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Jean plaidy - catarina, a viúva virgem

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  • CATARINA, A VIVA VIRGEM

    Jean Plaidy

    Ttulo original: KATHARINE, THE VIRGIN WIDOW

    Editora Record, Rio de Janeiro, 2001

    Traduo: Vera Whately

    Digitalizao: Dores Cunha

    Correo: Edith Suli

    SUMRIO

    A ArenaO casamento de Arthur, prncipe de GalesA tragdia no castelo de LudlowIntriga na casa de DurhamA morte de Elizabeth de YorkMs notcias da EspanhaMaria de RojasO protesto do prncipe de GalesA traio de Dona Elvira

  • Joana na InglaterraO encontro de Filipe com FernandoA misteriosa morte de FilipeCatarina, a embaixadoraA estranheza de JoanaFuensalida na corte do reiNa casa de GrimaldiJoana em TordesilhasO rei Henrique VIIIA rainha Catarina

  • A ARENA

    O SOL LANOU seus raios nas paredes cinzentas das torres, fazendoas brilhar como sefossem diamantes. O calor era to intenso que os cortesos suavam debaixo dos cintures, porcima dos quais vinham os elegantes gibes guarnecidos de rendas; eles no se mexiam nem para jogar para trs os mantos demangas soltas. Todos os homens e mulheres da corte tinham os olhos fixos na arena, onde um leo um dos melhores emais ferozes animais do rei empenhavase numa luta sangrenta contra quatro mastins ingleses. Os ces eram fortes evalentes, mas aquele leo nunca fora vencido. Ele rugia com desprezo para os ces, e os espectadores o aplaudiam.

    Agora, Rex, comece a trabalhar gritou um menino, sentado entre os convidados dorei. De rosto rosado, com o cabelo cobreado brilhando luz do sol, sua voz estridentedenotava grande animao.

    A menina sentada ao seu lado, um pouco mais velha que ele, colocou a mo no seu braopara tentar contlo; vrias pessoas desviaram a ateno dos animais para as crianas.Muitas sentiramse contagiadas pela animao, vitalidade e alegria do prncipe Henrique.

    Mas Henrique estava absolutamente concentrado na luta na arena. Queria que os mastinsvencessem, embora no acreditasse que isso fosse possvel. Rex era o melhor leo domundo, haja vista o nome que lhe haviam dado.

    O rei observava a cena do seu lugar de honra. Sentavase empertigado, mas suas roupasno eram to luxuosas quanto as de muitos de seus sditos, pois ele era contra desperdiartanto dinheiro para se apresentar num show ao ar livre. Dinheiro, na sua opinio, devia serusado para gerar mais dinheiro. Essa foi sua poltica desde os tempos de Bosworth Field. Ecom isso conseguira multiplicar o tesouro esgotado, fiscalizando tudo cuidadosamente com seuolhar avaro e fazendo crescer ainda mais os cofres reais com seus sutis esquemas. Porm o rei era o primeiro aadmitir que devia muito aos seus dois hbeis ministros Richard Empson e Edmund Dudley que agora se sentavam pertoda famlia real, com olhos alertas de advogados.

    O olhar do rei recaiu sobre a rainha, uma bela mulher de quem ele era secretamenteorgulhoso. Mas o rei da Inglaterra no era homem de mostrar seus sentimentos, e nuncadeixaria que Elizabeth de York soubesse o quanto ele a estimava. Como seu direito ao tronoera duvidoso e como havia suspeita de ilegitimidade entre seus antepassados, era preciso ser cauteloso.E Henrique VII era um homem muito cauteloso.

    Elizabeth era uma boa esposa, e o rei nunca se arrependeu de ter se casado com ela,mesmo considerando seu amor juvenil por Maud Herbert e sua paixo mais madura porKatherine Lee. Ele no era homem de deixar que as emoes interferissem nas suasambies.

    Uma vez que Ricardo III fora derrotado e Henrique ficara sabendo que sua grande ambioestava a ponto de ser concretizada, ele deixou de pensar em Katherine Lee; sabia que uma nicanoiva lhe convinha, Elizabeth deYork, e que por meio desse casamento as Casas de ork e Lancaster seriam unidas, levando apaz Inglaterra.

    Henrique VII nunca deflagaria uma guerra se pudessse evitla; para ele, a guerra erasinnimo de perda de dinheiro.

    Henrique olhou para sua famlia e permitiuse um sentimento de prazer, e um rpidosorriso passou pelos cantos da sua boca sria. Dois filhos e duas filhas.

    Bastante bom, bastante bom murmurou para si prprio.Elizabeth engravidara seis vezes, e eles tinham perdido apenas dois filhos at agora;

    considerando o destino da maioria das crianas, era de fato uma grande sorte.Porm, Arthur o mais velho, o prncipe de Gales que ainda no completara quinze

  • anos, era um menino doentio. Sua beleza, o rosado do rosto e a pele clara no eram um sinalde sade. Arthur tossia muito, e s vezes chegava a cuspir sangue.

    O rei teria ficado muito angustiado com a fragilidade de Arthur se no fosse por Henrique,seu outro filho, um prncipe que encheria os olhos de qualquer pai. Todos olhavam agora paraaquele menino de dez anos, como sempre olhavam quando a famlia real passava diante dasmultides. Era o jovem Henrique que o povo aclamava. Era para ele que todos sorriam.Felizmente, Arthur tinha um timo gnio e no era nada invejoso. Talvez vivesse cansadodemais para sentir inveja, talvez fosse grato ao seu irmo robusto e cheio de vitalidade, ummenino que se mostrava novo em folha depois de sair a cavalo o dia inteiro, um menino quesempre sabia como responder aos aplausos do povo.

    Entre os dois prncipes, sentavase Margarida, uma princesa de ar muito digno, sriademais para os seus doze anos; Margarida vigiava constantemente seu exuberante irmoHenrique, mas ele no se ressentia disso. Era bonito ver aquela afeio entre um irmo e umairm. Do outro lado de Henrique, sentavase Maria, uma encantadora menina de cinco anos,um tanto teimosa, muito bonita, mas mimada demais.

    Quatro filhos, pensou o rei, e Arthur o nico cuja sade nos preocupa. A filha de Eduardohavia cumprido bem o seu dever.

    A rainha virouse para ele e sorriu, lendo seus pensamentos. Ela sabia que quando omarido olhava assim para as crianas, estava pensando que ainda havia tempo para elesterem mais filhos.

    Elizabeth de York controlou o sbito ressentimento que aflorou dentro dela. O nicoverdadeiro desejo do seu marido era manter seu trono. Ela sabia que Henrique a estimava, no porsua beleza ou talento, mas por ela ser filha de Eduardo IV, pois foi esse casamento que tornou possvel levar paz Inglaterra;alm disso, ela lhe dera filhos, quatro dos quais estavam vivos.

    Os espectadores estavam tensos, e a ateno do rei estava agora na arena, pois a lutano estava correndo conforme se esperava. Rex encontravase deitado de costas, com umdos mastins preso na sua garganta e os outros saltandolhe em cima e rasgando sua carnecom as presas sangrentas.

    O prncipe Henrique levantouse. Eles venceram o Rex gritou. Oh, bravo... bravo!Os espectadores gritaram ao verem Rex ali imvel e sem vida, enquanto os ces

    continuavam a mordlo. A Rainha encostouse ligeiramente no rei. Eu no acreditava que os ces pudessem derrotar o leo. O rei no respondeu; chamou

    um dos encarregados das jaulas dos animais. Leve os ces embora, retire a carcaa do leo da arena e volte para falar comigo.Quando o homem fez uma mesura e saiu para obedecer s ordens do rei, as crianas

    comearam a conversar animadamente. Henrique falou aos gritos: Voc viu? Arthur, voc viu...? Eu no gosto desse esporte murmurou Arthur. Henrique riuse dele. Eu gosto mais de esporte que de qualquer outra coisa do mundo, e nunca tinha visto

    uma luta como esta. O que aconteceu com o leo?perguntou Maria, mas ningum lhe deu ateno.Margarida pegou no brao de Henrique. Fique quieto sussurrou. No est vendo que nosso pai no est satisfeito?Henrique virouse para o rei.

  • Mas por qu...? Eu pensei que fosse um bom esporte. Eu... Os olhos srios do reirecaram sobre o filho.

    Henrique, um dia voc vai aprender que o que voc pensa muito mais interessantepara voc prprio que para os outros.

    Henrique ficou intrigado, mas era impossvel reprimir sua exuberncia.O rei fez um sinal para um dos encarregados das jaulas e disse: Agora solte os ursos e os ces bravos.A Platia ficou chocada.Diante deles, na arena, viamse uns patbulos dos quais pendiam os corpos dos quatro

    mastins ingleses, aqueles mesmos que meia hora antes haviam lutado com tanta bravuracontra o leo mais feroz do rei.

    O rei observou a plateia em silncio, juntamente com seus conselheiroschefes, Dudley eEmpson.

    A farsa terminara, mas ningum devia esquecerse da ideia que ela pretendia passar.Os ces tinham sido condenados morte por traio, por terem ousado destruir o leo

    Rex. Eles eram traidores.O rei mandou que a sentena fosse lida antes que as cordas fossem colocadas no pescoo

    dos animais, depois disse com sua voz baixa e sombria: Que assim morram todos os traidores!Seus sditos olhavam para os ces que se contorciam, mas era no rei que estavam

    pensando.Na verdade, Henrique devia ser um homem apavorado, pois no podia resistir a mostrar a

    todos qual era o destino daqueles que tentavam ultrapassar o poder dos reis.Ele levantouse de repente, e sua famlia e seu squito prepararamse para seguilo.No haveria mais jogos naquele dia.As Crianas fugiram para seu jardim particular. Estava agradvel l fora, com uma brisa

    soprando do rio.Todos mantinhamse mais calados que o normal, muito impressionados com o enforcamento

    dos quatro mastins. Eles sempre se reuniam ali, naquele jardim gostoso com um forte aroma de rosas, quando os pais iampassar uns dias no palcio da Torre de Londres. No momento, aproveitavam aquela familiaridade; tinhamse assustado muitocom a cena que haviam presenciado e era confortante estar num lugar to protegido assim. Para eles, aquele era seu jardimparticular; ali sentiamse afastados das cerimnias que tomavam grande parte das suas vidas. Os grandes muros da Torre doBero e da Torre do Poo formavam um bastio contra olhos curiosos. Ali, eles podiam esquecer que eram prncipes eprincesas, podiam ser apenas crianas. Henrique quebrou o silncio.

    Mas por qu? Aqueles quatro mastins valentes... traidores! Como eles podiam sertraidores? perguntou.

    Maria comeou a chorar. Ela adorava cachorros e ficara encantada quando os quatrovenceram o cruel leo. Se no lhe tivessem dito tantas vezes que princesas no choram empblico, ela teria se derramado em lgrimas quando viu as cordas sendo colocadas em voltado pescoo dos ces.

    Quietinha, Maria disse Margarida, que os mantinha em ordem como se fosse a maisvelha. Algum tinha de manter a famlia em ordem, e Arthur era um intil nesse sentido.

    Obedientemente Maria parou de chorar, mas ficou claro que no conseguia esquecersedos mastins.

    Arthur virouse para Henrique, parecendo muito mais velho naquele momento. tudo muito fcil de entender disse.

