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LICENCIATURA LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTOS José Genésio Fernandes Maria Emília Borges Daniel ead Coordenadoria de Educação Aberta e a Distância Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Livro Leitura e Produção de Texto

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Page 1: Livro Leitura e Produção de Texto

LICENCIATURA

LEITURA EPRODUÇÃO DE TEXTOS

José Genésio Fernandes

Maria Emília Borges Daniel

eadCoordenadoria de Educação

Aberta e a DistânciaUniversidade Federal

de Mato Grosso do Sul

Page 2: Livro Leitura e Produção de Texto

PRESIDENTE DA REPÚBLICALuiz Inácio Lula da Silva

MINISTRO DA EDUCAÇÃOFernando Haddad

SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIACarlos Eduardo Bielschowsky

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL

REITORManoel Catarino Paes - Peró

VICE-REITORAmaury de Souza

COORDENADOR DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA - UFMSCOORDENADOR DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL - UFMS

Antonio Lino Rodrigues de Sá

COORDENADOR ADJUNTO DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL - UFMSCristiano Costa Argemon Vieira

COORDENADORA DO CURSO DE LETRAS - PORTUGUÊS E ESPANHOL (MODALIDADE A DISTÂNCIA)Damaris Pereira Santana Lima

CÂMARA EDITORIAL

SÉRIE

Antonio Lino Rodrigues de SáDario de Oliveira Lima

Damaris Pereira Santana LimaJacira Helena do Vale Pereira

Magda Cristina Junqueira Godinho Mongelli

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APRESENTAÇÃO

Prezados aprendentes:

Bem vindos ao Curso de Graduação da Coordenadoria de Educação aDistância/UFMS! Vocês estão participando de um curso de graduação “adistância”, mas não estão sozinhos, por vários motivos.

Primeiro, porque não são alunos confinados em espaço e tempo de salade aula presencial, onde o professor tem posição privilegiada no espaço ecomando absoluto do tempo. A sala agora é bem mais ampla e sem bordas:São Gabriel do Oeste, Água Clara, Rio Brilhante; Siqueira Campos, NovaLondrina, Paranavaí, Cruzeiro do Oeste, Cidade Gaúcha; Apiaí e Igarapava.

Segundo, porque estão juntos, fazendo parte de um grande grupo depessoas no qual só existem mesmo aprendentes. São aprendentes todosos envolvidos nas atividades desta disciplina, Leitura e Produção de Textos:aqueles que optaram por outros cursos como os de Letras Português-Espanhol, Matemática, Pedagogia e Pedagogia-Educação Especial; oscoordenadores, os professores, os tutores à distância, os tutores presenciaise os bibliotecários. Todos desejosos da moeda mais cobiçada e nuncaplenamente conquistada: o conhecimento imprescindível para viver eoperar no mundo de hoje.

Assim, no horizonte de expectativas dos aprendentes, não há lugar paraaquela pedagogia da vigilância de gente sem aspiração – mas somentepara atitudes de autodisciplina, de responsabilidade e de empenho paraaprender sempre MAIS e COM os outros. Pois, como diz o poema deAntonio Machado: “Caminhante, são teus rastos o caminho, e nada mais./caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar. / Ao andar faz-se ocaminho, / E, ao olhar-se para trás, vê-se a senda que jamais se há de voltara pisar. / Caminhante, não há caminho. Somente sulcos no mar”.

Boa sorte.

Professores:José Genésio Fernandes

Maria Emília Borges Daniel

Page 4: Livro Leitura e Produção de Texto

Sobre os autores

JOSÉ GENÉSIO FERNANDESé Professor de Semiótica e de Leitura e Produção de Textos no Departamento de Letras –Centro de Ciências Humanas e Sociais – da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Atua também no Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem da mesmauniversidade. É Mestre em Teoria da Literatura, pela Universidade Federal de Pernambuco,

e Doutor em Semiótica e Lingüística Geral pela Universidade de São Paulo.É artista plástico e coordenador da revista Rabiscos de Primeira:

caderno de publicação dos alunos de graduação em Letras da UFMS.E-mail: [email protected]

MARIA EMÍLIA BORGES DANIELé Professora de Língua Portuguesa e Lingüística no Departamento de Letras –

Centro de Ciências Humanas e Sociais – da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.Atua também nos programas de pós-graduação em Estudos de Linguagem e em Educação

da mesma universidade. É Mestre em Lingüística Aplicada - Ensino e Aprendizagemde Língua Materna –, pela Universidade Estadual de Campinas, e Doutora

em Semiótica e Lingüística Geral pela Universidade de São Paulo.Atualmente desenvolve pesquisa na área de Lingüística Textual.

E-mail: [email protected]

Imagem de capa:Árvore de letras - óleo sobre cartão

Genésio Fernandes

Page 5: Livro Leitura e Produção de Texto

tânciaPara começo de conversa 7

UNIDADE 1

Fundamentos e pressupostos conceituais sobre o texto 15

1 Considerações sobre algumas noções básicas 17

1.1 Considerações sobre a noção de linguagem,língua, texto e gênero 18

1.2 Considerações sobre a noção de leitura,de produção de sentidos e de práticas de leitura 26

UNIDADE 2

O texto e suas condições de produção e interpretação 33

2 Conhecimentos de que dependem a leitura e a escrita de textos 35

2.1 A produção de textos escritos: conhecimentos a serem considerados 37

2.2 O contexto nos processos de construção de sentidos na leitura e na escrita 43

2.3 Texto e intertextualidade 47

2.4 Texto e gêneros textuais 49

UNIDADE 3

O texto e suas estratégias de construção e interpretação 59

3 Referenciação e progressão referencial 61

3.1 Estratégias de referenciação 64

3.2 Formas de introdução de referentes no modelo textual 65

3.3 Retomada ou manutenção no modelo textual 65

Coerência textual: um princípio de interpretabilidade 71

SUMÁRIO

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6 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

EM BRANCO

VERSO DE PÁGINA

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7Leitura e Produção de Textos

Vamos lá! Esta é a disciplina intitulada “Leitura e produção detextos!”.

Em nosso curso, vamos falar muito da atividade que os ho-mens realizam com a linguagem. É. Os homens agem uns sobre osoutros, com e por meio da linguagem. Já reparou? Dia e noite, elesestão produzindo e lendo textos, com algum objetivo. Dessa imen-sa produção linguageira resultam as imagens desses homens, desuas comunidades, de seus países. Se um povo morre e deixa tex-tos, podemos saber dele por meio da leitura dos textos que deixou.Se não deixa textos, desaparece para sempre.

Esta disciplina tem três unidades. Cada unidade está divididaem tópicos ou subunidades. A disciplina tem como objetivo apre-sentar e discutir pressupostos conceituais sobre o texto e compre-ender as estratégias exigidas para sua construção e interpretação.Primeiro, jogamos a peteca para você:

• O que é linguagem?

• O que é língua?

• O que é texto?

• O que é gênero?

• O que é leitura?

• Que tipos de conhecimento a leitura e a escrita mobilizam?

1 PARA COMEÇO DE CONVERSA

Está vendo? Com essas perguntas, surgemrespostas e outras perguntas na sua cabeça. Todomundo sabe um pouco. Ajuntando esse pouco

com o pouco que os outros sabem dá uma boladagrande... de sabedoria. Tente responder a essas

questões e anote suas reflexões. Assim, no final dadisciplina, você poderá verificar se o que já sabe

cresceu com a contribuição das aulas,das leituras e dos colegas.

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8 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Perguntando e respondendo, você vai fazer o seu caminho de“aprendente”. Seus colegas e nós, também. Aprendemos a vidainteira e aprendemos mais quando ninguém nos obriga a isso. Éou não é? Como diz o poema de Antonio Machado, o caminho sefaz caminhando:

Caminhante, são teus rastos o caminho, e nada mais.Caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar.

Ao andar faz-se o caminho,E, ao olhar-se para trás, vê-se a senda que jamais se há de voltar a pisar.

Caminhante, não há caminho. Somente sulcos no mar

1.1 Introduzindo a DisciplinaA disciplina LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTO é obrigatória

para os alunos dos diferentes Cursos de Graduação. O objetivo delaé contribuir para que o aluno tenha bom desempenho em duasatividades de linguagem, indispensáveis em qualquer área do co-nhecimento.

São essas mesmas em que você está pensando: atividades deleitura e de produção de textos.

Como um aluno de matemática, de pedagogia ou de letras podecumprir as atividades do curso sem aptidão para ler e escrever tex-tos? Como poderá interagir com o conhecimento produzido e ar-mazenado nos livros e nos sites da Internet? Como poderá interagircom os colegas do curso, lendo e redigindo textos para construir eexpor suas idéias, para concordar ou discordar dos outros? Tudopassa pela linguagem.

A questão da linguagem é, pois, uma questão central para to-dos os domínios do conhecimento, para todos os cursos, para to-das as disciplinas. Esta disciplina tem como objetivo oferecer opor-tunidade de você se tornar um bom leitor e produtor de textos.Entretanto, esse não é objetivo só desta disciplina, mas de todas asoutras, durante todo o tempo que durar seu Curso de Gradua-ção. Trata-se de um aprendizado constante e da responsabilidadede todos os professores – não somente do professor de LínguaPortuguesa. Saber ler e produzir textos com proficiência é o maissignificativo sinal de bom desempenho lingüístico, como bemobserva Fiorin (2003, p. 3).

Quais são essas atividades que tanto o aluno dematemática quanto o aluno de psicologia é obrigado a

realizar no Curso de Graduação?

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9Leitura e Produção de Textos

Mas o que é saber ler?

Podemos afirmar que um aluno é bom leitor quando demons-tra ser capaz de interagir com o autor, por meio do texto, e deconstruir os significados inscritos no interior de um texto, rela-cionando tais significados com o conhecimento de mundo doseu tempo. Ler é, portanto, uma atividade complexa de cons-trução de um sentido para o texto, utilizando o conhecimentolingüístico, o conhecimento de mundo e o conhecimento ad-quirido nos livros.

É ser capaz de realizar a ação que se tem em mente, por meiodo texto. Um exemplo ajuda a entender isso. Se minha loja deeletrodoméstico está com o estoque baixo, preciso fazer o meu for-necedor saber disso, das minhas necessidades, do meu interessede compra, da quantidade e das especificidades dos produtos de-sejados. Uma ação como essa se faz por meio da redação de umgênero específico de texto: o pedido de compra. Você pode medizer que isso até o carregador da loja sabe fazer, sem muito estu-do. Ele pode dispor de informações sobre tudo o que a loja precisae até mais do que o dono. Sabe, sim. O que ele não sabe é identifi-car o gênero de texto apropriado para fazer isso, hierarquizar asinformações e estabelecer relações apropriadas entre elas, para ar-gumentar e defender pontos de vistas. Essa capacidade de realizartais articulações no interior de um texto não é muito comum hojeem dia.

Muita gente pensa que essa capacidade é resultado de bons co-nhecimentos gramaticais e de rigoroso treinamento em redação eanálise de frases isoladas. Grande engano! É preciso muito mais doque isso, pois a construção de um determinado gênero de textoenvolve atividades mais complexas do que a justaposição de umafrase ao lado de outra. Envolve conhecimento dos mecanismos deconstrução textual e capacidade de operar com eles para produziros efeitos de sentido pretendidos.

Esperamos que você vá fazendo o seu caminho de aprendentenessa teia de interações com os colegas, os professores e os tutorese que esta disciplina contribua para que tenha sucesso no cursoescolhido. Esperamos que possamos nos tornar uma comunidadeaprendente, isto é, todos nós nos colocando em atitude de ensinare de aprender, abertos para o novo e capazes de socializar experi-ências e conhecimentos.

Que a sua caminhada nesta disciplina seja prazerosamenteenriquecedora!

E o que é ser bom produtor de texto?

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10 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

1.2 Plano da Disciplina:Leitura e Produção de Texto

Carga horária: 60 horas

Professores: José Genésio Fernandes e Maria Emília Borges Daniel

OBJETIVOS

Geral:Possibilitar o desenvolvimento de competências, habilidades e es-tratégias essenciais para a leitura e a produção de textos, com vistasà conscientização sobre a natureza sociointerativa da linguagemno processo de formação integral do educador.

Específicos:– dar condições para o aluno compreender o texto como um todode sentido, um tecido cujo fim é a produção de efeitos de sentido;– possibilitar a compreensão do gênero de texto como forma deação social e historicamente situada;– possibilitar a compreensão da leitura como um processo com-plexo de construção de sentido;– oferecer conhecimentos e exercícios para o aprimoramento dacapacidade de leitura e de produção de diferentes gêneros de tex-tos, de maneira crítica.

EXPERIÊNCIAS DE APRENDIZAGEM

Ao longo de cada unidade serão propostas leituras e atividades aserem desenvolvidas individualmente, discutidas com o Tutor esocializadas, isto é, colocadas no FÓRUM para leitura e apreciaçãode todos os participantes de todas as cidades.

Leituras: em cada unidade será apresentado um tema (Texto-base),a ser estudado e debatido e a indicação de Leituras Complementa-res (Saber mais). Para aprofundamento de subtemas, serãoindicadas obras ou páginas na Internet (Referências).

Interação: para discussão dos textos e das atividades, o aprendentecontará com o apoio do tutor, recorrendo a diferentes ferramentas

TEMAS

Unidade IIO texto e suas condições de

produção e interpretação

Unidade IFundamentos e pressupostos

conceituais sobre o texto

Unidade IIIO texto e suas estratégias de

construção e interpretação

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11Leitura e Produção de Textos

e meios de comunicação (tira-dúvidas, bate-papo, telefone, fax), epoderá trocar idéias com colegas de curso (Fórum, Webmail).

Processo avaliativo

As atividades de aprendizagem encontradas nas unidades ser-vem de auto-avaliação e são discutidas nos momentos do Fórum edo Bate-Papo.

Ao final da disciplina, apoiado nas reflexões construídas ao lon-go das leituras, o aprendente produzirá texto sobre bases teórico-metodológicas do projeto pedagógico do curso a distância em quevai atuar.

AMPLIANDO HORIZONTES

Como você pode observar no Plano do curso, o objetivo centraldesta disciplina é colocar você em contato com um saber e um saber-fazer específicos: leitura e produção de diferentes gêneros de texto, ouseja, possibilitar-lhe o desenvolvimento de competências, habili-dades e estratégias essenciais para a leitura e a produção de textosde circulação geral e acadêmica, com vistas à conscientização so-bre a natureza sociointerativa da linguagem no processo de suaformação profissional integral.

Por isso, organizamos o seu percurso em 3 unidades temáticas:

Na unidade I – Fundamentos e pressupostos conceituais so-bre o texto: faremos estudos do texto em suas dimensões teórica eprática, enfocando seus aspectos constitutivos mais fundamentais,desde as condições externas de produção e interpretação até oselementos internos de configuração textual e enunciativa, demons-trando que a leitura e a produção de textos são atividades de cons-trução de sentido que pressupõem a interação autor-texto-leitor

Na unidade II – O texto e suas condições de produção e in-terpretação: discutiremos que, além das pistas e sinalizações que otexto oferece, entram em jogo, na construção do sentido, os co-nhecimentos do leitor e do produtor. É desses conhecimentos quetrataremos nessa unidade.

Na unidade III – O texto e suas estratégias de construção einterpretação: enfatizaremos que a referenciação é uma atividadediscursiva e que o processamento textual se dá numa oscilação entrevários movimentos: um para a frente(projetivo) e outro para trás (retrospec-tivo), representáveis parcialmente pelacatáfora e pela anáfora, respectivamen-te, além dos movimentos abruptos, fu-sões, alusões, etc.

Conforme Koch & Elias (2006, p. 135), “As-sim sendo, longe de se constituir como a somade elementos novos com outros já postos emetapas posteriores, o texto é um universo derelações seqüenciadas, mas não lineares”.

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12 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

PONTO DE ENCONTRO

Esperamos que, ao final das leituras e discussões feitas ao longoda Disciplina, você possa:

• conhecer e discutir os fundamentos e pressupostos conceituaissobre texto e leitura, compreendendo a produção e a leitura detextos como atividades interativas de construção de sentido;

• analisar o texto, considerando-o dentro de suas condições deprodução e interpretação;

• avaliar o texto, levando em consideração suas estratégias deconstrução e interpretação.

Nos encontros a distância, a intenção é provocar sua reflexãosobre essa coisa que é como a água para o peixe: a linguagem, esselíquido, esse ar dentro do qual e a partir do qual os homens criamum mundo de significados. No bojo dessa questão, a compreensãodo processo de produção de texto e de leitura é fundamental parao sucesso do aprendente em qualquer disciplina, de qualquer curso.

Nos momentos de “encontro”, suas reflexões serão socializadasnos espaços que a plataforma disponibilizar e/ou presencialmente.

GLOSSÁRIO

A ser construído por todos ao longo das atividades do módulo.

– Linguagem: é uma faculdade, uma capacidade humana. É essacapacidade que distingue os homens dos animais.

– Língua: é um conjunto de convenções, para permitir o exercícioda faculdade de linguagem – faculdade essa que, como vimos,preexiste como entidade abstrata a todo e qualquer ato decomunicação. Com a palavra língua, devemos entender o material,léxico, gramatical, estocado em competência. A Língua, o conjuntode convenções, é o que permite ao homem o exercício da linguagemcomo uma capacidade humana. A língua é um produto social dafaculdade de linguagem.

