Upload
drajmarie
View
396
Download
5
Embed Size (px)
DESCRIPTION
Monografia leishmaniose tegumentar Sobre. Ano 2005
Citation preview
1 INTRODUÇÃO
1.1 GENERALIDADES
A leishmaniose tegumentar americana - LTA, é uma doença infecciosa, não
contagiosa, de evolução crônica, causada por protozoário do gênero Leishmania, de
transmissão vetorial, que acomete pele e mucosas. É primariamente uma infecção
zoonótica urbana e periurbana, afetando outros animais que não o homem, o qual
pode ser envolvido secundariamente, e que se apresenta com características
clínicas e epidemiológicas diversas em cada área geográfica. 16, 21
Clinicamente é dividida em três grupos: leishmaniose cutânea, que produz
exclusivamente lesões cutâneas, ulcerosas ou não, porém limitadas; leishmaniose
cutâneo-mucosa ou leishmaniose mucocutânea, caracterizada por formas que se
complicam freqüentemente com o aparecimento de lesões destrutivas nas mucosas
do nariz, boca e faringe e leishmaniose cutânea difusa, formas dissiminadas
cutâneas que se apresentam em indivíduos alérgicos ou, tardiamente, em pacientes
que foram tratados de calazar ( forma visceral em que o parasito tem tropismo pelo
sistema fogocítico mononuclear, acometendo o baço, fígado, medula óssea e
tecidos linfoides ).16,21
Pelo menos 10 espécies de Leishmania causam doença no homem, ao
passo que várias outras só foram encontradas em animais. Mais de 40 espécies de
mamíferos silvestres do Novo Mundo já foram encontradas parasitadas in natura;
predominam pequenos roedores, marsupiais e desdentados, além de representantes
dos primatas e carnívoros.16, 21
A LTA apresenta ampla distribuição no Brasil, Venezuela, Guiana
Francesa, América Central, nas áreas florestais dos Andes, Suriname, Panamá,
Oriente Médio, região neotropical e planície litorânea do golfo do México,
Guatemala, Belize, Bacia Amazônica e outros. Não só no Brasil, como em outros
países do mundo, a LTA constitui problema de Saúde Pública. Sua importância
reside não somente na sua alta incidência, mas também na possibilidade de assumir
formas que podem determinar lesões destrutivas, desfigurantes e também
incapacitantes, com grande repercussão no campo psicossocial do indivíduo. 16, 21
Não existem, nas Américas, dados seguros para se avaliar o número de
pessoas atingidas pela doença. No Brasil, as estatísticas oficiais têm registrado
anualmente cerca de 35 mil casos novos, valores estes que não traduzem a
realidade, devido às deficiências no sistema de notificação das doenças
transmissíveis. Além disso, a assistência médica precária nas zonas rurais faz com o
que muitos doentes deixem que o mal se cure espontaneamente, passando sem
registro. 16, 21
1.2 SINONÍMIA DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR NO MUNDO
Cravo ou Botão de Biskra, Botão de Touggourt, Botão de Zibans, Botão de
Laghouat e Botão d'Ouargla na Argélia; Botão de Tebessa ou de Gafsa na Tunísia;
Botão do Nilo no Egito; Botão d'Alep na Siria; Botão de Bagdad ou de Bouchir na
Arábia; Botão do oriente; Úlcera de Ashkabad ou Botão de Delhi na Índia, Botão das
Filipinas nesse mesmo país; Gafsa na Tunísia; Úlcera de Bagdá no Iraque. Nas
Américas também foram descritos vários tipos de ulcerações cutâneas causadas por
leishmanias que, como no Velho Mundo, recebiam designações regionais: uta,
espúndia, pian bois, úlcera de Bauru, ferida brava, úlcera de los chicleros, bay
sore.1,2,8,9,16,20,21
1.3 TRANSMISSÃO
Através da picada de insetos transmissores infectados. Não há transmissão
de pessoa a pessoa.16
1.4 PERÍODO DE INCUBAÇÃO
No homem é, em média, de 2 meses, podendo porém apresentar períodos
mais curtos (duas semanas) e mais longos (dois anos), após a picada do
flebotomíneo infectado.16, 21
1.5 SUSCETIBILIDADE
A suscetibilidade é universal. A infecção e a doença não conferem imunidade
ao paciente.7
2 HISTÓRICO
2.1 OS PRIMEIROS ESTUDOS SOBRE LEISHMANIOSES NO MUNDO
Em 1881, o médico francês Alphonse Laveran descreveu o agente etiológico
da malária, e seu estudo foi seguido por outros que iriam esclarecer a etiologia de
moléstias associadas aos agentes transmissores, os insetos vetores.
Nos estudos sobre a Leishmaniose destacaram-se os nomes de Cunningham,
Borovsky, Donovan, Wright, Laveran, Mesnil e evidentemente Leishman12. Todos
esclareceram questões ligadas a etiologia do Calazar (leishmaniose visceral) e do
Botão do Oriente (leishmaniose cutânea).
A descoberta dos protozoários conhecidos com o nome de Leishmania data
de 1903.12 Contudo o registro de doenças semelhantes a Leishmaniose são muito
antigos. Desde o século XVIII se conhecia o Botão d'Alep (Botão de Aleppo - Síria) e
o Botão de Biskra, descrito durante a ocupação militar de Biskra pelo exército
francês em 1844. Igualmente em 1903, J.H. Wright descreveu o parasita do Botão
do Oriente, conhecido hoje com o nome de Leishmania tropica.
Wright incluiu primeiro este parasita num grupo especial, por ele denominado Welcozoma, criando a espécie Welcozoma tropica .Verificou-se depois, grande proximidade entre esse e o agente do Kala-Azar, pelo que a distinção genérica não poderia permanecer, devendo o parasita ser também incluído no gênero Leishmania e dele se fazendo a espécie L. tropica. 12
Carlos Chagas acentuou que os aspectos morfológicos da Leishmania tropica
eram mais variáveis do que na espécie anterior, visto que esta apresentava um
filamento cromático, denominado impropriamente rizoplasta. Chagas questionava a
denominação rizoplasta, dada por Nicolle, visto que:
Cumpre porém assinalar que citologicamente consideramos rizoplasta uma outra estrutura representada por um filamento que vai do núcleo principal ou do corpúsculo basal do blefaroplasto. Aqui o órgão, a que deram essa denominação, representa o início da formação de um flagelo intracelular.12
Estes organismos, munidos de flagelos foram amplamente observados por
Wright, quando estudava a úlcera do oriente e foram também observados no Brasil
por Gaspar Vianna.
Foi Nicolle quem verificou no calazar esse novo elemento estrutural da
Leishmania e que denominou rizoplasta.
Em 1904, Rogers constatou que o parasita de Leishman e Donovani se
desenvolviam no sangue humano sob a forma de flagelados e se assemelhavam,
em sua evolução, primeiro aos tripanossomos e depois aos herpetomonas.12 Esta
descoberta marcou uma real importância para a pesquisa, pois mostrou sua
afinidade com outros flagelos que foram a partir daí melhor estudados.
Marzinowsky e Bogroff confirmaram a existência, no Botão do Oriente, do
parasita de Wright que havia sido encontrado nos focos endêmicos dessa dermatose
(1904-1908).12
A partir de 1904, diferentes observadores afirmavam que o calazar não era
exclusivo da Índia, pois haviam sido constatados vários casos na China. Também
em 1904, Laveran e Cathoire publicaram estudos sobre os primeiros casos de
calazar registrados na Tunísia. Nicolle atestou o caráter endêmico da doença nessa
região, sobretudo em crianças, denominando-a de L. infantum.12
Em 1908, C. Nicolle mostrou que a L. infantum se cultivava facilmente no
meio Novy-Mac Neal (ágar e sangue de coelho). De 1908 a 1910, Nicolle mostra que
o calazar infantil podia ser inoculado em cachorros e alguns macacos. Ele constatou
que os cachorros da Tunísia eram portadores de uma leishmaniose muito próxima à
humana. Surgia então a hipótese de que a doença poderia ser transmitida às
crianças através das pulgas. 12
Nicolle ao inocular cachorros e macacos com o Botão do Oriente, torna
possível o estudo experimental da doença, realizando-as em laboratórios, longe das
zonas endêmicas. 12
Laveran obtém infecções generalizadas da doença inoculando ratos com a L.
