80
I SEMINÁRIO INTERMEDIÁRIO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIENCIA POLÍTICA (ABCP). DEIVISON SOUZA CRUZ JOSÉ ROBERTO BONIFÁCIO ANA PAULA SANTOS SAMPAIO JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? FEDERALISMO, FINANÇAS PÚBLICAS E MUDANÇA INSTITUCIONAL NO BRASIL PÓS-LRF [Versão Preliminar] São Carlos/SP Novembro de 2009.

JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

  • Upload
    habao

  • View
    217

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

I SEMINÁRIO INTERMEDIÁRIO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CIENCIA

POLÍTICA (ABCP).

DDEEIIVVIISSOONN SSOOUUZZAA CCRRUUZZ JJOOSSÉÉ RROOBBEERRTTOO BBOONNIIFFÁÁCCIIOO

AANNAA PPAAUULLAA SSAANNTTOOSS SSAAMMPPAAIIOO

JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? FEDERALISMO, FINANÇAS PÚBLICAS E MUDANÇA

INSTITUCIONAL NO BRASIL PÓS-LRF [Versão Preliminar]

São Carlos/SP Novembro de 2009.

Page 2: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

2

RESUMO

A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC101/00) pelo ângulo dos constrangimentos interpostos aos atores políticos por ela regulados. Argumenta-se que, ao visar conter as tendências diagnosticadamente pró-cíclicas na gestão de políticas públicas em diversas esferas de governo (União, estados e municípios), a inovação jurídica acarretou substanciais aperfeiçoamentos na gestão e no desempenho fiscal do setor público brasileiro. Mas também gerou subprodutos na forma de questionamentos de sua “juridicidade” e de sua constitucionalidade junto ao STF, os quais tornaram incerto o status-quo durante a maior parte do período de implementação observado. O que é paradoxal e digno de ser explorado analiticamente são as propriedades e as condicionantes do equilíbrio institucional decorrente destas regras, tendo em vista a posição em contrário da maioria dos juristas e doutrinadores consultados. Argumentamos que os comportamentos predatórios e espoliativos na gestão de recursos e bens coletivos (o que a literatura conceitua como um “Commom Pool

Resources Problem”) foram mitigados para dar lugar a um novo modelo de interação entre os agentes governamentais. Enfim, investigamos os impactos prospectivos que a concepção e a implementação do novíssimo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) podem acarretar sobre este modelo. Palavras-Chave: Política Fiscal, Ciclo Econômico-Eleitoral, Judicialização, Tragédia dos Comuns

Abstract: The paper examines the conception and the implementation of the Fiscal Responsability Law (LC 101/00) by point of view of constraints posed to the actors regulated for it. Arguments that, yet intended to restrain tendencies diagnosticatelly prociclical in policy-making of diverse governamental spheres (Union, states and municipalities), the legal innovation generates substantial improvements in fiscal administration and financial performance of brazilian public sector. But also generates by-products in form of contestation about its juridicity and its constitutionality before Federal Judiciary Courts (STF), that embedding with uncertainity the status-quo as long the part of implementation period observed. What is paradoxical and worth of investigation is the properties and conditionants of the institutional equilibrium originated from that rules. We posit that predatory and espoliative behaviours in administration of collective resources and goods (that the literature conceives as a “Common Pool Resources Problem”) mitigated for give place to a new model of interaction between brazilian governamental agents. Finally, explorates the prospective impacts that Acceleration of Growth Program (PAC) on its model. Key-Words: Fiscal policy, Political-Business Cycle, Judicialization, Tragedy of Commons.

INTRODUÇÃO Oferecer uma analise da LRF na véspera de sua primeira década de vigencia consitui-se em missão duplamente relevante. Em primeiro lugar, a constatação de que, a despeito de todos os prognósticos, a LRF foi uma “lei que pegou”, isto é, um diploma legal que não ficou prisioneiro da dicotomia clássica e persistente em nossa reflexão (e prática) político-jurídica entre o “país legal” e o “país real”. Secundariamente, mas não menos importante, ela acarretou ganhos de bem-estar, na forma de dispositivos de controle quantitativo e qualitativo do gasto público em diversas esferas de governo, gerando um forte consenso acerca da percepção e das expectativas de desempenho institucional do setor público brasileiro como antes historicamente se desconhecia. E tal consenso perpassa na atualidade todas as forças políticas, conservadoras ou progressistas, vinculando-as de uma maneira inaudita a um modelo de responsabilização fiscal que pode ser considerado exemplar entre os países emergentes. Basta notar que mesmo com o aprofundamento da crise financeira de 2008/2009, em decorrencia do estouro da Bolha da Sub-Prime, e o turning-point que esta representou junto à opinião pública mundial e à s agencias multilaterais de financiamento, o Brasil não desviou-se de sua trajetória de austeridade no setor público ainda que tenha decididamente optado (ainda antes que outros países) por medidas anticiclicas de política macroeconomica.

Page 3: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

3

A Lei de Responsabilidade Fiscal pode ser considerada então como aquilo que os economistas chamariam de um benefício coletivo. Isto é ponto pacifico, mas abre um imenso leque de controversias de dificil resolução mas que se nos afiguram incontornáveis se pretendemos de fato enfrentar as questões analíticas que temos em mãos. Em principio, sua interpretação nestes termos nos levaria quase que imediatamente (e acríticamente) à uma abordagem pelo foco das dificuldades pelas quais passam os atores políticos relevantes no processo decisório no sentido de se organizarem e de internalizarem os custos de negociação. Na literatura, a metáfora do Dilema do Prisioneiro é considerada capaz de modelar situações/contextos de interação estratégica tão distintos (e que teriam tão pouco em comum no que diz respeito a seus pressupostos, aspectos e implicações) quanto o Paradoxo da Ação Coletiva1, a saliencia dos custos de transação em determinadas2, a geração e a persistência do Capital Social e do espírito cívico em dadas coletividades políticas3 e a Tragédia dos Bens Comuns4. Não entraremos aqui nas particularidades e nos desdobramentos de cada uma destas formulações acerca da interação estratégica. Entretanto, claro fica desde o principio que a modelagem do Dilema do Prisioneiro sofre do que Sartori (1970) chamaria de um estiramento conceitual (conceptual stretching), ao abranger mais elementos e fenômenos do que seria recomendável subsumir, perdendo assim muito do seu valor analítico e explanatório.5 Um jogo de segurança mútua seria mais apropriado para dar conta das peculiaridades da situação contanto que ficasse demonstrado o potencial de retaliações mútuas de que dispoem os atores dentro do sistema político considerado. De todo modo trata-se de um jogo iterativo no tempo, considerando-se um período ex ante e um ex-post 3 2 1 0 1 2 3 4[ ; ; ; ; ; ; ; ; ; ; ]nt t t t t t t t tL L , em que a cooperação inexistente dentro do sistema

passa a existir. A observação empírica confirma o ponto, e séries temporais de dados de diversas agencias oficiais de contabilidade pública o confirmam. A tarefa analítica crucial seria gerar o mecanismo social que explica a emergencia e a durabilidade do equilíbrio político hoje existente na policy-area das finanças públicas brasileiras. Tal interpretação deve oferecer também os indicios que nos permitam saber a qualidade do dito equilíbrio (Nash, Pareto Superior ou Inferior), tendo em vista que alguns atores (estados e municípios) parecem ter ficado em situação pior do que outros (União), ao passo em que esta se acha em uma posição muito menos vinculada pelas normas da Lei Complementar 101/2000 e os limites que esta impoe sobre o comprometimento da Receita Corrente Líquida (RCL). Se pelo prisma internacional o Estado brasileiro, ao comprometer-se junto ao FMI e ao BIRD após a crise cambial de 1999 apresenta-se como um ator unitário, quando se adentra mais pormenorizadamente nos problemas de efetivação e implementação deste acordo, em sua

1 SAMUELSON, P. A. (1954). The Pure Theory of Public Expenditure. The Review of Economics and Statistics,

36(4), 387-389; OLSON, Mancur. 1982. The rise and decline of nations: economic growth, stagflation, and social rigidities. New Haven: Yale University Press, p. 17-74; Idem. 2000. Power and Prosperity: Outgrowing Communist and Capitalist Dictatorships. New York: Basic Books; Orenstein 1998.

2 Williamson 1980, 1985; NORTH, Douglass C. 1981, Structure and Change in Economic History. New York; London: W. W. Norton & Company; IDEM. 1990, Institutions, institutional change and economic performace. Cambridge: Cambridge Univ. Press; NORTH, Douglass C., & WEINGAST, Barry R. 1989. "Constitutions and Commitment: The Evolution of Institutions Governing Public Choice in Seventeenth-Century England." The. Journal of Economic History 49: 803-32.

3 Coleman 1990; Putnam 1993; Fukuyama 1996. 4 HARDIN, Garrett. The Tragedy of the Commons. Science, 13 December 1968: Vol. 162. No. 3859, pp. 1243-

1248.Disponível em: <http://www.sciencemag.org/cgi/content/full/162/3859/1243>.Acesso: 16.abr.08, 12:22.; OSTROM, Elinor. Governing the Commons: the evolution of institutions for collective action. Cambridge University Press, c1990.

5 Sartori (1970).

Page 4: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

4

incorporação ao ordenamento juridico interno uma série de problemas analíticos emergem. Tornam-se visiveis e salientes uma série de arenas decisórias institucionalizadas (partidos, Camara, Senado, Judiciário etc.), e com estas diversos atores com poder de veto (veto players) atuando a nivel federal, estadual, municipal ou societário. Emergem também as regras e procedimentos que balizam a operação de tais instituições de governo e impactam as preferencias destes agentes públicos e privados. Eis que surge e ganha relevo o que chamamos de jogo da responsabilização fiscal, tendo a democracia representativa como contexto primordial. A perseguição no cenário internacional de uma política de credibilidade nos compromissos (credible commitments) passa inexorávelmente pela contenção de gastos públicos e pela limitação de despesas e taxação que possam impactar negativamente a operação dos mercados. Nestes desafios, a teoria ensina que os regimes democráticos estariam em vantagens sobre os autocráticos, dada a falta de freios e contrapesos à voracidade fiscal e regulatória destes ultimos vis-à-vis os primeiros6. Muito embora não se tenham encontrado evidencias conclusivas que corroborem estas teses o que permanece na agenda é o desafio de descobrir e explicar os mecanismos políticos subjacentes ao desempenho economico e à estabilidade financeira dos diversos países, desenvolvidos ou não. 7 Como os atores políticos relevantes deliberam a respeito de uma issue que representa perdas distributivas e regulatórias em tão curto prazo e com tantas incertezas acerca de seus benefícios esperados? Como eles formam crenças e expectativas a respeito de uma política tão polemica e controversa? Que incentivos positivos e negativos se acham disponíveis no contexto político (domestico e internacional) e institucional? Qual o timing e a sequencia das mudanças institucionais? Há possibilidade de reversão na trajetória – e sendo positiva a resposta eles a percebiam claramente? Como se vê multiplas e intrincadas questões emergem e se desenrolam do simples olhar que se lança de imediato sobre o problema. Na primeira seção inventariamos alguns dados de séries temporais que nos dão uma panoramica do desempenho financeiro do setor público brasileiro (União, estados e municípios), tendo em vista o que se convencionou chamar a partir da década de 1970 de “Crise Fiscal do Estado”, culminando com a ratificação da LRF na esteira de uma estabilização monetária iniciada em meados dos anos 1990, e seus desdobramentos subsequentes. Em seguida, buscamos mapear os constrangimentos e pressões colocados pelo cenário internacional, ilustrando as hipóteses e interpretações mais convencionais acerca da temática em tela de juízo. No terceito capítulo, o processo decisório da Lei Complementar 101/2000, sua tramitação nas três arenas (Executivo, Legislativo e Judiciário), é apresentado e analisado à luz das principais contribuições teóricas acerca do funcionamento do sistema político brasileiro como um todo e das relações governo/Congresso e União/Estados e municípios em particular. No capítulo subsequente, dada a saliencia ou centralidade assumida pelo Poder Judiciário (notadamente o STF, mas também o TCU, a CGU e MPU) nos processos de ratificação e implementação, buscamos elencar os entendimentos que se firmaram na classe juridica (operadores e interpretes do Direito Fiscal e Tributário) brasileira durante os debates da inovação institucional, aferindo seu alinhamento (ou não) com as preferencias manifestas das elites políticas no mesmo período.

I. INSTITUIÇÕES POLÍTICAS E DESEMPENHO ECONOMICO

1.1. A Lógica do Oportunismo Político nas Democracias: O Ciclo Econômico-Eleitoral.

6 NORTH, Douglass C., & WEINGAST, Barry R. Op. Cit.; NORTH, Douglass C., Institutions… Cit.; Power and Prosperity…. Cit.

7 Cf. PRZEWORSKI, ALVAREZ, CHEIBUB & LIMONGI. Op. Cit.

Page 5: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

5

A comparação do desempenho macroeconômico e fiscal das nações sob diferentes regimes políticos não é um tema propriamente novo. Modernamente, o exame das diferenças entre a prosperidade e a segurança das repúblicas e dos principados parece ecoar preocupações que estiveram presentes do tempo de Maquiavel e Montesquieu. Em contraste, o exame do ciclo eleitoral induzido por regras e procedimentos democráticos de decisão coletiva data do último quartel do século XX. Esforços compreensivos de pesquisa e análise sistemáticas das relações entre variáveis econômicas e variáveis político-institucionais são ainda mais recentes na literatura. No segundo anexo temos um quadro através da qual buscamos sumarizar os principais resultados da literatura, bem como aspectos dos desenhos que lhes deram origem. North & Weingast (1989) realçam a relevância de políticas e instituições que implementam compromissos dignos de crédito (“credible commitments”) no desempenho da economia inglesa no limiar da revolução industrial. Para eles a chamada Revolução Gloriosa de 1688, tão celebrada por Locke e outros autores, seria o verdadeiro momento instaurador do capitalismo e da economia de mercado. Estudos similares foram efetuados para outros países europeus8 (North 1981, 1990;), e mesmo para o Brasil 9. Weingast (1995) alterou ligeiramente o modelo para auferir o impacto que a variável federalismo enquanto desenho institucional exerce sobre a estrutura de direitos de propriedade em 3 países (Inglaterra, Estados Unidos e China) 10 [Ver Anexo 2]. Em um dos seus últimos trabalhos, Mancur Olson Jr. (2000) esforçou-se por revisar criticamente e estender o poder explicativo daquelas teorias clássicas da escolha pública aplicadas à história econômica e à economia do desenvolvimento. Ao explorar heuristicamente a metáfora do “bandido estacionário” (“stationary bandit”) contraposta à imagem do “bandido errante” (“roving bandit”), como descrições (avaliações?) do comportamento dos governantes, de suas motivações e oportunidades, o autor retoma a problemática institucional de North, Weingast e outros, propondo uma nova e ampliada teoria do governo representativo sob compromissos dignos de credito. As premissas de auto-interesse individual à la Hobbes permaneceram praticamente intactas desde seus trabalhos anteriores. Outras e mais intrincadas conclusões são extraídas para explicar como as democracias regidas pelo método majoritário de decisão coletiva podem ser tão espoliadoras quanto as antigas autocracias. 11 O que impede autocratas e democratas de se entregarem à predação da riqueza social e individual, ao contrário do suposto por North & Weingast (1989), não seriam salvaguardas, coações e constraints de natureza institucional externos ao decisor político. Mas o desenvolvimento de um interesse abrangente (“encompassing”) na prosperidade e no desenvolvimento da comunidade, a percepção de uma interdependência estratégica entre as escolhas do governante (seja este um monarca, um corpo representativo ou os agentes das categorias organizadas), de um lado, e as decisões atomizadas de investimentos dos indivíduos/ cidadãos. Tiradas aquelas implicações das premissas, e com algumas ressalvas e mediações, pode-se dizer que o corolário final de seu argumento seria o de que as democracias seriam em geral superiores às autocracias (socialistas) do ponto de vista do desempenho macroeconômico. Isto nos leva de volta novamente ao Diagrama 1. 12

8 NORTH, Douglass C., & WEINGAST, Barry R. Op. Cit. NORTH, Douglass C. Structure and Change… Cit.; IDEM. 1990, Institutions… Op. Cit.; STASAVAGE 2002.

9 SUMMERHILL, s.d. 10 WEINGAST, Barry. 1995. “The Economic Role of Political Institutions: Market-Preserving Federalism and

Economic Development”. Journal of Law, Economics, and Organization 11:1-31. 11 OLSON, Mancur. The rise and decline of nations: economic growth…, pp. 17-74. 12 OLSON, Mancur. 2000. Power and Prosperity: Outgrowing Communist and Capitalist Dictatorships. New York:

Basic Books.

Page 6: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

6

Fica claro contudo o viés de seleção tanto no trabalho de Olson quanto no de North e associados. A par do pequeno número de países selecionados, observa-se facilmente que as observações correlacionam-se bastante com o que ambos pretendem explicar. 13 Ao citar Rússia e China, por exemplo, como casos de sociedades autocráticas que apresentaram evoluções divergentes na transição para o capitalismo fica muito patente falta de contraprovas que matizem as conclusões. Um e outro caso representariam casos extremos de fracasso e de sucesso da implementação de políticas liberalizadoras calcadas em compromissos críveis, na defesa dos direitos de propriedade e na alocação eficiente de recursos produtivos. 14 Tentativas de evitar esses complicadores dão a tônica dos principais trabalhos mais recentes. Antes de explorarmos a literatura internacional comparada de ciclos político-eleitorais com grande numero de observações, notemos ainda a resposta que Przeworski e associados oferecem às perplexidades dos modelos de North e Olson. Há dois níveis de resposta.para aquele autor. 15 Em primeiro, o exame dos desempenhos macroeconômicos das democracias e das ditaduras existentes no período 1950-1990 revela que não há diferenças do ponto de vista das taxas de crescimento, ou seja, do ritmo. Haveria diferenciais sim do ponto de vista do uso e da remuneração dos fatores, do modelo de crescimento da renda. Combatendo o argumento segundo o qual as ditaduras concentram os principais “milagres econômicos” do Pós-Guerra (Tigres Asiáticos), Przeworski et. al. (2000) assinalam que elas também concentram os principais fracassos. A elevada variabilidade nos desempenhos econômicos desfaz alguns mitos, sendo por vezes atribuída a alta incidência de guerras e à presença na amostra de países da OPEP. Assim é que, em um tom bem humorado, os autores concluem que “Tigres podem

ser ditaduras, mas ditaduras não são Tigres.”. 16 No segundo lugar, haveria uma inconsistência fundamental na literatura neoinstitucionalista que diz respeito a problemas de endogeneidade nas variáveis institucionais, cuja prioridade analítica e explicativa seria postulada por North (1990) e associados. Os efeitos de regras e procedimentos sobre o crescimento econômico seriam difíceis de se identificar. Consistente com os resultados econométricos de seu anterior trabalho coletivo17, para o autor os arranjos institucionais afetam variáveis demográficas (crescimento da população) mais do que variáveis econômicas (crescimento da renda total). Assim, em suas próprias palavras, “appears that if political institutions affect anything, it is demographic, rather than economic,

performance.”18 Embora o novo institucionalismo reconheça que as instituições são endógenas o autor assinala que elas não jogam papel autônomo e que a famosa explicação de North (1990) e seguidores para a pobreza dos países do Terceiro Mundo é circular. O suposto encorajamento às atividades produtivas dado por um menu de instituições que corrijam distorções na estrutura de incentivos oferecidos aos agentes assim não seria o resultado do desenho institucional em si mas das condições em que ele é adotado e implementado, dos atores (racionais e auto-

13 GEDDES, Bárbara. (1990), "How the Cases You Choose Affect the Answers You Get: Selection Bias in

Comparative Politics". In Political Analysis, edited by J. Stimson. Ann Arbor: University of Michigan, 131-150. 14 OLSON, Mancur. Power and Prosperity,.. Cit. Cap. 7 e 8. 15 Cf. PRZEWORSKI, A., ALVAREZ, M., CHEIBUB, J. E. & LIMONGI, F. (2000), Democracy and

development: political institutions and well-being in the world, 1950-1990. Cambridge: Univ. Press; PRZEWORSKI, Adam. 2004. “Some Historical, Theoretical, and Methodological Issues in Identifying the Impact of Political Institutions". Disponível: http://www. nyu.edu /gsas /dept /politics/ faculty/przeworski/papers/PRAGUE.PDF. Acesso: Tue, 6 Sep 2005 19:56:38.

16 Cf. PRZEWORSKI et. al. Democracy and development: Cit, , p. 178). 17 PRZEWORSKI, et. al. Idem. 18 PRZEWORSKI, Adam. “Some Historical, Theoretical, and Methodological Issues in Identifying the Impact of

Political Institutions", Cit. , p. 10.

Page 7: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

7

interessados, diga-se de passagem) que presidem sua adoção como marco regulador das transações econômicas e políticas. 19 1.2. A Judicialização e o Marco Constitucional da Separação de Poderes. Nesta seção intentamos discutir a inserção ou o enquadramento do tema da responsabilização fiscal no marco mais amplo do sistema político democrático-representativo brasileiro, na forma que os cientistas políticos hodiernamente o denominam, Presidencialismo de Coalizão. Expor as virtudes e fraquezas desta conceituação, dentre as quais a limitação da canais de representação dos governados de acompanhamento e fiscalização dos governantes. Seja por deliberação dos analistas políticos seja por escolha dos próprios agentes públicos, a política brasileira parece estar confinada no eixo das relações Executivo/Legislativo20. A mudança institucional ocupa uma centralidade quase absoluta na agenda dos cientistas políticos, particularmente daqueles que se ocupam com o estudo dos países em desenvolvimento. As finanças públicas, em diversos países, tendem a se comportar de modo cíclico dada as particularidades da estrutura institucional e as injunções da política eleitoral. No Brasil, país envolvido em um intenso processo de estabilização macroeconômica ao longo da última década e meia, a questão não é diferente21 O federalismo, enquanto mecanismo institucional básico em diversas democracias, é apontado em variados estudos como fonte de resistências à mudança institucional e de desperdício de recursos, dados os interesses consolidados de governantes subnacionais na manutenção da despesa pública em níveis elevados. Argumenta-se que estes se comportarão como atores dotados de poder de veto (veto-players) em face de qualquer mudança institucional que possa acarretar a liquidação deste status-quo. 22 O Judiciário vem ocupando um lugar de crescente destaque na trajetória institucional das democracias existentes, consolidadas ou não. Seja como ator ou instancia de veto (veto-point)

19 Idem. Ibidem, p. 13. 20 OLIVEIRA, F. M. C. O Primeiro Ano do Governo FHC. (Debate Com José Roberto Mendonça de Barros, Luiz

Gonzaga Belluzzo, Sérgio Abranches e José Arthur Gianotti, Mediadores). Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, v. 44, 1996.

21BORSANI, Hugo, 2003. Eleições e economia: instituições políticas e resultados macroeconômicos na América Latina (1979-1998). Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Ed. UFMG; IUPERJ; AMORIM NETO, Octavio & BORSANI, Hugo. 2004. Presidents and Cabinets: The Political Determinants of Fiscal Behavior in Latin America. Studies in Comparative International Development, Berkeley, CA, E.U.A., v. 39, n. 1, p. 3-27; Barros da Cunha, A. 2003. Optimal Exchange Rate Policy, Optimal Incomplete Taxation and Business Cycles. Trabalho apresentado no XXXI Encontro Nacional de Economia, Porto Seguro/BA, 09-12/12/2003. Disponível em: www.anpec.org.br/encontro2003/ artigos/B16.pdf; Bittencourt, J. L. & Hillbrecht, R. O. 2003. Ciclo Político na Economia Brasileira: um Teste para a Execução Orçamentária dos Governos Estaduais- 1983/2000. Trabalho apresentado no XXXI Encontro Nacional de Economia, Porto Seguro/BA, 09-12/12/2003. Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro2003 /artigos / B32 .pdf; CAMARGOS, Malco B. Do bolso para as urnas: a influencia da economia na escolha entre Fernando Henrique e Lula nas eleições de 1998.Dissertação (mestrado) - Ciência Política, Rio de Janeiro: IUPERJ, 1999;

22 ABRÚCIO, Fernando L. Os Barões da Federação. São Paulo, EDUSP, 1998; ABRÚCIO, F. E COSTA, V.M.F. (1998) Reforma do Estado e o contexto Federativo Brasileiro, Konrad-Adenauer-Stiftung, série Pesquisas, nº 2, São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung; Ames, B. (2003). Os entraves da democracia no Brasil (V. Pereira, Trans. 1ª ed.). Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas; MAINWARING, Scott P. (2001), Sistemas Partidários em novas democracias: o caso do Brasil. Tradução de Vera Pereira. Porto Alegre: Mercado Aberto, Rio de Janeiro: FGV; REMMER, Karen & WIBBELS, Erik. 2000. “The Subnational Politics of Economic Adjustment: Provincial Politics and Fiscal Performance in Argentina”. Comparative Political Studies 33:419-451; REZENDE, Flávio da Cunha. 1997. “Descentralização, Gastos Públicos e Preferências Alocativas dos Governos Locais no Brasil (1980-1994)”. Dados, vol. 40, n º 3; WIBBELS, Erik. “Federalism and the Politics of Macroeconomic Performance”. American Journal of Political Science 44:687-702, 2000; AFFONSO,Rui de B. A. e SILVA, Pedro L. B.(orgs). A Federação em perspectiva: ensaios selecionados. São Paulo: FUNDAP, 1995.

Page 8: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

8

sobre medidas e políticas de reformas apresentadas pelos Executivos e ratificadas pelos Legislativos, seja enquanto implementador ou assegurador (enforcer) de direitos e-ou conquistas individuais e coletivas ameaçadas (ou engendradas) pelas mudanças institucionais postas na agenda decisória da polity. Poucos são os estudos em que o processo de mudança institucional em uma issue-área tão sensível quanto a das finanças públicas é abordada com referencia a um número tão amplo de variáveis institucionais (o federalismo e o Judiciário). A maior parcela das pesquisas existentes costumam restringir seu foco às interações entre União e entes federativos subnacionais (Poder Executivo) ou às relações Executivo-Legislativo nas escalas federal 23 e estadual 24. O Judiciário, no mais das vezes, parece emergir como uma instituição isolada sem uma adequada descrição dos mecanismos institucionais que o vinculam ao conjunto da polity. A década de 1990 foi marcada no Brasil por profundas mudanças na institucionalidade econômica e política do país. As chamadas reformas orientadas para o mercado acarretaram drástica redução no tamanho do Estado brasileiro, a abertura da economia à competição internacional e ao investimento estrangeiro25 A discussão e a ratificação da Lei de Responsabilidade Fiscal (doravante LRF) no segundo governo Fernando Henrique Cardoso (1999-2002) representou para muitos o momento instaurador de um novo modelo de interação entre os agentes públicos no Brasil. Há indícios de que neste período se esboçou uma dinâmica rota-dependente (path-dependent), que mitigou a predação de recursos e restringe o ciclo eleitoral nas finanças públicas – e, por conseguinte, dissolveu a hipótese pessimista traduzida metafórica e estrategicamente na Tragédia dos Comuns26 Decisões recentes do STF no segundo semestre de 2007, reiteraram o conjunto de preferências contrárias ao novo instituto legal na forma em que foi ratificado pelos legisladores. A ausência das penalidades e restrições impostas pela LRF não quer dizer que os incentivos por ela gerados estejam também anulados. Antes de analisarmos a maneira como o ciclo eleitoral se coaduna com os modelos informacionais de comportamento legislativo (e, por conseguinte, com o desempenho parlamentar) cumpre-nos adicionar mais duas macrovariáveis institucionais ao convencional modelo de sistema político com que vem operando a literatura brasileira ao longo das duas ultimas décadas. Uma delas, bastante tradicional, vem a ser os mecanismos de articulação e intermediação de interesses na sociedade, por vezes chamados corporativismo, outras vezes pluralismo, ainda que não se tenha (a despeito do grande corpo de pesquisas e investigações empíricas e teóricas dentro da disciplina desde os seus primórdios) um consenso acerca destas definições e de medidas que possam operacionalizá-las empíricamente. Acresce-se a isto o fenômeno das chamadas redes sociais e de políticas (social networks e policy networks) que seria

23 MELLO, Marcus A. A Política da Reforma do Estado no Brasil: issue areas e processo decisório da reforma

previdenciária, administrativa e tributária. Trabalho preparado para o seminário The Political Economy of Administrative Reform in Developing Countries, 5-6 Junho de 1997, CIDE/Northwestern University, Cidade do México; FIGUEIREDO, A. C. ; LIMONGI, F. (1999), Executivo e Legislativo na Nova Ordem Constitucional. 1. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; Ames, B. Op. Cit.; Samuels, D. J. Ambition, federalism, and legislative politics in Brazil. Cambridge; New York: Cambridge University Press, 2003; SANTOS, F. (2003). O poder legislativo no presidencialismo de coalisão. Belo Horizonte/ Rio de Janeiro: Editora UFMG (Belo Horizonte)/ Editora IUPERJ (Rio de Janeiro).

24 ABRÚCIO, Fernando L. Op. Cit. 25 Para uma apreciação das reformas institucionais deste período ver: ALMEIDA, M.H.T. de & MOYA, Maurício.

(1997), "A Reforma Negociada: O Congresso e a Política de Privatização". Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 12, nº 34, pp. 119-132;; ALMEIDA, Maria H. T. de. Negociando a Reforma: A Privatização de Empresas Públicas no Brasil. Dados – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, Vol. 42, nº. 3, p. 421-451, 1999; Mello 1996).

26 Hardin, R. Op. Cit.; Ostrom, E. Op. Cit.

Page 9: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

9

considerado praticamente anomalo em relação aos paradigmas pluralista e corporativista se não houvesse despertado nos pesquisadores um interesse cognitivo pelo qual vem merecendo um programa de investigações prórprio. 27 A segunda tendência ou movimento é mais novo na agenda. Tem a ver com o crescimento da intervenção do Poder Judiciário em diversos sistemas políticos e sociedades, dando origem ao que os estudiosos chamam “judicialização”. Muito poucos estudos conhecemos acerca da maneira como esta variável conceitual tem se relacionado com os modelos mais convencionais de relacionamento entre os poderes Legislativo e Executivo, dada a centralidade destes no arcabouço institucional das democracias representativas existentes. A maneira como o Judiciário, ecoando as preocupações de engenharia institucional presentes em pensadores como Montesquieu e Madison, interfere no equilíbrio entre os poderes sociais e exerce (ou deixa de fazê-lo) a função de freios e contrapesos (check and balances) às aspirações majoritárias representadas seja no Parlamento seja na Presidência da República é ainda alvo de grandes controvérsias como há muito já nos demonstrou um clássico cientista político. 28 1.3. Em Busca de um Denominador Comum: O Jogo da Responsabilização Fiscal Paralelamente ao interesse empírico, há também um interesse de natureza teórica acerca das evoluções recentes do caso brasileiro. Tais desdobramentos não passaram completamente desapercebidos pelos pesquisadores. Como veremos, avançou-se muito no desenvolvimento de estudos cada vez mais detalhados e sofisticados acerca da gestão das políticas macroeconômicas (monetária, fiscal, cambial, industrial), da operação de regras e procedimentos do sistema de governo (presidência, Congresso, agencias), bem como dos mecanismos de ação coletiva e acesso ao poder público por partidos, sindicatos e demais organizações societais. Contudo, para o caso brasileiro até o momento parece havido pouco interesse (ou poucas oportunidades) dos estudiosos em integrar as distintas agendas de pesquisa que compõem a investigação das relações entre economia e política. Pouco se avançou na elucidação das conseqüências econômicas derivadas da operação do que um grande número de autores brasileiros chamam de Presidencialismo de Coalizão

29. Pretendendo descrever e explicar a complexa interação entre representação proporcional com lista aberta, multipartidarismo, federalismo e presidencialismo, o conceito de Presidencialismo de Coalizão originalmente fora formulado com forte ênfase, não apenas naqueles determinantes institucionais, mas também nas possíveis relações entre estes e a trajetória da economia e da sociedade brasileiras ao longo da era republicana. O ano de que falamos era o da promulgação da nova Constituição brasileira (1988), marcado por forte turbulência na política e na economia que colocavam em tela todo o peso da herança autoritária e elitista e realçava a magnitude dos complicadores à consolidação da democracia representativa. Contudo, o advento de teorias e métodos associados ao chamado Novo Institucionalismo na ciência política brasileira acabou por dissociar a perfomance macroeconômica das regras e procedimentos político-institucionais. Isto se deu tanto em um plano analítico quanto em um plano normativo30. Ou seja, não apenas se buscava examinar

27 .Heclo, H. 1985. 28 DAHL, R. A., Um Prefácio à Teoria Democrática, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1989 [1954]. 29 O termo, de longa e notória carreira no âmbito da Ciência Política brasileira, como se sabe, foi originalmente

cunhado por Abranches (1988). Para uma critica ou contraste a este modelo ver: Amorim Neto (1998), Colomer & Negretto (2001), Cheibub (2001).

30 Basta ver a tônica do debate ensejado pelas reformas políticas dos anos 1990 e as correlatas reformas econômicas orientadas para o mercado. Um bom exemplo dos esforços de dissociação analítico-normativa da política brasileira em relação ao momento econômico é dado por Santos (1994). Parece caminhar em similar direção, porém em um tom mais moderado, o já clássico trabalho de Figueiredo & Limongi (1999) sobre o funcionamento do Congresso Nacional.