– Texto: é um todo organizado de sentido. Dizer que ele é um todoorganizado de sentido implica afirmar que o texto é um conjuntoformado de partes solidárias, ou seja, que o sentido de umadepende das outras.

Desejamos a você boas leituras e ótimas reflexões.E que o caminhante, aqui e ali, tenha companhias

na viagem de eterno aprendente.

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13Leitura e Produção de Textos

– Gênero: é uma forma de ação sócio-histórica.

– Leitura: é um processo complexo de construção ou de atribuiçãode sentido, por meio da interação do leitor com o autor, mediadapelo texto. Ler não é pegar um sentido pronto, já presente no texto,diante dos nossos olhos. A atividade de ler é uma construção desentido. Construção solitária? Não. Uma construção solidária emque eu construo o sentido numa relação que envolve o leitor comsua história de vida e de leitura; o texto como uma construção; oautor que o elaborou num tempo e num espaço determinados ecom algum propósito.

– Práticas de leitura; o que é isso? Melhor definir isso,primeiramente, por meio de exemplo: a prática do comer dosribeirinhos do rio Acre não é a mesma de uma cidade do sul doBrasil. Uma moça do Acre foi um dia para um encontro em umhotel do sul. Depois de 4 dias, disse: não vejo a hora de voltar paracasa para poder almoçar gostoso. Assustado, um dos participantesexclamou: nossa, mas você não almoçou nesses quatro dias queestá aqui!? Sim, disse ela, mas isso aqui não é almoçar gostoso comona minha casa. Aqui tem muito talher, muita etiqueta do que podee não pode fazer à mesa. Na minha casa temos outras maneiras decomer: sentamos juntos à mesa ou no chão para comer, pegamosos alimentos com as mãos para colocar na boca. Almoçar gostoso éisso, à maneira lá de casa. Se eu fizer isso aqui, vão estranhar e atéter nojo de mim. Assim, também existem PRÁTICAS DE LEITURA,maneiras diferentes de usar o livro. A leitura é uma práticaencarnada em gestos, espaços e hábitos. Na leitura religiosa,recomenda-se beijar a bíblia etc. Você já leu aquele livro intitulado“livros que se lêem com uma mão só”? Existem lugares mais oumenos apropriados para a leitura de certas obras. Cada comunidadede leitores tem seus hábitos. Existe a prática da leitura do romancesentimental; a prática da leitura do romance policial; a prática daleitura acadêmica e tantas outras. Cada uma com seus gestos, seusespaços, suas competências, sua temática e seus objetivosespecíficos.

– Etnocentrismo espontâneo da leitura: essa expressão denominaaquela atitude espontânea de pensar que a única prática de leituraexistente na sociedade é aquela praticada pelos letrados, peloschamados de gente culta. A expressão é do autor brasileiro JoãoHansen e mencionada por Roger Chartier em sua obra “Au bordde la falaise”.

– Produção de texto: é o processo complexo de construção desentidos por meio da interação do autor com o leitor mediado pelotexto. Ou seja, é um projeto de dizer, constituído em uma dadasituação comunicativa, para alguém, com certa finalidade e de umdeterminado modo, dentre tantos outros possíveis.

Se um dia tiverinteresse em sabermais, leia aA ordem dos livros,de: Roger Chartier(Brasília: EditoraUnB,1994).

Saiba mais

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14 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

REFERÊNCIAS:OBRAS A SEREM UTILIZADAS PELOS ALUNOS

1. KOCH, Ingedore G. Villaça. e ELIAS, Vanda Maria. Ler ecompreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2006.

2. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: definição efuncionalidade. In: DIONÍSIO, Ângela P., MACHADO, Anna R.e BEZERRA, Maria A. (Orgs.) Gêneros textuais & ensino.Rio de Janeiro: Lucerna, 2002, p. 18 a 36.

3. ______ Gêneros textuais: configuração, dinamicidade ecirculação. In; KARVNOSKI, Acir Mário & GRYDECZKA (Orgs).Gêneros textuais: reflexões e ensino. Paraná: Haygangue, 2005.

4. SAVIOLI, Francisco Platão e FIORIN, José Luiz. Lições detexto: leitura e redação. 4. ed., São Paulo: Ática, 2003.

REFERÊNCIAS:OBRAS CONSULTADAS

ANTUNES, Irandé. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo:Parábola Editorial, 2005.

CARNEIRO, Agostinho Dias. Redação em construção: a escritura do texto. 2.ed., São Paulo: Moderna, 2001.

CULIOLI, A. Pour une linguistique de l’énonciation. 3 vol. Paris: Opherys,1990-1999.

DELL’ISOLA, Regina Lúcia P. Retextualização de gêneros escritos. Rio deJaneiro: Lucerna, 2007.

DRUMMOND, Carlos Drummond de. O poder ultrajovem. São Paulo: Record,1992, p. 49.

ILARI, Rodolfo. Introdução à semântica: brincando com a gramática. 2. ed.,São Paulo: Contexto, 2001.

————. Introdução ao léxico: brincando com as palavras. São Paulo:Contexto, 2002.

KOCH, Ingedore V. O texto e a construção dos sentidos. São Paulo: Contexto,2006.

_______ Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002.

LAKOFF, G. & JOHNSON, M. Metaphores we live by. Chicago: The ChicagoUniversity Press, 1980.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita: atividades deretextualização. 6. ed., São Paulo: Cortez, 2005

NEVES, Maria Helena Moura. Gramática de usos do português. São Paulo:Editora da Unesp, 2000.

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15Leitura e Produção de Textos

UNIDADE 1

Fundamentos epressupostos conceituais

sobre o texto

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16 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Esta é a primeira unidade do módulo. Mãos à obra.O objetivo central é que você possa conhecer e discutir algunsfundamentos e pressupostos conceituais sobre o texto e a leituracomo atividades de produção de sentido na interação humana.

Para tornar a leitura mais suave e as discussões focadasem aspectos específicos, dividimos esta primeiraunidade em três subunidades.

Pode começar a leitura. Mas, lembre-se: você não está emuma aula daquelas entre quatro paredes.Você é o caminhante, o aprendente.Você é que faz o seu mapa de viagem.Pode iniciar a leitura pelotópico que mais lhe interessar.

1.1 Considerações sobre a noção de linguagem,língua, texto e gênero.

1.2 Considerações sobre a noção de leitura,de produção de sentidos e de práticas de leitura.

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17Leitura e Produção de Textos

O que é linguagem? O que é língua? O que é um texto? Comoé produzido o sentido no texto? Uma carta íntima é um texto? Ooutdoor da sua rua é um texto? E uma foto do álbum de família,uma escultura, uma partitura musical: são todos textos? O que éleitura? É pegar um sentido pronto no texto? É construir um sen-tido para o texto? Ler é uma atividade solitária ou não? O que seentende por prática de leitura? É correto discriminar tipos de leito-res e de leituras?

Produção de texto e de leitura são atividades que realizamoscom e por meio da linguagem, para produzir sentido, e dependemde muitos conhecimentos. Quais, por exemplo?

1 CONSIDERAÇÕES SOBRE ALGUMAS NOÇÕES BÁSICAS

Não. Não precisa responder agora. Nem espere que agente lhe dê a resposta. As perguntas são para

começar a pensar no assunto. A gente sempre sabealguma coisa. Vamos retomar essas questões ao final

da leitura dessa unidade e conversar sobre isso.Certo?

Você já sabe que, aqui, ninguém dá mapa docaminho para o caminhante. Assim, se o desejar,antes de ler o TEXTO-BASE deste tópico, leia oprimeiro capítulo do livro-texto, intitulado Ler ecompreender os sentidos do texto, de Ingedore V.Koch e Vanda Maria Elias. São Paulo: Contexto,2006, p. 9-37. Leia, também, a lição número 1,intitulada Considerações sobre a noção de texto,no livro Lições de texto: leitura e redação, de JoséLuiz Fiorin e Francisco Platão. São Paulo: Con-texto, 2003, p. 11-24.

Convite...

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18 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

1.1 Considerações sobre a noção de linguagem,língua, texto e gênero

O homem está no mundo, na vida. Os animais também. Ho-mens e animais estão sempre agindo de alguma forma para atingirseus objetivos. A diferença é que os animais agem por instinto. Porinstinto, o cão bravio ataca, mata e pronto. Nunca vimos um cãosofrendo de remorso. Os animais não lidam com um mundo designificação, produzido na e por meio da linguagem. Eles não sen-tem a necessidade de atribuir significação às coisas para realizarsuas ações. O homem, sim. Ele pode até matar, como o cão bravio,mas sofrerá, depois, para harmonizar o significado de sua ação como mundo de significação, de valores, no qual ele vive e se movecomo o peixe na água.

O mundo dele é um mundo humano, significativo para ele.Para agir, o homem depende de dar uma significação às suas ações.

Quando os espanhóis colonizaram o México, dominando os ín-dios, surgiram perguntas muito sérias para eles: o que é um índio,é bicho ou gente? Ele tem alma? Para facilitar a conquista, matan-do-os, era preciso responder a essas questões. Assim, houve longosdebates sobre se os silvícolas eram animais ou homens, se tinhamalma ou não. E os colonizadores mais ferozes bem que desejaramque os debates concluíssem pela definição dos índios como bichos,pois, assim, a empreitada colonizadora viraria uma alegre caçada,sem nenhum problema. Isso quer dizer que eles tiveram de lidarcom algumas noções, afirmar um ponto de vista. Os homens agemsempre de um ponto de vista que faz sentido para eles.

Na universidade, os acadêmicos realizam ações para conhecer omundo da linguagem. Para isso, partem sempre do esclarecimen-to de algumas noções, definindo o ponto de vista mais adequadopara a ação de conhecer. Há muitos pontos de vista teóricos: é pre-ciso escolher o mais adequado. Assim, vamos ter de começar nos-so estudo pelo esclarecimento de algumas noções importantes paraquem se dedica ao estudo da linguagem no que diz respeito à leitu-ra e à produção de texto. Se vamos nos ocupar de linguagem, delíngua, de sentido, de texto, de leitura e produção de textos, é pre-ciso, primeiramente, fazer algumas perguntas.

O que é linguagem? o que é língua? O que é texto?O que é leitura e produção de texto e de sentido?

É preciso um esforço para dar respostas mais apropriadas a es-sas questões. Podemos começar por pensar no assunto, por nósmesmos. Todo mundo sabe um pouco sobre o que seja a lingua-

Um exemplo!

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19Leitura e Produção de Textos

A linguagem – a fala humana – é uma inesgotável riqueza demúltiplos valores. A linguagem é inseparável do homem e se-gue-o em todos os seus atos. A linguagem é o instrumento gra-ças ao qual o homem modela o seu pensamento, seus senti-mentos, suas emoções, seus esforços, sua vontade e seus atos, oinstrumento graças ao qual ele influencia e é influenciado, abase última e mais profunda da sociedade humana. Mas é tam-bém o recurso último e indispensável do homem, seu refúgionas horas solitárias em que o espírito luta com a existência, equando o conflito se resolve no monólogo do poeta e na medi-tação do pensador. Antes mesmo do primeiro despertar de nossaconsciência, as palavras já ressoavam à nossa volta, prontas paraenvolver os primeiros germes frágeis de nosso pensamento e anos acompanhar inseparavelmente através da vida, desde asmais humildes ocupações da vida quotidiana aos momentosmais sublimes e mais íntimos dos quais a vida de todos os diasretira, graças às lembranças encarnadas pela linguagem, força ecalor. A linguagem não é um simples acompanhante, mas simum fio profundamente tecido na trama do pensamento; para oindivíduo, é o tesouro da memória e a consciência vigilantetransmitida de pais para filho. Para o bem e para o mal, a fala éa marca da personalidade, da terra natal e da nação, o título denobreza da humanidade. O desenvolvimento da linguagem estátão inextricavelmente ligado ao da personalidade de cada indi-víduo, da terra natal, da nação, da humanidade, da própria vida,que é possível indagar-se se ela não passa de um simples refle-xo ou se ela não é tudo isso: a própria fonte do desenvolvimen-to dessas coisas.

gem. Sabe, sim, pois todos nós nos movemos nela e por meio dela,como o peixe na água.

A linguagem é uma faculdade humana, uma capacidade que ohomem tem de se comunicar com seus semelhantes, é uma abs-tração.

Há grandes estudiosos da linguagem. Um deles é Hjelmslev.Vejamos o que ele diz na obra, intitulada Prolegômenos a uma teo-ria da linguagem, Editora Perspectiva, pp. 1-5. É um dos mais be-los textos sobre o estudo da linguagem:

A linguagem é, pois, uma faculdade, uma capacidade humana.Uma capacidade que os animais não possuem. Por isso o texto dizque ela é o título de nobreza do homem. É essa capacidade quedistingue o homem dos outros animais.

Não é bonito?

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20 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Língua. O que devemos entender com esse conceito?

A língua é um conjunto de convenções, para permitir o exer-cício da faculdade de linguagem – faculdade essa que, como vi-mos, preexiste como entidade abstrata a todo e qualquer ato decomunicação. Com a palavra língua, devemos entender o materi-al léxico e gramatical, estocado em competência.

A Língua, o conjunto de convenções, é o que permite ao homem oexercício da linguagem como uma capacidade humana.

Acrescentemos mais uma coisa: a língua é um produto socialda faculdade de linguagem. O que isso quer dizer? Quer dizer queninguém, sozinho, pode criar a língua ou modificá-la. Você deveter visto aquela discussão na TV, no rádio ou em revistas e jornais,sobre uma antiga proposta de troca da palavra futebol pela palavraludopédio. Viu? Pois é, de vez em quando aparece uma pessoa, comoum tal de Antônio de Castro Lopes, querendo criar a língua sozi-nho. As pessoas acham graça e só. Por quê? Porque uma palavraentra no dicionário, somente quando a sociedade toda entra emacordo sobre sua adoção na forma e no conteúdo, quando passa ausá-la. A língua só existe em virtude de um contrato estabelecidoentre os membros da comunidade. Por isso se diz que ela é supra-individual, na medida em que é um objeto convencional, fruto deum pacto social.

O indivíduo tem de aprender a língua, para poder exercer bema capacidade de linguagem que possui. Conforme afirma Culioli(1990, p.14), a “[...] atividade da linguagem remete a uma ativida-de de reprodução e de reconhecimento das formas, ora, essas for-mas não podem ser estudadas independentemente dos textos, e ostextos não podem ser independentes das línguas”.

Está entendendo?

Linguagem

uma capacidade humana

Língua

conjunto de convenções eregras, para permitir o

exercício da faculdade de

linguagem

Se você quiser ver alista de palavras queo médico Antonio deCastro Lopes queriacriar sozinho para alíngua portuguesa,acesse o nome deleno Google.

Muito bem. Tendo essa capacidade da linguagem e possuindouma língua, a portuguesa, por exemplo, o homem produz textosna vida social. O que é texto? Uma carta íntima é um texto? Umromance é um texto? E um bilhetinho? Um convite de casamento,

Saiba mais

Não é demais repetir:veja o quadro:

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21Leitura e Produção de Textos

Observe os textos 1, 2 e 3, a seguir:

Genésio FernandesDesenho para a série

Figuras da foliaNanquim sobre papel, 2007

12cm X 10cm

Texto 1

Texto 2

Texto 3

uma conta de luz são textos? Se você pensou em afirmar que sim,acertou. São textos verbais.

Mas e uma fotografia? É um texto? Uma escultura, um dese-nho, uma partitura musical? Certamente você pensou que sim.Pode até ter tido uma pequena dúvida, mas pensou que sim. Sãotextos, sem dúvida alguma! Não são textos verbais, mas são textosvisuais ou audiovisuais. E o outdoor, os programas de TV, as tirinhasde jornal, as propagandas? São também textos? Sem dúvida. Sãoos chamados textos sincréticos, isto é, aqueles que utilizam váriasformas de expressão: o verbal e o audiovisual.

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22 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Veja bem. Os homens, possuindo a capacidade da linguagem,não param de produzir textos, utilizando as mais variadas formasde expressão. No bilhete, utilizam a expressão verbal, as palavrasda língua e todos os recursos que ela possui. Na música, utilizamos sons e, na escultura, o volume. No desenho, usam a linha e, napintura, as cores. Na propaganda, nos programas de TV e nos fil-mes, utilizam todos esses meios de expressão juntos, combinados.Na vida moderna, a cada batida do nosso coração, surgem bilhõesde textos. Podemos dizer que nossa vida está envolvida numatextosfera.

No dia 21/11/2007, a Folha de S. Paulo deu a notícia de quepesquisadores europeus encontraram a garra fossilizada de umescorpião do mar, de 2,5 metros de comprimento, em uma pedrei-ra, na Alemanha. A matéria apresentava um desenho do escorpiãoao lado de um homem, para melhor indicar seu tamanho. Trêsdias depois, aparecia na Folha esta tirinha:

Quer um exemplo?

Folha de S. Paulo, 24 nov. 2007

Texto 4

Veja: o leitor que não acompanhou o noticiário da Folha nos diasanteriores terá mais dificuldade para compreender a tirinha. Hoje éassim: aparece um texto na imprensa e, poucos dias depois, apare-cem outros textos cuja leitura depende do conhecimento do primei-ro. É como se estivéssemos condenados a ler tudo para poder ler.

