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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM JULIO CESAR MODENEZ DOIS MUNDOS? UM ESTUDO DOS MERCADOS LIVREIROS CARIOCA E PARISIENSE EM MEADOS DO SÉCULO XIX CAMPINAS, 2016

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

JULIO CESAR MODENEZ

DOIS MUNDOS?

UM ESTUDO DOS MERCADOS LIVREIROS CARIOCA

E PARISIENSE EM MEADOS DO SÉCULO XIX

CAMPINAS,

2016

JULIO CESAR MODENEZ

DOIS MUNDOS?

UM ESTUDO DOS MERCADOS LIVREIROS CARIOCA

E PARISIENSE EM MEADOS DO SÉCULO XIX

Dissertação de mestrado apresentada ao Instituto

de Estudos da Linguagem da Universidade

Estadual de Campinas para obtenção do título de

Mestre em Teoria e História Literária, na área de

História e Historiografia Literárias.

Orientadora: Profa. Dra. Márcia Azevedo de Abreu

Este exemplar corresponde à versão

final da Dissertação defendida pelo

aluno Julio Cesar Modenez

e orientada pela Profa. Dra. Márcia Azevedo de Abreu.

CAMPINAS,

2016

Aos que me tornaram o que sou (João, Rosa e Carol)

e à que se tornará comigo, mesmo e sempre (Amabile).

Agradecimentos

Inicio prestando meu profundo agradecimento Àquele que manteve meus pés firmes

na estrada e meu espírito firme em tranquilidade e paz.

Agradeço à minha família, sustentáculo de amor, carinho e união, sem a qual não teria

condições financeiras, psicológicas e afetivas de concluir esta etapa da minha vida,

especialmente meus pais, João e Rosa, que cegamente me impulsionaram, e à minha querida

irmã Ana Carolina, que sempre esteve ao meu lado, mesmo quando não estive ao lado dela.

À minha orientadora, Profª. Drª. Márcia Azevedo de Abreu, que com paciência e

entusiasmo me guiou por caminhos desafiadores e sempre edificantes.

À Profª. Drª. Orna Messer Levin, pelo carinho e preocupação que lhes são peculiares.

À Profª. Drª. Lúcia Granja, pelas experiências trocadas, dicas de ouro e sorrisos de

incentivo.

Ao Prof. Dr. Rodrigo Camargo de Godoi, pelas indicações e sugestões transmitidas na

banca de qualificação.

Aos demais pesquisadores do projeto “A circulação transatlântica dos impressos: a

globalização da cultura no século XIX”, um grupo sem igual que demonstrou à sociedade

acadêmica, cujo momento é de pesar e luta, os frutos de um trabalho sério e revolucionário.

Destaco os amigos Ana Gomes Porto, Ana Laura Donegá, Alexandro Paixão, Anderson

Trevisan, Atilio Bergamini, Beatriz Gabrielli, Bruna Grasiela da Silva Rondinelli, Clara

Carolina dos Santos, Ethienne Sauthier, Izenete Garcia Nobre, Larissa de Assumpção,

Leandro Thomaz Almeida, Lígia Cristina Machado, Lucas Lamonica, Maria Clara Gonçalves,

Mariana Lima, Moizeis Sobreira de Sousa, Renata Romero, Tais Franciscon e Willian

Tognolo.

Àquelas que foram as cobaias da minha primeira orientação, Fernanda Gomes Gaspar,

Rayssa Moraes Sousa e Sabrina de Souza Teco, e à companheira nesse e em diversos outros

momentos, Valéria Cristina Bezerra.

Ao Otávio, cuja sabedoria perpassa a pouca idade que tem.

Aos amigos de fé da Comunidade Santo Antônio, com quem todas as semanas

abasteço a mente com discernimento e o coração com irmandade.

À CAPES, pelo apoio financeiro e institucional.

À amável mulher que Deus enviou ao meu lado, minha futura mestra Amabile, pelo

companheirismo eterno que possibilitou encerrar este trabalho com segurança, serenidade e

fortaleza.

Resumo:

Este trabalho, vinculado ao projeto temático FAPESP “A circulação transatlântica dos

impressos: a globalização da cultura no século XIX”, tem por objetivo observar o

funcionamento de parte do mercado livreiro de Paris e do Rio Janeiro, no período de 1860 a

1876, por meio de uma análise comparativa de catálogos publicitários divulgados pelos

livreiros Michel Lévy e Baptiste-Louis Garnier, a fim de verificar a natureza de suas ações e

encontrar linhas de aproximação e divergência em suas práticas. Além disso, de acordo com

os romances anunciados nessas listas, traçamos uma comparação entre os acervos disponíveis

nas duas livrarias, com o intuito de verificar quão diversos eles eram tanto do ponto de vista

da origem nacional das narrativas quanto do ponto de vista de sua novidade. O trabalho revela

que, apesar das diferenças em termos de tamanho dos mercados, as ações dos livreiros e os

livros postos à venda têm importantes semelhanças, permitindo concluir que o tamanho do

mercado não afeta o modo de atuação dos agentes.

Palavras-chave: catálogos de livreiros; romances; século XIX; Michel Lévy; B. L. Garnier.

Abstract:

This work, bound to FAPESP project “The transatlantic circulation of printed matter - the

globalization of culture in the 19th century”, aims to observe how part of the bookseller

market from Paris and Rio de Janeiro worked, between 1860 and 1876, through a comparative

analysis of bookseller catalogues from Michel Lévy and Baptiste-Louis Garnier, in order to

verify the nature of their actions and find similar and different points on their practices.

Besides, according to the novels on sale on these lists, we made a comparison among the

collections available on both bookstores with the intention of verifying how diverse they

were, from the point of view of the national origin of the narratives as from its novelty. The

work reveals that, despite of the differences in the markets’ size, the actions of the booksellers

and the books on sale have important similarity, so that we can conclude the size of the

market doesn’t affect the way of acting of the agents.

Key words: bookseller catalogues; novels; nineteenth century; Michel Lévy; B. L. Garnier.

Sumário

Introdução ....................................................................................................................... 10

Capítulo 1 - Mercados livreiros de Paris e Rio de Janeiro

1.1. Livreiros no intercâmbio transatlântico de impressos ................................................... 28

1.2. Comércio livreiro parisiense: um mercado acirrado ...................................................... 31

1.3. O mercado livreiro carioca: o mundo no centro do Rio ................................................ 47

Capítulo 2: Catálogos de livreiros

2.1. Catálogos de Michel Lévy ............................................................................................. 58

2.2. Catálogos de B. L. Garnier ............................................................................................ 79

2.3. Comparação das estratégias e ações dos profissionais ................................................ 101

Capítulo 3: Os romances nos catálogos

3.1. Romances e romancistas anunciados por Michel Lévy ............................................... 107

3.2. Romances e romancistas anunciados por Baptiste-Louis Garnier ............................... 113

3.3. Comparações entre os livreiros .................................................................................... 124

Considerações finais ..................................................................................................... 131

Referências bibliográficas ............................................................................................ 134

10

Introdução

Boa parte dos estudos literários no Brasil, desde fins dos anos 1950, tem tomado

como base o famoso livro de Antonio Candido, Formação da Literatura Brasileira.1 Suas

palavras fundamentam, até hoje, artigos, ensaios, dissertações e mesmo teses de teoria e

história da literatura. Este trabalho não pretende ampliar ainda mais essa lista. Entretanto,

algumas ideias presentes no estudo irão lançar as bases da discussão que esta dissertação

pretende fomentar sobre a história da literatura na segunda metade do século XIX.

Candido afirma, no prefácio da primeira edição, que a literatura brasileira, um

"galho secundário da portuguesa, por sua vez arbusto de segunda ordem do jardim das

Musas", não seria capaz de suprir as necessidades de um leitor culto.2 E complementa:

"Há literaturas de que um homem não precisa sair para receber cultura e enriquecer a

sensibilidade; outras, que só podem ocupar uma parte da sua vida de leitor, sob pena

de lhe restringirem irremediavelmente o horizonte. Assim, podemos imaginar um

francês, um italiano, um inglês, um alemão, mesmo um russo e um espanhol, que só

conheçam os autores da sua terra e, não obstante, encontrem neles o suficiente para

elaborar a visão das coisas, experimentando as mais altas emoções literárias. (...)

Comparada às grandes, a nossa literatura é pobre e fraca".3

Segundo essa concepção, um francês poderia conhecer apenas autores de sua

pátria e, assim, estar literariamente bem nutrido. Enquanto isso, à periferia literária, ou nas

palavras de Candido, aos locais de "literatura pequena", restariam duas possibilidades:

conformar-se à "pobreza" de seus próprios escritos ou abrir-se aos impressos dos grandes

centros.

Ambas as ideias - a vantagem do leitor em território de literatura "rica e forte" e a

desvantagem em lugar de literatura "pobre e fraca" - podem ter seus argumentos invertidos.

Um francês Oitocentista, por ter à sua disposição uma ampla produção literária nacional, teria

uma visão de mundo restrita aos escritos produzidos apenas seus conterrâneos, enquanto um

brasileiro da mesma época poderia dispor de impressos de diversos centros literários mundiais

e, com isso, ter uma visão mais vasta da literatura.4

1 CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira. 1º Volume (1750-1836). 6ª edição. Belo Horizonte:

Editora Itatiaia Limitada, 2000.

2 Idem, p.9.

3 Idem, p.9-10.

4 A ideia da vantagem da periferia sobre o centro literário foi desenvolvida por João Cezar de Castro Rocha. Ver:

ROCHA, João Cezar de Castro. ¿Culturas shakespearianas? Teoría mimética y América Latina. México:

Sistema Universitario Jesuita: Fideicomiso Fernando Bustos Barrena, 2014.

11

Franco Moretti, no seu Atlas do Romance europeu,5 analisa a relação entre o

conteúdo de um acervo de livros e seu tamanho: para ele, a variedade de uma coleção é

influenciada, se não controlada, pelo espaço da biblioteca. Ou seja, acervos menores tendem a

ser mais canônicos do que os grandes - há uma seleção natural ocasionada pela falta de

espaço.6 Tal relação, ainda de acordo com Moretti, poderia ser levada aos mercados. Isto é,

um mercado pequeno não se comportaria como um grande, em escala menor, mas de modo

diferente. Contrariando essa ideia, Márcia Abreu, em um estudo comparativo7 de anúncios

publicados em jornais europeus e brasileiros do início do século XIX, afirma que, entre o

mundo livreiro da Inglaterra, França, Brasil e Portugal do começo dos Oitocentos, haveria

uma diferença de escala e não de natureza. Ou seja, a despeito dos tamanhos diversos, seria

possível encontrar linhas em comum na dinâmica dos mercados desses países. Portanto, os

mercados considerados "atrasados" ou "menores" seguiriam estradas mais estreitas, mas

paralelas às dos mercados grandes.

Essas questões - comportamento de livreiros em mercados grandes e pequenos e

riqueza literária associada ao volume de produção nacional - podem ser discutidas

considerando-se as práticas de livreiros Oitocentistas do Rio de Janeiro e de Paris em meados

do século XIX. Essas são perguntas de extrema abrangência, que demandariam um estudo

árduo e de grande alcance - afinal, muitos eram os comerciantes de livros, os métodos de

publicidade empregados e os meios de circulação de impressos nos dois locais. Este trabalho

não tem a pretensão de englobar todas essas variáveis, mas propõe apresentar um estudo de

caso, cujas conclusões poderão, no futuro, ser testadas em um escopo geral.

Assim, o objetivo principal desta dissertação é observar o funcionamento de parte

do mercado livreiro de Paris e do Rio Janeiro, no período de 1860 a 1876, por meio de uma

análise comparativa de catálogos publicitários divulgados por dois dos maiores profissionais

do livro - Michel Lévy (França) e Baptiste-Louis Garnier (Brasil) - a fim de verificar se sua

ação é semelhante ou divergente. Além disso, a composição de seus acervos será analisada

para observar onde há mais diversidade literária: em Paris, local de abundante produção

nacional de literatura, ou Rio de Janeiro, lugar com produção muito mais restrita.

5 MORETTI, Franco. Atlas do romance europeu: 1800-1900. São Paulo, SP: Boitempo, 2003.

6 Idem, p.170.

7 ABREU, Márcia. Uma questão de escala, não de natureza: um estudo comparativo de anúncios publicados em

jornais europeus e brasileiros do início do século XIX. Conferência no encontro Imprensa e circulação de

ideias: o papel de jornais e revistas nos séculos XIX e XX - Fundação Casa de Rui Barbosa, 13 de setembro de

2016.

12

A escolha dos profissionais analisados neste trabalho não foi aleatória: Jean-Yves

Mollier aponta que Lévy compôs "um valioso catálogo no qual toda a literatura francesa da

época esteve representada",8 ou seja, sua livraria oferece um escopo amplo da circulação de

livros no mercado parisiense e indica o importante papel do livreiro na consolidação da

literatura francesa. Já Baptiste-Louis Garnier é considerado o principal livreiro do Rio de

Janeiro9 e deixou um catálogo de muitos escritores brasileiros, tendo um papel essencial na

criação e difusão da literatura nacional.10

Ambos os livreiros atuavam em seus países também

como editores, além de utilizarem maneiras semelhantes para anunciar suas obras: sobretudo

por meio de anúncios em periódicos e de catálogos independentes ou apensos a livros.

Os catálogos de livreiros eram instrumentos de grande importância para a

divulgação de impressos, uma prática que remonta ao início do comércio livreiro da Idade

Moderna e persiste até os dias de hoje. Eles permitem não apenas estudar as imagens que os

livreiros faziam das práticas de leituras, mas também elaborar uma geografia do livro11

e

indicar os presumidos leitores;12

ou seja, não podem apontar o que efetivamente se lia, mas

por meio deles é possível descobrir o que se podia ler e o que circulava nos mercados

analisados. Eles foram objeto das pesquisas de Juliana Maia de Queiroz,13

Tânia Bessone e

8 MOLLIER, Jean-Yves. Sobre os Itinerários dos Profissionais do Livro na Europa e no Brasil in ABREU,

Márcia & DAECTO, Marisa Midori. A circulação transatlântica dos impressos: conexões.

Campinas:UNICAMP/IEL/Setor de Publicações, 2014. Disponível em

http://issuu.com/marciaabreu/docs/circulacao_transatlantica_dos_impre, acesso em 14/09/2016.

9 MACHADO, Ubiratan. História das livrarias cariocas. São Paulo: Editora da USP, 2012, p. 91.

10 MOLLIER, op. cit..

11 DEAECTO, Marisa Midori. O império dos livros: instituições e práticas de leitura na São Paulo Oitocentista.

São Paulo, SP: Editora da USP, 2011, p. 304.

12 DUTRA, Eliana de Freitas. Leitores de além-mar: a Editora Garnier e sua aventura editorial no Brasil. In:

ABREU, Márcia e BRAGANÇA Aníbal (orgs.) Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São

Paulo: Editora UNESP, 2010, p. 72.

13 QUEIROZ, Juliana Maia. Em busca de romances: um passeio por um catálogo da Livraria Garnier.In:

Márcia Abreu (org.). Trajetórias do Romance: circulação, leitura e escrita nos séculos XVIII e XIX.Campinas,

SP: Mercado das Letras, 2008.

13

Lúcia Bastos,14

Eliana de Freitas Dutra,15

Lúcia Granja16

, Marisa Midori Deaecto,17

Jean-

Yves Mollier,18

dentre outros.

Segundo Robert Darnton, as estratégias de vendas de impressos, ou seja, todos os

tipos de publicidade, devem ser conhecidas a fim de entender o contexto e as atitudes em

relação aos livros,19

o que torna os catálogos valiosas fontes primárias para pesquisas.

No século XIX, eles eram impressos em uma brochura que apresentava o acervo

(parcial ou integral) de cada livraria e, na maioria das vezes, eram distribuídos gratuitamente

no estabelecimento ou enviados mediante pedidos aos clientes.20

Além desses cadernos,

costumava-se também publicar catálogos no interior dos livros, sobretudo no Brasil e na

França, onde as atividades do livreiro e do editor recaíam sobre o mesmo profissional. Nesses

casos, os livreiros-editores aproveitavam o verso da primeira folha, antes da folha de rosto, a

contracapa e, em alguns casos, até mesmo a folha de rosto dos seus impressos para inserir

pequenos catálogos ou listas de obras à venda em suas livrarias. Essa prática permitia usar

todo o papel de impressão, o que não deixava folhas em branco e, por acréscimo, servia como

mais uma estratégia de publicidade.

14

NEVES, Lucia M. Bastos; FERREIRA, Tania M. Bessone. Brasil, Portugal e França: A circulação de ideias

políticas e culturais por meio dos que Tratam em Livros (1808-1830). Disponível em

http://issuu.com/marciaabreu/docs/circulacao_transatlantica_dos_impre, acesso em 10/11/2016.

15 DUTRA, Eliana de Freitas, op. cit..

16 GRANJA, Lúcia. Rio - Paris: primórdios da publicação da Literatura Brasileira chez Garnier. Letras

(UFSM), v. 47, 2013, p. 5.

17 DEAECTO, Marisa Midori, op. cit., p. 304.

18 MOLLIER, op. cit..

19 DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 124.

20 DEAECTO, Marisa Midori, op. cit., 2011, p. 304.

14

Figura 01: Dois anúncios de obras à venda na página de rosto de um livro editado por Michel Lévy. Disponível

em: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k5836487x/f4.planchecontact.r=.langPT, acesso em 26/12/2015.

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15

Figura 02: Anúncio de obras à venda na página de rosto de um livro anunciado por Paulo Martin em 1811.

Disponível em: http://www.caminhosdoromance.iel.unicamp.br/, acesso em 17/11/2016.

16

Figura 03: Exemplos de catálogos em brochura, sendo um francês e um brasileiro.

À esquerda, catálogo da Livraira de Auguste Durand (1856); à direita, catálogo da Livraria Universal de E. & H.

Laemmert (1860).

Fonte: Acervo do projeto “A Circulação Transatlântica dos Impressos”.

17

Figura 04: Exemplos de catálogos no interior de livros, sendo um francês e um brasileiro.

À esquerda: Catálogo da Nouvelle Collection de Classiques à venda na Livraria Hachette. In: BOILEAU,

Nicolas. Art poétique de Boileau. Paris: Hachette, 1850. Disponível em: gallica.bnf.fr/ark:/12148/

bpt6k54623824/f1.planchecontact.r=.langPT.

À direita: Obras à venda na Livraria de Soares & Irmão (Rio de Janeiro). In: ALENCAR, José de. As azas de

um anjo : comedia em um prologo, quatro actos e um epilogo. Rio de Janeiro: Soares & Irmão: 1860. Disponível

em: http://brasiliana.usp.br/handle/1918/00175600#page/224/mode/1up, acesso em 25/10/2016.

Há ainda catálogos publicados em periódicos, contendo centenas de títulos -

muitas vezes, número superior ao que se encontra em catálogos inseridos no início ou no final

de um livro. Eles poderiam ser considerados anúncios, mas diferenciam-se deles pois, na

propaganda, especifica-se o termo catálogo.

18

19

Figura 05: No alto, página do Diário do Rio de Janeiro de 05/11/1851 em que se publica um extrato do catálogo

de obras ficcionais à venda na livraria de B. L. Garnier, em que a lista de títulos ocupa 4 colunas. Acima, detalhe

do título. Disponível em <http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=094170_01& PagFis=40578>,

acesso em 10/06/2016.

De fato, os periódicos são fontes primárias valiosas, nas quais informações

precisas são encontradas. Porém, devido ao foco deste trabalho em catálogos de livreiros e à

imensidão de anúncios e até mesmo catálogos encontrados em periódicos, os dados dessa

fonte não foram considerados no corpus.

Em trabalho anterior,21

estudei catálogos encontrados no interior de livros

Oitocentistas, digitalizados e disponibilizados no acervo digital da Brasiliana Guita e José

Mindlin.22

Foram encontrados mais de 200 catálogos dentre 1087 livros publicados entre

1789 e 1914, sendo Garnier o editor responsável pelo maior número (66, dos quais quatro são

catálogos completos e 62 pequenas listas de obras à venda). Além desses, outros catálogos

foram encontrados por Lúcia Granja23

em Paris, avulsos e de diferentes datas, que formaram

uma base considerável de dados primários acerca do acervo posto à venda por B. L. Garnier

no Rio de Janeiro. Na composição do corpus não foram considerados os catálogos publicados

21

MODENEZ, Julio Cesar. Por dentro dos livros: a presença de romances em catálogos de livreiros (1843-

1865). Monografia apresentada ao Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP, 2013.

22 Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br>.

23 Lúcia Granja gentilmente cedeu seu material para o conjunto de pesquisadores do projeto A Circulação

Transatlântica dos Impressos, do qual ela também faz parte. Ver: GRANJA, Lúcia. Garnier no Brasil: esta

história se faz com homens e livros. In ABREU, Marcia & DAECTO, Marisa Midori. A circulação

transatlântica dos impressos: conexões. Campinas:UNICAMP/IEL/Setor de Publicações. Disponível em

http://issuu.com/marciaabreu/docs/circulacao_transatlantica_dos_impre, acesso em 31/10/2015.

20

em jornais, pois as informações identificadas em catálogos avulsos e em livros fornecem

dados suficientes para os propósitos dessa pesquisa.

Para compor um corpus de catálogos do livreiro francês Michel Lévy, a mesma

técnica foi posta em prática. Dessa vez, o acervo pesquisado foi a Gallica,24

base digital da

Biblioteca Nacional da França, com mais de 600 mil livros disponíveis. Foram encontrados

mais de 1200 livros editados por Lévy, entre 1844 (quando o profissional começou a produzir

seus impressos) e 1914, e cerca da metade deles possui catálogos ao término do livro.

Garnier tem, comparativamente, um número bem menor de catálogos que Lévy.

Entretanto, é preciso levar em consideração a preservação deficiente de impressos no Brasil

em comparação com a França; certamente, Garnier lançou, durante sua longa carreira, um

número de catálogos muito maior. Muitas dessas fontes, infelizmente, foram perdidas ou

destruídas com a ação do tempo.

Diante dessa realidade, foi preciso adequar o corpus desta pesquisa de acordo com

os dados de Garnier. Para cada catálogo do livreiro carioca, foi selecionado um de Lévy de

uma época aproximada. O período analisado abrange de 1860 a 1876. A década de 1860 é um

marco interessante, pois nesse período houve o grande crescimento de edições baratíssimas na

França. Além disso, é quando os dois estabelecimentos livreiro-editoriais alcançam um papel

de destaque em seus países. O ano de 1876 é a data do último catálogo longo de Garnier antes

de um hiato de mais de dez anos sem listas encontradas, tornando necessário o encerramento

do corpus neste ano. Feitos esses recortes, há um total de 9 catálogos, sendo 4 de Lévy e 5 de

Garnier. Os catálogos de Lévy são todos datados; para os de Garnier foi preciso um trabalho

de identificação a fim de obter um ano aproximado.25

CATÁLOGOS DE MICHEL LÉVY

ANO TÍTULO DO

CATÁLOGO FONTE

PÁG.

Nº DE

ROMANCES

1860

Catalogue de La

Librairie de Michel

Lévy Frères Editeurs -

mars 1860

Encontrado nas páginas finais de: LAFONT,

Charles. Les légendes de la charité (Nouvelle

édition revue et augmentée). Paris: Michel

Lévy Frères, 1860. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k542599

35 499

24

Disponível em <http://www.gallica.fr>.

25 Para datar um catálogo, verificam-se as primeiras edições dos romances nacionais, que geralmente são

anunciadas pouco tempo depois do seu lançamento. A partir disso, obtém-se o romance mais novo, que indica a

data mínima do catálogo, ou seja, ele não foi lançado antes do ano de publicação da primeira edição do romance

nacional mais atual. Tal ano, portanto, é apontado como a data aproximada do catálogo. Esse trabalho foi

possível em pouco tempo graças ao apoio do banco de dados do projeto temático, que traz as primeiras edições

de grande parte dos romances Oitocentistas.

21

62/f256.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

1863

Catalogue de La

Librairie de Michel

Lévy Frères Editeurs et

de Librairie Nouvelle -

novembre 1863

Encontrado nas páginas finais de: POE, Egar-

Alan. Euréka. Paris: Michel Lévy Frères,

1864. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k105783

2f/f275.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

36 749

1871

Catalogue de La

Librairie de Michel

Lévy Frères Editeurs et

de Librairie Nouvelle -

decembre 1871

Encontrado nas páginas finais de: RIVIÈRE,

Henri. Mademoiselle d'Avremont; Monsieur

Margerie. Paris: Michel Lévy Frères, 1872.

Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k585761

2r/f300.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

36 772

1875

Catalogue de La

Librairie de Michel

Lévy Frères Editeurs et

de Librairie Nouvelle -

avril 1875

Encontrado nas páginas finais de: OURLIAC,

Édouard. Dernières nouvelles. Paris: Michel

Lévy Frères, 1876. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k542832

31/f358.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

36 1021

Tabela 01: Catálogos publicados por Michel Lévy selecionados para exame.

CATÁLOGOS DE B. L. GARNIER

ANO TÍTULO DO

CATÁLOGO FONTE

PÁG.

Nº DE

ROMANCES

1860 Catálogo da Livraria de

B. L. Garnier - nº 20

Encontrado nas páginas finais de:

ROCHA, Justiniano José da. Compendio de

historia universal (Volume 02 : Da Idade

Media). Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1860.

Disponível em

<http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/19

18/01397720>, acesso em 01/11/2015.

22 30

1864 Catálogo da Livraria de

B. L. Garnier - nº 23

Encontrado nas páginas finais de:

ARAGUAIA, Domingos José Gonçalves de

Magalhães. Cânticos fúnebres. Rio de Janeiro:

B. L. Garnier, 1864. Disponível em

<http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/19

18/01087200 >, acesso em 01/11/2015.

Encontrado também como brochura avulsa e

no interior de outros livros.

32 47

1870 Obras á venda na

mesma casa

Encontrado nas páginas finais de: ALENCAR,

José. O gaúcho (Volume 1). Rio de Janeiro: B.

L. Garnier, 1870. Disponível em

<http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/19

18/00177310>, acesso em 01/11/2015.

2 22

1873 Catálogo da Livraria B.

L. Garnier - nº 2 Catálogo avulso em brochura. 106 494

1876 Livraria B. L. Garnier Catálogo avulso em brochura. 48 259

Tabela 02: Catálogos publicados por B. L. Garnier selecionados para exame.

Para a análise das obras anunciadas, escolhemos concentrar-nos nos romances.

Tal decisão provém da grande presença do gênero nos catálogos, conforme será apontado

adiante. Além disso, a prosa ficcional estava em notável ascensão nos Oitocentos, conforme

22

indicam as próprias listas de obras à venda e a bibliografia produzida pelos projetos

“Caminhos dos romances”,“A Circulação Transatlântica dos Impressos”, entre outros.

Ressaltamos que, em meados do século XIX, diversos termos eram utilizados para

designar romances, como histórias, contos, narrativas epistolares e aventuras.26

Ao mesmo

tempo, livros que hoje não são considerados pertencentes ao gênero, devido a seu escasso

número de páginas, o eram no século XIX como, por exemplo, História da Imperatriz

Porcina, folheto com 26 páginas, anunciado em 1864, no catálogo nº 23 de B. L. Garnier,27

na

categoria Romances, novellas, etc.. Evitando essa diversidade e as inconsistências dela

derivadas, utilizaremos, doravante, o termo romance para designar o conjunto de textos de

prosa ficcional em circulação no período.

Limitações

O corpus selecionado possui coerência cronológica, o que é importante, visto que

se espera observar manutenções e mudanças, visíveis apenas com a passagem do tempo.

Porém, apresenta limitações, que devem ser expostas para que haja um melhor entendimento

dos limites deste trabalho.

Em primeiro lugar, deve ser levado em conta o livro recipiente dos catálogos

encontrados apensos aos impressos. Por exemplo, em edições baratas, provavelmente não

serão encontrados anúncios de livros muito caros; em livros de instrução, o foco do livreiro

pode ser anunciar exemplares do mesmo tipo, visando o público comprador.

Outros fatores são o tamanho do catálogo e a quantidade de romances, que variam

muito, especialmente em Garnier. Por isso, não é plausível fazer uma comparação catálogo

por catálogo; optamos, aqui, por uma análise do conjunto de listas de cada livreiro,

possibilitando assim interpretações mais coerentes.

