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3544 DIÁRIO DA REPÚBLICA — I SÉRIE-A N. o 169 — 24-7-1998 ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA Lei n. o 36/98 de 24 de Julho Lei de Saúde Mental A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161. o , das alíneas a)e b) do n. o 1 do artigo 165. o e do n. o 3 do artigo 166. o da Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte: CAPÍTULO I Disposições gerais Artigo 1. o Objectivos A presente lei estabelece os princípios gerais da polí- tica de saúde mental e regula o internamento compulsivo dos portadores de anomalia psíquica, designadamente das pessoas com doença mental. Artigo 2. o Protecção e promoção da saúde mental 1 — A protecção da saúde mental efectiva-se através de medidas que contribuam para assegurar ou resta- belecer o equilíbrio psíquico dos indivíduos, para favo- recer o desenvolvimento das capacidades envolvidas na construção da personalidade e para promover a sua inte- gração crítica no meio social em que vive. 2 — As medidas referidas no número anterior incluem acções de prevenção primária, secundária e ter- ciária da doença mental, bem como as que contribuam para a promoção da saúde mental das populações. Artigo 3. o Princípios gerais de política de saúde mental 1 — Sem prejuízo do disposto na Lei de Bases da Saúde, devem observar-se os seguintes princípios gerais: a) A prestação de cuidados de saúde mental é pro- movida prioritariamente a nível da comunidade, por forma a evitar o afastamento dos doentes do seu meio habitual e a facilitar a sua rea- bilitação e inserção social; b) Os cuidados de saúde mental são prestados no meio menos restritivo possível; c) O tratamento de doentes mentais em regime de internamento ocorre, tendencialmente, em hospitais gerais; d) No caso de doentes que fundamentalmente careçam de reabilitação psicossocial, a prestação de cuidados é assegurada, de preferência, em estruturas residenciais, centros de dia e unida- des de treino e reinserção profissional, inseridos na comunidade e adaptados ao grau específico de autonomia dos doentes. 2 — Nos casos previstos na alínea d) do número ante- rior, os encargos com os serviços prestados no âmbito da reabilitação e inserção social, apoio residencial e rein- serção profissional são comparticipados em termos a definir pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da saúde, segurança social e emprego. 3 — A prestação de cuidados de saúde mental é asse- gurada por equipas multidisciplinares habilitadas a res- ponder, de forma coordenada, aos aspectos médicos, psicológicos, sociais, de enfermagem e de reabilitação. Artigo 4. o Conselho Nacional de Saúde Mental 1 — O Conselho Nacional de Saúde Mental é o órgão de consulta do Governo em matéria de política de saúde mental, nele estando representadas as entidades inte- ressadas no funcionamento do sistema de saúde mental, designadamente as associações de familiares e de uten- tes, os subsistemas de saúde, os profissionais de saúde mental e os departamentos governamentais com áreas de actuação conexas. 2 — A composição, as competências e o funciona- mento do Conselho Nacional de Saúde Mental constam de decreto-lei. Artigo 5. o Direitos e deveres do utente 1 — Sem prejuízo do previsto na Lei de Bases da Saúde, o utente dos serviços de saúde mental tem ainda o direito de: a) Ser informado, por forma adequada, dos seus direitos, bem como do plano terapêutico pro- posto e seus efeitos previsíveis; b) Receber tratamento e protecção, no respeito pela sua individualidade e dignidade; c) Decidir receber ou recusar as intervenções diag- nósticas e terapêuticas propostas, salvo quando for caso de internamento compulsivo ou em situações de urgência em que a não intervenção criaria riscos comprovados para o próprio ou para terceiros; d) Não ser submetido a electroconvulsivoterapia sem o seu prévio consentimento escrito; e) Aceitar ou recusar, nos termos da legislação em vigor, a participação em investigações, ensaios clínicos ou actividades de formação; f) Usufruir de condições dignas de habitabilidade, higiene, alimentação, segurança, respeito e pri- vacidade em serviços de internamento e estru- turas residenciais; g) Comunicar com o exterior e ser visitado por familiares, amigos e representantes legais, com as limitações decorrentes do funcionamento dos serviços e da natureza da doença; h) Receber justa remuneração pelas actividades e pelos serviços por ele prestados; i) Receber apoio no exercício dos direitos de recla- mação e queixa. 2 — A realização de intervenção psicocirúrgica exige, além do prévio consentimento escrito, o parecer escrito favorável de dois médicos psiquiatras designados pelo Conselho Nacional de Saúde Mental. 3 — Os direitos referidos nas alíneas c), d)e e) do n. o 1 são exercidos pelos representantes legais quando os doentes sejam menores de 14 anos ou não possuam o discernimento necessário para avaliar o sentido e alcance do consentimento.