Estamos rodeados de textos. E não tem querer ou não querer. Elesnão pedem licença: simplesmente invadem nossa vida, por meiodos nossos cinco sentidos. Mas é preciso insistir: o que é mesmoum texto? Veja os textos 5 e 6, abaixo:

Texto 5

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23Leitura e Produção de Textos

Texto 6

A escritura ele ficou brabo carro e mulher nada disso terra eenchente, pois a reza nem acabou e era chofer do ônibus quan-do a bíblia entra. Cachorro cachorro e o pneu nada vai dar cer-to na bíblia. Vendido foi debandou o boi tem carro novo é as-sim mesmo. Quando e o céu com o padre, chove as peças che-gam e tem enxada, nada de mais. Não vale. Macarrão nem deusouve a oração peca. Falaram na dona e roça assombração o matovirou

Texto vem do verbo tecer. Se digo que minha avó teceu umatoalha de mesa, o que está implícito no que digo? Que ela amon-toou um punhado de fios, de qualquer jeito? Não! Certamente,não. Se você está pensando que o certo é dizer que ela organizou osfios para formar a toalha, então acertou.

Leia novamente os dois textos acima: qual deles parece maisum amontoado de palavras do que uma organização, com algumpropósito determinado? O Texto 5 ou o Texto 6? Certamente oTexto 6. O Texto 6 é um amontoado de palavras, sem nexo. Aspartes não formam um todo de sentido. Esse amontoado de pala-vras é tão doido que não dá para perceber quem fala, o que fala,para quem e com que objetivo. Se você acha que isso é coisa delouco, acertou.

Quem vai a uma roça chamada Barra, em um dos grotões deMinas, encontra um louco. Ele vai à janela do carro e fala assim. Osvisitantes do lugar, por educação, fingem que entendem e dizem:sim, é... sim..., sim senhor!. Não deixa de ser uma cena de tentativade comunicação, mas quem participa dela não consegue construirum sentido para o palavreado que ele vai amontoando na sua fala.Um texto é, portanto, um todo organizado de sentido. É um todoque faz sentido como um todo. Veja bem: não é uma soma de suaspartes. Não se trata de soma de partes.

Se lhe derem a ler somente o quadrinho da terceira parte doTexto 5, o máximo que você poderia ler é que se trata de uma brigade dois personagens que discordam da posição da frente de algu-ma coisa. Não saberíamos bem quem é a terceira personagem da

Releia o Texto 5. Se alguém recortar a tira emquatro partes, embaralhá-las e for dando uma de cada vezpara ler, você vai ver que cada uma delas tem um sentido

particular e não o sentido do todo.

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24 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

cena e nem por que a imagem dela está diluída, pois não disporía-mos das figuras que ela tem nos outros quadrinhos (primeiro esegundo). Além disso, a primeira coisa que o texto perde, se forrecortado, é o contexto de produção. Nem mesmo saberíamos aque gênero de texto pertenceria. Ou seja, ninguém saberia mais seo terceiro quadrinho é uma tirinha de jornal ou uma ilustraçãoisolada de um livro. Não saberia também da relação do texto comoutro texto, o das histórias em quadrinhos da crítica Mafalda, cri-ada pelo argentino Quino.

Lendo a parte, o leitor percebe um sentido que não é o mesmodo todo. No seu todo, lemos que Mafalda lança a pergunta aoscolegas: “Para onde vocês acham que a humanidade está indo?”Para dar a resposta, os dois meninos entram numa disputa verbal.Eles discordam do sentido da palavra “frente”. Nenhum deles cedeà possibilidade de a “frente” significar o que o outro quer. O que otodo do texto permite ler é que o entendimento entre as pessoas ésempre difícil, mesmo quando as posições parecem convergir. Todomundo concorda que a humanidade tem de evoluir, de ir para afrente, mas não consegue fechar acordo sobre o sentido/direção daexpressão “para frente”.

Portanto, o sentido do texto não é a soma do sentido de cadaparte isolada. O sentido do texto é o que resulta da construção dotodo do texto, pela relação entre as partes que o compõem. Não dápara compreender o todo do texto, lendo somente partes isoladas.Guarde esta palavra: relação. Tudo no texto significa por meio derelações. Relação de muitas coisas. Você compreenderá isso cada

vez mais à medida que for estudando.

Falta ainda dizer que um texto é sempreuma resposta a um discurso anterior sobrequalquer coisa. Quer um exemplo disso? Porvolta de 1970/1980, as rádios não paravamde tocar a música de um cantor popularchamado Odair José, considerado brega.Essa letra, Texto 7, convoca o povo a parar

de tomar a pílula. Esse discurso não surgiu do nada e por nada. Elesurgiu em resposta a um outro discurso já existente na época.

Primeiro, leia o texto da letra e depois responda:qual era esse outro discurso, o que ele

recomendava ao povo?

Acesse o site do cantor Odair José, no Google,se quiser ouvir a música. É considerada brega,mas não deixa de ser um documento do queaconteceu no Brasil, na época.Se tiver interesse por estudos da cultura e dahistória, por meio de letras como essa, veja olivro “Eu Não Sou Cachorro, Não” de PauloCésar de Araújo, que é referência obrigatóriano estudo da música popular brasileira. Veja:www.brasilcultura.com.br/conteudo.php?id=480&menu=92&sub=518 – 29k.

Saiba mais

Page 25: Livro Leitura e Produção de Texto

25Leitura e Produção de Textos

Texto 7:

PARE DE TOMAR A PÍLULA

Já nem sei há quanto temponossa vida é uma vida sóe nada mais

Nossos dias vão passandoe você sempre deixandotudo pra depois

Todo dia a gente amamas você não quer deixar nascero fruto desse amor

Não entende que é precisoter alguém em nossa vidaseja como for

Você diz que me adoraque tudo nessa vida sou euentão eu quero ver vocêesperando um filho meuentao eu quero ver vocêesperando um filho meu

(REFRÃO)Pare de tomar a pílulaPare de tomar a pílulaPare de tomar a pílulaPorque ela não deixa o nossofilho nascer (3x)

Você diz que me adoraQue tudo nessa vida sou euEntao eu quero ver vocêEsperando um filho meuEntao eu quero ver vocêEsperando um filho meu

Pare de tomar a pílulaPare de tomar a pílulaPare de tomar a pílulaPorque ela não deixa o nossofilho nascer (3x)

Veja você que o texto repete sem cessar um refrão: “pare detomar a pílula!”. O texto dessa música era uma resposta a um outrodiscurso cuja prática já estava em andamento: o discurso do Governoda ditadura militar, que pedia para a população tomar a pílulaanticoncepcional. Os Estados Unidos exigiram do Brasil umprograma de controle da natalidade como condição para liberarempréstimos. O Governo não teve saída: mesmo a contragosto daIgreja católica, adotou o programa. Odair José foi, então, a voz querepetia para os ouvidos da população o discurso da Igreja católica,contra o programa de controle da natalidade. Resumindo:

• a linguagem é uma faculdade humana;• a língua é o conjunto de convenções e regras, para permitir o exercício dafaculdade de linguagem;• tendo essa capacidade e sabendo a língua, o homem produz textos para secomunicar;• o texto é um todo organizado de sentido e não um aglomerado de partes;• os textos podem ser verbais e não-verbais;• o texto é produzido sempre como uma resposta a um discurso anterior;• atribuir sentido a um texto depende, portanto, de uma interação entre quem oproduz e quem o recebe e da ativação de uma série de conhecimentos e habilidadespor parte de ambos. Por essa razão é que falamos de UM sentido para o texto e nãode O sentido.

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26 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

1.2 Considerações sobre a noção de leitura,de produção de sentidos e de práticas de leitura

Muito bem. Coloque a mão no lado esquerdo do peito: imagineque a cada batida do coração, os homens produzem milhares detextos. Mas os homens não produzem textos indiferenciadamente,assim como Deus não criou os animais todos iguais. Nos estudosde Biologia, vemos que os animais são distribuídos em gêneros eespécies.

No mundo da linguagem, os textos compreendem gêneros di-ferentes. Cada gênero de texto serve para os homens realizaremações diferentes. Os gêneros são, portanto, formas de ação. Quemvai escrever um texto sabe que vai fazer uma ação específica, comum fim específico e sabe que gênero de texto deve escolher pararealizar bem a ação pretendida.

Por exemplo, para realizar a ação de fazer alguém querido saberde seus sentimentos íntimos, você sabe que tem de escolher o gê-nero certo para fazer isso: a carta íntima. A carta é um gênero detexto, a ferramenta certa para comunicar assuntos pessoais e ínti-mos entre amigos ou pessoas que se amam. Escolher um gênerode texto para realizar uma ação, como a de fazer um pedido deemprego, é como escolher a roupa certa para ir a uma festa decasamento, à noite, em uma igreja. Ninguém vai com a roupa quebem quer. Escolhe uma roupa considerada apropriada para aquelasituação social.

Quer dizer socialmente aceita,historicamente aceita. Ninguém vai a uma festa dessas usandobiquini e nem uma roupa do século 17. A não ser que queira reali-zar outra ação: a de chocar.

Quem não sabe escolher e produzir o gênero de texto apropria-do para fazer a ação de pedir um emprego, por exemplo, tem me-nor chance de exercer a cidadania.

Porque na luta para conseguir o emprego,ele já sai perdedor.

Lembremos ainda que, para atribuir sentido a um texto, preci-samos saber a que gênero ele pertence. Sabemos disso por meiodo conhecimento cultural ou por meio do estudo. Na página 20,você viu o Texto 5, a tirinha da Mafalda. Vimos que a leitura de umsó quadrinho não permitia construir o sentido do texto 5 comoum todo. Agora, com essas considerações, você sabe por quê. Por-que, olhando um só quadrinho da tirinha, não é possível saber aação que o texto pretende realizar. Não é possível saber a que gêne-ro pertence. Somente o conhecimento da tirinha como um gênerohumorístico permite ao leitor construir o sentido global do texto,considerando essa instrução genérica. Ou seja, o leitor é instruído aproduzir sentido de humor e não de tragédia, por exemplo.

Que quer dizer apropriada?

Por quê?

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27Leitura e Produção de Textos

Então fiquemos, por ora, sabendo do seguinte:

• o gênero é uma forma de ação sócio-histórica, uma ferra-menta;

• saber escolher o gênero de texto apropriado para realizar umaação e saber escrevê-lo bem são habilidades importantes para oexercício da cidadania;

• conhecer o gênero de um texto é condição necessária parauma adequada atribuição de sentido a esse texto, pois o gênerodá instrução a respeito da ação que se pratica por meio dele.

O estudante brasileiro tem a capacidade da linguagem, ele co-nhece a língua portuguesa, ele sabe o que é um texto, ele sabe queo gênero é uma forma de ação, ele escolhe um gênero apropriadopara realizar uma ação determinada. Assim, pode produzir milhõesde textos. Como dissemos, estamos hoje envolvidos numa textosfera.Então falta falar de uma outra coisa: da leitura. O que é leitura? Oque é ler?

Aqui, é preciso um esclarecimento. A concepção de leitura variaconforme a concepção de língua adotada. Lembre-se do que fala-mos no início: para os colonizadores espanhóis, matar um índiopoderia significar coisas bastante diferentes, conforme a concep-ção que se desse ao termo “índio”. Se “índio” fosse definido comoo ser dotado de alma, matá-lo seria pecado mortal e crime; casocontrário, seria apenas uma cena de caçada como a de qualqueranimal.

Conforme Koch (2006, pp. 9 a 13), na concepção mais antiga, alíngua é definida como representação ou espelho de pensamento.Dessa concepção vão derivar as concepções: de sujeito como umsujeito psicológico, individual, senhor de sua vontade e de suasações; de leitura como uma atividade de captação das intenções eidéias do autor, sem considerar que, no ato de leitura, contam muito,para a produção de sentido, as experiências e os conhecimentos doleitor, bem como a interação que ele estabelece com o autor pormeio do texto.

Veja bem que o foco da preocupação é o autor e suas intenções,pois se considera que o sentido estaria centrado nele. Se assim fos-se, bastaria ao leitor, para dizer que lê bem, captar as intenções doautor. Isso é um problema. Por quê? Simplesmente porque, naleitura de um texto de Machado de Assis, por exemplo, não temosmais o autor, para perguntar-lhe se as intenções que vemos no seutexto correspondem, de fato, àquelas que ele teria tido ao escrever

Resumindo...

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28 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

o romance Dom Casmurro. Neste curso de EaD, você vai se relaci-onar com seus colegas, no Fórum, por meio de textos. Não é? Ora,não dá para seu colega que está longe, em outra cidade, ficar de-pendendo de saber das intenções que você teria tido ao escrever,para poder entender o seu texto ou mensagem.

É muito comum, também, uma outra concepção de língua. Tra-ta-se de entendê-la como código, portanto, como mero instrumen-to de comunicação. Na vida, os homens criam metáforas para falardas coisas. Isso vai passando de boca em boca e vai ficando comoverdade. Nem sempre são. Os homens vão vivendo conforme oesquema dessas metáforas, mas nem sempre elas correspondem àverdade. A metáfora da língua como instrumento ou código decomunicação é uma delas. Lakoff e Johnson (1980) criticam a con-cepção de língua como código de comunicação. Eles afirmam que,se concebemos assim a língua, fica pressuposto o seguinte:

a) as idéias (ou significações) são objetos;

b) as expressões lingüísticas são os continentes desse objetos;

c) comunicar é passar qualquer objeto ou coisa.

Se a atividade de comunicação fosse isso, um trabalho de colo-car idéias-coisas no código da língua, a leitura seria uma atividadede retirada das idéias-coisas desse código, utilizado nos textos/men-sagens. Você percebe que, conforme essa maneira de pensar, o focoé o texto. A leitura seria concebida como decodificação oudescodificação. Como você vê, aqui, ler seria retirar um sentido docódigo. Por isso, muita gente, inclusive professores, utiliza doisverbos para referir-se ao ato de comunicação e de leitura: eles fa-lam sempre em “passar” e em “retirar”. Por exemplo: “o texto pas-sa uma mensagem clara, mas os alunos não sabem retirar nada doque lêem”.

Acontece que essa concepção de língua e de leitura nãocorresponde aos fatos. A metáfora da língua como código, entendi-do como canal de passagem de conteúdos, faz a gente viver pen-sando coisas erradas. Quem namora, por exemplo, sabe que issonão é verdade. Se fosse verdade, não haveria nunca mal entendi-dos entre as pessoas que se amam. Por isso devemos saber que:

a) a língua NÃO é um canal, um veículo isento por onde transi-tam idéias;b) a leitura NÃO é apenas decodificação, ou seja, NÃO é ativida-de de retirar um sentido já pronto, posto no texto.

Em resumo, até aqui, falamos de duas concepções de línguaque não são mais aceitas, porque não permitem compreender ofenômeno da linguagem nas atividades de leitura e produção detexto.

Certo?

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29Leitura e Produção de Textos

Depois dessas reflexões, procure lembrar como foram as suasaulas de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental e Médio.Tente lembrar-se do discurso dos professores, para ver queconcepção de língua e de leitura eles adotavam no ensino dadisciplina. Se adotavam a primeira concepção, certamenteperguntavam, em algum momento de suas instruções de aula:o que o autor quis dizer? Qual foi intenção dele? Se adotavama segunda concepção, perguntavam: o que o texto quer passar?

Na concepção interacional (dialógica), tudo é compreendidonuma rede de relações. É na interação que tomam forma a língua,os sujeitos, a atividade de produção de sentidos nos textos escritose na leitura.

Portanto, desse ponto de vista, o sentido a ser lido não se en-contra somente no texto para o leitor retirá-lo ou pegá-lo pronto. Aleitura é, pois, uma atividade de produção ou de construção dosentido na interação do leitor com o autor mediada pelo texto.Veja você que a leitura não é, aqui, mera atividade de decodificação.Veja também que o sentido que o leitor lê no texto não é uma coisaque já estaria lá, à espera dele. O sentido é construído na relação edepende de muitos conhecimentos por parte do leitor. Vamos fa-lar desses conhecimentos mais à frente. Por ora, fiquemos comisso: a leitura é uma atividade interativa complexa de produção oude construção de sentidos.

Isso quer dizer que, na atividade de leitura, “a compreensãonão requer que os conhecimentos do texto e os do leitor coinci-dam, mas que possam interagir dinamicamente” (ALLIENDE &CONDEMARÍN, citados por KOCH, 2006, p. 37).

Você deve estar desconfiado do que estamos falando, não? Cor-rija-nos, se estivermos enganados, mas achamos que está pensan-do o seguinte: se o autor produziu um texto para alguém, deve terconstruído nele algum sentido. É verdade. Ninguém escreve umtexto sem algum propósito. Todo texto tem um objetivo. Tendoem mente esse objetivo, a imagem e os valores do leitor para quemse destina o texto, e de posse de diferentes tipos de conhecimento

Então, como resolver essa questão?Que concepção de língua, de sujeito, de texto e de

leitura é mais adequada para compreender aatividade linguageira do homem em sociedade?

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30 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

(lingüísticos, enciclopédicos ou de mundo e interacionais), o autorconstrói um espaço de significação e espera que o leitor ocupe esseespaço com sua capacidade de construir sentidos, ativando conhe-

cimentos de diferentes tipos, inclusive aque-les da sua história de vida e de leituras. Ouseja, o autor pressupõe a participação do lei-tor na construção do sentido, considerandoa (re)orientação que lhe é dada. Por isso, hásempre múltiplas leituras possíveis para ummesmo texto. Um exemplo ajuda sempre,para compreender que o autor constrói o tex-to numa relação contratual implícita com oleitor.

