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LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

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A prova pretende demonstrar as mais valias que esta tipologia urbana de Xangai, pode apresentar para as novas concepções da habitação urbana, assim como pretende demonstrar, através da comparação do lilong com arquitecturas domésticas de outra cultura e tempo, que existe algumas condições da habitação urbana que resistem à diferença cultural, social e ao tempo.

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Prova Final para Licenciatura em Arquitectura,

Acompanhada pelo prof. Doutor Rui Ramos

Estágio realizado no atelier Enginesa em Andorra, sob a responsabilidade do

Arquitecto Pau Iglesias Rodriguez, durante o período de tempo de Setembro de

2007 a Fevereiro de 2008.

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Agradecimentos:

Aos meus pais, tia e Niko pelo apoio, dedicação e paciência;

Ao professor Rui Ramos, pela orientação, interesse, e disponibilidade sempre

demonstrados;

À minha colega Xangaiense Jia e ao professor Zhang Liang, que me

proporcionaram informação bibliográfica;

Às minhas amigas, Catarina (responsável pelo design da capa) e Patrícia, pela

ajuda, atenção e companheirismo;

À minha prima Natércia pela ajuda na correcção ortográfica.

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ÍNDICE

7 RESUMO

9 INTRODUÇÃO

12 I. XANGAI NA CHINA [1368-1940]

13 Contexto geográfico

17 Xangai, antes da chegada dos ocidentais

21 As concessões estrangeiras: o desenvolvimento urbano de Xangai

30 II. L ILONG, A IDENTIDADE URBANA DE XANGAI

31 Tipo e identidade

34 Da casa-pátio chinesa ao Lilong

44 A matriz tipológica do Lilong

48 A adaptabilidade do Lilong

54 II I . O LILONG COMO FORMA URBANA

57 O tipo arquitectónico e a forma urbana

61 A forma urbana e a cidade chinesa

64 IV. O LILONG E OS “MAT-BUILDING” CONTEMPORÂNEOS

74 V. O L ILONG E O HABITAR CONTEMPORÂNEO

84 VI. UM CASO DE ESTUDO EM XANGAI: “O LILONG

CONTEMPORÂNEO”

97 CONCLUSÃO

101 CITAÇÕES

111 BIBLIOGRAFIA

115 ORIGEM DAS IMAGENS

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RESUMO

PALAVRAS-CHAVE: Xangai; Lilong; tipo; identidade; forma urbana; mat-building,

habitação urbana, habitar contemporâneo.

Num processo de urbanização e industrialização de grande magnitude, únicos no

mundo, a China dos tempos de hoje aporta uma arquitectura contemporânea de

enormes infra-estruturas de difícil definição e descrição, que no entanto, não deixa

de atrair a atenção devido à sua escala urbana. Neste âmbito, encontra-se a cidade

de Xangai como o novo pólo urbano e económico da China, onde a modernização

funcional acompanha uma modernização simbólica.

O recente e rápido desenvolvimento de uma indústria de construção e a

ausência de uma referência com suporte em conceitos claros e um vocabulário

próprio na arquitectura contemporânea chinesa, começa a pôr em causa a

identidade de Xangai, que por muito tempo foi garantida pelo lilong, a tipologia

urbana típica desta cidade.

A pressa de alcançar o futuro e o esquecimento das mais válidas soluções do

passado em Xangai são contrapostas neste trabalho através de uma análise tipo-

morfológica sobre o lilong que pretende demonstrar as mais valias que esta

tipologia apresentou para a identidade de Xangai e que continua a apresentar para

as novas concepções da habitação urbana.

Centrado no tema da habitação urbana, o propósito desta prova final é

demonstrar a vitalidade e a capacidade do lilong em proporcionar princípios

conceptuais pertinentes no desenvolvimento da habitação urbana, não só em

Xangai como no Ocidente, uma vez que esta tipologia se adaptou às diferentes

temporalidades e culturas do mundo.

O lilong apresenta-se como um elemento de fulcral importância nestas

dicotomias entre habitação/cidade, espaço urbano/doméstico e colectivo/

individual.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho propõe o estudo do lilong como tipologia definidora da

identidade e forma urbana de Xangai e como referência para a arquitectura

contemporânea. Para tal, este ensaio utilizará uma análise tipo-morfológica sobre o

lilong em confronto com a história da habitação urbana ocidental, a fim de clarificar

os seus valores e a aplicabilidade destes no processo criativo de futuros projectos

de habitação urbana contemporânea.

A escolha deste tema deriva de uma angústia pessoal resultante da verificação

do estado de declínio e da desvalorização do lilong que presenciei quando estive

em Xangai no âmbito da disciplina de projecto Ville et Patrimoine en Asie sobre

Xangai da École Nationale Supérieure d'Architecture de Paris-Belleville (ano de

Erasmus 2006/2007).

A arquitectura como arte não se desenvolve no tempo de forma casual.

Necessita de recorrer a referências arquitectónicas antecedentes indispensáveis ao

acto de projectar. Cada obra é o produto de várias referências, resultante das

experiências e conhecimentos de outras obras, arquitectos e culturas, assim como

também é uma potencial referência para posteriores projectos. Deste modo, entre

diferentes projectos existem determinados caracteres que se repetem. Estes

caracteres, com um carácter de “recorrência”, são os que são pretendidos

encontrar no lilong, como tipologia residencial, valorizando-os como uma referência

significativa na concepção da forma urbana do habitar contemporâneo.

Compreender a tipologia urbana implica perceber a história política, económica,

social e cultural da cidade que lhe deu forma, uma vez que é caracterizadora da

identidade da cidade que lhe deu origem. Neste âmbito, o primeiro capítulo

pretende inserir a tipologia urbana de Xangai, o lilong, no contexto histórico,

político, económico e social da cidade chinesa. Serão abordados, portanto,

aspectos sobre o espaço urbano e a arquitectura tradicional típicos e únicos da

cultura chinesa para facilitar a análise tipológica do lilong que se sucede.

O estudo do lilong como tipologia definidora da identidade de Xangai será

abordado ao longo do segundo capítulo, a partir da análise e da avaliação dos

factos arquitectónicos concretos da tipificação e dos vários modelos do lilong.

Contudo, não se pretende uma análise por semelhança de identidade de funções,

mas sim por semelhança de situações arquitectónicas, ou seja, uma associação

conceptual através de projecto a fim de encontrar a estrutura conceptual desta

tipologia. Com este fim será abordado o modelo que deu origem ao lilong, a sua

transformação e evolução. Para tal, este capítulo foi dividido segundo os momentos

marcantes da evolução da tipologia e auxiliares na sua definição.

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A tipologia residencial foi considerada pelos modernistas como o principal factor

na estruturação da forma urbana da cidade. Nesta linha de pensamento, dedicou-

se o terceiro capítulo à análise morfológica do lilong a fim de definir os diferentes

elementos que constituem a forma urbana característica de Xangai e as relações

que estabelecem entre eles, ou seja, o padrão urbano que lhes é inerente, para

completar a análise tipo-morfológica.

Analisado o lilong como tipologia e forma urbana de Xangai, pretende-se no

quarto capítulo confrontar o seu tipo com as tipologias da habitação urbana

contemporânea que apresentam princípios ordenadores de projecto semelhante

aos do lilong, a fim de que este ganhe credibilidade como estrutura conceptual de

referência à projecção de novas residências contemporâneas. Para atingir este

objectivo, o critério utilizado foi o conceito/processo “mat-building”, uma vez que

aborda temas actuais da arquitectura e da sociedade presentes em alguns

projectos contemporâneos e porque, como processo, este apresenta princípios

ordenadores de projecto semelhantes ao lilong.

Houve, no que foi anteriormente exposto, a intenção de insinuar que o lilong é

um mat-building, mas, como o trabalho pretende confrontar duas culturas

diferentes no âmbito da arquitectura contemporânea e o lilong responde a este

processo, é pertinente confrontar alguns projectos mat-building com a tipologia

urbana de Xangai.

O lilong caracterizou desde cedo a identidade urbana de Xangai e, por isso, o

segundo campo de estudo será o de estabelecer pontes entre esta tipologia e a

arquitectura contemporânea. Dedicou-se, então, o quinto capítulo a questionar o

papel das suas premissas na definição do espaço doméstico segundo as

transformações sociais, culturais, tecnológicas, que definem o habitar ocidental de

tendência global, implícitas também nos mat-building.

Para percebermos melhor as falhas e virtudes dos conceitos do lilong, dedicou-

se o último capítulo ao teste da aplicação prática dos conceitos derivados da

análise tipo-morfológica e do confronto entre o lilong e a arquitectura

contemporânea, através do projecto teórico-prático realizado na disciplina Ville et

Patrimoine en Asie, em Xangai. Ainda que as experiências académicas não sejam

aceites como prova de qualquer teoria, por derivarem de conhecimentos limitados

às mesmas, apresentam soluções possíveis a problemas colocados, assim como

deixam questões no processo aberto de projecto.

O trabalho é apresentado como um possível resultado projectual para o estudo

da habitação urbana, uma vez que as limitações do exercício restringiam-se à

análise em grupo sobre o lilong e às condições morfológicas do terreno.

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LILONG, TIPOLOGIA URBANA DE XANGAI, UMA REFERÊNCIA PARA A ARQUITECTURA CONTEMPORÂNEA

* Todos os excertos ao longo do trabalho cuja fonte não está na língua portuguesa foram por mim

traduzidos, estando retirados em anexo no final deste trabalho.

* As palavras em cinza claro que, por vezes, aparecem ao lado do texto correspondem a tópicos

primordiais dos respectivos sub-capítulos ou capítulos.

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Mapa das Concessões estrangeiras em Xangai (1904)

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I. XANGAI NA CHINA [1368-1940]

CONTEXTO GEOGRÁFICO

A imagem de uma pequena cidade de pescadores que se converteu, depois da

implantação dos estrangeiros, na fascinante metrópole chinesa dos inícios do

século XX, é ainda hoje a imagem mítica de Xangai. O sentido etimológico da

palavra Xangai gravou esse mito, uma vez que, devido à sua posição geográfica,

conseguiu uma postura estratégica no comércio marítimo e fluvial, a qual ficou

gravada como (Xang) “em cima” e (ai) do “mar”.

Como podemos observar, a cidade portuária situa-se num lugar-chave do

território chinês, ou seja, a meia distância dos dois pólos de desenvolvimento

(Pequim-Tianjin a norte e Hong Kong a sul) e no desemboque do Yangzi o qual

atravessa todo o País de oeste a este e comunica Xangai à região do Jiangnan1.

O território de Xangai compôs-se por muito tempo, portanto, por uma rede

fluvial (rios e canais de água) que tinha como principais objectivos impedir as

inundações assim como irrigar melhor a planície composta por terras agrícolas ricas

em arroz e peixe2.

A rede de canais de água e a produção agrícola permitiu que, na época do

Confecius, ou seja, na dinastia da Primavera e Outono (721-481 a.C.), Xangai

pudesse inscrever-se numa rede económica e cultural das pequenas cidades de

água, que compunham a região do Jiangnan. Esta situação privilegiada a uma

escala nacional serviu de trunfo na ascensão de Xangai.

Durante muito tempo, o território da cidade de Xangai compreendia apenas a

parte Oeste do rio Huangpu de 500m de largura, enquanto que a outra parte do rio

foi construída, no início do século XV na dinastia de Ming, através de uma vasta

rede de canais de água e afluentes do Yangzi, o qual teve o nome de Puxi. Só a

partir do século XIX e XX, depois de ter sido promovida como a nova zona

económica (no início de 1990 pelo Primeiro ministro Zhu Rongji), é que esta ampla

planície foi urbanizada como parte da cidade de Xangai, a qual mudou o nome para

Pudong.(ver fig.2 capítulo VI)

1 A região de Jiangnan compreendia Jiangsu a norte, Xangai ao centro Este e uma parte de Anhui, e

a sul Zhejiang. GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de

doctorat, EHESS, Paris, 1997, p.25 2 SCHOENAUER, Norbert, 6000 años de hábitat: de los poblados primitivos a la vivienda urbana en

las culturas de oriente y ocidente; trad. Josefina Frontado, Barcelona, Gustavo Gili, 1984, p. 197

Xangai

Fig.1 O delta do Yangzi 6000 anos a.c, e o

lago Tai, a meio da zona pantanosa (azul claro). O pontilhado é o traçado actual do território de Xangai.

Fig.2 Mapa da China.

Fig.3 O lado direito do rio Huangpu correspon-

de a Puxi em 1931.

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O rio Huangpu, que separa portanto o território em dois, tem um traçado

curioso resultante da junção, no século XV, de dois rios: um deles era o rio Suzhou,

que vinha do lago Tai, e o outro era o Dongjiang, alimentado pelo lago Ding.3 A

forma como Xangai organizou a sua rede de canais e o rio Huangpu, determinou,

com a implantação de postes militares, mercados, templos e edifícios públicos, a

sua função como cidade comercial em vez de capital administrativa.4

No fim do século XI, Xangai adquire o título administrativo de cidade (Zhen),

com o respectivo imperador responsável pelas taxas dos barcos comerciais. Esta

cidade-comerciante inscrevia-se, já na época, numa rede dupla composta por uma

estrutura urbana e administrativa de trocas comerciais que integrava a capital da

província, Songjiang, as prefeituras, os distritos, as aldeias e a erudita malha de

canais fluviais que serviam de vias de transporte, de irrigação e de esgotos.5

Em 1292 durante a prefeitura de Songjiang, Xangai converte-se num distrito

(xian) com cinco sub-prefeituras que pouco depois veio a acolher o escritório

imperial responsável pelo comércio do ultra-mar, que lhe facilitou o crescimento da

região e o reconhecimento da sua importância política e económica na China. Esta

ascensão permitiu-lhe construir uma muralha desde a dinastia Song (1127-1279)

até à dinastia Ming. Mas, é só na dinastia de Ming (1368-1644) e Quing6 (1644-

1911) que Xangai consegue desenvolver o seu comércio e a sua paisagem, através

do crescimento dos canais e rios como vias de trocas primordiais para o

desenvolvimento urbano.

Ainda com os ataques frequentes dos piratas que impediam o comércio nas

zonas costeiras, Xangai conseguiu, em 1685, sobre o imperador Kangxi, reforçar a

sua posição dominante nas trocas comerciais, através de uma taxa de interdições

sobre o comércio marítimo e da implantação da alfândega (1730) no cruzamento

das cinco e maiores rotas marítimas do país. Esta posição comercial veio reforçar a

cultura especializada do algodão e a fabricação dos produtos têxteis reputados em

Xangai.

No século XVIII, a cidade deixa de ser uma zona de influência regional e passa a

centro comerciante portuário de vocação internacional, superando as prefeituras

vizinhas, Songjiang e Suzhou, devido aos administradores ou governadores da

cidade e às corporações responsáveis pelo comércio que controlavam o

crescimento económico e urbano da cidade.

3 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op.cit., p.40 4 Ibid., p.34 5 GED, Françoise, Shanghai, collection, Portrait de ville, suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.14 6 De todos os impérios da China, o império de Quing é aquele que atingiu maiores dimensões e que

conseguiu um crescimento considerável de riquezas interiores chinesas superior aos outros países

da Ásia, devido ao seu poder comercial e artesanal e ao crescimento da população. O Império

Chinês representava assim a maior potência do continente asiático. GED, Françoise, Shanghai:

habitat et structure urbaine1842-1995 ,op.cit. ,p.40

Fig.4 A azul está o rio Huangpu que desagua

no leito Dongjiang (1325-1400).

Fig.5 As cinco sub-prefeitura de Songjiang na

dinastia de Ming: a cidade amuralhada, Songjiang, ao centro e a nordeste, perto do rio Huangpu, estava a sub-prefeitura de Xangai.

Fig.6 O território de Xangai na dinastia Song

(1127-1279). O rio Sonjiang a Norte e o

huangpo, paralelo ao anterior, a sul.

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15

Enquanto que os administradores adoptavam a posição de governador em

cada circuito (daotai),7 as corporações ou associações, (huiguan e gongsuo)8,

foram as que permitiram o desenvolvimento económico e urbano de Xangai.

Porém, quem permitiu o desenvolvimento apenas urbano, foram as

corporações locais, na medida em que dispunham de vastos terrenos fora da

muralha para a construção dos templos dedicados ao deus do lugar, as cenas de

teatro, jardins, escritórios, hotelarias, cemitérios, e também eram elas que loteavam

os terrenos e alugavam as casas construídas para os seus compatriotas originários

do mesmo país. As associações ficaram responsáveis pelas trocas comerciais (chá,

carvão, soja, açúcar, etc.)

Tal como disse Françoise Ged, em relação às corporações: “Estes tiveram

duplo título, a de arquitectos de extensão urbana, ao mesmo tempo motores de

desenvolvimento económico o qual estava ao alcance das redes assentes sobre

uma relação identitária do país de origem, e verdadeiros construtores da cidade,

dos seus edifícios de prestígio como das construções ordinárias.”9.

7 Como cada província da dinastia de Quing subdividia-se em circuitos, para cada um havia dois

administrador, um responsável por recolher os impostos dos cereais e de lançar as taxas de

transporte das mercadorias, e o outro, desempenhava a função mais civil e administrativa, Ibid.,

p.39 8 Idem 9 Ibid., p.42

Fig.7 A antiga região do Jiangnan: Xangai, Zhejiang, Jiangsu e uma parte de Anhui.

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Fig.8 Representação contemporânea de Xangai na dinastia de Ming.

Fig.9 A rede de canais de água e a muralha do distrito de Xangai na dinastia de Quing.

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XANGAI, ANTES DA CHEGADA DOS OCIDENTAIS

As pequenas cidades actuais de água do Jiangnan, como Tongli, Nanxun, Xitang,

Zhouzhuang, situadas a menos de 100Km de Xangai, reflectem, ainda hoje, a

antiga organização urbana de Xangai, composta pelos referidos canais de água,

antes da chegada dos ocidentais: uma sob-prefeitura, que, como cidade

administrativa do império chinês, continha uma muralha redonda10 à qual

circundava uma mancha homogénea de edifícios de madeira e em tijolo revestido a

cal, com telhados de telha cinzenta e poucos edifícios notórios, se comparamos

com outras cidades capitais chinesas. Assim o afirmaram os ocidentais quando

chegaram pela primeira vez a Xangai, em 1849:

“Apercebemo-nos rapidamente que apesar da sua actividade barulhenta na

periferia, Xangai era ainda uma pequena cidade. Quando passámos a muralha, feita

de terra batida com um fino revestimento exterior em tijolo, reparámos que eles

fechavam uma cidade medíocre e que dominavam as periferias sórdidas.”11.

Embora estivesse circundada por um canal à semelhança de Pequim, a forma

da muralha de Xangai, assim como a estrutura da cidade nas dinastias de Ming e

Quing, não seguiam o mesmo modelo das cidades capitais chinesas: muralhas

quadradas, encaixadas por outros quadrados, rodeadas por muros e com uma

fortificação interior para proteger o acesso ao palácio real das suas dependências.

Contudo, tal como outras cidades chinesas comerciantes, a organização da cidade

e os edifícios que definiam Xangai possuíam um grande valor simbólico.

Essa simbologia encontra-se presente nos mapas dos arquivos locais da

época, uma vez que apenas mostravam o elemento muralha e os respectivos

edifícios “oficiais” remarcáveis de uma cidade capital comerciante, sabendo que

nesse período a cidade transbordava a fortificação a sul e a este, ao longo do rio

Huangpu12. Tanto é assim, que Norbert Schoenauer refere:

“(...) isto reflecte-se na linguagem chinesa, a qual não faz a distinção entre “cidade”

e “muralha da cidade”, utilizando apenas uma única palavra para ambas as

ocasiões, cheng. De facto, as ditas fortificações dominavam não só o aspecto

externo da cidade como também o seu interior, todos os edifícios se agrupam

juntamente com os seus respectivos pátios, formando pequenos recintos

separados entre si” 13.

10 A muralha era redonda nas cidades comerciais do sul e quadradas nas cidades-capitais. GED,

Françoise, “Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, in

http://sources.asie.free.fr/espace/culture/inalco-cnrs/habitat/FGed.html (em 15/12/2007) 11 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine 1842-1995, op.cit., p.53 12 Sabíamos da sua existência devido à respectiva densidade das ruas que davam sobre as portas

da cidades, registado nos mapas. 13 SCHOENAUER, Norbert, 6000 años de hábitat : de los poblados primitivos a la vivienda urbana

en las culturas de oriente y ocidente, op. cit., p.199

Fig.10 A periferia rural de Xangai, uma paisagem desenhada que associa edifícios,

campos e canais.

Fig.11 O modelo de cidade administrativa chinesa.

Fig.12 A cidade de Xangai e os seus subúrbios

em 1860.

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A muralha chinesa não tinha apenas uma vocação política e de defesa como

nos países ocidentais. Ela instituía o espaço urbano, ou seja, não limitava apenas,

mas servia sim de elemento estruturante do espaço construído. Na China, o muro,

ou a muralha, independentemente das condições à realização de um recinto, é a

primeira coisa que um chinês efectua para delimitar o seu lugar de vida14. Segundo

Zheng Zu’an esta simbologia relacionava-se com o poder central: “Na China

imperial, a muralha simboliza a elevação de um centro urbano ao redor do “chefe

do lugar” de um registo (xian).” 15.

Os edifícios oficiais (o Yamen16 e a residência do daotai) também tinham um

carácter simbólico na medida em que eram encomendados pelos governadores

locais que queriam marcar a sua presença na capital dos circuitos comerciais. Para

tal, estes edifícios adquiriam uma posição central em relação ao interior da muralha

de Xangai.

14 GED, Françoise ,”Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, op. cit. 15 HENRIOT Christian, Zu’an Zheng, “Divisions de la ville à Shanghai (XIXe -XXe siècles)” in Les

divisions de la ville, édictions Unesco, édictions de la Maison des sciences de l’homme, p.161 16 O Yamen é a residência oficial dos administradores que desmpenhavam a função civil e

administrativa, característica da cidade capital provincial com muralha. Em 1720, Xangai teve direito

ao Yamen devido à posição estratégica comercial que tinha conseguido. GED, Françoise, Shanghai :

habitat et structure urbaine 1842-1995, op.cit., p.37

Fig.13 A muralha de Xangai com 8m de altura e 4,5Km de perímetro, e os seus principais edifícios em 1840.

1. Yamen do magistrado de Xian 2. Templo do Deus protector da cidade (Chenghuangmiao) 3. Jardim de Oeste 4. Escola

5. Hall dos exames (Wumiao) 6. Templo do Deus da Guerra 7. Instituto das cartas 8. Templo do espírito da fortuna 9.

Pequeno terreno de treino 10. Yamen do administrador do percurso (Daotai) 11. Templo do espírito do fogo 12.

Tongdetang (instituto caritativo) 13. Yingyutang (orfanato) 14. Tongrentang (instituto de caridade) 15. Hongqiao (ponte) 16.

Ponte do sotão a Oeste (Xicangqiao) 17. Residência do comandante da guarnição 18. Templo de Guan De, o deus da

Guerra 19. Porta do Norte 20. Templo de Tianma 21. Alfândegas interiores chinesas 22. Pequena porta de Este 23.

Grande porta de Este 24. Grande porta do Sul 25. Pequena porta do Sul.

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19

Embora as instituições literárias, o templo do Confúcio17 e do Deus protector da

cidade, e algumas casas prestigiosas fossem edifícios remarcáveis da cidade, estes

não tiveram direito a uma posição urbana codificada, porque eram construídas

pelas associações comerciais18 que não representavam o poder imperial. Contudo,

mantiveram a sua posição no interior da cidade, não sendo porém central.

Ao contrário das cidades europeias da Idade Média ou do Renascimento em

que os edifícios remarcáveis construídos em pedra e em tijolo continuam hoje

presentes na cidade, na China poucos foram os que ficaram, devido às mudanças

dinásticas das capitais que, na maioria, destruíam para substituir os edifícios oficiais

por outros. No caso das cidades comerciantes, como Xangai, os edifícios

remarcáveis eram escassos, daí apenas existir hoje o jardim Yu19.

A representação de Xangai, como de qualquer outra cidade chinesa, é mais

simbólica que propriamente descritiva. Enquanto que os ocidentais precisam dos

números e dos nomes das ruas para se orientarem no espaço urbano, os chineses

apenas precisam de elementos distintivos, tais como os edifícios oficiais, as portas

e as pontes20.

Esta simbologia não tem apenas uma conotação urbana, pois também na

arquitectura residencial existia uma distinção entre os edifícios segundo a classe

social hierárquica do funcionário. A distinção era feita de acordo com o número e o

tamanho do módulo e do pátio que compunha a casa-pátio, e não segundo a

decoração exterior como acontecia na arquitectura ocidental 21. (fig.17)

Esta hierarquização social também se reflectia no interior das residências

ordinárias. Como a família chinesa era de tipo extensiva e seguia os princípios do

Confúcio22 a organização da casa tradicional chinesa devia marcar “uma distinção

17 O templo de Confecius, fundado em 1260, era composto por uma sucessão clássica de edifícios,

orientados a Norte e de pátio interiores. Ibid., p.44 18 “Estas associações, quando se instalavam, o primeiro que construíam era em general a edificação

de um templo dedicado ao Deus local e o estabelecimento de um cemitério ou um lugar para as

motuárias, e asseguravam o tratamento dos edifícios que abrigassem as diversas actividades

comunas dos seus imigrantes: templos, escolas, instituições caridosas, cais, fábricas. etc.” Idem 19 O jardim Yu, construído entre 1560 e 1578, serviu para abrigar a família Pan. Hoje é ponto de

turismo em Xangai pelos seus jardins tradicionais e pela residência do chá. GED, Françoise,

Shanghai, collection Portrait de Ville, op.cit., p.16 20 HENRIOT Christian, Zu’an Zheng, “Divisions de la ville à Shanghai (XIXe-XXe siècles)” in Les

divisions de la ville, op. cit., p. 170. 21 O enfoque das casas ocidentais viradas para a rua deu resultado a um grande ênfase nas

fachadas. SCHOENAUER, Norbert, 6000 años de hábitat : de los poblados primitivos a la vivienda

urbana en las culturas de oriente y ocidente, p.367 22 Dos seguidores de Confúcio, no século IV a.c., o Meng zi (Mêncio ou Mâncio) e Xun Zi

procuraram compreender o confucionismo dentro de uma perspectiva naturalista. O confucionismo

não é uma religião pois possui, em vez de um credo estabelecido, determinações rituais de carácter

social, que permitem a um adepto do confucionismo a liberdade de crença em qualquer tipo de

sistema metafísico ou religioso que não vá contra as regras de respeito mútuo e etiqueta pessoal.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Confucionismo (em 03/ 05/2008)

Fig.14 Sede administrativa (xian) de Xangai. Dinastia Quing.

Fig.15 Templo do deus protector da cidade

(Chenghuangmiao). Dinastia Quing.

Fig.16 A porta na avenida Gubei, que hoje não existe. Fotografia de 1975.

Fig.17 Pequim: casa de dois patios. Como tinha mais do que um patio, esta casa era

destinada a uma família mais rica. O pavilhão a norte correspondia ao chefe da família, o pai.

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20

entre o interior e exterior, o superior e o inferior, o homem e a mulher ”23 Portanto, a

zona mais privada e interior, normalmente situada a Norte, destinava-se ao chefe

de família, e o resto do complexo organizava-se segundo uma ordem hierárquica

familiar.

Na proximidade da muralha e dos canais, localizavam-se as fábricas de cereais,

e no exterior situavam-se as pequenas fábricas e as habitações ordinárias.

Xangai não demorou muito tempo a adquirir as qualidades de uma cidade-

prefeitura em termos paisagísticos e a nível cultural. A sua situação geográfica, a

riqueza das terras e a gradual importância que foi adquirindo como porto regional

principal do negócio do algodão, ao longo do século XIX, serviu de apoio, ao

desafiar o porto de Suzhou24, às corporações que, com o dinheiro vindo do

comércio, investiram em actividades sociais.

Desta forma, Xangai conseguiu uma maior abertura tanto às trocas comerciais

marítimas nacionais como internacionais, Japão ou Coreia.

23 http://fr.wikipedia.org/wiki/Architecture_chinoise (em 27/02/2008) 24 Suzhou tinha perdido o seu papel de centro regional de trocas comerciais no inicio de 1850

devido aos transtornos físicos do rio Amarelo que acabou com o Grande canal, e ao ataque

destrutivo dos Taiping, o que permitiu que Xangai desenvolvesse os seus transportes fluviais. GED

Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.78

Fig.18 A extensão das concessões estrangeiras (1846-1914).

Page 25: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

21

AS CONCESSÕES ESTRANGEIRAS:

O DESENVOLVIMENTO URBANO DE XANGAI

Em 1832, o comércio estrangeiro na China era apenas realizado em Cantão pelos

Ingleses que viam este país como um território importante nas trocas comerciais,

isto sem imaginarem a riqueza que os esperava em Xangai.

A assinatura do tratado de Nankin em 1842, consequente da guerra do Ópio25,

facultou, para além do desenvolvimento naval, a abertura forçada dos cinco portos

da China (Cantão, Xiamen, Fuzhou, Ningbo e Xangai). Tal acontecimento

possibilitou que Xangai, em 1843, estabelecesse o seu comércio e circulasse numa

rede de relações comerciais entre os países signatários, com uma regularização de

relações de comércio e de navegação estabelecidas a largo tempo.

Esta situação permitiu, com a chegada de pessoas ligadas ao comércio e

transporte de Cantão e Ningbo26, consagrar vários trabalhos aos xangaienses27 que

melhoraram a postura da cidade como porto, no qual transitava mais da metade

das exportações e das importações chinesas.

Em consequência à abertura do porto de Xangai, os ocidentais instalaram-se no

território da cidade como aconteceu nos outros portos. No entanto, a atribuição e a

limitação dos terrenos foram definidos em acordo com as autoridades chinesas e

não segundo um arrendamento limitado por um poder estrangeiro. Daí a atribuição

do nome de “settlement” em inglês e “concession” em francês, ou seja, concessão

em português, aos terrenos governados pelos estrangeiros.28

Em relação à apropriação dos terrenos, as autoridades chinesas sentiram-se

obrigadas a registar uma cláusula, o Land Regulation29. Esta consistia em conceder

o privilégio da extraterritorialidade dos terrenos livres chineses aos ocidentais se

estes os explorassem para fins comercias e de habitação. Esta medida evitava

possíveis confrontos entre as duas culturas.

O Land Regulation fez com que cada concessão criasse o seu próprio sistema

administrativo, composto pelo conselho municipal, por um posto policial e um

controlo das alfândegas, ainda que os terrenos nominalmente dependessem da

25 A chamada Guerra do Ópio (provocada pelo estado chinês aos ingleses que exportavam ópio da

Índia para a China em troca de têxteis) terminou quando os chineses foram obrigados a assinar o

Tratado de Nanquim. Esse tratado fez com que o governo da Inglaterra conseguisse uma série de

vantagens económicas. http://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Nanquim (em 12/03/2008) 26 No início do século XIX, os comerciantes de Ningbu conseguiram uma posição dominante e

controladora de uma grande parte da economia de Xangai através de duas associações, Siming

gongsuo e Shanghai quianye gongsuo. GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine,

1842-1995, op. cit., p.78 27 Trabalhos como: produtores, transportadores, comerciantes e financeiros, 28 Idem 29 O Land Regulation consiste num conjunto de regulamentações sobre a renda fundiária dos

residentes ocidentais, que definiam por oficial os modos de aquisição dos terrenos, os

procedimentos para a eliminação dos santuários ou os modos de percepção das taxas nas

concessões. Idem

Fig.19 O Governo federal sobre a Ribeirinha,

em Xangai (1840). Chegada das mercadorias de Ópio e seu armazenamento ao longo do Bund.

Fig.20 Arsenal do Jiangnan, construído em

Xangai em 1865.

Fig.21 Concessão Francesa 1898.

Page 26: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

22

propriedade do imperador. Porém, no que dizia respeito à gestão urbana, cada

concessão e a autoridade chinesa tinham ao seu dispor grupos privados distintos:

para a primeira estavam os representantes das grandes firmas comerciais30 e para

a segunda estavam as corporações que administravam os trabalhos públicos e

cuidados médicos.

Por conseguinte, foram definidos os limites das Concessões em função dos

limites geográficos existentes. Entre 1846 e 1848, foram concedidos os terrenos

dos subúrbios da cidade amuralhada a norte do canal de água Yangingbang (actual

rua Yan’an) à Concessão Britânica31, e, em 1849, a sul desse canal encontrava-se

a Concessão Francesa. As concessões e os bairros chineses estavam limitados, a

este e a norte, pelo Huangpu e o rio Suzhou e, a oeste, pelo o antigo canal Creek.

Ambas as concessões adoptaram uma posição estratégica ao longo do rio

Huangpu. No entanto, a concessão britânica foi a que conseguiu beneficiar de um

largo acesso, pelo rio Suzhou, ao huangpu para atracar os seus barcos do

comércio, que, mais tarde, se reflectiu na sua predominância no comércio exterior.

Os americanos, como foram os últimos a chegar, negociaram uma parte do

território que percorria o Huangpu a norte do rio Suzhou, que, posteriormente, em

1863, depois de obter o estatuto de concessão, se reagrupou à nova concessão

britânica, formando assim a Concessão internacional.32

Os primeiros edifícios a serem construídos nas ruas principais das concessões

(bancos e as companhias de transporte) retomaram as características dos modelos

dos armazéns de Cantão e de Macau, devido aos compradores e negociantes

vindos destas cidades: edifícios com grandes varandas em madeira, com os

escritórios no rés-do-chão e os apartamentos do chefe da firma no primeiro andar.

Nas ruas secundárias localizavam-se os edifícios anexos como as residências, as

lojas e os armazéns.33

Paralelamente, as ambiciosas casas comerciais e os bancos dos ocidentais

foram fixados na larga avenida do Bund (cais), que, por muito tempo, foi o lugar de

chegada de todo o viajante. As fachadas destes edifícios inspiradas no barroco

neo-colonial34, foram as que deram a fama e serviram de imagem representante da

cidade.

