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José Genoino (caso MG) - Ação Penal nº 2006.38.00.039573-6
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 4ª VARA
CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAIS
Ação Penal nº 2006.38.00.039573-6
JOSÉ GENOINO NETO, nos autos da Ação
Penal em epígrafe, vem, por seus defensores, respeitosamente à presença de
Vossa Excelência para oferecer suas alegações finais, deduzidas em anexo.
Termos em que,
Pede deferimento.
São Paulo, 28 de outubro de 2011.
Luiz Fernando Pacheco
OAB/SP – 146.449
Natasha do Lago
OAB/SP – 184.825-E
.2.
I – SÍNTESE DOS FATOS
O defendente está sendo processado pela
suposta prática do crime inscrito no artigo 299 do Código Penal (falsidade
ideológica) porque teria, de acordo com a inicial acusatória, sido responsável
pela realização de operações de empréstimo que se reputam simuladas.
No mês de fevereiro de 2002, foi feito um
empréstimo em nome do PARTIDO DOS TRABALHADORES junto ao BANCO
BMG, no valor de R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais),
com o objetivo de cobrir gastos incorridos em razão da cerimônia de posse do
então recém eleito presidente da República, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA (fls.
4.068/4.135).
Tal empréstimo foi aditado por três vezes,
tendo sido renegociado o pagamento da dívida e amortizados os encargos
cabíveis em duas dessas ocasiões, conforme ajustado com a instituição
financeira credora (fls. 222/241).
Como presidente do partido à época e por
determinação do próprio Estatuto do PARTIDO DOS TRABALHADORES (fls.
92/132), o acusado fez constar a sua assinatura em todos os documentos
relativos a esta dívida, na qualidade de avalista/devedor solidário.
Pois bem.
.3.
Em 18 de dezembro de 2006, foi oferecida – e
recebida – denúncia perante esta seção judiciária, em face do peticionário e de
outras dez pessoas, pelo suposto cometimento dos crimes de gestão temerária e
fraudulenta do BANCO BMG e, ainda, de falsidade ideológica, alegando a
acusação, basicamente, que:
“Diante dos fatos e provas expostos, resta
patente a materialidade dos crimes de gestão
fraudulenta, haja vista a concessão de
pretensos empréstimos, irregularmente
autorizados pelos diretores da instituição
financeira, a empresas com situação
econômico-financeira sabidamente deficitária,
incompatível com o montante emprestado e
com frágeis garantias; bem como o de gestão
temerária, uma vez que restou clara a não
observância de princípios basilares da
atividade, quais sejam: a seletividade, a
garantia e a liquidez recomendadas pelas
normas de boa gestão e técnica bancária.
(...)
No caso em tela, percebe-se claramente a
ocorrência da simulação dos empréstimos,
seja pelo perdão de altos montantes quando da
rolagem das dívidas, seja pela ausência de
registro contábil dos empréstimos pelas
empresas do Sr. Marcos Valério. (...)
Ademais, cada simulação considerada
.4.
individualmente ensejou na prática, em
concurso formal, do crime de falsidade
ideológica, pela inserção, nos contratos de
empréstimo, de declaração falsa ou diversa da
que devia ser escrita, com o fim de alterar a
verdade sobre fato juridicamente relevante.”
(fls. 25/28, grifos nossos e do original)
Com a diplomação do então denunciado como
deputado federal, em 19 de dezembro daquele mesmo ano, os autos foram
remetidos ao Egrégio SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, por incompetência
superveniente deste juízo para dar continuidade à ação penal.
Seguindo-se o rito da Lei nº 8.038/90, foi
realizado o interrogatório do acusado (fls. 1.434/1.437), posteriormente
considerado nulo em razão da ausência de intimação dos advogados dos
corréus quanto à expedição da carta de ordem respectiva (1.950/1.955) e
novamente realizado em 29 de abril de 2009 (fls. 2.401 e 4.024/4.037).
Às fls. 2.046/2.047, o defendente apresentou
sua defesa prévia, na qual argüiu a irregularidade também do novo
interrogatório, tendo em vista a alteração processual introduzida pela Lei nº
11.719/08, que determinou fosse este ato realizado apenas ao final da
instrução.
Em 7 de maio de 2009, o SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL, concedendo a ordem no Habeas corpus nº 93.553-2/MG, afastou o
recebimento da denúncia quanto aos crimes do art. 4º da Lei nº 7.492/86
.5.
(gestão fraudulenta e gestão temerária de instituição financeira) para os
acusados que não integravam o quadro administrativo do BANCO BMG – entre
os quais o defendente – mantendo-o apenas com relação ao delito tipificado no
art. 299 do Código Penal (falsidade ideológica).
Ouvidas as testemunhas de defesa arroladas e
requeridas diligências por alguns dos acusados (que restaram indeferidas), foi
o feito novamente remetido para esta seção judiciária, por decisão de 15 de
março deste ano (fls. 4.052/4.053), vez que, devido à não reeleição do réu
como deputado federal, cessara a competência do SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL para julgar a causa.
O Ministério Público Federal requereu, à
revelia da prova, em sede de alegações finais (fls. 4.160/4.270), a condenação
deste acusado pelo crime de falsidade ideológica, reafirmando os argumentos
trazidos na denúncia e insistindo na tese de que os contratos de empréstimo
realizados com o PARTIDO DOS TRABALHADORES seriam mesmo simulados.
A imputação feita não merece, no entanto,
prosperar, pelo que se passa a expor nos itens seguintes.
PRELIMINARES
II – O CERCEAMENTO DE DEFESA
Esta ação penal encontra-se, desde o início,
maculada pela insanável inépcia da inicial acusatória, que deixou de descrever
.6.
o fato pretensamente criminoso com todas as suas circunstâncias,
inviabilizando, assim, o pleno exercício de defesa pelo acusado.
O nosso ordenamento jurídico, erigido sobre
as bases de um Estado Democrático de Direito, exige, como pressuposto para o
início de uma ação penal, a existência de fato tipificado criminalmente,
descrito em sua inteireza pelo órgão acusatório quando do oferecimento da
exordial.
Esta descrição não pode, entretanto, ser
genérica, porque é preciso que o acusado, para se defender, tenha
conhecimento dos fatos que lhe são imputados da forma mais completa
possível, ainda que a capitulação legal da conduta atribuída pelo Ministério
Público possa vir a ser alterada pelo magistrado, conforme dispõe o artigo 383
do Código de Processo Penal.
Bem por isso, determina o art. 41 do CPP que
a denúncia deverá conter “a exposição do fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias”, observando-se, assim, os princípios constitucionais da ampla
defesa e do devido processo legal.
Essa regra – inafastável – não foi, no entanto,
aplicada na presente Ação, dando causa a nulidade insanável, porque,
conforme pontificam, com acerto, os professores ADA PELLEGRINI GRINOVER,
ANTÔNIO SCARANCE FERNANDES e ANTÔNIO MAGALHÃES GOMES FILHO1:
1 As Nulidades no Processo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 95, grifamos.
.7.
“A instauração válida do processo pressupõe
o oferecimento de denúncia ou queixa com
exposição clara e precisa de um fato
criminoso, com todas as suas circunstâncias.
(...) A narração deficiente ou omissa, que
impeça ou dificulte o exercício da defesa, é
causa de nulidade absoluta, não podendo
ser sanada porque infringe os princípios
constitucionais”.