Em toda banca de revista, existem os fa-mosos romances sentimentais de massa. NoBrasil, são aqueles das séries Sabrina, Biancae Júlia. São os romances que seguem a tradi-ção do chamado romance cor-de-rosa ou ro-mances do coração, cujas representações che-garam até nós por meio de imagens, dese-nhos e pinturas. Veja, à esquerda: uma mu-lher toda sentimento, lendo extasiada, coma mão no coração.

Na produção desses romances, os autores precisam saber: queos leitores desse tipo de literatura são mulheres; que a maioriadelas não possui um vocabulário muito sofisticado; que não temhabilidade de leitura de períodos muito extensos; que, nesse tipode leitura, procura os valores do amor eterno e das paixões maisdiversas; que utiliza esses textos para uma atividade de leituralúdica.

Portanto, como você observa, tanto a escrita como a leitura sãoprocessos complexos de construção de sentido, regidos por con-tratos: contrato de escrita e de leitura. No caso da produção deromances sentimentais, o autor e as leitoras seguem um contratoimplícito. Tanto é verdade que, quando a editora publica algumromance que não tem os valores desejados pelas leitoras (amoreterno, paixões; personagens gentis, lugares românticos e finalfeliz), ou que apresenta vocabulário difícil ou enredo de romancepolicial, por exemplo, recebe delas cartas de protesto e até amea-ças de processo. Veja uma dessas cartas, tal como foi escrita pelaleitora:

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31Leitura e Produção de Textos

São Pedro, 25 de dezembro de 1985

Janice FloridoEditora

Janice num dos livros que comprei nestas férias, li a sua mensagempara que nós disséssemos nossa opinião sobre as revistas, então ái vaia minha.

Leio os romances de Júlia, Sabrina, Bianca e outra a muitos anos, qdoposso, compro, qdo não troco as minhas revistas em bancas de troca.

E em todos esses anos, as únicas de quem eu não gostei, para sersincera detestei, odiei, foram aquelas escritas, que se passam na grécia,onde o personagem é grego e arrogante, machista.

Para você ter uma idéia melhor eu ganhei de uma amiga, uma revistacom o título “As flechas de Cupido” número 176, Julia, novinha emfolha, e eu não consegui ler, por favor não coloque muitos romances degrego nas bancas, a paisagem podem ser maravilhosa, o entardecerdivino, as ruínas dos templos maravilhosas, mas os romances destesgregos são cansativos.

Espero não tê-la deixado chateada, pois sei que você e toda sua equipetrabalha com afinco e carinho para que nós leitoras, possamos desfrutarde momentos maravilhosos e mágicos.

É uma pena que eu não tenha condições de ir toda a semana na bancapara comprar os livros, pois infelizmente, estão caros. Mas se eu tivessecondição financeira, também não iria comprar de romances de gregos.Talvez eu não goste desses romances, pois já vivo há 20 anos com ummachão.

Adoro finais felizes, principalmente daqueles em que no final elesacabam com bebezinhos. Mas fora isso, você está de parabéns pelosromances publicados, pois sei o quanto é difícil contentar a todos.

Parabéns, felicidades de uma fã de romance: Marisa Plim de Jesus.

Diante disso, você pode, ainda, estar perguntando: mas essasleitoras, ao ler esses romances, constroem leituras repetidas, iguais?Claro que não. Já dissemos acima e repetimos: “a compreensãonão requer que os conhecimentos do texto e os do leitor coinci-dam, mas que possam interagir dinamicamente”. Isso quer dizerque cada leitora interage com o autor por meio do texto de manei-ra diferente, pois cada uma delas possui conhecimentos mais oumenos amplos e histórias de vida e de leitura também muito dife-rentes. Diferentes leitores fazem usos diferentes de um mesmotexto.

Falta dizer-lhe o que você já sabe, por experiência própria: nãoexiste no mundo somente uma prática de leitura, mas várias: aprática de leitura dos romances sentimentais, da bíblia, do jornal,

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32 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

das revistas femininas, das leis, das obras acadêmicas, dos quadri-nhos – tanto impressos quanto na tela do computador. Essas práti-cas gozam de maior ou menor prestígio na vida social, mas todaselas possuem seus direitos e representam os seres humanos comseus gestos e maneiras de apropriação e de uso particular e cadavez único do que lhes cai na mão. Cada prática de leitura tem ob-jetivos diferentes e exige habilidades diferentes.

Portanto, depois dessas considerações, não vá cair na mania dediscriminação, no que chamam de etnocentrismo letrado. O que sig-nifica isso? É considerar que só existe uma boa prática de leitura:aquela das obras consagradas pela elite cultural e que as outras nãocontam ou merecem apenas a denominação de “porcaria” ou de“perda de tempo”.

Para terminar esta parte, leia o artigo Como ensinar a ler a quem já sabeler, de Marlene Carvalho e Maurício Silva, na revista Ciência Hoje,volume 21, número 21, de junho de 1996, e depois discuta dois pon-tos que considerar importantes com os cursistas no Fórum. O textoestá disponível no site www.ead.ufms.br , no banco de textos da suadisciplina.

Para saber mais

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33Leitura e Produção de Textos

UNIDADE 2

O texto esuas condições de

produção e interpretação

Page 34: Livro Leitura e Produção de Texto

34 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Ler e escrever textos na perspectiva da interação

Esta é a segunda unidade do módulo. Mãos à obra.O objetivo central é que você possa conhecer e discutiralguns fundamentos e pressupostos conceituais sobreo texto e a leitura como atividades de produçãode sentido na interação humana.

Para tornar a leitura mais suave e as discussões focadasem aspectos específicos, dividimos esta segunda unidadeem quatro subunidades.

2.1 A produção de textos escritos: conhecimentosa serem considerados.

2.2 O contexto nos processos de construçãode sentidos na leitura e na escrita.

2.3 O texto e suas relações intertextuais.

2.4 Texto e gênero textual.

Pode começar a leitura! Mas, lembre-se: você não está emuma aula daquelas entre quatro paredes. Você é o caminhante,o aprendente. Você é que faz o seu mapa de viagem.Pode iniciar a leitura pela subunidade que mais lhe interessar.

Page 35: Livro Leitura e Produção de Texto

35Leitura e Produção de Textos

TEXTO-BASE

O texto como elemento de mediação entre os sujeitos envol-vidos na produção de sentidos.

Ao iniciarmos esta seção, é necessário que comecemos a refletirsobre o papel dos textos, orais e/ou escritos, verbais e não verbais,sobre temas pertinentes às áreas de conhecimento a serem traba-lhadas no desenvolvimento do curso, na modalidade EaD, no qualvocê ingressou.

São os textos que possibilitam a configuração do material didá-tico, impresso, audiovisual e multimídia, no qual são feitos os re-cortes das áreas de conhecimento trabalhadas no curso.

Por meio dos textos, é possível garantir que sejam realmentetrabalhados, no curso, os principais conceitos, definidos em cadaárea de conhecimento, ou disciplina, ou módulo, ou unidade.

É também mediante os textos que, nas relações entre os sujeitosda prática educativa, são construídos conceitos, idéias e reflexõesessenciais para a construção de sentidos que se pretende produzirno desenvolvimento das matérias constantes no currículo do curso.

Evidencia-se, assim, no âmbito da universidade, a indiscutívelutilidade dos textos, tanto por seu caráter interdisciplinar, configu-rado nas atividades de fala/escuta, escrita/leitura, quanto por serum lugar no qual se pode refletir melhor sobre o funcionamentoda linguagem e da língua na construção do(s) sentido(s)pretendido(s).

Fora da universidade, a proficiência na leitura e na escrita “...tor-na o indivíduo capaz de compreender o significado das vozes quese manifestam no debate social e de pronunciar-se com sua pró-pria voz” (PLATÃO & FIORIN, 2003, p. 3) , o que torna tal aptidãoessencial para o exercício da cidadania. No texto, a seguir, vocêpoderá compreender melhor essa questão:

2 CONHECIMENTOS DE QUE DEPENDEM A LEITURA E A ESCRITA DE TEXTOS

Acompanhe nossa reflexão a respeito.

Ver Glossário

Saiba mais

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36 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Foi o texto escrito, mais que o desenho, a oralidade ou o gesto,que o mundo ocidental elegeu como linguagem que cimenta acidadania, a sensibilidade, o imaginário. É ao texto escrito quese confiam as produções de ponta da ciência e da filosofia; é eleque regula os direitos de um cidadão para com os outros, detodos para com o Estado e vice-versa. Pois a cidadania plena,em sociedades como a nossa, só é possível — se e quando ela épossível — para leitores. Por isso, a escola é direito de todos edever do Estado: uma escola competente, como precisam seros leitores que ela precisa formar. (LAJOLO, Marisa. Folha de S. Paulo, 19/9/1993 (com adaptações).

Entretanto, no nosso cotidiano, observamos que jornais fala-dos, mensagens gravadas em fita, telefonemas substituem tradici-onais meios de comunicação que se utilizavam da língua escrita. Alíngua falada parece ocupar um espaço de maior prestígio.

Diante das circunstâncias atuais e considerando as modernastecnologias de comunicação e informação, como é possível expli-car a manutenção do prestígio da escrita?

Compare a sua resposta com a apresentada no texto que segue,

Você já havia pensado nisso antes?

A manutenção do prestígio da escrita se deve fundamentalmenteà sua função de produção de conhecimento e, ainda que im-perfeita, é a ferramenta disponível para essa tarefa. De fato, aoescrevermos, não estamos expressando um pensamento já for-mado, mas o estamos formando à medida que escrevemos e,por isso mesmo, a língua escrita não deve mais ser vista como‘espelho do pensamento´, mas como a responsável por suaestruturação. Os conhecimentos se vão formando simultanea-mente à sua expressão lingüística. Nesse terreno, é visível a su-perioridade da escrita sobre a fala: esta última, pela ausência deregistro, possibilita desvios de raciocínio, incompletude, con-tradições etc — problemas mais facilmente controlados pelaprimeira.CARNEIRO, Agostinho Dias. Para que aprender a escrever?In:— Redação em construção: a escritura do texto. 2. ed. rev. eampl., São Paulo: Moderna, 2001. p. 9.

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37Leitura e Produção de Textos

2.1 A produção de textos escritos:conhecimentos a serem considerados

Nas considerações anteriores, explicitamos uma concepção detexto correspondente à de Koch e Elias (2006, p. 214), ou seja, tex-to como “... um projeto de dizer constituído em uma dada situa-ção comunicativa, para alguém, com certa finalidade e de determi-nado modo, dentre tantos outros possíveis”.

Como você já deve estar imaginando, esse projeto de dizer, a par-tir do qual o produtor/locutor constitui os sentidos do texto,interagindo dinamicamente com o interlocutor/leitor pressupos-to, envolve uma série de estratégias sociocognitivas. Nesse caso,estratégia significa “....uma instrução global para cada escolha a serfeita no curso da ação” (KOCH, 2002, p. 50).

Quando produzimos textos, utilizamos essas estratégias paramobilizar vários tipos de conhecimentos armazenados na nossamemória.

Acompanhe nossa reflexão a respeito.

Dizer que utilizamos estratégias, no processamento textual, sig-nifica que realizamos, ao mesmo tempo, vários procedimentosinterpretativos orientados para os objetivos que pretendemos atin-gir num determinado texto. Tais procedimentos implicam três sis-temas de conhecimento (KOCH, 2002, p. 48):

Você saberia dizer como isso ocorree que conhecimentos são esses?

conhecimento lingüísticoconhecimento enciclopédicoconhecimento interacional

Conhecimento lingüístico

Se você respondeu que diz respeito ao conhecimento gramati-cal e ao lexical, necessário para a adequada articulação som-senti-do, acertou. É esse conhecimento que acionamos, por exemplo,para organizar o material lingüístico na superfície textual, utilizan-do os recursos coesivos que a língua nos proporciona, selecionan-do as palavras adequadas ao tema e/ou aos modelos cognitivosativados. Como exemplo, vejamos a relevância do conhecimentolingüístico para a compreensão do Texto 1, a seguir.

Glossário

Você saberia dizer o que significa umconhecimento propriamente lingüístico?

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38 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Texto 1:

As cobras. Luís Fernando Veríssimo.

Disponível em: http://www.portalliteral.terra.com.br . Acesso em: 27/8/07.

A compreensão dessa tirinha implica observar a relação entre aidéia 1 É o lucro que estimula o empreendimento [quadrinho 1], ea idéia 2 — o lucro deve sempre ser honesto [quadrinho 2],estabelecida pelo elemento coesivo – mas -, conjunção que expres-sa oposição relativamente ao esperado. No caso, como as Cobrastinham respondido Certo, Certo à afirmação de Queromeu, ocorrupião corrupto, sobre o lucro, o esperado seria que elas concor-dassem com ele.

Entretanto, o uso do mas expressa justamente a oposição à res-posta esperada. No terceiro quadrinho, que completa o sentidoglobal do texto, é preciso saber o que significa dogmatismo paraentender a reação irônica de Queromeu, personagem que represen-ta “... um assumido criminoso do colarinho branco.Ele até se orgulha disso, defen-dendo os direitos de seus pares:“Se todo mundo rouba no Bra-sil, por que corrupto não poderoubar?”.

Para ver outros textos exemplificativos, consulte um dos nossoslivros-texto, nas Referências indicadas para o Módulo I: Leitura eProdução de Textos.

dogmatismo[4] [...] qualquerpensamento ou atitude quese norteia por uma adesãoirrestrita a princípios tidoscomo incontestáveis.Dicionário EletrônicoHouaiss.

KOCH, Ingedore G. V. &ELIAS, Vanda M. Ler ecompreender: os sentidosdo texto. São Paulo:Contexto, 2006 .p. 40-42.

Conhecimento enciclopédicoou conhecimento de mundo

Se a sua resposta levou em conta a palavra“mundo”, você está na pista certa. Trata-se deconhecimentos gerais sobre o mundo, assimcomo de conhecimentos relativos a experiênciaspessoais, a eventos situados no tempo e no

espaço. São esses conhecimentos que possibilitam ao produtor/autor inscrever sentidos no texto. Observe o Texto 2:

E, agora, você saberia dizerque conhecimento é esse?

Saiba mais

Acesse o site http://www.portalliteral.terra.com.br, para sabermais sobre as personagens deLuís Fernando Veríssimo.

Saiba mais

Page 39: Livro Leitura e Produção de Texto

39Leitura e Produção de Textos

Texto 2:

Níquel Náusea – Fernando Gonsales

Disponível em: http://www2.uol.com.br/niquel/benedito.shtml. Acesso em: 28/8/07.

Agora, REFLITA: o que precisamos saber para entender essetexto? O que devemos levar em conta na leitura dos enunciadosmas por que diabos eles querem saber quantas patas tem umaaranha? Vendidos! [quadrinhos 2 e 3]?

Para isso, devemos considerar as seguintes informações:• as personagens são criações do autor de tirinhas;• as tirinhas são, em geral, publicadas em jornais erevistas, ou disponibilizadas na internet;• criada pelo cartunista brasileiro Fernando Gonsales,a personagem da tirinha acima é Benedito Cujo, umvestibulando profissional; o sonho dele é passar no vestibular.Passar longe.

Ao ativar essas informações, interagindo com o autor, por meiodo texto, o leitor atribui um sentido aos enunciados em questão ea compreensão ocorre de modo satisfatório.

Você se lembra do termo interação que jáusamos na primeira parte deste texto?

Tente conceituar esse termo em seu caderno de anotações,antes de acompanhar a nossa reflexão a respeito do

conhecimento interacional.Consulte o Glossário

Conhecimento interacional

O conhecimento interacional diz respeito à dimensãointerpessoal da linguagem, ou seja, às formas de interação por meioda linguagem, e envolve os conhecimentos: ilocucional,comunicacional, metacognitivo e superestrutural.

Conhecimento ilocucional: possibilita, de modo direto ou indi-reto, o reconhecimento dos objetivos pretendidos pelo produtordo texto em uma determinada situação interacional. Veja o exem-plo, Texto 3.

Para saber mais sobreBenedito Cujo e outros personagens deFernando Gonsales, acesse o site:http://www2.uol.com.br/niquel/benedito.shtml

Saiba mais

Page 40: Livro Leitura e Produção de Texto

40 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Texto 3:

Níquel Náusea – Fernando Gonsales

Disponível em: http://www2.uol.com.br/niquel/benedito.shtml. Acesso em: 28/8/07.

Desta vez, é preciso que observemos o que o autor da tirinhapropõe que consideremos na produção de sentido do texto. Vocêsabe por quê? Vejamos:

• no primeiro quadrinho, a personagem Níquel Náusea dispõe-se a dizer uma “frase feita” para Gatinha, a rata que vive tendofilhotinhos, e que ele acha uma “gata”;

• no segundo quadrinho, ele diz: “o importante é conservar acriança que existe dentro de você”, em sentido figurado (“frasefeita”);

• no terceiro quadrinho, Gatinha, demonstra “falta” de conhe-cimento ilocucional, ao responder: Eu tento, mas elas acabamnascendo, em sentido literal, o que produz um efeito de sentidohumorístico.

Conhecimento comunicacional

Se a sua resposta foi positiva, acertou, porque o conhecimentocomunicacional também está relacionado aos objetivos desejadosna produção de sentido do texto por meio de recursos adequadospara atingir tais objetivos, como, por exemplo:

• apresentar, numa situação concreta de comunicação, a quan-tidade de informação necessária para que o interlocutor seja ca-paz de reconstruir o objetivo da produção do texto;• selecionar a variante lingüística compatível com a situação deinteração;• observar a adequação do gênero textual à situação de comuni-cação.

