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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE PEDAGOGIA JOSÉ CLAUDENILSON SOUSA DA SILVA O EDUCADOR AFETIVO E A FORMAÇÃO PARA CIDADANIA: SEU PAPEL E CONTRIBUIÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DE VALORES EM ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE FORTALEZA 2013

JOSÉ CLAUDENILSON SOUSA DA SILVA O EDUCADOR AFETIVO E … · compreender e investigar a educação social e o papel da afetividade na mesma. Portanto o objetivo geral desta pesquisa

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE PEDAGOGIA

JOSÉ CLAUDENILSON SOUSA DA SILVA

O EDUCADOR AFETIVO E A FORMAÇÃO PARA CIDADANIA: SEU PAPEL E

CONTRIBUIÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DE VALORES EM ADOLESCENTES EM

SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE

FORTALEZA

2013

JOSÉ CLAUDENILSON SOUSA DA SILVA

O EDUCADOR AFETIVO E A FORMAÇÃO PARA CIDADANIA: SEU PAPEL E

CONTRIBUIÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DE VALORES EM ADOLESCENTES EM

SITUAÇÃO DE VUNERABILIDADE

Monografia submetida à aprovação da coordenação

do curso de Pedagogia do Centro Superior do

Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau

de Graduação.

FORTALEZA

2013

JOSÉ CLAUDENILSON SOUSA DA SILVA

O EDUCADOR AFETIVO E A FORMAÇÃO PARA CIDADANIA: SEU PAPEL E

CONTRIBUIÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DE VALORES EM ADOLESCENTES EM

SITUAÇÃO DE VUNERABILIDADE

Monografia como pré-requisito para obtenção do

título de licenciatura em Pedagogia, outorgado pela

Faculdade Cearense-FAC, tendo sido aprovada

pela banca examinadora composta pelos

professores.

Data de aprovação: 20/12/2013

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Professora MS. Joyce Carneiro de Oliveira

_______________________________________________ Professora MS.Suzanety Franco de Sá e Souza

_______________________________________________ Professora MS.Patrícia Campêlo do Amaral Façanha

AGRADECIMENTOS

Inicialmente gostaria de agradecer a todas as pessoas que me incentivaram na

busca para formação acadêmica e acreditaram na minha capacidade, a essas

pessoas meu muito obrigado.

Gostaria também de agradecer os colegas e amigos de turma que contribuíram

bastante no meu processo de aprendizado me ajudando com sua atenção, amizade,

com a troca de experiências e carinho, e principalmente aos professores que me

mostraram o quanto é prazeroso trabalhar com educação. Pude vê-los fomentando

sempre a importância de bons e apaixonados profissionais pela educação.

Obrigado a todos os grandes professores que tive dentro do centro acadêmico e que

não fazem mais parte da instituição. Agradeço a minha orientadora Patrícia Campêlo

pela atenção e paciência.

Foi muito difícil chegar até aqui e sozinho não conseguiria, por isso agradeço a

minha família, amigos e professores.

Por fim e com toda certeza o mais importante, obrigado meu Deus por poder realizar

um sonho meu e poder contribuir no processo de ensino e aprendizado das nossas

crianças, sei que não vou mudar o mundo mais vou ajudar na mudança positiva.

“O professor que pensa certo deixa transparecer aos

educandos que uma das bonitezas de nossa

maneira de estar no mundo e com o mundo, como

seres históricos, é a capacidade de intervindo no

mundo, conhecer o mundo.”

(Paulo Freire)

RESUMO

Esta pesquisa tem como tema O educador afetivo e a formação para cidadania com

foco no papel e contribuição do educador para a construção de valores em

adolescentes em situação de vulnerabilidade. Portanto o objetivo geral da mesma é

identificar quais as contribuições da afetividade na educação, formação cidadã e na

construção da personalidade de adolescentes que se encontram em situação de

vulnerabilidade social, os específicos são: fazer um levantamento dos sentimentos

dos educandos em relação aos educadores afetivos do projeto crescer com arte,

identificar a importância desse projeto para a vida dos educandos e investigar quais

os valores adquiridos dentro desse espaço de aprendizado não formal. O trabalho

de pesquisa buscou através de levantamento bibliográfico e estudo de caso,

utilizando-se de entrevista estruturada identificar quais as contribuições da

afetividade na educação e formação cidadã de adolescentes que se encontram em

situação de vulnerabilidade social de um espaço educativo não formal, buscando

identificar as percepções tanto dos educandos que tiveram sua formação baseada

numa educação afetiva como também do próprio pesquisador que vivenciou essa

relação dentro do ambiente educativo. Esse trabalho permitiu identificar de forma

clara como o educador afetivo intervém na realidade do educando e mostrar que a

educação realmente pode transcender as paredes físicas do espaço educacional

tanto formal quanto não formal, formando verdadeiros cidadãos sujeitos de seus

direitos. A afetividade é ferramenta de socialização e aproximação, é através da

mesma que o aprendizado se torna para o educando elemento de grande significado

para sua vida, é através do afeto que é garantida na educação à formação cidadã e

a construção da personalidade dos educandos.

Palavras-chaves: Afetividade; Educação; Vulnerabilidade social; Educador social.

ABSTRACT

This research has as its theme Affective educator and training for citizenship focusing

on the role and contribution of the educator to build values in adolescents in

vulnerable situations . So the overall goal is the same identify the contributions of

affect in education , civic education and the construction of adolescent personality

that are in a situation of social vulnerability , the specific is to survey the feelings of

the students in relation to affective educators project grow with art , identify the

importance of this project to the lives of learners and investigate what values

acquired within that space of non-formal learning . The research sought through a

literature review and case study , using a structured interview to identify which

contributions affectivity in education and civic education of adolescents who are in a

situation of social vulnerability of a non-formal educational space , seeking to identify

the perceptions of both students who had their training based on affective education

as well as the researcher who lived through this relationship within the educational

environment . This study found clear how affective educator intervenes in reality the

student and show that education really can transcend the physical walls of both

formal and non-formal educational space , forming true citizens subjects of their

rights . The affection is socialization tool and approach , is through it that learning

becomes for the student element of great meaning to your life , is through the

affection that is guaranteed to citizen education training and construction of the

personality of students .

Keywords : Affection , Education, Social vulnerability , social educator .

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

Eca- Estatuto da Criança e do Adolescente

Ldb- Lei de diretrizes e base da educação

O.g – Organização Governamental

Ong – Organização não governamental

ONU – Organizações das nações unidas

FUNCI – Fundação da Criança e da Família cidadã.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO............................................................................................. ......... 9

2 AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO NO BRASIL.......................................................11

2.1 Histórico................................................................................................................11

2.1.1 Instituições formais de Ensino...........................................................................14

2.1.2 Educação informal.............................................................................................16

2.1.3 Instituições não Formais....................................................................................17

2.1.3.1 As Organizações não Governamentais........................................................ 19

3 A PEDAGOGIA SOCIAL OS VALORES HUMANOS E A EDUCAÇÃO PARA

CIDADANIA.............................................................................................................. 23

3.1 A Pedagogia Social............................................................................................ 23

3.2 Os valores Humanos e a Educação Para cidadania .......................................... 24

3.3 A afetividade na Educação ................................................................................ 25

4 A EDUCAÇÃO DE ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE

SOCIAL..................................................................................................................... 28

4.1 Crianças e Adolescentes em vulnerabilidade Social.......................................... 28

4.2 O Educador Social............................................................................................... 31

5 METODOLOGIA.................................................................................................... 33

5.1 Tipo de pesquisa................................................................................................. 33

5.2 Cenário e período de pesquisa........................................................................... 33

5.3 Participantes da Pesquisa................................................................................... 34

5.4 Coleta de dados.................................................................................................. 34

5.5 Análise de dados.......................................................................................... ....... 35

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................. 36

6.1 Descrição das Vivencias do Educador Social no Projeto Crescer

Jangurussu................................................................................................................ 36

6.2 Entrevistas Aplicadas.......................................................................................... 38

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 45

REFERENCIAS......................................................................................................... 47

APÊNDICE................................................................................................................ 50

9

1 INTRODUÇÃO

A educação é elemento de suma importância para a formação humana,

sabendo que ela ocorre significativamente quando há de forma clara uma

identificação do educando com o educador e o aprendizado em questão, em que

deve haver uma relação respeitosa e amigável entre eles.

Sabendo disso pode-se considerar fator essencial para a educação a

relação construída dentro do espaço educativo formal e não formal entre educando e

educador. Souza (2009) diz que o que difere educação não formal e formal não é o

espaço escolar em que a pessoa está inserida, mas sim a organização do ensino

oferecido, em que o tempo e espaço diferenciado fomentam novos elementos para a

educação, tendo em vista o respeito ao tempo e aos processos de aprendizado de

todos os indivíduos. É necessário entender essa relação dentro desses espaços

tanto na troca de experiências como no desenvolvimento afetivo/subjetivo,

percebendo que a educação pode interagir contribuindo para o processo

transformador da criança e adolescente, é nesses espaços não formais que

identificamos com potencialidade afetiva o educador social.

A educação é ação essencial na construção de valores afetivos/sociais e

o educador assume também um papel de enorme importância para essa construção,

seus valores e métodos de ensino, seja na educação formal como na não formal,

têm grande peso na contribuição para esse processo. A partir disso surge como

questão norteadora deste trabalho: Que educação se quer para os filhos: uma

educação que garanta valores que aproximam, agregam e cativam ou uma

educação que gera seres que não se identificam como sujeitos ativos e autônomos,

que molda e controla?

Nesse trabalho deseja-se estudar mecanismos metodológicos que

assistam as necessidades do educador social e do educando para a formação e o

processo de ensino, e principalmente, preparar para uma construção cidadã,

valorizando aprendizado do educando, tendo em vista que essa educação acontece

partindo de uma relação afetuosa entre eles.

É de grande importância no processo educativo o educador dispor de um

olhar mais sensível para a realidade e necessidade das condições afetivas do

educando, utilizando não mais um olhar de fora para dentro, mas sim de dentro para

fora.

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Sabendo que não se cria uma relação afetuosa e respeitosa entre

educador e educando de um dia pro outro, essa relação acontece na prática do

cotidiano, é alimentada a cada momento dentro do espaço educativo, onde os

educadores com sua visão sensível e desprovida de preconceitos fomentam dentro

desse espaço uma ambientação de confiança, carinho, respeito permitindo uma

entrega recíproca.