infantum. Estas inoculações da L. tropica e do Botão do Oriente foram bem
sucedidas também em outros pequenos roedores. 12
Nesse período constatou-se áreas endêmicas da doença na Itália meridional,
na Sicília, na Grécia, em Malta, na Espanha e em Portugal. O modo de propagação
da moléstia não era bem conhecido. Nicolle achava que o papel das pulgas na
propagação da doença era ainda discutível. Outros observadores levantavam a
importância do papel dos mosquitos nesse processo. 12
A partir de 1909, diferentes observadores assinalaram a existência, em várias
regiões da América do Sul, de uma leishmaniose que apresentava grande
semelhança com o Botão do Oriente, considerando que esta poderia ser uma
variação da mesma doença. 12
2.2 EPIDEMIOLOGIA DA LEISHMANIOSE NO INÍCIO DO SÉCULO
Na África o calazar e Botão do Oriente observados na Índia, eram
considerados com focos endêmicos distintos. O calazar endêmico estava presente
também na China. Os dois tipos de Leishmaniose apresentavam-se no Turquestão,
no Cáucaso, na Síria, no Irã. Nesses países verificava-se também a Leishmaniose
canina. Neste continente o calazar e o Botão do Oriente apresentavam-se nas
seguintes regiões: Tunísia, Argélia, Biskra, Marrocos, Senegal, Egito, Sudão. 12
Na Europa o calazar era endêmico na Itália Meridional, na Sicília, na Grécia,
em Malta, na Espanha, em Portugal (aparecia também o Botão do Oriente). Na
França, mais precisamente em Marselha verificava-se a Leishmaniose canina. O
Botão do Oriente era assinalado em Creta. 12
Na América a Leishmaniose da pele e mucosas, conhecida com o nome de
Leishmaniose americana verificava-se no Brasil, no Peru, no Paraguai, no Uruguai e
nas Guianas. Migone observou um caso de Leishmaniose visceral num italiano de
47 anos, que contraiu a doença em Mato Grosso. Na Austrália a doença havia sido
registrada. 12
2.3 CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA NO INÍCIO DO SÉCULO
Conhecia-se duas formas bem distintas da Leishmaniose humana: a
Leishmaniose visceral ou calazar e a Leishmaniose cutânea ou Botão do Oriente, da
qual a Leishmaniose americana parecia ser uma variedade. 12
Sobre a morfologia geral das Leishmanioses, no começo do século, conhecia-
se bem duas espécies caracterizadas de Leishmania, a L. donovani e a L. tropica.
Após pesquisas realizadas nessa época, considerou-se que o Botão do Oriente seria
uma variedade da L. donovani. 12
As pesquisas consideravam duas formas bem diferentes de Leishmania: a
forma aflagelada e a forma flagelada. Sabia-se que a multiplicação das Leishmanias
fazia-se de maneira binária e que as Leishmanias aflageladas estavam, em geral,
dentro dos elementos anatômicos. 12
Sobre a biologia geral das Leishmanias, sabia-se que as formas aflageladas
desenvolviam-se nos tecidos do homem e no de alguns animais sensíveis às
Leishmanias (cachorros, macacos, ratos). Observou-se que os parasitas eram
endocelulares e as temperaturas entre 37 e 38°C , temperaturas do homem e da
maioria dos mamíferos, eram ideais para o desenvolvimento desses
microorganismos. 12
Lacava assinalou a existência de elementos de flagelados em pessoas com
Botão do Oriente com complicações de ulceração das mucosas. Escomel observou
Leishmanias munidas de pequenos flagelos nas ulcerações de pacientes de
Leishmaniose americana. Gonder observou igualmente pequenos flagelos em um
número reduzido de parasitas, proveniente de tecido de animais infectados com L.
tropica.12
As Leishmanias são essencialmente parasitas endocelulares (leucócitos,
células endoteliais, plasmódicas), mas no interior do tecido invadido encontrou-se
com freqüência, ao lado dos parasitas acomodados dentro dos elementos
anatômicos, um certo número de parasitas livres. Esse fato era explicado da
seguinte maneira:
Durante a inoculação na pele de um macaco ou de um cachorro, uma parcela
do tecido estaria rico em Leishmania tropica. Os parasitas eram englobados pelos
leucócitos que afluíam no momento da inoculação, ou penetravam graças aos
movimentos próprios nas células do tecido conjuntivo. Contrariamente o que se
verificava em geral, quando micróbios são englobados por leucócitos, as
Leishmanias viviam e se multiplicavam no interior de seus elementos. Eram os
leucócitos mononucleares os que eram parasitados com mais freqüência, e mais
fortemente, contudo os polinucleares eram também atingidos. 12
2.4 PRIMEIROS RELATOS DE LEISHMANIOSE NO BRASIL
No início deste século, em virtude da derrubada de matas para a formação de
plantações e construção de estradas de ferro, numerosos indivíduos, procedentes
de frentes de trabalho existentes na zona oeste do Estado e portadores de afecções
da pele, começaram a aparecer na Santa Casa de São Paulo. Tais doentes
despertaram a atenção dos clínicos pela semelhança das lesões com o quadro
clínico do Botão do Oriente e logo o agente causal foi identificado. 12
Em 1911, Gaspar Vianna, um jóvem médico paraense que trabalhava no
Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, em virtude de caracteres morfológicos
que julgou diferenciarem L. tropica, causador do Botão do Oriente, e o agente
etiológico da leishmaniose americana propôs para este o nome de L. braziliensis.
Em 1912, esse mesmo cientista deu, sem sombra de dúvida, um grande passo na
luta contra essa parasitose, ao descobrir a ação do tártaro emético para seu
tratamento.12
Em que pese a descoberta de Gaspar Vianna, a leishmaniose tegumentar
americana estendeu-se acompanhando as derrubadas de matas que precederam a
implantação das estradas de ferro ao longo das regiões Noroeste, Alta Paulista e
Alta Sorocabana e no sentido perpendicular às vias férreas. Além de Bauru, muitas
outras cidades dessas regiões tiveram seus nomes indissoluvelmente ligados à
endemicidade da moléstia. Bastaria lembrar Birigui, nome que também é aplicado
popularmente aos flebotomíneos transmissores da doença.12. Já em 1913, Brumpt e
Pedroso relatavam as primeiras observações epidemiológicas sobre a doença,
denominando-a “leishmaniose americana das florestas”, em alusão ao fato de que
sua transmissão se relacionava com o ambiente silvestre.20 Em 1922, no Rio de
Janeiro, Aragão reproduziu experimentalmente a doença, inoculando no focinho de
um cão um macerado de flebotomíneos que haviam sugado em pessoa doente.19 A
disseminação da leishmaniose tegumentar, inicialmente, foi relativamente pouco
estudada no Estado de Såo Paulo. No entanto, de princípios de 1939 a meados de
1941, o Prof. Samuel Pessôa e seus colaboradores da "Comissão de Estudos da
Leishmaniose" realizaram, sobre o assunto, amplas investigações das quais
resultaram numerosos trabalhos, enfeixados em excelente Monografia que veio à luz
em 1948. Há então um vazio de informações que só foi rompido no final da década
de 50 quando, na zona sul do Estado até então considerada isenta dessa
parasitose, foi descrito um foco de leishmaniose tegumentar em que foram
constatados 8 casos. Seguem-se alguns relatos de outros poucos casos na década
de 60, sendo interessante notar que, embora alguns desses relatos refiram-se a
zonas rurais ainda florestadas, outros dizem respeito à Capital e suas cercânias. No
período de 1975 a 1978, verifica-se o registro de 34 casos em 75, 21 em 76, 10 em
77 e um aumento brusco em 1978, 124 casos (CIS, 1985). Nesse ano a doença
passou a ser considerada de notificação compulsória.12
3 EPIDEMIOLOGIA
A LT encontra-se, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), entre as
seis doenças infecto-parasitárias de maior importância no mundo e estima-se que
ocorra em 88 países, sendo a sua notificação compulsória em apenas 32 deles. Do
total de casos já registrados de leishmaniose tegumentar (LT), 90% ocorreram em
apenas seis países: Irã, Arábia Saudita, Síria e Afeganistão (Velho Mundo), Brasil e
Peru (América do Sul). A LTA ocorre nas Américas desde o Sul dos Estados Unidos
até o norte da Argentina. O foco mais importante é o sul-americano, que
compreende todos os países, com exceção do Uruguai e do Chile 8. Predomina em