Outra característica que deve ser levada em conta é a natureza distinta das listas:

algumas são predominantemente compostas por obras editadas por quem compôs o catálogo,

e outras apresentam obras de várias editoras e que estão à venda em determinado lugar. Por

26

SOUZA, Simone Cristina Mendonça de, op. cit., p. 13-14.

27 Catálogo encontrado no interior de: ARAGUAIA, Domingos José Gonçalves de Magalhães. Cânticos

fúnebres. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1864. Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br/

bbd/handle/1918/01087200#page/1/mode/1up>, acesso em 10/09/2016.

23

isso, neste trabalho, não será feita uma análise dos profissionais como editores, mas haverá

foco na sua ação como livreiros.

Os catálogos também não apresentam um panorama geral da atuação do próprio

profissional. Por exemplo, a estratégia empregada pelos editores nessas listas de obras à venda

nem sempre é a mesma empregada em anúncios de periódicos. No recorte abaixo, Garnier

anuncia “romances ilustrados muito baratos” - algo pouco encontrado nos seus catálogos:

Figura 06: Anúncio publicado no Jornal Diário do Rio de Janeiro, em 31 de março de 1854. Disponível em

http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=094170_01&PagFis=39726, acesso em 14/10/2016.

Todas essas variáveis afetam a representatividade das conclusões a que se pode

chegar a partir da análise do material. Portanto, os resultados aqui apresentados não podem

ser entendidos como fatos gerais, mas como interpretações obtidas a partir de um conjunto

específico de dados. Entretanto, acreditamos que eles permitem vislumbrar linhas de força na

ação dos dois livreiros e fornecem indicações que permitem comparar as estratégias

empregadas no Brasil e na França a fim de discutir as questões centrais que este trabalho

24

pretende enfrentar: o tamanho do mercado afeta o modo de atuação dos livreiros? Mercados

onde a produção nacional é grande permitem aos leitores “emoções literárias” mais diversas?

Estrutura do trabalho

Em vista dessas limitações e procurando tecer um estudo de caso entre

profissionais de um mercado grande e um pequeno, este trabalho analisa o conjunto de

catálogos franceses selecionados; em seguida, do conjunto brasileiro; e, por fim, tece

comparações sobre o modo de atuação e de funcionamento dos dois, procurando detectar

linhas de força na prática de ambos e produzir interpretações provenientes delas.

A partir disso, espera-se compreender pontos específicos, como o comportamento

dos profissionais, as estratégias empregadas por eles, as invariáveis na estrutura dos catálogos,

os destaques na seleção de títulos e a relação entre gênero literário, origem da obra e preço.

Além disso, considerando o acervo propagandeado, observa-se a presença do nacional e do

estrangeiro, a fim de aferir a diversidade dos títulos postos em circulação, tanto em língua

original como em tradução, e seu grau de novidade. Interessa verificar, também, a presença de

romancistas hoje considerados canônicos e "desconhecidos" e a possível existência de títulos

em comum entre os dois livreiros.

O primeiro capítulo, intitulado Mercados editorias de Paris e Rio de Janeiro,

apresenta um panorama das atividades de Lévy e Garnier em meio a diversos outros

profissionais do livro: o surgimento e consolidação de suas casas, os contratos com os autores,

as estratégias comerciais, sobretudo de divulgação de impressos, e suas contribuições na

formação do cânone literário. O primeiro item relata como os editores mantinham relações

transatlânticas com letrados de outras localidades, formando uma comunidade internacional

com constante fluxo de impressos. O segundo item traz o histórico do editor Michel Lévy em

meio a um breve panorama sobre o mercado livreiro francês do mesmo período. Já o terceiro

item apresenta Baptiste-Louis Garnier e outros membros do comércio de livros fluminense.

O segundo capítulo, Catálogos de livreiros, traz uma análise detalhada dos

catálogos de livros anunciados à venda por cada profissional, levando em conta a divisão das

seções, os destaques dados a determinados gêneros e autores, o tamanho do acervo anunciado,

os preços dos impressos, os tipos e tamanhos dos volumes, as estratégias utilizadas pelos

editores, sobretudo em relação ao gênero romanesco, e a idade dos romances, ou seja, a

diferença entre as datas da primeira edição e do catálogo. São apresentados os catálogos em

25

dois blocos: em primeiro lugar, os de Michel Lévy, com as devidas comparações no decorrer

dos anos, e em seguida os de Garnier, também com a apresentação da evolução de suas listas.

Por fim, há uma análise comparativa dos dois grupos de catálogos, identificando semelhanças,

diferenças e relações.

O terceiro capítulo, Os romances nos catálogos, é focado nos romances presentes

nas listas, no que concerne à presença e procedência das traduções, à renovação e à atualidade

dos catálogos, ou seja, quais títulos e autores permaneceram ou apresentaram poucas

aparições, e à diferença entre a primeira edição dos romances e a data do catálogo.

Esse tipo de análise não seria possível sem a ajuda do Banco de Dados Circulação

Transatlântica dos Impressos (CiTrIm).28

O banco armazena dados sobre formas e indícios de

circulação de impressos no século XIX e vem sendo alimentado há mais de três anos por

diversos pesquisadores pertencentes ao projeto “A Circulação Transatlântica dos Impressos -

a Globalização da Cultura no Século XIX (1789-1914)”, coordenado por Márcia Abreu e

Jean-Yves Mollier.

Os dados relativos a formas de circulação guardam informações sobre as maneiras

pelas quais os impressos se faziam presentes: Publicações (quando o título é publicado em

língua original), Traduções (no caso de mudança de língua) e Adaptações (quando há

mudança de gênero textual). Os dados referentes a indícios de circulação são os meios pelos

quais se sabe que determinado impresso esteve presente em certo lugar. Para tanto, é possível

recorrer a anúncios de obras à venda; registros de censura; contratos entre editores, livreiros e

escritores; críticas publicadas na imprensa; leilões de livros; inventários post-mortem em que

se indicam livros; registros de importação; registro de leituras; catálogos contendo o acervo de

biblioteca ou gabinetes; e, finalmente, catálogos de livreiros e/ou editores anunciando livros à

venda.

Cada obra é, em primeiro lugar, um Registro, que armazena informações básicas,

ou seja, o título e língua originais e autor. A partir disso, todos os outros elementos são

conectados. Em seguida, faz-se uma pesquisa para identificar as publicações deste título (ou

seja, as edições em língua original realizadas no século XIX) e as eventuais traduções e

adaptações. Busca-se identificar quem é o autor (o que nem sempre é mencionado nos

28

O Banco foi desenvolvido por Márcia Abreu e Orna Messer Levin e conta com suporte e manutenção de Pablo

Farias, com financiamento do CNPq e da FAPESP. Atualmente, trabalham com catálogos Valéria Cristina

Bezerra (Doutorado-FAPESP), Julio Cesar Modenez (Mestrado-CAPES), Fernanda Gomes Gaspar (PIBIC-EM),

Sabrina de Sousa Teco (PIBIC-EM), Rayssa Moraes Sousa (PIBIC-EM), Lilian Tigre Lima (IC-FAPESP), Lucas

de Castro Marques (IC-FAPESP) e Moisés Badissera da Silva (IC-PIBIC).

26

indícios de circulação com que trabalhamos), quais as edições em língua original (buscando

dados completos, como local e data de edição, número de páginas etc.) e quais as traduções e

adaptações (também com dados completos).29

No cadastro dos catálogos de livros à venda são inseridas as informações próprias

desse tipo de publicidade (título do catálogo, livreiro, número de páginas, local da publicação,

data, fonte, acervo e observações) e, em seguida, inserem-se os títulos de romances ali

anunciados, os quais devem ser selecionados a partir dos dados pré-cadastrados. A cada título,

são inseridas as outras informações encontradas: número de volumes, tipo de acabamento,

descrições e outros detalhes. Com isso, o CiTrIm é capaz de apresentar, com exatidão, a

estrutura e os dados de cada catálogo.

29

Para essas pesquisas são utilizados sites como os da Gallica (http://www.gallica.bnf.fr), Brasiliana

(http://www.brasiliana.usp.br), Wikipedia (http://pt.wikipedia.org; http://fr.wikipedia.org), Internet Archive

(http://archive.org), Google Books (http://books.google.com), WorldCat (www.worldcat.org), entre outros.

27

Figura 07: Tela de inserção de dados de um catálogo de livreiro no CiTrIm.

Com isso, é possível efetuar buscas combinadas, permitindo cruzar as diversas

informações fornecidas, apresentadas em tabelas, o que está na base das análises apresentadas

nesse trabalho.

28

Capítulo 1 - Mercados livreiros de Paris e Rio de Janeiro

1.1. Livreiros no intercâmbio transatlântico de impressos

“(...) o livro continua sendo uma parte essencial da cultura humana, e a história do

livro, dos homens que dela participaram - impressores, editores, livreiros e escritores

- um meio privilegiado de aproximação dessa cultura, uma maneira de compreender

como os homens vivem, quais são os seus desejos, suas ambições, suas esperanças e

decepções”.30

Nos dias de hoje, é recorrente figurar nas listas de livros mais vendidos no Brasil

exemplares estrangeiros, que concomitantemente ao lançamento em seu local de origem

chegam a centenas de países ao redor do globo. São reflexos de uma cultura globalizada,

caracterizada pela informação em larga escala transmitida por meios de comunicação cada

vez mais potentes e inovadores. Entretanto, essa nuance não é exclusividade do século XXI.

Séculos antes, mais especificamente no ano de 1860, o catálogo31

de um dos

maiores editores da França no período, Louis Hachette, sugestivamente intitulado

Bibliothèque Variée, já apresentava seis partes, dentre as quais as quatro primeiras são

intituladas I- Litteráture Contemporaine, II- Œuvres des principaux écrivains français, III-

Chefs-d’Œuvre des Littératures modernes étrangèrs e IV- Bibliothèque des meilleurs romans

étrangers. Na primeira seção, obras contemporâneas, apenas francesas, figuram nas listas; na

segunda, o clube seleto de clássicos franceses, de La Fontaine a Montesquieu, reafirma uma

espécie de exclusividade gálica; na terceira, entretanto, aparecem obras-primas traduzidas do

italiano e do inglês; e na quarta, uma miscelânea de romances estrangeiros, dos mais variados

autores e nacionalidades.

Obras estrangeiras conviviam lado a lado com textos genuinamente nacionais,

como bem destacam os títulos das seções. Esse é um retrato do mundo ocidental do século

XIX, uma mistura entre as raízes do nacionalismo e os alicerces da globalização. A literatura,

como importante meio de propagação cultural, esteve no centro desses acontecimentos.

30

MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras: História do Capitalismo Editorial. São Paulo: Editora da

USP, 2010, p. 19.

31 Catálogo encontrado em ASSOLLANT, Alfred. La Mort de Roland, fantaisie épique. Paris, Hachette: 1860.

Disponível em http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k5674627b/f334.image.r=Biblioth%C3%A8que%20

AND%20Varie% C3%A9.

29

Os livros são instrumentos de extrema importância no intercâmbio cultural entre

os países. Além do conteúdo de suas páginas, que trazem ideias, processos culturais e

histórias próprias de seus locais de origem, eles são objetos físicos, cuja materialidade deve

ser levada em consideração.32

Os agentes responsáveis pela criação dos impressos, como o

autor, o editor, o tipógrafo, o impressor, o livreiro e, finalmente, o leitor, público alvo de todo

esse processo, têm papéis fundamentais.33

Aqui, diferenciando-se da abordagem tradicional

que privilegia os autores, abordaremos a importância dos outros elementos do comércio

editorial, especialmente os livreiros e editores.

A figura do editor é de suma importância no processo de propagação de

impressos. A profissão surgiu em Paris e em outras grandes capitais europeias no final do

século XVIII, juntamente com o crescimento da demanda do público e a gradual separação

das funções do livreiro e do editor, dada primeiro na Inglaterra e, posteriormente, na França.34

Mesmo que alguns deles proviessem de profissões do livro, a grande maioria dos editores de

sucesso na França Oitocentista pertencia a outros meios sociais, em busca de elevar sua

posição na sociedade. Assim, o editor tornava-se um mediador entre o mundo fechado da

livraria e o leitor, levando à venda os livros de acordo com os gostos do público.35

Logo,

surgiu a produção de livros em massa, vendidos a preços mais em conta, e foram criadas

coleções de bolso e obras destinadas a públicos considerados inferiores, atendo a uma grande

parcela de leitores.

Mas até meados do século XIX, os nomes mais influentes do comércio do livro na

França eram, em sua maioria, profissionais de serviço duplo, ou seja, livreiros-editores, e

acabaram tornando-se protagonistas da história editorial francesa. No período, essas grandes

corporações já produziam livros em série, sendo verdadeiras empresas capitalistas com o

objetivo de atingir as massas. A impressão deixou de ser um trabalho artesanal para ser

direcionada a uma produção em larga escala, dependente da tecnologia e do lucro, e a

32

CHARTIER, Roger. As Revoluções da Leitura no Ocidente. In: ABREU, Márcia (org.). Leitura, História e

História da Leitura. Campinas, SP: Mercado das Letras, 1999, p. 79.

33 ABREU, Márcia. Introdução. Literatura e História - Presença, Leitura e Escrita de Romances. In:

________________ (org.). Trajetórias do Romance: circulação, leitura e escrita nos séculos XVIII e XIX.

Campinas, SP: Mercado das Letras, 2008, p. 12.

34 MOLLIER, Jean-Yves. Sobre os Itinerários, op. cit., p.83.

35 Idem.

30

atividade livreira passou a ter cunho empresarial.36

O livro passou a trazer consigo a condição

de mercadoria, tornando-se uma propriedade privada com contornos capitalistas.37

Com o avanço das tipografias e do sistema de transporte, logo esses profissionais

abriram filiais de seus empreendimentos, ramificando-se primeiro pela Europa e, em seguida,

pelos continentes além-mar, graças à nova tecnologia dos navios, propagando seus impressos

a cada vez mais lugares.38

Esse intercâmbio cultural, sobretudo de livros, tornou as relações culturais entre

os países mais abrangentes e dinâmicas. Assim, formava-se uma comunidade letrada

internacional com seu próprio funcionamento e hierarquia. De acordo com Serge Gruzinsky,

“a moda de um autor e a habilidade comercial dos livreiros fazem com que se devorem as

mesmas obras em diferentes partes do mundo”,39

o que configura uma rede mundial de gostos

e aspectos culturais semelhantes.

Diversas pesquisas desenvolvidas no âmbito do projeto de cooperação

internacional “A circulação transatlântica dos impressos: a globalização da cultura no

século XIX”40

têm confirmado a afirmação de Gruzinsky41

e apontam que Brasil fazia parte

desse roteiro de circulação cultural, que tinha em Paris sua capital literária.

Pascale Casanova denomina essa nova configuração cultural global de República

Mundial das Letras. Ela prevê um modo próprio de funcionamento e hierarquias a partir de

uma geografia das artes, um mapa marcado pela oposição entre um centro literário (no caso,

Paris) e suas periferias.42

A França tinha em Paris sua capital política, mas o mundo a via como a capital

das Letras, do bom gosto e do saber intelectual. Era também o lugar da revolução, dos direitos

humanos e da boêmia; uma cidade mítica, constantemente descrita pelos viajantes e

reproduzida pelos escritores.43

Tudo isso fazia dela a capital da pátria universal da cultura, um

36

LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. A formação da leitura no Brasil. São Paulo: Ática, 1996, p. 14.

37 Ibidem, p.60.

38 ABREU, Márcia, A circulação Transatlântica dos Impressos. In: Livro-Revista do Núcleo de Estudos do Livro

e da Edição, v,1, n.1, São Paulo: 2011, p.117.

39 GRUZINSKY, Serge. Les quatres partes du monde - histoire d’une mondialisation. Paris: Éditons de La

Mar6nière, 2005.

40 ABREU, Márcia. A circulação Transatlântica dos Impressos, op. cit..

41 Ver: ABREU, Márcia & DAECTO, Marisa Midori. A circulação transatlântica dos impressos: conexões, op.

cit..

42 CASANOVA, Pascale. A República Mundial das Letras. São Paulo: Estação Liberdade, 2002, p. 40.

43 Ibidem, p. 43.

31

local de consagração literária cujo prestígio e reconhecimento possibilitavam a livros e

escritores uma espécie de desnacionalização e universalização.44

É nítido, assim, constatar que Paris apresentava um mercado editorial vasto, com

vários profissionais convivendo numa realidade de disputa acirrada pelo mercado leitor. Nas

ruas da cidade, o público leitor possuía diversas opções, preços e formatos para adquirir seus

livros, que foram se tornando cada vez mais acessíveis com o decorrer do século. Suas táticas

publicitárias para atrair novos clientes caracterizavam o que Jean-Yves Mollier chama de

“lógica da oferta”:45

os profissionais do livro deveriam atender ao dinamismo e à inovação

permanentes, sem os quais a clientela não seria seduzida.

Apresentamos, a seguir, alguns dos principais agentes dessa acirrada disputa pelos

leitores durante o século XIX.46

1.2. Comércio livreiro parisiense: um mercado acirrado

Desde o início do século, uma rede de concorrentes e estratégias capitalistas foi

sendo construída na velha Paris. Já nos anos 1810, o livreiro-editor Camille Ladvocat investia

em luxo e publicidade, tendo sido a inspiração de Balzac na construção do personagem

livreiro Dauriat nas Ilusões perdidas. Ladvocat retomou e melhorou os métodos publicitários

de seu antecessor, Charles Joseph Panckoucke, e sua casa editorial funcionou até 1854.47

Outro nome importante foi Charles Gosselin, cuja empresa foi fundada em 1820 e perdurou

também até 1854. Editor dos grandes românticos Lamartine, Vigny, Hugo e Balzac, publicava

em todos os formatos possíveis, aumentando sua rentabilidade.48

Um profissional de bastante fama até os dias hoje é Pierre Jules Hetzel. Ele

chegou a Paris em 1835, iniciou um comércio de livros e depois tornou-se sócio de Jean-

Baptiste Paulin. Nessa época, publicou muitos livros religiosos e, nos anos 1840, passou a ser

44

Ibidem, p. 162.

45 MOLLIER, Jean-Yves. Sources et methodes en histoire du livre, de l’edition et de la lecture. Trabalho

apresentado à Escola São Paulo de Estudos Avançados sobre a Globalização da Cultura no Século XIX,

UNICAMP, 2012.

46 Apresentamos apenas os profissionais que exerciam as funções de editores e/ou livreiros, como ficaram

conhecidos a partir do início do século XIX. Antes disso, Paris apresentava inúmeros impressores e empresários

da imprensa, que não serão tratados aqui. Ver: MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., 2010

47 MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., p. 274.

48 Ibidem, p. 272.

32

editor de obras românticas e de ficções voltadas ao público juvenil. A crise econômica de

1845 atingiu seus negócios e, em 1846, se associou com Jean-Victor Warnod.49

Gervais Charpentier era um jovem quando se lançou como livreiro na década de

1830. Para combater a contrafação belga que dominava o mercado durante a Monarquia de

Julho e produzia livros a preços baratíssimos, prejudicando o mercado parisiense, Charpentier

diminuiu a qualidade dos impressos para baixar o preço dos mesmos, enquanto os outros

editores, pressionados pelos autores, resistiam ao barateamento.

Em 1838, o editor lançou o primeiro de cerca de 400 volumes de sua nova

coleção, que oferecia ao leitor o equivalente a dois volumes in-8º por apenas 3,50 francos, em

vez de 12 a 15 francos, como era o costume. Geralmente eram reedições de clássicos, que se

tornavam mais em conta devido à ausência de direitos autorais.50

A iniciativa de Charpentier

inaugurou uma tendência de barateamento que viria a popularizar, ainda mais, o acesso ao

livro na França.

Para se ter uma ideia, a média salarial de um trabalhador industrial na França

desse período era de 1,89 francos por dia, gerando menos de 45 francos por mês.

Trabalhadores da área agrícola ganhavam ainda menos, cerca de 1,41 francos a diária.51

Com

a média de preço de 15 francos por livro, tornava-se inviável adquirir mais de um exemplar

por mês. Impulsionado pela nova prática de Charpentier, o público leitor passou a comprar

mais, gerando uma rápida reação do mercado; logo as principais concorrentes tomaram suas

providências.52

Foi nesse contexto que surgiu uma das principais casas editorias de Paris, a

Michel Lévy Fréres, posteriormente conhecida como Calmann-Lévy, e que perdurou por boa

parte do século. A origem do empreendimento se deu em 1841 quando Michel Lévy, aos 20

anos, oficializou-se livreiro e já começou a editar seus primeiros livros.53

O primeiro livro editado pela casa como se tornaria conhecida, Michel Lévy

Fréres, é Pierre Mouton, de Louis Reybaud, em 1844.54

De fato, no site da Gallica, que

49

Ibidem, p. 338-340.

50 Ibidem, p. 275-277.

51 CHANUT, Jean-Marie; HEFFER, Jean; MAIRESSE, Jacques; POSTEL-VINAY, Gilles. Les disparités de

salaires en France au XIXe siècle. Disponível em http://www.persee.fr/web/revues/home

/prescript/article/hism_0982-1783_1995_num_10_3_1562, acesso em 28/08/2015.

52 MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., p. 281.

53 MOLLIER Jean-Yves. Michel & Calmann Lévy ou la naissance de l'édition moderne. Paris: Calmann-Lévy,

1984, p. 53.

54 Ibidem, p. 73.

33

disponibiliza obras digitalizadas da Biblioteca Nacional da França, esta é a obra mais antiga

que aparece, em dois volumes.55

Esse romance, segundo Mollier, é a grande obra do reinado

de Luis Felipe da França, com uma trama política totalmente baseada na situação

contemporânea à publicação.

De acordo com as pesquisas de Martyn Lyons, Reybaud era um dos autores de

best-sellers Oitocentistas na França, sendo Jérôme Paturot, o romance citado no título de

Pierre Mouton, seu maior sucesso.56

Nos anos seguintes, após o sucesso do autor nos

folhetins, Lévy publicou outros dois de seus romances: César Falempin e Le Dernier

descommis-voyageurs.

A cada romance o editor pagava 1200 francos ao autor, com uma tiragem de 600

exemplares de 2 volumes vendidos a 15 francos.57

Com o estoque esgotado, chegariam aos

cofres de Lévy 9000 francos; com isso, é possível imaginar os ganhos financeiros do livreiro-

editor, que foram crescendo juntamente com seu prestígio e o número de exemplares,

produzidos a uma população já bastante alfabetizada.

55

Disponível em http://gallica.bnf.fr/services/engine/search/sru?operation=searchRetrieve&version=1.2&

collapsing=disabled&query=%28gallica%20all%20%22Pierre%20Mouton%20par%20l%E2%80%99auteur%20

de%20J%C3%A9r%C3%B4me%20Paturot%22%29%20and%20dc.relation%20all%20%22cb31204492d%22,

acesso em 20/11/2015.

56 LYONS, Martyn. Les best-sellers. In: CHARTIER, Roger & MARTIN, Henri-Jean. Histoire de l’édition

française. Paris: Fayard / Promodis apud ABREU, Márcia. A circulação de romances como problema para a

história literária. Trabalho apresentado à Escola São Paulo de Estudos Avançados sobre a Globalização da

Cultura no Século XIX, UNICAMP, 2012, p. 9.

57 MOLLIER, Jean-Yves. O dinheiro e as letras, op. cit., p. 73.

34

Figura 08: Capa do livro Pierre Mouton par l’auteur de Jérôme Paturot, de Louis Reybaud, primeira obra

editada pela Michel Lévy Frères, em 1844

Esse tipo de acordo atraía os autores, e o editor logo foi aumentando o número de

seus contratados.58

Sempre visando agradar o público, Lévy procurava publicar os romances

em voga no momento; assim, ele chegou ao célebre Alexandre Dumas, autor d’Os Três

Mosqueteiros e de centenas de outros romances populares, principalmente por meio do

sucesso do romance-folhetim.59

Dumas é considerado um mestre na arte folhetinesca, que consistia em publicar

romances em partes em periódicos. O gênero ganhou um lugar fixo e o início de uma

periodicidade constante em 1836, quando o jornal La Presse publicou o romance La vieille

fille de Balzac em partes, a fim de impulsionar as vendas do periódico. Mas foi Alexandre

Dumas, em 1838, com Capitaine Paul, que primeiramente trabalhou com as características

próprias do folhetim, como diálogos vivos e ganchos no final dos capítulos.60

O grande

58

MOLLIER Jean-Yves. Michel & Calmann Lévy, op. cit., p. 74.

59 Ibidem, p. 77.

60 MEYER, Marlyse. Folhetim: uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 58-61.

35

aumento na venda de jornais, impulsionado pela criação desses rodapés romanescos, logo

chamou a atenção dos editores de livros.61

A primeira obra de Dumas editada na casa Lévy foi um curto ensaio, Réponse à

l’auteur du pamphlet intituilé: Maison Alexandre Dumas et compagnie, em 1845.62

No

mesmo ano, em parceria com Pétion, a quem pertenciam os direitos d’O conde de Monte-

Cristo, Lévy publicou o romance, anunciando-o nos grandes jornais da época - o preço da

obra, dividida em dez volumes, passou de 50 para 90 francos em apenas um ano. Também

neste período, Lévy firmou um acordo com o editor teatral de Dumas, Troupenas, para

publicar a obra completa do escritor em formato in-8º. Pouco tempo depois, romances de

sucesso como Le Capitain Paul, Le Chavalier de Harmenthal e Ving Ans Après vieram à luz,

sempre vendidos na livraria Michel Lévy Frères.63

O editor descobrira, assim, o potencial

mercadológico desse autor das massas.

Além da obra completa de romances e teatro de Dumas, Lévy passou a produzir

os dramas de Vitor Hugo e as Bibliothèque dramatique e Bibliothèque littéraire, frutos de

contratos com novos autores.64

61

Ibidem, p. 63.

62 MOLLIER Jean-Yves. Michel & Calmann Lévy, op. cit., p. 77.

63 Idem.

64 Ibidem, p. 129.

36

Figura 09: Catálogo intitulado Bibliothèque dramatique, publicado em 1847. In: THOMAS, Émile. Histoire des

Ateliers nationaux considérés sous le double point de vue politique et social, des causes de leur formation et de

leur existence, et de l'influence qu'ils ont exercée sur les événements des quatre premiers mois de la République.

Suivi de pièces justificatives. Paris, Michel Lévy Frères: 1848. Disponível em

http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k61088740/f10.planchecontact.r=%20paul%20f%C3% A8val.langPT, acesso

em 25/08/2015.

37

Entretanto, sua Bibliothèque littéraire parece ser composta não apenas de novatos;

em 1848, em catálogo no interior de livro, o famoso Dumas aparece com grande destaque.

Figura 10: Catálogo intitulado Bibliothèque littéraire, com destaque para as obras de Dumas. In: DUMAS,

Alexandre. La Reine Margot. Paris, Michel Lévy Frères: 1847. Disponível em

http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k61437494/f4.image, acesso em 25/08/2015.

Em 1853, Lévy passou a produzir as obras de Stendhal, o que lhe custou um

contrato de apenas 2000 francos com livros à venda por cerca de 1,5 francos o volume. Mais

uma vez, o livreiro-editor soube tirar grande vantagem em seus acordos comerciais, e garantia

à sua lista de autores um nome muito conhecido da primeira metade do século.65

Em 1855, quando o mercado editorial se aquecia com edições vendidas a preços

em conta, Lévy passou a investir em uma maneira diferente de barateamento. Ao invés de

65

Ibidem, p. 237.

38

lançar coleções de bolso em formato 1-32º, como faziam seus concorrentes, especialmente

Hachette, ele priorizou a produção em larga escala de livros maiores, como 1-18º. Isso acabou

estimulando as outras casas a aumentarem suas produções e a verdadeiramente baixarem os

preços dos seus impressos.66

Ainda em 1855, numa associação com Hetzel, Lévy criou a Colletction Hetzel et

Lévy, com livros em formato 1-32º. Também passou a editar obras de Balzac e George Sand,

assumiu os direitos de publicação do editor de teatro de Dumas, Troupenas, e tornou-se editor

dos romances de Dumas não publicados pelo jornal Le Siècle.67

Em 1857, um dos seus maiores sucessos editoriais veio à luz: a primeira edição de

Madame Bovary, de Gustave Flaubert. Lévy chegou até ao jovem autor por meio do folhetim

publicado na Revue de Paris; ele ganhou 800 francos com a publicação de sua obra, 400 por

volume. A primeira edição, com 6000 unidades, foi rapidamente esgotada, sendo seguida de

outras duas impressões que somaram, ao todo, 29 mil exemplares. Na renovação de seu

contrato, em 1862, Flaubert recebeu 10 mil francos para que Lévy pudesse continuar editando

Bovary e publicasse Salammbô e outro romance a ser escrito.68

Era um grande avanço para o

escritor principiante, que pouco tempo depois foi processado pela censura devido ao conteúdo

imoral de sua obra.