Lei 36 98 SaudeMental

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Saúde mental

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  • 3544 DIRIO DA REPBLICA I SRIE-A N.o 169 24-7-1998

    ASSEMBLEIA DA REPBLICA

    Lei n.o 36/98de 24 de Julho

    Lei de Sade Mental

    A Assembleia da Repblica decreta, nos termos daalnea c) do artigo 161.o, das alneas a) e b) do n.o 1do artigo 165.o e do n.o 3 do artigo 166.o da Constituio,para valer como lei geral da Repblica, o seguinte:

    CAPTULO I

    Disposies gerais

    Artigo 1.o

    Objectivos

    A presente lei estabelece os princpios gerais da pol-tica de sade mental e regula o internamento compulsivodos portadores de anomalia psquica, designadamentedas pessoas com doena mental.

    Artigo 2.o

    Proteco e promoo da sade mental

    1 A proteco da sade mental efectiva-se atravsde medidas que contribuam para assegurar ou resta-belecer o equilbrio psquico dos indivduos, para favo-recer o desenvolvimento das capacidades envolvidas naconstruo da personalidade e para promover a sua inte-grao crtica no meio social em que vive.

    2 As medidas referidas no nmero anteriorincluem aces de preveno primria, secundria e ter-ciria da doena mental, bem como as que contribuampara a promoo da sade mental das populaes.

    Artigo 3.o

    Princpios gerais de poltica de sade mental

    1 Sem prejuzo do disposto na Lei de Bases daSade, devem observar-se os seguintes princpios gerais:

    a) A prestao de cuidados de sade mental pro-movida prioritariamente a nvel da comunidade,por forma a evitar o afastamento dos doentesdo seu meio habitual e a facilitar a sua rea-bilitao e insero social;

    b) Os cuidados de sade mental so prestados nomeio menos restritivo possvel;

    c) O tratamento de doentes mentais em regimede internamento ocorre, tendencialmente, emhospitais gerais;

    d) No caso de doentes que fundamentalmentecaream de reabilitao psicossocial, a prestaode cuidados assegurada, de preferncia, emestruturas residenciais, centros de dia e unida-des de treino e reinsero profissional, inseridosna comunidade e adaptados ao grau especficode autonomia dos doentes.

    2 Nos casos previstos na alnea d) do nmero ante-rior, os encargos com os servios prestados no mbitoda reabilitao e insero social, apoio residencial e rein-sero profissional so comparticipados em termos a

    definir pelos membros do Governo responsveis pelasreas da sade, segurana social e emprego.

    3 A prestao de cuidados de sade mental asse-gurada por equipas multidisciplinares habilitadas a res-ponder, de forma coordenada, aos aspectos mdicos,psicolgicos, sociais, de enfermagem e de reabilitao.

    Artigo 4.o

    Conselho Nacional de Sade Mental

    1 O Conselho Nacional de Sade Mental o rgode consulta do Governo em matria de poltica de sademental, nele estando representadas as entidades inte-ressadas no funcionamento do sistema de sade mental,designadamente as associaes de familiares e de uten-tes, os subsistemas de sade, os profissionais de sademental e os departamentos governamentais com reasde actuao conexas.

    2 A composio, as competncias e o funciona-mento do Conselho Nacional de Sade Mental constamde decreto-lei.

    Artigo 5.o

    Direitos e deveres do utente

    1 Sem prejuzo do previsto na Lei de Bases daSade, o utente dos servios de sade mental tem aindao direito de:

    a) Ser informado, por forma adequada, dos seusdireitos, bem como do plano teraputico pro-posto e seus efeitos previsveis;

    b) Receber tratamento e proteco, no respeitopela sua individualidade e dignidade;

    c) Decidir receber ou recusar as intervenes diag-nsticas e teraputicas propostas, salvo quandofor caso de internamento compulsivo ou emsituaes de urgncia em que a no intervenocriaria riscos comprovados para o prprio oupara terceiros;

    d) No ser submetido a electroconvulsivoterapiasem o seu prvio consentimento escrito;

    e) Aceitar ou recusar, nos termos da legislao emvigor, a participao em investigaes, ensaiosclnicos ou actividades de formao;

    f) Usufruir de condies dignas de habitabilidade,higiene, alimentao, segurana, respeito e pri-vacidade em servios de internamento e estru-turas residenciais;

    g) Comunicar com o exterior e ser visitado porfamiliares, amigos e representantes legais, comas limitaes decorrentes do funcionamento dosservios e da natureza da doena;

    h) Receber justa remunerao pelas actividades epelos servios por ele prestados;

    i) Receber apoio no exerccio dos direitos de recla-mao e queixa.

