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Loucos Diversidade Final

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  • Copyright c 2008 de Paulo Duarte de Carvalho AmaranteTodos os direitos desta edio reservados Fundao Oswaldo Cruz/LAPSISBN:

    CapaAdriana Carvalho e Felippe AmaranteProjeto Grfico e Editorao EletrnicaFlavia Manes e Renata Maus MesquitaSuperviso EditorialPaulo Amarante e Renata Ruiz

    Catalogao na fonteInstituto de Comunicao e Informao Cientfica e Tecnolgica em SadeBiblioteca de Sade Pblica

    A485 Amarante, Paulo e Lima, Ricardo (Coord.)Loucos pela diversidade: da diversidade da loucura

    identidade da cultura. Relatrio final. / Coordenado porPaulo Amarante e Ricardo Lima. [Rio de Janeiro]: s.n.,2008. 105 p. 1. Sade Mental. 2. Desinstitucionalizao. 3.Diversidade Cultural. 4. Polticas Pblicas de Sade. 5.Congressos. I. Amarante, Paulo (Coord.) II. Lima, Ricardo(Coord.) III. Ttulo. IV. Oficina Loucos pela Diversidadeda Diversidade da Loucura Identidade da Cultura (Riode Janeiro: 2007).

    CDD - 21.ed. 362.2

    2008Laboratrio de Estudos e Pesquisas em Sade Mental/FiocruzAv. Brasil, 4036 sala 506

  • Loucos pela Diversidadeda diversidade da loucura

    identidade da cultura

  • PRESIDNCIA DA REPBLICAPRESIDENTE Luiz Incio Lula da Silva

    MINISTRIO DA CULTURAMINISTRO Gilberto Passos Gil MoreiraSECRETRIO EXECUTIVO Joo Luiz Silva Ferreira

    SECRETARIA DA IDENTIDADE E DA DIVERSIDADE CULTURALSECRETRIO Srgio Duarte MambertiSUBSECRETRIO Ricardo Anair Barbosa de LimaGERENTE Amrico Crdula

    MINISTRIO DA SADEMINISTRO Jos Gomes Temporo

    FUNDAO OSWALDO CRUZPRESIDENTE Paulo Marchiori Buss

    ESCOLA NACIONAL DE SADE PBLICADIRETOR Antonio Ivo de Carvalho

    DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAO E PLANEJAMENTO EMSADE

    COORDENADORA GERAL Maria Alicia Dominguez Uga

    LABORATRIO DE ESTUDOS E PESQUISAS EM SADE MENTALCOORDENADOR Paulo Duarte de Carvalho Amarante

  • COORDENAOPaulo Amarante (Laboratrio deEstudos e Pesquisas em SadeMental - Laps/Escola Nacional deSade Pblica Sergio Arouca -Ensp/Fundao Oswaldo Cruz -Fiocruz)

    Ricardo Lima (Secretaria daIdentidade e da DiversidadeCultural - SID/Ministrio daCultura - MinC)

    ORGANIZAO E PRODUOLAPS/ENSP/FIOCRUZurea Pitta, Beatriz Adura,Edvaldo Nabuco, Leandra Brasil,Lucrcia Corbella, Patrcia VieiraDuarte e Renata Ruiz

    MINCAna Maria Villalba, Glucia Lira eKarina Miranda (equipe tcnica,SID); Patrcia Dornelles(colaboradora, SID); Fred Maia(gerente, Secretaria de ArticulaoInstitucional); Ana Lcia Pardo(representante MinC/RJ)

    GRUPO DE APOIO PARTICIPAO INTERATIVAClvis de Souza, Henrique Dantas,Jlio Almeida e Mateus Fernandes

    CONFECO DE MATERIALPERSONALIZADOOficina de Sucata - Centro de AtenoPsicossocial Rubens Correia (RJ)

    BUFFETCooperativa da Praia Vermelha (RJ)FILMAGEMVdeo Sade/Instituto deComunicao e Informao Cientfica eTecnolgica em Sade - ICICT/Fiocruz

    DOCUMENTRIOTV Pinel (RJ)

    TRANSMISSO AO VIVORede Fiocruz(www.redefiocruz.fiocruz.br)

    FOTOSAna Claudia Cmara, Beatriz Adura,Leandra Brasil e Virgnia Damas

    TRANSCRIESBeatriz Adura, EdvaldoNabuco, Gilmar Altamiro eSimone Baslio

    EDIO E REVISO DETEXTORenata Ruiz, Renata MausMesquita e TherezinhaBomfim

    ARTE USADA NA CAPAInspirada na obra de ArthurBispo do Rosrio (acervo doMuseu Bispo do Rosrio/Instituto Municipal deAssistncia Sade JulianoMoreira)

    DESIGN DA CAPAAdriana Carvalho (Coordenao deComunicao Institucional/Ensp/Fiocruz) e Felippe Amarante

    PROJETO GRFICO E EDITORAOELETRNICAFlavia Manes e Renata MausMesquita

    IMPRESSO E ACABAMENTOCorb Editora Artes Grficas

    FICHA TCNICA

  • Oficina Nacional de Indicao dePolticas Pblicas Culturais para Pessoas em

    Sofrimento Mental e em Situaes de Risco Social

    Loucos pela Diversidadeda diversidade da loucura

    identidade da cultura

    Relatrio Final15 a 17 de agosto de 2007

  • 11Sumrio

    Apresentao 12

    1. Introduo 14

    1.1. Objetivos1.1. Objetivos1.1. Objetivos1.1. Objetivos1.1. Objetivos1.2. Metodologia1.2. Metodologia1.2. Metodologia1.2. Metodologia1.2. Metodologia

    2. Programa da Oficina de Indicao de PolticasPblicas Culturais para Pessoas em SofrimentoMental e em Situaes de Risco Social 19

    2.1. 2.1. 2.1. 2.1. 2.1. Mesa de Abertura 20Atividade Cultural 28

    2. 2. 1 Mesa de DebatesA Diversidade e a Cultura nas Polticas Pblicas 29Atividade Cultural 55

    2.3. 2 Mesa de DebatesIdentidade e Produo de Sentidos:Estratgias de Solidariedade e Reciprocidade 56Atividade Cultural 75

    2.4. Painel TemticoPatrimnio, Difuso e Fomento 76

    3. Indicao de Polticas Pblicas Culturais paraPessoas em Sofrimento Mental e em Situaes deRisco Social: Diretrizes e Aes Aprovadas 102

    3.1. GT Patrimnio3.1. GT Patrimnio3.1. GT Patrimnio3.1. GT Patrimnio3.1. GT Patrimnio 1 0 31 0 31 0 31 0 31 0 33.2. GT Difuso3.2. GT Difuso3.2. GT Difuso3.2. GT Difuso3.2. GT Difuso 1 0 41 0 41 0 41 0 41 0 43.3. GT Fomento3.3. GT Fomento3.3. GT Fomento3.3. GT Fomento3.3. GT Fomento 105

    4. Lista de Participantes 107

  • Apresentao

    com muita alegria e entusiasmo que apresentamos apresente publicao. Ela resultado da poltica da diversidadecultural praticada com base nos objetivos e princpios daConveno sobre a Proteo e Promoo da Diversidade dasExpresses Culturais, aprovada pela Conferncia Geral daOrganizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e aCultura Unesco, no ano de 2005.

    Esse livro muito especial. Ele exibe a riqueza no campoda criatividade e dos pensamentos voltados ao segmento querene as pessoas em sofrimento mental. Sabemos que, nomundo inteiro, o convvio com as diferenas torna-se cadavez mais necessrio. Por isso, estamos radiantes com a ediodessa publicao. Nela esto registrados os debates, as idias,as exposies, as intervenes e a riqueza dos painisdesenvolvidos na Oficina Loucos pela Diversidade daLoucos pela Diversidade daLoucos pela Diversidade daLoucos pela Diversidade daLoucos pela Diversidade daDiversidade da Loucura Identidade da CulturaDiversidade da Loucura Identidade da CulturaDiversidade da Loucura Identidade da CulturaDiversidade da Loucura Identidade da CulturaDiversidade da Loucura Identidade da Cultura, realizadacom a finalidade de indicar polticas pblicas culturais parapessoas em sofrimento mental e em situaes de risco social.Um trabalho intenso e caloroso realizado no Rio de Janeiro, em2007, pelo Ministrio da Cultura, por meio da Secretaria daIdentidade e da Diversidade Cultural, e pelo Ministrio da Sade,por intermdio da Fundao Oswaldo Cruz. Uma oportunidaderara, prestigiada por autoridades, professores, alunos,pesquisadores, artistas, produtores, profissionais e usurios

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  • envolvidos em projetos culturais na rea da sade mental evrios outros segmentos da sociedade.

    Estamos trabalhando no sentido de construir polticaspblicas culturais para segmentos esquecidos ouincompreendidos por nossa sociedade, criadas a partir dediscusses, de debates, de trocas de idias. Polticas pblicasindicadas por pessoas que integram um grupo de trabalho, noqual esto presentes os primeiros interessados ou aqueles aserem contemplados com as aes. Nesse contexto que serealizou a Oficina, cujos frutos j esto sendo colhidos.Convidamos todos a mergulharem nas guas da diversidadeda loucura e da identidade da cultura, certos de que as reflexesaqui presentes contribuiro para os avanos direcionados aoatendimento das necessidades das pessoas em sofrimentomental.

    PAULO AMARANTE E RICARDO LIMACoordenadores da Oficina

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  • 1. INTRODUO

    Este relatrio apresenta os processos e resultadosda oficina Loucos pela Diversidade - da diversidade daLoucos pela Diversidade - da diversidade daLoucos pela Diversidade - da diversidade daLoucos pela Diversidade - da diversidade daLoucos pela Diversidade - da diversidade daloucura identidade da culturaloucura identidade da culturaloucura identidade da culturaloucura identidade da culturaloucura identidade da cultura, promovida pela Secretariada Identidade e da Diversidade Cultural do Ministrio da Culturae pelo Laps/Ensp/Fiocruz, realizada de 15 a 17 de agosto de2007, na Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca, nacidade do Rio de Janeiro.

    No primeiro dia a Oficina foi aberta ao pblico em gerale contou com mais de 300 participantes. Nos demais dias foirestrita aos convidados, cerca de 50 participantes, todos elesenvolvidos em projetos culturais na rea da Sade Mental.

    A Oficina contou com a participao de vriasautoridades, dentre elas o Ministro da Cultura Gilberto Gil, oSecretrio Nacional da Identidade e da Diversidade CulturalSrgio Mamberti, o Subsecretrio Ricardo Lima, o Vice-Presidente da Fundao Oswaldo Cruz, Paulo Ernani GadelhaVieira, o Diretor da Escola Nacional de Sade Pblica SergioArouca, Antonio Ivo de Carvalho, dentre muitos outrosdirigentes pblicos, professores, pesquisadores, artistas,lderes e participantes de experincias e projetos culturaisimportantes para o campo da Sade Mental. Como profissionaisda rea da Sade, alm daqueles diretamente envolvidos emprojetos culturais, foram convidados os componentes do Grupode Trabalho em Sade Mental da Associao Brasileira de Ps-graduao em Sade Coletiva (Abrasco), por seu carterabrangente e envolvimento desde o incio da elaborao doprojeto, por ocasio do VII Congresso Brasileiro da Abrasco,no Rio de Janeiro, em agosto de 2006.

    A Oficina foi coordenada por Ricardo Lima (SID/MinC)e Paulo Amarante (Laps/Ensp/Fiocruz) com o apoio de AnaMaria Vilalba, Glucia Lira e Karina Miranda (equipe tcnica daSID/MinC); de Patricia Dornelles (colaboradora SID/MinC); deAna Lcia Pardo (MinC/RJ) e da equipe do Laps/Ensp/Fiocruzcomposta por: Beatriz Adura, Eduardo Torre, Edvaldo Nabuco,

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  • Leandra Brasil, Lucrcia Corbella, Patrcia Vieira Duarte e RenataRuiz.