Nos anos 1860, com o grande crescimento de sua livraria, Lévy inaugurou outra

loja perto dos grandes teatros e óperas de Paris na Boulevard des Italiens, local de prestígio

cultural na França.69

Com isso, ele acumulou ainda mais prestígio à sua casa, que se mantinha

em crescimento e inovação constantes. No final dos anos 1860, seu capital de operação era

estimado em quase 2 milhões de francos.70

66

Ibidem, p. 265.

67 Ibidem, p. 280.

68 Ibidem, p. 341-343.

69 Ibidem, p. 312.

70 Ibidem, p. 397.

39

Figura 11: Capa de livro com a Michel Lévy na Boulevard des Italiens. In: EYMA, Xavier. Le roman de Flavio:

Naples en 1798. Paris, Michel Lévy Frères: 1862. Disponível em

http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k107387f/f1.image.r=%20boulevard%20des%20Italiens, acesso em

28/08/2015.

Também nos anos 1860 a Michel Lévy Frères passou a publicar as obras

completas de Balzac. Nos anos 1870, a casa se dedicava aos grandes lançamentos de Balzac e

Victor Hugo e às coleções Collection Michel Lévy, com livros a 1,25 francos, e Bibliothèque

contemporaine, a 3,50 francos.71

Em 1874, Calmann assumiu a empresa, que então possuía uma nova loja na Rua

Auber - seu irmão, Michel, viria a falecer no ano seguinte. A corporação, outrora Michel Lévy

Frères, passou a ser chamada Calmann Lévy; 72

durante alguns anos, na folha de rosto de seus

livros, um lembrete avisava aos leitores que aquela era a antiga casa Michel Lévy:

71

Ibidem, p. 423.

72 Idem.

40

Figura 12: Folha de rosto com o novo nome da casa de edição, antiga Michel Lévy Frères. In: BALZAC,

Honoré de. Oeuvres complètes de H. de Balzac. XX-XXIII, Oeuvres diverses. Tome 21, parties 3-4. Paris,

Calmann Lévy: 1874. Disponível em http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/ bpt6k96007406.r=.langPT, acesso em

28/08/2015.

A presença do aviso nas edições posteriores à mudança confirma a grande

importância e status que a Michel Lévy Frères acumulou em sua trajetória. Uma casa editorial

que captou para si os grandes nomes da literatura francesa, inovou na produção de impressos,

barateou e ampliou o acesso dos livros ao público leitor, soube investir em sucessos vindouros

e, sobretudo, destacou-se no competitivo mercado livreiro francês. Mesmo que as histórias

literárias tradicionais ignorem o fato, os profissionais do livro, convivendo numa lógica de

mercado, não hesitavam em acumular cada vez mais ganhos.

Mollier bem resume a trajetória desse homem das letras:

41

Michel Lévy morre proprietário de uma mansão no Champs-Elysées, de um château

e de um vinhedo em Bordelais, de uma editora localizada a poucos passos da nova

Opera, e, o mais importante, de um valioso catálogo no qual toda a literatura

francesa da época esteve representada, de Balzac à Vigny, passando por Dumas,

Nerval, George Sand, Stendhal e Tocqueville.73

O principal concorrente de Lévy era o livreiro Louis Hachette. Este iniciou suas

atividades em 1826, sucedendo Jacques-François Brédif, ingressando num círculo de relações

repleto de oficiais ministeriais e criando ao seu redor uma rede de grande influência e poderio.

Em 1840, Louis Bréton tornou-se seu sócio, dando origem, em 1846, à Hachette et Cie.74

Nos anos 1850, sua casa editora expandiu-se fortemente, contratando, sobretudo,

autores pouco conhecidos do público. A partir de 1865, a livraria tornou-se também uma

grande empresa de distribuição de impressos, sobretudo jornais, e implantou as bibliotecas

nas estações ferroviárias. Louis Hachette era um trabalhador empenhado em aumentar sua

fortuna, e manteve o monopólio nas estações até a situação com os outros editores ter se

tornado insustentável.75

Impressiona o sucesso alcançado por algumas obras editadas por Hachette. Por

exemplo, a Petite Histoire de France, de Mme. de Saint Ouen, vendeu mas de 2,2 milhões de

cópias entre 1838 e 1880.76

Sua estratégia de lançamento de coleções barateava o preço dos

livros, o que levava a uma produção em massa e, consequentemente, ao aumento das vendas.

O livreiro-editor compunha coleções específicas para diversas fatias do público. A

Bibliothèque Varieé contava com os considerados “gênios” da literatura mundial, com a

presença dos franceses contemporâneos, as traduções de obras da Antiguidade e de textos

estrangeiros, de Shakespeare, Goethe, Byron, entre outros, cujos preços, mesmo não sendo tão

altos, não chegavam a ser baratíssimos. Ao lado desses, completavam a lista relatos de

viagens, textos de história natural e anuários. Já a Bibliothèque des chemins de fer, com os

livros vendidos nas estações de trem, era composta de autores mais desconhecidos, o que

ocasionava preços mais em conta. Desses, alguns poucos permaneceram na História, como

Lamartine e Paul Féval. Também havia a Bibliothèque des merveilles, uma série de relatos de

73

MOLLIER, Jean-Yves. Sobre os Itinerários, op. cit..

74 MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., p. 272.

75 Ibidem, p. 291.

76 CHARTIER Roger e MARTIN, Henri-James. Histoire de l’édition française - tome III. Paris:

Fayard/Promodis, 1990, p. 204.

42

viagens colecionável.77

Com amizades sólidas e inimizades mais fortes ainda, soube conquistar os

diversos poderem em voga na França, desde o Rei Luis Felipe, Napoleão III e a Terceira

República, esta última tendo impulsionado a edição escolar e universitária sob o domínio do

editor, que viria a tornar-se conhecido por esse tipo de trabalho.78

Como os demais concorrentes, Hachette possuía métodos para ter exclusividade

com seus autores e aumentar seu prestígio. Por isso, ele remunerava os escritores por meio de

percentual, fixava com eles contratos de longa duração, buscava a maior rentabilidade por

meio da reprodução e revenda de clichés, investia em demasia em publicidade, presenteava os

jornalistas criadores de opinião e frequentava a corte e as sedes do poder, adaptando-se às

condições favoráveis do seu tempo. Até mesmo Michel Lévy, seu principal concorrente, o

admirava pela excelente administração de seus negócios.79

Com isso, Hachette, bem como Lévy, podia vender livros a preços baratíssimos.

Seus catálogos apontam listas de obras de 25 centavos a 5 francos, com formatos de até in-18º

e impressão em papel jésus, de baixa qualidade, porém mais em conta.80

77

Ibidem, p. 207.

78 MOLLIER, Jean-Yves. Sobre os Itinerários, op. cit..

79 Idem.

80 Catálogos encontrados em livros editados por Hachette, disponibilizados no site da Gallica. Geralmente, esses

catálogos de livros apresentam obras baratíssimas e, quase sempre, de autores desconhecidos.

43

Figura 13: Catálogo Hachette de literatura popular, com livros à venda por 1 franco o volume. In: RACINE,

Jean. Chefs-d'oeuvre. Paris, Hachette: 1868. Disponível em: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/

bpt6k5534972v/f312.image, acesso em 25/08/2015.

Mesmo com a morte de Louis Hachette, em 1864, a sociedade sólida que

construíra, baseada em interesses coletivos que previam judicialmente aos herdeiros dos

falecidos que mantivessem o acordado com os demais dirigentes vivos, permitiu que a livraria

não decaísse. Além desse cuidado, os casamentos arranjados entre os filhos de Hachette e

44

parentes de seus sócios possibilitaram a formação de uma rede familiar e comercial forte, que

perdura até hoje na França.81

O caso de Hachette é, sem dúvidas, emblemático na história da edição francesa.

Sua competência publicitária, o círculo de influências e o bom entendimento das diversas

fatias do público leitor tornaram-no uma peça chave no tabuleiro no mercado do livro, um

jogo em que ele era mestre.

Com a revolução do preço do livro, os editores investiam na compra definitiva, a

baixo custo, da propriedade literária de manuscritos, a tecnologia de máquinas rotativas

possibilitava uma tiragem mais alta. Tudo isso somado ao papel mais em conta à mão-de-obra

feminina, mais barata, contribuiu para uma popularização em massa dos impressos.82

Uma produção tão numerosa não era exagerada; a taxa de alfabetização na França

crescia exponencialmente. No recenseamento de 1866, quase 63% dos homens e 56% das

mulheres declararam saber ler; 83

numa população total de mais de 37 milhões de habitantes,

mais de 20 milhões pertenciam ao público alvo dos editores.

Mesmo com um grande público leitor local, o mercado de livros na França

ultrapassou as fronteiras para oferecer seus impressos a diversas outros territórios.84

Atraídos

pelas condições favoráveis de Paris, os profissionais estrangeiros mandavam produzir, na

França, materiais impressos nas línguas mais raras e diversas.85

Além disso, o país exportava

seus livreiros e editores, como demonstra a alta quantidade de franceses exercendo suas

profissões no Brasil e em Portugal.86

Uma dessas companhias de grande alcance internacional foi a Garnier Frères. Os

irmãos eram quatro: Bapitste, que abriu uma filial no Brasil, e Auguste, Hypolliye e Pierre,

que atuavam na França. Segundo Mollier, eles eram exímios comerciantes, que buscavam “o

poder financeiro, [e] o meio mais apropriado para conquistá-lo era o comércio de livros e eles

aplicaram os seus talentos neste último a fim de colocar em harmonia meios e fins”.87

81

MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., p. 272.

82 Ibidem, p. 277.

83 FRANÇOIS, Furet; WLADIMIR, Sachs. La croissance de l'alphabétisation en France (XVIIIe-XIXe siècle).

In: Annales. Économies, Sociétés, Civilisations. 29e année, N. 3, 1974. pp. 714-737.

84 MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., p. 14.

85 COOPER-RICHET, Diana. Paris, capital editorial do mundo lusófono na primeira metade do século XIX?.

Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010487752009000200009&script= sci_arttext#nt01,

acesso em 20/08/2015.

86 ABREU, Márcia. A circulação Transatlântica dos Impressos, op. cit., p. 119.

87 MOLLIER, Jean-Yves. O Dinheiro e as Letras, op. cit., p. 338.

45

A história do negócio começou em 1828, quando Auguste era empregado do

livreiro Saint-Jorre, onde também trabalhava o jovem Michel Lévy. Em 1833, Auguste se

instalou no Palais-Royal, sucedendo o livreiro Lerosey. Obteve o certificado de livreiro em

1835 editando, no princípio, obras obscenas, o que causaria alguns problemas com a justiça

futuramente. Hypollite chegou a Paris dois anos depois do irmão, e em 1838 passou a ser

livreiro com Auguste, bem como Pierre, que já tinha uma pequena loja anos antes.88

A expansão da Garnier Frères foi concomitante ao advento da Segunda República

e, diferentemente dos seus concorrentes, a empresa não seguiu a tendência do barateamento.

Pelo contrário, no período das coleções baratíssimas, lançou as Chefs-d’oeuvres de la

litterature française, antecessora dos Classiques Garnier, coleção moderna e ornada, o que

viria a ser sua marca. Seu acervo reunia, em maioria, obras escolares e clássicos franceses.

Com a morte de Auguste em 1887, Hippolyte assumiu a empresa sozinho e após sua morte,

em 1911, Auguste-Pierre, seu sobrinho, levou os negócios adiante.89

Pierre Larousse, outro nome de grande importância, iniciou as atividades como

livreiro-editor em 1852. Editor de obras escolares e universitárias, é famoso até hoje pelos

dicionários e enciclopédias. Seu sócio, Augustin Boyer, se ocupava da livraria, enquanto

Larousse escrevia livros. No início, ocupava uma casa na mesma rua que Hachette, mas

depois mudou de estabelecimento devido à forte concorrência.90

Já em 1855 foi fundada a

Librairie Nouvelle por Achille Bourdilliat e Charles Jaccottet, que teve um rápido êxito com a

publicação da Comédia humana em 45 volumes e outras obras de Balzac e a impressão do

periódico Le Monde ilustre; entretanto, desapareceu nos anos 1860.91

O retorno de Charpentier deu-se apenas em 1856, com uma nova loja, bem mais

modesta que a Hachette, os irmãos Lévy ou os Garnier. Mais uma vez pioneiro, nos anos

1860 foi o primeiro a se opor ao monopólio de Hachette nas estações ferroviárias. Seu filho,

Georges Auguste (Zizi), herdou a empresa do pai e assinou contratos com ninguém menos

que Émile Zola, antes da era dos Rougon-Macquart, e Gustave Flaubert. Em sociedade com

Eugène Fasquelle, em 1887, lançou a popular coleção Auteurs célèbres, a 0,60 francos o

volume.92

Nessa época, a confecção de 1500 exemplares com tiragens simples rendia 20% do

88

Ibidem, p. 323.

89 Ibidem, p. 323-338.

90 Ibidem, p. 359-366.

91 Ibidem, p. 281-282.

92 Ibidem, p. 291-316.

46

preço de capa, se impresso em Paris, ou 15%, se impresso na periferia ou no interior; o valor

diminuía se aumentasse o número de exemplares.93

Outra revolução nos meios de venda de livros deu-se nos anos 1870, quando os

editores voltaram a investir na qualidade dos livros e, portanto, em obras mais caras. Foi nessa

época que surgiu a empresa de venda de crédito de Abel Pilon. Ele criou uma rede de

revendedores de varejo que se dirigiam, especialmente, a clientes particulares, sendo o

pioneiro da venda a domicílio.94

Em 1874, Pilon se uniu a Michel Lévy para vender as Obras Completas de Balzac

a 180 francos o volume, mais que um salário médio mensal. A operação concedia a Pilon uma

comissão de 45% do preço, e prazos de pagamentos de até seis meses com o editor. Ele

parcelava os livros, e com isso mantinha contato com o cliente por um bom tempo.95

Logo os editores perceberam que eles mesmos podiam operacionalizar essa venda.

Nos anos 1890, os catálogos da Calmann-Lévy já apresentavam boletins de encomenda

destacáveis com opções de pagamento a prazo, e representantes da empresa eram

responsáveis em receber o pagamento todo início de mês.96

Com a nova estratégia de venda a

crédito, os livros encareceram; o método foi adentrando o século XX, onde se aprimorou com

as grandes corporações de vendas de livros on-line.

O mercado editorial da parisiense do século XIX é, sem dúvida, um objeto de

estudo rico e complexo. Paris, o centro do mundo cultural ocidental, era uma cidade

cosmopolita, e seus profissionais eram numerosos e inovadores. Com tamanha concorrência,

os livreiros e editores eram obrigados a investir em novas ideias e ramificações distintas.

Mollier aponta que existiam em Paris profissionais especializados, por exemplo,

em livros científicos, políticos, religiosos, escolares, literários etc. Ou seja, para sobreviver ao

competitivo mercado, era preciso apostar em fatias diferentes do público que, cada vez mais

alfabetizado, crescia exponencialmente.97

De fato, o grande número de possíveis leitores

possibilitava uma segmentação; por outro lado, incentivava a produção em massa: com o

poder aquisitivo limitado da maioria, foi preciso baixar o preço e, por conseguinte, aumentar o

93

Ibidem, p. 294.

94 Idem, p. 370-383.

95 Idem.

96 Idem.

97 MOLLIER, Jean-Yves. O dinheiro e as letras, op. cit..

47

número de exemplares. Afinal, um mercado consumidor extenso não é garantia de sucesso

comercial se os profissionais não souberem atingir seu público-alvo.

Assim, livreiros-editores de massas conviviam com profissionais requintados;

edições in-32º, baratíssimas, dividiam a prateleira com livros in-4º luxuosamente

encadernados. Dos dois lados do mundo editorial, o papel desses profissionais foi essencial na

constituição do mito literário de Paris, e sua eficácia cruzou os mares a oeste a fim de alçar

novos públicos.

1.3. O mercado livreiro carioca: o mundo no centro do Rio

O primeiro editor de livros no Rio de Janeiro foi o lisbonense Isidoro da Fonseca,

que em finais do século XVIII era responsável pela impressão de alguns poucos exemplares.

Uma das primeiras livrarias foi a de Paulo Martin,98

que chegou ao Brasil em 1800, onde

estabeleceu-se, vendendo várias obras por conta do seu pai, livreiro em Portugal, formando

uma rede comercial transatlântica já no início dos Oitocentos.99

Outro nome importante foi o

de João Roberto Bougeois, que pelo menos desde 1799 estabelecera sua casa de comércio,

tornando-se um dos livreiros mais famosos do Rio de Janeiro no início do século graças às

suas atividades como editor.100

Em 1808, com a chegada da família real ao Brasil, aportada no Rio de Janeiro, a

atividade livreira sofreu uma imensa revolução. Com a chegada de milhares de europeus à

colônia, a abertura dos portos e a vinda da Biblioteca Real, diversos livreiros passaram a abrir

seus comércios nas ruas cariocas, muitas vezes abastecidos por obras editadas ilegalmente em

Paris e Londres, que chegavam por navios a vapor nos recém-abertos portos brasileiros.101

Os primeiros prelos de impressão após Isidoro da Fonseca vieram de Portugal

para a criação da Impressão Régia, que monopolizava a atividade editorial no país e era usada,

98

HALLEWELL, Laurence. O Livro no Brasil - sua História. São Paulo, SP: T. A. Queiroz: Edição da

Universidade de São Paulo, 1985, p. 14. (Edição original: Books in Brazil: A history of publishing trade.

Metuchen & Londres: The Scarecrow Press, 1982.)

99 NEVES, Lucia M. Bastos; FERREIRA, Tania M. Bessone, op. cit., p.16.

100 NEVES, Lucia M. Bastos. Livreiros franceses no Rio de Janeiro (1799-1824). Disponível em

http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/bb3aea30006796253008218e5bdda0c1.pdf, acesso em 10/11/2015, p.

4.

101 HALLEWELL, Laurence, op. cit., p. 34.

48

sobretudo, para documentos oficiais.102

Apenas em 1821 deu-se o fim do monopólio103

e, com

isso, começaram a surgir outros estabelecimentos tipográficos e livrarias, impulsionados pela

Independência um ano mais tarde; a Impressão Régia, agora conhecida por Tipografia

Nacional, entrava em plena decadência.104

Com a queda de Napoleão, em 1814, cada vez mais franceses passaram a

desembarcar no Brasil. Um a um, eles foram se instalando na Rua do Ouvidor, que logo seria

o centro do comércio livreiro carioca. Dentre esses estavam Plancher, que enchia suas

prateleiras de livros vindos da França e lançou, em parceria com o livreiro inglês Thomas B.

Hunt, em 1827, o Jornal do Commércio; e Bompard, que foi um dos primeiros a investir na

venda de livros usados e era campeão de publicidade no Diário do Rio de Janeiro.105

No final dos anos 1820, os franceses já dominavam 40% do mercado livreiro

carioca. Muitos desses eram negociantes que buscavam melhores condições de vida ou

fugiam da Restauração francesa e traziam, em geral, uma literatura proibida, com ideias

liberais, que contribuíram para o clima político pré-Independência.106

Outro francês de destaque foi Cremière, antigo sócio de Plancher, que instalou um

gabinete de leitura que, em 1836, possuía 12 mil volumes para serem alugados, sempre com

os livros da moda na França. Chegou a exercer o papel de editor de alguns livros, mas sua

vocação era o comércio livreiro, onde atuou até 1850.107

Os anos 1830 no Brasil conheceram um período de turbulência política, com o

retorno de D. Pedro I a Portugal, o período de regência e a campanha da maioridade de Pedro

II. Mas mesmo timidamente, o número de livrarias continuou a crescer. Em 1836 surgiu a

livraria de E. Mongie, marcada pela grande movimentação de literatos, como Joaquim Manuel

de Macedo. Com anúncios em jornais. destacava seus livros, importados da França e

Inglaterra. Morreu prematuramente, em 1853, bem como sua loja. Outro que se instalou no

período, mais especificamente em 1831, foi o brasileiro Paula Brito, investindo, a princípio,

na atividade de tipógrafo.108

102

ABREU, Márcia. Os caminhos dos livros. Campinas: Mercado das Letras, 2003, p. 83.

103 Ibidem, p. 44.

104 Ibidem, p. 46.

105 MACHADO, Ubiratan, op. cit., p.21-24.

106 NEVES, Lucia M. Bastos, op. cit..

107 MACHADO, Ubiratan, op. cit., p.44.

108 Ibidem, p.53-58.

49

Mas o grande destaque da década foi o início dos trabalhos da livraria Laemmert.

Eduardo Laemmert chegou ao país em 1827 para dirigir, juntamente com um português de

nome Souza, a filial brasileira dos editores parisienses Boussage e Aillaud. Com o término do

contrato, Eduardo permaneceu no Rio para abrir o próprio negócio, a Livraria Universal que,

depois da chegada do irmão Henrique, passou a se chamar E. & H. Laemmert, Mercadores de

Livros e de Música. Sua livraria prezava pela confecção de volumes bem encadernados e

ilustrados, tendo como foco, sobretudo, os dicionários, almanaques e, no final do século XIX,

os romances.109

Nos anos 1840, a situação política era mais serena, favorecendo a chegada de

novos estabelecimentos, ainda, sobretudo, franceses. A Livraria Belgo-Francesa, estabelecida

em 1843, vendia apenas livros em língua francesa e áreas específicas, como medicina,

farmácia e literatura. A loja possuía um gabinete de leitura, que cobrava uma mensalidade de

2 mil réis, padrão da época. Nos anos 1850, com a expansão do sentimento nacionalista, a loja

acabou fechando as portas: diante de um público leitor crescente, mas ainda pequeno, não

conseguiu sustentar impressos exclusivamente em francês numa sociedade que ansiava por

obras nacionais. Já Firmin Didot e seus irmãos instalam-se próximos da Laemmert, e

passaram a investir em livros encalhados na França, anunciados no Rio como textos de gênios

literários. Com preços muito caros, não mantiveram a atração do público, e vieram a fechar no

final da década. Jean-Baptiste Lombaerts, por sua vez, inaugurou sua livraria em 1848,

trabalhando também com uma tipografia. Buscava a clientela rica e teve sucesso, já que

investia na assinatura de jornais e revistas estrangeiras, um segmento pouco explorado até

então.110

.

Nos anos 1850, o número de livrarias brasileiras e portuguesas aumentou, mas a

francesa Garnier e a alemã Laemmert continuaram sendo os grandes destaques. Em 1850, a

casa Laemmert passou a se chamar Tipografia Universal de Eduardo & Henrique Laemmert.

O Almanake Laemmert, lançado em 1844 (em 1839 o grande destaque foi a Folhinha) tornou-

se um grande sucesso, com 80 mil cópias alcançadas em 1861, e manteve-se em voga por

quase cem anos. O grande destaque da empresa eram as obras de referência, científicas e

seriadas, mas sem deixar de lado a literatura.111

109

EL FAR, Alessandra. Páginas de Sensação: literatura popular e pornográfica no Rio de Janeiro (1870-

1924). São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 19.

110 MACHADO, Ubiratan, op. cit., p.67-69.

111 EL FAR, Alessandra. Páginas de sensação, op. cit., p. 40.

50

Também nos anos 1850, Paula Brito inaugurou sua nova loja na Praça da

Constituição. Desde a década anterior, seu estabelecimento tornara-se um centro de incentivo

aos autores nacionais, atraindo um público de letrados diferente daquele que frequentava a

Mongie, tradicionalmente mais atraído pela literatura francesa. Nesse período, o livreiro

passou a exercer a atividade de editor, com a estratégia de fazer esse serviço por encomenda,

apenas após pagamento adiantado. Brito tornou-se, assim, o primeiro editor genuinamente

brasileiro e o primeiro livreiro a promover autores nacionais.112

Nessa época, o mercado livreiro passou a se diversificar. O português Domingos

José Gomes Brandão arrematava edições inteiras para vender aos poucos como preciosidades,

a altos preços e, mais tarde, tornar-se-ia livreiro-editor; em 1852, o Bazar Fluminense passou

a vender livros, além dos artigos variados que já dispunha (devido à grande concorrência dos

livreiros especializados, a estratégia durou apenas um ano); comerciantes de outros ramos,

especialmente importadores, acabavam trazendo livros; a Livraria Imperial passou a ter um

gabinete de livros e também assinar jornais estrangeiros; e, sobretudo, crescia o comércio de

livros usados, que geraram um princípio de barateamento dos preços.113

O número de profissionais do livro crescia vertiginosamente. Nos anos 1870,

livreiros de ofício, alfarrabistas e livreiros antiquários dividiam espaço no centro do Rio, cada

qual em seu lugar determinado: a Ouvidor, como centro do luxo, e os arredores, com opções

diversificadas. Em 1871, Serafim José Alves fundou a Livraria Econômica, com um estoque

com ênfase em literatura francesa, portuguesa e brasileira e o preço em conta. Tempo depois,

ele passou a trabalhar como editor, sobretudo de autores brasileiros. Consolidaram-se, nesse

período, as lojas de livros usados, como a Livraria Azevedo, a Nova Livraria Econômica e a

Livraria Central.114

Também nessa época o preço dos livros passou por um processo de barateamento,

com o surgimento de edições de bolso e coleções econômicas, confeccionados pelos livreiros

em voga e outros profissionais recém-instalados. Surgiram a Livraria Popular de Cruz

Coutinho e, na década de 1880, a Livraria do Povo, de Pedro da Silva Quaresma.115

Enquanto uma edição de Laemmert e Garnier custava entre 3 e 5 mil réis, livros

em brochura populares custavam de 100 a 2 mil réis; na época, um trabalhador especializado 112

GODOI, Rodrigo Camargo de. Um editor no Império: Francisco de Paula Brito (1809-1861). Tese de

Doutorado, Campinas: IFCH-UNICAMP, 2014.

113 MACHADO, Ubiratan, op. cit., p. 76-78.

114 Ibidem, p. 100-101.

115 EL FAR, Alessandra. Páginas de Sensação, op. cit., p. 79.

51

como ferreiro ganhava uma diária de 3300 réis, enquanto um não especializado recebia em

torno de 1400 réis. Com isso, o acesso aos livros passou a ser mais amplo.116

Não apenas o público aumentou, como seus gostos passaram a ser levados em

conta. Segundo Alessandra El Far,

“O gosto do público passou a falar mais alto, e os editores, por sua vez, em busca

não só de uma independência financeira, mas sobretudo de um lugar de destaque no

concorrido mercado editorial que se formava no Rio de Janeiro, atentavam cada vez

mais às predileções em voga.” 117

A concorrência era tamanha que uma mesma obra podia ser encontrada em

diferentes lugares do centro fluminense. No anúncio do jornal Diário do Rio de Janeiro

abaixo, datado de 1870, a obra Doutrina moral, voltada ao público jovem, é vendida em oito

lugares diferentes:

Figura 14: Anúncio da obra Doutrina moral, presente em várias livrarias cariocas. Fonte: Diário do Rio de

Janeiro, 03/01/1870. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?

bib=094170_02&pesq=garnier&pasta=ano%20187, acesso em 30/08/2015.

O anúncio parece imitar a hierarquia dos estabelecimentos: primeiro a Garnier, a

mais famosa e considerada a loja mais completa; em seguida a Laemmert, cuja importância

também era destacada; por fim, outros livreiros menores, muitos dos quais esquecidos nos

almanaques e historiografias. O fato é que o público carioca tinha diversas opções de compra.

116

EL FAR, Alessandra. Ao gosto do povo: as edições baratíssimas de finais do século XIX. In: ABREU, Márcia

e BRAGANÇA Aníbal (orgs.) Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros. São Paulo: Editora

UNESP, 2010, p. 94-95.

117 Ibidem, p. 94.

52

Era, de fato, um mercado dinâmico e já extenso, cujo destaque era o comércio de

B. L. Garnier. A história desse empreendimento perpassa toda a segunda metade dos

Oitocentos, estando sempre no topo da cadeia literária.