Na hipótese dos autos, a vestibular é
visivelmente deficiente, vez que não descreve com clareza as condutas que
injustificadamente imputa ao acusado, ao mesmo passo em que omite
circunstâncias fundamentais para o exercício da ampla defesa – devendo,
portanto, ser reconhecida a sua inépcia, senão a própria falta de justa causa
para a ação penal desde o início, bem como a nulidade daí decorrente.
Vejamos.
A falsidade ideológica atribuída ao
defendente consubstanciou-se, nas palavras da acusação, “pela inserção, nos
contratos de empréstimo, de declaração falsa ou diversa da que devia ser
escrita, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”
(fls. 28) – o que teria ocorrido, ainda, por meio da simulação de empréstimo ao
PARTIDO DOS TRABALHADORES.
Pois bem.
.8.
Dispõe o art. 299 do Código Penal, que
contém a classificação jurídica do fato criminoso imputado:
“Falsidade ideológica
Art. 299 - Omitir, em documento público ou
particular, declaração que dele devia constar,
ou nele inserir ou fazer inserir declaração
falsa ou diversa da que devia ser escrita, com
o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou
alterar a verdade sobre fato juridicamente
relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa,
se o documento é público, e reclusão de um a
três anos, e multa, se o documento é
particular.”
A leitura do tipo penal permite distinguir, com
facilidade, três modalidades objetivas possíveis de falsidade ideológica: (i)
omitir, em documento, declaração que dele devia constar; (ii) inserir
declaração falsa ou diversa da que deveria ser nele escrita; e, ainda, (iii) fazer
inserir declaração falsa ou diversa da que nele deveria ser escrita.
Trata-se, é evidente, de condutas diversas,
que, embora tipificadas no mesmo dispositivo penal, dão ensejo a defesas
também diversas por aqueles que são acusados de nelas terem incorrido.
No caso da acusação formulada nesse
processo, no entanto, o Ministério Público sequer tratou de explicar de que
.9.
modo teria se dado a falsidade ideológica, limitando-se a afirmar, “a partir da
assinatura apostas nos contratos de ‘empréstimo’ e respectivos aditivos” (fls.
36)”, que o defendente teria inserido, no contrato de empréstimo, “declaração
falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de alterar a verdade sobre
fato juridicamente relevante” – apenas transcrevendo, portanto, a redação do
próprio art. 299.
Ora, se o defendente era apenas avalista
nessas operações, a única coisa que poderia ter inserido – e inseriu – nos
documentos respectivos era a sua assinatura!
Não se esclarece, portanto, em nenhum
momento, qual seria a “declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido
escrita” ou que “verdade sobre fato juridicamente relevante” se pretendia
alterar – havendo mera referência a uma simulação que o órgão acusatório
sequer tratou de individualizar.
Isto, porém, vai de encontro ao que se espera
de uma acusação minimamente fundamentada, com descrição suficiente das
circunstâncias do fato que entendeu constituir crime – sobretudo se
considerarmos que o delito em questão admite três modalidades distintas, que
requerem defesas igualmente distintas.
Além disso, são elementares do próprio tipo
as circunstâncias que foram omitidas pela acusação, isto é, (i) a declaração
falsa inserida pelo acusado e (ii) a verdade sobre fato juridicamente relevante
que o agente teria a intenção de alterar.
.10.
Sem essa descrição, é impossível inferir onde
estaria a falsidade ideológica que foi vagamente jogada sobre os ombros do
réu.
Ao comentar o tipo do art. 299, nesse sentido,
JOSÉ SILVA JÚNIOR e GUILHERME MADEIRA DEZEM2 afirmam:
“Não é, conduta, qualquer declaração falsa
que conduzirá ao reconhecimento da
tipicidade do crime. A declaração no caso
deste crime deve ser sobre fato juridicamente
relevante, ou com a finalidade de prejudicar
direito ou criar obrigação. Neste sentido
afirma Mirabete que „Para que ocorra o delito
de falsidade ideológica é necessário que o
agente vise prejudicar direito ou criar
obrigação ou, ainda, que a alteração seja
relativa a fato juridicamente relevante,
entendendo-se como tal a declaração que,
isolada ou em conjunto com outros fatos,
tenha significado direto ou indireto para
construir, fundamentar ou modificar direito,
ou relação jurídica pública ou privada (RT
546/344).‟”
2 Código Penal e sua Interpretação. Org. Alberto Silva Franco e Rui Stoco. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2007, p. 1.401.
.11.
Isto importa dizer que, além de descrever
como se deu, supostamente, a falsidade ideológica, a acusação está ainda
obrigada a explicar a “alteração do fato jurídico relevante” pretendida – o que,
como visto, não ocorreu na inicial acusatória.
Se a acusação apenas afirma que havia esse
fim, mas não esclarece qual é o fato juridicamente relevante cuja verdade se
pretende alterar, indiscutível que deixou de descrever circunstância do crime
que deveria constar da denúncia – deficiência que, aliás, também não foi
suprida ao longo do processo.
Ora, o Ministério Público Federal se limita a
alegar que houve falsidade ideológica porque o empréstimo teria sido
simulado, mas não explica de que forma o acusado seria o responsável pela
aposição da pretensa declaração – que, além de não dizer qual é, nem mesmo
evidencia ser falsa ou diversa da que deveria ser escrita, impossibilitando ainda
mais uma vez a defesa do acusado.
Com efeito, os documentos que serviram de
lastro para a acusação dão conta apenas de contrato de empréstimo e
aditamentos entre o PARTIDO DOS TRABALHADORES e o BANCO BMG,
assinados pelo defendente na qualidade de presidente do partido e
regularmente renegociados com a instituição financeira.
Não há, nesses fatos, nada que se possa
presumir, com um mínimo de razoabilidade, ideologicamente falso, porque
efetivamente existia o empréstimo que havia até mesmo sido renovado,
pagando-se os encargos necessários para tanto, conforme descreve a própria
.12.
denúncia na parte que trata do “Empréstimo ao Partido dos Trabalhadores”
(fls. 9/12).
Na frustrada intenção de dar suporte à sua tese
acusatória, no entanto, o Ministério Público tenta explicar que a falsidade
ideológica se manifestou na simulação de cada empréstimo, que entendeu, por
sua vez, demonstrada a partir (i) do “perdão de altos montantes quando da
rolagem das dívidas” (fls. 26); (ii) da “ausência de registro contábil dos
empréstimos pelas empresas do Sr. Marcos Valério” (fls 26); e (iii) do “fato de
que o ajuizamento das ações de cobrança visando à recuperação do crédito
relativo às operações aqui mencionadas se deu apenas após junho de 2005 (fl.
1123), portanto, após as ‘denúncias’ e instalação da CPMI dos Correios”.
São estes os alicerces de areia em que se
afundou a denúncia para imputar ao acusado o delito de falsidade ideológica,
outorgando a ele a função de preencher as lacunas para se defender de um
crime que sequer foi minimamente detalhado na inicial acusatória.
Ocorre, porém, que estes fundamentos, além
de confusos, já não se aplicavam ao caso específico do defendente desde o
oferecimento da denúncia – o que fica evidente na menção à “ausência de
registro contábil dos empréstimos pelas empresas do Sr. Marcos Valério”.
Ora, o acusado nada tem que ver com as
empresas do corréu MARCOS VALÉRIO ou com suas respectivas contabilidades!
De fato, o empréstimo que se reputa falso
nessa acusação foi com o PARTIDO DOS TRABALHADORES, e não com as
.13.
referidas empresas, o que inviabiliza a justificativa acusatória para a simulação
que tentou construir para esse caso específico – principalmente se
considerarmos, conforme ficou demonstrado ao longo da instrução, que o
PARTIDOS DOS TRABALHADORES havia, sim, contabilizado regularmente este
empréstimo.