  • Mas eu no entendo gritou Henrique. Porque voc ainda um menino, apesar de toda sua arrogncia disse Margarida. No me chame de menino. Eu sou da mesma altura que Arthur. Pode at ser, mas isso no o torna um adulto explicou Margarida. Nosso pai mandou enforcar os cachorros porque eles usaram sua fora contra Rex. Rex

    era o rei das feras do nosso pai; alis,Rex significa rei. Nosso pai mostrou quela gente o que acontece com aqueles que usam

    sua fora contra os reis disse Arthur, num tom desanimado. Mas os cachorros foram levados arena para lutar insistiu Henrique. Isso no faz

    sentido. As atitudes dos reis nem sempre parecem fazer sentido disse Arthur. Mas eu faria sempre o bom senso prevalecer. Eu... eu... eu! murmurou Margarida. Voc usa esta palavra mais que qualquer

    outra. Ento um rei no deve mostrar aos seus sditos que ele um homem de bom senso?

    perguntou Henrique. No respondeu Arthur. Ele s precisa mostrar que um rei temido. Eu no quero que os cachorros morramfalou Maria, caindo em prantos.Margarida ajoelhouse, tirou um leno do bolso e enxugou as lgrimas da irm. No lhe disseram que no bonito uma princesa chorar como se fosse uma

    camponesa? Mas eles mataram os cachorros. Puseramlhes uma corda em volta do pescoo. Eles

    mataram... Eu sei que todos os traidores devem ser enforcados, mas... disse Henrique com voz grossa. Vamos falar de outra coisa ordenou Margarida. Quero que esta criana pare de

    fazer essa barulhada. Maria, o que sua nova irm diria se a encontrasse com essa cara debeb choro?

    Maria parou de chorar; obviamente j se esquecera da morte dos cachorros e estavapensando na nova irm.

    Pense s, ela vai atravessar todo o oceano para ser nossa irm. Ento, em vez dequatro seremos cinco continuou Margarida.

    Arthur afastouse do grupo, fingindo examinar uma das rosas. Estava sem jeito comaquela conversa sobre seu casamento iminente. Sentiase muito mais constrangido com issodo que queria admitir.

    Ela grande como voc?perguntou Maria olhando para Margarida. Maior, ela mais velha que eu. Da idade do nosso pai? No seja tola. Mas mais velha que Arthur. Ento deve ser muito velha. Arthur no realmente muito velho falou Henrique. Eu sou quase da idade dele. Bobagem falou Margarida. Voc cinco anos mais moo. Ento, dentro de cinco anos eu tambm vou me casar. Margarida disse secamente:

    Voc est destinado Igreja,Henrique. Portanto, no vai poder se casar.

  • Eu me caso, se quiser protestou Henrique, com os olhinhos enviesandose no seurosto gorducho.

    Deixe de falar bobagem. Talvez Arthur tambm no se case continuou Henrique, que no gostava da ideia de o

    irmo fazer uma coisa que ele no pudesse fazer. Essa espanhola j devia estar aqui hmuito tempo.

    Arthur virouse e olhou para todos, depois disse: Os navios dela sofreram um desastre. Essa viagem longa e perigosa. Mesmo assim, ns ouvimos dizer h tempos que ela j tinha partido... e ainda no

    chegou disse Henrique. H tempestades na baa de Biscaia falou Margarida. Talvez ela tenha se afogado gritou Henrique com um ar vingativo Nesse caso, voc

    tambm no vai se casar.Arthur assentiu, com seu jeito calmo, mas no parecia nem um pouco preocupado com

    essa possibilidade.Pobre Arthur, pensou Margarida, ele no est achando graa nenhuma em ser marido.De repente, lhe ocorreu que o assunto da noiva espanhola no era realmente um tpico

    muito mais feliz que o da morte dos mastins. Eu vou jogar uma partida de tnis falou Henrique de repente. Isso significava que ele

    iria procurar seus amigos, pois Arthur no era um parceiro sua altura.Encontraria um rapaz bem forte e, sem dvida, ganharia dele; no s porque detestava

    perder e seu parceiro sabia disso, como porque era realmente muito bom em esportes. Arthurse trancaria no seu quarto para ler um livro ou pensar na vida. Margarida entregaria Mariapara as empregadas, e iria bordar com umas companheiras para conversar um pouco; masacabaria pensando no casamento de Arthur com a infanta da Espanha e em outroscasamentos que seriam arranjados. Era quase certo que o prximo seria o seu. Ela no teriatanta sorte quanto Arthur, que pelo menos ficaria em seu prprio pas. Possivelmente, teria departir para um pas selvagem, alm da fronteira.

    A Rainha pde retirarse para seus aposentos mais cedo do que imaginava. O espetculoa enojara e alarmara. Ela ficou chocada com o fato de o marido ter trado a si prprio daquelaforma. No ousou olhar para ele, sentado ali diante daqueles corpos enforcados, mas sabiaexatamente qual seria sua expresso. Seus lbios estariam apertados e seu olhar enviesado ecalculista. Elizabeth compreendia mais a natureza do marido do que ele podia imaginar. Aolongo dos anos, ela se fartara de ver como uma coroa fascinava alguns homens e mulheres;ela os vira enfrentar desastres e morte para conseguir e manter uma coroa.

    Mas Henrique, seu marido, no compreendia isso. Ele no a compreendia em absoluto, enem tentava compreender. Era um homem fechado em suas emoes, e no as partilhavacom ningum. S por duas coisas ele era capaz de trair uma paixo avassaladora: pela coroae por ouro. E a rainha sabia que ele amava a coroa e o ouro com uma intensidade com queno amava nenhuma outra coisa ou pessoa.

    Elizabeth de York no era mais jovem, completara trinta e cinco anos em fevereiro ltimo; edurante esses trinta e cinco anos, o que mais lhe faltou foi segurana.

    Seu pai, um homem belssimo, era louco pela filha e planejoupara ela um grande casamento; quando ela completou nove anos foi prometida para

    Carlos, o filho mais velho de Luiz XI. Elizabeth lembrava que naquela poca todos a chamavam

  • deMadame Ia Dauphine, e lembravase tambm das suas aulas de francs. Era imperativo,dizia seu pai, que ela falasse fluentemente a lngua do pais onde um dia iria morar. Alm disso,ela aprendeu a escrever e a falar espanhol.

    Pensando naqueles dias, a rainha disse a si mesma, "O espanhol ser til quando a infantachegar... se que a infanta chegar um dia."

    Casamentos reais! S se podia ter certeza de que eles se realizariam na hora em quefossem celebrados! Seu casamento com o delfim nunca se realizou; ela lembrouse daocasio em que chegou ao palcio de Westminster a notcia de que Luiz aspirava mo deMargarida da ustria para o filho.

    Seu pai ficou colrico; o sangue subiulhe ao rosto e seus olhos ficaram injetados. Elemorreu logo depois disso, segundo alguns, devido raiva que essa notcia lhe causou.

    Desde aquela poca, ela passou a ter medo desse tipo de emoes. Esse foi o incio dosproblemas. com o pai morto e a coroa nas mos do tio, ela prpria, sua me e alguns outrosmembros da famlia refugiraramse no santurio, de onde seus irmos menores foramlevados e mandados para a Torre esta mesma torre onde ela estava sentada agora. Emalgum lugar ali, estavam enterrados os corpos dos dois jovens prncipes que tinhamdesaparecido to misteriosamente dos seus aposentos. Ela lembravase muito bem dosirmozinhos que tanto amava. O que fora feito deles? Eles eram um obstculo para o trono.Para seu tio Ricardo? Ou para seu marido Henrique?

    Ela no ousava pensar no destino daquelas crianas.Tudo isso ocorrera h muitos anos. Seu tio Ricardo, que pensara em casarse com ela,

    morreu em Bosworth Field. E ento, teve incio a dinastia dos Tudor.Foi aquela ocorrncia com os mastins que fez com que a rainha desenterrase o passado.

    O medo de traio do seu marido, sua determinao de mostrar o que aconteceria a qualquerum que se levantasse contra ele.

    Foi nesse estado de esprito que Henrique a encontrou. Ela sabia que o marido tinha ido vla para saber o que sua esposa estava sentindo com relao ao espetculo da arena, embora noperguntasse nada. Ele nunca pedia sua opinio nem seu conselho. Ela era apenas sua consorte. O desejo de preservar suaprpria supremacia estava sempre presente. Elizabeth considerava isso uma fraqueza, que Henrique tentava esconder com suaarrogncia.

    Est descansando? perguntou ele.O rei entrara nos aposentos dela sem se anunciar. Ela, que se lembrava do aparato de

    realeza com o qual o pai se rodeava, no conseguia acostumarse a isso.Elizabeth estendeulhe a mo, que ele beijou sem grande entusiasmo. O calor na arena estava insuportvel disse ela. A certa altura, eu tive medo de

    Arthur no resistir.O rei fechou a cara e disse: A sade do rapaz deixa muito a desejar. A rainha concordou, e murmurou: Mas o pequeno Henrique est se parecendo cada dia mais com meu pai.O rei aprovou aquela observao. Ele gostava de lembrar que o av materno do seu filho

    era Eduardo IV; mas sem querer que Elizabeth percebesse a extenso do seu orgulho, disse: Tomara que ele no herde os vcios do seu pai. Meu pai tinha muitas virtudes protestou Elizabeth. Suas virtudes lhe deram fora para lutar pelo trono e para aliciar muitos homens para o

    seu lado, mas foram seus vcios que o mataram. Tomara que Henrique novenha a ser um apreciador de boa comida e de vinho e, principalmente, de mulheres.

  • Henrique saber cuidar de si. com Arthur que eu estou preocupada. Em breve, a infanta estar aqui e o casamento ser celebrado falou Henrique, esfregando as mos e iluminando o rosto srio com um sorriso.Elizabeth sabia que ele estava pensando no dote da infanta e congratulandose pelo fato

    de no haver uma aliana mais vantajosa que a aliana com a Espanha.Henrique virouse para a rainha. Preciso prestar bastante ateno no Fernando. No tenho certeza de que ele

    confivel. Vai tentar fazer com que todas as vantagens fiquem do seu lado. Voc tambm bem esperto lembroulhe a esposa. Henrique assentiu. Eu tive necessidade de desenvolver essa esperteza. Ficarei muito contente quando o

    dote chegar s minhas mos e a cerimnia do casamento for realizada. Ao que parece, o que est detendo a nossa infanta no a diplomacia do pai dela,

    porm o mau tempo. Ah, o mau tempo. Os ventos da baa de Biscaia so insuportveis, mesmo no vero. Qual foi a ltima notcia da viagem?O rei hesitou. Ele no passava esse tipo de informao para ningum, nem mesmo para

    seus ministros. Mas no fazia mal contar para a esposa em que ponto estava a viagem dainfanta.

    Eu ouvi dizer que sua esquadra ainda se encontra em Laredo, o porto para onde elesforam forados a voltar devido s tempestades. Parece que Fernando e Isabel esto mantendo a infanta l de propsito, paraatrasar sua chegada Inglaterra.

    Possivelmente, a rainha est achando difcil separarse da filha.O rei falou com impacincia: Essa moa se tornar a princesa de Gales. Eles deviam estar to aflitos com esse

    atraso quanto ns.Havia muita coisa que ele no conseguia entender e nunca entenderia, pensou Elizabeth. A

    nica emoo do seu marido era sua desmedida ambio. Mas eu ouvi dizer que a rainha Isabel no est gostando nada de perder a filha falou

    a rainha. E ainda dizem que ela uma grande rainha!Henrique ficou pensativo, lembrandose dos boatos que ouvira sobre o relacionamento do

    rei espanhol com a rainha, com quem sua prpria famlia estaria em breve ligadapor meio do casamento. Diziam que Isabel no se esquecia nunca de que era a rainha de

    Castela e a mais importante do casal real. Henrique olhou rapidamente para sua rainha,agradecendo ao destino por ter se casado com ela.

    Abriu a guarda por um instante e disse: Eu creio que alguns de nossos sditos ficaramum pouco chocados com o enforcamento dos traidores.