    2 A realizao de interveno psicocirrgica exige,alm do prvio consentimento escrito, o parecer escritofavorvel de dois mdicos psiquiatras designados peloConselho Nacional de Sade Mental.

    3 Os direitos referidos nas alneas c), d) e e) don.o 1 so exercidos pelos representantes legais quandoos doentes sejam menores de 14 anos ou no possuamo discernimento necessrio para avaliar o sentido ealcance do consentimento.

  • 3545N.o 169 24-7-1998 DIRIO DA REPBLICA I SRIE-A

    CAPTULO II

    Do internamento compulsivo

    SECO I

    Disposies gerais

    Artigo 6.o

    mbito de aplicao

    1 O presente captulo regula o internamento com-pulsivo dos portadores de anomalia psquica.

    2 O internamento voluntrio no fica sujeito aodisposto neste captulo, salvo quando um internadovoluntariamente num estabelecimento se encontre nasituao prevista nos artigos 12.o e 22.o

    Artigo 7.o

    Definies

    Para efeitos do disposto no presente captulo, con-sidera-se:

    a) Internamento compulsivo: internamento pordeciso judicial do portador de anomalia ps-quica grave;

    b) Internamento voluntrio: internamento a soli-citao do portador de anomalia psquica oua solicitao do representante legal de menorde 14 anos;

    c) Internando: portador de anomalia psquica sub-metido ao processo conducente s decises pre-vistas nos artigos 20.o e 27.o;

    d) Estabelecimento: hospital ou instituio anlogaque permita o tratamento de portador de ano-malia psquica;

    e) Autoridades de sade pblica: as como tal qua-lificadas pela lei;

    f) Autoridades de polcia: os directores, oficiais,inspectores e subinspectores de polcia e todosos funcionrios policiais a quem as leis respec-tivas reconhecerem aquela qualificao.

    Artigo 8.o

    Princpios gerais

    1 O internamento compulsivo s pode ser deter-minado quando for a nica forma de garantir a sub-misso a tratamento do internado e finda logo que ces-sem os fundamentos que lhe deram causa.

    2 O internamento compulsivo s pode ser deter-minado se for proporcionado ao grau de perigo e aobem jurdico em causa.

    3 Sempre que possvel o internamento substi-tudo por tratamento em regime ambulatrio.

    4 As restries aos direitos fundamentais decor-rentes do internamento compulsivo so as estritamentenecessrias e adequadas efectividade do tratamentoe segurana e normalidade do funcionamento do esta-belecimento, nos termos do respectivo regulamentointerno.

    Artigo 9.o

    Legislao subsidiria

    Nos casos omissos aplica-se, devidamente adaptado,o disposto no Cdigo de Processo Penal.

    SECO II

    Dos direitos e deveres

    Artigo 10.o

    Direitos e deveres processuais do internando

    1 O internando goza, em especial, do direito de:

    a) Ser informado dos direitos que lhe assistem;b) Estar presente aos actos processuais que direc-

    tamente lhe disserem respeito, excepto se o seuestado de sade o impedir;

    c) Ser ouvido pelo juiz sempre que possa sertomada uma deciso que pessoalmente o afecte,excepto se o seu estado de sade tornar a audi-o intil ou invivel;

    d) Ser assistido por defensor, constitudo ounomeado, em todos os actos processuais em queparticipar e ainda nos actos processuais quedirectamente lhe disserem respeito e em queno esteja presente;

    e) Oferecer provas e requerer as diligncias quese lhe afigurem necessrias.