Você observa algum tipo de relaçãoentre esse conhecimento e o anterior?

frase feita ouexpressão idiomática:locução ou frasecristalizada numadeterminada língua, cujosignificado não é deduzíveldos significados daspalavras que a compõem eque geralmente não podeser entendida ao pé daletra. [Dicionário EletrônicoAntônio Houaiss].

Saiba mais

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41Leitura e Produção de Textos

Para exemplificar esse tipo de conhecimento, vamos imaginarque você escreva um bilhete assim:

Que informações estão faltando? Falta identificar: o remetente,o destinatário, o local e a data. Sem esses dados será impossíveldeterminar o fato referido no bilhete.

Conhecimento metacognitivo.

O conhecimento metacognitivo possibilita ao produtor garantira compreensão do texto e conseguir a adesão do interlocutor a res-peito dos objetivos pretendidos com esse texto, evitando distúrbi-os na comunicação. Utiliza, para isso, vários tipos de ações lingüís-ticas, configurando-as no texto por meio de sinais de articulaçãoou apoio textuais, como, por exemplo, recursos gráficos, repeti-ções, paráfrases, parênteses de esclarecimento. Observe, na tirinhaapresentada a seguir (Texto 4), os recursos lingüísticos e gráficosutilizados para marcar as falas das personagens de Laerte: Gato(branco) e Gata (preta).

Texto 4:

Piratas do Tietê – Laerte

Estou aqui, agora.Pode vir.

Qual a função desse conhecimento? Registrea sua resposta no caderno de anotações, antes de

acompanhar a nossa reflexão a esse respeito.

Disponível em: www.laerte.com.br . Acesso em 30/8/07.

Eis os recursos utilizados pelo autor e fundamentados noconhecimento metacognitivo:

• nas falas do Gato: a palavra LUTA sublinhada, retomada trêsvezes, e relacionada a três deferentes temas: “...luta contra amiséria?”; “... luta contra a opressão?”; “...luta porliberdade?”;

• na fala da Gata: a palavra “ECOLOGIA”, negritada e entreaspas.

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42 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Conhecimento superestrutural ouConhecimento sobre gêneros textuais.

Vejamos.

O conhecimento superestrutural refere-se às superestruturas oumodelos textuais globais, ou seja, os gêneros textuais. É esse co-nhecimento que possibilita identificar textos como exemplaresadequados aos diversos eventos da vida social, assim como a orde-nação ou seqüenciação textual de acordo com os objetivos preten-didos. Exemplos de gêneros textuais: bilhete, carta, resumo, rela-tório, horóscopo, fábula.

Esperamos ter evidenciado que a construção de sentidos naleitura e na produção de textos, atividades altamente comple-xas, depende de vários tipos de conhecimentossocioculturalmente determinados e vivencialmente adquiridose que constituem o contexto, conceito que estudaremos na pró-xima subnidade.

ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM

O que você pode dizer para atender o que é pedido nas trêsquestões abaixo? Coloque seus comentários no FORUM.

1) Ao ingressar num curso superior, na modalidade Educação aDistância – EaD -, qual é a sua opinião sobre o papel dos textos,falados e escritos, verbais e não verbais, considerando os temaspertinentes às áreas de conhecimento a serem trabalhadas duranteesse curso e depois dele?

2) Depois dessas reflexões, recorde como foram as suas aulas deLíngua Portuguesa no Ensino Fundamental e Médio. Tente lem-brar-se do discurso dos professores, para ver que concepção delíngua e de leitura (rever unidade I) eles adotavam no ensino dadisciplina. Se adotavam a primeira concepção, certamente pergun-tavam, em algum momento de suas instruções de aula: o que oautor quis dizer no texto? Se adotavam a segunda concepção, per-guntavam: o que o texto quer dizer? Ou adotavam as duas concep-ções, fazendo uma salada?

3) Suponhamos que você seja convidado a escrever um peque-no artigo sobre o que é e de que depende a leitura, para publicar

Esse tipo de conhecimento refere-se a quê?Você saberia citar, como exemplos,

os nomes de alguns gêneros textuais?

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43Leitura e Produção de Textos

BOFF, Leonardo.A águia e a galinha:uma metáfora dacondição humana, 4. ed.São Paulo: Vozes, 1977.

TODO PONTO DE VISTA É A VISTA DE UM PONTO

Ler significa reler e compreender, interpretar.Cada um lê com os olhos que tem.E interpreta a partir de onde os pés pisam.

Todo ponto de vista é a vista de um ponto.Para entender como alguém lê, é necessário saber como são

seusOlhos e qual a sua visão de mundo.Isso faz da leitura sempre uma releitura.

A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam.Para compreender, é essencial conhecer o lugar social de

quem olha.Vale dizer, como alguém vive; com quem convive, que

experiênciastem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume osdramas da vida e da morte e que esperanças o animam.Isso faz da compreensão sempre uma interpretação.

Ler o poema, intitulado “Todo ponto de vistaé a vista de um ponto”, de Leonardo Boff.

2.2 O contexto nos processos de construçãode sentidos na leitura e na escrita

Nos processos de leitura e escrita, o texto corresponde a umprojeto de dizer construído em uma dado con-texto, ou seja, em cada situação comunicativa.

O que é isso: projeto de dizer? A gente faz projeto para dizer algu-ma coisa? Parece estranho, mas não é. Nós projetamos, sim, o quee como dizer as coisas, em cada contexto, considerando: quem fala,com quem, quando, onde, em que condições, com que propósitoetc. E não é só na modalidade escrita, na falada também.

Entendeu?

no jornalzinho criado por uma turma do primeiro ano do seu cur-so. Para isso, consulte o texto-base e faça as leituras indicadas no“saber mais”

Para saber mais

Page 44: Livro Leitura e Produção de Texto

44 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Exemplo. Você é uma mulher. No ponto de ônibus, você preci-sa pedir uma informação para um homem. Você não o conhece.Num segundo, você planeja como se dirigir a ele para obter a in-formação que deseja. Desde o vocativo com que vai se dirigir a ele,até a entonação da voz, tudo é projetado. Você tem a possibilidadede dirigir-se a ele com as expressões vocativas: cara; homem, se-nhor; dito cujo, gostosão, lindo, moço etc. As possibilidades que alíngua lhe oferece são inúmeras. Você escolhe o vocativo mais apro-priado, mais conveniente para a situação. E tem de fazer isso, poisse agir de qualquer jeito, pode não obter a informação desejada eaté causar má impressão ou arrumar encrenca. Todo dizer é umprojeto de dizer. Mais um exemplo? Lá vai um na modalidade es-crita: Texto 5.

Texto 5:

Menino cheio de coisaVejam só: aos nove anos e três meses de idade, Serginho está deitado em baixo das

cobertas com uma calça de veludo de duzentos e vinte reais, camiseta de quarenta ecinco, tênis que pisca quando encosta no solo, óculos de sol com lentes amarelas, tacode beisebol, jaqueta de náilon lilás, boné da Nike, bola de futebol de campo tamanhooficial, dois times de futebol e botão, CD dos Tribalistas, joystick, Gameboy, uma caixade bombom de cereja ao licor, dois sacos de jujuba, um quebra-cabeça de mil e qui-nhentas peças, um modelo em escala do “F” cento e dezessete (desmontado), chocolatepra uma semana, três pacotes de batatinha frita (novidade, com orégano), dois litros derefrigerante com copo de canudinho combinando, quatro segmentos retos e quatrocurvos de pista de autorama, dois trenzinhos (um de pilha e um de corda), controleremoto, duas raquetes de pingue-pongue, duas canecas do Mickey e nem adianta seupai, do outro lado da porta trancada pelo menino emburrado, dizer que sua mãe jávolta.

Fonte: BONASSI, Fernando. Folha de S. Paulo, 12 mar. 2005. Folhinha.

Na leitura e produção de sentido desse texto, você deve consi-derar:

a) o contexto lingüístico, ou seja, o co-texto, que já orienta onosso olhar na construção da imagem do menino, sugerida nopróprio título: Menino cheio de coisa;

b) o gênero textual miniconto e sua funcionalidade. Como vi-mos na Unidade I, cada gênero serve para realizar uma formade ação. Que ação se faz por meio do miniconto? Certamenteuma ação breve de comunicação de um conteúdo narrativoficcional, com fins literários;

c) a tematização proposta no título Menino cheio de coisa, quesitua o protagonista da história nos tempos atuais, mais especifi-

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45Leitura e Produção de Textos

camente no contexto das relações familiares, exigindo do leitoruma compreensão não ingênua da situação. Isso porque não setrata de relato de uma cena familiar inocente, mas de uma críti-ca bem humorada à educação das crianças, sustentada nos valo-res do consumismo;

d) a data da publicação, que situa o relato no tempo: a atualsociedade de consumo;

e) o meio de veiculação: o jornal Folha de S. Paulo, mais precisa-mente o Caderno Folhinha, dirigido a crianças e a seus pais. Porisso, o conto é míni, para uma leitura rápida. O jornal não admi-te textos muito longos.

Os exemplos acima nos ensinam que, tanto na fala como naescrita, os autores e os leitores fazem uso de uma multiplicidade derecursos para produzir sentidos. Portanto, consideram recursos quevão muito além das palavras que compõem o texto. Em outrostermos, para ler e escrever, é preciso levantar os olhos do textopara o seu contexto.

Desconfiamos que já entendeu tudo sobreo contexto, não é? Então confira:

O que você entendeu, até aqui, constitui os diferentes tipos decontextos englobados por um contexto mais abrangente: o con-texto sociocognitivo, do qual trataremos mais adiante.

É preciso entender que há uma diferença entre o contexto de pro-dução e o contexto de uso de um texto.

No caso da interação face a face, o contexto de produção e ocontexto de uso coincidem. Na interação por meio da escrita, não.No miniconto, Texto 5, o mais importante para a interpretação é ocontexto de uso.

Quando o leitor não considera ou ignora o contexto de produ-ção, no ato de leitura de um texto, pode produzir sentidos absur-dos e até cômicos. No romance A Rainha dos Cárceres da Grécia, deOsman Lins, há uma cena em que, por volta de 1970, personagensda periferia de Recife lêem a notícia da morte de Getúlio Vargasnum pedaço de jornal antigo, tocado até eles pelo vento. Por faltado contexto de produção (nome e data da edição do jornal), bemcomo de conhecimento atualizado do cenário político nacional etc,

Continuemos!

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46 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

concluem: Getúlio suicidou-se hoje! Você pode rir, pois, como sabe,o suicídio ocorreu em 1954.

Podemos concluir que os sentidos de um texto não dependemsó da estrutura textual em si mesma, ou seja, do co-texto. Um lei-tor que considerasse apenas a estrutura, não faria um boa leitura.Por quê? Pelo fato de que os objetos-de-discurso a que o texto fazreferência são apresentados de forma incompleta. Muita coisa ficaimplícita. Por isso, é comum, nos estudos de lingüística textual, acomparação do texto com um iceberg. O que é um iceberg?

É um imenso pedaço de gelo que fica boiando no mar: umapequena parte aparente à flor da água e a maior parte submersa.Assim também ocorre no texto: para entender o que está aparente,na superfície dele (o explícito), precisamos do conhecimento doque não está aparente (o implícito). A construção de um sentidopara o texto depende da consideração do todo, da mesma formaque um comandante de navio só pode ter idéia precisa da dimen-são de um iceberg, se considerar tanto o que aparece quanto o quenão aparece dessa montanha de gelo. Enfim, o contexto, como oiceberg, é tudo aquilo que, de alguma forma, contribui para oudetermina a construção do sentido do texto.

Falta dizer o seguinte: depois que o texto sai das mãos do seuautor, passa a ter uma existência independente. Como você viuacima, o personagem do romance de Osman Lins lia, nos anos1970, uma notícia escrita em 1954, sobre um acontecimento tam-bém ocorrido nesse ano. Por falta de conhecimento e de traquejona prática de leitura em geral e de jornal em particular, trocou ocontexto de produção pelo de uso. Isso resultou num erro de leitu-ra com efeito de sentido cômico ou absurdo: um fato ocorrido muitoantes foi compreendido como tendo acabado de ocorrer.

Mas você, certamente, está pensando na fofoca, não é? Comosurgem os efeitos de sentido desastrosos ou maldosos do gênero detexto chamado fofoca? Surgem justamente porque o fofoqueiro omi-te, falseia, altera, para mais ou para menos, o contexto do que diz.

ATIVIDADE DE APRENDIZAGEM

Agora, convidamos você a ampliar os seus conhecimentos so-bre o contexto, indispensável para a compreensão e para a cons-trução dos sentidos do texto. Leia as páginas 66 a 71, do livro Ler e

compreender os sentidos do texto(KOCH & ELIAS, 2006). Em se-guida, escreva um pequeno tex-to, dizendo o que é preciso saberdo contexto, para fazer uma lei-tura da tirinha, texto 6.

Texto 6

Não precisa dizer mais.

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47Leitura e Produção de Textos

Parece coisa desconhecida, mas não é bem assim. Quantas ve-zes você mesmo já não recorreu a um outro texto para escrever oseu? Quantas vezes você não empacou na leitura de um texto pordesconhecer a referência a um outro texto nele mencionado? Eu játive esse problema. Muitas vezes! De duas eu não esqueço: umaquando vi, pela primeira vez, o círculo no sol lá na roça; a outraquando topei com um tal de Iago na leitura. Conto o caso do Iago;o do círculo no sol você pode ler.

Estava lendo Dom Casmurro, de Machado de Assis. Lá pelomeio da leitura, encontrei a seguinte frase: “Escobar foi minha pontade Iago”. Confesso que fiquei boiando. Não conseguia entendernada. Iago? Ponta de Iago? O que seria isso? O jeito foi ir desconfi-ando e procurando estabelecer relação dessa passagem com o restodo texto, mas não tinha nada disso no resto do romance.

Então passei a procurar, fora do texto, um sentido para a passa-gem: no dicionário, na conversa com amigos e, por fim em outrasobras literárias. Aí então encontrei a palavra Iago. Um nome pró-prio. Estava em um outro texto, na peça teatral, intitulada Otelo,de Shakespeare. Iago é o nome do personagem que destila o vene-no do ciúme em Otelo. Por isso, Otelo termina por matar a suaamada Desdêmona. Então entendi a passagem, ralacionando o tex-to de Machado de Assis ao de Shakespeare. Entendeu? Conhecer otexto-fonte é condição necessária para a construção do sentido naleitura. Conforme Koch & Elias (2006, pp. 85-6):

O caso do círculo no solestá publicado na revistaRabiscos de Primeira:caderno dos alunos doCurso de Letras daUFMS, ano I, número I,outubro de 2001, páginas80-87, sob o título“Da Taipa do fogão”.Ver o fragmento VII dessetexto: O círculo no sol ouo leitor de um livro só.Você encontra essefragmento no site da EaD,também. Meu nome éJosé Genésio Fernandes.

“Vale reiterar que, para o processo de compreensão, além do co-nhecimento do texto-fonte, necessário se faz também considerarque a retomada de texto(s) em outro(s) texto(s) propicia a constru-ção de novos sentidos, uma vez que são inseridos em outra situa-ção de comunicação, com outras configurações e objetivos.Do que dissemos até o momento, podemos depreender que, strictosensu, a intertextualidade ocorre quando, em um texto, está inseri-do outro texto (intertexto) anteriormente produzido, que faz parteda memória social de uma coletividade.Como vemos, a intertextualidade é elemento constituinte econstitutivo do processo de escrita/leitura e compreende as diver-sas maneiras pelas quais a produção/recepção de um dado textodepende de conhecimentos de outros textos por parte dosinterlocutores, ou seja, dos diversos tipos de relações que um textomantém com outros textos.”

Saiba mais

2.3 Texto e intertextualidadeDesde o começo, insistimos no fato de que a leitura depende de

muitos conhecimentos relacionados ao texto e ao contexto. Vamostratar agora de mais um desses conhecimentos: a intertextualidade.

Para começar,o que é intertextualidade?

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48 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

ATIVIDADE DE APRENDIZAGEM

Nesta atividade, você vai ler o que está em “A” e em “B”, abaixo,e depois fazer o que se pede em “C”:

A) Primeiro, leia o seguinte conto, de Carlos Drummond de Andrade,publicado em O poder ultrajovem:

O PODER ULTRAJOVEM

– Que é que tem trazer uma flor para casa?– Veio do oculista e trouxe uma rosa. Acha direito?– Por que não?– Eu esperei, ela me disse que foi o oculista que deu a ela. Esta-

va num vaso, ela achou bonita, ele deu.– E daí?– Então uma senhora casada vai ao oculista e o oculista lhe dá

uma rosa? Que lhe parece?– Que ele é gentil, apenas.– Pois eu não vou nessa de gentileza de oculista. Não há rosas

nos consultórios de oftalmologia. E que houvesse. Tem pro-pósito uma coisa dessas? Ela acabou chorando, dizendo queeu sou um bruto, um rinoceronte. Engraçado. Minha mulhervem com uma rosa para casa, uma rosa dada por um ho-mem, e eu não devo achar ruim, eu tenho que achar muitonatural.

– Desde quando é proibido uma senhora ganhar flor de umapessoa atenciosa? Que sentido erótico tem isso?