    Os quatro ces? Acho que muitos ficaram mesmo. E a senhora?Era to raro ele permitirse um tom pessoal no relacionamento deles que Elizabeth levou

    um susto. Eu... eu fiquei surpresa. No uma morte agradvel disse o rei. Mas bom que de vez em quando isso

    seja lembrado aos homens ambiciosos.Henrique sorria, mas com um sorriso frio. Estava pensando em dizer esposa que

  • pretendia enviar um marinheiro ingls para Laredo um mestre de Devon, que poderia trazer a frota da infanta espanhola para a Inglaterra

    sem mais atrasos mas mudou de ideia.Elizabeth sempre criticava suas iniciativas, e ele no queria saber de crticas de nenhum

    homem ou mulher. Assuntos de Estado exigem minha ateno. Hoje noite virei visitar a senhora disse

    ele.Elizabeth baixou a cabea em sinal de aquiescncia, mas ficou com medo. Ser que teria

    de enfrentar mais uma gravidez, ter mais um filho que provavelmente no chegaria maturidade?

    Fazia pouco tempo que o pequeno Edmundo tinha morrido. Quando os bebs resistiam poralgum tempo, a me se acostumava demais presena deles. Edmundo era uma crianabonita, mas era terrvel sofrer tanto desconforto, ter tanta dor, para dar luz um bebfraquinho, com quem ela se preocuparia at ele no conseguir resistir mais!

    Eu estou velha demais para ter outro filho, pensou. Mas no disse nada. De que adiantariadizer ao marido que j lhe dera seis filhos e que quatro estavam vivos?

    No era o suficiente?A resposta do marido seria fria e direta. Ele falaria que uma rainha deve continuar a ter

    filhos enquanto for possvel. Diria que era seu dever real.Ser que Henrique s vezes pensava em Katherine Lee, sua dama de honra? Se pensava,

    nem mesmo Katherine sabia. Elizabeth duvidava de que Henrique lhe fosse infiel, mesmo empensamento.

    Ela se casara com um homem estranho, mas pelo menos ele era um marido fiel. Henriquetinha relaes sexuais com um nico propsito: ter filhos. E ter filhos com outra parceira queno sua esposa seria um ato desnecessrio, na sua opinio.

    Havia momentos em que a rainha da Inglaterra desejava deixar de lado sua dignidade e rirsozinha; mas esse riso seria histrico, e a rainha era to pouco dada a exploses histricasquanto seu marido.

    Ento, ela fez um sinal de assentimento e disse a si mesma que devia informar s outrasmulheres que naquela noite o rei dividiria a cama com ela.

    O CASAMENTO DE ARTHUR, PRNCIPE DE GALES

    A INFANTA FICOU no convs vendo a costa espanhola sumir de vista. Quando ela veria

    seu pas de novo? pensou.Dona Elvira Manuel, a governanta sria e temvel a quem Isabel confiara a infanta e suas

    damas de honra, tambm observava a terra que estava deixando, mas no foi solidria com atristeza da infanta. Ela comeou a demonstrar a sua autoridade quando saiu da Espanha, eElvira era uma mulher que amava o poder.

    Colocou a mo no brao da infanta e disse: No se entristea. Vossa Alteza vai para uma terra nova, onde ser rainha um dia.A infanta no disse nada. Como poderia esperar que Elvira Manuel compreendesse? Ela

    rezava em silncio, rezava para ter coragem, para no trazer desgraa sua famlia, para nose esquecer de nada que sua me lhe ensinara.

    Foi um erro pensar na sua me naquele momento. Lembrouse daquele rosto srio porm

  • amoroso, que mudara tanto nos ltimos anos. Lembrouse da rainha Isabel, sempre muitoquieta e digna, mas ao mesmo tempo cheia de energia e determinao. A tristeza amodificara, aquela tristeza que a acometia quando ela olhava para seus filhos to queridos.

    Na Espanha eu era muito amada, pensou a infanta. O que ir me acontecer na Inglaterra?Quem ir me amar l? Eu no sou nem ao menos bonita como minhas damas de honra.Comparada a elas, vou parecer mais feia ainda. No foi gentil do meu sogro exigir que todasas minhas damas de honra fossem bonitas.

    Tudo ser diferente murmurou ela. Vossa Alteza falou alguma coisa? perguntou Elvira Manuel. Eu s falei que nessa terra nova nada ser como era na Espanha. At mesmo meu

    nome ser pronunciado de forma diferente. De agora em diante no serei mais Catalina, e simCatarina. E dizem que na Inglaterra praticamente no h vero.

    L no pode ser mais frio do que em algumas partes da Espanha. Mas ns vamos sentir falta do sol. Quando Vossa Alteza tiver seus filhos no vai se importar se o sol est brilhando ou no.A infanta virouse de costas e olhou para a gua do mar. Sim, pensou, um filho. Ela sabia

    que ficaria feliz quando tivesse seus filhos. E queria ter muitos. Seu signo era a rom, que emrabe significava fertilidade. Lembrouse das rvores de rom que cresciam em profuso nosjardins do Alhambra, juntamente com a mirta. Sempre que ela via seu signo e sabia que aolongo da vida no se esqueceria dele , lembravase dos ptios de Granada e da guacaindo nas fontes. Pensava na sua infncia, nos pais, no irmo e nas irms. Ser que sentiriasempre tanta saudade assim quando pensasse neles? Talvez quando tivesse seus prpriosfilhos superasse esse desejo de voltar infncia.

    Mas ainda faltava muito para ter filhos; e nesse meiotempo, sentiria saudade de casa. Oh, memurmurou , eu daria tudo que tenho para estar com a senhora agora.Nos aposentos reais do Alhambra, a rainha Isabel tambm estaria pensando nela agora.

    Estaria rezando pela segurana da filha at a sua chegada Inglaterra; e para que ocasamento de Catarina com o prncipe ingls fosse frutfero, que Catarina chegasse felicidade que fora negada s suas irms, Isabel e Joana, e ao seu irmo Joo. A infantaestremeceu quando Elvira Manuel disse num tom cortante:

    Est vindo uma brisa, Vossa Alteza. melhor voltar para sua cabine. No estou com frio respondeu Catarina, sem sentir o vento. Estava pensando nos

    dias em que todos eles se reuniam no quarto de brinquedos; no tempo em que ela se sentavano joelho da sua me enquanto as irms, Isabel e Maria, bordavam seus tapetes e JoQ liaalto para elas. Sua irm Joana no bordava nem lia, nem ficava quieta ao p da me; airrequiteta Joana causava grande ansiedade a todos!

    Sua irm Isabel e seu irmo Joo morreram tragicamente; Maria fora recentemente paraPortugal, a fim de se casar com o vivo de Isabel, Manuel, rei de Portugal. Ela seria feliz l,pois Manuel era um nobre gentil e cuidaria bem de Maria devido ao grande amor que devotara sua irm. E Joana? Quem podia dizer o que estava acontecendo com Joana? Sua vida nuncatranscorreria com tranquilidade. Havia boatos de que as coisas no corriam bem no seucasamento com o belo arquiduque Filipe, e que na corte de Bruxelas havia muitas cenasviolentas de cimes que terminavam numa estranha conduta de Joana.

    A infanta sempre percebera que sua irm Joana no deixava sua me ser feliz.Mas aquela era a famlia que ela estava deixando. Como seria a nova famlia qual se

  • ligaria? Arthur, Margarida, Henrique e Maria disse os nomes baixinho. Eles seriam seus

    companheiros agora, e ela passaria a ser Catarina, no mais Catalina.Ela estava indo para um pas estranho. O rei e a rainha da Inglaterra seriam seu pai e sua

    me de agora em diante. "Ns cuidaremos da infanta como se fosse nossa prpria filha, e suafelicidade ser nossa principal preocupao...", escrevera o rei da Inglaterra para sua me,que lhe mostrara essas palavras.

    Est vendo? Voc vai ter uma nova famlia, e talvez se esquea depressa de ns todos disse a rainha.

    Naquele dia, ela no conseguiu preservar a dignidade considerada necessria infanta daEspanha, e voou para os braos da me soluando.

    Eu nunca me esquecerei de vocs. Nunca deixarei de querer voltar para casa.Sua me chorara com ela. S ns, seus filhos, sabemos como ela doce, pensou a

    infanta. S ns sabemos que ela a melhor me do mundo e que necessariamente ficaremosde corao partido quando a deixarmos.

    A despedida do pai foi diferente.Ele abraoua afetuosamente, beijoua, mas seus olhos estavam cheios de lgrimas;

    no de tristeza pela partida da filha, mas por sua satisfao com aquele casamento. Por ele,Catarina j teria sido mandada para a Inglaterra h muito tempo. Fernando precisava daaliana com a Inglaterra, e estava ansioso por esse casamento. Ele gostava dela, mas osmaiores amores de sua vida eram o poder e o dinheiro; seu sentimento pelos filhos vinhasempre em segundo lugar, comparado s vantagens que eles podiam lhe trazer.

    Portanto, no tentou esconder a alegria com a partida da filha. Ele no era um homemnada sutil.

    Ora, filha, voc vai ser a princesa de Gales, e eu garanto que em pouco tempo ser arainha da Inglaterra. Mas no vai se esquecer da sua ptria, no ?

    O significado de suas palavras era diferente do significado das palavras de sua esposa. Arainha dizia: Voc se lembrar do amor que temos uma pela outra, da felicidade que tivemosjuntas, de tudo que eu lhe ensinei e que ir ajudla a enfrentar suas dificuldades comcoragem. O rei Fernando dizia: No se esquea de que voc uma espanhola. Quando estiverna corte da Inglaterra, fique sempre alerta a possveis vantagens para a Espanha.

    Escreva sempredisse Fernando, bem perto do seu ouvido. foce sabe quais os canais para me mandar informaes secretas.A infanta fechou os olhos, depois olhou para as guas cinzentas.Uma tempestade estava realmente se formando. Os perigos do mar se aproximavam. E se

    o navio no conseguisse chegar Inglaterra?Ela segurouse na balaustrada e pensou em Isabel e Joo que no tinham mais de se

    preocupar com os males da Terra. Quanto tempo levaria ainda para sua me se encontrarcom esses dois filhos?

    Aqueles pensamentos eram ruins. Ela ainda no tinha dezesseis anos e j pensava namorte.

    S naquele momento, percebeu a extenso do seu medo.Isso covardia, disse para si mesma. Como posso saber o que me espera na Inglaterra?Enjoada com o balano do navio, com frio e molhada da gua do mar, Catarina ficou ali no

    convs observando a terra aproximarse cada vez mais.

  • Inglaterra! A terra onde um dia ela seria rainha.Elvira estava ao seu lado. Vossa Alteza deve prepararse para o encontro com o rei. A senhora acha que ele estar em Plymouth para me receber? Certamente, e o prncipe tambm. Vamos! Precisamos nos aprontar para o encontro.As duas foram para a cabine, e as damas de honra juntaramse em volta delas. Todas

    mais bonitas que eu, pensou Catarina; e imaginou Arthur olhando para elas, e desapontandose por sua noiva ser a mais feia de todas.

    O porto aonde vamos chegar fica longe de Londres disse Elvira. Ouvi dizer que aviagem at a capital leva trs semanas.

    Trs semanas! pensou Catarina. No importava o desconforto que ela teria de aguentar,mas sim o fato de a cerimnia do casamento ter de ser adiada trs semanas!

    Quando ela terminou de se aprontar para ir para o convs, o navio j estava ancorado. Osol comeava a brilhar, refletindose na gua. sua frente viase a linda costa de Devon,com o campo mais verde que ela j vira na vida, salpicado de arbustos dourados.

    Eles haviam finalmente chegado a Plymouth Hoe, onde um grande nmero de pessoascarregavam bandeiras dizendo "Bemvinda a princesa de Gales!" "Deus abenoe a infanta daEspanha!".

    Quando Catarina chegou ao convs com suas damas e sentiu que estava sendocalorosamente saudada pela multido, ganhou nova vida. Depois, ouviu os sinos tocarem e viuum pequeno barco aproximandose do navio, com um grupo de homens esplendidamentevestidos.

