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38

Portanto, é explicável que as manifestações musicais mais características

dos dois países - o samba brasileiro e o jazz norte-americano – tivessem um

processo de desenvolvimento bastante semelhante, ainda que tenham gerado

resultados sonoros diferentes. Até mesmo José Ramos Tinhorão (1966, p. 13), que

defende ferrenhamente o nacionalismo aplicado à música popular brasileira, admite

este pensamento:

A história do samba carioca é, assim, a história da ascensão social contínua de um gênero de música popular urbana, num fenômeno em tudo semelhante ao jazz, nos Estados Unidos. Fixado como gênero musical por compositores de camadas baixas da cidade, a partir de motivos ainda cultivados no fim do século XIX por negros oriundos da zona rural, o samba criado à base de instrumentos de percussão passou ao domínio da classe média.

Calado (1990) vai mais além, e faz uma análise em que encontra

semelhanças, não só no processo de origem e evolução entre o jazz e o samba,

mas também, entre as várias formas que precederam o jazz nos EUA e as várias

formas desenvolvidas no Brasil, que guardam igual relação com o samba, são elas:

• O pregão

Pequenos fragmentos melódicos, onde além de certa liberdade rítmica são

característicos o falsete, o portamento e o vibrato acentuado, utilizados em geral

para anunciar e vender frutas ou outros produtos como sorvetes e doces.

É um exemplo das transposições que o negro africano fazia em que trazia

formas mínimas de expressões que acompanhavam seu trabalho no campo ou

mesmo nas cidades, num misto de fala e canto. Assim como nos EUA, tais formas

acabavam se confundindo ou sendo parte fundamental de cantos de trabalho.

• Vissungos

São cantos de trabalho encontrados no Brasil, de evidente origem africana,

que misturavam palavras africanas e portuguesas (introduzidas de acordo com a

Page 34: Jazz Amazônico - Conjecturas

39

assimilação da nova língua). Essas formas mostravam-se bastante semelhantes às

“Work-songs” desenvolvidas nos EUA.

Nos vissungos, encontravam-se duas formas básicas: O “boiado” – cantado

em solo, apenas pelo mestre da turma de trabalho, sem acompanhamento - e o

“dobrado” – que inclui a resposta em coro da turma, e em alguns casos o som dos

instrumentos utilizados nas atividades, além do traço marcante de “pergunta e

resposta”.

Outra semelhança do vissungo e das “work-songs” é a existência de

mensagens secretas nas entrelinhas de seus versos, com o objetivo de

comunicação entre os negros, de modo que os brancos não pudessem captar.

• Músicas de feitiçaria

São músicas que acompanhavam os rituais de feitiçaria diretamente

introduzidos pelos negros. No Brasil, esses rituais são conhecidos por nomes

diferentes: macumba (Rio de Janeiro); candomblé (Bahia); xangô (Pernambuco,

Paraíba e Alagoas) e outros. A relação desses cultos é bastante estreita com os

praticados pelos negros nos EUA, o chamado “voodoo”, como, por exemplo, seus

elementos e estrutura, que são praticamente idênticos.

Em ambas, música e dança desempenham o mesmo papel, sendo que os

fatores básicos que levam ao transe, à possessão, são os ritmos hipnóticos dos

tambores, tocados de maneira violenta e ininterrupta durante horas, além dos

cantos repetitivos e palmas:

Sem dúvida, a relação de matriz que este ritual [voodoo] transportado para os EUA guarda com o espetáculo jazzístico, por ser a manifestação primeira a unir música, dança, canto, mímica e outras formas de representação cênica, é semelhante à estabelecida entre o candomblé (ou a macumba) e o samba, por exemplo. (CALADO, 1999, p. 228).

• Música Instrumental dos Barbeiros

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Nascida nos centros urbanos do Rio de Janeiro e Salvador, esta modalidade

musical, basicamente instrumental, surgiu a partir do século XVIII. Era feita por

negros libertos que desempenhavam a profissão de barbeiros, o que possibilitava

um bom tempo livre para se dedicarem a outras atividades, dentre elas, a música.

Neste ponto, o caráter da música deixava de ser funcional, passando a

assumir um papel estético.

Esses grupos animavam as festas urbanas, executando um repertório

formado por dobrados, quadrilhas, fandangos, modinhas e lundus, utilizando

instrumentos de sopros na sua formação, tais como o pistão, trompa, enfim. É,

portanto, comparado às “brass-bands” norte-americanas, que mais tarde acabaram

evoluindo para as “jazz-bands”. Esses grupos resultaram nas primeiras formações

de “chorões”.

Depois de um período de contato com instrumentos de origem européia, adaptando-os a sua diferente concepção musical, o negro tanto nos EUA como no Brasil acabou chegando a novas formas que, mesmo ainda marcadas fortemente por suas raízes africanas, já refletiam uma nova situação cultural, caso do jazz e do choro. (CALADO, 1990, p. 231).

• O Lundu e o Maxixe

A partir de 1820, o lundu – forma de canção urbana desenvolvida a partir de

uma dança dramática de origem africana, acompanhada por instrumentos de

percussão – foi bastante utilizado nos entremezes (quadros rápidos com danças ou

músicas nos intervalos de tragédias, dramas ou comédias), encaixando-se com

sucesso.

Da mesma forma, o maxixe – dança de par, com ritmo forte e andamento

rápido, exige de seus participantes extrema agilidade na execução dos passos –

também acabou interessando aos teatros de revista23 na época, tornando-se

popular nos bailes acompanhados pelos chorões ou ainda nas sociedades

carnavalescas.

23 Gênero que mistura teatro com música e dança, e que aborda os principais fatos da época de forma crítica, humorística, despojada e irreverente.

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Tal processo assemelha-se às danças negras precursoras do jazz e formas

musicais que fizeram parte de sua origem, como por exemplo, os “spirituals” que

integraram os espetáculos de “minstrels”, ou o “ragtime” e o estilo “new orleans”,

que foram bastante aproveitados no teatro de revista negro dos EUA.

2.2 INFLUÊNCIAS JAZZÍSTICAS NA MÚSICA BRASILEIRA

Como já dito, há registros de influências do jazz na música brasileira desde a

década de 20 em vários lugares do Brasil, dentre eles:

No Rio de Janeiro e São Paulo,

Não deixa de ser significativo que no ano de 1921, tanto já existiam em São Paulo a “Jazz Manon”, banda que animava bailes (...), como no Rio de Janeiro, também nesse ano, a “Jazz Band do Batalhão Naval” que registrava em disco sua versão do “Home Agen Blues”. Justamente por disporem dos instrumentos de sopro, com os quais tocavam tradicionais dobrados e marchas nas exibições de seu regimento, esses músicos-militares figuram entre os primeiros a se interessarem pelo jazz. (CALADO, 1990, p. 235).

No Rio Grande do Sul,

o Rio Grande do Sul via nascer seu primeiro grupo de jazz, o Espia Só, que inicialmente assumia a forma de um regional, mas em 1926 transforma num “jazz band”, por influência direta de Donga e Pixinguinha. (idem).

E no Nordeste.

Nem mesmo o nordeste escapa a essa novidade: em 1931, é fundada a Jazz Band Acadêmica de Pernambuco, conjunto amador formado por estudantes universitários. (idem).

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Pode-se perceber, portanto, que as primeiras evidências da penetração do

jazz no Brasil surgem no início do século XX simultaneamente em várias regiões do

País.

Mais do que os aspectos musicais, a principal influência exercida nesta

época, e deixando marcas até os dias de hoje, foi no aspecto da formação

instrumental dos grupos brasileiros: o modelo das “Jazz Bands”:

Mais ainda que um novo gênero musical, foi uma nova formação instrumental que se implantou: o jazz band. O modelo para os novos conjuntos vinha do jazz New Orleans e Dixieland: trompete (ou pistão), clarinete e trombone (além do saxofone, às vezes formando a seção solista), mais violino, banjo, piano e bateria (a seção rítmica). (CALADO, 1990, p. 234).

Uma das figuras fundamentais para a evolução do jazz no Brasil, considerado

uma espécie de marco desta influência, foi Pixinguinha.

Pixinguinha passou a absorver tal linguagem em sua música, devido ao

contato com os estilos da música popular norte-americana, quando fez uma turnê,

em 1922, com seu conjunto ”Os oito batutas” em Paris, o que explica, por exemplo,

seu interesse pelo saxofone, que passou a alternar com a flauta, e mais tarde, em

idade mais avançada, tornou-se seu principal instrumento.

Essa influência parece não ter agradado aos nacionalistas daquela época,

como se pode perceber no comentário de Cruz Cordeiro (apud Marília da Silva;

Arthur Filho, 1979, p. 160), sobre sua composição, provavelmente a mais popular e

um dos maiores clássicos da Música Popular Brasileira: “Carinhoso”:

Parece que o nosso popular compositor anda sendo influenciado pelos ritmos e melodias da música de jazz. É o que temos notado, desde algum tempo e mais uma vez, neste seu choro, cuja introdução é um verdadeiro fox-trot e que, no seu decorrer, apresenta combinações de pura música popular yankee. Não nos agradou.

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43

Desde então, as “Jazz Bands” brasileiras foram sendo progressivamente

reforçadas por mais instrumentos de sopro, formando naipes específicos de

saxofones, trompetes e trombones que, somados à seção rítmica, acabaram

evoluindo para as “Big Bands24”, ou grandes orquestras.

Isso ocorreu, em especial, a partir da década de 40, quando as transmissões

radiofônicas norte-americanas divulgaram intensamente o som das bandas de

“swing”, resultando no desenvolvimento de importantes orquestras, como por

exemplo, a Orquestra Tabajara em São Paulo.

É importante ressaltar que o repertório dessas bandas não se resumia a

simplesmente cópia ou transposições da música norte-americana. Além de tocarem

música popular brasileira sob os ritmos e padrões de arranjo do “swing”, também

transformavam clássicos norte-americanos em samba:

O maestro Severino [da orquestra Tabajara], o que faziam também outras orquestras brasileiras, opera uma espécie de antropofagia jazzística: transforma clássicos norte-americanos como “Stardust” ou “Rhapsody in Blue” em samba. Aliás, um procedimento que poderia ter sido valorizado pelos nacionalistas preocupados com a influência nociva do jazz. (Calado, 1990, p. 243).

• A Bossa Nova

Dessas orquestras, muitos solistas destacaram-se, e dentre eles, estavam

muitos dos principais nomes que deram início ao “Jazz Brasileiro”, nos anos 50, que

será tratado mais detalhadamente, adiante.

Neste meio também, estavam aqueles que instauraram as primeiras raízes

do movimento que ficou conhecido como “Bossa Nova”, surgido no final da década

de 50 e início de 60, que se constituiu numa verdadeira revolução em termos não só

da música popular brasileira, como também da determinante instalação do jazz no

País, pois marcou de modo definitivo a fusão de duas fontes musicais que já se

aproximavam há algumas décadas (o samba e o jazz).

24 A formação “standard” (padrão) das “big bands” atualmente é: um quinteto de saxofone (dois altos, dois tenores e um barítono), quatro trompetes e quatro trombones (três tenores e um baixo), além da seção rítmica.

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a Bossa Nova representa (...) a fusão do samba com o jazz ou a apropriação transformadora do modelo cosmopolita pelo periférico, e a conseqüente transformação do ritmo periférico em estilo internacional padrão, teria conferido à Bossa Nova o status da modernidade. (...) Ou seja, um equivalente musical pop de uma determinada face do modernismo brasileiro, na medida em que encarna, musicalmente, o princípio antropofágico oswaldiano da superação das barreiras entre o nacional e o internacional, entre o periférico e o cosmopolita. (QUINTELA, 2004, no site: http://www.inventario.ufba.br/02/d02/02vquintela.htm).