Também a alegação de “perdão” da dívida é
de todo inaplicável ao caso do defendente, vez que, a cada renovação
contratual, foi necessário despender o montante que fora ajustado a título de
encargos financeiros – e a acusação estava ciente disso, porque ela mesma teve
acesso aos documentos demonstrativos antes do oferecimento da denúncia.
Tampouco a conjectura de que “até as
‘denúncias’ do mensalão não havia grande interesse do BMG em cobrar o
montante devido” (fls. 28) merece prosperar, porque tal cobrança seria mesmo
inviável até o vencimento da dívida – que a própria acusação apontou na
denúncia como sendo em 22.8.2005 (fls. 9)!
Não havia, portanto, já quando do
oferecimento da denúncia, nenhum suporte para a acusação lançada de maneira
inconseqüente, imputando o Parquet Federal ao acusado uma falsidade
ideológica que, porque nitidamente inexistente, descreveu de forma genérica e
de modo a confundir as diferentes operações de que trata este processo.
De fato, bastaria que a acusação tivesse
individualizado a operação de empréstimo contraída pelo PARTIDO DOS
TRABALHADORES para se dar conta de que não poderia mesmo haver qualquer
.14.
falsidade nos contratos – mas, no calor dos acontecimentos, não foi isso o que
decidiu fazer o ilustre membro do MPF.
Mais que isso, o Ministério Público sequer se
ocupou de tentar demonstrar a culpabilidade do acusado, limitando-se a alegar
que a conduta poderia ser individualizada “a partir da assinatura aposta nos
contratos”.
Ocorre, porém, que já era do conhecimento da
acusação, quando da propositura da ação penal, que essa assinatura nada
demonstrava em termos de culpabilidade, porque não passava de mera
exigência estatutária do PARTIDO DOS TRABALHADORES3
– conforme
documento juntado pela própria acusação às fls. 92/139 para instruir a
denúncia.
Cabia ao órgão acusatório, de posse dessa
informação, não denunciar JOSÉ GENOINO. Andou mal, no entanto, e nem
sequer tentou delinear uma conduta efetiva do acusado no sentido de simular
qualquer negócio – desincumbindo-se assim de demonstrar o verdadeiro
pressuposto para qualquer ação penal, qual seja, a descrição da autoria.
De fato, o nosso sistema jurídico repudia a
responsabilização objetiva, exigindo da acusação que descreva o necessário
“nexo causal” entre a conduta do acusado e o resultado criminoso obtido –
3 Nesse sentido, o art. 195 do referido estatuto: “Art. 195: A movimentação dos recursos do Partido deverá ser
efetuada através de contas correntes bancárias em nome do Partido dos Trabalhadores. §1º: A abertura e a
movimentação de contas bancárias e demais transações financeiras em nome do Partido dos
Trabalhadores deverão ser feitas, conjuntamente, pelo Presidente e pelo Secretário de Finanças ou
tesoureiro da respectiva Comissão Executiva. §2º: O Partido dos Trabalhadores não arcará com ônus de
quaisquer transações financeiras efetuadas em seu nome ou com número de seu C.N.P.J. (Cadastro Nacional
de Pessoas Jurídicas) por quaisquer pessoas, filiadas ou não, que não tenham sido expressamente autorizadas
pelo tesoureiro ou pelo presidente da Comissão Executiva do órgão correspondente” (fls. 122, grifamos).
.15.
porque, conforme determina o art. 13 do Código Penal, “o resultado, de que
depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa”.
Assim, para que se possa fazer um juízo de
culpabilidade, não basta que o órgão acusatório se valha de uma assinatura que
sabia decorrente do estrito cumprimento de dever estatutário, sendo necessário
demonstrar – ou, pelo menos, indicar de modo suficiente – uma conduta do
acusado no sentido de obter o resultado pretensamente criminoso.
Isso, no entanto, não foi feito pelo Ministério
Público, o que tornou impossível ao acusado defender-se da imputação
formulada, já que ausentes os elementos em que deveria a acusação ter-se
baseado para concluir pela sua autoria.
Bem por essa razão, remansosa jurisprudência
exige a demonstração do nexo causal:
“O princípio da responsabilidade penal
adotado pelo sistema jurídico brasileiro é o
pessoal (subjetivo).
A autorização pretoriana de denúncia genérica
para os crimes de autoria coletiva não pode
servir de escudo retórico para a não descrição
mínima da participação de cada agente na
conduta delitiva. Uma coisa é a
desnecessidade de pormenorizar. Outra, é
.16.
a ausência absoluta de vínculo do fato
descrito com a pessoa do denunciado.”4
“PEDIDO DE EXTENSÃO EM HABEAS
CORPUS. CRIMES CONTRA O SISTEMA
FINANCEIRO NACIONAL. DENÚNCIA.
NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A
CONDUTA ATRIBUÍDA AO
REQUERENTE E O RESULTADO
LESIVO NÃO DEMONSTRADO.
IMPUTAÇÃO FEITA APENAS EM
RAZÃO DO CARGO OCUPADO NA
SOCIEDADE EMPRESARIAL. INÉPCIA.
RECONHECIMENTO. IDENTIDADE DE
SITUAÇÕES PROCESSUAIS. EXTENSÃO
DEFERIDA. 1. Embora haja no ordenamento
jurídico pátrio disposições acerca da
possibilidade de responsabilização penal da
pessoa jurídica, é certo que, por tratar-se de
uma ficção, a sua existência pressupõe a
atuação de um ser humano, pessoa física, que
conduz as suas atividades em busca da
finalidade objetivada com a sua instituição. E,
na administração desta, a pessoa física
somente poderá ser penalmente
responsabilizada caso demonstrado o
necessário nexo causal verificado entre a
4 STF, HC 80.549/SP, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ em 24.8.2001, p. 44, grifamos.
.17.
sua conduta e o resultado lesivo. 2. Para que
seja validamente deflagrada a persecução
penal contra o suposto autor do delito,
preceitua o Código de Processo Penal que,
além de conter a qualificação do acusado e a
classificação do crime que lhe é atribuído, a
denúncia deve expor o fato criminoso, com
todas as suas circunstâncias, cuja omissão ou
deficiência implica na sua nulidade, em razão
da mitigação das garantias do contraditório e
da ampla defesa. 3. Na hipótese dos autos,
depreende-se que a exordial acusatória
quedou-se em demonstrar o liame causal
entre eventual conduta do requerente e o
resultado lesivo reclamado, cingindo-se a
atribuir-lhe de forma objetiva a
responsabilidade penal pelo evento
delituoso apenas em razão do cargo que
ocupa na sociedade empresarial que seria o
meio utilizado para a lavagem de capitais.
4. Pedido de extensão deferido, concedendo-
se a ordem para anular o processo no que diz
respeito ao requerente desde o oferecimento
da denúncia, inclusive.”5
Inexistente qualquer demonstração no sentido
de indicar a participação do acusado na falsidade imputada, consubstanciada
5 STJ, PEHC 200701997634, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ªTurma, DJ em 5.4.2010, grifamos.
.18.
hipoteticamente na simulação de empréstimos, carece a denúncia de requisito
inafastável.
Pelas razões expostas neste item e tendo em
vista o enorme prejuízo suportado pelo defendente com tão mal traçada
acusação, que lhe impossibilitou o exercício pleno do seu direito de defesa,
deve a denúncia ser declarada inepta, anulando-se, assim, todo o processo
desde o início.