30 Por vezes, estes representantes faziam parte do concelho municipal, excepto na concessão

francesa que tinham que se submeter sempre ao consulado que estava por em cima. Idem 31 Os Britânicos foram os que deram forma à administração municipal da concessão em Xangai,

através da palavra Settlement. HENRIOT Christian, ZU’AN Zheng, atlas de SHANGHAI, espaces et

représentations de 1849 à nous jours, Collection Asie Orientale, Paris 1999, p.70 32 O projecto de apenas e única concessão não incluiu a concessão francesa porque o governo

francês preferiu conservar a sua autonomia nacional no extremo-Oriente. GED, Françoise, Shanghai,

collection Portrait de Ville, op.cit., p.16 33 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine,1842-1995, op. cit., p.66 34 Estes edifícios tinham sido construídos pelos obreiros e carpinteiros chineses formados pelos

arquitectos europeus que seguiam o registo neoclássico em vigor na Europa. GED Françoise,

Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.75

Fig.22 O azul corresponde ao rio Suzhou, o

vermelho ao antigo canal Creek, e o laranja ao antigo canal Yangingbang.

Fig.23 Os edifícios importados de Cantão na Concessão francesa.

Fig.24 As fachadas neoclássicas dos bancos e

edifícios comerciais da avenida Bund (1937-1939).

Page 27: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

23

A extensão de Xangai tinha quase duplicado com a adjunção das concessões

contíguas à cidade amuralhada e aos seus subúrbios. Em 1914, segundo um

acordo com a missão jesuíta, a superfície da Concessão francesa tinha aumentado

para o dobro, passando de 76 a 145 hectares. A Concessão internacional apenas

teve a sua extensão depois do tratado de Shimonoseki 35, com o pedido em 1896

do consulado britânico às autoridades chinesas. Cada vez mais, as concessões

sentiam a necessidade de obter mais terrenos para construir.

O Land Regulation, que apenas possibilitava a construção de estradas

exteriores na extensão das concessões, foi um pretexto para os ocidentais obterem

mais terrenos para a construção de jardins públicos e lugares de lazer fora do limite

das concessões. No entanto, esta fase apenas permitiu a construção de fábricas e

residências na extensão da concessão internacional, assim como a estação de

comboios que ligava o centro de Xangai ao distrito de Baoshan e a Jessfield Road

(a actual rua de Nankin-oeste), visto que, em 1909, foram negados pelo governador

provincial em Nankin e abolidos depois da Revolução de 191136.37

O conjunto formava, portanto, um território contínuo no seu aperto, mas longe

de ser homogéneo na sua urbanização.

35 O Tratado de Shimonoseki, assinado entre a China e o Japão a 17 de Abril de 1895 na localidade

japonesa de Shimonoseki, pôs fim à Primeira Guerra Sino-japonesa e marcou o final da conferência

de paz entre o governo chinês da dinastia Qing e o governo do Império Japonês.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Shimonoseki (em 12/03/2008) 36 Chama-se de Revolução Chinesa o movimento nacionalista que derrubou a dinastia Manchu

(Quing), em 1911, proclamando a república.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_Chinesa (em 12/03/2008) 37 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.120

Fig.25 A cidade chinesa, as concessões e as estradas exteriores: o campo de corridas (amarelo), o arsenal do

Jiangnan (a vermelho) e a Missão Xujiahui (a castanho no lado esquerdo), em 1912.

Page 28: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

24

CONTINUIDADE da estrutura rural chinesa

Em Xangai, a compra do terreno era sempre feita por intermédio de outra

autoridade chinesa que não a imperial, um processo tipicamente chinês. Quando

um ocidental comprava um terreno ao proprietário chinês, aquele devia transmitir

ao cônsul da respectiva concessão que, por sua vez, comunicava aos dirigentes da

cidade chinesa para o registo num documento oficial, pelos daotai. 38

Igualmente, tal como na cessão dos terrenos na dinastia de Quing, não era o

proprietário que pagava os impostos e que construía as residências, mas sim o

cultivador, que, neste caso, era o construtor chinês.

Deste modo, os ocidentais eram os proprietários, ou seja, os que compravam e

geriam as operações construtivas no terreno, e os construtores chineses eram os

que loteavam e alugavam as casas construídas e que, portanto, pagavam o

imposto de contrato de arrendamento. As missões religiosas também faziam parte

dos grandes proprietários imobiliários devido à sua especialização nas transacções

imobiliárias e nos empréstimos hipotecários. Como disse Françoise Ged: “Um tal

dispositivo favorece uma dupla especulação, fundiária e imobiliária, beneficiando os

interlocutores distintos, que são uns chineses e outros estrangeiros.”39.

Esses documentos oficiais foram registados em plantas cadastrais detalhadas e

estabelecidos em 1887 na Concessão francesa e em 1900 na concessão

internacional, depois da destruição dos antigos documentos de 1783, pelos

ataques da sociedade do Petit Couteau em 1853.40

38 Este documento oficial de cessão consistia num título de aluguer perpétuo, que não utilizava o

termo de venda, ainda que ficasse registado no nome do proprietário chinês que não tinha nenhum

direito sobre o terreno. Ibid., p.72 39 Ibid., p.18 40 O petit couteau, era uma sociedade que pertencia aos Taiping. O Taiping, foi um Movimento

(1851 e 1864) que, com a revolta popular e messiânica contra a Dinastia Manchu, ficou em 1853

com a sede da cidade chinesa. Esta revolução foi combatida pelas tropas imperiais chinesas com o

auxílio de militares ingleses e norte-americanos. Ibid., p.15

Fig.26 As ruas principais de Xangai, em 1932. Em vermelho estão sinalizados os terrenos vendidos durante o ano

de 1931.

Page 29: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

25

Estes títulos oficiais comportavam o nome do proprietário, a superfície do

terreno respectivo por um número de ordem, a localização, e a correspondência

com o número de lote do plano cadastral. Este tipo de registo por parcela,

correspondente ao proprietário ocidental, e por lotes, relativo ao proprietário

imobiliário chinês, foi directamente pensado para estabelecer o cadastro nas

concessões.41

A planta cadastral serve-nos de grande auxílio na análise da forma urbana que

se foi desenhando, uma vez que mostra as sucessivas transformações das

parcelas. Como disse Francisco Barata: “O modo como o cadastro do solo urbano

se subdivide, se redimensiona, se transacciona, se valoriza ou se depaupera está

globalmente ligado ao modelo de cidade que se está construindo, e de uma forma

muito directa ao conceito de espaço público e de estrutura viária que esse modelo

urbano integra.” 42.

A influência ocidental em Xangai não pretendeu transformar a estrutura do sítio,

pelo contrário, houve um “respeito” pelas suas características paisagísticas ao

sobreporem as novas vias às existentes.

Esta continuidade do traçado antigo deve-se ao facto da gestão urbana

pragmática ter sido lançada, não por um homem político ou urbanista, mas sim

pelos membros do Conselho Municipal que, juntamente com os proprietários

fundiários, pretendiam facilitar a ascensão comercial das suas firmas.

Os representantes fundiários sentiram-se obrigados a tapar e alargar a trama

dos canais de água que serviam de limite separador entre as propriedades, porque

se desenhassem as estradas sobre as parcelas dos proprietários, não poderiam ser

recompensados pelo Conselho Municipal.43

Assim, a primeira grelha de ruas da Concessão francesa tentou combinar,

segundo a trama existente, ruas afastadas entre elas de 150m, para poderem

reduzir ao máximo os custos de construção e de expropriação suportada pela

comunidade dos contribuintes.44

Encontramos aqui, portanto, o princípio de construção económico sem

nenhuma planificação de extensão urbana por uma autoridade administrativa. No

entanto, havia uma planificação partidária, relativa a cada concessão, no que dizia

respeito à regulamentação da circulação. Por exemplo, as ruas N-S, situadas na

proximidade do limite de ambas as concessões, deviam distar entre elas 100 a

200m e coincidir na mesma ponte do rio Suzhou, assim como a largura das novas

ruas principais e secundárias devia ser, respectivamente, de 12m e 7,5 a 9m.

41 Estes registos cadastrais serviam para estabelecer as diferentes taxas fundiárias e os impostos

locativos que asseguravam o orçamento do concelho municipal das concessão. Idem 42 FERNADES, Francisco Barata, Transformação e permanência na habitação portuense: as formas

da casa na forma da cidade, 2ª ed. Porto, Faup Publicações, 1999. p.309 43 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.73 44 Ibid., p.126

Fig.27 Evolução do terreno urbano de 1850 a

1930.

Fig.28 A cidade chinesa até ao século XIX.

Trama quadrangular menos regular que a da cidade de Pequim.

Page 30: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

26

Porém, foram poucas as ruas que tiveram continuidade. (fig.34) Como diz Christian

Henriot: “Mesmo se os regulamentos procuravam definir as regras de base para a

construção, aqueles resultaram de iniciativas privadas, sem a intervenção dos

poderes públicos para promover qualquer poíitica urbana” 45.

Em consequência, no centro das concessões, formou-se uma trama

rectangular mais ou menos regular relativa à rentabilização da trama existente. Esta

era menos compacta e mais regular quanto mais se afastava do centro. Este facto

devia-se ao afastamento dos canais que possibilitou o desenho de grandes

quarteirões para os bairros mais ricos, que aportavam excelentes benefícios.46

O início do tecido urbano, ao assentar sobre a malha rectangular dos canais de

água, desenhada pelos chineses, permitiu que o seu crescimento seguisse, de

forma legítima, o desenho da trama da cidade tipicamente chinesa. Como refere

Françoise Ged: “Esta marca física herdada da partição rural das terras marca a

cidade e lê-se sobre a planta do traçado das vias dos anos 1980 (...)”47.

Esta irregularidade da urbanização, visível no regulamento de construção das

concessões, no registo das plantas cadastrais e no atlas das ruas de Xangai, deve-

se ao modo de cessão dos terrenos aos ocidentais e à existência de três

administrações municipais concorrentes.

DESCONTINUIDADE da gestão urbana da cidade

A coexistência, na mesma cidade, de três administrações municipais concorrentes

(a francesa, a chinesa e a britânica, mais tarde a “internacional”) sobre a soberania

do Conselho Municipal favoreceu, sem dúvida, o nascimento de uma gestão

municipal original e não unificada de Xangai que durará até à guerra sino-japonesa

de 1945.

Xangai dispunha de dois grandes privilégios para a modernização da cidade

que as cidades Europeias, como Paris e Londres, tinham posto em prática ao

longo do século XIX. Por um lado, existia uma vontade por parte dos ocidentais que

vinham da Europa em modernizar os grandes terrenos da cidade, e, por outro lado,

Xangai apresentava uma amplitude de terrenos livres que, ao contrário das capitais

europeias, englobava o centro histórico que tinha sido queimado e destruído com a

revolta de 185348.

45 HENRIOT Christian, ZU’AN Zheng, atlas de SHANGHAI, espaces et représentations de 1849 à

nous jours, op. cit., p.26 46 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine 1842-1995, op. cit., p. 124 47 Ibid., p.73 48 A tomada da sede da cidade chinesa pela sociedade do Petit Couteau e a conquista da capital de

Nankin pelos Taiping em 1853, fez desaparecer com os subúrbios a norte e a este da muralha,

incluindo-a. Ibid., p.174

1899

Fig.29 Evolução urbana da Concessão

internacional no século XIX. Em laranja estão indicados os dois canais (Creek e

Yangingbang) que foram tapados.

Fig.30 A primeira extensão da concessão francesa. A segunda planta apresenta os quarteirões de 150m de largura.

Page 31: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

27

Contudo, as concessões não deram lugar a projectos urbanísticos com uma

envergadura semelhante às das cidades novas que foram construídas de raiz e na

mesma situação de crescimento demográfico e económico que Xangai. Um

exemplo é Nova Iorque, onde, entre 1803 e 1815, se planificou o desenvolvimento

de Manhattan segundo uma grelha quadrangular de 2 928 “blocos”, destinados a

facilitar o desenvolvimento urbano devido ao mercado imobiliário.49

Igualmente, a morfologia urbana de Xangai era desprovida de características

das cidades coloniais orientais construídas no século anterior e organizadas

segundo uma estrita ordem: planta tabuleiro, centrada por uma grande praça

reservada à catedral e à sede administrativa do governo da proximidade com ruas

bastante largas como é o caso da cidade de Hanoi (1888-1890). Também foi

destituída das características das cidades coloniais do ocidente: uma praça

propícia aos desfiles, um castelo militar, uma sede administrativa monumental,

grandes eixos que ligavam entre eles a catedral, o castelo e o palácio do governo,

como poderia ser o caso da cidade de Calcutá (1833-1912).50

Como podemos observar, este modo de gestão urbana é específico das

Concessões e não de uma cidade colonizada tanto no Oriente como no Ocidente.

Ainda que a forma viária e a grelha da cidade de Xangai se pareça com a da cidade

de Manhattan e algumas cidades coloniais, e que os períodos de formação

coincidam, a constituição do espaço urbano não revela o mesmo processo.

Este facto deve-se, por um lado, ao estatuto das concessões que não permitiu

programações urbanísticas ambiciosas como podiam fazer os políticos das cidades

referidas, pois os representantes estrangeiros não tinham ao seu dispor as mesmas

quantidades de terreno, devido às restrições das autoridades chinesas.51 E, por

outro lado, como os três poderes, o religioso, o militar e o administrativo, estavam

separados e desmultiplicados, devido à existência de três autoridades e à discórdia

entre elas, foi difícil pôr em prática uma gestão unificada da cidade.

Este tipo de gestão urbana fez com que, no fim do século XIX e no início do

século XX, o território de cada concessão correspondesse à exportação dos

modelos e dos planos directores de planeamento de cada país signatário (fig.33),52

e que os eixos viários principais da cidade adoptassem a direcção E-O.

A desconfiança por parte das autoridades chinesas sobre a tecnologia e a

supervisão dos trabalhos dos ocidentais53 foi outro factor que dificultou o

desenvolvimento contínuo e coerente das redes de comunicação, assim como o

trabalho das empresas mistas privadas. Contudo, é importante frisar que, mais

tarde, as autoridades chinesas criaram várias companhias que adoptaram essas

49 Ibid., p.126 50 Calcutá, cidade da Índia colonizada pelos ingleses no fim do século XVIII. Ibid., p.79 51 Ibid., p.128 52 Ibid., p.149 53 Estes introduziram a via férrea que ligava Xangai a Wusong e outra a Nankin. Ibid., p.129-130

Fig.31 Hanoi, cidade colonial oriental do

Vietname (capital).

Fig.32 Calcutá, cidade colonial ocidental da

Índia: um forte militar perto do rio, ligado directamente à casa do governador com uma grande praça à frente e situado no limite da cidade e não ao centro.

Fig.33 Podemos afirmar através do desenho

dos lotes muito estreitos das parcelas da concessão francesa, em 1914, que houve uma planificação dirigida à especulação fundiária.

Fig.34 Os eixos principais da cidade de

Xangai, no século XX, (horizontais) revelam a separação administrativa das concessões N-S.

Page 32: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

28

tecnologias: a linha de telégrafo, o tramway Huashang dianche gongsi, o organismo

municipal Nanshi (responsável pela construção de estradas), permitindo assim aos

habitantes, sob a autoridade chinesa, a mesma qualidade de vida que nas

concessões.

É importante salientar que a descontinuidade não apareceu apenas em Xangai.

De facto, “Toda a cidade é composta da justaposições de partições, de bairros

cujos pontos de ruptura, os limites e os pontos de referências, nos aparecem mais

ou menos marcados” 54.

Igualmente a administração policêntrica inabitual não impediu a modernização

urbana de Xangai que acompanhou, quase ao mesmo tempo, a evolução das

cidades modernas europeias: “Nas capitais europeias esta modernização

apresentou-se durante meio-século desde 1830, através de um tecido urbano

particularmente denso. Em Paris, graças ao Rambuteau, prefeito da Seine de 1833

a 1848, havia já passeios, a instalação da água e do gás, o desenvolvimento dos

omnibus até à primeira metade do século XIX”55.

OS HABITANTES E OS CONSTRUTORES

O crescimento e o desenvolvimento rápido das concessões que observámos,

deve-se ao grande aumento da população nas concessões e à profissão que

alguns dos migrantes, desse aumento, tinham no país de origem.

Por um lado, as concessões tinham que se prepar para receber os inúmeros

xangaienses e habitantes das províncias vizinhas (Zhejiang e Suzhou) e de Nankin

que tinham escolhido esta parte do território para se alojar, visto que não tinha sido

destruída pelo movimento dos Taiping, que conquistaram a capital de Nankin.

Também, os imigrantes estrangeiros de todo o mundo escolheram a metrópole de

Xangai para se instalarem.

Por outro lado, como uma parte deste afluxo de imigrantes correspondia aos

negociantes vindos de Jiangsu, Fujian (em 1860) e de Cantão que exerciam outras

profissões que não a comercial, foi possível, em conjunto com os outros imigrantes,

contribuir para o desenvolvimento urbano das concessões.

Deste modo, tínhamos os negociantes que exerciam a profissão do país de

origem: “os carpinteiros de construção naval vinham de Cantão, os que levavam o

carvão de Ningbo, os riquexó56 do Subei, os pedreiros e carpinteiros de Ningbo ou

Shaoxing”57. E os outros imigrantes serviam de mão-de-obra para a construção de

residências e outros edifícios, assim como para a construção de vias públicas, cais

54 Ibid., p.172 55 Ibid., p.133 56 O riquexó é um meio de transporte de tração humana em que uma pessoa puxa uma carroça de

duas rodas onde acomodam-se mais uma ou duas pessoas. pt.wikipedia.org/wiki/Riquex%C3%B3 (em 16/03/2008) 57 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine 1842-1995, op. cit., p.111

Fig.35 A linha de comboio Wusong-Xangai, em 1987.

Fig.36 A população estrangeira maioritária na

Concessão internacional, de 1900 a 1920.

Fig.37 Habitat de tipo cantonês importado em

Xangai: comércio no rés-do-chão e habitação no primeiro andar.

Page 33: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

29

e saneamento. Por último, estavam os promotores de empresas privadas

estrangeiras58 que financiavam estas obras.

Esta situação tendeu para uma organização do território similar à da cidade

medieval europeia59, em que a unidade habitacional coincidia com o local de

actividade produtiva, uma vez que os imigrantes se instalaram segundo a sua

profissão ou a sua nacionalidade. Assim o afirmou Françoise Ged:“ As redes

cruzadas constituídas pela profissão ou pelo lugar de origem, resultavam das

apropriações distintas da cidade: as pessoas de Ningbo estavam instaladas na

Concessão francesa a norte da cidade chinesa (...) ”60.

O tecido de Xangai começou, assim, a densificar-se junto ao Huangpu até à rua

do Tibet pelos refugiados de Nankin que se agrupavam em unidades de habitação

e de trabalho compactas, e, na extensão das concessões tínhamos um tecido

menos denso e mais verde correspondente às grandes villas com jardim dos

estrangeiros que ocupavam grandes quarteirões regulares. Portanto, sobre uma

mesma trama homogénea maleável, existia um misto de arquitectura variável

segundo o trabalho e a nacionalidade dos imigrantes.61

Xangai tinha, então, conseguido uma posição dominante, regional e nacional,

pouco depois do tratado de Nankin, graças aos emigrantes estrangeiros e

chineses. Por um lado, tínhamos os residentes estrangeiros que procuravam o

lucro dos terrenos e as oportunidades comerciais, através da construção de

grandes redes de comunicação e de edifícios comerciais. Por outro lado tínhamos,

sobre a segurança lançada pelas concessões, uma grande quantidade de

residentes a viverem em pequenos lotes sobre e por “detrás do seu trabalho”.

Como as fachadas das ruas principais estavam reservadas às actividades

comerciais, e como haviam tantas pessoas a alojar, sem interromper a

continuidade funcional da estrutura viária urbana, nasceu o primeiro protótipo de

uma nova tipologia colectiva, o Lilong. Esta tipologia teve origem nas primeiras

construções temporárias de elevada densidade realizadas pelos ingleses, no interior

desse limite comercial. Uma vez reconhecido como um grande benefício por parte

do seu progenitor, foi rapidamente desenvolvido a larga escala como tipologia de

Xangai e adaptado aos novos conhecimentos tecnológicos (materiais e sistemas

construtivos), sociais e culturais importados pelos estrangeiros, tornando-se assim

na identidade urbana de Xangai.

58 Em 1852, foram instaladas quarenta companhias privadas estrangeiras de gás, de água e de

electricidade que mais tarde, em 1867, atingiram um total de trezentas. Ibid., p. 134-136 59 Na cidade medieval europeia prevalecia a casa gótica-mercantil composta pelo habitáculo da

unidade familiar sobre o local para a actividade productiva. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la

residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona,

Ed. UPC, 2000, p.15 60 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine 1842-1995, op. cit., p.111 61 Idem

Fig.38 Os bairros de favelas dos imigrantes

chineses situam-se ao arredor das concessões e perto dos bairros industriais, (Zhabei e Nanshi), assim como ao longo do rio Suzhou e do Huangpu.

Fig.39 Os primeiros Lilong, de Xangai em

madeira e tijolo, associam o comercio no rés-do-chão com a habitação no primeiro andar

(1880).

Fig.40 Um exemplo de quarteirão de Lilong, em 1939, As letras em cinzento correspondem

à habitação, e as mais escuras ao comércio.

Page 34: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

30

V Vista aérea, a rua secundária, e a rua principal de um Lilong

Page 35: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

31

II. LILONG, A IDENTIDADE URBANA DE XANGAI

TIPO E IDENTIDADE

A identidade de uma cidade relaciona-se com as características do conjunto

edificado que a define62, especificamente com a tipologia de habitação, devido a

esta assumir uma posição primordial no processo de formação e estruturação da

cidade, e por ser a forma urbana que representa um modo de viver de um povo.

O facto da casa representar um modo concreto de viver de um povo e a cultura

deste resultar de um processo lento de transformação, permitiu que a casa ao

marcar a presença daquele na cidade definisse a identidade da mesma. Esse

processo lento de transformação da casa foi redigido por Viollet de Duc no

dicionário da arquitectura: ”Na arte da arquitectura, a casa é, desde logo, o que

melhor caracteriza os costumes, os gostos e os usos de um povo; a sua ordem,

como a sua distribuição, não se modifica mais que ao longo de muito tempo.” 63.

As formas de habitar, ao criarem vínculos com a sociedade e a cultura que lhes

deu origem, estão a adquirir um sentido, uma identidade. No âmbito do tema da

identidade dos factos urbanos, K. Lynch também relacionou “o sentido do lugar” à

identidade: “A forma mais simples do sentido é a identidade, no significado

restringido do término usual: ”um sentido do lugar”. A identidade é o grau em que

uma pessoa pode reconhecer o lembrar um sítio, ou excepcional, ou pelo menos

particular ”64.

Como o sentido do lugar e da forma de habitar de uma cidade se ganha com o

tempo e com o contacto com a sociedade, impõe-se recorrer ao estudo do tipo

dessa forma urbana para encontrarmos a identidade da cidade, visto que o tipo é

uma estrutura conceptual e não formal: “de correspondência entre o espaço

projectado ou construído e os valores diferenciais que lhe atribui o grupo social ao

qual é destinado ”65.

62 FERNADES, Francisco Barata, Transformação e permanência na habitação portuense: as formas

da casa na forma da cidade, 2ª ed. Porto, Faup Publicações, 1999, p.60 63 EUGÈNE-EMMANUEL, Viollet-le-Duc, “Dictionnaire raisonné de l’architecture française du XI au

XVI siècle”, [1867-1873], in ROSSI, Aldo, La arquitectura de la ciudad, Editorial Gustavo Gili

Barcelona, 1999, p.126 64 LYNCH, Kevin, La buena forma de la ciudad, Gustavo Gili, Barcelona, 1985, p.101 65 DEVILLERS, Christian, “Typologie de l’habitat et morphologie urbaine”, [1974], in FERNADES,

Francisco Barata Transformação e permanência na habitação portuense: as formas da casa na

forma da cidade, op. cit., p.49

Page 36: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

32

Como afirmou Aldo Rossi: “O tipo vai-se construindo, pois, segundo a

necessidade e segundo a aspiração de beleza; único e no entanto variadíssimo em

sociedades diferentes e unido à forma e ao modo de vida.”(...) “algo permanente e

complexo, um enunciado lógico que se antepõem à forma e que a constitui ”66.

Portanto, o tipo da forma de habitar de uma cidade contém o sentido de um

povo, a identidade da cidade do mesmo.

Nesta linha de pensamento, identificar o significado etimológico do Lilong seria

um princípio para perceber o seu sentido, uma vez que as palavras chinesas são

ideogramas, ou seja, sinais que transcrevem um significado e não um som como as

outras escrituras67, e porque os caracteres chineses desenvolveram uma

percepção do mundo menos “literal” que as escrituras alfabéticas.

O sentido etimológico antigo em chinês de Li significa um bairro composto por

25 a 110 famílias governadas por um chefe, que actualmente têm dois significados,

a de bairro ou uma distância de 576m. E as ruas que serviam esse bairro tinham o

seu significante no Long.68 Portanto o Lilong, etimologicamente, corresponde a um

padrão definido por um conjunto de habitações associadas a um serviço particular

de uma rede de ruas internas.

Para um ocidental que está habituado a cidades onde os edifícios são

identificados segundo a sua forma, o seu estilo e Época, o significado revelado no

carácter Lilong parece-lhe estranho. No entanto, quando aquele visita o Lilong pela

primeira vez não o identifica pelo seu estilo mas sim pela sua unidade urbana que

não é um quarteirão nem a parcela como identidade jurídica (como a casa do Porto

do século XIX). Assim o descreveu Zheng Zu’an: “O lilong representava uma forma

de organização do espaço característico do tecido urbano em Xangai” 69 .

Deste modo, o que é característico do Lilong não é o estilo dos edifícios, mas

sim o seu padrão específico que conseguiu dar uma identidade à cidade de Xangai

(1860-198070). Este sentido do Lilong, reconhecido globalmente pela escrita e pela

sua permanência e extensão, por quase todo o tecido urbano de Xangai, (fig.1)

permite-nos afirmar que existe um tipo que se foi construindo com o tempo e com

as pessoas.

66 ROSSI, Aldo, La arquitectura de la ciudad, op. cit, p.78 67 Este tipo de compreensão da escrita apenas tem uma semelhança com a nossa no que diz

respeito aos algarismos, uma vez que o sinal “5” é compreensível por todos os ocidentais, daí que

os portugueses dizem “cinco”, os franceses “cinq”, etc. Ou seja, os ideogramas chineses podem ser

lidos sem saber os pronunciar. CYRILLE J, D Javary e Alain Wang, La Chine nouvelle, Petite

encyclopédie Larousse, Abril 2006, p.25 68 As definições que se seguem foram retiradas do dicionário chinês francês do Instituto Ricci, no

livro: CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris,1988, p.146 69 HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, op. cit., p.42 70 GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995,op. cit., p.137

Fig.1 A vista aérea sobre a actual “cidade antes amuralhada” comprova o carácter homogéneo

e unitário do padrão dos Lilong (“Google” Abril 2008).

Page 37: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

33

Para o estudo dos tipos está a tipologia que “(...) analisa a forma arquitectónica

na sua autonomia, mas procurando compreender os vínculos que estabelece com

a sociedade e com a cultura, amplamente entendidas.”71.

A tipologia estabelece, então, a correspondência entre a forma e a época onde

aquela foi produzida, sem referir a questão da utilidade ou da funcionalidade, para

encontrar a essência do tipo edificado. Para tal: “parece necessário submeter os

diversos tipos de edificação a uma investigação básica, perguntando, por exemplo:

“O que é uma igreja?” em vez de:”Como é uma igreja?””72.

Esta questão remete-nos para o estudo do tipo edificatório através da história e

da análise tipológica para chegar a uma resposta não formal mas sim ao conceito

estrutural da arquitectura, ao seu sentido. “Neste sentido, história e tipologia são

como dois aspectos complementares uma vez que, enquanto a história mostra os

processos de transformação, a análise tipológica espera ao que nesses processos

permanece de idêntico.(...) A essência pode ser então, interpretada como o

conjunto das potências inerentes à coisa e as mudanças podem ser interpretadas

como a actualização de essas potências”73.

A definição de tipo faz, portanto, referência a um conjunto de características

comuns identificáveis a diferentes formas que nos permitem reconhecer as suas

similaridades e princípios estruturais que lhe dão significado. Esse significado, no

caso das formas de habitar, é o que pela sua singularidade caracteriza a identidade

da cidade.

Nesta linha de pensamento, definiram-se três parâmetros de análise tipológica

que acompanham as diversas variantes que permitiram a evolução do Lilong na

história urbana de Xangai: encontrar o modelo que deu origem ao tipo e aprofundar

o processo de transformação do tipo de habitação unifamiliar em habitação

plurifamiliar; depois aprofundar a sua matriz tipológica e, por último, analisar a sua

adaptabilidade.

A análise tipológica será utilizada como um método e não como uma categoria,

uma vez que não são as características físicas do Lilong que se pretendem

encontrar, mas sim as conceptuais que permitem novas soluções arquitectónicas.

71 MARTÍ ARIS, Carlos, Las variaciones de la identidad : ensayo sobre el tipo en arquitectura, 1ª ed.

Barcelona, Serbal, 1993, p.81 72 SCHULZ CHRISTIAN, Norberg, Intenciones en Arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona,

2001, p.58 73 MARTÍ ARIS, Carlos, Las variaciones de la identidad: ensayo sobre el tipo en arquitectura, op. cit.

p.22

Page 38: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

34

DA CASA-PÁTIO CHINESA AO LILONG

Para responder ao fluxo crescente da população e ao desenvolvimento económico,

num contexto onde dominava um generalizado “laisser faire” administrativo, os

promotores privados chineses e estrangeiros decidiram desenvolver uma forma de

habitar inspirada nas casas-pátio tradicionais dos campos de Jiangsu e de

Zhejiang.

Com a revolta dos Taiping uma grande parte dos imigrantes, incluindo as sedes

das corporações que se responsabilizavam pelo alojamento e construção dos

edifícios de habitação, vinham de Jiangsu (fig.2).

Nesta situação de pressão de alojamento, o mais eficaz a construir foi o tipo de

habitação a que esses imigrantes estavam habituados e sobre os quais tinham

mais conhecimentos construtivos. Assim o afirmou Françoise Ged: “As sedes das

corporações, que simbolizavam o poder da cidade ou das regiões donde vinham,

traduziram as características do seu respectivo “país” pela sua arquitectura.” 74.

Desta forma, as primeiras companhias imobiliárias75 a aparecer foram as

chinesas, compostas por imigrantes dessas duas zonas, as quais utilizavam como

mão-de-obra os artesãos originários da sua cidade.76

Rapidamente, essa forma de habitar, inspirada nas casas-pátio do Jiangsu e de

Zhejiang, transformou-se numa nova tipologia, o Lilong (1860 até 1930).77

O VELHO SHIKUMEN Primeiro nível do desenvolvimento do Lilong

Em 1860, nasce a primeira génese do Lilong, o “Shikumen”. Inicialmente construído

na proximidade Este da “antiga cidade” chinesa para as grandes famílias dos

proprietários mais ricos, o Shikoumen foi rapidamente orientado pelos principais

princípios do modelo de habitação tradicional chinês e os de contiguidade, de

alinhamento e de repetição europeus. Hoje, são poucos os exemplares que existem

deste modelo.

O princípio de organização da planta de tipo extensivo e da estrutura em

madeira do Shikumen teve como base o modelo doméstico chinês - o Siheyuan,

dominante nas regiões sudoeste da China, incluindo Jiangsu e Zhejiang. A

referência ao modelo Siheyuan deve-se à necessidade de uma construção rápida e

com poucos gastos que pudesse albergar o mesmo tipo de família extensa desse

modelo, que tinha acabado de chegar em Xangai.

74 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995,op. cit., p.111 75 Em 1870 apareceu uma companhia imobiliária chinesa composta por proprietários de Zhejiang.

Mais tarde em 1888, começaram a aparecer firmas imobiliárias estrangeiras como a Yeguang. Ibid.,

p.143-144 76 Idem 77 CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport de

recherches, op. cit., p.152

Fig.2 As origens da população da Concessão

internacional eram de outras províncias, que não a de Xangai (1900 a 1920).

Fg.3 A fachada interior da casa-pátio tradici-

onal chinesa, na zona de Zhejiang.

Fig.4 O modelo tradicional Siheyuan.

1. pátio 2. alpendre 3. sala de estar 4. quartos 5. cozinha

Page 39: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

35

Fig.5 O MODELO O “VELHO SHIKUMEN” ZHAO FULI (1880). A sua estrutura compõe-se por duas paredes medianeiras situadas no fim este e no fim oeste de cada unidade, com

lajes assentes sobre vigotas em madeira, e um misto de paredes compostas por pilares de madeira e preenchidas em

tijolo. A carpintaria retomou o vocabulário tradicional no que diz respeito ao cruzamento das balaustradas, aos painéis

amovíveis que seccionavam o espaço, e às portadas de madeira das portas e das janelas.

1.sala de recepção

2.quartos

3.cosinha e despensa

Page 40: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

36

O Shikumen adoptou a forma de um edifício introvertido de dois pisos, de

planta organizada por módulos, de simetria rígida e virada para o pátio interior a sul

de recepção, o “Ke”. Sobre este espaço giravam todos os compartimentos da

casa: o compartimento principal (jian78), situado na zona central em frente ao pátio,

e mais dois compartimentos secundários (shang), ambos situados um de cada lado

do jian. O compartimento central era utilizado para vestir enquanto que o

secundário funcionava como quarto e biblioteca. Cada modelo variava depois no

número de jians segundo o prestígio e a riqueza de cada família.

A orientação N-S da casa-pátio tradicional também foi respeitada, visto que o

modelo Shikumen foi construído pelos chineses que, por questões climáticas e

protectoras de fluxos, preferiam o pátio a sul porque assim este estava protegido

pelo edifício a norte.79

O pátio chinês, em relação ao da casa-pátio tradicional do ocidente

(georgianas), tinha um carácter mais privado, porque este era utilizado para

trabalhos domésticos e a jardinagem, e não para a diversão pública familiar.80

Neste sentido, o pátio foi incorporado neste modelo do Lilong para marcar o nível

de penetração dos domínios mais íntimos e internos da casa.