    2 Recai sobre o internando o especial dever dese submeter s medidas e diligncias previstas nos arti-gos 17.o, 21.o, 23.o, 24.o e 27.o

    Artigo 11.o

    Direitos e deveres do internado

    1 O internado mantm os direitos reconhecidos aosinternados nos hospitais gerais.

    2 O internado goza, em especial, do direito de:

    a) Ser informado e, sempre que necessrio, escla-recido sobre os direitos que lhe assistem;

    b) Ser esclarecido sobre os motivos da privaoda liberdade;

    c) Ser assistido por defensor constitudo ounomeado, podendo comunicar em privado comeste;

    d) Recorrer da deciso de internamento e da deci-so que o mantenha;

    e) Votar, nos termos da lei;f) Enviar e receber correspondncia;g) Comunicar com a comisso prevista no arti-

    go 38.o

    3 O internado tem o especial dever de se submeteraos tratamentos medicamente indicados, sem prejuzodo disposto no n.o 2 do artigo 5.o

    SECO III

    Internamento

    Artigo 12.o

    Pressupostos

    1 O portador de anomalia psquica grave que crie,por fora dela, uma situao de perigo para bens jur-

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    dicos, de relevante valor, prprios ou alheios, de natu-reza pessoal ou patrimonial, e recuse submeter-se aonecessrio tratamento mdico pode ser internado emestabelecimento adequado.

    2 Pode ainda ser internado o portador de anomaliapsquica grave que no possua o discernimento neces-srio para avaliar o sentido e alcance do consentimento,quando a ausncia de tratamento deteriore de formaacentuada o seu estado.

    Artigo 13.o

    Legitimidade

    1 Tem legitimidade para requerer o internamentocompulsivo o representante legal do portador de ano-malia psquica, qualquer pessoa com legitimidade pararequerer a sua interdio, as autoridades de sadepblica e o Ministrio Pblico.

    2 Sempre que algum mdico verifique no exercciodas suas funes uma anomalia psquica com os efeitosprevistos no artigo 12.o pode comunic-la autoridadede sade pblica competente para os efeitos do dispostono nmero anterior.

    3 Se a verificao ocorrer no decurso de um inter-namento voluntrio, tem tambm legitimidade pararequerer o internamento compulsivo o director clnicodo estabelecimento.

    Artigo 14.o

    Requerimento

    1 O requerimento, dirigido ao tribunal compe-tente, formulado por escrito, sem quaisquer forma-lidades especiais, devendo conter a descrio dos factosque fundamentam a pretenso do requerente.

    2 Sempre que possvel, o requerimento deve serinstrudo com elementos que possam contribuir paraa deciso do juiz, nomeadamente relatrios clnico-psi-quitricos e psicossociais.

    Artigo 15.o

    Termos subsequentes

    1 Recebido o requerimento, o juiz notifica o inter-nando, informando-o dos direitos e deveres processuaisque lhe assistem, e nomeia-lhe um defensor, cuja inter-veno cessa se ele constituir mandatrio.

    2 O defensor e o familiar mais prximo do inter-nando que com ele conviva ou a pessoa que com ointernando viva em condies anlogas s dos cnjugesso notificados para requerer o que tiverem por con-veniente no prazo de cinco dias.

    3 Para os mesmos efeitos, e em igual prazo, o pro-cesso vai com vista ao Ministrio Pblico.

    Artigo 16.o

    Actos instrutrios

    1 O juiz, oficiosamente ou a requerimento, deter-mina a realizao das diligncias que se lhe afiguremnecessrias e, obrigatoriamente, a avaliao clnico-psi-quitrica do internando, sendo este para o efeitonotificado.

    2 No caso previsto no n.o 3 do artigo 13.o, o juizpode prescindir da avaliao referida no nmero ante-rior, designando de imediato data para a sesso conjuntanos termos do artigo 18.o

    Artigo 17.o

    Avaliao clnico-psiquitrica

    1 A avaliao clnico-psiquitrica deferida aosservios oficiais de assistncia psiquitrica da rea deresidncia do internando, devendo ser realizada por doispsiquiatras, no prazo de 15 dias, com a eventual cola-borao de outros profissionais de sade mental.

    2 A avaliao referida no nmero anterior pode,excepcionalmente, ser deferida ao servio de psiquiatriaforense do instituto de medicina legal da respectivacircunscrio.

    3 Sempre que seja previsvel a no comparnciado internando na data designada, o juiz ordena a emissode mandado de conduo para assegurar a presenadaquele.