    No aspecto metodolgico, a Oficina contou com aparticipao do Grupo de Apoio Participao Interativacomposto por Clvis de Souza, Henrique Dantas, Jlio Almeidae Mateus Fernandes.

    1.1. OBJETIVOSA Oficina teve como objetivo construir propostas de

    diretrizes e aes para subsidiar a elaborao de polticaspblicas do Ministrio da Cultura (MinC) em relao aos sujeitose grupos em sofrimento mental e em situaes de risco social.

    1.2. METODOLOGIA DA OFICINA1.2.1. MESA DE DEBATESAs mesas A Diversidade e a Cultura nas Polticas

    Pblicas e Identidade e Produo de Sentidos: estratgias desolidariedade e reciprocidade tiveram um coordenador e trse quatro palestrantes, respectivamente, denominados deprovocadores. Para esta funo foram convidadosprofissionais que desenvolvem experincias de produo deprojetos artsticos e culturais na rea. Esta atividadeproporcionou relatos de experincias e propostas, bem comoo debate com o pblico participante. O Grupo de Apoio Participao Interativa fez o registro e a sntese das palestrase dos debates produzindo assim parte do material quesubsidiou os Grupos de Trabalho na elaborao das propostasde diretrizes.

    1.2.2. PAINEL TEMTICO

    O painel teve como foco os temas PATRIMNIO, DIFUSO EFOMENTO e contou com um coordenador e um expositor/provocadorpara cada tema. Seguindo-se fala dos expositores foi realizado

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  • um amplo debate com os participantes. Como nas Mesas deDebate, o Painel contou com o registro e sntese proporcionadospela equipe de moderadores.

    1.2.3. GRUPOS DE TRABALHO (GTS)

    Os participantes foram estimulados a compor trs GTs,de acordo com suas prprias escolhas. Cada GT abordou umdos eixos focais da Oficina (PATRIMNIO, DIFUSO E FOMENTO) e ainterface destes eixos com os temas: a) Pontos de Cultura; b)Linhas de pesquisa prioritrias para apoio e financiamento; c)Editais e prmios.

    A discusso nos GTs foi uma continuidade das etapasanteriores, que se prestaram ao acmulo de informaes ereflexes por meio das Mesas de Debate e do Painel. Ou seja,os GTs tiveram a misso de organizar os subsdios das etapasanteriores e demais consideraes de cada tema em propostasde diretrizes e indicar aes para cada diretriz.

    Propostas de diretrizes foram consideradas asindicaes gerais para um conjunto de metas e aes. Elasdeveriam apontar prioridades e revelar princpios e valores quefundamentam as diversas polticas pblicas.

    Foram consideradas propostas de diretrizes fortesaquelas que, em palavras sucintas e de fcil compreenso,afirmam o essencial do que se quer conseguir no futuro. Elasabrem um campo de possibilidades, onde os projetos, osrecursos disponveis e os atores responsveis por suaviabilidade encontram-se de comum acordo. Tambm so fortesquando capazes de convencer outras pessoas quanto a suaimportncia.

    Para ajudar a cumprir esta etapa, cada grupo contoucom o apoio de um facilitador devidamente preparado comrecursos e tcnicas para dar suporte ao trabalho coletivo. Ofacilitador no representava nenhuma instituio ouorganizao ligada oficina, e estava imbudo de doispropsitos primordiais: zelar pela qualidade da participao eapoiar os grupos para que suas propostas se tornassem idiasfortes. Cada GT escolheu um relator para apresentar suaspropostas na Plenria Final.

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  • 1.2.4. PLENRIA FINAL

    A Plenria Final foi realizada com todos os participantes.Nela foram apresentadas as diretrizes e aes elaboradas nosGTs, constituindo assim um espao de ampla reflexo conjunta,de enriquecimento das propostas e de identificao do graude prioridade das mesmas.

    As propostas dos trs GTs foram apresentadasconsecutivamente pelos respectivos relatores, compondo o painelde propostas para considerao da Plenria.

    Em seguida foi feita uma nova leitura do Painel e,simultaneamente, a indicao da necessidade de destaquepor parte dos participantes, ou seja, a necessidade de que fosserevista a diretriz ou ao, seja para aprofundamento daquesto, argumentaes pr ou contra ou mesmo para ajustesde redao.

    Posteriormente, em desdobramento, ocorreu o debatedos destaques, primeiramente das diretrizes e, em seguida,das aes. Ficou estabelecida uma argumentao a favor e umacontra para cada destaque, seguido de votao da proposta.Na maior parte dos casos, a elaborao conjunta de uma novaredao pelos prprios debatedores possibilitou contemplarpontos de vista distintos.

    Durante todo o processo de debate e reviso daspropostas de diretrizes e aes, as alteraes e complementosque surgiram foram sendo visualizados em tempo real em umaprojeo e, ao ser finalizada sua redao, passaram a constar dopainel impresso, de forma a permitir o acompanhamento integralpela plenria. Ao final dos debates os participantes indicaram ograu de prioridade das propostas de diretrizes e aes de cadaeixo. A metodologia desenhada possibilitou a participaoampla e de qualidade, ao mesmo tempo garantiu que aspropostas elaboradas fossem idias-fora que afirmavamconsensos e catalisavam outras idias. O objetivo foi propiciarum exerccio coletivo de sntese, de identificao de pontosde convergncia, divergncia e priorizao, simultaneamenteregistrando as especificidades que ilustram estas prioridades.

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  • 19

    2. PROGRAMA DA OFICINA NACIONAL DE INDICAO DEPOLTICAS PBLICAS CULTURAIS PARA PESSOAS EMSOFRIMENTO MENTAL E EM SITUAES DE RISCO SOCIAL15 de Agosto15 de Agosto15 de Agosto15 de Agosto15 de Agosto

    Mesa de Abertura (pgina 20)Antonio Ivo de Carvalho, Paulo Gadelha, Srgio Mamberti eGilberto Gil

    Atividade Cultural: Grupo Harmonia Enlouquece - RJ

    1 Mesa de Debates (pgina 29)A Diversidade e a Cultura nas Polticas PblicasCoordenao Paulo AmarantePeter Pl Perbat, Cristina Lopes e Geo Britto

    Atividade Cultural: Grupo de Teatro do Oprimido Pirei na Cenna/Centro de Teatro do Oprimido (CTO) - RJ

    2 Mesa de Debates (pgina 56)Identidade e Produo de Sentidos:Estratgias de Solidariedade e ReciprocidadeCoordenao Patrcia DornellesRenato Di Renzo, Leopoldo Nunes, Noale Toja, Francisco Sayo

    Atividade Cultural: Z do Poo e Sarieiro (Z de Matosinhos) - MG

    16 de Agosto16 de Agosto16 de Agosto16 de Agosto16 de Agosto

    Painel Temtico (pgina 76)Patrimnio, Difuso e FomentoCoordenao Adair RochaRicardo Lima, Pedro Gabriel Delgado, Patrcia Dornelles,Fred Maia

    Debate em Plenria, Grupos de Trabalho (GTs)

    17 de Agosto17 de Agosto17 de Agosto17 de Agosto17 de Agosto

    Plenria Final

  • 2.1. MESA DE ABERTURA

    ! Antonio Ivo de Carvalho (Diretor da Ensp/Fiocruz)

    Bom dia a todos, Ministro Gilberto Gil, Secretrio Nacional SrgioMamberti, vice-presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha, os con-vidados da Oficina, professores da escola, alunos e alunas.Em primeiro lugar, eu queria dar boas-vindas a todos e dizerque ampliando e dando uma dimenso prtica nunca encon-trada na escola do homem, uma honra para esta casa essemomento, em que estreitamos uma parceria com Ministrioda Cultura e com a Secretaria da Identidade e DiversidadeCultural nica no mundo, para reafirmar que o acesso cul-tura parte indissocivel para melhoria da qualidade de vidada populao.A Escola Nacional de Sade Pblica da Fundao Oswaldo Cruz,instituio pblica na rea de sade no Brasil, j h dcadas,trabalha com conceito de sade que ultrapassou a idia es-treita, de simples ausncia de doenas e que dependa sim-plesmente do consumo de servios de produtos, medicamen-tos, diagnsticos colocados pelos modelos mdicos hegemnicos.Trabalhamos, h muitos anos, j com a idia de que a sade,na verdade, para alm de um direito humano fundamental, tambm a construo de condies para autonomia individual,a possibilidade de que as pessoas e grupos, quaisquer quesejam as suas condies, possam viver a melhor vida possvel.Ento, trabalhamos h muito tempo com essa idia de quesade , na verdade, um componente fundamental dessa di-menso de qualidade de vida.Essa Escola tem tambm, Ministro, uma tradio consolidadade estudos de ensino nessa rea, que considera a dimensodo sofrimento mental e da loucura como componentes dessadiversidade humana, que deve ser aceita e valorizada comoum patrimnio da humanidade, e no como um defeito. Oprofessor Paulo Amarante, para nomear um deles, lidera hmuitos anos, linhas de estudos e formao de centenas, mi-lhares de alunos, produzindo e trabalhando em diversas dis-ciplinas, cursos e programas de pesquisa com essa temticade maneira ampla, por isso a dimenso da cultura, a dimen-so da arte fazem parte tambm h muitos anos desse nossoprograma de estudos na rea da sade mental. Essa casa,

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  • com seus professores especialistas e alunos foi e vem sendoum esteio da luta antimanicomial no Brasil e no mundo, nessaexpectativa de aplicar na vida prtica e nas polticasinstitucionais, esse conceito mais amplo. Portanto, uma honraesse momento que encarna de uma maneira muito profundaesse compromisso recproco e de compartilhamento de idiasa respeito de cultura, sade, de loucura e diversidade. tambm, Ministro, uma honra especial receb-lo aqui, umbrasileiro artista que com suas composies, h dcadas vmemocionando e encantando o pblico por onde passa. Maisdo que isso um artista que, como brasileiro e cidado, exercedesde sempre a sua dimenso de cidado poltico ligado cultura, ao ativismo ambiental; tendo exercido em sua vida -em paralelo vida artstica - diversos cargos de responsabi-lidade pblica. Na rea da poltica partidria, foi fundador doPartido Verde, como vereador; como membro da comissode defesa do meio-ambiente em Salvador, foi fundador domovimento Onda Azul; entre uma srie de ttulos, culminandoagora com essa responsabilidade como Ministro da Sade, oumelhor, da Cultura (risos).

    (Interveno do Ministro Gilberto Gil)Sade e Cultura tudo a mesma coisa... Ministro da SadeEspiritual! (aplausos).