regiões de clima quente e úmido, geralmente abaixo de 800 metros de altitude e
como exceções citamos as regiões andinas de países tropicais como o Equador,
Peru e Venezuela, onde a doença ocorre em áreas que alcançam 1800 metros de
altitude.21
Dos 88 países onde a doença ocorre, 76 são países subdesenvolvidos ou em
desenvolvimento. As mudanças sócio-econômicas e comportamentais decorrentes
do processo de globalização dificultam não só o controle como aumentam o número
de vítimas mantenedoras do ciclo vicioso da pobreza e da miséria. Um exemplo
típico é o processo de urbanização das leishmanioses intimamente associado a
essas modificações, como êxodo rural, desemprego, favelas e guerras. 16
A incidência de LTA no Brasil tem aumentado, nos últimos 20 anos, em
praticamente todos os Estados, porém, não tem sido notificada no Rio Grande do
Sul. As populações rurais do Norte e Nordeste e Centro-Oeste do país são as que
pagam maior tributo à moléstia, que assola extensas áreas de colonização recente,
com cerca de 75% dos casos registrados no país. Surtos epidêmicos têm ocorrido
nas regiões Sul (Paraná), Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste, e na região Amazônica,
relacionados ao processo predatório de colonização. Desta forma, a Leishmaniose
Tegumentar é, fundamentalmente, uma zoonose de animais silvestres, que pode
atingir o homem ao entrar em contato com os focos zoonóticos. O maior número de
acometidos são adultos jovens, do sexo masculino, como indígenas habitantes de
regiões endêmicas, além de profissionais que desempenham atividades como
garimpo, desmatamento e atividades extrativistas, nas regiões Norte, Nordeste e
Centro-Oeste. Constituem ainda atividade de risco o treinamento militar nas selvas,
as expedições científicas e incursões de caçadores em áreas florestais. 21
No Nordeste, a endemia persiste também em áreas de colonização antiga,
especialmente nas zonas serranas dos estados dos estados do ceará, Paraíba, e
Bahia. Nestas áreas, um fato observado com freqüência é a infecção em cães e
eqüídeos, pela L. brasiliensis. A população de flebotomíneos é sempre maior no
ambiente peridomiciliar do que nas florestas remanescentes. Entre os insetos,
predominam as espécies Lu. Intermédia e Lu . whitmani, já incriminadas como
vetores da L. brasiliensis. Demonstrou-se ainda que a incidência da doença foi
significativamente maior entre as pessoas que conviviam com cães doentes. Soma-
se a isto o fato de que a doença acomete, em proporções semelhantes, adultos e
crianças de ambos os sexos. 21
A associação com atividades profissionais pode estar ausente em áreas onde
surgiram condições para a transmissão domiciliar. É o que se verifica por exemplo,
em Manaus, no estado do Amazonas, onde a expansão urbana aproximou a
população dos focos naturais da doença, assim como no Vale do Ribeira (SP). Nas
florestas vicinais, a zoonose, mantida principalmente pelo gambá (Didelphis
marsupialis), passou a acometer indistintamente adultos e crianças de ambos os
sexos. 21
O estudo epidemiológico dos focos naturais de leishmaniose é de tal modo
complexo que, mesmo nos dias atuais, existem regiões onde pouco se conhece
sobre os elos da cadeia de transmissão. Em certas áreas, o homem doente é o
único elemento que revela a existência da zoonose. Todavia, investigações
realizadas em diferentes regiões das Américas já contribuíram para a elucidação de
diversos ciclos de transmissão. 9
São referidas várias formas clínico-epidemiológicas relacionadas a diferentes
subgêneros e espécies de Leishmania sendo as seguintes mais comuns em nosso
meio:
Leishmania (Leishmania) amazonensis é distribuída pelas florestas primárias
e secundárias da Amazônia (Amazonas, Pará, Rondônia Tocantins e sudoeste do
Maranhão), particularmente em áreas de igapó e de floresta tipo “várzea”. Sua
presença amplia-se para o Nordeste (Bahia), Sudeste (Minas Gerais e São Paulo) e
Centro-Oeste (Goiás). Tem como hospedeiros naturais vários marsupiais,
principalmente, o roedor “rato-soiá” (Proechymis), além do Oryzomys, que, às vezes,
apresenta o parasita na pele sem lesões cutâneas. Seus principais vetores os
Lutzomyia flaviscutellata, Lutzomyia reducta e Lutzomyia olmeca nociva (Amazonas
e Rondônia) têm hábitos noturnos e vôo baixo. São pouco antropofílicos. A doença
humana é relativamente rara, podendo ocorrer lesão ulcerada, geralmente única.
Alguns indivíduos podem desenvolver o quadro clássico da leishmaniose cutânea
difusa. 16
Leishmania (Viannia) guyanensis, aparentemente limitada ao norte da Bacia
Amazônica (Amapá, Roraima, Amazonas e Pará) e estendendo-se pelas Guianas, é
encontrada principalmente em florestas de terra fírme - áreas que não se alagam no
período de chuvas. Vários mamíferos silvestres foram identificados como
hospedeiros naturais, tais como: a preguiça (Choloepus didactilus), o tamanduá
(Tamanduá tetradactyla), além de outros marsupiais e roedores. A infeção animal é
geralmente inaparente, com parasitas encontrados na pele e vísceras. Os vetores
são Lutzomya anduzei, Lutzomyia whitmani e Lutzomyia umbratilis, que é o principal
vetor, costumando pousar durante o dia em troncos de árvores e atacar o homem
em grande quantidade, quando perturbado. A doença humana, chamada “Pian-bois”,
é caracterizada por lesões únicas ou múltiplas. As lesões múltiplas são
conseqüências de picadas simultâneas de vários flebótomos infestados, ou
secundárias a metástases linfáticas. É muito raro o comprometimento mucoso pela
Leishmania guyanensis A doença atinge principalmente indivíduos do sexo
masculino, jovens e adultos, em fase produtiva, o que caracteriza a ocorrência
ocupacional nas frentes de trabalho, associada ao desflorestamento, penetração em
áreas de florestas virgens, e exercícios militares. Em áreas endêmicas pode haver
percentuais expressivos de crianças acometidas pela doença. 21
Leishmania (Viannia) braziliensis tem ampla distribuição, do sul do Pará ao
Nordeste, atingindo também o centro sul do país e algumas áreas da Amazônia
Oriental. Na Amazônia, a infecção é usualmente encontrada em áreas de terra firme.
Os hospedeiros naturais são desconhecidos e o único vetor que pode ser
individualizado é o Psychodopigus wellcomei, encontrado na Serra dos Carajás.
Este é altamente antropofílico, tem como hábito picar o homem mesmo durante o dia
e apresenta grande atividade na estação das chuvas. Em outras regiões do país, em
áreas de colonização antiga, onde o ambiente se encontra profundamente
modificado, ainda é a L. (V.) braziliensis o agente mais freqüentemente encontrado.
Entretanto, assumiu características epidemiológicas distintas com o passar do
tempo, em relação às espécies de flebotomíneos envolvidos na transmissão. No
passado, nas décadas de 30 e 40, durante o processo de colonização das regiões
Sul e Sudeste, a transmissão esteve associada aos vetores Lutzomyia whitmani,
Lutzomyia pessoai e Lutzomyia migonei, de comportamentos silvestres. Atualmente,
nessas regiões, coincidindo com a antiga distribuição da Mata Atlântica, a L. (V.)
braziliensis encontra-se associada à Lutzomyia intermedia nas áreas endêmicas
litorâneas dos estados do Espírito Santo (Viana), Rio de Janeiro (capital e interior) e
São Paulo (Vale do Ribeira), assim como nos vales de grandes rios do interior de
São Paulo e Paraná, onde o vetor é encontrado dentro e ao redor das habitações e
em abrigos de animais domésticos. No estado de Minas Gerais e em áreas do
interior da Bahia (Três Braços), o flebotomíneo incriminado é a Lutzomyia whitmani
encontrado, nas imediações dos domicílios, em plantações de bananeiras e em
áreas de florestas. No estado do Ceará, a principal forma de transmissão é
periurbana. Na Serra de Baturité o flebotomíneo é o Psychodopigus wellcomei e está
relacionado com áreas de florestas. Até o momento não se conseguiu identificar
animais silvestres como reservatórios de L. (V.) braziliensis. No entanto, é freqüente