Page 10: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

10

desenhos institucionais, mas também de avaliá-los à luz da rica e secular experiência internacional. Á parte aquelas controvérsias intra-acadêmicas, uma série de issues como as reformas macroeconômicas, a estabilização monetária, o agravamento de questões e demandas sociais há muito reprimidas e os impasses do jogo político-partidário se sobrepuseram na agenda dos policy-makers e representantes desde a inauguração do marco constitucional. Isto, de alguma maneira, condicionou a percepção dos estudiosos sobre a problemática institucional e fez com que as pesquisas que estendiam o campo de aplicação do conceito de Presidencialismo de

Coalizão ficassem restritas à investigação dos efeitos recíprocos da interação entre os determinantes institucionais de nossa polity. Cumpre definir o conceito de “responsabilização fiscal” aqui empregado, sua origem no discurso dos atores (e dos analistas) e seus desdobramentos na forma da mudança institucional em tela de juízo. Deve-se distinguir a natureza fiscal desta imputação de responsabilidades daquelas outras de natureza política e mesmo penal, muito embora no caso da LRF as três tenham permanecido (em distintas proporções) entrelaçadas, dai decorrendo diversas repercussões, dentre as quais, ainda não totalmente elucidada, a possível chave do seu exito. Ao implementar reformas, governos que buscam a concertação de suas políticas conferem a estas maior coerência do que aqueles que não recorrem a este método. Assim sendo os impactos da política pública a ser adotada e implementadas são conhecido ex ante e minimizada a incerteza decorrente de sua adoção, ao passo em que desenhos institucionais que favorecem esta maneira de avaliar e decidir acerca de um curso de ação política são mais bem sucedidos do que outros que não o permitem. 31 Redes sociais, grupos de interesse (lobbies, associações etc.) e entidades corporativas (sindicatos, federações patronais, sociedades rurais etc.) representariam em nossa conceituação não mais do que variações de grau de um mesmo fenômeno qual seja o de agregação, de formalização e de verticalização dos interesses que são organizados e intermediados em uma mesma sociedade (Ver Diagrama N. 1). As perspectivas partidária e informacional (Ver Anexo 1) coadunam-se bastante bem com a intermediação de interesses do modo como estamos propondo, com vantagens para esta última. A vertente distributivista por seu turno também se coaduna, mas pelo prisma da alocação dos benefícios públicos – no mais das vezes geograficamente circunscritos – tende a contemplar interesses organizados de menor abrangência social. 32 Já a vertente partidária, tendo em vista as clivagens emanadas da estrutura social, especialmente aquelas vinculadas ao conflito capital/trabalho, ou de cunho étnico/religioso/regional, tenderia a configurar-se mais como um canal de representação para interesses assim definidos, daí sua alta rigidez e baixa plasticidade. O mesmo tipo de limitações não se aplica aos modelos informacionais de comportamento legislativo. Nestes, as suposições de incerteza ex ante e ex post que cercam as decisões legislativas induzem os legisladores a buscar reunir o máximo possível de informações sobre o objeto e as implicações de suas escolhas. Um dos indicadores para se auferir os ganhos de especialização (expertise) em que se traduz o desenvolvimento do sistema de comissões em um dado corpo legislativo é a freqüência com que são realizadas audiências publicas (hearings). O informacionalismo se coaduna bastante bem também com as tendências à judicialização dos sistemas políticos tal como se observou no Brasil durante a década de 1990. A associação que postulamos aqui entre as duas variáveis seria negativa dado que as audiências e as

31 Krehbiel, K. Information and legislative organization. Ann Arbor, MI: University of Michigan Press, 1991;

STARK, David & BRUSZT, Laszlo. (1998), Enabling Constraints: Fontes Institucionais de Coerência nas Políticas Públicas no Pós- Socialismo. Revista Brasileira de Ciências Sociais, ANPOCS, Vol. 13, n.º 36, Fevereiro 1998, pp. 13-39.

32 Mayhew 1974; Fiorina 1989; Weingast & Marshall 1988.

Page 11: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

11

consultas públicas, como dissemos acima, mais do que recolher pareceres e dados, serviria para comprometer dado segmento social, político e econômico representado no processo decisório com os resultados (outcomes) da política pública adotada. Assim sendo isto reduziria a probabilidade de que tais interesses retaliassem o governo em uma outra arena (Judiciário) uma vez que tenham sido prejudicados na arena legislativa. Uma maneira de formalizar esta relação entre os caracteres ou atributos institucionais é feita através da formula abaixo:

( . )ier or gr

H f F A β= + [Equação. 1]

Onde Hier representa o grau de hierarquização dos interesses constituídos no momento t1, sendo função do seu nível de formalização (atribuição de status público ou For) multiplicado pelo seu grau de agregação ou abrangência Agr mais um fator aleatório β. Em principio seria temerário relacionar estes três atributos da corporativização/pluralização enquanto mecanismos de articulação e intermediação de interesses societais (hierarquização, formalização e agregação/abrangencia) tal como eles aparecem no Diagrama 1 e na Equação [1] e o processo de judicialização tal com a estamos considerando aqui. Inclinariamo-nos a afirmar que a “judicialização” que se torna estratégia dominante para um ator político em determinado momento (JUD t1) seria decorrente do grau de abrangencia dos interesses societais afetados por determinada policy no momento imediatamente posterior (Agrt2), mas que tal circunstancia seria tolhida seja pelo seu nivel de hierarquização ou de formalização no espaço público, variáveis estas cujo comportamento seria condicionado por elementos anteriores ao processo decisório em causa, isto é, exibiriam caracteres rota-dependentes. Assim sendo:

1 2( ) ( ) ( / )ud t gr t or ier

J A F H= − − [Equação. 2]

Assuminos, contudo, que a “corporativização” covaria inversamente com judicialização. A proposição não é isenta de ambigüidades e contestações em seu sentido. Quanto maior o nivel de agregação e de formalização dos interesses societais, o que como vimos condiciona sua hierarquização em organizações de pico, maior sua capacidade de interagir com o Executivo e sua maioria congressual, colocando em segundo plano estrategias não-cooperativas ou retaliatórias em outra arena (como a de recorrer a Ações Diretas de Inconstitucionalidade, ADins). Seria este o caso em que a inovação institucional em tela de juizo haveria se convertido em um bem público dotado de todas as caracteristicas que o tipificam33. Ou de maneira mais formal:

1( ) 1orp

ud t

CJ =

− [Equação. 3]

Governos adotam práticas de concertação mais por que desejam evitar complicadores pós ratificação de suas medidas no Legislativo do que por que consideram todos os interesses organizados da sociedade dignos de serem ouvidos em um processo decisório.

33 SAMUELSON, P. A. (1954). The Pure Theory of Public Expenditure. Cit; OLSON, Mancur. The rise and

decline of nations: economic growth… Cit, p. 17-74; Idem. Power and Prosperity… Cit.

Page 12: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

12

Tem-se assim que intermediação de interesses e judicialização vem a integrar-se em um novo, abrangente e mais complexo modelo de sistema político do que aquele originalmente denominado “Presidencialismo de Coalizão”. Não que o conceito tenha perdido seu apelo e sua capacidade descritiva e explanatória, mas por não incorporar mais variáveis relevantes acabou confinando-se a uma equação muito estreita e limitada preditivamente tendo em vista os poderes Executivo e Legislativo (Bicameralismo), a distribuição de poder entre partidos (multipartidarismo) e regiões (federalismo) mediada por regras e procedimentos de representação política proporcionalistas de lista aberta. 34

Um Presidencialismo de Coalizão Expandido acha-se prefigurado na famosa obra de Luiz Werneck Vianna et. al. (1999) e no artigo de Fabiano Santos (2005). O mesmo foi operacionalizado em Zorzal & Rodrigues (2001) e em Bonifácio (2006) para investigações acerca das políticas públicas de desestatização e desregulamentação econômicas nos setores mineral e petrolífero na década de 1990, respectivamente. 35 Mais agudas e incisivas nas conseqüências que extrai do argumento da judicialização do sistema político (polity) e dos resultados (outcomes) são as recentes intervenções de Fabiano Santos (2007), as quais levam em uma direção e sentido mais profundo as pesquisas já efetuadas. Na verdade, ecoando Werneck Vianna et. al. (1999), este autor diagnostica o seguinte:

34 ABRANCHES, Sergio H. H. (1988), Presidencialismo de Coalizão: O Dilema Institucional Brasileiro. Dados –

Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro. Vol. 31, n.1, pp. 19-22. 35 ; SANTOS, F. G. M. A Constituição de 1988 e a República Presidencialista : uma análise de três obras sobre

dilemas institucionais no Brasil contenporâneo. Saúde e Direitos Humanos, v. 2, p. 35-44, 2005; .

Gráfico N° 1 Uma Tipologia para a intermediação de

Interesses no Legislativo

Sindicatos, Federações Patronais, Sociedades

Rurais Entidades Religiosas

Subgovernos ou “Iron Triangles”

Social-Networks

“Anéis Bu-rocráticos”

Grupos de Interesses:

Lobbies Policy-

Networks

“Anéis de Contrapeso”

Formalização

Hie

rarq

uiza

ção

Agregação/ abrangência

Page 13: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

13

Isso é um processo muito recente, para dizer aí na Constituição de 88, mas que em outros países também vem acontecendo mais recentemente e nos Estados Unidos isso é algo que já tem alguma tradição. Eu tenho percebido, colegas vêm estudando isso de forma sistemática, no caso brasileiro, e é algo que a gente tem que prestar atenção e enfatizar porque tem ocorrido no Brasil. Ou seja, o Judiciário tem feito um trabalho de alteração do status quo legal. No Brasil isso tem ocorrido especificamente nas regras de competição político-partidá ria e, como todo ator político, os juizes têm preferências, então eu tenho dúvidas em relação à postura de que simplesmente se interpreta a Constituição. Existem inclinações políticos-ideoló gicas, alguns juízes são mais conservadores outros juízes são menos conservadores, o Governo tem um posicionamento em relação à ser mais ou menos conservador, então essas coisas acabam ocorrendo, ou para caminhar junto com o Governo, ou para caminhar contra. As decisões tomadas em relação à competição político-partidá ria têm sido decisões tomadas em oposição ao Governo, em oposição aos interesses do Governo. Isso aconteceu em relação à fidelidade partidária, isso aconteceu em relação à regra da verticalização, isso aconteceu em relação ao fundo partidário. O posicionamento dos juízes, das lideranças principais, do Supremo e do TSE tem ocorrido contrariamente aos interesses do Governo. [...] São os juízes que estão no TSE e que são do STF, têm uma postura conservadora, foram indicados por presidentes conservadores e, portanto, têm feito um trabalho de oposição ao Governo, que não é um Governo conservador. [...] Eu acho que as declarações e o posicionamento público do juiz Marco Aurélio de Mello são evidentes. Não precisa nem reiterar e nem trabalhar as declarações, elas são muito explicitas, nesse sentido. [...] Sim, no sentido de ter uma postura conservadora e opositora ao Governo e sempre contrária aos interesses do Governo, quais quer que sejam eles. [...] Certamente do Senado [é a oposição mais eficaz contra o Governo Lula], porque o Senado as coisas são ditas de forma mais clara, "somos oposição, temos interesses distintos, representamos os interesses distintos, mas vamos conversar aqui sobre o que é possível" e isso é feito de forma transparente, às claras os elementos de acordo político são feitos também e a opinião pública conhece. Essas pessoas são votadas, são eleitas, enquanto que no STF não, em nome de uma pureza, em nome de uma doutrina, em nome de uma verdade que ninguém concorda com ela. E ninguém é eleito ali. Se está fazendo uma intervenção brutal nas instituições democráticas em nome, de um lado, de uma pureza doutrinária que é deletéria, do outro lado de interesses políticos incontestáveis, então fica difícil. [...] [o Supremo Tribunal hoje] Usurpa [o papel do Legislativo], em determinadas circunstâncias, usurpa. 36

Ainda que nem todos os analistas políticos compartilhem destas preocupações, ou mesmo que as compartilhem não acatem as premissas nem as conclusões de um semelhante raciocínio, há que se reconhecer a relevância analítica da inclusão do Judiciário nas analises das relações políticas sob o sistema presidencialista, federativo e bicameral como o que vige no Brasil. Adentraremos melhor estes tópicos na próxima seção. II. AS RELAÇÕES EXECUTIVO/LEGISLATIVO/JUDICIÁRIO NA POLÍTICA DE ADOÇÃO E

IMPLEMENTAÇÃO DA LC 101/2000

2.1. A Criminalização da Irresponsabilidade Fiscal no Brasil: Contexto e a Proposta

36SANTOS, Fabiano. IUPERJ: STF LIDERA OPOSIÇÃO CONTRA LULA. Entrevista a Paulo Henrique

Amorim. 25/10/2007 10:23h. Disponível em: <http://conversa- afiada.ig. com.br/>. Acesso em: 20.Mar.2009, 13: 34.

Page 14: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

14

Estava o Brasil, como é sabido, experimentando no início da década de 1990 uma forte aceleração inflacionária, que se deve ao desequilíbrio e à indisciplina fiscal, como sustentado por especialistas no assunto. Ao mesmo tempo, como veremos, formava-se lentamente certo consenso entre economistas, juristas e outros estudiosos acerca das causas desse processo. Havia menos acordo, contudo, a respeito das medidas no plano administrativo e jurídico para remediar esta situação37. Com o sucesso da estabilização monetária em 1994 (Plano Real) aumentaram as pressões sobre os políticos no sentido da contenção de despesas, dos gastos perdulários e do desperdício de recursos nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal). Mais que isso, aumentou na mídia a visibilidade de escândalos de malversação e desvio de recursos públicos. Com estes escândalos financeiros no setor público, aumentou a repulsa da opinião pública pelas práticas e hábitos patrimonialistas e corruptas em voga no Brasil, tornando intolerável sua continuidade. A par desta intolerância crescente e da visibilidade de seus efeitos econômicos e de seus custos sociais não haviam dispositivos legais que tipificassem o crime de responsabilidade fiscal. Ainda haviam fortes resistências às políticas de ajuste fiscal e de contenção de despesas, acertadas com o FMI pela gestão do presidente eleito Fernando Henrique Cardoso (1995-98 e 1999-2002), constando explícita e claramente de seu programa de governo. A própria base de sustentação do governo no Congresso Nacional e nos estados, como notado pela própria mídia e pelos partidos de oposição, era integrada por forças historicamente vinculadas às tradições e práticas corruptas do patrimonialismo. Muitos (mas não todos) eram políticos do tipo “amigos do rei” de que Raymundo Faoro nos ensinara.38 Formava-se no Brasil uma consciência a respeito da necessidade de superar os modelos de administração pública não baseados em uma concepção explícita e robusta da cidadania e do respeito ao Estado de Direito. No capítulo anterior vimos que as normas e preceitos da dominação racional-legal, conceituada por Max Weber, sempre estiveram em choque direto com a realidade brasileira. Em razão disso nem mesmo a administração pública de tipo burocrático, com foco em procedimentos de controle do funcionalismo, tivera condições de se impor histórica e predominantemente no Brasil.39 É nesse contexto que devemos introduzir um novo condicionante da adoção da Lei de Responsabilidade Fiscal, a saber o processo de reforma do Estado Brasileiro ao longo da década de 1990. Este condicionante seria de natureza interna, mas também, em certo sentido, de ordem externa. Indo mais longe no rastreamento das causas da reforma do setor público brasileiro pode-se dizer que a necessidade de se reformar o Estado surgiu das crises econômico-financeiras das décadas de 1970 e 1980, com elevada inflação, fraco crescimento da economia, pesada divida externa, graves problemas sociais, desigualdades de renda e marginalidade, corrupção e ineficiência do setor público etc. Ao mesmo tempo, o mundo experimentava grandes transformações. Façamos então uma breve descrição destas mudanças no cenário internacional que repercutiram no cenário interno brasileiro e latino-americano, tornando evidente a crise do Estado. Com as integrações econômicas européia (CEE) e americana (Mercosul, Nafta) ficaram impossibilitados projetos

37Figueiredo, Carlos Mauricio et. alii. Op. cit., pp. 220-221; PUTTOMATI, Giulia da Cunha Fernandes Os dois

anos de implementação da lei de responsabilidade fiscal no Brasil: avanços e desafios. Trabalho apresentado no VII Congresso Internacional do CLAD sobre a Reforma do Estado e da Administração Pública Disponível em: <http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/CLAD/clad0044115.pdf >. Acesso em 22.set.2007, pp. 3-5.

38FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. Rio de Janeiro: Globo, 1973.. pp. 204, 217-222, 251-260, 270.

39WEBER, Max. Os três tipos puros de dominação legítima, Op. Cit., pp. 128-141; Idem. Burocracia e Classe, estamento, partido. Op. Cit. pp. 211-228.

Page 15: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

15

e estratégias de desenvolvimento baseados em substituição de importações, como se fazia no Brasil e na América Latina desde os anos 50. Ao mesmo tempo, a queda dos regimes socialistas no Leste Europeu, o fim da própria União Soviética (1991), e, consequentemente, o aparecimento de um mundo unipolar regido pela hegemonia da superpotência norte-americana, levou a um estreitamento das perspectivas ideológicas e programáticas para os governos e partidos políticos em todo o mundo, encaminhando tanto países desenvolvidos quanto em desenvolvimento para reformas econômicas orientadas para o mercado, para o neoliberalismo. Paralelamente as inovações tecnológicas e organizacionais geradas pela Terceira Revolução Industrial (nanotecnologia, telecomunicações, microinformática, fibra ótica etc) e outros processos acarretaram uma crescente internacionalização dos mercados financeiros e de produção, reestruturação de empresas e intensificação dos laços de interdependência entre os países e as regiões40. Luiz Carlos Bresser Pereira, titular do Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado (MARE) durante o primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), define a crise do setor público brasileiro como uma “crise fiscal” do Estado. Em suas palavras,

O déficit público elevado e a poupança pública insuficiente, e até mesmo negativa,

são componentes de fluxo da crise fiscal, enquanto o tamanho da dívida pública – interna ou externa – é um componente de estoque. Na verdade, a falta de crédito público é a característica fundamental da crise fiscal do Estado. Um país pode ter um déficit público elevado e também uma divida pública elevada, sem que o Estado perca seu crédito e o governo sua credibilidade [...]. A perda de crédito pelo Estado – sua incapacidade de se financiar a não ser pela senhoriagem (emissão de moeda) – é a quintessência da crise fiscal. Quando a perda de crédito pelo Estado torna-se absoluta, ou, em outras palavras, quando a crise fiscal torna-se aguda ou descontrola, o Estado perde a capacidade de sustentar a sua moeda, e a hiperinflação será o resultado mais provável.41

Como se depreende facilmente do trecho citado, ainda não figura o combate à corrupção como um motivo mencionado explícita e sistematicamente na argumentação do governo para justificar a necessidade de se adotar uma legislação ou dispositivo jurídico que previna a irresponsabilidade fiscal e torne punível nos termos do código penal a malversação, as irregularidades e a gestão temerária de fundos públicos. Como vimos no Capítulo anterior, esta certeza de que não há direito nem norma positivados que previnam e imputem estes tipos de comportamentos anti-republicanos tem raízes de longa data, profundas, na sociedade. Ipso

facto, refletindo a acerca das conseqüências do desequilíbrio financeiro sobre a economia e a sociedade, o autor completa o seu raciocínio:

Quando a poupança pública é nula, o Estado, para investir terá apenas uma alternativa, financiar o investimento por meio do déficit público. Entretanto, se o objetivo é reduzir o déficit público – um componente inerente a qualquer programa que queira solucionar a crise fiscal -, o resultado provável será um corte nos investimentos públicos e, consequentemente, uma redução do crescimento econômico. Assim, com poupança pública nula, se o Estado investir,o seu endividamento aumentará e a disponibilidade de credito para financiá-lo diminuirá; se o déficit público for eliminado, o investimento será cortado. Se a poupança pública é negativa, o Estado terá um déficit mesmo se o investimento público for

40MATIAS-PEREIRA, José. Finanças Públicas: A política orçamentária no Brasil. 1ª. ed. São Paulo: Atlas,

1999; ALEXANDRINO e PAULO, Op. Cit., Cap. 13; MARE, Op. Cit. Sobre a crise da divida externa e suas repercussões nas finanças públicas do país consultamos principalmente: BRESSER-PEREIRA, Luiz C. Crise Econômica e Reforma do Estado no Brasil: Para uma nova interpretação da América Latina. 1a ed. São Paulo: Editora 34, 1996.

41BRESSER-PEREIRA, Luiz C. Crise Econômica e Reforma do Estado no Brasil: Para uma nova interpretação da América Latina. 1a ed. São Paulo: Editora 34, 1996, p. 43.

Page 16: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

16

nulo. O déficit financiará gastos correntes, que serão constituídos crescentemente por juros sobre os empréstimos. Nos dois casos, o Estado será paralisado, estará incapaz de formular e implementar políticas públicas e promover o crescimento. E essa paralisia decorrente da falta de poupança pública estará definindo a crise fiscal e levando a economia à estagnação.42

Não nos alongaremos muito nos pormenores e na fundamentação do diagnóstico do ministro e de seus assessores, mas reteremos para os propósitos deste paper o conceito de “crise fiscal do Estado” e sua aplicação à experiência brasileira dos últimos anos. Retomaremos em diversas ocasiões a mesma noção e suas repercussões em termos de estabilidade macroeconômica e credibilidade externa do país junto aos investidores dos mercados emergentes. Complementando a interpretação de Bresser-Pereira, Abrucio, descreve este processo da seguinte forma:

A busca pelo equilíbrio das contas públicas é recente no País. [...]. É bom lembrar que até a década de 90 a idéia de fazer déficit era vista como positiva por boa parte dos políticos e da população. Governar era fazer obras, e não importava se isso arrasaria as contas públicas. [...] [Isso] Está mudando. Foi se criando uma consciência maior na sociedade e nos políticos sobre a responsabilidade fiscal. E aí foram importantes as CPIs dos Precatórios e da Máfia dos Fiscais e todo o escândalo envolvendo o malufismo. Do fim da década de 90 para cá, o equilíbrio das contas públicas se tornou um bem público. A queda da inflação, em 1994, foi importante porque desnudou as contas públicas. E isso também coincidiu com a Lei Camata (institui limites para gasto com pessoal), que é de dezembro de 1994. Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, tudo isso se consolidou. 43 (Grifo nosso)

O autor resume, como se depreende da passagem supra, alguns dos condicionantes internos da adoção da LRF sobre os quais já discorremos anteriormente. Mais que isto relaciona o problema do endividamento público e da irresponsabilidade fiscal à consciência dos governantes do país, à sua maneira anti-republicana e anti-jurídica de gerir os negócios da coletividade. Até aqui vimos que os argumentos para a reforma administrativa e fiscal seriam principalmente de ordem econômico-financeira não ainda de ordem ético-moral, ou, o que é seu coroamento lógico, de ordem político-jurídica, como se verá no Capítulo III. De todo modo, as avaliações de Abrucio e Bresser-Pereira são consistentes com as de Weber e Faoro que discutimos supra. Ambos chamam atenção para a mitigação fática das normas, práticas e disposições que consubstanciam a vigência de facto de um Estado de Direito no Brasil e a indefinição do modelo de dominação política (ora racional-legal ora tradicional-patrimonialista) que se acha em funcionamento. Mas há ainda importantes questões que ficaram por ser adequadamente respondidas. Por quê a predação da res púbblica deveria ser tipificada como crime punível nos termos da lei? Em outras palavras e nos distanciando do linguajar do vulgo: Por quê referir o novo diploma legal ao Código Penal Brasileiro e não somente à Lei Maior e ao Código Tributário Nacional? De que modo os legisladores brasileiros chegaram à formula legal adequada à realização deste objetivo social? Na busca por essas respostas este tópico busca elucidar as necessidades e os imperativos que levaram os governantes a adotar a LRF. Desvenda-se assim o sentido e as implicações da inovação legal, o modo como esta vem para combater as práticas corruptas inscritas em nossa cultura política, criminalizá-las e prover

42Idem, p. 45. 43ABRUCIO, Fernando. Lei Fiscal não é tudo ou nada, diz especialista. Entrevista. O Estado de S. Paulo, 27. Jul.

2004. Disponível em: <http://clipping.planejamento.gov.br /Noticias.asp?NOTCod=139466>. Acesso em: 20.Out.2007.

Page 17: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

17

meios e dispositivos para sua punição antes não contidos em outros diplomas legais como as Leis de no. 4.320/64, 5172/66 (Código Tributário Nacional) e diplomas normativos subseqüentes e a própria Constituição Federal de 1988 (Art. 165 e ss). Se entendermos “criminalização” de práticas sociais e políticas como sua tipificação nos termos do Código Penal Brasileiro e a imputação dos infratores com referencia explicita aos artigos deste vemos que a inovação jurídica representada pela LRF foi de grande monta, como nos informam competentes operadores e interpretes do Direito44. Daí que, na transição da norma ao fato – algo muito complicado no Brasil -, o Estado Democrático de Direito tenha muito a ganhar, como aludimos anteriormente mas isto não pode ser visto como garantia segura de que a interpretação correta da LRF vá prevalecer ao longo do tempo, como adverte Ives Gandra da Silva Martins. Na perspectiva deste autor, como veremos na seção seguinte, se é verdadeiro que a LRF vem suprir a falta de uma regulamentação infraconstitucional severa para implementar os comandos da CF/88, então cumpre ao interprete e ao operador do Direito afastar exegeses e interpretações convenientes de seu texto que desnaturariam o seu espírito45. Por isso, como se verá ao longo do presente capítulo ficarão bastante claras e explicitas também as resistências, complicadores e imbróglios que legisladores, operadores e interpretes do Direito (juristas, promotores, magistrados, jurisconsultos, doutrinadores etc.) terão que enfrentar para provar que os “amigos do rei” são, via de regra, “inimigos da lei”, passíveis de condenação e punição nos termos da lei. Segundo Figueiredo, em nível das situações fáticas, as origens da LRF podem ser traçadas em um plano histórico que resulta tanto de fatores internos (como os elencados supra) quanto externos46. Apoiando-nos em Edson Ronaldo Nascimento e Ilvo Debus (2002), consultores da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), agora apresentaremos em ordem cronológica os determinantes externos47. Em primeiro lugar, destacam os autores o Tratado de Maastricht (1993), diploma legal desenhado para regular a integração da Europa. O mesmo estipulava uma série de requisitos para os países da então Comunidade Econômica Européia (CEE, depois União Européia, EU) que desejassem aderir à Zona do Euro, isto é ao espaço econômico-financeiro da moeda única. Para os propósitos deste paper não nos deteremos muito nos pormenores deste dispositivo jurídico, somente na intenção dos seus formuladores ao estipular as condições de adesão, qual seja a de induzir os países-membros daquele bloco econômico ao equilíbrio e à disciplina fiscal sem a qual não podem coordenar suas políticas monetárias (taxas de juros e câmbio) de modo a harmonizá-las. Já o diploma normativo neozelandês de 1994 (Fiscal Responsibility Act) oferece na redação de seus artigos as seguintes características que destoam das premissas e das prescrições contidas no Tratado de Maastricht, embora reiterem o conceito de responsabilização legal do gestor público em sentido rigoroso. Isto tem uma explicação. Por tratar-se 44CRUZ, Flávio da (Coord.), Lei de responsabilidade fiscal comentada: a lei complementar n 101, de 4 de maio

de 2000. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, pp. 234-257; PELICIOLI, Angela Cristina. Comentários aos tipos penais previstos na lei dos crimes de responsabilidade fiscal. São Paulo: LTR, 2001, pp. 12, 15-33, 53-54; LIMA, Manuel Messias Pereira e LIMA, Ana Luiza Pereira. A lei de responsabilidade fiscal: prática e teoria. Rio de Janeiro: Forense, 2002; Mileski, Helio Saul. O Controle da gestão Pública. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, pp. 14-15, 152-156.

45MARTINS, Ives Gandra da S. Prefácio. In: MARTINS, Ives Gandra da S. e NASCIMENTO, Carlos Valder. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001, pp. xxxi-xxxii.

46Figueiredo, Carlos Mauricio et al. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ª edição, revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, pp. 16-25. Ressaltamos, contudo, que estes autores seguem uma abordagem mais centrada nos condicionantes externos.

47PUTTOMATI, Giulia da Cunha Fernandes. Op. Cit., p. 5; NASCIMENTO, Edson Ronaldo & DEBUS, Ilvo. Entendendo a Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ª ed. atualiz. Disponível em: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br/hp/downloads/EntendendoLRF.pdf> Acesso em: 18.Out.2007, pp. 6-7

Page 18: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

18

constitucionalmente de um Estado unitário e parlamentarista, na Nova Zelândia não tem vigência (ou prioridade) a definição de critérios para verificação da sustentação financeira da cada governo, como em uma confederação, tal qual preconizado na norma européia. Por outro lado, o Poder Legislativo define princípios e exige forte transparência do Executivo, que tem a liberdade para orçar e gastar. Portanto não há Estados-membros conduzindo suas políticas com relativa independência, convergindo para critérios acordados, e, além disso, assumindo o dever de evitar déficits excessivos. Em seguida a ambos, bem como sintetizando seu espírito e sua letra, o documento do FMI, Código de Boas Praticas para Transparência Fiscal, traz como seus principais aspectos, a melhor definição e divulgação ao público das funções de política e administrativas, informando sobre as atividades fiscais passadas, presentes e programadas. Isto traduz os princípios da transparência e do controle dos atos administrativos e das políticas públicas, como prioridade a ser buscada. Em segundo lugar, a documentação orçamentária deve especificar objetivos da política fiscal, estrutura macroeconômica, políticas orçamentárias e riscos fiscais. Por fim, as informações orçamentárias devem facilitar sua análise; as contas fiscais devem ser apresentadas periodicamente ao Legislativo e ao público. Ou seja, estes dois critérios traduzem a necessidade de ser incorporar respectivamente noções claras de planejamento e de publicidade, prestação das contas, relatórios fiscais Dentre os diplomas normativos de que se tem conhecimento na literatura há um forte consenso entre os especialistas em Direito Tributário e Financeiro de que este último inspira explicita e reconhecidamente a letra e o espírito do texto da LRF brasileira.48 Vale ressaltar que a legislação brasileira recebeu a influência também de outros modelos de responsabilidade fiscal, além dos de origem anglo-saxonicos e europeus supra-citados. Londero e colaboradores destacam que é anterior a todos aqueles o modelo vindo dos Estados Unidos, a Lei Gramm-Rudman-Holings (1985), instituindo os mecanismos de "sequestration", isto é, de corte automático (que teve recepção nas metas fiscais das LDO’s brasileiras) e de "pay-as-you-go", ou seja, de controle das despesas obrigatórias de caráter continuado, sendo este ultimo definido como “a própria essência da LRF”. A neozelandesa Fiscal Responsability

Act (1994), considerada o modelo de transparência fiscal para o FMI em seu Código de Conduta, entretanto, teria alcançado uma maior difusão ao sintetizar aqueles princípios norteadores. Os mesmo autores assinalam que o Brasil, ao contrário do que fora propalado pelo governo na mídia, não foi pioneiro nesta iniciativa de engendrar normas de responsabilidade fiscal e transparência na gestão pública. Citam no contexto latino-americano a Ley de Responsabilidad Fiscal adotada pela Argentina (Lei Nº. 255.152/99) e a Ley de

Prudência e Transparência Fiscal aprovada no Peru (Lei Nº. 272.458/1999).49

48Dada a complexidade do problema de pesquisa que temos em mãos, recorremos a diversas fontes para redigir

este capítulo. Especificamente sobre este ponto, das influencias externas e internas na concepção da LRF: Figueiredo, Carlos Mauricio et. alii, Op. Cit. p. 15-25; MOTTA, Carlos Pinto Coelho da, SANTANNA, Jair Eduardo, FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby e ALVES, Léo da Silva. Responsabilidade Fiscal: Lei Complementar 101, de 04/05/2000. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, pp. 22-25; NASCIMENTO, Edson Ronaldo & DEBUS, Ilvo. Op. Cit; SADDY, André. Lei de responsabilidade fiscal e democratização da gestão pública. Disponível:< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4006>. Acesso em: 26.Set.2007; LONDERO, Daiane et. alii. Op. Cit.; FERNANDES, Cândido Luiz de Lima e BICALHO, Ronaldo Goulart. Unificação européia: os limites do possível. Nova Economia, Belo Horizonte: UFMG, 1994 N. 1, p. 207; GREGGIANIN, Eugenio. O Programa de Estabilidade Fiscal e o papel do Congresso Nacional. Cadernos ASLEGIS/ Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. Vol. 1, Brasília: ASLEGIS, 1997, pp. 48-51; MATIAS-PEREIRA, José. Op. Cit.

49LONDERO, Daiane; MARCHIORI NETO, Daniel Lena & VELOSO, Gilberto de Oliveira. A lei de responsabilidade fiscal nos municípios do Rio Grande do Sul: um estudo jurídico-econômico. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/ texto.asp?id=8235>. Acesso em: 27 set. 2007.

