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Jurisprudência da Primeira Turma

Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

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Jurisprudência da Primeira Turma

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA

RECURSO ESPECIAL NQ 29.135 - SC (Registro n ll 92.0028638-0)

Relator: Ministro Demócrito Reinaldo

Recorrente: Rigesa, Celulose, Papel e Embalagens Ltda

Recorrida: Fazenda Nacional

43

Advogados: Alfredo Pereira Macedo e outros e Antônio Carlos Rodrigues de Barros e outros

EMENTA: Tributário - Imposto sobre Serviços de Transportes - Carga própria, em veículo próprio, para simples entrega, não está sujeito ao imposto

sobre serviços de transportes, por inocorrência do fato gerador.

O transporte de carga própria em veículo próprio, para simples entrega,

não está sujeito ao Imposto sobre Serviços de Transportes, por inocorrência

do fato gerador.

Recurso provido. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a

Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provi­

mento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, na forma do

relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte

integrante do presente julgado.Votaram com o Relator os Srs. Ministros Humberto

Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira, José Delgado e Garcia Vieira. Custas, como de lei.

Brasília-DF, 18 de agosto de 1998 (data do julgamento). Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro DEMÓCRITO REINALDO, Relator.

Publicado no DI de 21.09.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Rigesa, Celusose, Papel

e Embalagens Ltda interpôs recurso especial, com fundamento nas alíneas a e c

do princípio constitucional autorizativo, contra acórdão do extinto Tribunal Fe­deral de Recursos, resumido na ementa seguinte:

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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44 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

"Constitucional-Tributário - Imposto sobre Transportes - Lei

nº- 7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º- do artigo 3º- do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a repristinação tácita, decorrente de revogação da lei revogadora, e que não existe em nosso direito.

O imposto sobre transporte é tributo novo. Nada impede, en­tretanto, que, em sua criação, fosse determinada a observância de normas pertinentes ao que veio substituir. Recepção de conjunto normativo que passa a reger outras hipóteses.

Hipóteses de incidência, contribuinte, base de cálculo e alíquota previstas em lei" (folha 117).

Sustenta, a recorrente, que o v. aresto recorrido negou vigência aos artigos

4º-, 68, 70 e 97 do Código Tributário Nacional, artigo 2º-, § 3º-, da Lei de Intro­

dução ao Código Civil, bem como divergiu de julgados do Supremo Tribunal Federal e de outros tribunais (folhas 120/136).

Contra-arrazoado (folhas 142/144), o recurso foi admitido na origem, su­bindo os autos a esta instância.

Encaminhados com vistas à douta Subprocuradoria Geral da República, retornam agora, conclusos, em 03.06.98, com parecer favorável ao provimento do recurso (folhas 155/160).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO (Relator): A questão fulcral

a ser dirimida, conforme já resumidamente exposta, consiste em sabe~ se é legal­mente admissível, ou não, o transporte de carga própria em veículo próprio, sem a cobrança do denominado Imposto Sobre Serviços deTransporte.

A egrégia Sexta Turma do extinto e sempre lembrado TFR entendeu que a hipótese é de incidência do imposto, em face da restauração da vigência do § 3º­

do artigo 3º- do Decreto-Lei nº- l.438/75, com o advento da Lei nº- 7.450/85. Reconheceu, ainda, que "o Imposto sobre Transporte é tributo novo. Nada impe­

de, entretanto, que, em sua criação, fosse determinada a observância de normas

pertinentes ao que veio substituir" (folha 117). Por seu turno, a recorrente, após fazer uma completa sinopse legislativa da

tributação sobre os serviços de transportes, demonstrando a ilegalidade da inci­

dência do 1ST sobre o transporte de carga própria em veículo próprio, ressalta em suas razões recursais, in verbis:

RST}, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 45

"Assim, muito embora o colendo Supremo Tribunal Federal tenha

firmado posição quanto à inconstitucionalidade do § 3J2 do artigo 3J2 do Decreto-Lei n J2 1.438/75, com a redação do Decreto-Lei n J2 1.582/77, a egrégia Sexta Turma do egrégio Tribunal Federal de Recursos, ao admitir

o seu restabelecimento, e, por conseguinte, o restabelecimento de norma

declarada inconstitucional, está dando interpretação divergente daquela

externada por outros egrégios tribunais. Vejamos:

'Tributário. Imposto sobre Serviços deTransporte (ISTR). Não

incidência sobre transporte de bens quando estes são do transporta­dor, e é executado o serviço em veículo próprio. Inconstitucionalidade do inciso III do art. 3J2 do Decreto-Lei n J2 1.438/75, com a redação do

Decreto-Lei n J2 1.582/77. Precedentes do Supremo Tribunal Federal

nos RREE n llli 100.642 e 10 l.170. Recurso não conhecido. (RE n il

10 1.168-8-SP. DJU de 22.02.85, p. 1.593).

Tributário. ISTR. Serviços de transporte sobre carga própria,

em veículo próprio. Inconstitucionalidade.

I - Ao julgar a argüição de inconstitucionalidade suscitada na

AMS n J2 89.825-RS, decidiu o Pleno desta Corte que é inconstitu­cionalo art. 3 J2, inciso III, do Decreto-Lei n J2 1.438, de 1975, com a

redação do Decreto-Lei n J2 1.582, de 1977.

II - Sentença confirmada.

(Remessa ex officio n J2 114.644 - SP - (6496741) - DJU de 05.02.87, p. 929).

Constitucional e Tributário. ISTR. Serviço de transporte de mer­cadorias próprias em veículos próprios. Inocorrênciã de fato gera­

dor. Exigência fiscal ilegítima. Inconstitucionalidade.

I - Se a pessoa física ou jurídica transporta, em veículo próprio,

mercadorias ou bens próprios destinados ao comércio ou à indústria, não está sujeita ao pagamento do imposto sobre serviços de transpor­te na forma prevista pelos artigos 68, I e lI, 69 e 70 do CTN. O

Plenário do TFR declarou a inconstitucionalidade da norma inscrita

no art. 3 J2, III, do Decreto-Lei n J2 1.438, de 1975, com a redação do Decreto-Lei n J2 1.582, de 1977, por ser incompatível com o disposto

no art. 21, VII, da Constituição Federal.

(In Argüição de Inconstitucionalidade naAMS n J2 98.825-RS, ReI. Min. Carlos Velloso).

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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46 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

~I - Apelação provida. Segurança concedida.

Apelação em Mandado de Segurança nQ 112.447 - Pará - (Re­

gistro nQ 79.20024) DJU de 15.05.87, p. 8.991. Tributário. Imposto sobre Serviços deTransportes (ISTR). De­

creto-Lei nQ 1.438/75, art. 3Q, UI, com a redação do Decreto-Lei nQ

1.582/77.

Ao julgar a argüição de inconstitucionalidade, suscitada naAMS

nQ 89.825-RS, decidiu o Pleno desta Corte que é inconstitucional o

art. 3Q, inciso lU, do Decreto-Lei n Q 1.438/75, com a redação do

Decreto-Lei nQ 1.582/77.

Apelação desprovida.

(Apelação Cível nQ 1 06.451-PR-(7250835) DJU de 13.11.68 -

nQ 22.032 - fls. 133/134)."

Nesta instância, o douto Subprocurador-Geral da República, Miguel

Guskow, em seu bem lançado parecer, apresenta ponderações que se me afigu­

ram irreprocháveis, no seguinte excerto:

"É entendimento pacífico, tanto da doutrina quanto da jurisprudên­

cia, que o transporte rodoviário de carga própria, realizado em veículo

próprio para simples entrega, não ocorre fato gerador, por inexistência de serviço de transporte a terceiros como atividade remunerada.

O § 3Q do art. 3Q do Decreto-Lei nQ 1.438/75, que autorizava a co­

brança do imposto sobre serviço de transporte de carga própria em veículo

próprio, veio a ser declarado inconstitucional porque não se poderia con­

siderar prestação de serviços, o transporte de mercadorias do próprio trans­

portador. A partir da Emenda Constitucional nQ 27/85 e da edição da Lei nQ

7.450/85, o legislador, eliminando a cláusula "serviços" fez abranger no

Imposto sobre Serviços de Transporte também o simples transporte. Dis­

pôs o art. 94 da mencionada lei:

'Art. 94. O Imposto sobre Serviços deTransporte Rodoviário

Intermunicipal e Interestadual de Pessoas e Cargas passa a denomi­

nar-se Imposto sobre Transportes, regendo-se pelas normas em vi­

gor do tributo cujo nome é modificado, mantido inclusive o § 3Q do

artigo 3Q do Decreto-Lei nQ 1.438, de 26 de dezembro de 1975.'

(grifam os) .

RSTJ, Brasília, a. ll, (ll4): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 47

Essa cobrança, entretanto, é vedada pelo próprio Código Tributário

Nacional que estabelece, em seus artigos 68,69 e 70 que o imposto incide

sobre a prestação de serviço de transporte.

Segundo o entendimento do Ministro Eduardo Ribeiro, que, pedindo

vista dos autos terminou por mudar a posição defendida pelo relator, foi

equivocada a interpretação dada pela sentença ao art. 94, pois este não

teria autorizado novamente a cobrança do imposto de quem transporta mercadorias de sua propriedade em veículo seu.

Mesmo se assim fosse, não foi a melhor técnica a utilizada pelo le­

gislador.

Coaduna-se, pois, com a argumentação da decisão de primeiro grau assim externa da, verbis:

'Tenho que para cessar as 'dificuldades existentes de cobrança

nos últimos anos' do 1STR sobre carga própria não basta a simplória

mudança da denominação do tributo. Há que se respeitar, ao contrá­

rio, todo o rigor do processo legislativo, a integralidade dos princí­

pios constitucionais da hierarquia e legalidade, sendo insuficiente a

ambígua, subjetiva e arbitrária 'lógica e inquestionável supressão do termo serviço em todas as disposições' de legislação anterior para magicamente obter-se a nova regulamentação legal do 1ST.' (v. fls.

80/81) (folhas 158/159)."

Dessarte, pela procedência de tais argumentos, ao adotá-los como razão de

decidir, conheço do recurso e lhe dou provimento, restabelecendo a douta sen­

tença de primeira instância.

É como voto.

Relator:

Recorrente: Recorrido:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL NQ 98.377 - DF (Registro nU 96.0037752-9)

Ministro Garcia Vieira

Distrito Federal Minas Brasília Tênis Clube

Evaldo de Souza da Silva e outros e Sérgio Cupertino Mar-

ques e outros

Sustentação Oral: Evaldo de Souza da Silva (pelo Distrito Federal)

RSTJ,Brasília,a.ll, (l 14): 41-117,fevereiro 1999.

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48 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: Processual- Decreto - Distrito Federal-Tribunal de Justiça

do Distrito Federal- Preliminar - Apreciação.

Tratando-se de norm.a legal editada pelo Poder Executivo do Distrito Federal, não pode o egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal deixar de

decidir questão argüida, sob o fundam.ento de que não fora juntado aos autos

o texto da referida nOrIna.

Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Minis­

tros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos

votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao

recurso. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Demócrito Reinaldo, Humberto

Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira e José Delgado. Brasília-DF, 17 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro GARCIA VIEIRA, Relator.

Publicado no DI de 03.08.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: O Distrito Federal interpõe recurso

especial (fls. 123/132), arrimado na Constituição Federal, artigo 105, inciso lU,

letra a, insurgindo-se contra o v. acórdão que rejeitou a preliminar de prejudicialidade do mandado de segurança face à regulamentação, pelo Decreto do GDF nQ 16.381/

95, do procedimento para credenciamento para realização de bingos permanentes

no Distrito Federal. Alega contrariedade ao art. 337 do CPC.

Requer provimento para reformar o v. acórdão hostilizado.

Sem contra-razões. Despacho de fls. 142 admitiu o recurso.

O Ministério Público Federal opinou pelo conhecimento e provimento

parcial do apelo (fls. 146/153). Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato omissivo do Secre­

tário da Fazenda e Planejamento do Governo do Distrito Federal que indeferiu o

pedido de credenciamento para promoção de bingos permanentes.

O v. acórdão de fls. 111/119 concedeu a segurança.

É o relatório.

RSTJ,Brasilia,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 49

VOTO

o SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presidente, aponta o

recorrente, como violado, o artigo 337 do CPC, versando sobre questão devida­

mente prequestionada.

Conheço do recurso pela letra a.

O v. acórdão recorrido rejeitou a preliminar de prejudicialidade do pre­sente mandado de segurança face à edição do Decreto nl!.16.381, de 28 de março

de 1995 (fls. 133/136), sob o fundamento de que incumbia ao recorrente trazer

para os autos a íntegra do citado Decreto (fls. 114). Sem razão, a meu ver, tal

posicionamento. Como se trata de uma norma legal editada pelo Poder Exe­

cutivo do Distrito Federal, não podiam os ilustres membros do egrégio Tri­bunal de Justiça do Distrito Federal deixar de apreciar e decidir referida preli­

minar, sob o fundamento de que não fora juntado aos autos o texto do referido

decreto. Cabia ao Tribunal, de ofício, determinar a sua juntada e isso está bem

claro no artigo 337 do CPC, parte final.

O recorrente, nos termos deste dispositivo legal, só teria de juntar aos autos

referido Decreto, se assim tivesse determinado o Tribunal. A exigência de junta­

da do texto da citada norma do Distrito Federal só seria cabível se o tribunal

que apreciaria não fosse do próprio Distrito Federal. Os ilustres membros do

egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal não podem alegar desconheci­

mento de lei aqui editada pelo Governo do Distrito Federal. Com razão o Mi­

nistério Público Federal, ao sustentar, em seu parecer de fls. 146/153, que:

"O entendimento dado pelo egrégio tribunal a quo ao art. 337 do

CPC diverge, não só da doutrina pátria, mas também do Decreto-Lei nl!.

4.657/42 e da Lei nl!. 5.869/73 que consagram a aplicação do dispositivo legal supracitado, apenas nos casos de comprovação do direito municipal,

estadual, estrangeiro ou consuetudinário, alegado fora de território

constitutivo do Município ou Estado.

Hu:mbertoTheodoro Júnior, em seu 'Código de Processo Civil', 2;[

ed., Forense, Rio de Janeiro, 1996, p. 159, comenta o artigo 337 do CPC nos seguintes termos:

'JuriSprudência Selecionada - Salvo nas hipóteses do art. 212 do CPC de 1939, reproduzido no art. 337 do CPC de 1973, não é

necessário que a parte junte aos autos processuais o texto da lei em

que baseia o seu direito. Se a lei, reguladora da matéria controverti­da, já se achava editada em pleno vigor, devia o egrégio tribunal a

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-1 17, fevereiro 1999.

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50 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

quo aplicá-la independentemente de se lhe juntar o texto nos autos

processuais. Incide no pormenor o brocardo latino que diz: jura novit curia. Julgando, como julgou, que a recorrente não demonstrou a existência da questionada lei, que, na verdade, existia, o acórdão im­

pugnado negou vigência dessa lei' (do voto do Min.Antônio Neder,

ReI. do ac. unân. da PT. do STF de 12.05.1981, no RE n.!l74.066-

SP; RTJ, 99/146)" (fls. 151/152).

Dou provimento ao recurso para anular o acórdão recorrido e outro seja

proferido, apreciando-se a preliminar de prejudicialidade, que fora, por ele, re­

jeitada.

VOTO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Sr. Presidente, também

entendo como S. Exa., o Sr. Ministro-Relator. O art. 337 é claro. (lê):

"A parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consu­

etudinário provar-Ihe-á o teor e a vigência, se assim o determinar o juiz".

No julgamento do mandado de segurança, em se tratando de uma ação de

competência originária, o tribunal teria todas as condições de converter o feito em diligência. Ou determinando à parte um prazo para que provasse a vigência do

direito estadual ou local, ou, então, determinando a juntada do inteiro teor desse

decreto para efeito de apreciação do julgamento. Na hipótese, aplica-se perfeita­

mente o célebre brocardo jura novit curia. O juiz não pode negar que não co­

nhece o direito, especialmente o direito local, onde ele judica diuturnamente.

Estou de inteiro acordo com V. Exa., Sr. Ministro Garcia Vieira, e dou provi­mento ao recurso para que, anulado o acórdão, o Tribunal faça a diligência necessá­

ria para tomar conhecimento do inteiro teor desse decreto e julgue a preliminar.

É como voto.

VOTO

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Sr. Presiden­

te, consultando Theotonio Negrão verifiquei que o artigo 337 é um dos poucos

em que não há uma nota, uma referência a precedentes judiciais. Este dispositi­

vo é tão pouco usado que talvez este processo o inaugure.

Acompanhando a sustentação do eminente procurador e o voto do nobre

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 51

relator, verifiquei que não é lícito ao tribunal desconhecer a legislação vigente no

âmbito da sua competência, e verifiquei ainda que a obrigação que o art. 337

impõe à parte de comprovar a vigência e a existência do direito local é uma

obrigação condicionada à exigência do juiz. O art. 337 diz:

"A parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou con­

suetudinário provar-Ihe-á o teor, se assim o determinar o juiz. "

Ora, cumpriria, evidentemente, ao acórdão recorrido, para desconhecer a

preliminar, ter determinado previamente ao Distrito Federal que comprovasse a

existência deste texto normativo. Acompanho o eminente Relator.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: O egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal concedeu segurança ao Minas Brasília Tênis Clube para que

lhe fosse permitido realizar "Bingos Permanentes ", com a finalidade de angariar recursos para o fomento do desporto, realizando sorteios diários, bem como sua

respectiva veiculação nos meios de propaganda e comunicação, oficiando-se à

Secretaria de Segurança Pública do DF, sobre as realizações de tais eventos.

O lTIandalTIus foi concedido contra ato do Exmo. Sr. Secretário da Fa­zenda e Planejamento do Governo do Distrito Federal e com apoio em interpre­

tação de que é constitucional o art. 57 da Lei nQ 8.672/93.

A autoridade impetrada, inicialmente, entendeu prejudicado o mandado de

segurança por ter sido regulamentada a matéria por Decreto local, qual seja o

de nº 16.381, 28.03.95. Afirma que o pedido não subsiste, porque o mencionado Decreto veio a

autorizar o credenciamento de entidades para a promoção de sorteios na modali­

dade bingo, de similar, desde que observadas as normas regulamentares.

Defende que o mandado de segurança, se concedido, outorga ao clube

impetrante privilégios não amparados pela lei, em face de não atender às exi­gências legais administrativas para a realização do evento.

O Recurso Especial interposto aponta como violado o art. 337 do CPC, no

que foi acolhido pelo eminente Relator, o Exmo. Sr. Ministro Garcia Vieira, por considerar que o aresto recorrido não apreciou, de modo integral, a preliminar de prejudicialidade argüida pela autoridade impetrada.

Acompanho o entendimento posto pelo judicioso voto apresentado pelo relator.

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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52 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o processo é instrumento para definir o direito material discutido pelas

partes, no âmbito da relação jurídica formal, de forma que impere segurança e

credibilidade na decisão emitida. Em face de ter essa missão constitucional, há de se subordinar com relati­

vo rigorismo às regras de como deve proceder, com a finalidade de homenagear

a guarda dos seus princípios e não gerar instabilidade no relacionamento que

impõe solução. No' caso em espécie, evidencia-se que a autoridade impetrada, após o

colendo Supremo Tribunal Federal não ter concedido liminar para suspender os

efeitos do art. 57 da Lei Federal n" 8.672, de 06.07.93, baixou regulamentação

a seu respeito visando a disciplinar o credenciamento de entidades para a pro­

moção de sorteios na modalidade bingo, ou similar. Saliente-se que o art. 57, § 1", da Lei Federal n"8.672, de 06.07.93, dispõe

expressamente que cabe aos Estados-membros e ao Distrito Federal regula­

mentar a concessão do credenciamento para a realização dos bingos. Evidente que qualquer entidade pretendente a tal credenciamento só pode

ter seu pedido deferido se atender às condições impostas pelo Poder Executivo.

No caso examinado, o mandado de segurança foi impetrado em 23.03.95,

enquanto o decreto regulamentador data de 29.03.95, quando foi publicado.

Impera, na espécie, lógica processual de absoluta clareza. Não havia qual­

quer possibilidade de se examinar o referido mandado de segurança sem exame

de legislação superveniente expedida seis dias após a interposição do pedido.