o encontro de várias espécies domésticas, como o cão (Ceará, Bahia, Espírito
Santo, Rio de Janeiro e São Paulo), eqüinos e mulas (Ceará, Bahia e Rio de
Janeiro) e roedores domésticos ou sinantrópicos (Ceará e Minas Gerais),
albergando em proporção expressiva o parasita. Nas áreas de domínio da Lutzomyia
whitmani e, principalmente, Lutzomyia intermedia, a endemia perde seu caráter de
transmissão em região de floresta e sua ligação com as atividades ocupacionais,
atingindo indivíduos de ambos os sexos e de todos os grupos etários, com
tendências à concentração familiar dos casos e predominando nas residências
situadas próximas às encostas dos morros. Crianças e mulheres são atingidas com
freqüência. As lesões podem ocorrer em pálpebras ou em áreas normalmente
cobertas pelo vestuário, sugerindo que a transmissão com grande freqüência, ocorre
no interior das habitações. As populações atingidas são, em geral, de baixo padrão
sócio-econômico. A Lutzomyia intermedia é o flebotomíneo mais freqüentemente
encontrado dentro do domicílio e nos abrigos de animais domésticos dessas áreas
endêmicas, devido à sua grande adaptação a ecótopos artificiais, principalmente
quando próximos a áreas com cobertura vegetal (efeito marginal), sendo sua
presença no ambiente florestal bastante rara. A característica focal de transmissão
sugere uma adaptação do agente etiológico aos ciclos que se completam em micro
ambientes modificados pelo homem, tanto em áreas rurais, como na periferia de
grandes cidades, fazendo crer que o saneamento ambiental, o controle de vetores e
a diminuição das possíveis fontes de infecção sejam procedimentos eficazes no seu
controle. A existência de animais silvestres como fonte natural de infecções, ainda
insuficientemente estudada, parece incapaz de explicar a totalidade dos casos
humanos encontrados. Este aspecto leva a supor que outros ciclos, onde o homem
e animais domésticos participam, estariam sendo instalados com risco de acometer
populações bem mais numerosas do que aquelas que eventualmente penetram nas
matas.A doença humana é caracterizada por úlcera cutânea, única ou múltipla, cuja
principal complicação é a metástase por via hematogênica, para as mucosas do
nasofaringe, com destruição desses tecidos. Felizmente, a freqüência desta
complicação vem sendo reduzida, não excedendo a 2% dos casos nas áreas
endêmicas conhecidas. Provavelmente esta redução relaciona-se com o diagnóstico
e tratamento precoces. Outras espécies de leishmanias têm sido isoladas de casos
humanos, caninos, roedores e marsupiais, de diferentes regiões do Brasil (Bahia,
Amazonas, Pará, Rondônia, Mato Grosso, Minas Gerais e São Paulo) e apresentam
características biológicas e bioquímicas distintas, estando relacionadas a aspectos
clínico-epidemiológicos diferentes. Admite-se a inexistência de imunidade cruzada
entre os parasitas do subgênero Leishmania. A imunidade pode ocorrer entre os
parasitas do subgênero Viannia, porém é incompleta. As reinfecções parecem ser
raras. Populações indígenas que habitam a floresta e populações periurbanas ou
rurais, de áreas endêmicas, são freqüentemente infectadas por picadas de
flebotomíneos, o que explicaria uma elevada taxa de positividade à reação de
Montenegro ou a testes sorológicos, com manifestações inaparentes ou críticas da
doença, principalmente em crianças, nestes grupos populacionais. Em indígenas do
baixo Amazonas, a infecção é inaparente e, raramente, são observadas lesões
ulceradas. Foram descritos surtos de leishmaniose tegumentar americana em tribos
indígenas como os Wuará do Parque Nacional do Xingu, quando deslocados para
outra região. Este fato tem sido explicado pela falta do contato prévio com a LTA ou
pela inexistência de imunidade cruzada para um novo agente. Inquéritos
epidemiológicos, realizados com o teste intradérmico de Montenegro, em índios
Tyrios, do norte do Pará, mostraram que a positividade aumentava com a idade,
ocorrendo com maior freqüência no sexo masculino. A doença entre esses índios é
rara. No entanto, os missionários e militares que entram em contato com a tribo são
freqüentemente acometidos. Na Bolívia vêm sendo descritas as formas cutânea e
mucosa em indígenas, o que tem sido explicado por uma incapacidade imunológica
inata para lidar com o agente ou pela mudança nos hábitos tribais ocasionados
pelos deslocamentos populacionais. 2,10,15,21
4 ETIOPATOGENIA
4.1 AGENTE ETIOLÓGICO
As leishmanioses são causadas por diferentes espécies do gênero
Leishmania que compreendem protozoários pertencentes à família
Trypanosomatidae, (a mesma do Trypanosoma cruzi, causador da Doença de
Chagas). Possuem um ciclo de vida digenético (heteroxênico), vivendo
alternadamente em hospedeiros vertebrados, considerados definitivos, e insetos
hematófagos das especies Lutzomyia, na America Latina, e da subfamília
Phlebotominae, no resto do mundo, que são responsáveis pela transmissão dos
parasitas de um mamífero a outro. 8, 9, 13, 14, 15, 21
4.1.1 Classificação
Estes parasitas possuem a seguinte posição sistemática (após LEVINE et al,
1980):9
Reino: Protista - Haeckel, 1866
Sub-reino: Protozoa - Goldfuss,1817
Filo: Sarcomastigophora - Honigberg & Balamuth, 1963
Sub-filo: Mastigophora - Desing,1866
Classe: Zoomastigophorea - Calkins, 1909
Ordem: Kinetoplastida - Honigberg, 1963, emend. Vickerman,1976
Sub-ordem: Trypanosomatina - Kent, 1880
Família: Trypanosomatidae - Doflein,1901, emend. Grobben, 1905
Gênero: Leishmania - Ross,1903
No passado, a classificação de parasitas do gênero Leishmania se baseava
em observações clínicas e epidemiológicas, que variavam de acordo com as regiões
geográficas. A partir da década de 1960 foram utilizados critérios mais consistentes,
tais como as características de desenvolvimento dos parasitas em meios de cultura,
animais de experimentação e insetos vetores.21
Ultimamente, a taxonomia tem sofrido modificações periódicas, com a
introdução de novas técnicas para identificação de parasitas. Entre os métodos mais
utilizados cita-se, por exemplo, a análise do zimodema, realizada através de
eletroferese de isoenzimas, que revela o perfil enzimático de cada espécie.21
No método kDNA, os ácidos nucléicos do cinetoplasto são fragmentados,
através de enzimas de restrição. As enzimas seccionam a cadeia de DNA em locais
onde aparecem determinadas seqüências de aminoácidos, produzindo fragmentos
com diferentes pesos moleculares, que identificam a espécie do protozoário.21
Outra técnica utilizada é a análise do serodema ou perfil sorológico, através
de anticorpos monoclonais. Cada anticorpo monoclonal reconhece um antígeno
específico, que identifica a espécie de Leishmania.21
4.1. 2 Espécies do Subgênero Viannia (Laison & Shaw,1987)
São as seguintes espécies:
a) Leishmania (Viannia) braziliensis: é a espécie mais prevalente no homem e
pode causar lesões cutâneas mucosas. É encontrada no Brasil, Paraguai,
Argentina, Bolívia, Peru, Colômbia, Venezuela, Guatemala, Nicarágua,
Panamá e Honduras 19. Ocorre em todas as zonas endêmicas do nosso
país, desde o norte até o sul, tanto em áreas de colonizações antigas ou
recentes. É transmitida por diferentes espécies de flebotomíneos conforme
a região geográfica: no Nordeste, Lutzomyia whitmani; no Norte (Pará) Lu.
Wellcomei;e no sudeste, Lu. intermedia, Lu.migonei e Lu pessoai1. Até o
momento não se conseguiu identificar definitivamente nenhum animal
silvestre como reservatório; no entanto, é freqüente o encontro de várias
espécies domésticas albergando, em proporção expressiva, o parasita,
como o cão (Ceará, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo),
eqüinos e mulas (Ceará, Bahia e Rio de Janeiro) e roedores domésticos ou
sinantrópicos (Ceará e Minas Gerais).10
b) Leishmania (V.) guyanensis: produz habitualmente a forma cutânea com
lesões múltiplas. Ocorre na margem norte do Rio Amazonas, Guianas,
Colômbia, Suriname,Venezuela e Peru1,21. É encontrada principalmente em
florestas de terra firme - áreas que não se alagam no período de chuvas.