Como as casas do Shikumen eram agrupadas em banda, no interior dos

quarteirões do tecido urbano, foi necessário um sistema interior hierárquico de ruas

que permitisse comunicá-las entre elas e o exterior do conjunto. Esse sistema é

composto por uma rua N-S de principal acesso de veículos, bicicletas e peões, e

por várias ruas secundárias E-0, mais estreitas, de segundo acesso de bicicletas e

peões às respectivas casas. (fig.16)

Em relação ao modelo Siheyuan, o Shikumen incorporou a norte do volume

principal um outro de apenas um piso relativo à cozinha e às despensas. A

comunicação entre os dois volumes era feita através de uma passagem estreita

que servia de pátio de serviço e de poço de luz e ventilação. A introdução dessa

passagem fez com que aparecesse uma segunda entrada que não existia no

Siheyuan, a entrada de serviço.

A entrada mais formal, que limitava a parte sul do pátio principal, era fechada

por um muro alto de 5m e rematada por um frontão em arco de pedra de influência

europeia. Este remate foi o que deu o nome ao Shikumen: Shi significa em chinês

pedra e men porta. Também significava a parte e o todo, ou seja, a habitação e o

loteamento.81

78 Um jian é um vão, uma faixa compreendida entre duas paredes. 79 A disposição N-S relaciona-se com a arte Feng Shui chinesa que avalia a natureza e o conteúdo

das correntes que atravessam um lugar, de maneira a poder instalar-se nele aproveitanto os fluxos

benéficos e evitando os fluxos desfavoráveis (o vento). CYRILLE J, JAVARY D. e WANG Alain, La

Chine nouvelle, Petite encyclopédie Larousse, Abril 2006, p.19 80 SCHOENAUER, Norbert, 6000 años de hábitat : de los poblados primitivos a la vivienda urbana

en las culturas de oriente y ocidente; op. cit., p. 247 81 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.140

Fig.6 A fachada exterior do modelo “o velho Shikumen”.

Fig.7 O modelo “velho Shikumen” Zhao Fuli.

Fig.8 A passagem de serviço do “velho

Shikumen”.

Page 41: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

37

O pátio da entrada principal como a passagem de serviço, para além de

iluminarem e ventilarem, foram concebidos como uma forma tradicional de

individualizar duas actividades domésticas: uma, mais íntima, relacionada com os

compartimentos de estar e dormir, e outra, mais colectiva, exposta à preparação

da cozinha e outros serviços.

Portanto, os dois pátios não só possibilitavam a passagem como também

funcionavam como espaços intermédios, entre o colectivo e o íntimo, o que

facultou o atravessamento sucessivo dos compartimentos em vez da separação

entre eles. Igualmente, os painéis amovíveis que seccionava os jians, as portas do

pátio principal, permitiram essa passagem entre compartimentos.

No Renascimento italiano (século XVI), os espaços na arquitectura doméstica

também se sucediam uns aos outros através da existência de mais de uma porta

em cada compartimento e da sua organização simétrica. Contudo, existia uma falta

de distinção qualitativa entre a passagem e os espaços habitados no interior da

casa, devido ao modo de vida submergido nas relações sociais colectivas,

representadas na pintura através da sinalização dos gestos carnais das

composições das figuras82.

Este problema dos “compartimentos de passagem” foi revelado em Inglaterra,

meio século mais tarde, por Robert Kerr83, e reconhecido nas casas das classes

mais ricas que continham uma rede penetrante de espaço de circulações

diferenciadas84 (a do habitante e a do empregado) que chegava a cada um dos

compartimentos da casa. O requerimento universal de privacidade e a conjugação

dos espaços de passagem tinha-se estabilizado.

No entanto, só em 1928, com o projecto da “ Casa Funcional para a vida sem

fricção” de Alexander Klein, realizado numa agência de habitação, é que se

conseguiu uma planta que conciliasse a vertente do Renascimento em Itália com o

de Inglaterra85: a interconexão entre os compartimentos e a distinção qualitativa

entre a passagem e os espaços habitados.

Como podemos observar neste projecto, “os movimentos necessários” das

pessoas de compartimento para compartimento podiam ser distintos e sem se

82 A pintura de Rafael revela uma valorização dos sentimentos e do reconhecimento do corpo como

pessoa que, se sobrepõe ao fundo, à arquitectura. EVANS, Robin, "Figures, Doors and Passages",

[1978], in Translations from Drawing to Building and Other Essays, Architectural Association,

Londres, 1997, p.55-91 83 Robert Kerr, arquitecto inglês do século XIX, advertiu no seu livro “The Gentleman’s House” (1864)

o inconveniente dos “compartimentos de passagem”, Idem 84 A aplicação mais concreta desta disposição organizativa, foi o projecto Coleshill Berkshire (1650-

67) de Sr. Roger Pratt o qual defendeu no seu livro de arquitectura essa separação entre a

circulação dos empregados da dos habitantes. Idem 85 Em Inglaterra foram menos receptivos ao incipiente Renascimento italiano. Idem

Fig.9 As portas do pátio principal. Vista do interior do jian para o pátio. Museu “Xintiandi-Shanghai”, sobre o Shikumen.

O “ESPAÇO COMPOSTO”

Fig.10 Palácio Antonini, Udini, de Andrea

Palladio (1556). A passagem de espaço para

espaço.

Fig.11 A casa funcional para a vida sem

fricção, de Alexandre Klein (1928). Os segundos desenhos correspondem à investiga-ção e à sua conclusão.

Page 42: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

38

tocarem. Atente-se ao exemplo da casa-de-banho associada ao quarto e à zona

de serviço (cozinha e sala).

A organização dos espaços do modelo Shikoumen com um jian, também

seguiu esse princípio de contiguidade que evitava o cruzamento entre as pessoas,

porque a zona familiar estava separada da zona de serviço por umas escadas e por

duas entradas diferentes associadas a um pátio de transição que favoreceu a

privacidade familiar e promoveu a colectividade na passagem de serviço.

Em suma, os espaços de transição do modelo Shikumen asseguram uma

mudança de estatuto do espaço que, segundo a pesquisa levada a cabo por DEA

de Xu Yinong sobre as cidades do sul, funciona em toda a arquitectura e cidade

chinesa. Para melhor compreendermos este facto, analisemos a noção do espaço

chinês, a do “espaço composto” (fuhe kongjian), desenvolvida na pesquisa de Xu

Yinong:

“A existência do espaço composto liberto (...) de um intermediário que une dois

espaços opostos, (...) portanto o espaço assegura uma função de combinação ou

de mediação(...) através dos espaços exteriores naturais, entre os espaços da

aldeia e da comunidade, depois, entre os espaços das ruas e ruelas, e a seguir as

ruas do habitat e do pátio, até ao espaço interior. A variação e a ligação de esta

série de espaços formam o sistema do espaço composto que multiplica os níveis

de arquitectura vernacular chinesa. Cada nível para a natureza do espaço adapta-

se à medida do parâmetro ”86.

Os elementos transitórios, correspondentes aos elementos intermediários

relacionados com a “superfície” (como as portas de correr) ou com o volume (o

pátio e as ruas interiores do habitat), são aqui revelados como os definidores da

noção do espaço interior e a do espaço exterior, porque ao permitirem a transição

conseguem marcar a diferença entre os espaços e a sua fluidez. Portanto a noção

de exterior e de interior faz-se através da transição e não da distribuição.

Deste modo, os espaços de transição “indicam os usos cada vez mais

privativos e restritivos dos espaços”87 permitindo a passagem progressiva do

exterior em direcção ao interior.

Este processo de organização do espaço designa-se, segundo Françoise Ged

86 Tese de DEA de Xu Yinong, “O conceito do espaço composto tradicional na China, pesquisa

sobre a relação entre “interior” e “exterior” e o seu fundamento cultural na arquitectura vernacular

nas seis províncias do sul da China”, [1989 e 1990], in LIANG Zhang, La naissance du concept de

patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus, édictions recherches, 2003, p.177 87 Idem

Fig.12 A representação das diferentes cir-culações das pessoas e o seu cruzamento nos espaços do “velho Shikumen”.

Fig.13 O processo de emboîtement no tipo Siheyuan (casa-pátio em Pequim).

Fig.14 Dois painéis amovíveis seccionam o

shang num espaço bibliotecário, entre outros. Cada painel não chega a tocar o tecto.

Fig.15 As ruas interiores do “velho Shikumen”.

Page 43: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

39

por emboîtement88, porque o espaço (interior) é definido em relação ao espaço que

o contém (o exterior) através dos espaços intermédios que ficam entre os dois.

Por exemplo, no Shikumen o espaço exterior público é o espaço que está fora

das unidades habitacionais e/ou comerciais que limitam o Lilong, e o espaço

interior corresponde às casas-pátio. Entre as duas unidades fechadas (a casa-pátio

introvertida e o todo, Lilong) está o sistema de ruas interiores que fazem a transição

progressiva do público até ao mais privado.(fig.16)

Para um ocidental, estar nessas ruas interiores do Shikumen significaria estar no

exterior da casa-pátio e não num espaço menos privado, como o é para os

chineses. As noções habitualmente opostas entre o dentro e o fora, o interior e o

exterior são na China controladas pelo aspecto psicológico e cultural

intrinsecamente relacionado com a instituição social e os regulamentos rituais: “O

homem habita no exterior, a mulher habita o interior; o palácio é profundo, a porta

dos “boudoirs”89 está fechada hermeticamente, o guardião controla.”90.

Igualmente, Eliel Saarinen tinha a opinião de que os espaços interiores podem

situar-se dentro de outros espaços interiores, como é o caso dos cerramentos

dentro dos cerramentos que caracterizam o templo egípcio, uma vez que o “edifício

não é mais que “a organização do espaço no espaço. Como o é a comunidade.

Como é a cidade.””91.

Compreender o espaço chinês e a sua respectiva representação é difícil, visto

que não segue a mesma lógica ocidental. Enquanto que os artistas ocidentais,

depois do Renascimento, começaram a representar e a organizar linearmente o

espaço conforme a intensidade do afastamento, o espaço construído chinês era

escolhido segundo uma lógica multi-focal.

Uma “axonometria chinesa” não representa necessariamente a mesma escala

dos planos sucessivos, mas sim privilegia um ou outro espaço de acordo com o

papel que é o seu no conjunto do sítio considerado. Segundo esta regra, imensas

escalas de compreensão podem ser encaradas simultaneamente. A lógica não é

binária mas sim evolutiva.92 (fig.18)

88 Emboîtement corresponde, segundo Françoise Ged, ao processo de organização do espaço

interior e exterior que, compreende a colocação hierárquica de um espaço fechado dentro de outro

espaço fechado (tal como as bonecas russas) e assim sucessivamente, resultando espaços

intermédios entre os fechados. GED, Françoise, “Exterieur-Interieur, le mur d’enceinte en Chine”, in

op. cit. 89 Toucador (espécie de mesa, em cima com um espelho, para servir a quem se touca ou penteia). 90 Ibid., p.178 91 Eliel Saarinen, “Search for Form”, [1948], in VENTURI, Robert, Complejidad y contradicción en la

arquitectura, Editorial Gustavo Gili, SA, Barcelona, 1974, 1978, p.111 92 GED, Françoise, “Exterieur-Interieur, le mur d’enceinte en Chine”, in op.cit.

Fig.16 A organização do espaço do Shikumen,

Zhao Fu Li, através do processo emboîtement. A gradação dos cinzas corresponde à gradação do espaço exterior, público, ao

espaço interior, mais privado.

Fig.17 O espaço perspéctivo. Praça do

Capitólio, de Miguel Ângelo (1536-1546).

Fig.18 Como podemos observar na representação chinesa do Jardim do mandarim

Yu (1559), em Xangai, o palácio de té é focalizado através de uma axonometria que se vai torcendo ao seu redor, e de um aumento

de escala em relação ao resto.

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40

Fig.19 NOVO SHIKUMEN BAO KANG LI (1900).

1. Sala de recepção

2. Quartos

3. Cozinha

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41

O NOVO SHIKUMEN (construído até 1920)

Em 1895, com o tratado de Shimonoseki entre a China e o Japão, implantou-se a

manufactura de indústrias nos portos abertos, o que favoreceu a fixação de

grandes centros industriais e económicos nas concessões.

Esta situação, juntamente com o constante crescimento da população,

acrescido pelo aumento dos refugiados das pobres províncias vizinhas, fez com

que o dono dessas manufacturas nacionais desenvolvesse uma parcela de terreno

em lotes93, para a construção de um novo modelo de lilong de arrendamentos

baratos para os seus trabalhadores. Como esse novo modelo manteve a mesma

fachada que o anterior, foi denominado por “o novo Shikumen”.

O novo Shikumen não só abrigou os trabalhadores fabris como também as

famílias não tradicionais de pequeno tamanho resultantes da desintegração das

famílias tradicionais numerosas, após a queda da dinastia Quing em 1911.

Os fracos rendimentos dessas famílias e o seu tamanho obrigaram a que o

anterior modelo Shikumen fosse modificado para se adaptar a lotes urbanos mais

compactos e com menor espaço. Esta mudança fez aumentar rapidamente a

especulação imobiliária e a inflação, assim como o uso eficiente dos terrenos se

tornou uma preocupação, reflectida na forma urbana que este novo Shikumen

assumiu no território de Xangai.

Como as casas que compunham o Lilong dependiam do lote que, por sua vez,

dependia da forma e da dimensão da parcela, esta funcionou como a principal

condicionante da forma de todas as variantes desta tipologia. Assim, quando um

Lilong tinha uma forma mais orgânica era porque tinha sido construído segundo

várias parcelas, ou seja, o sistema de ruas interiores correspondia aos antigos

caminhos que separavam as parcelas entre si (nº 90 da fig.20). E, quando o Lilong

apresentava um traçado regular das ruas interiores, era porque tinha sido

construído de uma só vez sobre uma única parcela (nº74 da fig.20).

Quando as concessões começaram a ter ao seu dispor um certo número de

terrenos, que tinham sido pedidos às autoridades chinesas, as companhias

imobiliárias começaram a investir em operações de grande envergadura como foi o

caso do novo Shikumen, inserido numa parcela de um hectar ou mais. O aumento

da parcela que incorporava este modelo, permitiu conseguir, em relação ao anterior

modelo, um serviço de ruas mais largas e em maior número e uma combinação

mais racional entre o construído e o não construído, sempre e quando se

preservasse uma certa densidade de construção. (fig.16 e 19)

Sob estas circunstâncias, este modelo alterou-se para um esquema mais denso

e com áreas e pé-direitos mais reduzidos. A planta deixou de ter dois shang e um

jiang para passar a ter apenas um jian menos profundo, de frente a um pátio.

93 O loteamento foi sempre utilizado como um instrumento essencial na constituição dos tecidos

urbanos de fundação nova, como nas cidades coloniais, devido ao seu papel de ocupar espaço

com o máximo de eficácia de forma a alojar muita gente. Uma estratégia com fins económicos.

GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995,op. cit., p.149

Fig.20 O loteamento da Concessão Francesa

no início do século XX. Em vermelho estão as ruas N-S de acesso à parcela, que foram aproveitadas para a rua principal do Lilong.

Fig.21 Ambas as plantas foram extraídas do

atlas de Xangai 1947. Representação do comércio (azul) e dos lotes.

Fig.22 O “novo Shikumen” Dongxi Siwen Li. Acrescentos das habitações sobre a rua

principal.

Fig.23 Fachada sul do “novo Shikumen”. A

ocidentalização começou-se a sentir na decoração da fachada: varandas em madeira e frontões arabescos em cimento e em tijolo.

Page 46: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

42

Somente as unidades finais de uma banda de casas, ou seja, as que limitavam a

parte este e oeste do Lilong, é que mantiveram um dos dois shang.

O estreitamento do apartamento, associado à vontade de rentabilizar o terreno,

fez mudar o antigo padrão horizontal para um padrão mais vertical, o que ajudou na

diferenciação das funções: o piso térreo foi usado para as actividades colectivas

familiares e o segundo e terceiro para as actividades mais privadas. Também a

estrutura do telhado foi substituída por um sistema mais ligeiro e estável de

influência ocidental, devido ao estreitamento do vão.

Deste modo, mudou-se a inclinação do telhado da zona principal da casa para

45º, o que permitiu a junção de um mezanino (tingzitian) no último piso, e, na parte

de serviço do volume acrescentou-se, sobre a cozinha, um piso para um quarto de

aluguer aos imigrantes das províncias vizinhas que vinham sozinhos à procura de

trabalho.

A diferenciação entre a zona de serviço a norte e a zona principal a sul

manteve-se94, mas, desta vez apareciam inseridas num mesmo volume devido ao

desaparecimento da passagem de serviço colectiva. A passagem de facto não

desapareceu, mas foi sim substituída por um pátio de serviço privado situado entre

a zona principal e a cozinha, que também servia para ventilar e iluminar.

Neste sentido, o tipo de organização favoreceu o alojamento de mais de uma

família no mesmo lote: “Um jian podia satisfazer indiferentemente as necessidades

de uma família ou de vários compatriotas que sub-alugavam os compartimentos

disponíveis, segundo os seus rendimentos. Aqueles orientados a sul eram mais

caros que os que davam a norte ou dos “tingzitian” com dimensões reduzidas”95.

Os pisos do volume principal como tinham um pé-direito superior aos do

volume de serviço fez com que este recebesse um terraço na cobertura plana.

A diferenciação de altura dos dois volumes e a diminuição da altura do muro do

pátio (4m) facultou uma maior iluminação e ventilação das ruas e do rés-do-chão

das unidades introvertidas.

Com a imigração de companhias comerciantes em Xangai, o novo Shikumen

revelou a originalidade de conseguir agrupar o comércio no rés-do-chão das

unidades habitacionais que limitavam, o lado exposto dos Lilong às ruas ou

avenidas principais. Normalmente, estas unidades habitacionais substituíam o pátio

da frente pelo comércio e atrás colocavam a reserva. A combinação de residência e

trabalho permitiu dinamizar e proteger o interior do Lilong. (fig.28)

Embora este princípio tenha aparecido também nas cidades dos portos

abertos, como Hangzhou ou Wuhan, devido ao contacto que tiveram com as ideias

e o saber-fazer dos estrangeiros, as tipologias dessas cidades não conseguiram

controlar tão bem os espaços livres e os construídos, porque os estrangeiros não

tiveram a mesma experiência que a dos de Xangai. Assim, o habitat das cidades

94 A diferenciação volumétrica e da altura do pé-direito dos dois volumes foi conseguida através das

escadas que ao articularem os meios pisos conferiu unidade ao apartamento. 95 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.146

Fig.24 O “novo Shikumen”, Dongxi Siwen Li (1916). As duas faixas em vermelho correspondem aos apartamentos dos

extremos deste modelo (este ou oeste), e o amarelo é a unidade que se repete.

Fig.25 O corte do “novo Shikumen”, Dongxi Siwen Li (1916). O amarelo corresponde ao

mezanino, o castanho ao quarto de aluguer e o verde à cozinha.

Fig.26 O pátio de serviço. Habitualmente, no

topo está uma placa de madeira que, através de um sistema tradicional, se fechava em caso de chuva ou frio.

Fig.27 O terraço na cobertura plana da

cozinha do novo Shikumen.

Page 47: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

43

chinesas antigas que não tiveram um desenho estrangeiro europeu chamava-se de

hutong (originários de Pequim) e os pequenos loteamentos isolados com ruelas

largas e rectilíneas, situadas nas antigas concessões, eram denominados de Lilong.

O Lilong tornou-se, portanto, no habitat colectivo popular de Xangai, resultante

de uma forma especulativa chinesa do habitat aplicado a um loteamento fechado

inspirado no modelo tradicional, o Siheyuan. Este, como obra acabada que se

pode repetir96, serviu de regra e de referência no loteamento e construção das

casas Shikumen que, pela primeira vez, estavam associadas a uma trama de ruas

introspectivas que lhes possibilitou o acesso, a ventilação e a iluminação. Este tipo

de loteamento também não teve antecedentes nos países ocidentais, ainda que os

edifícios evocassem as terraced-house ou as row-house anglo-saxónicas, as quais

emprestaram os sistemas construtivos.

Os modernistas também recorreram ao estudo das casas unifamiliares como

modelo para a formação de uma tipologia de habitação urbana que se adaptasse à

posição do novo homem na cidade97. Dado que a casa individual é uma unidade

em si mesma que se pode repetir e que responde a um tipo de habitar, os

arquitectos utilizaram-na como referência na concepção de apartamentos nos

edifícios plurifamiliares.

“Pode afirmar-se que a arquitectura aparece quando o indivíduo transcende a

situação ambiental específica e reconhece os princípios que podem servir para

resolver também outras tarefas análogas. De um conjunto de situações específicas

abstraem-se formas significativas e elementos ordenadores que tornam possível

uma planificação mais geral. Algumas destas formas podem denominar-se

“arquetípicas”, pois representam os significados originais da experiência humana”98.

A noção de arquétipo surge aqui como o modelo primordial, o Siheyuan que

formalizou certos princípios que se tornaram característicos de determinado

programa ou conteúdo, originando o tipo (o Lilong). O tipo (o Lilong) aparece,

portanto, “no próprio momento em que a arte do passado cessa de se propor

como modelo condicionante do artista criador”99, ou seja, com o novo Shikumen.

Desse modo, em cada formação das tipologias urbanas existe sempre um

antecedente, um modelo que, pelas suas características, pode repetir-se e

sucessivamente transformar-se dando origem a um tipo.

96 “o modelo (...) é um objecto que tem que repetir-se tal e qual como é” de Quatremère de Quincy,

in ROSSI, Aldo, La arquitectura de la ciudad, op. cit. p.78 97 MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000, p.46 e 48 98 SCHULZ, Christian Norberg, Arquitectura Ocidental: la arquitectura como historia de formas

significativas, Barcelona, Gustavo Gil, 1983, p. 228 99 FERNADES, Francisco Barata, Transformação e permanência na habitação portuense: as formas

da casa na forma da cidade, op. cit., p.39

Fig.28 A inserção do comércio no “novo

Shikumen”.

Fig.29 Terraced-house determinadas no século XVII, correspondem às casas em banda.

Fig.30 Vista aérea sobre os Hutong, Pequim.

Hans Scmidt, Casa Schaeffer, Basileia, 1927.

Fig.31 Hans Schmidt. Estudo para uma

agrupação de vivendas estandardizadas, 1927.

Page 48: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

44

A MATRIZ TIPOLÓGICA DO LILONG

O NOVO TIPO LILONG xinshi lilong (1920-1949)

A cidade de Xangai, nesta época (1920-1930), era já considerada como pólo

económico, assim como pólo intelectual e político de primeiro plano.

Depois do movimento do 4 de Maio de 1919100, a metrópole encontrou-se em

confluência com diferentes correntes ideológicas (nacionalismo, comunismo,

liberalismo) e os intelectuais. A escolha do que se devia manter e mudar na cultura

chinesa era o tema preferencial, uma vez que as várias correntes de pensamento

podiam exprimir-se através de diversas sociedades, revistas literárias, jornais,

romances e até novelas.101

A destinação social tinha, portanto, mudado em direcção a uma classe da

sociedade composta por compradores, estrangeiros, intelectuais e empresários

chineses. Segundo Françoise Ged, Xangai tinha atingido o verdadeiro

cosmopolitismo de algumas cidades ocidentais: “A cidade dos anos 1920-1930, a

mais conhecida do grande público devido às múltiplas imagens divulgadas no

cinema, através dos romances, das gravuras ou das histórias dos viajantes, tornou-

se numa identidade complexa, uma verdadeira metrópole onde a agitação das

populações, tanto chinesas como estrangeiras, misturava culturas múltiplas” 102.

Esta ocidentalização promoveu a criação do “novo tipo Lilong” na parte oeste

das extensões das concessões, onde o tecido urbano era mais regular e menos

denso. Cada quarteirão tinha, então, mais do que um Lilong com, pelo menos, dois

lados que davam sobre a rua. Esta situação deu origem a formas irregulares no

Lilong assim como impediu que este estivesse limitado nos seus quatro lados pelo

comércio, uma vez que já não ocupava todo o quarteirão.

Como este modelo providenciou melhores instalações no interior (lareira,

banheiras, fogões, mobiliário de alto nível, o chão da cozinha em betão103) tornou-

se o mais favorável e o mais bem sucedido das variantes do Lilong, daí ter sido o

modelo de Lilong que mais se construiu, o que mais durou na história (de 1920-

1949) e o que, portanto, lhe deu o nome.

100 As enormes concessões, feitas pelo governo chinês ao Japão, vieram a público por ocasião da

Conferência de Paz de Versalhes (França, 1919) provocando indignada reacção na população

chinesa que, no dia 4 de Maio de 1919, professores e estudantes de Beijing saíram às ruas para

protestar. Os protestos propagaram-se também em Xangai. Este acontecimento possibilitou a

propagação do marxismo-lenismo e sua combinação com a prática da revolução chinesa,

preparando a ideologia e os dirigentes para a fundação do Partido Comunista da China.

www.marxists.architexturez.net/portugues/dicionario/verbetes/m/movimento_04_maio.htm

(em 29/07/2008) 101 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.166 102 Ibid., p.170 103 O regulamento de incêndio elaborado de 1920-1930 exigiu que o chão das cozinhas fosse

revestido por materiais de qualidade, como o cimento entre outros. Ibid., p.197

Fig.32 A fachada do lado esquerdo corres-ponde à fachada norte do “novo tipo Lilong” de

um jian.

Fig.33 Fachada Sul do “novo tipo Lilong” com um jian e meio.

Fig.34 Fachada Sul do “novo tipo Lilong” com dois Jian.

Page 49: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

45

(extraída da planta cadastral da Concessão Francesa de 1941).

(extraída da planta cadastral da Concessão francesa de 1941). Fig.37 Num mesmo quarteirão (ex: 234) podíamos ter vários Lilongs e de diferentes variantes (o Lilong Jardim, a vermelho, e o Lilong apartamento borboleta, em amarelo, partilhavam a mesma rua N-S de acesso). Quando o Lilong não compartilhava o seu sistema de ruas com outros Lilong, tinha pelo menos dois dos seus lados que davam sobre

as ruas do quarteirão (Lilong verde). O limite comercial ao longo do quarteirão foi mantido.

Fig.35 Localização do sitio em estudo.

Fig.36 A repartição do solo na última

extensão Oeste da concessão francesa em 1914. As últimas extensões corres-pondem a uma trama menos densa com quarteirões maiores e regulares (quar-

teirões 232,232,233,234), compostos por parcelas de tamanho regular perpen-diculares às vias principais e secundárias.

O resto do traçado resultou de uma tra-ma tanto agrária como artificial (trama quadriculada de canais e de caminhos

paralelos).

Page 50: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

46

A sua reputação deve-se também à oferta de escolha que proporcionou no

mercado imobiliário, a qual oferecia diferentes modos de organização dos

compartimentos e da circulação, traduzida no número de jians que compunham o

apartamento ( um jian, um jian e meio, dois jian) e na nova combinação de repetição

do apartamento.

Composição: um jian

No caso do modelo composto por um jian, a diferenciação entre as duas zonas (a

principal e a de serviço) e a sua localização no volume foi mantida, assim como os

respectivos pátios e a cozinha. Contudo, os compartimentos multiplicaram-se e

adoptaram uma função precisa, como a casa-de-banho, a sala de estar, a sala de

jantar e espaços abertos como varandas e terraços.

Composição: um jian e meio

Em relação aos anteriores modelos, este tentou introduzir meio jian para resolver a

circulação horizontal e a falta de privacidade, que, para os ocidentais e a nova

classe mais rica, era um problema. O meio jian correspondia, assim ao corredor de

circulação que incorporou as escadas e melhorou a ventilação no interior. É

importante referir que as escadas na vertical articulavam os meios pisos.

Composição: 2 jian

A localização do hall de escadas, neste modelo, foi mudada mais para norte (ao

lado da entrada de serviço) e para o centro da planta com o objectivo de, através

dele, os habitantes poderem aceder a todos os compartimentos. Esta mudança e a

permanência das escadas que articulava os meios pisos não só tornou benéfico

que mais do que uma família pudesse habitar a mesma casa (uma família em cada

andar e o trabalhador no quarto de aluguer que ficava a meio piso), como também

permitiu uma maior flexibilidade na sua utilização.

Deste modo, a largura do lote aumentou e o seu comprimento diminui, o que

possibilitou uma melhor ventilação e iluminação no seu interior, um pátio espaçoso

e uma maior abertura na fachada principal. Esta expressão de uma nova forma de

vida aberta no edificío (mezanino, varandas, terraços) foi conseguida através dos

muros portantes em tijolo.

Os três modelos, em relação aos anteriores, foram reagrupados segundo uma

combinação modular de dois apartamentos simétricos e não de apenas um. (fig.43)

Contudo, foi mantida a organização interna composta pelas ruas hierárquicas que

comunicava o agrupamento de casas em banda, o duplo acesso, a orientação N-S

dos apartamentos e das unidades comerciais.

* Nota: Esta legenda serve também para as seguintes plantas deste capítulo:

1.Sala de estar 2.Sala de jantar 3.Cozinha 4.Quarto 5.Hall 6.Escritório 7.Serviços 8.Garagem

Fig.38 “Novo tipo Lilong” de um jian: Mei Lan

Fang (1920-25), 1andar.*

Fig.39 “Novo tipo Lilong” um jian e meio: Jin Gu Cun (1929), 2 andares.*

Fig.40 “Novo tipo Lilong” dois jian: Jingan Bieshu (1920-30), 2 andares.*

Fig.41 “Novo tipo Lilong” dois jian: Jingan Bieshu, primeiro andar.*

Page 51: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

47

Apesar das transformações construtivas104, decorativas e volumétricas, a

essência do tipo do Lilong manteve-se, visto que o tipo não corresponde a

princípios formais (como vimos no início deste capítulo), mas sim a um conjunto de

características comuns e identificáveis que nos permitem reconhecer as

similaridades estruturais entre o Shikumen e o novo tipo, e identificar os princípios

que constituem esta tipologia.

Uma vez que o tempo é o principal elemento de análise que permite encontrar

os “caracteres de necessidade e de universalidade”105 definidores do tipo,

utilizámo-lo para podermos observar, através da evolução e transformação do

primeiro modelo do Lilong até este novo tipo, a permanência e a consistência de

alguns princípios lógicos e ordenadores. Como estes princípios foram constantes

no tempo, em diferentes variantes, conseguiram “expressar uma ideia de

arquitectura geral e permanente”106: o Lilong como tipologia urbana de Xangai.

Por conseguinte, o tipo “é a estrutura conceptual, a matriz de organização

espacial que está presente, mesmo com distintas soluções formais, num

determinado conjunto de obras que se seleccionam com um objectivo

específico”107.

Nesta linha de pensamento, podemos dizer que o tipo do Lilong corresponde à

seguinte matriz: o princípio de transição progressiva do espaço familiar (o privado)

ao espaço urbano (o público) através de elementos intermediários, semi-privados e

semi-públicos, que permitem o atravessar sucessivo hierárquico dos diferentes

espaços que organizam esta tipologia.

Esses elementos intermediários, correspondentes à superfície e ao volume da

tipologia, são os seguintes: o duplo acesso N-S (o de serviço e o formal), os dois

respectivos pátios N-S, e o sistema de ruas hierárquico (a rua principal e as ruas

secundárias).

Esta tipologia conseguiu, portanto, unidade e coerência urbana, porque os

elementos estruturantes do tipo do Lilong estavam regidos por uma ordem

hierárquica que, vinda da lógica social tradicional chinesa de organizar o espaço

(Siheyuan), acompanhou a evolução desta tipologia.

104 Em 1920 até 1930, começou-se a introduzir os novos materiais de construção como madeira e o

betão. Ibid., p.101 105 ROSSI, Aldo, “La Arquitectura de la ciudad”, [1976], in FERNADES, Francisco Barata,

Transformação e permanência na habitação portuense: as formas da casa na forma da cidade,

op.cit.,p.44 106 MARTÍ ARIS, Carlos, Las variaciones de la identidad : ensayo sobre el tipo en arquitectura, op.

cit., p.21 107 FERNADES, Francisco Barata, Transformação e permanência na habitação portuense: as formas

da casa na forma da cidade, op.cit., p.35

Fig.42 O “novo tipo Lilong” Mei Lang Fang.

Fig.43 O “novo tipo Lilong”, Jin Gu Gun. A combinação modular de dois em dois

apartamentos.

Fig.44 O “novo tipo Lilong” Jingan Bieshu.

Page 52: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

48

A ADAPTABILIDADE DO LILONG

A cidade de Xangai rapidamente incorporou uma nova imagem moderna típica das

cidades ocidentais. Por um lado, houve a necessidade de estender o território das

concessões e de reconstruir em altura devido à especulação imobiliária e fundiária.

Por outro lado, as novas actividades culturais, sociais e comerciais reclamavam

edifícios específicos, tais como: grandes comércios, lugares de distracção, edifícios

industriais, universidades, hospitais, etc. 108

A representação da nova vitalidade da cidade, através da arquitectura, aliciava

tanto as corporações ricas ou as grandes firmas estrangeiras, como a nova

sociedade urbana, composta pela burguesia ocidental e por uma clientela chinesa

aberta à multiplicidade das culturas da metrópole, tal como afirmou Françoise Ged:

”Estes estavam dispostos a consumir produtos importados, a divertir-se nos

lugares de diversão integrados nos próprios edifícios, ou simplesmente curiosos de

saborear um cocktail estrangeiro no bar do terraço-jardim do grande centro

comercial. Frequentar os bares ou os halls dos grandes hotéis significava também

aderir à modernidade que simbolizava a cidade”109.

Desta forma, grandes edifícios comerciais foram construídos ao longo da rua

Nankin110, por grandes empresas de arquitectos estrangeiros como Lester,

Johnson e Moriss e o arquitecto Elliot Hazzard, entre outros, relacionados com uma

nova geração de empresários chineses que competiam com as sociedades

estrangeiras no domínio dos negócios. Esta variedade de diversão que tinha

começado com os “clubs” reservados aos Ocidentais111 direccionou-se

posteriormente a um público mais alargado (cinemas, salas de jogos e de dança).

A mestria técnica adquirida para a edificação dos grandes centros de diversão,

também se repercutiu na construção da habitação de mais de dez pisos, que

anteriormente estava interdita pela falta de resistência mecânica do solo e de

companhias imobiliárias de grande êxito.