A Bossa Nova foi inicialmente delineada nas músicas de seus precursores, os

violonistas Garoto e Laurindo de Almeida e dos cantores e pianistas Dick Farney e

Johnny Alf, e teve como marco oficial de sua instauração, o lançamento do disco

“Chega de Saudade”, do cantor e violonista João Gilberto, em 1959. Junto a ele,

estavam também, na linha de frente deste movimento, toda uma geração que

apresentava-se como atores principais neste processo. São eles: Antônio Carlos

Jobim, Carlos Lyra, Ronaldo Bôscoli, Roberto Menescal, Baden Powell, Nara Leão,

Oscar Castro Neves, e o paraense Billy Blanco, dentre outros.

Muitos criticam a Bossa Nova, taxando-a de “um movimento alienado” e não

puramente brasileiro, como o crítico Tinhorão, que demonstra tal opinião, até de

forma irônica, na seguinte crítica:

Nós, da nossa parte, não vamos dar opinião [sobre o inventor da bossa-nova]. Para nós, tudo que é bossa nova, seja Johnny Alf ou bud Shank, é americano. Pois eles todos, que são americanos, que se entendam. (TINHORÃO,1998, p. 30).

Tinhorão (1998) acusa a Bossa Nova de acabar com a autenticidade ou

jazzificar o samba. Inclusive, um dos participantes da Bossa Nova, Carlos Lyra,

representante da vertente mais nacionalista do movimento, demonstra ainda, uma

espécie de confusão em sua música, com uma atitude muitas vezes ambígua e

contraditória, como por exemplo, ao compor a música “Influência do Jazz25”, em

25 Pobre samba meu/Foi se misturando, se modernizando e se perdeu/ E o rebolado, cadê? Não tem mais!/Cadê o tal gingado que mexe com a gente?/Coitado do meu samba mudou de repente/Influência do jazz... (parte da letra “influência do jazz” de Carlos Lyra)

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45

1963, critica a influência jazzística na música brasileira, quando ele mesmo se vale

de tal influência, estando entre os principais nomes e líderes da Bossa Nova.

No entanto, é preciso definitivamente compreender que a Bossa Nova não foi

um processo que se deu “à custa da morte” do Samba. A Bossa Nova significa o

nascimento de um novo gênero musical, que surgiu, como já dito, pela influência

destes dois estilos: jazz e samba. Sendo que nenhum deles, por causa disso,

deixou de existir. Ainda vivem, seguindo seu caminho, como um gênero musical em

si, e no caso do samba, coexistindo com a bossa nova e com todos os outros

gêneros da música popular brasileira, nos carnavais, nas escolas de samba, nos

terreiros, seja onde for, e em suas diversas formas evolutivas, rurais e urbanas26.

Em um depoimento para José Eduardo Homem de Mello, Ronaldo Bôscoli

diz:

Acho que a formação de quase todo mundo da bossa nova é de jazz. Aliás, formação benéfica, pois é a maior expressão popular de todos os tempos. Detesto essa distinção de autêntico. Autêntico, como diz o Tom, é o jequitibá. Ninguém é autêntico. Todas as correntes se interligam, comunicam. Se buscarmos as raízes reais da coisa, teremos que fazer música de índio: bateria não é brasileira, pandeiro não é brasileiro. Menescal e Lyra, todos tiveram grande contato com o Jazz. (apud CALADO, 1990, p. 245 – 246, grifo nosso).

Calado (1990, p. 245), mais uma vez, faz uma comparação da música

brasileira com o jazz. Neste caso, compara a bossa ao “bebop”, dizendo que não é

à toa que este, o “bop”, está entre as influências principais da bossa:

Assim como o bop [bebop], a bossa nova introduziu inovações em nível melódico, harmônico, rítmico, poético, interpretativo, ou mesmo estético, que entraram em confronto com boa parte da tradição musical que a precedeu. Jamais um estilo havia criado tanta celeuma nos meios musicais ou mesmo culturais do País.

26 Exemplos das diversas formas de samba são: samba de terreiro, do partido alto, samba-enredo, samba rural, samba de côco, samba-cancão, sambo do telecoteco, samba de breque, samba de roda...

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Outra comparação é no sentido da atitude “cool” da bossa nova. Pois, assim

como os “beboppers” (músicos que tocavam “bebop”), havia se revoltado contra os

antepassados do “jazz hot” (jazz quente) e suas excentricidades em cena,

assumiram uma atitude fria e quase distante frente ao público, os adeptos da bossa

nova também desprezaram a interpretação emocional ou dramatizada da antiga

música popular brasileira. Tal atitude é mais claramente percebida na maneira de

cantar da bossa nova, em que a voz é concebida como um instrumento, típico de

qualquer “jazz singer” (cantor de jazz), num contexto musical muito mais complexo,

tanto em nível melódico como harmônico e rítmico, implicando numa técnica

necessariamente mais apurada, não tanto no sentido de emissão, mas

principalmente no sentido de conhecimento de harmonia e processos de

improvisação e divisão rítmica, que rejeitava a maneira operística de interpretar os

sambas-canções e boleros melodramáticos do período anterior:

Jobim definiu a concepção do canto na bossa nova como consistindo em se cantar cool. Tentaremos explicar esta colocação. Isto quer dizer: cantar sem procura de efeitos contrastantes, sem arroubos melodramáticos, sem demonstrações de afetado virtuosismo, sem malabarismos. O cool coíbe o personalismo em favor de uma real integração do canto na obra musical. O que está de acordo com a posição estética do movimento. A “voz cheia”, o “dó de peito”, a “lágrima na voz”, o “canto soluçado” etc. são rejeitados pela bossa nova. Algo que causou e ainda causa espanto em grande parte do público: o fato de não se incrementar a loudness [sonoridade] da voz quando se canta uma nota aguda. O canto flui na fala normal. (CAMPOS, 1978, p. 35).

Se a bossa nova, por um lado buscava a simplicidade, na forma de interpretar

as canções, no seu intimismo, na concisão e objetividade:

a “bossa nova" (...) se singulariza pelo intimismo, pela concisão, pela racionalidade e pela objetividade, (...). Rompeu com os gêneros associados ao excesso em várias de suas manifestações na música popular, como o "exibicionismo operístico" (expressão cunhada por Augusto de Campos, 1968) e os arranjos que recorriam a orquestrações grandiosas. (NAVES, 2000, p. 37).

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Por outro, tinha seus excessos no que se refere, por exemplo, aos seus

acordes alterados e sofisticação, alteração da melodia em relação à tonalidade

vigente, linhas cromáticas e bordaduras melódicas, enfim.

Podemos (...) apontar um dos principais, senão o principal fator de distinção, atração e influência da Bossa Nova (...) sobre os músicos de jazz: a condução harmônica. No jazz sempre houve a previsibilidade das preparações de subdominante, dominante e tônica, além da prática comum de usar harmonias padronizadas, como no “twelve-bar blues”, ou “emprestadas” de músicas populares. No Brasil há uma tradição essencialmente melódica, com Pixinguinha, Noel, Caymmi, que se fixou na música brasileira. Daí resulta que, ao apossar-se de sofisticações harmônicas, conserva-se o pensamento melódico brasileiro, traduzido em contrapontos. Roitstein vê a Bossa Nova como uma música “simples e universal, profunda e complexa ao mesmo tempo”. E usa músicas de Jobim em suas aulas por considerá-las “harmonicamente perfeitas”. Gava (2002) reafirma essa preocupação com as linhas melódico-harmônicas nas músicas da BN, apontando “cromatismos internos e movimento dos baixos”, “camuflagem das funções básicas pela adição de notas e preocupações na condução das vozes”. (SCARABELOT, 2005, no site http://www.revista.art.br)

A bossa tinha como objetivo dar um outro ruma à função da música: não mais

destinada à dança coletiva, e sim à audição, o que a aproximava dos concertos do

“cool jazz”.

Há alguns que consideram a Bossa Nova o jazz brasileiro:

O jazz brasileiro é geralmente lírico: uma música cadenciada e de uma complexidade rítmica que nem sempre é evidente a um ouvinte casual. É também uma música que se pode dançar. Os norte-americanos conheceram bem uma forma muito popular de jazz brasileiro, denominada “bossa nova”. (DINIZ, 2006, no site http://river-man.blogspot.com/2005/10/o-jazz-sul-americano.html).

No entanto, a autora concorda com a idéia de que esta afirmação é negativa,

pelo motivo de a bossa nova ser uma forma musical em si e o Jazz Brasileiro outro,

que passou a se consolidar no final dos anos 70, como será mostrado a seguir. A

socióloga, Luciana Prass, em uma matéria escrita para a revista IHU “on line”, diz:

“Hoje o que se diz é que a conhecida fala de senso comum de que ‘a Bossa Nova é

Page 43: Jazz Amazônico - Conjecturas

48

o jazz brasileiro’ não passa de um exagero retórico, emblemática de nossa condição

de terceiro mundistas” (PRASS, 2005, p. 14).

• O “Jazz Brasileiro” (ex. faixa nº 12)27

O Jazz Brasileiro, como veremos, é um estilo musical, dentro do gênero

“Música Popular Brasileira”, que em sua essência é instrumental. Esta designação

causa ainda alguma confusão, pois muitas vezes é chamado também de “Música

Popular Brasileira Instrumental”, ou “Música Improvisada” (como preferem os

músicos), ou ainda, apenas “Música Instrumental”, dentre outras: “A ‘Música

Instrumental’, ou mais propriamente, a ‘Música Popular Brasileira Instrumental’, ou

ainda, o ‘Jazz Brasileiro’, é um gênero musical...” (PIEDADE, 2005, p.197).

No entanto, apesar de seus vários nomes, não há dúvidas acerca de sua

existência, a discussão, porém, encontra-se no âmbito de sua definição:

Hoje certamente se pode falar em um Jazz Brasileiro, e com iniciais maiúsculas. Constatar a sua existência não é problema. Já defini-lo é algo bem mais difícil. (BEZERRA, 2001, p. 1).

Piedade (2005, p. 198), em seus estudos sobre o Jazz Brasileiro, declara:

Venho estudando o Jazz Brasileiro buscando focalizar esta música como um gênero musical em sua plenitude, pertencente ao conjunto da música popular brasileira e apresentando uma relação típica com o jazz norte-americano.

Surgiu a partir da década de 50, com os primeiros músicos saídos das

orquestras “Jazz Bands”, que se encontravam em boates e bares para “jam

sessions”,

27 Música: Bebê. De Hermeto Pascoal, arranjo e interpretação de Eumir Deodato (Cd não informado).

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Foram das orquestras que saíram muitos dos principais solistas do que já poderia ser considerado o jazz brasileiro moderno, nos anos 50: como os saxofonistas Paulo Moura, Moacir Silva e Zé Bodega, para citar apenas alguns que ainda estão em atividade. Em boates, bares e “jam sessions”. (CALADO, 1990, p. 243).

Existindo em paralelo com a Bossa Nova, foi abrandada após o surgimento

da música de participação ou protesto na geração dos festivais nos derradeiros

anos 60 e início de 70, predominando, portanto, o texto neste período. Este forte

momento da música cantada enfraqueceu-se após os esforços da censura para

emudecer a música brasileira, então recomeçou uma nova era na música

instrumental.