    O mestre ingls que as levara ss e salvas at a Inglaterra chegou perto da infanta, fezuma reverncia e disse:

    Vossa Alteza est livre do mar. Chegamos a Plymouth Sound, e o povo de Devon estansioso para mostrar sua alegria em recebla. O prefeito e seu conselho administrativovieram darlhe formalmente as boasvindas.

    Catarina virouse para o intrprete que estava ao seu lado e mandou que ele perguntassese o rei e o prncipe de Gales encontravamse em Plymouth.

    Eu acho que eles no fariam essa viagem at Plymouth, Vossa Alteza foi a resposta. A viagem de Londres at aqui leva trs semanas. Mas ns recebemos ordens pararepresentlos at que eles prprios possamlhe oferecer uma recepo real.

    Catarina achou que eles estavam dando uma desculpa para a ausncia do rei e doprncipe. No era preciso tanta preocupao, pois ela estava aliviada de ter mais algum tempoconsigo mesma at se encontrar com eles.

    A infanta recebeu o prefeito e o conselho administrativo com o mximo da graciosidade,como sua me esperaria dela.

    Diga que eu estou contente de estar aqui com eles falou para o intrprete. Sintome grata por ter escapado dos perigos do mar. Estou vendo uma igreja daqui. Gostaria de irat l para agradecer a Deus por ter chegado s e salva.

    Ns cumpriremos as ordens de Vossa Majestade disse o prefeito.Quando Catarina desceu em terra, o povo de Plymouth juntouse sua volta.Ora, ela ainda uma criana disseram. Embora seu rosto estivesse coberto por um vu,

    no havia dvida de que ela era muito jovem; muitas mes no meio da multido entristeceramse ao imaginar aquela menina saindo de casa para viver num pas estranho.

  • Como ela era corajosa! No dava nenhum sinal de inquietude. "Ela uma verdadeiraprincesa", diziam. "Deus a abenoe!"

    Catarina de Arago passou pelas ruas de Plymouth para agradecer a Deus por suachegada Inglaterra, e rezar para no incorrer em nenhuma ofensa ao povo do seu novo pase para agradar a todos da melhor forma possvel.

    Ao passar por aquelas ruas impregnadas do cheiro do mar, ela sentiuse mais animada.Sorriu para todos aqueles que queriam vla de perto. O modo franco dos ingleses lhe eraestranho, mas aquela demonstrao de alegria deu menina solitria um conforto infinito.

    A Viagem para Londres comeou. Foi inevitavelmente lenta, pois o povo da Inglaterra tinhaordens do rei de receber a princesa da Espanha calorosamente. Essas ordens eramdesnecessrias; eles estavam sempre prontos a encontrar uma razo para demonstrar suaalegria.

    Nos vilarejos e cidades por onde passava, a cavalgada era detida pelo povo. A princesatinha de apreciar as danas regionais e admirar as decoraes florais e as fogueiras feitas emsua homenagem.

    Todos sentiamse atrados por aquela princesa suave. Ela era muito criana, muitotmida, uma menina de grande dignidade.

    Foi uma viagem agradvel de Plymouth at Exeter, e Catarina espantouse com o calor eo brilho do sol. Tinhamlhe dito que ela s veria garoa e nvoas, mas o sol brilhava tantoquanto na Espanha, e os campos eram os mais verdes que ela j tinha visto.

    Em Exeter, a natureza da viagem mudou. Naquela cidade nobre, houve mais cerimnias emsua homenagem que em Plymouth, e ela percebeu que at chegarem a Londres as coisascontinuariam assim.

    Esperando para recebla estava Lord Willoughby de Broke, que declarou ser o AltoAdministrador da corte do rei e que recebera ordens expressas de Sua Majestade para fazero que fosse necessrio em prol do seu conforto.

    Catarina garantiu que no havia nada mais a ser feito, mas ele curvouse numa revernciae deu um sorriso grave, mostrando que ela no tinha ideia da extenso da hospitalidadeinglesa.

    Em volta dos alojamentos da infanta, havia guardas e soldados da milcia, todos deuniformes azulrei e brancoum lindo cenrio.

    Catarina conheceu o embaixador do seu pai na Inglaterra e na Esccia, D. Pedro de Ayala,um homem espirituoso e divertido, cuja permanncia em Londres parecia terlhe tirado adignidade espanhola. Teve tambm o prazer de conhecer o Dr. de Puebla, o homem queFernando dissera que ela devia procurar, caso tivesse algum assunto sigiloso a tratar com elena Espanha.

    Ela percebeu que esses dois homens eram at certo ponto espies de seu pai, comomuitos embaixadores eram para seus prprios pases. E que diferena entre os dois! D. Pedrode Ayala era um aristocrata, que tinha recebido o ttulo de bispo das Canrias. Bonito,elegante, soube encantar Catarina com seus modos refinados. Puebla era de origem humilde,um advogado que chegara quela posio por seu prprio valor. Era muito culto e desprezavatodos que no o fossem; colocava Ayala nessa categoria, pois o bispo passara a juventudenuma vida desregrada, j que vinha de famlia nobre e no considerava necessrio atingir umalto conhecimento.

    Os modos de Puebla eram irritantes, pois ele achava que se tudo tivesse acontecido como

  • ele gostaria, teria saudado a infanta sem a ajuda de Ayala. Ayala estava a par dossentimentos de Puebla com relao a ele, e fazia o que podia para agravar essa situao.

    Quando eles saram de Exeter, D. Pedro de Ayala foi cavalgando de um lado de Catarina,e Lord Willoughby de Broke do outro; Puebla ficou para trs, morrendo de raiva.

    Ayala conversou com Catarina em castelhano, pois sabia que Willoughby de Broke nopoderia entender.

    Espero que Vossa Alteza no tenha sido incomodada por Puebla, aquele sujeitoabominvel.

    De maneira nenhuma disse Catarina. Ele foi muito atencioso comigo. Cuidado com ele. Esse sujeito um aventureiro e alm do mais um judeu. Ele est a servio dos soberanos da Espanha disse ela. Sim, Alteza, mas seu nobre pai tem conscincia de que ele mais leal ao rei da

    Inglaterra que ao rei da Espanha. Ento por que no foi dispensado e substitudo por outro? Porque, Vossa Alteza, ele compreende o rei da Inglaterra, e o rei da Inglaterra o

    compreende. Ele est nesta terra h muito tempo. Em Londres, trabalha como advogado, evive como um ingls. Ah, eu sei de algumas histrias sobre ele. Puebla um avaro, to avaroque uma vergonha para o nosso pas. Mora numa casa de m fama, e eu ouvi dizer quequando no janta na mesa do rei, janta nesse cortio a dois centavos por dia. uma quantiamuito baixa para um homem da sua posio pagar, e eu ouvi dizer que o senhorio tem prazerem hospedlo a troco de certos favores.

    Que favores? perguntou Catarina. Puebla um advogado praticante, e vive em bons termos com o rei da Inglaterra. Ele

    protege seu senhorio contra a lei, Alteza. estranho meu pai empregar esse homem, se ele tudo o que o senhor diz. Sua Alteza acredita que ele tem uma certa utilidade. H alguns anos o rei da Inglaterra

    ofereceulhe uma diocese, que lhe teria dado uma boa renda. E ele no aceitou? Ele queria aceitar, Alteza, mas no podia sem o consentimento dos seus pais. E o

    consentimento lhe foi negado. Ento, ao que parece, eles valorizam seus servios. Oh, ele conquistou sorrateiramente a confiana do rei. Mas cuidado com esse homem,

    Alteza. Ele judeu, e um homem ressentido como todos eles.Catarina ficou em silncio, pensando como tinha sido desagradvel conviver com esses

    dois embaixadores que se detestavam tanto; e no ficou nada surpresa quando Pueblaaproveitou a oportunidade para prevenila contra Ayala.

    Ele um presunoso, Alteza. No uma pessoa confivel. Um bispo! No conhece nadade lei e nunca dominou o latim. Seu estilo de vida uma vergonha para a Espanha.

    E ele tem a coragem de se chamar de bispo! Ayala devia estar na Esccia agora! Foi paraisso que foi mandado para este pas.

    Meus pais no ficariam contentes de saber dessa discrdia entre seus doisembaixadores.

    Alteza, eles sabem disso. Eu estaria negligenciando meus deveres se no osinformasse. Portanto, seus pais foram informados por mim.

    Catarina olhou com desprezo para Puebla. Alm de no ter as boas maneiras de Ayala,

  • parecia pomposo, e ela achava que a mesquinharia dele, que fora notada por muitas de suasdamas, era humilhante para a Espanha.

    Eu usei Ayala na Escciacontinuou Puebla. Ele foi til l para consolidar asrelaes entre ingleses e escoceses, Alteza, o que desejava vosso nobre pai. A guerra entre aInglaterra e a Esccia seria embaraosa para ele naquela poca; Jaime IV estava protegendoo impostor Perkin Warbeck, e provavelmente iria apoilo.

    Warbeck pagou o preo por sua presuno falou Catarina. Estou vendo que Vossa Alteza parece informada sobre a poltica inglesa. Sua Alteza, minha me, fez questo que eu conhecesse alguma coisa do pas no qual eu

    iria morar.Puebla sacudiu a cabea. sempre possvel haver impostores assim quando dois jovens prncipes desaparecem.

    Nosso Perkin Warbeck dizia ser Ricardo, Duque de York. Que tristeza para a rainha da Inglaterra falou Catarina. Ela ainda chora a perda de seus dois irmos que desapareceram to misteriosamente

    na Torre de Londres? A rainha no pode mostrar seus sentimentos. Ela tem filhos, um bom marido e uma

    coroa, que no seria dela se seus irmos estivessem vivos. Mas mesmo assim, ela deve ter tristeza disse Catarina, pensando no seu prprio

    irmo Joo, que morrera jovem e lindo, poucos meses aps se casar. Ela nunca se esqueceria deJoo e do choque que teve com sua morte trgica.

    Bem, enfim Warbeck foi enforcado em Tyburn, e esse assunto foi encerrado. Isso seriasatisfatrio se Ayala no tivesse trocado a corte escocesa pela inglesa. Londres lhe agradamais que Edinburgo. Ele no gosta do clima frio do norte, nem da rudeza dos castelosescoceses. Portanto... agora est conosco.

    Ayala aproximouse deles. Dr. de Puebla disse, com um sorriso sarcstico , seu gibo est rasgado. Isso

    jeito de aparecer diante da nossa infanta? Puebla um poduro. Se Vossa Alteza olhar paraa forma do seu nariz vai saber por qu.

    Catarina ficou horrorizada com aquelas palavras de escrnio, e no olhou para Ayala. Alteza gritou Puebla , por favor, considere o seguinte: D. Pedro de Ayala pode ter

    um nariz de castelhano, mas as bolsas abaixo dos olhos revelam o tipo de vida que ele leva. Agente nasce com certo tipo de nariz, mas isso no sinal de vida desregrada e viciada...

    Ayala aproximou seu cavalo do cavalo de Catarina. No preste ateno a ele, Alteza. Ele um homem desclassificado; ouvi dizer que sua

    atividade em Londres a de usurrio. Mas o que se pode esperar de um judeu?Catarina bateu na anca do cavalo e adiantouse do grupo, ficando ao lado de Lord

    Willoughby de Broke.Estava alarmada. Aqueles dois homens, que no conseguiam controlar o dio que sentiam

    um pelo outro, eram quem seus pais tinham escolhido para serem seus guias e conselheirosdurante seus primeiros meses naquela terra estranha.

    Mas medida que a viagem transcorria, Catarina sentiase mais atrada pela alegria deAyala.