Deste modo, foram construídos edifícios de habitação de ritmos verticais e

horizontais de estilo europeu, como a arte-deco, o tipo espanhol, o francês, entre

outros, pela grande imobiliária Chinesa, a Foncim112, visto que dispunha de grandes

108 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.191 109 Idem 110 Entre muitos, foram construídos o Sincere (Xianshi) em 1915-1917 pela agencia Lester, Johnson

et Moriss, o Wing On (Yong’an) por Elliot Hazzard em 1916-1918 e em 1930 foram construídos o

Sunsun (Xinxin), o Dalu, o Sun Cº (Daxin). Ibid., p.192 111 Todos estes edifícios seguiam a mesma exigência europeia dos regulamentos de segurança e

contra-incêndio. Ibid., p.192 112 Imobiliária fundada em 1920, na avenida 9 Edouard VII (actual rua Yan’an) e criada por M. Fano

quando chegou a Xangai em 1902 como agente imobiliário do Banco Indochina. Ibid., p.207

Fig.45 Publicidade em 1949.

Fig.46 O Club de Shanghai (1930-1939).

Fig.47 Apartamento Astrid Mansions.

Page 53: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

49

arquitectos como Léonard e Veysseyre e René Minutti, assim como engenheiros da

China Land e Building Cº.113

A partir de 1930, começou a construir-se, a oeste das Concessões, os edifícios

de habitação de seis a dez andares com uma fachada e organização interior

semelhante aos edifícios de apartamentos ocidentais da mesma época (ex: o

edifício Astrid Mansions). Paralelamente a esses edifícios imponentes, construíam-

se os edifícios de habitação integrados numa paisagem particularmente residencial,

situada nos quarteirões mais ocidentais das concessões, que guardavam o

princípio de organização dos Lilong: o modelo de casa da “cidade jardim” (Xincun) e

o modelo ocidental de “apartamentos” (dasha).

Como estes dois tipos de Lilong se situavam na malha menos densa das

concessões, por vezes, num mesmo quarteirão apareciam os dois associados no

mesmo sistema de ruas, ou, um deles com o “novo tipo”. (fig. 37)

O LILONG JARDIM Villas ou Xincun ( finais dos anos 20 e início dos anos 40)

Após a queda do império, apareceu uma nova classe social rica composta pelos

chineses e estrangeiros que, educados no ocidente, trouxeram para Xangai

diferentes estilos de vida e outras formas de estar e viver. Estas inovações

reflectiram-se no Lilong Jardim e no seguinte modelo Lilong, assim como na cidade

(melhoraram-se os serviços públicos como o gás, a electricidade e a água nos

locais sob a administração chinesa, assim como parques, etc.).

Em relação aos modelos anteriores, este mudou a sua forma evocando as

cidades-jardins, sem pôr em causa a organização interna própria do Lilong. Cada

casa de dois pisos era precedida por um jardim em vez do pátio e seguia a mesma

orientação N-S com a respectiva entrada principal a sul e a entrada de serviço a

norte, que era porém utilizada pelos empregados. Por vezes, existia uma terceira

entrada lateral que permitia o acesso directo aos quartos, para não perturbar as

pessoas que estivessem na sala de estar.

No entanto, a combinação das casas não era em banda. Tratavam-se de casas

individuais com o seu respectivo espaço livre que as separava entre elas.

Este modelo soube demonstrar a sua superioridade na organização dos

espaços, através dos espaços intermédios, como foi o caso da área de preparação

da refeição que ficava entre a sala de jantar e a cozinha, e das novas funções que

foram introduzidas, como o escritório, a garagem e os arrumos.

A localização das escadas permaneceu associada à zona de serviço a fim de

possibilitar a habitação a mais do que uma família.114

A novidade deste modelo inglês estava nas referências ocidentais da fachada.

113 De 1910 até 1930, estas operações ocidentalizaram a morfologia dos edifícios de habitação mas

com o cuidado de conservar a escala urbana chinesa. Idem 114 Idem

Fig.48 “Lilong Jardim” Xin Kang Huayuan

(1930-35).

Fig.49 Planta rés-do-chão do “Lilong Jardim”

Xin Kang Huyuan. Este modelo tinha duas entradas principais, porque funcionava para duas famílias.

Fig.50 “Lilong Jardim”. O nº9 corresponde à

área de preparação da refeição.

Page 54: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

50

Esta era mais aberta, porque a individualização de cada casa o permitia e a nova

sociedade ocidentalizada o exigia para ter melhores vistas. Deste modo, muitos

destes edifícios adoptaram vários estilos internacionais na concepção da fachada,

assim como o respectivo nome: o estilo moderno115, inglês, francês, espanhol. 116

A rua secundária, entendida como espaço de interacção social, perdeu-se

devido às grandes distâncias que existiam entre cada unidade habitacional no

sentido N-S. Contudo, este modelo manteve a ideia de entidade homogénea.

Embora este modelo tivesse reunido uma grande variedade de estilos europeus

e um maior conforto (sistema de aquecimento, lareira, bons materiais, grandes

escadas), foi desvalorizado pela sua baixa densidade e a falta de controlo dos

espaços vazios (as ruas secundárias e os jardins) que exigiam grandes lotes para a

sua construção.

As larguras exageradas das ruas secundárias são reflexo do novo regulamento

de construção que tinha entrado em vigor a partir de 1924 nas Concessões e na

parte chinesa.117 Como essas medidas eram fornecidas de acordo com cada

propriedade e não com o conjunto construído do Lilong118, o resultado da largura

das ruas foi o seguinte: “O afastamento entre dois edifícios de propriedades

diferentes deve ser pelo menos igual a 30 pés (cerca de 9,15m)”119.

O LILONG APARTAMENTO Gongyu ou dasha (1930-1940)

Este ambiente cosmopolita e de tensão ideológica incentivou o governo

nacionalista a promover um modo de vida segundo um estilo arquitectónico e a

reconstruir a cidade em altura, assente no controlo técnico da pedra, do betão ou

do ferro. Em consequência, apareceu o segundo modelo de edifício importado

pelos intelectuais ocidentais: o “Lilong apartamento”.

O Lilong apartamento, construído na zona da concessão francesa, na

concessão internacional e entre as duas, diferenciava-se da arquitectura dos

precedentes.

O módulo repetitivo inscrito no respectivo sistema de ruas interiores do Lilong,

correspondente a um edifício colectivo de três andares, variava segundo três

categorias: o modelo em linha, o edifício em torre, e o edifício borboleta.

115 Este estilo apenas foi anunciado pelos construtores em planta. Idem 116 “O Bali xincun, na actual rua de Fuxing, seria provavelmente considerado como uma curiosidade

de Paris, cidade cujo pediu emprestado o nome.” Idem 117 CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport de

recherches, op. cit. p.159 118 Atente-se que a maior parte dos lilong anteriores eram de apenas uma propriedade (o chefe da

empressa para a qual trabalhavam os habitantes destes modelos), e, portanto, não estavam

obrigados a seguir este regulamento. 119 Idem

Fig.51 Porta remarcável de um Lilong de tipo

espanhol na antiga Concessão Francesa.

Fig.52 Casa do estilo moderno.

Fig.53 “Lilong Jardim”.

Fig.54 O modelo em linha: Yong Jia Xincun

(1930).

Page 55: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

51

O número de apartamentos por piso, de cada categoria, variava segundo a sua

forma: o primeiro modelo podia ter de dois a seis apartamentos por andar, o

segundo, como era mais compacto, tinha apenas três, e o edifício-borboleta podia

ter de dois a quatro apartamentos por andar.

As duas entradas (a principal e a de serviço) foram mantidas. No caso do

edifício borboleta, como a escada de serviço era comum a dois apartamentos e

localizada na fachada de serviço prejudicou as condições de ventilação das

respectivas zonas de serviço.

A diferenciação N-S das duas zonas foi-se perdendo à medida que o edifício

ficava mais compacto. Também a orientação N-S de cada apartamento se foi

diluindo.

Seguindo o esquema ocidental, estes modelos foram construídos segundo uma

estrutura de betão revestido a pedra, tijolo ou estuque com alguma ornamentação

moderna ocidentalizada. E no interior foram equipados com quartos-de-banho

completos, sistema de aquecimento, gás e electricidade, lareiras e elevadores no

hall de entrada comum.

A coexistência de diferentes modelos de casa num mesmo padrão (matriz) de

Lilong revelou a capacidade deste em adaptar-se a diferentes contextos para

satisfazer as diferentes necessidades sociais, económicas e culturais típicas de

qualquer sociedade.

Esta capacidade de adaptação do padrão do Lilong tanto à malha urbana

composta pelos ocidentais, como aos diferentes modelos de casa, permitiu, ao

unificar o tecido e os diferentes grupos sociais e culturais, dar uma identidade tanto

urbana como social e cosmopolita a Xangai. Daí a adopação, pela cidade de

Xangai, do nome de “Paris do Oriente”, de “museu de todas as arquitecturas”120,

entre outras denominações.

Toda a casa urbana, incluindo a oriental, “percorre a história da civilização

estruturada por subtis transformações que constituem a sua génese, a sua

identidade enquanto fenómeno cultural ”121, porque a casa, enquanto fenómeno

civilizacional, sempre foi indissociável da cidade, visto que é ela que contrapõe o

colectivo e o privado, a sociedade e o indivíduo, o valor racional do desenho, o

valor do lugar (o “locus”), e que, portanto, define a identidade da cidade.

A análise tipológica sobre o Lilong, segundo a história, permitiu-nos encontrar,

através do que permanece, “a condição essencial da arquitectura”122, ou seja, o

120 GED, Françoise, “Shanghai, musée de toutes les architectures”, article paru dans Aujourd’hui la

Chine, revue de l’associaction des Amities Françaises chinoises, nº43, mars 1983, p.34 121 CARVALHO, Ricardo, JA224, Morada-Casa Rua, Julho_Setembro 2006, p.34 122 MARTÍ ARIS, Carlos, Las variaciones de la identidad : ensayo sobre el tipo en arquitectura, op.

cit., p.22

Fig.55 Apartamento em torre.

Fig.56 Fachada Sul de um “Lilong apartamento

torre”.

Fig.57 “Lilong Apartamento borboleta”: Yong

Jia Xincun. Podia aparecer isolado ou agrupado em banda, devido ás suas duas

empenas laterais.

Page 56: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

52

seu conceito estrutural, que não corresponde a um sistema estanque, inerte e

fechado sobre si mesmo, mas sim a “uma realidade em perpétua formação, dotada

de processos generativos capazes de incorporar na estrutura novos componentes

que a enriquecem e ampliam ”123.

Consequentemente, depois de termos decifrado o tipo do lilong, apresentámos

outros dois outros modelos (o “Lilong Jardim” e o “Lilong apartamento”) que, para

além de manterem o conceito estrutural do Lilong, o enriqueceram com a

capacidade de verticalização deste tipo, através do constante aumento de pisos e

a diminuição de utilização do terreno, que se tinha vindo já a revelar uma tendência

(uma constante).

A apresentação destes dois últimos modelos fez-nos ver que o projecto

desenvolve-se sobre uma base tipológica em que o tipo é continuamente

transformado permitindo novas soluções arquitectónicas com o mesmo significado,

num processo contínuo ao longo da história. Desta forma, cada trabalho surge não

como o resultado de uma simples e isolada ideia, mas como uma base para o

seguinte num processo de investigação permanente.

Assim a noção de tipo e a sua relação com o passado torna-se fundamental no

desenvolvimento do exercício da arquitectura, onde o seu conhecimento e

compreensão constitui uma base sobre a qual esta se assume mais como um

processo de continuidade do que de ruptura.

Nesta linha de pensamento mais fenomenológico124, podemos dizer que a

arquitectura é entendida como um resultado de uma contínua transformação

operada sobre os tipos ou estruturas formais,125 que permitem o desenvolvimento

de várias formas com o mesmo significado.

Dedicou-se o quarto e quinto capítulo à confrontação deste tipo com outros

que foram variando sobre o mesmo significado em outra cultura e época, a fim de

valorizar o tipo do Lilong como estrutura formal que ainda continua a procriar várias

formas arquitectónicas contemporâneas com um significado semelhante. Como

disse Montaner:

“Pensar a arquitectura desde os conceitos de tipo e estrutura permite-nos

estabelecer comparações sincrónicas. Pode-se comprovar como o (...) espaço

simétrico, axial, puro, transparente, rítmico e sereno do átrio do Panteão reproduz a

base do Seagram Building (1954-1959) de Mies van der Rohe”126.

123 Ibid., p114 124 A fenomenologia é o estudo da consciência e dos objectos da consciência.

www.cobra.pages.nom.br/ftm-fenomeno.html 125 A estrutura é aqui encarada como a estrutura oculta que configura e articula cada edifício:

exemplo a estrutura espacial, a estrutura formal. MONTANER Josep Maria, La modernidad

superada: arquitectura, arte y pensamiento del siglo XX, Barcelona, Gustavo Gili, 1997, p.122 126 Ibid., p.125

Fig.58 Fachada exterior do Lilong. A porta

principal de entrada ao sistema de ruas e o

limite comercial.

Fig.59 A fachada exterior do “novo tipo

Lilong”.

Fig.60 Fachada interior do “novo tipo Lilong“

Maoming Lu (de dois jians).

Page 57: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

53

No final de 1941, após a guerra sino-japonesa, a economia entrou em

depressão e os Lilons deixaram de ser construídos.

Após a liberação nacional, em 1949127, a tipologia Lilong, ainda que

considerada uma característica exclusiva de Xangai por ter promovido um padrão

de vida tradicional e socialmente coeso, foi considerada não competitiva e ineficaz

nas suas tecnologias de construção e na rentabilização do terreno,

comparativamente com as novas torres pré-fabricadas que começavam a ser

construídas em massa para uma nova família nuclear.

A vontade de abrir Xangai à modernidade e o desenvolvimento prioritário do

sector terciário, enquadrados na era das “quatro modernizações”128 de Deng

Xiaoping, incentivaram um desenvolvimento urbano apoiado em complexos de

escritório, comércio e de alojamentos de grande altura que não respondem aos

princípios da cultura chinesa, mas sim à tendência global que ignora a identidade

urbana de Xangai, conseguida anteriormente pelos Lilongs.

Segundo Francisco Barata, uma cidade “perde identidade cada vez que quem

nela constrói arquitectura corrente não entende as características do seu conjunto

edificado, nem está apto a realizar uma análise tipo-morfológica da área onde é

chamado a intervir ”129.

Sabendo que o Lilong é um emblema de habitação tradicional em Xangai e que

traz memórias de experiências e culturas aos xangaienses, este pode constituir

uma experiência válida a qualquer momento, apesar de situar-se num tempo

especifico.

Concluindo, deixo a opinião de Pascal Amphoux, a qual partilho:

“Quando é que os Chineses deixam de se influenciar pelos erros do nosso

urbanismo pós-guerra? Quando o ocidente renunciará de exportar de maneira

simplista o que ele mesmo não acredita? É tempo que possamos encontrar e

analisar em profundidade os lilong de Xangai, não para proteger o património no

sentido que entendem as nossas instituições, mas sim para valorizar os princípios

que definiram o Espírito de Xangai. Moribundo para o Urbanismo, cada xangaiense

tem portanto um lilong na cabeça. Xangai é uma cidade-fóssil, mas um fóssil

vivente ” 130.

127 No dia 1 de Outubro de 1949, Mao Zedong proclama a instauração da República popular da

China. CYRILLE J, JAVARY D. e WANG Alain, La Chine nouvelle, op.cit., p.30 128 Deng lança uma audaciosa política de abertura destinada ao apoio das “quatro modernizações”

(agricultura, industria, defesa nacional, ciências e tecnologias) para modernizar a China (1978).

Ibid.,p.32 129 FERNADES, Francisco Barata, Transformação e permanência na habitação portuense: as formas

da casa na forma da cidade, op. cit., p. 49 130 AMPHOUX, Pascal (Eds.) e MARTIN, Cristophe, “Lilong mort ou vif” [1987], in

lasur.epfl.ch/revue/A&C%20Vol%204%20No.2/AMPHOUX.pdf (em 27/01/2007)

Fig.61 Destruição dos Lilong, neste caso, é o “novo tipo”. Como podemos observar, a

estrutura do telhado define-se por uma asna em madeira semelhante à da do Ocidente (ex: a casa do Porto do século XIX).

Fig.62 A substituição dos Lilong pelas altas

torres residenciais.

Fig.63 Qual será o futuro da identidade de

Xangai?

Page 58: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

54

Vista aérea que mostra o traçado orgânico dos Lilong perto do rio Suzhou.

Page 59: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

55

III. O LILONG COMO FORMA URBANA

O carácter homogéneo que o padrão do Lilong conseguiu, no seu conjunto, no

tecido urbano de Xangai, através da sua adaptação à malha urbana e à

transformação da civilização xangaiense, converteu-o na forma urbana desta

cidade.

Sabendo que o lilong faz parte da estrutura urbana da cidade, e que foi durante

muito tempo a sua tipologia, pretende-se, para acabar o estudo daquele, analisar a

relação entre a tipologia e a forma urbana que o constitui, ou seja, o sistema de

conexões presentes na rede estabelecida pela estrutura da organização dos

espaços urbanos, causadores do carácter unificador, tanto espacial como social.

No entanto, antes de passarmos a essa análise, iremos introduzir o tema breve

das transformações que a casa urbana ocidental sofreu em relação ao espaço

urbano, para que possamos perceber as valias do Lilong como forma urbana.

Desde a cidade tradicional131 até à cidade industrial oitocentista132, começou-se

a formalizar a casa urbana através da substituição da casa unifamiliar tradicional

pela casa colectiva que se integrou na infra-estrutura urbana através do bloco

urbano e do quarteirão (dois tipos de forma urbana).

Porém, enquanto que na cidade tradicional existia a relação entre o privado da

casa e o público da rua, uma vez que no rés-do-chão estava a actividade laboral

que fazia a transição, na cidade oitocentista aquela deixou de existir, a partir do

momento em que se introduziu a noção de casa como núcleo de intimidade e se

separou desta os espaços de trabalho, de actividades quotidianas especializadas e

de ócio, através da construção de um sistema viário autónomo que os

comunicava.133 O problema de tráfico do sistema autónomo, as grandes distâncias

entre o trabalho e a casa e a ausência do valor da rua como espaço de mediação

entre o público e o privado, fez com que os modernistas ensaiassem diferentes

tipos residenciais e explorassem a capacidade do mesmo em estruturar a forma

urbana, a fim de recuperar a ideia de colectividade e de comunidade da cidade

tradicional.

131 Quando se fala da cidade tradicional, refere-se a um organismo urbano que se foi definindo

através de um largo processo histórico até se fixar numa forma que se pode representar numa

imagem unitária, homogénea e fechada. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la

ciudad moderna : vivienda y ciudad en la Europa de entreguerras, op. cit., p.14 132 Cidade especulativa produzida pelo desenvolvimento industrial oitocentista que destruiu os

traços que definiam a cidade tradicional. Esta foi a cidade que os modernistas criticaram. Idem 133 Ibid., p.15

Fig.1 Ercolano. Planta geral das escavações.

Fig.2 Priene. Planta da casa-pátio.

Fig.3 Madrid, uma edificação especulativa de

princípios do século. A casa colectiva, em bloco, da cidade industrial oitocentista.

Page 60: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

56

Para tal, os modernistas recorreram aos modelos tradicionais que traduziam um

tipo de relação social com o espaço livre que concedia identidade e carácter

homogéneo ao conjunto edificado.

Esse trabalho foi desenvolvido segundo duas vertentes. Por um lado, tínhamos

a teoria da “cidade jardim” anunciada por Ebenezer Howard, que recuperava a casa

unifamiliar como elemento base na extensão da cidade moderna. Por outro lado,

tínhamos também a cidade concentrada134 com edifícios colectivos de alta

densidade que, ao contrário da anterior, tentavam rentabilizar o terreno e diminuir

as distâncias entre casa e trabalho e actividades quotidianas, mas sem a dimensão

comunitária que tinham conseguido algumas “cidades jardim”.135

Como para os modernistas a relação social estabelecida entre os tipos

tradicionais e a rua podia ser garantida no interior dos grandes edifícios em barra ou

unités, aqueles libertaram o edifício da rua autonomizando-o em relação ao tecido

urbano, o que pôs em risco o desaparecimento da forma urbana. Por exemplo, o

edifício colectivo auto-suficiente da Unidade de Habitação de Marselha (1954-1952)

de Le Corbusier, assente sobre “pilotis”, acarretava nos pisos superiores uma

diversidade de actividades de lazer, serviços colectivos de primeira necessidade,

habitação e quartos de hotel agrupados segundo a “rua corredor” que funcionava

como espaço de mediação entre o público e o privado.136 Este tipo de edifícios, as

unités, dificultaram a vivência urbana nos espaços públicos que os cercava, devido

à falta de relação social entre a residência e o espaço urbano que estas formas

lineares137 solicitavam. Um dos factores justificativos é o destinatário abstracto,

correspondente a estereótipos de famílias138, o qual determinou a concepção

destas formas urbanas (a rua e a casa) como objectos abstractos.

Sucede-se então, numa primeira parte do capítulo, uma análise morfológica que

pretende definir os diferentes elementos que constituem a forma urbana Lilong e as

relações que se estabelecem entre eles. Numa segunda fase pretende-se definir as

relações entre essa forma urbana e a estrutura da cidade Xangai, de forma a

reflectir sobre estes problemas, que situam a casa urbana na sua profunda relação

com o contexto urbano.

134 Para este modelo de cidade surgiram duas propostas paradigmáticas: a Cidade Contemporânea

de 3 milhões de habitantes, exposta por le Corbusier em 1922, e a Cidade Vertical, elaborada por

Ludwig Hilberseimer em 1924-25. Ibid., p.24 135 Exemplo dos bairros suíços de Hans Bernouilli, que demonstraram a capacidade da casa em

enquadrar-se numa organização colectiva, sem perder a condição de célula autónoma. Ibid., p.22 136 HEREU, Pere, MONTANER Josep Maria, OLIVERAS Jordi, Textos de arquitectura de la

modernidad, trad. José Luis Gil Aristu, Madrid, 1994, p.522,524 137 A forma em linha é uma das formas urbanas desenvolvida pelos modernistas para a concepção

da cidade concentrada. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna :

vivienda y ciudad en la Europa de entreguerras, op. cit. p.33 138 No início do século XX nasce a ideia de homem-tipo resultado da associação do “super-homem”

nietzschiano com o trabalhador revolucionário, desenraizado, independente e nómada (desvinculado

da propriedade agrícola) idealizado por Max e Engels. CARVALHO, Ricardo, JA224, Morada-Casa

Rua, op. cit., p.39

Fig.4 Ebenezer Howard. Um dos programas

generais do modelo da cidade jardim, 1902. O núcleo residencial estava separado de todas as outras actividades da cidade.

Fig.5 Heinrich Tessenow. Projecto de casas

em banda, em Rahnitz-Dresden, 1919.

Fig.6 Cidade Contemporânea de 3 milhões de habitantes, exposta por Le Corbusier de 1922.

Fig.7 A Cidade Vertical de Ludwig Hilberseimer,

1925.

Fig.8 Unidade de Habitação (cité radieuse)

Marselha, 1952.

Page 61: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

57

O TIPO ARQUITECTÓNICO E A FORMA URBANA

Da análise efectuada deriva um aspecto pertinente, que não foi directamente

referido para o estudo do Lilong como forma urbana: a relação entre o construído

(a residência) e o espaço livre (o sistema de ruas e os pátios).

Em respeito a este tema temos vindo a observar, ao analisar a tipologia urbana

de Xangai, que a relação entre a residência e o espaço livre foi constante à medida

que evoluía e se transformava o tipo do Lilong, ou seja, o espaço livre variou

sempre segundo o construído de forma hierarquizada e estruturada, mantendo a

sua densidade. A variação do espaço livre dependia, portanto, do tamanho e da

posição do construído do Lilong em relação ao quarteirão e do regulamento que

regia o traçado das suas ruas.

Todo o trabalho que envolve o espaço público e urbano parte de designações

arquitectónicas bem precisas ou tende para elas. Tanto as praças como as ruas,

entre outros espaços urbanos, não se podem ler sem o edifício (e vice-versa),

porque este é o elemento que o define e o delimita. Contudo, é necessário que “ as

regras espaciais [devam] (...) ser simples, precisas, concretas e adequadas às

hierarquias institucionais e monumentais indicadas pelo traçado. Pode dizer-se que

elas constituem a potencial substância arquitectónica do próprio traçado.”139

Como iremos ver, o regulamento atribuído ao Lilong também constituía a

primordial substância na relação do espaço livre com o construído de forma a criar

um sistema de ruas inteligível e coerente:

- “7,5 pés (2,28m) quando uma fachada tinha em frente um muro ou uma

grelha ”140. Esta largura correspondia à da rua secundária, porque esta era limitada

a sul pela fachada da cozinha e a norte pelo muro do pátio da fachada principal.141

- “10 pés (cerca de 3m) quando a passagem é o único acesso a um ou a

muitos blocos de casas ”142. Como os blocos estavam dispostos em banda e em

paralelo de N-S, a única rua que os podia articular seria a rua principal N-S.

Os edifícios eram igualmente condicionados pelas dimensões das ruas. “A

altura dos edifícios sobre rua não podiam exceder uma vez e meia a largura da rua.

Num ângulo da rua, a altura era fixada em relação à rua mais larga” 143.

Estas dimensões definiram, o sistema hierárquico de circulações internas ao

lilong (fig.9) e impuseram aos habitantes um uso restrito a cada rua, uma vez que as

larguras foram determinadas não só para rentabilizar o terreno, como também

139 BERNARD, Ihuet, “La città come spazio abitabile” [1984], in FERNADES, Francisco Barata,

Transformação e permanência na habitação portuense: as formas da casa na forma da cidade,

op.cit., p.306 140 GED, Françoise e QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport de recherches, op.

cit., p.159 141 O regulamento também mencionava que “devia existir um espaço aberto em cada edifício de

habitação”, ou seja, o pátio. Idem 142 Idem 143 Idem

Fig.9 O “novo tipo Lilong” (1920-30). A rua principal de acesso a veículos.

Fig.10 O desenho do transbordo da fachada sul, correspondente às unidades habitacionais

de extremo este e oeste de uma banda do Lilong do velho e novo Shikumen, em forma de “cavalo” foi imposto pelos regulamentos das

Concessões.

Fig.11 O “novo tipo Lilong” (um jian e meio). Por vezes a entrada principal dava sobre ruas secundárias muito estreitas com pouca

iluminação.

Page 62: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

58

resultaram de uma análise às práticas constantes que se realizavam nas ruas dos

primeiros modelos do Lilong. Segundo Pierre Clément: “É possível que se tratasse

de funções convertidas em regulamentos, depois de um artigo posterior onde foi

especificado que: cada edifício chinês tinha que ter uma entrada independente

atrás e à frente, livre de todo o obstáculo, de largura mínima (...) ”144 (confrontar

fig.11).

Com o tempo, as ruas foram adquirindo uma escala humana e uma identidade

própria devido à permanência constante do tipo de relação do construído com o

espaço livre nas diversas variantes do Lilong, estabelecido pela ordem hierárquica

que regia a sua estrutura de organização progressiva, do privado para o público. E

é segundo a estrutura de organização do Lilong que serão definidos os elementos

que constituem a sua forma urbana e as relações que se estabelecem entre eles.

A cozinha, como estava associada à entrada de serviço que dava sobre a rua

secundária de frente para a entrada principal do vizinho, fez com que as pessoas,

ao irem despejar o lixo e ao lavarem a roupa no tanque (fig.12), interagissem nas

ruas secundárias, com as pessoas que entravam nas suas casas.

A posição e a relação de porta aberta da cozinha colectiva145 com a rua

secundária fez com que esta funcionasse como espaço semi-privado, devido às

actividades domésticas que se transportavam de casa, pela e da cozinha, para esta

rua. A utilização intensiva desta rua como mais um espaço da casa deve-se

também à sua posição intermédia entre a rua principal e a habitação, à sua largura

reduzida que provocava a proximidade entre os habitantes e ao clima quente e

húmido, que obrigou a que muitas actividades fossem feitas ao ar livre, como

dormir, comer na rua, etc.

Essa gradação do espaço podia ler-se num corte transversal ao edifício através

da continuação do mesmo nível do chão da cozinha para a rua secundária que

enfatizava a ideia da rua como espaço de extensão do lar e de

sociabilidade146.(fig.13)

É importante frisar que na construção da casa colectiva “ideal” pelos diferentes

mentores modernistas, apareceram tipos espaciais inovadores dentro do universo

doméstico, como o New Lanark de Robert Owen, que incorporava cozinhas

públicas para núcleos familiares.147 Também Dolores Hayden, no seu livro The

Grand Domestic Revolution, reuniu diversas experiências de colectivização dos

serviços domésticos, como os projectos de “casas sem cozinha”, reunidos em

pequenas comunidades com cozinhas comuns.148

144 Ibid., p.159 145 A partir do momento que as unidades habitacionais do lilong, inicialmente realizadas para apenas

uma família, foram habitadas por várias famílias e gerações, a cozinha tornou-se colectiva. 146 GED, Françoise, “Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, in op. cit. 147 CARVALHO, Ricardo, JA224, Morada, Casa, Rua, op. cit., p.36 148 MONTEYS Xavier, FUERTES Pere, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa,

Editorial Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.110

Fig.12 O ambiente das ruas secundárias do Lilong. Os tanques de cimento construídos

junto à parede da cozinha.

Fig.13 A entrada da cozinha a norte. O “novo

tipo Lilong” com um jian.

Fig.14 O pátio principal do “novo tipo Lilong”

(1920-1930).

Page 63: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

59

O pátio principal, como era um espaço ao ar livre pertencente ao espaço

privado da casa, facultou as actividades mais colectivas dentro desta, tornando-se

no espaço de transição das ruas secundárias ao interior da casa, e não o contrário

como a cozinha. Normalmente, é mais frequente encontrar pessoas a entrarem e a

saírem pela cozinha do que pelo pátio que quase sempre tinha a porta fechada,

respeitando o seu carácter introspectivo (espaço virado para o céu de muros altos

e de superfície pequena).

Perpendicular às ruas secundárias, está a rua principal orientada de N-S, que,

como era mais larga e estava limitada pelas empenas dos blocos de habitação,

tinha um carácter mais de passagem (veículos,etc) do que de estar. Contudo,

como estava posicionada entre as ruas secundárias (semi-privado) e as avenidas

comerciais (público) de grande dinamismo, converteu-se num espaço semi-público

de transição do público ao privado.

Françoise Ged foi uma das autoras que descreveu bem essa gradação do

sistema de ruas do Lilong:

“A rua instaura-se como um lugar público, de circulação, para peões, bicicletas,

autocarro e como espectáculo resultante deste ambiente. A passagem principal,

transversal a esta rua, exerce a mesma função mas à escala desta entidade que é o

Lilong. Sobre este eixo normalmente encontrávamos o telefone público, comum a

todos estes habitantes, lugar de chamada e de recepção das comunicações.

Pode-se encontrar a máquina de lavar a roupa para facilitar a evacuação das águas

sujas, os colchões de Inverno ou edredões lavados.

O “promeneur” já entrou numa certa intimidade comum ao grupo dos

habitantes do Lilong. A ruela, que comunica cada apartamento, funciona como

prolongamento do espaço privado do apartamento, pelo menos do compartimento

principal. (...) Esta rua delimita portanto um espaço muito mais pessoal mas

assegura a percepção visual, em parte, e auditiva do conjunto do Lilong. (...)”149.

De um modo geral, as ruas mais próximas e pertencentes aos bairros

residenciais eram concebidas pelos habitantes como espaços do seu domicílio,

uma vez que diariamente eram utilizadas para as actividades domésticas, tais como

estender a roupa, ir de pijama150 a um fast-food ou a um quiosque, lavar a roupa,

fazer ginástica, etc.

A transição entre este sistema interno de ruas do Lilong e o seu exterior

cosmopolita era feita segundo a porta, a qual acarreta um sentido simbólico próprio

da cultura chinesa, mencionado no primeiro capítulo.

149 GED, Françoise, “Shanghai-Interférences et justapositions” [1986], in CLÉMENT Pierre, GED

Françoise e QI Wan., Transformations de lʼhabitat à Shanghai , rapport de recherches, op. cit., p.153 150 Numa sondagem realizada pela Academia das ciências sociais de Xangai e a Federação das

mulheres da cidade, explicam que o facto de os xangaienses saírem à rua com o pijama deriva de

uma vontade de afirmar a proximidade do seu domicílio ao centro da cidade e de reforçar o seu

estatuto social e a sua vida comunitária. www.destinationchine.com/post/200609-pyjama-rue-

Shanghai.html (em 22/07/2008)

Fig.15 O “novo tipo Lilong” (1930). A rua

principal, e à direita vão aparecendo as ruas secundárias.

Fig.16 As ruas do Lilong são utilizadas como

espaços de extensão do lar.

Fig.17 A Porta de entrada principal (N-S) do

Lilong (1920-1930).

Fig.18 A porta de entrada ao Lilong (1920-1930), vista do interior.

Page 64: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

60

A porta, para além de permitir a passagem, tinha a finalidade de marcar o

momento da transição. Por esta razão, as portas das casas do Lilong tinham um

degrau que correspondia ao pré-marco da porta que a rodeava, e a entrada

principal N-S do Lilong estava definida pela espessura das unidades de habitação-

comercial do primeiro andar e com a marcação de um arco na fachada exterior.

A porta também aparecia no momento de transição para a cidade e para os

bairros residenciais, porque o objectivo era assinalar o início de um grupo de

arquitecturas como o fim do grupo que o precede.151

Por último, o elemento que delimita a forma urbana do Lilong é a unidade

habitacional-comercial, que agrupada a outras, funciona como o elemento

mediador dos ambientes privados e públicos, tal como na cultura ocidental. Atente-

se ao plano da cidade higienista de Paris (1853-1869) do barão Georgess-Eugéene

Haussmann, o qual incorporou o comércio no nível do piso térreo ao longo das

boulevards.152 Por vezes, no limite este e oeste os Lilong eram delimitados por

muros cegos.

No entanto, o limite comercial transcende essa simples função para, em

analogia com o muro simbólico da arquitectura chinesa, funcionar como elemento

definidor do que está dentro do Lilong, e não como elemento separador. “Em

Xangai, o muro que delimita um quarteirão de casas é materializado pelo comércio

que se abre para a rua ”153.