Não vinga, por ser idéia das épocas do juiz vinculado ao processo regulado

pelas Ordenações Manuelinas, o argumento de que não se conheceu da aplica­ção da legislação nova estadual por a parte não tê-la apresentado.

É de ser lembrado que o juiz do final do século XX há de ser o pregado

por Cândido Dinamarco, ativo, diligente, participativo, vivenciador dos fatos

processuais em toda a sua extensão, integrando-se, juntamente com as partes na

função de melhor instruir o processo para aplicar, com absoluta precisão, o

direito material conflitado.

O cidadão não aceita, e faz bem em assim se comportar, à afi.rmação do

magistrado de que não aplicou o direito local porque o desconhece. Ora, a

dicção do art. 337 do CPC, é dirigida às situações em que se discute a lide com

base em legislação de difícil acesso, ocasião em que o juiz determina a sua

apresentação para melhor exame e conferência.

Nenhuma exigência fez o egrégio tribunal em tal sentido. Penso até que se

lhe fazia desnecessária.

A autoridade impetrada, às fls. 86, informa que "O mérito do presente

mandado de segurança encontra-se prejudicado face à regulamentação da maté-

RSTJ,Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 53

ria por Decreto local, qual o de n ll 16.381, de 28.03.95, publicado no DODF do

dia 29.03.95". Ora, exigir, como exigiu o acórdão recorrido, a cópia integral do referido

decreto, é guardar absoluta homenagem à interpretação literal da lei e sublimar

a forma do modo mais elevado.

Em face do exposto, acompanho o voto do eminente Relator.

É como voto.

RECURSO ESPECIAL NQ 103.554 - SP (Registro n1l 96.0049922-5)

Relator: Ministro Milton Luiz Pereira

Recorrente: Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp

Recorridos: Veríssimo Bardini e cônjuge

Advogados: Maria Helena Borelli e outros, e Sônia Márcia Hase de Almeida

Baptista e outros

EMENTA: Adm.inistrativo - Indenização por apossamento ilícito (desa­propriação indireta) - Prova dominial resolvida na fase de conhecimento

(legitimação ativa ad causam) - Levantamento do valor indenizatório depo­sitado. Inaplicabilidade do art. 34, Decreto-Lei n1l3.365/41.

1. Afirmada a legitimação ativa ad causam, com pressupostos na prova de propriedade, examinada no processo de conhecimento, quando da execução,

descabe a aplicação do art. 34 do Decreto-Lei n!! 3.365/41, na ocasião do levanta­mento do valor indenizatório depositado e estabelecido na sentença de mérito.

2. Precedentes juriSprudenciais (ST] e STF).

3. Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide

a egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas cons­tantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Vota­

ram com o Relator os Senhores Ministros Garcia Vieira, Demócrito Reinaldo e

Humberto Gomes de Barros. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro José Delgado. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Milton Luiz Pereira.

RSTJ,Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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54 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

Custas, como de lei. Brasília-DF, 17 de setembro de 1998 (data do julgamento). Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente e Relator.

Publicado no DJ de 30.11.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Em ação de desapropria­

ção indireta, em sede de agravo de instrumento, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo constituiu aresto assim sumariado:

"Desapropriação indireta - Levantamento pelos autores do valor da

indenização, após sentença e sua confirmação pelo Tribunal- Possibilida­

de- Inadmissível a aplicação no caso do art. 34 do Decreto-Lei n!l3.365/ 41, pois a ação é dos prejudicados e essa discussão envolveria preliminar de ilegitimidade ativa, não reconhecida - Agravo não provido." (fi. 130).

Insurgindo-se contra o v. aresto, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp, interpôs recurso especial, com fulcro no artigo 105, inciso lII, alínea a, da Constituição Federal, sustentando que o v. aresto afrontou o disposto no art. 34 do Decreto-Lei n!l3.365/41.

Aduz:

Omissis

" ... obviamente, haverá de ser aplicado em feitos da natureza do pre­sente, também conhecido como de 'Desapropriação Indireta' especialmen­te no momento em que se cogita de levantamento de quantia depositada para pagamento, pelo apossamento de um bem, que deverá passar a inte­

grar o patrimônio do Poder que o expropria. E, é lógico, para se obter essa transferência de um para outro proprietário, o imóvel há que, até o fim, ou

seja, até que se concretize tal transferência, permanecer dentro do patrimônio daquele contra quem o feito foi proposto, e correu, até final

solução. E, ainda mais, esse imóvel deverá vir desonerado, inclusive."

Omissis

"Deixou bem claro a Sabesp, à fi. 2 da petição de fi. 85, protocolada sob n!l20.391, em 23.10.95, que a exigência de cumprimento, para rece-

RSTJ,Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 55

bimento da indenização, das disposições contidas no artigo 34 da lei espe­

cífica sobre desapropriações, se prendia ao 'fato de não serem raros os casos de alienação de parte do imóvel após proposta ação ordinária de

indenização, o que gera enormes prejuízos e complicações para a Sabesp­ré, quando da regularização do bem, junto ao Cartório Imobiliário'.

Exatamente com o objetivo de aquisição do domínio do imóvel em questão é que a Sabesp, ora recorrente, pretende examinar a documenta­ção atual, com negativa de ônus e alienações que, se perfeita, e só nessa hipótese, possibilitará o registro do terreno em seu nome.

Observe-se, de resto, que o oferecimento da documentação pelo au­

tor ocorreu em fevereiro de 1987!! O acolhimento de pedido de levantamento sem o cumprimento da

prova de propriedade atualizada não raro tem ocasionado sérios proble­mas quando da procura da regularização do registro do bem, junto ao cartório competente, ocasião em que se tem constatado alienação parcial

ou mesmo global do bem, levada a efeito após o ajuizamento do feito que busca indenização pelo apossamento." (fls. 138/139).

Requer:

"Por todo o exposto, aguarda a recorrente - Sabesp, que essa Corte, bem apreciando o presente recurso especial, e melhor ponderando, haja por bem reformar o v. acórdão de fls., para determinar que o interessado cabalmente comprove que o bem se encontra, hoje, em situação de ser integralmente transferido de seu patrimônio para o domínio da Sabesp

quando, então, poderá requerer ordem para levantamento da indenização e complementos, depositados para pagamento ao real e efetivo proprietário

do terreno que é objeto desta lide." (fl. 140).

Contra-razões apresentadas às fls. 148/156. Ao contra-arrazoar, o recorri­

do sustenta que o recurso não preenche os pressupostos de admissibilidade. Requer:

"Assim, está a recorrente atacando decisão que está albergada pela coisa julgada, com evidente afronta ao que diz o inciso XXXVI do artigo 5Q da Cons­

tituição Federal, pelo que deve ser aplicada a pena de litigância de má-fé - na

forma prevista no artigo 14 do Código de Processo Civil, na multa de dez por cento sobre o valor da condenação, revertendo esta para o recorrido." (fl. 152).

O ínclito Juiz 4Q Vice-Presidente, em exercício, do tribunal de origem admitiu o especial em decisão assim circunstanciada:

RSTJ,Brasília,a.ll, (I 14): 41-117,fevereiro 1999.

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56 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"A matéria controvertida e relativa à exigência do cumprimento do

artigo 34 do Decreto-Lei ni). 3.365/41, foi satisfatoriamente exposta na

petição de interposição e devidamente examinada pelo acórdao, estando

atendido, portanto, o requisito do prequestionamento. Há expressa indicação do dispositivo legal tido como violado e não

se vislumbra a incidência dos demais vetos regimentais ou sumulares. Ante o exposto, defiro o processamento do recurso." (fls. 158 a 159).

É o relatório.

VOTO

o SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA (Relator): Aviva-se que,

na fase executória do título sentencial constituído em ação desapropriatória in­

direta, apesar de oposição da parte-ré, sustentando a não aplicação do art. 34,

Decreto-Lei ni). 3.365/41, foi deferido o levantamento dos valores depositados

para pagamento da indenização arbitrada, provocando agravo, provido confor­

me o verberado acórdão, assim resumido:

- "Desapropriação indireta - Levantamento pelos autores do

valor da indenização, após sentença e sua confirmação pelo Tribunal

- Possibilidade - Inadmissível a aplicação no caso do art. 34 do De­creto-Lei ni). 3.365/41, pois a ação é dos prejudicados ·e essa dis­

cussão envolveria preliminar de ilegitimidade ativa, não reconhecida

- Agravo não provido." (fl. 130).

A falar em contrariedade ao artigo 34, Decreto-Lei ni). 3.365/41, presentes os

requisitos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido (art. 105, lII, a, CF).

Nesse contexto, desembaraçado o exame, apreende-se que o litígio aprisi­

ona-se ao levantamento de valor indenizatório, insistindo a parte recorrente na

comprovação de direito dominial, fulcro da legitimação ativa dos autores da

ação. Ora, a bem se ver, essa questão ficou vencida, como esclareceu o julgado

ensejador do presente recurso, textualmente:

"Quando a agravante contestou o pedido levantou várias prelimina­res e uma delas foi exatamente a de falta de prova da propriedade do

bem, faltando em razão disso, condição da ação, por ilegitimidade ativa.

As preliminares foram repelidas e houve desse julgamento a preclusão, formando no ponto a definitividade da legitimidade para a ação.

RSTJ,Brasilia,a.ll, (l14):41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 57

Ora, não pode agora a Sabesp, após julgamento pelo Tribunal man­

tendo a sentença e quase dez anos após a inicial, pretender discutir a legi­

timidade ativa, mesmo posterior à ação. Entenda-se que se está indenizan­

do autores que sofreram apossamento administrativo de suas terras, sem

prévia autorização, sem indenização e sem ação expropriatória. Tinham,

então, o interesse de agir para pedir a indenização que os prejudicou. Deseja a Sabesp a prova atual da propriedade e negativa de ônus,

como se estivéssemos em busca de proprietário de área desapropriada,

quando temos ação de autores do prejuízo demonstrado. Incabível a pre­

tensão de aplicação à desapropriação indireta o art. 34 do Decreto-Lei n!l

3.365/41, pois na desapropriação o Poder Público procura saber quem é o

proprietário do bem para indenizar, exigindo provas dessa propriedade.

Na ação de apossamento administrativo, é o particular quem vem pedir

indenização pela perda da posse do bem e eventual discussão quando a

posse ou propriedade se faz no processo, como preliminar da contestação.

Vencida essa preliminar, não mais se discute aquela legitimidade.

Essa também a posição do culto jurista e Desembargador José Carlos

de Moraes Salles, quando diz: 'Assinale-se, ainda, serem inaplicáveis à

desapropriação indireta as exigências do art. 34 do Decreto-Lei n!l3.365/

41, porque nos processos por expropriação indireta o autor é o expropria­do e não o expropriante, devendo apresentar, com a petição inicial, o do­

cumento comprobatório da propriedade. A respeito, confiram-se os arestos

publicados na RT 531/177 e na RTJESP 110/276'. ('A Desapropriação à

Luz da Doutrina e da Jurisprudência', RT - 2lJ. ed., p. 602).

Como se tem entendido que a desapropriação indireta é ação real sobre

imóveis, a prova da propriedade, do domínio é indispensável com a inicial e

deve ter sido feita, tanto que repelida a preliminar de ilegitimidade ativa.

Mesmo a prova atualizada da propriedade não pode ser exigida, se o direito de propriedade foi violado e o prejuízo ocorreu naquele momento do

apossamento, gerando o direito à indenização." (fls. 131 e 132).

Nem se diga que, a respeito, pendem os interpostos recursos especial e

extraordinário, uma vez que, tanto um, como outro, versaram exclusivamente os

critérios legais apropriados à aplicação de índices nos cálculos da correção

monetária. A questão tratada no recurso sob exame não foi considerada signifi­

cando que ficou irrecorrida, consubstanciando a plena eficácia da legitimação ad causalTI dos autores da ação indenizatória (fls. 48 a 52 e 55 a 62).

Outrossim, à espécie, calhou à fiveleta a fundamentação desenvolvida pelo Senhor Ministro Adhemar Maciel, votando no REsp n!l260-DF, verbis:

RSTJ,Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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58 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

c·· .) " ••• O art. 34 do Decreto-Lei nQ 3.365/41 não pode ser aplicado no

caso de indenização por desapropriação indireta, já que a regra inserta no

mencionado dispositivo é específica para as desapropriações diretas. Nas

ações de indenização por desapropriação indireta, o autor deve demonstrar

a propriedade do imóvel objeto das restrições administrativas no processo de conhecimento, a fim de que o juiz já fixe na sentença, se for o caso, a

indenização a ser paga. A questão de domínio não pode ser debatida nova­

mente na liquidação ou na execução do julgado, sob pena de ofensa à coisa

julgada. Ao contrário do que possa parecer à primeira vista, a ação de

indenização por desapropriação indireta se assemelha à ação reivindicatória,

e não à expropriatória direta. Daí porque é imprescindível a demonstração

da propriedade na fase de cognição, a fim de que a questão do domínio

seja desde logo solucionada pelo juiz. Tal questão não pode ser relegada

para fase ulterior, pois a sentença só será liquidada e executada para fins

de pagamento de indenização, se o juiz tiver anteriormente tido como pro­vado o domínio.

A respeito da inaplicabilidade do art. 34 do Decreto-Lei n Q 3.365/41

às ações de indenização por desapropriação indireta, invoco o seguinte

precedente de minha relatoria.

- 'Administrativo. Ação de indenização por desapropriação in­

direta. Art. 34 do Decreto-Lei n Q 3.365/41: Inaplicabilidade. Recurso

conhecido, mas improvido.

I - O art. 34 do Decreto-Lei n Jl 3.365/41 não se aphca às ações

de indenização por apossamento administrativo (desapropriação in­

direta), mas, sim, às ações de desapropriação direta.

II - Recurso especial conhecido, mas improvido' (REsp n Q

112.423-SP, 2ilTurma do STJ, unânime, relator Ministro Adhemar

Maciel, publicado no DJU de 06.10.97)".

Eis a ementa do julgado:

- "Administrativo. Ação de indenização por desapropriação in­

direta. Art. 34 do Decreto-Lei n Q 3.365/41: Inaplicabilidade. Prece­

dentes. Recurso provido.

I - O art. 34 do Decreto-Lei n Q 3.365/41 não se aplica às ações

de indenização por desapropriação indireta, mas, sim, às ações de

desapropriação direta.

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-1I7,fevereiro 1999.

Page 19: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 59

II - Nas ações de indenização por desapropriação indireta, a

questão de domínio deve ser resolvida no processo de conhecimento,

nunca na execução do julgado. III - Precedentes do STF, do STJ e do TJSP: RE nQ 108.846-SP;

REsp nQ 112.423-SP;AInQ 82.679-2;AInQ 102.724-2 eAInQ 104.029-2.

IV - Recurso especial conhecido e provido." (in DJU de 02.03.98).

No mesmo sentido:

- "Administrativo. Desapropriação indireta. Levantamento do preço. Decreto-Lei n Q 3.365/41, art. 34. Na chamada desapropriação

indireta, em que não há depósito prévio, o levantamento do preço corresponde a montante já fixado por sentença e por isso é inaplicável

o disposto no artigo 34 do Decreto-Lei n Q 3.365/41; aí a prova da propriedade constitui pressuposto da legitimidade do autor para a causa,

que já não pode ser posta em dúvida depois que o respectivo reconhe­cimento transitou em julgado. Recurso especial não cOdhecido." (REsp

n Q 85.519-SP - ReI. Min. Ari Pargendler - in D]LJ de 17.11.97).

À mão de reforçar, soando a inaplicabilidade do multi citado artigo 34, comporta mencionar o RE n Q 1 08.846-SP - 211.Turma - ReI. Min. Aldir Passari­

nho -in RDA 174/176 e a exposição doutrinária feita porJoaquiIn de Almeida Baptista na Revista de Direito Público, voI. 80, p. 121.

Confluente às razões justificadoras dos precedentes lembrados e das ma­

nifestações doutrinárias, nesta ocasião reanimadas e incorporadas como moti­

vação do convencimento, afastada a acenada contrariedade ou negativa de vi­

gência ao art. 34 do Decreto-Lei n Q 3.365/41, voto negando provimento.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 108.896- SP (Registro nQ 96.0060407-0)

Relator: Ministro Milton Luiz Pereira Recorrentes: Raul Ares e outros

Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo

Advogados: Roberto Elias Cury e outros, e Fátima F~rn"4.lU' , C:J.tellani e ou­tros

RST],Brasilia,a.ll, (I 14): 41-1 17,fevereiro 1999.

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60 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: Administrativo - Ação ordinária- Desapropriação indireta­

Estação ecológica - Juros compensatórios - Exame probatório contrário à

incidência - Súmula nQ 7 -STJ. 1. O decreto expropriatório, por si, não opera impedimento ao uso e gozo

da propriedade. Inexistência de concreta exploração econômica anterior para

ser compensada por juros compensatórios. Não são indenizáveis hipóteses de

aproveitamento. Convencimento assentado no exame de provas, feito nos li­mites da soberania reservada às instâncias ordinárias, não se expõe à via Es­pecial (Súmula n Q 7 -STJ).

2. Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide

a egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no

julgamento, por maioria, vencido o Senhor Ministro José Delgado, não conhe­

cer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos,

que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram com o Relator

os Senhores lVlinistros Demócrito Reinaldo e Humberto Gomes de Barros. Au­

sente, justificadamente, o Senhor Ministro Garcia Vieira. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Milton Luiz Pereira.

Custas, como de lei.

Brasília-DF, 20 de agosto de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente e Relator.

Publicado no D] de 30.11.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: O egrégio Tribunal de Jus­

tiça do Estado de São Paulo constituiu v. acórdão abreviado na seguinte ementa:

"Desapropriação indireta - Ausência de prova da efetiva perda

do uso da propriedade - Carência decretada.

Desapropriação direta - Área composta de terra nua e de reser­

va florestal- Inclusão das matas no cômputo da indenização - Medi­

da que se impõe face aos inúmeros benefícios intrínsecos da floresta,

além da mera exploração comercial madeireira - Inclusão determi-

RSTJ,Brasília,a.ll, (l 14): 41-1 17,fevereiro 1999.

Page 21: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 61

nada no percentual de 100% da avaliação das próprias matas, adicio­

nada à da terra nua. Juros moratórios, à base de 6% a.a., contados do trânsito em

julgado - Honorários advocatícios fixados à luz da Lei Especial -

Despesas processuais atribuíveis à Fazenda, porque deu origem à

lide como um todo - Provimento parcial ao recurso dos apelantes, da

Fazenda e de ofício. Nega-se ao deAmado Raimundo." (fi. 1.082).

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.

Com fulcro no artigo 105, inciso UI, alínea c, da Constituição Federal, os

expropriados interpuseram recurso especial, alegando dissídio jurisprudencial no tocante a não-inclusão de juros compensatórios, ao fundamento de que não houve

desapossamento administrativo, nem imissão na posse.

A Fazenda Estadual interpôs recursos extraordinário e especial, ambos

inadmitidos no tribunal de origem, decisão contra a qual foram interpostos agra­

vos de instrumento.

O agravo de instrumento da decisão que inadmitiu o recurso especial foi improvido

e a Primeira Turma negou provimento ao agravo regimental interposto.

As contra-razões foram apresentadas às fis. 1.175/1.182. Presentes os pressupostos essenciais, o nobre 4!l Vice-Presidente do tri­

bunal a quo admitiu o recurso especial, subindo os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA (Relator): Põem-se para

exame razões recursais aviadas com sucedâneo na alínea c, lU, artigo 105, Cons­tituição Federal, verrumando o v. acórdão que, em confirmando a r. sentença,

quanto aos juros compensatórios, estadeou:

"Com respeito aos juros compensatórios pleiteados pelos requeridos,

não são eles incidentes, pois prova alguma houve da imissão provisória

antecipada na posse por parte do Poder expropriante.

Com efeito, a simples criação da Estação Ecológica e a declaração do

imóvel de utilidade pública para fins de desapropriação não representa apossamento administrativo ou imissão provisória na posse, havendo robus­

ta prova nos autos de que a posse se mantém com os particulares, mormente

os assistentes litisconsorciais passivos, que têm edificações no local.