Baptiste-Louis Garnier chegou ao Brasil em 1844, atraído, como outros, pela

conjuntura política do novo país independente e os adornos da cultura francesa. No mesmo

ano fundou a Livraria Garnier, uma filial da matriz parisiense de propriedade de seus irmãos,

trazendo consigo o prestígio da livraria francesa e um acervo amplo e eclético.118

O editor manteve sociedade com a Garnier Frères até 1852, quando se isolou

como proprietário; mesmo assim, continuava a ter privilégios na exportação de livros da

França.119

No registro abaixo, datado de 1848, é possível atestar esse processo de intercâmbio

de impressos: duas caixas de livros tinham acabado de aportar no Rio com destino ao livreiro

da Rua do Ouvidor.

Figura 15: Registro das importações de caixas de livros feitas por Garnier, ainda em 1848. Fonte: Correio

Mercantil, 30/01/1848. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?

bib=217280&pesq=garnier&pasta=ano%20184, acesso em 30/08/2015.

O sucesso da livraria é também resultado do investimento em publicidade:

Garnier anunciava em demasia nos periódicos brasileiros e em catálogos criados

especialmente para o seu comércio, distribuídos gratuitamente,120

bem como no interior dos

seus livros.121

118

HALLEWELL, Laurence, op. cit., p. 126.

119 DUTRA, Eliana de Freitas, op. cit., p. 71.

120 QUEIROZ, Juliana Maia, op. cit., p. 201.

121 MODENEZ, Julio Cesar, op. cit..

53

Seu primeiro anúncio em jornal se deu logo em 1845, no Diário do Rio de

Janeiro:

Figura 16: Primeiro anúncio de Garnier no Diário do Rio de Janeiro. Fonte: Diário do Rio de Janeiro,

21/05/1845. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=094170_01&pesq=

garnier&pasta=ano%20184, acesso em 30/08/2015.

Figura 17: Catálogo de Garnier no interior de um livro. In: SENIO, O Gaúcho, romance brasileiro. Rio de

Janeiro, B. L. Garnier: 1870. Disponível em: http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/00177310, acesso

em 30/08/2015.

Garnier investia ainda em diversos outros artifícios, como rifas e prêmios mensais

distribuídos a compradores de altos valores, como demonstra o informativo abaixo:

54

Figura 18: Informativo do ganhador da última promoção da Livraria Garnier. Fonte: Diário do Rio de Janeiro,

10/12/1858. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=094170_01 &pesq=

garnier& pasta=ano%20184, acesso em 30/08/2015.

Apesar de exagerar no preço de determinados livros, a fim de obter o maior lucro

possível, suas vendas eram sempre altas, já que determinadas obras só eram encontradas na

sua livraria.122

Mas com a febre dos livros a preços baratíssimos, Garnier não ficou para trás:

em 1873, sua livraria anunciava o lançamento de vinte volumes da sua Bibliotheca de

Algibeira, com preços mais em conta. Garnier chegou a ganhar 30 contos de réis com a

iniciativa.123

Abaixo, o jornal A Reforma apresenta uma análise da nova coleção do livreiro:

122

GRANJA, Lúcia. Rio - Paris, op. cit., 2013.

123 DUTRA, Eliana de Freitas, op. cit., p. 71.

55

Figura 19: Crítica da Bibliotheca de Algibeira de Garnier. Fonte: A Reforma, 07/09/1873. Disponível em:

http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=226440&pesq=bibliotheca%20algibeira

&pasta=ano%20187, acesso em 30/08/2015.

Além de elogiar a qualidade dos impressos e o preço em conta, o texto exalta a

excelente tradução e o fato de os livros traduzidos de autores franceses chegarem “quasi ao

mesmo tempo que taes livros chegam aqui na lingua original [sic]”. Demonstra-se, assim, que

Garnier, além de exímio livreiro, era um editor de destaque.

O profissional, de fato, importou para o Brasil o modelo francês de editor e

prezava pela qualidade de seus impressos.124

Ele chegou a montar uma equipe de tradutores

para editar e publicar os folhetins de sucesso na França, enfrentando a forte concorrência no

setor.125

Desse modo, exercia a função de livreiro-editor, sendo reconhecido em ambas as

funções. O anúncio do livro de poemas Americanas, de Machado de Assis, destaca o papel de

editor de Garnier:

Figura 20: Anúncio destacando Garnier como editor. Fonte: Gazeta de Notícias, 14/11/1875. Disponível em:

http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=103730_01&pesq=garnier&pasta= ano%20187, acesso

em 30/08/2015.

Não foram apenas a qualidade e diversidade de seus produtos que o tornaram o

maior profissional do livro brasileiro nos Oitocentos. Com a morte de Paula Brito, a Livraria

Garnier passou a ser o ponto de encontro dos letrados, que frequentavam a loja para, além de

conferir as últimas novidades da França, trocar experiências, ideias e amizades.126

Machado de Assis, em certa ocasião, destacou a importância de Garnier no

mercado editorial: “Paula Brito foi o primeiro editor desse nome que houve entre nós. Garnier

124

GRANJA, Lúcia, op. cit., p. 4.

125 EL FAR, Alessandra. Páginas de Sensação, op. cit., p. 38.

126 GODOI, Rodrigo, op. cit., p. 275.

56

ocupa hoje esse lugar, com as diferenças produzidas pelo tempo e pela vastidão das relações

que possui fora do país”.127

De fato, Garnier acabou tornando-se o principal editor de autores brasileiros.

Adquirindo direitos de importantes nomes da literatura brasileira da poesia, romance, crítica e

ensaio,128

publicou livros de diversas temáticas e gêneros, traduziu obras de várias

nacionalidades e editou os periódicos Revista Popular (1859-1962) e o Jornal das Famílias

(1863-1878), que também serviam de chamarizes aos escritores.129

Ele tinha grande cuidado ao efetuar seus contratos, especialmente porque a

questão de direitos autorais ainda não era clara.130

Ele fixava termos minuciosos e seguros

com seus autores, estipulando multas em caso de não entrega dos livros contratados. Por outro

lado, os escritores tinham a garantia que sua produção lhes renderia algum pagamento. Mais

ainda, eles tinham a possibilidade de ver suas obras editadas em capa dura, impressas em

Paris ou publicar nos conceituados periódicos fundados pela editora.131

Tudo isso atraía os

escritores a fecharem com o “Bom Ladrão Garnier”, apelido dado ao editor pelo círculo de

letrados da época.132

Mollier reafirma a importância de sua atividade como legitimador da literatura

brasileira:

“Ao remunerar os escritores cariocas (mesmo mal), Baptiste-Louis Garnier

transformou os autores locais em verdadeiros profissionais das letras, o que lhe

valeu ser condecorado por D. Pedro II com a Ordem da Rosa, o equivalente à Legião

de Honra que receberam Michel Lévy e Louis Hachette, em Paris. Deixando um

catálogo no qual figuravam 665 escritores brasileiros, dentre os quais Machado de

Assis, José de Alencar e Bernardo Guimarães (...)”133

De fato, o livreiro-editor esteve envolvido com importantes figuras de sua época,

o que pode explicar o grande sucesso do francês no diferenciado mercado livreiro carioca. Por

exemplo, a condecoração citada acima foi fruto de uma negociação com o Marquês de Olinda,

na segunda metade dos anos 1860, na qual o editor se mostrou um servidor do reino ao editar

127

Diário do Rio de Janeiro, 03/01/1865, p. 1. Disponível em bndigital.bn.br/hemeroteca-digital.

128 DUTRA, Eliana de Freitas, op. cit., p. 71.

129 PINHEIRO, Alexandra Santos. Entre contratos e recibos: o trabalho de um editor francês no comércio

livreiro do Rio de Janeiro Oitocentista. In: ABREU, Márcia (org.). Trajetórias do romance: circulação, leitura e

escrita nos séculos XVIII e XIX. Campinas, Mercado das Letras: 2008, p. 175.

130 Idem.

131 Ibidem, p. 180-186.

132 EL FAR, Alessandra. Páginas de Sensação, op. cit., p. 35.

133 MOLLIER, Jean-Yves. Sobre os Itinerários, op. cit..

57

livros de interesse da monarquia.134

Alencar, seu principal contratado, era Ministro da Justiça

do Gabinete do Visconde de Itaboraí. Ou seja, ambos, o marquês e o visconde, possuíam boas

relações com os poderes dominantes.

Tudo isso contribuiu para a expansão e importância de Garnier no mercado

livreiro brasileiro e na consolidação da literatura do país. Sua equipe de contratados compara-

se a Michel Lévy, na França: ambos possuíam o que havia de mais importante literariamente

em seus países. Já no final dos anos 1870, todos o consideravam o livreiro mais importante da

cidade, como a História viria a confirmar.135

Baptiste-Louis morreu em 1893 e a livraria

passou para seu irmão Hippolyte, por herança,136

mantendo-se próspera até a virada do século

XX.

134

Diário do Rio de Janeiro, 03/01/1865, p. 1, apud GODOI, op. cit., p. 275.

135 MACHADO, Ubiratan, op. cit., p. 91.

136 DUTRA, Eliana de Freitas, op. cit., p. 71.

58

Capítulo 2: Catálogos de livreiros

2.1. Catálogos de Michel Lévy

- As capas: retratos da evolução da empresa

A relação de Michel Lévy com os catálogos no interior de livros é de longa data.

Já em 1844, com a publicação do primeiro livro editado pela casa Michel Lévy Frères, Pierre

Mouton, é possível encontrar, nos dois tomos do romance, um pequeno catálogo na última

página com obras à venda na mesma livraria e no prelo.

Figura 21: Pequeno catálogo de obras à venda na livraria, publicado no interior do livro Pierre Mouton.

Disponível em gallica.bnf.fr/Search?adva=1&adv=1&tri=&t_relation="cb31204492d" &lang=pt, acesso em

24/08/2015.

59

A partir de então, o livreiro-editor continuou a usar essa tática com constância. Há

uma média de 5 catálogos diferentes encontrados, por ano, entre 1844 e 1860, data do

primeiro analisado. De fato, essas listas de obras à venda acompanharam a trajetória da casa

livreira e refletem a evolução das táticas e estratégias no decorrer dos anos.

Os catálogos selecionados para esta pesquisa representam, particularmente,

diferentes fases da carreira da Michel Lévy Frères. O primeiro, de 1860, retrata uma época em

que o livreiro já havia consolidado seu empreendimento editorial e há poucos anos iniciara a

produção em massa de impressos, vendidos a preços baratíssimos. Neste momento, sua loja

ainda encontrava-se somente na Rue Vivienne, conforme aponta a capa do catálogo.

Figura 22: Capa do catálogo de Michel Lévy de março de 1860. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k54259962/f256.item.r=>, acesso em 01/11/2015

Aparentemente, o catálogo, contendo cerca de 1200 títulos, é um retrato do acervo

completo da livraria, já que não é denominado como parte de um conjunto maior, como

passou a acontecer às listas posteriores.

60

Na data do próximo catálogo (1863), a empresa inaugurara há pouco tempo uma

nova loja na Boulevard des Italienes, próxima às grandes óperas de Paris. O endereço antigo

continua sendo apresentado, ou seja, a empresa agora possuía dois estabelecimentos em Paris.

Os elementos estéticos da capa mantiveram-se semelhantes ao catálogo anterior: a moldura

personalizada, o destaque ao nome do livreiro-editor, a presença da logomarca do

empreendimento e a datação no final.

Houve, porém, uma divisão do catálogo: apresenta-se apenas a Primeira Parte

suas seções correspondentes. Não há informações sobre a quantidade e o conteúdo das outras

partes, mas analisando-se o interior do catálogo anterior e deste percebe-se que as peças de

teatro, presentes em massa na lista de 1860, estão ausentes em 1863. Provavelmente, as partes

subsequentes compreendam-nas - não há, contudo, dados primários que comprovem essa

teoria.

Figura 23: Primeira página do Catálogo da Michel Lévy Frères, de novembro de 1863. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k1057832f/f275.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

61

De todo modo, a denominação como Primeira Parte indica um esforço de Lévy

em organizar seus catálogos. Provavelmente, como o negócio prosperando e o número de

impressos aumentando, fez-se necessária a divisão.

O terceiro catálogo de Michel Lévy a ser analisado é datado de dezembro de 1871,

sendo encontrado numa publicação do ano seguinte. A listagem apresenta a casa editora em

nova sede, na Rue Auber, substituindo a loja da Rue Vivienne, além da já famosa loja na

Boulevard des Italiens.

Além da manutenção da divisão em partes, novas estratégias publicitárias podem

ser verificadas: todas as obras seriam entregues em domicílio sem custo aos clientes, com

exceção da Collection Michel Lévy, cujos volumes teriam acréscimo em 25 centavos na

remessa - não se sabe o motivo dessa diferenciação, mas é possível supor que, como tal

coleção englobava os principais nomes da casa editorial, o acréscimo do preço não acarretaria

no desinteresse do público. Também se pode concluir que existiam pelo menos mais duas

partes do catálogo, e que essas poderiam ser enviadas aos clientes via correio, gratuitamente,

conforme aponta o rodapé da capa.

São estratégias importantes, capazes de conectar a capital às províncias francesas.

Verifica-se aqui uma investida de Lévy contra seu principal concorrente, Hachette, que há

anos dominava o mercado das ferrovias e, portanto, uma parcela considerável do público do

interior da França.

62

Figura 24: Primeira página do catálogo de Michel Lévy de dezembro de 1871, publicado em livro de 1872.

Disponível em <http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k5857612r/f300.item.r=> acesso em 01/11/2015.

No primeiro destaque há a informação sobre o envio dos impressos via correio, transcrita abaixo:

Tous les ouvrages portés sur ce Catalogue sont expédiés franco (contre mandats ou timbres-poste), sans

augmentation de prix, excepte les volumes à 1 fr. de la Collection Michel Lévy, auxquels il faut ajouter 25 cent.

per volume. - Todas as obras anunciadas neste catálogo são enviadas gratuitamente (por postagem simples ou

com com selo), sem aumento de preço, exceto os volume a 1 franco da Coleção Michel Lévy, às quais há um

aumento de 25 centavos (tradução nossa).

No segundo destaque, há a informação sobre o envio gratuito da segunda e terceira partes do catálogo, conforme

transcrito abaixo:

Les 2e et 3

e parties de ce Catalogue seront envoyées franco à toute personne qui en fera la demande par lettre

afranchie. - A segunda e terceira partes desse catálogos serão enviadas gratuitamente a qualquer pessoa que

solicitar por carta registrada (tradução nossa).

Por fim, o último catálogo analisado, de 1875, parece comprovar a eficácia das

estratégias empregadas anos antes. A capa apresenta os mesmos dizeres do catálogo anterior,

indicando a manutenção de um modelo, aparentemente, de sucesso.

63

Figura 25: Primeira página do catálogo de Michel Lévy de abril de 1875. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k54283231/f358.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

As capas mostram que os catálogos de Michel Lévy desse corpus apresentam

elementos constantes, mas também alterações profundas, no decorrer dos 15 anos que

compreendem esta pesquisa. Apresentaremos, primeiramente, os elementos que se

mantiveram presentes nas quatro listas de obras; em seguida, elencaremos os pontos de

diferenciação entre elas. A avaliação dos romances e romancistas será realizada de forma

mais apurada no capítulo 3.

64

- Semelhanças: manutenção de um empreendimento de sucesso

Os quatro catálogos apresentam, cada um, 36 páginas. Com o tamanho e tipo da

fonte aparentemente idênticos, bem como a disposição das obras em cada página, todos

apresentam uma quantidade semelhante de títulos, cerca de 1200 por lista. Os quatro são

divididos em seções que privilegiam três critérios bastante claros: novidade dos títulos, preço

de venda e formato dos impressos.

A primeira seção é denominada Nouveaux ouvrages en vente, obras francesas

recém-lançadas que ocupam o que seria a contracapa do catálogo. Tal lista parece funcionar

como um chamariz ao público-leitor: há uma impressão de prioridade pela novidade, já que

essa é trazida logo no início.

Nos quatro catálogos, essa primeira seção é ocupada por obras publicadas em dois

formatos: in-8 e in-18, tamanhos maiores que o de grande parte das obras que vêm a seguir e,

que, portanto, apresentam preços mais caros. São poesias, romances, peças de teatro e livros

de história, sem qualquer critério de classificação por gênero.

Poucos são os romances que aparecem nessa primeira seção, mas eles sempre

marcam presença - com exceção do catálogo de 1860, os demais apresentam 10, 5 e 12 títulos,

respectivamente.

Durante os anos, os impressos dessa seção em formato in-8 mantiveram o mesmo

preço de 7.50 francos o volume; já os in-18 tiveram um pequeno aumento no último catálogo

de 1875: dos costumeiros 3 francos, houve um acréscimo de 50 centavos. Ou seja, a suposta

novidade trazida por Lévy tinha um custo mais elevado, porém constante: um leitor fiel à

livraria demoraria 15 anos para sentir um acréscimo no seu livro "novo em folha".

Outra constante observada logo nesse início, e que se mantém no restante de todos

os catálogos, é o destaque dado ao nome do autor. Esse é apresentado em caixa alta, com uma

fonte maior do que seus títulos. Isso pode indicar um conhecimento prévio dos escritores, que

facilmente localizariam seus preferidos, e também reforçar a ideia de atualidade do acervo: a

maioria dos títulos não estaria cristalizada na memória dos leitores a ponto de serem

destacados, como provavelmente seriam se fossem sucessos de longa data. Isso não indica que

textos mais antigos estivessem excluídos, como analisaremos adiante.

A seção subsequente nos catálogos também é a mesma em todos os anos: são as

Ouvrages Divers. Em 1860, são apenas duas páginas; em 1863, cinco; em 1871, seis; e, em

1875, sete. Em todos eles os formatos são in-8, vendidos a 7.50 francos o volume. As obras

65

dessa seção são, geralmente, de História, Viagens e Poesias, com a presença de poucos

romances - apenas os catálogos de 1871 e 1875 apresentam o gênero, com 11 e 19 títulos,

respectivamente.

O grande destaque da seção é Balzac, que possui 10 romances entre os dois

catálogos. Os demais repetem praticamente os mesmos nomes da seção de novas obras:

Houssaye, Flaubert, Méry etc. De fato, a intenção dessa parte do catálogo não é focalizar os

romances. Não há uma regra clara para a colocação na seção de obras diversas; a tendência,

porém, é renovar o acervo, já que os títulos entre os catálogos são totalmente diferentes nessa

seção.

Um leitor desavisado poderia, a priori, espantar-se com os preços altos praticados

até agora - mais de 7 francos cada. Para entender melhor o valor dos livros na época, observe-

-se o excerto do jornal La Presse, de 15 de janeiro de 1860. Nele, fixa-se o preço do quilo do

pão em Paris a 37 centavos (de primeira qualidade) e 30 centavos (de segunda qualidade).

Figura 26: Informação do preço do pão. Jornal La Presse, de 15/01/1860. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/ bpt6k478572d/f2.item.r=prix%20du%20pain.zoom>, acesso em 01/01/2016.

Ou seja, um livro a 7,50 francos equivalia a mais de 20 quilos de pão de primeira

qualidade, ou 25 kg do de segunda. Outro valor que pode ser levado em conta é o de um

exemplar do jornal La Presse, vendido, em média, por 10 centavos (a assinatura anual custava

40 francos)137

- seriam precisos 75 exemplares do jornal para equivaler a um livro da seção de

obras diversas de Lévy.

Mas os preços dessas primeiras seções dos catálogos de Lévy não condizem com

a grande maioria. Logo em seguida iniciam-se as seções populares, com tamanhos e preços

reduzidos e, portanto, mais acessíveis ao grande público - nesses recantos, o romance é

soberano.

137

Ver: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k4298478/f1.item.zoom, acesso em 01/01/2016.

66

A seção seguinte é a Bibliothèque Contemporaine, cujo tamanho varia conforme o

catálogo: de 5 páginas no primeiro, chega a ter 11 no último. Mas todos apresentam,

sobretudo, romances, cujos títulos variam muito de um ano ao outro, mas que mantêm quase

sempre o mesmo preço e formato: 3 francos o volume em formato in-18 - com exceção do

catálogo de 1860, cujos preços variam, e de 1875, que pratica o valor de 3.50 francos.

Este é o local dos novos romancistas franceses, mas conta com um ou outro

veterano. Nomes como Amedée Achard, Joseph Méry, Paul Féval, Ernest Feydeau, Alphonse

Karr, Juliette Lambert, Armand de Pontmartin, Louis Reybaud, George Sand, Henri Riviére,

Louis Ulbach, Alexandre Dumas Pai e Filho são os grandes destaques. O fato é que a

manutenção e crescimento dessa seção sugerem o crescimento da demanda do público e uma

valorização do gênero no decorrer dos anos.

A seção seguinte nos catálogos - com exceção do de 1860 - é a Bibliothèque

Nouvelle. Com volumes in-18 a 2 francos cada, é composta, como informa o próprio nome, de

livros contemporâneos - novamente com destaque para os romances. É a última das seções e

possui duas páginas em todos os três catálogos.

Mencionar termos relacionados à novidade é uma constância dessas primeiras

partes do catálogo de Lévy: Nouveaux, Contemporaine e Nouvelle representam, todas, um

apelo ao novo. Provavelmente, são estratégias publicitárias para realçar o caráter de frescor da

livraria, o que não indica, contudo, que as obras mais antigas estivessem descartadas. Um

caso emblemático é o de Honoré de Balzac, um autor longevo com presença constante nos

catálogos de Michel Lévy. A partir de 1863, as listas trazem uma página destacada, intitulada

Œuvres completes de H. de Balzac, com todos os volumes ao custo de 1 franco e 25 centavos.

(foi nesse período que Balzac, post-mortem, tornou-se o mais novo contratado da editora).

Balzac o único autor que recebeu a honraria de uma página completa, com grande

destaque e seção própria. Parece que o Lévy tinha o desejo de atrair para si os nomes mais

importantes da literatura francesa, além de sua ânsia comercial por maiores lucros por meio da

literatura popular. Integrando Balzac em seu catálogo, ele incrementava ainda mais o

oferecimento de livros de sua casa com um autor que viria a integrar as primeiras fileiras do

cânone literário.

67

Figura 27: Seção de obras completas de Balzac, catálogo Lévy de novembro de 1863. O expediente se repete

nos dois catálogos posteriores. Disponível em <http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k1057832f/f275.item.r=>,

acesso em 01/11/2015.

Após as obras Balzac, todos os catálogos apresentam, em seguida, sua principal

seção: a Collection Michel Lévy. Ela é sempre composta por volumes de muitas páginas (350

a 400, segundo o título da coleção) em formato in-18 custando apenas 1 franco - ou 1,25

francos em 1875.

Aqui, o editor também apresenta obras contemporâneas, mas sobretudo sucessos

de média duração. Há de se destacar, por meio dessa seção, a grande quantidade de autores e

livros que Lévy vendia, especialmente nomes franceses, o que prova que, nessa época, o

editor já possuía um rol de autores considerável, alguns dos quais, como Stendhal, entrariam

no cânone literário. Mas não somente: a grande maioria dos autores aqui encontrados foi

pouco citada ou completamente esquecida pelas histórias literárias, como Dumas, Sue,

Souvestre e Soulié.

A seção traz, em média, cerca de 500 títulos romanescos de aproximadamente 120

autores diferentes. Apesar de uma imensa maioria de romances, não há qualquer destaque ao

68

nome do gênero. Existe um destaque maior a certos romancistas, sobretudo grandes

folhetinistas, considerados populares, que não são encontrados em edições mais caras. Isso

obviamente interessava ao editor, cujo investimento em edições baratas deveria ser

recompensado. Apostar num público crescente e ansioso por certos autores era uma estratégia

certeira, mas diversificar o oferecimento das obras, mesmo que em quantidades menores a

desses autores famosos, possibilitava uma abertura a um público ainda maior.

Alguns dos títulos apresentados na Collection Michel Lévy retornam em seguida

na seção Brochures divers ou Œuvres divers. São textos menores (partes de romances ou

textos que hoje seriam chamados de contos), com preços variando entre 30 centavos e 1

franco.

Os preços dos livros, neste último catálogo, pouco aumentaram em comparação

aos outros. O mesmo, contudo não se pode dizer do pão: em nota de 05 de agosto de 1874, ou

seja, menos de um ano antes do catálogo, o valor do quilo teve um alto crescimento:

Figura 28: Informação do preço do pão. Jornal La Presse, de 05/08/1874. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k514757w/f1.item.r=%22le%20prix%20du%20pain%22.zoom>, acesso

em 01/01/2016.

Naquele momento, o meio quilo era vendido a 37 centavos, o mesmo preço do

quilo inteiro do pão de primeira linha em 1860. O jornal La Presse também aumentara: a

edição já custava 15 centavos em 1875.138

Ou seja, enquanto o preço do pão dobrou e o do

jornal aumentou em 50%, os livros tiveram um crescimento de, em média, 25 centavos (25%).

Com isso, é possível concluir que, no decorrer das décadas, o livro tornou-se ainda mais

acessível ao público leitor.

138

Ver: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k514757w/f1.item.r=%22le%20prix%20du%20pain% 22.zoom,

acesso em 01/01/2016.

69

- Diferenças: ajustes pontuais no decorrer dos anos

Dos quatro catálogos, aquele que mais foge da estrutura comumente observada é o

primeiro, de 1860. Principalmente devido ao fato de não fazer referência a uma parte

específica, como os outros, ele apresenta seções e obras ausentes nos outros três, mas que

refletem bem o processo de expansão e evolução da livraria.

Por exemplo, aqui a seção Bibliothèque Contemporaine é dividida em séries, de

acordo com os preços dos livros. A première série é formada de volumes in-18 ao preço de 2

francos cada, é composta por romancistas como Alexandre Dumas e Émile Souvestre. A

deuxième série, ainda em formato in-18, aumenta o preço para 3 francos o volume e conta

com outros autores, dentre os quais Lamartine, Sthendal, Charles de Bernard, Octave Feuillet

e Louis Reybaud. Não há um motivo concreto para o aumento do preço para o mesmo

tamanho de edição; mas possivelmente a tiragem da primeira série, que traz autores de então

maior apelo popular, deveria ser maior, o que baratearia o valor dos livros. O fato é que,

posteriormente, essa seção passou a ser única, sem as séries, mas mantendo-se o preço sempre

baixo.

Outro diferencial é um grande anúncio das obras completas de George Sand,

vendidas a 2 francos o volume em formato in-18.

Figura 29: Anúncio das obras completas de George Sand no catálogo de Michel Lévy de março de 1860.

Disponível em <http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k54259962/f256.item.r=>, acesso em 01/11/2015.

70

Ela não chega a ter a mesma quantidade de obras de, por exemplo, Alexandre

Dumas - afinal, este contratava colaboradores que o ajudavam na redação de seus textos, o

que lhe permitiu assinar uma quantidade elevada de livros no período139

- mas o destaque à

sua obra é relevante e, à exceção de Balzac nos catálogos posteriores, exclusivo.

Contudo, o grande diferencial do catálogo de 1860 é a presença de peças de teatro.

O gênero se encontra na Deuxieme Partie - Théatre. São 9 páginas textos do gênero, ingleses

e italianos, todos com preços em conta, semelhantes aos dos romances. Nesta parte está

presente a famosa Bibliothèque Dramatique, uma seleção de textos recém-lançados por novos

autores.

Destaca-se que, diferentemente das seções romanescas, organizadas pelo nome

dos autores, a listagem é pelo nome das peças, ou seja, ou o público leitor estaria mais

familiarizado aos títulos teatrais, ou os autores do gênero não seriam tão reconhecidos como

os de romances.

Por fim, ainda nesta parte, há o Théatre contemporain illustré - choix de pièces,

86 séries de 4 peças cada, com preços também baratíssimos (20 centavos a peça).

O fato de a seção de peças de teatro ter desaparecido não indica a ausência do

gênero nas estantes de Lévy, mas possivelmente uma separação das listas. Afinal, a

importância do gênero é notável, vide a grande quantidade e os baixos preços praticados.

Por fim, há em apenas em 1860 uma parte denominada Troisième Partie -

publications dites à 20 centimes. São textos a partir de 20 centavos o volume (não há

informações sobre o formato, mas provavelmente devem ser in-18 ou in-32, devido ao

baixíssimo preço dos impressos) que se dividem em duas seções: o Musée Littéraire du siécle

- Choix des meilleurs ouvrages des auteurs modernes e o Musée Contemporain.