    4 Os servios remetem o relatrio ao tribunal noprazo mximo de sete dias.

    5 O juzo tcnico-cientfico inerente avaliao cl-nico-psiquitrica est subtrado livre apreciao dojuiz.

    Artigo 18.o

    Actos preparatrios da sesso conjunta

    1 Recebido o relatrio da avaliao clnico-psiqui-trica, o juiz designa data para a sesso conjunta, sendonotificados o internando, o defensor, o requerente eo Ministrio Pblico.

    2 O juiz pode convocar para a sesso quaisqueroutras pessoas cuja audio reputar oportuna, desig-nadamente o mdico assistente, e determinar, oficio-samente ou a requerimento, que os psiquiatras prestemesclarecimentos complementares, devendo ser-lhescomunicado o dia, a hora e o local da realizao dasesso conjunta.

    3 Se houver discordncia entre os psiquiatras, apre-senta cada um o seu relatrio, podendo o juiz determinarque seja renovada a avaliao clnico-psiquitrica a cargode outros psiquiatras, nos termos do artigo 17.o

    Artigo 19.o

    Sesso conjunta

    1 Na sesso conjunta obrigatria a presena dodefensor do internando e do Ministrio Pblico.

    2 Ouvidas as pessoas convocadas, o juiz d a pala-vra para alegaes sumrias ao mandatrio do reque-rente, se tiver sido constitudo, ao Ministrio Pblicoe ao defensor e profere deciso de imediato ou no prazomximo de cinco dias se o procedimento revestircomplexidade.

    3 Se o internando aceitar o internamento e nohouver razes para duvidar da aceitao, o juiz pro-videncia a apresentao deste no servio oficial de sademental mais prximo e determina o arquivamento doprocesso.

    Artigo 20.o

    Deciso

    1 A deciso sobre o internamento sempre fun-damentada.

    2 A deciso de internamento identifica a pessoaa internar e especifica as razes clnicas, o diagnsticoclnico, quando existir, e a justificao do internamento.

  • 3547N.o 169 24-7-1998 DIRIO DA REPBLICA I SRIE-A

    3 A deciso notificada ao Ministrio Pblico, aointernando, ao defensor e ao requerente. A leitura dadeciso equivale notificao dos presentes.

    Artigo 21.o

    Cumprimento da deciso de internamento

    1 Na deciso de internamento o juiz determina aapresentao do internado no servio oficial de sademental mais prximo, o qual providencia o internamentoimediato.

    2 O juiz emite mandado de conduo com iden-tificao da pessoa a internar, o qual cumprido, sempreque possvel, pelo servio referido no nmero anterior,que, quando necessrio, solicita a coadjuvao das foraspoliciais.

    3 No sendo possvel o cumprimento nos termosdo nmero anterior, o mandado de conduo pode sercumprido pelas foras policiais, que, quando necessrio,solicitam o apoio dos servios de sade mental ou dosservios locais de sade.

    4 Logo que determinado o local definitivo do inter-namento, que dever situar-se o mais prximo possvelda residncia do internado, aquele comunicado aodefensor do internado e ao familiar mais prximo quecom ele conviva, pessoa que com ele viva em condiesanlogas s dos cnjuges ou a pessoa de confiana dointernado.

    SECO IV

    Internamento de urgncia

    Artigo 22.o

    Pressupostos

    O portador da anomalia psquica pode ser internadocompulsivamente de urgncia, nos termos dos artigosseguintes, sempre que, verificando-se os pressupostosdo artigo 12.o, n.o 1, exista perigo iminente para os bensjurdicos a referidos, nomeadamente por deterioraoaguda do seu estado.

    Artigo 23.o

    Conduo do internando

    1 Verificados os pressupostos do artigo anterior,as autoridades de polcia ou de sade pblica podemdeterminar, oficiosamente ou a requerimento, atravsde mandado, que o portador de anomalia psquica sejaconduzido ao estabelecimento referido no artigoseguinte.

    2 O mandado cumprido pelas foras policiais,com o acompanhamento, sempre que possvel, dos ser-vios do estabelecimento referido no artigo seguinte.O mandado contm a assinatura da autoridade com-petente, a identificao da pessoa a conduzir e a indi-cao das razes que o fundamentam.

    3 Quando, pela situao de urgncia e de perigona demora, no seja possvel a emisso prvia de man-dado, qualquer agente policial procede conduo ime-diata do internando.