    (continuao Antonio Ivo)Esse desempenho singular dentro da equipe do PresidenteLula marca com toda certeza uma nova compreenso prticado que so as polticas pblicas na rea da cultura. Lembra-mos e revitalizamos os anos negros da ditadura militar, quandoGilberto Gil e seu companheiro Caetano Veloso foram presos,expulsos do pas, sem que com isso tenham deixado de exer-cer a militncia artstica. Conhecemos tantas composies feitasno exterior na poca do exlio e de sua militncia poltica, quevm espalhando com seu exemplo tantas geraes desdeaquela poca.Afinado ao seu tempo, Gilberto Gil tambm um dos princi-pais defensores da liberdade digital e da flexibilizao dosdireitos autorais. Eu acho que o Ministro nos encontra tam-bm num momento muito propcio, quando temos o MinistroJos Gomes Temporo recm empossado Ministro da Sade,e que sendo oriundo dessa Casa onde foi estudante e profes-sor, compartilha e tem levado tambm sociedade brasileira

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  • e s outras reas governamentais amplas como aquelas quenos inspiram, a compreenso de que a Sade no serconstruda pelo povo brasileiro apenas no interior dos servi-os de sade; ela precisar ser o fruto de um esforointerinstitucional, de um esforo governamental e da socieda-de, de maneira a alterar e a produzir mudanas sociais eculturais que permitam, finalmente, a populao se apropriarde toda a sua potencialidade, se alimentar de sua diversida-de e viver as possibilidades que a vida oferece.Finalmente, Ministro, essa dimenso mais profunda e deparceria e compromisso que queremos dar a este momento,a essa abertura de Oficina e ao convnio que recm assina-mos, de maneira que possamos ampliar e acelerar a contri-buio de ampliao do espao de autonomia e autodetermi-nao, para que o nosso povo seja capaz, de cada vez mais,construir seu presente e tambm o seu futuro. Como diz umafamosa estrofe da nossa msica popular brasileira, cada vezmais pertinente - a gente no quer s comida para ser feliz!Muito obrigado pela sua presena e uma boa oficina a todos.(aplausos)

    ! Paulo Ernani Gadelha Vieira (Vice-Presidente deDesenvolvimento Institucional e Gesto do Trabalho da Fiocruz)

    Senhor Ministro, Gilberto Gil, Sr. Secretrio Nacional SrgioMamberti, companheiro Antnio Ivo, todos os presentes, euestou aqui representando a presidncia como vice-presidente,em nome do Paulo Buss que encontra-se em viagem aoexterior.Eu queria iniciar dizendo que eu acho que esse lapso doAntonio Ivo, quando ele fala da questo da Sade, talvezencante tambm ao nosso Ministro Gilberto Gil, no s pelolado da sade espiritual, mas, relembrando um momentoem que estivemos em Braslia discutindo algumas idias emcooperao com a Fiocruz. Ele nos dizia que, na verdade, overdadeiro tropicalista baiano no era ele, mas era seu paique era um mdico da lavra dos tropicalistas sanitaristas daBahia e de uma forte tradio que construiu uma viso nocampo da Sade Pblica, associando a questo danacionalidade expresso da doena ligada s questessociais e realidade brasileira. Ento, sua proximidade com

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  • o campo da Sade muito mais vasta e, toda vez que nstemos possibilidade de buscar essa cooperao, nsencontramos um acolhimento, ns encontramos umacriatividade, ns encontramos um arejamento, que faz comque, a exemplo deste momento que estamos vivendo aqui,de uma hora para outra, saamos das nossas referncias maisortodoxas e comeamos a pensar nesse grande universo quecompe o quadro da Sade.E a, incluindo esse aspecto fundamental da questo dosofrimento psquico e incorporando a ele uma dimenso quecada vez mais est sendo refletida e presente, que a questodo sofrimento produzido pelo risco social. Pra todos ns queacompanhamos hoje movimentos da sociedade brasileira,ns temos aqui tambm no nosso entorno situaesimpactantes do que representam riscos sociais; no s pelainiqidade, pela falta de oportunidade, de possibilidade deuma vida digna, mas tambm e agora muito fortementedemarcado pela violncia, pela anomia, pelas formas desofrimento que as populaes so submetidas. O que euqueria dizer que, numa reflexo dessa envergadura, apossibilidade de pensar seriamente nas polticas; e eu rendoaqui uma homenagem Paulo Amarante em nome de umapliade de pessoas que eu tive a felicidade de acompanharmuitos anos atrs, quando Paulo Amarante frente de umgrupo muito pequeno de verdadeiros brancaleones, quemantiveram acesa a chama da viso de uma forma de tratara questo do sofrimento psquico na Psiquiatria de uma formamais libertria, da luta antimanicomial, que permitiu depoisde muitas dcadas, se associar ao patrimnio da ReformaSanitria brasileira e conseguiu essa grande vitria que nstemos hoje aqui no Brasil.Ento, Ministro Gil, eu gostaria muito de agradecer, em nomedo Paulo Buss, a sua presena. Ns temos vrias linhas decooperao em curso. Ns temos um Ponto de Cultura sendotrabalhado numa unidade nossa em Petrpolis; temos reasna preservao do Patrimnio. Ns temos vrias questes,em que a nossa associao com o Ministrio da Cultura, eagora mais essa, na pessoa dessa figura maravilhosa tambmque Srgio Mamberti. Ento, muito obrigado. Deixo o abraodo Paulo Buss que est certamente invejoso de no poderestar aqui presente, porque ele tem uma admirao eamizade muito especial com o Ministro Gil e esse tema muito caro sua trajetria. Ento, em nome da Presidncia,muito obrigado aos organizadores e ao Ministro Gil.

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  • ! Srgio Mamberti (Secretrio Nacional da Identidadee da Diversidade Cultural)

    Bom dia a todos e a todas, querido Ministro e companheiroGilberto Gil, Dr. Antonio Ivo, diretor dessa Escola maravilhosa,representando a Fiocruz e a vocs todos aqui presentes quecompartilharam conosco desse momento muito especial em queo Ministro da Cultura e o Ministrio da Sade se unem pra criarnovos rumos e direcionamentos nessa parceria que pode sermuito rica pra construo da cidadania cultural desse pas. com grande satisfao que eu e toda a equipe da Secretariada Identidade e da Diversidade Cultural, damos incio hoje realizao desta Oficina de Consulta para a elaborao depolticas pblicas para a sade mental, que vem potencializarpropostas de aes para mais este segmento da sociedadebrasileira que ns, do Ministrio da Cultura, identificamoscomo muito pouco reconhecido no mbito das polticas culturais.Na verdade, uma das atribuies mais importantes destaSecretaria justamente identificar estratgias de aproximaoe promoo das expresses culturais que integram a diversidadecultural do nosso pas. Acreditamos que a dimenso da sademental pode e deve ser incorporada aos objetivos do ProgramaBrasil Plural, bem como s demais aes do Ministrio daCultura, de maneira transversal. Podemos, portanto, colaborardando visibilidade s diferentes aes culturais que constroemidentidade e fomentam incluso e autonomia a partir daslinguagens das expresses artsticas. E vale a pena lembrarque chegamos at aqui graas a um longo processo, queenvolveu, durante vrias dcadas, a luta e a dedicao demuitas pessoas, dentre mdicos, pesquisadores, artistas,cuidadores, pacientes e familiares, inclusive no mbito domovimento antimanicomial.Graas a esse processo, a experincia esttica da criaopode hoje ser utilizada como forma de expresso e decomunicao de portadores de sofrimento psquico, podeser utilizada para ampliar territrios e para proporcionar oenriquecimento da subjetividade.Nos ltimos tempos, a produo artstica vem, assim,fortalecendo e valorizando a identidade e a diversidade,dentro do paradigma da incluso, por meio de diferenteslinguagens e abordagens, e contribuindo para a desconstruode preconceitos, para a produo de sentidos, para aampliao de territrios de circulao, conhecimento e vida.

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  • Assim, a produo artstica desse segmento que a cultura ea sociedade excluram da cidadania cultural, vem sendoconsiderada um instrumento de mudana. Mudana que vaido sofrimento psquico ao encorajamento criativo, doconfinamento emancipao, da excluso ao aplauso. Semdeixar de lado o fato importante de que essa construoiniciada com a terapia ocupacional e a reabilitao psicossocialpor meio do fazer artstico, inclui tambm a criao de umanova cultura de olhar e de cuidar da loucura.Por tudo isto, estamos convencidos de que este, alm de serum momento de reflexo e elaborao, ou seja, de umaoficina que vai dar muito trabalho aos participantes, tambmum momento de celebrao pelo caminho j percorrido epelas novas conquistas que se anunciam.Com este seminrio, procuramos construir polticas pblicasque levem em conta a utilizao do processo criativo comoum exerccio subjetivo para o encorajamento e a construode novas ticas e estticas da existncia. Estamostrabalhando para a conscientizao de que somoseternamente diferentes, mas juntos poderemos contribuirpara a construo de um pas melhor, mais justo e maissolidrio.Agradeo Escola Nacional de Sade Pblica e FundaoOswaldo Cruz pela importante parceria. Agradeo tambma todos os artistas responsveis pela programao cultural,e a todos os participantes desta Oficina, e desejo a todos umbom trabalho. Muito obrigado!

    ! Gilberto Gil (Ministro da Cultura)

    Muito obrigado a todos e muito bom dia. Deixe-me saudarao Antonio Ivo, Paulo Gadelha, ao nosso querido Srgio, nossocompanheiro de trabalho do Ministrio, e tambm mandar omeu abrao para os outros Paulos. So muitos Paulos aqui,o Paulo Buss, o Paulo Amarante. uma casa cheia de SoPaulos.Conviver com as diferenas uma necessidade vital e omundo nunca precisou tanto aprender essa convivncia. Umdos segmentos mais incompreendidos da nossa sociedade o que agrega os portadores de sofrimento mental. Eu queriafazer uma observao lateral no sentido do sofrimentopsquico, lembrando a primeira frase das escrituras Vdicas.

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  • L est escrito tudo sofrimento. Tudo sofrvel, mesmoaquilo que seja considerado como bem-estar, felicidade ealegria, que consideramos positivos; l nesse grande universoreligioso, est dito que tudo sofrimento, inclusive aintegridade fsica e mental que tambm so sofrimentos. Nadaescapa! Por isso to importante, para o Ministrio daCultura, esta oficina promovida em parceria com a FundaoOswaldo Cruz. Acredito que os debates e reflexes queteremos aqui vo contribuir muito para a elaborao depolticas pblicas de cultura para a rea e para divulgar aproduo cultural das pessoas envolvidas com esse processo.A associao entre as perturbaes mentais chamadaspopularmente de loucura - e a produo cultural, maisespecificamente as expresses artsticas, faz parte da histriada humanidade. muito conhecida a expresso de que osartistas so loucos. Dizem que artistas e loucos so irmos;que arte, delrio e inspirao provm do mesmo impulso.Como dizia Salvador Dali, a nica diferena entre mim e olouco que eu no sou louco. Poderamos tambm dizerque a nica diferena que eu sou louco e eles no.Mas, infelizmente, a verdade que essa histria foi quasesempre marcada por conceitos e preconceitos que a sociedadeteve e tem a respeito das pessoas portadoras de distrbiosmentais. Conceitos e preconceitos que determinaram as formasde tratamento que essas pessoas sofreram durante muitotempo. Sabe-se que no Mundo Antigo e parte da Idade Mdia,os chamados loucos transitavam na vida pblica cercadosum certo temor, s que um temor com uma aura sagrada,onde havia um lugar para eles dentro do mbito maior.Mas como a sociedade tem a necessidade de manter padres,tudo e todos que so diferentes e incompreensveis assustam,do medo, viram ameaa ao institudo. Isso acabou provocandoo afastamento das pessoas diferentes e o seu isolamentocomo forma de proteo da famlia e da sociedade. Apesardesse medo provocado pela perturbao mental, diz o ditadopopular que de artistas e loucos todos ns temos um pouco.Ou, como disse o genial ator e dramaturgo Antonin Artaud:O ser tem estados inumerveis e cada vez mais perigosos.Felizmente, depois dos estudos de Freud e das descobertas deJung sobre o inconsciente coletivo e os arqutipos herdadospor todos ns, chegou-se pouco a pouco a uma viso maishumana e inovadora da perturbao mental e das expressesda riqueza subjetiva de pessoas portadoras de distrbiospsquicos. A desestigmatizao da doena mental , portanto,

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  • um processo em curso, que deve muito a diversas pessoasque lutaram e lutam pela transformao do preconceito emuma diferena a ser respeitada e at celebrada, como lembrouo querido Srgio Mamberti.Pessoas como o psiquiatra italiano Franco Basaglia, queliderou um movimento mundial contra os manicmios pblicos,e como a mdica brasileira Nise da Silveira, que conseguiudemonstrar na prtica o grande valor do contato afetivo e daexpresso criativa para a recuperao das pessoas sofredorasde perturbao mental. Ela nos ensinou que aqueles quepassam pelo grande sofrimento do rompimento com a realidade,do mergulho, sem proteo, nos abismos do inconsciente,podem, por meio da expresso artstica, tentar o caminho devolta para a superfcie.Sem pretenso de formar artistas no sentido que lhes atribui adisciplina esttica, a Terapia Ocupacional com as artes tornou-se importante para a reabilitao psicossocial e tambm parao tratamento, porque utiliza a perturbao como fonte decriao. Ou seja, utiliza a criatividade para a expresso deemoes, o que faz dessas criaes formas reveladoras dointerior da psique humana. So obras artsticas que, alm dabeleza, revelam ser preciosas fontes para o conhecimentodo mundo dos sonhos, dos sonhos que vo alm da vida decada um de ns e abarcam aquilo que nos faz irmos naeternidade do tempo e do espao.Aqui, a arte transcende, ou melhor, ignora a diferena entreas frgeis fronteiras da sanidade e da loucura. Nas composiesdesses artistas, cumprem-se as duas exigncias da arte:destruir a comunicao comum e criar uma outra comunicao.Alm disto, h tambm a dimenso da auto-estima. Ao seremreconhecidos publicamente como artistas, como criadores,essas pessoas so apanhadas pela rede da cultura e trazidaspara dentro de sua rbita, ainda que excntrica. So includosaps terem vivido um perodo de suas vidas na excluso. Eincluir exatamente o nosso papel, juntamente com o deincentivar a tolerncia e o respeito diferena.Esse o momento de saudar esse encontro, esse evento,essa possibilidade de incluso de volta ao convvio pleno.Agradeo a todos os participantes desta Oficina que, estoucerto, dar uma grande contribuio para que possamosavanar no sentido de atender s necessidades e demandasdos portadores de sofrimento mental. Com esta colaborao,poderemos perceber ainda melhor a nossa diversidade e participarainda mais nossas diferenas. Lembrando que, no contexto da

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  • identidade da cultura, loucura e liberdade devem ter o mesmosignificado. Muito obrigado!