A primeira, uma seleção de obras de letrados modernos, privilegia 10 autores:

Dumas com 62 romances, encabeçados pela famosa trilogia dos mosqueteiros (Le trois

mousquetaires, Vingt ans après e Le Vicomte de Bragelonne); Frédéric Soulié com dois

títulos; Eugéne Sue com 9 obras, com destaque para Les sept péchés capitaux; e ainda Léon

Gozlan, Charles de Bernard, Alphonse Karr, Paul Féval, Méry e Albéric Second. A segunda,

com obras mais recentes, repete alguns nomes da anterior, como Soulié (8 títulos), Sué (11),

Karr (1), Bernard (4) e Mery (7), e acrescenta Lamartine (com 7 romances), Dumas Fils (4),

Henry Murger (7), Émile de Girardin, Theóphile Gautier, Valois de Forville, Jules Sandeau e

139

MAUROIS, André. Os três Dumas, tradução de Les trois Dumas. São Paulo: Difel, 1957.

71

Champfleury (esses últimos com apenas um romance). Não há uma ordenação específica de

autores, seja alfabética ou por número de títulos.

Essas seções se destacam no conjunto do catálogo, pois apresentam letras maiores

e, como o título sugere, são consideradas pela livraria as melhores obras francesas do período

e, ainda, têm os preços mais em conta de toda a listagem. O destaque a essa parte deveria ser

mais uma estratégia comercial do editor que, convenientemente, selecionou apenas os

contratados que já tinham um histórico de sucesso - entretanto, a ideia não perdurou nos

catálogos seguintes.

Outras seções presentes em 1860 perduraram apenas no catálogo de 1863. É o

caso de uma pequena parte intitulada Bibliothèque des voyageurs: em 1860 são 16 obras,

sendo 9 romances; em 1863, são 19 obras, sem nenhum romance. Em ambos os casos, todos

os volumes são vendidos a 1 franco em formato in-32.

Não há qualquer ligação entre as obras, a nível temático, que possa justificar essa

coleção voltada para viajantes. Poderia ser o formato de bolso in-32; contudo, essa é uma

característica de outras seções. Enfim, se por falta de apelo ao público, reorganização da

disposição das obras no catálogo ou simplesmente falta de espaço, o fato é que tal

classificação não esteve presente nos catálogos subsequentes.

Outra seção que também aparece nas duas primeiras listas desse corpus é a

Collection Hetzel et Lévy: são 19 romances de um total de 48 títulos em 1860 e 21 romances

dentre 52 títulos em 1863. A coleção reflete a parceria entre os editores Lévy e Hetzel, datada

de 1855,140

mas que depois foi dissolvida, como bem apontam os próximos catálogos, em que

ela não se faz mais presente.

Há ainda as Ouvrages Illustrès, uma seção de obras mais caras (de 25 a 60

francos), em formato in-8 e de diversos gêneros. Isso demonstra que Lévy produzia também

impressos mais bem trabalhados, para um público mais restrito. Entretanto, essa seção não

preenche uma página inteira - em 1860 são apenas 7 obras, sendo um romance (Jérome

Paturot, de Louis Reybaud). A seção torna a aparecer em 1863, mas sem romances, e

desaparece nas listas de 1871 e 1875.

Aliás, em 1863, surge uma seção que se repetiria apenas em 1871: o Musée

Littéraire Contemporain. É uma junção das seções Musée Littéraire e Musée Contemporain

do catálogo de 1860 e, como havia então, manteve-se a descrição que apresenta “uma escolha

140

MOLLIER Jean-Yves. Michel & Calmann Lévy, op. cit., p. 280.

72

das melhores obras dos autores modernos”.141

As obras são em formato in-4 e em duas

colunas, e a entrega custa 10 centavos. Os preços variam entre 0.30 e 3 francos.

Novamente, Lévy classifica alguns nomes como os melhores autores de sua

época. Todos os que ganharam tal rótulo, três anos antes, voltam a aparecer aqui; há ainda o

acréscimo de Roger de Beauvoir, Champfleury, Comtesse Dash, Dumas Fils, Théophile

Gautier, Mme. Émile de Girardin, Charles Hugo, Alphonse de Lamartine, Henry Murger,

Jules Sandeau e Valois de Forvile - de fato, autores de sucesso que estavam na ativa nesse

período.

Desses romancistas, apenas três não foram destacados na mesma seção em 1871:

Léon Gozlan, Théophile Gautier e Albéric Second. Gozlan morrera em 1866 e Gautier iria

morrer no ano seguinte, mas não publicava desde 1863; Second ainda estava vivo e na ativa,

mas há quatro anos não publicava um romance sequer.

Há casos opostos, ou seja, autores mortos que ainda figuravam no rol dos

melhores autores modernos: Lamartine (falecera em 1869), Charles de Bernard (1850),

Charles Hugo (1871), Henri Murger (1861) e Roger de Beauvoir (1866). Mas é

impressionante o destaque dado a alguns ilustres falecidos: Joseph Méry, morto em 1866, tem

10 obras à venda; Eugéne Sue, falecido em 1857, possui 22 livros; e Frédéric Soulié, morto

em 1847, aparece com 23 títulos.

Mas é Alexandre Dumas que, como sempre, se apresenta como maior destaque:

falecido exatamente um ano antes (dezembro de 1870), o autor possui nada menos que 96

obras anunciadas no Musée Littéraire Contemporain. Há ainda a inclusão de Xavier Eyma,

Charles Jobey, Felix Maynard, Eugène de Mirecourt e George Sand - todos vivos e com a

pena em funcionamento. Além disso, por serem esses autores todos editados por Lévy, é

natural que o editor destaque as obras de sua própria produção.

O catálogo de 1871 também apresenta novidades. Além da possibilidade de

entrega a domicílio dos livros, conforme exposto anteriormente, há a aparição da Collection

format in-32, cujos volumes, em papel velino, eram vendidos a 1 franco - a seção permanece

no catálogo de 1875. Não há romances; são cerca de 45 títulos de Poesia e História.

141

“Choix des meilleurs ouvrages des auteurs modernes”. Tradução nossa. Catalogue de La Librairie de Michel

Lévy Frères Editeurs et de Librairie Nouvelle - novembre 1863. In: POE, Egar-Alan. Euréka. Paris: Michel Lévy

Frères, 1864. Disponível em <http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k1057832f/f275.item.r=>, acesso em

01/11/2015.

73

Mais uma vez, Lévy destaca o formato dos impressos, o que parece ser um

chamariz ao grande público, cuja possibilidade de adquirir um livro pequeno, portátil, prático

e barato era cada vez mais real e acessível.

O catálogo de 1875 não apresenta novas seções; depois de variadas alterações no

decorrer dos anos, Lévy parece demonstrar uma estabilidade na estrutura do catálogo. As

muitas seções de antes se resumem aqui em Nouveaux ouvrages em vente, Ouvrages divers,

Bibliothèque contemporaine, Bibliothèque nouvelle, Collection Michel Lévy, Collection

format in-32 e Brochures divers.

A comparação geral dos quatro catálogos demonstra que a estrutura pouco mudou

durante 15 anos. Enquanto alguns nomes mantiveram-se presentes nos catálogos durante todo

esse tempo, houve também considerável renovação (cerca de metade do acervo), o que não

significa que os livros anunciados sejam contemporâneos. Parece haver, ao mesmo tempo, o

surgimento de novas safras de escritores e a redescoberta de antigos, com tendência à

permanência de nomes de outrora, como observado no último catálogo. Isso demonstra que o

público francês podia adquirir o novo, mas também tinha à disposição uma grande quantidade

de obras de tempos passados, o que pode indicar uma preferência dos leitores por esse último

tipo.

A proporção de romances nos catálogos cresceu durante os anos, enquanto o

tamanho geral do catálogo não se alterou, conforme apontam os gráficos:

Gráfico 01: Quantidade de romances por catálogo de Lévy.

74

Gráfico 02: Proporção de romances em comparação com outros gêneros nos catálogos de Lévy.

Os dados apontam crescimento em todos os anos; o interessante, contudo, é o

aumento maior entre os catálogos mais próximos temporalmente (1860 a 1863 e 1871 a 1875)

do que entre os mais distantes (1863 a 1871), ou seja, quando parecia ter havido uma

tendência de estabilização, o gênero apresentou outro aumento vertiginoso.

Entre 1860 a 1863 houve mudança estrutural que justificasse um aumento

vertiginoso no número de romances, afinal, o primeiro apresenta gêneros literários, como o

teatro, que não constam no segundo, ao mesmo tempo em que o tamanho de ambos os

catálogos manteve-se o mesmo. Porém, de 1871 a 1875, esse tipo de alteração de estrutura

não ocorreu e, mesmo assim, a porcentagem de romances passou de 64% para 85% do total

do catálogo. Isso indica que o gênero não perdeu sua força, ao contrário, ganhou um fôlego

ainda maior na década de 1870.

Outra informação importante refere-se à idade dos romances anunciados. Esse

valor é obtido pela diferença entre o ano de publicação do catálogo e o ano da primeira edição

75

dos romances. Isso é importante para mostrar como algumas obras permanecem por muito

tempo no mercado e outras desapareceram com o decorrer dos anos.

Há alguns romances considerados sucessos de longa duração nos catálogos de

Lévy, ou seja, são anunciados mesmo muito tempo após seu lançamento. A tabela abaixo

indica os romances com idade acima de 50 anos presentes nos catálogos.

Romance (título original) Autor Língua original

Ano da

primeira

edição

Catálogos

em que

aparece

The Vicar of Wakefield Oliver Goldsmith Inglês 1766

1860

1863

1871

1875

The Mysteries of Udolpho Ann Radcliffe Inglês 1794

1863

1871

1875

Léonie de Montbreuse Sophie Gay Francês 1813

1863

1871

1875

Anatole Sophie Gay Francês 1815

1863

1871

1875

Lydie, ou Les Mariages Manqués Mme Simons Candeille Francês 1819 1863

Ivanhoe Walter Scott Inglês 1820

1863

1871

1875

Tomorrow Maria Edgeworth Inglês 1823 1863

A Sentimental Journey Through

France and Italy Laurence Sterne Inglês 1768 1871

Paul et Virginie Bernardin de Saint-Pierre Francês 1788 1871

1875

A Sicilian Romance Ann Radcliffe Inglês 1790 1871

1875

The Romance of the Forest Ann Radcliffe Inglês 1791 1871

1875

Things as They Are; or, The

Adventures of Caleb Williams William Godwin Inglês 1794

1871

1875

The Italian, or the Confessional of the

Black Penitents Ann Radcliffe Inglês 1797

1871

1875

Adolphe Benjamin Constant Francês 1816 1871

1875

St. Kathleen; Or, The Rock Of

Dunnismoyle

Alexander Sutherland

Neill Inglês 1820 1871

Die Leiden des jungen Werthers Johann Wolfgang von

Goethe Alemão 1774 1876

Atala, ou Les Amours de Deux

Sauvages Dans le Désert Chateaubriand Francês 1801 1876

Tabela 03: Romances de longa duração presentes nos catálogos de Lévy.

76

Apenas um romance aparece em todos os quatro catálogos: é The Vicar of

Wakefield, de Oliver Goldsmith. Aliás, dos 17 romances acima, 10 são originários de língua

inglesa, ou seja, boa parte dos romances de longa duração presentes são traduções.

Isso não quer dizer que o catálogo seja desatualizado. Le Vicar de Wakefield,

tradução francesa do romance de Goldsmith, por exemplo, têm 16 edições no período dos

catálogos (1860 a 1875),142

ou seja, as edições anunciadas são, provavelmente, reimpressões

recentes do romance. É interessante notar que textos antigos permanecem à venda, e com

diversas edições, vários anos depois.

A maioria dos romances anunciados nos catálogos, contudo, são recentes ou de

média duração. Os gráficos abaixo indicam a proporção de romances de acordo com a idade

deles.

142

Consulta feita pelo Worldcat. Fonte: http://www.worldcat.org/search?q=ti%3ALe+vicaire+de+

Wakefield&fq=yr%3A1860..1875+%3E&se=yr&sd=asc&dblist=638&start=11&qt=page_number_link.

Disponível em 10/11/2016.

77

78

Gráfico 03: Idade dos romances presentes no catálogo Lévy (1860 a 1875).

Para uma melhor análise, a tabela abaixo demonstra a evolução da porcentagem

da idade dos romances nos catálogos:

Idade dos romances / Catálogo 1860 1863 1871 1875

Até 5 anos 9% 16% 3% 1%

6 a 10 anos 16% 15% 4% 3%

11 a 15 anos 32% 17% 14% 7%

16 a 20 anos 19% 26% 13% 14%

21 a 25 anos 16% 9% 17% 15%

26 a 30 anos 7% 9% 20% 22%

acima de 30 anos 1% 8% 32% 39%

Tabela 04: Evolução da idade dos romances presentes no catálogo Lévy (1860 a 1875).

Nota-se que a quantidade de romances recentes, com até 5 anos de idade, após

uma subida em 1863, desaba nos catálogos seguintes. Em 1863, inclusive, há um caso curioso

de um livro que seria lançado apenas no ano seguinte e que já estava sendo anunciado: trata-

se de Les Amours des bords du Rhin, de Joseph Méry. Como o catálogo é do final do ano,

79

provavelmente a obra estava no prelo naquele momento, e só estaria disponível sob

encomenda.

Em 1875, contudo, os romances recentes correspondem a apenas 1% do total. O

mesmo ocorre no período de 6 a 10 anos e 11 a 15 anos. Observa-se crescimento apenas nos

livros de média duração, sobretudo de 26 anos para cima, ou seja, as obras anunciadas passam

a ser mais velhas com o passar do tempo. Portanto, mesmo em um mercado tão dinâmico e

vasto como o francês, há um largo espaço para textos mais antigos.

2.2. Catálogos de B. L. Garnier

Conforme explicitado anteriormente, Garnier não possui um conjunto de

catálogos homogêneo como Lévy no que se refere à materialidade e organização, portanto, as

diferenças são maiores e mais destacadas. Há, contudo, semelhanças de estratégias de venda e

colocação no mercado que puderam ser encontradas.

O primeiro catálogo Garnier deste corpus é de 1860,143 intitulado Catálogo da

Livraria de B. L. Garnier nº 20, tem seção única, chamada “Livros de educação, clássicos, de

instrução, recreio da mocidade, etc., etc.” e apresenta, sobretudo, livros didáticos.

143

ROCHA, Justiniano José da. Compendio de historia universal (Volume 02 : Da Idade Media). Rio de Janeiro:

B. L. Garnier, 1860. Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/

1918/01397720#page/1/mode/1up>, acesso em 05/11/2015.

80

Figura 30: Primeira página do Catálogo nº 20 de Garnier, de 1860. Disponível em

<http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/ 1918/01397720 >, acesso em 01/11/2015.

As obras romanescas, 33 no total, são quase todas voltadas à instrução de crianças

e jovens. Talvez isso se deva ao livro onde foi publicado, que também é de instrução (um

compêndio de história). Aqui pode haver uma questão de adequação ao público. Garnier pode

estar querendo atingir leitores de escola (alunos e professores) e isso tende a fazer com que se

busquem obras mais assentadas, portanto mais antigas.

Há, por exemplo, Dom Quichote da Infância (Aventuras de D. Quixote

compendiadas para o uso dos meninos) e Lydia ou a Menina bem educada, história de uma

menina de oito annos, para servir de instrucção e recreio á outras meninas da mesma idade.

Os preços variam entre 1$000 e 6$000.

Para avaliar o poder de compra de um leitor carioca, teçamos a mesma

comparação feita na França entre o preço do pão e dos livros. Em 1861, segundo o Jornal do

Commercio, 1 libra (0,45 kg) de pão custava 110 réis, se retirado na padaria.

81

Figura 31: Informação do preço do pão no Rio de Janeiro em 1861. Jornal do Commercio, 22/11/1861.

Dispionível em: http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=364568_05&pasta=ano%20186&pesq=,

acesso em 10/11/2016.

Levando em conta o preço médio de 3$000 em um livro nesse mesmo período,

tem-se que era possível comprar 12,2 quilos de pão pelo valor de um impresso simples - na

França do mesmo período comprava-se 3,3 quilos de pão ao preço médio de um livro.

Ou seja, os livros eram acessíveis a boa parte do público, mas não como os de

Lévy, extremamente baratos. Por outro lado, nesse catálogo de Garnier, os livros são todos em

formato in-8 ou in-12, em geral maiores que os do livreiro-editor da França.

Muitos dos títulos são acompanhados de pequenos comentários, indicando sua

utilidade. Por exemplo, no anúncio do romance O menino perdido, o catálogo é bem

específico: “Romance instructivo, civil e christão, engenhosamente escripto em estilo

familiar, e acomodado a todas as intelligencias, para servir de Compendio de boa

educação”.144

Há ainda um esforço em justificar a leitura do romance, provavelmente devido

ao fato de o gênero ter sido pouco valorizado pela crítica até meados do século XIX pois,

além de ser associado à diversão, sua forma não respeitava as regras clássicas.145

Nesse

catálogo, Garnier parece ainda se prender a esse conceito, que começaria a mudar nas décadas

seguintes.

144

ROCHA, Justiniano José da, op. cit..

145 AUGUSTI, Valéria. Do gosto inculto à apreciação douta: a consagração do romance no Brasil dos

Oitocentos. In ABREU, Márcia (org.). Trajetórias do Romance: circulação, leitura e escrita nos séculos XVIII e

XIX. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2008, p. 397.

82

A idade dos romances anunciados é muito diferente dos catálogos de Lévy. A

tabela abaixo indica o ano da primeira edição de cada um dos 14 romances cujas informações

básicas (autor e língua original) foram identificadas.146

Romance (Tradução) Título Original Autor

Ano da

Primeira

Edição

Aventuras de Telémaco Les Aventures de Télémaque François Fénelon 1699

As Aventuras de Robinson Crusoe

The Life and Strange Surprizing

Adventures of Robinson Crusoe

of York, Mariner

Daniel Defoe 1719

Viagens de Gulliver a vários países

remotos Gulliver’s Travels Jonathan Swift 1726

A Cabana Índia L’Inde de la Chaumière Indienne Bernardin de Saint-Pierre 1790

O Café de Surate Le Café de Surate Bernardin de Saint-Pierre 1790

Clara de Alba Claire d'Albe Marie Sophie Risteau

Cottin 1798

Isabel, ou os Desterrados da Sibéria Élisabeth, ou les Éxilés de

Sibérie Mme Cottin 1806

Conselhos à Minha Filha Contes à ma fille Jean-Nicolas Bouilly 1809

Cypriano, ou História de um

menino orphão

Le petit Savinien, ou Histoire

d’un jeune orphelin Sophie de Senneterre 1815

Bandoleiro dos Apenninos, ou

Aventuras memoráveis do famoso

Diabo Sacripanti

Le Brigand des Apennins, ou les

Aventures mémorables du

fameux Diavolo Sacripanti

Charles-Yves Cousin

d'Avallon 1816

Simão de Nantua ou o Mercador de

Feiras Simon de Nantua Laurent-Pierre de Jussieu 1818

Tabela 05: Primeiras edições dos romances anunciados no catálogo Garnier de 1860.

A média de idade de cada romance é de 79 anos, ou seja, nesse caso específico, há

um oferecimento de textos de longa duração, majoritariamente.

Claro que alguns fatores devem ser levados em conta nessas comparações: o fato

de não haver registro de outros catálogos de Garnier no mesmo período, que poderiam

apresentar títulos mais próximos aos de Lévy, e a possibilidade de o catálogo nº 20 estar

incompleto. Como foi encontrada no interior de um livro, essa lista pode estar reduzida em

relação à original, o que é endossado pelo fato de ela apresentar uma única seção, algo

146

Alguns romances presentes nos catálogos, sobretudo de Garnier, não puderam ser identificados por carecer de

fontes. Por exemplo, o texto A cruz de pão não se encontra em qualquer acervo on-line, nem com o nome em

português, nem com uma equivalência em francês ou em outras línguas possíveis de circularem no Brasil no

período. Portanto, as tabelas trazem apenas os romances com informações concretas.

83

incongruente com os catálogos posteriores de Garnier, todos divididos em diversas partes.

Além disso, por ser voltado a obras de instrução, o catálogo pode ter sido privado de outros

títulos que não se encaixassem nessa premissa. Mais ainda, muitos desses títulos estavam à

venda na França nesse momento, como mostrou a pesquisa de Martyn Lyons, que identificou

os best-sellers franceses da primeira metade do século XIX, entre os quais estavam D.

Quixote, Aventuras de Telêmaco, Robinson Crusoé, Robinson de doze anos, História de Gil

Blas, Mil e uma Noites e Tesouro de Meninos.147

Garnier apresenta aqui uma lista híbrida, ordenada por títulos, e não por autores,

como os de Lévy. O editor não destaca o nome do gênero romanesco, pincelando-o numa lista

de obras, sobretudo, de instrução, e justificando criteriosamente a leitura desses textos. Isso

pode se dever, mais uma vez, ao livro onde o catálogo está inserido.

O próximo a ser estudado é também um caso muito curioso: o catálogo número 23

de Garnier. Essa lista de obras é muito recorrente, tendo sido encontrada em 4 livros da

Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin,148 em um livro editado por Louis Hachette em

Paris149 e avulso na Biblioteca Nacional da França.150 O catálogo já foi minuciosamente

estudado por Lúcia Granja, que revelou ser uma das primeiras listas em que Garnier anunciou

sua produção como editor e, ainda, que ele investia fortemente na publicação de obras

didáticas (como verificado no catálogo de 1860) e poesia.151

147

LYONS, Martyn, op. cit..

148 O catálogo está presente no interior dos seguintes livros:

ARAGUAIA, Domingos José Gonçalves de Magalhães. Cânticos fúnebres. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1864.

Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/01087200# page/1/mode/1up>, acesso em

10/11/2015;

ARAGUAIA, Domingos José Gonçalves de Magalhães. Poesias avulsas. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1864.

Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br/bbd/ handle/1918/01088500#page/1/mode/1up>, acesso em

10/11/2015;

ALVARENGA, Silva. Obras poéticas de Manoel Ignacio da Silva Alvarenga. Rio de Janeiro: B. L. Garnier,

1864. Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/02182420# page/1/mode/1up>, acesso em

10/11/2015;

PEIXOTO, Alvarenga. Obras poéticas de Ignacio José de Alvarenga Peixoto. Rio de Janeiro: B. L. Garnier,

1865. Disponível em <http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/03936400# page/1/mode/1up>, acesso em

10/11/2015.

149 Les vacances des jeunes boërs par le Capitaine Mayne-Reid,ouvrage traduit de l´anglais par Mme H. Loreau.

Paris, Librairie de L. Hachette et Cia, 1865. Catálogo encontrado por Lúcia Granja.

150 Encontra-se avulso na série 8 Q 10 B da Bibliothèque Nationale de France (faltam as páginas 2 e 3).

Informações de Lúcia Granja disponibilizadas no banco de dados CiTrIm, do projeto temático FAPESP A

circulação transatlântica dos impressos - a globalização da cultura no século XIX.

151 GRANJA, Lúcia. Garnier no Brasil, op. cit..

84

Figura 32: Primeira página do Catálogo 23 de Garnier, de 1863. Disponível em

<http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/01087200>, acesso em 01/11/2015.

O anúncio do Jornal da famílias no catálogo, lançado em 1863, fez com que

Lúcia Granja datasse o catálogo como posterior a este ano.152

Há diversas seções: Religião,

textos de conduta moral, orações ou sermões ente 1$000 e 5$000; Livros de educação,

clássicos de instrução, etc., composta de dicionários, cursos e tratados, quase todos

encadernados e ilustrados com valores de até 7$000 o volume; História, Geographia etc.,

atlas, mapas e livros de história entre 2 e 6$000 o volume; Dinheiro, economia politica,

finanças, commercio, etc., volumes in-4 e in-8 entre 200 réis e 5$000; Medicina, homeopatia,

magnetismo, seguindo as mesmas características da parte precedente; Poesias, litteratura,

apenas obras poéticas, apesar de parecer indicar outros tipos de textos com a expressão

literatura; Romances, novellas, etc., com os textos em prosa ficcional; Peças de theatro,

variando entre 500 e 3$000 o volume; Obras diversas, com ilustrações, dicionários e outros

textos; e, por fim, Obras no prêlo, três textos a serem publicados.

Nesse catálogo, o romance passou a contar com uma seção própria,

provavelmente mais como uma estratégia de venda do que como aumento do prestígio do

152

Idem

85

gênero.153 Afinal, mesmo a prosa de ficção superando a poesia em termos numéricos (são 55

romances contra 26 livros de poesias), os pequenos textos críticos aparecem com mais

frequência entre as obras em verso - 12 títulos de poesia são acompanhados de comentários,

contra apenas 2 da seção romanesca. Um desses é um compêndio das ideias de maior

circulação sobre o romance na época, presente no anúncio de um livro intitulado Romances e

Novellas, de J. Norberto de Souza e Silva:

O romance, disse Lamartine, é a poesia do povo; é por seu intermedio que póde-se

diffundir pelas classes menos esclarecidas os grandes principios de religião, moral e

amor da patria. E o vaso figurado por Tasso, cujas bordas são untadas de mel, é a

realisação do preceito do velho Horacio quando mandava juntar o util ao doce. Entre

os cultores d'este genero de composição cabe distinto lugar ao Sr. J. Norberto de

Souza e Silva, que no volume supra-indicado escolhe assumptos brasileiros, derrama

a instrucção religiosa e moral, e moldura seus quadros com descripções e pinturas

tiradas da nossa natureza e inspiradas pelo nosso céo. Não prejudicão o erudito os

arabescos da imaginação; assigna a cada cousa a sua parte, e, procurando deleitar,

instrue. 154

O excerto acima demonstra a importância do romance devido ao seu poder de

difusão de ideias religiosas, morais e nacionalistas, sobretudo entre as classes desfavorecidas.

Aceita-se o teor de entretenimento do gênero, desde que esse não apenas deleite, mas instrua,

seguindo o preceito horaciano segundo o qual as composições deveriam associar instrução e

deleite.155

Ou seja, mesmo com um aumento considerável de romances anunciados, ainda

existe aquele cuidado com o gênero identificado no catálogo de 1860.

Em termos de valores, os romances apresentam preços mais em conta e opções

diversificadas. Por exemplo, o livro de poesia mais barato, Poesias tenras e amorosas, é

vendido a $640, seguido de Meandro poético, a 2$000, enquanto 29 dos 55 romances

presentes nessa lista de obras são vendidos a menos de 1$000.

Apenas Dumas e Sue têm seus nomes precedidos por seus títulos; os demais são

identificados apenas pelos títulos. Isso pode significar que, à época, Dumas e Sue já eram

mais conhecidos pelo público leitor brasileiro, provavelmente devido aos seus folhetins

publicados nos periódicos cariocas.156

153

QUEIROZ, Juliana Maia, op. cit., p. 203.

154 Catálogo encontrado no interior de ARAGUAIA, Domingos José Gonçalves de Magalhães, op. cit..

155 ABREU, Márcia. Uma comunidade letrada internacional. Trabalho apresentado ao Colóquio do projeto A

circulação transatlântica dos impressos - a globalização da cultura no século XIX (FAPESP). São Paulo, 2012.

156 Ver BEZERRA, Valéria Cristina. O Romance de Alexandre Dumas no Brasil. Disponível em

http://www.circulacaodosimpressos.iel.unicamp.br/arquivos/dossie_valeria_pt.pdf, acesso em 15/11/2015.

86

Garnier, de fato, tem nos romances estrangeiros a maior fatia da seção ficcional do

catálogo. Apenas quatro romances são brasileiros: O guarani, de José de Alencar (ainda sem a

consagração que viria a ter anos mais tarde como o chefe da literatura brasileira), Romances e

Novelas, de Joaquim Norberto de Sousa Silva, A morte moral, de Antônio Deodoro de

Pascual, e D. Narcisa de Villar, de Ana Luísa de Azevedo Castro. O editor parecia, assim,

investir numa estratégia mais segura, pautada na aposta em romances de sucesso na França.