    Descobriu que ele era divertido e espirituoso, que estava sempre pronto a responder ssuas perguntas sobre os costumes do pas e, sobretudo, a contar bisbilhotices sobre a famlia

  • qual ela em breve pertenceria.Grande parte do tempo Catarina viajou de liteira, embora ocasionalmente montasse uma

    mula ou um palafrm. O ms de outubro na Inglaterra no era frio, mas havia muita umidadeno ar, e em geral o sol era visto apenas como uma bola vermelha atravs da nvoa. s vezes,caam umas pancadas de chuva, quase sempre breves; quando o sol aparecia por trs dasnuvens, Catarina aproveitava seu calor. Nos vilarejos aonde passavam, o povo saa s ruaspara ver a infanta, e eles eram recepcionados nas casas dos nobres locais.

    Nessas ocasies a comida era farta, e Catarina notou que seus novos conterrneosgostavam muito de comer. Os serviais das casas onde a comitiva era recebida juntavamsepara vla homens e mulheres de bochechas rosadas, gritando entre si e sempre rindo.Como eles eram diferentes dos espanhis! Pareciam ter pouca dignidade e pouco respeitopela dignidade dos outros. Mas eram francos; tinham gostado de Catarina e no hesitavam emdemonstrar isso.

    No fosse pelas dificuldades que ela sabia que a esperavam em breve, teria se divertidonaquela viagem por terras enevoadas sob um sol desbotado, com o exuberante povo debochechas rosadas.

    Em geral, Ayala seguia a cavalo ao lado da sua liteira, respondendo sempre s suasperguntas com a maior presteza. Ela trocara o pomposo Puebla de roupas velhas pelo alegreclrico, e Ayala estava determinado a explorar essa situao ao mximo.

    Fez com que a infanta sentisse que havia uma conspirao entre eles, o que at certoponto era verdade. Quando ele comeava a falar em castelhano, nenhum dos que estavam aliconseguia entender uma palavra do que era dito.

    Sua conversa era animada e escandalosa, mas Catarina achava que era disso que elaprecisava, e gostava de estar com ele.

    Vossa Alteza deve ter cuidado com o rei disse ele. No preciso temer Arthur; ele suave como uma criana. Poder ser moldado a seu modo... no preciso temlo. Masse seu noivo fosse Henrique, a coisa seria diferente. Agradea a todos os santos por Henriqueser o segundo filho e Arthur ter sido destinado Vossa Alteza.

    Fale o que sabe sobre Arthur. Ayala levantou os ombros. Ele um rapaz um pouco nervoso, rosado e branco, com cabelos dourados, meia

    cabea mais baixo que Vossa Alteza. Ser seu escravo. verdade que no tem boa sade? , mas vai superar isso. E parece mais fraco porque sempre o comparam com o

    robusto Henrique.Catarina ficou aliviada; estava adorando a ideia de um marido jovem e gentil. J comeava

    a pensar nele como seu irmo Joo, que era louro como um anjo e gentil a seu modo. O senhor disse que eu devo ter cuidado com o rei. O rei quieto e impiedoso. Se no gostar de Vossa Alteza no ter constrangimento em

    mandla de volta para a Espanha. Isso no seria nada desesperador para mim. Mas seria para seus pais reais. E pense na desgraa para Vossa Alteza e para a Casa

    da Espanha. O rei temvel? Ele ser gentil com Vossa Alteza, mas ficar sempre vigiando suas aes. No se

    engane com seus modos suaves. O rei vive com medo de que algum venha reivindicar

  • o trono e de que ele acabe destronado. Nem sempre confortvel manter uma coroa.Catarina assentiu, e pensou na discrdia que surgira nos primeiros anos de casamento dos

    seus pais, quando Isabel aderiu Guerra da Sucesso. H um mistrio em torno da morte dos dois irmos menores da rainha: o mais velho, rei

    Eduardo V e o mais moo, duque de York. Muitos dizem que eles foram assassinadosna Torre de Londres por seu tio, o aleijado Ricardo; seus corpos nunca foram encontrados,

    e os boatos ligados a essas mortes so de arrepiar os cabelos, Alteza.Catarina estremeceu, e disse baixinho: Pobres crianas. Agora no se pensa mais nisso, e o rei que se senta no trono um homem sensato.

    Casouse com a irm dos prncipes, portanto aderiu s duas faces opostas. Seria maissensato no pensar no passado, Alteza. Houve dois pretendentes para o trono: PerkinWarbeck e Lambert Simnel. Simnel, que fingia ser Eduardo Plantageneta, conde de Warwickesobrinho de Ricardo III, est agora servindo como ajudante de cozinha entre os serviais do rei. Ele era obviamente umimpostor, por isso o rei mandouo para a cozinha. Mas Warbeck foi enforcado em Tyburn. O rei gosta de dar demonstraesao seu povo, pois vive em perptuo terror de que algum tente destronlo.

    Eu espero cair nas boas graas dele. Seu dote j caiu nas boas graas dele, e Vossa Alteza tambm ir agradlo. E a rainha? No preciso temer a rainha. Ela a receber com muito carinho. A rainha no tem

    influncia sobre o rei, que insiste em mostrarlhe que no deve o trono a ela. Ele o tipo dehomem que no aceita conselhos de ningum; a nica pessoa que consegue influencilo dealguma forma a me dele. Vossa Alteza deve tentar agradar a Margaret Beaufort, condessade Richmond, se desejar agradar ao rei; e para tal, basta dar muitos herdeiros casa real.

    Eu rezo para que Deus me faa uma mulher frtil. Parece que todas as princesas rezampor isso.

    Se houver mais alguma coisa que Vossa Alteza queira saber em qualquer tempo, peoque pergunte a mim e ignore o judeu.

    Catarina fez uma mesura com a cabea. E assim transcorreu a viagem.O Rei saiu do palcio de Richmond, impaciente e ansioso para ver a infanta espanhola, que

    levara tanto tempo para chegar ao pas. Arthur estava fazendo uma visita ao Pas de Gales,onde foi muito bemrecebido; na opinio de seu pai, ele devia visitar de quando em vez oprincipado para lembrar ao povo que era o prncipe de Gales. Recebeu um recado do rei paraque fosse o mais rpido possvel a East Hampstead, para dar as boasvindas sua noiva.

    Henrique no gostava de viajar, pois no era homem de ao, e achava que as viagenscausavam despesas desnecessrias.

    Mas na ocasio do casamento do meu filho, ser preciso soltar um pouco resmungoupara Empson.

    Isso mesmo foi a resposta. Espero que tenhamos renda suficiente para essa ocasio disse o rei, suspirando. E

    Empson decidiu criar, ento, uns impostos para fazer frente s despesas extras.Henrique deu um sorriso desanimado, mas na verdade sentiase exultante por seu filho estar

    se casando com uma das princesas mais ricas da Europa. Era uma boa coisa aquela pequenailha ser aliada do pas mais poderoso do mundo; e que ligao melhor que no os laos domatrimnio?

    O que o rei mais precisava era de herdeiros, e se essa menina lhe desse isso, tudo estaria

  • bem. Mas ele estava um pouco ansioso a respeito da infanta. O irmo dela, herdeiro daEspanha, morrera logo depois do casamento. Exausto de ser marido, diziam alguns. Eleesperava que Catarina tivesse mais sade que o irmo. E seu filho Arthur? Sua tosse e osangue que cuspia denotavam fraqueza. Era preciso muito cuidado com Arthur, que ainda nemcompletara quinze anos. Ele seria jovem demais para enfrentar um casamento?

    O rei no consultara seus mdicos, no consultara ningum. Ele, e somente ele, decidiriase o casamento deveria ser consumado imediatamente ou se o casal real deveria esperarmais uns meses, ou talvez um ano.

    Gente jovem, pensou, podiam querer entregarse ao ato do amor sem nenhuma restrio.Mas ele no acreditava que esse fosse o caso de Arthur. com Henrique as coisas seriamdiferentes; ele no teria nenhuma preocupao se o noivo fosse Henrique. Mas, e a infanta?

    Ela seria uma mulher saudvel? Ou doente como sua irm mais velha, que morrerarecentemente de parto?

    Quanto mais o rei pensava sobre isso, mais ansioso ficava para conhecer a infanta.Houve uma certa confuso no grupo da infanta.Ayala recebera uma mensagem dizendo que o rei estava indo encontrarse com a noiva

    de Arthur; ela passara a noite na residncia do bispo de Bath, em Dogmersfield, que ficava aumas quinze lguas da Ponte de Londres.

    Ayala no passou a notcia para Puebla, pois estava determinado a esconder tudo daquelehomem; no s porque no gostava dele e no perdia uma oportunidade de insultlo, comotambm porque realmente acreditava que Puebla tendia mais a servir a Henrique VII daInglaterra que a Isabel e a Fernando da Espanha.

    Ento ele procurou Elvira Manuel. O rei est vindo encontrarse conosco para conhecer a infanta disse abruptamente. Mas isso impossvel falou Elvira. O senhor conhece as recomendaes de Sua

    Alteza. Conheo. A infanta s dever ser vista pelo noivo ou por qualquer elemento da corte

    inglesa quando estiver casada. E dever manter o vu no rosto at depois da cerimnia. Eu estou determinada a obedecer s ordens do rei e da rainha da Espanha disse

    Elvira. Os desejos do rei da Inglaterra no me importam. No sei o que Henrique dir sobre isso falou Ayala com um sorriso matreiro, pois

    achava a situao picante e divertida. Uma coisa certa continuou Elvira Manuel. Para evitar discrdias, o senhor deve

    encontrarse com o rei e explicarlhe tudo isso. Eu sairei imediatamente falou Ayala. Nesse meiotempo, a senhora deve avisar

    infanta.Ayala seguiu para East Hampstead, e Elvira Manuel, com os lbios apertados, preparou

    se para a batalha.Foi ver Catarina para lhe dizer que o rei desejava conhecla, mas que em hiptese

    nenhuma isso devia acontecer.Catarina ficou preocupadssima, receosa de que o rei da Inglaterra a considerasse

    extremamente grosseira com aquela recusa.Quando Arthur encontrouse com o pai em East Hampstead, Henrique achouo abatido e

    preocupado.

  • No, decidiu o rei, este casamento no ser consumado antes de um ano. De qualquerforma, duvido que Arthur seja capaz de consumlo.

    Ajeite os ombros, meu rapazdisse o rei. Voc est muito curvo.Arthur ajeitou a postura obedientemente, sem qualquer ressentimento. Como o jovem

    Henrique teria se comportado de forma diferente! Mas claro que no havia necessidade decriticar a conduta de Henrique.

    Ns temos de ter mais filhos, pensou o rei, angustiado. Bem, meu filho, muito em breve voc estar face a face com sua noiva. Sim, pai. No deve deixar que ela o considere uma criana. Ela quase um ano mais velha que

    voc. Eu sei, pai. Muito bem. Ento, preparese para conhecla.Arthur pediu permisso para se retirar e ficou contente quando chegou aos seus

    aposentos. Estava muito ansioso. O que deveria dizer sua noiva? O que deveria fazer comela? Seu irmo Henrique falava sobre esses assuntos com um tom matreiro. Eleja conheciamuita coisa sobre a vida. Henrique quem devia ter sido o filho mais velho.

    Ele seria um bom rei, pensou Arthur. Eu me sairia melhor na Igreja.Ficou pensando na paz da vida monstica. Que alvio! Ficar szinho, ler, meditar, no ter

    de tomar parte proeminente nas cerimnias, no ter de sofrer uma contnua reprovao por secansar depois de cavalgar poucas horas, por no poder jamais fazer a bela figura queHenrique fazia em todos os torneios.

    Se eu ao menos no fosse o primognito! murmurou para si mesmo. Se eupudesse milagrosamente mudar de lugar com meu irmo Henrique, como ficaria feliz!

    Na manh seguinte, o rei partiu para Dogmersfield, tendo ao seu lado o prncipe.Comeou a chover logo depois, e o rei olhou aflito para Arthur, que parecia no estar se

    sentindo bem na sela. Sua tosse voltaria se ele se molhasse; embora fosse fina, era umachuva penetrante.