– Tem muito. Principalmente se é rosa. Ora, não tente negar osignificado das ofertas florais entre dois sexos. O oculista nãopodia dar essa flor, nem ela podia aceitar. O pior que não deveter sido o oculista.

– Quem foi, então?– Sei lá. Numa cidade do tamanho do Rio, posso saber quem

deu uma rosa a minha mulher?– Vai ver que ela comprou na loja de flores da esquina, e disse

aquilo só para fazer charminho.– Ela nunca fez isso. Se fez agora, foi para preparar terreno,

quando chegar aqui uma corbelha de antúrios e hibiscos.– Não diga uma coisa dessas.– Digo o que penso. Estou inteiramente lúcido, só me conduzo

pelo raciocínio. Repare no encadeamento: os vestidos moder-nos; os modos (só vendo a maneira dela sentar no sofá); arosa, que ela foi correndo levar para a mesinha de cabeceirado quarto. Cada uma dessas coisas é um indício; reunidas,são a evidência.

– Permita que eu discorde.– Discorda sem argumentos. A Elsa não é mais a Elsa. Demora

mais tempo no espelho. Fica olhando um ponto no espaço,abstrata. Depois, sorri. Estou decidido

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49Leitura e Produção de Textos

– A quê?– Vou segui-la daqui por diante. Contrato um detetive. E logo

que tenha a prova, me desquito.– Não vai ter prova nenhuma, juro. Ponho a mão no fogo por

Dona Elsa.– Pensei que você fosse meu amigo. Fiz mal em me abrir. Va-

mos mudar de assunto, que ela vem chegando. Mas reparesó que olhos de Capitu que ela tem, eu nunca havia reparadonisso!

Esquecia-me de dizer que meu amigo tem 82 anos, e Dona Elsa,79.

Carlos Drummond de Andrade

B) Em segundo lugar, leia as páginas 75 a 96, do livro Ler e compre-ender os sentidos do texto (KOCH & ELIAS, 2006).

C) Agora, depois dessas duas leituras, imagine uma jovem do inte-rior que lhe manda um e-mail, dizendo que não entendeu a partesublinhada do conto acima. Com os conhecimentos que tem doque foi exposto aqui e do capítulo lido, o que lhe diria, por e-mail,para judá-la. Coloque sua resposta no FÓRUM.

2.4 Texto e gêneros textuais

Gênero: você já conhece essa palavra. Já definimos gênero comoformas de ação social das quais lançamos mão nas mais diferentessituações comunicativas. Vamos alargar esses conhecimentos. Vejao seguinte diálogo de duas colegas de escola no ponto de ônibus:

– Minha amiga, acho que vou perder a prova hoje. Tô atrasada.O ônibus já passou?

– Ainda não. Tá com a passagem aí ou esqueceu também? Issoque você tem na mão é conta de luz, não?

– Nossa! Tô confusa hoje! Mas tá aqui a passagem. O que euesqueci mesmo foi a carta para o meu namorado e o pedidode trancamento de uma disciplina na escola. Acordei um pou-co tarde e ainda tive de escrever um bilhete para meu pai quevai chegar do trabalho.

– Você certamente não leu seus e-mails ontem, nem papeou nochat e muito menos leu a notícia do jornal?

– Não, por quê? Aconteceu alguma coisa?– O professor já era: entregou pedido de demissão... nem sei se

vai haver prova hoje. Sossegue.

Page 50: Livro Leitura e Produção de Texto

50 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Prova, passagem, conta de luz, carta, pedido de trancamento dedisciplina, bilhete, e-mails, notícias, chat, e pedido de demissão sãogêneros de textos, formas por meio das quais realizamos ações so-cialmente reconhecidas. Veja que as duas amigas só mencionam onome do gênero e nada mais precisam explicar, pois os gênerosapresentam alto poder preditivo e interpretativo das ações realiza-das. Como afirma Ingedore, (2006, p. 106), os gêneros “são consti-tuídos de um determinado modo, com uma certa função, em da-das esferas de atuação humana, o que nos possibilita (re)conhecê-los e produzi-los, sempre que necessário”. Note bem: o gênero éconstruído socialmente; não é uma construção individual. Se cadaum, por si, fosse criar um gênero para se comunicar, o processo deleitura e compreensão seria muito complicado. Bakhtin (1992: 301-302) afirma:

“Na conversa mais desenvolta, moldamos nossa fala às formasprecisas de gênero, às vezes padronizados e estereotipados, àsvezes mais maleáveis, mais plásticos e mais criativos. [...] Apren-demos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir afala do outro, sabemos de imediato, bem nas primeiras pala-vras, pressentir-lhe o gênero, adivinhar-lhe o volume (a exten-são aproximada do todo discursivo), a dada estruturacomposicional, prever-lhe o fim, ou seja, desde o início, somossensíveis ao todo discursivo que, em seguida, no processo dafala, evidenciará suas diferenciações. Se não existissem os gêne-ros do discurso e não os dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da fala, se tivéssemos de cons-truir cada um de nossos enunciados, a comunicação verbal se-ria quase impossível”

O gênero não é criado por um só pessoa. É fruto do trabalhocoletivo e surge para estabilizar as atividades comunicativas dodia-a-dia. Conforme Marcuschi (2002),

“caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis,dinâmicos e plásticos. Surgem emparelhados a necessidades eatividades socioculturais, bem como na relação com inovaçõestecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar aquantidade de gêneros textuais hoje existentes em relação a so-ciedades anteriores à comunicação escrita”.

Os meios tecnológicos modernos possibilitam o surgimentode uma enormidade de novos gêneros, os chamados gêneros emer-gentes. Já dissemos antes: estamos numa textosfera.

Vamos percebendo, portanto, um pressuposto básico: é impos-sível se comunicar verbalmente sem o uso do gênero como uma

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51Leitura e Produção de Textos

ferramenta, assim como é impossível se comunicar verbalmentesem um texto. Essa visão segue a noção de língua como atividadesocial, histórica e cognitiva. Falamos disso.

Assim, em um dado meio sociocultural e em um tempo históri-co determinado, as pessoas, pelo uso constante que fazem da lin-guagem, para realizar ações socialmente concebidas, criam os gê-neros, operam com eles e vão, assim, desenvolvendo uma compe-tência metagenérica. O que é isso?

É a competência que possibilita ao leitor e produtor de textointeragir de forma conveniente nas mais diversas práticas sociais.

O pai que faz três pedidos respeitosos para que o filho pare dejogar bola na sala, se quer, mesmo, realizar a ação de interromper aatividade imprópria do filho, não pode usar o gênero pedido respeito-so pela quarta vez, mas dar uma ordem. Insistir no pedido é adotar ogênero de texto impróprio para a situação. A mulher que já pediupara o marido não a agredir não pode utilizar o pedido, de novo, se eleinsiste na agressão; a forma de ação adequada a ser realizada é a de-núncia com o lavramento de um BO na delegacia. Não proceder damaneira conveniente indica incompetência para agir socialmente pormeio da linguagem – e isso, muitas vezes, tem conseqüências lamen-táveis e até trágicas. Observe, ainda, os textos “A”e “B”:

Um exemplo!

Folha de S. Paulo,24 de setembro de 2005

Texto A:

Texto B:

Você se lembra?

Pois não.

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52 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Veja bem. É a competência metagenérica que orienta a produ-ção de nossas práticas comunicativas e que orienta nossa compre-ensão sobre os gêneros textuais. Ela é muito importante para a atri-buição de sentido ao texto, na hora da leitura. É essa competênciametagenérica que permite afirmar que o texto “A” é um recado eque o texto “B” é uma tirinha, jogando com um outro gênero.

É graças a essa competência, observando a composição, o con-teúdo, o estilo, o propósito composicional e o modo de veiculaçãodesses dois textos, que sabemos reconhecer o gênero a que perten-cem. Segundo Fiorin: (2006), isso comprova que os enunciados

[...] são determinados pelas condições específicas e pelas finali-dades de cada esfera. Essas esferas de ação ocasionam o apare-cimento de certos tipos de enunciados, que se estabilizam preca-riamente e que mudam em função de alterações nessas esferasde atividades. Só se age na interação, só se diz no agir e o agirmotiva certos tipos de enunciados, o que quer dizer que cadaesfera de utilização da língua elabora tipos relativamente está-veis de enunciados. [...] Conteúdo temático, estilo e organiza-ção composicional constroem o todo que constitui o enuncia-do, que é marcado pela especificidade de uma esfera de ação(p. 61-62; ênfase acrescentada).

Portanto, todo gênero tem uma forma, um conteúdo temático eum estilo; elementos indissociáveis na constituição do gênero.Estamos afirmando que produzimos o gênero de determinada for-ma, mas, note bem: como isso, não queremos dizer que os gêne-ros não variam (o e-mail é uma variação, um descendente da cartaíntima) e nem que a forma seja o elemento definidor do gêneroem detrimento da função.

Voltemos ao texto “A” e “B” acima, para observá-los do pontode vista da forma da composição, do conteúdo temático e do es-tilo?

Observamos que o texto “A” pertence ao gênero recado. Trata-se de um texto cuja forma de expressão é bastante livre, pois podeconter elementos verbais e não verbais. Há a utilização de palavras,de desenhos e de cores e é escrito à mão. O suporte desse gênerode texto pode ser o bloco de recados ou qualquer papel disponívelno momento em que surge a necessidade da comunicação. Trata-se de um espaço limitado, muito menor do que o da carta, porexemplo. Do ponto de vista do conteúdo temático, os recados tra-tam sempre da comunicação ligeira de assuntos da vida cotidianaentre parceiros geralmente conhecidos nas situações familiares oude trabalho. É essa a função do recado. É essa a ação que realiza-

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mos por meio dele. Do ponto de vista do estilo, o autor do recadopode fazer muitas escolhas: pode ser mais ou menos subjetivo, maisou menos formal na escolha do nível de linguagem adotado. Notexto “A”, a relação entre os parceiros da comunicação é íntima, alinguagem é informal e existe até um tom poético com o desejo doraminho.

Afirmamos que o autor de recados é bastante livre para compô-lo, mas quem é totalmente livre neste mundo? Ninguém. Na escri-ta de qualquer gênero de texto, oral ou escrito, há uma margem deliberdade para inovações, mas existem as prescrições sociais. Vocêsabe muito bem que o grau de intimidade ou o nível de linguagemadotados em um simples recado pode dar muito problema e atémorte... Dizer que uma pessoa sabe de tudo isso é dizer que elatem competência metagenérica, que ela tem capacidades para ler eescrever adequadamente um gênero de texto.

O texto “B” pertence ao gênero tirinha. Do ponto de vista daforma de expressão, a tirinha é um texto verbal e não verbal. Incluielementos da língua escrita e falada distribuídos em balões e dodesenho (o traço e as cores característicos de cada autor na caracte-rização do espaço e dos personagens). Do ponto de vista do con-teúdo temático, as tirinhas apresentam sempre uma crítica bem-humorada de comportamentos, valores e sentimentos. Essa é suafunção. Ninguém lê tirinha para chorar, mas para rir, para sedescontrair. Por isso o jornal, que é seu suporte, as coloca lá nafrente, depois das notícias sérias, gerenciando assim sua relaçãocom o público leitor.

Resta ainda dizer que, para ler bem a tirinha em questão, o lei-tor precisa saber que, muitas vezes, os gêneros são produzidos pormeio de relações com outros gêneros. É o que se chama dehibridização ou de intertextualidade intergêneros. O texto “B” nãoé um recado, como o texto “A”, embora utilize esse gênero de textocomo elemento de sua composição. Isso quer dizer que, como for-ma de ação, ele não faz uma comunicação ligeira. O texto “A” éuma tirinha: seu objetivo é fazer rir do menino que escreveu umrecado para o pai em suporte impróprio. E, provavelmente, nãofaz todo mundo rir. Os habitantes da floresta amazônica, que nãopossuem casa com esse tipo de parede, nem sofá e nem telefone,provavelmente fariam outra leitura.

Um texto pode ser reconhecido por nós como uma tirinha epelos esquimós como um relato de uma cena comum do seu dia adia.

Veja o Texto C na página seguinte:

Um exemplo!

No filme O amor no tempodo cólera, há uma cena emque o chefe da empresacritica seu secretárioporque ele escreve cartasformais como se estivesseescrevendo cartas íntimas,de amor. No filme Nenhuma menos, há uma cena emque um personagem criticao cartaz elaborado pelaprofessora e diz o queum cartaz deve ter paracumprir sua função.Veja esses filmes.Comente as cenasindicadas e coloque seucomentário no Fórum.

Saiba mais

Pois não!

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54 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Texto C

Folha de S. Paulo.

Wood e Stock são personagens dos anos 1960, tempo de apolo-gia à liberdade sexual. Na tira, já velhos, os dois recordam os bonstempos em que faziam sexo livremente, sem problemas, até com anoiva dos amigos. Deixando de lado outros aspectos do texto, per-guntamos: por quê você ri da tirinha? Certamente porque nestemomento histórico, os valores de sua cultura não admitem essasliberdades. Mas se você assistir ao filme Nanuc, verá uma cena emque o esquimó oferece sua esposa a um hóspede como sinal decordialidade. O vistante não aceita, é claro, e, por isso, o esquimófica enfurecido com a desfeita do hóspede. Os valores da culturaesquimó são outros. Assim, eles certamente leriam a tirinha acima,sem rir, mas apenas como um relato de um dos acontecimentos comuns da vida familiar.

Por isso dissemos: os gêneros textuais são fenômenos histó-ricos, profundamente vinculados à vida cultural e social.

Mais um passo: vamos agora diferenciar tipo de texto de gêne-ro de texto. Você já sabe definir gênero, mas, pela sua experiêncianos bancos da escola, deve estar se perguntando: descrição, narra-ção, dissertação são gêneros de texto? Seriam formas de ação soci-almente reconhecidas no mundo do trabalho, por exemplo? Al-gum empregador já lhe perguntou: o senhor sabe fazer uma des-crição, uma redação? Eu garanto que nunca. No mundo do traba-lho, perguntam, por exemplo, se você sabe redigir um relatóriosobre o estado de uma repartição ou do depósito de compras daloja; um pedido de compra; uma carta formal etc. Esses, sim sãogêneros de texto. E então? Se narração, descrição, dissertação nãosão gêneros de texto, o que são? Segundo Marcuschi (2005, 22):

“a) Usamos a expressão tipo textual para designar uma espéciede construção teórica definida pela natureza lingüística de sua com-posição (aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógi-cas). Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia decategorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição,descrição, injunção.

Está vendo?Um gênero aqui

é outro ali.

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55Leitura e Produção de Textos

b) Usamos a expressão gênero textual como uma noção propo-sitalmente vaga para referir os textos materializados que encontra-mos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriamente funcionais,estilo e composição característica. Se os tipos textuais são apenasmeia dúzia, os gêneros são inúmeros.”

Com o objetivo de esclarecer as diferenças entre tipos e gêneros,Marcuschi (2005) compara as características de ambas as categori-as, resumindo-as conforme o seguinte quadro:

TIPOS TEXTUAIS

1. constructos teóricos definidospor propriedades lingüísticasintrínsecas;

2. constituem seqüênciaslingüísticas ou seqüências deenunciados no interior dos gênerose não são textos empíricos;

3. sua nomeação abrange umconjunto limitado de categoriasteóricas determinadas poraspectos lexicais, sintáticos,relações lógicas, tempo verbal;

GÊNEROS TEXTUAIS

1. realizações lingüísticas concretasdefinidas por propriedadessóciodiscursivas;

2. constituem textos empiricamenterealizados cumprindo funções emsituações comunicativas;

3. sua nomeação abrange umconjunto aberto e praticamenteilimitado de designações concretasdeterminadas pelo canal, estilo,conteúdo, composição e função;

Você deve estar se lembrando do tempo de escola. Alguns profes-sores pediam para você escrever descrição, narração como se fos-sem gêneros de texto, com alguma função nas relações comunicati-vas, mas não são gêneros. São tipos de texto que se combinam nointerior do gênero. Veja agora, abaixo, à esquerda, as designaçõesteóricas dos tipos de texto e, à direita, exemplos de gêneros de texto:

DESIGNAÇÕES TEÓRICAS DOSTIPOS (WERLICH, 1973):

• descritivo (enunciado de estruturasimples, verbo estático nopresente),

• narrativo (enunciado de ação,verbo de mudança no passado,referência temporal e espacial),

• expositivo (exposição sintéticapelo processo de composição;exposição analítica pelo processode recomposição, relação parte-todo),

• argumentativo (enunciado deatribuição de qualidade, juízo devalor, verbo ser no presente), e

• injuntivo (enunciado incitador deação, verbo no imperativo, uso domodalizador deve, vocativo).

EXEMPLOS DE GÊNEROS:

Carta íntima, carta formal, relatório,conta de luz, conta de água,partitura,ata, resenha, propaganda,piada,cardápio, noticiário de TV,edital de concurso, romance,soneto, horóscopo, encíclica, notafiscal, cordel, crônica, lista decompras, conto, chat, cupom depedágio, instruções de uso,editorial, folder, boleto bancário,receita médica, receita de cosinha,e-mail, monografia, outdoor etc.