Page 19: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

19

Deixemos de lado por um momento essa discussão e passemos agora ao exame dos determinantes internos da adoção da LRF. No caso brasileiro o contexto desta inovação legal era diferente. 2.2. Argumentos, Concepção e Ratificação: Debates e Expectativas no Executivo Greggianin assinala que a adoção de um especifico instrumento legal para conter gastos do setor público deveria ser feita o quanto antes se o Brasil desejava obter credibilidade junto aos investidores externos e ao FMI. O controle rigoroso de receitas e despesas, aumentando as primeiras e reduzindo as segundas, seria uma sinalização relevante aos mercados financeiros globalizados para afastar temores e preocupações com o estado de e externa da economia brasileira50. A manutenção do acordo, que o governo Fernando Henrique fora obrigado a fazer com o FMI no início do segundo mandato presidencial (1999/2002), dá a tônica da manifestação deste especialista e daqueles que se seguiram a ele, como veremos logo abaixo. Se torna cada vez mais clara e regular a identificação do patrimonialismo com corrupção e desta (negativamente falando) com fórmulas e diplomas legais contrários à irresponsabilidade fiscal e ao desvirtuamento da coisa pública. A fim de mapear o que seria a interpretação ou posicionamento do governo acerca da necessidade de se introduzir conceitos de responsabilidade na gestão fiscal recorremos a pronunciamentos, declarações, entrevistas, artigos na imprensa da época, documentos oficiais etc. de ministros de Estado e ocupantes de cargos de primeiro e segundo escalão do Governo Federal antes, durante e depois do período de tramitação do Projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal (PLRF)51. Pedro Malan, então Ministro de Estado da Fazenda, respondendo à pergunta de um jornalista em programa televisivo registrou seu ponto de vista acerca da aprovação da LRF nos seguintes termos:

50GREGGIANIN, Eugenio. Op. Cit., pp. 30-32. Para comentários do mesmo ponto em cotejo com os

dispositivos da LRF especificamente desenhados para os objetivos fiscais em tela (LC 101/00, Cap. IV, Art. 17) e com o próprio Programa de Estabilidade Fiscal lançado pelo governo, ver: CRUZ, Flávio da (Coord.), Op. Cit. pp. 64-74, 204-219.. A posição oficial do governo a esse respeito parece achar-se sintetizada em: PARENTE, Pedro, MALAN, Pedro e ORNELLAS, Waldeck. Exposição de Motivos dos Ministros ao Presidente Fernando Henrique Cardoso. In: MARTINS, Ives Gandra da S. e NASCIMENTO, Carlos Valder. Op. Cit., pp. 1-8.

51VELTEN, Simone Reinholz. A Participação Popular no Processo de Planejamento, Execução e Fiscalização do Cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal: Estudo de Caso com as Prefeituras e Câmaras Municipais do Estado do Espírito Santo. Brasília: ESAF, 2005. Monografia não premiada apresentada no X Prêmio Tesouro Nacional 2005: Lei de Responsabilidade Fiscal. Domingos Martins/ES. Disponível em: < http://www.tesouro.fazenda.gov.br/Premio_TN/xPremio/catalogo2_xpremio.htm#VELTEN27>, pp.33-34. Os documentos oficiais a respeito dos processos administrativos e legislativos concernentes à elaboração e aprovação da LRF acham-se nas seguintes fontes: BRASIL. Ministério do Planejamento e Orçamento. Consulta Pública nº. 1, de 7.Dez.1998. Apresentação do Anteprojeto do Regime de Gestão Fiscal Responsável. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/plc/PLC_APRES.HTM>; TAVARES, Martus. Discurso proferido na cerimônia de Sanção da Lei de Responsabilidade Fiscal, no Palácio do Planalto. Brasília, 04.05.2000. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/lrf/conteudo/publicacoes/DISCURSO.HTM>. Lei Fiscal é Aprovada no Senado. 12. Abr. 2000. Disponível em: < http://www.planejamento.gov.br/lrf/conteudo/lrf_midia/lei_fiscal_aprovada4-00.htm>; Cronologia da Aprovação da LRF. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/lrf/conteudo/fatos_importantes/fatos_importantes.htm>; E-CAMARA. Consulta Tramitação das Proposições: PLC 18/1999 (Anteprojeto da LRF). Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/fiquePorDentro/Temasatuais/orcamento_uniao/legislacaofederal.html>; PARENTE acredita que LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL será decisiva para a Mudança do Regime Fiscal brasileiro. Disponível em: < http://www.planejamento.gov.br/orcamento/conteudo/noticias/parente_acredita.htm>.

Page 20: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

20

[...] Eu vejo mesmo neste contexto atual, [...], o fato é o seguinte: o Congresso tem se movido. Foi aprovada a Lei Camata, na questão da administração pública; teve um fato muito importante no Senado, na semana passada, o senado aprovou o projeto do senador, ministro José Serra, sobre a regulamentação, depois de uma desconstitucionalização do art. 192, que é o que vai nos permitir caminhar com muita rapidez agora nas legislações. [...]. Nós estamos perante o Congresso com a Lei de Responsabilidade Fiscal, à qual atribuímos uma enorme importância, que deve ser votada com a rapidez que nós esperamos à luz dos contatos que temos tido com o Congresso, vamos avançar na continuidade da discussão sobre a reforma da previdência, e é fundamental aqui que nós nos empenhemos, só acho que não será possível aprová-la ainda este ano, na reforma tributária, por que o que temos aqui é um caos, que é incompatível com o Brasil que nós gostaríamos de ter no século XXI, do ponto de vista tributário. Eu acho que estão caminhando.52 (Grifo nosso)

Aludia o ministro ao andamento das reformas institucionais em principio do segundo governo Fernando Henrique, e à demora (que se estenderia por ainda doze meses no caso da LRF) até sua aprovação final pelos legisladores. Esta visão nos parece relevante pois nos dá uma medida da idéia de como no Brasil se crê que as mudanças fundamentais da sociedade devem passar necessariamente pelo processo legislativo, como aludido na citação abaixo. Mudanças legais estas cuja eficácia e legitimidade é colocada em dúvida pelos questionamentos doutrinários e jurisprudenciais veiculados no capítulo subseqüente.

[...] Além de acolher a expectativa constitucional, [a LRF] desempenha um outro papel igualmente significativo no contexto brasileiro, qual seja, de institucionalizar o ajuste fiscal. [...] Por outro lado, a motivação da LRF transcende ao universo jurídico. Os resultados [...] embora satisfatórios sob o ponto de vista do fulcro da Lei, denotam – infelizmente – uma falha estrutural da sociedade brasileira: a necessidade quase orgânica do processo legislativo. Em outras palavras, os princípios da moralidade administrativa e da gestão responsável e eficiente dos recursos públicos deveriam estar difundidos no inconsciente de todos os administradores, não necessitando de previsão legal. Contudo, o alto índice de corrupção e a desconfiança generalizados exigem justamente o contrário.53 (Grifo nosso)

Outro ponto de vista relevante seria o do então ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), economista Martus Tavares. Isto se explica pelo fato de que o mesmo fora secretário-executivo do próprio MPOG (1996-99) na gestão de Paulo Paiva, quando o PLRF foi enviado ao Congresso.

Queixas e reclamações. É o que tenho ouvido, de alguns prefeitos recém-empossados, contra os rigores da LRF. Mas não me lembro de nenhum deles fazendo campanha eleitoral com base na irresponsabilidade. Como podem agora, depois de eleitos, fazer coro à mudança na lei sancionada em 4 de maio passado? As críticas oscilam entre a falta de informação e a desinformação, tais como: ‘a lei é o símbolo da ideologia neoliberal imposta pelo FMI; é parte de uma política arbitrária do governo federal que rompe com o pacto federativo; a LRF é draconiana para os municípios, não dá prazo para os municípios se adaptarem; engessa investimentos nas áreas sociais porque impõe limites muito rígidos para dívida e pessoal; compromete a gestão atual em função da atitude irresponsável do antecessor’.

52MALAN, Pedro S. Transcrição da entrevista do ministro da Fazenda ao jornalista Bóris Casoy, no programa

Passando a Limpo da TV Record. 16.maio.1999. Disponível em: <http://www.fazenda.gov.br /portugues/documentos/ 1999/P990516.asp>. Acesso em: 21.Set.2007.

53LONDERO, Daiane et al. Op. Cit. nota de rodapé n. 6.

Page 21: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

21

Desde que cheguei ao governo federal, há 15 anos, ouço o seguinte argumento: ‘a dívida quem fez foi meu antecessor. Não é minha. Sou a favor de ajuste fiscal e, se precisar, eu corto. Mas é necessária uma carência’. Na hora de discutir a tal carência, sempre observei que o prazo pretendido era grande o bastante para o cumprimento do ajuste recair no mandato do próximo governante. 54 (Grifos do Autor)

Fazendo eco direto às analises e diagnósticos de autores já citados, como Abrucio e Bresser-Pereira, Tavares atribui as resistências à aplicação do novo diploma normativo ao que chama de “cultura da irresponsabilidade”. Como visto anteriormente, a corrupção política e o endividamento público estão intrinsecamente ligados e na linguagem sociológica o conceito para tipificar essa relação e suas implicações para a sociedade é o de patrimonialismo. Aos que qualifica como partidários desta maneira degenerada de gerir a coisa pública como se fosse privada responde que tais praticas e condutas não são mais toleráveis nos termos da então recém-aprovada Lei Complementar de nº 101/00:

A cultura da irresponsabilidade é tão forte que frequentemente se ouve dizer sobre o prefeito que assume: "coitado, vai pegar a prefeitura falida. Vai gastar dois anos só para arrumar a casa". Na realidade, coitados são os contribuintes que vão pagar as dívidas e esperar dois anos para ter melhores serviços. [...] Outro argumento utilizado pelos críticos da lei é o de que o antecessor irresponsável inviabiliza a gestão seguinte. Esquecem que o Congresso aprovou disposições muito mais rígidas para os últimos meses de mandato, em particular as vedações para fazer dívida de curto prazo – caríssimas-, ampliar a despesa de pessoal e inscrever restos a pagar em montante superior ao caixa transferido para o próximo exercício55. Como se observa, os argumentos utilizados pelos opositores não estão fundamentados no texto da lei nem na realidade da grande maioria dos municípios. Infelizmente, para alguns prefeitos, a raiz dos problemas financeiros dos municípios está no não-exercício de sua competência tributária, nos excessivos gastos com pessoal e na qualidade da gestão dos recursos arrecadados. 56 (Grifo nosso)

Ao mesmo tempo, nota-se que o então ministro identifica uma falha da administração municipal decorrente da não-implementação de dispositivos constitucionais que lhe facultam aumentar suas próprias receitas mediante a instituição de impostos, institucionalizando a descentralização fiscal e a maior autonomia dos governos estaduais57. Consoante com o exposto, certos interpretes do Direito como Daiane Londero assinalam que a “[...] principal dificuldade introduzida pela nova Carta foi o aumento das transferências de impostos para as demais unidades da federação, sem que fossem repassados os demais encargos da responsabilidade fiscal, causando o desequilíbrio orçamentário”.58 Prossegue no arrazoado do titular do MPOG temos a avaliação de que

O momento é outro. Hoje, a sociedade exige que seus governantes não gastem mais do que arrecadam porque sabe que quem irá pagar é a geração futura. Cada vez mais entende que o governo não fabrica dinheiro [...]. O êxito com a estabilização não se tornará permanente sem a disciplina fiscal continuada. Assim como vencemos a cultura da indexação, estamos vencendo a cultura da irresponsabilidade fiscal. [...]. A LRF não é resultado da pressão do FMI ou de interesses arbitrários do governo federal. Igualmente, não fere nenhum princípio federativo, a menos que se entenda por pacto federativo a obrigação da União de socorrer financeiramente os entes federados. Por

54TAVARES, Martus. Fazendo o dever com responsabilidade. Folha de S. Paulo, 11/01/2001, p. A3. 55Ver sobretudo os: Arts. 155 e 156 da Constituição Federal de 5.out.1988. 56TAVARES, Martus. Op. Cit. 57Ver: LC Nº. 101/2001 (LRF), Art. 38, IV, alínea “b”. 58LONDERO, Daiane et alii. Op. Cit.

Page 22: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

22

outro lado, cada governante vai se comprometer e prestar contas sobre metas fiscais para seu Legislativo. Os limites de pessoal e de dívida estão fixados em lei federal e em resolução do Senado simplesmente porque a Constituição assim definiu. O governo central nada pode impor aos entes federados por conta da LRF. 59 (Grifo nosso)

Vemos que ao mesmo tempo em que rebate acusações de inconstitucionalidade, formuladas tanto por partidos políticos de oposição como por influentes membros de nossa comunidade de intérpretes e operadores do Direito (cujos argumentos veremos no Capítulo III), o autor também repele as acusações de que o Executivo agira sob pressões das agencias internacionais de financiamento. Rebate críticas inclusive que acusam o governo de irresponsabilidade ou insensibilidade no campo social:

Quanto ao rótulo de draconiana e à questão da carência para sua implantação, é necessário esclarecer o seguinte: a LRF prevê uma carência de cinco anos para os municípios com menos de 50 mil habitantes, o que significa 95% dos municípios brasileiros. Estão previstos prazos para todos, sem exceção, se adaptarem aos limites de despesas de pessoal e de dívida. 60[...] O estabelecimento de limites para pessoal, ao contrário do que estão dizendo, favorece a expansão dos investimentos sociais, pois impede um comprometimento elevado de receita para pagar servidores. A aplicação da emenda constitucional nº 25, que limita os salários dos vereadores e os gastos das Câmaras, também produzirá economias importantes, e o limite de dívida ainda será fixado por resolução do Senado. 61 (Grifo nosso)

Escrevendo em coautoria com José Roberto Rodrigues Afonso, o seu ponto de vista rebate diversas propostas de alteração ou abrandamento na lei veiculadas por diversos prefeitos então iniciando seus mandatos eletivos. Comentando as críticas aos artigos da LRF que supostamente enrijecem as exigências paras transferências do Fundo de Participação dos Municípios (FPM)62 os dois autores respondem nos seguintes termos:

A Lei de Responsabilidade Fiscal não criou e nem alterou os critérios de rateio do FPM, muito menos o governo federal tem algo a ver com a forma como a receita, fixada constitucionalmente, é dividida entre as cidades. [...] Em alguns aspectos, onde podia, a LRF é até mais flexível do que a regra vigente anteriormente. Os governos ganharam mais prazo para reduzir suas despesas com pessoal. Pela Lei Camata, teriam que concluir o ajuste até maio de 200163. Agora, podem fazê-lo até dezembro de 2002. Como parte da regulamentação da LRF, o Senado Federal examina uma proposta que aumenta o limite da dívida municipal de

59TAVARES, Martus. Op. Cit. 60LC Nº. 101/2001 (LRF), Art. 63. 61TAVARES, Martus. Op. Cit. 62LC Nº. 101/2001 (LRF), Arts. 23, § 3º e 51, § 2º. 63 LC nº. 82, 27.mar.1995 (Lei Camata I), Arts. 1º, § 1º e LC nº. 96, 31.maio.1999 (Lei Camata II). AJUSTES à

Lei Camata não devem provocar demissões. Disponível em: <http://www1.an.com.br/1999/fev/18/0pot.htm>; PROJETO prorroga prazo da Lei Camata. Diponível em: <http://www.senado.gov.br/secs_inter/noticias/senamidia/historico/1999/5/ zn051213. htm>; TAVES, Rodrigo França. Demissões devem ser a última opção. Disponível em: <http://www.senado. gov.br/secs_inter/noticias/senamidia/historico/1998/10/zn102927.htm>; Franco, Gustavo H. B. Fundos de pensão estaduais: armadilhas a evitar. 24.ago.1999. Disponível:<http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos /imprensa/oglb990824.asp>; FRANCO, Gustavo H. B. Um mínimo de racionalidade. O Estado de S. Paulo, 20.fev.2000. Disponível:< http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a51.htm>; Citadini, Antonio R. Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Os Municípios e a Crise. Semanário O Prefeito, Ano II, Nº. 75, 15.Out.1998, pp. 10-11. Disponível em:<http://www.citadini.com.br/artigos/pref75.htm>.

Page 23: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

23

1 para 1,2 vezes a receita corrente e altera o prazo de enquadramento de 2.008 para 2.016. [...] Eles terão prazo de até cinco anos para se enquadrarem inteiramente às exigências burocráticas da LRF. [...] Alguns prefeitos querem ajuda financeira do governo federal para se enquadrar na lei. É bom então lembrar que os repasses da União para municípios vem crescendo brutalmente nos últimos anos e não estamos falando aqui apenas de transferências constitucionais. As transferências voluntárias cresceram 133%, em termos reais, durante o governo Fernando Henrique Cardoso. [...] O total das dívidas estaduais e municipais refinanciadas pelo Tesouro chega a R$ 220 bilhões. [...]64 (Grifo nosso)

Tavares e Afonso reagem também às acusações doutrinárias de que a LRF violaria cláusulas pétreas da Constituição Federal, que estabelecem o federalismo como a forma irrevogável de organização estatal do país. Concluem os autores fazendo referencia ao exposto anteriormente nos seguintes termos:

Isso tudo [transferências e renegociação de dívidas] tem um custo e está sendo pago por todos os brasileiros, inclusive dos Estados ou cidades que foram bem administrados e nada ou pouco precisaram se refinanciar junto a União. Tudo para beneficiar alguns poucos governos que no passado, gastavam mais do que arrecadavam e quanto mais ineficientes eram no trato do dinheiro público, mais beneficiados foram pelas rolagens de dívidas. [...] Tinha que ser posto um ponto final nesse ciclo perverso. A LRF impôs um basta a esse modelo: nunca mais um governo deve financiar ou refinanciar dívidas de outros governos, transferir recursos sem compromissos, premiar os ineficientes. Assim, poderemos ser uma federação autêntica, em que cada governo cabe dentro de seu território e as ações de cada governante cabem dentro de seu mandato. Cada comunidade deve ser premiada ou pagar a conta pelos acertos ou erros dos governantes que elegeu. Logo, em alguns governos, o ajuste será mais doloroso, exigirá mais impostos e/ou menos gastos, mas é o preço que hoje se paga pelos desacertos do passado, com que nada têm a ver os habitantes das outras cidades ou estados. Mais do que cumprir uma lei, há que se mudar uma cultura fiscal. E não faltam lições a se extrair dos próprios Estados e Municípios. [...]65 (Grifo nosso)

Gustavo Franco, foi bem menos otimista em sua avaliação do conteúdo e da forma que assumiu o PLRF após sua tramitação no Congresso Nacional. Para tanto destaca a expectativa e o propósito originais do Governo Federal e de suas diversas vertentes ao elaborar o anteprojeto que seria depois remetido à Câmara e ao Senado.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) era para ser uma revolução. Seria a ‘mudança no regime fiscal’ capaz de reverter algumas décadas de negligência e de deterioração nas instituições e práticas ligadas à política fiscal. Com esta revolução seríamos também capazes de tornar possível e sustentável a estabilidade da moeda. Alguns dos membros da equipe original do [Plano] Real tinham convicção que esta lei devia ser o nosso primeiro esforço (depois de aprovado o Fundo Social de Emergência em 1994), pois, afinal, era o coração do problema. A nossa Constituição previa, de fato, uma Lei Complementar de Finanças Públicas [...], e enquanto isso não fosse feito, permanecia em vigor, ‘recepcionada’ como lei complementar, a Lei 4320/64, obsoleta e amistosa ao processo inflacionário. Mas outros membros da equipe achavam que o esforço era prematuro, e que tantos eram os ‘esqueletos’, ‘ralos’ e ‘bombas-relógio’, tanto na União, quanto nos

64TAVARES, Martus & AFONSO, José Roberto R. Por quê dizer não à irresponsabilidade. Folha de S. Paulo,

18.mar.2001, p. A2. Disponível em: <http://www.mp.gov.br/lrf/conteudo/lrf_midia /artigo _porque_dizer_nao.htm>. Acesso em: 21.Set.2007.

65TAVARES, Martus & AFONSO, José Roberto R. Por quê dizer não à irresponsabilidade. Op. Cit.

Page 24: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

24

Estados e municípios, e todos ‘anteriores’ à feitura do orçamento, que de nada adiantaria uma lei de orçamento equilibrado, quando as finanças públicas eram constitucionalmente desequilibradas. Uma Lei de Finanças Públicas de verdade era, naquele momento, inviável, ou condenada a ‘não pegar’. Um problema que ainda está vivo. 66 (Grifos do autor)

E prossegue, focalizando mais especificamente o modo como os legisladores infraconstitucionais processaram as idéias e os conceitos de transparência, controle e publicidade que o Executivo supostamente pretendeu incorporar ao processo legislativo do Direito Financeiro brasileiro.

[...] O projeto original passou por uma longa reflexão e por um produtivo processo de discussão em audiência pública, que produziu uma peça de 110 artigos e 500 dispositivos. O relator [na Câmara], desancando o FMI e identificando ofensas ao Pacto Federativo e a Independência dos Poderes, ‘resumiu’ o projeto original em 77 artigos assim retirando-lhe boa parte do seu espírito e algumas de suas melhores passagens. Por isso mesmo devemos ter clareza que não será a revolução [fiscal] com que temos sonhado e nem me parece que mereça o pomposo título que acabou mantendo. Mas é um progresso e um bom começo. Sua repercussão tem sido espetacular, mas infelizmente, desproporcional ao conteúdo. Poderíamos ter ido muito mais longe, ou resistido mais ao ‘resumo’ do relator, se soubéssemos que a reação da opinião pública ia ser tão boa. Com efeito, a idéia de Princípios de Responsabilidade que devem ser obedecidos pelos 27 Estados e seis mil e tantos municípios terminou dando uma abrangência ao problema do ajuste fiscal que jamais se conseguiu. Foi sempre um problema da União, que os outros entes federados fingiam s que não lhes dizia respeito. Com a LRF o problema passa a ser de todos.

67 (Grifo nosso)

Nota-se que ao longo de sua intervenção reitera o ex-presidente do Banco Central certos aspectos do discurso do ministro Malan, acrescentando, porém em tom mais agressivo, as acusações contra os “inimigos” da Lei Complementar de nº 101/00.

Mas afinal o que tem dentro dessa nova lei? Tem enormes avanços em transparência, e muitos progressos que estão em diversos detalhes importantes da confecção e execução orçamentária, e que foram amadurecendo com o tempo, com a prática e em normas de hierarquia menor. Essa lei tem muito da Lei Camata, que sempre padeceu de um mecanismo de sanção para o desenquadramento, e da Resolução 78, do Senado Federal68, que limitava o endividamento público.69 (Grifo nosso)

Apesar disso, convém registrar também que certos aspectos do discurso do presidente do Banco Central corroboram as analises de Tavares e Afonso, bem como de outros especialistas (interpretes e operadores do Direito inclusive) e políticos, acerca das dificuldades quase intransponíveis a serem enfrentadas pelos agentes públicos na transição para um regime fiscal efetivamente transparente e responsável. O que transparece nas entrelinhas de suas intervenções Estes transformaram-se automaticamente em “inimigos da Lei”, por força de disposições da Lei Complementar de nº. 101/00, elaboradas de modo mais ou menos irrefletido e acrítico da parte dos legisladores.

66FRANCO, Gustavo H. B. A revolução fiscal apenas começou. O Estado de S. Paulo e Jornal do Brasil,

13.02.2000. Disponível: < http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a50.htm >. Acesso em: 21.Set.2007. 67FRANCO, Gustavo H. B. Op. Cit. 68Res. SF Nº.78/1998, Art. 39, I, LC Nº. 101/2001 (LRF), Art. 29. 69FRANCO, Gustavo H. B. Op. Cit.

Page 25: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

25

Mas a despeito de tudo isso a LRF é um extraordinário progresso, principalmente pela mobilização que está provocando. Isso me faz otimista quanto à continuidade do processo, ou seja, que novas leis venham a suprir as lacunas da LRF. Deve-se reconhecer, com todo pragmatismo, que o ‘resumo’ ou o enfraquecimento dos dispositivos do projeto original nada tem de acidental: assinala os limites do possível tendo em vista a precária situação dos Estados e municípios. É tristemente verdadeira a alegação que muitos entes federativos terão enormes dificuldades de se adaptar aos novos cânones, e se as dificuldades forem intransponíveis, isto não será bom para a LRF e para o processo de ajuste fiscal. A tendência seria, nesse cenário pessimista, de a LRF ‘não pegar’, o que será péssimo. Por isso a União deve ajudar no enquadramento, onde houver ‘esqueletos’ e ‘ralos’ que se possa resolver com uma divisão de sacrifícios que faça sentido. Como no caso dos bancos estaduais. Pode custar algum dinheiro para fechar um ‘ralo’ de uma vez por todas. Mas faz todo sentido para o ajuste fiscal.70 (Grifo nosso)

As ponderações e ressalvas introduzidas pelos agentes do Poder Executivo tem razões de ser bastante claras e insofismáveis. Trata-se do reconhecimento de sua co-responsabilidade no desempenho fiscal e financeiro observado na década de 1990, que resulta de maneira bastante clara e objetiva, das medidas de política macroeconômica praticadas à risca pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central, segundo exigências e recomendações do FMI e de outras agencias internacionais de financiamento. Isto, a nosso ver, torna o quadro da problemática jurídica bem mais complexo, relativiza bastante as interpretações que conferem às condutas patrimonialistas, irresponsáveis e corruptas a “culpa” pelo endividamento do setor público brasileiro. Fazendo eco às avaliações de especialistas como Fernando Abrucio, Ernesto Lozardo, professor de Economia da FGV-EAESP, destaca que a “crise fiscal” do Estado brasileiro decorre de uma interação mais complexa de fatores que meramente a falta de leis ou de costumes adequados à vida republicana normal de uma sociedade civilizada.

Nunca estivemos diante de tantas más notícias sobre escândalos fiscais e orçamentários de alguns Estados e prefeituras como nos últimos dois anos. [...] Isso deve-se às duas faces da mesma moeda da gestão pública: em uma, a falta de caráter de muitos dos nossos políticos, e na outra, a inexistência de leis que norteiem as gestões orçamentária e fiscal das entidades públicas. Por conta dessa moeda sem lastro e responsabilidades sociais, as dívidas do setor público cresceram em uma velocidade assustadora, em parte devido à exorbitância dos juros como a única política econômica para controlar preços, mas, também pelo fato de que, ao longo dos últimos anos, os Estados e as prefeituras pouco ou nada fizeram para reduzir gastos com pessoal [...]. A imprudência fiscal de vários governadores das gestões anteriores limitou a zero a capacidade de investimento dos seus estados. [...] [...] Uma das parcelas que mais influenciou o rápido crescimento da dívida líquida do setor público, que representa a dívida global do setor, foi o endividamento dos Estados, municípios e das estatais. Essa dívida representou 40% do endividamento global, no ano passado. Mas o fato relevante é que a dívida líquida global passou de 28% do PIB, em1996, para 41% do PIB, no final do ano passado, podendo atingir 46% do PIB nos próximos dois anos. É certo que uma grande parte desse aumento da dívida global é de responsabilidade do Banco Central ao praticar uma política de juros estratosféricos para controlar a inflação. Aqui ficam algumas dúvidas no tocante à causa e efeito do endividamento público e aos princípios das normas do anteprojeto de lei: como estabelecer normas sobre a obtenção de crédito no mercado

70FRANCO, Gustavo H. B. A revolução fiscal apenas começou. Op. Cit. Ver também: FRANCO, Gustavo H. B.

Um mínimo de racionalidade. O Estado de S. Paulo, 20.02.2000. Disponível:< http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a51.htm>.

Page 26: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

26

financeiro se o aumento do custo da dívida dos Estados e dos municípios decorre da política de juros altos do Banco Central no controle da estabilidade da moeda?71

Estas avaliações negativas da política econômica do governo e de suas ligações com o tema da responsabilidade fiscal e do endividamento público dão a tônica das criticas à maneira como o PLRF foi elaborado, como também ao seu conteúdo. Este parêntesis foi relevante pois permitiu antecipar o tom e o sentido das discussões e comentários que se produziram a respeito da LRF na perspectiva de interpretes e doutrinadores. Tal como veremos em seções subseqüentes a maior parte dos argumentos esgrimidos em favor ou contrários ao texto do diploma legal em tela de juízo destaca vícios de origem que seriam sintomáticos de inconstitucionalidade formal e substantiva, quando não deturpariam completa ou parcialmente o espírito do mesmo.

2.3. Os Argumentos da Oposição à adoção da LRF A campanha dos governadores dos estados junto ao governo federal revelou pontos de vista discordantes a respeito do que deveria ser a nova legislação fiscal e da maneira como estas abordagens trariam impactos sobre a sociedade. Para os fins de ilustração do argumento que permeia esta comunicação selecionamos algumas visões bastante distintas a respeito do tema do ajuste fiscal. Aqui pretendemos oferecer uma panorâmica de pontos de vista acerca da inovação legal contida na LRF. Para tanto efetuamos buscas e levantamentos no site de diversos veículos de comunicação (especialmente os jornais Folha de S. Paulo, O Globo, Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil, e as revistas Veja, Istoé, Época e outras) durante o período anterior e posterior à concepção, adoção e implementação da lei. Mas não nos circunscrevemos a isto somente. Simultaneamente, para complementar e dar sentido ao discurso político acerca do diploma legal (os pró e contras), cotejamos as intervenções no debate publico com a letra da Lei Complementar 101/00 e suas predecessoras (as Leis Camata I e II). Isto nos permitiu contextualizar a questão do combate à corrupção e à má gestão pública no ordenamento jurídico como esta será diagnosticada e examinada pelos doutrinadores relevantes, tal como será exposto na Seção III. A iniciativa de por em questionamento as mudanças legais que o Executivo vinha promovendo na área de Direito Tributário e Financeiro partiu justamente de dentro da base de sustentação do governo Fernando Henrique Cardoso. Os governadores do PFL queriam, por exemplo impor um limite para as perdas na arrecadação dos Estados provocadas pela Lei Kandir e pelo Fundef (fundo de valorização do magistério) e que não fosse renovado o FEF (Fundo de Estabilização Fiscal), que retira verba dos Estados.Os governadores defendiam um “teto” para as perdas dos Estados de 3% da receita líquida, introduzindo-se um artifício de compensação automática no serviço da dívida para os valores que o ultrapassassem. Os governadores queixavam-se de perdas anuais de algo entre R$ 9 bilhões e R$ 11 bilhões com o FEF, a Lei Kandir e o Fundef. Transcrevemos aqui parte do documento intitulado “Carta de São Luís” (12. jan.1999), por ter sido firmado na capital do estado do Maranhão tendo a sua então governadora Roseana Sarney (PFL) como uma das principais articuladoras. O texto traduz a posição conjunta da maioria dos chefes do poder executivo estadual em face da iminência das mudanças jurídicas a serem promovidas na esteira do ajustamento fiscal.

71Lozardo, Ernesto. Uma Lei Fundamental. O Estado de São Paulo, 14.abr.1999. Disponível em:

<http://www.fgvsp.br/academico/professores/ Ernesto_ Lozardo/Artigos/Real043.htm>. Acesso em: 21.set.2007.

Page 27: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

27

A harmonia entre a União e os Estados é a base do pacto federativo. Tentar rompê-la é um desserviço ao Brasil e às instituições. [...] O fracasso do ajuste fiscal seria danoso para os Estados que, com enormes sacrifícios, equilibraram suas finanças e para aqueles que estão implementando os seus programas de ajustes, sem os quais é impossível obter a redução das taxas de juros e a retomada do crescimento econômico. [...] No pressuposto de que o governo federal examinará a situação dos Estados, reiteramos nosso apoio ao presidente Fernando Henrique Cardoso na adoção de medidas necessárias ao fortalecimento do Real e que ele lidere o processo de entendimento, através de mecanismos adequados. Afastamos as ameaças à estabilidade econômica e ao cumprimento das leis, base do estado de direito e do equilíbrio da federação. Apoiamos as reformas e o ajuste fiscal e fazemos um veemente apelo ao Congresso Nacional para que conclua sua votação o mais rapidamente possível. [...] Os governadores signatários deste documento propõem a criação de Conferência Nacional de Governadores, para discussão das questões de interesse nacional, objetivando sua participação efetiva na formulação das políticas econômicas e sociais do país.72

Como se verá na seção III esta convergência de interesses políticos logo se dissolveria a propósito da interpretação dos dispositivos da LRF, uma vez que seu texto tenha sido ratificado no Congresso Nacional e seu verdadeiro espírito tenha se tornado suficientemente claro a todos os participantes da situação. Para alguns governadores e partidos políticos, o recurso às Ações Diretas de Inconstitucionalidade foi a conseqüência lógica inevitável. É claro que nem todos os governadores de estado foram plenamente contrários às disposições da LRF. João Alberto Capiberibe, então governador do Amapá (período 1999/02) pelo PSB, assim expressava o seu ponto de vista acerca da mudança jurídica então em curso:

A irresponsabilidade com que se rateia o Orçamento público é uma vergonha nacional. A transferência de recursos do Poder Executivo para o Legislativo e o Judiciário ameaça seriamente a governabilidade da maioria dos Estados. Não há critérios racionais para esses repasses, e alguns parlamentares aproveitam-se disso para abocanhar recursos sem prestar contas aos cidadãos. Feita a partilha, governadores ficam sem recursos para investimentos sociais em educação, saúde, habitação, entre outros. [...]. Ela não prejudica apenas nosso Estado, o Amapá, mas também Alagoas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, e outros Estados, onde os governadores manifestam indignação com a discrepância política e administrativa institucionalizada entre os intocáveis da nação. No Amapá, aliás, a briga para conter os gastos com os Poderes Legislativo e Judiciário virou uma guerra que tem em seu centro a moralidade administrativa. [...]. Por isso decidi promover uma discussão pública sobre os gastos de cada Poder. A Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO) é destaque nos meios de comunicação (jornais, rádios e TVs), enquanto o povo a comenta nas repartições públicas, nas escolas e nas ruas. A expectativa do governo é que o cidadão comum fique sabendo como a lei afeta sua vida, reagindo ao mau uso do dinheiro com que ele contribui como imposto. Desde o primeiro mandato no governo do Amapá (a partir de 1995), tomei a decisão de discutir e descentralizar o Orçamento público estadual. No segundo mandato vou avançar, colocando em escolas, postos de saúde e repartições públicas placas contendo os custos da manutenção, construção ou reforma. A intenção é forçar os demais Poderes a fazer o mesmo.73

Prossegue o governador descrevendo a situação financeira do seu estado e esboçando as expectativas de impactos do projeto da LRF então em tramitação no Congresso Nacional.

[...] Não cabe, portanto, – conclui Capiberibe – falar em entendimento entre os Poderes quando o que está em jogo são o dinheiro público e propostas indecentes de aplicação. É preciso formar opinião nacional sobre a questão e rebelar-se, exigindo

72MADUEÑO, Denise. Pefelistas querem limite para perdas dos Estados. Folha de S. Paulo, 26.fev.1999, p. 1-7. 73CAPIBERIBE, João Alberto. Por um país de cara limpa. Folha de S. Paulo, 17.ago.1999, p. 1-3.