Para a definição da forma urbana é necessário que o espaço construído e o

espaço livre se complementem e equilibrem para poderem formar um todo, que é a

cidade. Neste sentido, o Lilong conseguiu complementar os dois espaços dando

origem à forma urbana, através de uma ordem hierárquica que regia a posição dos

elementos, anteriormente referidos, na estrutura progressiva da sua organização da

forma.

Deste modo, o Lilong resolve os diferentes problemas e consegue reunir as

mais valias das diferentes tipologias residenciais ocidentais, definidoras da forma

urbana. A existência de um sistema fixo de ruas intermédias progressivas

(associadas aos restantes elementos edificatórios) entre a casa do Lilong e a malha

da cidade, facilitou o sentido de colectividade, defendida pelos modernistas na “rua

corredor”, a fim de unir o espaço livre ao construído numa única forma urbana sem

causar o problema do contacto directo da habitação familiar com o público (a rua

de circulação) da cidade tradicional. Por último, o limite comercial permitiu integrar

esta forma urbana na malha da cidade, o que não aconteceu com as unités de

habitação que, assentes sobre pilotis, soltavam-se do espaço urbano.

Em suma, a forma urbana do Lilong soube ser eficaz e coerente, porque

optimizou cada pequeno espaço, através da ordem hierárquica.

151 YONGSHU Li, “Cathay’sidea-Design theory of chinese classical Architecture”, in ZHANG, Liang,

La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, op. cit., p.78 152 CARVALHO, Ricardo, JA224, Morada, Casa, Rua, op. cit., p.38 153 GED, Françoise, “Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, in op.cit.

Fig.19 A porta do pátio principal do “velho

Shikumen”.

Fig.20 A porta de transição aos bairros

residenciais, perto do people’Square (2007).

Fig.21 Projecto de reabilitação de um Lilong, realizado pela Universidade de Tongji-Shanghai. O aumento do espaço da mini-galeria do lilong, vem frisar a importância

urbana das unidades comerciais do Lilong.

Fig.22 O limite comercial como definidor do

que está dentro do Lilong.

Page 65: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

61

A FORMA URBANA E A CIDADE CHINESA

Paralelamente à história da constituição da forma urbana do Lilong, está a

importância da sua lógica na organização da rede urbana de Xangai.

Os princípios de organização que regem essa lógica coincidem com os do

arquétipo organismo urbano chinês que são distintos aos dos ocidentais em dois

aspectos: o sentido de espaço público e o sentido de ordem na organização e na

utilização do espaço urbano presente, desde a casa, passando pelos bairros até

chegar à cidade.

De uma forma geral, na China, o espaço público de propriedade pública154

reduz-se ao elemento rua, porque este era concebido como o lugar da actividade

comercial e não de reunião pública onde as pessoas param para estar a conversar,

como nas praças e jardins.

Assim o retrataram os Ocidentais, quando ao chegarem pela primeira vez a

Xangai depararam-se, apenas, com as ruas de pequeno e grande comércio como

o único espaço público: “Os viajantes ocidentais do século XX, saturados do

espírito do século das luzes, ao chegarem a Xangai, sentiram uma decepção em

relação à falta de espaço público amplo e a sua frustração pelo não tratamento das

ruas que dificultavam a orientação ” 155.

Mesmo com a introdução, pelos ocidentais, das praças e jardins fora dos limites

das concessões, estes espaços continuam hoje a funcionar como um espaço de

passagem e não de estar ou de convívio. Apenas os jardins, que se converteram

em ginásios públicos ao ar livre, adquiriram uma utilidade.

No entanto, é notório que o facto de os chineses não terem adaptado o mesmo

sentido do espaço público ocidental pode dever-se à sua rápida substituição, no

Ocidente, pelos espaços de convívio e de atracção relacionados com a mesma

lógica do consumo na China, seja ele cultural ou de produtos industrializados de

massa, e menos virados para a cidade, como por exemplo os centros comerciais,

Foruns, Museus, Hipermercados, feiras, centros comerciais nas ruas, etc. Como

disse Fabiano Dias:

“O caos urbano, as velocidades dos automóveis e da vida agitada das

metrópoles modernas (sintomas que já se estendem para as cidades menores),

aliados à falta de segurança das ruas, criou um novo ambiente urbano muito pouco

favorável para a vida comunitária nos lugares públicos, cristalizando no século XX a

tendência já iniciada cem anos antes da interiorização da vida, com o surgimento

de lugares que se voltam para si e menos para a cidade ”156.

154 No espaço público não está presente a relação entre a propriedade e o uso, como acontece

com os espaços colectivos do centro comercial, cafés, etc.. GAUSA, Manuel, diccionario de

metápolis avanzada, Barcelona, Actar, 2000, p.203-204 155 GED, Françoise, Shanghai, colecção, Portrait de ville, op. cit., p.21 156 DIAS, Fabiano, O desafio do espaço público nas cidades do século XXI

www.romanoguerra.com.br/arquitextos/arq000/esp312.asp (em 20/07/2008)

Fig.23 As pessoas a jogarem mah jong no passeio de uma avenida de grande movimento (seis sentidos de cada lado).

Fig.24 Ginásios ao ar livre instalados nos jardins.

Fig.25 O comércio na rua

Fig.26 O sapateiro num primeiro plano e a

máquina de costura em segundo plano.

Page 66: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

62

O segundo aspecto centra-se no sentido de ordem da organização das

diferentes escalas, a casa, o bairro e a cidade, na estruturação urbana da cidade

chinesa, para em simultâneo percebermos a lógica do Lilong, como forma urbana,

no tecido de Xangai.

Quando observamos qualquer traçado regulador da antiga cidade chinesa,

aparentemente parece assentar num mesmo esquema utópico e abstracto que o

traçado Ocidental, por exemplo, o sistema de traçado do castrum romano

assemelha-se com o ching-t’ien chinês (tabuleiro quadriculado com os eixos

principais orientados N-S, E-O). Contudo, os chineses, ao contrário dos ocidentais,

conseguiram que a ideologia reprodutora deste tipo de esquema conformasse, ao

unificar o pensamento e a prática, as condições concretas necessárias para a sua

realização. Por isso é que o castrum romano perdeu a sua hegemonia.157

Neste sentido, explica-se o facto das cidades chinesas terem optado por um

esquema viário estabelecido por uma série de prioridades funcionais: o eixo

principal assume um traçado independente e normalmente conduz às entradas na

cidade as vias secundárias, apenas distribuem o tráfego nas zonas limitadas, e as

interiores respondem exclusivamente às necessidades do tráfego reproduzido pelo

bairro e pelos núcleos da habitação.158

Ao contrário das cidades chinesas, as cidades ocidentais optaram por definir

um traçado viário com um carácter indiferenciado, devido à mistura de diferentes

tipos de tráfico na mesma via159 e ao facto desta ter sido concebida como um

elemento ligado ao espaço construído, e não segundo a função que devia

desempenhar como via de serviço. Este facto deve-se ao processo originado,

fundamentalmente, pela exploração intensiva do chão urbano160 que conformou as

ruas, características da cidade ocidental, ladeadas por uma cortina de edifícios.

Em discordância, as vias da rede viária chinesa, especificamente nos bairros,

eram concebidas como elementos separados do espaço construído.

Os chineses conseguiram, consequentemente que o tipo de estrutura urbana

geométrica e funcional da rede viária se complementasse, porque ao dar

prioridades funcionais a essa quadrícula de forma estratificada conseguiram

diferenciar, na rede, as artérias de tráfego geral, as vias comerciais, a ruas de

acesso privado aos núcleos de habitação e as ruas de serviço às habitações, e, em

157 Enquanto, que o modelo urbano rectangular Chinês, apesar da implantação de civilizações

heterogéneas, conseguiu perdurar, devido à transmissão orgânica de umas constantes culturais

homogéneas e unitárias, o Castrum romano não consegui aguentar a sua hegemonia perante o

predomínio de outras formas culturais. GAVINELLI, Corrado, Ciudad y territorio en China; trad.

Francisco Pol Mendez, 1ª ed, Madrid 1979, p. 216 158 Ibid., p.216- 217 159 Por exemplo, numa mesma rua era sobreposto o tráfico geral e os movimentos gerados pelos

núcleos de vivendas, GAVINELLI, Corrado, Ciudad y territorio en China, op.cit., p. 217 160 Este processo “reflecte-se especificamente, na distribuição dos espaços comerciais em posições

vantajosas.”, Idem

Ruas interiores

Vias secundárias

Eixos principais

Fig.27 A cidade proibida, em Pequim, 1987.

Fig.28 A rua de uma bairro residencial em

Pequim, em 1980, e a mesma em 2004.

Fig.29 A cidade proibida em Pequim. O processo de emboîtement.

Fig.30 Um fragmento do espaço urbano de

Pequim (1080). Processo de emboitements.

Page 67: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

63

simultâneo, através da função destas vias, definiram as diferentes escalas da grelha

segundo o processo de emboîtement (a casa dentro do bairro, e este dentro da

cidade).

Igualmente em Xangai, o esquema viário seguia esse processo, uma vez que o

sistema hierárquico de circulação das ruas interiores do bairro (Lilong) era

reproduzido à escala do quarteirão e depois à escala da cidade, cuja escala mais

privada se inseria na escala mais pública. Observemos as plantas, fig.31 a 33, em

confronto com a planta de Pequim.

Este princípio hierárquico permitiu, à escala do Lilong, distribuir a circulação e o

comércio de forma equilibrada, assim como assegurar o conforto, a sociabilidade e

a segurança da vida doméstica nas ruas internas. Adicionalmente, na escala da

cidade, evitaram-se os engarrafamentos e potenciou-se a comunicação e

distribuição da habitação, do comércio, do trabalho e do lazer.

Desta forma, a configuração do espaço urbano como expressão formal de

umas concepções práticas relacionadas com o sentido de organização e de

utilização típico da cultura chinesa (emboîtement), permitiu que o espaço urbano

chinês fosse de fácil cognição e memorização.

Mesmo a morada de qualquer Lilong seguia a mesma apreensão do espaço

urbano: em primeiro vinha o nome do Lilong que evocava uma comunidade de um

certo número de habitantes que se subdividia em li “este” ou li “oeste”,

correspondente aos dois conjuntos de casa em banda; em segundo, vinham as

ruas secundárias anunciadas segundo o nosso alfabeto, e, por último, aparecia o

número da porta, que correspondia à unidade mais íntima.161

Em suma, tanto na cidade típica chinesa como em Xangai, existe uma

correlação entre a articulação do local (Lilong) com o todo indiferenciado (a cidade)

uma vez que ambos estavam compostos por elementos individuais governados por

uma ordem hierárquica na qual os elementos grandes rodeavam os mais

pequenos. Deste modo, o padrão da grelha chinesa soube ser vantajoso, uma vez

que segundo Kevin Lynch: “o padrão de grelha é bastante útil, se o desenho

conseguir manter a escala em mente e souber como variar uma grelha, de modo a

corresponder a um carácter especial ”162.

161 GED, Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, op. cit., p.138 162 LYNCH, Kevin, A boa forma da cidade, trad. Jorge Manuel Costa Almeida e Pinho, Lisboa,

Edições 70, 1999, p.354

Fig.31 As linhas em vermelho correspondem

aos eixos principais de circulação criados pelos ocidentais na cidade de Xangai.

Fig.32 As linhas amarelas correspondem às

avenidas comerciais. As azuis às ruas secundárias de comunicação aos Lilongs. E as

verdes correspondem ao sistema hierárquico das ruas interiores do Lilong.

Fig.33 O respectivo sistema de ruas internas

dos Lilongs acima referidos.

Page 68: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

64

Planta de cobertura do “novo tipo Lilong”, Jin Gu Cun (1929)

Page 69: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

65

IV. O LILONG E OS “MAT-BUILDING”

CONTEMPORÂNEOS

Com a crise da relação entre a casa e a rua, objecto de progressivo antagonismo,

os modernistas construíram um pensamento mais abrangente e inclusivo sobre a

vida urbana, que começou a ser exposto nos últimos dois CIAM (Congressos

Internacionais de Arquitectura Moderna, realizados entre 1928 e 1956), a criticas

metodológicas no campo da habitação e do urbanismo. Esses congressos serviam

para a difusão da arquitectura moderna internacional que, tinha começado logo

após as vanguardas.

Durante os dois últimos CIAM, o de 1953 em Aix-en-Provence (França) e o de

1956 em Dubrovnik (Lugoslavia), estruturou-se o seu “desaparecimento” e uma

certa continuidade para um grupo que se distingue entre outras expressões, o

Team 10. Este grupo, constituído por ideias individuais das quatro equipas mais

destacadas (Jacob B. Bakema, George Candilis, Alison e Peter Smithson, de Aldo

van Eyck), opôs-se ao formalismo da Carta de Atenas como também à nova

monumentalidade163 (ambos lançados pelos modernistas do CIAM), em favor, da

introdução dos conceitos de identidade, de modelo de associação, de vizinhança,

entre outras ideias no tema do habitar.164

Contudo, tanto a ideia de monumentalidade dos modernistas como as ideias do

Team10 reintroduziam na arquitectura, a experiência da “comunidade”, mas de

forma diferente. Enquanto, que a primeira, pretendia criar símbolos de essa

comunidade dentro de um marco urbano que evocasse a nação, através da

decomposição da vida urbana (habitação, circulação e actividades públicas) em

partes separadas165, o Team10, queria unificar esses três elementos separados

numa arquitectura que fosse a expressão da comunidade. Ou seja, o Team10

procurava uma linguagem primária em que a forma física e a necessidade social e

163 Esta ideia entrou em debate pela nova geração dos modernistas, na década de 1930, os quais, e

sobretudo Sigfried Giedon defendia no seu livro “A necessidade de uma nova monumentalidade”,

centrada nos centros cívicos que simbolizavam a ideia de “comunidade” pelas suas conotações

nacionais, ex: de Chandigarh de Le Corbusier (1951-1963). COLQUHOUN, Alan, La arquitectura

moderna, una historia desapasionada, Editorial Gustavo Gili, SA, 2005, p.218 164 MONTANER, Josep Maria, Depois do movimento moderno, Arquitectura da segunda metade do

século XX, Editorial Gustavo Gili, SL, 1ª edição, 2ª impressão, 2007 op.cit, p.30 165 O marco urbano correspondente aos centros cívicos concebidos pelos modernistas, tal como o

de Saint-Dié (1946) de Le Corbusier, apenas representava uma parte da vida urbana (relações

públicas), o resto (habitação, circulação, etc) tinham outros espaços e arquitecturas. COLQUHOUN,

Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada,op.cit., p.218

O TEAM10 E OS MAT-BULDING

Page 70: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

66

psicológica das pessoas (o significado) fosse uma coisa só.166

O reconhecimento do grupo Team10 de que vivia numa realidade mutante e

passageira167, fez-lhe ver que a comunidade na cidade devia ser pensada no

âmbito da própria habitação. Se a validez da comunidade baseia-se nas pautas da

vida, ou seja, nos “hábitos do organismo, modos de vida e relações com o que o

rodeia”168, o tipo de habitação, como elemento estruturante das relações humanas,

deve ser pensado num âmbito mais alargado, abrangendo as relações mais

imediatas relativas ao núcleo familiar com a comunidade.169

Portanto, a expressão formal da comunidade devia estabelecer as relações do

espaço existencial quotidiano (a habitação a circulação e as actividades públicas),

tal como acontecia nos pequenos povos vernaculares do passado, que, segundo

Aldo van Eyck formavam “uma entidade completa ou autónomo”170, devido à sua

dimensão humana, cultural e simbólica.171

Deste modo, os vários membros do Team 10 começaram a analisar, segundo

um estudo mais fenomenológico e existencialista, cada comunidade particular do

passado e o respectivo modelo de associação humana que, se relaciona com o

tipo de habitar, para encontrar novas estruturas urbanas.

No entanto, é com o texto do livro Urban Structuring (1967) de Alison e Peter

Smithson, de carácter mais doutrinário sobre o tema da comunidade, que propõe

uma proposta mais completa e ordenada das novas possibilidades da revisão

formal, que podiam aparecer nas intervenções urbanas. Entre os cinco novos

conceitos urbanos introduzidos neste texto (associação, identidade, modelos de

crescimento, mobilidade e cluster172), o cluster foi o conceito mais representativo

do objectivo do Team10, porque era o que mais se aproximava da ideia de

estrutura formal.173

A palavra cluster, enquanto modelo de organização livre e sistemático

assimilável à ideia morfológica de cacho, permitia dar uma forma especifica de

habitar para cada situação particular: “Cluster, que serve para indicar um modelo

especifico de associação, foi introduzido para substituir grupos de conceitos como

166 Ibid. , p.213 167 Esta visão da realidade tinha como fonte de conhecimento a disciplina da antropologia que,

nesta época, teve um papel destacado no mundo cultural europeu. MONTANER Josep Maria,

Depois do movimento moderno, Arquitectura da segunda metade do século XX, op. cit., p.32 168 HEREU Pere, MONTANER Josep Maria, OLIVERAS Jordi, Textos de arquitectura de la

modernidad, op. cit., p.291 169 COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada, op.cit., p.219 170 EYCK Aldo van,”Commentaires sur un détour plein d’enseignement” in MARCHAND Bruno, La

multiplicité des tendances: Les années 1940,1950 e 1960, [2003], in

ltha.epfl.ch/enseignement_lth/theorie/polycopie_th5/chap_11.pdf (em 15/04/2008) 171 MONTANER Josep Maria, Depois do movimento moderno, Arquitectura da segunda metade do

século XX, op. cit., p.33 172 Ibid., p.291 173 Ibid., p.75

Fig.1 Urban Reidentification, Grelha CIAM 9, 1953, A e P. Smithson. Imagens da vida quotidiana.

Fig.2 Alison e Peter Smithsosn. O primeiro esboço de um “Cluster”,1952.

Page 71: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

67

“casa, rua, distrito, cidade” (subdivisões da comunidade) ou “quadras, povoados,

cidade” (entidades de grupos)”174.

Assim, para cada ”forma de associação existe um modelo inerente de

edifício”175 ou um modelo de reagrupamento formal. Intrínseca a esta ideia, a infra-

estrutura, desempenha um papel primordial na definição formal de um determinado

modelo de associação e respectiva comunidade.

Para os Smithson, a infra-estrutura para além de facilitar a formação

espontânea da comunidade, devia dar coerência à estrutura urbana, tal como

acontecia na organização clara do urbanismo chinês (estudado no capitulo

anterior), em que este resultava da expressão formal das relações humanas. “O

objectivo do urbanismo é a compreensão, ou seja, a claridade da sua

organização”176.

Neste sentido, para os Smithson tanto os sistemas viários como os de

comunicação deviam ser considerados como infra-estrutura urbana, no âmbito do

planeamento urbanista, de forma a definirem, através da inter-comunicação de

funções que aliciam, um determinado modelo de associação.177

Nos princípios da década de 1960, estas ideias desenvolveram-se em uma

série de projectos que experimentaram diferentes articulações entre a infra-

estrutura e os elementos programáticos, anunciando uma nova ordem que deu

origem ao termo “mat-building” (edifício tapete), identificado em 1974 por Alison

Smithson.178

Por exemplo, o grupo de Candilis, Josic e Woods, fizeram projectos em que a

infra-estrutura, a rede de comunicação, era fixa e o recheio, os distintos volumes

funcionais, era aleatório. Dessa forma, essas redes tinham traçados em forma de

árvore (os projectos de Touluse-le-Mirail o Caen Hérouville, ambos de 1961) ou de

reticula (como na Universidade de Berlim, de 1964-1979). Este último projecto,

segundo Alison Smithson, foi o precursor dos mat-building.179

Igualmente, o orfanato de Amesterdão (1957-1960), obra de Aldo van Eyck,

anterior aos outros projectos, seguiu o conceito da rede circulatória definidora, mas

neste caso, existia uma dialéctica entre as formas exteriores que se repetiam e os

espaços interiores (a infra-estrutura) que as acompanhava e serviam, criando assim,

segundo a terminologia de Van Eyck, “espaços intermédios” e “umbrais” através

dos quais comunicam os espaços privados e públicos.180

174 Ibid., p.75 175 Alison e Peter Smithson, Urban Structuring, [1967], in Ibid., p.76 176 SMITHSON, Alison, “Team X Primer”, [1972] in COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna,

una historia desapasionada,op.cit., p.219 177 Idem 178 COLL Jaime, “Mat-Building”, [1998], in

www.mansilla-tunon.com/circo/epoca3/pdf/1998_054.pdf (em 07/04/2008) 179 SMITHSON Alison, “How to recognize and read Mat-Building”, AD/9/74, in Ibid, p.2 180 COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada,op.cit., p.220

Fig.3 Georges Candilis, Alexis Josic e Shadrach Woods. Uma parte da Universidade

Livre de Berlim (1964-1979).

Fig.4 Orfanato Municipal de Amesterdão, Holanda (1957-1960). Planta do rés-do-chão. As circulações(amarelo).

Fig.5 Esboço de Le Corbusier, sobre o espaço urbano da cidade de Veneza, que se vai

diluindo na circulação interna do projecto do Hospital de Veneza (1964).

Page 72: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

68

Esta valorização da infra-estrutura como forma e suporte de edifícios com um

programa complexo, devido à sua qualidade como espaço de inter-relações,

também foi tida em conta no projecto do Hospital de Veneza (1964) de Le

Corbusier. Uma vez que este, nesta fase da sua carreira, aproximou-se às ideias de

renovação do Team10: a atenção posta na pessoa e no seu habitat.

Deste modo, Le Corbusier assentou o seu projecto sobre o mesmo suporte

horizontal que o da cidade tradicional, assumindo assim a escala tanto de edifício

como a de tecido urbano: unidades compostas por salas quadradas ao arredor de

um pátio (a casa-pátio introvertida) agrupadas numa grelha quadrada semelhante à

rede dos canais de água de Veneza.

No livro “How to recognise and read a mat-building” de Alison Smithson, este

tipo de edifícios “mat” consistia numa trama horizontal de elementos programáticos

e circulatórios num jogo de cheios e vazios estabilizados numa ordem geométrica

visível181.

Embora alguns arquitectos contemporâneos referem-se ao mat-building como

um tipo e edifício baixo, horizontal, pouco denso, constituído por uma repetição

sistemática de um elemento simples ou um módulo, definindo uma forma

homogénea como se de um tipo de edifício se tratasse, não é correcto. Um mat-

building corresponde a um processo que proporciona resultados semelhantes.

Esse processo baseia-se numa regra geométrica da rede como suporte e controlo

das definições de relações entre os espaços e a sua forma.

Nesta linha de pensamento, o Lilong podia ter sido referenciado por Alison,

quando esta recorreu a signos do passado e outras culturas que se identificassem

com “mat” (Katsura, Sinan, Honnan182, as construções abobadadas gregas, a

arquitectura árabe, a trama americana de Mies, Kasbah, entre outras). Uma vez que

o Lilong (1860-1930) utilizou a rede hierárquica de ruas como instrumento

articulador, na horizontal, dos diferentes programas da vida privada dos habitantes

com os da vida urbana da cidade (comércio, trabalho, lazer e circulação), assim

como também serviu de suporte formal do lilong como tipologia e forma urbana.

Também em Portugal, por exemplo no projecto da casa de Sesimbra

(1960,1966), os autores Nuno Teotónio Pereira e Nuno Portas utilizaram como

instrumento de suporte a diferentes realizações espaciais, a rede geométrica.

A rede espacial de controlo surge, neste laboratório das “concepções de

habitar”, como dispositivo de projecto e não como projecto em si, ou seja, a rede

geométrica não é afigurada como suporte geométrico da concepção ao projecto

181 SARKIS Hashim,Le Corbusier’s Venice and the Mat Building Revival, Prestel, Munich 2001, p.105 182 Esta cidade foi apresentada por Alison Smithson no catálogo da exposição de MOMA,

organizada por Rudofsky, “Architecture Without Architects” (1964), in COLL Jaime, “Mat-Building”,

[1998], op.cit., p.4

Fig.6 Hospital de Veneza (1964). Planta terceira. Em amarelo estão as circulações e em

vermelho são os quartos (células).

Fig.7 Honnan, Shansi, Shensi y Kansu. Casas

escavadas no loess.

O LILONG E OS

MAT-BUILDING RESIDENCIAS

Fig.8 Esquema alusivo às funções que um quarteirão pode acarretar quando composto por vários lilongs (1939).

Page 73: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

69

(como acontecia com alguns projectos de Frank Lloyd Wright)183, mas sim, como

suporte a diferentes realizações espaciais que, segundo Nuno Portas, eram

capazes de satisfazerem os desejos dos habitantes daquela época.184

Sabemos hoje, que este compromisso entre a rede geométrica e as

necessidades espaciais do habitante pode ser revisto pela sua simplicidade, e que,

não corresponde à essência do projecto arquitectónico para tratar as questões

sociológicas. No entanto, através da rede geométrica do Lilong um chinês pode

reconhecer as funções específicas de cada espaço resultante dessa rede.

No Lilong a rede geométrica é composta, segundo um processo de

“emboîtement”, por vários muros artificiais quadrados que fecham outros tantos

correspondentes aos respectivos ambientes da casa, do quarteirão até chegar à

cidade. Este tipo de geometria composta por quadrados é intuitiva, assim como a

sua utilização, porque reflecte o pensamento chinês. Como disse Zang Liang: “O

quadrado não deve ser procurado numa relação geométrica directamente

observável pelo olhar mas sim pela intuição ”185. A sua utilização valoriza o espírito

chinês, e “a paisagem transforma-se em pensamento e sentimento. Uma evocação

da imaginação” 186.

Por exemplo, no Lilong “a borda comerciante que fecha o quarteirão

xangaiense será considerado como “exterior” por um habitante chinês mas

“interior” para um observador ocidental ”187.

A recorrência, pelos arquitectos, à regra geométrica da rede, relaciona-se com

a vontade destes em oferecer ambientes variados e estimulantes à vida social, de

responder à exigência dinâmica do programa do edifício, a vontade de integrar tudo

numa forma flexível que englobe o paisagismo e o urbanismo, etc.

Nesta linha de pensamento, Álvaro Siza utilizou a rede como suporte formal e

articulador de diferentes programas e ambientes no projecto de habitação social da

quinta da Malagueira (1977) em Évora, também considerado mat-building188. Neste

183 Wright utilizou frequentemente redes não ortogonais como suporte ao desenho das plantas e

para a concepção espacial de algumas das suas Usoniam Houses, como The Hanna House de

1936. SERGENT, John, Frank Lloyd Wright’s Usonian Houses: Designs for moderate cost one-family

homes, Whitney Design, Nova York,1984. 184 Nuno Portas refere na sua investigação que o objectivo do projecto era: “dar ambientes variados

e estimulantes à vida social da casa (...) assim como se pretendia expressar bem a individualidade

do mundo pessoal no que se convencionou chamar a zona íntima (...) e uma concepção aberta dos

serviços domésticos, evitando uma segregação de funções que, tendencialmente entrarão no

“campo” quotidiano dos membros do agregado familiar.” PORTAS, Nuno, “Habitação em

Sesimbra”, Arquitectura, 3ª série, nº92, Lisboa, 1966, p.115 185 ZHANG Liang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, op.cit., p.161 186 XIAOXIE Zheng, A propôs de la protection de la tradition, des caracteres et de la physionomie

stylistique de “Ville célebre d’histoire et de culture”, [1983] in Idem 187 GED, Françoise ,”Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, in op.cit. 188 Este projecto do arq. Álvaro Siza foi considerado mat-building no livro Le Corbusier’s Venice and

the Mat Building Revival de Hashim Sarkis.

Fig.9 A planta do projecto da casa de

Sesimbra (1960,1966).

Fig.10 Lillong Bao Kang Li: o processo de

emboîtement (do público (amarelo) ao mais privado (o castanho)).

Fig.11 Plano ideal da cidade no Kaogong ji,

restituído por He Yeju 1985; Representações

do “Base quadrada”, Sanli tu de Nie Chongyi, século XVI.

Page 74: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

70

projecto a rede é representada segundo dois traçados que se sobrepõem, a rede

de ruas e a dos aquedutos.

Como o projecto tinha que responder à extensão do bairro Santa Maria e a uma

série de encargos ligados à politica da habitação de regime progressista em

Portugal, o arquitecto concebeu um sistema de ruas que agrupasse os edifícios

colectivos e as casas-pátio como reflexo de um grupo social189, enquanto que os

aquedutos frisaram as directrizes desta rede, ao funcionarem como condutas de

infra-estruturas de água e electricidade.190

Desta forma, as ruas assumiram diferentes larguras, e, as que distribuíam as

casas foram desenhadas sem passeio e estacionamento para proporcionar

diferentes ambientes a escalas distintas de forma a controlar, o público e o privado,

e garantir a identidade de bairro.

É interessante referir que também este projecto estabeleceu pontes entre o

passado, a presença árabe na cidade de Évora (as casa-pátio e o aqueduto), com

o moderno (as chaminés, a função do aqueduto).

Segundo Alan Colquhoun, para a classe de ideias urbanas que exploraram o

Team10, existiam dois modelos conceptuais, que deram origem aos “mat-building”.

Um deles corresponde aos projectos, até agora referidos, baseadas no conceito de

“comunidade”, e o outro modelo, corresponde à “teoria dos sistemas” desenvolvido

desde a II Guerra mundial com as ciências humanas.

Esta teoria aplicava o princípio comum da auto-regulação às máquinas, à

psicologia e à sociedade, ou seja, a todos os conjuntos “organizados”.191 Os

edifícios entendidos como sistemas podiam potencialmente se auto-regular, uma

vez que, segundo Alan Colquhoun: “É o utilizador que desempenha um papel activo

no edifício, logo o papel do arquitecto é mais fornecer a estrutura que permita ao

utilizador de escolher o seu próprio comportamento ”192.

Assim, tínhamos o primeiro modelo de edifícios que estabelecia pontes entre o

moderno e o vernacular, porque olhava para trás, à “integridade” perdida das

comunidades e culturas de base artesanal.193 E, “(...) o segundo olhava para a

189 Para tal, foram desenvolvidas tipologias com pátios com um muro mais alto para privilegiar a

íntimidade dos estratos sociais mais elevados que identificavam a Malagueira às casas antigas de

Évora, como se fizeram casas com pátios com muros mais baixos para os habitantes de cultura

mais popular. MATO Gisela, “Siza Vieira em Évora: revistar uma experimentação, Cidades.

Comunidades e Territórios”, [2004], in http://jeanmichelleger.free.fr/choses-ecrites/detail.php?id=86

(em 28/07/2008) 190 A existência do aqueduto era completamente simbólica neste território de grande presença

árabe. MONEO, Rafael, Inquietud teórica y estrategia proyectual: en la obra de ocho arquitectos

contemporâneos, Actar,Barcelona, 2004, p.232 191 Esta teoria fundamentava-se na crença de que a tecnologia instrumental substituía, portanto,

todas as outras tendências. Idem 192 COLQUHOUN, Alan, “Centraal Beheer”, [1974], in TAYLOR, Brian Brace, La modernité critique

autour du CIAM 9 d’Aix en Provence, editions imbernon, Marseille, 2006, p.188 193 COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada, op.cit., p.221

Fig.12 Habitação social da quinta da Malagueira (1977) em Évora. A mancha

homogénea composta por casas-pátio com muros mais altos que outros.

Fig.13 Planta geral da implantação do projecto

da quinta da Malagueira.

Fig.14 Esquema do traçado do aqueduto que

“irrigavam” as 1200 casas do Bairro da Malagueira em Évora, desenhado por Álvaro Siza.

Fig.15 Uma das ruas (sem passeio) da quinta

da Malagueira.

Page 75: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

71

frente, a um mundo capitalista de estruturas abertas das quais a democracia, o

individualismo, a mercantilização e o espírito consumista não se viam

obstaculizados por nenhum conjunto de códigos culturais estabelecidos a

“priori””194.

Dentro deste segundo modelo de edifícios situam-se alguns mat-building

contemporâneos de autores como Rem Koolhaas e Kasuyo Sejma que defendem a

arquitectura como fundamento essencial na formação de uma cultura urbana

produtiva, segundo a leitura da cidade como fragmento. Como disse Rem

Koolhaas:

“É interessante deixar de entender a cidade como um tecido, para concebê-la

como uma coexistência, um conjunto de relações entre diferentes objectos que

quase nunca se articulam visual ou formalmente, que já não ficam agarradas em

conexões arquitectónicas. Para mim, é um passo decisivo. Mas se chegarmos à

conclusão de que a conexão já não é algo necessário, estamos, de certo modo,

dinamizando o alicerce da nossa existência profissional. Se o planeamento já não é

algo necessário, ou tornou-se algo irrelevante... Para que planificar?”195.

Por isso, é que hoje os mat-building encontram-se em forma de mega centros

comerciais, terminais aéreos, museus, edifícios de habitação que cada vez mais se

apresentam como um “espaço multi-activo e inter-activo”196, e, outros edifícios, de

extensão horizontal ilimitado a uma escala urbana, redefinindo a fronteira do que é

cidade e edifício, público e privado, estrutura e infra-estrutura e, sobretudo,

desafiando a separação disciplinar entre arquitectura e urbanismo.197

O conjunto residencial “Nexus World de Fukuoka”198 no Japão (1991) do

arquitecto Rem Koolhaas, inscrito sobre uma trama horizontal composta por três

bandas de habitação e de passagens de circulação, corresponde a este segundo

modelo de estruturas urbanas.

Trata-se de uma proposta de projecto urbano ligado à problemática

habitacional que, ao contrário do Lilong, do Hospital de Veneza e do Bairro da

Malagueira, recusa e afasta-se da tipologia dominante na cidade, inserindo-se no

meio urbano com capacidade de se sustentar (como forma e ideia) pelo seu próprio

sistema.

No entanto, este projecto utiliza a infra-estrutura (as passagens de carácter

semi-público) como instrumento articulador, da unidade habitacional introvertida199

(no primeiro e segundo andar), do estacionamento e de alguns serviços públicos no

194 Idem 195 OMA,Rem Koolhaas, revista “El Croquis” nº 53, Madrid 1992, p. 21-22 196 GAUSA, Manuel, “The Metapolis Dictionary of Advanced Architecture: City, Technology and

society in teh Information Age”[2003], in arq.a, Habitar Colectivo, nº57, Maio 2008, p.11 197 SARKIS Hashim, Le Corbusier’s Venice and the Mat Building Revival, op.cit., 198 Este projecto residencial “Nexus Housing” faz parte de um plano urbanístico denominado “Nexus

World”, desenvolvido pelo arquitecto Arata Isozaki para a cidade de Fukuoka, no Japão. 199 A utilização da casa-pátio revela um respeito pela cultura nipónica

Fig.16 O conjunto residencial “Nexus World de

Fukuoka” (1991). Planta do rés-do-chão e a planta tipo.