E foi aí que o Jazz Brasileiro passou a se consolidar, em especial a partir do

fim da década de 70 e início da década de 80, passado o “frissom” da bossa nova,

sendo chamado principalmente de “Música Improvisada” ou “Música Instrumental”,

termo que deveria significar, por definição, toda forma musical que é unicamente

executada por instrumentos, sem a inclusão do texto cantado, portanto, incluiria

desde o choro até a música de concerto, dita “erudita” ou “clássica”. Porém, a partir

desta década, o termo música instrumental passou a ser utilizado para se referir tão

somente às formas musicais que estão sobre os parâmetros do jazz.

A denominação “música instrumental” (...) a partir da metade final dos anos 70 (...) referia-se basicamente, às formas musicais cunhadas na informação do jazz e à geração de seus praticantes, os instrumentistas dispersos com o esvaziamento da bossa nova e o desinteresse do mercado e da indústria fonográfica. (BAHIANA, 1980, p. 77).

Foram a partir dos anos 70 que esta forma de música tomou maiores

proporções no Brasil:

Os anos 70 viram o estouro da ponta de um desses ciclos [música cantada e música improvisada, no caso, música improvisada] e o começo do parto de mais uma forma nova de música improvisada – e uma nova platéia. (idem, p. 79).

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Esta nova geração era formada, em doses menores por alguns

remanescentes da bossa nova, e em doses maiores, por aqueles que participaram

apenas da fase final da bossa. No entanto, o público não se interessou rapidamente

pela música instrumental, só depois de certo período é que começou a haver uma

modificação nesse quadro, a partir de 76/77, começando a surgir alguns nomes

consistentes, de forma gradual. E estes que isso fizeram, foram aqueles que

romperam com a tradição do tão somente jazz/bossa - que foi sua raiz – passando a

incorporar elementos da música dita de raiz, do rock, de clássicos, enfim,

ocasionando numa linguagem musical bastante híbrida.

Dentre todos que participam desta nova tendência, há pelo menos dois

nomes que se destacam: Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal que, apesar de

terem sonoridades e caminhos diferentes entre si, sintetizam todo o resultado

sonoro desta passagem: “Dois nomes que exemplificam perfeitamente essa

passagem da linha jazz/bossa para uma linguagem mais misturada e mais ampla:

Egberto Gismonti e Hermeto Pascoal” (BAHIANA, 1980, p. 83).

Durante quatro anos, a produção musical de Egberto seguia a linha em que

“a improvisação jazzística era controlada pelo preciosismo da ourivesaria orquestral,

aproximando-se ora da canção, ora dos processos ‘eruditos’” (idem). Porém, a partir

de 74 sua música começou a mudar, passou a fundir a liberdade do improviso, com

a elaboração do arranjo e também, cada vez mais, com dados da música brasileira

básica.

A música de Hermeto, que toca acordeom, flauta, garrafas, piano, bacia,

saxofone e sintetizador, entre outros, é marcada por uma cascata de livres

associações, que se desenvolve e partir de dados muito da terra, em que retoma os

xaxados e xotes de sua infância e adolescência, além de citar outros elementos da

música brasileira como choro.

Hermeto teve muita influência no exterior, chegando a tocar junto com Miles

Davis, influenciando a muitos compositores e músicos da atualidade, como por

exemplo, Herbie Hancock.

Page 46: Jazz Amazônico - Conjecturas

51

Neves (apud MULLER, 2005, p. 60) tece o seguinte comentário sobre

Hermeto: “deliciosamente antropofágico, liquidificando todas as informações

sonoras atuais, Hermeto partiu do mais descabelado free até a música nordestina”.

Portanto, talvez a dificuldade de definir o gênero “Jazz Brasileiro”, deve provir

exatamente daí: o fato de haver no Brasil uma riqueza extraordinária em sua matriz

rítmica, estando o “Jazz Brasileiro” num entrecorte destas múltiplas influências,

resultando num misto de músicos que, observando em grosso modo, são tão

diferentes entre si, que não ousaríamos agrupá-los num mesmo rótulo. No entanto,

numa visão mais profunda, é possível fazer relação entre eles, colocando-os não

sobre um prisma de uma definição estilística arbitrária, mas sim sobre a visão de

que há em todos eles, o que Bezerra (2001, p.2) chama de uma mesma

“brasilidade”: “Talvez a solução não esteja numa definição estilística fechada, mas

sim na existência de um certo fator, uma certa ‘brasilidade’”.

Assim, nota-se que a definição de jazz brasileiro está mais vinculada a uma

relação de semelhanças entre músicos do que de uma definição precisa: “Essa teia

de vínculos se constrói pouco a pouco com base em cadeias de influências...”

(BEZERRA, 2001, p. 2).

Tal fenômeno em muito se parece com o que já ocorria com dois tipos de

jazz de fronteira que já observamos: o “free” e o “fusion”.

Piedade (2005) considera o Jazz Brasileiro como o resultado do encontro da

musicalidade brasileira com a norte-americana, e diz ainda, que isso se dá não

como uma mistura perfeita entre estes estilos, mas resultando de um processo de

tensão entre estas duas formas, o que ele chama de “fricção de musicalidades28”,

entendendo como musicalidade: “um conjunto de elementos musicais e simbólicos,

profundamente imbricados, que dirige tanto a atuação quanto a audição musical de

uma comunidade de pessoas” (PIEDADE, 2005, p.199).

Em outras palavras diz que o “Jazz Brasileiro”, ao mesmo tempo em que

canibaliza o “paradigma bebop”29, busca incessantemente afastar-se da

28 Piedade (2005) usa esta metáfora mecânica para designar o jazz brasileiro, que implica na característica física de que, quando os objetos são postos em contato, se tocando e esfregando suas superfícies, eles podem chegar a trocar partículas, mas os núcleos duros das substâncias que os compõem, tendem a se manter. 29 Piedade (2005) chama de “paradigma bebop”, a “musicalidade jazzística que torna possível o diálogo entre um trompetista sueco, um pianista tailandês e seu público, numa “jam session” em Caracas; enfim, algo como uma língua comum” (p. 199).

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musicalidade norte-americana, isto através da articulação de uma musicalidade

brasileira. No jazz brasileiro, as musicalidades que o formam, dialogam entre si, mas

não se misturam.

Este diálogo fricativo de musicalidades, característicos da música instrumental, espelha uma contradição mais geral do pensamento: uma vontade antropofágica de absorver a linguagem jazzística e uma necessidade de brecar este fluxo e buscar raízes musicais no Brasil profundo (...) Se trata de uma espécie de jogo, neste gênero musical, manifestando-se entre o idioma do jazz e as musicalidades brasileiras, que promove um encontro que se finge, mas nunca se realiza plenamente. Mais que um encontro, trata-se de um confronto: a ficção do encontro musical é que ele é uma fricção. (PIEDADE, 2005, p. 200 - 201).

Porém, apesar de muitas vezes a idéia de tensão ser considerada algo

negativo, indesejável, Piedade (2005) não considera estas fricções como algo ruim,

diz ser essencial ao Jazz Brasileiro, uma parte constituinte, uma forte marca de sua

identidade em seus diversos elementos constituintes:

Esta dialética seria, assim, congênita e essencial ao jazz brasileiro enquanto gênero musical: dotado de uma estabilidade em termos de temática – a fricção de musicalidades sendo aqui constituinte, evidenciando-se principalmente nas improvisações – de estilos – fundamentalmente idiomas regionais, como a musicalidade nordestina – e de estruturas composicionais – no código musical propriamente, como na rítmica e no emprego de determinados modos (...) É precisamente aí que se encontra uma parte constituinte muito saliente deste gênero (...) que lhe dá seu caráter ao mesmo tempo nacional e global. (PIEDADE, 2005, p. 200 - 203).

Bezerra (2001) faz uma análise para buscas os elementos característicos

dessa música, e diz serem eles:

- Formação Instrumental

A característica brasileira da sólida formação instrumental nos sopros, em

especial os metais, além do piano, violão e percussão.

Page 48: Jazz Amazônico - Conjecturas

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- Plano Estético

Em nossa música há certa concisão, uma espécie de economia de meios:

Voltando os ouvidos para o Jazz Brasileiro, percebemos que essa “escola da concisão”, produziu frutos. O foco da música é geralmente bem definido. O fraseado é incisivo. Os acompanhamentos são econômicos. A harmonia é concentrada, porém de grande efeito. Mesmo o humor e a decantada “brejeirice” brasileira, que não deixa de dar as caras, são obtidos de maneira “esperta”, sempre ligando A e B pelo caminho mais curto possível: quem piscar, perde a gig (BEZERRA, 2001, p. 3).

E esta concisão revela o contrário do que se espera da imagem estereotipada

do Brasil, como um país de excessos.

Podemos observar que ao contrário dessa imagem estereotipada [imagem tradicional do Brasil como um país excessivo e festivo], muitas manifestações musicais se destacam por melodias breves, secas, cortantes, claramente desenhadas; harmonias áridas e ásperas; ritmos simples e poderosos; cantorias a capella desérticas e hieráticas. Isso se observa tanto na música vinda da caatinga, como naquela do cerrado, como na do pantanal. (idem, p. 2).

Já Piedade (2005), diz que o jazz brasileiro tem em si inflexões rítmico-

melódicas características e uma não linearidade no pulso, o que ocasiona uma

espécie de frouxidão no ritmo:

Há no jazz brasileiro inflexões rítmico-melódicas específicas e dissincronias no pulso que evocam uma certa “frouxidão”, isto conforme um certo caráter de abertura e relaxamento que é atribuído à música brasileira em geral, e tais elementos são carregados de significação cultural e implicações ideológicas. Por exemplo, os tipos de levada de bateria, o ponto exato em que deve ocorrer um toque de caixa, os golpes nos pratos muitas vezes assimétricos, aspectos aparentemente flexíveis, na verdade são conhecimentos compartilhados e envolvem muita precisão. (PIEDADE, 2005, p.204).

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Porém, apesar das várias conjecturas, o que se deduz é que o jazz brasileiro

acaba por seguir as diretrizes do que vem ocorrendo no jazz pelo mundo, como já

dito no capítulo I, em que ele vai se fundindo e mesclando, resultando em novas

sonoridades, e no caso do Brasil, se mesclando em especial com os estilos ditos “da

terra”.

os artistas ligados a esse novo momento da música instrumental traziam características estáticas distintas das formas exclusivamente instrumentais observadas em períodos anteriores da música brasileira. A música que faziam se afastava, em grande medida, da combinação bossa/jazz da década de 60, ao incorporar a ela, novos elementos. De maneira especial, os presentes em gêneros regionais, ditos “de raiz”. (MULLER, 2005, p. 63).

Podendo utilizar também, elementos bem contemporâneos, como no caso de

Hermeto, que mescla as duas vertentes.

Uma coisa é certa: aquilo que se percebe como Jazz Brasileiro não pode ser reduzido apenas a uma das tantas linhas estéticas envolvidas no assunto. Também parece improvável que ele possa ser definido como algum tipo de combinação desses gêneros em certas proporções relativas. Portanto, quando aqui se fala em Jazz Brasileiro, se fala em um estilo plural e mutável. (O JAZZ..., 2006).

Portanto, o estilo “Jazz Brasileiro” se caracteriza também, por ser um estilo

bastante e plural e mutável, nas mais variadas proporções.

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CAPÍTULO III. JAZZ AMAZÔNICO

Baseado em todas as informações já expressas neste trabalho, agora, se irá

em busca da resposta à indagação a que se propõe esta pesquisa: “Existe um Jazz

Amazônico?”.