Page 28: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

28

que o país melhore as condições de vida do povo e comemore seus 500 anos de vida de cara limpa.74

Fica fora de dúvida se trata esta de uma posição extremista e pouco atenta aos imbróglios jurídicos que a aprovação do diploma viria acarretar. Como se sabe a argüição de inconstitucionalidade da Lei Complementar de nº 101/00 passou precisamente pela auto-aplicabilidade das “normas gerais” que os artigos e disposições do texto da mesma veicula em matéria de Direito Tributário. Uma das mais destacadas vozes que se levantaram contra a LRF, ao menos no formato que o governo pretendeu imprimir ao seu texto foi a do então Governador do Rio Grande do Sul (1999-2002) Olívio Dutra. O Rio Grande do Sul tornou-se um dos estados que suportou maiores problemas de adequação à nova institucionalidade fiscal oriunda da Lei Complementar nº. 101/2000. Quando da promulgação da LRF, o comprometimento da receita estadual com o pagamento de salários do funcionalismo público excedia em mais de 20 pontos percentuais o patamar fixado pelos artigos daquele diploma jurídico e de suas antecessoras, as Leis Camata I e II.75 Questionado pelos repórteres de uma influente revista semanal a respeito da necessidade de se “enxugar” a máquina estadual, o ex-governador se defende com argumentos que se assemelham aos do economista Zimmerman e do Prefeito Célio de Castro e Marta Suplicy, que veremos em momento subseqüente.

Evidente - concorda Dutra com os entrevistadores - Mas é bom lembrar que, quando chegamos à prefeitura de Porto Alegre, em 1989, a folha de pagamentos consumia 92% da receita do município. Sem demitir e praticar arrocho salarial, conseguimos diminuir esse índice aumentando a receita tributária. Ou seja, acabamos com as anistias fiscais e atacamos a sonegação. Na administração do Estado, pretendemos fazer o mesmo. Ao invés de demitir, precisamos aumentar e qualificar o quadro de funcionários, para melhorar o nosso desempenho em áreas vitais. Creio que, ao final do governo, o comprometimento da receita estadual com a folha cairá para 67%. A Lei Camata, que prevê um limite de 60% para tanto, é impraticável.”76

Questionado pelo fato de que no seu estado mais de 90% dos municípios cumpriam a Lei Complementar de nº. 82/95 (Lei Camata I então em vigor), o ex-governador ironizou:Que

bom! Mas é preciso ver a quantas andam a saúde, a educação e o saneamento básico na

maioria desses municípios que fazem o tal dever de casa. 77

Não se está pretendendo afirmar aqui que as práticas e condutas que a LRF foi criada para combater enquanto instrumento jurídico-normativo se acham associadas a este ou àquele partido político ou campo ideológico. Do prisma substantivo, contudo, o argumento levantado pelos agentes políticos contrários à sua adoção não deixa de ser relevante. Para Célio de Castro, então prefeito de Belo Horizonte (1997-2000 e 2001-2004) e coordenador-geral da Frente Nacional de Prefeitos os termos da discussão da LRF e do combate à má gestão é que estariam desfocados e mal-formulados. Em suas próprias palavras:

O debate que se trava hoje em torno da Lei de Responsabilidade Fiscal, da maneira como tem sido conduzido pelos governistas, fundamentado no sofisma da moralidade, não passa de uma cortina de fumaça. Tal cortina busca persuadir os incautos de que o objetivo principal é a moralidade e o equilíbrio das finanças públicas.

74Ibidem. 75LC Nº. 82/1995 (Lei Camata I), Art. 1º, II, LC Nº. 96/1999 (Lei Camata II), LC Nº. 101/2000 (LRF), Art. 19, I. 76DUTRA, Olívio. “Cristão e marxista”. Entrevista. Revista Veja. Disponível em:

<http://veja.abril.com.br/280499/p_013.html> Acesso em: 20.out.2007. 77DUTRA, Olívio. Op. Cit.

Page 29: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

29

Claro que esse objetivo é justo e com ele todos os de bom senso concordam. Sob a névoa da fumaça, escondem-se questões fundamentais e desvia-se a atenção da sociedade das reais intenções de seus idealizadores e das conseqüências desastrosas deste verdadeiro ajuste fiscal que penaliza os municípios e, claro, os cidadãos brasileiros.78 (Grifo nosso)

Destacando as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIns) que seu próprio partido

e outros, bem como outras entidades da sociedade civil impetraram no Supremo Tribunal Federal no sentido de sustar a implementação imediata da Lei Complementar de nº. 101/00, o Prefeito vai além e ataca também a Lei de Crimes contra as Finanças Públicas

79. Além de atribuir-lhe certa redundância em termos jurídicos sistêmicos, a esta ultima debita uma catástrofe social iminente:

A pretexto de moralizar os gastos públicos, a Lei de responsabilidade fiscal, complementada pela Lei 10.028, implanta a criminalização da gestão pública ao

estabelecer a prisão de prefeitos, caso eles não cumpram todas as metas previstas. Aliás, para combater a corrupção, o desvio de dinheiro público e a improbidade administrativa, o país já tem várias outras Leis, tais como a Lei do Colarinho Branco e a Lei Camata, a Resolução 78 do Senado Federal80 e a própria Lei Eleitoral. Em centenas de municípios, os cidadãos brasileiros, já penalizados pelo verdadeiro quadro de devastação social resultante da política econômica desenvolvida pelo Palácio do Planalto, sentem os resultados da Lei de Responsabilidade Fiscal. Além de serem obrigados a cumprir as exigências financeiras da Lei, muitos deles à custa do aumento de impostos, os prefeitos estão impedidos de realizar políticas sociais que busquem minimizar, em nível local, os impactos nefastos da política do Governo Federal. A implantação e a ampliação de programas reconhecidos internacionalmente como instrumentos eficazes no combate à pobreza, como o Bolsa Escola, estão comprometidos. [...].”81

Como se verá no decorrer das analises e arrazoados mostrados na Seção III, a posição esboçada pelos agentes políticos, Dutra e Castro, ecoou fortemente o debate doutrinário e jurisprudencial da LRF. No geral, suas opiniões a respeito da inovação jurídica representada por este diploma conduz a resultados opostos àqueles enunciados nos princípios de transparência e responsabilidade fiscal e tributária. O cientista político Fernando Luiz Abrucio oferece uma descrição das reações às reformas institucionais voltadas para a redução do déficit e do endividamento do setor público que remete ao que sabemos do capítulo anterior a respeito do que as pessoas consideram como sendo ou não uma conduta ou uma prática contrária ao Direito e aos valores republicanos. É o momento em que o Direito Fiscal e Tributário brasileiro redescobre suas origens no patrimonialismo português de que temos triste memória. Questionado se a LRF tornara-se inexeqüível exatamente no momento de sua aplicação, o cientista político se expressou como segue:

Muitos Estados e prefeituras terão dificuldades para cumprir a lei em 2005. Não adianta fingir que está tudo bem. O melhor é manter os princípios da responsabilidade fiscal e mudar com os instrumentos que já existem na lei. A lei é mais inteligente do que aqueles que a estão praticando. No artigo 67, ela cria um conselho de gestão fiscal (com representante de todos os poderes, do

78CASTRO, Célio de. O desafio de romper a cortina de fumaça. Fevereiro/2001 Edição 17. Disponível:

<http://www.cidadesdobrasil.com.br/cgi-cn/news.cgi?cl=099105100097100101098114&arecod=26& newcod =493>. Acesso em: 21.set.2007.

79Lei Nº. 10.028/00. 80Res. SF Nº.78/1998. 81CASTRO, Célio de. Ibidem.

Page 30: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

30

Ministério Público, de entidades da sociedade), que até hoje os governos FHC e Lula não tiraram do papel. Esse conselho discutiria e apresentaria mudanças ao Congresso para revisar parte dos acordos82. Temos de mudar a lei por dentro. O debate tal como está na mídia e na classe política é o seguinte: você é contra ou a favor da Lei Fiscal. Todos têm de ser a favor do princípio da responsabilidade fiscal e saber que a lei permite flexibilização. Senão, a discussão vai para o tudo ou nada. Você não pode apostar no tudo, que inviabiliza Estados e municípios, ou no nada, que acaba com as conquistas que tivemos. Já estamos maduros para fazer reforma sem rasgar o espírito da lei. Vamos acabar com a visão de que os técnicos têm de ser protegidos dos políticos. A Lei Fiscal virou a história do Ulisses, que coloca algodão nos ouvidos para não ouvir o canto das sereias. Hoje estamos preparados para tirar o algodão dos ouvidos. 83 (Grifo nosso)

Gustavo Zimmerman apresentou uma avaliação dos impactos da LRF que se assenta em premissas parcialmente similares tanto às dos agentes políticos de oposição ao governo federal quanto aos partidários deste mesmo. Trata-se, portanto, de um diagnostico mais equilibrado de pontos negativos e negativos da matéria legal em comento, que vale a pena ser reproduzido:

[...] Na realidade, a disciplina imposta por essa lei também vale para o governo federal, mas é ele que estabeleceu quais são os limites para ele próprio e para as demais esferas. Essa lei estabelece normas muito rígidas para o exercício fiscal e financeiro. Tem mecanismos de controle dos gastos permanentes. Gastos permanentes são aqueles que passam de um exercício fiscal para o outro, principalmente os relacionados com a contratação de pessoal. [...] [...] [...] Com o advento da Constituição de 1988, estados e municípios tiveram expressivo aumento de receita. É bem verdade que tiveram também um expressivo aumento de gastos de pessoal, pois a própria Carta garantiu a estabilidade a servidores e promoveu mudanças na aposentadoria de funcionários públicos. Os municípios, em particular, praticamente dobraram os recursos que recebiam. Obviamente, assumiram novas funções. Porém, como os gastos com pessoal aumentaram e a dinâmica pública tende a manter um ritmo constante de crescimento nessa área, achou-se por bem aprovar a Lei Camata, que foi uma iniciativa do Legislativo Federal. A legislação surgiu exatamente para possibilitar a ampliação da capacidade de investimento de estados e municípios.84

A introdução de normas concretizando os princípios do controle e do planejamento no Direito Fiscal enquanto pré-requisito da responsabilização e da gestão eficiente e transparente do setor público, como veremos, se encontra inserta nos dispositivos da LRF 85, como também nos da CF198886. Para o pesquisador o fato de os “tetos” de despesas como pessoal impostos pelas Leis Camata I e II serem os mesmos da Lei de Responsabilidade Fiscal, isto é, no máximo 60% da Receita Corrente Líquida (RCL)87, não é o que há de mais relevante em seu texto.

[...] Mas ela traz uma outra novidade. Determina que só é possível fazer um gasto permanente se houver a indicação de onde virá a receita permanente para saldá-lo. Há uma confusão nesse aspecto. Algumas pessoas pensam que a Lei de

82 LC Nº. 101/2000 (LRF), Art. 67, I a IV e § 1º . 83ABRUCIO, F. Idem. 84Zimmermann, Gustavo. Prefeituras entre a cruz e a espada. Entrevista concedida ao Jornal da Unicamp.

<http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/agosto2002/unihoje_ju186pag2a.html>. Acesso em: 20.out.2007.

85LC Nº. 101/2000 (LRF), Art. 17, 19, I, II e III. 86Arts. 40, 41, 155 e 156 da Constituição Federal de 5.out.1988. 87LC Nº. 82/1995 (Lei Camata I), Art. 1º, II, LC Nº. 96/1999 (Lei Camata II), LC Nº. 101/2000 (LRF), Art. 19, I.

Page 31: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

31

Responsabilidade Fiscal impede a contratação de servidores. Não é isso. Ela só condiciona essa contratação à disponibilidade de verbas. 88 [...] [...] Esses limites são razoáveis. Obviamente, você tem prefeituras que tiveram piores administrações. Hoje, em São Paulo, temos poucos municípios acima desse nível. Na federação, temos quatro estados com problemas de adequação. O Estado de São Paulo está um pouco acima, mas não deverá ter dificuldade para se enquadrar. Na realidade, não houve apenas o controle dos gastos permanentes, mas também um controle do nível de endividamento. As prefeituras, estados e o governo federal não podem se endividar a partir de um determinado limite.89 Esse é um dos pontos mais controversos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mais do que impor um limite, o que é saudável, ela condena a ampliação ou a manutenção do investimento nos entes federados que estejam com problemas. As prefeituras que tiveram uma grande expansão populacional, o que causa uma necessidade maior de investimento, estão invariavelmente endividadas, como é o caso de Campinas. Isso é um excesso da legislação, que a meu ver deveria ser corrigido. Tal situação não foi fruto exclusivo de uma ação momentânea, mas sim de um processo de longo prazo.90 (Grifo nosso)

Podemos afirmar que em diversos pontos relevantes este diagnostico coincide com os supra-citados argumentos de especialistas, como Luiz Carlos Bresser-Pereira e Fernando Abrucio. A tese da “crise fiscal” do setor público brasileiro, proposta pelo primeiro destes recebe aqui uma releitura de Zimmerman que desacredita parcialmente a eficácia e a legitimidade dos dispositivos e instrumentos recomendados para equacioná-la ou minimizá-la no plano do ordenamento jurídico nacional. Pondera sua avaliação, contudo, o economista, nos seguintes termos:

Ela tem alguns outros procedimentos que são, do meu ponto de vista, absolutamente saudáveis. Inibe, por exemplo, a renúncia fiscal. É o caso do famoso incentivo para atração de investimentos. Se por um lado esse tipo de iniciativa é a contrapartida à ausência de uma política industrial, ela implica num custo social extremamente elevado. Era muito comum, em vésperas de eleição, dar-se anistias, algumas extremamente elevadas. A não-cobrança da dívida ativa não acarretava a responsabilização dos prefeitos. Sob esse ponto de vista, a lei é absolutamente primorosa. Ela tem um outro aspecto, que é pouco conhecido. A lei amplia a transparência governamental, porque exige que se tornem públicos os balancetes mensais. Eu conheço inúmeras prefeituras que não faziam isso, nem para as Câmaras de Vereadores. Hoje, o Tribunal de Contas e o Ministério Público têm que receber o documento mensalmente. E mais: se as prefeituras quiserem corrigir algum dado do balancete, terá que fazê-lo numa época certa. Porém, a transparência contábil pode ser enganosa. A contabilidade pública é como biquíni fio dental: mostra muita coisa, mas esconde o essencial. A transparência não é uma conquista inquestionável, mas representa um avanço. O Poder fiscalizatório também aumentou. Tanto o Tribunal de Contas quanto o Ministério Público são agentes importantes de fiscalização. Se um cidadão não estiver satisfeito com a dinâmica contábil de uma prefeitura, ele poderá recorrer a qualquer uma dessas instituições.91

Novamente coincidindo com as precisões de Abrucio mas divergindo daquelas de Bresser-Pereira, o autor nos ajuda a compreender um aspecto que se tornou verdadeiro lugar-comum nas discussões de Finanças Públicas e que recebeu pesada ênfase daqueles que aderiram à interpretação da Lei Complementar de nº 101/00 como instrumento de transparência e responsabilidade fiscal.

88 LC Nº. 101/2000 (LRF), Arts. 16, § 1º, I e II, 17, § 1º ao § 5º, 18 e 21. 89 LC Nº. 101/2000 (LRF), Arts. 31, § 1º, 38, IV alínea “b”. 90Zimmermann, Gustavo. Op. Cit. 91Zimmermann, Gustavo. Op. Cit.

Page 32: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

32

A Lei de Responsabilidade Fiscal não impõe apenas alguns parâmetros administrativos e fiscais. Ela tem embutida uma visão da política fiscal pública. Para o setor público não é necessariamente válida a assertiva de que não se pode gastar mais do que se ganha. Você pode afirmar que um trabalhador não pode gastar mais do que ganha, mas você não diz o mesmo de uma empresa. Se fosse assim, ela jamais investiria ou teria que ter uma poupança prévia para investir. Não é esta a dinâmica do setor privado e nem do setor público. [...] Então, não é a dívida em si mas a forma de endividamento é que pode ser ruim. Isso vale para as pessoas, para os governos e para as empresas.92

Outro ponto atacado no argumento dos governistas, especialmente os de Tavares e Afonso, bem como de Franco, é o fato de que o novo diploma legal exige aplicação imediata de seus artigos e prescrições, sem que os entes federados subnacionais por ela regulados tenham como se adequar. Fazendo eco às criticas de juristas como Ernesto Lozardo, cujo argumento contrapomos diretamente ao de membros do governo como Gustavo Franco, tal como exposto supra, Zimmerman, assim define as condições que o anteprojeto e a própria peça legal depois ratificada impôs às prefeituras e aos estados:

O período de transição [adaptação dos prefeitos às novas exigências] foi previsto antes do advento da Lei de Responsabilidade Fiscal, por ocasião da aprovação da Lei Camata. Esse período foi expandido com a entrada em vigor desta última. No entanto, a Lei de Responsabilidade Fiscal não tratou de algumas situações concretas. Ela é de difícil aplicação em relação às administrações que se encerraram. As críticas partem mais dos novos prefeitos e governadores do que daqueles que foram reeleitos. [...] As críticas são procedentes, particularmente quando partem de municípios endividados e com uma alta demanda social provocada pelo crescimento populacional. [...] Tendencialmente, a capacidade de investimento [de estados e municípios] deve ser ampliada. Mas ela depende basicamente das condições de oferta de crédito. As necessidades de investimentos são dadas, mas as necessidades de desembolso dependem do montante do crédito. Se eu tiver que pagar um investimento em cinco anos, eu terei um desembolso de xis. Se eu tiver que pagar esse mesmo empréstimo em dez anos, já é xis sobre dois. Isso é que está influenciando no limite do endividamento. Com as normas extremamente rígidas, por conta da política monetária igualmente rígida, esse endividamento está diminuindo. Mas eu temo que estejam ocorrendo desembolsos maiores. As restrições ao crédito, impostas pela política monetária atual, fazem com que os empréstimos sejam de prazos menores. Isso traz um efeito maléfico e, em última análise, estabelece um paradoxo com os objetivos da lei. 93 (Grifo nosso)

Pelo exposto nas duas ultimas citações, fica a descoberto enfim o verdadeiro propósito da LRF, em que o tema do endividamento e da contenção dos déficits do setor publico sobrepuja a questão da corrupção e da malversação dos recursos da coletividade por seus administradores eleitos.

[...]. Agora, seja qual for o novo presidente, ele terá necessariamente [...] que flexibilizar a lei. [...] Ela foi feita num momento em que a economia estava com um potencial inflacionário menos crítico, as pressões macroeconômicas eram menores e o nível da atividade econômica era mais efetivo, quer porque o PIB (Produto Interno Bruto) ainda crescia, porque a privatização e a liberalização de preços dos serviços de utilidade pública ampliaram a base da arrecadação. Agora, temos duas novas tendências: a queda do nível de atividade geral e a maior restrição da base tributária. Não há mais como expandir a arrecadação sem maiores prejuízos à atividade econômica, a não ser que se retome os investimentos. Esses problemas

92Idem. 93Zimmermann, Gustavo. Op. Cit.

Page 33: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

33

tenderão a aparecer de forma mais clara e intensa na campanha presidencial e certamente legitimará as demandas até agora reprimidas. [...] Eu não sou pessimista com os efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas entendo que certamente ela terá que passar por algum tipo de flexibilização.94 (Grifo nosso).

Voltaremos ao ponto de vista deste e dos outros autores supra-mencionados na secao III, a propósito das controvérsias jurisprudenciais que cercaram a interpretação textual da LRF. Por ora temos como meditar acerca da maneira como diferentes agentes políticos e sociais apreendem o sentido, o espírito do diploma legal. III. MATIZES DE UM EQUILÍBRIO INSTITUCIONAL EMERGENTE: A LRF NO DEBATE

DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL Praticamente a totalidade dos juristas, intérpretes e operadores do Direito, que escreveram obras, artigos e arrazoados acerca da LRF, buscam minimizar os efeitos adversos da adoção imediata do novo dispositivo legal. Embora enfatizem em uníssono a sua relevância prática e não apenas teórica na promoção dos valores e princípios do Direito Administrativo Público e do Direito Tributário brasileiro, deixam entrever a incapacidade de adaptação dos agentes públicos no curto prazo e mesmo a virtual resistência destes, buscando expor brechas, lacunas e ambigüidades eventualmente não descobertas ou latentes no texto. Ou mesmo gerar conflitos de interpretação acerca da consistência e da facticidade da mesma. Daí a velocidade com que proliferaram intervenções no debate público denunciando objetivos ideológicos (pressões do FMI) por trás das propostas de responsabilização, controle e transparência fiscal, desnaturando o combate à corrupção e à malversação enquanto propósitos políticos desejáveis e legítimos da sociedade brasileira. Dividimos este capítulo em três seções. A primeira trata das correntes ou vertentes principais no debate doutrinário que se trava em nosso meio jurídico a respeito da LRF e do Direito Tributário brasileiro em uma perspectiva mais ampla. A segunda busca focalizar pontos mais precisos de controvérsia no texto legal do diploma em tela, verificando na medida do possível a sua consistência com os propósitos colimados. A ultima enfatiza os conflitos dirimidos pela intervenção do STF acerca da constitucionalidade da Lei Complementar de nº 101 e da conformação que os princípios de transparência, controle, planejamento e responsabilização assumiram em seu texto.

3.1. As Correntes Fundamentais no Debate Doutrinário do Direito Tributário Brasileiro e da LRF

José Mauricio Conti nos ensina que há duas correntes doutrinárias fundamentais no debate que se trava no contexto do Direito Fiscal e Tributário brasileiro95. Estas, em sua visão, também informam e balizam os desenvolvimentos no debate doutrinário e jurisprudencial acerca da interpretação da Lei de Responsabilidade Fiscal. A primeira vertente, denominada tricotômica, partilhada por muitos estudiosos, como Ives Gandra da Silva Martins, propugna tese de que a lei complementar em matéria tributária deve preencher três funções: 1) dispor sobre conflitos de competência; 2) regular as limitações ao poder de tributar; e 3) estabelecer normas gerais em matéria tributária.

94Zimmermann, Gustavo. Op. Cit. 95CONTI, José Mauricio. Lei de Responsabilidade Fiscal: Aspectos Jurídicos. Disponível em:

<http://www.idtl.com.br/artigos/67.html>. Acesso em: 5.set.2007.

Page 34: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

34

Referia-se o autor ao art. 18, § 1º. da Emenda Constitucional de nº. 1/1969, o qual, veio a obter recepção no art. 146 da Constituição de 1988, devidamente escoimado de ambigüidades em seu texto, mantendo-se em sua inteireza as três funções enumeradas em distintas asserções indicativas96. Assim a legislação complementar é definida por Martins como:

[...] norma de integração entre os princípios gerais da Constituição e os comandos de aplicação da legislação ordinária, razão pela qual, na hierarquia das leis, posta-se acima e abaixo daqueles. Nada obstante alguns autores entendam que tenha campo próprio de atuação, no que têm razão, tal esfera própria de atuação não pode à evidência, nivelar-se àquela outra pertinente à legislação ordinária. A lei complementar é superior à lei ordinária servindo de teto naquilo que é de sua particular área mandamental.97

O próprio Código Tributário Nacional (CTN), de 1967, redigido em formato de legislação complementar, se situaria, enquanto fonte de Direito Tributário, em uma posição intermediária na hierarquia das leis, abaixo da Constituição e da Emendas Constitucionais e acima das Leis Ordinárias. Serviria, na apta expressão do professor Ives Gandra da Silva Martins como uma espécie de colchão legislativo aparador entre estes dois níveis de legislação98. Entretanto, ao discorrer à respeito da LRF enquanto peça de legislação complementar, vindo reconhecidamente em preenchimento de lacunas do CTN e da CF, Ives Gandra reconhece que:

À evidencia, a lei complementar, por ser um modelo único a todas as unidades da Federação, deverá, de inicio, acarretar, como já está ocorrendo, sérios problemas de adaptação para as administrações públicas menos disciplinadas. É que representa modelo único, elaborado tanto para a menor quanto para a maior das entidades federativas, o que vale dizer, toma o mesmo parâmetro para limitação de despesas, independentemente das realidades múltiplas das pessoas jurídicas da federação.99

Mesmo assim, o doutrinador não concede que a regulação infraconstitucional provida via Lei Complementar de nº. 101/2000, seja desnecessária ou supérflua dado o peso do setor público e da federação brasileira sobre nossa economia100. Denominada inadequadamente de dicotômica, a outra vertente posiciona-se distintamente. José Geraldo Ataliba Nogueira explicitava os argumentos desta corrente, asseverando que a edição de normas gerais é excepcional, devendo restringir-se a princípios. Devem, pois, ser

interpretadas restritivamente101

Argüindo precisamente a adequação da Lei Complementar como instrumento de regulamentação infraconstitucional, seu arrazoado inicia-se nos seguintes termos:

96MARTINS, Ives Gandra da S. Sistema Tributário na Constituição de 1988. 5ª ed. rev. e atualiz. São Paulo:

Saraiva, pp. 27-30; MARTINS, Ives Gandra da S. Sistema Constitucional Tributário. .In: Curso de Direito Tributário. 4 ed. Belém: CEJUP. 1995, Vol. 1, p. 24-27.

97MARTINS, Ives Gandra da S. Sistema Tributário na Constituição de 1988. 5ª ed. rev. e atualiz. São Paulo: Saraiva, p. 69.

98MARTINS, Ives Gandra da S. Op. Cit, p. 27. 99MARTINS, Ives G. da S. Os Fundamentos Constitucionais da Lei de Responsabilidade Fiscal nº 101/2000. In:

ROCHA, Valdir de Oliveira. (Org.), Aspectos relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Dialética, 2001, p. 168.

100Idem. p. 169, 172-174. 101NOGUEIRA, José Geraldo Ataliba. Normas gerais de direito financeiro e tributário e autonomia dos Estados e

Municípios: Limites à norma geral – Código Tributário Nacional. In: Revista de Direito Público nº. 10, Jul-Set de 1969, São Paulo, ed. Revista dos Tribunais, pp. 45-80.

Page 35: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

35

Se o Brasil é uma federação, se os Estados são autônomos e se consagrou também – como princípio constitucional – a autonomia municipal, como compreender a existência das normas gerais de Direito Financeiro e Tributário? Se a autonomia consiste no ‘governo dos próprios negócios, mediante autoridades e leis próprias’, como obedecerem os autônomos a normas elaboradas por outrem? Como conciliar a competência do Congresso para elaborar estas normas gerais, com a autonomia das estados e municípios? Quais as finalidades das normas gerais? Quais os limites constitucionais ao seu poder vinculante?102

Sua resposta é a de que o princípio federativo deve prevalecer, ou seja, as normas gerais editadas via Lei Complementar, tal como previsto nas inovações da Constituição de 1967 e no espírito de diplomas legais precedentes (Decreto-Lei de nº. 2416/40 e CF 1946), devem ceder diante da autonomia de estados e municípios, sob a pena de fazer surgir competição de princípios que possa conduzir à derrocada do sistema jurídico. A insistência do Congresso em editá-la, vincula apenas a União, sendo inconstitucional se aplicada a estados e municípios103. Deve-se compreender a argumentação de Geraldo Ataliba no contexto das argüições e denuncias de inconstitucionalidade de que estava eivado o então recente Código Tributário Nacional (CTN), especialmente pela ameaça que engendrava à autonomia dos entes subnacionais da federação brasileira. Avança assim o douto jurista às suas conclusões sobre a natureza e os alcances do instrumento da Lei Complementar:

A lei complementar, norma geral de Direito Tributário, incumbe complementar a constituição, preenchendo suas eventuais lacunas – onde não seja possível fazê-lo por iniciativa das ordens parciais, nas respectivas esferas de competência - ou ditar critérios para prevenção de atritos entre os tributantes. Cabe-lhe, pois precisar melhor, onde necessário, as áreas de competência das ordens parciais ou fixar balizas obviadoras de conflitos104

Cabe às normas gerais, dentro do arrazoado do doutrinador, dispor somente acerca de assuntos relativos à manutenção da harmonia entre os entes da federação, preservando o equilíbrio entre as partes, bem como acerca de princípios, o que deixa de fora a possibilidade de fazerem referência a minúcias que importariam em ferir a autonomia legislativa dos entes federados. Assim, as normas gerais de direito tributário devem regular tão somente os conflitos de competência e as limitações ao poder de taxar. Havendo dois temas a serem objeto de regulação, deu-se o nome de vertente dicotômica. Entretanto, como nos alertou Conti, a denominação peca pela imprecisão, tendo em vista que a tese assevera haver tão somente uma função, qual seja: editar normas gerais de direito tributário. O conteúdo destas normas gerais é que abrange apenas as limitações ao poder de tributar e os conflitos de competência 105 A esta interpretação aderem Figueiredo, Ferreira, Raposo, Braga & Nóbrega (2001), para quem a invasão dos limites de competência estadual e municipal pela União é uma constante sem que a jurisprudência brasileira disponha de uma definição consensual ou pacifica do que sejam normas gerais. Discorrendo sobre a proposta de regulamentação do Art. 163 da CF contida no Capitulo I da Lei Complementar de nº 101/2000, os autores se expressam nos seguintes termos a respeito do que se entende como “norma geral”:

[...] não é uma tarefa fácil [identificar, dentre os dispositivos da LRF, quais não são normas gerais], vez que se trata de um conceito jurídico indeterminado e que, por

102Idem. Ibidem. 103Idem. Ibidem., p. 61, 70. 104NOGUEIRA, José Geraldo Ataliba. Op. Cit., p. 77. 105CONTI, José Mauricio. Op. Cit.

Page 36: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

36

esse motivo, impossibilita um grau de certeza ou mesmo de definitividade quanto à identificação de quais normas integrantes da LRF devem obrigatoriamente ser aplicadas pelos Estados e municípios. Cabe aqui, inicialmente, esclarecer que não se pode admitir uma certa tendência, que estranhamente tem encontrado adeptos, a exigir-se a aplicabilidade de todas as normas constantes da lei pelo simples fato de que ela declara que todas as suas disposições obrigam a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios. Ora, não é possível, juridicamente, que a União se utilize de sua competência legislativa para violar principio federativo. [...] Não se pode exigir a aplicação de normas que o violem, caso contrário, estar-se-ia diante de uma situação em que se admitiria a outorga à União de poderes para estruturar o funcionamento de todos os demais entes que integram a Federação, suprimindo por completo os seus espaços de autonomia previstos no texto constitucional.106

Na concepção de César A. Guimarães Pereira devemos encarar esta indeterminação do conceito de “normas gerais” sob um outro ângulo. Em suas próprias palavras:

O conceito de normas gerais é tormentoso. Reportemo-nos à noção exposta por Marçal Justen Filho, para quem se trata de conceito jurídico indeterminado, em que se pode identificar zonas de certeza (positiva e negativa) e zonas de penumbra. Somente em face de uma determinada norma é que se pode aferir a extrapolação ou não da competência da União nos termos do art. 163 da CF. O que se pode identificar, em abstrato, é que as normas gerais (a) vocacionam-se a vincular todos os entes políticos, (b) pautam-se por critérios de razoabilidade e proporcionalidade na estipulação de regras sobre a ação de tais entes políticos e (c) não podem violar princípios ou regras da CF, como o princípio federativo, o princípio da autonomia dos Municípios ou o da isonomia entre os entes políticos. [...] Portanto, há uma competência normativa da União nesse campo. Essa competência é justificada (extrajudicialmente) pelo papel da União como gestora global da economia nacional e pela relevância do endividamento público na administração da economia. Traduz-se constitucionalmente na centralização, na União, de competências relacionadas com essa atuação em face da economia (art. 21, VII, VIII, XI e art. 22, VI, VII, da CF) e para a edição de normas gerais sobre direito financeiro (art. 24, I, e § 2º, da CF ). 107

O autor, entretanto, é cuidadoso a respeito desta interpretação das “normas gerais” e resguarda-se de veicular um argumento que ofereça suporte à violação do principio federativo sob o qual se conserva o edifício constitucional vigente no país.

Essa competência normativa” prossegue Pereira “não exclui a dos demais entes políticos – até mesmo por força do art. 24, § 2º, e do art. 30, II, da CF. O endividamento [público] relaciona-se, em ultima analise, com a administração do patrimônio próprio dos entes políticos. Não é cabível que as normas gerais da União cheguem ao ponto de suprimir a autonomia de Estados, Distrito Federal e Municípios. Se o que justifica a edição de normas gerais sobre endividamento é a relevância global da divida pública sobre a economia, esta deve ser um limite ao conteúdo de tais normas. Não se trata de submeter os entes políticos às determinações da União mas de reconhecer que, em certos tempos, o interesse protegido pelas normas de direito financeiro transcende os limites locais. 108

Edvaldo Brito entende que está eivado de inconstitucionalidade o texto da LRF a propósito do seu caráter de norma infraconstitucional, ao sujeitar Estados e Municípios a sanções

106Figueiredo, Carlos Mauricio. et al. Op. Cit., 2001, pp. 34-35. 107PEREIRA, César A. Guimarães. O Endividamento Público na Lei de Responsabilidade Fiscal. In: ROCHA,

Valdir de Oliveira (org.), Op. Cit. pp. 53-54. 108Idem, Op. Cit. p. 54. Ver também p. 58.

Page 37: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

37

institucionais de que a própria União não é passível por descumprimento das metas por ela fixadas.