Teve-se durante a formação do pesquisador enquanto cidadão e sujeito

de direitos, grandes profissionais (Educadores Sociais) que mostraram através do

afeto que existe uma oportunidade de mudança e que também tinha o direito de ser

feliz e principalmente de sonhar. A partir dessa vivencia houve o desejo de

compreender e investigar a educação social e o papel da afetividade na mesma.

Portanto o objetivo geral desta pesquisa é: identificar quais as

contribuições da afetividade na educação, formação cidadã e na construção da

personalidade de adolescentes que se encontram em situação de vulnerabilidade

social. E os objetivos específicos: fazer um levantamento dos sentimentos dos

educandos em relação aos educadores afetivos do projeto crescer com arte,

identificar a importância desse projeto para a vida dos educandos e investigar quais

os valores adquiridos dentro do espaço de aprendizado não formal. .

A pesquisa terá como embasamento teórico as contribuições de autores

como Paulo Freire (1996), Isabel Galvão (2008), Maria da Gloria Gonh (2006), Ana

Paula Souza (2009), Andre Soariano Diaz (2006), Cassiana Stersa Versoza (2010),

Elis Dieniffer Soares Miranda (2008), Roberto Carlos Simões Galvão (2010).

O respectivo trabalho explana em um primeiro momento sobre a

introdução e apresentação do mesmo, em um segundo momento o contexto

histórico das instituições de educação e seus tipos de organização (formal, informal,

não formal) sendo também discutido sobre as organizações não governamentais e

organizações sociais mantidas pelo governo.

No terceiro momento será discutida a relação da afetividade e a educação

na perspectiva da formação da cidadania. Será feito, um levantamento tendo como

ponto de reflexão o Educador Social e sua Prática e também um resgate histórico da

realidade social de crianças em situação de vulnerabilidade social, no quarto

momento está a metodologia da pesquisa realizada, posteriormente no quinto são

apresentados os resultados e discussões da referida pesquisa e no sexto momento

são apresentadas as considerações finais.

11

2 AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO NO BRASIL

2.1 Histórico

De acordo com Bello (2001) a historia da educação no Brasil teve inicio a

partir de 1549 com a chegada dos jesuítas, que implantaram sua educação que ia

de encontro à educação feita pelos índios, buscando a negação de sua cultura e

costumes. Com o intuito de catequizar os índios, os jesuítas no mesmo ano criaram

a primeira escola brasileira em Salvador, Bahia. Acreditavam que não iriam

conseguir convertê-los a fé católica se eles não pudessem ler e escrever.

Bello (2001) também coloca que vinte anos após a chegada dos jesuítas

no Brasil, mas precisamente em 1570, foram criadas no país cinco escolas de

“Instrução elementar” (em Porto Seguro, São Vicente, Espírito Santo, Ilhéus e São

Paulo de Piratininga) e também três colégios, um no Rio de Janeiro, um em

Pernambuco e o outro na Bahia. Esse mesmo autor relata que:

Eles não se limitaram ao ensino das primeiras letras; além do curso elementar mantinham cursos de Letras e Filosofia, considerados secundários, e o curso de Teologia e Ciências Sagradas, de nível superior, para formação de sacerdotes. No curso de Letras estudava-se Gramática Latina, Humanidades e Retórica; e no curso de Filosofia estudava-se Lógica, Metafísica, Moral, Matemática e Ciências Físicas e Naturais.

Bello (2001) expõe que o modelo de ensino implementado pelos jesuítas

teve funcionalidade de 1549 até 1759 quando os mesmos foram expulsos pelo

Marquês de Pombal deixando a educação totalmente desestruturada. A expulsão foi

devido aos objetivos dos jesuítas serem contrários ao que a corte desejava, pois

eles buscavam fortalecer a igreja com a formação de noviços. Pombal

representando a corte desejava reerguer Portugal da decadência que enfrentava. O

mesmo autor prossegue dizendo que: “A educação Jesuíta não convinha aos

interesses comerciais emanados por Pombal” queria ele que a escola servisse

diretamente aos interesses do estado.

Bello (2001) ainda explica que com a expulsão dos Jesuítas pouco restou

da prática educativa utilizada, sabendo disso Portugal criou em 1772 o “subsídio

Literário” que era uma taxa que tinha por finalidade garantir a efetividade da

educação da época e investir nos professores financeiramente quanto ao trabalho

12

realizado, todavia a taxa nunca foi cobrada regularmente deixando por vezes os

professores na espera de um retorno por parte de Portugal. E se estende dizendo

que os professores além de serem mal pagos não eram preparados para a função

“Eram nomeados por indicação ou sob concordância de bispos e se tornavam

"proprietários" vitalícios de suas aulas régias”.

O mesmo autor (2001) também diz que com a chegada da família real em

1808, Dom João VI abriu academias militares, escolas de direito e medicina. Já em

1821 ele volta a Portugal e no ano seguinte seu filho proclama a independência do

Brasil.

Em 1826 um Decreto institui quatro graus de instrução: Pedagogias (escolas primárias), Liceus, Ginásios e Academias. Em 1827 um projeto de lei propõe a criação de pedagogias em todas as cidades e vilas, além de prever o exame na seleção de professores, para nomeação. Propunha ainda a abertura de escolas para meninas. (BELLO, 2001).

Bello (2001) coloca que em 1835 surge a primeira escola dita normal, no

entanto essa criação não teve sucesso, já que com a proclamação da república em

1889 se adotou na organização escolar um modelo de influencia positivista que tinha

por princípio de orientação “a liberdade e laicidade do ensino, como também a

gratuidade da escola primária. Estes princípios seguiam a orientação do que estava

estipulado na Constituição Brasileira.” No decorrer da historia o Brasil ganha espaço

para o mercado mundial e concentra uma quantidade maior de capital para

investimento na produção industrial interna, com isso vê-se a necessidade de reforçar

o investimento na educação no intuito de garantir mão de obra.

Este mesmo autor diz que em 1934 a nova constituição trouxe em seu

texto pela primeira vez a educação como direito de todos e responsabilidade tanto do

poder público como da sociedade em geral. Nesse período muitos movimentos da

sociedade civil realizaram ações na busca de garantir a educação para todos e

qualidade do ensino. Nesse mesmo ano foi criada a primeira universidade no Brasil

situada em São Paulo, cujo principio de organização eram as normas do estatuto das

universidades brasileiras de 1931. Essa criação foi o primeiro passo para o

surgimento de novas instituições de ensino superior.

Bello (2001) relata que com a chegada do regime militar no Brasil todos

os possíveis avanços da educação foram parados e a repressão prejudicou

claramente o seu avanço, pois professores foram presos e demitidos, escolas e

13

universidades foram invadidas, muitos foram mortos em confronto com a polícia.

Alegava o regime em questão que a instituição de ensino era “subversiva e

comunizante”. No fim do regime a discussão sobre a educação se colocou de forma

política, pois abriu espaço para a busca de uma educação que fosse realmente

significativa, e em 1971 no processo de ditadura militar mesmo com as repressões e

lutas se criou uma nova LDB (Lei 5.692- Lei de diretrizes e bases da educação)

ferramenta de grande peso na organização e efetivação do ensino.

Sabe-se que a educação como muitos direitos hoje garantidos foi

assegurada através da luta na busca de igualdade e direitos essenciais, por uma

vida de qualidade. No entanto Gisella Lorenzi (2000) discorre que Inicialmente as

populações carentes economicamente eram entregues aos cuidados da Igreja

católica através de algumas instituições e que o ensino obrigatório só foi

regulamentado em 1854 com algumas restrições como: Os escravos estavam

permanentemente excluídos da oportunidade de ensino como também qualquer

pessoa que “padecessem” de alguma doença contagiosa ou não tivesse sido

vacinada. É importante ressaltar que segundo a mesma autora muitas crianças

vindas da classe menos favorecida não tinham acesso às políticas de saúde, sequer

educacionais. Portanto fica claro que mesmo aquelas atendidas pela igreja católica

não tinham a educação garantida.

Ainda a respeito do surgimento das instituições Sanfelice (2006) coloca:

Às vezes a unidade escolar surge como decorrência da política educacional em prática. Mas nem sempre. Em outras situações a unidade escolar somente se viabiliza pela conquista de movimentos sociais mobilizados, ou pela iniciativa de grupos confeccionais ou de empresários.

Sanfelice (2006) discorre também em relação à organização do ensino

quando diz que hoje as instituições de educação vão do ensino infantil ao ensino

superior e se dividem entre o ensino oferecido pela rede pública (municipal, estadual

e federal) e o ensino dito privado, todavia se considera o ensino em escolas técnicas

e também em escolas de ensino da língua.

Além dessa classificação também há a divisão das instituições de ensino

em formais, informais e não formais. Será discorrido sobre as mesmas a seguir.

14

2.1.1 Instituições formais de ensino

É essencial compreender as vertentes que classificam os tipos de

educação em questão para se poder de forma clara identificar a afetividade dentro

dos diversos ambientes educativos, sabendo disso Gohn (2006, p 28) diz que:

A princípio podemos demarcar seus campos de desenvolvimento: a educação formal é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a informal como aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo de socialização na família, bairro, clube, amigos, etc., carregada de valores e culturas próprias de pertencimento e sentimentos herdados; e a educação não formal é aquela que se aprende ”no mundo da vida”, via os processos de compartilhamento de experiências principalmente em espaços e ações coletivas cotidianas.

Jacobucci (2008) conceitua o espaço formal como espaço que está

relacionado a instituições escolares da educação básica e também do ensino

superior definidos pela lei de diretrizes e bases da educação na Lei 9394/96. E que

segue um sistema predefinido para a ação educativa e sua organização dentro

próprio espaço.

Pinto (2005) esclarece que é fácil compreender o conceito de educação

formal quando se associa essa educação a espaços como escolas e universidades

denominadas instituições tradicionais de ensino, tendo como foco o professor e o

aluno. O mesmo autor diz também que o sistema de educação formal está

associado a várias etapas do desenvolvimento sendo necessários anos de ensino

acadêmico, organizado por disciplinas definidas por programas curriculares gerais

aprovados e reconhecidos pelos órgãos competentes.

