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1 LANCETA E CORPO PRIMORDIAL artigo de Ricardo Costa http://ricardocosta.net Era uma vez um pequeno animal que surgiu no mar há bem mais de quinhentos milhões de anos. Deixou descendentes muito parecidos com ele que ainda são vivos e que por aí andam. Nós próprios, os seres humanos, a ele devemos aquilo que somos. Aqueles que com ele mais se parecem não andam longe de nós. A criatura, um verme, ainda não tem nome. Aos seus descendentes mais próximos deram os cientistas o título pomposo de ANFIOXO LANCEOLADO(Branchiostoma lanceolatum, vulgo : peixe-lanceta ou lanceta, lancelet em inglês e francês). o progenitor, verme marinho de 2 cm de comprimento o lanceta, seu descendente, meio verme e meio peixe cauda em forma de colher boca arredondada barbatana caudal parte anterior do corpo No processo evolutivo, a cauda do progenitor converte-se em barbatana caudal e a parte anterior do seu corpo na boca e cabeça do lanceta. São os primeiros cordados na história da evolução, caracterizando-se por terem um cordão nervoso dorsal que se desenvolve dando origem aos vertebrados (01 01A). Animais de corpo mole, decompõe-se logo que morrem. São raros os seus fósseis. É graças aos seus parentes vivos – que mantêm a sua morfologia, as características básicas de um corpo primitivo (há várias espécies de lanceta) e que povoam certos espaços dos oceanos de hoje –, que os cientistas conseguem perceber como tais criaturs eram na origem e decifrar o que isso implica na evolução. Azul = placa continental Vermelho = maior incidência Conhecimentos de considerável importância, adquiridos a partir do final da primeira década do século XXI na área da genética, trazem-nos revelações surpreendentes com implicação diversa noutras áreas : uma revolução na ciência (02). NA ORIGEM Em 2017 foi localizado um fóssil intacto de lanceta, além de outros em idêntico estado que o precederam na evolução dos cordados (03), nas arribas da costa norte da Península de Peniche, entre a Ponta do Trovão e o Portinho de Areia da praia de Peniche de Cima (04). A invulgar concentração de fósseis de corpo mole de sucessivas épocas neste lugar, uns mais antigos e outros mais modernos, em estado excepcional de conservação, é uma mais-valia que inquestionavelmente reforça o seu valor geológico, reconhecido como património universal único (05).

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LANCETA E CORPO PRIMORDIAL artigo de Ricardo Costa http://ricardocosta.net

Era uma vez um pequeno animal que surgiu no mar há bem mais de quinhentos milhões de anos. Deixou descendentes muito parecidos com ele que ainda são vivos e que por aí andam. Nós próprios, os seres humanos, a ele devemos aquilo que somos. Aqueles que com ele mais se parecem não andam longe de nós. A criatura, um verme, ainda não tem nome. Aos seus descendentes mais próximos deram os cientistas o título pomposo de “ANFIOXO LANCEOLADO” (Branchiostoma

lanceolatum, vulgo : peixe-lanceta ou lanceta, lancelet em inglês e francês). o progenitor, verme marinho de 2 cm de comprimento o lanceta, seu descendente, meio verme e meio peixe

cauda em forma de colher boca arredondada barbatana caudal parte anterior do corpo

No processo evolutivo, a cauda do progenitor converte-se em barbatana caudal e a parte anterior do seu corpo na boca e cabeça do lanceta. São os primeiros cordados na história da evolução, caracterizando-se por terem um cordão nervoso dorsal que se desenvolve dando origem aos vertebrados (01 01A). Animais de corpo mole,

decompõe-se logo que morrem. São raros os seus fósseis. É graças aos seus parentes vivos – que mantêm a sua morfologia, as características básicas de um corpo primitivo (há várias espécies de lanceta) e que povoam certos espaços dos oceanos de hoje –, que os cientistas conseguem perceber como tais criaturs eram na origem e decifrar o que isso implica na evolução.

Azul = placa continental Vermelho = maior incidência

Conhecimentos de considerável importância, adquiridos a partir do final da primeira década do século XXI na área da genética, trazem-nos revelações surpreendentes com implicação diversa noutras áreas : uma revolução na ciência (02).