Fig.17 Cortes longitudinais. O primeiro passa pelas rampas de acesso e o outro passa pelo

pátio com pé-direito mais alto.

Fig.18 Conjunto residencial Nexus World de Fukuoka, Japão, 1991, de Rem Koolhaas.

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72

rés-do-chão. Contudo, o modelo de associação entre habitação, circulação e as

actividades públicas é diferente aos anteriores, devido à concepção do “vazio”

neste sistema.

Neste edifício o vazio, correspondente aos pátios e aos poços de luz, foi

concebido como parte substancial ao projecto, consolidando uma identidade

especifica, individual e fragmentária.

Num mat, ou seja, num tapete ou num tecido: “Os vazios, os poros das

estruturas radiculares dos mat-building não são simples pátios, os projectos não

giram em torno deles. Os vazios são parte inerente deles como o poro o é de uma

esponja ”200 Uma vez que, é segundo o tamanho e a forma dos vazios que o tecido

consegue estender-se e adaptar-se a outras formas e fundo, como é o caso do

Hospital de Veneza e do Lilong que, juntamente com o tecido da cidade,

constituem um todo continuo.

A consideração do vazio como espaço substancial ao projecto permitiu garantir

a identidade do Lilong, uma vez que, independentemente da condicionante da

forma e do tamanho da parcela e dos estilos ocidentais, as ruas e os pátios

adaptaram-se sem perder a sua entidade positiva como espaços de transição e de

interacção social. Assim tínhamos um padrão espacial básico que consistia numa

relação de estrutura cheio e vazio e numa produção urbana integrada que deu

consistência e unidade ao interior do Lilong.

Igualmente, a “tipologia de baixa altura” concebida por Kasuyo Sejima para o

seu mencionado “Estudo de habitações metropolitanas”201 (1996), assimilou a

diversidade como proposta e organizou-se em um conteúdo intrínseco, insinuando

as recentes e complexas necessidades urbanas do mundo contemporâneo. Para

tal, recorreu aos seguintes vazios: os pátios das unidades introspectivas, as ruas

respectivas de serviço, a rua aleatória de circulação e o espaço público circular.

O facto, de ainda hoje, assistirmos a fenómenos da sociedade dessa época,

como a “paisagem da borda da estrada, a mecanização dos objectos quotidianos,

a cultura do consumo” 202; assim como a riqueza dos pensamentos contrastados:

“o regresso efémero da monumentalidade e do humanismo, a afirmação dos

regionalismos e a influência do vernacular, a reconsideração do funcionalismo de

entre as duas guerras, a multidão de tendências e de expressões poéticas

pessoais.”203, explica essa continua recorrência aos mat-building como processo

no acto criativo de projectar.

Analisado que o mat-building, como processo, aborda temas actuais sobre a

arquitectura e a sociedade e que, segundo o livro Le Corbusier’s Venice and the

200 SOSA, José António, “Constructores de ambientes: del mat-building a la lava programática”, in

Quaderns d’Arquitecture i Urbanisme nº220, 1998, p.93 201 Kasuyo Sejma, Ryue Nishizawa , El Croquis nº99, Madrid, 2000, p.114-124 202 MARCHAND Bruno, La multiplicité des tendances: Les années 1940,1950 e 1960, op.cit. 203 Idem

Fig.19 As passagens no rés-do-chão e os poços de luz que continuam até ao ultimo andar.

Fig.20 O cheio e o vazio do Lilong.

Fig.21 O momento de tensão de algumas ruas secundárias do Lilong.

Fig.22 Estudo de habitações metropolitanas de baixa altura de Kasuyo Sejima (1996).

Planta da cobertura e a unidade casa-pátio.

Page 77: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

73

Mat Building Revival, existem projectos mat de habitação urbana contemporânea

que apresentam princípios ordenadores de projecto semelhante aos do Lilong,

podemos constatar que o Lilong ganhou credibilidade como estrutura conceptual,

de referência à projecção de novas residências contemporâneas.

Essa semelhança entre projectos acontece, visto que a arquitectura é uma

actividade criativa que necessita de referências para a estruturação do seu

projecto, para além das condições sociais que podem ser semelhantes. Como

disse Marti Aris: “As obras de arquitectura remetem umas a outras e num jogo de

correspondências funda-se a noção de tipo. Mas o tipo não se identifica com

nenhuma das materializações mas sim com o principio lógico que as engloba.”204.

Deste modo, o mat-building corresponde ao tipo que une o Lilong aos outros

projectos mat de habitação contemporâneos, aqui mencionados e seguramente a

outros que não foram aqui estudados.

O que é importante salientar, neste capítulo, é que a residência plurifamiliar

contemporânea preocupa-se, cada vez mais, em promover a vida urbana, e, que o

Lilong, apesar de pertencer a outro tempo e a outra cultura, também conseguiu

dinamizar a vida urbana dos seus habitantes, porque utilizou um sistema que deu

resposta às necessidades da vida urbana dos seus residentes, garantindo uma

autonomia de funcionamento em relação ao exterior, como uma unidade urbana.

Tanto o Lilong como os outros projectos contemporâneos, ainda continuam a

ser uma tendência e uma referência, porque utilizaram um sistema que lhes

permitiu adaptar-se à realidade passageira, mutante e consumista que vivemos

hoje. Esse sistema consiste, portanto, numa rede geométrica de infra-estruturas

(ruas ou passagens) que proporciona múltiplas combinações entre o módulo

habitacional e os diversos mutáveis elementos programáticos do edifício (ginásio,

supermercado, café, etc).

Esses edifícios utilizaram como módulo, a casa-pátio porque permitia articular,

através do vazio, os vários elementos programáticos deste tipo de sistema e

porque como tipologia é muito bem sucedida por todo o tipo de classe social,

como podemos observar neste capítulo.

Igualmente Manuel Gausa apoia este tipo sistema de edifícios, que continuará a

ser abordado no capítulo seguinte: “(...) perante a indeterminação e a mutabilidade

da cidade contemporânea mais receptiva, pelo contrario, a mecanismos abertos

com capacidade de evolução e perturbação. A substituição no projecto

contemporâneo, da ideia fechada de composição (definição exacta e desenhada

das partes) pela de sistema (mecanismo “aberto” o ideograma vector susceptível

de proporcionar múltiplas combinações e manifestações formais diversas) constitui,

de facto, um dos maiores exponentes de mudança de paradigmas que caracteriza

hoje a disciplina”205 .

204 MARTÍ ARIS, Carlos, Las variaciones de la identidad, Ed. Serbal, op. cit., p.186 205 GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, Actar Barcelona, Gustavo Gil, 2002, p.11

Fig.23 Tecido em fibras mistas. Imagem alusiva aos mat-building.

Fig.24 Metodologia do SAR (Instituto de pesquisa arquitectural oficialmente fundada em 1964 por oito agências de arquitectura

apoiadas pela Ordem dos arquitectos, em Eindhoven (cidade neerlandesa)). Aldo van Eyc também participou neste instituto.

Page 78: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

74

Representação do modo de habitar no nº94 do Lilong (Taian Li (1917-33)) em 1988

Page 79: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

75

V. O LILONG E O HABITAR CONTEMPORÂNEO

O desejo de modernizar e a novidade ocidental são hoje, mais do que nunca, os

desejos de uma cidade, que luta em ser “a gigantesca potência emergente” da

Ásia. Desde a abertura da China ao mercado internacional, o aumento da produção

interior bruta e da exportação fez com que o nível geral de vida dos Xangaienses

não deixasse de melhorar e os modos da estruturação social e as práticas

territoriais dos indivíduos tendessem para uma emancipação das mobilidades.206

O trabalho salarial, que antes era controlado pelo Estado e pelo partido,

permitiu ao indivíduo autonomizar-se e valorizar certos aspectos essenciais em

termos de acesso ao consumo: a propriedade privada, banida por Mao, tornou-se

num sinal de distinção social; o aumento da presença das novas tecnologias no

espaço da casa; a multiplicação de lugares de consumo (restaurantes, centros

comerciais, etc) 207; o aumento da renovação e o rejuvenescimento das elites208

consequente do acréscimo de indivíduos com imensos diplomas e estudos no

estrangeiro e das crianças que estudam nas melhores escolas privadas; assim

como ter carro próprio foi associado na publicidade à riqueza e ao poder.209

Esta tendência da sociedade xangaiense à individualização global não se

relaciona apenas com a crescente subida da qualidade de vida dos indivíduos.

Questões como a política de um único filho com preferência a um menino (aumento

dos abortos); a instauração de uma idade mínima para os candidatos ao

casamento (23 anos mulheres, e 22 homens); a não completa emancipação da

mulher, visto que não pode adquirir cargos importantes devido à licença de parto; o

aumento do divórcio; os filhos que “abandonam” a casa cedo para irem viver para o

“campus” universitário, fez com que se preveja uma sociedade xangaiense cada

vez mais idosa, com mais homens do que mulheres e que os valores tradicionais

familiares como “as quatro gerações sobre o mesmo tecto” desapareçam em favor

do filho único, da individualidade.210

No entanto, em paralelo a esses grupos individuais mais ocidentalizados, estão

as famílias tradicionais migratórias, fenómeno consequente do êxodo rural

206 Revue d’ Urbanisme: Villes chinoises en mouvement, nº341, mars, avril 2005, 207 Idem 208 A meio de 1990, apareceu no pais comunista a “classe média” (10 a 15% da população), relativa

aos derigentes e aos quadros superiores de empresas privadas ou do Estado, técnicos qualificados,

ricos individuais, etc. CYRILLE J., JAVARY D. e WANG Alain, La Chine nouvelle, op.cit., p.47 209 Ibid., p.49 210 Ibid., p.50-67

Page 80: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

76

(procuram as grandes cidades pela oferta de trabalho), que vieram marcar as

diferenças culturais e a segregação sócio-espacial. 211

Contudo, apesar das diferenças entre a sociedade xangaiense e a do ocidente,

devido a questões políticas, culturais e sociais, ambas tendem à individualização

global e à diversidade influenciada pelas novas tecnologias informáticas e

telemáticas, e os média na vida laboral e doméstica.

Desse modo, pretende-se retirar e questionar o papel das premissas que

descrevem o Lilong na definição do espaço doméstico segundo as transformações

sociais, culturais, tecnológicas que definem o habitar ocidental de tendência global,

implícita também no sistema mat-building, como a individualidade, a casa cidade e

a flexibilidade.

A INDIVIDUALIDADE

A necessidade de um habitar confortável e seguro sempre acompanhou a evolução

da civilização humana desde os pequenos povoamentos até às cidades de hoje. A

habitação, para além de ter sido o tema nuclear da arquitectura, representa o mais

paradigmático instrumento arquitectónico na formação do indivíduo.

Qualquer casa, como espaço vazio, solicita um hábito que é por nós

determinado segundo a disposição dos nossos bens pessoais e íntimos que, com

o tempo, convertem o espaço vazio num lugar íntimo e pleno de identidade. É

assim, que através do hábito do habitante, se define a habitação. “A dimensão do

domínio que possui o habitar é também e antes de mais domínio de si, e por isso é

domínio moral, ethos. A única forma de deter-se é ocupar um lugar. E isto é

habitar”212.

No entanto, essa relação entre o habitante e a casa é feita porque o indivíduo

necessita de um refúgio do ambiente social, de um ambiente privado e íntimo

essencial para a sua relação consigo e com o mundo213, ou seja, para a formação

do seu carácter que depende desse balanceamento entre a sua intimidade e o

exterior. Desta forma, a intimidade correspondente à esfera privada depende do

exterior, da esfera pública, e é, segundo estas duas esferas, que se define a

intimidade individual.

Mesmo que se alterem as necessidades espaciais, aumentem as exigências de

conforto e qualidade do espaço doméstico, a verdadeira essência da casa está em

oferecer um espaço de conforto que garanta um ambiente de privacidade e

intimidade, essencial à formação do carácter do indivíduo.

Numa época em que a sociedade global aspira a uma identidade singular e em

que a recuperação da memória individual, quer da cidade ou da casa, assume um

211 Revue d’ Urbanisme: Villes chinoises en mouvement, op.cit. 212 BERLANGA José Luís Villacañas, “La Casa, el sujeto”, in “Acerca de la Casa 2”, Sevilha, 1998,

p.230-231 213 MÉLICH Glória, Lo intimo, in Quaderns n.º226, Barcelona, Julho 2000.

Fig.1 Publicidade gigante para as malas de Louis Vuitton (Xangai).

Fig.2 Fotografia de Hu Yang, em Living in

Shanghai (2005).

Fig.3 Esta imagem é alusiva ao tema: Individual/Diverso. Les locataires, fotografia de

Robert Doisneau, 1962.

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77

valor essencial, é urgente interrogarmo-nos sobre as casas urbanas apoiadas nos

últimos parâmetros de habitação aliados ao sentido comercial standard (T1, T2, T3,

T4, etc), uma vez que o problema de hoje não está nas massas,214 mas sim no

indivíduo. Os hábitos que anteriormente se realizavam em conjunto e em partilha

com a família passaram a uma coabitação susceptível de favorecer a

independência tanto de acções e comportamentos diversos como de necessidades

individuais mudadas. “À cultura do igual sucede-se a cultura do diferente. Cada

pessoa é um mundo. Cada casa215 é um mundo”216.

Este generalizado colapso de todo o estereótipo residencial foi analisado por

Roger Diener, no seu livro Fenêtres habitées, através de uns estudos/desenhos às

residências do centro da cidade que apresentavam uma multiplicidade de modos

de vida face aos apartamentos igualmente repetidos.217

A consciência individual, presente na organização do espaço, à qual se apropria

o habitante revela uma realidade em que a individualização, defendida há sete

décadas por Mies Van der Rohe, prevalece sobre a maximização lançada pelos

arquitectos funcionalistas que, infelizmente, continua presente nas cidades de um

modo geral.

Deste modo, o conjunto de casas-pátio (1931-1938) de Mies Van der Rohe,

apresenta hoje um legado de avanços no estudo da habitação. Desenvolvido como

um projecto de investigação218, durante oito anos, sobre a questão da tipologia

residencial, hoje aparece como referência em alguns livros como Le Corbusier’s

Venice and the Mat Building Revival, na qual é apresentado como um mat-building.

Influenciado pelo pensamento nietzsheziano anti-positivo219, Mies orientou o seu

trabalho de investigação na individualização das habitações unitárias através de

mecanismos topológicos (diferentes formas de implantação, diferentes proporções

dos terrenos, diferentes profundidades e orientação) que assentavam sobre um

sistema que, como constante da tipologia, agrupava as diferentes variantes de ha-

214 A repetição sistemática dos espaços como dos apartamentos, lançados na corrente do

funcionalismo nos quais deviam ser todos iguais para umas quantas pessoas, tinham a finalidade de

permitir um nível de qualidade de vida mínimo. Ibid., p.326 215 A casa corresponde ao espaço lar e não ao edifício. GAUSA, Manuel, diccionario metápolis de

arquitectura avanzada, op. cit., p.105 216 Ibid., p.326 217 GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, op.cit., p.21 218 Durante este processo de investigação, Mies estuda umas quantas casa-pátio como projectos

individualizados que estabelecem alguma correspondência com aguns princípios espaciais e

constructivos do Pavilhão de Barcelona, e é com a casa com três pátios (1934) que consegue um

projecto mais elaborado. ÀBALOS, Iñaki, A Boa-vida, Gustavo Gili, Barcelona, Gustavo Gili, 2000,

p.20 219 Defendia a individualidade do Homem. O homem libertado de qualquer vínculo, senhor de si

mesmo e dos outros, o homem desprezador de qualquer verdade estabelecida ou por estabelecer e

apto a se exprimir a vida, em todos os seus actos. pt.wikipedia.org/wiki/Friedrich_Nietzsche (em

16/08/2008)

Fig.4 Le Corbusier, Plan Obus (Argel, 1930). Perspectiva de los redents de Fort L’empereur

com habitações de diferentes tipos inseridas na estrutura.

Fig.5 Planta do conjunto de casas-pátio, Mies

van der Rohe (1938).

Page 82: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

78

bitar a casa mantendo a identidade individual.220

Esta escolha de trabalhar abstractamente a casa, renunciando aos estereótipos

da família convencional defendida pelo existenzminimum221 e segundo um sistema,

permitiu a construção de uma consciência individual que procura libertar-se dos

dogmas de uma sociedade ultrapassada e redutora, uma vez que o habitante

usufruía de um isolamento (casa-pátio) em relação ao exterior (cidade/metrópole).

Numa sociedade cosmopolita, heterogénea, diversificada e individualista como

a de Xangai, ou qualquer outra cidade do Ocidente, faz mais sentido que a

habitação seja pensada como um sistema que proporcione uma diversidade de

organizações individuais do espaço habitável e não com uma única variante de

casa. Como disse Ivar Ekeland, no seu livro Le Chaos (1995): “um sistema dinâmico

amplifica cada vez mais as diferenças particulares; faz aceder aos fenómenos

individuais à escala macroscópica e, de facto, é uma ampliação sucessiva destas

pequenas diferenças onde acaba encontrando-se o azar”222.

Daí a validade do sistema constante do Lilong nos tempos de hoje, uma vez

que, composto por uma rede de ruas hierárquicas conseguiu, ao longo da sua

história, agrupar as diferentes variantes de habitar a casa, uma em cada sistema ou

por vezes várias no mesmo sistema. A estas variantes juntavam-se as diferentes

unidades comerciais e serviços públicos, que vinham dinamizar o sistema. (fig.7)

Igualmente, o projecto da unidade de habitação de Marselha (1951) de Le

Corbusier apresentou um sistema constante correspondente a uma quadrícula que

servia as variantes relativas aos serviços autónomos e às unidades habitacionais, e

que no seu conjunto funcionava como uma unidade urbana auto-sustentável, tal

como o Lilong.223

Adaptando este sistema ao tema da individualidade: “a imagem hoje podia ser

uma folha quadriculada, cujos quadrados tinham elementos que pudessem

combinar, obtendo assim novos elementos. Certas dessas combinações são

casas”224. (fig.8)

Desse modo, a habitação urbana deveria ser pensada segundo um sistema

aberto a sucessivos acontecimentos, que proporcionasse um tipo de ordem mais

versátil podendo o habitante ter a liberdade de criar vínculos, domesticar,

materializar os seus sonhos. Impõe-se, portanto, uma nova vivenda pensada“desde

a diversidade e a individualidade, mais do que a homogeneidade e a

colectividade”225.

220 ÀBALOS, Iñaki, A Boa-vida, op.cit., p.22,23 221 Investigação sobre a habitação mínima, levada a cabo segundo os parâmetros funcionalistas:

optimização e produção em série. 222 GAUSA, Manuel, diccionario metápolis de arquitectura avanzada, op. cit., p.326 223 FRAMPTON, Kenneth. História crítica da Arquitetura Moderna. Martins Fontes, 1997, São Paulo,

p. 274. 224 MONTEYS Xavier, FUERTES Pere, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa,

Editorial Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.144 225 GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, op.cit. p.20

SISTEMA

Fig.6 Fotografia de Hu Yang, em Living in Shanghai (2005). Atente-se à “crock pots”, panela eléctrica. Num mesmo espaço temos a

sala, o quarto e a cozinha.

Fig.7 Lilong Yong Jia Xincu, 1930. Num mesmo sistema de ruas interiores, temos os modelos: apartamento borboleta e em linha.

Fig.8 A casa dispersa, montagem de X.M

Page 83: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

79

A CASA CIDADE

A partir da era pós-moderna, a casa passou a ser pensada para o homem pós-

humanista através de um novo conceito espaço-tempo entendido como estando

vinculado ao mundo de fluidos invisíveis de circulação de bens e informação,

dominados pelas tecnologias informáticas e telemáticas, e os média na vida laboral

e doméstica, que, antes eram organizados por concentração geográfica.

Esta integração dos fluídos a uma escala global tem a ver, por um lado, com:

“O sujeito já não é mais um produtor individual de significados, mas, sim, um

conglomerado heterogéneo, com perfis desvanecidos, um movimento, uma

entidade variável e dispersa, cuja verdadeira identidade e cujo verdadeiro lugar se

constituem nas práticas sociais, tal como Michael Hays descreveu no seu

”Modernism and the Posthuman Subject” (1992)”226. E, por outro, as noções de

espaço e de tempo mudaram, o tempo deixou de ser sequencial e repetitivo, uma

vez que perdeu uma cadência, ou seja, perdeu o seu papel maestro de acção para

fazer-se de desprendimentos.227

Esta realidade metafísica dinâmica que caracteriza a vida acelerada quotidiana

mudou a estrutura social tradicional (relação lugar, casa, família), assim como

dificultou a definição e separação entre o público e o privado, uma vez que as

actividades do espaço exterior foram importadas para o interior, devido à presença

das novas tecnologias no espaço da casa, potenciando-a como um local de

trabalho, de lazer e de comunicação (a importação do cinema para o interior de

casa, HI-FI, o telemóvel, etc).

Serviços interiores da casa, como cozinhar, lavar a roupa e secar, e até a sala

de estar como espaço de convívio e de lazer, também foram, em algumas

sociedades, providenciados para o exterior por instalações públicas em espaços

públicos, como as lojas de comida rápida, as lavandarias, os museus, os

“shoppings”228, os “Konbini”229,os cybercafé, etc.

Cada vez mais o indivíduo é visto como um potencial consumidor, e a sua

individualidade tende, como no Japão230, a ler-se através da sua relação com

objectos e bens de consumo.231 É como se as funções condensadas no edifício

226 ÁBALOS, Iñaki, A Boa-vida, op.cit., p.147 227 GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, op.cit., p.17 228 Em Xangai os Shoppings acompanham a velocidade de transformação da cidade, 24h sobre

24h, e normalmente localizam-se em pontos de cruzamento das estações de metro, com

autocarros, táxis e Parkings. Revue d’ Urbanisme: Villes chinoises en mouvement, op.cit., p. 6 229 “O Konbini é uma loja multifuncional que apoia os novos estilos de vida quotidiana dos

japoneses”, MOREIRA Inês e YOSHIMURA Yuji, “Práticas quotidianas aceleradas, ou onde vive

Kazuyo Sejima?”, in www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp206.asp (em17/08/2008) 230 Uma das sociedades que retrata este novo entendimento do tempo e das prácticas quotidianas

é a “Japonesa, que cada vez mais reflecte a sociedade à escala global. Lembremo-nos do sistema

efémero, portátil, flexível, modular destinado a uma cosmopolita mulher solteira que vive em Tóquio,

de Toyo Ito”. Idem 231 Idem

Fig.9 Trabalho e lazer.

Fig.10 Toyo Ito, Pão 1, alojamento para uma mulher nómada de Tóquio, 1985.

Fig.11 Estender a roupa na rua exterior ao Lilong (2007).

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80

casa tivessem sido distribuídas na horizontal com o intuito de converter a cidade

numa grande “casa dispersa” para um usuário nómada.232

Este sentido da cidade-casa deixou de ser um facto contemporâneo a partir do

momento que apareceu o sentido de colectividade e a presença da casa colectiva

no tecido urbano. As funções que antes estavam na casa, como as sagradas,

passaram para a cidade em forma da catedral, entre outras, porque as relações

que existiam entre essas funções e a casa podiam estabelecer-se à escala da

cidade, devido ao sentido de colectividade do espaço público233.

Esta tendência da cidade-casa acontece nas cidades como Paris, Tóquio, onde

a estrutura social piramidal falhou em favor de modelos horizontais e onde as

rotinas da vida quotidiana caíram numa situação de indiferença234 que levou os

habitantes a utilizarem o espaço público como espaço doméstico.

Por exemplo, em Paris, as ruas de cada arrondissement são utilizadas pelos

habitantes dessa zona como se fosse o “corredor” de casa, porque dispõe de

lavandarias, todo o tipo de comida preparada para levar para casa ou para comer

no sítio, cybercafés, entre outras funções, cada 20m. Por isso, viver nos

apartamentos pequenos de Paris, sem máquina de lavar roupa e uma cozinha

minúscula, acaba por não ser um problema se o habitante se habituar a este modo

de vida.

Em Xangai, apesar das segregações sociais, a rua continua a desempenhar um

papel fundamental para aqueles que consideram o espaço da cidade como parte

da sua casa, como por exemplo, os novos casais e jovens que por questões

económicas ou sociais vivem num espaço reduzido, seja ele apartamento ou o

quarto na casa dos pais. No Japão este tema foi analisado pelo jornalista Kyoichi

tsuzuki, o qual afirmou que: “Em definitivo, apenas a função do dormir ficou

agarrada ao compartimento como a cidade se tornou numa espécie de

apêndice”235.

Neste sentido, impõe-se redefinir o apartamento como os espaços intersticiais,

interiores e exteriores ao edifício plurifamiliar, com maior polifuncionalidade e

polivalência, uma vez que as tarefas domésticas e a ideia de casa são cada vez

mais diversas, assim como o indivíduo. A flexibilidade impõe-se.

232 GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, op.cit., p.19 233 RYKWERT, Joseph, "One way of thinking about a house", Lotus, nº8, Alfieri, Milão, 1974, p.192-

193 234 Este tipo de estrutura social corresponde a um mundo sem dimensões transcendentais, ao qual

os ingleses denominam por Superflatness, superplaneidade. É como se o espaço da cidade

correspondesse a um hotel superplano, in www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp206.asp 235 TSUZUKI Kyoichi, “Tokio style, ou vivre chez soi comme en ville”, in, Faire son nid dans la ville,

Archilab Japon Orleans, 2006, comissários: Akira Suzuki, Mariko Terada, p.32

Fig.12 Em todas as ruas encontra-se fast-food

chinês. Come-se na rua sentado ou caminhando. (2007).

Fig.13 A rua cozinha.

Fig.14 Ginásio nas ruas do Lilong.

Page 85: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

81

FLEXIBILIDADE

Autores como Gerard MacCreanor, quando se referem à flexibilidade como a algo

móvel, fazem questão de a definir segundo a sua diferença com a adaptabilidade,

uma vez que esta é associada à capacidade de mudança genérica: “Adaptabilidade

é uma forma diferente de compreender a flexibilidade. O edifício adaptável admite,

ao mesmo tempo, muitas funções diferentes e vai mais além da função. Permite

também a possibilidades de uma mudança de uso. Do viver ao trabalhar, do

trabalhar a actividades de distracção ou, até como contentor de vários usos

simultâneos.”236

No entanto, neste trabalho pretende-se entender a flexibilidade, no sentido lato

da palavra, como a capacidade que o espaço físico da área habitável possui em se

adaptar ao processo dinâmico do acto de habitar, materializando-se numa qualquer

disposição construtiva, formal ou tipológica que permita, assim, uma certa

diversidade e mudança nos modos de ocupação dos espaços.

A flexibilidade não se deve generalizar à multiplicidade de complexos

dispositivos móveis, manipuláveis e ajustáveis, uma vez que existem habitantes

que, não estando habituados a uma casa toda mecanizada, sentem a dificuldade

de domesticar o espaço. Contudo, é reconhecível a importância desses

dispositivos na organização espacial da habitação.

Uma outra forma de conseguir a flexibilidade espacial é através da

fragmentação do espaço, ou seja, introduzir um número de compartimentos

relacionados entre si e libertos do determinismo funcional, com que hoje em dia são

concebidos, sempre e contudo, deixando bem definida a posição do que é

permanente (cozinha, casa-de-banho e escadas) segundo um relacionamento

multifuncional com o conjunto do espaço habitável, de modo a albergar modos de

habitar contemporâneos não convencionais.

“Se as partes fixas, permanentes, se agrupam em núcleos de serviços e as partes

mutantes em divisões rígidas e com critérios de temporalidade, as mudanças que

sofra a unidade familiar ao longo do tempo serão resolvidas sem profundas e

custosas transformações. Na definição da vivenda, temos de fixar e agrupar

claramente o que é permanente e o que é efémero, o que é fixo e o que é

susceptível a ser mudado”237

Uns dos arquitectos contemporâneos que exploram bem esse tema é Kasuyo

Sejima e Ryue Nishizawa, uma vez que se interessam por combinar e recombinar

os espaços específicos de uma determinada dimensão através de espaços

indefinidos de transição, que não corredores, de carácter polivalente devido à sua

dimensão e relação com o conjunto. Por exemplo, o projecto Casa na China de

Ryue Nishizawa exemplifica muito bem o carácter desses espaços transitórios.

236 MACCREANOR, Gerard, “Adaptability”, in A+T n.º 12, 1998, p.40 237 ARANGUREN, Maria José e GALLEGOS José Gonzáles, “Habitar la caja”, [1999], in BÁRTOLO

Prata, Re-habitar a casa urbana do Porto, Faup, Porto, 2006/2007, p.54

Fig.15 Indeterminação espacial contemporânea (S. Gansell. House for nomads (1994)).

Fig.16 Diagrama conceptual do projecto a casa

na China, Tianjin (2003), de Ryue Nishizawa.

Fig.17 Maqueta da casa na China, Tianjin (2003), de Ryue Nishizawa.

Fig.18 Diagrama conceptual para a

configuração do número de unidades por apartamentos em Funabashi (2002/2004), no Japão de Ryue Nishizawa.

Page 86: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

82

Para Sejima, o importante não é propriamente a linguagem final que terá o

edifício, mas sim responder aos anseios sociais e psicológicos do habitante,

portanto ela organiza as condições funcionais do edifício segundo arquétipos

baseados em hábitos comuns num diagrama último do espaço, e imediatamente

converte esse esquema em realidade.238 Tanto para Sejima, como para Nishizawa,

a arquitectura segue uma lógica mais estratégica que figurativa: “uma planta muito

simples, mas na realidade muito complexa”; ”um edifício do qual não se sabe se é

temporal ou permanente”; “um edifício construído entendendo o comportamento

humano”239.

Por exemplo, no projecto Funabashi apartamentos (2002/2004) em Chiba, no

Japão, Nishizawa reduziu cada apartamento a uma casa-de-banho, uma cozinha e

um quarto enorme que podia funcionar tanto de quarto como de sala. Quando

funcionava apenas de quarto, era porque tinha uma posição mais reservada e uma

dimensão mais pequena (05), e quando tinha uma posição mais central e de

dimensões maiores, funcionava de quarto e sala (08). Deste modo, a flexibilidade

do apartamento 08 dependia das dimensões e da sua posição em relação ao

conjunto. (fig.18)

Igualmente, nos primeiros modelos do Lilong, o espaço que estava entre a

entrada principal e as escadas, por vezes foi utilizado como sala, quando apenas

vivia uma família, ou como quarto e sala, quando habitavam várias famílias.

A polivalência desses espaços do Lilong e do projecto Funabashi, deve-se ao

facto de terem sido concebidos como um vazio a conquistar, destinado à

habilitação, e também porque os compartimentos não foram minuciosamente

distribuídos. (fig.21)

No caso do Lilong, a flexibilidade dos espaços foi conseguida, por um lado,

através da posição permanente dos serviços (cozinha e escadas) que, associados à

segunda entrada, separavam o edifício unifamiliar em vários “apartamentos” na

horizontal e na vertical (por isso vivem várias famílias numa mesma casa) e, por

outro lado, a introdução das escadas a meio nível deu origem ao(s) quarto(s) de

aluguer que funcionavam como compartimento independente e polivalente. (fig.22)

Esta flexibilização na utilização do espaço do Lilong foi acrescida com a

existência de mais do que um acesso às casas. Esta variante é uma das poucas,

ainda hoje, pouco questionada na casa colectiva ocidental. “O número de acessos,

ou de portas interiores, a sua forma e uso, constituem uma rede de dispositivos

que é a expressão sofisticada da variedade de usos de uma casa”240.

238 Ambos libertavam-se da metodologia de interpretação dos programas com o intuito de criar um

espaço que apagasse esses programas estereotipados e que proporcionasse o encontro das

esferas pública e privada e a sua vaga vinculação, como se de um parque se tratasse. A monografia

Kasuyo Sejima e Ryue Nishizawa, El Croquis nº121 e 122, Madrid 2004, p.23 239 Kasuyo Sejima e Ryue Nishizawa, El Croquis nº99, Madrid 2000, p.336 240 MONTEYS Xavier, FUERTES Pere, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa, op.

cit., p.72

Fig.19 Projecto Funabashi, planta primeira. O apartamento 05 é o amarelo, o 08 é o vermelho, e 06 é o castanho. As cores mais

escuras do 05 e 08 correspondem aos quartos e o de 06 corresponde à sala. A iluminação dos compartimentos do “miolo” é feita pelos

pátios vazios. Ba:w.c., K:cozinha, G:jardim, V: vazio.

Fig.20 Os espaços habilitáveis. OMA. Vivendas

em Fukuoka(1991).

Fig.21 O número de quartos-sala, ou quartos que podiam existir num Lilong. Todos

dependentes da mesma cozinha colectiva. O verde e o laranja correspondem aos quartos de aluguer.

Fig.22 O “novo tipo Lilong” (1 jian e meio),

2007. A amplitude, a altura do pé-direito e a não predeterminação da função de cada compartimento dos primeiros lilong, permitiu a

polivalencia dos mesmos.

Page 87: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

83

Com a desintegração da família tradicional ocidental e oriental que originou

diversas unidades mono-elementares, mono-parentais, ou pluri-sociais, faz todo o

sentido a utilização de uma segunda porta, associada por exemplo, ao mundo

íntimo do indivíduo, o quarto: “Pensemos, por exemplo, nos filhos adultos que

convivem com os seus pais ou nas vivendas nas quais um dos usuários trabalha e

recebe em casa.

A segunda porta deve ajudar a que situações como estas não se convertam em

anomalias para o funcionamento da casa e permitam, ao mesmo tempo,

reincorporar este “apartamento” de novo à casa, no momento em que a casa é, em

definitivo, uma casa onde a flexibilidade foi entendida em términos distintos aos

habituais”241.