Já no seu art. 1º, encontra-se o exemplo [de inconstitucionalidade], quando diz que ela estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição’. É assim porque sobre Finanças Públicas ela diz muito pouco, sem chegar mesmo a esgotar a regulação do art. 163 e até tisnando o § 1º do art. 164, ambos da Constituição; neste ultimo caso, quando manda que o resultado do Banco Central constitua receita do Tesouro Nacional (cf. art. 7º). É assim porque ela invade o campo da Lei nº 4320, de 17.03.64, ao desdobrar a matéria do § 9º do art. 165 da Constituição, gerando prejudiciais antinomias reais, ou seja, conflitos insolúveis entre as normas das duas leis, uma ordinária e outra complementar. Muitos serão os problemas quando se quiser saber em que campo está, para efeito de revogação: no campo da complementar 101 ou no campo da ordinária 4320? porque, nem toda matéria desta ultima foi admitida, pelo principio da recepção, como sendo de lei complementar. Por outro lado, há matéria dessas leis complementares requeridas pelos dispositivos constitucionais [...] que é de ser veiculada por norma geral, reservando-se assim, aos demais legisladores dos entes federados a competência para emitir a norma específica, mas nessa lei complementar não há essa distinção.109 (Grifos do autor)

Como se pode notar o contraste não poderia ser mais gritante entre esta perspectiva e aquela esposada por Ives Gandra da Silva Martins e pelos seguidores da vertente “tricotômica”. Aquilo que Edvaldo Brito qualifica como uma invasão da Lei de Responsabilidade Fiscal no

campo tributário seria inaceitável tendo em vista os óbices constitucionais representados pela interpretação das normas gerais de direito tributário como somente regras definidoras de gêneros a serem desdobradas por normas específicas pelos respectivos entes políticos investidos em competência de instituir tributos. Prossegue assinalando o autor:

Inconstitucionais são, dentre outros, os arts. 1º e 7º; § 1º do art. 9º; o art. 14 e seus parágrafos; o item I do § 3º do art. 23; o § 7º do art. 30; o § 2º do art. 31. Enfim, são dispositivos que representam limites à liberdade pública, aos direitos e garantias individuais, a direito super-estatal, superlegal, para os quais nem mesmo a emenda à Constituição pode impedir o exercício, tais como são os direitos sociais. O próprio principio federativo que é a realização da liberdade do ponto de vista da organização do Estado, que, também, nem mesmo qualquer emenda à Constituição pode restringir, afinal, foi ofendido por essa lei complementar, que veio como uma justificativa de moralização, de outra organização administrativa, de transparência, de clareza, tudo isto, portanto, até justificável, só que ela não pode [...] destruir liberdades fundamentais, nem a forma federativa do Estado, nem abolir direitos sociais e humanos, como se encontra nos estreitos limites da lei de responsabilidade fiscal.110

Suplementa Edvaldo Brito o seu raciocínio acerca das inconstitucionalidades fundamentais existentes no diploma da LRF com as seguintes considerações:

A lei de responsabilidade fiscal, apesar de ser lei complementar e, então, formalmente, não estar viciada, tem, materialmente, a eiva de inconstitucionalidade, ao cuidar de matéria deferida, constitucionalmente, à lei complementar de normas

gerais de direito tributário. Efetivamente, a Constituição outorga ao legislador complementar federal-nacional a atribuição de estabelecer, em matéria tributária, quando se trata de emitir normas para toda a federação, apenas normas gerais. Isto é, gêneros normativos cuidando de

109BRITO, Edvaldo. Lei de Responsabilidade Fiscal: Competência Tributária, Arrecadação de Tributos e

Renúncia de Receita. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (org.), Op. Cit. pp. 113-114. 110BRITO, E. Op. Cit. p. 114.

Page 38: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

38

elementos a serem desdobrados em compatibilidade com as peculiaridades regionais e locais. Ora, mesmo que se possa admitir a incursão da lei de responsabilidade fiscal no campo da arrecadação, impossível é aceitar-se, juridicamente, que ela trate, de modo especifico, sobre atividade tributária dos entes da federação, por definição, autônomos. Assim, é-lhe defeso disciplinar, com tipos específicos, a competência

tributária de cada qual dos entes federados cujo conteúdo comporta renuncia de receita.111

Na mesma linha de afirmação da puerilidade do texto da Lei Complementar de no 101/2000, Estevão Horvath, Professor de Direito Financeiro da USP, argumenta que normas gerais devem ser interpretadas restritivamente, ou, ao menos, cautelosamente, para não se obliterar o principio federativo. Entretanto, seu arrazoado não investe pela argüição da inconstitucionalidade da referida lei ou de alguns de seus dispositivos em particular. Nota-se como o autor se coloca na corrente encabeçada por Geraldo Ataliba, a quem cita em seu texto112.

Argumenta Horvath: De um lado, a Constituição brasileira dispõe caber expressamente à lei complementar as funções estabelecidas nos arts. 163 e 165, § 9º [...]. De outro lado, o principio federativo está a recordar a autonomia inerente aos entes que compõem o Estado Brasileiro. Num dispositivo, permite-se que uma lei – que não a Constituição – cuide de dispor sobre assuntos relativos ao Direito Financeiro e obrigue, embora emanada do Congresso Nacional (e não das Assembléias Legislativas estaduais ou Câmaras Municipais), também os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. Noutro ângulo emerge o artigo que reza ser o Brasil um Estado Federal. Ora, num Estado desse tipo, os entes não são autônomos e independentes, podendo tratar de seus assuntos peculiares da maneira que melhor lhes pareça? A resposta vem para logo e é, a nosso ver: em termos. Sim, pelo fato de que nem uma nem outra norma existem sozinhas, pairando no ordenamento jurídico pátrio. 113

Há uma dualidade de comandos constitucionais, segundo o autor, configurando competências, coexistindo, de um lado, a outorga aos entes federados da autonomia de que necessitam para gerir seus negócios, com a possibilidade de que a União edite normas gerais (§ 1º do art. 24 da CF88) que os vinculem a todas as pessoas físicas e jurídicas, públicas ou privadas, de outro. Neste caso de Direito Financeiro – como o da LRF –, tipificado como de competência concorrente, a desconsideração pela autonomia de Estados e Municípios seria apenas aparente. Ao asseverar que as normas gerais editadas pela União nestes casos de competência concorrente são leis nacionais não tão somente leis federais, Horvath parece ir diretamente ao cerne da questão do modo como a controvérsia doutrinária vem sendo conduzida no Brasil:

O que são normas gerais, a doutrina ainda não conseguiu – se é que algum dia conseguirá – esclarecer. Quando muito, define-se pela negativa, ou seja, diz-se o que não são normas gerais. De toda sorte, estas normas têm caráter principiológico e não são específicas. Devem aplicar-se a todos os entes federativos, não podendo dirigir-se somente a um deles. Não constituem cheque em branco dado ao legislador infraconstitucional para preencher exatamente do jeito que bem entender. Para além disso – e, diríamos, principalmente – deve-se ter sempre presente o obvio, quem nem sempre parece, para alguns, tão evidente: lei complementar não é Constituição. Se esta pode tudo, aquela pode somente nos limites – expressos ou implícitos – da Constituição. Quer-se com isto dizer que, ao elaborar normas gerais sobre o que

111Idem. Op. Cit. pp. 116-117. 112HORVATH, Estevão. A Constituição e a Lei Complementar No 101/2000 (“Lei de Responsabilidade Fiscal”).

Algumas questões. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (org.), Op. Cit. p. 151. 113Idem, p. 150.

Page 39: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

39

quer que seja, o legislador está cingido a respeitar sempre a autonomia das pessoas jurídicas. 114

Iara Darcy Police Monteiro vai além do que diz Horvath, e afirma que houve de fato ultrapassagem do limite constitucional de competências pelo Executivo e pelo Legislativo, órgãos do governo central, ao propor e ratificarem conjuntamente a LRF. Os próprios vetos apostos pelo governo ao texto aprovado no Congresso, a comprometeram tecnicamente, desfigurando seu texto e fazendo com que muitos dos artigos se refiram a dispositivos inexistentes, dado que vetados presidencialmente115. Por outro lado, a usurpação de competência legislativa se completou com o tratamento da mesma a fim de viabilizar a imediata e direta aplicação de seus preceitos.

Como o próprio nome está a indicar, normas gerais são disposições legais que disciplinam uma dada matéria na sua generalidade, estabelecendo regras de base, fundamentos, em suma, limitam-se a fixar diretrizes e orientação, sem esgotar a regulamentação da matéria. As normas gerais constituem espécie normativa própria para o Estado federativo, em que coexistem uma ordem normativa central e uma ou mais ordens normativas descentralizadas. Assim, ao Poder Central é conferida competência para estabelecer as normas gerais, com natureza de lei nacional, porquanto destinadas a estabelecer um regramento de diretrizes básicas e uniforme para toda a federação. Aos demais entes federados [...] é reservada competência para dispor as regras de aplicação, de detalhamento das diretrizes fixadas pela União, com vistas a atender às peculiaridades locais. 116

Argumentando, contudo, em sentido consoante ao de Horvath, a autora assevera que a boa aplicação da matéria de competência concorrente pode ajudar a sanar as antinomias indicadas. Há, contudo, diferenças entre ambos. Mesmo que não caiba à União, a seu ver, invadir a competência outorgada a Estados e Municípios, esgotando a disciplinação da matéria por meio da edição das normas gerais que a Constituição lhe faculta, não se pode concluir, como Brito e Horvath pela inocuidade da Lei Complementar de no. 101/2000. Para Misabel Derzi, entretanto, a antinomia entre normas gerais e o federalismo, aludida pelos partidários dos argumentos da corrente “dicotômica” não é tão forte assim quando enfatizam. Em seus abalizados termos

[...], as normas gerais apenas desempenham papel relevante se a modalidade de Estado for federal. Na verdade, pressupõem o federalismo como forma de Estado, pois somente nele convivem ordens jurídicas distintas, que tais normas gerais visam a direcionar e harmonizar.117

Inspirado nas teorias de Kelsen e de outros autores sobre o federalismo e a descentralização de poderes, Derzi rebate a premissa fundamental daqueles que argúem a constitucionalidade da LRF sob este prisma, qual seja, o da incompatibilidade procedimental entre o instituto jurídico em tela de juízo (Lei Complementar no 101/2000) e as entidades políticas que intenta regular. Recorramos a mais uma de suas precisas analises:

114HORVATH, Estevão. A Constituição e a Lei Complementar No 101/2000 (“Lei de Responsabilidade Fiscal”).

Algumas questões. Op. Cit. p. 151. 115 Mensagem n 627, de 4 de maio de 2000. Anexo Razões dos vetos. In: MADEIRA, José Maria P &

GUIMARAES, Marcelo. Lei de Responsabilidade Fiscal. Rio de Janeiro: Editora Espaço Jurídico, pp. 174-186.

116MONTEIRO, Iara Darcy Police. Breves Anotações sobre Disposições da Lei Complementar n 101, de 4.5.00. In: QUADROS, Cerdonio. (Org), Responsabilidade fiscal: estudo e orientações – uma primeira abordagem. São Paulo: NDJ, 2001. p. 313.

117DERZI, Misabel Abreu Machado. Arts 40 a 47. In: MARTINS, Ives Gandra da S. e NASCIMENTO, Carlos Valder. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 255.

Page 40: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

40

É preciso observar que a competência da União para legislar concorrentemente sobre Direito Financeiro (inclusive orçamentário e credito público), disciplinada no art. 24 da Constituição, somente se materializa por meio da produção de normas gerais, as quais não podem suprimir, estancar ou substituir o exercício da competência legislativa própria de Estados e Municípios. Ou seja, as normas gerais não suprem, nem suprimem a necessidade de lei própria da pessoa competente (federal, estadual ou municipal) para instituir e regular-lhe o orçamento, autorizar a contratação de operação de credito, instituir o tributo. A lei complementar de normas gerais não substitui o exercício da competência própria de cada ente político da Federação. A lei complementar não cria limitações que já não existam na Constituição, não restringe nem dilata o campo por ela delimitado. Completa e esclarece as disposições relativas à limitação, facilitando sua execução de acordo com os fins que inspiraram o legislador constituinte. O mesmo se passa no campo do Direito Tributário.118

O marco constitucional do federalismo brasileiro também é ponto de partida para as considerações de Motta, Santanna, Fernandes e Alves. Estes autores, tendo como premissa assentada que a federação se coloca como clausula pétrea da Carta Magna de 1988 (§ 4º, I, art. 60), deste fato extraem conclusões para sua própria interpretação da LRF. Para eles, os constituintes estabeleceram competências compartilhadas e concorrentes para legislar, estabelecendo uma fonte de forte divergência doutrinária119.

Examinada com rigor dos melhores paradigmas de aferição de constitucionalidade, é forte a linha de argumentação de que a norma não se ajusta ao próprio sentido do pretenso regime federativo e a autonomia dos Estados que integram o Estado federado, no modelo teórico e tão entusiasticamente sustentado por alguns doutrinadores. Ao regular as finanças públicas, acabou, segundo os acérrimos críticos, por invadir a ampla seara do Direito Administrativo, restringindo inclusive o poder de gestão de autoridades que, pelo modelo federativo, estão livres das normatizações do poder central [...]120.

E, na seqüência deste arrazoado, asseveram diretamente a respeito dos fundamentos constitucionais da controvérsia interpretativa e de aplicação trazida a lume pela LRF:

Toda dificuldade resulta do fato de que no elenco dos artigos que repartem a competência legislativa – arts. 22, 24 e 30 da Constituição Federal – não foi colocada, com autonomia na enciclopédia das ciências, as finanças públicas, mas essa ciência ou ramo da ciência assume inteira autonomia e lhe é reservado capitulo inteiro da Constituição no Titulo VI. A Lei de Responsabilidade Fiscal coloca-se como regulador das finanças públicas e, desse modo, em norma federal pretende regular tema que não está no elenco de competências legislativas privativas da União, nem ao menos concorrente. Não é suficiente, porem, essa perspectiva: no art. 24, inc. I, da Constituição Federal foi definida a competência concorrente para legislar sobre Direito Financeiro. Esse ramo do Direito, segundo o interesse do classificador, tanto pode estar contido nas Finanças Públicas como este estar contido naquele.121

A indeterminação conceitual também constitui uma chave de analise relevante para a LRF na ótica destes autores, mas os mesmos parecem inclinar-se para a interpretação de Brito e

118DERZI, Misabel Abreu Machado. Op. Cit., pp. 256-257. 119MOTTA, Carlos Pinto Coelho da, SANTANNA, Jair Eduardo, FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby &

ALVES, Léo da Silva. Responsabilidade Fiscal: Lei Complementar 101, de 04/05/2000. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.71.

120Ibidem, p.78. 121MOTTA et. al., Op. Cit., pp.78-79.

Page 41: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

41

Horvath a este respeito, aventando para a hipótese de conflitos entre a União e os demais entes políticos uma vez aplicados os dispositivos da Lei Complementar122. Mas por outro lado os autores parecem inclinar-se para a vertente tricotômica, tal como Derzi e Gandra, entendendo a Lei complementar como lei nacional (e não apenas leis federais), ou normas gerais de caráter vinculante123, oferecendo complemento à Constituição, harmonizando os conflitos e viabilizando a federação, excluindo a hipótese de competência concorrente. Em sua interpretação, as LCs seriam privativas da União e superiores às leis ordinárias editadas pelos estados federados124.

Não somente os limites para as despesas com pessoal ‘por ente’ (artigos 18 e 19 da Lei de Responsabilidade Fiscal) atendem os comandos da Constituição Federal, como – do mesmo modo – a repartição mencionada no artigo 20 (gastos "por unidade) está a cumprir a função ordenadora e harmonizadora da lei complementar reclamada pelo Título VI da Lei das Leis. Não há, desse modo, qualquer vício que possa macular a Lei de Responsabilidade Fiscal, nesse particular, justamente porque, como já foi dito, o princípio federativo que consagra a coexistência de pessoas políticas, em regiões autonômicas distintas, não está abalado. Pela fisionomia da federação brasileira, de origem e caráter centrífugo, os comandos da nova lei não ofendem as zonas autonômicas da própria União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios. Até mesmo porque esse proceder não tolhe ou aniquila das capacidades dos entes políticos que participam do pacto respectivo. Esse raciocínio se anexa a tudo o que se disse sobre a função de harmonização, existente nas normas gerais. 125

Como se pode notar há uma ampla diversidade de interpretações a respeito da constitucionalidade da LRF. Todas elas giram em torno da regulamentação infraconstitucional de dispositivos da CF/88. Mais especificamente, da propriedade, da eficácia e da validade do instrumento da Lei Complementar enquanto “norma geral” regulamentadora de assuntos e temas de Direito Financeiro e Tributário nas esferas de poder municipal e estadual.

3.2. Principais pontos de controvérsia doutrinária e jurisprudencial na LRF

Faz-se aqui um exame das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADins) impetradas no Supremo Tribunal Federal contra dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal considerados inconsistentes ou conflitantes com o ordenamento jurídico prevalecente no país. Conforme visto no decorrer das análises e arrazoados desenvolvidos em seções anteriores do presente Capítulo e dos que o antecederam, a posição esboçada por agentes políticos da oposição ao governo, de um lado, e ministros, de outro, ecoou fortemente os debates doutrinários e jurisprudenciais do diploma normativos em comento. No geral, as opiniões dos primeiros à respeito da inovação jurídica representada por este texto legal conduz a resultados opostos àqueles enunciados nos princípios de transparência, planejamento, controle e responsabilidade fiscal e tributária. As dos segundos alegam, contudo, que a manutenção do status quo legal na área do Direito Tributário e das Finanças Públicas traz prejuízos ao país como um todo e inviabilizam quaisquer tentativas e esforços de enfrentamento das graves e prolongadas crises econômicas e sociais vivenciadas pelo Brasil em tempos recentes. Defendendo a LRF das acusações de detalhismo e minudencia exageradas, exorbitando a alçada de suas competências o poder público que a editou e gerando ambigüidades e

122Idem, pp.86-87, 90. 123Idem, p. 96. 124Idem, pp. 101-102. 125MOTTA, Carlos Pinto Coelho da et. al., Op. Cit. p.124.

Page 42: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

42

imprecisões acerca da extensão da matéria e das pessoas de Direito público por ela reguladas, o Advogado-Geral da União se valeu inicialmente do estudo efetuado por Cid Heráclito de Queiroz126. Por meio desta citação fundamenta a constitucionalidade do art. 20 em tela de juízo:

A Lei Complementar nº 101, de 4/5/2000, estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição. 127

Passou então Gilmar Ferreira Mendes a discorrer sobre as preferências do legislador ao selecionar a linguagem em que se acha redigido o texto em comento. Isto lhe parece relevante porquanto a nova lei está fundamentada não somente no art. 163, incisos I, II e III, como também no § 9º, inciso II, do art. 165, e no art. 169 da Carta de 1988. Na visão do autor o leque de disposições e matérias reguladas pela LRF é bem mais amplo do que se afigura à primeira vista, abrindo a possibilidade para as argüições de constitucionalidade que precisou enfrentar uma vez aprovada pelo Congresso Nacional.

[...] Com efeito, a LC nº 101, - prossegue Gilmar Mendes - a um só tempo, dispõe sobre finanças públicas, dívida pública externa e interna e concessão de garantias, com fulcro no art. 163, incisos I, II e III, estabelece normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta, com base no inciso II do § 9º do art. 165, e estabelece limites e condições para a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, com lastro no art. 169. [...] É oportuno destacar que o Capítulo II - "Das Finanças Públicas", do Título VI, da Constituição está dividido em duas Seções, a primeira, mais genérica, tratando das Normas Gerais (arts. 163 e 164) e a segunda, mais específica, tratando "Dos Orçamentos" (arts. 165 a 169). São, portanto, sete artigos, com trinta e um parágrafos, trinta e quatro incisos e cinco alíneas, todos com o escopo de defender as finanças públicas contra os agravos de toda ordem que, infelizmente, se produzem na vida pública nacional, atrasando o nosso desenvolvimento econômico e social. 128

O sentido das provisões constitucionais acerca da Lei Complementar, em geral, na compreensão do Advogado-Geral da União, avançam na direção de combater e restringir o que nos capítulos precedentes definimos como “amigos do rei” na vida pública brasileira. Toda a ampla série de condutas, valores e práticas anti-juridicas e anti-republicanas resumidas sob os conceitos de patrimonialismo e “cultura da irresponsabilidade” foi alvo visado tanto pelas iniciativas do legislador constitucional quanto do legislador ordinário. Do seu ponto de vista:

[...] Os destinatários das normas relativas às finanças públicas são todos quantos, em qualquer um dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive na administração indireta, tenham o encargo legal de gerir recursos, administrar o patrimônio ou contrair obrigações em nome do poder público. [...] Por conseguinte, a Constituição, em seu art. 163, inciso I, dá a mais ampla força à lei complementar que prescreve, para impor, a todos os entes públicos, regras gerais ou específicas, normas coercitivas, vedações e penalidades em torno da receita e da despesa, do processo de endividamento e da dívida pública, das obrigações legais ou contratuais de natureza financeira e do patrimônio públicos.

126QUEIROZ, Cid Heráclito de. Lei Complementar nº 101, de 4.5.2000: fundamentos constitucionais e exegese

do art. 20 Apud MENDES, Gilmar Ferreira. Advogado-Geral da União. MEMORIAL - Aditivo, 04.Out.2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_17/ MemorialAGU2.htm>.

127QUEIROZ, Cid Heráclito de. Op. Cit. Apud MENDES, Gilmar F. Op. Cit. 128MENDES, Gilmar F. Op. Cit.

Page 43: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

43

[...] Nessas condições, bastaria ao constituinte incluir, no texto constitucional, tão-somente o preceito do citado art. 163 e seu inciso I e uma lei complementar regularia todo o amplo campo das finanças públicas. [...] Todavia, o constituinte brasileiro, prolixo, como em todo o texto de nossa Carta, foi mais além e traçou numerosas regras, umas para integrar, necessariamente, a lei complementar, outras para limitá-la de algum modo, todas tendo por finalidade a proteção das finanças públicas. E foi prolixo justamente em face dos excessos e abusos praticados nas três esferas de governo, notadamente no respeitante à despesa pública. [...] Nos seus incisos II, III e IV, do art. 163, enumerou, desde logo, três matérias que deveriam compor a lei complementar das finanças públicas: dívida pública, concessão de garantia e emissão e resgate de títulos da dívida pública. Note-se que, nos incisos V, VI e VII, são mencionadas - numa das muitas impropriedades de nossa Carta - matérias que, muito embora integrem o conceito mais abrangente de finanças públicas, são próprias de uma outra lei complementar, a relativa ao sistema financeiro nacional, a que se refere o art. 192.129

Ao abordar a substância da ADIn 2238 em suas considerações adicionais enviadas ao relator da mesma no STF, Ministro Ilmar Galvão, o Advogado-Geral da União, Gilmar Ferreira Mendes, opta por examinar de modo individualizado as alegações da requerente acerca da violação de cláusulas pétreas da Carta Política. Alegava a requerente que o princípio federativo, consagrado no art. 1º e protegido no inciso I do § 4º do art. 60 da Carta Magna, estaria sendo afrontado pelas disposições insertas nas alíneas do inciso II do art. 20 da LRF130. Em síntese, sugeria que tais normas excederiam a competência da União para legislar sobre “normas gerais” de direito financeiro, finanças públicas e orçamento (art. 24, I e II, da CF) e, assim, violariam o disposto no art. 24, § 1º, da Constituição Federal. Consideremos tal alegação. Estabeleceu assim a AGU o diálogo com as interpretações doutrinárias que acima discutimos, a saber, a corrente tricotômica e a corrente “dicotômica”. Tomamos a liberdade, para fundamentar o ponto de efetuar a mesma reprodução textual das normas sujeitas à impugnação a fim de levar mais a fundo o argumento defendido pela parte requerida. Assim sendo:

[...] Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados: I - União: 50% (cinqüenta por cento); II - Estados: 60% (sessenta por cento); III - Municípios: 60% (sessenta por cento). 131 Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais: [...] II - na esfera estadual: a) 3% (três por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Estado; b) 6% (seis por cento) para o Judiciário; c) 49% (quarenta e nove por cento) para o Executivo; d) 2% (dois por cento) para o Ministério Público dos Estados; [...]. 132

129MENDES, Gilmar F. Op. Cit. 130Art. 20, LC 101/00 citado em: MENDES, Gilmar F. Ibidem. 131Art. 19, LC 101/00. 132Art. 20, LC 101/00.

Page 44: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

44

Alinhando-se com as teses da corrente dicotômica a Requerente pretenderia dar força à crença de que os arts. 19 e 20 afigurar-se-iam excessivamente detalhistas e, por conseguinte, mitigaria a competência estadual para disciplinar, para além das normas gerais federais sobre a matéria, sua específica concretização em face das singularidades regionais. Embora admitindo a dificuldade técnica e conceitual de definir-se o alcance da legislação federal sobre normas gerais, para tanto indica um suposto excesso na disciplina da matéria por lei federal, pois nada restaria a ser regulado pelo estado-membro. Mendes nega que a alegação mereça prosperar, citando, assim como Motta, a percepção destas dificuldades já no processo legislativo pelos parlamentares, mais especificamente durante a própria tramitação do Projeto de Lei Complementar no Senado Federal.133

Em sua visão, a postulação da Requerente estaria baseada em dois equívocos básicos e decisivos. Primeiramente, sua presunção, sustentada de modo totalmente precário, de que a única hipótese autorizadora da disciplina da matéria pelo Legislativo reside no disposto na letra do art. 24, I e II, da Carta Maior. Assim procedendo ignora a Requerente o fato fundamental de que a matéria encontra-se regida em lei complementar nacional e que seria absolutamente evidente a necessidade de inquirir-se motivação de se editar tal regramento. Como sabido, o texto constitucional refere-se à disciplina das Finanças Públicas em topos específicos. De fato, o Capítulo II do Título VI da Constituição Federal encontra-se intitulado exatamente Das Finanças Públicas (Arts. 163 a 169).134 Notemos de antemão como o Advogado-Geral da União toma por dado o conceito de “normas gerais”, passando ao largo de sua indeterminação jurídica, tal como exposto quase exaustivamente, na seção anterior. O amplo desacordo da doutrina a este respeito135 contrasta direta e recorrentemente com o tom relativamente acrítico com que o defensor da constitucionalidade da LRF trata das premissas do assunto. Vejamos então por que e como Gilmar Mendes Ferreira, com o intuito de fundamentar a matéria, reproduz o intróito da Seção I do referido Capítulo II do Título VI da Constituição Federal, intitulada "Normas Gerais": Art. 163. Lei complementar disporá sobre: I - finanças

públicas.136 A ressonância dos argumentos da vertente tricotômica na exegese operada por este autor é bastante clara e consistente. Citando textualmente o influente opúsculo de Carlos Pinto Coelho da Mota e colaboradores pretendeu o advogado-geral erodir em seus fundamentos constitucionais mais articulados a retórica da tese oposta ao caráter auto-aplicável das disposições da LRF. As precisões de Motta se dão nos seguintes e abalizados termos:

Mesmo em temas da competência concorrente, no Brasil, há predominância da União. Ao consagrar no art. 24, a possibilidade da União, Estados, Municípios e Distrito Federal editarem normas sobre o tema, acrescentou-se o § 1º para estabelecer que, no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. Consabido que, nos parágrafos subsequentes, firmou o império das normas gerais, e somente essas sobre a das demais unidades federativas. Numa escala sucessiva de precedência, União sobre Estados e estes sobre os Municípios, assinala Teixeira Machado que o Município poderá legislar suplementarmente, no que couber à legislação federal ou estadual, de acordo com o art. 30, inc. II, da Constituição Federal, sendo que neste caso o Município pode estabelecer normas especiais de controle interno e de administração financeira e orçamentária. [...] Este comando [art. 24], que fixa uma competência da União deve ser complementado com o art. 163, inc. I, da Constituição Federal, que destina à Lei

133Apud Motta, Santana, Fernandes & Alves. Op. Cit., p. 381. 134 MENDES, Gilmar F. Op. Cit. 135 NOGUEIRA, José Geraldo Ataliba. Op. Cit., p. 46. 136 MENDES, Gilmar F. Op. Cit.

Page 45: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

45

Complementar a disposição sobre finanças públicas. De ressaltar-se que, literalmente, enquanto no art. 24, inc. I, a competência é apenas para edição de normas gerais, no art. 163 não. Tudo está a indicar maior elastério. A regularidade das finanças públicas é, inclusive, ponto tão fundamental para o sistema federativo, que justifica a mais grave ação possível na convivência de uma federação que é o uso do instrumento da intervenção.137

Com este apelo à autoridade de tão ilustres doutrinadores e a seus brilhantes arrazoados jurisprudenciais, Mendes esperava ter evidenciado que qualificou como um equívoco

fundamental na interpretação da Requerente ao circunscrever a argüição de constitucionalidade da LRF, ao estreito contexto das disposições do art. 24, I e II, da Lei Maior. Ademais invoca em sua causa o que se acha determinado no art. 165, § 9º, I e II, da mesma Carta para dar suporte sistêmico à sua própria contra-alegação de que em mais de uma ocasião esta faz referência a competências deferidas à lei complementar nacional. Entre as matérias a serem ali disciplinadas encontram-se aquelas relativas à elaboração e à organização do plano

plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual. Sustenta-se com isso que com o estatuto de lei complementar nacional definem-se as normas que haverão de regular a "elaboração" e "organização" de todos os demais diplomas normativos relativos às finanças públicas.

§ 9º - Cabe à lei complementar: I - dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual; II - estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos.138

Uma norma semelhante àquela introduzida no inc. II do art. 20 da Lei Complementar de nº. 101/2000, portanto, encontraria fundamento adicional para sua legitimidade no disposto no artigo imediatamente supra-citado do texto constitucional. Do mesmo modo, na visão de Mendes compete também à lei complementar nacional "estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta", o que, obviamente, implica definir parâmetros, limites e critérios para a gestão financeira e patrimonial de todos os níveis de governo. Evidencia-se igualmente, destarte, a competência da lei complementar nacional para estabelecer critérios semelhantes àqueles insertos no art. 20, II, da LRF, cuja legitimidade seria amparada constitucionalmente pelo disposto no art. 165, § 9º, II. Recorrendo novamente à autoridade doutrinária de Carlos Pinto Coelho da Mota e colaboradores, o Advogado-Geral da União adota as conclusões que estes autores extraem de seu próprio raciocínio:

Isto posto, dúvida alguma poderá existir quanto à natureza das normas reclamadas pela Constituição Federal, nos artigos 163, 165, § 9º, e 169. Todas essas regras têm o caráter de lei nacional e constituem o mais importante instrumento de efetivação da coerência e harmonia entre todos os entes políticos, que possuem competência legislativa para tributar. Como normas gerais que são, as regras compactadas na Lei de Responsabilidade Fiscal visam demarcar, na prática, o campo autonômico de todos os entes políticos, tarefa não levada a efeito pelo legislador constituinte, que se limitou a estabelecer núcleos de autonomia sem lhes fixar extensão. 139

137MOTTA, Carlos P. C. et al., Op. Cit., pp. 116-117. 138MENDES, Gilmar F. Op. Cit. 139Citado em MENDES, Gilmar F. Ibidem.

Page 46: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

46

Na visão do autor o alcance das normas insertas no transcrito § 9º do art. 165 do texto constitucional, pode ser avaliado pela consideração da norma a ele textualmente adjacente. O dispositivo evidencia que a legislação complementar prevista no § 9º do art. 165 haverá de referir-se não só ao Poder Executivo, mas também aos demais Poderes e ao Ministério Público – o que já afastaria, similarmente, a tese de afronta ao preceito da separação de poderes. Atribui Mendes o equivoco da Requerente a este respeito a uma interpretação apressada da expressão "administração direta e indireta" constante do inciso II do § 9º do art. 165 citado ainda mais acima. Reproduzamos o texto do o art. 168 da Constituição Federal a que ele se refere:

[...] Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9º.

No mesmo passo, o dispositivo evidencia que a disciplina regulamentadora alocada à legislação complementar prevista no § 9º do art. 165 da Carta Magna é de grande amplitude, abrangendo questões procedimentais e especificamente aquela relativa a recursos correspondentes a dotações orçamentárias e créditos dos diversos Poderes Públicos. Em sua visão, se ao exposto se acopla a uniformidade nacional do critério imposto no transcrito art. 168, parece inequívoca a legitimidade da regulação da matéria em lei complementar nacional. É digno de nota a esta altura de sua argumentação contra a postulação das ADIns como marca significativa e criteriosa diferença aqui o Advogado-Geral da União daquelas correntes que José Mauricio Conti denominava “dicotômicas”140. Para Gilmar Mendes um argumento definitivo no sentido da legitimidade da disciplina da matéria em lei complementar nacional reside nas diversas disposições do art. 169 da Constituição Federal. A redação mesma do dispositivo torna insofismável o caráter nacional da lei complementar nele referida, pois apta a disciplinar a "despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios". A redação do preceito, em sua apreciação - não restritiva como diria José Maurício Conti para qualificar-se como um defensor da corrente “dicotômica” -, é ainda mais explícita, pois não cuida de determinar apenas a disciplina da "despesa com pessoal ativo e inativo" das diversas esferas da Federação, mas trata de mencionar expressamente a previsão de "limites estabelecidos em lei complementar".

[...]. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

Da orientação tricotômica no debate doutrinário extrai Mendes a noção auxiliar de que a LRF nada mais faz do que regulamentar e implementar comandos constitucionais.141Em acréscimo, após invocar exatamente as normas insertas no art. 169 da Constituição Federal, conclui-se

140 CONTI, José M. Op. Cit. 141“Vê-se, desse modo, que as regras postas pela Lei de Responsabilidade Fiscal, especialmente através dos

artigos que tratam da Despesa Pública, são meras efetivações dos comandos postos, ou pelo constituinte originário, ou pelo reformador. A Constituição Federal, ao ser promulgada, trouxe, no artigo 38 das Disposições Transitórias, comando estabelecendo limites para os gastos com pessoal até que fosse editada a Lei de Responsabilidade Fiscal (ou outra equivalente): Dita norma transitória previa, inclusive, mecanismos para o caso de excesso.” MOTTA, Carlos Pinto Coelho da et. al., Op. Cit. p. 122.