NA ORIGEM Em 2017 foi localizado um fóssil intacto de lanceta, além de outros em idêntico estado que o precederam na evolução dos cordados (03), nas arribas da costa norte da Península de Peniche, entre a Ponta do Trovão e o Portinho de Areia da praia de Peniche de Cima (04). A invulgar concentração de fósseis de corpo mole de sucessivas épocas neste lugar, uns mais antigos e outros mais modernos, em estado excepcional de conservação, é uma mais-valia que inquestionavelmente reforça o seu valor geológico, reconhecido como património universal único (05).

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As arribas da costa norte da Península de Peniche são uma incrível montra de fósseis. Enterrados tanto no seu solo argiloso como incrustados em rochas caracterizadas por fracturas regulares, algumas bastante simétricas, devido a dilatações e contracções

causadas por variações extremas de temperatura durante milénios, os fósseis que aqui se vêem comportam mistérios que levarão muito tempo a desvendar.

http://rcfilms.dotster.com/arribas-ABALO-CRAKED-WEST-VIEW.jpg

ANELÍDIOS TRANSPERENTES (comprimento : cerca de 2 cm) http://rcfilms.dotster.com/arribas_ABALO_CONGER_1_LONG_WORM_CONTEXT.jpg

http://rcfilms.dotster.com/arribas_ABALO_CONGER_1_LONG_WORM_2.jpg

É evidente que estes vermes transparentes são mais antigos que o seu vizinho verme anelídeo sem nome. Será bastante provável que uma destas criaturas esteja na sua origem. Será também provável que entre ambos haja um parente intermédio visto existirem entre um outro significativas diferenças.

1 Evolução do corpo e cauda do verme primordial para o peixe-lanceta

2 Tanto o lanceta vivo como o seu fóssil de Peniche são negros

Grande parte desses fósseis não tem semelhante em parte alguma. Alguns carecem de um estudo apurado. Animais do jurássico https://pt.wikipedia.org/wiki/Jur%C3%A1ssico têm embutidos outros mais pequenos do cambriano https://pt.wikipedia.org/wiki/Cambriano. Alguns destes são desconhecidos.

É um anelídeo de corpo mole. Tem uma cabeça opaca e uma boca com mandíbulas, logo seguida de um tubo digestivo repleto de óvulos negros até à cauda. Aparentemente desloca-se rastejando ou nadando. Terá um ânus situado na parte posterior do seu corpo. Aparenta semelhanças flagrantes com o seguinte :

É semelhante ao anterior, mas a sua cabeça parece ser um pouco diferente. A cauda está dentro de um tubo aberto nos sedimentos com a largura do seu corpo, constituído também por nódulos transparentes. Dentro dele, a todo o comprimento, vemos que cada um dos nódulos envolve um óvulo negro. Serão exemplares da mesma espécie? cabeça

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NB :

1 – O corpo do lanceta vivo é um pouco transparente. O fóssil de Peniche é opaco, sendo razoável admitir que terá sido relativamente transparente enquanto ser vivo. Importa ter em conta que a anatomia patente no fóssil será idêntica à do ser vivo :

O corpo primordial O corpo primordial era um cordado de corpo mole, pequeno verme fusiforme com dois centímetros de comprimento, um anelídeo musculado portador de um cordão nervoso dorsal sem vértebras. Por debaixo do cordão nervoso, de uma ponta à outra, há uma notocorda onde estão implantados todos os músculos do corpo, o que fundamenta a razão de serem denominados cefalocordados, ou simplesmente cordados. Na evolução para os vertebrados, a notocorda será protegida com vértebras, dando solidez ao corpo. Dispõe, na sua extremidade anterior, de uma região capaz de exercer funções cerebrais. Será a partir daí que se desenvolverá o cérebro dos vertebrados. Habitava no fundo do mar há pelo menos 540 Ma (Ma = milhões de anos) um predador a tempo inteiro. Abrigava-se num túnel em forma de U (toca) escavado na areia ou lamas com a largura do seu corpo. Mantinha-se quase sempre em posição vertical com a boca de fora, alimentando-se de microrganismos. Saía por vezes do seu abrigo para caçar durante o dia no espaço circundante do leito do mar. Tinha a capacidade de nadar. Ingerindo água com nutrientes, o alimento era retido e digerido por um extenso órgão filtrante, situado logo depois da faringe. A água que o animal ingeria e os seus dejectos eram expulsos do tubo digestivo por rápida contracção dos músculos de todo o corpo, o que lhe permitia usar o fluxo intestinal para se deslocar a jacto, faculdade herdada por cefalópodes como polvos, lulas e chocos. Nestes porém, a água é ejectada por bolsas impulsoras independentes do sistema digestivo : dois sifões em paralelo na cabeça dos polvos (manto), um funil implantado por baixo da cabeça das lulas e dos chocos, que expele a água por brusca contracção do manto, nadando para trás, mas podendo recuar um pouco por acção inversa. Graças a uma membrana caudal em forma de colher, que servia de leme, deslocava-se o verme para onde lhe convinha, nadando para a frente. Tinha por cima da boca um par de olhos frontais rudimentares, com visão central predominante, rodeada de pequenos cílios tácteis que serviam para detectar e identificar o alimento.