    Atividade Cultural: Grupo Harmonia Enlouquece - RJ

    O Grupo Harmonia Enlouquece, formado por usurios etrabalhadores dos servios de sade mental, surge em 2001 comoum desdobramento do projeto Convivendo com a Msica doCentro Psiquitrico do Rio de Janeiro (CPRJ). Coordenado pelopsiclogo e musicoterapeuta Sidnei Dantas como uma atividadeaberta a todos (usurios, profissionais e familiares desta instituio), voltado para troca de experincias afetivas e sonoro-musicais,tendo a msica como elemento central.

    Com composies prprias e dois CDs gravados, suasmsicas tratam no apenas das experincias vividas por usuriose trabalhadores dos servios de sade mental, mas tambm detemas como amor, trabalho, cotidiano, cidadania, moradia, cultura,entre outros. O grupo apresentou a msica Sufoco da Vida, deautoria de Hamilton de Jesus Assuno.

    Formao: Ada Cristina Souza, Andr Luiz de Oliveira, FranciscoSayo, Franklin Guimares, Geiza Caldas de Carvalho, Hamiltonde Jesus Assuno, Juliana Cristina da Silva, Julio Csar dos SantosAndrade, Luiz Mrio R. Frana, Marcelo Duarte Ferreira, RaquelCruz, Sidnei Dantas, Telma Rangel.

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  • 2.2. 1 MESA DE DEBATES (COORDENAO PAULO AMARANTE)

    A DIVERSIDADE E A CULTURA NAS POLTICAS PBLICAS

    ! Peter Pl Pelbart (Filsofo, ator, Cia Teatral UEINZZ! - SP)

    Eu gostaria de agradecer aos organizadores desse encontropor esse convite honroso. Parabenizar em particular aoprofessor Paulo Amarante e toda sua equipe, bem como aAna Lcia Pardo e ao Ministrio da Cultura, em geral, pelacorajosa iniciativa.Somos a Cia Teatral UEINZZ! - SP, nascida h dez anos numHospital-dia em So Paulo, quando um paciente props fazerteatro de verdade e no um teatrinho de louco para louco.Essa proposta vingou sobre a direo artstica de Srgio Pennae Renato Cohen e depois de um tempo deixamos inteiramenteo Hospital-dia onde nascemos para construir uma companhiaautnoma, espcie de Nau dos Insensatos, deriva docircuito artstico.Ns ensaiamos semanalmente. Tivemos mais de 150apresentaes ao todo, viajamos muito pelo Brasil e tambmpelo exterior. Tudo isso faz parte de nosso currculo glorioso,mas toda essa concretude no garante nada. Por vezes,passamos meses no marasmo de ensaios semanais inspidose, s vezes, nos perguntamos se j nos apresentamos ouvoltaremos a nos apresentar, alguns atores desaparecem,os patrocnios minguam, textos so esquecidos... A companhia,ela mesma aparece como uma virtualidade impalpvel e, derepente, surge uma data, um teatro disponvel, um mecenasou um patrocinador, o vislumbre de uma temporada, umconvite para o Cariri, ou para Paris, ou para Kassel - uma cidadena Alemanha. O figurinista recauchuta os trajes empoeirados,atores sumidos h meses reaparecem, s vezes, fugidos atde uma internao! Um campo de emanao reativado, ossolitrios vo se enganchando, os dispersos se convocammutuamente. Mas, mesmo quando tudo vinga, o limite tnueque separa a construo do desmoronamento, e talvez essaseja a coisa mais radical desse tipo de projeto, mas tambmisso demanda um tipo de investimento e de contorno singular.

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  • No nosso caso, trabalhamos todos de modo voluntrio porquase dez anos, salvo por algum patrocnio, onde todos -atores, equipe, etc - so devidamente remunerados. Eugostaria ento de dizer a todos sobre isso, sobre esse ponto,essa linha tnue que se d no limite entre a construo e odesmoronamento.Eu queria primeiro relatar um fragmento da nossa apresentaonum festival teatral em Curitiba, alguns anos atrs, em quefaltavam poucos minutos para nossa trupe entrar em cena ecada ator se preparava para proferir, em grego, o embateapolnico que d inicio a esse espetculo sem p nem cabea- conforme o comentrio glorioso de um crtico da Folha deSo Paulo.Eu aguardo tenso, repasso na cabea eu tambm sou atorali as palavras que devemos usar uns contra os outros emtom intimidatrio, em desenfreada correria. Eu passo os olhosem meio ao pblico e percebo nosso narrador recuado algunsmetros. Ele parece desorientado, eu me aproximo e ele meconta que perdeu seu texto. Enfio a mo no bolso de suacala e encontro um mao de folhas por inteiro. O ator olhaos papis que estendo a sua frente e parece no reconhec-los; desfia os olhos e murmura que dessa vez no participada apresentao. Essa a noite da sua morte! Trocamosalgumas palavras e minutos depois, aliviado, vejo-o de voltaao microfone. Mas sua voz, sempre forte e vibrante, soa agorafraca e pastosa.Pois bem, damos incio ao espetculo e na cena seguintedessa pea, intitulada Ddalos, eu fao o papel de Avis, reido inferno e ele, narrador, vira o barqueiro Caronte quelevar Orfeu at Eurdice, mas, entre uma remada e outra,bruscamente ele interrompe a cena. Faz uso de suas ltimasreservas picas, atravessa o palco na diagonal e dirige-se sada do teatro, uma portinhola que d para a rua. Ali eu oencontro sentado na mais cadavrica mobilidade, balbuciandoa exigncia de uma ambulncia: Chegou a sua hora! Eu meajoelho ao seu lado e ele diz: Vou para o Charco. Comoassim? - pergunto eu. E ele diz: Vou virar sapo. O prncipeque virou sapo. O prncipe que virou sapo, respondo,pensando que em nossa primeira turn artstica ele viaja comsua namorada recente. como uma lua-de-mel. Ele retruca,de modo inesperado: Mensagem para o ACM. Sem titubear,eu digo: Eu t fora, no sou amigo do ACM. Melhor mandaro ACM para o Charco e ficarmos ns dois do lado de fora .

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  • Depois a situao se alivia e, ao invs da ambulncia, elepede um cheeseburger do Mc Donalds. Conversamos sobreo resultado da loteria que apostamos juntos e o que faremoscom os milhes que nos esperam, ouo os aplausos finaisvindos de dentro do teatro. O pblico comea a retirar-se. Oque eles vem quando saem pela mesma portinhola que dpara a rua Avis, rei do inferno, que meu personagem,aos ps de Caronte, morto-vivo. Depois, recebemos umareverncia respeitosa de cada espectador que passa por ns,para quem, essa cena ntima parece fazer parte do espetculo.Foi tudo por um triz. por um triz que nos apresentamos, por um triz que no nos apresentamos, por um triz queno morremos, mas nada disso deve ser amputado. umingrediente que faz parte dessa esttica e dessa tica - porum triz.Passo agora para o meu segundo exemplo. nossoprimeirssimo ensaio da Cia Teatral UEINZZ!, realizada aindanas dependncias do Hospital-dia, h dez anos atrs. Numexerccio teatral sobre os diferentes modos de comunicaoentre seres vivos, pergunta-se a cada pessoa do grupo queoutras lnguas fala cada um alm do portugus. Um pacienteque nunca fala, apenas emite um som anasalado semelhantea um mantra disforme, responde imediatamente com grandeclareza e segurana: Alemo. Surpresa geral! Ningum sabiaque ele falava alemo. E que palavra voc sabe em alemo?.UEINZZ!, ele diz: O que significa UEINZZ em alemo? E eleresponde: UEINZZ!. E todos riem. Eis a lngua que significa asi mesma. Que se enrola sobre si, lngua esotrica, misteriosa.s vezes, ela acompanhada de uma excitao que desembocanum jogo inspirado no material coletado nos laboratrios. Osdiretores trazem ao grupo sua proposta de roteiro: a trupenmade, perdida no deserto sai em busca de uma torreluminosa e no caminho cruzam obstculos, entidades,tempestades. Ao cruzar o orculo em sua lngua severina, ele,que o orculo, deve indicar o rumo que convm aosandarilhos. O ator para orculo prontamente designado: este que fala alemo. Ao lhe perguntarem onde fica a TorreBabelina ele deve responder: UEINZZ!. O paciente entra comrapidez no papel, tudo combina: o cabelo e o bigode bempreto o corpo macio e pequeno de um Buda turco, seu jeitoesquivo e esquizo, o olhar vago e escutador de quem est emconstante conversao com o invisvel. verdade que ele caprichoso quando lhe perguntam: Grande orculo de Ddalo

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  • onde fica a Torre Babelina?. s vezes, ele responde com umsilncio e outras com um grunhido; outras ele diz: Alemanhae outras, Bauru. At que perguntam mais especificamente:Grande orculo de Delfos, qual a palavra mgica emalemo? A ele responde o infalvel UEINZZ! que todos esperam.De qualquer modo, o mais inaudvel dos pacientes - o que fazxixi na cala e vomita no prato da diretora - caber a ele aincumbncia crucial de indicar ao povo nmade a sada dastrevas e do caos. Depois de proferida sua palavra mgica deveproliferar pelos auto-falantes espalhados pelo teatro, girandoem crculos concntricos e amplificando-se em ecos vertiginosos:UEINZZZ, UEINZZZ, UEINZZZ. A voz que, em geral, nsdesprezvamos porque no ouvamos a ruptura assignificante como diria Gattari encontra a um espao aceito em ritual,uma eficcia mgico-potica. Quando a pea batizada comesse som, temos dificuldade de imaginar como se escreveisso WAINZ ou WAINZZ ou UEINZ... O convite vai de um jeito,o folder de outro, o cartaz brinca com todas as possibilidadesnuma grande variao bablica. Ns somos a Companhiateatral UEINZZ: U-E-I-N-Z-Z.Agora eu vou relatar um fragmento que extrapola o domnioteatral. Ns fomos convidados recentemente para o convviode uma semana com os atores do Thtre du Radeau, nosubrbio da Frana, num projeto de afetao recproca. Odiretor daquela trupe chama-se Franois Tanguy, um malucogenial que entrou para nossa companhia num grau deempatia, num corpo a corpo, numa comunicao xamnica,dificilmente imaginvel, apesar da barreira absoluta da lngua.Ele circulava com uma barra de madeira que termina numpente - objeto que ns usaramos para coar nossas costas,mas que lhe foi presenteado pelo Franois, que, por sua vez,o recebeu de algum cacique do Xingu e fez longas seescom esse instrumento com os nossos atores. Para os ndios,esse instrumento serve para ir escarificando as costas dointerlocutor durante uma conversa. Isso significa deixar nocorpo do interlocutor alguma marca do encontro e o diretorusou esse mesmo princpio com nossos atores.Enfim, tudo ali era surpreendente. Almovamos ouvindo emvoz alta o suicidar em sociedade, ao lado de um antroplogomuito velho, amigo pessoal e editor de Artaud e, nessaatmosfera em que se cruzavam artistas vindo de vrias partes,um de nossos atores perguntou ao Franois se havamos sidoconvidados porque ramos anjos decados. Ento, no ltimo