Como se pode ver o processo educativo não ocorre somente dentro do

ambiente escolar, todo espaço pode ser propício para o aprendizado, cada espaço

com sua característica.

Jacobucci (2008) reforça dizendo que ”O espaço formal diz respeito

apenas a um local onde a Educação ali realizada é formalizada, garantida por Lei e

organizada de acordo com uma padronização nacional.” Apesar dessa definição ele

enfatiza que o espaço educativo formal vai além de sua estruturação como

característica, tendo que ser levada em conta sua fundamentação, teoria e

metodologia utilizada. Percebe-se que essa metodologia nem sempre atende a

realidade dos educandos, o que causa em muitas crianças e principalmente, nos

15

adolescentes de baixa renda, uma resistência para frequentar esses espaços, e é

notório na Educação conteudista, sem o mínimo de compromisso com a situação

social e emocional dos educandos.

Paulo Freire (2008) afirma que: “Falar da realidade como algo parado,

estático, compartimentado e bem comportado, quando não falar ou dissertar sobre

algo completamente alheio a experiência dos educandos, vem sendo realmente, a

suprema inquietação desta educação.” Uma educação que vê os educandos como

meros receptores denominados por Freire como “vasilhas”, recipientes que

necessitam ser cheios, em que o educador é o sujeito que conduz o educando para

a ação de memorização de conteúdos, e continua: “Em lugar de comunicar-se, o

educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências,

recebem pacientemente, memorizam e repetem” e diríamos que também esquecem,

pois nesse contexto não tem nenhuma funcionalidade, nenhuma importância para a

vida de quem recebe.

O educador deve a todo o momento questionar sua prática com o objetivo

de que o aprendizado se torne de forma concreta elemento de grande significado

para a vida dos educandos, visando à utilização desse aprendizado nas suas

práticas cotidianas. Freire (1996) coloca que embora a educação esteja subordinada

a prática “bancária” é importante que esse mantenha vivo em si o gosto da rebeldia

que, aguçando sua curiosidade e estimulando sua capacidade de arriscar-se, de

aventurar-se, de certa forma o “imuniza” contra o poder apassivador do

“bancarismo”, de contra partida o professor precisa estimular essa curiosidade e

esse desejo de se arriscar, o que propiciará a construção de novos conhecimentos.

Gohn (2006) diz que o que se espera da educação formal é que além da

aprendizagem de maneira efetiva, o que muitas vezes nem ocorre, ela prepare os

alunos para seguirem um nível de aprendizado mais avançado e reforce o ensino de

”conteúdos historicamente sistematizados, normalizados por leis, dentre os quais

destacam-se o de formar o indivíduo para ser um cidadão ativo, desenvolver

habilidades e competências várias, desenvolver a criatividade, percepção,

motricidade, etc.

É claro e perceptível que a educação formal ainda não consegue cumprir

seu papel de maneira efetiva, principalmente quando se tem em vista seu papel na

formação de cidadãos.

16

2.1.2 Educação informal

Diferente das instituições de ensino formal que necessitam de uma

estrutura física e condição adequada para que o ensino aconteça significativamente,

seguindo um calendário de conteúdo predefinido, na educação informal o

aprendizado ocorre de maneira diferente como expõe Gohn (2006) dizendo que na

educação informal o espaço físico educacional é demarcado partindo de seguimento

que envolve o cotidiano do educando e as relações que ele constrói. Tem-se como

exemplo disso os grupos sociais em que ele está inserido de maneira a se identificar

como por idade, por sexo, por religião, por etnia, por localidade, por laços afetivos,

etc.

Esses espaços informais também se tornam propícios para o

aprendizado, pois é a partir dessas referências construídas nos espaços de

identificação do educando que o ensino ocorre. Gohn (2006) coloca que “A

educação informal opera em ambientes espontâneos, onde as relações sociais se

desenvolvem segundo gostos, preferências, ou pertencimentos herdados” e continua

dizendo que a educação informal tem como característica a socialização do

indivíduo e o desenvolvimento de atitudes, modos de pensar e de se expressar de

acordo com os valores e crenças de cada grupo em que o individuo está inserido e

reforça que:

A educação informal não é organizada, os conhecimentos não são sistematizados e são repassados a partir das práticas e experiência anteriores, usualmente é o passado orientando o presente. Ela atua no campo das emoções e sentimentos. É um processo permanente e não organizado. (GOHN, 2006).

Tendo em vista que a educação informal é um processo permanente e

não organizado e que o aprendizado é algo que é repassado partindo das práticas e

das experiências anteriores Gohn (2006) ainda diz que o resultado do aprendizado

adquirido pelo indivíduo na educação informal não é esperado, “ele simplesmente

acontece a partir do desenvolvimento do senso comum nos indivíduos, senso este

que orienta suas formas de pensar e agir espontaneamente”. É nesse momento que

se pode enxergar a importância dos espaços formais e também dos espaços não

formais de educação que tem claro o objetivo de sua prática.

17

Segundo Gohn (2006) nos espaços de ensino informal o papel do

educador pode ser assumido por diversas pessoas, pode-se notar que vai variar de

acordo com o espaço de convívio do indivíduo, onde o educador pode ser os pais, a

própria família, os amigos, os vizinhos, colegas de escola, a igreja e também os

meios de comunicação. A educação formal (escola) necessita compreender e

identificar o espaço informal como também espaço onde o aluno aprende, e que é

essencial colocar sua prática educativa relacionando-a diretamente com a educação

informal, buscando construir e refletir novos conceitos sobre a realidade que cerca

seus alunos.

2.1.3 Instituições não formais

De acordo com Gadotti (2005) a educação não formal define-se como

“toda atividade educacional organizada sistemática, executada fora do quadro do

sistema formal para oferecer tipos selecionados de ensino a determinados

subgrupos da população.” É uma educação que mesmo fora do ambiente escolar

possui características essenciais para a formação de valores dos educandos e

fortalecimento de suas potencialidades.

Gohn (2006) deixa claro isso quando diz que é na educação não formal

que o indivíduo adquire conhecimento de seus direitos enquanto cidadão, e percebe

a capacidade para o trabalho no desenvolvimento de suas habilidades e

potencialidades, e no exercício de práticas de organização para o alcance de

objetivos comuns, com o intuito de resolver problemas coletivos do cotidiano, em

que o indivíduo faz uma leitura crítica sobre o que passa ao seu redor.

Gohn (2006) também diz que:

A educação não formal designa um processo com várias dimensões tais como: a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos; a capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem de habilidades e/ou desenvolvimento de potencialidades; a aprendizagem e exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com objetivos comunitários, voltados para a solução de problemas coletivos cotidianos; a aprendizagem de conteúdos que possibilitem aos indivíduos fazerem uma leitura do mundo do ponto de vista de compreensão do que se passa ao seu redor.

E fala também que a educação não é organizada por séries, idades ou

conteúdos, sua atuação perpassa a cultura política de cada grupo, buscando

18

desenvolver laços de pertencimento e identificação dos espaços de convívio do

indivíduo ajudando assim na construção da identidade coletiva dos grupos em que

se envolve. Contudo é desenvolvida nos espaços não formais a autoestima

individual e do grupo tendo como fundamento a solidariedade e a identificação de

interesses comuns, onde a cidadania é construída partindo desses princípios e

identificações.

A respeito do desenvolvimento de habilidades Alves (2002) diz que todo

ser humano possui a capacidade para desenvolver suas habilidades e que é no

processo de formação e crescimento que as crianças e adolescentes as identificam,

desenvolvem e fortalecem. Esse mesmo autor relata que o talento aparece no jovem

quando este está crescendo, e suas experiências tendem a ser cristalizadas nesse

momento. E continua: “O gênio surge geralmente quando a pessoa atinge a

maturidade.” Para poder garantir a formação de seres capazes de transformar sua

realidade deve-se garantir espaços educacionais que permitam que as crianças e

adolescentes vivenciem suas experiências de forma positiva na perspectiva da

construção do novo e de valores que os coloquem como atores ativos de sua vida.

A educação não formal assume o papel no processo de formação social

do aluno, permitindo que o mesmo possa vivenciar os valores que o constroem e

buscando sua reflexão sobre a real importância dos mesmos para o bem de si e do

outro o que garantirá a construção de sua cidadania e preparo para o convívio social

e sua relação com o trabalho.

Reafirmando a reflexão anterior Maria da Gloria Gohn (2006) diz:

A educação não formal designa um processo de formação para a cidadania, de capacitação para o trabalho, de organização comunitária e de aprendizagem dos conteúdos escolares em ambientes diferenciados. Por isso ela também é muitas vezes associada à educação popular e à educação comunitária.

.

Souza (2009) defende que a educação não formal tem relação direta com

as classes sociais mais baixas economicamente, visando suprir as deficiências do

ensino oferecido. O mesmo autor reforça também que a educação não formal acaba

tendo como objetivo a inserção de crianças e adolescentes claramente excluídos

socialmente, se tornando um espaço de formação, pois se sabe que o ensino formal,

que deveria garantir essa formação, não consegue suprir diretamente as

necessidades educacionais dos alunos.

19

A LDB (BRASIL, 1996) aponta que é dever da família e do estado garantir

o exercício da cidadania do indivíduo em desenvolvimento. De acordo com Gohn

(2006) ”Há na educação não formal uma intencionalidade na ação, no ato de

participar, de aprender e de transmitir ou trocar saberes”, tendo em vista o trabalho

coletivo e a preocupação com o processo de construção dos saberes e

aprendizados. Saberes esses que encontram novos espaços para sua construção.

Tendo em vista que são diversos os espaços onde ocorre a educação não

formal Gadotti (2008) expõe que a educação não formal perpassa o ambiente

escolar, que também pode trabalhar com educação não formal, e apresenta outros

espaços como as organizações não governamentais, as igrejas, os sindicatos, os

partidos, a mídia, as associações de bairros, etc. Espaços esses que também

garantem a formação e o processo educativo de nossas crianças e adolescentes.