Ademais, o estado virgem das matas decorre mais da dificuldade de

RST}, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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62 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

acesso do que de eventual apossamento, que, repita-se, não ficou demons­

trado por parte dos requeridos alegadamente proprietários. Assim, de se desconsiderar o pedido de juros compensatórios for­

mulados". (fi. 843).

o v. aresto apropriado aos embargos de declaração reafirmou a compreen­

são sustentada pelo Juízo monocrático (fi. 1.113). Eis, pois, a questão: são devidos, ou não, no caso, osjuros compensatórios?

A respeito do tema, em verdade, a jurisprudência construiu solução favore­

cendo a contagem dos referidos juros e, inclusive, a sua cumulação com os

moratórios (Súmulas nN 12, 69,102 e 114-STJ).

Com efeito, a jurisprudência fincou que os compensatórios deverão ser com­

putados "na desapropriação direta, desde a data de imissão na posse e, na indi­

reta, a partir da ocupação ... ". Significa dizer que, seja numa ou outra forma de

desapropriação, dependentes de formalizada imissão ou de prova da ocupação.

Enfim, ditos juros destinam-se a compensar o impedimento do uso e gozo eco­

nômico da propriedade.

Acontece que, na espécie - desapropriação indireta -, descogitando-se,

pois, de formal imissão na posse, o dies a quo para a contagem dos juros com­

pensatórios, depende da prova do impedimento da usufruição econômica do imó­vel. Porém, esse exame está reservado às instâncias ordinárias que, em cumprin­

do esse mister, firmemente, como já registrado, assentaram:

" ... havendo robusta prova nos autos de que a posse se mantém com

os particulares .... ". (fi. 843).

Desse modo, é caso de aplicação da Súmula nU 7-STl Não se anteponham

precedentes desta Corte favorecedores da incidência dos juros em comento, uma

vez que foram edificados para solucionar controvérsias postas sob particulariza­

dos enfoques, nos quais os acórdãos combatidos não se enraizaram diretamente

nas provas. De efeito, ora referiram-se à cumulatividade; outras vezes, se consi­

derada, ou não, a diferença entre o valor atualizado da indenização e da oferta ou, ainda, quando a parte expropriante insurgiu-se porque os juros foram fixa­

dos em data conseqüente de prova documental tratando de embargo administra­

tivo à utilização do imóvel. Ad exeIllpluIll: REsps nN 77 .541-SP e 102.495-SP.

Existem, é certo, julgados estabelecendo a data de publicação do decreto

expropriatório como marco temporal inicial para contagem dos multicitados ju­

ros. Assim, o decreto serviria como indicação da data de "ocupação"'-

Na espécie, todavia, o aresto fulcrou-se unicamente nas provas, que pare-

RSTJ,Brasília,a.ll, (l 14): 41-117,fevereiro 1999.

Page 23: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 63

ceram "robustas" para os julgadores, inclusive, enfatizando "o estado virgem

das matas decorre mais da dificuldade de acesso do que de eventual apossamento, que, repita-se, não ficou demonstrado por parte dos requeridos ... " (fl. 843).

Ou seja: assinalando-se que, por si, o decreto expropriatório não operou

"impedimento" ao uso e gozo, porque, concretamente, inexistia exploração an­

terior para ser compensada na via dos juros pleiteados. Em arremate, sim, os juros compensatórios somente são devidos quando

restar demonstrado que a exploração econômica foi obstada pelos efeitos da declaração expropriatória. Pois não são indenizáveis meras hipóteses ou remo­

tas potencialidades de uso e gozo. Aqui, à exaustão, afastadas por exame fincado

nas provas, fortificando convencimento, como adiantado, reservado à soberania das instâncias ordinárias (Súmula n Jl 7 -STJ).

Por todo o exposto, obstado o reexame das provas que serviram à constituição

do v. acórdão objurgado no ponto controvertido trazido na via especial, exercitando o definitivo juízo de admissibilidade, voto não conhecendo do recurso.

É o voto.

VOTO-VISTA (VENCIDO)

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: O recurso especial em exame ataca

acórdão com fundamentos sintetizados na ementa que passo a transcrever (fls. 1.082):

"Desapropriação indireta - Ausência de prova da efetiva perda do uso da propriedade - Carência decretada.

Desapropriação direta - Área composta de terra nua e de reser­

va florestal- Inclusão das matas no cômputo da indenização - Medi­

da que se impõe face aos inúmeros benefícios intrínsecos da floresta,

além da mera exploração comercial madeireira - Inclusão determi­nada no percentual de 100% da avaliação das próprias matas, adici­

onada à da terra nua.

Juros moratórios, à base de 6% a.a., contados do trânsito em

julgado - Honorários advocatícios fixados à luz da Lei Especial -

Despesas processuais atribuíveis à Fazenda, porque deu origem à

lide como um todo - Provimento parcial ao recurso dos apelantes, da Fazenda e de ofício. Nega-se ao de Amado Raimundo."

Discute-se, por impulso dos recorrentes, apenas, se os juros compensató­

rios, no caso em questão, são devidos, em face do acórdão ter negado a sua

incidência com os fundamentos seguintes:

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

Page 24: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

64 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"Com respeito aos juros compensatórios pleiteados pelos requeridos, não

são eles incidentes, pois prova alguma houve da imissão provisória anteci­

pada na posse por parte do Poder expropriante. Com efeito, a simples criação da Estação Ecológica e a declaração

do imóvel de utilidade pública para fins de desapropriação não representa

apossamento administrativo ou imissão provisória na posse, h.avendo ro­

busta prova nos autos de que a posse se mantém com os particulares, mor­mente os assistentes litisconsorciais passivos, que têm modificações no local."

o eminente relator, fazendo aplicação da Súmula n2 7, deste STT, não

conhece do recurso.

Em conseqüência da vista solicitada, apresento o meu voto.

Examino o recurso especial interposto pelos desapropriados e dos seus

fundamentos, destaco (fls. 1.118/1.119):

"3. Embora não tenha ocorrido o apossamento administrativo e nem

tenha sido a expropriante imitida na posse do imóvel, nos autos da ação de

desapropriação, a expropriante, Fazenda do Estado de São Paulo, deve ser

condenada a pagar aos expropriados os juros compensatórios, desde a data

em que ocorreu a perda de disponibilidade do imóvel por parte de seus

legítimos proprietários, com a criação da 'Estação Ecológica Juréia-Itatins',

através do Decreto Estadual n2 26.717, ou seja, de 6 de fevereiro de 1987.

4. É que as restrições impostas ao imóvel de propriedade dos recor­

rentes decorrem do Decreto Estadual n!.l26. 717, de 6 de fevereiro de 1987,

que criou a 'Estação Ecológica Juréia-Itatins', as quais vedaran:- totalmen­

te o uso, o gozo e a livre disposição da área por parte de seus legítimos

proprietários, suprimindo inteiramente seu valor econômico, em flagrante violação ao artigo 52, inciso XXII, da Constituição Federal e artigo 524

do Código Civil, num verdadeiro apossamento administrativo.

5. Não se trata de mera limitação administrativa, mas de total impedi­

mento ao uso, gozo e disponibilidade da área objeto da ação por parte de seus

legítimos proprietários, com o conseqüente esvaziamento do seu conteúdo

econômico. Nesse sentido é a lição de Hely Lopes Meirelles, em seu "Direi­

to Administrativo Brasileiro", 1 7ll edição, Malheiros Editores, pp. 544/545:

'Limitações administrativas são, p. ex., o recuo de alguns metros

das construções em terrenos urbanos e a proibição de desmatamento de parte da área florestada em cada propriedade rural.

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 65

Mas, se o impedimento da construção ou de desmatamento atingir a

maior parte da propriedade ou a totalidade, deixará de ser limitação para ser interdição de uso da propriedade, e, neste caso, o Poder Público ficará obrigado a indenizar a restrição que aniquilou o direito dominial e supri­

miu o valor econômico do bem. Pois ninguém adquire terreno urbano em

que seja vedada a construção, como também, nenhum particular adquire terras ou matas que não possam ser utilizadas economicamente, segundo

sua destinação normal. Se o Poder Público retira do bem particular seu

valor econômico, há de indenizar o prejuízo causado ao proprietário. Essa

regra, que deflui do princípio da solidariedade social, segundo o qual só é legítimo o ônus suportado por todos em favor de todos, não tem exceção

no direito pátrio, nem nas legislações estrangeiras'."

Certo está, portanto, nos autos que realmente não ocorreu apossamento

administrativo, nem imissão na posse do imóvel que foi objeto da limitação

administrativa reconhecida e indenizada pelo acórdão recorrido. A reivindicação dos juros compensatórios está vinculada, conforme se

depreende das razões recursais, tão-só, pela limitação administrativa reconhecida.

No REsp nº 60.070-7-SP, relatado pelo eminente Ministro Humberto Go­mes de Barros, a l11.Turma, à unanimidade, entendeu (fls. 1.125):

"Desapropriação indireta - Criação de reserva florestal- Res­

trição de uso de propriedade particular - Indenização - Juros com­pensatórios. Prescrição.

1. A ação de desapropriação indireta é de natureza real.

Ela não se expõe à prescrição qüinqüenal (Súmula nº 119). O titular do domínio agredido pela desapropriação indireta - en­

quanto não ocorrer usucapião - tem ação para pleitear ressarcimento.

2. A criação da reserva florestal 'Parque Estadual da Serra do

Mar' não importou em apossamento administrativo, no entanto, es­

vaziou o conteúdo econômico da propriedade, ao destacar do domí­nio as prerrogativas de usar e fruir do bem.

3. Os juros compensatórios integram a indenização e são devi­

dos a contar da interdição ao uso do imóvel, computados cumulativa­mente com os juros moratórios a partir do trânsito em julgado da decisão (Súmula nº 12)."

O voto emitido pelo eminente relator contém os seguintes fundamentos (fls. 1.129/1.131):

RST],Brasilia,a.l1, (l14):41-117,fevereíro 1999.

Page 26: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

66 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA

"Sobre o segundo ponto, o recorrente sustenta que o caso dos autos con­

figura ação indenizatória por restrição à propriedade, a afastar a hipótese de

desapropriação indireta, posto que a Resolução nQ 66/85 da Secretaria de Cultura do Estado, ao determinar o tombamento da área, apenas limitou o uso da propriedade. De sorte que, ausente o pressuposto do desapossamento, uma

vez que a interdição de uso não implica a perda da posse e do domínio em favor da Administração Pública, descabe o direito à indenização, máxime sobre a área

de cobertura vegetal, assim como a incidência de juros compensatórios.

Efetivamente, a criação da reserva florestal não importou em

apossamento administrativo, no entanto, esvaziou o conteúdo econômico

da propriedade, ao destacar do domínio as prerrogativas de usar e fruir do bem, consistente no direito de efetuar desmatamento, loteamento e a ex­

ploração dos recursos naturais da terra.

Portanto, a restrição de uso não cingiu-se à mera limitação parcial do

imóvel, antes impôs total interdição do aproveitamento econômico da área.

Assim, impõe-se a indenização, acrescida de juros compensatórios,

em razão do prejuízo sofrido pelos proprietários, pois, o tombamento da

área impediu a utilização do bem segundo sua natural destinação.

De assinalar-se que esta Corte em caso análogo assentou:

'Desapropriação indireta - Interesse de agir- Prescrição - Mata

de preservação permanente - Indenizabilidade - Juros moratórios e compensatórios.

I - A área floresta da, incluída no perímetro do 'Parque Estadual

da Serra do Mar', impedindo a sua exploração econômica, é

indenizável. Precedentes.

II - Os proprietários do imóvel, em tal caso, têm interesse de

agir em juízo, através de ação de desapropriação indireta.

III - O fato de os proprietários terem adquirido a área, após a

criação do parque, não exclui o referido interesse processual, nem o

seu direito à indenização, porquanto, segundo reiterados preceden­

tes, os adquirentes, nessa hipótese, sub-rogam-se em todos os direi­tos e ações correspondentes.

IV - O prazo prescricional da ação de desapropriação indireta

é o vintenário e, no caso, não transcorreu.

V - Os juros moratórios, na desapropriação, fluem a partir do

trânsito em julgado da sentença e são cumuláveis com os compensa­

tórios (Súmulas nQs 12 e 70 do STJ), sendo devidos estes, na espécie,

a partir de quando ficou caracterizada a restrição ao uso do imóvel.

RST],Brasília,a.ll, (114): 41-117, fevereiro 1999.

Page 27: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 67

VI -Recurso especial não conhecido.' (REsp nº 7.515 -Relator

Ministro Pádua Ribeiro). Quanto à fluência cumulativa dos juros compensatórios e

moratórios, a questão resta superada, nos termos da Súmula nº 12 do STJ, que dispõe: Em desapropriação, são cumuláveis juros compen­

satórios e moratórios'."

Igual entendimento revela o julgamento do REsp nº 38.570-0-SP, relatado

pelo eminente Min. Humberto Gomes de Barros, com ementa assim posta (fls.

1. 134):

"Desapropriação indireta - Criação de reserva florestal- Res­trição de uso de propriedade particular - Indenização - Juros com­

pensatórios.

1. A criação da reserva florestal 'Parque Estadual da Ilha Car­

doso' não importou em apossamento administrativo, no entanto, es­

vaziou o conteúdo econômico da propriedade, destacar do domínio

as prerrogativas de usar e fruir do bem. 2. A interdição da área impede a utilização do imóvel segundo

sua natural destinação, pelo que impõe-se a indenização do proprie­

tário pelo desfalque sofrido em seu patrimônio.

3. Os juros compensatórios integram a indenização e seus devi­

dos a contar da restrição do uso do imóvel, fluindo cumulativamente com os moratórios a partir do trânsito em julgado da sentença."

O Exmo. Sr. Ministro Demócrito Reinaldo no REsp nº" 20.213-SP, em

voto acolhido à unanimidade pela Turma, afirmou (fls. 1.144/1.1.45):

"Não corre prescrição qüinqüenal, no caso de desapossamento

administrativo, também chamado de desapropriação indireta (TASP, 112/261). É evidente, que o apossamento administrativo, verificado

na hipótese, retirando, do proprietário, todo o seu direito de uso do imóvel, ou mesmo restringindo-lhe a utilização, tem implicações ime­

diatas no direito de propriedade, que lhe é assegurado pela Consti­

tuição Federal, equivalendo, em essência, a uma desapropriação in­

direta. Nesses casos, o Poder Público assume o ônus decorrente, des­de que, não seria admissível a transmissão da propriedade imóvel,

através de uma mera ocupação ou obstaculação de utilização por um

curtíssimo prazo de cinco (5) anos.

RST],Brasília,a.11, (l 14): 41-117, fevereiro 1999.

Page 28: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

68 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Quanto ao incabimento dos juros compensatórios, não tem ra­

zão, a recorrente. Em primeiro lugar, é impossível, nesta "fase, fixar­

se, como termo inicial do apossamento (pela recorrente), das áreas de terra, outro que não seja aquele estabelecido no decisório impug­

nado - a data da promulgação da Lei n!l 1.172/76 - porquanto, a

busca de outro marco temporal importaria em profundo reexame da prova, a que é infenso o Recurso Especial (Súmula n!l 7). Ao depois,

a decisão hostilizada não está em antinomia com a Súmula n!l164 da

Suprema Corte, mas em perfeita sintonia, 'desde que, nas desapro­

priações (indiretas) são devidos os juros compensatórios, a partir da

imissão, pelo Poder Público, na posse do imóvel expropriado.'

Tendo sido a Lei n!l 1.172/7 6 que impôs a restrição ao uso da

propriedade e ensejou a presente ação indenizatória, afigura-se-me

da maior presteza, fixar-se, para efeito de incidência dos juros com­pensatórios, a data de sua promulgação."

Registro, ainda, que os julgados acima elencados são todos referentes a ações

desapropriatórias ajuizadas contra o Estado de São Paulo, em razão da edição de

decretos criando estações ecológicas, com limitações administrativas.

No caso em exame, a indenização reconhecida pelo acórdão está vinculada

à criação da Estação Ecológica Juréia-Itatins (Decreto Estadual n!l 26.717/87).

Na mesma linha, registro a ementa do REsp n!l 37.950-4-SP, relatado pelo

eminente Ministro José de Jesus Filho (fls. 1.207):

"Desapropriação Parque estadual- Indenizabilidade da co­

bertura vegetal- Juros compensatórios e moratórios - Súmulas n!ls

12 e 102-STl

I - Conforme já decidiu esta Corte as matas que recobrem a área

expropriada representam um valor econômico, portanto, as limitações

administrativas quando superadas pela ocupação permanente, vedando

o uso, gozo e livre disposição da propriedade, impõe-se a obrigação

indenizatória justa, espancando mascarado confisco. Precedentes.

II - 'A incidência dos juros moratórios sobre os compensató­

rios, nas ações expropriatórias, não constitui anatocismo vedado em lei'. - Súmula n!l 102-STl

III - Recursos conhecidos e providos."

De igual forma está no REsp n!l 39.842-8-SP, relatado pelo eminente Mi­

nistro Milton Pereira (DJU de 30.05.94) (fls. 1.211/1.212):

RSTJ,Brasília,a.ll, (l 14): 41-117,fevereiro 1999.

Page 29: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 69

"Tenho como escorreito o pronunciamento supratranscrito, o qual ado­

to como razão de decidir, posto que assente com o entendimento desta Corte

sobre o tema, consoante se vê dos seguintes precedentes:

'Desapropriação indireta. Indenização.

Não é negado ao Poder Público o direito de instituir parques nacionais contanto que o faça respeitando o sagrado direito de pro­

priedade, assegurado pela Constituição.

Não é para confundir as limitações da Lei n2 4.771/65 com a

proibição de desmatamento e uso de uma floresta que cobre total­mente a propriedade porque seria 'interdição de uso de propriedade',

salvo indenização devida'.

(REsp n2 5.989-PR, ReI. Ministro Garcia Vieira, in DJ de 15.04.91).

'Desapropriação - Parque estadual- Mata de preservação per­

manente - Limitação administrativa de uso - Juros compensatórios e

moratórios - Súmulas n illi 12, 69 e 70-STJ. 1. O Poder Público pode criar Parques (art. 52, Lei n!2 4.771/65)

ficando resguardado o direito de propriedade, com a conseqüente repa­ração patrimonial, quando ilegalmente afetado. As 'limitações adminis­trativas', quando superadas pela ocupação permanente, vedando o uso,

gozo e livre disposição da propriedade, desnaturam-se conceitualmente,

materializando verdadeira desapropriação. Impõe-se, então, a obrigação

indenizatória justa e em dinheiro, espancando mascarado confisco.

2. Indenizabilidade de toda a área compreendida na reserva,

como compensação pelo desaparecimento do direito de uso e gozo,

afetando o seu valor econômico. 3. Os juros compensatórios destinam-se a ressarcir, no caso, pelo

impedimento do uso e gozo econômico do imóvel, constituindo solução

(REsp n!2 39. 842-8-SP - ReI. Ministro Milton Pereira, in D J de 3 o. O 5.94) ."

Peço vênia ao eminente Relator, em face do panorama jurisprudencial

suprarevelado, para divergir, e, conseqüentemente, conhecer do recurso especial.

Não se está reexaminando prova. O debate está circunscrito em se definir se

os juros compensatórios são aplicáveis em casos de desapropriação por limitações administrativas. No particular, os recorrentes bem demonstraram· a divergência,

pelo que penso merecer conhecimento o recurso especial.

Voto, assim, em face de aceitação da admissibilidade do recurso especial pelo seu conhecimento e, conseqüentemente, em face da linha jurisprudencial

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

Page 30: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

70 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDEJUSTICA

sustentada pelos acórdãos acima referidos, dar-lhe provimento para reconhecer

os juros compensatórios devidos desde a edição da norma que impôs a limitação administrativa geradora da indenização reconhecida pelo acórdão.

É como voto.

VOTO-VOGAL

o SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Sr. Presidente, com a devida vênia do Sr. Ministro José Delgado, acompanho o voto de V..Exa.

É como voto.

VOTO-VOGAL

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Sr. Presiden­te, peço vênia ao Sr. Ministro José Delgado para, neste caso, acompanhar o voto de V. Exa. Na verdade, os juros compensatórios são conseqüentes da ocupação,

do impedimento, do uso e do gozo, mas o acórdão diz que esse impedimento

resulta da situação em que se encontram as matas, que são virgens. O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Aparte): Sr. Presidente, quero

apenas lembrar que há decisões desta Turma, em situações idênticas, conceden­do os juros compensatórios.