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  • dia antes da nossa apresentao, o Franois colocou sobreas costas desse ator uma imensa asa decada, colaborandocom a imagem do anjo decado e, foi com essa asa que elese apresentou. Foi a que aconteceu o mais inusitado: esseator havia proposto Lorain - uma das atrizes da trupe francesa- um casamento. Ela era bem mais velha, talentosssima e,quando ela compreendeu de forma performtica o teor daproposta, acolheu-a imediatamente. Terminada ento aapresentao o ator lembrou: E o casamento? E num climaferico aconteceu um casamento festivo, com vu de noiva, onoivo trajado com uma suntuosa capa de prncipe russo, umagigantesca mscara de veado rendada de transparente, todosos convivas vestiram perucas exticas e assim deu-se ocasamento do anjo cado e da atriz calejada. Algo do limiteentre razo e desrazo, loucura e sanidade, fantasia erealidade foi a deslocado e assumido coletivamente,ritualmente e performaticamente. A atriz que nunca tinhacasado agradeceu a ele e insistiu que ele seria a nica pessoano mundo que poderia lhe ter proposto isso.No ltimo fragmento, j nesses ltimos anos, recebemos aproposta de uma artista plstica franco-argentina, para fazero que ela chamou de uma enquete sobre o nosso entorno.Dessa vez no se tratava de fazer uma apresentao teatral,mas sair com um microfone e uma cmara na mo pela cidadede So Paulo, entrevistando pessoas comuns e lanandocontra elas perguntas queima-roupa. Por exemplo: umvendedor de amendoim perguntado sobre qual a magiado seu lugar. Ele no entende a pergunta e o ator retoma:Qual o prazer desse lugar? E o vendedor no entende. Eo ator se exaspera e diz: Caramba! Sua vida, qual o sentidoda sua existncia? E o outro, depois de um longo silncio,como se casse uma ficha diz: Ah... o sofrimento.Ou, num outro momento na Praa da S, um profeta de ruacomea a discutir com o entrevistador - so nossos atoresno meio a uma chuva torrencial - se Deus existe ou no.Dilogos dostoievskianos, em meio a tempestades tropicais.No meio desses dilogos esquisitos, o louco deixa de serlouco para ser aquele que tem o direito de fazer a perguntaque todos calam, e, cada um dos entrevistados desinvestidode sua roupagem cotidiana, fazendo surgir no nosso entornoa inquietante normalidade que nos rodeia.Esse projeto foi convidado a integrar a Documenta, a maisimportante exposio de arte contempornea do mundo, comvrias horas de vdeo gravadas pela Alessandra Vieira e que

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  • foram incorporadas na instalao, porm, convite daexposio, grande parte do grupo foi convidada a continuarna cidade de Kassel, na Alemanha. Esta mesma experincia,numa comuna perto da cidade, nas portas da Volkswagen, aex-central da Gestapo, em Kassel. Eu no tenho tempo decontar a dimenso sublime e hilria dessa Nau dosInsensatos, aportando no centro germnico internacional;isso tudo fica para outra vez. Apenas nos d a dimenso dapotncia expansiva e conectiva de um dispositivo, afinal, tominsculo quanto esse. Apenas chegamos a So Paulo e aMiriam Schnaidermann nos convidou a participar de um filmedela e do Reinaldo Pinheiro sobre sobreviventes. Pois bem,talvez se trate justamente disso: da distncia entre os viventese os sobreviventes.Permitam-me uma palavrinha a mais para tentar narrar issotudo. Nessa relao entre prticas estticas e vidas precrias,no contexto contemporneo, eu diria assim: o que est emjogo nesse dispositivo teatral ou para-teatral a subjetividadesingular desses atores e nada mais. Isto , o que est emcena, uma certa maneira de perceber, de sentir, de vestir-se, de mover-se, de falar, de pensar e tambm a derepresentar sem representar, de associar desassociando, deviver e de morrer, de estar no palco e sentir-se em casasimultaneamente; nessa presena precria, a um s tempoplmbea e impalpvel, que leva tudo extremamente a srioe, ao mesmo tempo, no est nem a, como definiu depoisde sua apresentao musical, o compositor Lvio Tractemberg:Eles no esto nem a, eu quero lev-los para o meu show.Ou, ir embora no meio do espetculo com a mochila na moporque sua participao j acabou, ora largando tudo porquechegou a sua hora e vai se morrer em breve; ora atravessare interferir em todas as cenas como um lbero de futebol,ora conversar com seu ponto que deveria estar oculto,denunciando sua presena; ora virar sapo ou grunhir ou, comoos nmades da muralha da China, falar com as gralhas, ouapenas dizer: UEINZZZ!.No consigo deixar de pensar que essa vida em cena, vidapor um triz, que faz uma das peculiaridades desse trabalhoe que d, s vezes, a impresso para alguns telespectadoresque, so eles os mortos-vivos e que a vida verdadeira estdo lado de l do palco, num contexto marcado pelo controleda vida que alguns chamam de biopoder.As modalidades de resistncia vital proliferam de maneirasmais inusitadas. Uma delas consiste em pr, literalmente, a

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  • vida em cena. No a vida nua e bruta, no a vida reduzidapelo poder ao estado de sobrevida em meio ao liinismoterminal que presenciamos a cada dia. No a vida besta, avida bovina, os cyber-zumbi, os homo-otrios com quecruzamos a cada esquina e que ns mesmos somosdiariamente; mas a vida em estado de variao, modosmenores de viver que habitam nossos modos maiores e queno palco ou fora dele, ganham s vezes visibilidades cnicasou performticas, mesmo quando se est beira da morteou do colapso, da gagueira ou do grunhido, do delrio coletivo,da experincia limite.No mbito restrito, ao qual me refiro aqui, o teatro pode serum dispositivo, entre outros, para a experimentao hesitantee sempre incerta, inconclusa e sem promessa de reversodo poder sobre a vida em potncia da vida, do biopoder embiopotncia, redesenhando inteiramente a geografia de nossaperverso, expropriao, clausura, silenciamento.Se hoje o capital penetra a vida numa escala nunca vista quevampiriza sua fora de criao, o avesso tambm verdadeiro. A prpria vida virou com isso um capital, pois seas maneiras de ver de sentir, de pensar, de perceber, demorar e de vestir-se tornam-se objetos de investimento docapital, elas passam a ser fonte de valor e podem elasmesmas tornarem-se um vetor de valorizao.Por exemplo, quando um grupo de presidirios grava a suamsica, o que eles gravam e vendem no s a sua msica,nem s suas histrias de vida escabrosas, mas seu estilo,sua percepo, sua revolta, sua castidade, sua maneira devestir, at mesmo sua maneira de morar na priso, degesticular, de protestar. Sua vida, seu nico capital, sendosua vida, seu estado extremo de pr a vida em resistncia. que eles capitalizaram e assim se autovalorizou e produziuvalor. Nessa perspectiva, se claro que o capital se apropriada subjetividade e das formas de vida numa escala nuncavista, a subjetividade ela mesma um capital biopoltico e,cada vez mais, cada um dispe virtualmente: loucos, detentos,ndios, mas tambm todos e cada um e cada qual com a vidasingular que lhe pertence, ou que lhe dado inventar comconseqncias polticas a determinar.Uma ultimssima idia: num livro recente, Maurcio Lazarattoevocou a hiptese instigante de que o capitalismocontemporneo, mais do que um modo de produo, umaproduo de mundos. Trocando em midos, a empresa

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  • contempornea diferentemente da fbrica fordista, no criaa mercadoria, mas, antes de criar a mercadoria, cria o mundono qual a mercadoria existe, faz sentido, pode ser cobiadae pode ser consumida. Atravs da pesquisa do marketing,da comunicao, a empresa prope um mundo virtual que oconsumidor deve atualizar na medida que se dispe apertencer a esse mundo, aderindo aos desejos, crenas einteligncias que o compem, ou seja, na medida em queessa forma de vida que lhe proposta e a sensibilidade queo corresponde o ganham, por exemplo, esposando umamaneira de se vestir, de comer, de comunicar, de falar notelefone, etc. Portanto, como diz Lazaratto, a guerra econmica tambm uma guerra esttica; um combate entre formasde vida, entre maneiras de viver e de sentir. Claro que osmundos, as formas de vida, as maneiras de sentir e assubjetividades que o capitalismo produz e multiplica sobanais, so formatadas, so normalizadas e, por isso, soelas majoritrias e nos obrigam ao sistema da mltiplaescolha, entre possveis previamente estabelecidos.Resta saber em que medida, diante disso, todos e qualquerum, por mais annimo que seja ou por mais louco ou pormais ndio ou por mais preso, tambm virtualmente criadorde mundo na medida em que toma posse de sua maneirasingular de ser, de sentir, de desejar, de ter, de habitar, defalar, de afetar. Por conseguinte, nessa guerra esttica, ondecoexistem, agonsticamente, mltiplos mundos no interior deum mesmo mundo estourado, o universo paralelo da loucuradeixa de ser apenas uma dimenso solipsista, desqualificada,para incorporar-se polifonia sensvel e afetiva de um mundoplural fazendo valer sua sonoridade no seio do querecentemente um msico paulista batizou por neurpolis. nesse horizonte que, a meu ver, possvel situar aexperincia do teatro. H dcadas atrs, Foucault ficouseduzido pelos olhos infames, pelas suas vidas insignificantessem glria, que por um jogo do acaso eram iluminadas porum timo, pelo holofote do poder com o qual se defrontarame cujas palavras pareciam atravessadas por uma intensidadeslida. Talvez j no encontremos mais essas existnciasfulgurantes, embora essenciais, esses poemas-vida,partculas dotadas de uma energia tanto maior quantomenores e mais difceis de serem detectadas.Diludos entre os mltiplos mecanismos de poder annimo,as palavras talvez no gozem mais daquela fulgurao teatrale daquela vibrao que Foucault olhava nos arquivos e a

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  • banalidade que toma o proseio do nosso contemporneo.Mas, no seio disso, a partir de uma autosubjetivao tateante,emisses de singularidades diversas, parecem afirmar odesejo de outra coisa. Como diz Deleuze estamos em buscade uma vitalidade. Mesmo a Psicanlise tem a necessidadede dirigir-se a uma vitalidade do doente que a doena talveztenha perdido, mas tambm a psicanlise perdeu. nessediapaso que na esquizocenia - termo cunhado por umdos nossos diretores, Srgio Penna, para designar a prtica - aloucura pode tornar-se fora biopoltica, pode tornar-sebiopotncia. Mas o alcance dessa afirmao extrapola e muitoa loucura ou o teatro e permitiria pensar a construo dedispositivos multifacticos ao mesmo tempo, polticos,estticos, clnicos na reinveno das coordenadas deenunciao da vida. Nas condies subjetivas e afetivas dehoje, um dispositivo minsculo como o que apresentei,poderia ressoar com as urgncias maisculas do presente.