Partindo do princípio de que, do início do séc. XXI, a tendência do jazz é que

seja composto, que se combine com as mais diversas formas musicais, podendo ser

considerado além de um gênero30 musical, também uma linguagem. E ao chegar ao

Brasil, o jazz encontrou a empatia da música local, pelo fato de haver similaridade

de antepassados. Este gênero acabou influenciando diversos estilos resultando,

inclusive, num estilo novo: o “Jazz Brasileiro”, que é essencialmente instrumental, e

que mescla em si, numa relação de fricção, a linguagem jazzística e ao mesmo

tempo toda brasilidade das músicas “de raiz”, deixando ainda, espaço aberto para

novos compostos como o rock e a música contemporânea, dentre outros, segundo a

liberdade e necessidade do compositor.

Portanto, faz sentido que averigüemos a música instrumental no Pará.

Investigar se ela tão somente se encaixa no gênero “Jazz Brasileiro” ou se seguiu

seu próprio caminho, mesclando a linguagem jazzística à música regional

amazônica.

3.1 MÚSICA PARAENSE

Considera-se música paraense, a música produzida no Pará, ainda que o

compositor tenha outra origem. Se o compositor dá a sua composição uma

característica paraense, nortista, se está enquadrado ao estilo de música regional,

é considerada Música Paraense.

30 Segundo José Siqueira, nos livros “Música para a Juventude”: Gênero – Musicalmente, o gênero resulta do conjunto de caracteres que uma composição apresenta, caracteres esses que servem de elementos diferenciadores. Estilo: Denominamos estilo à maneira própria e especial de se exprimir em qualquer arte. O estilo pode ser encarado sob vários aspectos, compreendendo: época, escola, autor, costume, uso, caráter, grau de aperfeiçoamento, etc.

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Origem:

A música paraense, como a música brasileira em geral e tudo o mais que se

refere à identidade e cultura nacional, tal como a conhecemos hoje, é fruto de todo

um processo de miscigenação.

Um dos compostos iniciais é a Música Sacra Portuguesa.

Nos dois primeiros séculos de colonização (a partir de 1616), a música foi

marcada por estar diretamente ligada à Igreja. O colonizador impunha sua cultura,

por meio da catequese dos índios, principalmente durante os rituais litúrgicos do

cantochão, o que resultou num processo de aculturação dos nativos.

A música ligada diretamente à igreja com seus rituais litúrgicos do cantochão, expressão máxima dos cânticos religiosos das missas e procissões, seria a ferramenta sonora usada na catequese dos índios (...) O nativo passa então por um processo de deculturação e os que resistem são mortos ou obrigados a empreenderem ousadas fugas (SILVA, 2003, p. 7).

Para este intento, os colonizadores utilizavam principalmente a música.

Os antigos missionários, e entre eles Vieira, reconheciam na prática da música importante veículo catequético e político. Com a música, se faziam estimar pelos índios e pelos negros. Portanto, a cultura musical, concebida no nível histórico, começou efetivamente a desenvolver-se com a instalação da sociedade de feição européia nos trópicos. (SALLES, 1970, p. 13)

Neste processo, além da parte sacra, houve também a contribuição da

música profana, visto que os primeiros colonos também introduziram algumas festas

populares, tais como folguedos profanos como o entrudo31, por exemplo. Segundo

31 Festa popular de tradição portuguesa que se desenvolvia nas ilhas africanas de Cabo Verde e da Madeira como diversão bastante rústica que precedia a quaresma. (ENTRUDO..., 2006).

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Vicente Salles (1970, p. 18): “... muitos desses folguedos constituíram a base do

hoje rico folclore amazônico”.

Gilvan Silva (2003) coloca que, enquanto nas festas da aristocracia

portuguesa haviam danças acompanhadas do som das gaitas, tamborins e violas,

os índios, que não conheciam essas formas de manipulação dos sons, produziam

suas músicas (que tinha caráter essencialmente religioso) através de instrumentos

produzidos com troncos de árvores (tambor), cabaças (maracá) e bambus (alguns

tipos de flautas), em que “... emitiam alguns sons mais parecendo com ruídos (...),

não havendo a preocupação harmônica” (SILVA, 2003, p. 7). Esta vivência musical

tão diferente da do colono, constituiu outro “ingrediente” da formação de nossa

música.

A principal contribuição do negro se deu através de toda sua bagagem

rítmica já trazida de seu continente, como em toda cultura musical que influenciou.

Os negros, por sua vez (...), chegam trazendo do seu continente uma bagagem rítmica de dar inveja, nas noites, após um dia de muito sofrimento no trabalho pesado da colônia, a sonoridade produzida por instrumentos como atabaques, tambores e cuícas, aqueciam as almas, em quanto lembravam de sua terra e clamavam por liberdade. (SILVA, 2003, p.8).

Como era de se esperar, os nativos reagiam a todo processo de invasão e

exploração aqui estabelecido, desencadeando em diversos conflitos, como o que

ficou conhecido por “Cabanagem”, considerado o maior e mais famoso. A

Cabanagem foi uma revolta contra os portugueses que viviam no Pará e que não

admitiam a independência do Brasil. E é até o término da cabanagem que foi

constituída toda a base cultural paraense.

No período compreendido entre 1616 – fundação de Belém – e o final da cabanagem, a música praticada pelos europeus, índios e negros escravos traçariam os moldes de nossa música [paraense] (SALLES, 1980, p.25).

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O que assinalou assim, toda a raiz na qual a cultura paraense, neste caso

mais especificamente a música, viria se firmar.

3.2 O JAZZ NO PARÁ

Em pesquisas em recortes de jornais e livros, na busca de alguma pista

sobre quando, como e quem ou quais músicos foram os pioneiros em trazer e

incorporar o Jazz à música paraense, não foram encontradas informações muito

precisas. Em recortes de jornais, as informações encontradas não datam antes da

década de 90. No entanto, em entrevistas a músicos paraenses que já estão na

cena musical há algum tempo, muitos concordam que o pioneiro foi o pianista

Álvaro Ribeiro.

Alfredo Oliveira confirma esta idéia em uma entrevista ao Jornal O Liberal,

em 2005, quando declara que Álvaro Ribeiro foi quem iniciou a escola jazzística em

Belém, sendo o pioneiro em trazer essa linguagem à nossa música, a partir da

década de 60.

No começo da década de 60, a música rompida com a harmonia “quadrada” desembarca na terra através dos acordes dissonantes da bossa-nova e de jazz, tocados pelo pianista Álvaro Ribeiro, que faz escola entre nós. (O LIBERAL, 13/11/2005).

No livro “Ritmos e Cantares”, Alfredo Oliveira (2000) apresenta uma

publicação do jornal O Liberal do ano de 1991 (não informa a data precisa), em que

a jornalista Rose Silveira também apresenta Álvaro Ribeiro como o precursor:

Hoje ele toca sozinho, mas diz que vive muito bem acompanhado de seu piano, tocando jazz e bossa nova, que sempre foram seu forte (... ): “Acrescento um toque de jazz em tudo que faço”, diz Álvaro (...) [Álvaro] é um grande incentivador da geração mais nova” (OLIVEIRA 2000, p. 208 – 209).

Page 54: Jazz Amazônico - Conjecturas

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Infelizmente, não se pode afirmar com precisão, por haver pouquíssimas

fontes, se de fato foi Álvaro Ribeiro o precursor, ou se não, quem foi. Mas o que se

pode compreender sobre a história do Jazz no Pará, é que consiste em algo ainda

bastante recente. Contudo, vem se disseminando e gerando frutos em nossa cultura

de maneira bastante célere.

Hoje, é possível ler nos jornais e ouvir nas rádios os mais diversos grupos

musicais paraenses que se formam sobre os parâmetros do jazz, sobretudo, na

área instrumental. Na música cantada, há ainda poucos cantores com esses

parâmetros, dentre eles, deve-se citar o trabalho da cantora Dayse Addario, que

sempre assumiu esta influência em seu trabalho, tendo gravado o CD intitulado

“Monólogo Urbano”, acompanhada da banda “Zarabatana Jazz”, todo calcado nas

informações do jazz. Atualmente, encontra-se em fase de conclusão de seu

segundo CD, que assim como o primeiro, é marcado pela influência jazzística.

Na área da Música Instrumental, ouve-se diversos grupos e nomes que

trazem o jazz como marca em seus trabalhos, são eles: a “Big Band” Amazônia

Jazz Band (talvez a mais conhecida referência de jazz para o grande público),

Zarabatana Jazz, Grupo Tynbres, Minni Paulo Quarteto, Cumbuca jazz, Tríade,

harpia trio, Jony Lameira Trio, Delcley Machado, Tynnôko Costa, Gileno

Foinquinhos, Bob Freitas, Brazuca Jazz, Pandora, Albery Albuquerque (que neste

momento está mais voltado para a música experimental, mas já foi grande

referência do jazz), dentre outros.

Dentre tantos nomes, foram escolhidos três que, em suas trajetórias e na

atuação de seu ofício como músicos, têm de forma consolidada (tendo assumido

sem qualquer inibição ou preconceito) a influência do jazz em seus trabalhos, sendo

reconhecidos por tal. Dois deles, talvez, acompanharam a trajetória do jazz em

Belém desde o princípio, são eles Minni Paulo e Tynnôko Costa, e o outro, veio de

uma geração não tão inicial, mas também não tão recente, que do mesmo modo é

reconhecido por sua relação com o jazz: Ziza Padilha.

Page 55: Jazz Amazônico - Conjecturas

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3.3 BREVE BIOGRAFIA DOS COMPOSITORES

• MINNI PAULO

Nascido em Belém do Pará, no ano de 1954, o compositor, arranjador,

diretor musical e contrabaixista, Minni Paulo, começou a estudar música aos 15

anos, como autodidata, tocando contrabaixo elétrico. Só depois, passou a estudar

música e baixo acústico no extinto SAM (serviço de Atividades Musicais), para

aperfeiçoar sua técnica e conhecimentos teóricos já adquiridos de maneira

empírica, e corrigir os eventuais “vícios” que o músico autodidata costuma ter.

No entanto, considera o ano que marcou seu real começo como músico

profissional, o de 1973, em que montou o grupo “Sol do Meio Dia”. Deste grupo,

inclusive, participaram artistas que hoje têm carreira solidificada no contexto da

música paraense.

Em 1977 foi para o Rio de Janeiro, e lá ingressou nas bandas de Johnny Alf,

Zezé Mota e outros cantores brasileiros, fazendo com eles turnê por todo o Brasil,

Países da América do Sul e Europa. E foi assim, especialmente em 1979, que

entrou em contanto com o movimento da “Música Instrumental Brasileira” que

estava surgindo, no período pós-bossa nova, no Rio de Janeiro, como já abordado

no capítulo II, e do qual fez parte. Com isso, em 1980, voltou para Belém e criou

seu primeiro grupo de Música Instrumental no Pará chamado “Cabeças

Insatisfeitas”, o qual seguia a nova tendência que estava surgindo no Brasil.

Chegou a fazer um show no Teatro da Paz, intitulado “Minni Paulo e Convidados”,

com formação básica de guitarra, piano, contrabaixo e bateria.

Neste tempo que passou em Belém, Minni Paulo também criou o grupo

chamado “Banda Esperta”, em que fazia estudos com os músicos, repassando a

eles todo o material e novidades que tivera acesso.

Ele próprio diz ter sido o pioneiro em trazer a música instrumental nestes

parâmetros para o Pará, germinando, na media em que colocava os músicos em

contato com ela:

Page 56: Jazz Amazônico - Conjecturas

61

Eu fazia uma espécie de estágio com o pessoal. Nós fazíamos tardes de estudos, e eu ministrava pequenos “workshops” (...) Coloquei os músicos em contato com um conceito de harmonia e improvisação mais modal e menos funcional, trouxe o Real Book pra cá, enfim...”.