2.1.3.1 As organizações não governamentais

Segundo Steil e Carvalho (2001) o termo ONG (organizações não

governamentais) aparece primeiramente em documentos das organizações das

Nações Unidas no final de 1940, e tem referencia a movimentos internacionais que

surgiram depois da segunda guerra mundial com o intuito de criar espaços

institucionais que visassem à garantia da paz entre as nações através da

cooperação econômica e do fortalecimento do diálogo entre os países. Nessa época

essas organizações tinham como objetivo socorrer os países destruídos pela guerra

e agir no intensivo combate à pobreza de países em desenvolvimento, tendo a

ideologia e a prática social denominada como "desenvolvimento de comunidades",

que pautariam as relações políticas de cooperação e de dominação dos países ricos

sobre os países pobres no Ocidente capitalista. Essa seria a primeira geração das

ONGs.

Lúcia Capanema (2004) diz que essa visão desenvolvimentista trouxe

para os países de terceiro mundo dois pontos extremamente decisivos para o

fortalecimento das desigualdades econômicas dentro dos mesmos, fazendo um

movimento inverso do que se desejava. Isso se deveu em primeiro lugar “a

estratégia de modernização e industrialização dos países pobres que incluía a

concentração de benefícios nas elites mais afinadas” e “essa concentração do

capital disponível visava aumentar o consumo de bens industrializados nacionais e

20

importados.” A autora prossegue dizendo que em segundo lugar a industrialização

se concentrou nas regiões mais desenvolvidas de cada país gerando conflitos entre

regiões agrícolas e regiões industrializadas. Isso junto à utilização de tecnologia e

mecanização de algumas áreas agrícolas fizeram com que os camponeses

migrassem para a região industrial em busca de sobrevivência gerando assim

“bolsões de miséria” nas periferias das grandes cidades.

Steil e Carvalho (2001) se posicionam dizendo que a segunda geração de

ONGs teve como referencia as políticas europeias no desenvolvimento da década

de 1970 e sintetizam que “estas políticas envolviam tanto fundos governamentais de

assistência oficial, quanto a rede de organizações de cooperação internacional,

formada por fundos de cooperação não governamental para o desenvolvimento

social.”

Os fundos não governamentais eram vindos de igrejas cristãs, mas

também de entidades da sociedade civil. E os mesmos autores prosseguem dizendo

que os fundos europeus tiveram como destino os “centros e institutos de educação e

assessoria que surgiram como focos de resistência aos regimes militares,

financiando atividades de formação de lideranças populares e apoiando

organizações dos movimentos sociais e sindicatos.”

Sabendo que o Brasil no período em questão estava passando por um

regime militar e que todo esse movimento acontecia de forma clandestina esse

investimento europeu fortaleceu os movimentos sociais existentes no combate ao

regime ditatorial, as ações tinham como ponto inicial tornar possível uma base ligada

à classe menos favorecida através da participação em sindicatos, associações de

bairro e movimentos sociais que atenderiam a grupos de todos os tipos, étnicos, de

gênero, de orientação sexual, meio ambiente, etc., pois fortalecer essas classes era

o objetivo.

De Acordo com Steil e Carvalho (2001) partindo da I conferência de meio

ambiente em 1972 surgiu uma nova concepção de ONGs, que teriam por objetivo

incluir em sua luta social conceitos como desenvolvimento social, cidadania e

sociedade civil. No entanto reafirmam que desde 1970 esses conceitos já eram

identificados. E continuam dizendo que “as ONGs se apresentam como uma

invenção social que passou por diferentes processos de múltiplas definições que

acompanharam as conjunturas sociais e políticas que se sucederam desde sua

origem até os dias de hoje.”

21

As organizações não governamentais vêm no processo histórico

legitimando os movimentos sociais contrários ao sistema político, criando as

organizações da sociedade civil, tendo por finalidade fortalecerem os movimentos

populares que visam à igualdade social e a luta a favor das classes excluídas e

menos favorecidas, como esclarece Oliveira e Haddad (2001):

Numa acepção mais contemporânea, portanto, a sociedade civil organizada e organizações da sociedade civil confundem-se para designar o multifacetado universo das organizações constituídas livremente por cidadãos que atuam diante da carência de produtos e serviços que o Estado não atende de modo satisfatório e o mercado não tem interesse de atender.

Portanto as organizações não governamentais estão suprindo alguns

serviços cuja carência o poder público não consegue atender de forma satisfatória.

Nesse contexto a educação tem sido uma das favorecidas. Steil e Carvalho (2001)

expõem que as ONGs vêm assumindo um papel ativo perante o estado na luta por

direitos, Estado esse que deveria garantir os direitos do cidadão e seu bem estar

social. Com a omissão do estado nessa garantia cria-se assim um ambiente

favorável às iniciativas vindas da sociedade civil “Que venham a substituir o Estado

na realização de políticas públicas e de assistência social.”

Os mesmos autores também relatam que já na metade da década de

1990 surge outra concepção de ONGs direcionada para o fortalecimento de parceria

e voluntariado buscando diminuir ou até mesmo eliminar a participação do estado na

sustentação das organizações, buscando potencializar o financiamento no contexto

internacional, com isso elas tiram o peso do poder público na efetiva garantia de

direitos e o colocam de forma distribuída nas organizações sociais, no entanto é

claro que “as ONGs não são capazes de sustentar políticas públicas universais,

assim como está fora de sua alçada saldar a enorme dívida social do país.”

Oliveira e Haddad (2001) dizem que no Brasil as ONGs ganham maior

visibilidade nacionalmente a partir da Conferencia Mundial da Organização das

Noções Unidas (ONU) ocorrida no Rio de Janeiro, encontro esse chamado de ECO-

92 e que a imprensa da época utilizou o nome ONG como sinônimo de entidade de

cunho não lucrativo. É durante a história que se vai criando uma identidade própria

das ONGs e uma clareza maior da sua atuação dentro do território brasileiro e os

objetivos na de sua prática social.

22

As ONG´S trazem em sua luta a reflexão na defesa das classes menos

favorecidas, e na garantia de suprir as necessidades básicas que são negadas a

uma parte da população, segue no seu contexto educacional o mesmo processo em

que busca refletir a realidade social e a formação do senso crítico do individuo na

garantia de seus direitos, educação essa dita não formal, pois não segue uma

estruturação ou conteúdo pré-definido como se vê na educação formal.

23

3 A PEDAGOGIA SOCIAL, OS VALORES HUMANOS E A EDUCAÇÃO PARA A

CIDADANIA

3.1 A pedagogia social

Diaz (2006) defende que a Pedagogia Social é de caráter teórico e

prático, que tem relação com a socialização do sujeito, possuindo como

característica além do trabalho social a ação sobre os seres humanos sendo nesse

sentido mais uma vertente educacional que intervém socialmente “em situação

normal como em situação de conflito ou necessidade.” Essa intervenção não

necessariamente precisa estar dentro de um ambiente regular de ensino, pois a

pedagogia social age em todos os espaços onde é desenvolvida a vida humana.

Rodrigues (2001) afirma que a educação é o processo regular

desenvolvido em toda sociedade e tem por finalidade preparar os indivíduos em

processo de crescimento para assumirem um papel social referente à vida coletiva,

para garantir a sua existência através do trabalho, para um comportamento justo na

vida pública, e para o uso de suas habilidades de forma responsável no seu

cotidiano. E reforça que: “Ao redor desses aspectos se desdobra o conjunto das

ações educativas a ser desempenhada pelos sujeitos educadores, entre eles a

escola.”

A formação do ser cidadão perpassa por todos os espaços de convívio

social do individuo, onde o espaço educacional formal e não formal e também

informal é o segundo espaço social em que a criança é inserida e tem grande peso

na sua formação. Logo após a família é nesses espaços que o educando poderá

suprir as suas necessidades, sendo orientado e ajudado para seu desenvolvimento

social.

Segundo Pinto (2005) o desenvolvimento das competências do indivíduo

pode ser variado e tanto o espaço formal, não formal e o informal permite um

aprendizado eficiente, em que os educandos aprendem de formas diferentes.

A educação é de grande contribuição para a formação do homem e sua

relação social, na qual o internalizar de valores sociais é primordial para um convívio

social mais saudável, garantindo então a formação de seres sujeitos de sua própria

história, conhecedores de seus direitos eminentes à vida. Graciani (2006) coloca

isso de maneira bem clara quando expõe que:

24

As contribuições positivas da educação para a sociedade destacam-se duas: a reorganização da cidadania, pela criação de uma ordem mais justa, fraterna e o desenvolvimento de habilidades, competências para a vida, que permitam menos exclusão e desigualdades sociais e econômicas, levando-se em conta a diversidade e o multiculturalismo, com valorização de valores cívicos, culturais, sociais e morais, com ênfase no meio ambiente e na ética, além da pluralidade cultural banalizada pelo conhecimento científico, técnico e humanista na formação dos aprendizes. A educação é uma atividade para vida, que ocorre na família, na rua, na igreja, no trabalho, na escola e em todos os espaços sociais.

Levando em conta as reflexões anteriores é notório que a educação

precisa se reorganizar para de fato atender de maneira efetiva aos elementos

referentes à formação de nossas crianças e adolescentes como um todo, em que

considerar o educando como ser mutável e ativo nesse processo e perceber sua

posição enquanto educador é elemento de grande importância na formação da

cidadania, permitindo a formação de seres humanos críticos e reflexivos sobre sua

própria realidade. Tudo isso precisa ter como base a presença dos valores humanos

na educação.

3.2 Os valores humanos e a educação para a cidadania

Segundo Roberto Carlos Simões Galvão (2010) a educação para a

cidadania está diretamente ligada à formação de agentes transformadores, seres

reflexivos que compreendem historicamente sua própria realidade, seres esses

capazes de mudar seu contexto social e intervir diretamente no mesmo, se

percebendo como seres políticos.

Cecília M. Krohling Peruzzo (2013) acredita que a educação é “também

educar para a convivência social e a cidadania, para a tomada de consciência e o

exercício dos direitos e deveres do cidadão.” E continua dizendo que “A conquista da

cidadania significa a passagem de súditos para cidadãos, dentro de um arcabouço

social que requer o envolvimento das pessoas, condicionando-se seu status de

cidadão à qualidade da participação”.

Sobrinho (2008) reforça que: “Tudo em educação deve estar referido à

formação de seres humanos, tendo em vista a edificação de uma vida em sociedade

mais elevada, justa e digna.” Essa formação permite ao educador criar

possibilidades de incluir novos valores na sua construção do educando, enquanto

25

ser de direitos, baseado em uma educação cidadã que busca através da formação

despertar no educando o ser sujeito ativo que busca igualdade e qualidade de vida

na perspectiva de crescimento e aprimoramento de valores referentes ao convívio

social.