    ! Cristina Lopes (Psicloga, atriz e cantora, ProjetoCidados Cantantes/Grupo Coral Cnico Teatro e Dana - SP)

    Agradeo o convite para fazer esta palestra aqui. Vou falardo Projeto Cidados Cantantes que ocorre em So Paulodesde 1992 como poltica pblica e rene trs modalidadesque esto acontecendo: o Coral Cnico, teatro e dana. Sooficinas que renem pessoas muito diferentes e que no estofocadas numa nica identidade. E a tem um pensamento doregente acerca desse Projeto, que quando ele chegou nogrupo em 1996 como voluntrio, e at hoje, sentiu que eraum desafio e que ele tinha que se adequar a trabalhar comum grupo to diferente. Mas no cotidiano, aps muitos anosdessa experincia, ele percebeu o quanto semelhante atantos outros grupos que ele rege e acompanha.Ento, o Cidados Cantantes nasce em 1992 como umprojeto intersecretarial, da Sade e da Cultura, e vai acontecerno Centro Cultural So Paulo. Para quem no conhece SoPaulo, este um espao pblico; eu diria o mais importanteespao pblico de cultura da cidade e esse foi um propsitonosso. Esse grupo agrega, desde o seu nascimento, pessoasmuito diversas. No um trabalho voltado exclusivamentepara o sofrimento de sofredores mentais. Ele busca aglutinar

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  • pessoas que tenham o gosto pela arte. Ento, dessamaneira que elas acabam sendo signatrias, pelo gosto damsica, do teatro e da dana. Ocorre em um espao pblicoe enquanto poltica pblica, no se paga para entrar; aberto,enfim, j nos anncios. Ento, nesse momento de encontrodas diferenas, que estava ocorrendo para ns um trabalhomuito interessante. Eu vou falar um pouco dele mais luz doque seria o nosso boom nesse projeto, que no um projetoexclusivo, pois ele est dentro de uma poltica maior.O Coral Cnico acaba sendo o carro chefe desse Projeto,como um ncleo mais permanente de pessoas que habitamos ensaios semanais. O grupo ensaia e nestes ensaios quese d uma produo interessante, que uma produo desubjetividade. Uma produo onde as pessoas podem, dealguma maneira, reescrever histrias. Desde a escolha deum repertrio at a produo de um projeto cnico em cimadaquele repertrio musical e que fale, de alguma maneira,de um lugar de vida daquele territrio paulistano ou de suasorigens. Muitos desses repertrios vo construir astemporadas anuais e estas temporadas vo dando, ento, otom daquele momento. um grupo que busca, desde o seu nascedouro, umanecessidade de autonomia, de autosustentabilidade. Achoque um pouco o grande desafio desta oficina: pensarproposies que possam apontar para esta necessidade deproduo cultural autnoma. E, mesmo assim, ainda tem muitanecessidade porque mesmo sendo um projeto hbrido - entrea Sade e a Cultura fundamentalmente - os gerentes da Sadeolham e falam: No, esse trabalho muito Cultura paraestar dentro da Sade. O que vocs fazem Cultura. Nodevia estar aqui. E a Cultura olha e diz: Isso Sade, Sade Mental, Sade Inclusiva, no deveria estar numespao de Cultura. Como que isso se manifesta: a genteest ali, dentro do Centro Cultural So Paulo e se h qualquerprogramao importante, considerada mais importante, sesobrepe na agenda, na ocupao das salas, enfim, vocest sempre como um locatrio que deve, no pagou o aluguel.Ento, voc algum, um estrangeiro dentro de um espaoque, na verdade, deveria ser um espao de todos. Eu acreditoque essa dificuldade de enxergar a potncia do trabalhoreside mesmo nessa contramo que o trabalho cultura esade, quando se associam, provoca.A gente trabalha nessa perspectiva da mistura. a misturade metas, de perspectivas, de instrumentos, e a mistura

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  • de gente. No d pra dizer que um grupo de sade mental,porque no exclusivamente portador de sofrimento mental.Mas se a gente for olhar o alcance do que provoca estetrabalho, a gente poderia dizer, sem dvida, que ele temum alcance na qualidade vida. Podemos nos autodenominarcomo um grupo de sade mental? No nos definimos assim.Por inteno, no queremos nos definir assim. As pessoas seaproximam para uma produo cultural; a gente trabalha naperspectiva de que as pessoas se renem em torno daproposio, na perspectiva da tarefa, com uma proposta dePichon Rivire, quando ele pensa no grupo operativo, daspessoas se reunirem em torno da tarefa para poderemproduzir algo, e no em torno de identidade nosolgica. Ento,o grupo no se enxerga e no se apresenta como um grupoou de idosos ou de portadores de HIV positivo ou desofrimentos mentais. Esta uma perspectiva pensada, umaperspectiva que foi construda nessa dimenso. J vivemosum processo que foi diferente. Ele nasce no campo da LutaAntimanicomial, como algo perturbador, pra de alguma formaquestionar as formas de tratamento e, onde a Musicoterapia,a Terapia Ocupacional pensada na perspectiva daLaborterapia ou o Psicodrama, que tem o seu valor, mas quevem muito associado perspectiva de atendimento, dateraputica, como algo que est no enquadre da suaproposio. Ento, as pessoas que se aproximam de algoque seja Arteterapia, Musicoterapia, j vm como umadestinao, de quem que vai chegar e pra qu estdestinado aquele propsito.Ns no trabalhamos nesse propsito, mas isso no significaque h alguma crtica a esse tipo de formulao. Nossa opo abordar de outra maneira, ou seja, temos um compromissocom a tarefa cultural como um fim. Para ns, nesse projeto,a arte no meio, ela um fim. E, portanto, trabalhamosnesta perspectiva da qualidade, do envolvimento, daspessoas se sentirem e, porque so atores, danarinos. Issono significa que vai tirar um DRT. Apesar de que no CentroCultural So Paulo, para usar a sala de dana, eles vm eperguntam: Cad a carteirinha? Vocs esto habilitados?.No, no para isso que trabalhamos, essa meta. So sim,pessoas amantes da dana, da arte, da msica, e isso podeestar ao acesso de todos, por que no? No necessariamenteter uma inscrio nos respectivos conselhos destes segmentos.Tambm no que no precise, mas no tem este a priori

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  • para voc acessar o palco, acessar uma sala de dana, parapoder mexer em um piano. No sei se est dando paraacompanhar, mas, enfim, esta perspectiva desfoca aquiloque a gente encontra de mais comum e a gente quis fugirdisto.Todo o trabalho do Projeto Cidados Cantantes est muitofundado num projeto maior da poltica pblica de So Paulo,num projeto que eu ajudei a idealizar desde 1989, nogoverno da Luiza Erundina, que so os Centros de Convivnciae Cooperativa. No seu iderio - que no necessariamenteo que a sua aplicao cotidiana - ele postula para a suaexistncia: primeiro funcionar, acontecer em um espaopblico por excelncia. O que eu chamo de espao pblicopor excelncia? Espaos onde as pessoas possam acessar,entrar, transitar, independentemente de uma carteirinha oude uma hora marcada porque est dentro de um posto desade ou que est dentro de uma escola ou porque estdentro de um hospital, enfim, lugares que j tm uma vocaopr-destinada e que as pessoas, quando olham, j sabemse vo para um Posto de Sade, vo para tratar de doenas. assim que as pessoas lidam: ou eu vou para uma vacina,ou vou para uma consulta, como se precisassem dizer quandochegam na porta, para que esto entrando. No entram,simplesmente. Este um dado muito sutil. No d paraacontecer um Centro de Convivncia Cooperativa numaUnidade Bsica de Sade. No d para ser em um hospital eno d para ser em uma escola. Esse lugar tem que ser umlugar onde as pessoas possam entrar sem dizer para queesto entrando, e esses lugares prioritrios escolhidos foramos parques do municpio.Todos os 20 Centros de Convivncia da cidade de So Pauloesto em parques? No. Em todos os que esto em parque,as pessoas tm um trnsito absolutamente aberto? No. Esseiderio no se garante s nesse territrio aparentementeaberto, mas um dado importante. um facilitador ondeuma equipe mais comprometida se d essa chance de seabrir, sem banca, sem porta, sem carto e ocorremassociaes extremamente interessantes. Ento, esse umdos aspectos: espaos pblicos por excelncia.O outro aspecto do grupo a ser montado : ter a oferta culturalcomo uma oferta que aglutine os interessados. Ento umaperspectiva pichoniana; do grupo, que se organiza entornodaquilo que eles chamam tarefa na questo cultural. Numsentido bem amplo, nas oficinas nos CECCOs dessa forma

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  • que as coisas se apresentam. Elas podem ser desde umaoficina de marchetaria, a uma oficina de dana, a uma oficinade yoga, etc. amplo este sentido cultural, como umatendncia cultural com as diversas manifestaes culturaispossveis. Ento, a partir do momento que voc oferece algoa ser feito, a ser criado, voc no define a priori quem quevai participar e, no definindo a priori, o grupo no identificado por uma nosologia ou por uma condio devulnerabilidade social, econmica, enfim, e isso tambm faza diferena.Segundo aspecto: o grupo se faz heterogneo, ou seja,forma-se um grupo heterogneo. A eu me perguntava o que que diferencia um grupo dessa natureza? Uma oficina deexpresso corporal - o que diferencia esta oficina deexpresso corporal de um Centro de Convivncia de umaoficina cultural de um SESC?Em So Paulo, o SESC grande, bravo, importante para aCultura. No sei aqui no Rio como que ... mas, vamosimaginar um lugar bacana, que oferece uma oficina deexpresso corporal, o que que o diferencia? Quando eudirigi o CECCO Ibirapuera, durante seis anos, demos muitaconsultoria ao SESC Vila Mariana porque eles queriam estarprontos para a incluso. Qual era a perspectiva? Como quea gente faz incluso? Por que vocs fazem incluso? Incluso coisa da moda, eu no gosto deste termo; a gente trabalhacom potencializao. Incluso j outra praia para a gentediscutir. Esse binmio incluso-excluso, no d para a gentediscutir aqui, mas, de qualquer maneira, fundamentalpromover espaos que potencializem o outro na sua criaoe na sua ao.E foi assim que a gente foi conversar com o SESC. O SESCachou que no poderia, no estava na idia fazer o que agente fazia nos Centros de Convivncia o que a gente buscavafazer nos Cidados Cantantes. Mas parar para pensar queincluir no simplesmente abrir qualquer espao e falar,quem quiser pode entrar; tem uma outra perspectiva decompromisso. O que diferencia o Centro de Convivncia dequalquer outro espao que oferece uma atividade x artsticae cultural que existe uma equipe. Existe uma equipemultidisciplinar que faz parte desta oficina. Eu, por exemplo,estou no Projeto Cidados Cantantes e, apesar de eu estarna tarefa de coordenao, eu canto e cantar me d muitoprazer. Eu sou membro daquele coral, eu sou coralista. Tenhooutras atribuies? Tenho. Mas a minha atribuio fica ali de

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  • planto, esperando algo acontecer para eu poder me daruma funo. Essa funo, ela se mistura no fazer artstico eesse um aspecto importante dessa proposio. Essesprofissionais, e so profissionais da Sade e esse casamento muito interessante, acho que isso tambm fica como aspectopara a oficina. um lugar importante que este profissional de sadeocupa e um lugar que apesar dele no ter um enquadre dapsicoterapia, da arteterapia, da musicoterapia, ele tem um alcanceteraputico inevitvel.Hoje, no Projeto Cidados Cantantes, eu mesma, acompanhandoumas oficinas de Centros de Convivncia, vejo que apesardas pessoas irem para a oficina de yoga, trs vezes porsemana, com depresso, elas no vo trs vezes por semanapara diminuir a depresso. Agora, a depresso altera,coquetel de HIV passa a fazer um efeito que no fazia nosujeito. Semelhante ao colega dele que toma o mesmocoquetel, est em situao parecida, mas que tem um efeitodistinto. A nica diferena na vida desses caras, que umest na oficina de produo cultural e o outro no. Ento para a gente pensar: que fenmeno esse?Desta forma, chegamos a alguns itens do que a gente observou.Por exemplo: nos Cidados Cantantes temos: mudana no crculode amigos, mudana de hbito alimentar e sedentrio, aquisiode trabalho e moradia, retorno escola e ao lar, diminuio daincidncia de internao psiquitrica, potencializao dos efeitosde coquetis de anti HIV e psicotrpicos, reduo ou supressodo uso de medicamentos, participao e acesso aos recursosculturais, educacionais e de sade da cidade. Isso s paradar um dado de populao beneficiada, ou seja, 58% daspessoas que esto em vulnerabilidade de sade - que um termo da Sade Pblica que a gente passou a trazerpara o nosso vocabulrio e que compreende estavulnerabilidade no s o sofrimento mental, portadores deHIV, deficiente, enfim - 32% da populao, hoje, dosCidados Cantantes de populao em geral; 10% depessoas em vulnerabilidade social, vtimas de violncia,pessoas desempregadas. S para vocs entenderem o queeu chamo a vulnerabilidade em sade, ela est dividida em:32% de sofrimento mental, 23% de portadores de HIVpositivo, 11% de pessoas com dependncia qumica e 11%de pessoas com deficincia. A gente no fica fazendo estetipo de levantamento, foi mais para poder dar uma dimenso,porque eu acho que a oficina vai ter que se ocupar de pensarem algumas questes que a gente acabou trazendo.