III – A ILEGALIDADE NO RECEBIMENTO
DA DENÚNCIA
Existe, ainda, outra irregularidade que está a
comprometer o início desse processo e que configurou limitação à defesa do
acusado: o modo com que a inicial acusatória foi recebida.
Em 18 de dezembro de 2006, foi oferecida
denúncia contra o defendente perante esta seção judiciária, imediatamente
encaminhada à conclusão e recebida no mesmo dia pela MM. Juíza ADRIANE
LUÍSA VIEIRA TRINDADE, aproximadamente 35 minutos após a sua autuação
(fls. 1.237/1.238).
No dia seguinte, 19 de dezembro de 2006, foi
o defendente diplomado para o cargo de deputado federal, fixando-se, a partir
desse momento e nos termos dos arts. 53, §1º, e 102, inciso I, alínea “b” da
Constituição da República, a competência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
para processar e julgar a ação penal.
.19.
Antes da remessa dos autos para o tribunal
competente, no entanto, observou-se que havia uma incongruência: embora a
denúncia tivesse sido recebida em 18.12.2006, os registros indicavam que o
seu protocolo apenas ocorrera na manhã do dia seguinte, quando já havia
cessado a competência desta seção judiciária.
Assim percebendo, o MM. Juiz ALEXANDRE
BUCK MEDRADO SAMPAIO chegou a manifestar-se no sentido de que teria
havido erro material, e que, portanto, a denúncia não poderia ter sido recebida
naquela data, mas apenas no dia seguinte:
“A denúncia foi recebida pela MM. Juíza
desta Vara Federal em 18/12/2006. Porém,
conforme consta do registro de distribuição
eletrônica desta Seção Judiciária, a denúncia
apenas foi ofertada em 19/12/2006 (vide fl.
1.2). Ora, não sendo razoável, nem possível,
que a denúncia fosse recebida antes de ser
protocolada, tenho como inelutável, in casu, a
ocorrência de erro material quanto à data de
recebimento da inicial acusatória.” (fls. 1.281)
Aplicando-se a nova data de recebimento, os
autos foram então remetidos ao SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Em face do ocorrido – e considerando, ainda,
que, tendo sido a denúncia formulada em exatas 37 páginas, instruída com sete
.20.
volumes e dois anexos, seria impossível que a magistrada houvesse analisado
minimamente a acusação –, a defesa houve por bem impetrar ordem de Habeas
corpus perante o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, com o objetivo de anular o
despacho que recebera a denúncia6.
Vencidos os Ministros EROS GRAU, GILMAR
MENDES, CELSO DE MELLO e SEPÚLVEDA PERTENCE, a ordem foi denegada,
mas não sem que se observasse que a “celeridade” nesse recebimento
constituiu “um verdadeiro recorde”, duvidoso em termos de boa aplicação da
justiça.
Em que pese a ordem não ter sido concedida –
nos estritos e estreitos limites de cognição do writ – a defesa insiste que o
recebimento da denúncia foi ilegal, não só porque a data do seu recebimento
(18.12.2006) é incompatível com a do protocolo (19.12.2006), como porque a
fundamentação do despacho deixa claro que a resposta judicial se deu de forma
incompatível com o que se espera no nosso sistema jurídico.
De fato, o Ministro MARCO AURÉLIO
acentuou em voto vencedor na decisão que afastou o recebimento da denúncia
quanto aos crimes financeiros imputados ao acusado, que:
“O recebimento deu-se em poucas linhas.
Ficou consignado apenas que, na peça,
descreveu-se fato, em tese, criminoso,
fazendo-se esta acompanhada „de suporte
probatório capaz de evidenciar a justa causa
6 HC nº 91.449-7/MG, relatado pelo Min. Marco Aurélio e julgado em 7.5.2009.
.21.
para a instauração da ação penal, estando
presentes os pressupostos processuais e
condições da ação, sendo cumpridos os
requisitos formais inscritos no art. 41 do
Código de Processo Penal‟ (folha 188)”7.
Considerando, no entanto, que não se atacava
naquele Habeas corpus “a singeleza do pronunciamento mediante o qual foi
recebida a denúncia”, o Ministro procedeu à análise da matéria questionada
sem mais se manifestar sobre o assunto.
Ocorre, porém, que a decisão de recebimento
foi, de fato, infundada – e a “singeleza” dos “argumentos” usados só
demonstra a precariedade do ato judicial naquele momento.
Com efeito, além de o recebimento ter-se
dado intempestivamente, porque já cessada a competência dessa seção
judiciária, os autos permaneceram nas mãos da magistrada por pouco mais de
meia hora, sendo impossível que, nesse tempo, pudesse ela ter feito um juízo
imparcial da razoabilidade dos fatos narrados na inicial e, assim, recebido
regularmente a denúncia.
Os fatos demonstram, em verdade, que a
decisão de recebimento da denúncia já estava tomada antes mesmo do seu
oferecimento, já tendo a juíza concluído pela viabilidade da acusação sem
sequer conhecer os seus termos.
7 HC nº 93.553-2/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, Pleno, DJ em 3.9.2009, p. 9.
.22.
Isso, no entanto, fere às escancaras o
sistema acusatório adotado pelo nosso ordenamento, que exige uma
postura imparcial do julgador.
Segundo AURY LOPES JR.8, o sistema
acusatório se caracteriza, entre outras coisas, pela “clara distinção entre as
atividades de acusar e julgar” e pelo fato de o juiz manter-se “como um
terceiro imparcial, alheio a labor de investigação e passivo no que se refere à
coleta da prova, tanto de imputação como de descargo”.
Ora, se a acusação não cabe ao juiz e a sua
postura deve ser imparcial, um recebimento de denúncia realizado de forma
parcial não pode subsistir no nosso ordenamento!
De fato, os autos revelam que o recebimento
seria feito de qualquer forma, aguardando-se o oferecimento da denúncia tão-
somente como requisito formal para que a decisão fosse exarada.
Não é, realmente, crível que alguém consiga,
em cerca de meia hora, analisar, ainda que superficialmente, as mais de mil
páginas que integravam a denúncia, entre acusação propriamente dita e
documentos de apoio.
É evidente que essa análise não foi feita e a
decisão de recebimento já estava, portanto, tomada – provavelmente em razão
8 Direito Processual Penal e sua conformidade constitucional. Vol. 1. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,
2008, p. 58.
.23.
da diplomação do defendente como deputado federal, que ocorreria no dia
seguinte.
Isto porque, se a denúncia já estivesse
recebida até o dia 19 de dezembro daquele ano, não seria dado ao acusado
apresentar defesa preliminar, conforme o rito mais benéfico da Lei nº
8.038/90, porque os autos chegariam ao SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já na
qualidade de ação penal – além de o juízo de recebimento ser, obviamente,
furtado daquela corte.
O fato é que a denúncia foi recebida de forma
preordenada e às pressas, sem observância de princípios que devem nortear a
atuação do Poder Judiciário.
Não se trata, está claro, de eficiência da
magistrada que recebeu a inicial acusatória em tempo tão “recorde”, mas de
atuação manifestamente ilegal.
A falta de fundamentação no recebimento, em
afronta ao princípio inscrito no art. 93, IX, da Constituição Federal é, nesse
sentido, apenas mais um indicativo da ilegalidade que se pretende combater.