Depois de ter retornado ao Rio ainda mais uma vez, em 1984, volta para

Belém, decidido a ficar de vez, e assim, formou o grupo “Minni Paulo Quarteto”,

composto pelos músicos Paulo Levi no sax, João Marcos Mascarenhas no piano

elétrico, Sagica na bateria e Minni Paulo no contrabaixo.

No entanto, em 1987, Minni saiu novamente de Belém. Desta vez, foi para a

França, com a finalidade de se aperfeiçoar mais, além de tocar nas noites

parisienses. Minni contratava professores particulares para que focassem o estudo

em seus interesses principais. E, durante seis anos, cumpriu o ritual em que

intercalava idas para a França e vindas para Belém. Sempre que retornava, trazia

mais novidades aos músicos.

Em algumas das idas à França, Minni levava seu grupo “Minni Paulo

Quarteto”, mas após estes 6 anos, o grupo se desfez, pois 2 de seus membros

foram estudar e tocar nos EUA, na “Berklee College of Music”, e até hoje, firmaram

passos por lá, retornando a Belém apenas esporadicamente, e nessas vezes em

que se encontram, voltam a tocar.

Quando é questionado sobre como define sua música, Minni Paulo prefere

chamá-la de “Música Instrumental Brasileira”, pois diz que “ritmicamente, está ligada

bastante aos ritmos do negro, que é uma característica da música brasileira em

geral“, Mas reconhece que tem também, influências do carimbó, síria, côco.

Revela que sempre escuta esses gêneros musicais com o intuito de

influenciar sua música e que inclusive, começou uma pesquisa sobre a música

indígena amazônica, inspirado, em especial, pela música de Albery Albuquerque.

Minni diz que essas influências, amazônicas, e também as caribenhas, se tornam

mais presentes no aspecto melódico de sua música que considera ser o aspecto

musical mais importante, e não apenas no aspecto rítmico.

Page 57: Jazz Amazônico - Conjecturas

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Entretanto, por um período de 12 anos (a partir de 1994), acabou entrando

num “ostracismo” como músico que, segundo ele, ocorreu por falta de um apoio

mais democrático do governo à classe artística, se dedicando, neste período, à

composição de suas músicas.

Desde 2001, organiza o festival “Baiacool Jazz”, em que participam além de

grupos instrumentais do Pará, grupos e músicos de fora. Já participaram artistas

como o guitarrista Toninho Horta, o saxofonista Léo Gandelman, o trompetista

Márcio Montarroyos, o grupo “Nosso Trio”, “Cama de Gato”, “Boca Livre”, Hermeto

Pascoal, enfim, além de atrações internacionais.

De sexta-feira a domingo (...) [acontecerá] o ‘Baiacool Jazz Festival’, o primeiro evento desse tipo de música na cidade. Organizado pelo baixista Minni Paulo Medeiros & Zoé Agência de Música (...) Esta será a segunda versão do ‘Baiacool Jazz Festival’ em Belém, que já teve uma primeira versão em Salinas, em julho passado (O LIBERAL, 11/12/2003).

Atualmente está envolvido no projeto “Baiacool Jazz Club”, que será um bar

destinado à música instrumental, pois acredita que Belém está carente deste tipo

de espaço. Minni Paulo teve a preocupação de oferecer equipamentos de

qualidade, como caixas JBLeon, um bom amplificador para guitarra, um piano

elétrico, enfim: “é uma questão de respeito com o músico, não se encontra este tipo

de tratamento na maioria dos bares de Belém, vai estar tudo lá, agora os músicos

não terão mais desculpas quando a ‘gig’ 32estiver ruim”, Brinca.

Minni Paulo já gravou dois CD’s próprios, um intitulado “Floresta das

Chuvas”, o primeiro de sua carreira, gravado em 1995, que recebeu excelentes

elogios da crítica nacional e foi com ele que fixou a carreira solo como compositor e

instrumentista. Seu segundo CD chamado “Marabaixo”, foi gravado na França,

ainda não foi lançado por falta de verba para terminar os processos de mixagem,

masterização e prensagem. Além de ter feito participações em outros projetos de

CD, como o de comemoração ao aniversário da “Sol Informática”, intitulado “14

32 Expressão usada pelos músicos, que se refere às apresentações de trabalho, normalmente feita em bares e casas noturnas.

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MIPS” (1999), CD “Cartografia Musical Brasileria” do projeto “Rumos Itaú Cultural”,

dentre outros.

Também participou de projetos como o “Projeto Pixinguinha” (quatro vezes),

Jazz no Metrô, Jazz in the Gardner (Suíça), Sala Funarte, Mistura Fina Parque da

Catacumba, Fundação Laurindo Lobo e tocou com Alaíde Costa, Filó, Rafael Lima,

Marina, Luís Melodia, Tim Maia, Jards Macalé, Ricardo Vilas, Nilson Chaves,

Angela Rôrô, João de Aquino, Marco Resende, Paulo André Barata, Jane Duboc e

outros.

Atualmente, vem se dedicando a compor de forma mais livre, procurando se

desprender cada vez mais de rótulos e da opinião externa, fazendo apenas a música

que agrade a si mesmo.

• ZIZA PADILHA

O músico Ziza Padilha – cujo nome de batismo é Emerson Coelho – já está

no meio musical há 17 anos, atuando como violonista, compositor, arranjador, diretor

musical, produtor e professor de música.

Iniciou seus estudos como autodidata aos treze anos, tocando violão ao

contrário, pois é canhoto. Foi após um acidente de carro sofrido aos quinze anos de

idade, que o deixou impossibilitado de andar por mais de um ano, que passou a

tocar como destro, pois neste período, seu irmão Elves Coelho também violonista,

levava um violão para casa dando-lhe aulas, e ele adquiriu, portanto, a forma de

tocar do irmão.

Foi depois de recuperado que escolheu seguir em frente como músico,

optando por esta profissão, sempre buscando dicas com amigos e vizinhos músicos,

tendo como importante figura, nesta época, o violonista Jesus Santos.

Aos 16 anos, Ziza passou a interessar-se profundamente sobre o estudo de

harmonia, elemento musical que mais o encantava, e foi estudar com os

contrabaixistas Poli Dourado e Paulo Coutinho. Mais tarde também estudou

Harmonização e Improvisação com Luiz Pardal no antigo SAM (Serviço de

Atividades Musicais da UFPA). Em seguida, foi para o Conservatório Carlos Gomes

estudar Violão Clássico com o professor Antônio Carlos (Careca Braga).

Page 59: Jazz Amazônico - Conjecturas

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No entanto, a parte mais sólida e profunda de sua formação foi mesmo como

autodidata, sempre buscando material de estudos, como livros de harmonia,

improvisação, arranjo, produção musical, mixagem, tecnologia musical, enfim, além

das análises e conclusões próprias, feitas a partir da observação pessoal.

O nome Ziza Padilha, é referência em Belém não só de um grande músico e

arranjador, mas também, no que se refere à aplicação da tecnologia nas diversas

áreas da música. Presta consultoria em diversos estúdios, principalmente para a

formação da parte digital, além de já ter ministrado cursos em instituições como o

IAP (Instituto de Artes do Pará) e para empresas particulares sobre o sistema

áudiodigital e de softwares para edições de partitura, arranjos, etc.

Ziza Padilha fez e faz muitas apresentações nas noites belemenses, além de

ter participado de vários festivais de música, recebendo premiações em muitos

deles, desde de 1990. Dentre eles: Festival do Sesi e Festival Canto Sabiá (1991);

Festival de Bragança (1993); Festival de Ourém e da Secult (1995); Festival de

Ourém, Festival de Alegre (ES) e Fecan (1996). Em 1997 participou novamente do

Fecan e Ourém, além do Festival de Icoaraci e Mirandópolis (SP).

Sua relação com o jazz começou desde a época em que começou seus

estudos de harmonia, por volta dos 17 ou 18 anos. Ao estudar harmonia, fazia

análises de diversas músicas brasileiras, para compreendê-las e também buscar

uma forma própria de compor. Passou então, a perceber que os processos

harmônicos da bossa nova, eram bem parecidos com o do jazz, o que o levou a

buscar mais conhecimento deste gênero musical. No entanto, apenas compunha

algumas poucas músicas instrumentais, atuando mais, nesta época, como músico

instrumentista. Mas, foi ao lado da cantora Dayse Addario, que desde 1996 firmou

uma trajetória e um trabalho mais sólido.

Dayse sempre teve forte inclinação ao jazz e blues, estilos que marcavam seu

repertório, mas sentia falta de cantar esses estilos com músicas feitas por

compositores “da terra”, com um “ar” mais próximo de sua realidade e quando

conheceu Ziza, que já tinha composições instrumentais nos parâmetros do jazz,

incentivou-o a compor mais músicas assim. E foi através dela que amadureceu e

consolidou sua forma característica de composição, arranjo e execução, que têm

influência bastante forte do jazz, o que acabou tornando-se uma marca no trabalho

de ambos.

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Uma das marcas de seu trabalho [Dayse Addario] são suas interpretações próprias das canções paraenses com o sabor do blues e do jazz. Dayse Addario é acompanhada pelo Grupo Instrumental Zarabatana Jazz, dirigido por Ziza Padilha, músico paraense, violonista, arranjador, diretor musical e compositor das canções do CD “Monólogo Urbano da Cantora”. (MÚSICA PARAENSE, 2006, no site: http://musicaparaense.blogspot.com)

Quando se trata de compor músicas que se valem de palavras, Ziza Padilha

prefere compor no sistema de parcerias. Dentre seus parceiros, estão grandes

poetas e compositores de Belém como: João de Jesus Paes Loureiro, Renato

Gusmão, Walter Freitas, Cacá Farias, Joãozinho Gomes, Tadeu Pantoja, Pedrinho

Calado, Daniel Bastos, Eduardo Dias, Jorge Andrade etc.

Algumas de suas composições estão registradas nos seguintes CDs: 15 MIPS

da “Sol Informática” (Mrs. Dayse - instrumental); “Boi de Louvação” (canção “Ponto

de Pouso” em parceria com Tadeu Pantoja); ”Coletânea da Albras” (“Caravelas” e

“Curiós”, ambas com Pantoja); “Sumanos”, de Renato Gusmão (“No Laço” em

parceria com Gusmão.) e o Monólogo Urbano gravado com a cantora Dayse

Addario.

Em 1997, para a realização do show “Nova Era”, formou o grupo instrumental

denominado “Zarabatana Jazz”, cuja formação era: Príamo Brandão no contrabaixo,

Charles Mattos na bateria, Paulo André no teclado, Carlos Eduardo no saxofone e

Ziza Padilha na guitarra, violão e arranjos. Após o show, Ziza decidiu manter o

grupo, como desenvolvimento de seu trabalho na área instrumental. No decorrer dos

anos, o grupo passou por várias formações. No contrabaixo, já passaram pelo

grupo: Marco Outeiro, Mario Jorge, Mauricio Gringo e Beto Taynara. Como pianistas:

Leonardo Coelho, Tinnôko Costa, Jonas Dantas e Alcir Meireles. Como bateristas:

Paulo Borges, Zeca Sagica, Edvaldo Anaice, Helder Góes e João Ricardo. Como

saxofonistas: Marcos “Puff”, Esdras de Souza, Carlos Eduardo e Abner César.