Sabe-se que na história o conceito de cidadania se diverge, todavia

Rodrigues (2001) consegue chegar próximo do ponto referente à cidadania para

educação quando socializa que:

Do ponto de enraizamento histórico, remetemo-nos ao mundo clássico construído pelos gregos e que nos liga à ideia de pólis como comunidade constituída por indivíduos livres, autônomos, habitantes de um determinado espaço geográfico e social. Interessa-nos, sobretudo para este trabalho, considerar que para ser cidadão na Grécia clássica algumas condições deveriam ser preenchidas. Só poderia ser cidadão o indivíduo livre para expressar e exercer a sua vontade no espaço público e assumir as responsabilidades decorrentes dessa vontade.

Facilitar a construção desse sujeito livre capaz de se expressar de forma

a expor sua vontade, ciente da responsabilidade de seus argumentos é o papel

primordial para o educador, acreditando contribuir na formação de sujeitos críticos e

principalmente sujeitos ativos e construtores de novos aprendizados.

3.3 A afetividade na educação

Segundo Miranda (2008) a interação existente entre professor e aluno é

ampla e perpassa as paredes físicas da escola, pois nessa relação estão envolvidos

sentimentos que podem marcar a vida do educando, tendo em vista que a busca da

afetividade nessa relação é de grande impacto na formação e facilitação do

processo de aprendizagem tanto para a construção do conhecimento quanto para o

desenvolvimento do aspecto emocional do educando. E adianta que o professor

precisa se colocar perante o aluno como ser facilitador, mediador do aprendizado e

não como ser supremo detector de todo o conhecimento, e continua dizendo que ser

professor não é apenas transmitir conhecimentos “consiste em despertar no aluno

valores e sentimentos como amor ao próximo e o respeito entre outros.” Consiste na

garantia através da educação para a formação de cidadãos.

Ainda de acordo com Miranda (2008) a educação afetiva está ligada

diretamente a visão humanística do educador sendo o afeto a base para o

26

desenvolvimento do educando. Nesse contexto é importante que o educador

trabalhe partindo de seus próprios valores e questionando constantemente seus

preconceitos, buscando se tornar livre de qualquer ação discriminatória:

É preciso que os professores se percebam enquanto agentes históricos e atuantes na sociedade em que vivem, para que então eles possam vir a influenciar ou auxiliar os seus alunos a adotarem uma posição crítica diante da mesma, pois um ser inconsciente e sem ideologia só pode contribuir para a formação de um cidadão acomodado, passivo e alheio aos acontecimentos que se encontrem ao seu redor.

De acordo com Santos e Molon (2008) a educação deveria garantir

através de novos conhecimentos adquiridos pelos educandos a concepção de futuro

e a elaboração de projetos pessoais e profissionais na perspectiva de um futuro com

mais oportunidades, sendo a mesma elemento primordial na formação integral do

individuo e essa formação integral tem relação direta com o educador. Como o aluno

lida também com as questões afetivas dentro do ambiente escolar, os autores

ressaltam que esses saberes afetivos e emocionais, que são adquiridos a partir de

suas experiências, muitas vezes não são levados em consideração por alguns

educadores.

O educador seja no ensino regular, seja em qualquer outro espaço de

formação tem na sua ação a representação de uma ideologia, sendo essencial

compreender seu papel ativo na prática pedagógica e sua importância para a

construção de atitudes e afloramento de valores que compõem a personalidade dos

educandos.

Tendo em vista as reflexões anteriores Versoza (2010) coloca que as

habilidades dos educadores ultrapassam o caráter físico e técnico, tendo o

profissional da educação que desenvolver as habilidades referentes à subjetividade,

ao contato social, à comunicação, ao acolhimento e à sensibilidade.

É importante ressaltar que a afetividade está diretamente ligada a essas

habilidades e que elas permitem uma aproximação e uma relação construída através

da confiança e do respeito entre educador e educando, com grande ressalva a um

item que é de suma importância que é a sensibilidade do educador, pois o mesmo

precisa ter o entendimento de que a mesma permitirá a construção da afetividade

diante de uma realidade social que necessita de uma intervenção positiva, ou seja, o

educador só irá intervir se realmente acreditar na sua prática pedagógica e

27

principalmente se estiver incomodado com a condição vulnerável de suas crianças

e/ou adolescentes.

28

4 A EDUCAÇÃO DE ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE

SOCIAL

4.1 Crianças e adolescentes em vulnerabilidade social

Sierra e Mesquita (2006) se posicionam dizendo que o ser vulnerável não

tem ligação alguma com o ser incapaz, vulnerabilidade tem relação com a

possibilidade de superação de fatores de risco e das condições que são oferecidas

para facilitar a superação dessa situação de risco na perspectiva de efetivar e

garantir o bem estar e o desenvolvimento das crianças e adolescentes, no entanto é

refletido que: “Se por um lado eles adquiriram o direito à proteção integral, por outro

lado perdem a chance de serem considerados eternamente vítimas dos problemas

sociais.”

Segundo Gomes e Pereira (2004) a situação das comunidades carentes e

o esquecimento pelo poder público ainda é gritante, de fato que a preocupação do

Estado está direcionada para o crescimento econômico do país, sem haver

preocupação com a desigualdade social enfrentada pela população, essa

desigualdade fica clara quando os autores relatam que:

Pobreza não pode ser definida de forma única, mas ela se evidencia quando parte da população não é capaz de gerar renda suficiente para ter acesso sustentável aos recursos básicos que garantam uma qualidade de vida digna. Estes recursos são água, saúde, educação, alimentação moradia, renda e cidadania.

Se essa realidade já é desumana para os adultos, imagine essa situação

vivenciada por crianças e adolescentes em pleno desenvolvimento e na construção

de seus valores e atitudes que serão fundamentais para formação de sua

personalidade.

De acordo com Gomes e Pereira (2004) a condição econômica das

famílias e o fator social é ponto primordial na garantia de um desenvolvimento

saudável da população como um todo, e ressaltam que as crianças e adolescentes

são os seres mais vulnerável quando se fala de direitos negados tanto pelo poder

público quanto pela sociedade em geral e acrescentam: ”A pobreza, a miséria, a

falta de perspectiva de um projeto existencial que vislumbre a melhoria da qualidade

de vida, impõe a toda a família uma luta desigual e desumana pela sobrevivência.”

29

É gritante a quantidade de crianças e adolescentes em situação de

vulnerabilidade social. No século XIX as mães, que na época não podiam assumir a

maternidade solteiras devido à cultura da época, tinham que entregar para as

poucas instituições existentes suas crianças como forma de garantir a sua

sobrevivência, muitas colocavam seus rebentos em “rodas” como coloca Gisella

Lorenzi (2000):

A Roda constituía-se de um cilindro oco de madeira que girava em torno do próprio eixo com uma abertura em uma das faces, alocada em um tipo de janela onde eram colocados os bebês. A estrutura física da Roda privilegiava o anonimato das mães, que não podiam, pelos padrões da época, assumir publicamente a condição de mães solteiras. Mais tarde em 1927 o Código de Menores proibiu o sistema das Rodas, de modo que os bebês fossem entregues diretamente a pessoas destas entidades, mesmo que o anonimato dos pais fosse garantido.

No século XXI a situação das crianças ainda é bastante crítica, pois se

antes a mãe entregava seu filho nas instituições, hoje as crianças são abandonadas

em instituições, nas ruas ou dentro de casa. Estas são vítimas de um sistema bem

mais cruel, em que seus direitos básicos são negados, dentre eles o da educação.

Hoje se vive em uma triste realidade quando se fala na formação de

crianças e adolescentes, em que grande parte dos direitos fundamentais e à vida

estão sendo negligenciados e que a educação formal não garante efetivamente uma

formação humana. Rodrigues (2001) expõe que:

O ato de formar o ser humano se dá em dois planos distintos e complementares: um de fora para dentro e outro, de dentro para fora. Pelo primeiro, ele “precisa ser educado” por uma ação que lhe é externa, de modo similar à ação dos escultores que tomam uma matéria informe qualquer, uma madeira, uma pedra, ou um pedaço de mármore, e criam a partir dela um outro ser.

Portanto fica claro que todo ambiente e toda relação construída pelo

educando irá refletir diretamente no seu desempenho educacional e principalmente

na sua formação enquanto cidadão. Por isso é importante entender que a educação

segue diversos caminhos para a formação da cidadania do individuo e tem relação

direta com os valores, ações e relações do educando.

De acordo com Pereira (2010) a vulnerabilidade de crianças e

adolescentes se caracteriza diretamente pela ação das desigualdades sociais, tendo

em vista os direitos negados como o convívio familiar e convívio social, falta de

30

acesso à educação, saúde, lazer, alimentação, a inserção precoce no trabalho, alto

índice de reprovação escolar, acesso ao consumo de drogas, a falta de perspectiva

de futuro e o recurso mínimo para a sobrevivência.

O Estatuto da criança e do adolescente (Lei. 8.069 de 1990) defende no

artigo 3º que “a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais

inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata essa lei,

assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades,

a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em

condições de liberdade e dignidade.”

O educador não pode se ver à parte da realidade social como afirma

Souza (2009): “O pedagogo não pode perder de vista os problemas sociais,

especialmente num tempo em que eles são potencializados por reflexões e

implicações da globalização, pela desigualdade e pela pobreza.” Identificar as

condições socioeconômicas dos educandos é passo primordial para uma educação

cidadã e para uma intervenção do educador na realidade social de seu educando.

Paulo Freire (1996) afirma que a realidade social é transformável, que é

feita pelo homem e o próprio homem pode muda-la, que não é algo estático e

acabado, como se houvesse um único caminho, cabendo à sociedade acomodar-se

a essa realidade. Ressalta também: “Que o fatalismo vai sendo substituído por uma

crítica de esperança que pode mover os indivíduos a uma cada vez mais concreta

ação em favor da mudança radical da sociedade.”

Pode-se perceber que não é só dentro do ambiente escolar que se

garante a formação da criança em situação de vulnerabilidade social. Natali (2009)

afirma que desde 1990 no Brasil é no contra turno do ensino regular que devem ser

garantidas as políticas públicas não governamentais de direito ao atendimento de

crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, e ele destaca o papel

do educador social como ser mediador educacional.