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA (Aparte): Sr. Ministro, o caso concreto diferencia-se de outros onde foi reconhecido o direito.

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Parece-me que essa particularidade ocorreu em alguns casos.

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Foi o que reconhecemos. O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Quando apa­

rece isso, tenho negado seguimento. Na verdade, essas matas são virgens não por convicção, mas por inacessibilidade.

Acompanho, data venia, o Sr. Ministro José Delgado, face a este fundamento que nos precedentes não surgiu, o voto do eminente Ministro Milton Luiz Pereira.

RECURSO ESPECIAL Nº 113.874-MG (Registro nQ 96.0073129-2)

Relator: Ministro Milton Luiz Pereira Recorrente: Caixa Econômica Federal- CEF

RSTJ,Brasilia,a.11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

Page 31: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 71

Recorridos: Luís Sérgio Orrin Camassari e outros

Advogados: José Gomes de Matos Filho e outros e Tarcísio Borges Cordeiro e

outros

EMENTA: Processual Civil- Litisconsórcio passivo necessário - Citação­

Sistema de mediação - Atividade da autora - CPC, art. 47, parágrafo único. 1. Requerida a citação de litisconsorte necessário, compete à parte-au­

tora, não ao réu, agir conforme estatuído na lei (art. 47, parágrafo único, CPC).

Mal endereçada a determinação judicial à ré, cumpre ao juiz renovar a ordem à autora. No sistema de 1nediação, adotado pelo CPC, sem a intimação regu­

lar, o processo não deve continuar, evitando-se macular a relação processual

de vício propiciador de nulidade. Descogitando-se da preclusão (art. 183, CPC),

deve ser ordenado ao autor cumprir a obrigação legal, no prazo assinado. A

parte-ré não pode sofrer prejuízo por equivocado ato judicial.

2. Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide

a egrégia Primeira Turma do SuperiorTribunal de Justiça, por unanimidade, dar

provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes

dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram com

o Relator os Senhores Ministros José Delgado, Garcia Vieira, Demócrito Reinaldo e Humberto Gomes de Barros. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Milton

Luiz Pereira.

Custas, como de lei. Brasília-DF, 22 de setembro de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente e Relator.

Publicado no DI de 30.11.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: O colend~ Tribunal Re­gional Federal da 1 a Região assentou o entendimento consubstanciado na emen­

ta, a saber:

"Processual Civil. Incumbindo à parte, que alegou a legitimi-

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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72 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDEJUSTIÇA

da de passiva necessária da União Federal para integrar a causa, a pro­

moção de sua citação, em não o fazendo, no prazo legal, prossegue-se

na ação sem a intervenção da União Federal. Art. 47, parágrafo único,

do Código de Processo Civil. Improvimento do recurso." (fi. 62).

o recurso especial manifestado (art. 10 5, lU, a, CF), funda-se na negativa

de vigência ao artigo 47 do Código de Processo Civil. Sustenta a CEF que

"havendo litisconsórcio necessário, a citação dos litisconsortes incumbe ao au­

tor, e não ao réu".

A recorrente afirma ser improcedente o prosseguimento do feito sem a

citação da União.

Conforme certidão às fis. 69, transcorreu o prazo legal sem que fossem

apresentadas as contra-razões.

O recurso especial foi inadmitido na origem, contudo, dei provimento ao

agravo de instrumento interposto determinando a subida do recurso. É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA (Relator): Relanceando os

olhos sobre as peças informativas sublinha-se que, em agravo de instrumento,

versaram as partes questão relativa ao empréstimo e pagamento de crédito educativo,

no âmbito processual, pugnando a Caixa Econômica Federal a citação da União

F ederal como litisconsorte passiva necessária, a respeito, aconsoantado à ementa,

assentado o ferretado v. acórdão:

"Processual Civil- Incumbindo à parte, que alegou a legitimi­

dade passiva necessária da União Federal para integrar a causa, a

promoção de sua citação, em não o fazendo, no prazo legal, prosse­

gue-se na ação sem a intervenção da União Federal. Art. 47, parágra­

fo único, do Código de Processo Civil. Improvimento do recurso."

A foco de contrariedade ao artigo 47, parágrafo único, CPC; a tempo e

modo, satisfazendo os requisitos formais, foi interposto o presente recurso, com

suficiente merecimento para ser conhecido (art. 105, lU, a, CF). Favorecido o exame, contempla-se que a Caixa Econômica Federal, ré, na

contestação pediu a citação da União Federal, qualificando-a como litisconsorte

passiva necessária (art. 47, parágrafo único, CPC - fi. 39 - in lme). O digno juiz,

ao invés de ordenar que a parte autora a promovesse, determinou à própria Caixa-

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 73

ré (fl. 48). Como assim não procedeu, foi determinado o prosseguimento do pro­

cesso sem a intervenção da União Federal (fl. 49), provocando o agravo. Nesse contexto, incontroverso que a determinação para a citação de

litisconsorte apontado como necessário, foi equivocadamente endereçada à ré e

não, como determina expressamente a lei, à autora, evidencia-se falta prejudi­

cial à recorrente. Demais, a tempo e modo, insurgindo-se contra o ato judicial, não se configurou a preclusão (art. 183, CPC), sem ocasião, pois, para a extinção

do processo. Se a União Federal legitima-se, ou não, como litisconsorte passiva, é questão que, ainda, não está em causa, uma vez que não se formalizaram a sua

citação e decorrente manifestação. A única questão é esta: deferida a citação, a

trato de obrigação do autor e não do réu, pode ser declarado extinto o direito à

nomeação de litisconsorte?

Ora, decidida pelo juiz a citação de litisconsorte, cumpria formalizá-la,

competindo à autora da ação cuidar do assunto, como destinatária expressamen­te indicada - parágrafo único, art. 47, CPC. Sem a sua intimação, portanto, não

correndo o prazo assinado, não podia o nobre juiz determinar a continuação do

processo. Tal prosseguimento, faltando a citação, maculou a relação processual,

ficando sem validade e viciada por nulidade.

Enfim, pelo sistema da mediação para o ato citatório, adotado pelo Código de Processo Civil, impõe-se a intimação da parte autora para promovê-lo. Após, decidirá o juiz sobre a concreta integração, ou não, do litisconsorte na relação

processual.

Confluente às razões lineadas, demonstrado que foram contrariadas as dis­

posições do art. 47, parágrafo único, CPC, voto provendo o recurso, a fim de que o senhor juiz ordene à parte autora da ação que promova a citação pedida, no

prazo que vier a determinar.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 131. 781- SP (Registro n!.! 97.0033369-8)

Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros

Recorrente: Fazenda Nacional

Recorrida: Pilar Administradora e Corretora de Seguros S/C Ltda

Advogados: Olívia da Ascenção Corrêa Farias e outros e Abrão

Biskier e outro

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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74 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA

EMENTA: Processual - Embargos declaratórios - Recurso protelatório -Prequestionarnento de terna já superado pelo Supremo Tribunal Federal-Multa.

- Nada justifica a pretensão de questionar matéria já superada pelo Su­premo Tribunal Federal, fazendo com que aquela altíssima Corte se afogue na repetição de julgamentos. Semelhante recalcitrância explica-se apenas, com

a constatação de que a recorrente inspira-se no intuito de protelar a efetiva entrega da prestação jurisdicional.

- Incide na multa cominada pelo art. 538, parágrafo único, do CPC, a

parte que opõe embargos declaratórios, no escopo de suscitar questão já su­

perada na jurisprudência.

ACÓRDÃO

Vistos: relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primei­ra Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso.

Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Milton Luiz Pereira, José Delgado, Garcia Vieira e Demócrito Reinaldo.

Brasília-DF, 3 de setembro de 1998 (data do julgamento). Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Relator.

Publicado no DJ de 19.10.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: A lide objeto deste recurso foi descrita assim, no relatório que orientou o acórdão ora desafiado:

"Cuida-se de embargos de declaração opostos ao v. acórdão de fls. 123, o qual, por unanimidade, deu provimento à remessa oficial e ao re­curso interposto contra a r. sentença de fls. 87/92, que concedera a ordem impetrada pela empresa Pilar Administradora e Corretora de Seguros S/C

Ltda, com o escopo de afastar a cobrança da contribuição para o Fundo de Investimento Social - Finsocial, cuja exigência estava sendo formulada pelo Sr. Delegado da Receita Federal de São Paulo.

Essa decisão colegiada deu origem à seguinte ementa:

'Tributário. Constitucional. Contribuição para o Finsocial. De-

RSTJ,Brasília,a.ll, (l14):41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 75

creto-Lei n ll 1.940/82, art. 111, § lll- Empresas que realizam venda de

mercadorias, instituições financeiras e sociedades seguradoras.

1. O Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento do Re­

curso Extraordinário nQ 150.764-1-PE, firmou entendimento de que

o art. 56 do ADCT da Constituição de 1988 emprestou ao Finsocial

a característica de contribuição, jungindo-se a imperatividade das re­

gras insertas no Decreto-Lei n Q l.940182, com as alterações ocorri­das até a promulgação da Carta de 1988, ao espaço de tempo relativo

à edição da lei prevista no art. 195, I, do corpo permanente e art. 56

do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, declarando a

inconstitucionalidade do art. 9Q da Lei n1l7 .689/88, por incompatibi­

lidade manifesta com o contexto constitucional.

2. Em face do pronunciamento do Excelso Pre~ório, cessada

está a vinculação dos órgãos judicantes desta Corte ao julgamento

anterior ao seu Plenário, nos termos do parágrafo único do art. 176 do Regimento Interno do TRF 3a Região, devendo prevalecer a ma­nifestação da Suprema Corte a propósito dos temas constitucionais

suscitados. 3. Daí se concluir, com base no entendimento firmado pelo

Supremo Tribunal Federal que a contribuição para o Finsocial é devida pela alíquota de 0,5% (com o acréscimo de 0,1 % apenas

no exercício de 1988 na forma do Decreto-Lei n 1l 2.397/87) a par­

tir da promulgação da Constituição Federal de 1988 e até sua

extinção por força do art. 13 da Lei Complementar n Q 70/91, sen­

do inválidas as majorações de alíquotas trazidas pela legislação

editada durante esse período de exigência transitória do Decreto­

Lei n ll 1.940182. Direito do contribuinte que se reconhece, nesses

limites.

4. Matéria preliminar rejeitada. Apelação e remessa oficial par­

cialmente providas.'

Inconformada, aduz a embargante que o v. acórdão embargado en­contra-se eivado pelo vício da omissão, uma vez que a quaestio in juditio

deducta não teria sido apreciada à luz do que dispõe o art. 28 da Lei n!l

7.738/89. Após tecer diversas considerações, todas tendentes a obter a

reconsideração do julgado, a parte requer que os embargos sejam acolhi­dos e, afinal, providos (fls.134/137).

Os embargos foram rejeitados, impondo-se à embargante pena por exercício abusivo, eis que:

RSTJ,Brasília,a.ll, (1l4): 41-117, fevereiro 1999.

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76 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

'Embargos de declaração. Manifestação de inconformismo em

relação ao julgamento do recurso. Seu descabimento. Imposição de

multa, em face de o recurso haver sido interposto depois da entrada

em vigor da Lei nQ 8.950/94.

1- O mero inconformismo da parte, no que tange ao julgado,

não autoriza a oposição de embargos de declaração, se o acórdão não

padece do vício da omissão, dúvida, obscuridade ou contradição.

2- Se os embargos de declaração manifestam o ânim0 procrasti­

natório da parte, deve o órgão julgador condenar o embargante a

pagar ao embargado multa não excedente de 1 % (um por cento)

sobre o valor da causa.

3- Embargos de declaração a que se rejeita, com imposição de multa.'(fl. 153)"

O recurso especial abriga-se nos permissivos a e c.

A recorrente reclama de ofensas ao art. 535 do CPC, ao art. 7Q da Lei nQ

7.787/89, ao art. 1" da Lei nQ 7.894/89 e, também, ao art. IQ da Lei n" 8.147/90.

Traz a confronto precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior

Tribunal de Justiça, a dizerem que não constitui excesso a aposição de embar­

gos declaratórios, com o intuito de prequestionar teses a serem objeto de re­

curso especial ou extraordinário.

Este, o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): O

acórdão recorrido resultou do voto proferido pelo eminente Juiz Souza Pires,

nestas palavras:

"A teor do que reza o art. 535, I e II, do Cód. Proc. Civil, cabem

embargos de declaração quando há no acórdão obscuridade, dúvida, con­

tradição ou omissão relativa a ponto sobre que devia pronunciar-se o Tri­

bunal.

Nesse passo, descabe a interposição de embargos de declaração

embasados exclusivamente no inconformismo da parte, ao fundamento de

que o direito não teria sido bem aplicado à espécie submetida à apreciação

e julgamento.

A esse respeito, trago à colação os seguintes precedentes jurispru­

denciais:

RSTJ, Brasília, a. 11, (I 14): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 77

'Mesmo nos embargos de declaração com fim de prequestio­

namento, devem-se observar os lindes traçados no art. 535 do CPC (obscuridade, dúvida, contradição, omissão e, por construção

pretoriana integrativa, a hipótese de erro material). Esse recurso não é meio hábil ao reexame da causa' (STJ -1 aTurma, REsp nQ 11.465-

O-SP, reI. Min. Demócrito Reinaldo, j. 23.11.92, rejeitaram os embs.,

v.u., DJU de 15.02.93, p. 1.665, 2a col., em.).

'A pretexto de esclarecer ou completar o julgado, não pode o

acórdão de embargos de declaração alterá-lo' (RTJ 90/659. RT 527/

240,JTA 103/343).

Se o fizer, poderá ser cassado em recurso especial (RSTJ 21/289, 24/

400, STJ - 2llTurma, REsp nQ 6.276-PB, reI. Min. Ilmar Galvão, j. 12.12.90,

deram provimento, v. u., DJU de 04.02.91, p. 569, 2a col. em.) ou desconstituído através de rescisória (JTA 108/390).

tes:

'É incabível, nos declaratórios, rever a decisão anterior,

reexaminando ponto sobre o qual já houve pronunciamento, com in­

versão, em conseqüência, do resultado final. Nesse caso, há alteração

substancial do julgado, o que foge ao disposto no art. 535 e incisos

do CPC. Recurso especial conhecido em parte e assim provido' (RSTJ

30/412).

Nesse mesmo diapasão, são os precedentes jurisprudenciais seguin-

'Processual Civil. Embargos de declaração. Ausência dos pres­

supostos contidos no artigo 535 do CPC. Rejeição. Os embargos de

declaração constituem recurso de exceção, consoante disciplinado

imerso no art. 535 do CPC, exigindo-se para seu provimento, este­

jam presentes os pressupostos legais de cabimento. Inocorrentes as

hipóteses de omissão, dúvida, contradição, obscuridade ou erro ma­

terial, não há como prosperar o inconformismo, cujo real intento é

emprestar-lhe efeitos infringentes. Embargos rejeitados, sem discre­pância' (PTurma, relator Ministro Demócrito Reinaldo, v.u., DJ de 09.05.94,p.10.819).

'Processo Civil. Embargos declaratórios. Pretensão infringente.

RST],Brasília, a.11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

Page 38: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

78 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Admissão apenas em casos excepcionais. Inocorrência de omissão,

contradição, obscuridade ou dúvida. Embargos rejeitados. I - Inocorrendo no acórdão omissão, contradição, obscuridade

ou dúvida, rejeitam-se os embargos declaratórios.

II - Não se enquadrando a espécie nas hipóteses excepcio­

nadas admitidas por construção doutrinário-jurisprudencial, inad­

missível a infringência do julgado na via dos embargos declaratórios' (2ll. Seção, relator Ministro Sálvio de Figueiredo, DJ de 07.02.94, p.1.100).

Sob outro aspecto, como ensina Theotonio Negrão, em seu 'Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor', 22"- edição, nota 6, ao

art. 535: 'os embargos de declaração não constituem recurso idôneo para

corrigir os fundamentos de uma decisão'.

Essa lição vem sendo sufragada pela jurisprudência, tanto que o egré­gio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu que:

'O juiz não está obrigado a responder a todas as alegações das

partes) quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundar a de­

cisão) nem se obriga a responder um a um a todos os seus argumentos'

(RJTJESP 115/207).

Efetivamente, à parte cabe narrar o fato e ao juiz aplicar o melhor direito à espécie, segundo o princípio jurídico, segundo o qual, narra :mihi factulll dabo tibi jus.

Ora, não cabia trazer à colação o disposto no art. 28 da Lei n1l 7. 738/ 89, uma vez que a exigibilidade do Finsocial, à alíquota de 0,5% (zero vírgula cinco por cento), resultou proclamada pelo voto-condutor do v.

acórdão embargado. Conseqüentemente, entendo que os presentes embargos de declara­

ção não merecem prosperar, uma vez que apresentam-se à míngua dos pressupostos autorizadores de sua interposição.

N esse sentido, não posso deixar de assinalar haver resultado eviden­

ciado o ânimo procrastinatório dos embargos de declaração em tela, o que,

restando expressamente declarado, obriga-me a impor à embargante a multa

de 1 % (um por cento) sobre o valor da causa) quantulll que reverterá em

benefício da embargada (Código de Processo Civil, art. 538, parágrafo úni­

co).

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 79

Ante o exposto, meu voto é no sentido de rejeitar os presentes embar­

gos de declaração". (fls. 138/143)

A este pronunciamento acrescentou-se o voto-vista, lançado pelo eminente

Juiz Pérsio Lima, assim:

"Conforme consta do art. 538, parágrafo único, do CPC só cabe a

multa de 1 % nos embargos de declaração quando forem manifestamente

protelatórios.

O SuperiorTribunal de Justiça assim se manifestou a respeito:

'os embargos declaratórios devem ser encarados como o instrumento de

apeifeiçoamento de prestação jurisdicional. A multa cominada no art. 538,

parágrafo único, do CPC, reserva-se a hipóteses em que se faz evidente o

abuso.' (RSTJ 30/378, citado porTheotonio Negrão - Código de Pro­

cesso Civil e Legislação Processual em Vigor - 26a edição, pp. 43617).

Por outro lado, sendo claramente protelatórios os embargos, é

irrecusável ao julgador impor a sanção cominada pela lei.

É o que afirma Sérgio Berm.udes:

'manifestamente protelatórios os embargos, tanto o Juiz quanto o

Tribunal, declarando expressamente esse vício, condenarão o embargante

a pagar multa de até 1 % do valor da causa, atualizando-se este para

que se mantenha a sua identidade ao longo do processo inflacionário'.

(In A Reforma do Código de Processo Civil, p. 67).

No caso em tela, evidencia-se claramente o intuito protelatório, pois

a dúvida levantada não tinha cabimento, visto que no acórdão embargado, a questão já havia sido examinada." (fls. 145/146)

Estou de acordo com estas manifestações.

Nada justifica a pretensão de questionar matéria já superada pelo Supremo

Tribunal Federal, fazendo com que aquela altíssima Corte se afogue na repeti­ção de julgamentos. Semelhante reca1citrância explica-se apenas, com a

constatação de que a recorrente inspira-se no intuito de protelar a efetiva entre­

ga da prestação jurisdicional.

Nego provimento ao recurso.

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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80

Relator: Recorrente:

Recorrida:

Advogados:

REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL Nº 151. 734 - MG (Registro n il 97.0073527-3)

Ministro Demócrito Reinaldo Indústrias Gessy Lever Ltda

Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais

Rogério BheringAndrade e José Roberto de Castro

EMENTA: Tributário - Lançamento do tributo por ato expresso da ad­

ministração - Impossibilidade de homologação - Decadência regida pelo

art. 173 do CTN. O lançamento por homologação (àrt. 150, § l il , do CTN) é ato adminis­

trativo de natureza conflrmatória e só admitido na hipótese de pagamento

antecipado do tributo. Em havendo lançamento pela autoridade administrativa (art. 142 do

CTN), com a posterior inscrição do débito tributário e por ausência de

pagamento, torna-se manifesta a impossibilidade da homologação poste­

rior (lançamento por homologação), eis que, com esta (homologação) se

extingue o débito e com aquele (lançamento de ofício) nasce o débito tri­

butário. O lançamento expresso é manifestamente incompatível com a

homologação, que é a declaração de extinção do débito, em face do paga­

mento antecipado.