Page 47: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

47

veementemente na já referida obra destinada exatamente ao exame do diploma jurídico ora em tela de juízo.142 Para Mendes a previsão de que a União haveria de legislar sobre "normas gerais" relativas a matérias de "direito financeiro" e de "orçamento" (CF, art. 24, I e II, e § 1º) bem como editar lei complementar sobre "finanças públicas" (CF, art. 163, I) encontra especial e expressa concreção nas diversas normas constantes do Capítulo II do Título VI da Magna Carta. Deste mesmo arrazoado, Mendes deriva conseqüências legitimadoras ou asseguradoras da constitucionalidade da LRF, obstada pelas ADIns, que lhe permitem opor s-e a alegações acerca da suposta ofensa ao preceito fundamental da divisão de poderes, considerando-a “impertinente e de todo dependente da alegada ofensa ao princípio federativo.” Recorrendo novamente aos doutrinadores, o Advogado-Geral da União asseverava que não se reconhece nenhuma afronta ao preceito da separação de poderes ao se considerar a inexorável colaboração dos diversos Poderes Públicos e a interpretação sistemática do texto constitucional no escopo de obtenção de higidez fiscal.143 Nos seus próprios termos:

[...]. Dúvida não há [...], pois qualquer definição dos limites globais de despesa haveria de impor quotas para os distintos Poderes Públicos exatamente para o fim de preservar sua autonomia, impossibilitar a absorção de sua participação nas receitas públicas por parte de outro Poder Político e, ao mesmo tempo, viabilizar a edição do ‘ato normativo motivado de cada um dos Poderes’ previsto no § 4º do art. 169 da Carta Magna [...]. [...] Para assim concluir, basta ter presente o fato de que, já sob o sistema atual, as propostas orçamentárias dos distintos Poderes Públicos já se encontram sujeitas ao crivo do Poder Legislativo, sem que desse fato decorra ofensa alguma à divisão de poderes. [...] De fato, a disciplina da matéria viu-se estabelecida pelo Congresso Nacional, o que – uma vez afirmada sua competência legislativa – eliminaria todo e qualquer possível atentado à divisão de poderes [...]. Em verdade [...] a adoção de um modelo uniforme, permanente e estável opera no sentido de minimizar as tensões entre os distintos Poderes Públicos e vincular todos eles à garantia de eficácia da imposição constitucional de limitação das despesas com pessoal bem como das prerrogativas de autonomia e independência, com efetiva garantia da harmonia entre os Poderes Públicos, insertas nos arts. 168 e 169, §§ 4º e 7º, da Carta Magna.144

Como vimos anteriormente esta é também a posição apresentada por juristas como Ives Gandra da Silva Martins145 e Misabel Derzi146, para os quais fica afastada por principio qualquer hipótese de colisão entre a LRF e o ordenamento constitucional vigente. A antinomia manifesta entre o instrumento da Lei Complementar, de um lado e o principio constitucional do federalismo, de outro, é para o Advogado-Geral da União apreendida nos seguintes termos doutrinários, extraídos de Mota et al.:

No Brasil, em matéria de finanças públicas, o que se observa, ao lado de poucos Estados que conseguem sustentar a própria despesa, é a maioria com sérios problemas de endividamento. A nível municipal, o quadro apresenta matizes ainda mais acentuados: 89% dos Municípios arrecadam menos de 100 mil reais por mês, sobrevivendo da transferência de recursos de fundos constitucionais. Por esses motivos, essas esferas de governo encontram-se subjugadas financeiramente, fortemente dependentes do governo central. Por razões políticas, periodicamente, conseguem transferir dívidas para a União, que mais cedo ou mais tarde são absorvidas e roladas. Portanto, em termos práticos, a autonomia financeira é mais discutível no plano teórico, ficando de concreto apenas como argumento.

142Idem, p.124. 143MOTTA, Carlos Pinto Coelho da et. al., Op. Cit., p. 129. 144MENDES, Gilmar F. Op. Cit. 145MARTINS, Ives G. da S. Op. Cit. 2001, p. 168. 146DERZI, Misabel Abreu Machado. Op. Cit., pp. 256-257.

Page 48: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

48

A autonomia administrativa, ou autogoverno estaria prejudicada pela Lei de Responsabilidade Fiscal? Em resposta afirmativa, argumentam que a União não poderia pretender regular a aplicação de recursos que não lhe pertencem. Esse argumento não procede, pois que não se está limitando a autonomia financeira ou administrativa, mas exigindo que cada um gaste apenas de forma compatível com o que arrecada. Por analogia, se entre pessoas físicas o Direito admite a conduta até a insolvência, que limita a ação administradora do agente, com muito mais razão lógica, pode a União ordenar limites de razoabilidade às unidades federadas, pois a conduta dilapidadora do patrimônio público ou irresponsável afeta toda a comunidade. A autoridade que pretende ter maior autonomia ou autogoverno deverá esmerar-se no ajustamento de suas contas, aprimorando a eficácia das finanças públicas. 147

O exposto até aqui por certo não exaure a controvérsia jurisprudencial nem a querela doutrinária ensejada pela interpretação e pela aplicação dos dispositivos da LRF. Em seguida, veremos a repercussão destas posições jurídicas sobre o controle abstrato e concreto de constitucionalidade das leis, com foco nos artigos da própria Lei Complementar de nº. 101/2000. Deixaremos para a seção conclusiva um breve balanço acerca do que consideramos, grosso-modo, como qual foi a corrente “vitoriosa” no debate sobre o qual discorremos até aqui. 3.3. As Decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca do controle de constitucionalidade abstrato no caso da LRF

Quando iniciamos as pesquisas e levantamentos empíricos e documentais que consubstanciam a abordagem dos problemas e questões discutidas aqui, as Ações Diretas de Inconstitucionalidade impetradas contra dispositivos da LRF ainda não haviam sido julgadas pela magna corte curadora da Lei Maior do país.148 Despertou-nos grande atenção como se desfez o status-quo legal sobre o qual tantos conflitos sociais e políticos foram travados na política brasileira da ultima década. Àquela altura nossas discussões das teses e argumentos de operadores e interpretes do Direito Financeiro e Tributário foram reorientadas pela necessidade de mapear os pontos mais vulneráveis que o diploma jurídico em comento apresentava do ponto de vista da argüição de legitimidade constitucional. Esta preocupação guiou os levantamentos subseqüentes e os resultados tomam a forma que segue. Ver-se-á como as decisões do STF, tiveram conseqüências relevantes tanto do ponto de vista jurídico quanto político.149

147MOTTA et al., Op. Cit., pp. 114-115. 148O acompanhamento de processos das ADIns se fez por consultas ao sitio eletrônico do Supremo Tribunal

Federal, onde se acham publicados os Informativos daquele Egrégio Tribunal. Ver, por exemplo, Informativos STF, nº. 204 (25-29.Set.2000); nº. 206 (9-13.Out.2006); nº. 218 (19.fev.-2.Mar.2001); nº. 267 (6-10.Maio.2002); nº. 475 (6-10.Ago.2007), nº. 485 (22-26.Out.2007). Disponível em: < http://www.stf.gov.br/portal/informativo/pesquisarInformativo.asp?s1=Lei+de+Responsabilidade+Fiscal&pagina=3&base=INFO>.

149Ministério diz que Poderes vão pagar multa se não cortarem gastos. Folha de S.Paulo, 24.fev.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u15951.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; Poder Judiciário pede que FHC evite corte no orçamento. Folha de S.Paulo, 27.mar.2001 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17616.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; FREITAS, Silvana de. Judiciário pede que FHC evite corte. Folha de S.Paulo, 27.mar.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17629.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; STF discute cortes com presidentes dos tribunais superiores. Folha Online, 29.mar.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17794.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; Judiciário cortará R$ 32,5 milhões a menos do que determinado. Folha Online, 03.abr.2001. Disponível em:

Page 49: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

49

Esta palavra final acerca da constitucionalidade da LRF não tem efeitos menos ambíguos e claros que os textos jurídicos que se propõem a clarificar. Se por um lado as decisões sobre as ADIns apresentam efeitos vinculantes ex tunc, e não retrospectivos, não criando obrigações para os agentes públicos se sujeitarem ao cumprimento das suas prescrições “draconianas” no futuro e suspendendo as existentes, por outro, não cancelam do ponto de vista fático os bons resultados observados em termos de desempenho fiscal e de visibilidade da corrupção e da mal-versação de recursos públicos. A ausência de efeitos ex nunc para determinações erga

omnes não desfaz simplesmente o que já existe e foi conquistado em termos de controle da dívida pública, de responsabilização dos agentes políticos, de transparência das ações, regras e procedimentos, de controle. Ou seja, a inconsistência da letra não afeta o espírito da LRF ou os princípios que sua letra concretiza e, inversamente, sobre os quais ela mesma se acha estruturada, a saber, os do Planejamento, da Transparência, do Controle e da Responsabilidade. 150 Para tanto retomamos os argumentos do Advogado-Geral da União em favor de uma declaração imediata de constitucionalidade da Lei Complementar de nº 101-00, bem como aquelas teses e interpretações que se lhe opõem no debate. Os princípios de responsabilidade fiscal que encontraram sua concretização nas normas insertas na Lei Complementar de nº 101, ao serem submetidos à argüição de constitucionalidade na magna Corte, tornaram incertas ou menos seguras as conquistas e os avanços obtidos com sua promulgação em maio de 2000. Em geral, pode-se afirmar que os ministros do STF entenderam não haver relevância jurídica na tese de inconstitucionalidade sustentada do art. 15, entendendo que as medidas previstas no artigo impugnado objetivam tornar efetivo o cumprimento do PPA, das LDOs e da LOA, tal

<http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17990.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; LEI de Responsabilidade deve ser mudada pelo Supremo. Folha de S.Paulo, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u32367.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; MANFRINI, Sandra. Fazenda diz que essência da LRF está mantida após decisão do STF. Folha Online, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u32373.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; STF abre brecha para endividamento mas governo contesta interpretação. Folha Online, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u47067.shtml>. Acesso: 10.nov.2007: Decisão do STF sobre LRF aumenta ambiente de incerteza, avalia CNI. Folha Online, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u47077.shtml>. Acesso: 10.nov.2007: GRABOIS, Ana Paula. Secretário da Fazenda do RJ pede reforma na Lei de Responsabilidade. Folha Online. 09.jan.2003. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u44573.shtml>. Acesso: 10.nov.2007: MIGNONE, Ricardo. Governador do ES pede a Lula R$ 300 mi para pagar funcionalismo. Folha Online, 07.jan.2003 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u44491.shtml>. Acesso: 10.nov.2007: FREITAS, Silvana de. Ministro do STF vê casuísmo em MP pró-Marta. Folha de S.Paulo, 17.mar.2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u67887.shtml>. Acesso: 10.nov.2007: LAGE, Janaina. MP 237 foi criada para reduzir dívidas dos municípios, diz Levy. Folha Online, 17.mar.2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u94487.shtml>. Acesso: 10.nov.2007; Supremo libera Sergipe de punição da Lei Fiscal. 13.Nov.2007. Disponível em: <http://br.noticias.yahoo.com/s/13112007/25/politica-supremo-libera-sergipe-puni-da-lei-fiscal.html>. Acesso: 10.nov.2007.

150PORTO, Éderson Garin, CASTRO, Fabio Caprio Leite de & Perottoni, Felipe Luciano. A Lei de Responsabilidade Fiscal e os meios eletrônicos como forma de promoção da transparência fiscal na gestão pública. Jus Navigandi, nº 1080. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8533>. Acesso em: 10.nov.2007; ISMAEL, Ricardo. Do Estado Patrimonial ao Estado Pós-Burocrático: Considerações sobre a Defesa do Interesse Público. Disponível em: <http://www.universia.com.br/materia/img/ilustra/2005/jun/anpuh.doc>. Acesso em: 15.nov.2007; SILVA, Marcos Fernandes Gonçalves da. Op. Cit.; ZIVIANI, Juliardi. 2003. Lei de Responsabilidade Fiscal: planejamento, controle, transparência e responsabilização. Jus Navigandi, edição nº 517. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6026>. Acesso em: 15.nov.2007; MATIAS-PEREIRA, José. Reforma do Estado e transparência: estratégias de controle da corrupção no Brasil. VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8-11 Oct. 2002. Disponível em: <http://bvc.cgu.gov.br/bitstream/123456789/1839/1/0044105.pdf>. Acesso em: 15.nov.2007.

Page 50: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

50

como previsto no art. 165 da CF, não inibindo a abertura de créditos adicionais previstos no art. 166 da CF. Sobre aquela disposição da LRF versava o conteúdo da ADInMC 2.238-DF, ajuizada pelos partidos políticos então de oposição ao governo federal (PCdoB, PT e PSB) cujo posicionamento sobre o diploma tivemos oportunidade de examinar na seção II deste estudo. O art. 15 considera irregulares as despesas que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17, que exigem, para a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarreta aumento da despesa, o impacto orçamentário-financeiro e a declaração de que o aumento tenha adequação orçamentário- financeira com a LOA e compatibilidade com o PPA e a LDO, além de exigir que seus efeitos sejam compensados pelo aumento permanente de receita. Igualmente, o Egrégio Tribunal indeferiu o pedido de suspensão cautelar do Art. 17, considerando que a circunstância de o aumento de despesa continuada estar condicionado à redução ou ao aumento da despesa também em caráter continuado é, à primeira vista, proposição lógica, que não ofende o princípio da separação de Poderes nem o disposto nos artigos citados da CF. A mesma ADInMC 2.238-DF alegava violação do princípio da separação de Poderes e o disposto nos artigos 51, IV, 52, XIII, 99 e 127, § 1º, todos da CF. Por sua vez o principio da transparência, consagrado no Relatório Resumido de Execução Orçamentária e no Relatório de Gestão Fiscal, sobre os quais seus artigos impõem sanções, praticamente não sofreu questionamentos de sua legitimidade na alçada do STF. Comentando o Art. 48 da LRF, Porto et. al. asseveram o seguinte:

A redação do artigo desempenha a representação essencial dos objetivos inspiradores da lei, naquilo que ela possui de mais inovador. Para o alcance e manutenção do equilíbrio fiscal funda-se a idéia de que a transparência auxilia no controle e fiscalização da distribuição de recursos pelas dotações orçamentárias. A transparência é o fio condutor entre o equilíbrio fiscal (objetivo) e o planejamento (operação), como meio mais seguro de auxílio ao controle da gestão fiscal. Nesse sentido é que se vislumbra a importância da previsão de ampla divulgação dos documentos formais e legais de planejamento. Outrossim, não apenas a publicação dos dados de maneira acessível e viável a toda a população traça uma forma de transparência, mas, inclusive, existe o objeto de agregar os interesses do povo de maneira direta. Planta-se, assim, uma semente de maior eficiência, a germinar com a publicidade e transparência dos dados lançados nos instrumentos orçamentários. Decorre daí uma maior qualidade informativa, resultante da confiabilidade e certeza da correção dos dados divulgados, em função da publicação dos dados, da indicação do regime contábil adotado e da participação popular como meio efetivo de controle das aplicações orçamentárias. 151

Como se verifica no terceiro Anexo a este trabalho a alta corte afastou, à primeira vista, a alegada inconstitucionalidade formal dos dispositivos (Art. 26, § 1º, Art. 28, § 2º, Art. 29, § 2º e Art. 39, caput) por ofensa ao estabelecido no art. 192 da CF segundo requerido pela supra-mencionada ADInMC 2.238-DF. O Egrégio Tribunal indeferiu também a cautelar pleiteada contra o Art. 11, parágrafo único por entender juridicamente irrelevante a alegação de ofensa ao art. 160 da CF, uma vez que a norma atacada cuida de transferências voluntárias que não são incompatíveis com restrições impostas aos entes beneficiários das mesmas. Reza aquele preceito constitucional o seguinte:

Art. 160. É vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos, nesta seção, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos.

151PORTO, Éderson Garin, CASTRO, Fabio Caprio Leite de & Perottoni, Felipe Luciano. Op. Cit.

Page 51: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

51

Pelo prisma do conceito de controle da Administração Pública, também pretensamente concretizado no texto da LRF, talvez não se possa afirmar o mesmo que a respeito dos princípios anteriores. E esta “sorte” que a noção teve no entendimento jurisprudencial dos ministros do STF fica ainda mais clara se tivermos em mira a maneira como ele se acha formulado na acepção de Alexandrino & Paulo:

[...] o dever-poder de vigilância, orientação e correção que a própria Administração, ou outro Poder, diretamente ou por meio de órgão especializados, exerce sobre sua atuação administrativa. Garante-se, mediante o amplo controle da Administração, a legitimidade de seus atos, a adequada conduta funcional de seus agentes e a defesa dos direitos dos administrados. O poder-dever de controle é exercitável por todos os Poderes da República, estendendo-se a toda a atividade administrativa (vale lembrar, há atividade administrativa em todos os Poderes) e abrangendo todos os seus agentes. Por esse motivo, diversas são as formas pelas quais o controle se exercita, sendo, destarte, inúmeras as denominações adotadas. 152

Talvez o dispositivo mais relevante daqueles insertos na LRF para habilitar a sociedade e seus representantes no combate à corrupção e à malversação de fundos públicos, o principio do controle talvez tenha sofrido um duro revés dado que o STF indeferiu a suspensão cautelar do art. 51, por entender não caracterizada, à primeira vista, ofensa ao princípio federativo. O dispositivo impugnado pela ADI (MC) 2.250-MG, impetrada pelo então Governador do Estado de Minas Gerais, Itamar Franco – também opositor do governo federal -, determinava aos Estados-Membros e aos Municípios o encaminhamento de suas contas ao Poder Executivo da União, nas datas estabelecidas, para a consolidação das contas dos entes da federação, sob pena de, não o fazendo, terem suspensas as transferências voluntárias de recursos. Ao resguardar o propósito do legislador complementar na letra do texto jurídico em comento, a interpretação do Egrégio Tribunal sinalizou apoio a dispositivos que, em certas leituras, vinculam assimetricamente os entes federados (estados, União, municípios) ao tipo de controle externo previsto nas normas descritas (Ver Anexo 3). Chegamos enfim ao principio da responsabilidade, ou mais tecnicamente, de responsabilização dos governantes, a mais explicita e clara inovação reforçada pelas normas da LRF e sua amplamente conhecida inspiração anglo-saxônica, a noção de “accountability”.

153 A mesma ADIn nº. 2250, sustentava que da forma como está redigido o texto da lei, os Estados e municípios, entes federados que pela CF são autônomos e independentes, terão de prestar contas à União, que não tem qualquer superioridade hierárquica a justificar tal determinação. A prestação anual de contas deve ser feita, conforme previsto na CF, por todos os entes estatais, na forma estabelecida pela respectiva Constituição Estadual ou Lei Orgânica Municipal, respeitadas as diretrizes fixadas na CF. Esta, por sua vez, não contém a determinação do art. 51 da LRF, que extrapolou os limites de seu campo de atuação. O órgão responsável pela fiscalização e controle orçamentário e financeiro de cada ente da Federação é o respectivo Poder Legislativo, auxiliado pelo Tribunal de Contas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este paper muito nos esclareceu acerca dos temas a que se propôs investigar. A começar pela descoberta – um tanto óbvia porém nem sempre evidente – de um vínculo indissolúvel entre

152Alexandrino, Marcelo e PAULO, Vicente. Op. Cit., pp. 522-523. 153PORTO, Éderson Garin, CASTRO, Fabio Caprio Leite de & Perottoni, Felipe Luciano. Ibidem.; Alexandrino,

Marcelo & PAULO, Vicente. Op. Cit., pp. 494 Et. seq.

Page 52: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

52

corrupção política e endividamento do setor público brasileiro. Mas ela foi bem além das nossas expectativas iniciais, como relataremos a seguir. Os dois problemas, cuja forma e conteúdo foram enunciadas e examinadas na Seção I e desdobradas na Seção II, ofereceram a matéria ou substância a ser regulada pela LRF e pelos atos e dispositivos jurídicos a ela relacionados. As confusões e desinformações a respeito dos propósitos ou intentos a que serviriam de fato as Leis Complementares de nº. 82, 96 e 101 (as três “LRFs”) refletem ao que pudemos apurar tanto a ignorância e incapacidade de nossas classes políticas quanto o despreparo de nossos cidadãos. Pois, se é possível falar de Leis de

Responsabilidade Fiscal no plural, como fizemos aqui, também é correto referir a uma pluralidade de objetivos a que os mesmos diplomas jurídicos em comento possam servir. Combater a corrupção no setor público seria um deles, mas nem por isso o mais relevante como demonstramos por nossa discussão da “crise fiscal do Estado”. Nesta altura de nossas investigações já nos haviam se tornado suficientemente evidentes e incontornáveis as conseqüências econômico-financeiras da presença e da atuação dos “amigos do rei” na sociedade brasileira contemporânea. A propensão arraigada e pervasiva de nossos agentes políticos a depredar a coisa pública e a enveredar por cursos anti-jurídicos de ação, estaria minando efetivamente a saúde das instituições do Estado de Direito no Brasil. Em jogo estariam a solidez (ou falta desta!) dos princípios de impessoalidade, de razoabilidade e transparência na Administração Publica, como enfatizamos ao longo da Seção I obtendo para esta tese a confirmação dos agentes cujas percepções e interpretações foram expostas subsequentemente. Algo que em termos da abordagem neoinstitucional de autores como North (1981, 1990) e Olson (1982, 2000), ainda não alcançamos um arranjo institucional eficiente para fundamentar o melhor desempenho de nossa economia e de nossas finanças. Via de regra, a posição dos prefeitos e governadores foi de crítica, oposição e mesmo de resistência à implementação da Lei de Responsabilidade Fiscal, seja imediata ou gradual. Como vimos na Seção III, a extensão e o sentido desta atitude dos agentes públicos eleitos face à conformação ou concreção assumida pelos princípios de transparência, planejamento, controle e responsabilidade com a promulgação da LRF foi dada pelas diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIns) ajuizadas no Supremo Tribunal Federal contra seus artigos. Vários motivos podem ser apontados para esta rejeição ao novo diploma legal aprovado pelo Congresso, dentre as quais a mais plausível seria a de que a nova legislação não estabelecia clausulas de transição ao passo em que vincula os titulares dos novos cargos de chefia do poder executivo municipal, eleitos em outubro de 2000 e que mal haviam acabado de tomar posse quando foi ratificada a Lei Complementar de no. 101/00. Gerou graves repercussões sociais e políticas a assunção pelos governantes eleitos a partir daquele momento de responsabilidade civil e penal objetiva, estabelecida por esta, e subjetiva, fixada pela Lei no. 10.028/00. Nesse ínterim, tornou-se de particular interesse para este paper o caso de São Paulo, maior cidade brasileira, e cuja administração em tempos recentes vem sendo considerada pela imprensa, pelos meios políticos e pela sociedade civil como um paradigma em matéria de irresponsabilidade fiscal, corrupção e desvirtuamento da coisa pública. Vimos no caso paulistano, devidamente examinado pelos especialistas elencados em nossas discussões o quanto o endividamento e o déficit do setor público se acham intrinsecamente vinculados na pratica de nossos representantes políticos. O conceito sociológico de “patrimonialismo”, exposto preteritamente, ganhou aqui uma das suas mais precisas e acabadas ilustrações e corroborações. Ademais o emprego deste referencial analítico nos permitiu discernir certas perplexidades identificadas por interpretes e operadores do Direito, ao verificar a existência de duas matérias (endividamento público e corrupção política), nem sempre distinguíveis factualmente, porém reguladas pelo mesmo conjunto de normas e diplomas legais. E vimos que a questão material do endividamento se revelou bem mais contundente no debate público,

Page 53: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

53

sobrepujando e subsumindo o tema da corrupção política na visão dos juristas. Sendo a “crise fiscal” do Estado brasileiro determinante na ratificação da Lei Complementar de nº 101/00, isto talvez esclareça por que os legisladores preferiram desmembrar do PLRF os artigos referentes a matéria penal remetê-los a legislação ordinária, ratificada por sua ver como a Lei nº. 10.028/00. Com isso, poderia afirmar-se, parafraseando pela ultima vez Raymundo Faoro que os “amigos do rei”, uma vez mais, resistiram com sucesso a mudanças no status quo que pudessem colocar em xeque suas posições de renda, prestigio e poder. Muito sub-reptíciamente, uma válvula de escape acabara de ser implantada no “regime de gestão fiscal responsável” pelos mesmos legisladores. Vimos, contudo, que o jogo de responsabilização fiscal, estabelecido entre os três poderes a nivel estadual e federal, ora favorecendo a corporativização ora a judicialização das decisões e dos resultados (outcomes) políticos é o que de fato se acha por trás do equilíbrio observado ao longo desta década de LRF. O contraste entre o rigor e a amplitude da LRF e de seus artigos e a alegada precariedade de seus fundamentos constitucionais se tornou bastante patente com o exame das ADIns e dos argumentos mobilizados para sustentá-las ou desqualificá-las doutrinariamente. Ao discutirmos estas questões, passamos à opinião da classe jurídica que é a que mais de perto nos toca. O que fizemos no terceiro capítulo. Ao invés de simplesmente opor uma idéia doutrinária a outra pretendíamos ali examinar os efeitos concretos produzidos pelo ato normativo sobre as Personalidades jurídicas de Direito Público por ela vinculadas desde sua publicação no Diário Oficial da União. Contudo, limitamo-nos por razoes de espaço e tempo disponíveis a enunciar as percepções dos agentes políticos e sociais afetados pelo status quo tributário e fiscal inaugurado em 5 de maio de 2000, mas prefigurado em atos normativos (a começar pela CF) com mais de uma década de antecedência e variados graus de rigor e abrangência. Ficou bastante evidente a vitória dos argumentos e teses associadas a uma interpretação restritiva do instituto da Lei Complementar na regulação infraconstitucional de matérias de Direito Tributário e Finanças Públicas. Não se pode dizer claramente, entretanto, se a defesa irrestrita das clausulas pétreas da Carta Política pelo STF (federalismo e separação de poderes) representou uma derrota no combate à corrupção e ao endividamento do setor público. De fato, não pudemos confrontar os dispositivos do texto os com resultados fiscais e financeiros dos Estados e dos Municípios, principais alvos das prescrições administrativas, fiscais e penais contestadas nas ADIns, ao longo do período de vigência da Lei Complementar de nº 101 e de suas predecessoras, as Leis Camata I e II. Com isso ganhariam um outro sentido e alcance as determinações do STF acerca dos artigos invalidados ou mantidos do texto da lei, bem como iluminam-se as hipóteses de interpretação da mesma segundo a letra e o espírito da Constituição Federal de 1988. Dada a eficácia erga omnes e ex nunc das decisões tomadas pelos ministros de nossa alta corte constitucional, poderíamos gerar novos conhecimentos a respeito dos fins a que veio de fato servir a hoje extensa e complexa legislação complementar e ordinária de responsabilização fiscal existente no Brasil, bem como auferir a concreção dos princípios e conceitos sobre os quais fora alicerçada. Daí que, não há como saber a priori com quem estaria a maior parcela da verdade no debate doutrinário e jurisprudencial desencadeado pelas “LRFs”, muito embora estejamos inclinados, por princípio, a endossar as conclusões e as premissas da vertente “tricotômica” acerca da interpretação dos dispositivos da Lei Complementar 101, dotando-os de eficácia e legitimidade auto-aplicável. Estamos com isso querendo afirmar que se por um lado as normas e prescrições insertas nas “LRFs” não podem ser vistas como uma panacéia, por outro, não são totalmente inócuas, redundantes e ineficientes em face da realidade do estado de coisas que pretendeu modificar e do ordenamento jurídico que intentou complementar. O enfrentamento do “patrimonialismo” na década final do século XX por certo não terminou nem pode ser tida como certa sua definitiva erradicação a médio e longo prazos, dadas as

Page 54: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

54

hesitações e a fraqueza de vontade de nossos representantes. E mais ainda dos próprios cidadãos. Pois o tipo de mudanças de que estamos falando não se esgota nas reformas a nível meramente legal e institucional, por maior que seja o empenho das autoridades em mobilizar os institutos legais corretos e adequados para conformar os princípios jurídico-sociais desejados pela sociedade brasileira.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRANCHES, Sérgio. 1988. Presidencialismo de coalizão: o dilema institucional brasileiro. Dados/RJ, 31 (1), p. 5-33. ABRUCIO, Fernando. Lei Fiscal não é tudo ou nada, diz especialista. Entrevista. O Estado de S. Paulo, 27. Jul. 2004. Disponível em: <http://clipping.planejamento.gov.br /Noticias.asp?NOTCod=139466>. Acesso em: 20.Out.2007. AJUSTES à Lei Camata não devem provocar demissões. Disponível em: <http://www1.an.com.br/1999/fev/18/0pot.htm>. Acesso em: 27 set. 2007. ALESINA, Alberto e SUMMERS, Lawrence. 1993. “Central Bank Independence and Macroeconomic Performance: Some Comparative Evidence”. Journal of Money, Credit, and Banking 25:151-162. Alexandrino, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Administrativo. 5ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2007. AMORIM NETO, Octavio & BORSANI, Hugo. 2004. Presidents and Cabinets: The Political Determinants of Fiscal Behavior in Latin America. Studies in Comparative International Development, Berkeley, CA, E.U.A., v. 39, n. 1, p. 3-27. AMORIM Neto, Octavio. 1998. Of presidents, parties, and ministers: cabinet formation and legislative decision-making under separation of powers.PhD Thesis, California. Arbache, J. S. . Unions and Wage Inequality in Brazil. XXIV Encontro Brasileiro de Econometria, 11a13/12/2002. Nova Friburgo/RJ. Disponível em: http:// www. sbe. org. br/ ebe24/012.pdf ASAZU, Claudia Yukari. Os Caminhos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF): Instituições, Idéias e Incrementalismo. 2003. (Administração Pública e Governo) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo. BARBOSA, Rui Rogério Naschenweng. Apresentação. In: CRUZ, Flávio da (Coord.). Lei de responsabilidade fiscal comentada: a lei complementar n 101, de 4 de maio de 2000. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 7. Barros da Cunha, A. 2003. Optimal Exchange Rate Policy, Optimal Incomplete Taxation and Business Cycles. Trabalho apresentado no XXXI Encontro Nacional de Economia, Porto Seguro/BA, 09-12/12/2003. Disponível em: www.anpec.org.br/encontro2003/ artigos/B16.pdf Bittencourt, J. L. & Hillbrecht, R. O. 2003. Ciclo Político na Economia Brasileira: um Teste para a Execução Orçamentária dos Governos Estaduais- 1983/2000. Trabalho apresentado no XXXI Encontro Nacional de Economia, Porto Seguro/BA, 09-12/12/2003. Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro2003 /artigos / B32 .pdf BLANCO-COSSIO, Fernando. 2001. “Comportamento Fiscal dos Governos Estaduais Brasileiros: Determinantes Políticos e Efeitos sobre o Bem-Estar dos seus Estados”. In Finanças Públicas: Vº Prêmio Nacional, Brasília: Ministério da Fazenda – Tesouro Nacional. BOIX, Charles. 1998. Political Parties, Growth, and Equality: Conservative and Social Democratic Strategies in the World Economy. Cambridge: Cambridge University Press. SILVA, M. Z. ; RODRIGUES, A. T. Crise do Estado e Privatização: um estudo do caso das empresas do Setor Mineral. Vitória/ES: UFES/NEPCS/LEP, 2001 (Relatório de pesquisa).

Page 55: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

55

BONIFÁCIO, José Roberto. (2005), A Grande Transformação, 60 Anos Depois: a Agenda Polanyiana e as Ciências Sociais. Trabalho apresentado no XXIX Encontro Anual da ANPOCS, 25 a 29 de outubro de 2005- GT23 - Sociologia econômica. Caxambu / MG, Outubro de 2005. _____________________. (2006), Para uma Economia Política do Presidencialismo de Coalizão: Governança Regulatória, Ciclos Eleitorais e Intermediação de Interesses no Setor Petrolífero Brasileiro. Rio de Janeiro/RJ: IUPERJ. (Dissertação de Mestrado não defedendida) BORSANI, Hugo, 2003. Eleições e economia: instituições políticas e resultados macroeconômicos na América Latina (1979-1998). Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Ed. UFMG; IUPERJ. Brasil fica em 72º em ranking mundial de corrupção, diz ONG. G1-Globo, Disponível em:<http://g1.globo.com/Noticias/Politica/0,,MUL110330-5601,00.html>. Acesso em: 17. Out. 2007. Brasil melhora sua nota em ranking de corrupção, diz ONG. Revista Época, 26. set. 2007. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG79282-6009-488,00.html>. Acesso em: 17. Out. 2007. BRASIL. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE). (1995), Plano Diretor da Reforma do Estado (Plano aprovado pela Câmara da Reforma do Estado da Presidência da República em set. 95). Brasília: Imprensa Nacional, Nov. 1995. Disponível: < http://www.planejamento.gov.br/gestao/conteudo/publicacoes/plano_diretor/portugues.htm>. Acesso em: 20. Out.2007. BRASIL. Ministério do Planejamento e Orçamento. Consulta Pública nº. 1, de 7.Dez.1998. Apresentação do Anteprojeto do Regime de Gestão Fiscal Responsável. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/plc/PLC_APRES.HTM>. Acesso em: 26.Set.2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF, Nº. 206, Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo206.htm>. Acesso em: 30. Out.2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF, Nº. 218. Brasília, 19 de fevereiro a 2 de março de 2001. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo218.htm>. Acesso em: 30. Out.2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF, Nº. 475, Brasília, 6 a 10 de agosto de 2007 . Disponível em: < http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo475.htm >. Acesso em: 30. Out.2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF, Nº. 204, Brasília, 25 a 29 de setembro de 2000 Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo204.htm>. Acesso em: 30. Out.2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF, Nº. 485. Brasília, 22 a 26 de outubro de 2007. Disponível em: < http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo485.htm >. Acesso em: 30. Out.2007. BRASIL. Supremo Tribunal Federal.. Informativo STF, Nº. 267, Brasília, 6 a 10 de maio de 2002. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo267.htm>. Acesso em: 30. Out.2007. BRESSER-PEREIRA, Luiz C. Crise Econômica e Reforma do Estado no Brasil: Para uma nova interpretação da América Latina. 1a ed. São Paulo: Editora 34, 1996.