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  • Mas, voltando aquilo que diferencia, a equipe tcnica temuma tarefa, embora no tem aquela tarefa que a universidadenos preparou, ela tambm no deixa de ser uma tarefaconhecida. A gente consegue definir como uma tarefa demediao e que, alm de mediar, uma tarefa de manejogrupal e quando voc mistura muita gente diferente, vocprovoca conflito, provoca aquilo que a gente quer provocar:encontros. Mas encontros que, s vezes, so tumultuados,que so vivos; encontros que no so maneiros, no soencontros sutis; encontros disfarados, encontros escrachados,importantes e, para isso, voc no cria uma arena e fala, Vire-se!. Existe uma responsabilidade e esse manejo grupal, paratornar o grupo operativo, como diria Pichon, requer profissionais,no qual a Sade tem um papel nisso.A vai uma crtica ao Ministrio da Sade. Eu no vou poderficar nos outros dias, no vou poder falar isso para o PedroGabriel, mas vou deixar aqui a minha questo. O Ministrioda Sade, atravs da Coordenao de Sade Mental,construiu uma proposio de Centros de Convivncia para oBrasil baseado em alguma experincia que eu no sei deonde vem. No vem de So Paulo e no vem de muitos lugaresque eu conheo e que pensa esses Centros de Convivncia, comoum lugar assim: um universitrio para gerir administrativamente evrios profissionais das artes, oficineiros, exclusivamente paraportadores de sofrimento mental. Eu acho isso lamentvel,lamentvel.Primeiro, acho que a gente tem que fugir dos guetos. A gentetem que buscar diversidade no encontro das diferenas eisso no negar a importncia de segmentos, mas valorizaro quanto que potente nos encontrarmos da maneira que agente vive. Aqui esta mistura se d, na nossa casa, na nossacomunidade. Ento, tornar esse encontro potente e criativo.Que a Arte, que a Cultura estejam l para todos. Para que acriao se torne algo em ebulio, que isso seja extremamentesaudvel, deve alterar o status, alterar a identidade e acondio. As pessoas, quando se vem na sua produo,nessa produo criativa, altera o seu jeito de se olhar, a suaforma de se ver no mundo e isso potente, empoderador,isso d poder s pessoas. D a chance de troca, de opinio,de ao, isso cidadania. No preciso necessariamente meapresentar na minha dor, no meu estigma para eu servalorizado. A partir do momento em que eu crio espao deCultura exclusivamente para um segmento, eu acho que agente perde muito. Por outro lado, quando a gente retira

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  • dos profissionais de sade um papel de manejo grupal dessapossibilidade de encontro, a gente retira tambm aquilo quenos diferencia de qualquer outra oficina de arte que tem pora, que nos responsabiliza com esses efeitos da criao.O Ren Cais esteve em So Paulo e foi conhecer o ProjetoCidados Cantantes e disse que no tinha nada parecido naEuropa com aquilo que ele estava vendo. E no foi a produocultural em si que o capturou, porque ele cantou conosco,fez roda de ciranda... No foi esta perspectiva que o capturoupara ele ter ficado mexido, emocionado, mas foram os nossoseixos de sustentao do Projeto. E ele captou sem a genteprecisar falar. Ele disse: Vocs esto em um espao pblico;no melhor espao aqui da cidade. Vocs esto num palco deteatro. Vocs no esto dentro de um espao de Sade. Vocsesto em um grupo misturado, que tem profissionaismisturados, e que tambm tm funes muito claras. E eledisse na concepo que ele tem de grupo, do quanto a nossatarefa como profissionais tcnicos - que no nosso caso erampsis - ele chamou de guardies dos efeitos da criao. E aentendi que esse cara foi muito sensvel nossa concepoporque ele nos co-responsabiliza naquilo que efeito decriao no outro. Eu no sou responsvel pela criao dooutro, eu no sou responsvel por provocar no outro umadeterminada criao, ela vai se dar e, enquanto polticapblica, necessrio que hajam as melhores condiespossveis para que isso se d. necessrio o melhor palco, amelhor tela, o melhor pincel, a melhor tinta, para que possamsair as melhores obras, no serve qualquer negcio! A melhorobra no a melhor obra do que o Conselho Regional dePsicologia faz, que eu tambm tenho as minhas crticas.Participei da primeira verso do prmio Arthur Bispo doRosrio e disse que no ia participar mais, porque eu nogostaria de estar premiando a obra louca, a obra dodeficiente, a obra do aidtico. No corresponde a estemomento de contemporaneidade, a gente precisa produzirobra no-adjetivada.Se o cara tem a sua histria, que bom que essa histria notenha sido um impeditivo, que bom que essa histria possatrazer esta variao de subjetividades e perspectivas, comoo Peter apontou. Eu acho que no negar esta condio,mas essa condio no pode adjetivar a minha criao. Elano pode vir frente do eu-sujeito que estou criando. Nessamedida, fica ento a proposio de que a gente possa, juntoao Ministrio da Cultura, imaginar que dispositivos como os

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  • Centros de Convivncia possam ser Pontos de Cultura e que,estes Pontos de Cultura possam ter editais especficos parafazer uma seleo daquilo que h de melhor para respondera esta perspectiva de criao. E, como uma ltima proposioque est a, eu depois deixo para vocs darem uma olhada que se crie um Fundo Nacional para a Cultura e a Diversidade,nessa perspectiva da incluso ou da potencializao, nosmoldes do que h no municpio de So Paulo - e que eu nosei se tem em todos os municpios - que o Fumcad (FundoMunicipal da Criana e do Adolescente) que o ECA conquistou.Esse fundo de renncia fiscal, um patrocnio que no vaido gosto, do fundo, da vontade, um patrocnio que vem lcompromissado, renncia fiscal do empresrio, e que dflego para que estes trabalhos ocorram, e ocorram comqualidade e com perspectiva de mudanas de vida daspessoas. Obrigada.

    ! Geo Britto (Ator, Projeto Teatro do Oprimido na SadeMental - RJ/SP)

    Boa tarde. Eu gostaria primeiro de parabenizar pelo eventopois acho fundamental estar realizando atividades como essa,estar convidando as pessoas dos movimentos sociais, domovimento artstico, para discutir polticas pblicas. Eu achoque uma construo democrtica e um exemplo que deveser seguido em vrias reas. O Ministrio da Cultura e oMinistrio da Sade esto se juntando, o que hoje, muitodifcil a gente ver. A gente v cada um fazendo atividadesisoladamente e acho que este um desafio para todo governoe para toda a sociedade.O caso da gesto dentro do Ministrio da Sade, ns tivemosvrios avanos democrticos. Eu acho, por exemplo, que osCAPS tm todo potencial para se tornarem Pontos de Culturadentro da Sade. Da mesma forma que eu vejo os CAPS comoPonto de Cultura, os CAPS da sade espiritual, como disse onosso ministro. Ento eu acho que se a gente trabalhar juntos,desenvolver, radicalizar esta idia, eu acho que ns teremosum longo caminho a seguir.Queria agradecer ao Paulo, Patrcia Dornelles, a todas aspessoas que ajudaram a organizar esse seminrio, agradecerem nome de todos.

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  • Meu nome Geo Britto, eu sou do Centro do Teatro doOprimido. O Teatro do Oprimido uma tcnica de muitaenergia que foi sistematizada, o Augusto Boal diz mesmoque ele queria descobrir esta tcnica. Ele sistematizou algoque na verdade j existia na sociedade que esse movimentoteatral e que ns acreditamos que o ser torna-se humanoquando descobre o teatro. O que isso? Ns acreditamosque todo mundo faz teatro, at mesmo os atores. Todos nssomos capazes, todos ns fazemos teatro. Eu estou fazendoteatro agora nesse momento. Quando eu vim para c, euescolhi a blusa que eu ia usar, o Paulo escolheu o terno delepara estar aqui no Rio; vocs, quando vieram, se vocs fossempara a praia vocs iriam com outra roupa. O que eu estoufalando aqui, quer dizer, todo esse movimento, tudo isso,sou eu que estou dizendo, no tem ningum aqui, a princpio,falando por mim. Fala isso, fala aquilo, pode at acontecer,mas ns estamos realizando o qu? Uma linguagem do teatroque os atores usam em cena e ns muitas vezes no nosdamos conta disso. Ento, a idia do Teatro do Oprimido colocar para as pessoas que todos ns temos esta linguagem.Isso no quer dizer, necessariamente, que ns vamos nostornar atores profissionais ou no. Mostra o prazer, a potnciaque o teatro .Da mesma forma que todo mundo pode jogar bola, nonecessariamente ser um Ronaldinho da vida, mas descobriro prazer de jogar bola e outras atividades como pintar, cantare outras mais. O que ns do Teatro do Oprimido queremos uma coisa que muito simples: ns queremos mudar o mundo!S isso que ns queremos. Mas ns no queremos somenteisso, ns queremos fazer isso com muita humildade. Nstemos bons projetos e estamos mudando o mundo dentrodos CAPS, dentro dos Pontos de Cultura, das prises, nascomunidades aqui do Rio de Janeiro, o mundo inteiro.Hoje, o Teatro do Oprimido tem uma metodologia no mundointeiro, existe em 70 pases. Agora, ns tivemos recentementena ndia, no Festival de Teatro do Oprimido, a abertura dofestival. Foi uma caminhada com doze mil componentes quefazem teatro, de nove pases. Ns criamos uma federaode Teatro do Oprimido que congrega um milho de pessoas.Em junho do ano passado, ns tivemos o Festival de Teatrodo Oprimido, na Palestina. Na Palestina tem um Centro deTeatro do Oprimido, tem um grupo de Teatro do Oprimidoque trabalha com vrios pases rabes. Eles utilizam o Teatrodo Oprimido na Jordnia, no Egito, em toda aquela regio

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  • ali. Inclusive, o livro do Boal est traduzido em mais de 25lnguas. O tradutor do livro rabe, quando ele viu o livropronto, falou assim: Cuidado com esse livro que ele muitoperigoso!. A Palestina, inclusive, tem um trabalho de sademental. A Palestina tem dois hospitais psiquitricos. Tem umna Faixa de Gaza, vocs devem imaginar como deve funcionare outro na Galilia. Esse um lugar onde eles fazem umtrabalho, tem um grupo de Teatro do Oprimido l. Eles doo curso junto com os clientes e profissionais e tm um sucessomuito grande, fazem vrias apresentaes, etc. Infelizmente,nesse festival eles no puderam se apresentar porque osfuncionrios estavam em greve e o Governo de Israel nodeixava que eles passassem. No sei se vocs acompanharamh vrios meses. Ento, tinha uma questo poltica que sempre muito delicada e tinha outro grupo na Frana queeles no utilizavam o hospital psiquitrico. Existem algunshospitais psiquitricos na Frana, em que para a pessoa setornar enfermeiro matria obrigatria que ela faa Teatrodo Oprimido para poder utilizar isso no seu trabalhocotidiano.Acredito que o teatro esta capacidade de voc se observar,do ser humano ao se observar. Voc, ao ver um gato -acredito que ningum nunca viu um gato na frente do espelhoindo se arrumar para encontrar a gatinha. Ns, sereshumanos, gostamos de nos olhar no espelho, de nos arrumare prever o futuro, no prever, construir o futuro. No caso doteatro, a gente tem esta capacidade de observar no presenteo que aconteceu no passado, para construir o futuro.Shakespeare dizia que o teatro o espelho da humanidade.A gente acredita que mais do que isso. O Teatro doOprimido, a gente acredita que ele o espelho dahumanidade. Ns temos que penetrar e mudar aquilo comque a gente no concorda, mudar para melhor. E vocs teroa oportunidade de ver isso no s pelas minhas palavras,mas tarde, s 14h, com o Pirei na Cenna, que o grupocom o qual a gente trabalha h mais de dez anos e eles vose apresentar aqui.Dentro do teatro, o Teatro do Oprimido trabalha muito coma rea de sade mental h muitos anos. O Boal sempre teveuma boa relao com essa rea da sade mental. Na verdade,o Teatro do Oprimido so vrias tcnicas que so criadas apartir daquilo que acontece. Ento o problema no vocpegar a pessoa. A partir do problema que voc est vivendo,voc sente necessidade de criar uma nova tcnica. Ento,