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56 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Observando a definição de tipo de texto proposta por ele,percebe-se que ela está relacionada à constituição lingüística queocorre no interior dos gêneros. O tipo seria delimitado por suascaracterísticas lingüísticas constitutivas, ou seja, os tipos são defi-nidos por seus traços lingüísticos predominantes, por isso, naspalavras do autor, “um tipo textual é dado por um conjunto detraços que formam uma seqüência e não um texto”. Um texto éem geral tipologicamente variado ou, dito de outra forma, hetero-gêneo, portanto, “quando se nomeia um certo texto como ‘narra-tivo’, ‘descritivo’ ou ‘argumentativo’, não se está nomeando o gê-nero e sim o predomínio de um tipo de seqüência de base”(MARCUSCHI, 2005, p. 27). O tipo é uma categoria lingüísticaparadigmática, logo, todos os gêneros podem começar a ser anali-sados pela heterogeneidade tipológica que os constitui.

No final do ano, o coordenador do pólo de EaD deChapadão do Sul queria fazer a direção central da UFMS saber dasituação do pólo. Para realizar essa ação (fazer saber sobre a situa-ção do pólo), ele escolheu o gênero mais adequado: o relatório.Veja-o no quadro abaixo, com seis partes enumeradas, correspon-dentes a seis tipos de texto que nele se combinam:

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SULEDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – PÓLO DE CHAPADÃO DO SUL

Relatório

O pólo da EaD de Chapadão do Sul está situado na Rua Bom Futuro, 225, na área centralda cidade. A sede é composta de sete salas: uma da coordenação, uma da secretáriaacadêmica, duas salas para tutoria presencial, uma sala de atividades presenciais, umasala de biblioteca e uma sala de pedagogia. Todas as salas estão em bom estado deconservação e satisfazem as necessidades do módulo. Falta apenas uma sala para olaboratório de computação. Entretanto, o mesmo não ocorre com alguns equipamentos.Alguns computadores estão estragados.

Um bando de formigas pretas entrou nos aparelhos e fez casa lá dentro. O técnico abriuos computadores, matou as formigas e limpou-os. Elas roeram os fios e danificaram odisco rígido e, depois disso, cinco aparelhos não funcionaram mais.

Dizem que isso acontece aqui nesta região e que é preciso fazer dedetização do ambientepara evitar isso.

Considerando esse problema, não poderemos funcionar normalmente, por falta decomputador para os alunos. O argumento de que dois aparelhos são suficientes paraatender parte dos alunos não procede, pois trata-se de dois aparelhos antigos e muitolentos.

Pedimos encarecidamente as providências necessárias, para que possamos atender osalunos normalmente a partir do mês de fevereiro de 2008.

Chapadão do Sul, 15 de dezembro de 2007

________________________________

A coordenação

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Um exemplo!Isso sempre ajuda.

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Você vai fazer as três tarefas abaixo e colocá-las no FÓRUM:

1) Dizer quais os tipos de texto (descritivo, narrativo, argumentativo, injuntivo,expositivo) correspondem às seis partes do relatório acima. Para isso, precisa ler o arti-go intitulado Gêneros textuais: definição e funcionalidade, de Luiz Antônio Marcuschi,no livro Gêneros textuais e ensino (DIONISIO, MACHADO & BEZERRA (Orgs), 2002,pp. 19 a 36). Nesse artigo, ele dá um exemplo de como fazer isso. Relendo o que disse-mos até aqui e lendo esse artigo, você consegue cumprir essa tarefa.

2) Faça um resumo das principais idéias contidas no capítulo intitulado Gênerostextuais no livro Ler e compreender os sentidos do texto (KOCH & ELIAS, 2006, pp.101 a 122).

3) Faça uma relação de todos os gêneros de texto existentes dentro de sua casa e na suarua.

Ao final desta Unidade II, você está percebendo que a língua éusada por meio de textos e que os textos se realizam por meio detipos e de gêneros. Mais do que isso, já percebeu que aprimorar acapacidade de expressão na língua portuguesa, por exemplo, é sa-ber manusear cada vez melhor as habilidades de ler, escrever, ou-vir e falar, utilizando a linguagem falada ou escrita para produzirnovos textos. Se quiser, e somente se quiser aprender mais, leia aseguinte obra: Dell’Isola, Regina Lúcia Péret. Retextualização degêneros escritos. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. Repetimos: essa lei-tura não é obrigatória.

Veja que o gênero relatório é composto pela ordenação de dife-rentes tipos de texto. Você certamente já deve estar perguntando:essas sete partes do relatório correspondem a que tipos de texto?Nós poderíamos responder-lhe, mas você é o aprendente e podedar essa resposta, relendo o que foi dito atrás e fazendo o que épedido no SABER MAIS abaixo.

Para saber mais

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58 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

EM BRANCO

VERSO DE PÁGINA

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59Leitura e Produção de Textos

UNIDADE 3

O texto esuas estratégias de

construção e interpretação

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60 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Nesta Unidade, pretendemos evidenciar por que énecessário substituir a noção de referente pela noçãode objeto-de-discurso, bem como a noção de referênciapela noção de referenciação.

Nessa perspectiva, enfatizaremos que a referenciação é umaatividade discursiva e que a construção textual se dá num jogoentre vários movimentos: um para frente (projetivo) e outro paratrás (retrospectivo), representáveis em parte pela catáfora e pelaanáfora, respectivamente, entre outros movimentos.

Assim, o texto não se constitui como a soma de elementosnovos com outros já postos em etapas posteriores, mas comoum universo de relações seqüenciadas, mas não lineares.Há nele uma parte visível, ou seja, a sua materialidadelingüística (o explícito), e outra parte invisível (o implícito).

Diante do exposto, podemos inferir que o sentido não épreestabelecido no texto, mas construído na interação autor-texto-leitor. Portanto, cabe ao autor e ao leitor considerar os implícitose preencher as lacunas do texto de acordo com as sinalizaçõesnele propostas e com base nos conhecimentos que possuem.

A Unidade III está dividida em duas subunidades:

3.1. Referenciação e progressão referencial;

3.2. Coerência textual: um princípio de interpretabilidade.

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61Leitura e Produção de Textos

Então, agora deu para entender por que os conceitos dereferenciação e de progressão referencial são inter-relacionados?

Um exemplo pode ajudá-lo. Veja esta notícia (Texto 1).

Texto 1

Vamos iniciar a Unidade III, com o estudo da referenciação e daprogressão textual.

Por que estamos propondo o estudo conjunto desses dois con-ceitos? Observe a apresentação de cada um deles:

3 REFERENCIAÇÃO E PROGRESSÃO REFERENCIAL

Denomina-se referenciação o processo de introduzir, no texto,“novas entidades ou referentes. Quando tais referentes são re-tomados mais adiante ou servem de base para a introdução denovos referentes, tem-se o que se denomina progressãoreferencial” (KOCH & ELIAS, 2006, p. 121).

Sim ou não?

Maria Lima de Jesus, 35, foi estuprada na Rua Catumbi, on-tem, às 22 horas, quando voltava do trabalho. A vítima sofreutodo tipo de violência e foi socorrida por um morador e fez umboletim de ocorrência na delegacia do bairro da Prata.A mulher trajava minissaia e blusa bastante decotada, o quechamou a atenção do pessoal de plantão. O delegado prometeuinvestigação, mas ponderou que a “dita cuja não trajava roupaadequada para quem vinha do trabalho”. Segundo ele, têm sidofreqüentes ataques como esse a mulheres facilitadas. Adaptação: José Genésio Fernandes.

Essa notícia é de um jornaleco machista, da pior espécie, e foimodificada para atender o nosso propósito aqui. Veja que o jorna-lista vai construindo um referente no seu texto. Como? Primeira-

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62 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

mente, ele introduz um referente, Maria Lima de Jesus e, em se-guida, vai retomando esse referente, por meio de outras expres-sões: “a vítima”, “a mulher”, “a dita cuja” e, por fim, “mulheresfacilitadas”. Assim, o autor introduz um referente no texto e o vaifazendo progredir, por meio da reconstrução dele com outras ex-pressões lexicais, segundo sua visão machista de mundo. O textoficaria monótono se ele repetisse o nome da mulher no lugar decada expressão pela qual ele a retoma.

Se você concluiu que a referenciação consiste na construção dereferentes e a progressão referencial na reconstrução desses refe-rentes, compreendeu que, na construção e na interpretação do tex-to, esses dois processos são inter-relacionados.

Cabe, agora, esclarecer que, atualmente, os referentes são deno-minados objetos-de-discurso. Ou seja, os referentes de que fala-mos, nos textos, não correspondem diretamente aos objetos domundo natural, não são meros rótulos para designar as coisas domundo. Por isso, os referentes são os objetos que construímos ereconstruímos no interior do próprio discurso, de acordo com nos-sas crenças, atitudes e objetivos comunicativos. Daí a razão de subs-tituir a noção de referente pela noção de objeto-de-discurso, bemcomo a noção de referência pela noção de referenciação.

Nele, como viu, não está emquestão uma mulher real, mas uma mulher significada ouconstruída no texto, a partir do ponto de vista machista do autor.Primeiro passo: ele introduz a mulher no texto/discurso pelo seunome próprio completo e respeitoso: Maria Lima de Jesus.

Segundo passo: ele reconstrói esse referente pela expressão “avítima” e, com isso, não se trata mais de apenas um nome, mas deuma pessoa em estado de sofrimento causado pela ação ilícita deoutra pessoa. Terceiro passo: com a expressão “a mulher”, ele reto-ma o referente “a vítima”, de maneira definida, focando sua femi-nilidade, e ainda sem desmerecê-la. Quarto passo: pela expressão“dita cuja” e “mulheres facilitadas”, ele reconstrói os referentesanteriores de maneira depreciativa e de tal forma que Maria Limade Jesus não é mais a vítima, mas a culpada.

Veja que a reconstrução dos referentes vai sendo feita por graus:“dita cuja” a desmerece pelo nível de linguagem. Segundo o Dici-onário Eletrônico Houaiss, a expressão designa o “ser de que já sefalou, quando não se deseja nomeá-lo”. E, “Mulher facilitada” adesmerece mais ainda, pois a transforma no pior, em mulher fácilsexualmente. A vítima virou culpada no discurso.

Portanto, a referenciação e a progressão referencial consistemna construção e na reconstrução de objetos-de-discurso. Verifiquecomo isso ocorre também no Texto 2.

Nós apostamos que, pela leitura da notíciasobre a mulher, Texto 1, você já entendeu isso!

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63Leitura e Produção de Textos

Texto 2

Descoberta nova espécie de coruja em PernambucoPesquisadores brasileiros descobriram uma nova espécie decoruja, exclusiva de Pernambuco. A ave, que habita a MataAtlântica, pesa cerca de 50 gramas e mede 14 centímetros, daponta do bico à da cauda. O animal apenas é encontrado emdois fragmentos de floresta, ambos ao sul do Estado, e estáameaçado de extinção.A coruja, chamada de caburé-de-pernambuco, foi vista pelaprimeira vez em 1980. Rara, voltou a ser encontrada em no-vembro de 2001. Comparando com outras espécies de corujas,três cientistas chegaram à conclusão de que se tratava de umaave desconhecida.Com a descoberta, sobe para 20 o número de corujas conheci-das no Brasil. A descrição da nova espécie foi publicada no últi-mo número da Revista Ararajuba, da Sociedade Brasileira deOrnitologia. Além de Cardoso, são autores do artigo, ArthurGalileu de Miranda Coelho, professor aposentado da Universi-dade Federal de Pernambuco (UFPE), e Luiz Pedreira Gonzaga,da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Fonte: Verônica Falcão. Jornal do Commercio - Recife, PE. Junho 2003.

O referente principal — uma nova espécie de coruja — após serintroduzido, é retomado por meio de novos referentes: a ave, oanimal, a coruja, caburé-de-pernambuco, rara, uma ave desconhe-cida. Esses movimentos caracterizam, portanto, as atividadesdiscursivas de referenciação e de progressão referencial.

Na atividade discursiva de referenciação, o produtor do texto,em interação com outros sujeitos, opera sobre o material lingüísticoque tem à sua disposição e escolhe as formas de referenciação deacordo com um querer-dizer, para representar determinados esta-dos de coisas. “Os objetos-de-discurso não se confundem com arealidade extralingüística, eles a (re)constroem no próprio proces-so de interação” (KOCH & ELIAS, 2006, p. 124).

Analise um exemplo do que acabamos de afirmar, lendo o Tex-to 3.

Texto 3

O dia começa às cinco para a turma que serve o café da manhã— carregam os pães e grandes vasilhames com café em carri-nhos de ferro. Pelos guichês das celas trancadas surgem cane-cas e bules amassados, à medida que o grupo passa. Os inimi-gos da aurora deixam a vasilha de café no guichê da porta ependuram um saco plástico para receber o pãozinho com man-teiga e evitar o suplício de sair da cama. Fonte: Koch & Elias. Ler e compreender: os sentidos do texto. (2006, pp. 124-125).

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64 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Você saberia dizer a que se refere a expressão os inimigos da au-rora? Acertou, se entendeu que tal expressão faz sentido apenas nointerior desse texto, no qual ela se refere aos detentos que não gos-tam de acordar cedo. Fora desse contexto, seria muito difícil “desco-brir” o referente da expressão: ele é construído textualmente.

Você deve ter observado que, para chegar a reconhecer esse re-ferente, foi necessário utilizar o saber construído lingüisticamentepelo próprio texto e as inferências que podem ser calculadas pormeio dos elementos nele presentes. E isso só foi possível porquevocê mobilizou conhecimentos lexicais, enciclopédicos e culturaise lugares-comuns de uma determinada sociedade, além de sabe-res, opiniões e juízos ativados no momento da interação autor –texto – leitor.

3.1 Estratégias de referenciação

As estratégias de referenciação, utilizadas na construção dos re-ferentes textuais, são:

• Introdução (construção): é o caso de: (a) Maria Lima de Jesus,no Texto 1; (b) uma nova espécie de coruja, no Texto 2: um objetoaté então não citado no texto foi introduzido no texto, de modoque a expressão lingüística que o representa foi posta em foco, res-saltando esse “objeto” no modelo textual.

• Retomada (manutenção): é o caso das expressões: (a) a vítima,a mulher, a dita cuja, mulheres facilitadas; no Texto 1; (b) a ave, oanimal, a coruja, caburé-de-pernambuco, rara, uma ave desconhe-cida, a nova espécie, no Texto 2, formas referenciais que reativamum “objeto” já presente no texto, de modo que tal objeto-de-dis-curso se mantém em foco.

• Desfocalização: quando acontece a introdução de um novoobjeto-de-discurso que passa a ser o foco, mas o objeto retirado defoco mantém-se em estado de ativação parcial, para utilização ime-diata sempre que necessário. No Texto 2, no qual o foco é umanova espécie de coruja, ocorre uma desfocalização, no trecho: Alémde Cardoso, são autores do artigo, Arthur Galileu de Miranda Co-elho, professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco(UFPE), e Luiz Pedreira Gonzaga, da Universidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ).

Assim, podemos concluir que “referentes já existentes podemser, a qualquer momento, modificados ou expandidos, de modoque, durante o processo de compreensão, vai-se criando namemória do leitor ou do ouvinte uma representação extrema-mente complexa, pelo acréscimo sucessivo de novascategorizações e/ou avaliações acerca do referente”. (KOCH & ELIAS, 2006, p. 126).

Ou seja: conclusões,deduções, conseqüênciaslógicas.

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65Leitura e Produção de Textos

3.2 Formas de introdução de referentes no modelo textual

No Texto 1, vimos uma forma de introduzir um objeto-de-dis-curso novo no texto representado pela expressão uma nova espé-cie de coruja. Esse processo de introdução de referentes textuais édenominado ativação não-ancorada.

Outra forma de introduzir um novo objeto-de-discurso no tex-to é a ativação ancorada. Ela ocorre quando o novo objeto-de-dis-curso “ancora-se”, ou seja, fundamenta-se em algum tipo de asso-ciação com elementos já presentes no co-texto ou no contextosociocognitivo.

Você pode encontrá-lo no Texto 3, no qual a expressão os inimi-gos da aurora refere-se aos detentos que não gostam de levantarcedo, o que só nos foi possível reconhecer, porque associamos talexpressão a enunciados presentes no co-texto, como “Pelos gui-chês das celas trancadas surgem canecas e bules amassados [...] Osinimigos da aurora deixam a vasilha de café no guichê da porta ependuram um saco plástico para receber o pãozinho com mantei-ga e evitar o suplício de sair da cama”. A partir desses enunciados,e ativando nossos conhecimentos sociocognitivos, reconhecemosna cena narrada, a rotina de indivíduos privados da liberdade.

Entender o que vai ser explicado no próximo item, implica queantes você entenda os conceitos de anáfora e catáfora, apresenta-dos a seguir.

Anáfora é o mecanismo por meio do qual se aponta ou remetepara elementos presentes no texto ou que são inferíveis a partirdeste. Comumente, reserva-se a denominação de anáfora à re-missão para trás (por ex., Paulo saiu; ele foi ao cinema) e decatáfora, à remissão para frente (por ex.: Só quero isto: que vocêsme entendam). (KOCH & ELIAS, 2006, 127).

3.3 Retomada ou manutenção no modelo textual

O uso de pronomes ou outras formas de valor pronominal cons-titui a principal estratégia de referenciação textual, utilizada pararetomar ou manter em foco objetos previamente introduzidos, for-mando as cadeias referenciais ou coesivas, que promovem a pro-gressão referencial do texto.

Tendo em vista o objeto já ativado no texto, a progressãoreferencial pode realizar-se por meio de recursos de natureza gra-matical, como pronomes, elipses, numerais, advérbios de lugar,ou de natureza lexical, como sinônimos, hiperônimos, expressõesnominais entre outros.