Com relação à idade dos romances, é possível observar uma preferência por textos

de média duração. A tabela indica os títulos com informações encontradas seguidos dos anos

de suas primeiras edições:

Romance

(como no anúncio) Título Original Autor

Ano da

Primeira

Edição

Historia del Infante D. Pedro de

Portugal, El qual Anduvo las

Siete Partidas del Mundo

Historia del Infante D. Pedro de

Portugal, El qual Anduvo las Siete

Partidas del Mundo (9906)

Gomes de Santo

Estevão 1602

Simplicidades de Bertoldinho Le Piacevoli e Ridicolose

Semplicità di Bertoldino Giulio Cesare Croce 1608

História da donzela Theodora Historia da donzella Theodora Juana Milian 1712

História de D. Ignez de Castro História de D. Ignez de Castro Desconhecido 1772

Camilla, ou o Subterraneo Camille, ou le Souterrain Marsollier 1791

O Dote de Suzaninha La Dot de Suzette Joseph Fiévée 1798

Metusko ou os polacos Métusko, ou Les Polonais Pigault-Lebrun 1800

Isabel, ou os Desterrados da

Sibéria

Élisabeth, ou Les Éxilés de

Sibérie Mme Cottin 1806

Ourika, ou história de uma negra Ourika Claire de Duras 1823

A Quanto se Expõe Quem Ama,

Novela que em Todo seu

Contexto Não Admite a Letra A

A Quanto se Expõe Quem Ama,

Novela que em Todo seu Contexto

Não Admite a Letra A

José Joaquim Bordalo 1826

O Bravo The Bravo James Fenimore

Cooper 1831

A Salamandra La Salamandre Eugène Sue 1832

Aventuras de Lyderico Aventures de Lydéric Alexandre Dumas 1841

História de um morto L'Histoire d'Un Mort Racontée

par Lui-même Alexandre Dumas 1844

Oito dias no castelo Huit Jours Au Château Frédéric Soulié 1844

Os dois matrimônios

malogrados, ou as duas vítimas

do crime

Os dois matrimônios malogrados,

ou as duas vítimas do crime

José Manuel Valdés y

Palacios 1845

Carotin Carotin Paul de Kock 1846

O marquês de pombal Le Marquis de Pombal Clémence Robert 1846

A Soberba Les sept péchés capitaux:

L'Orgueil Eugène Sue 1847

A Ira Les Sept Péchés Capitaux: La

Colère -Tison d'Enfer Eugène Sue 1848

A Inveja Les sept péchés capitaux: L'Envie Eugène Sue 1849

87

Romances e Novelas Romances e Novelas Joaquim Norberto 1852

A Última marquesa La Dernière marquise Eugène de Mirecourt 1853

Elisa, ou a Virtuosa Castro Elisa, ou a Virtuosa Castro Desconhecido 1853

Sophia Printemps Sophie Printemps Alexandre Dumas fils 1853

A filha do arcediago A filha do arcediago Camilo Castelo

Branco 1854

Raphael e a Fornarina Raphael et la Fornarine Joseph Méry 1854

Um drama nas montanhas Un Drame Dans les Montagnes Xavier de Montépin 1856

Martha, romance Marthe de Montbrun Eugénie-Marie Soler 1857

O Guarani O Guarani José de Alencar 1857

Os Tripeiros Os Tripeiros Antonio Coelho

Lousada 1857

Anathema Anathema Camilo Castelo

Branco 1858

D. Narcisa de Villar D. Narcisa de Villar Ana Luísa de Azevedo

Castro 1858

A Morte Moral A Morte Moral Antônio Deodoro de

Pascual 1864

Tabela 06: Primeiras edições dos romances anunciados no catálogo Garnier de 1864.

A idade média dos romances acima é de 42 anos, sendo 13 deles das décadas de

1850 e 1860. Os textos em língua portuguesa são os mais recentes, como era esperado, e as

traduções não são, majoritariamente, muito antigas.

Já em 1870, o catálogo de Garnier é uma seleção exclusivamente nacional,

intitulada Obras á venda na mesma casa, com sete autores destacados e preços estáveis. É

importante deixar claro que Garnier anunciava outros livros além daqueles editados em sua

casa, diferentemente de Lévy, que divulgava apenas os de sua própria edição.

88

Figura 33: Catálogo de obras à venda na Livraria Garnier, de 1870. Disponível em

<http://www.brasiliana.usp.br/bbd/handle/1918/00177310>, acesso em 01/11/2015.

Neste catálogo, Alencar aparece sob seu verdadeiro nome e também de seu

pseudônimo Senio, contabilizando 14 títulos, sendo 8 romances; Joaquim Manuel de Macedo

aparece com 18 títulos, desses, 10 romances; Machado de Assis contabiliza 2 romances e 2

livros de poesias; Bernardo Guimarães tem 1 romance e 1 livro de poesias; Moreira de

Azevedo, 1 romance e 1 livro de variedades; e Pereira da Silva, 2 livros de crônicas.

Alencar se destaca como o principal nome de Garnier, tendo seus romances, cartas

e peças de teatro em grande destaque. Trata-se, afinal, de uma lista no interior do primeiro

volume d’O Gaúcho, de sua autoria, apesar do uso do pseudônimo. Macedo tem o maior

número de obras, reflexo de sua extensa carreira literária; Machado e Bernardo Guimarães,

ainda timidamente, já figuram entre esses grandes nomes.

Os romances, finalmente, aparecem juntamente aos livros de poesias e demais

gêneros. Parece não haver mais aquela distinção de sete anos antes, quando os gêneros não se

89

misturavam. Os preços entre eles também não são mais tão distintos, ao contrário, equivalem-

se.

O catálogo demonstra que Garnier também vendia livros mais em conta, mas sem

deixar de lado os impressos bem produzidos. Como destacou Lúcia Granja, O Guarani tem

uma 3ª edição em 2 volumes in-8 encadernados a 3$000 cada, e outra em 1 volume in-4 “bem

enc.” (encadernado), segundo o catálogo, a 16$000. Ou seja, era possível adquirir uma edição

simples para leitura, ou uma versão luxuosamente encadernada, possivelmente, para

coleção.157

Esse oferecimento de uma edição mais em conta coincide com a criação, no

mesmo ano do catálogo (1870), da Livraria Popular, de Antônio Augusto da Cruz Coutinho

(nove anos mais tarde Pedro Quaresma lançaria a Livraria do Povo, com o mesmo

objetivo).158

A ideia dessa coleção popular era oferecer brochuras a preços muito baixos, entre

1$000 e 3$000.

Apesar do espaço reservado à produção nacional no catálogo, no anúncio do livro

Mosaico brasileiro, de Moreira de Azevedo, ressalta-se que ele foi “nitidamente impresso e

enc. em Pariz (sic)”. Ou seja, a presença francesa permanece, mesmo que nenhum romance

desse país figure entre os selecionados. Claramente essa seleção é apenas uma parte do grande

acervo de Garnier, que possuía inúmeros textos estrangeiros, mas o fato de haver a

preferência pelos nacionais nessa propaganda demonstra que o editor já se empenhava na

construção de, senão um cânone, um acervo nacional sólido, especialmente como livreiro, ao

disponibilizar em sua livraria os nomes mais recorrentes de sua época.

Romance

(como no anúncio) Autor

Ano da

Primeira Edição

A Moreninha Joaquim Manoel de Macedo 1844

O Moço Loiro Joaquim Manoel de Macedo 1845

Dois Amores Joaquim Manoel de Macedo 1848

Rosa Joaquim Manoel de Macedo 1849

Vicentina Joaquim Manoel de Macedo 1853

Cinco Minutos José de Alencar 1856

O Guarani José de Alencar 1857

Os Romances da Semana Joaquim Manoel de Macedo 1861

Lucíola José de Alencar 1862

Diva José de Alencar 1864

157

Ver: GRANJA, Lúcia. Rio - Paris, op. cit., p. 88.

158 EL FAR, Alessandra, op. cit., p.79.

90

O Culto do Dever Joaquim Manoel de Macedo 1865

Iracema José de Alencar 1865

As Minas de Prata José de Alencar 1866

Memórias do Sobrinho do meu Tio Joaquim Manoel de Macedo 1867

O Ermitão de Muquém Bernardo Guimarães 1869

A Luneta Mágica Joaquim Manoel de Macedo 1869

As Vítimas Algozes Joaquim Manoel de Macedo 1869

O Gaúcho José de Alencar 1870

A Pata da Gazela José de Alencar 1870

Contos Fluminenses Machado de Assis 1870

Os Franceses no Rio de Janeiro Moreira de Azevedo 1870

Ressurreição Machado de Assis 1872

(no prelo)

Tabela 07: Primeiras edições dos romances anunciados no catálogo Garnier de 1870.

A média de idade das obras anunciadas neste catálogo é baixa, o que é favorecido

pelo teor plenamente nacional da lista. Assim, é possível aferir que, ao menos em relação às

obras nacionais, havia um oferecimento de obras bastante atuais, algumas das quais editadas

no mesmo ano em que o catálogo foi divulgado.

A partir de 1873, Garnier lançava uma nova série de catálogos, incluindo o

Catálogo da Livraria de B. L. Garnier n. 2 - Litteratura, em que há uma advertência de que o

mesmo anula os precedentes, ou seja, essa nova numeração provavelmente indique que o

editor organizara e/ou renovara seu acervo, de modo que suas listas antigas tornaram-se

obsoletas.

91

Figura 34: Primeira página do catálogo n. 2 da Livraria Garnier, de 1873. Acervo do projeto “A circulação

transatlântica dos impressos - a globalização da cultura no século XIX”.

Essa nova organização é novamente observada na página 6, onde Garnier anuncia

outras listas, como a 13 (livros de Medicina), 14 (Matemática e outras ciências exatas), 15

(Artes e Economia), 20 (História, Geografia, Memórias, Mapas e Viagens) e 1 (Livros dos

quaes é editor B. L. Garnier, e outros que se achão em grande número na mesma livraria),

que consta apenas de obras editadas pelo profissional. A seção Romances, Novellas,

Variedades, Etc. do catálogo n.1 foi estudado por Juliana Maia de Queiroz, que indicou e

analisou os vários comentários críticos elogiosos às obras romanescas ali anunciadas.159

Entretanto, aqui será analisado o catálogo número 2, de Literatura, pois, além de

ser um trabalho inédito, traz mais correspondências com os de Lévy: a quantidade de obras

anunciadas é maior que o n.1, e sua organização é semelhante, como será verificado a seguir.

159

QUEIROZ, Juliana Maia, op. cit., p. 207.

92

O subtítulo do catálogo n. 2 é Novellas, Romances, Narrativas, Crítica litteraria,

Poesias, Peças de Theatro, etc.. Isso indica que o gênero romanesco ainda não possuía uma

nomenclatura única, sendo chamado também de novela e narrativa;160

entretanto, já não é

mais excluído da seção literária, dividindo espaço com poesias, peças de teatro e críticas. Já

parece despontar um processo de consolidação, comprovado com a grande quantidade de

romances presentes.

Logo no início, há um anúncio de que todos os livros podem ser enviados via

correio mediante um pagamento de 15% sobre o preço. Garnier já oferecia, neste momento,

um serviço de frete, que consistia em enviar os impressos registrados via correio. Há uma

cobrança, diferentemente de Lévy, que dispunha de um serviço quase sempre gratuito; mas,

diante das escalas dos mercados e dos tamanhos dos territórios dos países, é um grande

avanço trazido por Garnier.

Após tais considerações, o catálogo traz uma seção denominada Complemento,

com obras dos mais diversos gêneros: anais, livros religiosos, estudos de várias áreas, poesias

e romances. Dos romancistas, há apenas estrangeiros: Camilo Castelo Branco, português,

Enrique Perez Escrich, espanhol, e Paul Féval, Xavier de Montepin, Ponsul du Terrail e Paul

de Kock, franceses. Seus livros são vendidos em formato in-8, entre 1$500 e 2$000 o volume.

Em seguida, tem lugar o catálogo geral de obras de literatura, num total de mais

de 800 títulos. Desses, 495 são obras ficcionais, um número considerável, que demonstra

como o mercado livreiro carioca apresentava um leque amplo de opções nesse período.

Essa lista é muito semelhante às de Lévy: os nomes dos autores geralmente são

indicados no início dos anúncios, que são bastante diretos e sem detalhes da edição, e apenas

as informações de formato e quantidade de volumes são mencionadas entre o título e o preço

do impresso. Os valores, aliás, diminuíram consideravelmente, com romances em volumes in-

8 e in-12 vendidos entre $400 e 2$500. Segundo Marisa Lajolo e Regina Zilberman, os preços

médios em 1876 (ou seja, anos depois deste catálogo), variavam entre 2$000 e 3$000,161

enquanto o jornal Diário de Rio de Janeiro custava, à época, cerca de 66 réis o exemplar,162

160

Ver: SOUZA, Simone Cristina Mendonça de. Primeiras impressões: romances publicados pela Impressão

Régia do Rio de Janeiro (1808-1822). Tese de Doutorado. Campinas/SP: Unicamp, 2007, p. 13-14.

161 LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina, op. cit., p.318.

162 A assinatura trimestral do jornal em 1873 custava 6$000, correspondente a 90 exemplares de jornal. Ou seja,

cada exemplar valia cerca de 66 réis. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?

bib=094170_02&pasta=ano%20187&pesq=, acesso em 10/11/2016.

93

um pequeno aumento em relação a 1865.163

Portanto, a aquisição de livros tornou-se mais

facilitada e ampliada, o que pode explicar o grande aumento no oferecimento.

As obras do catálogo têm uma idade média de 34 anos, o que não significa que a

lista exclua sucessos de longa data. A tabela abaixo indica os romances com mais de 100 anos

de idade presentes no catálogo:

Título Anunciado Obra original Autor

Ano da

primeira

edição

Astucias de Bertoldo Le Sottilissime Astuzie di

Bertoldo Giulio Cesare Croce 1606

História de Hippolyto, Conde de

Duglas

Histoire D'Hippolyte, Comte de

Duglas Madame d'Aulnoy 1690

Aventuras de Telémaco Les Aventures de Télémaque François Fénelon 1699

O Desgraçado Napolitano, ou vida

de M. Roselli

L'infortuné Napolitain, ou les

Sventures du Seigneur Rozelli Abbé J. Olivier 1708

Aventuras de hum homem de

qualidade

Mémoires et aventures d’un

homme de qualité qui s’est retiré

du monde

Abbé Prévost 1728

O Bacharel de Salamanca Le Bachelier de Salamanque Alain-René Lesage 1736

Os Esposos Desgraçados ou a

História de Mr. e de Madama

Bedoyere

Les Époux Malheureux ou

Histoire de Monsieur et Madame

de La Bédoyère

Baculard d'Arnaud 1745

Cartas de uma peruviana Lettres d’une Péruvienne Françoise de Graffigny 1747

Amelia ou os Desgraçados Efeitos

da Extrema Sensibilidade Amelia Henry Fielding 1751

Aventura de Hortência, ou o bom

marido Contes Moraux Marmontel 1755

A Boa Mãe Contes Moraux Marmontel 1755

A Má Mãe Contes Moraux Marmontel 1755

O Compadre Matheus Le Compère Matthieu, ou les

Bigarrures de l’Esprit Humain Henri-Joseph Dulaurens 1766

A Baronesa de Batteville

Mémoires de Madame la

Baronne de Batteville, ou la

Veuve Parfaite

Mme Le Prince de

Beaumont 1766

As desgraças da inconstância Les Malheurs de L' inconstance C. Dorat 1772

Amores do Diabo Le Diable Amoureux Jacques Cazotte 1772

Emma ou a Filha do Desgosto Emma, or the child of sorrow Anônimo 1773

Tabela 08: Romances de longa duração presentes no catálogo Garnier de 1873.

Um dos romances mais recorrentes é Aventuras de Telêmaco, de François

Fenélon, trazido à luz em 1699. Na França da primeira metade do século XIX, ainda de

163

Em 1860 a assinatura trimestral custava 5$000. Ver: http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=

094170_02&pasta=ano%20187&pesq=. Acesso em 02/01/2016.

94

acordo com a pesquisa de Lyons, as tiragens mínimas de Aventuras de Telêmaco alcançavam

258.700 exemplares e 112 edições. De 1850 a 1874, foram mais 136 edições. Ou seja, esses

livros eram atuais tanto para um francês, quanto para um brasileiro.164

Descontados os textos centenários, a média da idade dos livros passa para 27

anos. Contudo, há um grande oferecimento de textos atuais, com até 10 anos desde o

lançamento de sua primeira edição, o que representa cerca de 20% do catálogo. A tabela

apresenta os romances atuais anunciados, cujas informações foram identificadas:

Título Anunciado Obra original Autor

Ano da

primeira

edição

História de um homem Histoire d'un homme Amédée Achard 1863

Anos de prosa. A gratidão. O

arrependimento.

Anos de prosa. A gratidão. O

arrependimento Camilo Castelo Branco 1863

Aventuras de Bazílio Fernandes

enxertado

Aventuras de Bazílio Fernandes

enxertado Camilo Castelo Branco 1863

Estrelas Propícias Estrelas Propícias Camilo Castelo Branco 1863

Memórias de Guilherme do

Amaral

Memórias de Guilherme do

Amaral Camilo Castelo Branco 1863

Noites de lamego Noites de lamego Camilo Castelo Branco 1863

A San Félice La San Felice Alexandre Dumas 1864

A filha do doutor negro A filha do doutor negro Camilo Castelo Branco 1864

Amor de Salvação Amor de Salvação Camilo Castelo Branco 1864

Vinte Horas de Liteira Vinte Horas de Liteira Camilo Castelo Branco 1864

Diva Diva José de Alencar 1864

Memorias de uma Favorita Souvenirs d'Une Favorite Alexandre Dumas 1865

A sereia A sereia Camilo Castelo Branco 1865

O esqueleto O esqueleto Camilo Castelo Branco 1865

Iracema Iracema José de Alencar 1865

O Culto do Dever O Culto do Dever Joaquim Manoel de

Macedo 1865

O Processo de Clemenceau Affaire Clémenceau Alexandre Dumas fils 1866

A queda d´um anjo A queda d´um anjo Camilo Castelo Branco 1866

O judeu O judeu Camilo Castelo Branco 1866

O olho de vidro O olho de vidro Camilo Castelo Branco 1866

O santo da montanha O santo da montanha Camilo Castelo Branco 1866

As Minas de Prata As Minas de Prata José de Alencar 1866

Armadeille Armadale Wilkie Collins 1866

O Terror Prussiano La Terreur Prussienne Alexandre Duma 1867

A bruxa de Monte Córdova A bruxa de Monte Córdova Camilo Castelo Branco 1867

164

Consulta feita pelo Worldcat. Disponível em: https://www.worldcat.org/search?q=ti%3Aaventures+de

+t%C3%A9l%C3%A9maque&fq=yr%3A1850..1874+%3E&qt=advanced&dblist=638. Disponível em

10/11/2016.

95

A doida do candal A doida do candal Camilo Castelo Branco 1867

As Pupilas do Senhor Reitor:

Chronica da Aldeia

As Pupilas do Senhor Reitor:

Chronica da Aldeia Júlio Dinis 1867

Memórias do Sobrinho do meu

Tio

Memórias do Sobrinho do meu

Tio

Joaquim Manoel de

Macedo 1867

O Conde de Camors Monsieur de Camors Octave Feuillet 1867

Mistérios de Fafe Mistérios de Fafe Camilo Castelo Branco 1868

O retrato de Ricardina O retrato de Ricardina Camilo Castelo Branco 1868

A Morgadinha dos Canaviais:

Chronica da Aldeia

A Morgadinha dos Canaviais:

Chronica da Aldeia Júlio Dinis 1868

Uma Família Ingleza: Scenas da

Vida do Porto

Uma Família Ingleza: Scenas da

Vida do Porto Júlio Dinis 1868

A Luneta Mágica A Luneta Mágica Joaquim Manoel de

Macedo 1869

As Vítimas Algozes As Vítimas Algozes Joaquim Manoel de

Macedo 1869

Nina Nina Joaquim Manoel de

Macedo 1869

Serões da Província Serões da Província Júlio Dinis 1870

A Namoradeira A Namoradeira Joaquim Manoel de

Macedo 1870

As Mulheres de Mantilha As Mulheres de Mantilha Joaquim Manoel de

Macedo 1870

Os Fidalgos da Casa Mourisca:

Chronica da Aldeia

Os Fidalgos da Casa Mourisca:

Chronica da Aldeia Júlio Dinis 1871

Um Noivo e Duas Noivas Um Noivo e Duas Noivas Joaquim Manoel de

Macedo 1871

A Mocidade de Trajano A Mocidade de Trajano Visconde de Taunay 1871

A Mulher de Fogo La Femme de Feu Adolphe Belot 1872

Nunca mais Nunca mais Alfredo Campos 1872

O Ninho do Beija Flor O Ninho do Beija Flor Araripe Júnior 1872

Livro de consolação Livro de consolação Camilo Castelo Branco 1872

O carrasco de Vitor Hugo José

Alves

O carrasco de Vitor Hugo José

Alves Camilo Castelo Branco 1872

Scenas da Foz Scenas da Foz Camilo Castelo Branco 1872

Os Quatro Pontos Cardeais Os Quatro Pontos Cardeais Joaquim Manoel de

Macedo 1872

Julia, romance Julia de Trécoeur Octave Feuillet / Désiré

Hazard 1872

Inocência Inocência Visconde de Taunay 1872

A filha do cabinda A filha do cabinda Alfredo Campos 1873

Alfarrábios: O Ermitão da Glória e

O Garatuja

Alfarrábios: O Ermitão da

Glória e O Garatuja José de Alencar 1873

O Capitão Remy Le Capitaine Rémy Élie Berthet 1874

Ao Correr da Pena Ao Correr da Pena José de Alencar 1874

Tabela 09: Romances atuais presentes no catálogo Garnier de 1873.

Mesmo algumas edições mais antigas dessa lista, como Histoire d'un homme, de

Amédée Achard (1863) não tiveram renovação na França: até a data do catálogo, apenas a

96

edição de 1863 havia sido publicada em francês.165

Além disso, essa obra foi traduzida para o

português166

exatamente no mesmo ano da primeira edição original, ou seja, novamente,

brasileiros e franceses estavam em condições de igualdade:

O último catálogo de Garnier analisado, provavelmente do ano de 1876, é

numerado como n. 1, demonstrando outra renumeração do editor às suas listas de obras. O

subtítulo o descreve como sendo Catálogo dos livros de que é editor B. L. Garnier e de outros

que se acham em grande numero na mesma livraria. A seção romanesca intitula-se

Litteratura, romances, novellas, variedades, etc e contém 80 títulos.

Figura 35: Início da seção de literatura do catálogo de Garnier de 1875. Acervo do projeto “A circulação

transatlântica dos impressos - a globalização da cultura no século XIX”.

165

Consulta feita pelo Worldcat. Disponível em: https://www.worldcat.org/search?q=ti%3A

Histoire+d%27un+homme&fq=yr%3A1860..1873+%3E&qt=advanced&dblist=638. Disponível em 10/11/2016.

166 ACHARD, Amadeu. História de um homem. Porto: 1863.

97

Um dos interesses deste catálogo são os comentários críticos a determinadas

obras. Muitos desses textos já haviam sido utilizados no catálogo n. 1 de 1873, analisado por

Juliana Maia de Queiroz,167 sobretudo os relativos a autores brasileiros. Os romances

nacionais, de fato, são os mais comentados. Alencar, que tem toda sua obra anunciada, conta

com especial destaque às obras As Minas de Prata, descrita como "romance fundado em

factos históricos e um digno continuador do 'Guarany'"168 e O Sertanejo, que traz os dizeres:

"a este livro faça o publico o mesmo acolhimento sempre dispensado a todos os trabalhos

litterarios do Sr. conselheiro Alencar". O editor também descreve o autor, atribuindo-lhe

"escrupulosa fidelidade com que desenha as épocas (...) e crêa situações cheias de encanto e

interesse que prendem a atenção dos leitores".169 O catálogo ainda anuncia Senhora, por G.M.,

e obras de Senio (O Gaúcho, A Pata da Gazella, Sonhos d'Ouro e O Tronco do Ipê), que

também é comentado: "Dentre os nossos mais apreciados romancistas, um dos nomes a quem

maior quinhão de glória cabe é o de Senio (...) seus livros são livros de consulta, escriptos no

estylo mais brilhante e seductor"170.

Ou seja, dos mais renomados romancistas considerados pela crítica, dois são a

mesma pessoa: José de Alencar. Mesmo com os prováveis exageros do editor ao seu notável

contratado, ele era o maior autor do maior editor brasileiro. Alencar parece, assim, ser para

Garnier o que Balzac tornou-se para Lévy: um autor destacado e sempre presente em suas

listas.

Outro romancista com forte presença é Bernardo Guimarães, cujo grande destaque

é A Escrava Isaura: "este romance do talentoso poeta mineiro é um livro de sensações; scenas

verosimeis e tocantes achão-se na historia daquella escrava (...)". O autor é considerado

"como um dos ornamentos da nossa litteratura, e um dos mais poderosos obreiros desse

grande agente da civilisação: a leitura".171 De fato, ele veio a tornar-se mais um integrante do

cânone brasileiro.

Joaquim Manoel de Macedo, romancista já experiente, também se destaca, como

visto no catálogo anterior. Dele se diz: "Poucos escriptores temos que, como este, adquirissem

popularidade e renome (...) A moral, eis o seu principal conselheiro para escrever. Não será

167

QUEIROZ, Juliana Maia, op. cit., p. 207.

168 Catálogo Garnier n. 1, de 1875. Acervo do projeto A circulação transatlântica dos impressos - a globalização

da cultura no século XIX, p. 82.

169 Idem.

170 Ibidem, p. 121.

171 Ibidem, p. 100.

98

este o melhor elogio que se possa fazer ao Sr. Joaquim Manoel de Macedo?" Nota-se nesse

excerto a recorrente referência da moral nos romances, ainda presente.

Machado de Assis, que tem anunciados seus primeiros romances, Helena e

Ressurreição, também recebe comentários elogiosos: "(...) não é de admirar que elle seja tão

estimado do publico, juiz supremo que o acolhe sempre de braços abertos, como a amigo

antigo e experimentado, animando-o a prosseguir na sua carreira.".172

Há ainda os anúncios de

Pereira da Silva, "assaz conhecido entre os primeiros talentos litterarios do Brazil"173

, e

Teixeira e Souza, grandes nomes da literatura.

Apesar do prestígio que o romance começou finalmente a gozar nesse período, a

poesia mantinha-se num patamar mais elevado. Um exemplo disso é a Bibliotheca Nacional

Brazilia, "dos melhores autores antigos e modernos, publicados sob os auspicios de S. M. o

Sr. D. Pedro II.".174

Os autores presentes são Manoel Ignacio da Silva Avarenga, Ingácio de

José Peixoto, Álvares de Azevedo, Frei Fernando de S. Carlos, Gonçalves Dias, Casimiro de

Abreu, Junqueira de Freire e Thomas Antonio Gonzaga, todos poetas que, segundo a ordem

real, eram os melhores autores brasileiros.

Com relação aos franceses, Dumas Pai aparece com mais discrição do que na lista

de 1873, mas o anúncio de A Condessa de Charny traz a chancela de ser a "unica traducção

approvada pelo autor".175

Chama a atenção o trabalho da tradução, que é vendida ao público

como fiel ao original, já que o próprio romancista a aprovara.

Há também casos de comentários a autores franceses, hoje canonizados pelas

histórias literárias, que não apareceram nas listas de Michel Lévy, mas têm lugar em Garnier.

É o caso de Jules Verne, cuja "colecção dos seus livros fórma um arsenal scientífico de subido

valor, e quem o ler com firme attenção, ganhará não poucos conhecimentos, além do desejo

que naturalmente occorrerá de querer aprofundar mais o estudo dos quadros da natureza, tão

habilmente traçados pelo illustre escriptor francez".176

O romance, nesse caso, cumpre a

função de instrução, levando mais conhecimento ao leitor, a quem é permitido, com esse

propósito, deleitar-se.

172

Ibidem, p. 110.

173 Ibidem, p. 116.

174 Ibidem, p. 87.

175 Ibidem, p. 93.

176 Ibidem, p. 124.

99

Victor Hugo também tem lugar. No anúncio do seu romance Noventa e Três, o

editor destaca: "Dentre todas as brilhantes manifestações do fertil engenho do poeta francez,

cuja reputação enche o mundo civilisado, o ultimo romance que acaba de ser publicado quasi

ao mesmo tempo em onze linguas diversas, e que agora acaba de se publicar, é porventura a

sua melhor producção".177

Quatrevingt-treize fora publicado na França em 1874, o que

comprova a data do catálogo como, provavelmente, 1875, já que o editor anuncia que ele fora

publicado quase ao mesmo tempo. Esse fato, por si só, é muito importante, pois revela uma

conexão entre, pelo menos, 11 línguas diferentes, que receberam o romance de Hugo, um

autor já considerado renomado e importante, concomitantemente.