A existência de mais do que uma porta no interior da casa também é pertinente,

para a economia de meios. Por exemplo, em vez de se ter duas casas-de-banho

pode-se ter uma com duas portas, em que o uso fica determinado pela chave na

porta. (fig.24)

Em suma, o carácter inovador deve ser distinguido do formalmente novo,

colocando o centro da questão num processo de continuidade, de evolução

tipológica, mais do que no campo da invenção formal. A novidade do habitar deve

centrar-se na possibilidade dos elementos que constituem a configuração espacial

do objecto casa, de gerarem novas relações espaciais, novas formas de tratamento

dos espaços intersticiais, de transição, ou seja, dotar o espaço da casa de

capacidade de ser utilizado por diferentes pessoas, com distintas interpretações,

ou pelas mesmas pessoas com necessidades e usos variáveis, evitando assim a

excessiva especialização dos compartimentos. (fig.23)

Analisadas a actualidade da sociedade ocidental e xangaiense e as respectivas

formas do habitar, em comparação com algumas formas de pensar e de habitar a

casa ocidental consequentes de variadas investigações ao longo do século XX-XXI,

verificamos que certos princípios do Lilong continuam actuais e pertinentes na

concepção da habitação contemporânea:

- um sistema dinâmico que proporciona múltiplas combinações de casas

colectivas/unifamiliares, que poderiam ser todas diferentes no mesmo sistema, com

unidades de comércio, de lazer, entre outras, sem perder o seu carácter

homogéneo e respondendo às necessidades do homem actual heterogéneo e

consumista (a diversidade de actividades programáticas que pode oferecer este

tipo de sistemas), individual (quarto de aluguer) e nómada (casa-cidade).

- a capacidade em responder à fusão do espaço-tempo através da flexibilização

do espaço segundo disposições construtivas, formais e tipológicas (as duas

entradas, os meios níveis das escadas, e a posição estratégica das partes fixas da

casa em relação ao conjunto) permitiu uma certa diversidade e mudança nos

modos de ocupação dos espaços.

241 Ibid, p.74

Fig.23 Fotografia de Hu Yang, em Living in

Shanghai (2005). Fotografia de um quarto de

aluguer no Lilong.

Fig.24 Kuhn-Pfiffner. Edifícios de habitação em Lenzburg (1993-94). Repetição de unidades

funcionalmente indiferenciadas.

Fig.25 Charlotemburg-Nord de Hans Sharoun (1956-1961). Atente-se à porta de união dos dois apartamentos, esta é uma possibilidade para o filho independente solteiro ou casado, e

para o aluguer desse mesmo quarto. Este projecto também apresenta a possibilidade de reduzir o percurso em casa, através de duas

portas na casa-de-banho.

Page 88: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

84

Maquete do projecto “um lilong contemporâneo” (2006/2007) em Xangai, da autora.

Page 89: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

85

VI. UM CASO DE ESTUDO EM XANGAI:

“O LILONG CONTEMPORÂNEO”

Novos processos de urbanização, resultantes das profundas tendências da

globalização da economia, tecnologia e informatização das sociedades, têm se

sobreposto ao espaço físico dos lugares, a fim de produzir uma nova estrutura

urbana que caracteriza a nossa época. Xangai entre outras metrópoles do mundo,

é uma das cidades que afectada pela globalização242, está a sofrer uma forte e

rápida reestruturação urbana em função das necessidades e objectivos cada vez

menos, até diria, não exclusivos da sociedade local.

Embora esses processos pareçam literalmente como mais um ciclo sucessivo

de transformação e evolução das cidades243, no caso de algumas metrópoles

recentes, como Xangai, revela-se como um processo informal e incerto, em

desfasamento com a cidade actual.

Este desfasamento materializado em espaços descontínuos e heterogéneos foi

explicado por François Asher no seu ensaio Métapoles ou l’avenir des villes, como

resultado da nova relação entre “cidade-tempo” e “espaço da mobilidade” implícita

na recente dimensão multifacetada das metapolis. A aparição de grandes recintos

para o consumo, o espectáculo e o entretenimento constituíram o exemplo mais

claro dessa progressiva redução do tempo necessário entre o desejo e a

satisfação.244

Em Xangai, essa relação entre “cidade-tempo” inscreve-se num “antes” e num

“depois” em vez do desenrolar linear, no qual os espaços-tempo adoptam

características polimorfas visto que evocam uma multiplicidade de relações sociais

nas quais os Chineses estão inscritos e definidos em simultâneo. Por um lado,

temos os modos e alguns hábitos tradicionais que acompanham a cidade baixa

tradicional, e, por outro, temos a velocidade dos transportes e dos modos de vida

242 A globalização do sistema financeiro, dentro do que se denominou “capitalismo avançado”, é um

dos factores mais incertos e determinantes das novas organizações urbanas contemporâneas: nelas

o capital pode operar instantaneamente a escala global, resultando portanto cidades dinâmicas,

convertidas em pólos de atracção mais ou menos eficazes cujo êxito depende da capacidade e

qualidade de oferta de determinadas facilidades, que possibilitem, assim, o desenvolvimento da

actividade cultural e produtiva. GAUSA, Manuel, diccionario metápolis de arquitectura avanzada, op.

cit., p.258 243 Vários processos sócio-económicos simultâneos e tempos históricos distintos sempre

trabalharam sobre um espaço construído, destruído e construído em ciclos sucessivos de

transformação urbana. 244 GAUSA, Manuel, diccionario metápolis de arquitectura avanzada, op. cit., p.406

Fig.1 Efeitos da globalização em Xangai. Esta

cidade inglesa “Thames town” faz parte do projecto de nove cidades “temáticas” que

começaram a ser construídas ao redor da cidade de Xangai. Cada cidade deve representar um país e sua arquitectura tradicional, num mix de arquitecturas clássicas

e contemporâneas.

Fig.2 Pudong Xangai.

Fig.3 Passerelles no distrito de Luwan, Xangai

(2007).

Page 90: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

86

associados às passerelles e às grandes torres de escritórios e de habitação que se

sobrepõem à cidade tradicional desenhada pelo Lilong.

Esta discrepância tão grande entre tempo-espaço está a desaparecer devido à

demolição dos Lilong, que segundo o Estado não respondem à nova imagem das

cidades chinesas contemporâneas, consideradas por François Acher como a

““hipermodernidade”, cujo o sufixo “hyper” exprime ao mesmo tempo “exagerado”

e a estrutura hipertextual a n dimensões”245.

Deste modo, a recuperação da identidade de Xangai impõe-se: “Tal como as

pessoas, as sociedades e os povos possuem uma memória colectiva que constitui

parte essencial da sua identidade como grupo e cuja perda poderá causar graves

perturbações. Sabe-se que esta memória colectiva constitui um quadro de

referência fundamental para o equilíbrio psicológico necessário para reagir às

mudanças que constantemente se prefiguram nas nossas cidades”246.

Neste sentido, para a não perda da identidade de uma cidade, no momento do

processo de transformação e evolução das cidades, deve se manter uma estrutura

de cidade que nos permita fazer a passagem pelos diferentes períodos históricos,

sem que, durante esse processo, se perca a noção da memória colectiva

característica da ideia comum de cidade.

Para tal, a modernização de Xangai deveria ir ao encontro da descoberta das

suas raízes, do seu património. No entanto, o sentido de valorização da sua cultura

e história passa por “assegurar a continuidade identitária na planificação e

urbanismo”247, através da construção de uma réplica de monumento que possa

identificar-se com a forma da arquitectura clássica. Um dos exemplos é a extensão

dos edifícios do jardim Yu, que tem vindo a ser construídos, desde 1987248, com

materiais contemporâneos (betão) e adoptando programas ocidentais como o

McDonald’s, entre outros. Um caso semelhante ao do santuário de Naiku em Ise,

no Japão, este de maior dimensão.249

Embora o conceito chinês de património histórico tenha sido constituído a partir

do ocidente pelo arquitecto Liang Sicheng, o contexto da constituição da nação

chinesa impulsionou a sua ambiguidade, uma vez que a falsificação era legitimada

para fazer reaparecer os monumentos ou um património lendário. Esta atitude do

Estado, relacionada com a constituição da nação chinesa, revela uma interpretação

do património, segundo o tempo, diferente da do ocidente. Enquanto na China se

245 Revue d’ Urbanisme: Villes chinoises en mouvement, op.cit. 246 BARATA, Teresa, A cidade em Portugal: uma geografia urbana, 3ªed, Porto Afrontamento, 1992,

p. 388 247 ZHANG, Liang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles,op.cit., p.246. 248 CLÉMENT pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport de

recherches, op. cit., p.22 249 ITABASHI, Miki, A influência japonesa na arquitectura moderna ocidental: uma introdução, Prova

de Licenciatura em Arquitectura, FAUP, Porto 2006/2007, [Formato digital, CD], p.103

Fig.4 A sobreposição de duas realidades.

(2007).

Fig.5 Jardim Yu (no lado direito está o McDonald’s). Ano novo, Fevereiro 2007.

Fig.6 Liang Sicheng na Comissão para o projecto da ONU, New York, 1947. À esquerda, a terceira pessoa entre o Le

Corbusier e Óscar Niemeyer é Liang Sicheng.

Fig.7 Maquete de síntese da análise: a unidade.

Page 91: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

87

mistura o passado e o presente com o futuro, no ocidente a noção de património é

fruto da consciencialização do carácter irreversível do tempo250. Como disse Zhang

Liang “(...) a permanência da tradição não só resiste à razão histórica, como

também se apoia na tradição de construir, não sem uma confusão que persista até

hoje”251.

Apesar destes países em constante transformação, como a China e o Japão,

não valorizarem o seu património como uma mais valia para o seu desenvolvimento

urbano e arquitectónico, existe outra via que parece aceitável.

Dado que o Estado chinês procura dar um estatuto internacional às suas

cidades através de grandes nomes da arquitectura mundial252, fica à

responsabilidade do trabalho desses arquitectos, se ocidentais, com uma

perspectiva e sensibilidade diferente do património, poder recuperar as mais válidas

soluções que a cidade tradicional levanta, no sentido de dar continuidade à ideia

comum da cidade de Xangai.

Igualmente é de valorizar, que essas soluções tradicionais de outra cultura são

sempre uma referência valiosa para o enriquecimento do conhecimento e da

evolução do trabalho do arquitecto, tal como foi a arquitectura tradicional do Japão

para os arquitectos modernos como Frank LLoyd Wright253 e Bruno Taut, entre

outros.

E é, a estas questões que o exercício realizado na disciplina de projecto Ville et

Patrimoine en Asie sobre Xangai, na École Nationale Supérieure d'Architecture de

Paris-Belleville (ENSAPB) no ano lectivo 2006/2007, pretendeu dar resposta.

Embora o exercício tenha sido realizado em apenas três meses e antes da

viajem a Xangai, é interessante apresentá-lo, uma vez que resultou de uma análise

ao Lilong.

Tanto o exercício de análise como o projecto livre não apresentavam grandes

condicionantes, o que permitiu que, pela primeira vez, pudessem ser expressos, no

exercício prático, os meus pensamentos sobre a habitação urbana, formados

durante os meus quatro anos de aprendizagem na Faup, que, cruzados com os

conhecimentos adquiridos com o exercício de análise e a cultura japonesa (de

iniciativa privada), deram origem aos principais fios condutores deste projecto.

Igualmente, Álvaro Siza quis: “ (...) expor a minha visão da arquitectura a partir de

projectos que realizei, ou até somente imaginei, pois nesses se sedimentaram os

meus pensamentos”254.

250 COSTA, Alexandre Alves, “O património e o Futuro”, in trabalhos de antropologia e Etnologia,

vol.38, fasc. 3-4, Porto, 1998, p.111-112 251 ZHANG, Liang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles,op.cit., p.246 252 Revue d’ Urbanisme: Villes chinoises en mouvement, op.cit. 253 “Frank Lloyd Wright, conseguiu através do seu fascínio inicial pela gravura japonesa e depois pela

sua experiência vivida no Japão retirar ensinamentos e interpretar e adaptar de modo a recriá-los na

realidade ocidental, enriquecendo-a”, ITABASHI, Miki, A influência japonesa na arquitectura moderna

ocidental: uma introdução, op. cit., p. 67 254 SIZA Álvaro, Imaginar a evidência, Edições 70, Lisboa 1998, p.17

Fig.8 Croquis sobre o esquema do projecto.

Fig.9 Distribuição programática

Fig.10 A rua pedonal comercial que separa os dois volumes do projecto “o Lilong contemporâneo” da autora.

Fig.11 Rua N-S de principal acesso aos

apartamentos. Do lado direito está o limite comercial transparente para a rua pedonal que separa os dois volumes.

Page 92: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

88

Fig.12 Planta de implantação do projecto. Fig.13 A antiga cidade amuralhada de Xangai.

Fig.14 Planta do Rés-do-chão do projecto da autora: marcação em amarelo das cozinhas.

Page 93: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

89

O exercício da análise consistia em estudar a planta, o corte e duas fotos de

uma variante do Lilong, para no final, cada grupo apresentar segundo uma frase ou

palavra, o significado do mesmo. É importante frisar que a análise foi realizada

individualmente segundo as bibliografias dadas pelo professor xangaiense Zhang

Liang. No meu grupo, o lema do Lilong relacionava-se com o processo de

organização do espaço: a unidade dentro da unidade (emboîtement).

Em relação ao exercício prático, as únicas condicionantes dadas

correspondiam às condições topográficas e morfológicas do terreno, e o programa

era livre para que cada aluno pudesse materializar o referido significado segundo a

sua posição pessoal sobre o tema da habitação urbana.

O terreno a construir tinha uma área de cerca de 9000m2 e situava-se no

extremo norte da antiga cidade amuralhada de Xangai, entre o Jardim Yu, a Sul, e o

jardim contemporâneo Gu Chen, a este. Dado o terreno, o primeiro esboço do

projecto consistiu numa mancha homogénea densa de três andares, em

concordância com o tecido envolvente (Lilong), através do processo de

emboîtement e um sistema de ruas hierárquicas.

A intenção era produzir uma unidade urbana auto-suficiente, mas com um limite

multifuncional que atraísse os não habitantes, uma vez que estava ao lado de um

dos principais centros turísticos de Xangai, o jardim Yu. Deste modo, o terreno foi

dividido em duas unidades iguais por uma rua pedonal comercial, ambas limitadas

pela franja multifuncional de propriedade dos habitantes, já que na China os

habitantes mantêm o costume de viverem perto do local de trabalho255.

No interior de cada unidade, foi introduzido o referido sistema de ruas do Lilong

com um desenho diferente de forma a dinamizar um bairro residencial mais

ecológico, cuja circulação de veículos estava interdita. Visto que a bicicleta continua

e continuará a ser o veículo mais utilizado, por questões ambientais, e que as ruas

secundárias do lilong eram as mais dinâmicas e as mais sociáveis, desenharam-se

as ruas de principal acesso N-S mais estreitas e as ruas secundárias E-O mais

largas para dar lugar à sociabilização.

Deste modo, manteve-se na rua secundária, a entrada de serviço que dava

sobre uma cozinha colectiva, e na rua N-S estava a entrada de principal acesso aos

diversos apartamentos. No entanto, a rua secundária era definida em ambos os

lados pelas cozinhas colectivas para potenciar a sociabilização.

A cozinha colectiva, que funcionava para os apartamentos do primeiro piso, foi

pensada não só para dinamizar a rua, mas também para permitir o cruzamento dos

tecidos sociais nos espaços comuns (escadas e os hall comuns), uma vez que os

habitantes do último piso, que viviam em apartamentos completos, estavam

255 A cidade maoista conseguiu organizar a vida social ao redor das unidades de trabalho “danwei”,

uma carta de residência que fornecia emprego a vida, segurança social, alojamento, a fim de

controlar as mobilidades residenciais de trabalho e outras. No entanto, nas grandes cidades esta

carta tende a desaparecer devido ao salário laboral que antes não existia. Revue d’ Urbanisme: Villes

chinoises en mouvement, op.cit.

Fig.15 Tipologia A - área:41m2 (rés-do-chão) M.C.= monta cargas.

Fig.16 Tipologia B(38Mm) G(50m2).

Primeira planta)

Fig.17 Tipologia C(25m2) D(40m2). Primeira planta

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90

sujeitos a cruzarem-se com um grupo social jovem, do rés-do-chão e do primeiro

andar, habituado à flexibilidade dos horários laborais, às facilidades para comer

fora, ao aumento da preparação dos pratos preparados, congelados e serviços ao

domicílio, e à contínua valorização do acto de comer em conjunto. “O céu alimenta

o homem pelos cinco sopros. A terra alimenta o homem pelos cinco sabores.

Raros são os restaurantes que permitem acolher um convívio isolado.”256

Ao mesmo tempo, este tipo de organização respeitou a gradação vertical (do

público para o privado) que também acontece na habitação colectiva tradicional

ocidental, mas que se diferencia desta pelo facto de ter uma cozinha colectiva no

rés-do-chão aproximando-se, assim, à casa colectiva tradicional chinesa.

Observemos a habitação colectiva dos Hakka, tulou Zhencheng, na cidade de

Hukeng, a norte de Yongding,257 a ideia de espaço público chinês associada ao

espaço doméstico.

Na sequência de algumas alterações sociológicas analisadas no anterior

capítulo, de relacionamento do grupo familiar, de independência do indivíduo face à

estrutura familiar e o seu relacionamento com pessoas que não do grupo familiar no

interior e fora da sua célula privada, foram desenvolvidas onze tipologias acrescidas

do quarto de aluguer associado à entrada principal.

Cada dois apartamentos tinham um pátio em comum uma vez que o pátio na

China é utilizado como um espaço semi-privado para a realização do tai chi

(ginástica chinesa) das 5h, para a jardinagem e para as crianças brincarem em

segurança. Outra função primordial do pátio era criar um microclima de transição

entre as condições climáticas do exterior e o interior.

A possibilidade de se aceder ao pátio directamente pelos respectivos

apartamentos e pelo espaço colectivo das escadas, permitiu que aquele

funcionasse como mais um lugar de convívio reservado, a porta fechada.

Este tipo de organização espacial, também foi abordado no projecto de

habitação Funabashi, em Chiba de Ryue Nishizawa: “Estava interessado em

trabalhar com a individualidade através de produzir relações entre pessoas que

vivem no mesmo edifício. Em Tokio, os edifícios de vivendas estão normalmente

baseados na ideia de desconexão entre unidade, (...) “No entanto, ainda que seja

importante manter a privacidade, podia ser interessante que os arquitectos

relacionáramos sobre as consequências espaciais que podem ter, no facto de que

existem pessoas que escolham viver com outras pessoas que não conhecem.

Portanto tentarei de criar um sentimento de independência ao mesmo tempo que

suscitava uma relação entre habitantes”258.

256 LA CHINE, Regards sur le Monde, Sélection du Reader’s Digest, Primière Édiction, 2e tirage. 257 100 Merveilles de CHINE, Editions Grund, Paris, 2007, p.188-189. 258 Kasuyo Sejima, Ryue Nishizawa, El Croquis nº 121/122, Madrid 2004, p.20

Fig.18 A arquitectura característica dos

edifícios de terra de etnia Hakka, típica desta região do Fujian.

Fig.19 Pátio interior de um Toulu. No rés-do-chão estão as cozinhas, no segundo andar

estão os armazéns de cereais, e nos dois últimos andares estavam os quartos. O pátio era o lugar comunitário, para os casamentos,

funerais, festas, etc.

Fig.20 Apartamento no districto de Putuo de

Xangai. Até nas altas torres o pátio é tido em conta.

Fig.21 O padrão do projecto “um lilong

contemporâneo”, conseguido pelos diferentes

pátios.

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91

Fig.22 Planta Primeira do projecto “um lilong contemporâneo”

Fig.23 Planta segunda do projecto “um lilong contemporâneo”

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92

Fig.24 Tipologia E(36m2). Primeira planta

Fig.25 Tipologia F (58m2). Primeira planta

Fig.26 Tipologia G(64m2) e J(51m2).

Segunda planta

Fig.27 Tipologia H (64m2). Segunda planta.

No entanto, o pátio dos apartamentos do último piso era privado, porque

destinava-se a famílias de estratos mais elevados que preferem residências que

potenciem o convívio, mas que não participam nele, tipo os gentrificadores259.

Desse modo, o pátio serviu para manter a ideia de comunidade, permitindo o

convívio de alguns grupos, mas mantendo a privacidade de outros.

As onze tipologias estão divididas em dois tipos, os apartamentos T1

destinados às famílias mono-elementares, mono-parentais, ou pluri-sociais, e aos

idosos, e os apartamentos T2, que respeitavam a política das famílias de um único

filho. O primeiro grupo distribuiu-se pelo rés-do-chão e primeiro andar, e as

tipologias T2 no último andar. Em ambos os grupos há a possibilidade do duplex.

Apesar da existirem várias tipologias, todas respondem aos mesmos critérios

de independência do indivíduo e de convívio, a fim de evitar, pela preferência, a

desocupação de algumas delas. No entanto, anomalias, como a falta de arrumos

para uma sociedade de consumo, a mesma tipologia com várias orientações, entre

outros, ficaram por resolver.

O aspecto unitário e denso do edifício, típico dos mat-building, conseguiu-se

através do aumento progressivo das tipologias à medida que se chegava ao último

andar, e dos pátios e poços de luz que permitiram comunicar os diversos

apartamentos numa única unidade urbana.

Uma das mais valias deste projecto é a fluidez visual entre apartamentos, e

entre estes e o espaço das ruas, devido à proximidade causada pelo estreitamento

dos poços de luz. Para além da fluidez visual, estes poços de luz distribuem, pelos

apartamentos que eles iluminam, uma penumbra típica dos espaços orientais cujo

controlo milimétrico da luz é para eles um princípio para atingir um fim: a beleza do

espaço:

“Alguns poderão dizer que a beleza enganadora criada pela penumbra não é a

beleza autêntica. Todavia(...) nós Orientais criamos beleza ao fazermos nascer

sombras em locais por si mesmo insignificantes, (...) Creio que o belo não é uma

substância em si, mas apenas um desenho de sombras, um jogo de claro-escuro

produzido pela justaposição de diversas substâncias. Tal como uma pedra

fosforescente que emite brilho quando colocada na escuridão e ao ser exposta à

luz do dia perde todo o fascínio de jóia preciosa, também o belo perde a sua

existência se lhe suprimi-mos os efeitos da sombra”260.

259 Normalmente, os processos de gentrificação identificam casos de recuperação do valor

imobiliário de regiões centrais de grandes cidades que passaram nas últimas décadas por um

período de degradação. Os gentrificadores correspondem aos residentes de mais alta renda que

vem recuperar a actividade económica destas regiões onde viviam e vivem pessoas com menor

poder aquisitivo. http://pt.wikipedia.org/wiki/ (em 20/08/2008) 260 TANIZAKI, Jun’ichiro, “Praise of Shadows”, p.45-46, in NETO, Hugo Pereira, Katsura, uma

introdução à arquitectura tradicional japonesa, Prova de Licenciatura em Arquitectura, Faculdade de

Arquitectura da Universidade do Porto, Porto, 2005 [policopiado], p.103

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93

Fig.28 Vista da cozinha do apartamento 08 na

primeira planta. Edificio Funabashi (2002/2004), Japão.

Fig.29 Colocação da tipologia G (duas) sobre a tipologia A (sobre outras duas).

Fig.30 Tipologia I (65m2) K(65m2).

Segunda Planta

O momento de transição do exterior comercial ao sistema interior de ruas

também foi acentuado por altas e estreitas portas (eram mais estreitas do que a rua

a que dava acesso), assim como no interior do edifício prevaleceu a ideia de porta

como um buraco na parede.

Igualmente o arquitecto chinês I.M. Pei em relação ao seu projecto do Hotel

das Colinas Perfumadas (1979-1982) em Pequim, valorizou a porta como um

símbolo da cultura chinesa: “O atravessamento do muro conserva aqui todo o seu

cerimonial: a entrada do hotel é controlada por um pórtico, tipo de pórtico

comemorativa, ou P’ai-Lou.”261

Todos os espaços semi-públicos e semi-privados como as ruas interiores, a

cozinha e os pátios foram nivelados a uma cota inferior que a do resto do edifício

para acentuar a porta como um buraco na parede e para marcar o momento de

transição.

É curioso que este tratamento do espaço interior também acontece em alguns

projectos do Ryue Nishizawa, da Kasuyo Sejima, entre outros. Provavelmente é

uma característica da cultura oriental, uma vez que a arte chinesa dispersou-se por

vários países como o Japão262, através do budismo e da filosofia.

Foi igualmente utilizada a coordenação modular, típica da cultura oriental

indispensável para articular através do módulo os diversos espaços sem perder o

domínio das relações de proporção entre as partes e o todo da unidade urbana.

Também na fachada se utilizou o quadrado, respectivo às janelas pivotantes, como

unidade de repetição.

Por muitos arquitectos, esta atitude de resposta à habitação, densa e

monótona, é interpretada como desumana e inaceitável. No entanto, o excesso de

monotonia pode ser entendido, como disse o arquitecto Álvaro Siza, como “um

desafio à busca da diferença, que não pode resolver-se numa questão estética,

porque se assim fosse, o resultado apareceria logo artificial, caricaturado ou

inventado”263.

Todos os projectos depois de terminados têm um ar inacabado. Só quando o

projecto leva algum tempo, depois de ter entrado em contacto com as pessoas e

ter sido domesticado, é que tanto a arquitectura como a cidade ganham esta

densidade e a beleza que vemos com desespero nos edifícios habitados e nas

cidades antigas.264

É preciso notar que, apesar das falhas deste exercício, o mesmo serviu para

compreender uma possível utilização de alguns conceitos do Lilong e as respostas

inovadoras que esta tipologia Xangaiense pode oferecer às contradições entre

modernidade e convenção.

261 SUNER, Bruno, Ieoh Ming Pei, Fernand Hazan, Paris, 1988, p.9 262 NETO, Hugo Pereira, Katsura, uma introdução à arquitectura tradicional japonesa, op.cit., p.27 263 SIZA Álvaro, Imaginar a evidência, op.cit., p.117 264 Ibid., p.124

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94

Fig.31 Fachada Este. Fig.32 O pátio da tipologia A, visto do pátio do último andar.

Fig.33 Fachada Oeste. Marcação apenas dos pátios e dos acessos às ruas secundárias.

Fig.34 Fachada Este e Corte AA’ e BB’ .

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95

Fig.35 Maqueta do projecto “um Lilong contemporâneo” em Xangai da autora.

Fig.36 Fachada Sul.

Fig.37 Tipologia J,G,H, à esquerda, a meio está a tipologia K e I, e no lado direito está a tipologia A.

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96

Fig.38 Esquisso da rua secundária, com o ponto de fuga sobre uma das portas de entrada, da autora.

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97

CONCLUSÃO

Num período de conclusão, pretende-se reflectir sobre a pertinência deste trabalho:

Para que pode servir o conhecimento de outra cultura que não a nossa e em

específico a arquitectura que caracteriza essa cultura?

A nossa época, cada vez mais, define-se por um sistema social e produtivo, cuja

disciplina a qual acede é desprovida de um retorno operativo. Tanto a civilização

como a produção que um dia acompanharam a ideia de um tempo progressivo

cuja evolução estava sujeita a uma acumulação dos conhecimentos, os quais

registavam a sucessão sequencial dos eventos, hoje, são ambas pensadas para

um presente com uma antecipação futurista do amanhã: “produz-se para

consumir-se mais e consome-se para aumentar a produção”265. O sentido

inequívoco do trio formado pelo Passado, Presente e Futuro que em épocas

recentes existia, parece hoje ter sido esquecido.

Desse modo, o sentido ético do “progresso” que sempre esteve associado a

uma evolução gradual até ao futuro parece ter sido desvanecido. Contudo, no

âmbito do progresso da arquitectura, também ela afectada pelas forças do

mercado, a história de uma cultura ou a arquitectura dessa cultura pode ser um

instrumento imprescindível.

Igualmente a cultura chinesa, com a ocidentalização, tornou-se industrializada,

abandonando, assim, muitos dos valores tradicionais em favor do progresso

baseado na ciência, na técnica e na imitação de outras culturas, como a ocidental.

A associação da noção chinesa de património aos valores da nação invalidou a

utilização da sua história como um instrumento útil para alcançar o verdadeiro

progresso, que permita que a China fosse “a única e a mais excepcional”, e não um

“laboratório de arquitecturas” como em Dubai.

Já Wright, segundo a sua visão baseada na experiência que teve na China,

defendia que os chineses deveriam avaliar a sua cultura, assim como nós o fizemos

com a nossa e com as outras para a inovação da arquitectura: “A República da

China, na sua visão, era só um pedaço de costa que a grande China ainda não

incluiu e que, nestes tempos modernos, milhões de chineses ainda não conhecem

e pouco se preocupam em o fazer”266.

Para conseguirmos, portanto, um verdadeiro progresso, único e inovador,

impõe-se investigar sobre “uma civilização e as suas formas, que pertencem a

265 PIZZA, Antonio, La construcción del Passado: reflexiones sobre historia, arte y arquitectura,

Celeste Ediciones, Madrid, 2000, p. 9 266 WRIGHT, Frank Lloyd, Escritos nº7: 1867(1944), El Croquis Editorial, Madrid, 1998, p.608

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98

outro tempo, “assumindo de maneira programática que elas diferem

completamente das nossas”267 e das mesmas da actualidade.

O conhecimento de outras culturas, de outras formas de vida, de estar, de

sentir, de agir, de pensar, deve-nos ajudar para, como diz Gropius, “restabelecer

valores negligenciados e abrir os nossos olhos para experiências que hoje estão a

faltar nas nossas vidas”268.

Assim, devemos confrontar o passado com o presente e o futuro não só da

mesma cultura como também entre culturas, de modo a verificar os pontos em

comum e, através deles, pela diferença, descobrir as mais valias que cada cultura

pode oferecer a um determinado contexto: “O Oriente e o Ocidente devem adaptar

as suas atitudes e enriquecer uma a outra, descartando o que é fraco e obsoleto

em ambas as partes”269.

Também no âmbito da inovação na arquitectura, é importante compreender a

arquitectura do passado e de outras culturas. Para tal, devemos decompo-la e

voltar a compor para perceber os verdadeiros e únicos elementos que a compõem,

que definem as partes e o todo, para depois sabermos inseri-las na função para a

qual se destina, o seu valor estético, no contexto histórico, político e social.270

A incessante vontade de Xangai inovar no campo da arquitectura,

especificamente em edifícios de grande altura, foi interpretado por alguns ocidentais

como a condicionante da inovação e não como o seu fim. Por exemplo Ged

Françoise defende que, reconhecidas as valias que o Lilong apresenta no tema do

habitar urbano, uma das soluções à inovação desses edifícios passa pela

verticalização dos princípios que caracterizam o Lilong.271

Também Le Corbusier, querendo dar uma solução aos problemas da cidade

industrializada, recorreu aos valores do passado da cidade tradicional, que,

analisados individualmente e confrontados com outro tempo, foram inseridos no

contexto da verticalização (ex: “rue corridor”).

267 PIZZA, Antonio, La construcción del Passado: reflexiones sobre historia, arte y arquitectura,

op.cit., p.9 268 GROPIUS, Walter, Architecture in Japan [1960] in Katsura: imperial villa ed. Virginia Ponciroli,

Electa, Milão, 2005, p. 350 , in ITABASHI, Miki, A influência japonesa na arquitectura moderna

ocidental: uma introdução, op.cit., p.104 269 Idem 270 ENGEL, Heinrich, The Japanese House, A Tradition for Contemporary Architecture, [1964] in Ibid,

p.104 271 GED Françoise, “Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, op.cit.

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99

Como disse António Pizza: “A consideração do Passado nos seus aspectos

problemáticos irá demonstrando a sua produtividade em relação ao exercício de

uma atitude crítica face à nossa contemporaneidade; portanto, só se somos

capazes de construir um passado, poderemos estar em condição de projectar o

nosso futuro, a partir da iniludível valorização da liberdade criativa do nosso

pensamento”272

O estudo sobre o passado de uma cultura e sua arquitectura permitirá portanto,

através do seu reconhecimento na memória, não só configurar os seus resultados

como soluções a problemas levantados, como também permitirá saber encontrar

os problemas da nossa realidade. Assim, é através da amplitude dos

conhecimentos na memória que podemos adquirir essa liberdade criativa

necessária para projecções arquitectónicas inovadoras. “O arquitecto trabalha

manipulando a memória, disso não há dúvida, conscientemente mas a maioria das

vezes subconscientemente.”273

O exercício apresentado no último capítulo, serviu para evidenciar que o

conhecimento de outras culturas do passado, neste caso a doméstica, impulsiona-

nos, com os conhecimentos que temos, a uma renovação da nossa cultura da

casa, ou de outros temas. Arquitectos como Bruno Taut, depois de terem estado

em contacto com outras culturas (japonesa), também tentaram conciliar formas

precedentes dessas culturas com a sua.274

A influência da cultura japonesa e ocidental, do passado árabe, entre outros,

assim como os princípios globais que caracterizam a nossa civilização, deram

origem a projectos, analisados nesta prova, com uma estrutura conceptual

semelhante ao do lilong. O facto desta estrutura, que se tentou encontrar neste

trabalho, ter acompanhado os diferentes tempos e culturas, deve ser considerada,

segundo a minha opinião pessoal, como uma referência pela sua capacidade de

resposta ao tema do habitar urbano.

No entanto, seria interessante e enriquecedor aprofundar o estudo desta prova

com outros projectos e de outras culturas que não os enunciados neste trabalho,

assim como o estudo da verticalização do lilong seria pertinente para a valorização

desta tipologia como identidade urbana de Xangai.

Estes estudos entre culturas e tempos históricos, ou na mesma cultura sobre a

arquitectura, são sempre enriquecedores para a formação e a ampliação dos

conhecimentos do arquitecto, assim como o resultado desses estudos resultam em

pertinentes referências arquitectónicas.

272 PIZZA, Antonio, La construcción del Passado: reflexiones sobre historia, arte y arquitectura, op.

cit., p.11 273 SIZA Álvaro, Imaginar a evidência, op. cit., p.37 274 TAUT Bruno, La casa y la vida japonesa, trad. Dolores Abalos, Barcelona, Fundación Caja de

Arquitectos, 2007, Prefácio

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CITAÇÕES

CAPÍTULO I

P.15 GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat,

EHESS, Paris, 1997.p.42

“Celles-ci étaient à double titre les architectes de l’extension urbaine, à la fois moteurs de

développement économique auquel répondait la souplesse des réseaux bases sur la relation

identitaire au pays d’origine, et véritables constructeurs de la ville, de ses édifices de prestige comme

des constructions ordinaires.”