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A desenfreada evolução de corpos minúsculos para seres gigantescos A gula é o motivo. O verme sem nome sempre foi um imparável aspirador, transmitindo geneticamente essa incontornável pulsão à espécie humana. A gula engorda uns tantos aumentando demasiado o peso do seu corpo e nutre muitos mais dando-lhes sustento bastante para superar os outros nisto, naquilo e mais ainda, derivando em ganância. Raramente a coesão social da espécie consegue travar tal propósito. Por isso nos confrontamos hoje em dia com sérios riscos de extinção. Por isso o velho Charles Darwin disse certo dia, sem papas na língua e com toda a razão, que o ser humano não passa de um verme.

Na evolução, cedo começam ínfimas criaturas a tornar-se cada vez maiores, comendo os mais pequeninos. Peixes, polvos, lulas, dinossauros, estes, de entre todos os mais pretensiosos, pariram monstros apavorantes. Não se vêem fósseis de dinossauro nas arribas da Ponta do Trovão, em Peniche. Mas em redor da península, a leste, norte e sul, os mostrengos eram mais que muitos. Deixaram ossos e ossos e até esqueletos inteiros, que muito alegram as gentes da Lourinhã. Quanto a vestígios de polvos e lulas gigantes, é coisa que não falta na montra de fósseis, lá prás bandas de Peniche de Cima. Custa a acreditar mas é verdade. Desconfiados como sempre foram, teimam os penicheiros em fazer orelhas moucas a tais novidades. Mas a coisa vai mudar. Basta abrirem os olhos, mas para isso terão de ver. Alguém terá de lhes mostrar aquilo que nunca viram : a CMP, o Ministério da Cultura, uns tantos maduros em quem confiem. Gente que se pela por paródias de carnaval, mais cedo ou mais tarde acabará por fazer cortejo pondo na berlinda os gordos que nos andam a tramar : por degeneração, descambando em entes perniciosos, tanto a nós como a eles próprios.

VER A VIAGEM DO BEAGLE https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Viagem_do_Beagle

(Charles Darwin entre o Bem e o Mal)

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INOVAÇÃO Tópicos * Um fóssil de cobra portuguesa descoberto próximo de Leiria é dos mais antigos do mundo (de notar que tal proximidade geográfica envolve o mesmo habitat que o da Península de Peniche) (06). A cobra terá evoluído a partir do lagarto, um pequeno réptil quadruple cujo antepassado é um anfíbio, a salamandra. * Um fóssil com mais de dois metros, baptizado de “super salamandra” (Metoposaurus algarvensis https://pt.wikipedia.org/wiki/Metoposaurus_algarvensis ), com a idade de uns

duzentos milhões de anos, do tamanho de um homem, foi descoberto em Portugal, no Algarve, na aldeia da Penina, perto de Loulé. “Tinha grandes mandíbulas achatadas, superiores e inferiores, articuladas na parte anterior, que se podiam fechar como se fossem a boca de um penico para engolir peixes,

outros anfíbios e talvez até pequenos dinossauros e mamíferos” (tendência atávica proveniente do verme ancestral). Presume-se pertencer à ordem dos Temnospondyli (07). * Genética : fenótipo. “O fenótipo resulta da expressão dos genes do organismo, da influência de factores ambientais e da possível interacção entre os dois (08).” NOVAS HIPÓTESES E DESCOBERTAS RECENTES A segunda década do século XXI será um marco importante no entendimento da evolução dos cordados, mamíferos da classe (09) dos animais vertebrados à qual pertence a espécie humana :