31

4.2 O educador social

Segundo Natali (2009) nos dias atuais o educador social atua em diversos

campos como “presídios, asilos, instituições de cumprimento de medidas sócio-

educativas, programa de redução de danos entre outros” e reforça que a formação e

ação do educador social está direcionada às lutas da classe popular e que devem

ser constantes as reflexões sobre sua prática e seu papel social.

De acordo com Diaz (2006) a educação social:

È uma ação educativa que procura que os indivíduos pertencentes a uma determinada sociedade se formem e adquiram as habilidades e competências sociais, consideradas necessárias para alcançarem a integração social. Educar para a participação social implica, fundamentalmente, melhorar as relações em todos os âmbitos relacionais da pessoa, é preparar o homem para actuar com habilidades sociais no campo das relações laborais, é gerar mudanças de atitude, face à cultura e às outras culturas, é, finalmente, assumir os princípios básicos de uma justa convivência social.

Diaz (2006) prossegue dizendo que a educação social também é a

intervenção educativa que ocorre perante um problema social existente e reforça

que a educação social não só deve responder aos problemas sociais como também

buscar efetivar e facilitar a promoção da qualidade de vida do cidadão, tendo em

vista estratégias que visem prevenir o desequilíbrio social que porventura surja.

Portanto intervir no âmbito social, cultural, econômico, emocional, na eminência de

prever situações de risco para crianças e adolescente.

Diaz (2006) ainda diz que a educação social não se limita apenas ao

espaço não formal, ela age e interage na vida do cidadão, e ainda fala que “A

educação social alcançará o seu verdadeiro espaço quando conseguir melhorar a

convivência entre os cidadãos.” O educador social tem um papel de grande impacto

na vida de crianças e adolescentes quando em sua prática busca desenvolver as

habilidades de seus educandos, potencializar seus valores, refletir suas posturas e

aflorar sentimentos que agregam e que constroem, visando em suas ações à

construção de uma sociedade mais justa e solidaria.

Junior (2011) diz que o educador social tem que assumir um papel ativo

tendo na sua ação propósitos claros, sempre possuindo como veículo a interação

para a construção do saber, em que deve desafiar os educandos permitindo que

32

essa construção seja dinâmica, na intenção de fortalecer o processo participativo

para um aprendizado coletivo partindo dos conhecimentos de cada um.

O autor também acrescenta dizendo que algumas habilidades são

importantes para facilitar esse processo de aprendizado e cita algumas como a

flexibilidade para lidar com o novo e o que é diferente, saber lidar com as

expectativas, sonhos, nível de aprendizado e experiências dos educandos, como

também ter a capacidade de ouvir e levar em conta cada saber, saber falar de forma

doce e amigável e principalmente estar aberto para a busca de novos

conhecimentos para sua prática.

Secco (2011) coloca que um enorme desafio do educador é estar

inserido em um contexto dominante, onde está sujeito às regras e preconceitos

ditados pelo sistema opressor e capitalista e diz que ele deve sempre questionar a

prática e nunca ignorar elementos que produzam falas ou atitudes de preconceito de

qualquer seguimento. Se perceber enquanto sujeito com qualidades e defeitos tem

grande significado na prática educativa, pois é com base nisso que também

entenderá o outro na tentativa de criar ou facilitar a propagação de valores

essenciais para a vida em sociedade.

Graciani (2011) diz que para combater práticas educativas que

descriminam o educando, convém direcionar a formação do educador para uma

visão crítica e profunda do mundo, com essa prática o profissional de educação

pode “reinterpretar seu papel como sujeito histórico, crítico e criativo, passando a se

reconhecer como sujeito da ação educativa, transformador de sua historia e da

historia social.” E prossegue dizendo que com a visão transformadora o educador

pode entender as causas de um fenômeno e identifica-lo, para poder sensibilizar,

acolher, intervir na realidade de seus educandos.

Graciani (2011) discorre dizendo que:

O ser humano não gosta de se sentir segregado, solitário, abandonado, pois essas situações causam medos, angústias, esgotamentos físicos e emocionais, sentimentos de autodesvalorização, impotência, fragilidade e desesperança. Somos seres Integrais, plenos, que desejamos ser cuidados e merecemos ser reconhecidos em nossa singularidade, exclusividade e potencialidade, para participar da construção coletiva de possibilidades de uma vida comunitária saudável e profícua.

As crianças e adolescentes são claramente vítimas das situações citadas

anteriormente, é notória a desestruturação da família, a violência social, a droga, a

33

falta de infraestrutura, até mesmo a falta de moradia e de condições dignas de vida.

Tudo isso afeta diretamente a formação dos mesmos tendo o educador social

grande responsabilidade em sua ação, pois diante de grandes dificuldades

enfrentadas por vezes ele é a única alternativa para a saída dessa situação.

34

5 METODOLOGIA

5.1 Tipo de pesquisa

O trabalho teve como alicerce a pesquisa bibliográfica que permite uma

compreensão geral do objeto de pesquisa, em seguida utilizou o estudo de caso. Os

dados foram coletados através de entrevista com educandos que fizeram parte de

um projeto de uma Organização governamental entre 2008 a 2011 utilizando um

roteiro (APÊNDICE A).

O estudo de caso utiliza como principal ferramenta de coleta de dados a

aplicabilidade, na tentativa de obter através do método prático as informações e os

resultados desejados. (BOAVENTURA, 2004).

Tendo em vista a colocação do autor citado anteriormente o estudo visa

comprovar de maneira eficaz através do estudo de caso a relação da afetividade

com a educação e suas contribuições no processo de ensino/aprendizagem.

5.2 Cenário e período de pesquisa

O projeto Crescer com Arte Jangurussu é um projeto da Fundação da

criança e da família cidadã (FUNCI) estando hoje unificada a Secretaria dos direitos

humanos da prefeitura de Fortaleza, onde o espaço físico, a contratação de

profissionais e todo recurso que garantem o funcionamento do projeto parte da

gestão municipal.

O projeto se localiza no bairro do grande Jangurussu mais precisamente

na comunidade do João Paulo II e atende cerca de 100 adolescentes da área, sendo

seu trabalho voltado para arte-educação, onde são desenvolvidas linguagens

artísticas tais como: teatro, percussão e dança, e também oficinas temáticas

aplicadas pelos educadores sociais. Seu público atendido é composto por

adolescentes em situação de vulnerabilidade social (situação de abuso e exploração

sexual, situação de trabalho Infantil, violência doméstica, situação de drogadição,

etc.).

Por motivos citados anteriormente o Crescer com Arte Jangurussu é o

projeto escolhido para a realização desse estudo de caso, sobre o qual foi realizada

entrevista com ex-alunos no mês de novembro de 2013.

35

5.3 Participantes da pesquisa

A pesquisa monográfica teve como base as entrevistas realizadas com

antigos educandos do projeto crescer com arte na comunidade do João Paulo II,

situada no bairro do grande Jangurussu área de grande índice de desigualdade

social e alto índice de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade

social, buscou-se com as entrevistas estruturadas identificar quais as contribuições

do educador afetivo na formação de valores e construção da cidadania de

adolescente participantes do projeto social citado.

Tendo em vista que a pesquisa se realizou com adultos que no período de

sua adolescência participaram de forma efetiva nas atividades realizadas no espaço

Crescer com Arte Jangurussu, espaço esse em que o pesquisador trabalhou por

cinco anos como educador social ( de 2007 a 2011). Foi levando em consideração

tanto às percepções dos educandos quanto as vivencias que o educador teve no

período citado dentro do espaço educativo com esses adolescentes.

Os entrevistados foram escolhidos devido a grande afinidade existente

entre eles e o pesquisar, e também pelo longo período em que estiveram juntos no

projeto Crescer com Arte.

5.4 Coleta de dados

Para a coleta de informações foi utilizada a entrevista direcionada e

estruturada, visando obter de forma mais concisa e contextualizada as informações

necessárias para a identificação das contribuições da afetividade, utilizada pelo

educador social, na vida de adolescentes.

Foram entrevistado três ex-educandos do projeto em questão no início de

novembro, num sábado pela manhã, entrevista essa realizada na residência do

próprio entrevistador que por meio das redes sociais conseguiu o contato dos

mesmos e pôde convidá-los para a pesquisa e para um café da manhã em sua casa.

No dia da pesquisa, depois do café da manhã foi apresentado um vídeo

para os entrevistados mostrando os trabalhos artísticos realizados por eles no

período em que estiveram no projeto no intuito de resgatar um pouco das vivencias

realizadas nesse período. Foi feito por eles um resgate histórico de sua participação

36

no projeto e um relato da sua percepção sobre a contribuição da relação afetiva

construída entre o educador social e os educandos na sua vida atual.

5.5 Análise de dados

Foram analisados os discursos dos educandos através de entrevista de

maneira a apresentar as considerações dos mesmos sobre a sua formação e sua

relação com os educadores afetivos, cujos dados serão confrontados com as

contribuições dos teóricos expostos nesse trabalho, buscando embasar o trabalho

em questão.

37

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO

6.1 Descrição das vivências do educador social no Projeto Crescer Jangurussu

Os adolescentes frequentam o espaço Crescer com arte Jangurussu três

vezes na semana em um único período, sendo que desses dias, dois são

trabalhados o produto artístico e em um terceiro são realizados momentos de

formação em diversas temáticas com os adolescentes, como: trabalho Infantil,

sexualidade, projeto de vida, gênero, abuso e exploração de crianças e adolescente,

o ECA (Estatuto da criança e adolescentes), valores sociais (afetividade, família,

amigos, cultura, respeito, cuidado), cultura de paz, primeiro emprego, dentre outros.

A equipe de trabalho compõe-se por: um porteiro, uma cozinheira e uma

auxiliar, uma coordenação de projeto, um auxiliar de serviços gerais, quatro

educadores sociais e três arte-educadores (teatro, dança e percussão).

O educador social além de realizar formações temáticas, é incumbido de

fazer o acompanhamento dos adolescentes nos espaço em que estão inseridos

(família, escola e projeto) na busca de identificar se a criança ou adolescente está

passando por qualquer tipo de violação de seus direitos. Quando identificada a

violação, o educador encaminha o caso ao respectivo órgão competente. Por

exemplo, quando identificado que o adolescente está em situação de trabalho infantil

é feito um relatório da situação do adolescente pelo Educador e encaminhado para

secretaria de direitos humanos para a apuração do caso, sendo o educador

responsável pelo acompanhamento do mesmo.