Sobre a música instrumental paraense, Ziza acredita que há sim, um forte

movimento em Belém, que apesar de haver mais músicos instrumentistas nesta

área, há também uma parcela significativa de compositores. Quanto à designação

“Jazz Amazônico”, acha que não precisa necessariamente ter este rótulo mas que,

com certeza, já existe uma linguagem nossa, que vem desde o sangue caboclo.

Comenta o compositor:

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Jamais um americano vai tocar como um brasileiro e um brasileiro como um americano. Nossa pulsação é diferente da deles, a nossa é sempre sincopada e a deles tercinada.

Atualmente, Ziza prepara-se para gravar o primeiro álbum do “Zarabatana

Jazz” e prepara-se também para o lançamento do 2º CD da cantora Dayse Addario.

Tem também, o projeto de lançar um livro didático de violão popular, que já está

escrevendo, que se chamará “Violão Popular Levado à Sério”, além de lançar em

português o “Guia Básico do ‘Pro Tools’ 7.3” (software de gravação digital) e ainda o

“Manual do Sibelius 4.0” (programa de editoração de partituras), todos elaborados

com animação em 3D33.

• TYNNÔKO COSTA

O músico Antônio Carlos Vieira Costa, é compositor, pianista, arranjador e

produtor, e mais conhecido no meio artístico como Tynnôko Costa.

Tynnôko é natural da Cidade de Belém, e cresceu num ambiente bastante

envolvido pela música. De formação erudita, começou seus estudos musicais no

Conservatório Carlos Gomes, em 1954, por intermédio do Governador do Estado e

mais tarde, foi estudar no Conservatório de Belas Artes do Professor Adelermos

Matos.

Em 1961, com 12 anos de idade, devido ao falecimento de seu padrinho e

madrinha (pessoas responsáveis por sua criação) foi para Recife. Lá entrou para o

Seminário Marista estudando música, paralelamente, no conservatório da Cidade,

onde estudou órgão, composição, regência, coro de música sacra, teoria,

contraponto, harmonia e piano.

Foi em recife, a partir do ano de 1967, que começaram seus primeiros

contatos com o jazz. Após um breve namoro com Margareth, sua professora, que

apesar da impostação lírica, gostava e cantava algumas músicas do repertório

jazzista. Margareth tinha em sua casa discos de Billie Holiday que apresentou ao

Tynnôko. Ele acabou interessando-se por essa música. Tynnôko também ganhou

33 Imagens de duas dimensões elaboradas de forma a proporcionarem a ilusão de terem três dimensões.

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67

de um amigo, nesta mesma época, vários discos norte-americanos, copiando em

fita todos eles, no convento. Então, em 1968, por fora do conservatório, começou a

pesquisar e estudar de forma mais profunda o jazz, bem como música popular, com

especial atenção à música brasileira.

Após ter saído da congregação Marista - por divergências de pensamentos

- retornou para Belém em 1970, decidido a viver e trabalhar com música, passando

a tocar em casamentos, recepções, grupos de música popular, além de dar aulas

particulares de teoria e piano.

Em 1974, Tynnôko gravou todas as faixas do que seria seu primeiro

trabalho solo, no estilo “música brasileira”, nos estúdios Rauland, juntamente com o

baterista João Moleque e o contrabaixista Lázaro. No entanto, após todo o processo

de gravação e mixagem já concluído, a fita, que então seria mandada para o

processo de prensagem, misteriosamente sumiu. Se fosse lançado, o disco teria o

nome de “Órgão Dançante”.

Tynnôko trabalhou, neste período, em diversos “grupos de baile”, como “Os

Incas” e os “Os Astecas”, um trio instrumental, além de tocar com Ely Farias,

durante três anos (1972-1974), gravando com ele, dois LPs de Carimbó. Nesta

época, também trabalhava para a Banda do Corpo de Bombeiros, fazendo

adaptações e transcrições de hinos e dobrados para que tocassem.

Em 1979, formou um sexteto, em que incluía, na maioria do repertório,

músicas com arranjos próprios. O grupo contava com a seguinte formação: piano,

contrabaixo, trompete, sax tenor, trombone, sax alto, bateria e vocal.

Em 1979 foi para o Rio de Janeiro, devido ao costume que mantém de

todos os anos viajar, no mês de julho, para os grandes centros urbanos do Brasil,

para participar de cursos de férias e com isto, sempre se manter atualizado e

informado sobre os principais acontecimentos musicais do País.

Teve como professores nestes cursos, grandes compositores da Música Contemporânea Brasileira, como Almeida Prado, Marlos Nobre, Gilberto Mendes, Radamés Gnatalli, Guerra Peixe e muitos outros. (BRANDÃO, 1999, p. 19).

Page 63: Jazz Amazônico - Conjecturas

68

Em assim, foi convidado para tocar com Elza Soares no ano seguinte. No

entanto, tocou com ela apenas dois meses, pois com o falecimento de seu filho

pequeno, Elza decidiu dar um tempo em sua carreira.

Em agosto de 1980, Tynnôko foi aprovado em um teste para uma Bolsa de

Estudos na Unicamp durante dois anos (1981-1982), onde estudou Composição

com Laércio de Freitas; Contraponto com Guerra Peixe; Fuga e estruturação com

Eleazar de Carvalho, dentre outros. E foi neste período que passou a se aproximar

mais da música regional amazônica, devido ao pedido feito pelos professores, de

que, quando fosse para Unicamp, levasse informações da música de sua região.

Desde então, não parou mais de se interessar e pesquisar a música

regional, tendo sido motivado, principalmente pelo professor Adelermos Matos, após

longas conversas com ele, recebendo muitas informações do mesmo, inclusive

lançando, juntamente com o professor, um livro intitulado “Música na Mata”, sobre a

história do próprio Adelermos. Mais tarde, após a morte do maestro, Tynnôko

descobriu um livro de pesquisas em que ele catalogou mais de 60 ritmos

amazônicos. Tynnôko pretende lançar este livro, após permissão da filha do

maestro.

Paralelamente, neste período que esteve em São Paulo, tocava nos mais

diversos lugares: em hotéis, casas noturnas, teatros, enfim. Acompanhou diversos

intérpretes da Música Brasileira, como Elis Regina, Alcione. Simone, Maria

Bethânia, Gal Costa, Caubi Peixoto, Nelson Gonçalves, Belchior, Sandra de Sá,

Emílio Santiago, Ângela Maria, Peri Ribeiro, Beth Carvalho, dentre muitos outros.

Em 1982 voltou para o Rio, passando a tocar nas melhores orquestras, do

tipo “Big Band”, da época. Chegou a tocar em Nova York, com Jamelão, além de

várias cidades da América Central, do Norte e Latina.

Com os trabalhos escassos devido as conseqüências da “Era Collor”,

Tynnôko foi trabalhar no estúdio “Aquários”, ainda no Rio de Janeiro, que prestava

serviços para o SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) e com isso, recebeu a

proposta de implantar o sistema de vinhetas desta emissora em várias cidades,

dentre elas, Belém. Tynnôko aceitou a proposta, e foi assim que retornou para sua

Cidade.

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69

Na sua volta para Belém, reatou seus contatos musicais, fazendo outros

também, e passou a trabalhar em estúdios como músico e/ou arranjador, além de

shows com os mais diversos cantores paraenses.

Em 1992 formou o grupo Tynbre, grupo instrumental que era formado pelos

músicos Dadadá (percussão), Ney Conceição (contrabaixo), Dedê (teclado), Bererê

(bateria) e Tynnôko (teclados e arranjos):

Formou (...) um dos mais importantes grupos de música instrumental do Pará, o grupo Tynbre (...) um grupo de músicos da mais alta competência e qualidade, gerando assim um trabalho de alto nível musical. (BRANDÃO, 1999, p. 23 e 24).

Outro feito de Tynnôko, nesta época, foi o desenvolvimento e a execução

do projeto “Memorial”, projeto este que se propunha a resgatar a memória musical

do Estado do Pará, fazendo uma leitura instrumental de diversas músicas de

compositores paraense, dando a elas um tratamento sofisticado, mas sempre

utilizando uma linguagem bastante acessível ao público, com o intuito de divulgar a

música paraense, servindo como uma espécie de cartão postal do Pará. Lançou

então, com esta proposta, o CD “Memorial”.

Tynnôko teve, e ainda mantém, participações importantes como

organizador e/ou diretor musical e/ou arranjador em diversos Festivais de Música

na capital e interior do Estado.

Em 1996, escreveu arranjos para a Big Band “Amazônia Jazz Band”, de

músicas do compositor Waldemar Henrique, e após esta experiência, a pedido do

então regente da Big Band, reescreveu uma música de sua autoria, chamada

“Rapsódia Brasileira”, para a formação do grupo, passando depois, a compor obras

especialmente para a orquestra, como: Dança dos Índios Tapuias, Pororoca,

Amassando Açaí, dentre outros:

Neste momento, houve uma ramificação do trabalho de Tynnôko (...) a de compositor de música contemporânea escrita para orquestra (...) Foi através da ‘Jazz Band’ que seu nome e sua obra foram divulgados,

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70

como compositor de música orquestral, por várias cidades brasileiras e no exterior. (BRANDÃO, 1999. p. 27).

Ao perguntar a opinião de Tynnôko, sobre a possibilidade de haver um

“Jazz Amazônico”, Tynnôko diz: “Acredito que aqui na Amazônia se faz uma música

com linguagem jazzística que tem um sotaque próprio”. Inclusive, afirma já ter

encontrado muitos músicos de fora que dizem que ele tem uma forma diferente de

improvisar, uma maneira muito própria.

Atualmente, Tynnôko vem trabalhando num projeto em que pretende

fundar uma escola de música, voltada para o ensino musical calcado nos

parâmetros mais modernos de conteúdos, nos âmbitos de harmonia, arranjo,

instrumento, enfim, algo difícil de encontrar nas escolas especializadas de música

em Belém, apenas em eventuais oficinas. Esta escola também terá característica

social, pois oferecerá bolsas para alunos mais adiantados, que deverão “adotar” um

aluno mais carente para ensinar música, com o objetivo de formar uma orquestra

com eles.

Boa parte das aulas deste projeto contará com o auxílio da tecnologia, em

que Tynnôko – que já fez cursos de capacitação em São Paulo – fará CD’s com

exemplos, conteúdos, exercícios, enfim, para auxiliar e otimizar as aulas.

3.4 ANÁLISE DAS OBRAS

• Música: “Festa no Curiaú” de Minni Paulo Medeiros (faixa nº13)34

A música “Festa no Curiaú” é executada por um combo35, cuja formação é:

piano, baixo acústico, bateria, percussão, trombone baixo, flugel horn, sax’s tenor e

soprano, flauta piccolo, clarinete e clarone.

Como o próprio nome sugere, a música é uma homenagem à Vila de Curiaú,

localizada em Amapá, à 12 km de Macapá. A Vila de Curiaú tem bastante influência

negra, visto ser uma das poucas remanescentes de quilombos do País, recebeu

34 Faixa nº 13 do CD “Cartografia Musical Brasileira”, do projeto Rumos Itaú Cultura (2000). 35 Pequeno conjunto de jazz, em geral, de três a oito músicos. (BERENDT, 1987, p. 357). Neste caso, o grupo é um pouco maior, contendo 11 músicos.

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inclusive, o título definitivo de área quilombola, tendo como habitantes, negros

descendentes de escravos. As comunidades que lá habitam, preservam os

costumes afros nas comemorações das datas religiosas, o que evidencia bastante a

tradição e características negras nesta região, que tem como ritmos mais simbólicos

o “Marabaixo36” e o “Batuque Amazônico”.