    Arthur achava que era sua culpa no ter nascido forte. Ele tentou sorrir, como se adorasseandar a cavalo na chuva.

    Quando estavam a poucos quilmetros do palcio do bispo, o rei viu um cavaleirogalopando na direo deles e reconheceu logo o embaixador espanhol Ayala.

    Ayala parou diante do rei, tirou o chapu e fez uma graciosa reverncia. Eu fui avisado de que Vossa Majestade estava vindo ver a infanta. A informao est agora confirmada falou o rei. Nosso jovem noivo estava to

    impaciente, que quando soube que a infanta estava em Dogmersfield resolveu no esperarmais nada. Ele prprio voltou s pressas do Pas de Gales, pois est ansioso para ver suanoiva.

    Arthur tentava forar uma expresso que confirmasse as palavras de seu pai quando oembaixador espanhol deu um sorriso irnico na sua direo, mostrando que compreendia seunervosismo.

    Que pena! falou Ayala. Vossa Majestade no poder ver a noiva. Eu... no poderei ver a noiva? perguntou o rei com um tom frio na voz.O rei e a rainha da Espanha insistem que a filha deles observe os costumes das donzelas

    espanholas nobres. A infanta manter o rosto coberto com um vu at depois

  • da cerimnia; nem mesmo o noivo poder ver seu rosto antes disso.O rei ficou em silncio. Veiolhe uma terrvel suspeita, pois ele era um homem muito

    desconfiado. Por que ele no podia ver o rosto da infanta? O que os soberanos espanhistinham a esconder? Estariam lhe mandando uma criatura deformada? "S depois dacerimnia." Essas palavras pareciam de mau agouro.

    uma condio bem estranha disse Henrique. um costume espanhol. Eu no gostei disso.Virou a cabea ligeiramente e disse por cima do ombro. Vamos formar um conselho, meus senhores. Temos um assunto urgente a decidir.

    Senhor embaixador, com licena. No levaremos muito tempo para chegar a uma deciso.Ayala fez uma mesura com a cabea e dirigiuse para o lado da estrada, enquanto o rei

    indicava com a mo um campo prximo. Venha conosco, Arthur. Voc precisa fazer parte deste conselho disse o rei.Seguiu com o filho para o centro do campo, e seu squito reuniuse sua volta. Ento ele

    disse ao grupo: Eu no gostei disso. No me permitiram ver a noiva do meu filho, embora ela esteja nas

    minhas terras. No desejo agir contra a lei a esse respeito, portanto o conselho deve decidir oque deve ser feito. A infanta casouse com o prncipe por procurao. O que temos dedecidir se ela j minha sdita desde ento; se for, temos de saber que lei probe que eu aveja se desejar. Eu vos rogo, senhores, que considerem este assunto na maior brevidadepossvel, pois a chuva no d sinal de diminuir e ns estaremos ensopados quando chegarmosa Dogmersfield.

    Houve um murmrio entre os conselheiros, enquanto Henrique os observava a distncia.Como sempre, ele havia declarado o que desejava e esperava que seus conselheiros lheobedecessem. Se algum deles criasse objees aos seus desejos, mais tarde seriaconsiderado culpado por alguma ofensa; no iria para a priso, mas teria de pagar umavultosa multa.

    Todos sabiam disso. Muitos tinham pago altas multas por pequenas ofensas. O rei nopensava mal deles depois que a multa era paga. O que o aplacava era o dinheiro.

    Em poucos segundos o conselho tomou sua deciso. Em um reinado, o mestre absoluto o rei; ele no tem de se sujeitar a nenhuma lei ou

    costume estrangeiro. Todos os sditos do rei devem obedecer aos seus desejos; embora ainfanta tenha se casado com o prncipe de Gales por procurao, ela uma sdita do rei.

    Os olhos de Henrique brilharam de satisfao, mas com ligeiro pesar. No futuro ele nopoderia, com justia, extrair uma bela multa de nenhum deles.

    Esta resposta era a nica que eu esperava dos senhores disse. No se podeimaginar que o rei no tenha permisso de ver qualquer de seus sditos.

    Saiu do campo onde seus conselheiros estavam reunidos e dirigiuse para Ayala, queesperava do outro lado da estrada.

    A deciso foi tomadadisse, virandose depois para Arthur. O senhor pode liderar nossa cavalgada at Dogmersfield. Eu irei na frente.Esporeou o cavalo e saiu galopando; Ayala, rindo por dentro, seguiuo de perto.Os soberanos da Espanha iriam saber que Henrique da Inglaterra no era homem de

    receber ordens, pensou o embaixador. Ficou imaginando o que Dona Elvira Manuel diria

  • quando se confrontasse com o rei da Inglaterra.Catarina estava sentada com suas damas de honra quando sentiu que havia uma confuso

    no corredor de baixo. O tempo estava muito ruim para elas sarem do palcio do bispo, porisso tinham decidido esperar at a chuva passar.

    Elvira surgiu, e Catarina ficou espantada com sua agitao. O rei est l embaixo disse ela. Catarina levantouse alarmada. Ele insiste em ver Vossa Alteza. Declarou que vai ver Vossa Alteza de qualquer forma.

    Eu nem posso imaginar o que seus pais reais diro quando souberem disto. Mas o rei da Inglaterra no foi informado do desejo dos meus pais? Ao que parece, h apenas uma pessoa cujos desejos so considerados neste pas, ou

    seja, o rei da Inglaterra. O que est acontecendo l embaixo? O conde de Cabra est dizendo para o rei que Vossa Alteza s deve ser vista depois do

    casamento, e o rei est dizendo que no ir esperar at l. S h uma coisa a ser feita falou Catarina com calma. Ns estamos na Inglaterra, e

    enquanto estivermos no pas do rei devemos obedecerlhe. Vamos parar com essesprotestos. Vamos esquecer nossos prprios costumes e adotar os costumes deles. V dizerque estou pronta para receber o rei.

    Elvira olhou atnita para ela; Catarina estava igual me, e nem mesmo ela teve coragemde desobedecer s suas ordens, pois estaria desobedecendo a Isabel de Castela.

    Catarina olhou na direo da luz, com o vu jogado para trs.Viu o sogro, um homem de estatura pouco acima da mdia, to magro que suas

    vestimentas ficavam soltas no corpo; seu cabelo louro, quase at os ombros, estava escorridoe molhado; o manto que cobria seu gibo era debruado de arminho no pescoo e nas mangaslargas. Ele tinha lama na roupa e at mesmo no rosto. Viase que havia viajado a cavalonaquele tempo inclemente, e que no achara necessrio tirar a sujeira da viagem antes deencontrarse com ela.

    Catarina sorriu e deixouse examinar por aqueles olhos alertas e astutos, que procuravamalgum defeito, alguma deformidade que os pais da infanta quisessem esconder.

    Henrique no falava espanhol nem latim. Catarina aprendera um pouco de francs com aesposa do seu irmo Joo, Margarida da ustria; mas a estada da cunhada na Espanha foracurta, e depois que ela partiu Catarina no teve mais ningum com quem falar naquela lngua.Henrique falou em ingls:

    Bemvinda Inglaterra, minha senhora infanta. Meu filho e eu esperamos ansiosos porsua chegada durante meses. Se ns fomos rudes em deixar de lado os costumes do seu pas,pedimos perdo. A senhora h de compreender que agimos assim pelo grande desejo quetnhamos de lhe dar as boasvindas.

    Catarina tentou responder em francs, mas acabou passando para o espanhol. Fez umareverncia diante do rei, enquanto ele examinava os detalhes da sua figura. Aquela infantaespanhola era saudvel, mais que seu frgil Arthur. Era tambm bem mais alta, e seus olhos esua pele eram claros. Ela era robusta; no voluptuosa, porm forte. No tinha grande beleza,mas era saudvel e jovem. Seus pais s pretenderam escondla dele e do noivoexclusivamente em razo dos costumes espanhis. A nica coisa realmente bonita nela eramseus cabelos fartos e grossos, cabelos saudveis, de tom ligeiramente avermelhado.

    Henrique ficou satisfeito.

  • Catarina falava com ele agora na sua prpria lngua, e embora ele no a compreendessesabia que ela estava respondendo s suas boasvindas com graa e charme.

    Tomou a mo da infanta e levoua at a janela.Depois fez um sinal para Ayala, que acabara de entrar na sala. Diga infanta que estou muito contente.Ayala traduziu, e Catarina respondeu que a bondade do rei deixavaa muito contente

    tambm. Digalhe que em poucos minutos seu noivo vai chegar a cavalo ao palcio, frente do

    seu squito. Eles no podem estar a mais de meia hora daqui.Ayala transmitiu tambm essas palavras para Catarina, e ela sorriu.Ela estava entre o rei e Ayala quando viu seu noivo pela primeira vez.Ele parecia muito pequeno frente de todo aquele grupo; primeira vista parecia muito

    jovem, mais que ela, e parecia tambm muito assustado, mais que ela.Naquele momento, a infanta ressentiuse menos do seu destino.E determinou que ela e Arthur seriam felizes para sempre.No final da noite, Catarina estava quase bonita luz da vela, com o rosto afogueado e os

    olhos cinza cheios de entusiasmo. Suas damas de honra, todas escolhidas a dedo, eram naverdade muito belas. Dona Elvira Manuel sentouse a distncia, com a cara amarrada. Nopodia esquecer que os desejos de seus soberanos tinham sido ignorados.

    A infanta tinha convidado o rei e o prncipe para cear em seus alojamentos no palcio dobispo; na galeria, os menestris tocavam. A ceia foi prolongada, e Catarina espantouse,como sempre, com a quantidade que se comia na Inglaterra. No banquete daquela noite,foram servidos porco, galo, pavo, galinha, carneiro e vaca, tortas deliciosas, veado, peixe eaves silvestres, tudo regado a vinho seco e vinho doce.

    Os ingleses lambiam os lbios e mostravam sua admirao pela comida, e at os olhos dorei brilhavam de prazer. S aqueles que o conheciam podiam imaginar que ele estavacalculando quanto teria custado aquele banquete; se o bispo podia fazer frente quelasdespesas poderia contribuir com a mesma generosidade para o tesouro pblico, sempre vidopor mais.

    O prncipe sentouse ao lado de Catarina. Tinha maneiras elegantes e pareciaexcessivamente crtico; sua camisa era impecavelmente limpa, de uma seda fina no colarinho enos punhos. Seu manto era debruado de pele como o do seu pai, e seu cabelo louro caalheno rosto, brilhando como ouro, j quase seco da chuva.

    Sua pele era leitosa, com um ligeiro rosado nas bochechas, e os olhos azuis pareciamafundados na rbita. Seu sorriso era doce e um tanto tmido, e Catarina sentiuse atrada porele. Arthur no se parecia nada com o pai, nem com Fernando. Isabel lhe contara que naprimeira vez em que viu Fernando achouo o homem mais lindo do mundo. Catarina nopensava assim sobre Arthur, mas Isabel de Castela, depois de conhecer Fernando de Arago,decidiu que s se casaria com ele, e enfrentou graves problemas para evitar os casamentosque lhe tentaram impingir.

    Nem todos os casamentos podiam ser iguais ao de Isabel e Fernando, e mesmo elestiveram momentos de discrdia. Catarina lembravase das brigas entre seus pais em razodo poder. Ela sabia que tinha outros irmos, filhos s do seu pai.

    Quando Catarina olhou para Arthur, teve certeza de que o casamento deles seria diferentedo de seus pais.

  • Arthur conversou com ela em latim, pois no falava espanhol e ela no falava ingls.Isso seria remediado em breve, disse o prncipe. Ela lhe ensinaria sua lngua, e ele lhe

    ensinaria a lngua dele. Arthur agradeceu a Catarina as cartas que ela lhe escrevera, eCatarina agradeceu a Arthur as cartas dele.