In casu, apurando-se a exigência do débito tributário mediante o lan­

çamento de ofício, a decadência se rege pelo disposto no art. 173, I, do CTN.

Em se cuidando de exação pertinente aos anos de 1982 e 1983 e iniciando-se

o procedimento administrativo (lançamento) em fevereiro de 1987, a deca­

dência não se conflgurou, desde que não decorridos os cinco (5) anos (art.

173, I, do CTN).

Recurso improvido. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a

Primeira Turma do SuperiorTribunal de Justiça, por unanimidade, negar provi­

mento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráflcas constantes dos

autos, que flcam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do

julgamento os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira,

José Delgado e Garcia Vieira. Custas, como de lei.

RSTJ,Brasília,a.11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA

Brasília-DF, 18 de junho de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro DEMÓCRITO REINALDO, Relator.

Publicado no DJ de 28.09.98.

RELATÓRIO

81

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: A Fazenda Pública do

Estado de Minas Gerais aforou execução fiscal contra a empresa Indústrias Gessy

Lever Ltda, objetivando a cobrança de importância correspondente a ICMS,

devidamente submetida a lançamento (art. 142 do CTN) e não paga.

A executada opôs embargos à execução, sob dupla fundamentação:

a) cerceamento de defesa na fase do procedimento administrativo; b) extinção do débito, em face da decadência, consoante o disposto no art.

150, § 4 11, do CTN.

Os embargos foram julgados improcedentes nas instâncias ordinárias.

Irresignada, a empresa vencida se insurge através do especial (art. 105, lU, a,

da CF). Fundamenta-se na alegação de afronta ao art. 150, § 411, do CTN, eis que, em se tratando de ICMS, em que o lançamento se faz por homologação, o prazo

prescricional se verifica em cinco (5) anos, contados do fato gerador. Portanto,

parte do crédito pertinente a 1983, se encontra extinto.

O recurso subiu a esta instância em face de decisão proferida em agravo de instrumento.

Estando o feito preparado, trago a julgamento.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO (Relator): Senhores Mi­nistros, a Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais promoveu execução fiscal

contra a empresa Indústrias Gessy Lever Ltda, objetivando reaver quantia que menciona e resultante de apuração, em procedimento regular, de ICMS não pago.

A Fazenda verificou, através de levantamento, que a executada promoveu

entradas e saídas de mercadorias desacobertadas de documento fiscal, formulan­do o crédito tributário, com os devidos consectários.

Houve defesa da devedora e transitada em julgado a decisão administrati­

va, o débito tributário não pago, foi inscrito na dívida ativa, iniciando-se a exe­

cução.

RSTJ,Brasília,a.ll, (l14):41-117,fevereiro 1999.

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82 REVISTADO SUPERIORTRIBUNAL DE JUSTIÇA

A executada opôs embargos estribados em dois (2) fundamentos basilares:

a) cerceamento de defesa, na fase administrativa;

b) decadência do direito à constituição do crédito. O juiz julgou improcedentes os embargos, sentença confirmada pelo Tri­

bunal de Justiça, em grau de apelação.

Contra esta decisão, manifesta, a vencida, recurso especial (alínea a do permissivo constitucional). O fundamento da irresignação consiste n'a ofensa ao

art. 150, § 4Q, do CTN, porquanto, parte do crédito tributário já se encontra

prescrito, por se tratar de ICMS, em que se faz o lançamento por homologação e

a contagem do prazo para o início da extinção do crédito há de começar do fato

gerador. A controvérsia, ao meu ver, é de fácil solução.

Em verdade, o ICMS, pela sua própria natureza, está sujeito ao lançamento

por homologação. Isto porque, no comum dos casos, o pagamento desse tributo é

feito antecipadamente. Nesse caso, a lei (art. 150 do CTN) atribui ao sujeito

passivo o dever de examinar a base de cálculo e a alíquota (definida em lei) e a

elaboração do cálculo para concluir qual o quantum devido. E, ao depois, ante­

cipa o pagamento. É o que se denomina de autolançamento, a que a lei denomina de "lançamento por homologação". É o magistério de Aliomar Baleeiro: "Pelo

art. 150, o pagamento é aceito antecipadamente, fazendo-se o lançamento a

posteriori: a autoridade homologa-o, se exato, ou faz o lançamento suplementar,

para haver a diferença acaso verificada a favor do Erário. É o que se torna mais

nítido no § 1 Q desse dispositivo, que imprime ao pagamento antecipado o efeito de

extinção do crédito, sob condição resolutória de ulterior homologação. Negada

essa homologação, anula-se a extinção e abre-se oportunidade a lançamento de

oficio" (Direito Tributário Brasileiro, 1 oa ed., p. 521).

A conhecida figura do lançamento por homologação, adverte Paulo de

Barros Carvalho, "é um ato jurídico administrativo de natureza confirmatória,

em que o agente público, verificado o exato implemento das prestações tributá­

rias de determinado contribuinte, declara, de modo expresso, que obrigações houve, mas que se encontram devidamente quitadas até aquela data, na estrita

consonância dos termos da lei" (Curso de Direito Tributário, p. 282).

Destarte, a recorrente não pode lograr êxito em sua pretensão, eis que, in

casu, incide a regra do art. 173 e não o art. 150, § 4Q, ambos do CTN. É que o

mencionado § 4Q é explicativo do art. 150, que estabelece: "o lançamento por

homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito

passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade ad­

ministrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conheci­

mento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente o homologa".

RSTJ, Brasília, a. 11, (l 14): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 83

Na hipótese, inexistiu a antecipação do pagamento; ao revés, o débito tri­

butário foi apurado em procedimento administrativo, que redundou no lança­

mento feito pela autoridade administrativa, na forma do art. 142 do CTN. Por­tanto, não há de se falar em lançamentos por homologação, que se não conci­

liam, no caso.

A natureza do ato homologatório, ensinam os tributaristas, difere da do lançamento tributário. Enquanto aquele primeiro anuncia a extinção da obri­gação, liberando o sujeito passivo, estoutro declara o nascimento do vínculo,

em virtude da ocorrência do fato jurídico. Um, certifica a quitação; outro cer­

tifica a dívida (Paulo de Barros Carvalho, ob. cit., p. 282).

Ora, se não houve pagamento antecipado do débito, não há como se falar

em homologação, e nem em aplicação do § 40. do art. 150 do CTN'. A homologa­

ção é nada mais do que a declaração de extinção do débito - em face do paga­

mento antecipado.

N a hipótese vertente, houve lançamento pela autoridade administrativa (art. 142 do CTN) e posterior inscrição do débito tributário. Ora, o lançamento

expresso se incompatibiliza com a homologação. Com esta, extingue-se o débi­

to; com aquele, nasce o débito tributário. Aqui, a Fazenda Pública iniciou o procedimento do lançamento, com a

autuação, nos exercícios de 1982 e 1983. O prazo decadencial começou a fluir

no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter

sido efetuado. Impõe-se a aplicação do art. 173, I, do CTN. As exigências tribu­

tárias são pertinentes aos anos de 1982 e 1983. O prazo decadencial se expiraria em 31 de dezembro de 1987 e 31 de dezembro de 1988. Iniciando-se o procedi­

mento administrativo preparatório do lançamento em 6 de fevereiro de 1987, a

decadência não se configurou, desde que não decorridos cinco (5) anos, conta­

dos na forma do art. 173, I, do CTN.

Com estas considerações, conheço do recurso, mas lhe nego provimento. É como voto.

Relator:

Recorrente:

Recorridos:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL Nº 158.980 - SP (Registro n0.97.0091043-1)

Ministro Garcia Vieira

União

Benedito José de Andrade e outro

Gilda Gronowicz e outro

RSTJ,Brasília,a.11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

Page 44: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

84 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: Processual- Preclusão - Legitinüdade das partes.

O juiz de oficio, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não

proferida a sentença de mérito, poderá apreciar questão relativa àlegitimida­de das partes. Esta matéria não se subordina à preclusão.

Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Minis­

tros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao

recurso. Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Demócrito

Reinaldo, Milton Luiz Pereira e José Delgado.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros. Brasília-DF, 17 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro GARCIA VIEIRA, Relator.

Publicado no DJ de 04.05.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: A União interpõe recurso especial

(fls. 548/554), arrimada na Constituição Federal, art. 105, lII, a, alegando

inocorrer a preclusão quando o tema for a legitimidade das partes. Aponta nega­

tiva de vigência aos arts. 267, § 32 , e 515, do CPC.

Pede a anulação do v. acórdão.

Contra-razões às fls. 556/562.

Despacho de fls. 570 admitiu o recurso.

Trata-se de ação de ressarcimento de danos causados pela construção de sistema de captação de águas pluviais que provocou a erosão e assor~amento de

terreno. A r. sentença de fls. 427/429 julgou procedente o pedido. O v. acórdão

(fls. 488/496) deu parcial provimento à apelação. Interpostos embargos de de­

claração, foram os mesmos rejeitados (fls. 540/545).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presidente, aponta a

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 85

recorrente, como violados, os artigos 267, § 3!2, e 515 do CPC, versando sobre

questão devidamente prequestionada. Conheço do recurso pela letra a. Embora não tenha havido recurso do despacho saneador de fls. 74, que

julgou legítimas as partes, dessa decisão não ocorreu a preclusão, porque o juiz,

de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a

sentença de mérito, poderá apreciá-la. Esta matéria não se subordina à preclusão.

Neste sentido, os Recursos Especiais n9.ii 86.135-SP, DJ de 17.11.97, reI. Min.

Carlos Alberto Menezes Direito; 53.052-0-AL, DJ de 19.08.96, relator Min.

Barros Monteiro; e 59.978-4-PR, DJ de 02.09.96, relator Min. Milton Luiz

Pereira. Acontece, que o IBC, sucedido pela União, na apelação (fls. 445/459),

argüiu a sua ilegitimidade passiva baseado no contexto probatório. Diz o IBC em sua apelação (fls. 446/447):

"Com relação a esse último item, tem-se que o ora apelante não

poderia ser considerado parte legítima no feito, assim como faltavam aos apelados, numa circunstância que merecia uma acurada análise por parte

do juízo a quo, condições para figurarem no pólo passivo da relação jurí­

dica.

A ilegitimidade da autarquia, como parte passiva na lide, ficou de­monstrada desde os albores da demanda, mormente pelo fato provado e

comprovado nos autos de que o problema ocasionado nas terras indicadas

(erosão) na inicial não foram provocadas pelo IBC, pois sua origem, além de remota e antiga, veio a ser agravada quando a Fepasa fez construir a céu

aberto outro emissário, dando continuidade àquele efetuado pelo apelante,

despejando toda água pluvial coletada naquelas que seriam as propriedades dos apelados.

Ora, se o apelante não direcionou qualquer coletor de água de chu­va para as terras atingidas, não seria ele o responsável pela erosão noti­

ciada, extraindo-se daí a ilegitimidade perquirida, aspecto que o douto magistrado não chegou sequer a analisar na r. decisão de fls., apesar de debatida.

Se ao instituto cafeeiro faltava essa condição essencial para o conhe­

cimento e o desenvolvimento regular do processo, na esfera passiva da

relação, aos apelados também não era dado o direito de figurar na esfera

ativa, porquanto, decididamente, não conseguiram eles provar a contento

que são proprietários das terras contíguas ao IBC ou à Fepasa no distante

município de Bernardino de Campos, localizado no Estado de São Paulo" (fls. 446/447).

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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86 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o v. acórdão recorrido, ao afastar a preliminar de ilegitimidade, o fez

escorado nas provas, acentuando que:

"Ademais, está comprovado, nos autos, a propriedade dos apelados e

o instituto-apelante não negou, e nem o poderia, a construção do armazém

e do sistema de captação de águas pluviais, de modo que nã'o há como negar sua legitimidade passiva" (fls. 492).

A recorrente, neste recurso especial, ao sustentar a existência de ilegitimidade,

o faz com apoio no contexto probatório. Ela, após se reportar às suas razões de apelação, nas quais sustenta a sua ilegitimidade, com base nas provas, diz

que:

"De fato, a documentação trazida aos autos pelos autores, primeiramen­te, é insuficiente e incerta, inexistindo a certeza de que os danos a serem ressarcidos pertençam aos apelados. Verifica-se, in casu, a carência de ação,

argüida em fase anterior e tempestivamente.

N os termos do artigo 267, VI, do diploma adj etivo, deveria ser o feito extinto sem julgamento de mérito, dada a clara ocorrência da ilegitimida­de passiva do instituto réu" (fls. 551).

Como se vê, para examinar-se a argüida ilegitimidade da ré, teria o juiz de reexaminar as provas coligidas nestes autos e isso é vedado por nossa Súmula n!.'.

7. Como a única pretensão da recorrente é a de ser decretada a sua ilegitimidade passiva (fls. 554) não se pode acolher o seu pedido.

Nego provimento ao recurso.

RECURSO ESPECIALNQ 161.921-PR (Registro n!.'.98.0000930-2)

Relator: Ministro Garcia Vieira

Recorrente: Incorporadora Quatro Ltda

Recorrida: Fazenda Nacional Advogados: Rogério Verdade e Dolizete Fátima Michelin e outros

EMENTA: Cofins -Venda de imóveis - Incidência. As atividades de cOInércio e indústria de construção civil, engenharia

RST],Brasília,a.l1, (114): 41-117,fevereiro 1999.

Page 47: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 87

civil e incorporação estão sujeitas à Cofins porque caracterizam compra e

venda de mercadorias. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Minis­

tros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos

votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao

recurso. Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Demócrito Reinaldo, Milton Luiz Pereira e José Delgado.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros. Brasília-DF, 17 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente. Ministro GARCIA VIEIRA, Relator.

Publicado no DI de 04.05.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTR0 GARCIA VIEIRA: Incorporadora Quatro Ltda, com

fundamento na Constituição Federal, artigo 105, inciso IIl, letras a e c, inter­

põe recurso especial (fls. 90/1 06), aduzindo não incidir a Cofins sobre a receita

proveniente da venda de imóveis, porque estes não são mercadorias, não haven­

do, portanto, prestação de serviços.

Denegada a segurança em primeira instância, o colendo tribunal a quo reformou esta decisão.

Aponta violação à Lei Complementar n 2 70/91, artigo 22 , Código Civil, artigos 43 e 47 do CTN, artigo 110 e divergência jurisprudencial.

Contra-razões (fls. 130/133).

Despacho (fls. 135) admitiu o recurso. É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA (Relator): Sr. Presidente, aponta a recorrente, como violados, vários dispositivos legais, versando sobre questão

devidamente prequestionada e demonstrou a divergência.

Conheço do recurso pelas letras a e c.

RST],Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

Page 48: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

88 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Estabelece o citado dispositivo legal que a Contribuição para o Financia­mento da Seguridade Social- Cofins, de 2% incidirá sobre o faturamento men­sal, assim considerando a receita bruta das vendas de mercadorias, e serviços e

de serviços de qualquer natureza. O objetivo social da recorrente é a "indústria da construção civil, adminis­

tração e conservação de prédio ... " e também, incorporação imobiliária, compra, venda, permuta e locação de imóveis, intermediação em operações imobiliárias e projetos de planejamento e engenharia civil.

Entendo que as atividades desenvolvidas pela recorrente, de comércio e

indústria da construção civil, engenharia civil e incorporação, estão sujeitas à Cofins porque caracterizam a compra e venda de mercadorias, em sentido am­plo, como o empregou o legislador, e este usou a palavra faturamento como vendas realizadas, importância apurada e receita obtida e não no sentido pura­mente comercial. A própria lei fala em receita bruta.

A questão foi bem examinada pelo Juiz-Relator, que em seu bem lançado voto de fls. 84, acentuou:

"A constitucionalidade da Contribuição Social criada pela LC nll 70/91 foi reconhecida pelo egrégio STF no julgamento da Ação Direta de

Constitucionalidade nll l-I (DJU de 06.12.93, p. 26.598) e, nesse .sentido, fir­mou-se o entendimento desta Corte com a edição da Súmula n!l 21.

A incidência da Cofins se dá sobre o faturamento mensal, assim con­siderada a receita bruta das vendas de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza (LC n!l 70/91, artigo 2!l).

Dedica-se a apelante ao ramo do comércio e indústria da construção civil, engenharia civil e incorporação (fls. 17). Assim, exercendo atividade que se encontra relacionada na Lei Complementar n!l 56/87, enquadra-se como prestadora de serviços, sujeita, pois, ao recolhimento da contribui­

ção cuja exigibilidade ora se discute. Nesse sentido, colhe-se precedente desta Corte, verbis:

'Tributário - Cofins - Incidência - Venda de mercadorias - Leis Complementares n!ls 54/87 e 70/91 - Decreto-Lei n1l 406/68.

A empresa, exercendo atividade de compra, venda e incorporação

de imóveis, é prestadora de serviços, e como tal está obrigada ao paga­mento da Cofins. Inexistência de ofensa ao princípio da tipicidade, (AMS

n!l 95.04.36486-1-PR, relatorJuiz Carlos Sobrinho, DJ de 06.12.95, p.

85.008/85.014)'." (fls. 84)

Nego provimento ao recurso.

RSTJ,Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

Page 49: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

Relator:

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA

RECURSO ESPECIAL NQ 162.981 - SP (Registro n!:! 98.0006982-8)

Ministro José Delgado

Recorrentes: Brigitte Maria Fernandes e outros

Advogados: Roberto Correia da Silva Gomes Caldas e outro Recorrida: Fazenda Nacional

Procuradores: Elyadir Ferreira Borges e outros

89

EMENTA: Processual Civil e Tributário - Ação de repetição de indébito­

Valor da causa. 1. O valor da causa nas ações de repetição de indébito tributário deve

corresponder ao beneficio patrimonial visado pelo contribuinte, acompanha­

do de correção monetária a partir do pagamento indevido (Slímula n!:! 162-

STJ) e de juros moratórios a partir do trânsito em julgado da sentença (Súrnula

n!:! 188-STJ). 2. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Ministros

da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e

notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Parti­

ciparam do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Garcia Vieira, Demócrito Reinaldo,

Humberto Gomes de Barros e Milton Luiz Pereira.

Brasília-DF, 5 de maio de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro JOSÉ DELGADO, Relator.

Publicado no DJ de 03.08.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: Brigitte Maria Fernandes e ou­tros interpõem o presente recurso especial (fls. 77/85), com fulcro nas alíneas a

e c, do inc. lII, do art. 105, da Carta Magna, contra acórdão (fls. 71/73) profe­

rido pela 4il.Turma doTRF/3il.Região, cujos fundamentos estão sintetizados na

ementa que o compõe e encontra-se assim estruturada (fl. 74):

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

Page 50: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

90 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"Processo Civil. Agravo de instrumento. Valor da causa. Ação

de repetição de indébito tributário. Artigo 259, I, CPC. Montante

recolhido. Correção monetária. Juros. Desprovimento.

I - O valor da causa, na ação de repetitória, correspondente às

parcelas indevidamente recolhidas, há de ser o da soma destas, mone­

tariamente corrigidas desde as datas dos respectivos recolhimentos,

afastando-se a fixação por estimativa.

II - Não se deve computar os juros no cálculo do valor da causa

de repetição de indébito tributário porque estes incidem somente a

partir do trânsito em julgado.

III - Agravo desprovido."

Em sede de ação de repetição de indébito referente a imposto sobre opera­

ções financeiras, os recorrentes interpuseram agravo de instrumento. contra de­cisão que acolheu impugnação ao valor da causa, determinando sua retificação

para que correspondesse à restituição pleiteada em juízo.

O tribunal a quo não acolheu o pleito formulado, desprovendo o agravo

de instrumento.

Nesta instância, sustentando-se os recorrentes em violação dos arts. 258,

286, II, e 604 do CPC, além de dissídio pretoriano, pretendem a reforma do v.

acórdão por este ter entendido ser o valor da causa na ação de repetição de

indébito, o correspondente à restituição pleiteada, afastando a fixação por esti­

mativa, como perseguido por eles.

Oferecidas contra-razões (fls. 87/89) pela Fazenda Nacional.

Admitido o processamento do especial (fls. 91), subiram os autos a esta

Corte. É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): Da análise dos requi­sitos de admissibilidade, vislumbro que o recurso não merece prosperar com

fundamento na alínea a. Os dispositivos tidos por malferidos não se encon­

tram inseridos e debatidos no corpo do aresto vergastado, não ger.ando, com

isso, o imprescindível prequestionamento viabilizador da instância especial.