P.17 Ibid, p.53

“On s’aperçoit vite que malgré ses dehors d’activité bruyante, Shanghai est encore une petite, trés

petite ville. Quando on gravit les murailles, faites de terre battue avec un mince revêtement extérieur

de briques, on constate qu’elles enferment une cité médiocre et dominent des faubourgs sordides.”

SCHOENAUER Norbert, 6000 años de hábitat: de los poblados primitivos a la vivienda urbana en

las culturas de oriente y ocidente, trad. Josefina Frontado, Barcelona, Gustavo Gili, 1984, p.199

“(...) esto se refleja en el lenguaje chino, el qual no hace distinción entre “ciudad” y “muralla de la

ciudad”, utilizando una sola palabra para ambas ocasiones, cheng. En efecto dichas fortificaciones

dominaban no solamente el aspecto externo de la ciudad sino también su interior, todos los edifícios

se agrupaban junto con sus respectivos pátios, formando pequeños recintos separados entre si.”

P.18 HENRIOT Christian, Zu’an Zheng, “Divisions de la ville à Shanghai (XIXe-XXe siècles)” in Les

divisions de la ville, édictions Unesco, Editions de la Maison des sciences de l’homme, 2002, p.161

“Dans la Chine imperiale, la muraille symbolise l’élévation d’un centre urbain au rang de “chef-lieu”

d’un comté (xian).”

P.24 GED Françoise, Shanghai, colecção, Portrait de ville, suplemento à Archiscopie nº9, 2000.

p.18

“Un tel dispositif favorise une double spéculation, foncière et immobilière, en bénéficiant à des

interlocuteurs distincts, qui sont les uns chinois, les autres étrangers.”

P.26 HENRIOT Christian, ZU’AN Zheng, atlas de SHANGHAI,espaces et représentations de 1849 à

nous jours, Collection Asie Orientale, Paris 1999. P.26

“Même si des règlements cherchaient à definir des règles de base pour la construction, celle-ci a étè

le fait d’iniciatives privées, quelconque politique urbaine.”

GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997, p.73

“Cette empreinte physique, héritée du découpage rural des terres, marque la ville et se lit sur un plan

du trace des voies des années 1980.”

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102

P.28 GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat,

EHESS, Paris, 1997, p.172

“Toute ville est, en effet, composée de la justaposition de partitions, de quartiers dont les points de

rupture, les limites, et les points de repères, les noeuds, apparaissent plus ou moins marqués.”

Ibid., p.133

“Dans les capitales européenes, cette modernisation s’etait apresentait sur un demi-siècle dês 1830

et devait composer avec un tissu urbain existant particulièrement dense, À Paris, grâce à

Rambuteau, préfet de la Seine de 1833 à 1848, l’usage des trottoirs, l’alimentation en eau et en gaz,

le developpement des omnibus s’étaient généralisés dês la primière moitié du XIX siècle.”

Ibid., p.111

“(...) les charpentiers de construction navale venaient de Canton, les chaudronniers de Ningbo, les

tireurs de pousse du Subei, les maçons et charpentiers de Ningbo ou Shaoxing.”

P.29 Idem

“Des réseaux croisés ainsi constitués, par métier ou par lieu d’origine, resultaient installés dans la

Concession française au nord de la cité chinoise; au sud de celle-ci habitaient les gens de Canton

ainsi qu’à Hongkong et dans divers emplacements de la Concession internacionale; les gens du

Jiangxi étaient à Zhabei; les gens du Fujian prés de l’actuelle rue Jinlingdong et de la petite porte de

l’Est.”

CAPÍTULO I I

P.31 EUGÈNE-EMMANUEL VIOLLET-LE-DUC, “Dictionnaire raisonné de l’architecture française du

XI au XVI siècle” [1867-1873], in ROSSI, Aldo, La arquitectura de la ciudad, Editorial Gustavo Gili

Barcelona, 1999, p.126

“(...) En el arte de la arquitectura, la casa es, desde luego, lo que mejor caracteriza las costumbres,

los gustos y los usos de un pueblo; su orden, como su distribución, no se modifica más que a lo

largo de mucho tiempo.”

LYNCH, Kevin, “La buena forma de la ciudad” [1985], in Juan Luís de las Rivas Sanz El espacio

como lugar : sobre la naturaleza de la forma urbana, Universidad. Secretariado de Publicaciones,

Valladolid, 1992, p.33

“La forma más simple del sentido es la identidad, en el significado restringido del término usual: “un

sentido del lugar”. La identidade es el grado en que una persona puede reconocer o recordar un

sitio como algo diferente a otros lugares, en cuanto tiene carácter próprio vivido, o excepcional, o al

menos particular.”

P.32 ROSSI, Aldo, La arquitectura de la ciudad, Editorial Gustavo Gili Barcelona, 1999, p.78

“El tipo se va constituyendo, pues, según la necessidad y según las aspiración de belleza; único y sin

embargo variadísimo en sociedades diferentes y unido a la forma y al modo de vida.”(...)” algo

permanente y complejo, un enunciado lógico que se antepone a la forma y que la constituye.”

HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à nos

jours, CNRS édictions, Paris, 1999, p.42

“Le lilong représentait une forme d’organisation de l’espace caractéristique du tissu urbain à

Shanghai.”

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103

P.33 MARTÍ ARIS Carlos, Las variaciones de la identidad : ensayo sobre el tipo en arquitectura, 1ª

ed. Barcelona, Serbal, 1993, p.81

“(...)analiza la forma arquitectónica en su autonomia, pero tratando de comprender los vínculos que

estabelece con la sociedad y con la cultura, ampliamente entendidas.”

SCHULZ, CHRISTIAN Norberg, Intenciones en Arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, 2001,

p.58

“(...) parece necesario someter los diversos tipos de edificación a una investigación básica,

preguntando, por ejemplo: “Qué es una iglesia?”, en vez de: “Como es una iglesia?””

MARTÍ ARIS Carlos, Las variaciones de la identidad : ensayo sobre el tipo en arquitectura, 1ª ed.

Barcelona: Serbal, 1993, p.22

“En este sentido, historia y tipologia se nos presentan como dos aspectos complementarios ya que

mientras la historia muestra los procesos de cambio, el análisis tipológico atiende a lo que, en esos

procesos, permanece idêntico. (...) La esencia puede ser, entonces, interpretada como el conjunto

de las potencias inherentes a la cosa y los câmbios pueden ser interpretados como la actualización

de esas potencias.”

P.34 GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat,

EHESS, Paris, 1997, p.111

“Les sièges des guildes, qui symbolisaient la puissance de la ville ou des régions auxquelles celles-ci

se rattachaient, traduisaient les caractéristiques de leur “pays” respectif par leur architecture.”

P.38 A tese de DEA de Xu Yinong, “O conceito do espaço composto tradicional na China, pesquisa

sobre a relação entre “interior” e “exterior” e o seu fundamento cultural na arquitectura vernacular

nas seis províncias do sul da China” [1989 e 1990], in LIANG Zhang, La naissance du concept de

patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus, édictions recherches, 2003, p.177

“L’existence de l’espace composé releve (...) d’un intermédiaire qui fusionne deux espaces opposés,

(...) ainsi elle assure une fonction de combinaison ou de médiation (...) à partir des espaces extérieurs

naturels, entre les espaces du village et de la commune, puis, entre les espaces des rues et ruelles,

ensuite ceux de l’habitat et de la cour, jusqu’a l’espace intérieur. La variation et la liaison de cette

série d’espace composé qui multiplie les niveaux de l’architecture vernaculaire chinoise. Chaque

niveau pour la nature de l’espace s’adapte à la mesure du paramètre.”

P.39 LIANG Zhang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus,

édictions recherches, 2003, p.178

“L’homme habite à l’extérieur, la femme habite à l’interieur; le palais est profond, la porte des

boudoirs est fermée hermétiquement, le gardien veille.”

SAARINEN Eliel, “Search for Form”, [1948], in VENTURI Robert, Complejidad y contradicción en la

arquitectura, Editorial Gustavo Gili, SA, Barcelona, 1974/1978, p.111

“(...) un edifício no es más que la “organización del espacio en el espacio. Como lo es la comunidad.

Como lo es la ciudad”.”

P.42 GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat,

EHESS, Paris, 1997, p.146

“Une travée pouvait satisfaire indifféremment les besoins d’une famille ou de plusieurs compatriotes

qui sous-louaient selon leurs revenus les pieces disponibles. Celles orientées au sud étaient plus

cotées que celles donnant au nord ou que le tingzitian aux dimensions reduites.”

Page 108: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

104

P.43 SCHULZ, CHRISTIAN NORBERG, Arquitectura Occidental : la arquitectura como historia de

formas significativas, Barcelona, Gustavo Gil, 1983, p. 228

“Puede afirmarse que la arquitectura aparece cuando el individuo trasciende la situación ambiental

especifica y reconoce los princípios que pueden servir para resolver también otras tareas análogas.

De un conjunto de situaciones especificas se abstraen formas significativas y elementos ordenadores

que hacen posible una planificación más general. Algunas de estas formas pueden denominar-se

“arquetípicas”, puesto que representan los significados originales de la experiencia humana.”

P.44 CLEMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris,1988, p.170

“La ville des années 1920-1930, la plus connue du grand public grace aux multiples images diffusées

au cinema, au travers des romans, des gravures ou des récits de voyages, était devenue une entité

complexe, une veritable métropole où le brassage des populations, chinoises comme étrangères,

mêlait des cultures multiples.”

P.48 GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat,

EHESS, Paris, 1997, p.191

“Celle-ci était prêt à consomer des produits importes, à s’amuser dans les lieux de divertissement

integégrés aux bâtiments, ou seulement curieuse de déguster un cocktail étranger au bar de la

terrasse jardin du grand magasin récemment achevé. Frequenter les bars ou les halls des grands

hôtels signifiait aussi adhérer à la modernité que symbolisait la ville.”

P.50 CLEMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris,1988, p.159

“L’écart entre deux bâtiments de propriétés différentes doit être au moins égal à 30 pieds (9,15m).”

P.51 MARTÍ ARIS Carlos, Las variaciones de la identidad : ensayo sobre el tipo en arquitectura, 1ª

ed. Barcelona: Serbal, 1993, p. 114

“(...) una realidade n perpétua formación, dotada de procesos generativos capaces de incorporar a

la estructura nuevos componentes que la enriquecen y amplían.”

P.52 MONTANER Josep Maria ,La modernidad superada : arquitectura, arte y pensamiento del

siglo XX, Barcelona : Gustavo Gili, 1997, p.125

“Pensar la arquitectura desde los conceptos de tipo y estrutura nos permite estabelecer

comparaciones sincrónicas. Se puede comprobar como el (...) espacio simétrico, axial, puro,

transparente, rítmico y sereno del átrio del Panteón se reproduce en la base del Seagram Building

(1954-1958) de Mies van der Rohe.”

P.53 AMPHOUX Pascal e MARTIN Cristophe, “Lilong mort ou vif” [1987] in

www.lasur.epfl.ch/revue/A&C%20Vol%204%20No.2/AMPHOUX.pdf

“Quand les Chinois cesseront-ils d'être fascines par les erreurs de notre urbanisme d'après-guerre?

Quand l’Occident renoncera-t’il d’exporter de façon simpliste les modeles auxquels il ne croit plus

lui-même? Il est temps que l'on redecouvre les lilongs de Shanghai et que l'on en fasse l'analyse en

profondeur, non pour en proteger le patrimoine au sens qu’il l'entendraient nos institutions, mais

pour en degager les principes qui font l'Esprit de Shanghai. Moribond pour l'urbaniste, chaque

Shanghaien a pourtant un lilong dans la tête. Shanghai est une ville-fossile, mais le fossile est vivant.”

Page 109: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

105

CAPÍTULO I II

P.57 CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, op. cit., p.159

“7,5 pieds (2,28m) lorsqu’une façade a pour vis-à-vis un mur ou une grille.”

“10 pieds (3m environ) lorsque le passage est le seul accès à un ou plusieurs blocs de maisons.”

P.58 CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan, Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris,1988, p.159

“Il est possible qu’il s’agisse lá d’usages devenus des règlements, d’après un article ultérieur où il est

spécifié que: chaque bâtiment chinois doit avoir un accès indépendant à l’arrière et à l’avant, libré de

tout obstacle, de largeur minimum(...).”

P.59 Françoise Ged, “Shanghai- Interférences et justapositions”, [1986], in CLÉMENT Pierre, GED

Françoise et QI Wan., Transformations de lʼhabitat à Shanghai , rapport de recherches, I.F.A., Paris,

1988, p.153

“La rue s’instaure comme lieu public, de circulation, pour pietons, velos, bus et de spectacle sur ce

qui s’y déroule. Le passage principal, transversal à cette rue, exerce la même fonction, mais à

l’échelle de cette entité qu’est le lilong. Sur cet axe est souvent situe le téléphone public, commun à

tous ses habitants, lieu d’appel et de réception des communications. Peuvent s’y trouver la machine

à laver pour la facilite d’évacuation des eaux usées, les matelas d’hiver ou les couettes fraîchement

lavées.

Le promeneur est déjà inclus dans une certaine intimité commune à l’ensemble des occupants du

lilong. La ruelle, desserte de chacun des logements, fonctionne comme prolongement de l’espace

prive de l’appartement, du moins de la piece principale. (...) Cette ruelle délimite donc un espace

beaucoup plus personnel mais assure la perception visuelle, en partie, et auditive de l’ensemble du

lilong. (...)”

P.61 GED Françoise, Shanghai, colecção, Portrait de ville, suplemento à Archiscopie nº9, 2000,

p.21

“Les voyageurs occidentaux du XIXe siècle, imprégnés de l’esprit du siècle des lumières, décrivent leur

déception devant l’absence d’espace public munificent et leur irritation au coeur des lacis de ruelles

non entretenues, oû s’orienter devient un exercice difficile.”

CAPÍTULO IV

P.67 Smithson, Alison “Team X Primer" [1968], in COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna,

una historia desapasionada,, p.219

“”El objectivo del urbanismo es la comprensibilidad, es decir, la claridad de su organización.””

P.69 ZHANG, Liang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus,

édictions recherches”, 2003, p.161

“Le carré n’est pas à chercher dans un rapport géométrique directement observable par l’oeil, mais il

doit être perçu par l’intuiton.”

Zheng Xiaoxie, “A propôs de la protection de la tradition, des caracteres et de la physionomie

stylistique de “Ville célebre d’histoire et de culture”” [1983], in Ibid.

“ (...) le paysage se transforme en pensée et sentiment. Une évocation de l’imagination.”

GED Françoise ,”Exterieur-Interier, le mur d’enceinte en Chine”, in,

sources.asie.free.fr/espace/culture/inalco-cnrs/habitat/FGed.html

Page 110: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

106

“(...) la bordure commerçante qui enserre un quartier shanghaïen sera considérée comme

"extérieure" pour un habitant chinois mais "intérieure" pour un observateur occidental.”

P.70 COLQUHOUN, Alan, “Centraal Beheer” [1974], in TAYLOR, Brian Brace, La modernité critique

autour du CIAM 9 d’Aix en Provence, édiction imbernon, Marseille, 2006, p.188

“C’est l’usager qui joue un role actif dans le bâtiment alors que le role de l’architecte est plutôt de

fournir le cadre qui permet à l’usager de choisir son propre comportement.”

P.71 COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada, op.cit., p.221

“(...) el segundo mira hacia delante, a un mundo capitalista de estructuras abiertas dentro de las

cuales la democracia, el individualismo, la mercantilización y el espíritu consumista no se ven

obstaculizados por ningún conjunto de códigos culturales establecidos a priori.”

OMA, Rem Koolhaas, El Croquis nº 53, Madrid 1992, p. 21-22

“Es interesante dejar de entender la ciudad como un tejido, para concebirla como una mera

coexistência, un conjunto de relaciones entre distintos objetos que casi nunca se articulan visual o

formalmente, que ya no quedan atrapadas en conexiones arquitectónicas. Para mí, este es un paso

decisivo. Pero si llegamos a la conclusión de que la conexión ya no es algo necesario, estamos, en

cierto modo, dinamitando los cimientos de nuestra existência profesional. Si el planeamiento ya no

es necesario, o se ha vuelto irrelevante...para qué planificar?”

P.72 SOSA, Jose António, “Constructores de ambientes: del mat-building a la lava programática”,in

Quaderns d'Arquitecture i Urbanisme nº220, 1998, p.93

“Los vacios, los poros de las estruturas radiculares de los mat-building no son simples pátios, los

proyectos no giran en torno a ellos. Los vacios son parte inherente de ellos como el poro lo es de

una esponja.”

ltha.epfl.ch/enseignement_lth/theorie/polycopie_th5/chap_11.pdf

“le paysage du bord de route, la mécanisation des objets quotidiens, la culture de la consommation.”

“le retour éphémère de la monumentalité et de l’humanisme; l’affirmation des régionalismes et

l’influence du vernaculaire; la reconsidération du fonctionnalisme de l’entre-deux-guerres; la multitude

de tendances et d’expressions poétiques personneles.”

P.73 MARTÍ ARIS, Carlos, Las variaciones de la identidad, Ed. Serbal, Barcelona, 1993, p.186

“Las obras de arquitectura remiten unas a otras y en ese juego de correspondências se funda la

noción de tipo. Pero no se identifica con ninguna de sus materializaciones sino cone el principio

lógico que las engloba.”

GAUSA Manuel, Housing : Singular housing, Actar Barcelona, GG, 2002, p.11

“(...) ante la indeterminación y mutabilidad de la ciudad contemporânea más receptiva, por el

contrario, a mecanismos abiertos con capacidad de evolución y perturbación. La sustitución en el

proyecto contemporâneo, de la idea cerrada de composición (definción exacta y diseñada de las

partes) por la de “sistema” (mecanismo “abierto” o ideograma vector susceptible de propiciar

múltiples combinaciones y manifestaciones formales diversas) constituye, de hecho, uno de los

mayores exponentes del cambio de paradigmas que caracteriza hoy la disciplina.”

CAPÍTULO V

P.76 BERLANGA José Luís Villacañas, “La Casa, el sujeto”, in “Acerca de la Casa 2”, Sevilha, 1998,

p.230-231

“La dimension de domínio que posee el habitar es también y ante todo domínio de si, y por eso es

domínio moral, ethos. La única forma de detenerse es ocupar un lugar. Y esto es habitar.”

Page 111: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

107

P.77 GAUSA Manuel, diccionario metápolis de arquitectura avanzada, Barcelona, Actar, 2000,

p.326

“A la cultura de lo igual sucede la cultura de lo diferente. Cada persona es un mundo. Cada vivienda

es un mundo.”

P.78 Idem

“un sistema dinámico amplifica cada vez más las diferencias particulares; hace acceder de los

fenómenos individuales a la escala macroscópica y, de hecho, es en la ampliación sucesiva de estas

pequeñas diferencias donde acaba encontrándose el azar.”

MONTEYS, FUERTES Pere, Xavier, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa,

Editorial Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.144

“La imagen hoy podria ser una hoja de cálculo, en cuyas casillas hay elementos que pueden

combinarse, obteniendo asi nuevos elementos. Ciertas de estas combinaciones son casas.”

P.80 TSUZUKI Kyoichi, “Tokio style, ou vivre chez soi comme en ville”, in , Faire son nid dans la ville,

Archilab Japon Orleans, 2006, comissários: Akira Suzuki, Mariko Terada, p.32

“En définitive, seule la fonction du dormir reste attachée à la pièce dont la ville devient en quelque

sorte l’appendice.”

P.81 MACCREANOR Gerard, “Adaptability”, in A+T n.º 12, 1998, p.40

“Adaptability is a different way of viewing flexibility. The adaptable building is both transfunctional and

multifunctional and must allow the possibility of changing use; living into working into leisure or as a

container of several uses simultaneously.”

ARANGUREN Maria José, GALLEGS José Gonzáles, “Habitar la caja”, inédito [1999], in PRATA

Bártolo, Re-habitar a casa urbana do Porto, Faup, Porto, 2006/2007, p.54

“Si las partes fijas, permanentes, se agrupan en núcleos de servicios y las partes cambiables se

alojan sin divisiones rígidas y con critérios de temporalidad, los câmbios que sufra la unidad familiar a

lo largo del tiempo serán resueltos sin profundas y costosas transformaciones.”

P.82 Kasuyo Sejima e Ryue Nishizawa, El Croquis nº99, Madrid 2000, p.336

“una planta muy simple, pero en realidad muy compleja”; “ un edifício del que no se sabe si es

temporal o permanente”: “un edifício construído entendiendo el comportamiento humano.”

MONTEYS Xavier, FUERTES Pere Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa, Editorial

Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.72

“El número de acessos, el de puertas interiores, su forma y uso, constituyen un entramado de

dispositivos que es la expresión sofisticada de la variedad de usos de una casa.”

P.83 Ibid., p.74

“Piensese, por ejemplo, en los hijos adultos que conviven con sus padres o en las vivendas en las

que uno de los usuários trabaja y recibe en casa. La segunda puerta puede ayudar a que

situaciones como estas no deban convertirse en anómalias para el funcionamiento de la casa y

permitan, a la vez, reincorporar este “apartamento” de nuevo a la casa, en el momento en que

cambie dicha situación, sin realizar modificación alguna. Planteada así, esta casa es, en difinitiva, una

casa donde la flexibilidad ha sido entendida en términos distintos a los habituales.”

Page 112: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

108

CAPÍTULO VI

P.86 ZHANG Liang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus,

édictions recherches”, 2003, p.246.

“(...) la permanence de la tradition non seulement resiste à la raison historique, mais repose aussi la

tradition de bâtir, non sans une confusion qui persiste jusqu’à aujourd’hui.”

P.89 LA CHINE, Regards sur le Monde, Sélection du Reader’s Digest, Primière édiction, 2e tirage.

“Le ciel nourrit l’homme par les cinq souffles. La terre nourrit l’homme par les cinq saveurs. Rares

sont d’ailleurs les restaurants qui sont en mesure d’acueilir un convive isolé.”

P.90 Kasuyo Sejima, Ryue Nishizawa, El Croquis nº 121/122, Madrid, 2004, p.20

“Estaba interessado en trabajar con la individualidad a traves de generar relaciones entre personas

que viven en el mismo edifício. En Tokio, los edifícios de viviendas están normalmente basados en la

idea de desconexión entre unidades. Sin embargo, aunque es importante mantener la privacidad,

podria ser interesante que los arquitectos reflexionáramos sobre las consequencias espaciales que

puede tener el hecho de que haya personas que elijan vivir junto a otros a los que no conocen. Por

lo tanto traté de crear un sentimiento de independencia a la vez que suscitaba una relación entre los

habitantes.”

P.93. SUNER, Bruno, Ieoh Ming Pei, Fernand Hazan, Paris 1988, p.9

“Le franchissement du mur conserve ici tout son cérémonial: l’entrée de l’hôtel est surmontée d’un

portique, sorte de porte commémorative, ou P’ai-lou.”

CONCLUSÃO

P.95 PIZZA, Antonio, La construcción del Passado: reflexiones sobre historia, arte y arquitectura,

Celeste Ediciones, Madrid, 2000, p. 7

“(…) en una época en la que el sistema social y productivo asedia sin respiro a una disciplina

desprovista de cualquier retorno operatvo, (…)”

P.103 WRIGHT, Frank Lloyd, Escritos nº7: 1867 [1944], El Croquis Editorial, Madrid, 1998, p.608

“La República China en su vision era solo un pedazo de costa que la gran China aún no ha incluído y

que, en estos tiempos modernos, millones de Chinos aún no conocen y poco se preocupan por

hacerlo.”

P.104 PIZZA, Antonio, La construcción del Passado: reflexiones sobre historia, arte y arquitectura,

Celeste Ediciones, Madrid, 2000, p.9

“(...) una civilización y sus formas, que pertenecen a otro tiempo, asumiendo de manera

programática que ellas difieren completamente de las nuestras.”

P.105 PIZZA, Antonio, La construcción del Passado: reflexiones sobre historia, arte y arquitectura,

op. cit., p.11

“La consideración del pasado en sus aspectos problemáticos irá demostrando su productividad

respecto al ejercicio de una actitud critica frente a nuestra contemporaneidad; por tanto, solo si

somos capaces de construir un pasado, podremos estar en condición de proyectar nuestro futuro, a

partir de la ineludible valorización de la libertad creativa de nuestro pensamiento.”

Page 113: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

109

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Page 117: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

113

ORIGEM DAS IMAGENS

CAPITULO I—HENRIOT Cristian, Virtual Shanghai, Shanghai Urban Space in Time,

http://virtualshanghai.ishlyon.cnrs.fr/Map_List.php?ID=135&CF=3 (em 22/08/2007)

1 . GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

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2. HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, CNRS édictions, Paris, 1999, p.17

3. HENRIOT Cristian, Virtual Shanghai, Shanghai Urban Space in Time,

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4. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

5. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

6. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

7. HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, CNRS éditions, Paris, 1999, p.18

8. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport de

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9. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

10. GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.14

11. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

12. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

13. HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, CNRS édictions, Paris, 1999, p.14

14. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

15. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

16. XIXIAN Xu, JIANRONG Xu, A Changing Shanghai, Publishing House : Shanghai People’s Fine,

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17. SCHOENAUER Norbert, 6000 años de hábitat : de los poblados primitivos a la vivienda urbana

en las culturas de oriente y ocidente, p.207

18. HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, CNRS édictions, Paris, 1999, p.28

19. HENRIOT Cristian, Virtual Shanghai, Shanghai Urban Space in Time, virtualshanghai.ish-

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20 . CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.20

Page 118: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

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21. HENRIOT Cristian, Virtual Shanghai, Shanghai Urban Space in Time virtualshanghai.ish-

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24. HENRIOT Cristian, Virtual Shanghai, Shanghai Urban Space in Time, http://virtualshanghai.ish-

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25 . http://virtualshanghai.ish-lyon.cnrs.fr/Map_List.php?CF=3

26. Shanghai, Lao shanghai ditu, The Album of Shanghai during The Past 150 years, Shanghai

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27. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

28. 29. 30. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat,

EHESS, Paris, 1997

31. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

32. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

33. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

34. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

35. Xu, JIANRONG Xu, A Changing Shanghai, Publishing House : Shanghai People’s Fine, 2004

36. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

37. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

38. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

39. GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.18

40. HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, CNRS édictions, Paris, 1999, p.43

CAPÍTULO I I

1. “Google earth” Abril 2008

2. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

3. GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.22

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24.25. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai,

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35. 36. 37. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai,

rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.148, 151

38. 41. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai,

rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p. 191, planta redesenhada

39. 42. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai,

rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.185, planta redesenhada

40. 41. 43. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai,

rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.181, planta redesenhada

44.45. HENRIOT Cristian, Virtual Shanghai, Shanghai Urban Space in Time,

http://virtualshanghai.ish-lyon.cnrs.fr/Image.php?

46. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

47. 48. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai,

rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.201, planta redesenhada

49. http://www.mcgill.ca/mchg/student/lilong/chapter3/, redesenhado

50. GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.26

51. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

52. http://picasaweb.google.com/lh/searchbrowse?psc=G&filter=1&q=lilong#11

53. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.203

54. http://www.mcgill.ca/mchg/student/lilong/chapter3/, redesenhado

56. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.205

69. GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.25

62. http://picasaweb.google.com

Page 120: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

116

CAPÍTULO II I—GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie

nº9, 2000, p.6

1. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000, p.15

2. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000, p.15

3. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000, p.19

4. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000, p.20

5. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000, p.22

6. www.athenaeum.ch

7. MARTI ARIS, Carlos, Las formas de la residência en la ciudad moderna : vivienda y ciudad en la

Europa de entreguerras, 2ª ed. Barcelona, Ed. UPC, 2000

8. http://www.galinsky.com/buildings/marseille/index.htm

9. www.livingspace.sh.cn/content.php?type=article&id=56

10. GED Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.24

11. 18. Françoise, Shanghai, collection Portrait de Ville suplemento à Archiscopie nº9, 2000, p.23

19. http://www.xintiandi.com/english/aboutus_history3.asp

21. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport

de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.240

27. LIANG Zhang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus,

édictions recherches”, 2003, p. 145

28. As duas fotografias cortadas a meio foram tiradas do livro, XIXIAN Xu, JIANRONG Xu, A

Changing Shanghai, Publishing House : Shanghai People’s Fine, 2004, p. 10

29.http://www.miquelmartin.org/pictures/albums/album28/s_DSC_8407_Hutongs_from_the_Drum_t

ower_Beijing.jpg

30. GED Françoise, Shanghai : habitat et structure urbaine, 1842-1995, thèse de doctorat, EHESS,

Paris, 1997

CAPÍTULO IV—CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à

Shanghai, rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.185, redesenhada

1. TAYLOR, Brian Brace, La modernité critique autour du CIAM 9 d’Aix en Provence, édictions

imbernon, Marseille, 2006, p. 148-149

2. MONTANER Josep Maria, Depois do movimento moderno, Arquitectura da segunda metade do

século XX, Editorial Gustavo Gili, SL, 1ª edição, 2ª impressão, 2007, p.30

3. COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada, Editorial Gustavo Gili,

SA, 2005, p.220

4. COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada, Editorial Gustavo Gili,

SA, 2005, p.221

5. MONTEYS Xavier, Le Corbusier. Obras y proyectos. Obras e projectos, Editorial Gustavo Gili, SA,

Barcelona, 2005, p.247

6. BOESIGER Willy, GIRSBERGER H., Le Corbusier: 1910-65, 7ª ed.,Barcelona, Gustavo Gili, 2001,

p.182

7. GAUSA Manuel, Housing : Singular housing, Actar Barcelona, GG, 2002, p.90

Page 121: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

117

8. HENRIOT Christian et ZHENG Zu’an, Atlas de Shanghai, Espaces et représentations de 1848 à

nos jours, CNRS édictions, Paris, 1999, p.42

9. PORTAS, Nuno, “Habitação em Sesimbra”, Arquitectura, 3ª série, nº92, Lisboa, 1966, p.116

11.LIANG Zhang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus, édictions

recherches”, 2003, p.160

12. Álvaro Siza, El Croquis nº68 e 69, Madrid, 2000, p. 78

13. Álvaro Siza, El Croquis nº68 e 69, Madrid, 2000, p. 76

14. TAYLOR, Brian Brace, La modernité critique autour du CIAM 9 d’Aix en Provence, édictions

imbernon, Marseille, 2006, p.240

15. Álvaro Siza, El Croquis nº68 e 69, Madrid 2000, p. 81

16. 17. 18. Rem Koolhaas, revista “El Croquis” nº 53, Madrid, 1998

19. http://www.palgrave-journals.com/udi/journal/v12/n2/fig_tab/9000193f2.html#figure-title

22. Kasuyo Sejima, Ryue Nishizawa, El Croquis, Madrid 2004, p.23

23. GAUSA Manuel, Dicionário de metapolis avanzada, Barcelona, Actar, 2001, p.192

24. COLQUHOUN, Alan, La arquitectura moderna, una historia desapasionada, Editorial Gustavo

Gili, SA, 2005, p.184

CAPÍTULO V— CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à

Shanghai, rapport de recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.135, redesenhado

1. CYRILLE J,-D. Javary e Alain Wang, La Chine nouvelle, Petite encyclopédie Larousse, Abril 2006,

p.46

2. http://www.shanghartgallery.com/galleryarchive/artists/name/huyang/archive/Shanghai

3. MONTEYES Xavier, FUERTES Pere, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa,

Editorial Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.149

4. MONTEYS Xavier, FUERTES Pere, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa,

Editorial Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.25

5. ÁBALOS, Iñaki, A Boa-vida, Gustavo Gili, Barcelona, Gustavo Gil, 2000, p.15

6. http://www.shanghartgallery.com/galleryarchive/artists/name/huyang/archive/Shanghai

7. CLÉMENT Pierre, GED Françoise et QI Wan., Transformations de l’habitat à Shanghai, rapport de

recherches, I.F.A., Paris, 1988, p.202

8. ÁBALOS, Iñaki, A Boa-vida, Gustavo Gili, Barcelona, Gustavo Gil, 2000, p.145

9. GAUSA Manuel, diccionario metápolis de arquitectura avanzada, Barcelona, Actar, 2000, p.576

10. GAUSA Manuel, diccionario metápolis de arquitectura avanzada, Barcelona, Actar, 2000, p.429

13. Fotografia em http://www.flickr.com/photos/tags/lilong

15. GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, Actar Barcelona, Gustavo Gili, 2002, p.29

16. Kasuyo Sejma, Ryue Nishizawa , El Croquis nº121 e 122, Madrid, 2004, p.372

17. Kasuyo Sejma, Ryue Nishizawa , El Croquis nº121 e 122, Madrid, 2004, p.373

18. Kasuyo Sejma, Ryue Nishizawa , El Croquis nº121 e 122, Madrid, 2004, p.348

19. Kasuyo Sejma, Ryue Nishizawa , El Croquis nº121 e 122, Madrid, 2004, p.352

20. GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, Actar Barcelona, Gustavo Gili, 2002, p.28

23. http://www.shanghartgallery.com/galleryarchive/artists/name/huyang/archive/Shanghai

24. GAUSA, Manuel, Housing : Singular housing, Actar Barcelona, Gustavo Gili, 2002, p.30

25. MONTEYS Xavier, FUERTES Pere, Casa Collage, un ensayo sobre la arquitectura de la casa,

Editorial Gutavo Gili, SA, Barcelona, 2001, p.63

Page 122: LILONG, uma referência p/ arq. contemporânea

118

CAPÍTULO VI

2. Fotografia em http://www.graindesels.com/?p=30

6. LIANG, Zhang, La naissance du concept de patrimoine en Chine_XIX_XX siécles, Ipraus, Edicions

recherches”, 2003, p.106

19. 100 Merveilles de CHINE, édictions Grund, Paris, 2007, p.189

20. 100 Merveilles de CHINE, édictions Grund, Paris, 2007, p.189

21. Fotografia em www.playthegameoflife.org/labels/china.html

27. Kasuyo Sejma, Ryue Nishizawa , El Croquis nº121 e 122, Madrid, 2004, p.356

*Nota: as imagens que não estão aqui registadas foram por mim fotografadas em Fevereiro

de 2007, quando estive em Xangai.

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