    Eram cartas rpidas e formais em latim, escritas por insistncia dos pais, sem dar ideia darelutncia de ambos com relao quele casamento; mas agora que tinhamse conhecido,eles sentiamse confortados.

    Estou ansiosa para conhecer seu irmo e suas irms disse Catarina. A senhora os conhecer muito em breve. O senhor deve sentirse contente de viver entre eles. Os meus irmos se separaram

    de mim h muito tempo. Todos eles. A senhora deve ter sofrido muito com isso. Catarina baixou a cabea. A senhora vai gostar dos meus irmos continuou ele. Margarida tem muito bom

    senso, vai ajudla a compreender nossos costumes. Maria ainda muito criana e bastantemimada, mas muito charmosa. Quanto a Henrique, no momento em que a senhora oconhecer vai ter pena de ele no ser o primognito do meu pai.

    E por que eu teria pena disso? Porque a senhora vai ver que ele melhor que eu em todos os sentidos; se fosse o filho

    mais velho do meu pai, viria a ser seu marido. Mas ele um menino, no ? Tem dez anos, mas j tem a mesma altura que eu. cheio de vitalidade, e as ovaes

    do povo so sempre dirigidas a ele. Eu acredito que todos gostariam que ele fosse oprimognito. Mas como no , certamente ser o arcebispo de Canturia, e eu usarei a coroa.

    O senhor preferiria ser o arcebispo de Canturia? Arthur sorriu para ela. Sentiu queseria uma rudeza admitir isso, pois se ocupasse esse cargo no se casaria com ela. Ento,disse timidamente:

    Eu j preferi, mas agora acho que mudei de ideia. Catarina sorriu. Era tudo muito maisfcil do que ela imaginara. Elvira aproximouse dela e cochichou no seu ouvido:

    O rei gostaria de assistir a umas danas espanholas. Gostaria de ver Vossa Altezadanar. Vossa Alteza s deve danar com uma de suas damas de honra.

    Acho que vou gostar disso.Catarina levantouse e escolheu duas de suas damas de honra para danarem com ela

    uma das danas mais majestosas da Espanha. A uma ordem sua, os menestris comearam atocar.

    As trs graciosas moas danando solenemente luz de vela criaram um belo cenrio.Arthur ficou observando, com os olhos claros brilhando de prazer. Como a infanta era

    graciosa! Que maravilha poder danar sem perder o flego!Os olhos do rei a examinavam. A menina era saudvel, pensou. Teria muitos filhos. No

    havia nada a temer. Alm do mais, Arthur sentiase atrado por ela; parecia ter amadurecidoum pouco naquela ltima hora. Ele estaria pronto? Que problema! Talvez aquele meninohipersensvel ficasse apavorado na hora de ir para a cama com ela, talvez achasse que eraimpotente. Por outro lado, se ele provasse que no era impotente, ser que no se excederiae acabaria comprometendo sua sade?

    O que fazer? Esperar? No faria mal nenhum esperar. Talvez seis meses. Um ano. Mesmoassim, os dois ainda seriam muito crianas.

  • Bem que Henrique podia ter sido seu filho mais velho!Ayala ficou colado ao rei, matreiro, tentando adivinhar seus pensamentos. A infanta disse que como no quer que Vossa Majestade pense que na Espanha todas

    as danas so solenes, ela e suas damas de honra lhe mostraro outros tipos de danas. Eu terei prazer nisso falou o rei.L estava a infanta, graciosa, digna, charmosa e alegre como uma cigana, rodopiando pelo

    salo com as saias fartas, suas mos brancas to expressivas quantos seus ps. Catarina deArago sabia danar bem.

    O rei bateu palmas, e o prncipe fez eco aos aplausos do pai. Estamos gratos s senhoras da Espanha por nos terem apresentado este lindo

    espetculo disse Henrique. Creio que nossas danas inglesas no tm o mesmo mritoque as suas, mas como a infanta danou para o prncipe, o prncipe deveria danar para ainfanta. O prncipe de Gales ser o parceiro de lady Guildford em uma de nossas danasinglesas.

    Arthur entrou em pnico. Como ele poderia se comparar a Catarina no salo? Ela odesprezaria. Veria como ele era pequeno, como era fraco; ficou apavorado a ponto de perdero flego e comear a tossir, como lhe acontecera muitas vezes. Seu pai no ficaria nadacontente com isso.

    Lady Guildford sorria para ele; Arthur a conhecia bem, pois ela era governanta de suasirms, e eles sempre danavam juntos. O toque de seus dedos frios o confortou; enquantodanava ele percebeu o olhar grave e observador da infanta, e pensou: ela uma moa gentil,vai compreender, no h nada a temer.

    Terminada a dana, ele sentouse mais uma vez ao lado da infanta. Estava um poucoarquejante, mas sentiase muito feliz.

    Chegou o dia do casamento. Catarina esperava no palcio do Bispo de St. Paul para serescoltada catedral para a cerimnia. Ela seria levada ao altar por seu cunhado, o duque deYork, a quem j fora apresentada. Ele a deixara bastante preocupada com seu ar arrogante euma expresso que ela no conseguiu compreender. Era uma expresso quase sombria e umtanto irritada; Catarina sentiuse como se fosse um delicioso pedao de carne que eledesejava e que lhe fora tirado para ser dado a outra pessoa.

    Que coisa mais ridcula! Ela no era um pedao de carne. E por que um menino de dezanos ficaria irritado pelo fato de o irmo estar se casando?

    Ela imaginara aquilo; mas mesmo assim ficou muito animada ao pensar que veria o duquede York de novo.

    Catarina tinha sado de Lambem para Soutwark, passando pela Ponte de Londres, e seujovem cunhado foi escoltla.

    Henrique era um garoto bonito. Entrou nos alojamentos da infanta como se fosse o prpriorei, magnificamente vestido, com um gibo de cetim de mangas cortadas de uma forma extravagantee a gola adornada de rubis. Seu rosto era largo, a boca grande, os olhos azuis e fortes, mas to pequenos que quando ele sorriapareciam desaparecer no meio do rosto rosado. Sua pele era clara, brilhante e saudvel; o cabelo era louro, com um tomavermelhado. Ningum poderia ter dvida de que ele fosse um prncipe. Era difcil acreditar que ele tivesse apenas dez anos,pois parecia mais velho que Arthur. E Catarina ficou imaginando como se sentiria se aquele menino fosse seu noivo em vez doirmo.

    Mas eles no a teriam casado com um menino de dez anos. E por que no? Havia muitoscasamentos reais de grande incongruncia.

    Henrique tirou o chapu de plumas e fez uma reverncia para a infanta.

  • Madame, seu servo disse, mas seu olhar no demonstrava a humildade de suaspalavras.

    Henrique explicou em latim que estava ali para escoltla at Londres. So ordens do meu pai. Mas mesmo sem suas ordens eu teria vindo.Catarina no acreditava nisso e achouo um fanfarro; mas estava consciente do fascnio

    que ele exercia, e percebeu que ele sabia disso.Henrique olhou para o cabelo basto da infanta, que ela soltara para a viagem at Londres,

    e tocouo com seu dedo gordo. muito macio disse, com os olhinhos brilhando. Catarina sabia que estava estranha,

    com o cabelo solto debaixodo chapu preso por um lao dourado. Seu chapu parece um pouco com o que os cardeais usam. E ele riu, um riso tpico de

    um menino de dez anos. Henrique estava ao lado da infanta quando eles passaram pelas ruas,onde o povo se aglomerava para ver o cortejo; ela notou que embora algumas pessoas a olhassem com curiosidade, quasetodos se concentravam no jovem prncipe que cavalgava ao seu lado. Ele tinha conscincia disso e no perdia oportunidade decomprovar sua popularidade, fazendo tudo o que podia para ter o maior sucesso possvel.

    Os cidados de Londres haviam organizado um cortejo para dar as boasvindas princesa da Espanha, que consideravam sua futura rainha; no centro desse cortejo vinha

    Santa Catarina, rodeada de vrias virgens cantando em louvor da princesa de Gales.Catarina sorriu graciosamente para o povo, e eles a aclamaram aos gritos: "Salve a

    princesa de Gales! Deus abenoe a infanta da Espanha! Salve o prncipe de Gales! Salve oduque deYork!".

    Quando o jovem duque de Yok levantou o chapu para que a luz mostrasse seus cabeloslouros, Catarina teve de admitir que ele era um belo prncipe.

    Quando os dois chegaram ao palcio do bispo, adjacente catedral, foi o jovem duquedebrk quem pegou a mo da infanta e entrou com ela.

    Tudo isso acontecera uns dias antes, e agora ela iria se casar; mais uma vez aquele jovemcaminharia ao seu lado e a levaria at o altar, onde o irmo dele estaria esperando pela noiva.

    A infanta no conseguia se mexer no belo vestido de noiva, pois por baixo havia umaarmao de arame; na cabea ela usava uma mantilha de ouro, prolas e pedras preciosas. O vudescialhe pela cabea, escondendo o seu rosto. Catarina estava vestida como uma princesa espanhola, e aquele estilo erauma novidade na Inglaterra.

    Henrique chegou perto e olhoua admirado. Meu Deus, como a senhora est bonita! disse. bondade sua. Eu estou sendo sincero. No bondade minha, irm. Que bom que eu lhe agradei.Seus olhos diminuram ainda mais, de uma forma que j era conhecida dela. No a mim que a senhora pretende agradar. No verdade? Pretende agradar ao

    meu irmo. Eu desejo agradar a todos os membros da minha nova famlia. A senhora j agradou a Arthur e a Henrique. No importa que agrade s meninas. Oh, mas ... muito importante. A senhora vai agradar a Margarida se bordar bem. Mas seus olhos so lindos demais

    para se ocuparem com trabalho de agulha. Quanto a Maria, ela se agrada de todos que atratam bem. Mas a senhora me agrada porque bonita. No uma razo melhor?

  • Para bordar preciso aprender, o que me daria grande crdito. Mas ser bonita o queno acho que eu seja no me daria crdito nenhum.

    A senhora saber um dia que o povo da Inglaterra admira mais a sua beleza que osseus bordados disse ele com um ar srio. Henrique gostaria de pensar em alguma coisainteligente para dizer, algum tipo de observao que seu tutor, John Skelton, faria se estivessepresente. John Skelton era a pessoa a quem o prncipe mais admirava. Ele lhe ensinara muito,e no s atravs de livros de estudo. Henrique gostava da sua atitude corajosa e insolente eda sua presena de esprito, e tinha aprendido tudo o que ele lhe ensinara sobre ocomportamento de um cavalheiro e sobre muitas outras coisas. Skelton no era avesso sbisbilhotices sobre os hbitos escandalosos de alguns cortesos. Em geral, certasinformaes que deviam manterse secretas passavam entre eles, e nessas horas Skeltondizia: "Vossa Alteza tem de ser um homem, e tambm um arcebispo, e se por m sorte forforado a entrar para a Igreja ser melhor semear seus gros silvestres antes." Henriqueconhecia bem o tipo de gros silvestres que podiam ser semeados e tinha nsia de semelos. Tinha pena de o pobre Arthur ter como tutor o Dr. Linacre, um velho solene e sbio queensinavae tentava fazer com que Arthur concordasse com ele que o principal objetivo davida era o domnio do grego e do latim.

    Henrique queria dizer a Catarina que embora ele fosse um menino seria, sem dvida, ummelhor marido que Arthur, mesmo naquele seu estgio de vida. Porm, por mais precoce que omenino fosse, no sabia expressar esses sentimentos.

    Ento ele pegou na mo da linda noiva do seu irmo e levoua do palcio catedral,enquanto o povo aplaudia e gritava: "Que belo noivo nosso prncipe Henrique ser quandochegar seu dia!"

    Henrique ouvia e se deleitava com isso, mas ao mesmo tempo sentiase irritado. A vidalhe dera tudo, menos uma coisa de grande importncia. A vida lhe dera boa sade, beleza,vitalidade e grande capacidade, mas ele era o segundo filho do rei.