Conheço do recurso, portanto, apenas pela divergência.

A questão em tela cinge-se unicamente na definição do valor atribuído à

causa nas ações de repetição de indébito tributário.

Como é sabido, o fundamento básico desse tipo de ação é afastar a

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 91

locupletação indevida, merecendo, pois, a restituição se fazer acompanhar da

quantia originariamente recolhida, acrescida de juros moratórios a partir do trânsito em julgado da sentença, e de correção monetária a partir do pagamento

indevido, conforme vislumbramos do teor das seguintes Súmulas exaradas por

esta Corte:

"Súmula n!.l 162 - Na repetição de indébito tributário, a correção

monetária incide a partir do pagamento indevido."

"Súmula n!.l 188 - Os juros moratórios, na repetição de indébito, são devidos a partir do trânsito em julgado da sentença."

Neste aspecto, portanto, acerca dos juros e da correção monetária, não há

polêmicas. A ação de repetição de indébito é de natureza nitidamente condenató­

ria, e o discutido valor da causa deve equivaler, pois, ao benefício patrimo­

nial visado pelos recorrentes, como bem nos orienta a doutrina de Luiz Cláu­dio Amerise Spolidoro, in "Do Valor da Causa e sua Impugnação", Lejus, São

Paulo, 1997:

"A restituição do indevido ou repetição do indébito é matéria prevista

nos arts. 964 e ss. do CC, uma vez que o pagamento indevido é uma das

formas de enriquecimento ilícito, por decorrer de prestação feita, esponta­neamente, por alguém com o intuito de extinguir uma obrigação erronea­

mente pressuposta, gerando ao accipiens, por imposição legal, o dever de

restituir, uma vez estabelecido que a relação obrigacional não existia, tinha

cessado de existir ou que o devedor não era o solvens ou que o accipiens não era o credor.

Portanto, é o direito de exigir a restituição do que se pagou

indevidamente por erro (RT 468/223, 474/111,446/91,450/246).

O valor da causa, portanto, será aquele que se busca ver restituído. O mesmo ocorre para com a repetição do indébito fiscal."

Encontrando-se, pois, plenamente delimitado o quantum do conteúdo

econômico da pretensão deduzida pelos recorrentes, ressai ineludive1mente ser

este o valor da causa, não merecendo, conseqüentemente, nenhuma reparação o

acórdão ora vergastado, pelo que, mantenho-o na íntegra:

"Cuida-se de ação de repetição de indébito objetivando a restitui-

RSTJ,Brasília,a.ll, (1l4):41-117,fevereiro 1999.

Page 52: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

92 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ção dos valores recolhidos a título de imposto sobre operações financei­

ras (IOF), corrigidos monetariamente a partir de cada pagamento indevido e acrescidos de juros.

Ora, se assim é, o valor da causa na ação repetitória, correspondente às parcelas indevidamente recolhidas, há de ser o da soma destas, moneta­

riamente corrigidas desde as datas dos respectivos recolhimentos, não se admitindo possa o autor atribuir-lhe valor por estimativa.

Essa a regra trazida pelo Código de Processo Civil, in verbis:

'Art. 259. O valor da causa constará sempre da petição inicial e será:

I - na ação de cobrança de dívida, a soma do principal, da pena e dos juros vencidos até a propositura da ação.'

Há que se ressaltar que a correção monetária, embora não prevista no dispositivo transcrito acima, incide no cálculo do valor da causa, pois se a mesma é aplicada para a repetição de indébito tributário (Súmula n!l 46 do extinto Tribunal Federal de Recursos), deve-se admiti-la também

para a fixação do valor da causa, posto que este deve refletir ao máximo o proveito almejado pelo autor.

Por outro lado, forçoso é concluir que, in casu, os juros não devem incluir-se na soma do artigo 259, I, do Código de Processo Civil, isto porque o Código Tributário Nacional, em seu artigo 167, parágrafo único, estipula que os mesmos incidem somente a partir do trânsito em julgado. Portanto, nas ações de repetição de indébito tributário, não há que se falar em juros vencidos quando do ajuizamento da demanda.

Posto isso, nego provimento ao agravo para fixar como valor da cau­sa o montante recolhido a título de imposto sobre operações financeiras (IOF), corrigido a partir de cada recolhimento."

Isto posto, nego provimento ao presente recurso especial.

É como voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 165.231-MG (Registro n!l98.0013453-0)

Relator: Ministro José Delgado

Fazenda Nacional Recorrente:

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

Page 53: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA

Procuradores: Oilson José Zanlorenzi e outros

Recorrida: Advogado:

Embrasp - Empreiteira de Obras e Serviços Ltda José Carlos Nogueira da Silva Cardillo

93

EMENTA: Processual Civil- Intimação do Procurador da Fazenda PÚ­

blica- Lei n Q 6.830/80, art. 25. 1. A regra cogente expressa pelo art. 25 da Lei n Q 6.830/80, não permite

interpretação que desvirtue o seu comando da obrigatoriedade da intimação

da Fazenda Pública ser feita pessoalmente ao seu representante legal.

2. Por intimação pessoal há de se compreender a comunicação do ato processual que é procedida via mandado ou com a entrega dos autos, de modo

direto, em cartório, à pessoa com capacidade processual para recebê-la. Mas

isso não significa a obrigatoriedade da remessa dos autos, via postal, para que

se dê por intimado o representante da Fazenda Pública. 3. É ineficaz a comunicação da realização de ato processual através de

carta, ainda que com aviso de recebimento. Precedentes.

4. Recurso especial parcialmente provido para que a intimação do re­

presentante da Fazenda seja feita, pessoalmente, por mandado, sem a obrigatoriedade da remessa dos autos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Minis­

tros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar parcial provimento ao

recurso. Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Garcia Vieira,

Demócrito Reinaldo, Humberto Gomes de Barros e Milton Luiz Pereira. Brasília-DF, 5 de maio de 1998 (data do julgamento). Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro JOSÉ DELGADO, Relator.

Publicado no DJ de 03.08.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: A Fazenda Nacional interpôs agra­

vo de instrumento contra decisão do juízo monocrático que indeferiu pedido para

que lhe fossem remetidos os autos, via postal, para fins de realização de intimação

pessoal, em face de o procurador se encontrar em comarca do interior.

RSTJ,Brasília,a.1!, (l14):41-1!7,fevereiro 1999.

Page 54: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

94 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o órgão colegiado de segundo grau, a 3.aTurma do TRFIl.a Região, mante­

ve a decisão a quo de modo assim ementado (fls. 29):

"Processual Civil. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Comarca do interior. Intimação do representante judicial da Fazenda Pública.

1. A intimação pessoal do representante judicial da Fazenda

Pública, prevista no art. 25 da Lei n-º- 6.830, de 22.09.80, pode ser

feita por via postal, mencionando o ato a ser praticado.

2. É dispensável a remessa dos autos juntamente com o expedi­

ente intimatório, especialmente quando a execução corre em comarca

do interior do Estado.

3. Improvimento do agravo."

Nesta instância, a Fazenda interpõe recurso especial (fls. 34/39), sustentan­

do que foi intimada de modo irregular, diante do descumprimento das determina­

ções expressas dos arts. 25, caput, e seu parágrafo único, do CPC, e 38 da Lei

Orgânica da Advocacia Geral da União (LC n-º- 73/93), que dispõem claramente

que as intimações e notificações devem ser feitas pessoalmente.

Colaciona, por fim, ementa da 2il Turma desta Corte para demonstrar o

dissídio jurisprudencial invocado pela alínea c do permissivo constitu,cional.

Sem contra-razões.

Originariamente inadmitido (fls. 41), o recurso especial foi processado por força de agravo de instrumento onde exarei decisão dando provimento ao

mesmo (fls. 46).

É o relatório.

VOTO

O SR MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): Da análise dos pressu­

postos de admissibilidade, afigura-se deficiente a fundamentação do recurso pela

alínea c do permissivo constitucional, posto que o recorrente não logrou de­

monstrar o dissídio pretoriano invocado nos moldes da orientação preconizada

pelo art. 26 da Lei n-º- 8.038/90, em harmonia com os artigos 541, parágrafo

único, do CPC, e 255 e parágrafos do RISTJ, visto que estes exigem o cotejo

analítico das teses divergentes, não se aperfeiçoando com a simples transcrição

de ementa semelhante à hipótese dos autos.

Conheço do recurso, portanto, apenas pela alínea a, e somente pela alegada

ofensa ao art. 25, caput, e seu parágrafo único, da Lei n-º- 6.830/80, por ter sido

o único que foi devidamente prequestionado pela decisão do tribunal a quo. O

RSTJ,Brasília,a.ll, (114): 41-117,fevereiro 1999.

Page 55: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 95

dispositivo 38 da LC nQ 73/93 não se apresenta explicitamente debatido e deci­

dido no corpo do acórdão, capaz de gerar o prequestionamento necessário para

esta fase recursal. Passo ao exame merital.

A mensagem contida no art. 25 da Lei nQ 6.830/80, no sentido de que "Na

execução fiscal, qualquer intimação ao representante judicial da Fazenda Públi­

ca será feita pessoalmente", não admite, pela força co gente e especial contida,

interpretação restritiva. Por intimação pessoal há de se entender aquela feita, via mandado ou com a entrega dos autos, diretamente, em cartório, à pessoa do Pro­

curador que representa o órgão público em juízo. Essa forma de levar à Fazenda Pública o conhecimento de atos processuais,

embora se constitua em privilégio e trato indevido do princípio da igualdade,

encontra, porém, apoio na jurisprudência desta Corte, em face da visão de que,

pela imensa quantidade de causas movidas contra o Estado, há de se impor um

critério de segurança mais aprimorado na referida comunicação.

Mas é necessário esclarecer que o parágrafo único do artigo retromencionado,

não obriga, mas apenas faculta, sejam as intimações feitas mediante vista dos

autos, bastando para se aperfeiçoá-la a comunicação realizada via mandado judi­cial cumprido por oficial de justiça, contendo expressamente o objeto da intimação.

Esta egrégia Corte, no Recurso Especial nQ 84.971-MG, relatado pelo eminente Ministro Antonio de Pádua Ribeiro, publicado no DJU de 05.08.96,

decidiu o que assim está ementado:

"Processual Civil. Execução fiscal. Intimação do representante

da Fazenda Pública.

1 - A intimação da Fazenda Pública, na execução fiscal, deve

ser feita pessoalmente ao seu representante, embora não seja obrigato­riamente mediante a remessa dos autos.

2 -Ao admitir, no caso, como válida a intimação pessoal, feita

por precatória, o acórdão recorrido negou vigência ao art. 25 e seu

parágrafo único, da Lei nQ 6.830, de 22.09.80.

3 - Recurso especial conhecido, mas desprovido."

De igual modo se apresenta o decidido no Recurso Especial n Q 128.376-

MG, também relatado pelo eminente Ministro Antonio de Pádua Ribeiro, pu­

blicado no DJU de 18.08.97, conforme ementa:

"Processual Civil. Execução fiscal. Intimação do representante da Fazenda Pública.

RSTJ,Brasilia,a.ll, (l14):41-117,fevereiro 1999.

Page 56: Jurisprudência da Primeira Turma...nº-7.450/85 - artigo 94 - Restauração da vigência do § 3º-do artigo 3º-do Decreto-Lei nº- 1.438/75. Hipótese que não se confunde com a

96 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

1 - A intimação da Fazenda Pública, na execução fiscal, deve ser feita pessoalmente ao seu representante, embora não seja obrigatoriamente median­te a remessa dos autos. Ofensa ao art. 25 e seu parágrafo único, da Lei ni2 6.830, de 22.09.80, caracterizada.

2 - Recurso conhecido e provido."

Portanto, é unânime o entendimento de que a intimação do representante da Fazenda Pública seja feita pessoalmente, mas neste rol não se encontra obri­gatoriamente o dever da remessa dos autos, via correio, para concretizá-la. A norma do art. 25 da Lei n1l 6.830/80, e seu parágrafo único, não pode ser inter­pretada de forma extrema, mas devidamente temperada. Neste ponto, o presente recurso não merece provimento.

Sob outro ângulo, a intimação foi realizada mediante carta com aviso de recebimento e, quanto a isso, merece prosperar a irresignação do recorrente por­

que tal modo de comunicação do ato processual é ineficaz, não considerado do tipo "pessoal". Eis o entendimento deste Tribunal:

"Processual Civil. Execução fiscal. Intimação do representante da Fazenda via carta com aviso de recebimento: inutilidade. Recurso

especial conhecido e provido. I - Exigindo a lei que a intimação seja feita pessoalmente, nenhum

valor jurídico terá sua efetivação via carta, ainda que seja com AR. H - Tratando-se de ação de execução fiscal, o representante da

Fazenda Pública que estiver oficiando no feito, ou seu substituto,

deverá ser intimado pessoalmente. IH - Inteligência do art. 25 da Lei n ll 6.830 e do art. 38 da Lei

Complementar nQ 73/93. Aplicação da Súmula nll 240 do extinto TFR. IV - Recurso especial conhecido e provido". (REsp nQ 149.184-

PE, reI. Min.Adhemar Maciel, DJ de 16.03.98).

"Processual Civil - Execução fiscal - Fazenda Pública - Re­partição fora da comarca - Intimação.

1- N as execuções fiscais, a intimação da Fazenda Pública sediada fora da comarca onde corre a ação deve ser pessoal e não através de

carta registrada. 2- Recurso especial conhecido e parcialmente provido". (REsp

n1l 85. 730-MG, reI. Min. Peçanha Martins, DJ de 08.09.97).

"Processual Civil. Execução fiscal. Intimação pessoal do re­

presentante judicial da Fazenda Pública. Na execução fiscal, a intimação

RSTJ,Brasília,a.11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURlvlA 97

do representante da Fazenda Pública deve ser feita pessoalmente (Lei

n'" 6.830/80, art. 25), a tanto não se assimilando a intimação por carta com aviso de recebimento. Recurso especial conhecido e provido em

parte". (REspn'" 83.983-MG,rel. Min.Ari Pargendler, DJ de 21.10.96).

Com estas considerações, dou provimento parcial ao recurso, para que a

intimação do representante da Fazenda seja feita, pessoalmente, por mandado,

sem a obrigatoriedade da remessa dos autos. É como voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 168.211-DF (Registro n'" 98.0020499-7)

Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros Recorrentes: Município de São Gabriel da Palha e outros

Recorrido: Fazenda Nacional

Advogados: Luiz Alberto Bettiol e outros e Lília Figueira de Almeida e outros

EMENTA: Processual- Conta de liquidação - Atualização - Precatório

cOlllplelllentar - Juros de lllora.

I - A expedição de precatório não extingue a lllora do Esta·do nelll inter­rOlllpe a contagelll dos juros respectivos.

U - Na expedição de precatório cOlllplelllentar os juros llloratórios de­

velll ser incluídos, até o pagalllento integral da condenação.

lU - Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primei­

ra Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das

notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso. Vota­

ram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Milton Luiz Pereira, José Delgado, Garcia Vieira e Demócrito Reinaldo.

Brasília-DF, 1'" de setembro de 1998 (data do julgamento). Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Relator.

Publicado no DI de 19.10.98.

RSTJ,Brasília,a.11, (l14):41-117,fevereiro 1999.

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98 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

o SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: O acórdão recorrido reputou incabíveis juros moratórios em conta de atualização de precatório complementar. Fincou-se no argumento de que não ocorre mora

quando, expedido este, o pagamento só é efetivado meses depois. O recurso especial foi interposto com fundamento nas alíneas a e c.

Contra-razões, às fls. 213/217. É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): A

questão é conhecida e se encontra superada na Primeira Seção. Dispenso-me, pois, de considerações outras, para ficar com a tranqüila jurisprudência da Casa, lembrada no juízo de admissibilidade, verbis:

"Precatório complementar. Inclusão de juros de mora. Admis­

sibilidade. Cabe, na expedição de precatórios sucessivos, a inclusão dos

juros vencidos até o efetivo pagamento." (2JlTurma - REsp nº 81.759-

DF, ReI. Min. Hélio Mosimann, DJ de 11.03.96 - Seção I-p. 6.611. No mesmo sentido: FTurma - REsp n1l 71.372-DF, ReI. Min. José

de Jesus Filho, DJ de 26.02.96- Seção I - p. 3.955; REsp n1l 67.864-l-DF, ReI. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 16.10.95 - Seção I-p. 34.615; 2JlTurma-REsp nll 78.485-DF, ReI. Min. Hélio Mosimann, DJ de 18.12.95 - Seção I-p. 44.554)"-fls. 219.

Provejo o recurso.

RECURSO ESPECIAL Nº 169.876 - SP (Registro n1l 98.0023955-3)

Relator: Ministro José Delgado Recorrente: Município de São Paulo

Recorrido: Ministério Público do Estado de São Paulo Advogados: José Rubens Barbosa Júnior e outros

RSTJ, Brasília, a. 1l, (1l4): 41-1l7, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 99

EMENTA: Adnlinistrativo - Processo Civil-Ação civil pública.

1. O Ministério Público está legitirn.ado para propor ação civil pública

para proteger interesses coletivos.

2. Impossibilidade do juiz substituir a Administração Pública detenni­

nando que obras de infra-estrutura sejaIllrealizadas eIll conjunto habitacional.

Do IlleSIllO Illodo, que desfaça construções já realizadas para atender proje­

tos de proteção ao parcelaIllento do solo urbano.

3. Ao Poder Executivo cabe a conveniência e a oportunidade de realizar

atos fisicos de administração (construção de conjuntos habitacionais, etc.). O

Judiciário não pode, sob o arguIllento de que está protegendo direitos coleti­

vos, ordenar que tais realizações sejaIll consUIlladas.

4.As obrigações de fazer perITIitidas pela ação civil pública não têIll força

de quebrar a harIllonia e independência dos Poderes.

5. O controle dos atos adITIinistrativos pelo Poder Judiciário está vincula­

do a perseguir a atuação do agente público eIll call1po de obediência aos prin­

cípios da legalidade, da Illoralidade, da eficiência, da irn.pessoalidade, da fina­

lidade e, eIll alguIllas situações, o controle do Illérito.

6. As atividades de realização dos fatos concretos pela adnünistração de­

pende de dotações orçaITIentárias prévias e do prograIlla de prioridades esta­

belecidos pelo governante. Não cabe ao Poder Judiciário, portanto, deterITIinat"

as obras que deve edificar, IlleSIllO que seja para proteger o Illeio aITIbiente.

7. Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Ministros

da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e

notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso. Partici­

param do julgamento os Srs. Ministros Garcia Vieira, Demócrito Reinaldo,

Humberto Gomes de Barros e Milton Luiz Pereira.

Brasília-DF, 16 de junho de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro JOSÉ DELGADO, Relator.

Publicado no DJ de 21.09.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: O Município de São Paulo inter-

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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100 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

põe recurso especial para modificar acórdão com fundamentos sintetizados na ementa (fls. 714) do teor que transcrevo:

"Ação civil pública. Sentença que, afastando as preliminares, con­denou a Municipalidade de São Paulo a regularizar loteamento sob

sua iniciativa (sistema mutirão). Submissão da Municipalidade às dis­posições da Lei nº 6.766/79. Decisão correta que é mantida. Nega-se provimento aos recursos (oficial e voluntário da municipalidade)."

o recorrente entende que a decisão hostilizada negou vigência aos arts. 3º e 267, ambos do CPC, e no mérito, ao art. 40 da Lei nº 6.766/79. Lembra, às fls.

727, que:

"Oportuno observar que o venerando acórdão fez expressa menção a diversos dispositivos legais e constitucionais que embasaram a apelação e que a recorrente, data venia, entende terem sido violados. Assim, repeliu as alegações de ilegitimidade do Ministério Público para propor a ação,

de falta de interesse de agir e da impossibilidade jurídica do pedido. Ou­trossim, entendeu que o caso dos autos não admite o enquadramento no artigo 40 da Lei Federal nº 6.766/79, porque a Municipalidade assumiu a

condição de loteadora."

O Ministério Público Estadual, parte recorrida, apresentou contra-razões,

oportunidade em que sustentou a ausência de prequestionamento da matéria jurídica abordada pelo recurso. Quanto ao mérito, defendeu que o recurso não

merece ser provido. É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO (Relator): Conheço do recurso. A matéria jurídica enfrentada pelo recorrente foi amplamente discutida no acórdão,

conforme será identificada a seguir.