    4 Na situao descrita no nmero anterior o agentepolicial lavra auto em que discrimina os factos, bemcomo as circunstncias de tempo e de lugar em quea mesma foi efectuada.

    5 A conduo comunicada de imediato ao Minis-trio Pblico com competncia na rea em que aquelase iniciou.

    Artigo 24.o

    Apresentao do internando

    O internando apresentado de imediato no estabe-lecimento com urgncia psiquitrica mais prximo dolocal em que se iniciou a conduo, onde submetidoa avaliao clnico-psiquitrica com registo clnico e lhe prestada a assistncia mdica necessria.

    Artigo 25.o

    Termos subsequentes

    1 Quando da avaliao clnico-psiquitrica se con-cluir pela necessidade de internamento e o internandoa ele se opuser, o estabelecimento comunica, de ime-diato, ao tribunal judicial com competncia na rea aadmisso daquele, com cpia do mandado e do relatrioda avaliao.

    2 Quando a avaliao clnico-psiquitrica no con-firmar a necessidade de internamento, a entidade quetiver apresentado o portador de anomalia psquica res-titui-o de imediato liberdade, remetendo o expedienteao Ministrio Pblico com competncia na rea em quese iniciou a conduo.

    3 O disposto no n.o 1 aplicvel quando na urgn-cia psiquitrica ou no decurso de internamento volun-trio se verifique a existncia da situao descrita noartigo 22.o

    Artigo 26.o

    Confirmao judicial

    1 Recebida a comunicao referida no n.o 1 doartigo anterior, o juiz nomeia defensor ao internandoe d vista nos autos ao Ministrio Pblico.

    2 Realizadas as diligncias que reputar necessrias,o juiz profere deciso de manuteno ou no do inter-namento, no prazo mximo de quarenta e oito horasa contar da privao da liberdade nos termos dos arti-gos 23.o e 25.o, n.o 3.

    3 A deciso de manuteno do internamento comunicada, com todos os elementos que a fundamen-tam, ao tribunal competente.

    4 A deciso comunicada ao internando e ao fami-liar mais prximo que com ele conviva ou pessoa quecom o internando viva em condies anlogas s doscnjuges, bem como ao mdico assistente, sendo aqueleinformado, sempre que possvel, dos direitos e deveresprocessuais que lhe assistem.

    Artigo 27.o

    Deciso final

    1 Recebida a comunicao a que se refere o n.o 3do artigo anterior, o juiz d incio ao processo de inter-namento compulsivo com os fundamentos previstos noartigo 12.o, ordenando para o efeito que, no prazo decinco dias, tenha lugar nova avaliao clnico-psiqui-trica, a cargo de dois psiquiatras que no tenham pro-cedido anterior, com a eventual colaborao de outrosprofissionais de sade mental.

    2 ainda correspondentemente aplicvel o dis-posto no artigo 15.o

  • 3548 DIRIO DA REPBLICA I SRIE-A N.o 169 24-7-1998

    3 Recebido o relatrio da avaliao clnico-psiqui-trica e realizadas as demais diligncias necessrias, designada data para a sesso conjunta, qual cor-respondentemente aplicvel o disposto nos artigos 18.o,19.o, 20.o e 21.o, n.o 4.

    SECO V

    Casos especiais

    Artigo 28.o

    Pendncia de processo penal

    1 A pendncia de processo penal em que sejaarguido portador de anomalia psquica no obsta a queo tribunal competente decida sobre o internamento nostermos deste diploma.

    2 Em caso de internamento, o estabelecimentoremete ao tribunal onde pende o processo penal, dedois em dois meses, informao sobre a evoluo doestado do portador de anomalia psquica.

    Artigo 29.o

    Internamento compulsivo de inimputvel

    1 O tribunal que no aplicar a medida de seguranaprevista no artigo 91.o do Cdigo Penal pode decidiro internamento compulsivo do inimputvel.

    2 Sempre que seja imposto o internamento reme-tida certido da deciso ao tribunal competente paraos efeitos do disposto nos artigos 33.o, 34.o e 35.o

    SECO VI

    Disposies comuns

    Artigo 30.o

    Regras de competncia

    1 Para efeitos do disposto no presente captulo,tribunal competente o tribunal judicial de competnciagenrica da rea de residncia do internando.

    2 Se na comarca da rea de residncia do inter-nando existir tribunal judicial de competncia especia-lizada em matria criminal, a competncia atribudaa este.