O Ministro GILMAR MENDES, aliás, no voto
que restou vencido no Habeas corpus que a defesa impetrou para anular a
decisão do recebimento, já havia consignado:
“Logo, parto dessa premissa: é necessário –
devido à gravidade, àquilo que ela significa
.24.
– que a denúncia não seja recebida por
carimbo; que a denúncia não seja recebida
por um ato de não-reflexão do juiz. Parece
que isso é fundamental na construção do
modelo. Portanto, parece-me que não condiz
com qualquer paradigma do Estado de
direito.”
Ora, a denúncia, nesse caso, não só foi
recebida “por carimbo”, como não houve qualquer reflexão da juíza.
Este recebimento, viciado em sua origem, não
pode ser tolerado no nosso ordenamento jurídico.
Assim, tendo-se em vista (i) o grande volume
que foi submetido à apreciação desta seção judiciária quando do oferecimento
da denúncia, (ii) a celeridade desproporcional com que a inicial acusatória foi
recebida e (iii) o fato de o recebimento ter-se realizado, de acordo com os
registros judiciários, apenas em 19.12.2006, quando já havia cessado a
competência deste juízo, deve ser reconhecida a ilegalidade do recebimento
efetuado.
IV – O INOPORTUNO INTERROGATÓRIO
DO ACUSADO
O defendente foi inicialmente interrogado em
28 de maio de 2007, tendo este interrogatório sido posteriormente considerado
.25.
nulo pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, devido à ausência de intimação dos
corréus quanto à expedição da carta de ordem respectiva (fls. 1.950/1.955) –
determinando-se, assim, fosse o acusado novamente interrogado.
Quando da decisão de anulação, no entanto, já
estava em vigor a Lei nº 11.719/08, que trouxe algumas alterações processuais,
imediatamente aplicáveis, conforme art. 2º do CPP.
Entre as mudanças introduzidas, estava a
determinação de que o interrogatório deveria ser realizado apenas ao final da
instrução, de acordo com a nova redação do art. 400 do CPP:
“Na audiência de instrução e julgamento, a
ser realizada no prazo máximo de 60
(sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de
declarações do ofendido, à inquirição das
testemunhas arroladas pela acusação e pela
defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no
art. 222 deste Código, bem como aos
esclarecimentos dos peritos, às acareações e
ao reconhecimento de pessoas e coisas,
interrogando-se, em seguida, o acusado.”
Esta inovação é de grande relevância para o
exercício do direito de defesa, porque permite que o réu apresente sua versão
dos fatos depois de já produzida toda a prova – inclusive, e principalmente,
aquela requerida pela acusação.
.26.
Ocorre, no entanto, que o SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL não atentou para esta questão na ocasião, tendo o defendente sido
interrogado pela segunda vez em 29 de abril de 2009, estando, portanto, a nova
alteração processual em pleno vigor.
Em razão disso, o acusado argüiu, já em sua
defesa prévia (fls. 2.046/2.047), a irregularidade deste interrogatório, que
deixou de observar a nova redação do art. 400 do CPP, que é aplicável
inclusive quando se segue o rito da Lei nº 8.038/90.
Nesse sentido, a recente decisão do SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL:
“PROCESSUAL PENAL.
INTERROGATÓRIO NAS AÇÕES PENAIS
ORIGINÁRIAS DO STF. ATO QUE DEVE
PASSAR A SER REALIZADO AO FINAL
DO PROCESSO. NOVA REDAÇÃO DO
ART. 400 DO CPP. AGRAVO
REGIMENTAL A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. I – O art. 400 do Código de
Processo Penal, com a redação dada pela
Lei 11.719/2008, fixou o interrogatório do
réu como ato derradeiro da instrução
penal. II – Sendo tal prática benéfica à
defesa, deve prevalecer nas ações penais
originárias perante o Supremo Tribunal
Federal, em detrimento do previsto no art.
.27.
7º da Lei 8.038/90 nesse aspecto. Exceção
apenas quanto às ações nas quais o
interrogatório já se ultimou. III –
Interpretação sistemática e teleológica do
direito. IV – Agravo regimental a que se nega
provimento.”9
A Corte Suprema, no entanto, equivocou-se
neste processo, tendo ela própria determinado fosse o ato realizado em
desobediência à nova regra.
Em março deste ano, contudo, os autos foram
novamente remetidos a esta seção judiciária em razão da não reeleição do
defendente como deputado federal.
Com isso, cessou o procedimento especial da
Lei nº 8.038/90, que poderia trazer dúvidas (já suprimidas definitivamente com
a decisão colacionada acima) quanto à aplicabilidade da nova redação do art.
400 do CPP.
Sem o rito especial, voltou-se ao
procedimento ordinário, tendo o nobre magistrado, então, dado seguimento à
instrução processual, abrindo inclusive prazo para requisição de diligências
complementares, conforme autoriza a nova lei.
O preclaro magistrado olvidou-se, no entanto,
de que, estando a instrução ainda em andamento quando da remessa dos autos
9 AP 528/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJ em 7.6.2011, grifamos.
.28.
a esta seção judiciária, os acusados deveriam ter sido interrogados como último
ato instrutório, sobretudo porque o novo interrogatório fora realizado já sob a
égide da nova legislação.
Não foi isso, porém, o que ocorreu, tendo-se
apenas aberto prazo para que as partes apresentassem sucessivamente suas
alegações finais, ignorando-se por completo a nova regra processual.
Nesse sentido, entretanto, a jurisprudência é
firme ao afirmar que a Lei nº 11.719/08 impõe ser o interrogatório o último ato
da instrução processual, alcançando inclusive os processos em curso:
“PROCESSUAL PENAL: HABEAS
CORPUS. INTERROGATÓRIO DO
ACUSADO. ARTIGO 400 DO CPP COM A
REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.719/08.
ÚLTIMO ATO DE INSTRUÇÃO.
EFETIVIDADE DA AMPLITUDE DA
DEFESA DO ACUSADO. NORMA
PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA.
VALIDADE DOS ATOS PRATICADOS
SOB A VIGÊNCIA DA LEI ANTERIOR.
ARTIGO 2º DO CPP. A LEI NOVA
ALÇANÇA OS PROCESSOS EM CURSO. I
- Nos termos do artigo 400 do CPP, com a
redação dada pela Lei nº 11.719/08, o
interrogatório passou a ser o último da
instrução, de forma a garantir a efetividade da
.29.
amplitude da defesa do acusado. II - Cuida-se
de lei de natureza processual, portanto de
aplicação imediata, devendo ser aplicada sem
prejuízo da validade dos atos praticados sob a
vigência da lei anterior, consoante o disposto
no artigo 2º do CPP. III - A norma processual
penal deve ser aplicada desde o momento de
sua entrada em vigor, alcançando, inclusive,
os processos em curso. IV - Ordem
parcialmente concedida.”10
O novo interrogatório dos acusados era,
portanto, medida necessária naquela fase processual.
Logo, diante da ausência de reinterrogatório
dos acusados, além de não se observarem as regras processuais vigentes, houve
manifesto cerceamento de defesa por supressão de garantia que lhes era
assegurada, i.e., a de se pronunciarem após toda a produção de provas.
Isto posto, aguarda-se a conversão do
julgamento em diligência, a fim de que possa o réu ser novamente inquirido.
10
TRF 3ª Região, HC 200903000091961, Rel. Des. Cecilia Mello, 2ª Turma, DJ em 17.9.2009, grifamos.
.30.