    Na catedral, foi erigido um altar circular com capacidade para oito pessoas, inclusive paraCatarina e seu volumoso vestido. O altar era coberto por um pano escarlate e tinha volta umparapeito.

    Henrique levoua at aquele tablado, onde Arthur esperava por ela com uma linda roupade cetim branco, adornada de pedras preciosas.

    Henrique VII e sua rainha, Elizabeth de York, observavam a cerimnia de um camarote aolado do tablado.

    O rei achou que Arthur parecia muito pequeno ao lado da noiva, e ficou imaginando se abrancura doentia da sua pele se tornava mais bvia devido ao rosado do seu rosto. Ele aindano se decidira se o casamento devia se consumar ou no. Seria vlido fazer um esforo parater um neto o mais depressa possvel, pondo em risco a sade do seu herdeiro, ou deixar ocasal esperar cerca de um ano? Eleja recebera metade do dote da noiva, e mal podia esperarpara pr as mos na outra metade. Teria de tomar cuidado com Fernando. O rei espanholvivia planejando guerras; queria ver os Estados italianos sob o controle espanhol, e dava todotipo de desculpa sobre a segunda parte do dote da filha.

    Mas eu dou um jeito nisso, pensou Henrique. Se houvesse uma criana, Fernando teria depagar a segunda parte rapidamente. E ficaria duplamente feliz com o casamento se sua filhativesse um filho logo...

    Mas mesmo assim...

  • Elizabeth sabia em que o marido estava pensando. Eles eram jovens demais, pensou ela.Arthur, pelo menos, era jovem demais. A excitao o enfraquecia. Se ao menos Henriqueconversasse comigo sobre isso! Mas no adianta pensar assim, ele nunca me consulta.Somente uma pessoa ir decidir se a jovem infanta deve perder sua virgindade esta noite, eessa pessoa o rei da Inglaterra. Mas ele ainda no se decidiu.

    O arcebispo de Canturia e dezenove bispos e abades preparavamse para realizar acerimnia. O arcebispo pedia que o jovem casal repetisse seus votos, em voz bem alta parapoderem ser ouvidos por toda a catedral. A voz da infanta era bem firme, mas a de Arthur erafraca.

    Eu espero, pensava a rainha, que ele no desmaie. Isso seria interpretado como um mauagouro.

    Seus olhos pousaram no seu primognito, todo de branco, e ela lembrouse daquelesetembro no castelo de Winchester, quando ouviu o choro fraco do seu primeiro filho.

    A rainha fora levada para seu quarto, onde haviam colocado uma bela tapearia, mas elainsistira para que uma das janelas no fosse coberta para deixar entrar um pouco de ar e deluz no quarto. Sua sogra, Margaret Beaufort, condessa de Richmond, mantevese ao seulado, e ela ficou muito grata pela sua presena. Antes disso, se sentia bastante intimidadadiante daquela temvel senhora, a nica mulher que tinha uma verdadeira influncia sobre o rei.

    O parto havia sido doloroso, e ela ficou contente de ser atendida apenas por mulheres.Margaret tambm achava que nascimento de bebs era um assunto para mulheres; portanto, arainha despediuse de todos os cavalheiros da corte quando suas dores comearam e retirouse para o quarto com a sograe as atendentes.

    Como o parto tinha sido difcil! Arthur chegou um ms antes do tempo, e depois ela sofreudemais devido a uma febre puerpural. Mas depois de restabelecida, tentou no ter medo deum prximo parto, pois sabia que seria inevitvel. A rainha tem de lutar at a morte, senecessrio, para dar herdeiros ao rei e ao pas. Essa era sua misso na vida.

    E l estava seu filho agora aquele beb frgil e louro, seu primognito, cuja sade forato delicada desde a infncia preparandose para repetir o modelo real com aquela moada Espanha.

    Seu rosto cobriuse de lgrimas e seus lbios tremeram. Ela percebeu que estavarezando: "Proteja meu filho. D a ele fora para servir o seu pas. D a ele felicidade, uma vidalonga e um casamento frutfero."

    Mas Elizabeth de York sabia que estava rezando por um milagre.Depois da celebrao da missa, a noiva e o noivo foram para a porta da catedral,

    ajoelharamse, e Arthur declarou que doava sua noiva um tero de sua propriedade.O povo aglomerado em volta da catedral aplaudiu o casal real."Salve a princesa e o prncipe de Gales!"O casal levantouse, e o jovem prncipe Henrique ficou ao lado da noiva, parecendo

    decidido a no se deixar afastar das comemoraes. Pegou na mo dela e caminhou com osnoivos at o salo do banquete, no palcio do bispo, onde havia sido preparada uma festamagnfica.

    A comida de Catarina foi servida num prato de ouro adornado de pedras preciosas;enquanto comia, pensava com nervosismo na noite de npcias, e sabia que seu noivo estavato nervoso quanto ela. Sua vontade era adiar aquela noite; estava com tanto medo quegostaria que sua me estivesse ali para dizerlhe com sua voz serena que no havia nada a

  • temer.A festa durou vrias horas. Como os ingleses gostavam de comer! Quantos pratos foram

    servidos! Quanto vinho foi bebido!O rei observava os noivos. Ser que ele percebia o medo dos dois? Catarina comeava a

    acreditar que havia pouca coisa que o rei no percebia.A rainha tambm sorria. Como ela era boa, ou seria, se lhe dessem permisso para isso. A

    rainha seria sempre o que o rei desejava que ela fosse, pensou Catarina; e certamente haveriamomentos em que ele exigiria que ela fosse cruel.

    Catarina ouvira falar da cerimnia da noite de npcias. Na Inglaterra, era uma cerimniairreverente e turbulenta... at mesmo na realeza. Ela estava certa de que isso nuncaacontecera com sua me. Mas o povo ingls no tinha a dignidade do espanhol, eles erammais grosseiros.

    Virouse para Arthur, que tentava sorrir, mas ela viu que ele estava tremendo.Finalmente, eles chegaram ao quarto. A cama estava sendo benta, com as cortinas

    abertas; Catarina sabia ingls o suficiente para reconhecer a palavra "frtil".Ela no ousou olhar para Arthur, mas imaginou como ele estaria se sentindo.O quarto era iluminado por vrias velas, e a luz brilhava na tapearia escarlate, nas cortinas

    de seda e nos rostos dos que estavam reunidos no quarto.O rei aproximouse e puxou os dois para perto dele. Vocs so muito jovens, tm a vida toda diante de si. Ainda no esto prontos para o

    casamento, esta cerimnia ser apenas um smbolo; quando tiverem idade suficiente,consumaro o ato do casamento.

    Catarina viu o alvio estampado no rosto de Arthur, e teve vontade de chorar de alegria.Nem ela nem Arthur estavam mais com medo.

    Eles foram levados para a cama, e as cortinas foram cerradas enquanto os atendentestiravamlhes as roupas; e mesmo quando no havia mais nada cobrindo aqueles corposbrancos nus e eles estavam ajoelhados lado a lado, no tiveram medo.

    Rezaram para conseguir cumprir seu dever; rezaram como qualquer casal reza na sua noitede npcias. Mas aquela no era uma noite de npcias comum, pois o rei declarara que eleseram jovens demais para consumar o casamento.

    Uma taa de vinho quente e doce foi servida aos dois, e eles tiveram ordem de beber.Depois, um atendente enrolouos com um robe, e a cerimnia terminou.

    O povo que se aglomerara em volta do quarto debandou; os serviais de Catarina e Arthur espanhis e ingleses permaneceram na antecmara; a porta da cmara nupcial foitrancada e os noivos ficaram sozinhos.

    No preciso ter medo disse Arthur. Eu ouvi a ordem que o rei nos deu falou Catarina. Ento ele beijou sua testa e disse: Dentro de algum tempo, eu serei seu marido de verdade. Dentro de algum tempo repetiu Catarina.Ento ela deitouse no leito nupcial, ainda vestida com o robe no qual fora enrolada. A

    cama era grande. Arthur deitouse ao seu lado, tambm de robe. Eu estou muito cansada falou Catarina. A cerimnia foi muito barulhenta. Eu estou sempre cansado disse Arthur. Boa noite, Arthur. Boa noite, Catarina.

  • Os dois estavam to exaustos devido s cerimnias e aos seus temores que dormiram logodepois; de manh, a noiva e o noivo virgens estavam prontos para continuar as celebraes docasamento.

    A TRAGDIA NO CASTELO DE LUDLOW

    TODA A CIDADE DE LONDRES ESTAVA ansiosa para celebrar o casamento do prncipe

    de Gales com a infanta; o rei sabia bem que seu povo precisava de alguma alegria na vida, eque se tivesse permisso para celebrar o casamento de Arthur deixaria de pensar nospesados impostos que o afligiam.

    Que eles se alegrem disse o rei para Empson. com uma fonte de vinho aqui e ali,ficaro satisfeitos. Que haja bastante pompa. Os nobres providenciaro isso.

    Henrique estava pronto para dar sua prpria contribuio, pois tinha grande desejo queseus sditos expressassem lealdade nova dinastia Tudor. No havia nada de que o povomais gostasse do que um casamento real; e como quem estava se casando era o meninodestinado a se tornar seu rei, o rei ordenou que as celebraes continuassem.

    Catarina sentiase um tanto confusa com tudo aquilo. Arthur estava cansado dascelebraes, mas o jovem Henrique estava encantado. Margarida imaginava como seriaquando o seu casamento fosse celebrado, e a pequena Maria ficava feliz toda vez que adeixavam presenciar as cerimnias.

    A cerimnia mais importante de todas foi realizada em Westminster, para onde a famliareal se trasladou de barcaa. Depois da noite de npcias, Catarina foi mandada para o castelode Baynard, onde ficou sob a severa vigilncia de Dona Elvira. O rei deixou bem claro para suagovernanta que o casamento ainda no se consumara, e como Elvira considerava sua infantaainda jovem demais para a consumao, estava determinada a respeitar os desejos do rei.

    Portanto, a barcaa foi pegar a infanta e sua governanta e as belas damas de honra.Catarina gostaria que suas damas no fossem to lindas assim. bem verdade que ela

    estava sempre magnificamente vestida, e que suas roupas eram mais lindas que as de suasdamas; mas a beleza delas era tal que no havia necessidade de belas roupas para que todosas notassem.

    O povo enfileirouse ao longo das margens do rio para saudar a princesa quando elaseguiu para Westminster, e enquanto ela sorria e acenava para todos, esqueceuse poralgum tempo das saudades que sentia de sua famlia.

    Ao descer da barcaa, Catarina viu que em frente ao palcio de Westminster tinha sidopreparado um imenso pavilho para as festividades. No lado sul, viase um palanque cobertode tecidos de alto luxo com fios de ouro e vrios outros menos luxuosos para os espectadores.

    Catarina descobriu que era ali que se realizava ajusta, o torneio lana entre cavaleiros,considerada a diverso perfeita, onde toda a nobreza inglesa se reunia.

    Na celebrao do casamento mais importante da Inglaterra, as grandes casas estavamdeterminadas a se enfrentar com o mximo de extravagncia; quando os campees entravamna arena, ouviamse suspiros maravilhados e fortes aplausos.

    Catarina foi levada para o palanque entre os vivas do povo e sentouse nas almofadasforradas de tecidos de ouro. Junto a ela estavam o rei, a rainha e toda a famlia real. Masquem ocupava o lugar de honra era ela.

    A infanta pensou como seus pais ficariam felizes se pudessem vla agora.

  • Ao seu lado estava Arthur, muito plido e com um ar cansado, contrastando com Henrique,radiante e vendendo sade. Ele tinha se sentado num tamborete aos ps da noiva, e apertavaos joelhos com as mos de uma forma ao mesmo tempo infantil e digna.

    Margarida, por quem Catarina sentia