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  • uma das tcnicas que tm l, que tem relao com a rea dapsicoterapia e sade mental, o teatro do desejo que umadas tcnicas que o Boal criou quando chegou na Europa.Depois que ele foi preso, torturado e exilado, ele foi para aEuropa desenvolver este trabalho e l, ele comeou a ouvirquestes que no eram to concretas, no era como o teatro-frum, que vocs vo ver hoje tarde. A partir da ele foicriando uma nova tcnica, a partir da o Teatro do Oprimidovai se desenvolvendo, algo vivo, est sempre em movimento.Eu, particularmente, tenho uma experincia muito forte e queeu acho que muito importante para mim, com a Casa dasPalmeiras. Est aqui o Walter Mello, que um companheirode longas datas. Eu pude trabalhar na Casa das Palmeiras etive o prazer de ter contato com a Dra. Nise da Silveira econversar com ela. A gente fazia as oficinas na Casa dasPalmeiras e tem inclusive vrias histrias que ela relata. Teveum dia que a gente tava fazendo uma oficina dentro da Casadas Palmeiras, fazendo exerccios teatrais, que so diversos.Um dos exerccios chama-se fotografar a imagem e muitosimples. A pessoa vai na frente, tem um grupo e as pessoasfazem imagens diversas e o grupo fecha os olhos. As pessoasdo grupo fazem o abrir e fechar os olhos como se fosse umafotografia. Ento ele abre e fecha os olhos e reproduz aimagem que o outro fez. Estava todo mundo fazendo e tinhaum cliente especial, um bailarino ps-moderno, enfim, umapessoa muito especial, a gente tava fazendo o abrir e fechare algum falava Abre, fecha e ele falava assim: Abre, fecha,abre, fecha e fazia o contrrio. Tava todo mundo fazendo,quando eu cheguei mais prximo dele e falei: Abre, fecha,abre, fecha. Sr. Jamil, eu estou falando para abrir e fechar eo senhor est fazendo o contrrio. E ele falou assim: Vocpensa que abrir o olho fcil? Tem gente que passa a vidainteira e nunca abre o olho.Ento, dentro desse princpio, a gente tem vrias experinciaslegais que poderiam ser relembradas que, como eu coloquei,tm diversas histrias. Desde o momento em que um dia asede deles precisou de ajuda, e a gente chegou com umgrupo de ensaio e perguntou para eles o que eles queriamde ns que a gente tava usando. Ento, a Claudia Simone,que diretora do grupo, falou: Remdio, tomar remdionenhum, e algum falou: Esse remdio que vocs estotomando e que me deixa mais feliz, me deixa mais alegre.Ento, eu queria tomar este remdio. A, a gente perguntou:Mas que remdio? E responderam: A gotinha do oprimido.

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  • Eu queria esse remdio para a gente. Ento, eu acho queessa coisa foi uma coisa muito interessante, foi umadescoberta, um momento pedaggico para o grupo e paraas prprias pessoas do trabalho.No Teatro do Oprimido ns temos um trabalho grande que dentro da sade mental. Trabalhamos em cerca de 60CAPS e CECCOS, na cidade, no Estado de So Paulo e noEstado do Rio de Janeiro em que ns fazemos um trabalhode capacitao. Ento, esses profissionais vm at a gente.No caso do Rio de Janeiro, a nossa sede na rua Mem de S,nmero 31, ou ns vamos at So Paulo. Que profissionaisso esses? No tm uma especialidade. Ns chamamos estaspessoas e eles vm trabalhar conosco porque uma coisaque acontece com a gente, como a Cristina falou: Ah! Masvocs so teatro ou ... Vocs fazem teatro ou vocs fazempoltica? Vocs fazem sade ou ... Ns somos, ns no nosespecializamos. Ns temos este dever a, dirio, cotidiano.Ns no nos tachamos. As pessoas costumam dizer: Ah!Isso teatro, teatro poltico, esse teatro dos anos 60, doBronx, de psiquitrico Ns costumamos dizer que nsfazemos teatro como poltica. Da mesma forma que oprofessor faz a sua ao pedaggica como poltica, um mdicofaz a sua ao de sade como poltica, nossa ao comteatro, nossa interveno na sociedade com o teatro. dessa forma que a gente trabalha.Ento, estes profissionais vm at ns, ns fazemos umacapacitao com eles e depois eles retornam para as suasunidades de sade: os CAPS, os CECCOS, nas diversas rease multiplicam isso que aprenderam com a gente. O que agente aprendeu com eles e o que eles aprenderam com agente. sempre uma troca, ns aprendemos sobre a sademental e ensinamos teatro. Ento, esse dilogo permanenteque acontece com os profissionais, que levam as tcnicas doTeatro do Oprimido dentro das unidades de sade etrabalham com os outros profissionais de sade, com osusurios, com a famlia. A idia o mximo de integrao,ento eles comeam identificando quem tem o desejo defazer o Teatro do Oprimido, o Teatro do Oprimido noprecisa ser obrigatrio, seno no seria Teatro do Oprimido.Quando a gente comea a fazer essa seduo ao teatro, aomundo do teatro, que as pessoas pensam que um mundodos escolhidos que s certas pessoas podem fazer, a gentecomea a quebrar esta resistncia e criar, inclusive, performances,cenas, espetculos teatrais e que so inicialmente, apresentados

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  • dentro das unidades de sade mental, e, posteriormente soapresentados fora. Este o nosso objetivo, quebrar estalgica, essa barreira que tem que ser s para a sade mental.A gente comea a se apresentar em escolas, nas praas, nasruas... nos apresentamos onde ns somos convidados. Ento,enquanto pensam que fazemos teatro para os atores, nspensamos que podemos fazer teatro em qualquer lugar, atno teatro; porque, geralmente, quando a gente ouve a palavrateatro, a gente pensa logo na idia da arquitetura. Para nsno. Para ns, em qualquer espao onde voc est apresentandouma iniciativa de base, automaticamente, voc cria qualquerespao tcnico, onde as pessoas esto projetando suas imagens,suas vivncias, suas emoes, voc est construindo teatro.No trabalho do Teatro do Oprimido dentro dos CAPS, dosCECCOS, quando a gente trabalha com os usurios, muitasvezes a pessoa quer encaixar o delrio na realidade. A genteno. A gente quer trabalhar a realidade com o delrio. Ento,muitas das vezes, o usurio traz uma cena delirante, mas oque delrio? Que definio essa de delrio? Se entrar umapessoa aqui, agora gritando, ento, seria delrio? No vimaqui para analisar o que esse delrio. Ento, a gente pegaestas histrias que as pessoas trazem e, com todo o respeito,com todo o desejo, a gente constri cenas com essas peas,mostra para as pessoas e faz esse dilogo. Ao nos apresentarmosnas escolas, por exemplo, os alunos ficam - Ah! So os loucos!O que ser que vai acontecer? Eles vo me atacar, eles vome agredir... Ento, a partir do momento em que a genteapresenta o teatro, eles percebem que so seres humanoscomo eu, como o outro, como todos ns; eles comeam aentender uma lgica diferenciada da sade mental e comeama quebrar estas barreiras, todas essas subjetividadesdefinidas que existem. Ento, esse um desafio que a gentetem: como a gente pode potencializar esse trabalho daCultura, nevragicalmente, dentro da sade mental.Agora uma outra coisa que super interessante da genteobservar tambm , no somente os usurios, mas aresistncia dos prprios profissionais. muito interessanteporque a gente vai fazer a oficina do Teatro do Oprimido, e,com todo o respeito, eu no sou psi, mas h uma resistnciamuito grande dos prprios psis em vivenciar as experincias.Eu proponho um exerccio, eu proponho uma tcnica teatral,no tem que racionalizar muito. O que eu vou fazer? No!Vai l e faz, vivencia! No, eles to sempre querendo falar...

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  • A palavra fundamental. A palavra foi uma das maioresinvenes da humanidade e, muitas vezes, as pessoas seprendem muito s palavras e se esquecem do som, dasimagens, das emoes, das experincias, da sensibilidade ese enclausuram nisso como uma forma de segurana. Eu estousegurando isso, eu tenho isso, todas as pessoas tm isso.Nesse trabalho, ns quebramos essa resistncia. muitoengraado como esses profissionais voltam aos seus CAPS eeles comeam a trabalhar logo depois. A gente faz oacompanhamento nos CAPS, visitas, treinamento, osprofissionais voltam com um discurso assim: Puxa, a gentecomeou a fazer os exerccios e os usurios comearam a riro tempo todo, comeavam a falar ao mesmo tempo. A euperguntava para eles: Vocs quando fizeram esses exerccios,o que aconteceu com vocs? Ah! A gente riu o tempo todo.Ah! A gente falava o tempo todo, a gente no se concentrava.Na verdade, o que eles estavam falando era exatamenteaquilo que eles faziam antes, s que eles no se observavam.S viram isso depois, a partir do momento que a gentecolocava o que ele vivenciava em cena que eles percebiamisso. Ento, eu acho que esse um elemento muito interessante,de estar sendo observado.O nosso trabalho, quando a gente t fazendo esse trabalho,o mais importante que a gente capacita o trabalhador paraele fazer isso. Para que o trabalhador est aprendendo isso?Justamente para que este profissional possa fazer polticapblica, porque o Projeto, a priori, j est bom. Geralmente,o curso dura seis meses, s que eles continuam nos CAPS,continuam nos CECCOS porque esses profissionais abraaramisso, continuam isso como forma de trabalho, comoferramenta de trabalho. Da mesma forma que a gentetrabalha nas prises, a gente trabalha com os funcionrios,agentes penitencirios, psiclogos, a equipe dos presdiosou, nas escolas. A gente trabalha com os professores,lideranas comunitrias, no sentido daquilo ficar no prprioespao, no prprio territrio porque o cliente pode passarpor ali, o usurio pode passar, mas independente de quemfor passar, o Teatro do Oprimido est ali. Vai estar sendousado, seja pela assemblia do CAPS, seja para uma festaque vai acontecer, seja no momento em que o CAPS vai levaruma mostra, um cenrio para participar... Ento, o Teatrodo Oprimido no passou a ser somente mais uma oficina(com todo o valor que tm as oficinas nos CAPS), mas elepassou a ser uma ferramenta, uma metodologia, um instrumento

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  • de anlise, de estudo e de pesquisa do que o CAPS, doque ele pode vir a ser amanh. Ento, o prprio trabalhoentre os profissionais, entre os funcionrios, entre os usurios,entre os familiares, isto , como que eles podem estardiscutindo junto uma forma de radicalizar a possibilidadedemocrtica que essa poltica tem. Ento, acho que isso super importante nesse sentido. uma ferramenta usadacomo leitura psi, mas uma a mais que no quer substituiras outras, porque eu acho que todas elas so fundamentais,todas elas so importantes. E o que a gente quer ser umaa mais. A arte, em si, no contm a verdade da realidade,ela tem uma verdadeira realidade. Tem uma realidade queela contempla, que muitas vezes impossvel chegar, elacontempla outros grupos. Ento, a gente tem que vivenciar,contemplar, chegar com outros grupos. A gente