NO MÉRITO
V – INEXISTÊNCIA DE FALSIDADE
IDEOLÓGICA
Ainda que as questões acima sejam superadas
– hipótese admitida apenas a título de argumentação – os autos estão a indicar
que o único deslinde possível para esta ação penal é a absolvição do acusado,
porque não ficou demonstrada falsidade ideológica alguma.
A conduta que genericamente se imputou ao
defendente na denúncia foi a de “inserção, nos contratos de empréstimo, de
declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de alterar a
verdade sobre fato juridicamente relevante” (fls. 28), tipificada no art. 299 do
Código Penal.
Também em sede de alegações finais, a
acusação, embora mais uma vez tenha deixado passar a oportunidade de
detalhar a participação do acusado nas condutas que entendeu puníveis, insiste
na tese de que os contratos de crédito “não eram, verdadeiramente, mútuos, eis
que nunca tiveram como objetivo serem adimplidos”, mas “simulações cujo
objetivo era acobertar a verdadeira natureza do desvio de recursos da
instituição financeira” (fls. 4.208).
Estas conclusões, no entanto, não
encontram qualquer respaldo nos autos.
.31.
Com efeito, o Ministério Público afirma que a
falsidade ideológica se consubstanciou na pretensa simulação dos empréstimos
que foram realizados entre o PARTIDO DOS TRABALHADORES e o BANCO BMG
– que, por sua vez, restaria demonstrada a partir de três premissas essenciais11
:
(i) ausência de registro contábil; (ii) “perdão” de valores na rolagem da dívida;
e (iii) falta de interesse em proceder à cobrança.
Os empréstimos não foram, contudo,
simulados – e as premissas de que parte a acusação não se aplicam nem
remotamente à hipótese do empréstimo no qual o defendente constou como
avalista.
De fato, a alegação de que não haveria
registro dos empréstimos na contabilidade do partido não procede.
O PARTIDO DOS TRABALHADORES não deixou,
em nenhum momento, de registrar as operações havidas em sua contabilidade,
que foram incluídas nas prestações de contas anuais ao TRIBUNAL SUPERIOR
11
O Ministério Público chega a mencionar outros supostos indícios de simulação nas suas alegações finais,
mas, como não tratou especificamente do empréstimo no qual o defendente constou como avalista, deixaremos
de analisá-los em detalhes, porque inaplicáveis à hipótese do acusado. Foram “indícios” para a acusação, nesse
sentido: (i) “a inexistência de registros de pagamentos de juros, encargos ou amortizações, como é de prática
em operações de empréstimo, tendo estes sido cobrados judicialmente apenas após a instauração da CPMI”
(fls. 4.174) – o que não se sustenta, como veremos abaixo, porque os encargos foram pagos e os
comprovantes, devidamente juntados, atestam que isso ocorreu antes da CPMI; (ii) “a inconsistência na
identificação de entrada e saída de recursos verificada em análise contábil relacionada às empresas de
MARCOS VALÉRIO, indicando fraude contábil” (fls. 4.174) – não se trata, por óbvio, do empréstimo com o
PT, por referência expressa do Ministério Público; (iii) “a má gestão dos Bancos BMG e Rural nas operações”
– a gestão destes bancos, em si, pouco tem que ver com o fato de os empréstimos serem simulados ou não, por
se tratar de coisas diversas (fls. 4.174); e (iv) “o fato dos contratos de prestação de serviços de publicidade
realizados pelas empresas DNA PROPAGANDA e SMP&B a órgãos da administração pública indireta terem
sido dados como garantia dos empréstimos feitos pelas empresas ligadas a Marcos Valério a pedido do PT,
embora apresentem vedação expressa quanto à possibilidade de serem incluídos como garantia de mútuos”
(fls. 4.174/4.175) – mais uma vez, isto diz respeito a outros contratos de empréstimo, que não contêm a
assinatura do defendente como avalista e cuja suposta falsidade ideológica não lhe foi imputada.
.32.
ELEITORAL desde quando isto se tornou possível, conforme explicou o
defendente em seu interrogatório:
“E essa contabilidade está, desde 2004 – o
empréstimo foi feito em 2003 -, registrada no
Tribunal Superior Eleitoral. E o próprio
BMG, em duas ocasiões, entrou com uma
ação judicial cobrando a dívida. E o partido –
eu não estava mais na Presidência -, o partido
assumiu essa dívida, porque está, é uma
dívida absolutamente legal.” (fls. 4.026)
É exatamente nesse sentido, também, o
depoimento do então secretário de assuntos institucionais do PARTIDO DOS
TRABALHADORES, Sr. PAULO ADALBERTO ALVES FERREIRA:
“O SENHOR PAULO ADALBERTO
ALVES FERREIRA – Esse empréstimo de
2003, ele está registrado na contabilidade
do PT desde a sua efetivação e consta de
todas as prestações de contas anuais que
são entregues em abril, todos os „abril‟ dos
anos, ao Tribunal Superior Eleitoral.
Sempre constou desde 2003. Portanto,
todos os anos, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008,
2009. E nós ainda temos compromissos a
honrar em razão desse empréstimo.” (fls.
4.015/4.016, grifamos)
.33.
Ainda a documentação enviada pelo Diretório
Nacional do PT a pedido do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (fls. 4.068/4.135)
comprova o quanto alegado, constando da respectiva petição de juntada,
inclusive,
“que esses mesmos valores foram objeto de
acordo judicial homologado perante a Justiça
do Estado de Minas Gerais, sendo que as
parcelas estão sendo devidamente quitadas
pelo peticionário e constam da escrituração
contábil do Partido, cujos balanços
financeiros anuais apresentados ao Tribunal
Superior Eleitoral foram submetidos à
apreciação da instância nacional de direção e
regularmente aprovados, conforme cópias das
atas e dos pareceres da Comissão Executiva
Nacional que seguem anexos”. (fls. 4.069,
grifamos)
Não houve, portanto, qualquer
irregularidade quanto ao registro do empréstimo, que foi devidamente
levado ao conhecimento do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL.
Tampouco possui qualquer fundamento o
suposto “perdão” de valores quando da rolagem da dívida, vez que os valores
pactuados foram, quando não pagos a tempo, legalmente renegociados.
.34.
De fato, foram juntados aos autos, já com a
denúncia, os seguintes documentos relativos ao empréstimo contraído entre o
PT e o BANCO BMG:
(i) “Contrato de Mútuo – Financiamento de Capital de Giro”, no
valor de R$ 2.400.000,00, firmado em 17.2.2003, com o aval do
defendente e dos corréus DELÚBIO SOARES e MARCOS VALÉRIO,
além de nota promissória emitida pelo próprio partido na mesma
data, no valor de R$ 3.120.000,00 (fls. 222/225);
(ii) “Instrumento Particular de Confissão de Dívida e Outras
Avenças”, firmado em 26.5.2003, no qual se reconheceu a dívida
corrigida de R$ 2.559.146,04 e pagou-se a quantia de R$
159.146,04 a título de encargos devidos, comprometendo-se o
partido a desembolsar o restante do valor em 24.11.2003 (fls.
228/229 e 230);
(iii) “Aditamento e Re-ratificação ao Instrumento Particular de
Confissão de Dívida e Outras Avenças Firmado em 26.5.2003”,
assinado em 20.1.2004, por meio do qual se convencionou o
pagamento, naquela data, da importância de R$ 555.107,64, e, em
1º.7.2004, do valor principal, corrigido, de R$ 2.546.981,87 (fls.