    Artigo 31.o

    Habeas corpus em virtude de privao da liberdade ilegal

    1 O portador de anomalia psquica privado daliberdade, ou qualquer cidado no gozo dos seus direitospolticos, pode requerer ao tribunal da rea onde o por-tador se encontrar a imediata libertao com algum dosseguintes fundamentos:

    a) Estar excedido o prazo previsto no artigo 26.o,n.o 2;

    b) Ter sido a privao da liberdade efectuada ouordenada por entidade incompetente;

    c) Ser a privao da liberdade motivada fora doscasos ou condies previstas nesta lei.

    2 Recebido o requerimento, o juiz, se o no con-siderar manifestamente infundado, ordena, se necess-rio por via telefnica, a apresentao imediata do por-tador da anomalia psquica.

    3 Juntamente com a ordem referida no nmeroanterior, o juiz manda notificar a entidade que tivero portador da anomalia psquica sua guarda, ou quempuder represent-la, para se apresentar no mesmo actomunida das informaes e esclarecimentos necessrios deciso sobre o requerimento.

    4 O juiz decide, ouvidos o Ministrio Pblico eo defensor constitudo ou nomeado para o efeito.

    Artigo 32.o

    Recorribilidade da deciso

    1 Sem prejuzo do disposto no artigo anterior, dadeciso tomada nos termos dos artigos 20.o, 26.o, n.o 2,27.o, n.o 3, e 35.o cabe recurso para o Tribunal da Rela-o competente.

    2 Tem legitimidade para recorrer o internado, oseu defensor, quem requerer o internamento nos termosdo artigo 13.o, n.o 1, e o Ministrio Pblico.

    3 Todos os recursos previstos no presente captulotm efeito meramente devolutivo.

    Artigo 33.o

    Substituio do internamento

    1 O internamento substitudo por tratamentocompulsivo em regime ambulatrio sempre que seja pos-svel manter esse tratamento em liberdade, sem prejuzodo disposto nos artigos 34.o e 35.o

    2 A substituio depende de expressa aceitao,por parte do internado, das condies fixadas pelo psi-quiatra assistente para o tratamento em regime ambu-latrio.

    3 A substituio comunicada ao tribunal com-petente.

    4 Sempre que o portador da anomalia psquicadeixe de cumprir as condies estabelecidas, o psiquiatraassistente comunica o incumprimento ao tribunal com-petente, retomando-se o internamento.

    5 Sempre que necessrio, o estabelecimento soli-cita ao tribunal competente a emisso de mandados deconduo a cumprir pelas foras policiais.

    Artigo 34.o

    Cessao do internamento

    1 O internamento finda quando cessarem os pres-supostos que lhe deram origem.

    2 A cessao ocorre por alta dada pelo directorclnico do estabelecimento, fundamentada em relatriode avaliao clnico-psiquitrica do servio de sadeonde decorreu o internamento, ou por deciso judicial.

    3 A alta imediatamente comunicada ao tribunalcompetente.

    Artigo 35.o

    Reviso da situao do internado

    1 Se for invocada a existncia de causa justificativada cessao do internamento, o tribunal competenteaprecia a questo a todo o tempo.

    2 A reviso obrigatria, independentemente derequerimento, decorridos dois meses sobre o incio dointernamento ou sobre a deciso que o tiver mantido.

    3 Tem legitimidade para requerer a reviso o inter-nado, o seu defensor e as pessoas referidas no artigo 13.o,n.o 1.

  • 3549N.o 169 24-7-1998 DIRIO DA REPBLICA I SRIE-A

    4 Para o efeito do disposto no n.o 2 o estabele-cimento envia, at 10 dias antes da data calculada paraa reviso, um relatrio de avaliao clnico-psiquitricaelaborado por dois psiquiatras, com a eventual cola-borao de outros profissionais de sade mental.

    5 A reviso obrigatria tem lugar com audio doMinistrio Pblico, do defensor e do internado, exceptose o estado de sade deste tornar a audio intil ouinvivel.

    SECO VII

    Da natureza e das custas do processo

    Artigo 36.o

    Natureza do processo

    Os processos previstos no presente captulo tm natu-reza secreta e urgente.

    Artigo 37.o

    Custas

    Os processos previstos neste captulo so isentos decustas.

    SECO VIII

    Comisso de acompanhamento

    Artigo 38.o

    Criao e atribuies

    criada uma comisso para acompanhamento da exe-cuo do disposto no presente captulo, seguidamentedesignada por comisso.