O que se percebe através do convívio com crianças e adolescentes em

um Projeto Social na área do grande Jangurussu, bairro com o menor Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH) em Fortaleza, que a não execução das políticas

públicas de forma eficaz e a não garantia dos direitos explícitos no ECA (Estatuto da

Criança e do Adolescente, 1990 ), gera uma resistência à educação formal e

proporciona uma identificação com o processo não formal e informal, visto que a

relação educador/educando se dava através da troca de experiências, respeito

mútuo e admiração.

O educador social trabalha nesse projeto diretamente na formação da

cidadania através de oficinas temáticas ou ações educativas dentro ou não de um

espaço determinado, onde são discutidas temáticas referentes à vida e as relações

38

construídas dentro dos espaços cotidianos dos educandos, temáticas essas que

podem seguir o percurso das demandas provenientes da realidade em que vivem,

não seguindo um calendário pré-definido. O que vai indicar o caminho a ser seguido

no processo de formação da cidadania é simplesmente a condição social e a

realidade existente, como também as dificuldades enfrentadas pelos educandos,

sabendo que vários direitos são negados e negligenciados pela sociedade e pelo

próprio poder público.

É importante compreender que o educador social partindo da convivência

com o educando se torna durante essa relação ser de referencia, ajudando a suprir

as necessidades de família dos educandos, claro que não a substituindo, mas

sabendo que as relações afetivas dentro do seio familiar como na maioria estão

bastante fragilizadas, nesse contexto o educador passa a assumir para muitos o

papel de pai ou mãe ou membro da família. É necessário o educador ter consciência

do seu papel enquanto orientador, no que se refere ao sensibilizar e ser referencial,

no entanto não é recomendável assumir o papel referente à família mesmo sabendo

das fragilidades, pois o educador deve se posicionar de maneira a tornar o sujeito

seguro, independente e capaz de superar seus próprios desafios, não deve

fortalecer o ciclo de dependência dos educandos, dependência essa tanto emocional

quando sociocultural.

O educador busca fazer com que o educando reflita partindo do seu

contexto social e passe a questionar sua própria realidade, se torne sujeito

autônomo capaz de escolher o caminho a ser seguido, essa é uma das atribuições

do educador social. Paulo Freire (1979) reforça essa colocação quando diz que:

“Quando o homem compreende sua realidade, pode levantar hipótese sobre o

desafio dessa realidade e procurar soluções. Assim, pode transformá-la e com seu

trabalho pode criar um mundo próprio: seu eu e suas circunstancias.”

39

6.2 Entrevistas aplicadas

A entrevista continha seis questões e foi aplicada com três ex-alunos do

Projeto Crescer Jangurussu. Segue abaixo o que eles responderam.

Como você Iniciou sua Participação no Projeto crescer com arte?

Entrevistado 1: Eu conheci o projeto crescer com arte através de um

amigo, me interessei e acabei gostando. A princípio eu pensava que era só uma

aula, uma rotina: você vem, faz a aula e vai embora. Ali dentro foi tudo pra mim,

amizade, confiança e maturidade.

Entrevistado 2: Minha Irmã procurou saber do projeto através da

coordenadora e falou com minha mãe por que pra ela eu era uma pessoa

problemática e tinha que ocupar meu tempo, pra vê se eu mudava. Minha mãe me

colocou mesmo sem eu querer.

Entrevistado 3: Na escola tinha um rapaz que dava umas oficinas, ele me

falou que no crescer tinha uma vaga e ele queria que eu fosse para participar da

oficina de dança, na época eu era muito tímida, eu fui com a minha mãe, ai comecei

a participar, fui muito bem recebida e fui apresentada a todos.

Chegar a um espaço novo pode gerar algum tipo de rejeição inicial o que

aconteceu com os entrevistados que não se permitiam envolverem inicialmente nas

ações e tinham grande dificuldade em respeitar a organização e as regras que

regiam o ambiente em que funcionava o projeto. Com o tempo e mais abertos a

participar passaram aos poucos a se permitirem e envolverem nas ações e a

acompanharem o ritmo do projeto.

De acordo com Sierra e Mesquita (2006) a criança e o adolescente possui

formas peculiares de reagir diante de diversos contextos sociais, o que pode o tornar

mais ou menos vulnerável, tendo em vista que a questão de conduta e

comportamento não é levado em consideração quando se fala em condição de

vulnerabilidade, no entanto o autor reforça que é necessário considerar esse fator

como condição de vulnerabilidade, pois é possível identificar algumas competências

referentes a formação da personalidade.

40

Antes de entrar no projeto como era sua relação com a família e sua

relação nos espaços em que você frequentava? Cite alguma situação.

Entrevistado 1: Antes de entrar no projeto eu não tinha uma vida muito

apegada aos meus pais não, principalmente ao meu pai que era alcoólatra. Depois

que entrei no Projeto tive outro pensamento, eu acabei me aproximando mais, eu

era muito ignorante com ele por que ele chegava bêbado, a gente discutia. Quando

eu entrei no projeto mudou esse pensamento, fui mais carinhoso, olhei o lado sofrido

da pessoa, sofri com aquela pessoa, por gostar dela, me fez ser mais humano, mais

sensível.

Entrevistado 2: Eu não ficava muito em casa, eu era do tipo “adolescente

rebelde”, não era questão de falta de respeito, eu não tinha aquela convivência

amorosa com a família, a eu não tinha tudo isso, até mesmo com os amigos por

mais que na maioria do tempo era com que eles que eu ficava.

Entrevistado 3: Eu era quieta mas as vezes era muito arrogante com

minha mãe, como eu tinha 11 anos de idade eu não tinha o conhecimento que eu

tenho hoje, eu tratava minha mãe como se eu fosse dona do meu nariz. Eu já queria

sair, me mandar, eu já queria ser uma criança adulta e tinha uma relação muito ruim

com minha família. Quando eu entrei mesmo no projeto é que foi começando a

mudar, eu fui vendo que as atitudes que eu estava tendo em casa não estavam

sendo certas e com meus amigos também. Eu fui vendo que aquelas atitudes não

eram minhas, não era eu, que eu tinha que conhecer coisas novas.

A juventude se depara com uma realidade em que se está distante da

família, raramente há educação de qualidade, cultura, lazer, saúde, muitas vezes

sem perspectiva de mudança social, sem qualidade de vida. No caso dos

entrevistados o refugio e o apoio diante dessa situação vulnerável foi o seu

envolvimento no projeto, onde encontraram educadores que se disporam a ouvi-los,

orienta-los, e fomentaram a reflexão sobre sua própria realidade, visando torna-los

capazes de agirem perante essa realidade.

De acordo com Pereira (2010) a família é núcleo primário na garantia da

proteção da criança e adolescente, local de afeto e socialização, no entanto é nesse

ambiente que os mesmos se deparam com situações de descontrole e perturbações,

pois a imposições de regras, acordos e desacordos, questão de disciplina, ou

autoritarismo dos adultos facilitam o surgimento de crises nas famílias, sendo as

41

crianças e os adolescentes vítimas de relações familiares conturbadas e famílias

desestruturas e com pouco afeto.

É notório que algumas famílias não têm estrutura para preparar suas

crianças e adolescentes para a vida, para viver em sociedade, por diversos fatores

tanto econômicos, culturais, sociais, emocionais e também educativos. A

adolescência, fase de descoberta da autonomia, da identidade e de sentimentos que

não são claros para o jovem, é período em que a família não sabe como lidar com

essa situação, essa atitude pode criar no adolescente uma rejeição perante as

regras imposta de convivo social. Isso pode leva-lo ao afastamento do seio familiar,

podendo buscar refugio em outros espaços, com outras pessoas que por vezes não

os colocam em posição favorável para uma formação social aceitável ou construtiva.

O que a juventude da época fazia em seu tempo livre? Existiam outros

projetos sociais?

Entrevistado 1: ficava na quadra, na minha comunidade não tinha nada,

só o tráfico, muitos amigos meus morreram por causa disso e eu soube driblar

através do projeto isso dai.

Entrevistado 2: ficava assistindo TV, na rua ou ficava no telefone, pois

não tinha muito atrativo na comunidade.

Entrevistado 3: não tinha tanto espaço quanto tem agora pro jovens

realmente saírem da vida da droga, sair da vida da prostituição. Hoje o jovem

participa, tem mais oportunidades.

Segundo Pereira (2010) a concepção de condição de vulnerabilidade

introduz na criança ou adolescente uma visão de ser dependente com a autonomia

limitada e diz mais: “Esses jovens e suas famílias introduzem como atributos

negativos pessoais as falhas próprias de sua condição histórico-social.” Essa

condição se instala fortalecendo a situação de miséria e dependência, tanto material

como também afetiva, em que as pessoas acabam se considerando como seres

inferiores, incapazes e sem valor, fazendo com que o individuo se perceba como

desprovido de potencial e incapaz de sair da situação social em que vive. Na

educação esses fatores precisam ser levados em consideração, pois têm grande

peso na formação e na compreensão do comportamento do individuo ou da

comunidade.

42

A educação não formal vem trazendo para o contexto educacional uma

educação que parte de educando para educando, uma educação que busca tirar do

mesmo essa concepção de ser em condição vulnerável e passa a fomentar no

mesmo através de ações educativas que o envolvem e cativam, a identificação como

ser transformador e ativo, consciente de seus direitos e deveres, capaz de avaliar de

maneira crítica e intervir nas ações referentes à sua vida e da sua comunidade.

Quando o ser se vê como capaz e não vitima das condições ele passa a acreditar na

sua ação transformadora, com isso pode-se acreditar nessa transformação através

da educação não formal, de educação que busca despertar no educando o sujeito

crítico que estará disposto a reivindicar a garantia de uma vida melhor pra si e para a

sociedade.

Em relação a sua perspectiva de futuro, você acredita que o projeto foi

importante para a escolha de sua profissão? Por quê?