Além do homem, vários mamíferos foram identificados como hospedeiros
naturais, tais como a preguiça (Choloepus didactylus), o tamanduá
(Tamanduá tetradactyla), estando associada com desdentados e
marsupiais. As principais espécies de flebotomíneos envolvidas na
transmissão são a Lu. anduzei e Lu. whitmani. Lu. Umbratilis, que é o
principal vetor, costumando pousar durante o dia em troncos de árvores e
atacar o homem em grande quantidade, quando perturbado. A doença
atinge principalmente indivíduos do sexo masculino, jovens e adultos, em
fase produtiva, o que caracteriza a ocorrência ocupacional nas frentes de
trabalho, associada ao desflorestamento, penetração em áreas de florestas
virgens, e exercícios militares. Em áreas endêmicas pode haver
percentuais expressivos de crianças acometidas pela doença.2,9,10,16,21
c) Leishmania (V.) lainsoni: registrada apenas na Amazônia, tem a paca como
animal suspeito de reservatório natural e como vetor a Lu. ubiquitalis.1
d) Leishmania (V.) shawi: responsável por casos esporádicos no Amazonas e
Pará, tem como reservatórios vários animais silvestres como macacos,
preguiças e quatis e como vetor a Lu. whitmani.1
e) Leishmania (V.) naiffi: ocorre na Amazônia, nos Estados do Pará,
Amazonas, e Guiana Francesa,tendo o tatu como reservatório natural. O
parasita causa LTA de evolução benigna e seus principais vetores são a
Lu. squamiventris, Lu. paraensis e Lu. ayrozai.21
f) Leishmania (V.) peruviana: presente principalmente nos Andes peruanos,
causando formas cutâneas de LT no homem e, ocasionalmente, em
animais domésticos, principalmente cães. É o agente do “uta”, forma
benigna de leishmaniose tegumentar.21
g) Leishmania (V.) panamensis: responsável pela doença no Panamá, Costa
Rica, Colômbia, Equador e Honduras.10,21
h) Leishmania (V.) colombiensis: encontrada na Colômbia, Venezuela e
Panamá, determinando esporádicos casos no homem.16
4.1.3 Espécies do Subgênero Leishmânia (Saf’janova, 1982)
São as seguintes espécies:
a) Leishmania (Leishmania) amazonensis: agente etiológico de LTA, incluindo
a forma anérgica ou leishmaniose cutânea difusa e formas cutâneas com
lesões únicas ou múltiplas. Seus reservatórios são roedores,
principalmente, o “rato-sóia” (Proechymis), além do Oryzomys,
marsupiais e a raposa (Cerdocyon thous). Os vetores tem habitos
noturnos, voo baixo e são pouco antropolfilicos, sendo o principal deles a
Lu. flaviscutellata e secundariamente, Lutzomyia reducta e Lu. olmeca
nociva (Amazonas e Rondonia). 1
Distribuída pelas florestas primárias e secundárias da Amazônia (Amazonas,
Pará, Rondônia e sudoeste do Maranhão), particularmente em áreas de
igapó e de floresta tipo “várzea”. Sua presença amplia-se para o
Nordeste (Bahia, Ceará, Piauí), Sudeste (Minas Gerais e São Paulo) e
Centro-Oeste (Goiás, Mato Grosso).15
b) Leishmania (Leishmania) mexicana: registrada no México, Caribe,
Colômbia, Equador: produz LTA, denominada úlcera dos chicleros.16
c) Leishmania (Leishmania) pifanoi: é agente de LTA na Venezuela21
e) Leishmania (Leishmania) venezuelensis: de ocorrencia nos Andes
venezuelanos causando doença relativamente benigna.21
f) Leishmania (Leishmania) donovani: responsável pela leishmaniose
visceral.10
g) Leishmania (Leishmania) tropica: agente da Leishmaniose cutânea.10
h) Leishmania (Leishmania) aethiopica: agente da leishmaniose cutânea.10
4. 1. 4 Especies de importancia no Brasil
Até o momento, seis espécies de Leishmania, pertencentes aos subgêneros
Leishmania e Viannia, foram identificadas no Brasil como causadoras de LTA
humana: L. (leishmania) amazonensis, L. (viannia) brasilienses, L. (viannia)
guyanensis, L. (viannia) lainsoni, L. (viannia) naiffi e L. (viannia) shawi.1
4.2 VETORES
Todas as espécies do gênero são transmitidas pela picada de fêmeas
infectadas de dípteros da sub-família Phlebotominae, pertencentes aos gêneros
Lutzomyia – no Novo Mundo, e Phlebotomus – no Velho Mundo. Ao exercer o
hematofagismo, a fêmea do flebotomineo corta a epiderme e a derme, inoculando as
formas promastigotas metaciclicas provenientes das regioes anteriores do trato
digestivo do inseto (proboscida, cibario, faringe e esofago). Os vetores das
leishmanioses são também conhecidos como: cangalha, cangalhinha, mosquito-
palha, birigui, tatuíra, orelha de veado, etc. Cerca de 500 espécies de flebotomíneos
são conhecidas em todo o mundo, a maioria sem importância na transmissão da
Leishmaniose. Pelo menos 30 espécies do genero Lutzomyia estão incluídas na
relação dos prováveis transmissores. 16
No Brasil,as principais especies envolvidas são Lutzomyia whitmani, Lu
wellcomei, Lu pessoai, Lu intermedia, Lu umbratilis e Lu flaviscutellata, entre outras.
São menores que os pernilongos comuns; apresentam-se muito pilosos e de
coloração clara (cor de palha ou castanhos claros); facilmente reconhecidos pela
atitude que adotam quando pousam, pois as asas permanecem erectas e
entreabertas; as fêmeas exercem hematofagia, preferencialmente, no horário
noturno. A oviposição é feita em quantidades de 40-70 ovos, em lugares úmidos e
com matéria orgânica, ficando os ovos aderentes ao substrato, graças a substâncias
viscosas que acompanham as desovas. O período de incubação estende-se de 6 a
17 dias, variando conforme a temperatura. A eclosão, geralmente se dá de 7 a 10
dias após a postura. Passam por 4 mudas e seu período de desenvolvimento varia,
conforme a espécie, a temperatura, a umidade e o alimento disponível, podendo
durar de 18 dias até meses, nas épocas frias e secas. A pupa não se alimenta,
permanecendo imóvel. A duração do período pupal varia de 7-12 dias, dependendo
também da temperatura e de fatores genéticos. A eclosão dos machos, inicia-se
antes da das fêmeas , ocorrendo preferencialmente à noite. A cópula ocorre em
superfície, podendo acontecer mesmo quando a fêmea está se alimentando. Ambos
os sexos necessitam de carboidratos, que são extraídos de néctar de flores e frutos,
como fonte energética. As fêmeas necessitam ingerir sangue para o
desenvolvimento dos ovos. Movem-se de modo saltitante, com vôos curtos; podendo
ser coletados tanto em copa, como em solo. Os criadouros em ambientes extra
domiciliares são raízes tubulares de árvores, ocos, depressões e buracos de troncos
de árvores e tocas de animais, entre e sob as rochas, fendas e juntas. No ambiente
domiciliar e peridomiciliar, chiqueiros de porcos, bananais, lixo ou restos próximos a
casas tendo, algumas espécies, grande capacidade de se adaptarem ao ambiente
domiciliar humano, quando ocorre destruição do seu habitat natural. A sazonalidade
e a densidade são dependentes de alguns fatores como temperatura, umidade
(chuva), velocidade dos ventos; podendo seu número, nos meses quentes e úmidos,
aumentar e nos meses frios e secos, diminuir.16,21
4.3 CICLO BIOLOGICO
4.3.1 Ciclo no Vetor
A infecção do inseto ocorre quando a femea pica o vertebrado para exercer o
repasto sanguineo e juntamente com o sangue, ingere macrofagos parasitados por
formas amastigotas. Durante o trajeto pelo trato digestivo anterior, ou ao chegarem
no estomago, os macrofagos se rompem liberando as amastigotas. Essas sofrem
uma divisão binaria e se transformam rapidamente em promastigotas, que tambem
por processos sucessivos de divisão se multiplicam ainda no sangue ingerido, que e
envolto por uma membrana peritrofica secretada pelas celulas do estomago do
inseto. Após a digestao do sangue, entre o terceiro e quarto dias, a membrana
peritrofica se rompe e as formas promastigota ficam livres e permanecem se
reproduzindo por divisão binaria, podendo seguir dois caminhos de acordo com a
especie do parasito. No primeiro, as formas promastigotas das especies
pertencentes ao subgenero Viannia dirigem-se para o intestino onde se colonizam
nas regiões do piloro e ileo(seção peripilaria). Nestes locais ocorre transformação
das promastigotas em paramastigotas que permanecem aderidas pelo flagelo ao
epitelio intestinal atrves de hemidesmossomas, onde ainda se dividem. Novamente
ocorre transformação em promastigotas que migram atraves do estomago em
direção a faringe do inseto. Alem das alterações morfologicas das promastigotas
durante o processo de migração no trato digestivo do vetor, há uma mudança da
expressão estagio – especificas de varias moleculas dessas formas durante o seu
desenvolvimento. Este processo e denominado metaciclogenese, onde as
promastigotas que migram para a parte anterior do tubo digestivo do vetor atingem
um estagio infectivo, ou seja, se transformam em formas metaciclicas infectantes. A
principal transformação bioquimica observada ocorre com a variação do tamanho
das porções glicidicas da molecula de lipofosglicano (LPG) ancoradas na superficie
das membranas das promastigotas. No segundo, as formas promastigotas das
especiespertencentes ao subgenero Leishmania multiplicam-se livremente ou
aderentes as paredes do estomago (seção suprapilaria). Em seguida, ocorre
migração dos flagelados para a região anterior do estomago onde transformam-se
em paramastigotas, colonizando no esofago e na faringe. Neste local, diferenciam-
se novamente em pequenas promastigotas metaciclicas, semelhantes ao
desenvolvimento anterior. O tempo necessario para que o ciclo se complete varia
entre tres a cinco dias para diferentes especies.2,16,21
4.3.2 Ciclo no Vertebrado
Durante o processo de alimentação do flebotomineo, as formas promastigotas
são introduzidas no local da picada. Dentro de quatro a oito horas, estes flagelados
são interiorizados pelos macrofagos teciduais. A saliva do flebotomineo contem
neuropepetideos vasodilatadores que atuam facilitando a alimentaçaão do inseto e
ao mesmo tempo imunossuprimindo a resposta do hospedeiro vertebrado;
exercendo desta forma importante papel no suscesso da infectividade das
promastigotas metaciclicas. O macrofago estende pseudopodes que envolvem o o
parasito, introduzindo-o em seu interior, envolto pelo vacuolo fagocitario.