Consulte:KOCH, Ingedore V.O texto e a construçãode sentidos. São Paulo:Contexto, 1997.

Saiba mais

Você quer ver um exemplode ativação ancorada?

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66 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Inicialmente, vamos tratar dos recursos de natureza gramaticalpara retomar ou manter em foco os objetos-de-discurso.

Veja, no Texto 4, como as substituições pronominais foram ocor-rendo e promovendo a seqüência requisitada pela coerência:

Texto 4

1 - O Imperador D. Pedro II sempre se empenhou em mudar aimagem externa do Brasil e em

2 - transmitir seu “verdadeiro” aspecto civilizado. Ele visitoupessoalmente a Exposição

3 - Universal da Filadélfia (1876). Lá teria conhecido AlexanderGraham Bell, que lhe

4 - apresentou sua mais nova invenção, o telefone. Ao testá-lo, oimperador teria dito ao inventor

5 - americano que, estando disponível no mercado, o Brasil se-ria o seu primeiro comprador.

Fonte: Folha de S. Paulo, 19/11/2000. Trecho citado por: ANTUNES, Irandé.Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial, 2005 p. 90-91.

Quadro 1Os nexos coesivos do Texto 4.

Termo(s) referente(s)

O Imperador D. Pedro II

Brasil

Exposição Universal da Filadélfia

Alexander Graham Bell

o telefone

Termo(s) substituto(s)

...se, Ele, lhe.

...seu

...Lá

...que, sua

...-lo, seu

Linha(s)

1, 2, 3.

1, 2.

2, 3.

3, 4.

4, 5.

O Quadro 1 possibilita a você observar, de modo objetivo, osoito pronomes (se, Ele, lhe, seu, que, sua, -lo, seu) e o advérbio(Lá), todos substituindo um determinado termo antecedente, aolongo do Texto 4.

Observe também que, para não se confundir na identificaçãodo referente do pronome seu (linha 5) é o telefone (linha 4) vocêprecisa fazer uma leitura cuidadosa do texto.

Ao ler o Texto 4, você notou que a ligação entre o termo antece-dente e seu termo substituto forma um nexo —um nexo coesivo— e que a ocorrência de vários nexos forma uma cadeia — umacadeia coesiva —, por exemplo:(ANTUNES, 2005, 91)

O Imperador D. Pedro II se Ele lhe

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67Leitura e Produção de Textos

Sobre essa cadeia, observe que ela é a maior de todas e perpassao texto todo. Isso indica que a expressão O Imperador D. Pedro IIrepresenta o elemento nuclear em torno do qual se desenvolve anotícia.

Após a análise das substituições pronominais que foram consti-tuindo as cadeias coesivas no Texto 4, você notou que todos ospronomes, além do advérbio, configuram casos de anáforas, poisretomam termos situados antes deles na seqüência textual?

Veja agora um exemplo de catáfora, ou seja: o pronome vemantes do nome que ele, antecipadamente, substitui:

Sob um sol escaldante, ele chega impecável (...) ao acampamentodos guerrilheiros (...) no Camboja, território minado e ondenenhum diplomata havia pisado antes. Como prova de confi-ança, os guerrilheiros pedem que ele nade num rio. Sem titu-bear, ele entra na água. Era o ano de 1992. Negociava-se diplo-maticamente a intrincada e difícil tarefa de repatriar 370cambojanos, muitos vivendo na vizinha Tailândia. A repatria-ção aconteceu sem uma única vítima. Esse é apenas um dosmuitos méritos de Sérgio Vieira de Mello, Comissário de Direi-tos Humanos da ONU, que morreu em 19 de agosto de 2003.Fonte: IstoÉ, 23/9/03. Trecho citado por: ANTUNES, Irandé. Lutar com palavras:coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial, 2005 p. 88.

Vamos passar agora a tratar dos recursos de natureza lexical usa-dos para retomar ou manter em foco objetos-de-discurso já ativadosno texto.

Retomar ou manter uma unidade lexical (substantivos, adjeti-vos, verbos e alguns advérbios), substituindo-a por outra, é, tam-bém, um recurso coesivo pelo qual ocorre a inter-relação de doisou mais segmentos textuais. Tal mecanismo de substituição impli-ca, pois, o uso de uma palavra no lugar de uma outra que lhe sejatextualmente equivalente.

Isso pressupõe um ato de análise e interpretação para avaliar aadequação do termo substituidor quanto ao que se pretende con-seguir com a retomada ou a manutenção do foco de determinadosobjetos-de-discurso.

Justifique sua resposta.

Eis um exemplo que pode auxiliar você a verificar se a sua res-posta à pergunta acima foi adequada, quanto a reconhecer os re-cursos de natureza lexical usados para retomar ou manter em focoobjetos-de-discurso já ativados no texto 5:

Você percebeu essa ocorrência nos textos(Textos 1 a 4) já apresentados nesta Unidade?

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68 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Texto 5

Saia de bolinhas, colete preto e cabelos presos, Madonna estavamais para a santa Evita que para a demoníaca material girl quan-do desembarcou em Buenos Aires, no sábado 20. A tática usadapela pop star era para aplacar um pouco os ânimos argentinos,mas não deu muito certo: escalada pelo diretor Alan Parker paraviver no cinema o papel de Eva Perón (1919-1952), a estrelaamericana vem enfrentando a ira dos peronistas. Foi recebidacom pichações e bombardeada pela imprensa. Tentando con-tornar a situação, Madonna foi logo dizendo que estava em mis-são de paz.

Fonte: ANTUNES, Irandé. Lutar com palavras: coesão e coerência.São Paulo: Parábola Editorial, 2005. p. 97.

Esperamos que você tenha observado que a substituição, aolongo do texto, do referente Madonna pela cadeia coesiva oureferencial — a demoníaca material girl, a pop star, a estrelaamericana, Madonna — possibilita acrescentar informações oudados novos a respeito desse objeto-de-discurso. Por isso, o textose torna mais informativo.

Finalizando esta subunidade 3.1, esperamos que você tenhacompreendido:

1) por que é necessário substituir a noção de referente pela no-ção de objeto-de-discurso, bem como a noção de referência pelanoção de referenciação;

2) que a referenciação é uma atividade discursiva e que a cons-trução e a interpretação de um texto implicam um jogo entrevários movimentos: um para frente (projetivo) e outro para trás(retrospectivo), representáveis em parte pela catáfora e pelaanáfora, respectivamente, entre outros movimentos;

3) que um texto não se constitui como a soma de elementosnovos com outros já postos em etapas posteriores, mas comoum universo de relações seqüenciadas, mas não lineares. Hánele uma parte visível, ou seja, a sua materialidade lingüística(o explícito), e outra parte invisível (o implícito);

4) que o sentido não é algo preestabelecido no texto, masconstruído na interação autor-texto-leitor, o que implica con-siderar os implícitos e preencher as lacunas do texto de acor-do com as sinalizações nele propostas e com base em conhe-cimentos lingüísticos, enciclopédicos e interacionais, entreoutros.

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69Leitura e Produção de Textos

Para completar o estudo feito na subunidade 3.1, faça umrelatório de leitura dos capítulos 7 e 8 do livro Ler e compreen-der: os sentidos do texto (KOCH & ELIAS, 2006), especificados aseguir:

Capítulo 7: Funções das expressões nominais referenciais (pp.137-149).

Capítulo 8: Seqüenciação textual (pp. 152-181).

A seguir, encaminhe seu relatório ao FÓRUM e leia três rela-tórios dos colegas para compará-los com o seu. Se desejar, façacomentários sobre os relatórios lidos para discutir idéias ou su-gerir algo que julgar interessante.

Observe que você não deve fazer um resumo dos capítuloslidos, mas um relatório desses dois capítulos que você irá lerpara aprender mais sobre a construção e a interpretação de umtexto, para confrontar idéias, para tirar conclusões. Ou seja, aleitura deve ser reflexiva e crítica. Para isso, você deve utilizaros conhecimentos adquiridos ao longo do Módulo Leitura eProdução de Textos, bem como outros adquiridos por meio deoutras leituras ou de suas atividades sociocomunicativas.

O que as autoras do texto (KOCH & ELIAS) dizem a você?O que você diz às autoras do texto? O texto tem alguma relaçãocom alguma coisa que você já leu, ou conheceu de outra for-ma? Você formulou perguntas para as autoras antes de iniciar aleitura? Quais? Obteve respostas? Que dúvidas persistiram?Achou a tarefa fácil ou trabalhosa? Como resolveu as dificulda-des que surgiram? Outras perguntas devem surgir no decorrerda leitura e da elaboração do relatório.

Consulte também a subunidade 2.4, na qual foi discutida aelaboração de um relatório (p. 54). Recorra ao seu TUTOR quan-do precisar.

Para saber mais

Com o objetivo de orientá-lo, sugerimosalgumas perguntas-chave sobre o conteúdo e

o modo de ler cada um dos dois capítulosque lhe indicamos:

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70 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

EM BRANCO

VERSO DE PÁGINA

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71Leitura e Produção de Textos

Vamos introduzir o estudo desta última parte com uma histó-ria. Não vamos dizer que é verdadeiríssima, porque você sabe, muitobem, que quem conta um conto aumenta um ponto. Mas que acon-teceu lá pelo interior de Mato Grosso do Sul, isso aconteceu. Évero!!!

Uma professora levou para a sala um gênero de texto bem co-nhecido, a fábula da Raposa e as uvas. Leu-a com os alunos epediu uma tarefa: na aula seguinte todos deveriam trazer-lhe umtexto próprio, um reconto da fábula. No outro dia, cada um entre-gou-lhe a tarefa. Na hora dos comentários dos textos, ela notouque um dos meninos falava de um lobo. Ela estranhou: lobo? Nãotem lobo na fábula lida, disse ela. Tem, sim, disse o menino, comtoda a certeza do mundo. Está bem aqui, disse-lhe, apontando como dedo a expressão “o matreiro animal”.

O menino não sabia o significado de “matreiro” e trocou-o por“mateiro”, ajeitando as coisas lá na sua cabeça, comendo um erreda palavra, criando um outro referente para o texto lido. Você cer-tamente está perguntando: mas de onde ele tirou isso? E a respostaé: ele retirou isso do seu conhecimento de mundo, de sua históriade vida. No seu mundo, lá nessa região, existe um tipo de lobochamado lobo mateiro. Sua história de vida tem histórias de lobo,desse tipo de lobo.

Não estamos dizendo que o menino foi um bom leitor da fábu-la, pois faltou a ele conhecimento suficiente para diferenciar o sen-tido de “matreiro” e “mateiro”. O que queremos demonstrar comesse caso é que cada um de nós faz das tripas coração para cons-truir a coerência do que ouve e do que lê. A construção mais apro-priada da coerência é aquela que resulta do processamento domaior número de conhecimentos: lingüísticos, enciclopédicos, tex-tuais e interacionais, conforme vimos atrás.

Esse caso da raposa da fábula que virou lobo mateiro no recontodo menino é um bom exemplo para afirmar que a coerência dotexto é sempre uma construção. Todos nós estamos no mundo eesse mundo só tem sentido para nós, quando produzimos um sen-

COERÊNCIA TEXTUAL:UM PRINCÍPIO DE INTERPRETABILIDADE

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72 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

tido para ele. Estamos sempre produzindo sentidos para aquiloque lemos ou ouvimos. Como? A resposta é: com nossos conheci-mentos sociocognitivos construídos na interação com os outros eguardados em nossa memória. Veja o texto 1, abaixo:

Texto 1

Folha de S. Paulo, 30 de agosto de 2007.

Observe o texto 1. Você pode afirmar que a coerência está notexto? Pode mostrá-la para nós? Certamente que não. A coerêncianão é uma coisa material e visível à espera de nós no texto. Repeti-mos: ela é uma construção nossa. Uma construção que fazemos,interagindo com o autor e o texto, seguindo as pistas dadas e pro-cessando-as com a ajuda dos conhecimentos que possuímos.

O leitor que ri ao ler o texto 1 comprova que construiu umsentido de humor para ele, a não ser que esteja fingindo, para evi-tar ser taxado de lento ou de leso. Se ri sinceramente, é porquesoube acionar os conhecimentos que possui, para construir essesentido. Quais conhecimentos?

Conhecimento: a) do gênero de texto (a tirinha é um gênerocuja ação é a crítica de comportamentos, costumes, valores); b)conhecimento de mundo (sex-shop, padaria); c) conhecimento prag-mático (é absurdo confundir sex-shop com padaria). Assim com-preendemos o jogo que provoca o riso, nessa situação comu-nicativa. O filho, surpreendido pelo pai no sex-shop, finge ter co-metido um erro pragmático, dirigindo-se ao sex-shop pensando seruma padaria. O pai, sacando a esperteza do filho, também fingenão ter conhecimento de mundo suficiente para distinguir umabaguete de um pênis vibrador. Veja quantos conhecimentos o lei-tor precisa acionar para construir a coerência do texto, para poderrir.

Dizem os manuais de ensino que um texto deve ter coerência ecoesão. A coesão, como o próprio nome diz (coeso significa ligado),é a propriedade que determinados elementos textuais têm de esta-belecer relação entre si e com outros fatores do texto. Veja os textos2 e 3:

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73Leitura e Produção de Textos

Texto 2

Amigão! Só, só, só. A mina lá. Este verão. Ricardão e maisricardão... Noite de cão. Você nos braços de Morfeu. Fui ma-drugada alta. Adeus toda república! Betão.

Texto 3

Amigão, me senti muito só essa noite, enquanto minha namo-rada está lá longe, neste verão cheio de ricardão. Por isso, passeiuma noite de cão enquanto você dormia profundamente e re-solvi partir bem de madrugada. Dê um adeus para todos darepública. Até logo: Betão.

Veja que o texto 2 não é um texto coeso. Não possui elementosformais que servem para fazer a ligação, a relação, a conexão entreas palavras do texto, como o texto 3. Entretanto, o texto 2 é coeren-te, pois permite ao estudante, o “amigão”, construir o sentido dobilhete do Betão. Por outras palavras, permite ao amigão fazer ocálculo do seu sentido, considerando os elementos contextuais. Acoesão facilita estabelecer a coerência, mas conforme Koch (2006,p. 186),

“a coesão não é condição necessária nem suficiente da coerên-cia: as marcas de coesão encontram-se no texto (“tecem o teci-do do texto”), enquanto a coerência não se encontra no texto,mas constrói-se a partir dele, em dada situação comunicativa,com base em uma série da fatores de ordem semântica,cognitiva, pragmática e interacional”

Estamos certos de que compreendeu bem o que foi exposto,mas é preciso saber que isso não é tudo. Você verá, com maisestudo, que conceituar coerência não é simples como parece.Por isso, é preciso estudar mais e sempre, recorrendo às obrasmais atualizadas, pois muitas obras apresentam conceitos ultra-passados. Além disso, é preciso saber que existem vários tiposde coerência: sintática, semântica, temática, pragmática eestilística. Não vamos explicar e nem dar exemplo desses tiposde coerência: você é que vai fazer isso, com a ajuda do que apren-deu nas outras unidades e com a leitura do capítulo 9 da obraLer e compreender os sentidos do texto. Veja o que é para fazer, no“saber mais”.

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74 LETRAS (Português e Espanhol) – Licenciatura

Para fazer as duas tarefas, você precisa de três textos: primeiro, o capítulo 9 da obra Lere compreender os sentidos do texto (KOCH, 2006, pp. 183 a 211); segundo, a Lição 24 daobra Lição de texto: leitura e redação (FIORIN (2003, pp. 367 a 392); e em terceiro lugar,a Lição 25 da mesma obra (FIORIN (2003, pp. 393 a 411).

Tarefa 1:

Depois de ler o capitulo 9 da obra Ler e compreender os sentidosdo texto, escreva uma carta para um dos colegas de EaD, conten-do: a) os objetivos do capítulo; b) uma definição de coerência ede coesão; c) uma explicação do que seja coerência sintática, se-mântica, temática, pragmática e estilística, apresentando exem-plos de cada tipo. Escreva de forma que ele compreenda sua ex-plicação. Coloque a carta no FÓRUM.

Tarefa 2:

A lição 25 da obra Lição de texto: leitura e redação apresenta opoema Infância na página 395 e o poema Paviloviana, na pági-na 409 e 410. Faça um comentário sobre os dois textos, do pontode vista da coerência e coesão, e coloque no FÓRUM. O que sequer aqui é que leia a lição, pois o autor já faz isso.

Para saber mais

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Este é o Guia Didático da disciplina Leitura e Produção

de Textos, obrigatória para os alunos dos diferentes

Cursos de Graduação, na modalidade EaD, da UFMS.

O objetivo dele é contribuir para que o aluno tenha bom

desempenho em duas atividades de linguagem,

indispensáveis em qualquer área do conhecimento:

leitura e produção de textos.

Em nosso curso, vamos falar muito da atividade que os

homens realizam com a linguagem. É. Os homens agem

uns sobre os outros, com e por meio da linguagem.

Já reparou? Dia e noite, eles estão produzindo e lendo

textos, com algum objetivo. Dessa imensa produção

linguageira resultam as imagens desses homens, de

suas comunidades, de seus países. Se um povo morre e

deixa textos, podemos saber dele por meio da leitura dos

textos que deixou. Se não deixa textos, desaparece para

sempre. Você verá que a questão da linguagem é uma

questão central para todos os domínios do

conhecimento, para todos os cursos, para

todas as disciplinas.