Entrevistado 1: antigamente eu era muito criticado por “pixar”, por

conhecer a cultura dos projetos sociais acabei sendo mais respeitado pela minha

arte, comecei a dar oficinas de grafite, o projeto só fez fortalecer meu desempenho

naquilo que eu aprendi. Isso foi bom para as pessoas me verem de forma diferente.

Entrevistado 2: depois que eu entrei no projeto, pude identificar os meus

sonhos, no projeto eu trabalhei minha criatividade, vi que eu gostava de trabalhar

com o público, tudo isso ajudou com que eu encontrasse um trabalho, uma profissão

que eu me identificasse.

Entrevistado 3: o conhecimento e a formação. Se eu nunca tivesse tido

uma oficina sobre entrevista de trabalho, hoje eu não teria noção do que é uma

entrevista de trabalho. Então eu acho que tudo que teve no projeto de formação foi

como se fosse Deus que colocasse na minha vida. Participe dessa formação por que

um dia você vai precisar na sua vida, com cada formação daquela hoje eu vejo que

precisei muito por que se não fosse à formação eu não seria a pessoa que eu sou

hoje.

Depois que saíram do projeto os educandos foram encaminhados para a

realização de curso profissionalizante e posteriormente passaram a estagiar no

período de um ano na função para a qual estavam se preparando. Hoje um dos ex

educandos trabalha como educador de grafite, dando oficinas na própria

43

comunidade; outro está se organizando para montar um negocio próprio na

perspectiva da garantia de estabilidade financeira; a outra está se preparando para o

Enem frequentando cursos preparatórios na eminência de galgar uma vaga na

universidade.

Aprender a não desistir e acreditar no futuro são a bandeira defendida

pelos entrevistados, pois estão em busca de formação e investindo nos seus

objetivos no desejo de garimparem condições de melhoria de vida na tentativa de

conseguirem uma vida melhor. Pode se considerar que o projeto crescer, tem

buscado a sua formação de sujeitos de direito e deveres, cidadãos responsáveis

pela construção de seus próprios valores e de acordo com o histórico dos sujeitos

aqui estudados provavelmente tem atingido esse objetivo.

Quais os valores que você identifica que adquiriu durante a sua

participação no Projeto?

Entrevistado 1: aprendi a ser uma pessoa melhor, a ver o mundo de outra

maneira, olhar sempre com olhar crítico. Os valores que ficam são a amizade,

respeito, ensinamento. Amizade é tudo, no projeto eu aprendi isso.

Entrevistado 2: hoje eu aprendi a valorizar um conjunto positivo, a família

e os amigos, a escutar mais minha mãe, valorizar as coisas boas que acontecem

comigo. A mudança maior foi em mim, nos meus valores, isso me ajudou a me

aproximar da minha família e a escolher meus amigos.

Entrevistado 3: os sentimentos eu acho que é respeitar e aprender a

deixar que os outros me respeitem, amar e ter atitude sem medo, a compreender o

outro e o amor pela família, muitas coisas eu aprendi lá.

Segundo Almeida (1997) a educação como proponham Wallon é a ação

para o desenvolvimento pleno do ser na formação de sua cidadania, sendo o outro

(Educador) o ser que assume responsabilidade total quando se fala em garantir essa

formação. A autora reforça dizendo que a prática pedagógica precisa buscar

valorizar a expressão da criança sem incentivar atitudes competitivas e

individualistas e prossegue:

(...) deve ensinar conteúdos que não camuflem a realidade e as contradições sociais e que permitam à criança e ao adolescente escolherem valores sociais e morais que não resultem em submissão e conformismo,

44

mas que promovam o desenvolvimento da pessoa, nas suas dimensões individual e social.

A cidadania vê o ser comum como sujeito de direitos, respeitados nas

suas particularidades e elemento essencial na relação social. Compreender limites e

respeitar o outro, tendo cuidado com o ser humano, são valores que se aprende ou

deveria aprender na base familiar e na escola. A educação é caminho para a

garantia da cidadania, da formação humana, valores que também são aprendidos

com professores/educadores.

Como era sua relação com os educadores?

Entrevistado 1: eu respeitava os educadores e eles me respeitavam, eu

sempre fui bem carinhoso com eles e eles comigo.

Entrevistado 2: era mesmo uma família, problemas eles resolviam era

tudo divertido, no momento de ser sério era sério pra dar conselhos, coisa assim.

Era de certa forma tipo um refugio da sociedade com eles, que a sociedade muitas

vezes julga, bate e rebate nosso jeito, mas lá não, eles aceitavam a gente como a

sociedade deveria aceitar.

Entrevistado 3: os educadores foram mais que professores. Pra mim

foram amigos, não foram só educadores, só aquela pessoa que me ensinou a

formação que tinha, foram pessoas que estavam lá comigo que muitas vezes eu

cheguei pra conversar sobre a minha vida, contava o que estava acontecendo. Os

educadores faziam o que nossos pais deveriam fazer, eles não foram só

profissionais, foram amigos, pessoas que eu iria chegar e contar, e eles iriam me

ajudar. Eu acho que o melhor de um educador social depois que a pessoa sai e se

lembra de tudo, é ver o quanto aquela pessoa mudou, o quanto ela está diferente, o

quanto você ensinou aquela pessoa a ser uma pessoa melhor, e hoje ela está

melhor do que você ensinou. Você mudou aquela pessoa, você ensinou o que você

sabia, aquela pessoa acolhe o que você tinha e hoje ela está bem melhor do que era

antes, eu acho que eu era assim.

O afeto é primordial para uma relação saudável, é partir do mesmo que

toda relação se constrói, é a abertura para a troca de atitudes positivas e

acolhedoras. Na educação é a porta para uma relação composta de carinho,

respeito, valorização, atenção, cuidado e principalmente repleta de verdade no que

45

se faz e diz partindo da confiança alimentada no cotidiano entre educador e

educando.

A afetividade é a forma de trazer o aprendizado de maneira acolhedora e

aceitável tornando o aprender algo de enorme significado para a prática do

educando. A afetividade e a educação para a cidadania tem como base proporcionar

a mudança de forma reflexiva, tendo claros os direitos e deveres do ser cidadão e

consciência da necessidade de se criar um mundo melhor para todos, um mundo

bem mais agradável de viver onde o homem cuida do homem como de si mesmo.

Segundo Carvalho e Faria (2010) a educação que tem como finalidade

desenvolver o ensino e aprendizagem da criança deve também trabalhar os

sentimentos pessoais e interpessoais não só como complemento curricular mas

como parte do currículo do educando, sendo de fato uma nova maneira de conceber

esse processo, e continua dizendo: “O afeto é muito importante para que um

professor seja considerado eficiente e é muito importante para o aluno sentir-se

importante, valorizado.”

Isso abre portas e cria muitas possibilidades no que se refere à

construção de um mundo melhor.

46

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo permitiu que os objetivos traçados fossem atingidos e o

questionamento inicial respondido fazendo crer que a educação deve ser munida de

afetividade e valores para a formação de cidadãos, sujeitos conscientes e críticos,

que realmente façam a diferença em sua vida e na de outras pessoas.

Partindo das entrevistas realizadas é notória a importância dos

educadores afetivos nas vidas e na construção de valores em adolescentes. Pode-

se perceber isso quando os mesmos expressam de maneira afetuosa sua posição

em relação à ação dos educadores na sua historia, e quando se posicionam fazendo

um levantamento dos aprendizados adquiridos durante o período em que estiveram

no projeto.

Pôde-se identificar também satisfação e o brilho no olhar de cada um

quando relembravam do passado e resgatavam tudo o que significou para eles na

época, a saudade e também os ensinamentos que os educadores ofereceram como

algo que hoje faz diferença em suas vidas. Os educadores eram considerados por

eles como amigos, apoio, cuidado, carinho, refugio, afeto.

O que pode caracterizar esse trabalho é a transformação social através

de uma relação afetuosa que vem de encontro a relações conturbadas e por vezes

agressivas vivenciadas pelos educandos, que simplesmente desejam serem

ouvidos, cuidados, respeitados na sua individualidade e orientados. A pesquisa

mostra que a educação afetiva independente do ambiente em que aconteça,

precisando partir do educador para o educando, precisa ser significativa, ter sentido

e utilidade para sua realidade.

O trabalho constata que a afetividade dentro do ambiente educativo

permite o pleno desenvolvimento do ser, abre um leque de possibilidades, é um

caminho para o aprendizado significativo, é o exercício para utilização de valores

afetivos que unem e transformam. O educador afetivo tem papel fundamental na

transformação e na facilitação das relações e principalmente na aproximação o entre

educador e educando.

O educador afetivo contribui claramente para a formação cidadã quando

olha para o educando e identifica um ser em potencial, quando o desafia a sonhar e

acreditar, quando o instiga a refletir, quando está aberto a escuta-lo, quando se

desprende de seus preconceitos, quando prioriza o que ele tem a dizer. O educador

47

afetivo representa para o educando cuidado, respeito e compreensão, valores que

deveria ser cativados na família, na escola e na rua.

A educação pode ser considerada como ação que se relaciona com o ser

aprendiz, quando o educando busca o aprender por motivação própria ou instigada

pelo educador, torna real o que se aprende, se relaciona com o cotidiano. Portanto

se sugere que os educadores possam ter práticas em que a afetividade sempre

esteja presente. Que esse profissional possa também ter uma formação na qual

entenda as contribuições da afetividade, dos valores humanos na educação e da

formação de cidadãos conscientes de seus direitos e deveres.

O pesquisador tem interesse em aprofundar esta pesquisa, pois acredita

que a educação significativa está ligada diretamente com a construção de valores,

com a relação do homem com o homem e a afetividade é ferramenta pedagógica

para formação social, que deveria ser utilizada por todos educadores.

48

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51

APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA APLICADA COM OS EX ALUNOS

DO PROJETO CRESCER JANGURUSSU

Como você Iniciou sua Participação no Projeto crescer com arte?

Antes de entrar no projeto como era sua relação com a família e sua relação

nos espaços em que você Frequentava? Cite alguma situação.

O que a juventude da época fazia em seu tempo livre? Existiam Projetos

Sociais?

Em relação a sua perspectiva de futuro, você acredita que o projeto foi

importante para a escolha de sua profissão? Por quê?

Quais os valores que você identifica que adquiriu durante a sua participação

no Projeto?

O que você lembrar que foi importante pra sua vida da época que estava no

Projeto? Como era sua relação com os educadores?