As características negras da Vila, portanto, estão bastante presentes nesta

composição, sendo a Vila de Curiaú representada em especial, pelo Batuque

Amazônico, que é:

Uma dança que teve origem no Candomblé Africano e trás em seu ritmo frenético a coragem e a alegria da raça negra. O batuque chegou ao Brasil ainda no período colonial, espalhando-se por vários cantos do país, em especial as regiões Norte e Nordeste (...) Na região Norte, o Batuque enraizou-se principalmente no Pará e no Amazonas (...) O Batuque Amazônico trata-se de uma homenagem à "cabocla Jurema", entidade bastante conhecida dos praticantes da umbanda e demais que, segundo à lenda, mora dentro de um lago (...) A dança folclórica em homenagem à Jurema começa com uma invocação à entidade entoada pelos componentes do grupo folclórico pedindo proteção para toda a Amazônia, região intimamente relacionada à Jurema devido à abundância do elemento água. (http://www.geocities.com/frutosdopara/batuque.html)

A música encontra-se na tonalidade de fá maior e está organizada da

seguinte maneira: Introdução – 8 compassos, Parte A – formada por duas frases de

8 compassos cada, que se repetem todas as vezes que são executadas, Parte B –

também formada de 2 frases, com 8 compassos cada.

Neste arranjo, toca-se 2 “chorus” e 1/2, sendo que os dois primeiros

representam a música em toda sua extensão com o arranjo escrito, a metade do

último é utilizado para improvisação, que é realizada pelo sax-soprano na parte B da

música, e após isso, há uma “codetta”37, que emprega o material da segunda frase

36 Apesar dos câmbios sociais, o marabaixo é considerado como uma das mais significativas festas folclóricas do Amapá. É um ritual que compõe várias festas católicas populares em 8 comunidades negras da área metropolitana de Macapá e Santana. O marabaixo também consiste no toque de caixas construídas com tronco de árvores e pele de animais, na dança das mulheres em círculo ao redor do salão, com dois ou três homens que tocam as caixas ao centro. (OLIVEIRA, 1999). 37 Coda é a secção com que se termina uma música. Nesta secção o compositor ou arranjador poderá ou não utilizar ideias musicais já apresentadas ao longo da composição. Codetta é uma coda pequena.

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da parte B, terminando com um “fade out” (diminuição gradual de volume até o

inaudível) nas várias repetições da parte A.

Na introdução da música, já nos deparamos com sua “porção” regional, em

que a percussão faz 8 compassos do ritmo de “batuque amazônico”, que depois

disso segue, enquanto entram os sopros tocando o primeiro tema da música, em

toda parte A, durante 32 compassos. O segundo momento da música é marcado

quando se inicia a parte B, em que a temática rítmica muda, virando um samba

Célula rítmica do batuque:

Toda melodia da música tem referência regional, pois foi inspirada em

desenhos melódicos da música indígena, que na parte A, tem tratamento bastante

simples, pois todos os instrumentos tocam em uníssono, sem divisões de vozes ou

blocos harmônicos.

No entanto, é na parte B que se encontra a “porção” jazzística da música que,

apesar de ser um samba e o desenho melódico ter inspiração indígena, a arranjo

dos sopros e a harmonia torna este trecho mais elaborado, com sonoridade

jazzística, devido à formação dos blocos harmônicos nos sopros, à presença de

bastante acordes suspensos (acordes em que se omite a terça, substituindo-a pela

quarta, criando uma sonoridade suspensiva), de dissonâncias nas extensões dos

acordes e na progressão harmônica, das qualidades de acordes empregados, como

acordes dominantes secundários, acordes substitutos da sétima de dominante de

acordes diatônicos primário e secundários, além dos contracantos encontrados, que

utilizam bastante a escala hexafônica38 (escala de tons inteiros), que apesar de não

ser propriamente uma escala jazzística, aplicada principalmente na música de

38 Escala que divide a oitava em seis intervalos iguais de um tom, começou a ser bastante utilizada pelos impressionistas franceses, em especial por Debussy.

Page 68: Jazz Amazônico - Conjecturas

73

concerto mas, quando é aplicada no âmbito da música popular, dependendo da

forma e do contexto que é utilizada, ganha uma atmosfera sonora jazzista, pois

muitos músicos de jazz a utilizaram e/ou utilizam.

No segundo “chorus” a parte A é acrescida do piano e contrabaixo, que

acompanham a melodia e a percussão em batuque amazônico, tocando uma

harmonia que também não é tradicional da música regional amazônica, são tocados

acordes de efeito suspensivos (Fsus4, por exemplo). Após a parte A do segundo

“chorus”, a música segue, tocando a parte B como da primeira vez, e quando

termina, toca-se toda extensão da parte B por várias vezes, que é utilizada para a

improvisação, e aí, neste improviso, encontra-se outra característica jazzística nesta

música, talvez a mais marcante, que é a sonoridade utilizada pelos músicos que

improvisam.

O instrumento líder neste improviso é o sax alto, muito bem executado pelo

saxofonista Carlos Malta, que utiliza uma linguagem bem nervosa, típica do jazz,

fazendo, porém, algumas citações da música brasileira, sendo escolhida para tal, a

música “brasileirinho” (de Waldir Azevedo e Pereira Costa). A sonoridade jazzística

também é realizada pela base, como as reharmonizações e improvisações paralelas

do pianista, as acentuações e conduções em colcheias do baterista que

praticamente não marca o “metro” da música, o “walking bass” (baixo caminhante)

do contrabaixista, enfim. Neste trecho, ocorre quase que uma improvisação coletiva

podendo ser feita certa relação com o que ocorria no “free jazz”.

Após a improvisação, toca-se a segunda frase da parte B e depois 8

compassos de percussão em batuque amazônico e piano, seguindo para várias

repetições da parte A, terminado num “fade out”.

A música apresenta de forma bem equilibrada os elementos da cultura

interna e externa, em que a parte A sempre está dedicada à referência interna;

regional, apesar da harmonia empregada que, no entanto, tem participação muito

singela, servindo como fundo aos elementos principais: a percussão e a melodia. E

a parte B, está dedicada à influência externa em relação à região amazônica: do

jazz e do samba. Portanto, pode-se dizer que os elementos não se misturam,

estando bem separados um do outro, o que nos permite reconhecer com precisão

cada um deles, observar em que ponto começa e termina cada um, o que resume

Page 69: Jazz Amazônico - Conjecturas

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bem o conceito de “fricção de musicalidades” empregado por Piedade (2005) ao

referir-se ao Jazz Brasileiro.

• Música: “Na Corda Bamba” de Ziza Padilha (faixa nº 14)39

A música “Na corda Bamba” trata-se de uma música composta para a

formação instrumental de guitarra, teclado, bateria, contrabaixo elétrico e saxofone

alto.

O decorrer da música segue a seguinte forma: “A A’ interlúdio B” (tema

inicial, repetição do tema com variação nos quatro últimos compassos, convenção e

segundo tema), sendo que cada parte é formada de 12 compassos, com exceção

do elemento de ligação, em tutti instrumental formado de 4 compassos, que é

tocada como uma espécie de convenção.

O arranjo da música segue este esquema em 2 “chorus”, sendo que na

última vez, para finalizar, repete os dois últimos compassos 3 vezes, terminando a

última vez com um tutti em que as notas são tocadas de forma staccato.

É importante ressaltar que, nas apresentações ao vivo, há espaços para

improvisação, que é definido pelos músicos nos ensaios ou durante a execução,

sem um rigor formal.

A melodia, nesta gravação, é executada pelo saxofone, que não segue

com exatidão as notas da partitura, fazendo alguns floreios, retardos, antecipações,

enfim, ornamentações características do jazz e da música popular. A guitarra, por

sua vez, além do papel rítmico-harmônico, faz algumas incursões melódicas, nos

espaços de pausa da melodia principal.

No aspecto rítmico, definido especialmente pela bateria e contrabaixo, é

importante notar que a música está em compasso quaternário, em que, na Parte A,

segue a levada rítmica caracterizada pelas inflexões do prato e da caixa, sendo que

o prato é tocado constantemente e a caixa marca a acentuação da música. Os

39 Gravado no “Zarabatana Studio”, cedido pelo compositor. Ainda não lançado em CD.

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outros acessórios da bateria realizam outras figuras rítmicas. A acentuação,

marcada pela caixa, nas partes A é a seguinte:

E na parte B, modifica, sendo desta forma:

Apesar de a figura rítmica ser uma célula do baião (expressa adiante), a

acentuação utilizada é a bem característica do jazz, em especial do estilo bebop,

como já expresso no capítulo I, pois se acentua o segundo (que neste caso está

antecipado) e o quarto tempo.

A brasilidade contida nesta música é observada, especialmente, pela linha do

contrabaixo juntamente com o bumbo da bateria. A célula rítmica executada

assemelha-se bastante à célula rítmica do baião, que também pode ser chamada de

célula mãe dos ritmos nordestinos, que é notada da seguinte maneira:

No entanto, tal célula rítmica, originalmente, é tocada em compasso binário

(2/4), porém, nesta música, a célula sofre uma alteração sendo adaptada ao

compasso quaternário (4/4) da música.

Melodicamente, a música também tem uma temática nordestina, por

executar escalas lídias e dóricas, características da música nordestina, só que, por

ser executada de forma mais lenta, ter uma sofisticação harmônica, a sensação

“nordestina” é abrandada. A melodia contém também uma intenção quartal, típico

do jazz.

Harmonicamente, a música segue um encadeamento pouco convencional,

carregada de acordes de empréstimo modal, acordes substitutos, modulações,

enfim, o que até nos deixa confusos sobre o centro harmônico principal da música,

Page 71: Jazz Amazônico - Conjecturas

76

que é a tonalidade de Si bemol menor. No entanto, apesar destes processos, houve

uma referência interna, regional, na elaboração harmônica, pois o encadeamento

utilizado baseia-se na utilização do Im – VI(maj7), progressão bastante comum na

música popular paraense, segundo o compositor, como por exemplo, nas músicas

de Paulo André e Ruy Barata, Alfredo Reis, Vital Lima, que foram inspiração nesta

música. É aí que se encontra presente o aspecto regional, diz o compositor:

Apesar de não ser exclusivo da música paraense, a progressão Im7 – VI(maj7) é bastante utilizada na nossa música popular, dando um clima característico à MPP (música popular paraense). Há inúmeras músicas que podemos tocar com essa progressão, e foi nisso que pensei quando fiz essa harmonia.

Apesar da composição não apresentar características muito evidentes da

música amazônica como, por exemplo, o processo rítmico, que seria o mais

esperado de se encontrar, não se pode dizer que não é uma música paraense, e

não apenas por que foi composta no Pará por um compositor da terra, mas porque,

certamente, há na sua execução certo “gingado” amazônico, que se tocada por

músicos de fora, seguramente soaria diferente. Um exemplo é o “beat” da música,

que não é tão frenético, revelando toda calmaria do homem amazônico.

• Música “Amassando Açaí” de Tynnôko Costa (faixa nº 15)40

A música “Amassando Açaí”, como já colocado, foi composta para a formação

“Big Band” em 1999, especialmente dedicada à “Amazônia Jazz Band”,

provavelmente a mais conceituada “Big Band” do Pará.

Segundo o compositor, a música é resultado de suas pesquisas no que se

refere ao aproveitamento dos ritmos folclóricos amazônicos, neste caso, o Carimbó,

para a aplicação de tendências e vertentes da música instrumental para orquestra

nos seus mais variados estilos.