A compreensão dos temas jurídicos desenvolvidos no curso da ação ora exa­

minada, em sede de recurso especial, exige que se tome conhecimento dos termos do relatório da sentença monocrática, fls. 616/618, do teor seguinte:

"O Ministério Público do Estado de São Paulo aforou contra o Mu­

nicípio de São Paulo esta ação civil pública pedindo condenação da ré no

RSTJ,Brasília,a.l1, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 101

cumprimento da obrigação de fazer, no prazo máximo de dois anos (art.

18, inc. V, da Lei nQ 6.766/79), consistente na regularização do parcelamento, das edificações, do uso e da ocupação do solo, relativos ao empreendimen­

to indicado na inicial, na seguinte ordem sucessiva:

a) em caráter principal, mediante apresentação de 'projeto' a ser sub­

metido à aprovação dos órgãos competentes e do registro imobiliário, bem

como posterior execução das obras de infra-estrutura pertinentes, tudo para

sua alteração e integral adequação aos requisitos definidos nas leis munici­pais, estaduais e federal de regência;

b) em caráter alternativo, caso não acolhido o pedido antecedente,

mediante apresentação de' alteração no empreendimento', naquilo que for

necessário, segundo as exigências técnicas feitas pelos órgãos públicos para

a regularização, inclusive com o desfazimento de todo o conjunto ou de

parte inaproveitável, caso absolutamente impossível o aproveitamento das

construções e parcelamento já efetuados, por força de restrições urbanísti­

cas e administrativas invenciveis, indenizando os danos amb.ientais e urba­

nísticos;

c) em ambos os pedidos antecedentes, caso qualquer mutirante ca­dastrado tenha participado do mutirão e não seja contemplado em razão de

alteração do projeto original, seja a ré condenada na indenização por per­das e danos, consistentes na quantificação da mão-de-obra dispendida para

a execução do mutirão (em liquidação de sentença), ou na entrega da uni­

dade habitacional semelhante à que lhe foi reservada no convênio, tudo na

forma da condenação genérica do art. 95 e segs. do CPC, c/c art. 117 e art.

21 daLACP;

d) para a hipótese de descumprimento do prazo da obrigação de fa­zer fixado na sentença, seja estabelecida a obrigação de pagar multa diária

no valor estimado de CR$ 1.000.000,00, mais correção monetária, desti­nada à conta corrente do Fundo de Reparação de Interesses Difusos Lesa­

dos (DE nQ 7.070/87 e art. 13 da Lei nQ 7.347/85).

Em prol de suas pretensões, o autor alegou, basicamente, os motivos abaixo resumidos:

- Em 21.02.90, o Funaps e a Associação dos Trabalhadores Sem­

Terra do Conjunto Habitacional Movimento Unido, celebraram convênio

para construção de 164 unidades residenciais, pelo sistema de mutirão.

- Para a realização do empreendimento a ré utilizou.a área aproxi­

mada de 21.929,1 Om2, tendo aquela associação por possuidora, situada na

Estrada dos Taipas, s/nQ, J. Rincão, Distrito de Perus, Capital-SP.

- Após efetuado o parcelamento do solo, para fins urbanos, no

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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102 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

loteamento denominado 'Conjunto Habitacional Movimento Unido', me­

diante o material adquirido pela associação, os próprios associados

mutirantes edificaram 155 casas, residindo no local 115 famílias mutirantes, porém, há casas inacabadas e não há infra-estrutura pública e a canaliza­

ção de esgoto está incompleta, as verbas do Funaps estão suspensas desde

março/92 e as obras estão paralisadas, com risco de deterioração e dispên­

dio de mais dinheiro público para os reparos. - De acordo com o convênio (cláusulas 8;1 e 9;1), a ré se responsabili­

zou pelas obras de infra-estrutura e projetos complementares, porém, refe­

rido conjunto habitacional pelos órgãos municipais competentes, não hou­

ve prévia anuência do Estado, não houve licença da Cetesb e não houve

registro imobiliário no cartório imobiliário.

- Portanto, o conjunto habitacional está em desacordo com a Lei

Federal n!l. 6.766/79 (arts. 12,13, lI, 18 e 37); com as normas estaduais (em especial Lei n!l. 997/76 - arts. 2/5; Decreto n!l. 8.468/76 - arts. 57, X, e

58, I; Decreto n 12 13.069/78 - arts. 1!l., 312, 412,11,12,17,19 e 20); e normas

municipais (Leis nº" 9.412/81,9.413/81 e 1l.228/92, Decretos .nº" 31.6011

92 e 32.329/92 e seus anexos).

A ré foi citada e apresentou contestação de fls. 532/553, acompanha­da dos documentos de fls. 554/556, consistente na defesa abaixo resumida.

1 - Em primeira preliminar, a ré argüiu impossibilidade jurídica do

pedido com base no art. 30, incs. I e VIII, da Carta Federal, alegando que a Municipalidade, no âmbito dos limites de sua competência constitucio­

nal, editou regras específicas para tratar da matéria estritamente de inte­

resse local, relativa à implantação de conjuntos habitacionais populares.

Portanto, em face do cumprimento da legislação municipal pelas entidades

conveniadas, inexiste regularização a ser promovida no parcelamento. 2 - Em segunda preliminar, a ré argüiu impossibilidade jurídica do

pedido com base no art. 40 da Lei Federal n!l. 6.766/79, alegando que, em

face do dispositivo legal, a Municipalidade não tem o dever, mas, sim, a

faculdade de regularizar o loteamento, de acordo com a conveniência e

oportunidade, cujo ato discricionário não pode ser objeto de condenação

judícial.

3 - Em terceira preliminar, a ré argüiu a ilegitimidade ativa do Mi­

nistério Público alegando inexistência de interesse difuso na presente ação.

Para tanto, argumenta que um dos requisitos da configuração do interesse

difuso é a indeterminação dos sujeitos, cuja característica es.sencial é a

inexistência de vínculo jurídico entre os beneficiários. Portanto, os inte­

resses discutidos nesta ação civil pública, não se caracterizam com interes-

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 103

ses difusos, porque os seus beneficiários são pessoas determináveis, os quais

estão inscritos junto à Associação. 4 - Quanto ao mérito, a ré pediu improcedência da ação alegando,

em síntese, que:

- A Municipalidade não pode ser equiparada ao loteador particular,

no tocante ao parcelamento do solo, para fins de cumprimento da Lei nQ

6.766/79, porque os interesses de um e de outro são diversos, pena de ofensa ao princípio da isonomia, que exige tratamento desigual aos desi­

guais.

- A legislação federal não previu o parcelamento do solo pela pró­pria Municipalidade, portanto, a Lei Federal nQ 6.766/79· não pode ser

aplicada aos Programas de Mutirão, porque se trata de hipótese não pre­vista em lei, pena de ofensa ao princípio da legalidade.

- Inexiste prejuízo aos participantes e à coletividade pelo Programa de

l\1.utirão, o qual beneficia os mutirantes que deixam de habitar lugares im­próprios e adquirem imóvel em local equipado com todos os melhoramen­

tos urbanos, cujo benefício atinge toda coletividade, a qual passa a conviver

com um centro urbano humano e digno.

- A Municipalidade mantém fiscalização permanente na implanta ção

dos mutirões, os quais obedecem rigorosamente às normas contidas no DM nQ 31.601/92, além do que as obras de infra-estrutura são realizadas

por empresas contratadas pelo Poder Público, as quais respeitam as exi­

gências dos órgãos técnicos municipais para sua aceitação técnica. - O pedido de indenização de danos ambientais e aos mutirantes, na

hipótese de impossibilidade de regularização do loteamento, é descabido

porque colide com o espírito da criação do Funaps.

- A responsabilização da Municipalidade por qualquer dano ao meio ambiente e aos mutirantes há a necessidade de demonstração da culpa,

pela incúria, desmazelo ou recusa em impedir evento danoso que poderia

ser por ela impedido, o que incorreu no presente caso.

Na réplica de fls. 558, acompanhada dos documentos de fls. 575/596,

o autor rebateu as preliminares e insistiu no pedido, sobrevindo novas manifestações das partes.

Nesta fase, na forma do art. 330, I, do CPC, o processo comporta julgamento antecipado."

Necessário se faz, também, complementar o referido relatório com o que

compõe o acórdão recorrido apresentado do modo que passo a transcrever (fls.

714/715):

RST},Brasília,a.ll, (l 14): 41-117,fevereiro 1999.

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104 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"O Ministério Público do Estado de S. Paulo ajuizou ação civil pú­

blica contra Municipalidade de S. Paulo. Visando a condená-la em obriga­

ção de fazer, no prazo máximo de dois anos (art. 18, V, da Lei nD. 6.766/79) consistente na regularização do parcelamento, das edificações, do uso e da

ocupação do solo, relativamente ao loteamento descrito na inicial, confor­

me a ordem ali constante.

Ao relatório de fls. 616/618, adotado, acrescento que a r. sentença,

afastando as preliminares da contestação, julgou a ação inteiramente pro­cedente.

Houve determinação de reexame necessário.

Apela a ré (fls. 624/639), visando à integral reforma da decisão de

primeiro grau, com o acolhimento das preliminares de sua contestação, e

improcedência da ação.

Recurso tempestivo, contrariado (fls. 654/660) e isento de preparo.

A manifestação do Ministério Público, nesta instância, é pelo improvimento do recurso (fls. 7031708).

É o relatório."

Conhecidos os debates desenvolvidos até o julgamento da apelação inves­tigo, agora, o teor do voto-condutor do acórdão recorrido (fls. 715/719):

"O ilustre Magistrado prolator da sentença recorrida, como sempre

faz, deu correta solução à lide, tendo decidido brilhantemente, à forma de

seu costumeiro proceder.

As preliminares foram muito bem afastadas na r. sentença recorrida.

Com efeito, não há falar-se em ilegitimidade de parte do Ministério

Público para a propositura da presente ação, nem em falta de interesse de agir, e menos ainda em impossibilidade jurídica do pedido, consoante bem

decidido na decisão de primeiro grau, e à forma sustentada pelo douto

Procurador de Justiça oficiante.

Evidentemente, o parcelamento e o uso do solo constituem-se em

interesses difusos, a serem defendidos pelo Ministério Público, na forma

de ação civil pública. Cabe aqui ser transcrito o que afirma o autor em

contra-razões recursais (fls. 657/658): 'Vale lembrar da legislação já devi­

damente prequestionada, que dá suporte às alegações do autor: art. 129,

lII, Constituição Federal; arts. 1D., inciso IV, 5D. e 21, da Lei nD. 7.347/85-

Lei da Ação Civil Pública; arts. 81, 82, 110 e 117 da Lei nD. 8.078/90 -

Código de Defesa do Consumidor; art. 25, IV, a, da Lei nD. 8.625/93 -Lei

Orgânica do Ministério Público. Compete ao Ministério Público a de-

RSTJ,Brasilia,a.ll, (114): 41-1l7,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 105

fesa dos interesses difusos, coletivos e dos individuais homogêneos (os

direitos dos mutirantes), inclusive em face do Poder Público, pois o legislador não o isentou da responsabilidade pelos danos por ele causa­

dos (art. 37, § 62 , da Constituição Federal; art. 15, Código Civil), nem

da recuperação do meio ambiente urbano e natural (Constituição Esta­

dual, arts. 180, lII, e 191; Lei Orgânica do Município de São Paulo;

art. 148, IV), atribuindo ao parquetfunção institucional específica, in­

clusive para fazer o Poder Público respeitar os direitos eleitos pela

Constituição Federal (art. 129, lI)'.

Da falta de interesse jurídico do autor, também não se pode cogitar,

porquanto se a lei atribui ao Ministério Público a defesa de interesses difusos, na ação civil pública em que o autor isto postula, presente se

encontra o seu interesse de agir.

Ademais, não se pode acoimar de impossível, o pedido que a lei ex­

pressamente prevê, como acima bem esclarecido.

No mérito, a decisão de primeiro grau só pode ser mantida.

F oi a presente ação civil pública julgada procedente em sua integralidade,

em razão do que a Municipalidade-ré restou condenada "no cumprimento de

obrigação de fazer, no prazo máximo de dois anos (art. 18, inçiso V, da Lei nU

6.766/79), constante da regularização do parcelamento, das edificações, do

uso e da ocupação do solo, relativos ao empreendimento indicado na inicial,

na seguinte ordem sucessiva: a) em caráter principal, mediante apresentação de 'projeto' a ser

submetido à aprovação dos órgãos competentes e do registro imobiliário, bem como posterior execução das obras de infra-estrutura pertinentes, tudo

para sua alteração e integral adequação aos requisitos definidos nas leis

municipais, estaduais e federal de regência;

b) em caráter alternativo, caso impossível a referida regularização,

mediante apresentação de 'alterações no empreendimento', naquilo que

for necessário, segundo as exigências técnicas feitas pelos órgãos públicos

para a regularização, inclusive com o desfazimento de todo o conjunto ou

de parte inaproveitável, caso absolutamente impossível o aproveitamento

das construções e parcelamento já efetuados, por força de restrições urba­

nísticas e administrativas invencíveis, indenizando os danos ambientais e urbanísticos;

c) em ambas obrigações antecedentes, caso qualquer mutirante ca­

dastrado tenha participado do mutirão e não seja contemplado em razão de

alteração do projeto original, condeno a ré ao pagamento de indenização

por perdas e danos, consistentes na quantificação da .mão-de-obra

RSTJ,Brasília,a.ll, (l14):41-117,fevereiro 1999.

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106 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

despendida para a execução de mutirão (em liquidação de sentença), ou na

entrega da unidade habitacional semelhante à que lhe foi reservada no convênio, tudo na forma da condenação genérica dos arts. 95 e segs. do CPC, c/c art. 117 e art. 21 da LACP;

d) para a hipótese de descumprimento do prazo da obrigação de fa­

zer fixo multa diária no valor estimado de CR$ 1.000.000,00, válido para

a data do ajuizamento mais correção monetária, até a fase de liquidação, destinada ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados (DE n.9. 7.070/87 e art. 13 da Lei n.9. 7.347/85)".

Bate-se a Municipalidade, primordialmente, por não estar submetida às obrigações previstas na Lei de Parcelamento do Solo Urbano (Lei n.9.

6.766/79). Todavia, seus argumentos não prosperam. Provado nos autos que o empreendimento 'Conjunto H~bitacional

Movimento Unido' foi promovido pela Municipalidade, através do siste­

ma de mutirão, com recursos do Funaps (Fundo de Atendimento à Popu­lação Moradora em Habitação Subnormal), daí decorrendo o conseqüente parcelamento da gleba onde se iniciou (mas não se concluiu) a construção

de casas populares, não pode a apelante - por mais sedutores que sejam os argumentos - deixar de cumprir o que determina a Lei n.9. 6.766/79.

Não logrou a apelante, em momento algum, demonstrar que está desobrigado de cumprir a Lei Federal em tela, assente nos autos que pos­

ta-se ela na condição de lote adora ou empreendedora, e como tal sujeita ao cumprimento da Lei de Parcelamento do Solo, em especial artigos 6.9. e seguintes, relativamente ao projeto de loteamento, de desmembramento, e ao registro de ambos, evidentemente sem as exigências próprias de pessoas

físicas ou jurídicas de direito privado (certidões negativas de protestos, ações penais, etc.).

É claro que o legislador, atento às peculiaridades dos loteamentos destinados a conjuntos habitacionais rotulados como de 'interesse social',

como o de que trata esta Ação, em seu art. 4.9., II, permitiu que os lotes tivessem área menor do que a prevista para outro loteamento (125m2), mas

ainda assim, devem ser os mesmos 'previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes'.

Doutra parte, o artigo 40 da Lei n.9. 6.766/79, realmente, encerra uma

faculdade para a Prefeitura Municipal regularizar o loteamento ou desmembramento. Todavia, tal faculdade diz respeito ao não cumprimento

das exigências legais pelo loteador. No caso em julgamento, o loteador é a

própria Municipalidade que não pode invocar a faculdade ora referida. E o reconhecimento administrativo de que deve submeter-se às exi-

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 107

gências da legislação específica foi feito pela Secretaria de Habitação e

Desenvolvimento, através da Portaria n!l. 722/Sehab-0/93 (fls. 497), que

constitui Grupo Trabalho com a 'incumbência de equacionar os proble­

mas, propor soluções e estabelecer os procedimentos administrativos vi­

sando à regularização, inclusive junto aos demais órgãos públicos envolvi­

dos, dos empreendimentos habitacionais de interesse social implantados no âmbito do Programa Funaps Comunitário. E, se os estudos se destina­

vam a regularizar, depreende-se que irregular se encontravam, e encon­tram-se, os loteamentos, como não nega a Municipalidade, apenas argu­

mentando não estar sujeita à legislação específica, como se a administra­

ção pública não devesse pautar seu procedimento pelo princípio da legali­dade, assim como de impessoalidade, moralidade e publicidade (Consti­

tuição Federal, art. 37, caput).

Não se nega a importância social do empreendimento, mas é no pró­

prio interesse dos mutirantes que a lei deve ser cumprida, sob pena de

nunca adquirirem o domínio da sonhada casa própria. Ou pior, sem que a

Municipalidade cumpra as normas legais, relativamente ao saneamento

básico, vias públicas, áreas de lazer, acesso a vias públicas já existentes,

condições de salubridade das habitações, etc., é bem provável que os beneficiários do empreendimento - cujo interesse social é inegável- con­tinuem morando em residências subnormais.

E não há como se afastar a responsabilidade indenizatória da Municipalidade, caso os mutirantes não tenham à sua disposição as unida­

des residenciais que lhes foram prometidas, e para as quais trabalharam, acreditando no projeto, o que parece não ter acontecido com a Secretaria

de Habitação, porquanto, como alegado na inicial, e não contestado (fls.

5), as obras estão paralisadas desde março/92. A indenização, a que se refere a r. sentença, decorre do previsto no Código Civil (art. 159) e na

Constituição Federal (art. 37, § 62), posto que evidente a culpa da

Municipalidade, por haver-se omitido na regularização do loteamento.

No que diz respeito à multa, é bem de ver-se que a mesma não tem o sentido indenizatório, como insinua a apelante, mas sim o de

penalidade, somente aplicável na hipótese de não cumprimento da obriga­

ção de fazer estabelecida em sentença. E, na medida em que destinada ao

Fundo Especial de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Decreto Es­

tadual n!l. 7.070/87 c/c art. 13 da Lei n!l. 7.347/85), não se pode cogitar de

enriquecimento ilícito de quem quer que seja.

Quanto ao seu valor, nada apresenta de excessivo. Considerando-se a cotação do dólar americano a CR$ 755,52 no dia do ajuizamento

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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108 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(07.03.96), conforme publicado no BoletimAASP - n!l1920, pp. 5, 11

a 17.10.95, Suplemento, a multa diária de CR$ 1.000.OClO,00 cor­

responde a aproximadamente US$ 1.323,60. Portanto, de bom tama­nho, tendo-se em vista a importância da obrigação a ser cumprida, e a presunção que a municipalidade não se furtará ao cumprimento de

decisão judicial.

N o mais, a r. sentença deve ser mantida integralmente. Na verdade, o decidido em primeiro grau não comporta modificação,

devendo ser mantido por seus próprios e jurídicos fundamentos, daí porque

deve ser negado provimento ao recurso da apelante, e também ao recurso oficial,

mantida íntegra a r. sentença."

Aprecio, por ser preferencial, a preliminar de ilegitimidade do Ministério

Público para promover a presente ação. O recorrente afirma que o Ministério Público é parte ilegítima para pro­

mover a presente ação, por não existir, no caso em espécie, interesse difuso a ser

protegido pelo caminho da ação civil pública.

Atento ao conceito de interesses difusos e ao de interesses coletivos, rejeito

a preliminar.

No caso em apreciação, embora não estejam caracterizados interesses

difusos, entendo que estão presentes interesses coletivos representados pelos

mutirantes.

Aceitando a corrente que defende haver a Lei da Ação Civil Pública e do

Código de Defesa do Consumidor aplicado às expressões direito e interesses como sinônimo, acosto-me aos entendimentos dos que afirmam ser direito difuso o de

natureza transindividual, indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e indetermináveis, ligadas entre si por circunstâncias de fato (Código de Defesa

do Consumidor, art. 81, parágrafo único: Direitos coletivos são os transindividuais,

de natureza indivisível de que sejam titulares grupo, categoria ou classe de pesso­

as, ligados entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica-base).