* Descoberta de um réptil que se assemelha a mamífero, seu antepassado longínquo. O achado implica uma nova versão da história da evolução das espécies. O réptil tinha quatro membros robustos e nove toneladas de peso. Foi descoberto no sul da Austrália (10).

Galleonosaurus

* A simetria bilateral do corpo dos vertebrados (11) projecta-se na sua dinâmica (12).

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Será este o resultado : 1 – Quatro barbatanas versus quatro patas (13) 2 – Quatro patas versus quatro asas (14) Sapeornis, o primeiro animal voador https://pt.wikipedia.org/wiki/Sapeornis_chaoyangensis

Passarola de Bartolomeu de Gusmão Homem voador no meio de gansos https://pt.wikipedia.org/wiki/Passarola

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GENÉTICA É ponto assente entre os entendidos que o genoma dos vertebrados foi sujeito a duplicações. No processo evolutivo, cada um dos seus genes deu origem a outros dois. Cada um deles, como numa brincadeira de crianças (tu e eu, eu e tu), terá servido lindamente a tendência de inovação própria dos cordados. Pertencem os cordados ao reino animal e caracterizam-se pela bilateria, duas rodadas determinantes no inefável jogo da vida.

Consiste a ideia (15) em instigar a novidade, como por exemplo a criação de cabeças e membros (16). Quer isto dizer que o comportamento social, a cultura, de algum modo interfere na constituição genética de um indivíduo, pelo seu ADN.

BILATERIA fluxo

Por influência dos espíritos do lugar (Genius loci https://pt.wikipedia.org/wiki/Genius_loci ), caprichosos com são, aqui e em qualquer outra parte, a gruta da Furninha https://pt.wikipedia.org/wiki/Furninha, situada na encosta sul da Península de Peniche, brinda-nos com mais alguns ensinamentos. Na gruta foram descobertos importantes vestígios pré-históricos, entre os quais e em particular, fragmentos de cerâmica recolhidos por Nery Delgado https://pt.wikipedia.org/wiki/Joaquim_Filipe_Nery_da_Encarna%C3%A7%C3%A3o_Delgado. Vem isto a propósito de uma experiência feita com 113 indivíduos testados na observação de cerâmica datada de há 4.000 A.C. até à nossa época. " Mostram os resultados que o comportamento visual segue as mesmas tendências que as que orientam a evolução das sociedades complexas que construíram esses utensílios " (17), isto é, forçando o observador moderno a dirigir espontaneamente a linha do seu olhar para o traçado desses vasos, dessas estatuetas ou, no caso da pintura rupestre, a dar-lhe a ver aquilo que eles viam, aquilo que para eles era essencial, nas encostas rochosas onde caçavam ( ver Sítios de arte rupestre do Vale do Coa https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADtios_de_arte_rupestre_do_Vale_do_Coa ) ou nas grutas em que se recolhiam (18).

LIVRE VONTADE

De entre os cordados, o Homem é o animal mais evoluído. Cérebro muito desenvolvido, raciocínio abstracto, uso desenvolto da linguagem, capacidade de introspecção, de resolução de problemas complexos, aprendizagem fácil que lhe permite, apesar da sua típica dualidade, alterar tendências inatas são os seus traços distintivos. Permitem os genes do Homem que ele seja um ser versátil por um lado e, por outro, dificilmente mutável, tendo em vista a preservação da espécie. Uma

história que ilustra a dificuldade de mutação do ser humano é a dos gémeos James Springer e James Lewis https://www.youtube.com/watch?v=HbNVIWMC7fU, que foram separados com um mês de idade e adoptados por diferentes famílias, só voltando a estar juntos com trinta e nove