    Artigo 39.o

    Sede e servios administrativos

    Por despacho conjunto dos Ministros da Justia e daSade so definidos os servios de apoio tcnico e admi-nistrativo actividade da comisso, bem como a res-pectiva sede.

    Artigo 40.o

    Composio

    A comisso constituda por psiquiatras, juristas, porum representante das associaes de familiares e utentesde sade mental e outros tcnicos de sade mental,nomeados por despacho conjunto dos Ministros da Jus-tia e da Sade.

    Artigo 41.o

    Competncias

    Incumbe especialmente comisso:

    a) Visitar os estabelecimentos e comunicar direc-tamente com os internados;

    b) Solicitar ou remeter a quaisquer entidadesadministrativas ou judicirias informaes sobrea situao dos internados;

    c) Receber e apreciar as reclamaes dos inter-nados ou das pessoas com legitimidade pararequerer o internamento sobre as condies domesmo;

    d) Solicitar ao Ministrio Pblico junto do tribunalcompetente os procedimentos judiciais julgadosadequados correco de quaisquer situaesde violao da lei que verifique no exercciodas suas funes;

    e) Recolher e tratar a informao relativa apli-cao do presente captulo;

    f) Propor ao Governo as medidas que julguenecessrias execuo da presente lei.

    Artigo 42.o

    Cooperao

    1 Para os fins previstos na alnea e) do artigo ante-rior, os tribunais remetem comisso cpia das decisesprevistas no presente captulo.

    2 dever das entidades pblicas e privadas dis-pensar comisso toda a colaborao necessria ao exer-ccio da sua competncia.

    Artigo 43.o

    Base de dados

    A comisso promover, nos termos e condies pre-vistos na legislao sobre proteco de dados pessoaise sobre o sigilo mdico, a organizao de uma basede dados informtica relativa aplicao do presentecaptulo, a que tero acesso entidades pblicas ou pri-vadas que nisso tenham interesse legtimo.

    Artigo 44.o

    Relatrio

    A comisso apresenta todos os anos ao Governo, at31 de Maro do ano seguinte, um relatrio sobre o exer-ccio das suas atribuies e a execuo do disposto nopresente captulo.

    CAPTULO III

    Disposies transitrias e finais

    SECO I

    Disposies transitrias

    Artigo 45.o

    Disposies transitrias

    1 Os processos instaurados data da entrada emvigor do presente diploma continuam a ser reguladospela Lei n.o 2118, de 3 de Abril de 1963, at decisoque aplique o internamento.

    2 Os estabelecimentos hospitalares que tenhamdoentes internados compulsivamente ao abrigo da leireferida no nmero anterior, no prazo de dois mesesaps a entrada em vigor da presente lei, comunicamao tribunal competente a situao clnica desses doentese os fundamentos do respectivo internamento e iden-tificam o processo onde tenha sido proferida a decisoque o determinou.

    3 Quando a deciso de internamento seja proferidaaps a entrada em vigor da presente lei, o prazo referidono nmero anterior conta-se aps o incio da execuoda deciso que tenha determinado o internamento.

  • 3550 DIRIO DA REPBLICA I SRIE-A N.o 169 24-7-1998

    4 O tribunal solicita entidade que determinouo internamento o processo em que a deciso foi pro-ferida e, uma vez recebido, d cumprimento ao dispostono artigo 35.o da presente lei.

    SECO II

    Disposies finais

    Artigo 46.o

    Gesto do patrimnio dos doentes

    A gesto do patrimnio dos doentes mentais nodeclarados incapazes regulada por decreto-lei.

    Artigo 47.o

    Servios de sade mental

    A organizao dos servios de sade mental regu-lada por decreto-lei.

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    Artigo 48.o

    Entrada em vigor

    A presente lei entra em vigor seis meses aps a suapublicao.

    Artigo 49.o

    Revogao

    revogada a Lei n.o 2118, de 3 de Abril de 1963.

    Aprovada em 18 de Junho de 1998.

    O Presidente da Assembleia da Repblica, Antniode Almeida Santos.

    Promulgada em 8 de Julho de 1998.

    Publique-se.

    O Presidente da Repblica, JORGE SAMPAIO.

    Referendada em 14 de Julho de 1998.

    O Primeiro-Ministro, Antnio Manuel de OliveiraGuterres.