Jornal Unicamp

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  • 8/18/2019 Jornal Unicamp

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    3Campinas, de 6 a 12 de agosto de 2012

    Rumo àTese analisa os desafiosque o Brasil tem de superarpara modernizar o setor

    rede elétrica

    MANUEL ALVES FILHO

    [email protected]

    mbora tenha tomado algumas providências, oBrasil ainda precisa fazer uma extensa lição decasa para poder criar as condições necessárias àimplantação da chamada smart grid (rede inte-ligente) no seu sistema elétrico. A opinião é de

    Carlos Alberto Fróes Lima, que acaba de defender tese

    de doutorado sobre o tema, na Faculdade de EngenhariaMecânica (FEM) da Unicamp, sob a orientação do pro-fessor Gilberto de Martino Jannuzzi. De acordo com oautor do trabalho, questões ligadas à legislação e regu-lação do uso dessa nova tecnologia seguem aguardandosoluções. “A previsão é de que os testes em âmbito na-cional possam começar em 2013. Até agora, porém, nãoforam definidos pontos cruciais como as especificaçõesdos novos medidores e nem mesmo os valores das ta-rifas. O país ainda está se organizando para estabeleceressas diretrizes”, analisa.

    Fróes afirma que tais providências são urgentes efundamentais porque o advento da smart grid propor-cionará uma “revolução” do ponto de vista de controlee efetividade dos serviços tanto nos setores de geração,transmissão e distribuição da energia elétrica, quanto nocomportamento do consumidor e na relação deste comas concessionárias do setor. “O conceito de smart gridainda não está disseminado no Brasil, sendo um assuntonovo por aqui. Entretanto, ele é muito abrangente, en-volvendo muito da eficiência energética e já vem sendoaplicado há algum tempo nos Estados Unidos, Japão epaíses europeus. A tecnologia cria uma série de possi-bilidades técnicas, operacionais e também de negócios”,elenca o pesquisador.

    Dito de modo simplificado, o que se pretende com aintrodução da smart grid é dotar a rede elétrica de inteli-gência, de modo que ela possa ser operada e controladade forma digital (usando equipamentos com tecnologiade comunicação de dados em cada ponto da rede) e commais eficiência. Atualmente, explica o autor da tese, a ge-ração já dispõe de tecnologias inteligentes, que ajudam amanter a oferta em níveis adequados, mas também temseus desafios de inovação. A disposição, agora, é fazercom que a transmissão e a distribuição também atinjamum patamar de operação e supervisão superiores. Umadas alternativas, segundo Fróes, é instalar sensores nosdiversos pontos da rede. Com isso, as concessionáriasteriam como monitorá-la remotamente, identificandoem tempo real eventuais interrupções no fornecimento,perdas técnicas e até mesmo furtos de energia.

    Mais do que isso, por meio do medidor eletrônico,que deverá substituir o conhecido “relógio” eletrome-cânico, tanto a empresa fornecedora quanto os própriosclientes terão como acompanhar de maneira mais próxi-ma e frequente o consumo. “Atualmente, um funcioná-rio vai uma vez ao mês até a residência do cliente para re-gistrar o quanto foi consumido no período anterior. Comos recursos da smart grid, isso poderá ser feito a cada 15minutos, por exemplo, pelas duas partes. Isso fará comque as pessoas possam ter maior controle sobre seusgastos com energia e a concessionária conheça melhoros hábitos dos seus clientes”, detalha Fróes. Além dessasvantagens, prossegue ele, a tecnologia também permitiráque sejam estabelecidas tarifas diferenciadas conforme operíodo do dia e conforme o consumo.

    O pesquisador observa que a Agência Nacional deEnergia Elétrica (Aneel), reguladora do setor, já estabe-leceu uma primeira resolução nesse sentido. O docu-mento prevê que o custo da energia no horário de pico

    será cinco vezes maior do que nos momentos de baixoconsumo. “Com isso, o consumidor poderá programarmelhor o uso da energia elétrica e, eventualmente, bai-xar o valor da sua conta. Em vez de tomar banho entre18h e 21h, por exemplo, ele poderá deixar para fazer suahigiene pessoal depois desse período, quando a tarifaserá menor”, exemplifica Fróes. Ocorre, entretanto, queas tarifas a serem praticadas ainda dependem de regu-lamentação. “Ou seja, a tarifa no horário de pico vai sercinco vezes maior em relação a que valor? Isso ainda nãofoi definido”, acrescenta o autor da tese.

    Segundo ele, uma consequência dessa possível mu-dança de atitude por parte dos consumidores poderá sera redução dos investimentos em geração de energia. Eleesclarece que a oferta do serviço não é estimada a par-tir de uma demanda média, mas com base no pico deconsumo. “Ora, se houver uma redução importante doconsumo no horário de pico, a geração poderá ter umplanejamento operacional diferenciado. Ou, dito de ou-tra maneira, o país poderá crescer e se desenvolver semque haja a necessidade de investimentos tão grandes em

    novas gerações”, imagina.