Penso que, em conseqüência, ocorre a legitimidade do Ministério Público

para promover a presente ação civil pública, visando a proteger os interesses

coletivos dos titulares da categoria de mutirantes convocados para participarem

do empreendimento.

Rejeito a preliminar.

Em face do panorama processual acima revelado tem-se como configurada

uma ordem emanada do Poder Judiciário, consubstanciada em uma obrigação

de fazer, em prazo certo, para que o Poder Executivo, às suas expensas, pratique

atividades de natureza administrava no sentido de promover a regularização de

RSTJ, Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURlvlA 109

parcelamento do solo referente ao cOl;1junto habitacional identificado nos autos

e implantado em sistema de mutirão. Em síntese, o Poder Judiciário está a determinar ao Poder Executivo que,

com prazo de (2) dois anos para conclusão, sob pena de multa diária, realize as

seguintes atividades administrativas:

a) regularização do parcelamento, das edificações, de uso e da ocupação do solo, tudo relativo ao conjunto habitacional descrito na inicial;

b) apresente, em conseqüência, projeto a ser submetido à aprovação dos

órgãos competentes e do registro imobiliário, para que, posteriormente, após a

aprovação de tais projetos, execute obras de infra-estrutura necessárias ao funci­

onamento do conjunto habitacional; c) ou, se impossível regularizar a ocupação do solo com a aprovação de

tais projetos, apresente outros projetos alterando o empreendimento naquilo que

for necessário, segundo as exigências técnicas dos órgãos públicos, procedendo

o desfazimento de todo o conjunto habitacional ou de parte inaproveitável, caso

seja absolutamente impossível o aproveitamento das construções já realizadas;

d) em ambas as obrigações antecedentes determinadas, caso o mutirante

tenha participado do mutirão e não tenha sido contemplado com um imóvel,

deve a Prefeitura indenizá-lo por perdas e danos, consistentes na quantificação da mão-de-obra despendida para a execução do mutirão.

Determinou, ainda, o acórdão que, se o recorrente, Município de São

Paulo, não cumprir as obrigações de fazer acima mencionadas, pagará multa diária de CR$ 1.000.000,00, valor válido para a data de ajuizamento da ação,

mais correção monetária, tudo destinado ao Fundo Estadual de Reparação de

Interesses Difusos Lesados.

Sou do entendimento de que o recurso merece ser provido. Tenho em conside­

ração, na formação do meu convencimento, a manifestação recursal de fls. 727/732:

"Ademais, admitindo-se, por hipótese de argumentação, fosse mes­

mo necessária a providência de se regularizar o mutirão aqui tratado, tal

pedido também estaria eivado de impossibilidade.

Pleiteia-se, no âmbito deste feito, que a Municipalidade seja conde­nada a promover a regularização do parcelamento do solo, referente ao

conjunto habitacional implantado em sistema de mutirão.

Entretanto, se provida a pretensão estar-se-ia ofendendo o Princípio

da Separação dos Poderes, preceituado no art. 2D. da Constituição Federal.

Como é sabido, o Poder Público só pode fazer o qu.e a lei manda

(Poder Vinculado) ou autoriza (Poder Discricionário). Os atos que se classi­

ficam como vinculados têm seus contornos quase que totalmente delineados

RSTJ,Brasília,a.ll, (l14):41-117,fevereiro 1999.

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llO REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

pela lei, que deve fielmente ser observada pelo agente público, sob pena de

nulidade do ato. Sendo a prática de tais atos um dever da Administração, a contrario sensu, constituem um direito dos administrados. Assim, a omis­são do agente público na prática de tais atos ou a sua prática sem a fiel

observância do enunciado da lei, em todas as suas especificações, traria ofensa

a direito do administrado que, no primeiro caso, poderia, através do Poder Judiciário, compelir a Administração à prática do ato, e no segundo, a decla­

rar a sua nulidade. O mesmo não ocorre, porém, com relação aos atos dis­

cricionários. Nesta categoria de atos, embora o agente público esteja vincu­

lado à forma legal para a realização do ato, à sua finalidade, que é, sempre,

o interesse público, e deva ser competente para praticá-lo, tem liberdade de

escolha de sua conveniência, oportunidade e conteúdo. Cabe, pois, ao agente

público escolher sobre a conveniência e oportunidade para prátÍca dos atos

discricionários. Nisso não pode o Poder Judiciário substituí-lo.

Nesse sentido, oportunas são as palavras de Hely Lopes Meirelles:

'O que o Judiciário não pode é, no ato discricionário, substituir

o discricionarismo do administrador pelo do juiz. Mas, pode sempre proclamar as nulidades e coibir os abusos da Administração'. (In 'Di­

reito Administrativo Brasileiro', 1811 edição, p. 105).

O Judiciário pode, sim, rever o ato discricionário e, se for o

caso, declará-lo nulo, pois nenhuma lesão de direito pode ser exclu­

ída da apreciação do Poder Judiciário; o que não pode, repita-se, é

determinar que o agente público pratique um ato discricionário cuja

escolha de conveniência e oportunidade lhe pertence.

No caso específico destes autos, a Municipalidade teria, natu­

ralmente, afaculdade, mas não o dever, de regularizar o loteamento segundo critério de conveniência e oportunidade, fundamentada na

regra do art. 40 da Lei Federal nQ 6.766/79.

A Municipalidade, consoante os interesses da coletividade e os ditames da Lei, poderá entender conveniente proceder à regulariza­

ção desta área específica, destinando, para tanto, receita própria; mas,

jamais poderá ser condenada a fazê-lo de forma compulsÓria.

A propósito do art. 40 da mencionada Lei Federal, Diógenes

Gasparini comenta: 'É o que indica o dispositivo ao enunciar, nas

hipóteses que mencionou que o Município poderá. Esse verbo indica

uma faculdade. Destarte, não está o Município obrigado a regulari­

zar. A regularização será feita se for conveniente e oportuno para o

Município. Não seria, ainda, correto entender nessa outorga uma

RST.T, Brasília, a. ll, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA III

obrigação, já que as entidades políticas, por legislação ordinária, não

impõem deveres ou obrigações'.

(In 'O Município e o Parcelamento do Solo', Editora Saraiva,

2il. edição, pp. 145/146).

Daí que não pode a pretensão condenatória, no presente feito,

ser instrumentalizada, sem que se transforme o juiz em administra­

dor das finanças, obras e prioridades públicas, ferindo o Princípio da

Independência entre os Poderes.

N esse sentido, Cândido Rangel Dinamarco esclarece:

'Outro exemplo muito expressivo e vigorante (da impos­

sibilidade jurídica do pedido) é a incensurabilidade do mérito

de ato administrativo em via jurisdicional: chocar-se-ia com o

princípio da independência entre os 'Poderes' do Estado a in­

tromissão de um deles nos critérios de oportunidade e conveni­

ência dos negócios de outro ( ... )' ('A Execução Civil', 2il. edi­

ção, Editora RT, p. 214).

Assim, inclusive, já decidiu o próprio egrégio Tribunal de Justi­

ça, pela Sétima Câmara Civil, que, por votação unânime, deu provi­

mento ao recurso de apelação n Q 236.882-114 da Municipalidade. Pede­

se vênia para efetuar a transcrição de alguns trechos importantes.

'Ademais, se se chegasse à questão de fundo, seria preciso

lembrar que o Poder Judiciário não pode substituir o Executivo

na determinação das políticas administrativas a cargo deste, pena

de se suprimir a administração à luz das diretrizes hauridas na

eleição popular em prol de diretrizes judiciárias formadas à mar­

gem da interpretação de lei inexistente.

Não há como interferir, o Judiciário, no âmbito da discriciona­

riedade administrativa, salvo, é claro, o caso de ilegalldade, marcada

pelo abuso ou desvio de poder - de que não se cogita, no caso.'

Portanto, resulta que o pedido de condenação consistente na regula­

rização do mutirão, nos parâmetros fixados na Lei Federal n Q 6.766/79,

desconsiderando a legislação municipal específica, é juridicamente impos­

sível, impondo-se, por conseguinte, a decretação da carência da ação."

O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário, em nosso

RST], Brasília, a. lI, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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112 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ordenamento jurídico, não permite que o Executivo seja substituído, na exe­

cução das atividades de administração, pelo Poder Judiciário. Este, no exercício

de sua função constitucional, exerce, apenas, controle sobre a competência, for­ma, finalidade, motivo e objeto do ato administrativo. Nunca, porém, na

concernente à execução de atos de administração, haja vista que, no particular,

deve ser respeitada a autonomia do Executivo em definir, no uso de sua ativida­

de discricionária, da conveniência e oportunidade de atuar, tudo vinculado à

previsão orçamentária e ao programa de governo.

O controle exercido pelo Poder Judiciário sobre tais atos e sobre seu con­

teúdo, isto é, se, ao serem executadcs os princípios da legalidade, moralidade,

transparência, impessoalidade, formalidade foram obedecidos. Poderá suspendê­

las se ofensas aos mencionados princípios forem detectadas. Diferente, porém,

é, em substituição à atividade administrativa do Poder Executivo, determinar

que sejam executados.

A função administrativa, no seu sentido objetivo, material ou funcional, exercida pelo Poder Executivo, só se submete ao controle do Poder Judiciário

quando inicia o seu ciclo para alcançar a consumação. Em outras palavras, o

controle exercido pelo Poder Judiciário é sobre o atuar do Poder Executivo, fa­

zendo com que ele obedeça, no exercício de tal ação, aos princípios impostos pelo

ordenamento jurídico: legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação, impessoalidade e, em determinadas situações, o controle do mérito.

Por tais fundamentos, dou provimento ao recurso. É como voto.

Relator: Recorrente:

Recorrido:

Advogados:

RECURSO ESPECIAL Nº 176.310-RS (Registro n]} 98.0039864-3)

Ministro Humberto Gomes de Barros

Curtume Fridolino Ritter Ltda

Companhia Estadual de Energia Elétrica - CEEE

Tatiana Hoffman de Oliveira Gonçalves e Helder Ricardo Rocha

de Menezes

Sustentação Oral: Andrea da Silva Frota (pela recorrida)

EMENTA: Administrativo - Tarifa de energia elétrica - Plano Cruzado­

Decretos-Leis nm; 2.283 e 2.284/86 - Congelamento de preços - Portarias nm; 38

e 45/86 - llegalidade -Tese pacificada no STJ.

RSTJ,Brasília,a.11, (114): 41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURMA 113

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou-se no sentido

da ilegalidade das Portarias n~ 38 e 45/86 do DNAEE, que majoraram a tarifa de energia elétrica em contraposição ao congelamento de preços instituído

pelos Decretos-Leis n~ 2.283 e 2.284/86. O congelamento, entretanto, não con­

taminou os reajustes ocorridos após seu termo finaL

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primei­

ra Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Humberto

Gomes de Barros e José Delgado, conhecer do recurso, no mérito, por unanimi­

dade, dar-lhe provimento. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros

Milton Luiz Pereira, José Delgado, Garcia Vieira e Demócrito Reinaldo.

Brasília-DF, 25 de agosto de 1998 (data do julgamento).

Ministro MILTON LUIZ PEREIRA, Presidente.

Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Relator.

Publicado no DI de 19.10.98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS: Cuida-se de recurso especial (alíneas a e c), dirigido a acórdão doTribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul, assim resumido:

"Direito Administrativo.

Plano Cruzado. Congelamento de preços. Aumento de tarifas.

Possibilidade excepcional de revisão.

l. Não obstante tenha o Decreto-Lei n!! 2.284, de 10.03.86, por

seu art. 35, determinado o congelamento geral de preços, abriu ele,

com o art. 36, como exceção, a possibilidade de revisão, mesmo por­

que, se não excepcionasse, haveria contrariedade a preceito constitu­cional (art. 167, lI, da Carta de 1969).

2. As Portarias n~ 38, 45 e 153, do DNAEE, de 27.02.86,

04.03.86 e 27.11.86, respectivamente, são válidas por não contraria­

rem as disposições dos arts. 36 do Decreto-Lei n!! 2.283, de 27.02.86,

e 35 do Decreto-Lei n!! 2.284, de 10.03.86.

Recurso provido." (fl. 261).

RSTJ,Brasília,a.ll, (I 14): 41-117,fevereiro 1999.

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114 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Este o relatório.

VOTO-MÉRITO

o SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): A

matéria dos autos é conhecida e resta superada nesta Corte. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está pacifica­

da no sentido de:

"Administrativo - Tarifa de energia elétrica - Plano Cruzado­

Congelamento - Decretos-Leis n"s 2.283 e 2.284/86 Portarias n"s

38/86 e 45/86 - Súmula n" 83-STl

1. No eito de jurisprudência uniformizada em embargos de di­

vergência, é ilegítima a majoração da tarifa de energia elétrica

estabelecida por portarias (DNAEE n"s 38 e 45/86).

2. Precedentes da jurisprudência - Súmula do STl

3. Recurso improvido" (REsp n" 63.670-PR, DJ de 25.03.96,

Relator Ministro Milton Luiz Pereira - PTurma);

"Administrativo. Tarifa de energia elétrica. Plano Cruzado. Con­

gelamento de preços. Reajustamento. Portarias n"" 38/86 e 45/86 do

DNAEE. Decretos-Leis n"" 2.283, de 27.02.86 e 2.284, de 10.03.86.

Ilegitimidade das Portarias, porque violam o congelamento de

preços instituídos pelos Decretos-Leis.

Precedentes do STl

Recurso provido" (REsp n" 88.778-SP, DJ de 20.05.96, Relator Ministro Hélio Mosimann).

Dou provimento ao recurso.

Esclareço que o congelamento não contaminou os reajustes ocorridos após

seu termo final.

VOTO-PRELIMINAR (VENCIDO)

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Sr.

Presidente, a sustentação oral da Dra. Andréa demonstrou com muito brilho a

situação em que foi construído o acórdão.

Em verdade, o acórdão limitou o alcance do Decreto-Lei n" 2.283, afirman-

RSTJ,Brasília,a.l1, (114):41-117,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURlvlA 115

do que o preceito constitucional do equilíbrio do contrato resultaria violado em

se tratando de concessionária de serviço público se o aumento das tarifas fosse obstado com aplicação do decreto-lei. Ora, o que o acórdão fez, a meu sentir, foi

afirmar que seria inconstitucional o decreto-lei se aplicado a essas situações.

Parece-me que o acórdão foi erigido sob a égide da Constituição.

Deste modo, não conheço do recurso.

ESCLARECIMENTOS

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Ministro Humberto Gomes de

Barros, o que me preocupa é que o acórdão decidiu contra o entendimento

reiterado da Primeira e Segunda Turmas da Primeira Seção.

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Sr.

Ministro Garcia Vieira, mas com o fundamento que nos é proibido examinar, qual seja, o da constitucionalidade.

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Ministro Humberto Gomes de

Barros, resta saber se o fundamento constitucional é suficiente para podermos

aplicar a nossa Súmula n!2 126.

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Sr. Ministro Garcia Vieira, parece-me que não só é suficiente como também é único.

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Srs. Ministros, o não

conhecimento não altera a nossa jurisprudência. Não sei se V. Exas. se recordam, mas, em princípio, defendi, com certo ardor, que essas tarifas de energia elétrica

poderiam ser alteradas, porque o art. 167, inciso lI, da Constituição Federal o permitia expressamente. O art. 36 do Decreto nº- 2.284, permitia também, em

certos casos, a alteração da tarifa, mas esse ponto de vista não prevaleceu na

egrégia Primeira Seção. Então, comecei a acompanhar a jurisprudência da Se­

ção. A matéria era, realmente, constitucional e pode ser decidida com base na

Constituição Federal pretérita.

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Sr. Ministro Demócrito Reinaldo, mas se o acórdão de origem se limitou a aplicar

o decreto sem fazer referência à Constituição, teremos que afirmar aqui.

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Ministro Demócrito Reinaldo,

a matéria é também constitucional porque há matéria infraconstitucional, tanto que julgamos centenas de precedentes.

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Sr. Ministro Garcia

Vieira, julgamos e continuaremos julgando. Não conhecer do recurso não altera

nossa jurisprudência. O que afirmei é que é nulo o aumento de tarifa de energia elétrica na vigência do Decreto n!2 2.283.

RST], Brasília, a. 11, (114): 41-117, fevereiro 1999.

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116 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Srs. Ministros, fui tentado a liquidar este processo através de decisão unipessoal, no entanto, como era matéria ainda nova, pensei ser melhor examinarmos isso.

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: Srs. Ministros e eminente Minis­tro-Presidente, o que me impressiona é que o fundamento constitucional transi­

tou em julgado. Então, certo ou errado, não cabe a nós, por via de recurso especial, modificá-lo.

Não há matéria infra constitucional autônoma. Venho defendendo que o recurso especial apenas pode analisar legislação infraconstitucional autônoma,

ou seja, legislação infraconstitucional não contaminada diretamente pelos prin­cípios da Constituição Federal. É o que o Supremo Tribunal vem defendendo

em inúmeras posições. Se há qualquer preponderância de matéria c.onstitucio­nal no acórdão, se esta transitar em julgado, não podemos conhecer do recurso

especial. O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Ministro José Delgado, essa é a

nossa Súmula nD.126.

O SR. MINISTRO JOSÉ DELGADO: Exatamente, Sr. Ministro Garcia

Vieira, por isso tenho aplicado com muita intensidade a suspensão do recurso especial, quando observo a preponderância da matéria constitucional, envio-o

para o Supremo Tribunal Federal, aplico o que diz o Código. Não cabe recurso dessa minha decisão até que a matéria constitucional fique definitiva. Não posso invadir a competência da matéria constitucional.

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Srs. Ministros, pelo que

estou deduzindo, o Sr. Ministro-Relator propõe uma solução, em preliminar,

pelo não conhecimento.

VOTO-MÉRITO

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Sr.

Presidente, quanto ao mérito, a própria patrona reconhece que o provimento é inevitável.

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA (Aparte): S~. Ministro Humberto Gomes de Barros, datíssima vênia, ouso sugerir a V. Exa. para evitar­

se embargos declaratórios da companhia de eletricidade, que no acórdão limite­se até onde essa ilegalidade estaria estabelecida, ou se ela teria condições de macular os reajustes que aconteceram depois. A nossa jurisprudência faz uma distinção a partir da Portaria nD. 153.

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Não me parece que esteja em causa.

RSTJ,Brasília,a.ll, (l 14): 41-1 17,fevereiro 1999.

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JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA TURlv[A 117

o SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Mas, efetivamente, tem

significação, dado o conteúdo, pois é uma ação de restituição de indébito e o pedido é geralmente amplo.

Portanto, V. Exa. acomoda-se, no mérito, à nossa juriSprudência?

O SR. MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): Sem

dúvida. Reconhecendo que há divergência, praticamente me aco.modo e o faço

com alegria. Superado esse fundamento constitucional é a nossa jurisprudência

da qual fui contribuinte efetivo.

VOTO-PRELIMINAR

O SR. MINISTRO GARCIA VIEIRA: Sr. Presidente, peço vênia ao

eminente Ministro-Relator e ao Ministro José Delgado para divergir, acompa­

nhando o voto de V. Exa. Ministro Milton Luiz Pereira.

Também entendo que a matéria é essencialmente infraconstÍtucÍonal. O

acórdão assentou-se na Portaria nl! 3.845 do DNAEE e nos Decretos-Leis n llli

2.283 e 2.284. A menção ligeira à Constituição não chega a ser suficiente para

manter o acórdão. A nossa Súmula nl! 126 é no sentido de que é inadmissível

recurso especial quando o acórdão recorrido assenta-se em fundamentos consti­tucional e infra constitucional, qualquer deles suficientes por si só para man~ê­

lo, e a parte vencida manifesta recurso extraordinário.

No caso, entendo que o fundamento constitucional não. é suficiente para

manter o acórdão. Se tirássemos o fundamento infra constitucional não haveria como manter o acórdão.

Gostaria de lembrar que o acórdão recorrido é contra a jurisprudência

tranqüila deste Tribunal e isso nos preocupa.

RST],Brasília,a.ll, (114):41-117,fevereiro 1999.

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