Rapidamente as formas promastigotas se transformam em amastigotas que são
encontradas 24 horas após a fagocitose. Dentro do vacuolo fagocitario dos
macrofagos, as amastigotas estão adaptadas ao novo meio fisiologico e resistem a
ação destruidora dos lisossomas, multiplicando-se por divisão binaria ate ocupar
todo o citoplasma. O nucleo do macrofago chega a deslocar-se do centro para dar
lugar ao vacuolo com as amastigotas. Esgotando-se sua resistencia, a membrana do
macrofago se rompe liberando as amastigotas no tecido, sendo novamente
fagocitadas, iniciando no local uma reação inflamatoria.2,16,21
4.4 MORFOLOGIA
4.4.1 Formas amastigotas
Em preparações coradas pelo Giemsa, os parasitas aparecem como
corpúsculos ovóides, de contornos bem definidos, medindo de 2 a 6µm de
comprimento por 1,5 a 3µm de largura. O citoplasma apresenta coloração azul-
pálida, enquanto que o núcleo excêntrico aparece corado em vermelho, acolado à
membrana citoplasmática. Próximo ao núcleo, corado em violeta, o cinetoplasto
apresenta-se puntiforme ou como um bastonete denso.16,21
4.4.2 Formas promastigotas
São formas alongadas em cuja região anterior emerge um flagelo livre. No
citoplasma observam-se granulações azurofilas e pequenos vacuolos. O nucleo
assemelha-se ao existente na forma amastigota e situa-se na região central da
celula. O cimetoplasto geralmente e ovoide, e situa-se entre a extremidade da região
anterior e o nucleo, variando bastante em sua posição. O tamanho das formas
promastigota e variavel, mesmo dentro de uma mesma especie, seja no tubo
digestivo do inseto vetor ou em cultura, medindo entre tem 15 a 40µm de
comprimento e 1,5 a 3µm de largura,incluindo o flagelo que frequentemente e maior
que o corpo.16,21
4.4.3 Formas paramastigotas
Apresentam-se ovais ou arredondadas com o cinetoplasto margeando o
nucleo ou posterior a este e um pequeno flagelo livre. Seu tamanho varia entre 5,0-
10,0µm x 4,0-6,0µm. São encontradas aderidas ao epitelio do trato digestivo do vetor
pelo flagelo atraves de hemidesmossomas.16,21
4.5 REPRODUÇÃO
O processo de reprodução das leishmanias e feita atraves de divisão binaria.
Nas formas promastigotas existentes no trato digestivo do vetor, o primeiro sinal de
divisão e a produção de um segundo flagelo que sempre permanece menor do que o
original. Isto e acompanhado por uma mudança no cinetoplasto, devido
provavelmente a replicação do DNA. O nucleo então se divide em dois, que
normalmente ficam lado a lado. Neste momento o cinetoplasto esta denso e
compacto. Após o nucleo ter se dividido, o cinetoplasto fende-se em dois e o corpo
do parasito se separa longitudinalmente pela região anterior para produzir duas
pequenas promastigotas. Em culturas e comum, entretanto, o encontro de formas
cujo cinetoplasto se divide antes do nucleo. A reprodução das formas amastigotas
ocorre no interior dos fagossomas dos macrofagos, tambem por divisão binaria, de
modod similar ao que ocorre nas formas promastigotas. Em meios de cultura sem
células, à temperatura ambiente, os parasitas multiplicam-se sob a forma de
promastigotas; em cultura de células, a 37ºC, multiplicam-se como amastigotas.16,21
4.6 INTERAÇÃO PARASITO-HOSPEDEIRO
A capacidade dos macrófagos de controlarem a proliferação das leishmanias
ou de sucumbirem a sua proliferação depende de vários fatores. Alguns desses
fatores dizem respeito à virulência da espécie infectante. Outros, da capacidade do
paciente em montar uma resposta imunológica eficiente que, por meio dos linfócitos
T e B, estimule a destruição das leishmanias pelos macrófagos.
Apesar de serem todas inoculadas na pele, espécies distintas de leishmania
têm preferências por órgãos diferentes e causam lesões maiores ou menores,
produzem ou não metástases e podem ser ou não auto-curáveis. Induzem
imunidade permanente ou temporária e às vezes nenhuma. Esse conjunto de
fatores, e suas possíveis combinações com a capacidade de resposta do paciente, é
o responsável pelas diversas formas clínicas das leishmanioses.2
Nos mamíferos silvestres, as leishmânias causam pouco ou nenhum efeito
patológico, caracterizando uma relação de equilíbrio entre parasita e hospedeiro;
muitos animais albergam amastigotas na pele e nas vísceras, sem qualquer sinal de
doença. Hospedeiros acidentais, incluindo o homem, reagem intensamente à
presença do invasor, resultando daí o aparecimento das lesões. Às vezes, porém, a
infecção no homem é inaparente ou se manifesta sob a forma de lesão mínima.9,14
5 ASPECTOS IMUNOLÓGICOS DA DOENÇA
Devido a seu curto aparelho bucal, os flebotomíneos são incapazes de
canular pequenos vasos da derme, provocando então lesões neste microambiente,
no qual as forma promastigotas metacíclicas encontrarão diversas substâncias tais
como: proteínas do soro, saliva e fluidos digestivos do inseto. Com relação aos
elementos sorológicos do hospedeiro, destacam-se as proteínas do complemento,
os anticorpos (IgG) e fibronectina. A saliva contribui efetivamente na infecciosidade
das formas promastigotas, por meio de substâncias vasodilatadoras. Essa
substância imunossupressora parece inibir a apresentação de antígenos de
Leishmânia pelos macrófagos. 8,16
Os anticorpos da classe IgG e as fibronectinas participam do processo de
adesão das promastigotas infectantes ao macrófago por meio de receptores para
porção Fc das IgG.As diversas espécies de Leishmania são capazes de ativar o
complemento tanto pela via clássica como pela via alternativa. Os fatores do
complemento, principalmente o C3 e seus produtos de clivagem, favorecem a
fagocitose, uma vez que os macrófagos possuem receptores específicos para os
mesmos. O complexo lítico final do complemento (C5-9), provavelmente por
impedimento estérico produzido pelo espessamento da LPG (lipofosfoglicano). 8,16
Além do LPG, a glicoproteína gp63 e alguns carboidratos (fucose e manose)
estão envolvidos com a ligação do parasito com a célula hospedeira. A penetração
na célula por meio de receptores para estes ligantes resulta em uma forma de
escape da Leishmânia. Uma vez que dessa forma o mecanismo microbicida de
explosão respiratória dos macrófagos não será ativado. No interior do fagossoma as
promastigotas transformam-se em amastigotas que sobrevivem e se multiplicam
dando início á infecção. Neste papel de sobrevivência, destaca-se a LPG, devido a
sua ação inibidora de enzimas hidrolíticas e da proteína Kinase C, enzima
responsável pelo início da explosão respiratória. 16
O resultado da infecção pela Leishmânia depende de respostas imunes
mediadas por células determinadas geneticamente. Anticorpos anti-Leishmânia são
produzidos, mas não são protetores. Foram bastante estudados em modelos
animais, e humanos com leishmaniose, na tentativa de identificar as populações
celulares e as citosinas envolvidas. Há evidências tanto de respostas protetoras
como de respostas que exacerbam a doença. A resolução da infecção e a proteção
contra a reinfecção correlacionam-se com a expansão das células T CD4 do linfócito
T auxiliar do tipo 1 Th1, que secretam interferon Gama e interleucina 2 em resposta
aos antígenos da Leishmânia.16
A produção de IFN-g por células “Natural Killer” (NK) em resposta a IL12 e a produção de IL4, por células tais como os mastócitos e basófilos, pode ser importante na iniciação de respostas Th1 e Th2. As células NK têm sido descritas como fonte de IFN-g, o qual auxilia na diferenciação da subpopulação de células CD4+ e induz resistência à L. major em camundongos (SCHARTON & SCOTT, 1993). As células CD8+ também podem produzir quantidades substanciais de IFN-g (SALGAME et al, 1991) e podem participar na regulação inicial das respostas de citocinas pela célula CD4+. Além disso, a presença de células CD8+ com um padrão de citocinas similar ao da célula Th2 também já foi descrito na leishmaniose humana (UYEMURA et al, 1993). As células T CD4+ também podem ser fontes de citocinas no meio local da ativação primária de células T específicas a Leishmania. A secreção local de IFN-g poderia direcionar a resposta de célula T específica ao parasita a desenvolver uma resposta do tipo Th1.
As características diferentes das subpopulações Th1 e Th2 implicam em funções diferentes no curso da elaboração da resposta imune. As células Th1 estão envolvidas principalmente na eliminação de patógenos intracelulares e nas respostas imunológicas do tipo celular. Por outro lado, os linfócitos ditos do tipo Th2 estão envolvidos na indução da resposta humoral e nos fenômenos de eosinofilia. As células do tipo Th1 são caracterizadas pela secreção de IL2, IFN-g e TNF. Já as células do tipo Th2 produzem IL4, IL5, IL6, IL9, IL10 e IL13. As subpopulações Th1 e Th2 também induzem a síntese de anticorpos de isotipos diferentes.
A estimulação policlonal de células B in vitro e a indução de respostas de anticorpos específicas a um antígeno, in vitro ou in vivo, demonstram que as células Th1 induzem respostas de anticorpos dominadas pelo isotipo IgG2a, enquanto as células Th2 favorecem a síntese de isotipos IgG1, IgE e IgA (COFFMAN & CARTY, 1986; COFFMAN et al,
1988). Apesar das respostas Th1 e Th2 serem bem documentadas, há células que expressam citocinas dos dois tipos e por isso são denominadas Th0. Já as células que produzem altas quantidades de TGF - b são chamadas de Th3 (MOSMANN & SAD, 1996).