232/233 e 234);
(iv) “2º Aditamento e Re-ratificação ao Instrumento Particular de
Confissão de Dívida e Outras Avenças firmado em 26/05/03”,
celebrado em 14.7.2004, ocasião em que o partido pagou o valor
de R$ 349.927,53, a título de juros, e comprometeu-se a pagar o
restante, no valor de R$ 2.591.011,44, em 9.2.2005 (fls. 236/238 e
239); e
.35.
(v) “Aditamento ao Contrato de Mútuo – Financiamento de Capital de
Giro nº 13.03.00102, firmado no dia 17/02/2003”, firmado em
21.2.2005, reconhecendo-se a dívida de R$ 2.901.168,00, além
dos encargos de R$ 199.080,76, que deveriam ser pagos até
22.8.2005 (fls. 240/241).
Nota-se, a partir destes documentos, que não
houve nenhum “perdão de dívida”, porque os valores apenas foram
renegociados, o que não é incomum na praxe bancária, aliás, muito ao
contrário, é prática corriqueira.
Além disso, ao serem renegociados, os
valores não mantiveram aquele patamar fixo de R$ 2.400.000,00 que a
acusação faz supor na tabela de fls. 9 (denúncia) e 4.184 (alegações finais),
tendo-se alterado a cada renovação, conforme critérios ajustados desde a
contratação12
.
Também os encargos foram sempre
imediatamente pagos, com exceção apenas da última renovação, em que se
convencionou que seriam saldados junto com o valor principal, em 22.8.2005 –
mas não “perdoados”. Os comprovantes juntados às fls. 230, 234 e 239, no
próprio procedimento do Banco Central, são bastante explicativos quanto a
isso.
12
A cláusula 2ª do contrato de mútuo, citada nas renovações da dívida, determinava, nesse sentido, que “Sobre
o valor da dívida, no caso de encargos pós-fixados, incidirá, exponencialmente, acréscimo idêntico ao da
variação do índice/base de remuneração previsto no preâmbulo, verificada no período compreendido entre a
data de assinatura do presente instrumento e a data de vencimento da(s) parcela(s) de amortização ou de
liquidação deste, incidindo sobre o valor apurado os juros previstos no Quadro III do preâmbulo” (fls. 223), ou
seja, a taxa CDI, mais 12,68% a.a..
.36.
Não houve, portanto, “perdão” de valores na
rolagem da dívida, mas mera renegociação, apenas se postergando o
pagamento de montantes que nunca deixaram de ser devidos.
Por fim, também a alegação de que não
haveria interesse em cobrar a dívida não merece prosperar – e basta que se
atente para a data de vencimento final do contrato para chegar a esta
conclusão.
De fato, a última renovação contratual
estipulou que o empréstimo deveria ser definitivamente quitado em 22.8.2005,
sendo dado ao partido desembolsar voluntariamente os valores até esta data.
Ora, se o partido ainda estava dentro do prazo
para adimplir a obrigação, não faria qualquer sentido que o BANCO BMG
tentasse receber judicialmente os valores antes da data fatal – ainda que,
conforme a inicial acusatória alega, tivessem estourado as “denúncias” do
chamado “mensalão”.
O máximo que poderia ser feito para
demonstrar o interesse em receber os valores, até lá, seria renegociar
formalmente a obrigação – e isso foi feito pelo banco.
Chegada a data estipulada e ainda não quitado
o empréstimo, o BANCO BMG poderia, então, recorrer à via judicial para
reaver os valores – e foi isso o que ocorreu.
.37.
Com efeito, os documentos juntados às fls.
3.759/3.789 descrevem com detalhes o processo de execução ajuizado pelo
BANCO BMG – o que ocorreu, aliás, no exato dia seguinte ao do vencimento do
prazo final para pagamento pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES, i.e., em
23.8.2005, conforme atesta a petição de execução por título extrajudicial de fls.
3.759/3.762.
O depoimento de PAULO ADALBERTO ALVES
FERREIRA, mais uma vez, também é bastante esclarecedor nesse sentido:
“Esse empréstimo, ele tinha um valor original
de dois milhões e quatrocentos mil reais. Foi
feita agora, em fevereiro de 2009, uma
repactuação de toda dívida. De 2003 a 2009,
nós tivemos pagamentos irregulares, certo?,
devidamente contabilizados e apresentado ao
Tribunal Superior Eleitoral. Nosso descritivo
está todo nessa apresentação. E, a partir de
2009 de fevereiro, nós repactuamos um valor
aproximado de cinco milhões de reais. E,
desde lá, nós pagamos cento e cinqüenta mil
reais/mês ao Banco BMG.” (fls. 4.016)
Ora, se não houvesse “interesse” em receber
os valores emprestados, não só as renovações realizadas (anteriores a eclosão
dos fatos) seriam desnecessárias como também o próprio ajuizamento da
execução o seria.
.38.
É evidente, portanto, que a intenção do
BANCO BMG de receber o valor emprestado, corrigido e acrescido de juros,
nunca deixou de estar presente e se manifestou a cada renovação contratual,
além de ser fundamental na fase executória.
Mas não é só.
Ainda que dispensássemos as explicações
acima, que desconstroem os argumentos utilizados para a acusação para fazer
parecer que as operações foram simuladas, a imputação não merece, por si
própria, ser acolhida.
Vejamos.
A falsidade ideológica, conforme já tivemos a
oportunidade de destacar aqui, pode ocorrer de três diferentes formas, todas
relacionadas à alteração da veracidade, da fé pública, de um documento – ou
seja, ainda que a forma seja preservada, o conteúdo deste documento, de algum
modo, não deve corresponder à verdade dos fatos.
Quando a acusação explica que o defendente
inseriu “declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de
alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante” (fls. 28) – entendendo
que isto estaria demonstrado a partir da suposta simulação dos empréstimos,
porque eles não seriam, “verdadeiramente, mútuos, eis que nunca tiveram
como objetivo serem adimplidos” (fls. 4.208) – incorre, pois, em
impropriedade indesculpável.
.39.
De fato, o que o Ministério Público afirma,
em outras palavras, é que aqueles contratos celebrados entre o PARTIDO DOS
TRABALHADORES e o BANCO BMG não poderiam ser qualificados como
“mútuos”, porque não haveria intenção por parte do mutuário de devolver
os valores emprestados.
Isto, no entanto, não faz qualquer sentido se
considerarmos o que se entende por mútuo no Direito brasileiro, porque esta
“intenção” de devolver os valores, embora desejável, está longe de ser
requisito para que o contrato se performe.
Com efeito, assim dispõe o Código Civil
sobre este tipo de contrato:
“Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas
fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao
mutuante o que dele recebeu em coisa do
mesmo gênero, qualidade e quantidade.”
A doutrina, por sua vez, explica que, além de
se tratar de contrato de empréstimo de coisa fungível, “trata-se de contrato
real, isto é, o contrato só se aperfeiçoa pela entrega pelo mutuante da coisa
emprestada ao mutuário. Sem tal entrega, não há que se falar na existência de
contrato de mútuo”13
(requisito performativo).
Logo, pode-se dizer que haverá contrato de
mútuo sempre que as partes, de comum acordo, convencionarem o empréstimo
13
SALOMÃO NETO, Eduardo. Direito Bancário. São Paulo: Atlas, 2005, p.180.
.40.
de coisa fungível e o mutuante entregar a coisa ao mutuário – ainda que este
não tenha a intenção de devolvê-la, porque esse elemento não faz parte da
definição de mútuo no ordenamento jurídico brasileiro.