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anos, em 1979. Só então o psicólogo Thomas Bouchard, da Universidade de Minesota estudou o seu caso (19). Estando eles separados e nada sabendo um do outro, casaram-se e divorciaram-se ambos de mulheres com o nome de Linda e voltaram a casar com outras com o nome de Betty. Interessavam-se por desenho mecânico e carpintaria, na escola davam-se bem com matemática e eram fracos na escrita. Fumavam. Comiam e bebiam bem, um e outro. Tinham dores de cabeça todos os dias, à mesma hora (19). Entendem alguns filósofos e cientistas que se dedicam ao estudo da genética do comportamento https://pt.wikipedia.org/wiki/Gen%C3%A9tica_do_comportamento que a livre vontade pode ser restringida ou anulada por intervenção genética (20). Não falta quem se revolte perante a hipótese de tal coisa acontecer. Certo é que cada um de nós é único, apesar de podermos ter parecenças flagrantes com outros. Certo é ainda que, mau grado possamos confundir um com o outro, dispomos de meios eficazes, inatos ou culturais, de identificar quem é ou não é : como o cão que nos identifica pelo cheiro ou como a gaivota que, num simples relance, nos topa por termos destruído o ninho que abusivamente fez no nosso telhado e nos ameaça, passado um mês, com voos rasantes por cima da cabeça. Que fazer perante um cão que não gosta de nós e nos morde ou de uma gaivota que nos pica? Qual a norma ética que devemos utilizar?

TERRA NOSSA Era uma vez uma crosta terrestre constituída por rochedos volcânicos gigantescos que se encaixavam uns nos outros como num quebra-cabeças. Esta história durou uns bons 160 Ma, tempo esse situado entre há cerca de 200 e 500 Ma. À volta dessa crosta tudo era mar. Havia então um só continente, a que um homem esclarecido do século XX deu o nome de Pangeia. Chamava-se ele Alfred Wegener https://pt.wikipedia.org/wiki/Alfred_Wegener . O planeta Terra https://pt.wikipedia.org/wiki/Terra era já habitado por cordados no cambriano inferior, compreendido mais ou menos entre há 542 e 513 Ma. Os cordados primitivos surgiram na época anterior, no ediacarano (entre há 630 e 542 Ma) (21).

Os quatro planetas mais próximos do Sol : Mercúrio, Vénus, Terra e Marte

HISTÓRIA DA TERRA https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_Terra

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PANGEIA mãe de sete continentes

VÍDEOS https://www.youtube.com/watch?v=g_iEWvtKcuQ

https://www.youtube.com/watch?v=UvIDxu7twpc

Momentos houve em que o planeta azul de azul nada tinha. Fervia, derretia, arrefecia a nossa terra, do vermelho para o azul. Branca, coberta de gelo, pouco a pouco volta a aquecer. E pouco a pouco mais aquece, passando do azul ao rubro. Não é coisa de pouca monta, nem pró pobre nem pró rico, nem para quem os pretende rebaixar, ficando ele bem de pé, com mais uns tantos da banda. E quanto mais a coisa aquece mais chefes de banda há. E quanto pior eles forem mais encrencas hão vir dar-nos cabo da cabeça. É isso que a gente quer? A Terra era assim há 540 Ma : http://dinosaurpictures.org/ancient-earth#540 . E assim há 100 Ma : http://dinosaurpictures.org/ancient-earth#105

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Momentos houve em que brechas se abriram no chão da nossa terra. Nós, os seres vivos, fomos então levados a cavalo de um novo continente para onde agora nos encontramos, bem vivos, mas sempre receando alguma maléfica surpresa. No mesmo sítio onde estávamos há milhões de anos e que vai deslisando pouco a pouco, cá vamos indo, em cima de um corpo cada vez mais gordo. Hic et nunc cá estamos nós. Aconteceu-nos isso há uns 100 Ma, mais uns para lá e outros para cá. Ficámos assim parados no tempo, vivendo no alto de uma extensa falésia alcantilada, que se afasta devagarinho da sua gémea. O mar alaga a fresta que se abre entre a América do Norte e a Europa, carregando consigo a gigantesca massa de nutrientes que os continentes circundantes nela vazavam, levada por chuvas intensas.