O modelo de infecção melhor estudado é o da infecção de camundongos por L. major. A realidade funcional das subpopulações Th1 e Th2 foram particularmente bem estabelecidas no modelo experimental de infecção de camundongos por Leishmania em função da existência de camundongos geneticamente sensíveis ou resistentes a esses parasitas. Os camundongos geneticamente sensíveis (BALB/c, por exemplo) desenvolvem lesões cutâneas no sítio de injeção; já os camundongos geneticamente resistentes (C57Bl/6, CBA, C3H), parecem curar rapidamente e se mostram resistentes a novas reinfecções. Numerosos trabalhos demonstram que a progressão da doença está associada à ativação de células Th2.
A dicotomia funcional está associada à produção de IL4 em camundongos sensíveis e de IFN-g em camundongos resistentes no que concerne à L. major (HEINZEL et al, 1989). O desenvolvimento de uma resposta predominantemente do tipo Th2 pode ser um componente importante na extrema susceptibilidade de camundongos BALB/c a Leishmania, mas parece ser menos importante na manutenção das infecções crônicas, não fatais, associadas com as infecções de L. amazonensis em camundongos C57Bl/10 (SCOTT & AFONSO, 1993), onde a involução da resposta Th1 é que parece determinar a maior susceptibilidade. A dicotomia Th1 x Th2 também é observada em casos humanos, onde uma maior gravidade da infecção por L. braziliensis aparece associada ao fenótipo Th2.
Os pacientes que contraem a forma cutânea de leishmaniose, desenvolvem uma resposta do tipo Th1 ao nível das lesões, enquanto uma resposta do tipo Th2 aparece no nível das lesões mucocutâneas dos pacientes que sofrem da forma crônica associada a uma destruição das mucosas (PIRMEZ et al, 1993).
Apesar da importância da resposta Th1 na cura da infecção, é importante salientar que não são todos os clones Th1 que são sempre protetores, já que dentre os vários epítopos T CD4+ identificados na principal glicoproteína de superfície da forma promastigota de L. major, gp63, apenas um epítopo é capaz de estimular células Th1 e proteger camundongos contra a infecção (JARDIM et al, 1990). Além disso, a molécula recombinante PSA-2 (Antígeno de Superfície de Parasita – de L. major), purificada de Escherichia coli e administrada em lipossomos ou Corynebacterium parvum como adjuvante, é capaz de gerar uma forte resposta do tipo Th1, mas não protege os camundongos contra a infecção (SJÖLANDER et al, 1998). Alguns estudos sugerem que a ativação das células Th1 ou Th2 é influenciada pela associação peptídeo-molécula de classe II apresentada às células T. Diferentes variantes do peptídeo dominante 12-26 da proteína cI do repressor do fago l foram produzidos com a ajuda de mutações pontuais. Esses variantes diferem de forma a induzir uma resposta de hipersensibilidade dependente de IL4 e uma produção de anticorpos, o que indica que a natureza do epítopo reconhecido pelas células T CD4+ pode modificar o tipo das células efetoras (SOLOWAY et al, 1991). A dose do antígeno também pode modificar a natureza celular ou humoral da resposta imune por sua influência sobre a orientação da diferenciação Th1 ou Th2. No modelo de infecção murina por L. major, camundongos no início da infecção desenvolvem uma reação de hipersensibilidade quando desafiados com um extrato de Leishmania. Estes animais se tornam resistentes a infecções subseqüentes com doses de parasitas que levariam a lesões cutâneas irreversíveis (BRETSCHER et al, 1992). A forma solúvel ou particulada do antígeno pode influenciar na diferenciação dos linfócitos T CD4+ ativados. O tratamento de camundongos com Ovalbumina (OVA) polimerizada, resulta em uma
diminuição da resposta de anticorpos IgE e um aumento da taxa de IgG2a produzida em resposta à OVA nativa (HAYGLASS & STEFURA, 1991). Além disso, a administração in vivo da OVA polimerizada induz uma produção maior de IFN-g quando comparada à injeção de OVA nativa (GAZZINELLI et al, 1992). Estes resultados podem sugerir que antígenos de alto peso molecular orientam a resposta T CD4+ para um perfil Th1.17
6 QUADRO CLÍNICO
As lesões cutâneas são similares nas várias formas de leishmanioses
tegumentares e surgem após um período de incubação que varia de 1-4 semanas. A
lesão inicial é constituída por pápula eritematosa, única ou múltipla, localizada em
geral em região descoberta do tegumento, que corresponde ao ponto de inoculação.
Evoluem assumindo aspecto pápulo-vesiculoso, pápulo-pustuloso, pápulo-crostoso e
finalmente formam úlceras, que tipicamente apresentam bordas elevadas,
enduradas e fundo com tecido de granulação grosseira, cor vermelho-viva, podendo
estar recobertas por exsudato seroso ou purulento, configurando a clássica lesão
com borda em moldura 20. Os pacientes raramente queixam dor, mas alguns referem
ardência e pontadas, confundindo a lesão inicial com miíase por Dermatobia. Não há
sinais de flogose, tais como edema e calor, exceto se houver infecção bacteriana
associada, tornando a lesão mais dolorosa e com aspecto purulento 21. Pode haver
também a associação de infecção fúngica superficial 8. Durante os três ou quatro
primeiros meses a lesão atinge seu diâmetro máximo que varia de alguns milímetros
a vários centímetros. Em seguida, se estabiliza e à medida que começa a prevalecer
a reação do hospedeiro, tende a cura espontânea , o que na maioria das vezes, se
dá no período de seis meses a três anos,21 deixando uma cicatriz plana,
hipopigmentada e atrófica.8 No início da doença é comum a presença de linfangite e
linfadenite regionais, especialmente quando as lesões se localizam na face ou
membros superiores. O comprometimento ganglionar pode ser primário
(enfartamento de gânglios precedendo a lesão de pele) ou secundário (enfartamento
de cadeia ganglionar na região da lesão de pele, após a identificação desta) e
raramente pode apresentar-se generalizada. Alguns doentes relatam aumento do
gânglio antes do aparecimento da lesão cutânea. De fato, já se comprovou que a
doença pode permanecer latente por longos períodos, na forma ganglionar. Os
gânglios reacionais tendem a regredir após alguns meses, quando a lesão primária
se estabiliza; às vezes, porém, ulceram, comprovando a presença do parasita no
local. Em raros casos a disseminação da L. brasiliensis por via linfática dá origem a
múltiplas lesões secundárias, alinhadas em direção centrípeta, simulando a
linfangite nodular esporotricótica. Já quando o agente é a L. guyanensis, a presença
de úlceras múltiplas, conseqüentes à disseminação linfática é bem mais freqüente.21
Durante a evolução do quadro cutâneo, destacamos o notável potencial
polimorfismo das lesões sendo possível encontrar formas impetigóide, liquenóide,
tuberculosa ou lupóide, nodular, vegetante e ectimatóide, o que torna imprescindível
estar atento ao diagnóstico diferencial. A leishmaniose cutânea disseminada é rara,
as lesões são eritematosas, sob a forma de pápulas, tubérculos, nódulos e
infiltrações difusas e, menos freqüentemente, sob a forma tumoral. A infiltração pode
envolver extensas áreas do corpo e, quando presente na face, confere ao paciente o
aspecto leonino, confundindo-se com a hanseníase virchowiana.
6.1 LESÕES CUTÂNEAS
Na apresentação cutânea da LTA as lesões de pele podem caracterizar a forma
localizada (única ou múltipla), a forma disseminada (lesões muito numerosas em
várias áreas do corpo) e a forma difusa. Na maioria das vezes a doença apresenta-
se como uma lesão ulcerada única.
6.1.1 Forma cutânea localizada e múltipla
Nas formas cutânea localizada e múltiplas a lesão ulcerada franca é a mais comum
e se caracteriza por úlcera com bordas elevadas, em moldura. O fundo é granuloso,
com ou sem exsudação. Em geral, as úlceras são indolores. Observam-se também
outros tipos de lesão como úlcero-crostosa impetigóide, ectimatóide, úlcero-
vegetante, verrucosa crostosa, tuberosa, linquenóide e outras. Nestas formas, na
fase inicial, é freqüente a linfangite e/ou adenopatia satélite, que poderia preceder a
lesão de pele. Às vezes, no cordão linfático podem se desenvolver nódulos, que se
ulceram, lembrando a esporotricose. Podem ser observados pápulas na periferia das
lesões.
6.1.2 Forma cutânea disseminada
A forma cutânea disseminada caracteriza-se por lesões ulceradas pequenas, às
vezes acneiformes distribuídas por todo o corpo (disseminação hematogênica).
Tanto a forma localizada quanto a disseminada costumam responder bem à
terapêutica tradicional.
6.1.3 Forma cutânea disfusa
A leishmaniose cutânea difusa - LCD é considerada forma rara da leishmaniose
tegumentar e se encontra distribuída em alguns países das Américas, África e Ásia.