Page 56: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

56

BRITO, Edvaldo. Lei de Responsabilidade Fiscal: Competência Tributária, Arrecadação de Tributos e Renúncia de Receita. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (org.), Aspectos relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Dialética, 2001. CAMARGOS, Malco B. 1999. Do bolso para as urnas: a influencia da economia na escolha entre Fernando Henrique e Lula nas eleições de 1998.Dissertação (mestrado) - Ciência Política, Rio de Janeiro: IUPERJ, 1999. CAMINOTO, João. Piora posição do Brasil no ranking da corrupção. O Estado de S. Paulo. Disponível em: <http://txt.estado.com.br/editorias/ 2007/09/27/pol-1.93.11.20070927.12.1.xml>. Acesso em: 17. Out. 2007. CAPIBERIBE, João Alberto. Por um país de cara limpa. Folha de S. Paulo, 17.ago.1999. CARDOSO, Fernando Henrique. Mensagem No 627, de 4 de maio de 2000. Anexo Razões dos vetos. In: MADEIRA, José Maria P & GUIMARAES, Marcelo. Lei de Responsabilidade Fiscal. Rio de Janeiro: Editora Espaço Jurídico. CARREIRÃO, Yan de S. 2002. A decisão do voto nas eleições presidenciais brasileiras. Florianopolis Rio de Janeiro: Ed. da UFSC; Ed. da FGV, CASTRO, Célio de. O desafio de romper a cortina de fumaça. Fevereiro/2001 Edição 17. Disponível em: <http://www.cidadesdobrasil.com.br/cgi-cn/news.cgi?cl =099105100097100101098114&arecod=26& newcod =493>. Acesso em: 21.set.2007. Celentano, Alexandrine Brami & Siroën, Jean-Marc. Mondialisation et politique fiscale au Brésil. Le s É t u d e s d u C E R I. N° 140 - décembre 2007. Disponível em: <http://www.ceri-sciences-po.org/publica/etude/etude140.pdf>>.Acesso: 16.abr.08, 12:22. Citadini, Antonio R. Os Municípios e a Crise. Semanário O Prefeito, Ano II, Nº. 75, 15.Out.1998, pp. 10-11. Disponível em:<http://www.citadini.com.br/artigos/pref75.htm>. Acesso em: 27 set. 2007. COMPRA de voto: TSE cassou 215 políticos em 8 anos. O Dia, 28.set.2007. Disponível em: <http://odia.terra.com.br/brasil/htm/geral_125860.asp>. Acesso em: 10.Out.2007. CONTI, José Mauricio. Lei de Responsabilidade Fiscal: Aspectos Jurídicos. Disponível em: <http://www.idtl.com.br/artigos/67.html>. Acesso em: 5.set.2007. Corrupção: Brasil melhora sua nota, mas cai no ranking, Revista Veja, 26 de Setembro de 2007. Disponível em: < http://vejaonline.abril.com.br/notitia/servlet/newstorm.ns.presentation.NavigationServlet?publicationCode=1&pageCode=1&textCode=131676&date=1190842620000>. Acesso em: 17. Out. 2007. Cronologia da Aprovação da LRF. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/lrf/conteudo/fatos_importantes/fatos_importantes.htm>. Acesso em: 26.Set.2007. CRUZ, Flávio da (Coord.), Lei de responsabilidade fiscal comentada: a lei complementar n 101, de 4 de maio de 2000. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2004. CUKIERMAN, Alex, WEBB, Steven & NEYAPTI, Bilin. 1992. “Measuring the Independence of Central Banks and its Effects on Policy Outcomes”. The World Bank Economic Review 6:353-398. Decisão do STF sobre LRF aumenta ambiente de incerteza, avalia CNI. Folha Online, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u47077.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. DERZI, Misabel Abreu Machado. Arts 40 a 47. In: MARTINS, Ives Gandra da S. & NASCIMENTO, Carlos Valder. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001. DESDE 2000, 623 políticos foram cassados no País, Portal Terra, 5.Out.2007. Disponível em:<http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI1965447-EI7896,00.html>; Acesso em: 10.Out.2007.

Page 57: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

57

DESDE 2000, 623 políticos foram cassados. DEM lidera ranking. O Globo Online 04.Out.2007. Disponível em:<http://oglobo.globo.com/pais/mat/2007/10/04/298003467.asp>. Acesso em: 10.Out.2007. DUTRA, Olívio. Cristão e marxista. Entrevista. Revista Veja. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/280499/p_013.html> Acesso em: 20.out.2007. E-CAMARA. Consulta Tramitação das Proposições: PLC 18/1999 (Anteprojeto da LRF). Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/fiquePorDentro/Temasatuais/orcamento_uniao/legislacaofederal.html >. Acesso em: 26.Set.2007. FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. Rio de Janeiro: Globo, 1973. FERNANDES, Cândido Luiz de Lima e BICALHO, Ronaldo Goulart. Unificação européia: os limites do possível. Nova Economia, Belo Horizonte: UFMG, 1994 N. 1. Ferreira, Ivan Fecury Sydrião & Bugarin, Maurício Soares. . "Ciclo Político-Orçamentário no Federalismo Fiscal Brasileiro: O Papel das Transferências Voluntárias no Resultado das Eleições Municipais" XXVI Encontro Brasileiro de Econometria 10, 11 e 12 de dezembro de 2004. João Pessoa/PA http://www.sbe.org. br/ ebe26/027.pdf FIGUEIREDO, Argelina & Limongi, Fernando. 1999. Executivo e legislativo na nova ordem constitucional. Rio de Janeiro: FGV Ed. Figueiredo, Carlos Mauricio, FERREIRA, Cláudio, RAPOSO, Fernando, BRAGA, Henrique e Nóbrega, Marcos. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ª ed., rev., atualiz. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. FRANCO, Gustavo H. B. Um mínimo de racionalidade. O Estado de S. Paulo, 20.fev.2000. Disponível em:<http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a51.htm>. Acesso em: 27 set. 2007. FRANCO, Gustavo H. B. A revolução fiscal apenas começou. O Estado de S. Paulo e Jornal do Brasil, 13.Fev.2000. Disponível em: < http://www.econ.puc-rio.br/gfranco/a50.htm >. Acesso em: 27.Set.2007. FRANCO, Gustavo H. B. Fundos de pensão estaduais: armadilhas a evitar. 24.ago.1999. Disponível em:<http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos /imprensa/oglb990824.asp>. Acesso em: 27 set. 2007. FREITAS, Silvana de. Judiciário pede que FHC evite corte. Folha de S.Paulo, 27.mar.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17629.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. FREITAS, Silvana de. Ministro do STF vê casuísmo em MP pró-Marta. Folha de S.Paulo, 17.mar.2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u67887.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. GARRETT, Geoffrey. 1998. Partisan Politics in the Global Economy. Cambridge University Press, p. 1-50 e 106-120. GEDDES, Bárbara. (1990), "How the Cases You Choose Affect the Answers You Get: Selection Bias in Comparative Politics". In Political Analysis, edited by J. Stimson. Ann Arbor: University of Michigan, 131-150. GRABOIS, Ana Paula. Secretário da Fazenda do RJ pede reforma na Lei de Responsabilidade. Folha Online. 09.jan.2003. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u44573.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. GREGGIANIN, Eugenio. O Programa de Estabilidade Fiscal e o papel do Congresso Nacional. Cadernos ASLEGIS/ Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. Vol. 1, Brasília: ASLEGIS, 1997. HAGGARD, Stephan e Mathew D. McCUBBINS (orgs.). 2001. Presidents, Parliaments, and Policy. New York: Cambridge University Press.

Page 58: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

58

HARDIN, Garrett. The Tragedy of the Commons. Science, 13 December 1968: Vol. 162. No. 3859, pp. 1243-1248.Disponível em: <http://www.sciencemag.org/cgi/content/full/162/3859/1243>.Acesso: 16.abr.08, 12:22. HIBBS, Douglas. 1977. “Political Parties and Macroeconomic Policy”. American Political Science Review 71:1467-1487. HORVATH, Estevão. A Constituição e a Lei Complementar No 101/2000 (“Lei de Responsabilidade Fiscal”). Algumas questões. In: ROCHA, Valdir de Oliveira.(Org.), Aspectos relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Dialética, 2001. Instituto de Fiscalização e Controle (IFC). Projeto Adote um Município – A1M, Caravana 'Todos Contra a Corrupção', Projeto de Capacitação à Distância, Projeto de Certificação de Programas. Disponível em: <http://www.ifc.org.br/bancodados/index.php>. Acesso em: 10. Out.2007. ISMAEL, Ricardo. Do Estado Patrimonial ao Estado Pós-Burocrático: Considerações sobre a Defesa do Interesse Público. Disponível em: <http://www.universia.com.br/materia/img/ilustra/2005/jun/anpuh.doc>. Acesso em: 15.nov.2007. ISSLER, J. V., Mello Franco, A. A. & Guillén, O. T. de C. . On the Welfare Costs of Business Cycles in the 20th Century. http://www.sbe.org.br/ebe24/066.pdf] JESUS, Damásio de. Arts. 1º e 2º. Adendo Especial Lei de Crimes Contra as Finanças Públicas, In: MARTINS, Ives Gandra da S. & NASCIMENTO, Carlos Valder. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001, pp. 603-629. JONES, Mark, Pablo SANGUINETTI e Mariano TOMMASI. 1999. “Politics, Institutions, and Fiscal Performance in a Federal System: An Analysis of the Argentine Provinces”. Journal of Development Economics 61:305-333. Judiciário cortará R$ 32,5 milhões a menos do que determinado. Folha Online, 03.abr.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17990.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. JUSTIÇA cassou 623 mandatos desde 2000 por crime eleitoral, diz pesquisa, Folha Online 04.out.2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u333863.shtml>. Acesso em: 10.Out.2007. KHAIR, Amin. Lei de Responsabilidade Fiscal: guia de orientação para as prefeituras. Brasília: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; BNDES, 2000. LAGE, Janaina. MP 237 foi criada para reduzir dívidas dos municípios, diz Levy. Folha Online, 17.mar.2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u94487.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. LEI de Responsabilidade deve ser mudada pelo Supremo. Folha de S.Paulo, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u32367.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. LEI Fiscal é Aprovada no Senado. 12. Abr. 2000. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/lrf/conteudo/lrf_midia/lei_fiscal_aprovada4-00.htm>. Acesso em: 26.Set.2007. Leoni, Eduardo & Rennó,. Lucio R. Lei de Responsabilidade Fiscal e Reeleição: Incentivos à Disciplina Fiscal. I Seminário Federalismo, Descentralização e Políticas Públicas no Brasil, 5 de dezembro de 2008, Secretaria do Planejamento do Estado da Bahia - SEPLAN, Universidade Federal da Bahia - UFBA/Centro de Recursos Humanos - CRH e FLEM. Disponível em: <http://aplicativos.flem.org.br/sie/arquivos/lucio_renno.pdf>.Acesso: 16.abr.08, 12:22. Libanio, R. de C. & Menezes Filho, N. A. de. 2003. Indicadores Sociais e Desempenho nas Eleições Estaduais. Trabalho apresentado no XXXI Encontro Nacional de Economia, Porto Seguro/BA, 09-12/12/2003. Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro2003/ artigos/ F34. pdf

Page 59: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

59

LIJPHART, Arend. 1999. Patterns of Democracy: Government Forms and Performance in Thirty-Six Countries. New Haven: Yale University Press. LIMA, Manuel Messias Pereira e LIMA, Ana Luiza Pereira. A lei de responsabilidade fiscal: prática e teoria. Rio de Janeiro: Forense, 2002. LONDERO, Daiane; MARCHIORI NETO, Daniel Lena & VELOSO, Gilberto de Oliveira. A lei de responsabilidade fiscal nos municípios do Rio Grande do Sul: um estudo jurídico-econômico. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/ texto.asp?id=8235>. Acesso em: 27 set. 2007. Lozardo, Ernesto. Uma Lei Fundamental. O Estado de São Paulo, 14.abr. 1999. Disponível em: <http://www.fgvsp.br/academico/professores/Ernesto_Lozardo/Artigos/Real043.htm >. Acesso em: 27 set. 2007. MADUEÑO, Denise. Pefelistas querem limite para perdas dos Estados. Folha de S. Paulo, 26.fev.1999, p. 1-7. MAIS de 600 políticos foram cassados por corrupção em seis anos, Agência JB 04.Out. 2007. Disponível: <http://jbonline.terra.com.br/extra/2007/10/04/e041013960.html> Acesso em: 10.Out.2007. MALAN, Pedro S. Transcrição da entrevista do ministro da Fazenda ao jornalista Bóris Casoy, no programa Passando a Limpo da TV Record. 16.maio.99.. Disponível em: <http://www.fazenda.gov.br /portugues/documentos/ 1999/P990516.asp>. Acesso em: 27 set. 2007. MANFRINI, Sandra. Fazenda diz que essência da LRF está mantida após decisão do STF. Folha Online, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u32373.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. MARTINS, Ives G. da S. Prefácio. In: MARTINS, Ives Gandra da S. e NASCIMENTO, Carlos Valder. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001, pp. xxxi-xxxii. MARTINS, Ives G. da S. Sistema Tributário na Constituição de 1988. 5ª ed. rev. e atualiz. São Paulo: Saraiva. MARTINS, Ives G. da S. Os Fundamentos Constitucionais da Lei de Responsabilidade Fiscal nº 101/2000. In: ROCHA, Valdir de Oliveira. (Org.), Aspectos relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Dialética, 2001. MARTINS, Ives G. da S. Prefácio à 1ª edição. In: Figueiredo, Carlos Mauricio, FERREIRA, Cláudio, RAPOSO, Fernando, BRAGA, Henrique e Nóbrega, Marcos. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ª ed., rev., atualiz. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. MARTINS, Ives G. da S. Reforma do Estado e transparência: estratégias de controle da corrupção no Brasil. VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8-11 Oct. 2002. Disponível em: <http://bvc.cgu.gov.br/bitstream/123456789/1839/1/0044105.pdf>. Acesso em: 15.nov.2007. MARTINS, Ives G. da S. Sistema Constitucional Tributário. .In: Curso de Direito Tributário. 4 ed. Belém: CEJUP. 1995, Vol. 1. MATIAS-PEREIRA, José. Finanças Públicas: A política orçamentária no Brasil. 1ª. ed. São Paulo: Atlas, 1999. MELLO, Marcus A. A Política da Reforma do Estado no Brasil: issue areas e processo decisório da reforma previdenciária, administrativa e tributária. Trabalho preparado para o seminário The Political Economy of Administrative Reform in Developing Countries, 5-6 Junho de 1997, CIDE/Northwestern University, Cidade do México. MENDES, Gilmar Ferreira. Advogado-Geral da União. MEMORIAL - Aditivo, 04.Out.2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_17/ MemorialAGU2.htm>. Acesso em: 5.set.2007.

Page 60: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

60

Menezes Filho, N. A., Zylberstajn, H., Chahad, J. P. & Pazello, E.. Trade Unions and the Economic Performance of Brazilian Establishments. XXIV Encontro Brasileiro de Econometria, 11a13/12/2002. Nova Friburgo/RJ. http://www.sbe.org.br/ ebe24/092.pdf MIGNONE, Ricardo. Governador do ES pede a Lula R$ 300 mi para pagar funcionalismo. Folha Online, 07.jan.2003 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u44491.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. Mileski, Helio Saul. O Controle da gestão Pública. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003. Ministério diz que Poderes vão pagar multa se não cortarem gastos. Folha de S.Paulo, 24.fev.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u15951.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. MONTEIRO, Iara Darcy Police. Breves Anotações sobre Disposições da Lei Complementar n 101, de 4.5.00. In: QUADROS, Cerdonio. (Org), Responsabilidade fiscal: estudo e orientações – uma primeira abordagem. São Paulo: NDJ, 2001. Morais, I. A. C. de & Portugal, M. S. O. . Business Cycle in the Industrial Production of Brazilian States. XXXI Encontro Nacional de Economia: Porto Seguro/ BA, 09-12/12/2003 [http://www.anpec.org.br/encontro2003/ artigos/E75.pdf] MOTTA, Carlos Pinto Coelho da, SANTANNA, Jair Eduardo, FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby e ALVES, Léo da Silva. Responsabilidade Fiscal: Lei Complementar 101, de 04/05/2000. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Políticos Cassados por Corrupção Eleitoral. Disponível em: <http://www.lei9840.org.br/politicoscassadosdossie.pdf>. Acesso em: 10. Out.2007. NASCIMENTO, Edson Ronaldo & DEBUS, Ilvo. Entendendo a Lei de Responsabilidade Fiscal. 2ª ed. atualizada. Disponível em: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br/hp/downloads/EntendendoLRF.pdf>. Acesso em: 18. Out.2007. NASCIMENTO, Edson Ronaldo. Três Anos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Disponível em: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br/hp/downloads/lrf3Ed.pdf >. Acesso em: 26.Set.2007. NOGUEIRA, José Geraldo Ataliba. Normas gerais de direito financeiro e tributário e autonomia dos Estados e Municípios: Limites à norma geral – Código Tributário Nacional. In: Revista de Direito Público nº. 10, Jul-Set de 1969, São Paulo, ed. Revista dos Tribunais, pp. 45-80. NORDHAUS, William. 1975. “The Political Business Cycle”. Review of Economic Studies 174:169-190. NORTH, Douglass C. 1981, Structure and Change in Economic History. New York; London: W. W. Norton & Company. _________________. 1990, Institutions, institutional change and economic performace. Cambridge: Cambridge Univ. Press. NORTH, Douglass C., & WEINGAST, Barry R. 1989. "Constitutions and Commitment: The Evolution of Institutions Governing Public Choice in Seventeenth-Century England." The. Journal of Economic History 49: 803-32. OLSON, Mancur. 1982. The rise and decline of nations: economic growth, stagflation, and social rigidities. New Haven: Yale University Press, p. 17-74. ________________. 2000. Power and Prosperity: Outgrowing Communist and Capitalist Dictatorships. New York: Basic Books. OSTROM, Elinor. Governing the commons: the evolution of institutions for collective action. Cambridge University Press, c1990. PARENTE acredita que LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL será decisiva para a Mudança do Regime Fiscal brasileiro. Disponível em: < http://www.planejamento.gov.br/orcamento/conteudo/noticias/parente_acredita.htm>. Acesso em: 26.Set.2007.

Page 61: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

61

PARENTE, Pedro, MALAN, Pedro e ORNELLAS, Waldeck. Exposição de Motivos dos Ministros ao Presidente Fernando Henrique Cardoso. In: MARTINS, Ives Gandra da S. e NASCIMENTO, Carlos Valder. Op. Cit., pp. 1-8. PELICIOLI, Angela Cristina. Comentários aos tipos penais previstos na lei dos crimes de responsabilidade fiscal. São Paulo: LTR, 2001. PEREIRA, César A. Guimarães. O Endividamento Público na Lei de Responsabilidade Fiscal. In: ROCHA, Valdir de Oliveira.(Org.), Aspectos relevantes da Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Dialética, 2001. PETERS, B. Guy. 1999, Institutional theory in political science: the 'new institutionalism'. London; New York: Pinter. PIERSON, Paul. Politics in time: history, institutions, and social analysis. Princeton University Press, c2004. Poder Judiciário pede que FHC evite corte no orçamento. Folha de S.Paulo, 27.mar.2001 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17616.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. PORTO, Éderson Garin, CASTRO, Fabio Caprio Leite de & Perottoni, Felipe Luciano. A Lei de Responsabilidade Fiscal e os meios eletrônicos como forma de promoção da transparência fiscal na gestão pública. Jus Navigandi, nº 1080. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8533>. Acesso em: 10.nov.2007. PROJETO prorroga prazo da Lei Camata. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/secs_inter/noticias/senamidia/historico/1999/5/ zn051213. htm>. Acesso em: 27 set. 2007. Propinas custam US$ 1 trilhão por ano, mostra Bird; Brasil tem pior marca de corrupção em 10 anos, Valor Online, 11. jul. 2007. Disponível em: <http://www.valoronline.com.br/valoronline/Geral/brasil/ Propinas+custam+ US$+1+trilhao+por+ano+mostra+Bird+Brasil+tem+pior+marca+de+corrupcao+em+10+anos,,,5,4413535.html>. Acesso em: 17. Set. 2007. PRZEWORSKI, A., ALVAREZ, M., CHEIBUB, J. E. & LIMONGI, F. (2000), Democracy and development: political institutions and well-being in the world, 1950-1990. Cambridge: Univ. Press. PRZEWORSKI, A., ALVAREZ, M., CHEIBUB, J. E. & LIMONGI, F. 2000. Democracy and development: political institutions and well-being in the world, 1950-1990. Cambridge: Univ. Press. PRZEWORSKI, Adam. 2004. “Some Historical, Theoretical, and Methodological Issues in Identifying the Impact of Political Institutions". Disponível: http://www. nyu.edu /gsas /dept /politics/ faculty/przeworski/papers/PRAGUE.PDF. Acesso: Tue, 6 Sep 2005 19:56:38. PUTTOMATI, Giulia da Cunha Fernandes Os dois anos de implementação da lei de responsabilidade fiscal no Brasil: avanços e desafios. Trabalho apresentado no VII Congresso Internacional do CLAD sobre a Reforma do Estado e da Administração Pública Disponível em: <http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/CLAD/clad0044115.pdf >. Acesso em 22.set.2007. REMMER, Karen & WIBBELS, Erik. 2000. “The Subnational Politics of Economic Adjustment: Provincial Politics and Fiscal Performance in Argentina”. Comparative Political Studies 33:419-451. REZENDE, Flávio da Cunha. 1997. “Descentralização, Gastos Públicos e Preferências Alocativas dos Governos Locais no Brasil (1980-1994)”. Dados, vol. 40, n º 3. SADDY, André. Lei de responsabilidade fiscal e democratização da gestão pública. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4006>. Acesso em: 26.Set.2007.

Page 62: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

62

SANTOS, F. G. M. A Constituição de 1988 e a República Presidencialista : uma análise de três obras sobre dilemas institucionais no Brasil contenporâneo. Saúde e Direitos Humanos, v. 2, p. 35-44, 2005. SANTOS, F. G. M.; BOSCHI, Renato; DINIZ, Eli. Elites Políticas e Econômicas no Brasil Contemporâneo. 1ª. ed. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2000. v. 1. 118 p. Santos, Fabiano. IUPERJ: STF LIDERA OPOSIÇÃO CONTRA LULA. Entrevista a Paulo Henrique Amorim. 25/10/2007 10:23h. <http://conversa- afiada.ig. com.br/>. SANTOS, Wanderley G. dos. 1994. Regresso: máscaras institucionais do liberalismo oligárquico. Rio de Janeiro: Opera Nostra. SILVA, Marcos Fernandes Gonçalves da. A economia política da corrupção. São Paulo: Revista de Administração de Empresas, v. 39, nº. 3, 1999. Disponível em: <http://bvc.cgu.gov.br/bitstream/123456789/1616/1/MFernandes1.pdf> e em: <http://www.rae.br/rae/index.cfm?FuseAction=Artigo&ID=165&Secao=P%C3%9ABLICA&Volume=39&numero=3&Ano=1999>. Acesso: 15.nov.2007. STEIN, Ernesto, TALVI, Ernesto & GRISANTI, Alejandro. 1999. “Institutional Arrangements and Fiscal Performance: The Latin American Experience”. In Fiscal Institutions and Fiscal Performance, orgs. James Poterba e Jurgen von Hagen. Chicago: The University of Chicago Press. STF abre brecha para endividamento mas governo contesta interpretação. Folha Online, 10.maio.2002. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u47067.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. STF discute cortes com presidentes dos tribunais superiores. Folha Online, 29.mar.2001. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u17794.shtml>. Acesso: 10.nov.2007. STOKES, Susan C. 2001. Mandates and democracy: neoliberalism by surprise in Latin Latin America. Cambridge: Cambridge University Press. Supremo libera Sergipe de punição da Lei Fiscal. 13.Nov.2007. Disponível em: <http://br.noticias.yahoo.com/s/13112007/25/politica-supremo-libera-sergipe-puni-da-lei-fiscal.html>. Acesso: 10.nov.2007. TAVARES, Martus. Fazendo o dever com responsabilidade. Folha de S. Paulo, 11.jan.2001, p. A3. TAVARES, Martus. & AFONSO, José Roberto R. Por quê dizer não à irresponsabilidade. Folha de S. Paulo, 18.mar.2001, p. A2. Disponível em: <http://www.mp.gov.br/lrf/conteudo/lrf_midia /artigo _porque_dizer_nao.htm>. Acesso em: 27 set. 2007. TAVARES, Martus. Discurso proferido na cerimônia de Sanção da Lei de Responsabilidade Fiscal, no Palácio do Planalto. Brasília, 04.maio.2000. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/lrf/conteudo/publicacoes/DISCURSO.HTM>. Acesso em: 26.Set.2007. TAVES, Rodrigo França. Demissões devem ser a última opção. Disponível em: <http://www.senado. gov.br/secs_inter/noticias/senamidia/historico/1998/10/zn102927.htm>. Acesso em: 27 set. 2007. TSE cassou 215 políticos em oito anos. Agência JB, 28. set. 2007. Disponível: <http://jbonline.terra.com.br/extra/2007/09/28/e280912476.html>. Acesso em: 10.Out.2007. VELTEN, Simone Reinholz. A Participação Popular no Processo de Planejamento, Execução e Fiscalização do Cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal: Estudo de Caso com as Prefeituras e Câmaras Municipais do Estado do Espírito Santo. Brasília: ESAF, 2005. Monografia não premiada apresentada no X Prêmio Tesouro Nacional 2005. Disponível em: < http://www.tesouro.fazenda.gov.br/Premio_TN/xPremio/catalogo2_xpremio.htm#VELTEN27>. Acesso em: 26.Set.2007..

Page 63: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

63

VIANNA, L. J. W. (Org.). A Democracia e os Três Poderes no Brasil. 1º. ed. Belo Horizonte-Rio de Janeiro: Editora UFMG (Belo Horizonte); IUPERJ/FAPERJ (Rio de Janeiro), 2002. VIANNA, L. J. W.; CARVALHO, Maria Alice Rezende de; MELO, Manuel Palacios Cunha ; BURGOS, Marcelo Baumann. A Judicialização da Política e das Relações Sociais no Brasil. 1a.. ed. Rio de Janeiro: Editora Revan, 1999. WAY, Christopher. 2000. “Central Banks, Partisan Politics, and Macroeconomic Outcomes”. Comparative Political Studies 33:196-224. WEBER, Max. Burocracia e Classe, estamento, partido. In: GERTH, H. H. & MILLS C. W. (Eds.) Ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1979. pp. 211-228. WEBER, Max. Os três tipos puros de dominação legítima. In COHN, Gabriel (org.). Weber. Col. Grandes Cientistas Sociais n. 13. São Paulo: Ática, 1982: pp. 128-141. WEINGAST, Barry. 1995. “The Economic Role of Political Institutions: Market-Preserving Federalism and Economic Development”. Journal of Law, Economics, and Organization 11:1-31. WIBBELS, Erik. 2000. “Federalism and the Politics of Macroeconomic Performance”. American Journal of Political Science 44:687-702. Zimmermann, Gustavo. Prefeituras entre a cruz e a espada. Entrevista concedida ao Jornal da Unicamp. Disponível em: <http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ ju/agosto2002/unihoje_ju186pag2a.html>. Acesso em: 20.out.2007. ZIVIANI, Juliardi. Lei de Responsabilidade Fiscal: planejamento, controle, transparência e responsabilização. Jus Navigandi, edição nº 517. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6026>. Acesso em: 15.nov.2007. <http://www.tede.ufv.br/tedesimplificado/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1213> < http://www.anpad.org.br/enanpad/2004/dwn/enanpad2004-gpg-2345.pdf . <http://www.congressocfc.org.br/hotsite/trabalhos_1/303.pdf>. <http://imap.org.br/files/imap/PPP/REFERENCIAS/PPP%20compreeendendo%20o%20modelo%20brasileiro.pdf > < http://www.bibliotecadigital.ufba.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1240>

Page 64: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

ANEXO Nº. 1:

RELAÇÕES EXECUTIVO/LEGISLATIVO NO BRASIL: SÍNTESE DOS PRINCIPAIS ARGUMENTOS, HIPÓTESES E TEORIAS DA LITERATURA Dimensões ou

Termos de Comparação

Autores

Ames Samuels Rojas de Carvalho Santos, F. Pereira / Mueller /

Rennó Figuereiredo &

Limongi Proposta Alternativa

(Síntese)

Unidade analítica (Relações

Macro/Micro)

Parlamentares individuais

Parlamentares individuais

Parlamentares individuais (Blocos ou conjuntos

ideal-típicos concentrado/dominante,

disperse/compartilhado…)

Parlamentares individuais

Parlamentares individuais (facções pró e anti-governo).

Coalizões e partidos Parlamentares

individuais

Psicologia dos parlamentares

individuais

Hobbesianismo Forte.

Negligência individual

Ignorancia racional, limites cognitivos à

racionalidade e incerteza.

Alternância entre Disciplina e

Indisciplina: variação por issue area.

Disciplinado, sem autonomia individual

(estruturalismo)

Disciplina individual enquanto estratégia

Tipos ideais Máfia do

orçamento

Parlamentares com mobilidade

ascendente/ baixo clero

Parlamentares com votos concentrados e

dominantes em certas localidades/municipios.

Parlamentares ignorantes acerca de

seu eleitorado (Constituency).

Governo e oposição como macro-atores

relevantes dos processos decisórios.

Parlamentares individuais que

disputam a reeleição

Hipótese

Emendas orçamentárias como moeda

universal

Regras institucionais aumentam incerteza na ação parlamentar

Impacto da constituency na produtividade

parlamentar

Sistema eleitoral impacta a arena

parlamentar mas seus efeitos são mediados

pelos poderes presidenciais.

Sistema Eleitoral Brasileiro reforça os

Poderes Presidenciais e habilita o Executivo

a sobrepujar os legisladores,

impondo-lhes sua agenda.

Poderes de agenda do presidentes e

prerrogativas das lideranças partidárias imputam disciplina

parlamentar

Parlamentares com maiores recursos de

poder interno a instituição e/ou com maior produtividade

apresentam maior chance de reeleição

Principais Referências

Teóricas e/ou Conceituais

Veto Player’s (Tsebelis)

Conexão Eleitoral (Mayhew)

Neoinstitucionalismo Distributivo

(Mayhew, Fiorina, Weingast/Marshall)

Barões da Federação (Abrúcio), Ambições

Progressivas (Schlesinger)

Distritos Seguros e Marginais (Fiorina),

Distritos Concentrado/Dominantes

(Ames) Neoinstitucionalismo

Distributivo (Mayhew, Fiorina, Weingast/Marshall)

Paralisia Decisória (W. G. Santos),

Presidencialismo de Coalizão

Racionalizado (S. Abranches/J. Huber); Neoinstitucionalismo

Informacional (Krehbiel)

Neoinstitucionalismo Distributivo

(Mayhew, Fiorina, Weingast/Marshall)

Presidencialismo de Coalizão (Abranches) Cartel Legislativo ou Neoinstiucionalismo

Partidário (Cox & McCubbins; Kiewet

& McCubbins)

Presidencialismo de Coalizão Ampliado (Werneck Vianna et.

al. 1999; Santos, F. 2004, Bonifácio

2006) Conexão Eleitoral adaptada ao caso

brasileiro

Page 65: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

65

Segredo Ineficiente (Cox-McCubbins)

(Mayhew/Melo/Rennó)

Modelo institucionalista

abrangente focado na noção de incerteza (Simon Kahneman-

Tversky, Elster, Epstein &

O`Halloran)

Estratégia parlamentar

Busca desordenada de recursos de

emendas individuais.

Mobilidade ascendente dos mais

competentes; Compra de votos

pelos menos competentes.

Direcionamento de Recursos de Patronagem (Pork) às bases eleitorais

Alinhamento com a agenda do Executivo como sinalização ao

eleitor mediano.

Barganhas das facções partidárias

com líderes e com o Executivo.

Centralização de poderes nas mãos de

lideranças

Parlamentares reagem a incerteza

buscando mais recursos de poder e

aumentando sua produtividade

Instituições congressuais

Baixa disciplina Baixa produtividade Indisciplina e coesão

alternadas. Alta disciplina Alta disciplina

Avaliação da arena eleitoral

Normativamente negativa

Baixa competitividade

Normativamente negativa

Alta competitividade Competitiva.

Normativamente neutral;

Competitiva.

Alta competitividade; Normativamente

indiferente

Normativamente neutro

Alta competitividade

Papel da reeleição

Alto Baixo Alto. Baixo Alto. Nulo. Alto

Papel das Emendas

Orçamentárias individuais

Alto Baixo Alto. Baixo. Alto. Baixo Alto

Papel da Proposição

Legislativa não orçamentária

Baixo Baixo Baixo. Alto. Baixo. Baixo Alto

Papel do Sistema de Comissões

Alto (CMOF: Comissão Mista de

Orçamento e Fiscalização)

Baixo Baixo Alto. Médio. Alto Alto

Papel da Intermediação de

Ignorado. Ignorado. Ignorado. Alto e Relevante. Baixo ou Ignorado. Relevante. Alto e Relevante.