Xavier de Montépin tem seu romance O Bigamo assim descrito: "Nenhum

romance, entre os muitos publicados nestes dous ultimos annos, obteve mais brilhante

sucsesso que este: a sua aceitação só pode ser comparada com as que tiveram outr'ora o 'Judeu

Errante' de Eugenio Sue, e o 'Conde de Monte Cristo' de Alexandre Dumas".178

Assim,

Garnier aponta o sucesso atual de Montépin e a fama antiga de Dumas e Sue,

comprovadamente bem conhecidos pelo público.

Outros franceses também possuem seus comentários elogiosos: o romance

Desmoronamento de Émile Gaboriau é descrito como "o grande successo da época";179

Edmond About tem seu romance O nariz de um tabelião tido como "tão interessante quanto

original romance, que passa por um dos seus mais graciosos escriptos";180

Paul de Kock181

é

chamado de "popularissimo autor, que, com o seu genio humoristico, tornou-se

verdadeiramente universal (...) [e o] romancista mais alegre deste seculo";182

João Macé tem

sua História de um bocadinho de pão considerada "uma das obras-primas do nosso tempo" e

"obra adoptada pela commissão de premios";183

e George Sand aparece junto a uma crítica do

jornal A Reforma, que diz que "O nome do autor e o facto de serem aquelles interessantes

177

Ibidem, p. 102.

178 Ibidem, p. 112.

179 Ibidem, p. 97.

180 Ibidem, p. 80.

181 Ver: PAES, Alessandra Pantojo. Das imagens de si ao mundo das edições: Paul de Kock, romancista

popular. Dissertação de Mestrado, Belém: UFPA, 2013.

182 Catálogo Garnier n. 1, de 1875. Acervo do projeto A circulação transatlântica dos impressos - a globalização

da cultura no século XIX, p. 104.

183 Ibidem, p. 107.

100

livros publicados na mais acreditada revista franceza [Revue des Deux Mondes] dispensam

qualquer elogio e considerações a respeito dos escriptos do primeiro romancista francez".184

Os preços e formatos dos livros mantêm-se os mesmos do catálogo anterior: in-8

ou in-12, entre 1$000 e 3$000 o volume. A idade das obras cai para, em média, 20 anos entre

a data do catálogo e a primeira edição, sendo que mais da metade dos romances possui idade

menor que 10 anos, como aponta o gráfico:

Gráfico 04: Idade dos romances presentes no catálogo Garnier de 1876.

Ou seja, no último catálogo do corpus, é possível encontrar várias novidades do

período, mas também romances de média duração. A proporção dos romances de longa

duração, porém, é bem menor que as listas anteriores, o que indica uma maior variedade de

escritos.

184

Ibidem, p. 119.

101

2.3. Comparação das estratégias e ações dos profissionais

Esse passeio por catálogos de Michel Lévy e Baptiste-Louis Garnier, perpassando

15 anos de publicações, revelou, apesar do curto espaço de tempo, algumas mudanças, mas

também manutenções bem sólidas.

Primeiramente, há uma mesma estratégia de divulgação de livros entre os dois

profissionais: ambos apresentam catálogos em fim de livro e independentes como forma de

propaganda e como apresentação de seus acervos. Além disso, anunciam também em jornais:

Figura 36: Anúncio de livros de Michel Lévy. Fonte: jornal La Presse, de 09/05/1862, p.1. Disponível em

<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k4794265/f1.item.r=ouvrages%20vente%20Lévy.zoom>, acesso em

01/09/2016.

102

Figura 37: Anúncio de livros de B. L. Garnier. Fonte: Jornal do Commercio, de 25/09/1860, p.3. Disponível em

<http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=364568_05&pasta=ano%20186&pesq=>, acesso em

10/11/2016.

Os catálogos de ambos anunciam livros apenas na língua de seus países, originais

ou traduzidos - Lévy apresenta títulos em francês e Garnier, em português. Porém, ao menos

para Garnier, essa estratégia restringia-se aos catálogos: o livreiro-editor da Ouvidor divulga

em periódicos anúncios inteiramente em francês, como o demonstrado acima.

O gênero romanesco é o mais presente em todos os catálogos analisados; há

seções exclusivas para o gênero em ambos, como a Bibliothèque Contemporaine de Lévy e a

seção de Romances, Novelas e Variedade de Garnier - a diferença é que o primeiro nunca

destaca o gênero no título das seções, diferentemente do segundo.

103

O processo de consolidação do gênero romanesco no Brasil, sobretudo com o

surgimento de textos brasileiros, pode ter contribuído para o destaque de Garnier aos

romances, o que não era necessário na França naquele momento, em que os títulos

romanescos nacionais já circulavam com mais frequência desde o início do século.

Os catálogos de Lévy são todos datados na capa; os de Garnier, além de terem a

numeração alterada com frequência, não apresentam informações de data. Isso pode indicar,

para Lévy, uma maneira de identificar o catálogo mais recente diante de um grande número

de listas publicadas - de fato, até o mês de publicação é mencionado, pois havia mais de um

catálogo por ano. Já Garnier, ao evitar rotular suas listas com datas, poderia mantê-las em

vigor por mais tempo; tal ideia, entretanto, é enfraquecida com os dados de atualidade dos

dois últimos catálogos, que demonstram grande presença de romances recentes. Talvez por

isso o editor enumerava suas listas, reiniciando a contagem algumas vezes.

Lévy, na França, teve mantida a base do seu catálogo: a organização geral e as

seções pouco mudaram, sempre agrupadas por preço e destacando o caráter de novidade das

obras, mesmo quando elas são já um tanto antigas e se repetem entre os catálogos. Já Garnier,

talvez devido à escassez de materiais preservados, é o que apresentou maiores diferenças

entre seus catálogos, com pouca padronização. Da primeira lista de obras de instrução, com

poucos volumes, passando pela consolidação do gênero romanesco, o editor apresentou uma

evolução notável.

As seções dos catálogos de Garnier são, geralmente, organizadas por gêneros

literários (com exceção do último, que apresenta uma lista literária única), e frequentemente

apresentam diversos comentários críticos e longas descrições, sobretudo nos últimos. Isso não

se observa em Lévy, que sempre limitou-se a publicar apenas os títulos, preços e formatos de

suas obras.

Há diferenças na apresentação dos impressos: enquanto Garnier geralmente

valorizava a boa impressão e o acabamento de volumes geralmente in-4 ou in-8, a despeito do

preço, Lévy enfatizava o preço baratíssimo de suas impressões in-18 ou in-32, entrando pouco

no mérito da matéria-prima.

Essas diferenças, entretanto, não configuram-se como características gerais do

mercado local, mas como estratégias que possivelmente refletem a maneira como cada um

dos profissionais se posicionou em seus mercados. No Brasil, por exemplo, havia segmentos

de literatura popular a preços baratíssimos, enquanto na França os irmãos de Bapiste Louis

valorizavam o acabamento dos impessos à venda pela Garnier Frères.

104

Figura 38: Anúncio da Livraria Popular de Cruz Coutinho. Fonte: Gazeta de Noticias, 09/10/1876, p.3.

Disponível em <http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=103730_01&pasta=ano%20187& pesq=>,

acesso em 10/11/2016.

Figura 39: Extrato do catálogo da Garnier Frères de 1873. Disponível em <http://gallica.fr>, acesso em

10/08/2016. Em destaque, a descrição das características materiais dos impressos, transcrita abaixo:

Cette collection, imprimée avec luxe par M. Claye, sur magnifique papier des Vosges fabriqué spécialement

pour cette édition, est ornée de vignettes gravées sur acier, d'après les dessins de Staal. - Esta coleção, impressa

com luxo pelo Sr. Claye, com belo papel de Vosges, fabricado especialmente para esta edição, é adornada com

decalques gravados no aço, a partir dos desenhos de Staal (tradução nossa).

105

Ou seja, Lévy e Garnier atuavam em mercados semelhantes, em que segmentos

diferentes de impressos e preços conviviam entre si. Cada qual, ao seu modo, supria diferentes

necessidades de público e leitura.

Contudo, essas posições dos profissionais em seus mercados não eram

cristalizadas, mas abriam margens para pequenas mudanças. Lévy, que desde 1860 aplicava

preços em conta, com materiais de qualidade inferior, passou a apresentar, nos últimos

catálogos, um pequeno encarecimento, ocorrido concomitantemente ao aumento no tamanho

dos livros (dos usuais in-18 e in-32, passou-se a anunciar volumes in-8). Ou seja, mesmo com

um público-alvo vasto, o editor passou a investir também em impressos mais bem

trabalhados, ainda que numa proporção menor aos livros de acesso amplo.

Já Garnier passou a oferecer também volumes mais em conta, como observado

nos seus últimos catálogos. Lúcia Granja acredita que essa tendência de barateamento de

Garnier foi inspirada nas ações de Lévy:

Em termos de comparação, temos que as tiragens de Garnier, informação que ainda

não pudemos confirmar completamente, giravam em torno de trezentos exemplares

nessa época; 2.400 réis, em 1864, não configuram edições baratas, mas havia, como

no caso de Lévy, a oferta da edição de melhor qualidade e da edição “popular”,

impressa no mesmo formato e na mesma tipografia que usava Lévy, a de Simon &

Raçon, em Paris; a rede de livrarias e quiosques era inexistente no Brasil, mas

Garnier, segundo informações que também precisam ainda ser mais bem

esclarecidas, enviava os seus produtos para todo o país. Métodos comparáveis,

diferentes públicos, diferentes sociedades e diferentes formas de acesso à leitura.185

O fato é que, apesar dessa mudança de rumo, os editores não deixaram de fazer o

que os havia consagrado até então. Lévy não deixou de anunciar suas coleções baratíssimas,

nem desprezou os autores de grande sucesso, assim como Garnier continuou exaltando a

qualidade de suas obras e investindo na literatura brasileira. Logo, ambos abriram-se a novos

formatos, mas permanecendo majoritariamente naquilo que lhes bem sucedera.

Os catálogos de ambos apresentam, ainda, uma convivência entre romances

recentes e sucessos de média e longa duração. Alguns desses últimos, inclusive, formam um

repertório de textos comum entre as duas localidades, demonstrando que havia uma circulação

intensa das mesmas obras antigas no Brasil e na França. Além disso, ambos possuem uma

maioria de traduções entre os romances de longa duração.

Todos esses dados comprovam que a natureza da atuação desses profissionais em

seus mercados, apesar das escalas diferentes, é muito semelhante. Ou seja, mesmo que o

185

GRANJA, Lúcia. Rio-Paris, op. cit., p.88.

106

tamanho do mercado francês fosse muito maior que o brasileiro, os principais livreiros-

editores de ambos os lugares (Lévy e Garnier) possuíam estratégias e ações parecidas.

107

Capítulo 3: Os romances nos catálogos

Após a análise comparativa dos conjuntos de catálogos, sobretudo em relação à

estrutura, estratégias empregadas e atualidade dos romances, este capítulo focará,

especificamente, no gênero romanesco. Isso será feito em duas etapas: primeiramente, de

maneira individual, para cada livreiro, e em seguida, numa análise comparativa entre os

aspectos mais importantes de cada conjunto de catálogos, a fim de detectar as linhas que os

aproximam e/ou distanciam.

Os tópicos analisados são referentes aos autores e textos de prosa ficcional mais

presentes nos catálogos, à presença de textos nacionais e estrangeiros (e, no segundo caso, a

procedência dos mesmos, permitindo elaborar um mapa de circulação de romances) e à taxa

de renovação de cada acervo, ou seja, a quantidade de textos que permaneceram ou que foram

renovados com o decorrer dos anos.

3.1. Romances e romancistas anunciados por Michel Lévy

Muitos foram os escritores que passaram pelos catálogos de Lévy. O gráfico

abaixo indica a quantidade de romancistas presentes em cada catálogo:

100

160

133 161

499

749 772

1021

1860 1863 1871 1875

Romances e romancistas presentes nos catálogos de

Michel Lévy (1860-1875)

Qtde. Romancistas Qtde. Romances

Gráfico 05: Quantidade de romancistas e romances nos catálogos de Lévy.

108

Percebe-se um grande aumento de romances e romancistas do primeiro para o

segundo catálogo, ocasionado, possivelmente, pelo maior espaço dos romances nas listas: de

uma média de 5 livros por romancista em 1860, passou-se para 4,7, ou seja, a diversidade

aumentou. Contudo, entre 1863 e 1871, mesmo com mais títulos romanescos à disposição, o

número de autores diminuiu, ou seja, menos romancistas davam vazão a um acervo

semelhante - a média, por escritor, passou a ser de 5,8 romances. O número de autores só

retornou aos mesmos patamares em 1875, mas com uma oferta de um número muito maior de

títulos, gerando uma média de 6,3 livros para cada escritor.

Desse modo, não é possível afirmar que, com o crescimento absoluto do número

de textos à disposição, houve concomitantemente um aumento da diversidade. Claro que

havia mais obras à venda, porém, de menos nomes - por mais que um autor tenha a

capacidade de se reinventar e mudar seu estilo de escrita, traços de autoria sempre se

preservam de um texto para outro.

O gráfico abaixo comprova a baixa taxa de renovação do acervo. Nele, verifica-se

a porcentagem de obras presentes nos 4 catálogos, em 3, 2 e em apenas 1.

Gráfico 06: Quantidade de aparições dos romances nos catálogos de Lévy.

109

Ou seja, 44% das obras anunciadas se repetem em, pelo menos, dois catálogos.

Outro dado informa que 377 romances presentes no catálogo de 1860 são anunciados em

1875, ou seja, quase 1/3 do total da lista é composto por textos à venda 15 anos antes.

Isso é um indicador de que havia espaço para textos mais antigos, mesmo com um

considerável oferecimento de títulos novos. Há autores, inclusive, que permanecem nas quatro

listas e com grande quantidade de obras.

A tabela abaixo indica os 20 romancistas com mais romances anunciados de cada

catálogo:

1860 1863 1871 1875

01 Alexandre Dumas Alexandre Dumas Alexandre Dumas Alexandre Dumas

02 George Sand George Sand Honoré de Balzac George Sand

03 Émile Souvestre Émile Souvestre George Sand Comtesse d’Ash

04 Frédéric Soulié Honoré de Balzac Émile Souvestre Émile Souvestre

05 Joseph Méry Frédéric Soulié Frédéric Soulié Joseph Méry

06 Charles de Bernard Alphonse Karr Alphonse Karr Alphonse Karr

07 Alphonse Karr Joseph Méry Joseph Méry Frédéric Soulié

08 Eugène Sue Louis Reybaud Comtesse d’Ash Clémence Robert

09 Louis Reybaud Léon Gozlan Eugène Sue Alfred de Bréhat

10 Henri Murger Henri Conscience Alexandre Dumas fils Louis Ulbach

11 Léon Gozlan Eugène Sue Henri Murger Amédée Achard

12 Henri Conscience Roger de Beauvoir Charles de Bernard Henri Conscience

13 Alexandre Dumas fils Alexandre Dumas fils Louis Reybaud Louis Reybaud

14 Champfleury Amédée Achard Paul Féval Eugène Sue

15 Jules Janin Henri Murger Roger de Beauvoir Hector Malot

16 Jules Sandeau Comtesse d’Ash Henri Conscience Alexandre Dumas fils

17 Roger de Beauvoir Paul Féval Léon Gozlan Arsène Houssaye

18 Comtesse d’Ash Charles de Bernard Amédée Achard Ernest Feydeau

19 Armand de Pontmartin Sophie Gay Sophie Gay Paul Féval

20 Félicien Mallefille Champfleury George W. M. Reynolds Léon Gozlan

Tabela 10: Romancistas com maior número de romances anunciados por catálogo de Lévy.

São 31 autores que ocupam, nos quatro catálogos, as 20 primeiras posições dentre

os mais anunciados. Existe um destaque maior a certos romancistas, sobretudo grandes

folhetinistas considerados populares, como Dumas e Sue. Isso obviamente interessava ao

110

editor, cujo investimento em edições baratas deveria ser recompensado. Apostar num público

crescente e ansioso por certos autores era uma estratégia certeira, mas diversificar o

oferecimento das obras, mesmo que em quantidades menores a desses autores famosos,

possibilitava uma abertura a um público ainda maior.

De todos os autores presentes na tabela, apenas Henri Conscience, belga, não

escrevia originalmente em francês, mas em flamengo. Ou seja, dos autores mais anunciados

por Lévy, praticamente todos são da França. Se considerarmos o conjunto total dos catálogos,

a supremacia da língua francesa não muda, conforme aponta o gráfico abaixo. Ele traz a

quantidade de romances por língua nos quatro catálogos de Michel Lévy.

LÍNGUA 1860 1863 1871 1875 TOTAL

Francês 471 709 729 949 2858

Inglês 6 15 27 34 82

Flamengo 13 16 11 21 61

Alemão 4 7 3 13 27

Russo 1 0 0 1 2

Polonês 0 0 0 1 1

Sueco 1 0 0 0 1

Tabela 11: Quantidade de romances por língua original nos catálogos de Michel Lévy.

A quantidade de romances originalmente franceses é esmagadora: ao todo, 94%

das obras à venda nos catálogos são originais de língua francesa. Mais ainda, os números

absolutos de livros cresceram exponencialmente.

O movimento das traduções difere um pouco. Primeiramente, é importante

ressaltar que nenhum texto estrangeiro foi anunciado em língua original, mas sempre em

tradução para o francês. Desses, há uma oscilação de originais em holandês, alemão e outras

línguas (russo e polonês) e um crescimento dos de língua inglesa. O gráfico abaixo aponta tais

resultados:

111

Gráfico 07: Número de traduções presentes nos catálogos de Lévy.

Há um crescimento contínuo dos romances de língua inglesa que, se não chegam

perto de se comparar à supremacia francesa, ao menos apresentam um ganho considerável: de

apenas seis edições em 1860, passam a ser 34 em 1875. A tabela abaixo mostra a procedência

dos autores desses textos.

Romancista Qtde. Romances

encontrados País de origem

George W. M. Reynolds 19 Inglaterra

Ann Radcliffe 11 Inglaterra

Charles Dickens 10 Inglaterra

Edgar Allan Poe 10 Inglaterra

Harriet Beecher Stowe 6 EUA

Oliver Goldsmith 5 Irlanda

Mrs. Craik 3 Inglaterra

Walter Scott 3 Inglaterra

Edward Bulwer Lytton 2 Inglaterra

Thomas Bailey Aldrich 2 EUA

William Godwin 2 Inglaterra

William Makepeace Thackeray 2 Inglaterra

Alexander Sutherland Neill 1 Escócia

Laurence Sterne 1 Irlanda

112

Maria Edgeworth 1 Inglaterra

Regina Maria Roche 1 Irlanda

Tabela 12: Quantidade de romances por língua original nos catálogos de Michel Lévy.

A maioria dos nomes provém da Inglaterra, país que, segundo Moretti, também é

um centro editorial importante no século XIX. Se considerado o Reino Unido com um todo,

apenas dois romances de língua inglesa escapam do rótulo britânico: dois escassos textos

norte-americanos - os escritores Harriet Beecher Stowe e Thomas Bailey Aldrich.

Mesmo timidamente em relação aos números grandiosos dos livros à venda como

um todo, o crescimento da literatura em língua inglesa é considerável. Se o aumento de

romances disponíveis, entre 1860 e 1875, foi de 104%, o número de obras originais em inglês

cresceu mais de 460%. Isso aponta que o acervo de Michel Lévy, mesmo ainda muito fechado

nas obras originárias do seu próprio país, parecia ter iniciado um processo discreto de abertura

às obras de língua inglesa.

É curioso notar que, com o holandês e o alemão, a tendência não é idêntica, mas

parecida. Ambas as línguas tiveram uma queda do segundo para o terceiro catálogo, mas

cresceram consideravelmente na lista de 1875 - 21 e 13 títulos, respectivamente.

O aumento absoluto, contudo, não indica um crescimento proporcional de

estrangeiros nos catálogos. Os gráficos abaixo indicam isso:

94%

6%

Porcentagem de romances

originais e traduções

Catálogo Lévy 1860

Romances em francês

Romances traduzidos

95%

5%

Porcentagem de romances

originais e traduções

Catálogo Lévy 1863

Romances em francês

Romances traduzidos

113

94%

6%

Porcentagem de romances

originais e traduções

Catálogo Lévy 1871

Romances em francês

Romances traduzidos

93%

7%

Porcentagem de romances

originais e traduções

Catálogo Lévy 1875

Romances em francês

Romances traduzidos

Gráfico 08: Porcentagem de romances originais e traduções nos catálogos de Lévy.

O percentual de estrangeiros transita entre 5 e 7% do total de obras de cada

catálogo, ou seja, a presença de traduções acompanhou o crescimento total dos livros postos à

venda. Portanto, não se pode considerar que houve um avanço significativo na diversidade

cultural dos textos à disposição. É como se a casa livreira de Lévy fosse uma espécie de ilha,

na qual poucos intrusos têm a condição de adentrar. Isso ocasiona uma movimentação intensa

do mercado livreiro local, sempre em crescimento, como demonstram os números aqui

apresentados; contudo, há um enfraquecimento de temas, estilos e ideias diferentes,186 que

poderiam provir de outros países do globo.

3.2. Romances e romancistas anunciados por Baptiste-Louis Garnier

Conforme exposto anteriormente, os catálogos de Garnier não têm a mesma

constância dos de Lévy, ou seja, cada qual apresenta um número de romances muito diferente

um dos outros. Por isso, os dados comparativos aqui apresentados levarão em conta a questão

proporcional e não absoluta dos números de cada lista de obras à venda. Outro fator que

precisa ser esclarecido é a exclusão de romances, nos gráficos, cujos autor e/ou língua original

sejam desconhecidas, afinal, a presença desses poderia afetar os dados de proporcionalidade.

186

MORETTI, Franco, op. cit..

114

São 56 obras nessas condições, listadas abaixo, que correspondem a 6,5% do total de

romances encontrados.

Romance Catálogo em que

aparece

A cruz de pão 1860

A fada graciosa 1860

Barco do pescador 1860

Conversações de uma menina com sua boneca, seguidas da história da boneca) 1860

Emilia, ou os Foragidos dos Pyrenêos 1860

Henriquinho ou O Menino Roubado 1860

Joaquina Rosa, ou a Menina curiosa 1860

Lydia ou a Menina bem educada 1860

O Mentor dos meninos 1860

Viagens e Aventuras de um Jovem Português 1860

Constança ou Filha maldita 1860

Plutarco da Mocidade 1860

Historia de um Piolho, ou o Viajante de Nova Especie 1860

A Última hora de uma sepultada 1864

Novas cartas amorosas, por uma apaixonada 1864

O barbeiro gascão e o toureador castelhano 1864

O livro das pensionistas, ou escolha de historietas traduzidas do francês por

meninas estudiosas, oferecidas a suas camaradinhas 1864

Roldão amoroso ou Aventuras deste famoso paladino 1864

istória de D. Ignez de Castro 1864

Vida e ações do célebre Cosme Manhoso, com os logros em que caiu por causa

da sua ambição, seus trabalhos e suas misérias 1864

Elisa, ou a Virtuosa Castro 1864

Castello de Scharfenstein 1873

A Condecinha de Flores 1873

A cruz de pão 1873

A fada graciosa ou a boa amiga dos meninos 1873

A Feliz Adoção ou Olympia 1873

Carlos Barimore e Neseida. O Excesso do Ciúme. 1873

Cartas Escolhidas 1873

Contos do tio Pedro ou uma viagem às cinco partes do mundo 1873

Emilia, ou os Foragidos dos Pyrenêos 1873

Escolha de anedotas, antigas e modernas, extraídas dos melhores autores 1873

Novas cartas amorosas, por uma apaixonada 1873

O Eremita dos Bosques de Santarém ou Os Três Amigos 1873

Adriana ou História da Marquesa de Brianville 1873

Affonso de Lodève 1873

Elisa ou O Modelo de Piedade Filial 1873

Esperia ou O Eremeterio de S. Thiago 1873

115

Eugenio e Virginia 1873

Héloïse et Abélard 1873

O Amigo do Principe e da Pátria ou o bom cidadão 1873

O Castigo da Prostituição 1873

Libertinos e Conspiradores 1873

O Arrependimento Premiado 1873

O Cabazinho de Flores 1873

Ademai, conto oriental 1873

Aventuras de um jovem português, ou conto moral de um viajante pela África e

Índias de Espanha 1873

Elisa, ou a Virtuosa Castro 1873

Escolha das melhores novelas 1873

Severino Magriço, ou o Dom Quixote Português 1873

A arte de ganhar dinheiro 1876

História de D. Ignez de Castro 1876

Historia Jocosa do Celebrado Pae-Pae Cognominado o Gargantua Portuguez 1876

Novas cartas amorosas, por uma apaixonada 1876

O barbeiro gascão e o toureador castelhano 1876

O Castigo da Prostituição 1876

Tabela 13: Romances encontrados nos catálogos de Garnier cujas informações básicas são desconhecidas.

A análise inicia com o número de romances e romancistas presentes nos

catálogos.

Gráfico 09: Quantidade de romancistas e romances nos catálogos de Garnier.

116

Nos primeiros catálogos, além de pouco oferecimento absoluto de romances, há

uma quantidade proporcional de auotres alta, ou seja, há poucos autores com mais de uma

anunciada. O gráfico abaixo deixa isso mais claro:

Gráfico 10: Média de romances por romancista nos catálogos de Garnier.

Com isso, é possível aferir a diversidade do acervo, ou seja, a média de romances

de cada autor contidos nos catálogos. Esse valor, em todas as listas, é pouco menor que a

média encontrada nas listas de Lévy. Ou seja, os catálogos de Garnier, em geral, apresentam

uma boa variedade de textos à disposição.

O gráfico abaixo apresenta a porcentagem de romances em comum entre os

catálogos:

117

1%

4%

12%

83%

Porcentagem de romances presentes nos

catálogos de B.L. Garnier (1860-1876)

Presentes em 4 catálogos Presentes em 3 catálogos

Presentes em 2 catálogos Presentes em apenas 1 catálogo

Gráfico 11: Quantidade de aparições dos romances nos catálogos de Garnier.

Os dados indicam que a grande maioria dos romances anunciados por Garnier

aparece apenas uma única vez, demonstrando um processo renovação. Não há títulos que

aparecem nos cinco catálogos, mas há algumas presentes em 3 e até 4 listas de obras à venda.

A tabela indica os títulos, autores e origem das obras que aparecem 3 ou mais vezes nos

catálogos de Garnier:

Romance Autor Nacionalidade

A Luneta Mágica Joaquim Manoel de Macedo Brasil

A Moreninha Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Anathema Camilo Castelo Branco Portugal

Arminda e Theotonio, ou a Consorte Fiel Elias Antonio da Fonseca Portugal

As Minas de Prata José de Alencar Brasil

As Vítimas Algozes Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Aventures de Lydéric Alexandre Dumas França

Camille, ou le Souterrain Marsollier França

Carotin Paul de Kock França

Contes Moraux Marmontel França

Diva José de Alencar Brasil

Élisabeth, ou Les Éxilés de Sibérie Mme Cottin França

Iracema José de Alencar Brasil

La confession du Bon Bavarois, et Le Colonel

Happethaler Alfred Assolant França

Le Batteur d'Estrade Paul Duplessis França

Le Coureur des Bois ou les Chercheurs d'Or Gabriel Ferry França

118

Le Docteur Judassohn Alfred Assolant França

Le Génie du Christianisme Chateaubriand França

L'Histoire d'Un Mort Racontée par Lui-même Alexandre Dumas França

Lucíola José de Alencar Brasil

Memórias do Sobrinho do meu Tio Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Mes Mémoires Alexandre Dumas França

O Culto do Dever Joaquim Manoel de Macedo Brasil

O Guarani José de Alencar Brasil

O Moço Loiro Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Os Romances da Semana Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Rosa Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Sophie Printemps Alexandre Dumas fils França

The Bravo James Fenimore Cooper EUA

Vicentina Joaquim Manoel de Macedo Brasil

Tabela 14: Romances com 3 ou 4 aparições nos catálogos de Garnier

Alexandre Dumas (3 romances), José de Alencar (5) e Joaquim Manoel de

Macedo (9) são os autores mais constantes nos catálogos de Garnier. Macedo tem grande

destaque, possivelmente por ser um dos mais importantes contrados do editor.187

A constância

de José de Alencar revela, mais uma vez, o principal nome de Garnier numa posição

privilegiada, uma espécie de figura carimbada das listas de obras à venda. Já Dumas, o autor

das multidões, é um destaque natural, tanto no Brasil quanto na França.