40 Extraído de fita de vídeo: acervo TV Cultura. Apresentação da Orquestra “Amazônia Jazz Band” no Festival internacional de música (2000).

Page 72: Jazz Amazônico - Conjecturas

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A música inicia com os ganzás41, as maracás42 e curimbós43, fazendo a base

rítmica do carimbó, distribuído da seguinte maneira, em 8 compassos:

Após a repetição destes compassos, inicia-se, no compasso 9, uma melodia

executada pela marimba, em 8 compassos, que toca um tema bastante clichê do

carimbó que, no entanto, é executada em intervalos de quartas aumentas,

evidenciando a sonoridade quartal, típica do jazz. Depois, a melodia se repete,

acrescentando-se o xilofone, que faz o mesmo desenho melódico uma terça abaixo.

A partir do compasso 17, o tema inicial se mantém enquanto o 1º clarinete

entra, tocando uma escala hexafônica ascendente e descendente, em 8 compassos

que também se repetem, e nesta repetição, entram o 2º clarinete, que toca a mesma

escala do 1º clarinete em um intervalo de 3ª menor abaixo, e a flauta, que toca a

primeira melodia da marimba, o clichê de carimbó, uma oitava acima. A introdução

da escala de tons inteiros, neste trecho, pretende caracterizar a máquina do açaí

funcionando: “é aí que se começa a amassar o açaí!”, brinca o compositor.

No compasso 25, a peça ganha uma sonoridade mais grave, em que o

piano, a guitarra e o contrabaixo tocam uma melodia em uníssono em suas regiões

graves, em 8 compassos que se repetem, e depois, unem-se a eles os instrumentos

mais graves dos sopros (sax barítono, trombones e tuba) que tocam a mesma

melodia que os instrumentos de base, também em uníssono. Neste momento, há

uma sonoridade bastante caracterizada pela música brasileira, em especial o baião,

devido a célula rítmica empregada.

41 Instrumentos feitos de pequenos cestos entrelaçados, enchidos com areia ou pequenas pedras. 42 São feitas artesanalmente de cabaças, sementes ou arroz e cabo de madeira. 43 Tambor feito de tronco escavado, coberto com pele de animal (cobra, anta, veado), que é posicionado horizontalmente permitindo que o executante sente em cima para poder tocá-lo com as mãos.

Page 73: Jazz Amazônico - Conjecturas

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A partir do compasso 41 há uma mudança de sonoridade, pois toda massa

sonora que vinha tocando antes cessa e apenas as madeiras (clarinetes, saxes e

flauta) entram, tocando uma melodia tipicamente nordestina. O compositor revela

que este trecho de característica nordestina tem a função de lembrar a influência

que esta música exerceu na música paraense, sobretudo em Roraima (sul do Pará).

Em uma nova mudança de sonoridade, a partir do compasso 53, totalmente

diferente da temática inicial, mostra-se a influência norte-americana, numa

sonoridade mais pop, quase como um “funk” (estilo bem característico da música

negra norte- americana que foi fortemente influenciada pelo jazz) que, no entanto,

conserva o ganzá e as maracás do carimbó, que tocam em um ritmo divido em

“carimbó+funk”.

Uma concepção mais progressiva do tema acontece a partir do compasso

73, em que o compasso muda de forma radical para 7/8, e em 38 compassos, o

tema é desenvolvido de modo que o ritmo de carimbó é aplicado em compassos

ímpares. Nas palavras do compositor: “É aí que se amassa mesmo o açaí”. Neste

momento, a parte harmônica da música também passa a desenvolver-se mais,

demonstrando o tom mais progressivo da música.

O tempo binário volta no compasso 81, em que ocorre uma espécie de

ponte ou frase harmônica em bloco tutti, e a percussão pára por algum tempo, para

que haja uma nova frase do naipe de metais. No compasso 89, a melodia principal

do tema retorna juntamente com a percussão tocando em ritmo de carimbó, e

enquanto isso, o restante da orquestração resume todas as vertentes já executadas

antes.

Depois faze-se um retorno ao “segno” ( ), compasso 41, relembrando a

influência nordestina.

A música ganha o “ar” mais rústico típico do carimbó, a partir do compasso

114, em que busca caracterizá-lo com todos os seus elementos, o mais próximo do

carimbó de “raiz” possível: a percussão, realizando a célula básica do carimbó já

demonstrada, a flauta, os clarinetes e o sax-alto que excutam frases típicas do

carimbó acompanhados pela guitarra, que neste momento, toca como se fosse um

banjo folclórico, em termos de execução e também da harmonia executada, que toca

a progressão “V7-I”, bem característica do carimbó. Isso tudo é executado em 24

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compassos e após isso, ocorre um “break” (parada) tutti, menos a percussão que

segue, enquanto no compasso 124 começa a ser formada uma “pirâmide

harmônica”, técnica bastante utilizada pelo compositor em suas orquestrações,

finalizando a música com a frase inicial, só que executada em tom menor.

Portanto, nesta música, Tynnôko utiliza como “ingrediente” principal o

carimbó, em diversas formas: com suas características tradicionais e também

mesclando com diversos outros estilos, transformando-o e adaptando-o.

O jazz, ao longo da composição, faz-se presente primeiramente na forma

instrumental utilizada, que é a formação “Big Band”, surgida no Brasil no início do

séc. XX influenciada pelas “jazz bands” do estilo new orleans, dixieland e

principalmente do swing (década de 40), bem como nas orquestrações ao longo da

música, como por exemplo, a forma quartal no início, os desenvolvimentos

harmônicos (especialmente os compassos de 53 ao 70, em que há uma

progressividade na harmonia, não sendo executada somente a harmonia típica do

carimbó, que é a progressão “V7 – I”, como já foi colocado, passando a ter um

caráter um pouco mais complexo). Há também a “pirâmide harmônica” na parte final

da música, em que instrumentos graves dos sopros tocam a nota base “sol” o piano

toca o acorde “G7(alt)44” e aos poucos os outros instrumentos vão complementando

o acorde em intervalos dissonantes a partir de uma nota centro.

Essa música tem em diversos aspectos uma sonoridade jazzística, mas

também, mescla outras sonoridades em si, fazendo jus ao objetivo do compositor

que era unir; misturar vários estilos ao “ingrediente” principal: o carimbó. Portanto, o

jazz acaba sendo mais um dos muitos compostos desta música, em que

apresentam-se, seus elementos, de certa forma “diluídos” no decorrer da música.

44 O acorde de sol alterado significa que o acorde é uma acorde dominante podendo ser formado por todas suas alterações possíveis: b9, #9, #11 ou b5 e b13.

Page 75: Jazz Amazônico - Conjecturas

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após as análises feitas, pode-se perceber que na música instrumental

produzida em Belém, de fato, há referências externas e internas que se encontram.

No entanto, talvez neste encontro, a fusão ainda seja um tanto superficial, em que

os elementos amazônicos aparecem apenas como espécie de citação ou elemento

exótico na composição. Ou quando não, é possível perceber de forma bem nítida

onde está cada componente, pois há pouca proximidade entre eles, os elementos

estão numa mesma música, mas quase que separados, pois não estão fundidos

suficientemente a ponto de podermos vê-los como fazendo parte de um só. Mesmo

que ocorra o processo de “fricção de musicalidades” sugerida por Piedade (2005),

para dizermos que fazem parte de um mesmo complexo, seria necessária uma

proximidade maior entre os gêneros, para haver de fato uma fusão.

Pode ser que a música instrumental paraense ainda esteja num processo de

amadurecimento, caminhando para uma fusão mais profunda entre o jazz a música

amazônica. Pelo menos é esse o desejo que pode-se supor que exista, quando

observamos, por exemplo, os nomes dos grupos instrumentais. Sempre há uma

alusão à música norte-americana somada à música amazônica, como por exemplo:

“Zarabatana (instrumento de guerra utilizado pelo índio – caracteriza a raiz, o

regional) Jazz” (caracteriza a influência externa, denotando que se trata de um

trabalho sobre os aspectos mais contemporâneos da música popular; sobre os

parâmetros do jazz). “Cumbuca (referência a um objeto – cabaça grande com boca

estreita – bastante característico da região amazônica, do índio) Jazz” (influência

externa) e “Amazônia Jazz Band”, bastante sugestivo, sendo que sua própria

tradução explica a intenção: Banda de Jazz da Amazônia.

Portanto, se não se pode afirmar com precisão que o que se produz em

Belém é um “Jazz Amazônico” (devido ao número reduzido das obras e

compositores averiguados e também de acordo com as análises feitas), poderemos

então, afirmar que existe uma música instrumental produzida no Pará, neste caso,

em Belém, que está dentro dos parâmetros contemporâneos da Música Instrumental

Brasileira. Música esta que, no entanto, carrega em si todo um “gingado”, que

poderíamos chamar de “sotaque amazônico”, mesmo que não haja na composição

elementos técnicos e musicais evidentes da música regional. Mas, pelo simples fato

Page 76: Jazz Amazônico - Conjecturas

81

de ter sido composta na terra, por compositores da terra, já carrega em si forte

caráter e sangue amazônida, que se traduz subjetivamente na forma de tocar do

músico, que está envolvido, mesmo que inconscientemente, na atmosfera cabocla

da região.

Talvez este sotaque permaneça sempre um sotaque, ou talvez seja apenas

um fruto de uma nova vertente musical que poderá emergir no Pará.

É importante que haja averiguações neste sentindo, e este trabalho pode ser

um ponto de partida aos questionamentos e incentivo às indagações e pesquisas

nestes termos.

O renomado compositor Paulo André Barata, acredita que os compositores

estão preocupados em traçar um mapa rítmico do Pará, para definir o que seria a

música paraense, mas ele pensa que tal preocupação é vã, pois quando se refere à

música popular paraense diz: “Não existe música paraense e sim, músicos

paraenses” (FIUZA, 2007, p.6). Portanto, pensa que não há algo de original, uma

música de fato nossa. Observando essa afirmação, advertimo-nos do quanto é

importante que haja pesquisas acerca do que rege e constitui a música popular

paraense, em todas suas áreas.

Há tão poucos, ou quase nada de estudos ou pesquisa acadêmica a este

respeito, principalmente quando se trata da música urbana instrumental no Pará. É

fundamental que estudantes de música possam compreender o que acontece na

contemporaneidade da música popular em nossa cidade, observando e analisando

a produção musical urbana e os processos de construção desta música. Para tanto,

precisam estar abertos às mais diversas influências, compreendendo a música

como um espaço de diversidade, e no momento em que ocorrer o encontro de

influências externas e internas na produção musical local, ponderar os resultados.

A opinião de Paulo André só vem confirmar a urgência e necessidade de

pesquisas mais profundas neste aspecto, que só podem ser realizadas pela

instigação às pesquisas desde as primeiras séries do estudo musical por parte do

professor de música, que colaborará para a construção de um ser humano ativo,

que ao mesmo tempo é pensante, reflexivo e podendo ser também construtor, do

processo de tradução, evolução e compreensão do contexto cultural que está

inserido.

Page 77: Jazz Amazônico - Conjecturas

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ANEXOS

Page 87: Jazz Amazônico - Conjecturas

92

ANEXO A – Partitura (guia) ”Festa no Curiaú” de Minni Paulo

Page 88: Jazz Amazônico - Conjecturas

93

ANEXO B – Partitura (guia) da música “Na Corda Bamba” de Ziza Padilha

Page 89: Jazz Amazônico - Conjecturas

94

ANEXO C – Partitura “Amassando Açaí” de Tynnôko Costa