Page 66: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

66

Interesses (Audiencias,

Consultas Públicas,

Concertaçoes etc.)

Nível de Consolidação das

Instituições Democráticas

Baixa Alta Médio Alto Baixo Alta Alto

Resultados institucionais

Altos custos de negociação entre

Executivo e Legislativo

Baixa produtividade parlamentar individual

Altos custos de

negociação entre os poderes.

Estabilidade institucional

Estabilidade institucional

Efeitos sobre a Democracia

Entraves (Deadlocks) ou

Obstáculos

Baixa institucionalização

Baixa

institucionalização. Institucionalização Institucionalização

Orientação normative

Pessimista-caricata (parlamentares

individuais)

Pessimista (parlamentares

individuais)

De Neutra para Otimista moderada.

Otimista moderada. Pessimista.

Otimista (coalizões) Pessimista

(parlamentares individuais)

Otimista (parlamentares individuais +

coalizões)

Fonte: formulação própria dos autores

ANEXO Nº. 2: CICLOS POLÍTICO-ELEITORAIS E RESULTADOS MACROECONÔMICOS

Método de Comparação

Número de Países ou de Observações Exemplares Resultados

Muitos Países (Quantitativo)

9 países industrializados (1947/72). Nordhaus (1975) 12 países industrializados (1945/69). Hibbs Jr. (1977) XX países industrializados (Pós-Guerra).

Tufte (1978)

Olson Jr. (1982)

Page 67: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

67

72 países (21 industrializados, 51 em desenvolvimento, período 1950/1990).

Cukierman, Webb & Neyapti (1992)

Independência legal do banco central é determinante da performance entre países desenvolvidos mas não entre os emergentes. Há relação de dupla causalidade entre inflação e rotatividade de diretores (governors) dos bancos centras, o que seria uma proxy para a falta de independência.

16 países (período 1955/1988). Alesina & Summers (1993)

Independência legal do banco central promove apenas estabilidade de preços.

Entre 60 (1960/98) e 85 (dec. 1990) democracias.

Alesina, Roubini & Cohen (1997)

Przeworski, Alvarez, Cheibub & Limongi (2000)

Persson & Tabellini (2003)

26 países da América Latina e Caribe (1990/95)

Stein, Talvi & Grisanti (1999)

Sistemas eleitorais altamente proporcionais tendem a aumentar o tamanho dos governos, magnitude dos déficits e a resposta procíclica ao ciclo-econômico-eleitoral. Reduzidos déficits e dívida são mais prováveis de serem encontrados sob a operação de procedimentos hierárquicos mais transparentes e hierárquicos, que neutralizam os efeitos perversos da proporcionalidade do sistema eleitoral.

23 províncias argentinas e a capital federal (1985/1996).

Jones, Sanguinetti & Tommasi (2000)

“Partidos importam”, não por conta das preferências distintas de seus membros e líderes por um maior ou menor nível de gastos públicos (como no caso dos países da OECD), mas por habilitar o presidente a disciplinar os governadores provinciais filiados a sua legenda, de modo a conter o viés expansionista no comportamento fiscal. Á luz do argumento dos autores, com partidos fortes, os presidentes argentinos têm sempre mais incentivos para internalizar externalidades negativos da imprudência fiscal dos governadores e faze-los internalizar uma parcela do mesmo. Contra os achados de pesquisas com países da OECD, os autores concluem que o governo dividido não é variável significante. Adicionalmente foi encontrado um ciclo orçamentário em anos eleitorais, uma elevada propensão a gastar da parte das províncias mais aquinhoadas no bolo de recursos, e um vinculo entre instituições fiscais austeras e menores gastos.

23 províncias argentinas (1991/95).

Remmer & Wibbels (2000)

A performance do ajuste estrutural varia com o volume de recursos consumidos nas redes clientelistas dos governadores. Contrariamente ao afirmado pelo mainstream, quanto maior o grau de competição político-partidária nas províncias, maiores as chances de sucesso das reformas, e vice-versa. Os autores não acharam evidencia em suporte a teses de que a policy covarie com o controle dos presidentes sobre seu partido, o governo dividido e as instituições orçamentárias.

46 países desenvolvidos (10 federativos e unitaristas, período: 1970-1995).

Wibbels (2000) Federalismo impacta negativamente o desempenho macroeconômico e aumenta custos de negociação / implementação de ajustes e reformas pró-mercado nos países em desenvolvimento.

Page 68: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

68

Way (2000)

Dahlberg & Johansson (2002)

Hallerberg & Marier (2004)

Borsani (2003)

132 observações na América Latina. Amorim Neto & Borsani (2004)

27 estados brasileiros (1985-1997).

Blanco-Cossio (2001)

Não há um padrão generalizado de indisciplina fiscal entre os estados. Predomínio de posturas de stop and go. Período eleitoral e alta fragmentação partidária impactam políticas fiscais; ideologia dos governadores parece influenciar resultados fiscais. Gastos estaduais impactam renda percapita,, desigualdades na disribuição, mas não a taxa de desemprego, proporção de pobres e intensidade regional da pobreza.

Mendes & Rocha (2003)

Menezes Filho & Libânio (2002?)

Dentre as variáveis socioeconômicas (dados PNAD) usadas para predizer taxas de reeleição somente tiveram resultados significativos o nível de escolaridade dos chefes de família, a % da PEA na agricultura, o aumento do nível de escolarização dos jovens e o número de pessoas abaixo da linha da pobreza.

25 estados brasileiros (1982/1998) Sakurai & Gremaud (2004)

572 municípios paulistas (1989/ 2001)

Muitos Países (Qualitativo)

Olson Jr. (2000)

Poucos Países (Quantitativo)

3 (Argentina, Perú, Venezuela, dec. 1990)

Stokes (2001)

Poucos Países (Qualitativo)

5 países europeus (Espanha, Portugal, França, Holanda, Inglaterra, sec. XVI-a XVIII) e 1 americano (EUA, séc. XIX)

North (1981) North (1990)

Uma das primeiras versões do argumento acerca da relevância do “credible commitment” revela-se significativa na explicação das diversas trajetórias experimentadas pelos principais estados europeus no início da era moderna.

1 país europeu (Inglaterra , sec. XVII-XVIII)

North & Weingast (1989)

3 países (Inglaterra , sec. XVII-XVIII, EUA séc. XIX, China Séc. XX)

Weingast (1995) Esta extensão do argumento mostra como os arranjos federativos, enquanto atributo institucional específico de uma forma de governo limitado, melhoraram o desempenho macroeconômico dos 3 países estudados.

Page 69: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

69

2 países europeus (Inglaterra e França, sec. XVII-XVIII)

Stasavage (2002)

1 país latino-americano (Brasil, sec. XIX)

Summerhill (s.d.)

Forte contraexemplo à hipótese de North & Weingast (1989). Constituição de 1824 instaura uma “revolução inglória”, inibindo o desenvolvimento da finança privada simultaneamente ao aumento da credibilidade do débito soberano do setor público. O estudo de caso lustra os efeitos que a falta de arranjos federativos (como os examinados por Weingast 1995 para EUA e UK) têm sobre a eficiência alocativa.

5 países presidencialistas Haggard & McCubbins (2001)

Estudos de caso 2 países europeus (Espanha e Inglaterra, anos 1980/90)

Boix (1998)

Fonte: Elaboração própria com base nas indicações de LANDMAN, Todd. (2000), Issues and methods in comparative politics: an introduction. London; New York: Routledge.

ANEXO Nº. 3: AÇÕES DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADINS)

CONTRA A LC Nº. 101-00 NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)

Dispositivo da LRF impugnado1 ADIns Nº. e Requerente1 Alegação1 Argumentos da Advocacia Geral da União2

Resultado da Decisão no STF3

LC 101-00 in totum ADIn Nº. 2238: partidos políticos de oposição (PC do B, PSB e PT)

Ofensa ao parágrafo único do art. 65 da CF - em que se sustentava que o projeto deveria ter voltado à Câmara dos Deputados em razão de o Senado ter alterado certos dispositivos da Lei, tendo em vista que as alterações introduzidas pelo Senado não importaram alteração do sentido da proposição legislativa.

O Tribunal rejeitou a argüição de inconstitucionalidade formal da lei, em sua totalidade. Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por maioria, considerando que a regulamentação do art. 163 da CF por lei complementar pode ser feita de forma fragmentada, rejeitou a argüição de inconstitucionalidade formal da lei, em sua totalidade, ao argumento de que o projeto teria que ter disciplinado por inteiro o art. 163 da CF

§ 5º do Art. 9º ADInMC 2.238

Ofensa ao art. 192 da CF – segundo a qual o dispositivo impugnado estaria tratando de atribuição do Banco Central fora da lei complementar específica -, porquanto o Banco Central não está, em tal hipótese,

Tribunal indeferiu o pedido de medida liminar quanto ao § 5º do art. 9º da citada Lei Complementar.

Page 70: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

70

agindo como órgão central do Sistema Financeiro Nacional, mas sim como executor da política econômica do Governo.

Art. 9º, § 3º ("§ 3º No caso de os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público não promoverem a limitação no prazo estabelecido no caput, fica o Poder Executivo autorizado a limitar os valores financeiros segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias").

ADIn Nº. 2238: partidos políticos de oposição (PC do B, PSB e PT)

Afronta ao princípio da separação de poderes, uma das “cláusulas pétreas” da CF, sendo vedada sua modificação por emenda constitucional. Tal dispositivo viabiliza uma interferência do Executivo em domínio constitucionalmente reservado à atuação autônoma dos poderes Legislativo e Judiciário.

O STF deferiu o pedido de liminar, estando atualmente suspensa a eficácia do referido dispositivo legal. Não houve decisão a respeito do mérito, estando a ação em tramitação Tribunal deferiu o pedido de medida cautelar para suspender, até decisão final, a eficácia do § 3º do art. 9º da citada LC.

Art. 14, inc.II: exige que a concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita esteja acompanhada de medidas de compensação por meio do aumento de receita proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

ADI(MC) 2.238-DF

Ofensa ao art. 167, III da CF ("Art. 167. São vedados: ... III - a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta;)

Por maioria, o Tribunal indeferiu o pedido de liminar, afastANDO, à primeira vista, a alegada inconstitucionalidade por entender que o dispositivo impugnado refere-se a algo já implícito na própria CF, dizendo respeito à forma como terão de ser compensadas as renúncias de receita, com intuito de não onerar os governos subseqüentes. Vencidos os Ministros Ilmar Galvão, relator, e Sepúlveda Pertence, que deferiam o pedido de liminar por entender que o dispositivo inibe a concessão de incentivos fiscais, faculdade inerente ao ente que exerce competência tributária, de natureza constitucional, e que, por isso mesmo, somente poderia encontrar limite na própria Constituição.

Art. 11, parágrafo único: veda a realização de transferências voluntárias para o ente que se revelar negligente com a arrecadação de seus próprios impostos.

ADInMC 2.238-DF

Ofensa ao art. 160 da CF,( "É vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos, nesta seção, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos.").

Tribunal indeferiu a cautelar pleiteada por entender juridicamente irrelevante a alegação de ofensa ao art. 160 da CF, uma vez que a norma atacada cuida de transferências voluntárias que não são incompatíveis com restrições impostas aos entes beneficiários das mesmas.

Art. 12, § 2º ("O montante ADInMC 2.238-DF Violação do art. 167, III, da CF, -vque, Tribunal deferiu a suspensão cautelar do §

Page 71: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

71

previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser superior ao das despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária.")

ADIn Nº. 2238: partidos políticos de oposição (PC do B, PSB e PT)

embora proíba a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalva as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta. O dispositivo da LRF excedeu ao não contemplar, na redação do § 2ºdo art. 12, as exceções previstas no Art. 167, III, da CF88. Afronta ao princípio federativo, consagrado no art. 1º e protegido no inciso I do § 4º do art. 60 da CF. tais normas excederiam a competência da União para legislar sobre “normas gerais” de direito financeiro, finanças públicas e orçamento (art. 24, I e II, da CF) e, assim, violariam o disposto no art. 24, § 1º, da CF. Os preceitos do art. 20 da LRF, veiculados por lei complementar, consubstanciam normas gerais de direito financeiro, e, como tal, devem respeitar os limites a que ficam sujeitas referidas normas gerais. estando em desacordo com a Constituição, pois vai além do que havia sido determinado pelo Art. 169, e colide com o princípio federativo, previsto no Art. 1º, ambos da CF88. A previsão de limites de gastos com pessoal por Poder violaria o art. 99, § 1º, da CF –"os tribunais elaborarão suas propostas orçamentárias dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias"

2º do art. 12, considerando que que, ao primeiro exame, a Lei Complementar não pode editar norma absoluta, desprezando a ressalva da CF. O STF acolheu o pedido liminar, estando atualmente suspensos os efeitos do parágrafo 2o do art. 12. No mérito, a ação ainda não foi julgada.

Arts. 19, I, II e III e 20, II: fixa os limites de gastos com pessoal no âmbito estadual.

ADIn Nº. 2238: (partidos políticos de oposição ao governo: PC do B, PT e PSB); ADIn Nº. 2241: Mesa da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais; ADIn Nº. 2256: Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (ATRICON); ADIn Nº. 2261: Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP); ADIn Nº. 2365: Partido Comunista do Brasil (PC do B).

A previsão de que a União haveria de legislar sobre "normas gerais" relativas a "direito financeiro" e "orçamento" (CF, art. 24, I e II, e § 1º) bem como editar lei complementar sobre "finanças públicas" (CF, art. 163, I) encontra especial e expressa concreção nas diversas normas constantes do Capítulo II do Título VI da CF. Fica demonstrada a absoluta legitimidade das normas insertas nas alíneas "a", "b", "c" e "d" do inciso II do art. 20 da LC nº 101, de 2000, afastando-se a alegada ofensa aos arts. 1º, caput, 24, § 1º e 60, § 4º, I, da Constituição Federal.

Foi indeferido, por maioria de votos, o pedido de medida liminar visando a suspender provisoriamente os efeitos do art. 20, estando atualmente o processo em tramitação, sem que tenha sido apreciado o mérito. Tribunal, por maioria, indeferiu o pedido de liminar, por não vislumbrar, num primeiro exame, incompatibilidade do dispositivo impugnado com a CF, vencidos os Ministros Ilmar Galvão, relator, Sepúlveda Pertence, Octavio Gallotti, Néri da Silveira e Carlos Velloso, que deferiam a liminar, por aparente ofensa ao § 1º do art. 99 e ao art. 169 da CF. Em questão de ordem apresentada pelo Min. Ilmar Galvão, relator, o Tribunal indeferiu os pedidos da Advocacia-Geral da União no sentido de serem ouvidos os Estados-membros afetados pelo dispositivo impugnado e de submeter as ações diretas ao julgamento definitivo do Tribunal, anulando-se o julgamento liminar ora em andamento.

Art. 15: considera irregulares as despesas que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17, que

ADInMC 2.238-DF. O dispositivo estabeleceria outros requisitos além dos fixados pela CF, o que impediria o desenvolvimento das

Tribunal indeferiu o pedido de medida liminar, considerando não haver relevância jurídica na tese de inconstitucionalidade

Page 72: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

72

exigem, para a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarreta aumento da despesa, o impacto orçamentário-financeiro e a declaração de que o aumento tenha adequação orçamentário- financeira com a LOA e compatibilidade com o PPA e a LDO, além de exigir que seus efeitos sejam compensados pelo aumento permanente de receita.

atividades dos entes federados ao restringir a utilização de expedientes orçamentários previstos nos §§ 2º e 3º do art. 167 da CF.

sustentada, entendendo que as medidas previstas no artigo impugnado objetivam tornar efetivo o cumprimento do PPA, das LDOs e da LOA, tal como previsto no art. 165 da CF, não inibindo a abertura de créditos adicionais previstos no art. 166 da CF.

Art. 17: conceitua a despesa obrigatória de caráter continuado e exige, para os atos que criarem ou aumentarem despesa, a compensação pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

ADInMC 2.238-DF Ofende o princípio da separação de Poderes e o disposto nos artigos 51, IV, 52, XIII, 99 e 127, § 1º, todos da CF.

Tribunal indeferiu o pedido de suspensão cautelar , considerando que a circunstância de o aumento de despesa continuada estar condicionado à redução ou ao aumento da despesa também em caráter continuado é, à primeira vista, proposição lógica, que não ofende o princípio da separação de Poderes nem o disposto nos artigos citados da CF.

Art. 18, § 1º: contabiliza, como despesas de pessoal, os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra.

ADInMC 2.238-DF. Ofensa aos artigos 37, II e XXI, da CF, segundo a qual os contratos em questão referir-se-iam a serviços.

Tribunal indeferiu pedido de liminar por ausência de plausibilidade jurídica da tese, salientando-se, ainda, que a norma impugnada evita que se burle o limite previsto de gasto com pessoal, valorizando o servidor público.

Art. 020, I, II e III, § 001 º e § 2º, I, II (“A repartição dos limites globais do art. 019 não poderá exceder os seguintes percentuais...”)

ADInML 2261-0 - STF ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO -CONAMP (CF 103, 0IX )

Art. 001, Art. 018, Art. 065, caput e parágrafo único, Art. 066, § 2, Art. 127 , § 3, Art. 165 , § 2 e Art. 169, caput. Consultando pela CONAMP, o jurista Celso Ribeiro Bastos emitiu substancioso parecer jurídico em 17/7/2000, e concluiu que “dentro dos limites globais a serem fixados por lei, ao Ministério Público incumbe elaborar seu quadro funcional e traçar sua política remuneratória. Jamais poderia a legislação federal, pura e simplesmente, fixar um percentual máximo e imutável para os gastos com o

Page 73: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

73

Ministério Público, de qualquer dos Estados da federação. Viola-se não só a realidade federativa do Brasil, como também a autonomia da instituição do Ministério Público”.

Art. 1º, § 3º, Inc. II e Art. 20, II e III: estende ao Distrito Federal a fórmula estabelecida para a repartição dos limites globais de despesas com pessoal imposta aos Estados.

ADI 3756/DF: Mesa Diretora da Câmara Legislativa do Distrito Federal

O Tribunal julgou improcedente pedido formulado em ação direta. Salientou-se a natureza singular do DF, principalmente a partir da CF88, que o elevou à condição de parte integrante da Federação brasileira e o dotou de autonomia político-administrativa (art. 1º e 18), e de tratar-se de unidade federativa que detém competências que são próprias dos Estados e dos Municípios (CF, art. 32, § 1º) e que tem instituições elementares que são organizadas e mantidas pela União (CF, art. 21, XIII e XIV), a qual também financia, em parte, serviços públicos a cuja prestação está jungido (CF, art. 21, XIV, parte final). Afirmou-se que o DF não se traduziria nem em Estado-membro nem em Município, mas estaria bem mais próximo da estruturação do primeiro, o que estaria demonstrado em diversos dispositivos da CF (Arts 24; 32, § 3º; 34; 92, VII; 103, IV). Posteriormente, Ressaltando a singularidade do caso concreto, o Tribunal acolheu embargos de declaração opostos, pela Mesa Diretora da Câmara Legislativa do Distrito Federal, contra acórdão que julgara improcedente o pedido. Sustentava a embargante que a decisão do STF não fixara “o momento temporal a partir de quando haverá de incidir com força e eficácia vinculativa, o que se afigura in casu imprescindível, à vista do excepcional interesse público subjacente à questão jurídica e tendo em vista as inúmeras

Page 74: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

74

relações jurídicas travadas de boa-fé e sob a égide do percentual de 6% como limite de gastos com pessoal do Poder Legislativo”. Pleiteava a integração ou aclaração do julgado em “ordem a permitir que o Poder Legislativo do Distrito Federal, no prazo legal de dois quadrimestres previsto no art. 23 da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), enquadre-se definitivamente nos limites prudenciais de gastos públicos, evitando-se, assim, a coarctação de políticas públicas de elevado interesse social”.

Art. 21, inc. II ( "Art. 21 - É nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda: ... II - o limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo."),

ADI (MC) 2.238-DF.

Tribunal conferiu interpretação conforme à Constituição Federal ao inciso II do art. 21, para que se entenda como "limite legal" o previsto em lei complementar.

Art. 23, § 1º e 2º: permite a redução dos valores atribuídos a cargos e funções para alcançar o cumprimento do limite estabelecido com a despesa com pessoal e faculta a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária.

ADInMC 2.238-DF. Aparente ofensa à garantia da irredutibilidade de vencimentos dos servidores públicos (CF, art. 37, XV).

Tribunal deferiu a suspensão cautelar de eficácia da expressão contida no § 1º do art. 23 e pelo mesmo fundamento, também deferiu a medida liminar para suspender integralmente o o § 2º do mesmo artigo.

ADIn Nº. 2238: Associação Paulista dos Magistrados.

Por maioria, o Tribunal, preliminarmente, deixou de referendar a admissibilidade, no processo, da Associação Paulista dos Magistrados na qualidade de amicus curiae (Lei 9.868/99, art. 7º, § 2º), uma vez que a mesma formulara o pedido de admissão no feito depois de já iniciado o julgamento da medida liminar. Considerou-se que a manifestação de amicus curiae é para efeito

Page 75: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

75

de instrução, não sendo possível admiti-la quando em curso o julgamento.

Art. 35 - que veda as operações de crédito entre entes da federação diretamente ou por intermédio de fundo, autarquia, fundação ou empresa estatal dependente, inclusive suas entidades da administração indireta.

ADI (MC) 2.250-MG ADIn Nº. 2250: Governador do Estado de Minas Gerais, Itamar Franco.

Argumenta existirem vários fundos públicos, constituídos com receitas de empréstimos obtidos junto a organismos financeiros internacionais, que são administrados pelo Governo Estadual. Isto é contrário ao princípio federativo, que tem como um de seus requisitos a autonomia política e administrativa dos Estados-membros.

entender não caracterizada, à primeira vista, a alegada ofensa ao princípio federativo, o Tribunal indeferiu a suspensão cautelar do art. 35 sendo suspenso o julgamento quanto ao art. 51 por falta de quorum.

Art. 51: determina aos Estados-Membros e aos Municípios o encaminhamento de suas contas ao Poder Executivo da União, nas datas estabelecidas, para a consolidação das contas dos entes da federação, sob pena de, não o fazendo, terem suspensas as transferências voluntárias de recursos.

ADI (MC) 2.250-MG ADIn Nº. 2250: Governador do Estado de Minas Gerais, Itamar Franco.

Ofensa ao princípio federativo.

O Tribunal indeferiu a suspensão cautelar do art. 51, por entender não caracterizada, à primeira vista, ofensa ao princípio federativo.

Art. 24, parte final que remete ao art. 17 da mesma LC ("Nenhum benefício ou serviço relativo à seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a indicação da fonte de custeio total, nos termos do § 5º do art. 195 da Constituição, atendidas ainda as exigências do art. 17."),

ADInMC 2.238-DF. Tribunal indeferiu a liminar pleiteada tendo em conta o indeferimento do pedido quanto ao art. 17.

Art. 26, § 1º, Art. 28, § 2º, Art. 29, § 2º e Art. 39, “caput”

ADInMC 2.238-DF. Tribunal afastou, à primeira vista, a alegada inconstitucionalidade formal dos referidos artigos por ofensa ao art. 192 da CF

Art. 29, § 2º ("Art.29 - ... § 2º - Será incluída na dívida pública consolidada da União a relativa à emissão de títulos de responsabilidade do Banco

ADI (MC) 2.238-DF

Ofensa ao disposto no inciso IV do art. 192 da CF, que deveria ser objeto de regulamentação em lei complementar específica.

Tribunal indeferiu a medida liminar pleiteada, por entender juridicamente irrelevante a tese de inconstitucionalidade sustentada pelos autores da ação.

Page 76: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

76

Central.") Artigo 30, I: fixou o prazo de noventa dias após a publicação da LC 101 para que o Presidente da República submeta ao Senado Federal proposta de limites globais para o montante da dívida consolidada da União, Estados e Municípios

ADInMC 2.238-DF.

O Tribunal julgou prejudicado o pleito, tendo em vista o exaurimento da eficácia do dispositivo porquanto já passado o prazo de noventa dias nele previsto. Em seguida, o julgamento foi suspenso, projetando para posterior exame, o pedido de concessão de liminar relativamente aos arts. 14, II, e ao art. 21, II, ambos da LC101/2000.

Art. 51: a prestação de contas e o princípio federativo

ADIn Nº. 2250: Governador do Estado de Minas Gerais, Itamar Franco.

Da forma como está redigido o texto da lei, os Estados e municípios, entes federados que pela CF são autônomos e independentes, terão de prestar contas à União, que não tem qualquer superioridade hierárquica a justificar tal determinação. A prestação anual de contas deve ser feita, conforme previsto na CF, por todos os entes estatais, na forma estabelecida pela respectiva Constituição Estadual ou Lei Orgânica Municipal, respeitadas as diretrizes fixadas na CF. Esta, por sua vez, não contém a determinação do art. 51 da LRF, que extrapolou os limites de seu campo de atuação. O órgão responsável pela fiscalização e controle orçamentário e financeiro de cada ente da Federação é o respectivo Poder Legislativo, auxiliado pelo TC.

Esta ação está em tramitação junto ao STF, sem que o mérito tenha sido julgado.

Art. 56: prevê que as contas submetidas pelo Chefe do Poder Executivo a parecer prévio do Tribunal de Contas incluirão as dos presidentes dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério Público. (“As contas prestadas pelos Chefes do Poder Executivo incluirão, além das suas

ADI (MC) 2.238-DF

Contraria norma contida no art. 71, II da CF, que confere competência ao Tribunal de Contas para julgamento das contas de todos os administradores e responsáveis por dinheiros públicos à exceção apenas das contas prestadas pelo Presidente da República, em relação as quais lhe compete apenas emitir parecer prévio para apreciação pelo Congresso Nacional

Min. Ilmar Galvão, relator, proferiu voto no sentido de deferir o pedido de liminar quanto ao art. 56, após, o julgamento desse artigo foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Sepúlveda Pertence. Este , acompanhou o voto do relator, para também deferir a liminar quanto ao art. 56 da lei em questão, afirmando que qualquer prestação de contas por órgão não vinculado ao Executivo somente poderia ser objeto de

Page 77: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

77

próprias, as dos Presidentes dos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério Público, referidos no art. 20, as quais receberão parecer prévio, separadamente, do respectivo Tribunal de Contas.”)

julgamento pelo respectivo Tribunal de Contas e que a inclusão das contas referentes às atividades financeiras dos Poderes Legislativo, Judiciário e do Ministério Público, dentre aquelas prestadas anualmente pelo Chefe do Governo, tornaria inócua a distinção efetivada pelos incisos I e II do art. 71, da CF, já que todas as contas seriam passíveis de controle técnico, a cargo do Tribunal de Contas, e político, de competência do Legislativo.

Art. 57: estabelece prazo de 60 dias para que seja proferido pelos Tribunais de Contas parecer prévio conclusivo, se prazo diverso não houver sido previsto pelas Constituições Estaduais. (“Os Tribunais de Contas emitirão parecer prévio conclusivo sobre as contas no prazo de sessenta dias do recebimento, se outro não estiver estabelecido nas constituições estaduais ou nas leis orgânicas municipais.”) (“Os Tribunais de Contas não entrarão em recesso enquanto existirem contas de Poder, ou órgão referido no art. 20, pendentes de parecer prévio.”)

ADI (MC) 2.238-DF

Min. Ilmar Galvão proferiu voto no sentido de indeferir o pedido de liminar quanto ao art. 57, mas após, o julgamento desse artigo foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Sepúlveda Pertence. Acompanhado pelos demais Ministros, este divergiu do voto do relator quanto ao art. 57 da lei impugnada, salientando o que disposto no § 2º do Art. 57, considerou que a referência, nele contida, a “contas de poder” estaria a evidenciar a abrangência, no termo “contas” constante do caput desse artigo, daquelas referentes à atividade financeira dos administradores e demais responsáveis por dinheiros e valores públicos, que somente poderiam ser objeto de julgamento pelo Tribunal de Contas competente, nos termos do art. 71, II, da CF. Aduziu que essa interpretação seria reforçada pelo fato de essa regra cuidar do procedimento de apreciação das contas especificadas no aludido art. 56, onde também se teria pretendido a submissão das contas resultantes da atividade financeira dos órgãos componentes de outros poderes à manifestação opinativa do Tribunal de Contas.

Art. 59, § 1º, inc. IV: dispõe que ADI (MC) 2.238-DF Tribunal indeferiu o pedido de liminar, por

Page 78: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

78

os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou órgãos referidos no art. 20 daquela lei, quando constatarem que os gastos com inativos e pensionistas se encontram acima do limite definido em lei.

ausência de plausibilidade jurídica da tese de inconstitucionalidade sustentada pelos autores da ação, dado que o inciso atacado representa apenas mera advertência, sem maiores conseqüências.

Art. 60 ("Lei estadual ou municipal poderá fixar limites inferiores àqueles previstos nesta Lei Complementar para as dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de garantias")

ADI (MC) 2.238-DF

Viola, à primeira vista, a competência privativa do Senado Federal para dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como estabelecer limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária desses mesmos entes federativos (CF, art. 52, VII e IX).

Tribunal indeferiu o pedido de medida liminar por entender que o dispositivo impugnado não viola, à primeira vista, os arts. 52, VII e IX, da CF, uma vez que a competência do Senado Federal é a de fixar limites máximos, e não mínimos de endividamento.

Art. 68: cria o fundo do Regime Geral de Previdência Social, com a finalidade de prover recursos para o pagamento dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, na forma do art. 250 da CF (CF, art. 250: "Com o objetivo de assegurar recursos para o pagamento dos benefícios concedidos pelo regime geral de previdência social, em adição aos recursos de sua arrecadação, a União poderá constituir fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, mediante lei que disporá sobre a natureza e administração desse fundo.")

ADI (MC) 2.238

Tribunal também indeferiu o pedido de medida liminar quanto ao art. 68, afastando a alegação, uma vez que o art. 250 da CF, ao dispor sobre a instituição de fundo integrado por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, não exclui a hipótese de os demais recursos pertencentes à Previdência Social, até mesmo os provenientes da arrecadação de contribuições, virem a compor o referido fundo. Também entendeu o Tribunal não haver impedimento para que providência de natureza legislativa de caráter ordinário, sem alteração no texto, seja veiculada por LC. Ressalta-se que, em já havendo lei complementar que trata sobre finanças (Lei 4.320/67), a norma impugnada evidencia uma lei ordinária, podendo tratar sobre o referido fundo, que não é matéria de lei complementar..

Art. 72 ("A despesa com serviços de terceiros dos Poderes e órgãos referidos no art. 20 não

ADI (MC) 2.238-DF o Tribunal, tendo em conta o indeferimento, por maioria, do pedido de liminar quanto ao art. 20, conferiu ao art. 72 interpretação

Page 79: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade

79

poderá exceder, em percentual da receita corrente líquida, a do exercício anterior à entrada em vigor desta Lei Complementar, até o término do terceiro exercício seguinte").

conforme à CF para que se entenda como serviços de terceiros, os serviços permanentes, considerando-se que a regra do art. 72 é forma para evitar que, pela contratação de terceiros, contornem-se os limites globais de despesa com pessoal.

Fonte: elaborado pelo autor com base na compilação de dados de fontes secundárias e primárias. Obs.: 1 Dados apresentados por: CONTI, José Mauricio. Lei de Responsabilidade Fiscal: Aspectos Jurídicos. Disponível em: <http://www.idtl.com.br/artigos/67.html>. Acesso em: 5-9-2007, 10:00. 2 Considerações Adicionais relativas às Ações Diretas de Inconstitucionalidade ADIns Nº. 2238, 2241, 2250, 2256 e 2261 encaminhadas, por requerimento do Presidente da República e do Congresso Nacional, pelo Advogado-Geral da União Gilmar Mendes ao Ministro Ilmar Galvão, relator das mesmas no STF. 3 Dados apresentados por: CONTI, José Mauricio. Op. Cit.; Acompanhamento de processos no site do Supremo Tribunal Federal. Informativo STF Nº267, Brasília, 6-10.maio.2002. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo267.htm#Lei%20de%20Responsabilidade%20Fiscal%20-%2015>. Informativo STF, Nº. 204, Brasília, 25 a 29 de setembro de 2000 Disponível em:< http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo204.htm >; Informativo STF, Nº. 206, Disponível em:< http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo206.htm >; Informativo STF, Nº. 218. Brasília, 19 de fevereiro a 2 de março de 2001. Disponível em:<http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo218.htm>; Informativo STF, Nº267, Brasília, 6 a 10 de maio de 2002 Disponível em:<http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo267.htm>; Informativo STF, Nº. 475 Disponível em:< http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo475.htm >; Informativo STF, Nº. 485 Brasília, 22 a 26 de outubro de 2007 Disponível em:. < http://www.stf.gov.br/arquivo/informativo/documento/informativo485.htm >. (ADIN no. 2238) proposta por partidos da ... www4.bcb.gov.br/.../F20020527-Decisões%20do%20STF%20sobre%20a%20Lei%20de%20Responsabilidade%20Fiscal.pdf - Páginas Semelhantes Caderno do MPPR - Edição Especial - Agosto 2000 < http://folio.mp.pr.gov.br/CGI-BIN/om_isapi.dll?clientID=159618&hitsperheading=on&infobase=mp_cad_mp.nfo&record={628F}&softpage=Document42> AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (Med. Liminar) 2261 - 0 - STF.

Page 80: JUDICIALIZANDO O CICLO ECONÔMICO-ELEITORAL? · PDF fileSão Carlos/SP Novembro de 2009. 2 RESUMO A comunicação examina a concepção e a implementação da Lei de Responsabilidade