Abre-se mais a fresta e o novo oceano, o Atlântico, expande-se para norte, leste e oeste. A oeste, desemboca no Pacífico, o maior dos oceanos, precário em vida, e fecunda-o. De um nicho insignificante, único no mundo na sua pequenez, na sua humilde e infinita riqueza, batida por ventos e marés, soltam-se no ar e na água sementes que irão fazer explodir a vida. O verme sem nome é um deles e, de todos, com uma ajudinha dos seus velhos progenitores, será o mais fecundante. Tem toda a pinta de quem aprendeu a furar no tempo. Atlântico

A Europa há 130 Ma A Península de Peniche https://pt.wikipedia.org/wiki/Pen%C3%ADnsula_de_Peniche

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NOTAS (01) – Verme anelídeo primordial http://seaworm.penichefossil.net/

(01A) – O verme primordial tem um apêndice em forma de colher na parte posterior do corpo que, na evolução para o lanceta, desenvolve uma pequena barbatana caudal, além de uma outra, muito fina, de uma ponta à outra do dorso. Surge assim uma espécie intermédia a que é atribuído por peritos alemães o nome de Trachyteuthis hastiformis. Existem dois fósseis desse animal na Alemanha, um em Berlin, no Museu de História Natural https://en.wikipedia.org/wiki/Natural_History_Museum,_Berlin , e outro no Museu de Solnhofen, cidade no extremo sul da Baviera. Uma imagem do primeiro exemplar figura na página nove (NOTA 2) e dez (NOTA 3) do nosso artigo 21st Century Innovations In Cephalopod Research (PENICHEFOSSILNET http://penichefossil.net ). O link que abria a imagem dá erro, que se mantém desde que o artigo foi criado, pouco tempo depois de termos enviado uma imagem do fóssil de Peniche ao director do museu, alertando que a designação que lhe era dada não estaria correcta. No que toca o exemplar do museu de Solnhofen, é identificado com a designação de Trachyteuthis hastiformis jura http://rcfilms.dotster.com/arribas-ABALO-TRACHYTEUTHIS-HASTIFORMIS-JURA.jpg. Jura é uma referência ao lugar onde o fóssil foi descoberto https://en.wikipedia.org/wiki/Franconian_Jura. Segundo reza a identificação que lhe é dada, trata-se do ancestral de uma lula do jurássico visto ter duas abas de cada um dos lados da cabeça https://en.wikipedia.org/wiki/Trachyteuthis, que são tidas como membranas natatórias. Tal raciocínio é absurdo, na medida em que a criatura tem uma barbatana (vista com cabeça) no lado anterior do corpo e duas no lado posterior. (02) - Cientistas conseguem mapear genoma do 'elo perdido' dos vertebrados https://oglobo.globo.com/sociedade/ciencia/cientistas-conseguem-mapear-genoma-do-elo-perdido-dos-vertebrados-3613069 Haikouichthys-Ercaicunensis (o primeiro peixe) https://en.wikipedia.org/wiki/Haikouichthys / https://prehistroric.fandom.com/wiki/Haikouichthys-Ercaicunensis / http://www.prehistoric-wildlife.com/species/h/haikouichthys.html / http://news.bbc.co.uk/2/hi/science/nature/504776.stm

(03) – Cordados https://pt.wikipedia.org/wiki/Cordados

(04) – Ponta do Trovão http://www.cm-peniche.pt/Municipio-de-Peniche-assinala-a-classificacao-da-Ponta-do-Trovao-como-GSSP-do-andar-

Toarciano-Jurassico-Inferior / Peniche: Ponta do Trovão tem valor geológico mundial (notícia no jornal Público, 17 de Novembro de 2006) https://www.publico.pt/2006/11/17/ciencia/noticia/peniche-ponta-do-trovao-tem-valor-geologico-

mundial-1276957 / Portinho de Areia da praia de Peniche de Cima (mapa) / https://mapcarta.com/pt/33030624

(05) – Classificação da Ponta do Trovão como GSSP, notícia da Câmara Municipal de Peniche, 13/07/2016 http://www.cm-peniche.pt/Municipio-de-Peniche-assinala-a-classificacao-da-Ponta-do-Trovao-como-GSSP-do-andar-Toarciano-Jurassico-Inferior (06) – Evolução da cobra portuguesa (notícia de Teresa Firmino https://www.publico.pt/autor/teresa-firmino no jornal Público, 01/30/2015 https://www.publico.pt/2015/01/30/ciencia/noticia/fossil-de-cobra-portuguesa-e-agora-dos-mais-antigos-do-mundo-