    Publicações

    Fróes Lima, Carlos A., Jannuzzi, Gilberto M., Planejando omercado de smart grid: regulamentação e compromissos como cliente-consumidor, SNPTEE 2011, outubro 2011, Floria-nópolis-SC, disponível em http://www.xxisnptee.com.br/ site/

    Fróes Lima, Carlos A., Jannuzzi, Gilberto M., Smart Grid willbe a Reality. For Developing Countries, Energetic Matrix, So-cio-cultural Issues, Regulatory and Local Development Shap-ing Outcomes, Incomes and Viable the Efficiency Awareness, The 24th International Conference on Efficiency, Cost, Op-timization, Simulation and Environmental Impact of EnergySystems, julho 2011, Novi Sad, Serbia, disponível em http:// www.ecos2011.com

    Fróes Lima, Carlos A., Jannuzzi, Gilberto M., Smart GridImplementation in Developing Countries: analysis focussingconsumer behaviour, markets and regulation, 6o DubrovnikConferences on Sustainable Development of Energy, Waterand Environment Systems, setembro 2011, Dubrovnik, Cro-atia, disponível em http://wwwdubrovnik2011.sdewes.org/ 

    Fróes Lima, Carlos A., Jannuzzi, Gilberto M., Smart gridcould improve energy business and environmental sustain-ability in developing countries, 6o Dubrovnik Conferences onSustainable Development of Energy, Water and EnvironmentSystems, setembro 2011, Dubrovnik, Croatia, disponível emhttp://wwwdubrovnik2011.sdewes.org/ 

     Tese: “Revolução tecnológica na indústria de energia elétricacom smart grid, suas consequências e possibilidades para omercado consumidor residencial brasileiro” Autor:Carlos Alberto Fróes LimaOrientador: Gilberto de Martino JannuzziUnidade: Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM)

    Outra alteração que a smart grid poderá introduzirdiz respeito à atuação das concessionárias. Fróes diz que,assim como acontece em outros países, as empresas bra-sileiras poderão ser autorizadas a fornecer outros produ-tos e serviços além da energia elétrica. Nos Estados Uni-dos, por exemplo, as companhias do setor podem vendero serviço de operar eletrodomésticos considerados “in-teligentes”. Além de serem eficientes e apresentaremum baixo nível de consumo de eletricidade, os aparelhospodem ser operados à distância pelas concessionárias.“Nesse caso, o cliente autoriza a empresa a desligar re-motamente o seu aparelho quando chega o horário depico e quando a oferta de energia não é suficiente paraatender toda a população. Isto pode evitar apagões. Ocliente também pode acionar ou pedir à concessionáriapara que o aquecedor seja acionado uma hora antes deele chegar em casa, durante o inverno”.

     Ainda no campo das possibilidades, a smart gridpode criar também a figura do consumidor-fornecedor.Desse modo, aquela pessoa que dispõe de um sistemadoméstico de geração de energia eólica ou fotovoltai-ca poderá transferir o excedente da sua produção paraa rede, sendo remunerado por isso. “Nessa hipótese, omedidor eletrônico registrará tanto a entrada quando asaída de energia. Mas, para que isso aconteça, será ne-cessário ainda o estabelecimento de normas para nãohaver interferências de frequências na rede de energia.Do mesmo modo, é preciso estabelecer as especificaçõestécnicas dos medidores, para que os aparelhos executemas funções desejadas”, adverte Fróes.

    Por fim, o pesquisador lembra que a smart grid po-derá se constituir em uma grande oportunidade de ne-gócios no Brasil. Ele observa que os aproximadamente58 milhões de medidores domésticos convencionaisterão que ser substituídos por equipamentos mais mo-dernos. “Esses aparelhos precisão ser fabricados, ins-talados e consertados, quando for o caso, por alguém.Isso representará a criação de novas empresas e de umimportante número de empregos, com a consequentegeração de riquezas para o país”, entende o autor datese.

     Ao ser questionado sobre quem pagará a conta portoda essa “revolução”, Fróes é direto: “Todos pagaremos,de alguma forma”. De acordo com ele, não se pode afir-mar, num primeiro momento, que haverá redução dopreço de tarifa por causa da adoção da rede inteligente. Ao contrário, a fase inicial exigirá altos investimentos, oque deve trazer algum tipo de impacto para o bolso doconsumidor. “O Brasil vai ter que decidir como isso seráfeito. No Reino Unido, ficou definido que os clientes éque arcariam com o custo de instalação dos novos me-didores. Aqui, a solução terá que ser discutida, inclusivecom a participação da sociedade”, pondera.

    Um aspecto que parece claro, completa Fróes, é quea implantação da smart grid no sistema elétrico brasi-leiro é uma medida inevitável, em razão das vantagensque ela trará. “Atualmente, nossa rede, que começou aser implantada na primeira metade do século 20, estáobsoleta. É preciso atualizá-la. Penso que esse avançoem direção a uma rede inteligente será feito aos poucos. Afinal, não é possível mudar o setor da noite para o dia. Assim, vamos introduzir alguns neurônios progressi-vamente, de modo que ela fique cada vez mais inteli-gente. Outros países já fizeram isso com sucesso. Nós

    também devemos chegar lá, mas é preciso reafirmar

    que muitas questões legais, técnicas e operacionais ain-da não foram estabelecidas. Sem essas diretrizes, nãoiremos a lugar algum. Se a lição de casa não for feitacom urgência e competência, os consumidores e o paíssairão perdendo”, analisa.

     Atualmente, a smart grid tem tido alguns de seus re-cursos testados, de forma piloto, em duas cidades bra-sileiras: Sete Lagoas, em Minas Gerais, e Parintins, no Amazonas. Na cidade mineira, foram instalados novosmedidores e modernos sistemas de telecomunicação,que permitem a troca de dados entre os equipamentosde campo e as centrais computadorizadas. Com isso, aconcessionária local tem como monitorar os níveis deconsumo da população, bem como identificar, em temporeal, eventuais interrupções no fornecimento de energia. Já no município amazônico, foram instalados sensoresem vários pontos da rede de distribuição, que tambémpermitem a intervenção imediata da fornecedora emcaso de falhas no sistema. São testes como estes quepoderão ser realizados em dimensão nacional em 2013.No ano seguinte, a tecnologia deverá entrar em operaçãocomercial.

    Carlos Alberto Fróes

    Lima, autor do

    trabalho: país ainda

    precisa

    definir questões

    ligadas à legislação

    e regulação do uso

    da smart grid

    inteligente