França e Brasil dominam os romances com presença constante nos catálogos. Se

considerarmos todos os textos de prosa ficcional encontrados, a França leva maior vantagem,

conforme apontam os dados abaixo:

LÍNGUA 1860 1864 1870 1873 1876 TOTAL

Francês 12 23 0 264 136 435

Português 1 14 22 164 100 301

Inglês 2 1 0 23 6 32

Espanhol 2 2 0 11 9 24

Alemão 3 0 0 6 4 13

Italiano 0 1 0 6 0 7

Holandês 0 0 0 2 0 2

Polonês 0 0 0 1 0 1

Tabela 15: Quantidade de romances por língua original nos catálogos de Garnier.

187

QUEIROZ, Juliana Maia, op. cit., p. 207.

119

Apesar de o francês ser a língua dominante na composição dos originais (53% do

total), o português também tem uma forte presença, com 37% de todas as obras anunciadas

por Garnier. Há ainda uma diversidade considerável de outras línguas, sobretudo inglês,

espanhol e alemão. Disso podemos, novamente, comprovar a importância do mercado

francófono no mercado internacional e também a pujança da indústria de tradução para o

português, afinal, os mais de 400 títulos franceses anunciados nos catálogos de Garnier são

publicados como traduções. Isso comprova o estudo de Márcia Abreu, que indica a relevância

da edição em língua portuguesa para a difusão dos romances.188

É importante também observar o movimento de participação das traduções e de

romances nacionais nos catálogos de Garnier, ou seja, a proporção que elas ocuparam no

decorrer dos anos. O gráfico abaixo desconsidera a lista de 1870, exclusivamente nacional.

Gráfico 12: Porcentagem de romances por língua original nos catálogos de Garnier.

Enquanto a participação dos franceses foi caindo a cada catálogo, os de língua

portuguesa tiveram forte subida. Ou seja, o mercado para produções nacionais se fortalecia ao

mesmo tempo em que ocupava o espaço do dominante romance francês.

188

ABREU, Márcia, A circulação de romances como problema, op. cit., p. 15.

120

A tabela abaixo aponta os escritores franceses com mais aparições nos catálogos.

Cada romance anunciado contabiliza uma aparição, independente se o título já fora

encontrado em catálogos anteriores.

Romancista Aparições nos catálogos

Alexandre Dumas 80

Paul Féval 25

Jules Verne 19

Alexandre Dumas fils 14

Charles-Victor Prévost D'Arlincourt 13

Pierre Alexis de Ponson du Terrail 10

Paul de Kock 9

Chateaubriand 8

Élie Berthet 8

Ernest Capendu 7

Eugène Sue 7

Honoré de Balzac 7

Marmontel 7

Alfred Assolant 6

Alfred de Musset 6

Arsène Houssaye 6

Émile Gaboriau 6

Octave Feuillet 6

Xavier de Montépin 6

Auguste Arnould 5

Bernardin de Saint-Pierre 5

Mme Cottin 5

Paul Duplessis 5

Théophile Gautier 5

Tabela 16: Autores franceses com 5 ou mais romances presentes nos catálogos de Garnier.

Alguns nomes de destaque no Brasil também figuravam na lista dos 20 mais

anunciados na França (Alexandre Dumas, Paul Féval, Alexandre Dumas fils, Eugène Sue,

Honoré de Balzac e Arsène Houssaye), o que revela, mais uma vez, a sintonia entre os

mercados francês e brasileiro.

Com relação aos livros de língua portuguesa, deve-se levar em conta que não

provêm apenas do Brasil, mas também de Portugal. A tabela abaixo indica os principais

escritores em língua portuguesa encontrados nos catálogos e seus países de origem:

121

Romancista País Aparições nos catálogos

Camilo Castelo Branco Portugal 65

Joaquim Manoel de Macedo Brasil 45

José de Alencar Brasil 37

Augusto Fausto de Souza Brasil 12

Bernardo Guimarães Brasil 7

Elias Antonio da Fonseca Portugal 7

Machado de Assis Brasil 6

Júlio Dinis Portugal 5

Manuel Duarte Moreira de Azevedo Brasil 5

Guimarães Júnior Brasil 4

Soares de Souza Junior Brasil 4

Alfredo Campos Portugal 3

José Joaquim Bordalo Portugal 3

José Joaquim Rodrigues de Bastos Portugal 3

Teixeira e Sousa Brasil 3

Visconde de Taunay Brasil 3

Tabela 17: Romancistas de língua portuguesa encontrados nos catálogos de Garnier.

Camilo Castelo Branco, português, é quem mais aparições possui nos catálogos de

Garnier aqui analisados. De fato, estudos demonstram que o romancista teve grande

circulação no Brasil.189

Ele vivia das letras ao escrever para diversos editores e gêneros,

oferecendo um produto atraente ao público de Portugal que, como no Brasil, era aficionado

pelos sucessos franceses.190

Provavelmente, a forte presença nos catálogos de Garnier é um

reflexo da boa aceitação em terras lusas.

Porém, são os brasileiros que possuem a maioria dos romances em língua

portuguesa - 60% ao todo. Macedo e Alencar, novamente, se destacam; há ainda Augusto

Fausto de Souza, que era colaborador da Revista Popular, Jornal das Famílias e Jornal do

Commercio,191

e Bernardo Guimarães, autor d’A Escrava Isaura.

189

QUEIROZ, Juliana Maia. Relações transatlânticas e literárias no século XIX. Polifonia, Cuiabá, MT, v. 20,

n. 28, p. 189-203, jul/dez., 2013.

190 Ver: OLIVEIRA, Paulo Motta. A Ascensão do romance em Portugal: alguns apontamentos. X Congresso

AIL. Universidade do Algarve, 18 a 23 de julho de 2011. Disponível em

<www.fchs.ualg.pt/xcail/comunicacoes/pdf/outros/Paulo_Oliveira.pdf> Acesso em 09/09/2016.

191 RIBEIRO FILHO, J. S. Dicionário Biobliográfico de escritores cariocas (1565-1965). Livraria Rio de

Janeiro: Brasiliana Editora, 1965.

122

Os romances em língua inglesa, a terceira força dos catálogos de Garnier, dividem

as nacionalidades entre Inglaterra, Irlanda e Estados Unidos.

Romancista País Aparições nos catálogos

James Fenimore Cooper EUA 11

Samuel Smiles Inglaterra 3

Charles Dickens Inglaterra 2

Daniel Defoe Inglaterra 1

Edward Bulwer Lytton Inglaterra 1

George Augustus Moore Inglaterra 1

Henry Fielding Inglaterra 1

Jane Austen Inglaterra 1

Jonathan Swift Irlanda 1

Regina Maria Roche Irlanda 1

T. J. Horsley Curties Irlanda 1

Cardinal Nicholas Wiseman Inglaterra 1

Wilkie Collins Inglaterra 1

Tabela 18: Romancistas de língua inglesa encontrados nos catálogos de Garnier.

Levando em conta que a Inglaterra é considerada o berço do romance moderno192

e que no século XIX a hegemonia política ocidental era disputada entre este país e a França, a

presença de romances ingleses nos catálogos brasileiros é bastante restrita. Walter Scott, por

exemplo, um dos maiores nomes do romance inglês, nem sequer aparece.

Franco Moretti, quando analisou os acervos das bibliotecas circulantes inglesas e

observou o número reduzido de obras estrangeiras ali presentes, concluiu que “a Inglaterra se

torna uma ilha”,193

ou seja, produz e consome sua própria literatura. De acordo com os

catálogos aqui estudados, aparentemente as águas do Atlântico também isolam a Inglaterra da

exportação de romances. Os Estados Unidos, por exemplo, apresentam uma quantidade maior

de romances, sobretudo os escritos por James Fenimore Cooper que lidera, isolado, as

aparições de textos em língua inglesa.

Cooper foi traduzido, no Brasil, por Caetano Lopes de Moura, que também

traduziu a obra de Walter Scott, a pedido de J. P. Aillaud, editor francês, nos anos 1820, e era

192

Ver VASCONCELOS, Sandra. A Formação do romance inglês: ensaios teóricos. São Paulo: Hucitec /

FAPESP, 2007.

193 MORETTI, Franco, op. cit., p.161.

123

inicialmente vendido por Laemmert.194

Portanto, o público conhecia o norte-americano de

longa data, o que pode explicar tamanha presença nos catálogos.

Com relação aos textos de outras línguas, há em Garnier forte presença do

espanhol Enrique Pérez Escrich e do alemão Christoph von Schmid - este último, segundo

Lyons, também teve grande sucesso na França.195

Romancista Língua Aparições nos catálogos

Enrique Pérez Escrich Espanhol 9

Christoph von Schmid Alemão 8

Antonio Bresciani Italiano 4

Cervantes Espanhol 4

Giulio Cesare Croce Italiano 2

Henri Conscience Holandês 2

Wenceslau Ayguals d'Izco Espanhol 2

Carolina Coronado Espanhol 1

Caroline Pichler Alemão 1

Christian August Vulpius Alemão 1

Emilio Castelar Espanhol 1

Friedrich Philipp Wilmsen Alemão 1

Giovanni Boccaccio Italiano 1

Gomes de Santo Estevão Espanhol 1

Jan CzyńskiJan Polonês 1

Patricio de la Escosura Morrogh Espanhol 1

Rudolf Erich Raspe Alemão 1

Tabela 19: Romancistas de diversas línguas (exceto francês, português e inglês) encontrados nos catálogos de

Garnier.

É possível, assim, traçar um mapa da circulação transatlântica de alguns romances

aportados em solo brasileiro, de acordo com os catálogos deste corpus. O mapa demonstra a

forte interligação do Brasil ao restante do mundo já no século XIX.

194

HALLEWELL, Laurence, op. cit., p. 233.

195 LYONS, Martyns, op. cit..

124

Figura 40: Mapa de procedência dos romances encontrados nos catálogos de B. L. Garnier (1860-1876).

Isso comprova que o repertório de leitura do Brasil oitocentista era muito mais

vasto do que supõe a historiografia literária tradicional, que costuma reduzir autores a meia

dúzia de nomes célebres e desconsiderar os letrados que, algumas vezes, tiveram mais

impacto em uma determinada época, e até mesmo esquecer obras de escritores que, embora

pouco aclamadas pela crítica, fizeram sucesso entre os leitores.196

A procedência desses romances privilegia, como se esperava, a França, metrópole

cultural do período, e Portugal, que, além de ser a antiga metrópole política, contava com

afinidade linguística em relação ao Brasil. Além desses, englobam também outros territórios

europeus e também americanos.

3.3. Comparações entre os livreiros

As comparações entre os romances anunciados por Lévy e Garnier no decorrer

dos catálogos apontam confluências e afastamentos importantes.

196

ABREU, Márcia (org.). Leitura, História e História da Leitura. Campinas, SP: Mercado das Letras, 1999, p.

14.

LEGENDA

França- Brasil

Portugal - Brasil

EUA - Brasil

Inglaterra - Brasil

Alemanha - Brasil

Espanha - Brasil

Itália - Brasil

125

A diversidade das listas é um ponto variável. Enquanto Lévy possui entre 4 e 6

livros por autor nos catálogos, Garnier não passa de 3. Ou seja, há uma miscelânea maior de

autores à venda - proporcional, é claro, ao tamanho do acervo disponível. A estratégia de

Garnier é, sem dúvida, anunciar um pouco de cada autor, ao invés de muito de poucos. Por

exemplo, enquanto Lévy anunciava boa parte dos livros de Dumas à disposição no período

(131 títulos diferentes, ao longo do período pesquisado), Garnier dispunha de 75.

O francês atuante no Rio, porém, anunciava a obra completa dos romancistas

brasileiros, o que Lévy procurava igualmente fazer aos seus conterrâneos. Nesse ponto, é

preciso destacar que alguns autores franceses, devido à magnitude do seu comércio interno e

também de exportação, escreviam mais romances que os brasileiros, o que pode ter

influenciado na grande média de textos por autor na França. Contudo, o mercado brasileiro

tornou-se beneficiado, já que Garnier soube ampliar o leque dos oferecimentos ao invés de

focar em poucos nomes estrangeiros. Ou seja, preferiu preencher uma prateleira com diversos

autores e, portanto, estilos diferentes de escrita, do que com apenas poucos contemplados.

Outro ponto de distanciamento é com relação à renovação dos títulos anunciados.

A grade maioria dos romances divulgados por Garnier aparece uma única vez no corpus,

diferentemente de Lévy, onde mais da metade das obras à venda repete-se em ao menos 3

ocasiões.

Novamente, guardadas as devidas proporções, podemos afirmar que as obras

oferecidas por meio dos catálogos de Garnier possuíam mais diversidade, ou seja, um leitor

encontraria novidades com maior frequência em alguns catálogos de Garnier do que de Lévy.

Isso não quer dizer que segundo possuísse um acervo velho e ultrapassado, afinal, ele também

trazia novidades com frequência; contudo, há em seus catálogos uma grande taxa de

permanência.

Outra característica que reforça bem a diferença do mercado grande em relação ao

pequeno é a presença da língua nacional. Enquanto os catálogos de Lévy são compostos, na

sua imensa maioria, de títulos franceses, Garnier apresenta traduções como o carro chefe do

seu empreendimento.

Se avaliados os movimentos, temos que Lévy, mesmo que muito discretamente,

passou a apresentar um número crescente de traduções - com destaque aos ingleses - enquanto

que Garnier ampliou significavelmente o número de autores nacionais. Porém, a velocidade

dessa evolução foi muito maior para o livreiro atuante no Brasil do que para o de Paris.

126

Assim, se antes um leitor brasileiro tinha à disposição majoritariamente traduções

francesas, em alguns anos podia também ler o último romance de Alencar ou outro escritor

seu conterrâneo e escolher também, se quisesse, o texto francês; já o consumidor de Lévy

teria à disposição uma ou outra tradução, mas elas praticamente se perderiam na massa de

impressos nacionais.

De todo modo, nenhum deles tem um catálogo considerado exclusivamente

composto nem de obras nacionais, nem de traduções, apesar de as proporções serem

diferentes. Além disso, eles nunca destacam as nacionalidades das obras em seções próprias,

mas misturam os títulos, ou seja, não há seções denominadas "obras estrangeiras" ou de

“literatura nacional” (apesar de, no catálogo de 1876, Garnier destacar os nacionais com

longos comentários). Ou seja, esse processo de ampliação do romance brasileiro nos catálogos

pareceu ter sido feito de maneira orgânica. Sem grandes alvoroços e destaques ao colocar à

venda um título brasileiro, o livreiro-editor dispunha-os ao lado dos franceses.

Esses, aliás, mantiveram a total supremacia, afinal, a quantidade de romances

produzidos na França até esse período era muito grande. Entretanto, a ocorrência de

estrangeiros em Lévy, sobretudo ingleses, despontou no decorrer dos anos, demonstrando

que, mesmo timidamente, o mercado francês passou a ter uma abertura maior a textos de fora.

Já Garnier, que sempre apresentou grande presença de autores estrangeiros, teve a

proporção deles, que chegava à totalidade nos primeiros catálogos, caindo a cerca de 50% nos

últimos. A literatura nacional, geralmente com mais comentários críticos ao seu redor,

mostrou-se crescente.

Garnier e Lévy também apresentavam obras em comum em seus catálogos. Para

essa comparação, utilizamos as listas mais próximas temporalmente: 1863 de Lévy com 1864

de Garnier, 1871 de Lévy com 1873 de Garnier e 1875 de Lévy com 1876 de Garnier (as

listas de 1860 não apresentam nenhum romance em comum).

Romance Autor

Huit Jours Au Château Frédéric Soulié

Les sept péchés capitaux: La Colère Eugène Sue

Les sept péchés capitaux: L'Envie Eugène Sue

Les sept péchés capitaux: L'Orgueil Eugène Sue

Marthe de Montbrun Eugénie-Marie Soler

Tabela 20: Romances em comum entre os catálogos de Lévy de 1863 e Garnier de 1864.

127

Romance Autor

Acté Alexandre Dumas

Adolphe Benjamin Constant

Affaire Clémenceau Alexandre Dumas fils

Amaury Alexandre Dumas

Ascanio Alexandre Dumas

Aventures de Quatre Femmes et d'un Perroquet Alexandre Dumas fils

Catherine Blum Alexandre Dumas

Cécile ou la Robe de Noces Alexandre Dumas

Chevalier de Maison Rouge Alexandre Dumas

Conscience l'Innocent Alexandre Dumas

Diane de Lys Alexandre Dumas fils

Dieu Dispose Alexandre Dumas

El Salteador Alexandre Dumas

Eugènie Grandet Honoré de Balzac

Fernande Alexandre Dumas

Gabriel Lambert Alexandre Dumas

Georges Alexandre Dumas

Het Ijzeren Graf Hendrik Conscience

Isabel de Bavière: Règne de Charles VI Alexandre Dumas

La Boîte d'Argent Alexandre Dumas fils

La Colombe Alexandre Dumas

La Comtesse de Salisbury Alexandre Dumas

La Dame aux Camélias Alexandre Dumas fils

La Dame Aux Perles Alexandre Dumas fils

La Dame de Monsoreau Alexandre Dumas

La Duchesse de Langeais Honoré de Balzac

La Guerre des Femmes Alexandre Dumas

La Maison de Glace Alexandre Dumas

La Reine Margot Alexandre Dumas

La robe de Nessus Amédée Achard

La Terreur Prussienne Alexandre Dumas

La Tulipe Noire Alexandre Dumas

La Vendetta Honoré de Balzac

La vie à vingt ans Alexandre Dumas fils

Le Bâtard de Mauléon Alexandre Dumas

Le Capitaine Paul Alexandre Dumas

Le Chevalier d'Harmental Alexandre Dumas

Le Comte de Monte Cristo Alexandre Dumas

Le Fils du Diable Paul Féval

Le nez d'un notaire Edmond About

Le Roi des gueux Paul Féval

Le Roi d'Italie Albert Blanquet

Le roman d'une femme Alexandre Dumas

Le Trou de l'Enfer Alexandre Dumas

128

Le Tueur de Tigres Paul Féval

Le Vicomte de Bragelonne Alexandre Dumas

Les Amours de Paris Paul Féval

Les Compagnons de Jéhu Alexandre Dumas

Les Compagnons du Silence Paul Féval

Les Deux Diane Alexandre Dumas

Les Drames de la Mer Alexandre Dumas

Les Frères corses Alexandre Dumas

Les Louves de Machecoul Alexandre Dumas

Les Mille et Un Fantômes Alexandre Dumas

Les Mohicans de Paris Alexandre Dumas

Les Quarante-Cinq Alexandre Dumas

Les Stuarts Alexandre Dumas

Les Trois Mousquetaires Alexandre Dumas

Mémoires de Garibaldi Alexandre Dumas

Mémoires d'un Médecin: La Comtesse de Charny Alexandre Dumas

Monsieur de Camors Octave Feuillet

Olympe de Clèves Alexandre Dumas

Pascal Bruno Alexandre Dumas

Paul et Virginie Bernardin de Saint-Pierre

Pauline Alexandre Dumas

Sophie Printemps Alexandre Dumas fils

Sylvandire Alexandre Dumas

Trois Hommes Forts Alexandre Dumas fils

Une Fille du Régent Alexandre Dumas

Vingt Ans Après Alexandre Dumas

Tabela 21: Romances em comum entre os catálogos de Lévy de 1871 e Garnier de 1873.

Romance Autor

Adolphe Benjamin Constant

Flamarande George Sand

Graziella Alphonse de Lamartine

Huit Jours Au Château Frédéric Soulié

Jean de Thommeray Jules Sandeau

Julia de Trécoeur Octave Feuillet

La Belle Jenny Théophile Gautier

La Vertu de Rosine Arsène Houssaye

L'Art de Plaire Ernest Feydeau

Le nez d'un notaire Edmond About

Les sept péchés capitaux: La Colère Eugène Sue

Les sept péchés capitaux: L'Envie Eugène Sue

Les sept péchés capitaux: L'Orgueil Eugène Sue

Mademoiselle Cléopatre Arsène Houssaye

Mademoiselle Mariani Arsène Houssaye

129

Marthe de Montbrun Eugénie-Marie Soler

Mémoires d'un Médecin: La Comtesse de Charny Alexandre Dumas

Quatre-vingt-treize Victor Hugo

Scènes de la Vie de Bohème Henri Murger

Sophie Printemps Alexandre Dumas fils

Tabela 22: Romances em comum entre os catálogos de Lévy de 1875 e Garnier de 1876

Levando em conta que todas as obras francesas anunciadas por Garnier eram

traduzidas, destaca-se a rapidez do processo de tradução do francês para o português no

período.

O conjunto em comum das listas de 1871 e 1873 é caracterizada por ser composta

majoritariamente por Dumas pai e filho. Além de Garnier apresentar 45 romances de Dumas

em comum com Lévy, o livreiro-editor da Rua do Ouvidor anunciou 22 títulos do autor que

não se encontram no catálogo de Paris, entre eles livros da série Les Crimes Célèbres (1839-

1841), Les Deux Étudiants (1838) e La Maison Phénicienne (1840).

Os catálogos de 1875 e 1876 também são de interessante análise, pois há uma

diversidade maior nos autores em comum. São 15 romancistas diferentes apresentando os

mesmos textos em dois mercados de tamanhos muito distintos.

Considerando, portanto, o período do corpus e apenas os dois livreiros, quantos

títulos diferentes havia no mercado?

Gráfico 13: Intersecção entre os romances diferentes anunciados nos catálogos de Michel Lévy e Baptiste-Louis

Garnier (1860-1876).

Em

comum:

92

romances

130

Se somados os romances diferentes em circulação, tem-se um total de 1930 títulos

diferentes, sendo que 92 desses estão presentes em ambos os mercados. É um número

pequeno (cerca de 5% do total), mas considerável e, sobretudo, indicador de que, além de um

mercado em comum, havia uma grande quantidade de textos próprios de cada livreiro.

131

Considerações finais

Os catálogos de livreiros provaram ser uma riquíssima fonte de informações

acerca não só de romances em circulação no século XIX, mas das relações dinâmicas entre os

membros da comunidade leitora. Eles demonstram que Lévy parece ter tido um importante

papel na consolidação da literatura francesa, enquanto Garnier teve um importante papel na

criação e difusão da literatura brasileira. Ambos os profissionais, assim, são elementos chave

na compreensão da cultura letrada de seus países.

Bourdieu afirma que há duas lógicas econômicas inversas: uma é a economia da

“arte pura”, que consiste no acúmulo de capital simbólico capaz de assegurar lucro a longo

prazo, ou seja, investir em autores de renome para conseguir sucesso por meio do

reconhecimento de sua arte; a outra é a lógica “econômica”, que investe no sucesso imediato

de autores que respondem ao gosto da clientela, refletida na alta tiragem e no investimento de

curo prazo.197 São caminhos, segundo o autor, que não se encontram, cada qual levando ao

sucesso financeiro de uma casa editorial de uma maneira distinta.

Os catálogos de Lévy e Garnier não parecem confirmar essa teoria. Enquanto o

primeiro investia em livros quase sempre populares, o segundo exaltava a exclusividade de

suas obras, seu bom acabamento e a preciosidade dos seus impressos, culminando na sua

importância para a formação da literatura brasileira. Entretanto, pouco a pouco, os caminhos

desses homens começaram a se encontrar: Lévy passou a apresentar autores, como Balzac, em

grande destaque, e a juntar em sua casa os nomes que viriam a integrar o cânone literário

francês, enquanto Garnier investia no barateamento dos impressos e na divulgação de nomes

populares. Ou seja, existiu um processo de confluência, e não de afastamento, da ação desses

profissionais no mercado dos livros de seus países.

Ambos deram destaque aos romances com o passar dos anos, o gênero ganhava

seu espaço e, apesar de ser constantemente atrelado a alguma utilidade além do

entretenimento, foi conquistando as seções dos catálogos, aumentando sua presença a cada

amostra.

Outro ponto de importante análise foi o crescimento da proporção de romances

nacionais presentes nos catálogos de Garnier, cujos comentários críticos foram o único

diferencial a destacá-los das traduções. Os textos brasileiros vieram para somar-se a um

197

BOURDIEU, Pierre. As regras da arte - gênese e estrutura do campo literário. Tradução de Maria Lucia

Machado. São Paulo: Editora Schwarcz Ltda., 2005, p. 163.

132

acervo já diverso, que contava com a presença de poucos textos de vários escritores

estrangeiros e que, de maneira orgânica, passou a acolher também uma leva de romancistas do

Brasil.

Nenhum livreiro apresentava apenas textos nacionais, nem mesmo Michel Lévy

na França, um mercado mais dinâmico. Ao mesmo tempo, nenhum anunciava apenas

traduções, inclusive Garnier. Além disso, os dois profissionais mesclavam textos recentes e de

média e longa duração em suas listas.

Há ainda um mesmo conjunto de romances presentes no material de divulgação de

ambos os profissionais, o que indica uma oferta comum em locais tão distantes do globo, com

romances franceses sendo traduzidos e vendidos no Brasil no mesmo ano que em seu país de

origem. Isso indica uma forte comunicação entre os territórios, possibilitada pela ação de

tantos profissionais que atuavam no mercado livreiro, especialmente os livreiros-editores,

impressores e tradutores.

Aliás, os textos anunciados por Garnier contemplam diversos tipos de público: há

obras eruditas, de público médio e populares. Ou seja, o fato de a taxa alfabetização no país

ser pequena não reduziu os romances à venda a apenas eruditos, como poderia se pensar.198

Outro fator de relevada importância é a existência, em ambos os livreiros, de

obras nacionais de maior e menor sucesso.

Autor Canonização Edições até 1876

José de Alencar Canonizado 117

Bernardo Guimarães Canonizado 25

Machado de Assis Canonizado 17

Manuel Duarte Moreira de Azevedo Não canonizado 11

Guimarães Júnior Não canonizado 11

Visconde de Taunay Canonizado 11

Teixeira e Sousa Não canonizado 9

Augusto Fausto de Souza Não canonizado 3

Soares de Souza Junior Não canonizado 1

Tabela 23: Autores brasileiros anunciados por Garnier, informação da canonização e número de edições até

1876.

Esses dados vão contra a ideia de que no Brasil, por falta de produção, todo

romance era, ao mesmo tempo, canonizado e sucesso de público. Ao contrário, nem tudo o

198

Ver: ABREU, Márcia. Semelhança na diversidade - a leitura de romances na Europa e no Brasil. In:

RÖSING, Tania & ZILBERMAN, Regina. Leitura: história e ensino. Porto Alegre: Edelbra, 2016, pp. 237 -

259.

133

que foi produzido no país entrou para o cânone: há volume suficiente de obras para permitir

uma seleção. Por exemplo, há autores com diversas edições publicadas, como Manuel de

Azevedo e Guimarães Junior, que não ganharam destaque nas histórias literárias; já Visconde

de Taunay, com as mesmas 11 edições, e Machado de Assis, com 17, foram canonizados.

Diante dos dados e fatos apontados, é possível afirmar que, realmente, entre os

mercados literários francês e brasileiro - levando em conta o estudo de caso entre dois dos

principais livreiros-editores dos seus locais de atuação entre 1860 e 1876 - há uma diferença

de escala, mas não de natureza. Ou seja, apesar dos tamanhos completamente distintos e de

conviver com situações político-econômicas discrepantes, Rio e Paris estavam interligados

por muito mais que os mesmos periódicos, romances e agentes, mas também por estratégias e

comportamentos semelhantes dos seus profissionais do livro. Tal ideia vai em direção oposta

à de Moretti, de que um mercado pequeno não se comportaria como um grande, em escala

menor.

Com esse estudo, demonstramos também a alta variedade e atualidade dos

romances oferecidos por Garnier no Brasil, maior até mesmo que Michel Léy na França.

Assim, pudemos contradizer a ideia de Candido de que os leitores que vivem em mercados de

grande produção nacional têm mais “emoções literárias” que os brasileiros.

Essas novas linhas de encontro engrossam ainda mais as relações transatlânticas

entre os países nos Oitocentos e ajudam a desconstruir as ideias que veem o Brasil sob os

óculos do atraso ideológico e cultural. Comparada às grandes, a nossa literatura pode ser

menor, mas não mais pobre ou fraca.

134

Referências bibliográficas

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Letras, 1999.

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Sites consultados

Banco de Dados CiTrIm - Circulação Transatlântica dos Impressos

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