Ora, na hipótese dos autos, as partes não só
acordaram o empréstimo de R$ 2.400.000,00 (fls. 222/224), coisa fungível por
natureza, como o valor foi efetivamente transferido pelo mutuante ao mutuário,
conforme comprovante de fls. 226.
Se foram atendidos os requisitos, não só
meramente formais, para que se possa falar em mútuo, evidente que o
contrato se realizou e não foi, portanto, simulado, independentemente da
suposta intenção do mutuário – que, por sinal, em nenhum momento
pareceu pretender não devolver os valores, conforme atestam as quatro
renegociações da dívida e a própria execução.
Vale a pena destacar ainda, por fim, que,
mesmo que houvesse simulação do contrato (o que não houve), não poderia
haver falsidade ideológica.
Isto porque estamos diante de um contrato de
empréstimo entre instituição financeira e particular, sendo o documento,
portanto, de natureza particular. Nessa hipótese, a ocorrência de simulação
não teria o condão de configurar falsidade ideológica, por completa
impossibilidade de as partes serem por ela enganadas – vez que ambas,
pretensamente, participariam da conduta.
.41.
Assim, se as partes estivessem cientes de que
o documento particular que estavam a produzir descrevesse uma mentira, não
poderiam elas se dizerem enganadas por uma falsidade ideológica, que inexiste
pela sua própria incapacidade de alterar qualquer verdade.
Nesse sentido, com apoio na jurisprudência,
assinala JULIO FABBRINI MIRABETE14
:
“Simulação entre as partes: crime não
caracterizado – TJSP: „Não se configura o
delito de falsidade ideológica se o efetivo ou
potencial prejudicado participou da alteração
da verdade e, pois, não podia ser enganado
por ela‟ (RT 442/350).”
Logo, mesmo que as operações fossem
simuladas, não estaríamos diante do delito tipificado no art. 299 do Código
Penal, por completa impossibilidade de o potencial prejudicado ser enganado.
Não há, portanto, que se falar em falsidade
ideológica na hipótese dos autos, seja porque não houve mesmo qualquer
simulação, seja porque, ainda que houvesse, ela não seria suficiente para
ensejar a prática do crime em questão.
Por estas razões, deve o defendente, se
superadas as preliminares trazidas nos itens anteriores, ser absolvido por esse
juízo.
14
Código Penal interpretado. São Paulo: Atlas, 2003, p. 1.938, grifos do original.
.42.
EMINENTE MAGISTRADO
O defendente é um homem íntegro, sério, que
sempre se destacou na luta política por um Brasil mais justo e igualitário.
Nasceu em Quixeramobim, no Ceará, onde
começou a militar como líder estudantil. Integrou a direção da União Nacional
dos Estudantes (UNE) e filiou-se ao PCdoB em 1968. Preso em abril de 1972,
na guerrilha do Araguaia, e após cinco anos de cadeia e tortura, retomou a vida
em São Paulo, trabalhando como professor de história no colégio Equipe.
Anistiado em 1979, JOSÉ GENOINO NETO
ajudou a fundar o PARTIDO DOS TRABALHADORES, elegendo-se, desde 1982,
deputado federal por cinco vezes consecutivas. Exerce, hoje, no governo
DILMA, a honrosa função de Assessor Especial do MINISTÉRIO DA DEFESA.
Em dezembro de 2002, assumiu a missão
política de presidir o PARTIDO DOS TRABALHADORES, jamais se imiscuindo em
questões administrativas e financeiras do partido, que estavam a cargo de
outros dirigentes eleitos para tanto, conforme já havia ele dito em seu
interrogatório:
“Eu apenas sou avalista. A administração das
finanças do partido, as negociações pelo
partido é feita pelo estatuto do partido, pelo
secretário de finanças e planejamento, que era
.43.
o tesoureiro do partido. Não participei de
nenhuma tratativa com o Banco, nem para
fazer o empréstimo, nem para os aditamentos,
nenhuma tratativa com o Banco.” (fls.
4.027/4.028)
É isto também o que se extrai do acervo
probatório produzido nos autos:
“que a depoente conhece o denunciado José
Genoíno; que, durante um de seus mandatos
da direção do PT/MG, o deputado Genoíno
exercia a função de Presidente Nacional do
PT; que, nesse período, se reunia com
Genoíno, normalmente, para discutir as
questões políticas do partido; que as questões
financeiras eram resolvidas entre os
tesoureiros, isto é, o tesoureiro nacional
reunia-se com os tesoureiros estaduais
enquanto os presidentes reuniam-se entre si”
(Depoimento da Sra. MARIA DO CARMO LARA
PERPÉTUO, fls. 3.341/3.342, grifamos)
“A SENHORA MARINA CHAVEZ ALVES
(ADVOGADA DE DEFESA DO SENHOR
JOSÉ GENOÍNO) – E quais são as funções
do Presidente do Partido dos Trabalhadores?
.44.
O SENHOR PAULO ADALBERTO ALVES
FERREIRA – O estatuto prevê a
representação política das decisões do
diretório nacional e das decisões da executiva.
Esse é o papel previsto no estatuto para a
figura do presidente.
A SENHORA MARINA CHAVEZ ALVES
(ADVOGADA DE DEFESA DO SENHOR
JOSÉ GENOÍNO) – E o deputado José
Genoíno, na condição de presidente do
Partido dos Trabalhadores, tratava das
questões financeiras do partido?
O SENHOR PAULO ADALBERTO ALVES
FERREIRA – Quem conhece o Genoíno sabe
do comportamento dele. O Genoíno trabalha
muito com o critério de delegação. O Genoíno
é isso, sempre foi isso. O Genoíno não é uma
liderança que se detém nos aspectos
administrativos. O Genoíno, ele representou,
até o momento da sua saída, o partido nas
posições políticas, na relação com os partidos,
na relação com parlamento e na relação com o
governo.
A SENHORA MARINA CHAVEZ ALVES
(ADVOGADA DE DEFESA DO SENHOR
JOSÉ GENOÍNO) – E não exercia a gerência
financeira do partido?
.45.
O SENHOR PAULO ADALBERTO ALVES
FERREIRA – O Genoíno não se ocupava da
administração do PT.” (Depoimento do Sr.
PAULO ADALBERTO ALVES PEREIRA, fls.
4.012/4.023, grifamos)
O defendente sequer se ocupava, Excelência,
da gerência do partido, porque não era essa a sua atribuição enquanto
presidente.
Se constava dos contratos de empréstimo a
sua assinatura como avalista, é evidente que isso só ocorreu por exigência
estatutária, sem que tivesse ele elaborado qualquer aspecto da operação.
O seu perfil histórico demonstra que suas
atividades estavam centradas nas relações do partido com suas bases, com os
movimentos sociais e com suas bancadas no Congresso Nacional, sempre com
o propósito de defender o seu partido e o governo Lula.
Todos os elementos presentes nos autos
comprovam a inocência do acusado, que sempre teve uma atuação política
pautada pela retidão e seriedade.
Por todo o exposto, pede a defesa que, se
não for reconhecida a nulidade do processo em decorrência (i) da inépcia
da inicial acusatória, (ii) da ilegalidade no seu recebimento e (iii) da
ausência de interrogatório do acusado ao término da instrução processual,
seja o defendente absolvido das imputações que lhe foram injustamente
.46.
lançadas, por ser medida de expressão máxima do JUSTO e do
JURÍDICO, por ser medida de realização da profundamente
almejada JUSTIÇA!
São Paulo, 28 de outubro de 2011.
Luiz Fernando Pacheco
OAB/SP – 146.449
Natasha do Lago
OAB/SP – 184.825-E