1684419 ; a relevância deste jornal no jornalismo da ciência (07) – Meet the super salamander that nearly ate your ancestors for breakfast https://theconversation.com/meet-the-super-salamander-that-nearly-ate-your-ancestors-for-breakfast-39221 (artigo de Stephen Brusatte https://theconversation.com/profiles/stephen-brusatte-133378, 24/03/201) / Descobertos em Loulé os primeiros fósseis de placodontes conhecidos em Portugal https://www.dn.pt/sociedade/interior/descobertos-em-loule-os-primeiros-fosseis-de-placodontes-

conhecidos-em-portugal-9123426.html (artigo no jornal Diário de Notícias, 16/02/2018)

(08) – Fenótipo https://pt.wikipedia.org/wiki/Fen%C3%B3tipo

(09) – Classe https://pt.wikipedia.org/wiki/Classe_(biologia)

(10) – Galleonosaurus https://www.dn.pt/tag/paleontologia.html

(notícia de Filomena Naves https://www.dn.pt/sociedade/interior/fisico-carlos-fiolhais-recebe-grande-premio-ciencia-viva-montepio-

8916818.html no jornal Diário de Notícias, 22/11/2018) (11) – Simetria corporal dos animais https://www.biologianet.com/anatomia-fisiologia-animal/simetria-corporal-dos-animais.htm (12) – Movimento dos animais https://midia.atp.usp.br/plc/plc0002/impressos/plc0002_12.pdf , texto de Gil da Costa Marques (13) – Fóssil pré-histórico revela evolução de peixe para animais de quatro patas. Pesquisa mostra que aves primitivas tinham quatro asas ao invés de duas http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2014/01/fossil-pre-historico-revela-evolucao-de-peixe-para-animais-de-quatro-patas.html

(notícia do jornal O Globo, 15/03/2013) (14) – Pesquisa mostra que aves primitivas tinham quatro asas ao invés de duas http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2013/03/pesquisa-mostra-que-aves-primitivas-tinham-quatro-asas-ao-inves-de-duas.html

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(notícia do jornal O Globo, 15/03 2013) (15) – Os Olhos da Ideia http://rcfilms.dotster.com/ideia.pdf (ensaio)

(16) – What makes vertebrates special? We can learn from lancelets https://www.eurekalert.org/pub_releases/2018-11/oios-wmv111918.php Okinawa Institute of Science and Technology (OIST), novembro de 2018

(17) – Proofs of parallel evolution between cognition, tool development, and social complexity https://www.eurekalert.org/pub_releases/2019-03/snrc-pop030619.php SPANISH NATIONAL RESEARCH COUNCIL (CSIC), 8 de março 2019

(18) – Investigação de uma equipa que incluiu João Zilhão, investigador do Centro de Arqueologia da ULisboa, em destaque na prestigiada revista "Science" https://www.letras.ulisboa.pt/pt/noticias/1019-investigacao-de-

uma-equipa-que-incluiu-joao-zilhao-investigador-do-centro-de-arqueologia-da-ulisboa-em-destaque-na-prestigiada-revista-science , notícia, 23 fevereiro 2018

(19) – Sources of Human Psychological Differences: The Minnesota Study of Twins Reared Apart http://web.missouri.edu/~segerti/1000H/Bouchard.pdf

Revista Science, New Series, Vol. 250, Nº 497 (Oct.12, 1990), 233-228 (20) – Do your genes determine your entire life? https://www.theguardian.com/science/2015/mar/19/do-your-genes-determine-your-entire-life

Artigo de Julian Baggini no jornal The Guardian, 19 de março 2015 / Free Will and Genetics https://philpapers.org/browse/free-will-and-genetics referências várias ****************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************

LANCELET AND ANSCENTRAL BODY http://rcfilms.dotster.com/LANCELET.pdf ****************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************************

artigo criado a 22/03/19 actualizado a 25/03/19 work in progress