Essa variante da leishmaniose tegumentar caracteriza-se por maciço
comprometimento dérmico, natureza crônica, com recaídas freqüentes e anergia ao
teste intradérmico de Montenegro. Apresenta aspectos clínico, imunológicos,
parasitológicos, anatomopatológicos e terapêuticos diferentes das outras formas de
leishmaniose cutânea, existindo duas possibilidades para explicar esta adversidade:
1. As diferenças seriam devidas a uma deficiência imunológica específica dos
hospedeiros;
2. Representam duas entidades diversas, causadas por subespécies diferentes de
leishmanias capazes de induzir imunodepressão específica no hospedeiro infectado.
As características clínicas iniciais da LCD apresentam-se como mácula, pápula ou
nódulo no local da inoculação. Ao contrário do que ocorre com a leishmaniose
cutânea, não se observa ulceração, evoluindo com aparecimento de outras lesões
semelhantes na vizinhança, e em período variável, de meses a anos, ocorre
disseminação hematogênica do parasita com aparecimento de outras lesões em
várias partes do corpo. As áreas mais freqüentemente afetadas são: face (nariz,
regiões malares, lábio superior, pavilhão auricular) e membros (braço, antebraços,
pernas, pés). A doença poupa o couro cabeludo, regiões inguinocrurais, axilas e
região das palmas das mãos. As lesões são eritematosas, sob a forma de pápulas,
tubérculos, nódulos e infiltrações difusas, e, menos freqüentemente, sob a forma
tumoral. A infiltração pode envolver extensas áreas do corpo e, quando presente na
face, confere ao paciente o aspecto leonino, confundindo-se com a hanseníase
virchowiana . Quando as lesões localizam-se sobre as superficies ou áreas sujeitas
a traumas, pode haver exulcerações ou apresentar superfície hiperceratósica,
vegetante ou queloidiana. Podem ser observadas ainda lesões verrucosas ungueais
associadas a lesões verrucosas das extremidades distais dos pododáctilos. Não há
referência na literatura quanto aos aspectos histopatológicos iniciais na LCD
humana. Como de um modo geral os pacientes são diagnosticados na fase evolutiva
da doença, nota-se quadro monótono, constituído por macrófagos vacuolizados,
repletos de parasitas, obscurecendo as estruturas da derme e da hipoderme.
Ao exame físico, de um paciente portador de lesões cutâneas deve-se também
examinar as mucosas.
6.2 LESÕES MUCOSAS
A apresentação mucosa da LTA é na maioria das vezes secundária às lesões
cutâneas, surgindo geralmente, meses ou anos após a resolução das lesões de
pele. Às vezes, porém, não se identifica a porta de entrada supondo-se que as
lesões sejam originadas de infecção subclínica. São mais freqüentemente
acometidas as cavidades nasais, seguidas da faringe, laringe e cavidade oral.
Portanto, as queixas mais comuns no acometimento nasal são obstrução, epistaxes,
rinorréia e crostas; da faringe, odinofagia; da laringe, rouquidão e tosse. No
acometimento da cavidade oral, as queixas são ferida na boca. As lesões podem ser
discretas com poucos sintomas, daí a necessidade de sempre se buscar a
identificação de doença em mucosas. Ao exame clínico, pode-se observar
infiltração, ulceração, perfuração do septo nasal, lesões úlcero vegetantes, úlcero
crostosas ou ulcero-destrutivas. Poderá ocorrer destruição parcial ou total da
pirâmide nasal e outras estruturas acometidas na boca. Outras mucosas, como
língua e órgãos genitais, são raramente atingidas. A presença de uma ou várias
cicatrizes atróficas em pele ou história de úlcera cutânea com evolução prolongada,
ao lado das queixas acima referidas, reforçam o diagnóstico clínico de leishmaniose
mucosa. A ausência de cicatrizes não afasta a suspeita clínica de acometimento
mucoso por leishmaniose, devendo ser investigada outras patologias com
diagnóstico diferencial.
A Lesão mucosa associada ao comprometimento cutâneo da LTA, pode ser
concomitante, sendo o acometimento mucoso à distância da lesão ativa de pele, ou
contígua (o comprometimento mucoso ocorre por extensão da lesão de pele situada
próxima de mucosas). O diagnóstico precoce de qualquer lesão mucosa é essencial
para que a resposta terapêutica seja mais efetiva e sejam evitadas as seqüelas
deformantes e/ou funcionais.
6.3 COMPROMETIMENTO GANGLIONAR
O comprometimento ganglionar pode ser primário (enfartamento de gânglios
precedendo à lesão de pele) ou secundário (enfartamento de cadeia ganglionar na
região da lesão de pele, após a identificação desta) e raramente pode apresentar-se
generalizada.
7 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
As formas cutâneas devem ser diferenciadas das úlceras traumáticas, úlceras
de estase, úlcera tropical, úlceras de membros inferiores por anemia falciforme,
piodermites, paracoccidioidomicose, neoplasias cutâneas, sífilis e tuberculose
cutânea. A hanseníase virchowiana deverá ser excluída, principalmente no
diagnóstico diferencial da leishmaniose cutânea difusa. Nas lesões mucosas, o
diagnóstico diferencial deve ser feito com a paracoccidioidomicose, hanseníase
virchowiana, rinoscleroma, bouba, sífilis terciária, granuloma médio facial e
neoplasias. Nas formas vegetantes, distingue-se a variedade verrucosa, muito
freqüente, que simula a esporotricose verrucosa, a cromomicose, a
paracoccidioidomicose, a piodermite vegetante e a tuberculose verrucosa 15. Às
vezes, no cordão linfático podem se desenvolver nódulos, que se ulceram,
lembrando a esporotricose.9
8 COMPLICAÇÕES
a) Infecção secundária das úlceras leishmanióticas é relativamente
comum, sendo a responsável pelas queixas de dor no local das lesões.
Estudos realizados no sentido de isolar os agentes responsáveis por
tais infecções indicaram os seguintes agentes: bactérias
(estreptococos, estafilococos, pseudomonas) e micobactérias (Avium
celulare). Alguns fungos também foram isolados em meios de culturas
apropriados. Nestes casos deve-se proceder ao exame
bacterioscópico, cultura e antibiograma e, em seguida, estabelecer o
tratamento com os antimicrobianos indicados para tais agentes. Deve
ser lembrado que o tratamento específico para LTA, somente será
instituído após a melhora da infecção secundária. Os mesmos critérios
devem ser adotados para as lesões cutâneas e de mucosas.
b) Lesão mucosa nasal pode levar à rinite purulenta e a complicações
como sinusite até broncopneumonia causada pela secreção aspirada
da faringe;
c) A complicação com broncopneumonia é a principal responsável por
óbitos nos casos de mucosa.
d) Meningite pode ser uma complicação da disseminação da infecção de
uma úlcera da face para a base do crânio.
e) Lesão extensa no centro da face pode levar à trombose de seio
cavernoso.
f) Lesões na boca e faringe podem causar sialorréia e dificuldade na
deglutição, levando a desnutrição.
g) Em lesões avançadas da laringe pode haver perda da voz e obstrução
da passagem do ar, causada pelo edema ou pela cicatriz retrátil,
obrigando a realização de traqueostomia de urgência.
h) Lesões conjuntivais podem levar a distorções da fenda ocular e,
raramente, a perda do olho.
i) Miíase pode surgir como complicação de úlceras. 1,3, 9, 10,15, 16, 21
9 MÉTODOS DIAGNÓSTICOS
9.1 DIAGNÓSTICO CLÍNICO
É o ponto de partida de todo e qualquer procedimento diagnóstico. Faz-se
necessário conhecer toda a história natural da doença a fim de conduzir a contento
os procedimentos que devem ser implementados e decidir que outras técnicas
precisam ser efetuadas para o diagnóstico específico. 10
Deve-se levar em conta a máxima "não tratar sem o diagnóstico específico",
pois, os medicamentos utilizados para tratamento das Leishmanioses são tóxicos.
Na Leishmaniose cutânea há que se considerar as várias apresentações que
diferem da lesão ulcerada típica de bordas elevadas, em moldura e fundo granuloso.
10,15
Na Leishmaniose Mucosa seria desejável avaliação por otorrinolaringologista
experiente, feitura de rinoscopia e também a fibroscopia na tentativa de detectar
lesões satélites ou mais afastadas. 10
9.2 DIAGNÓSTICO EPIDEMIOLÓGICO
Tanto nas lesões cutâneas como nas lesões mucosas, devem ser observados
dados epidemiológicos de existência de casos de LTA na região, procedência de
área endêmica (viagem de lazer ou trabalho, residência anterior); referência de cães
ou eqüinos com lesões e residindo nas proximidades; inserção em áreas florestais.
Nas lesões cutâneas, os dados epidemiológicos referidos são recentes (em média 2
meses); no caso de lesão mucosa é essencial buscar também a história pregressa
de ulceração de pele de longa duração, além da existência de cicatriz e utilização de
medicamentos para leishmaniose. 10
9.3 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
9.3.1 Considerações iniciais
Na prática, os exames mais amplamente utilizados para diagnóstico da LTA,
são o teste intradérmico de Montenegro e a pesquisa direta do parasita nas lesões.
Quando se opta pelo exame direto, este deve ser realizado antes do início do
tratamento, pois os parasitas desaparecem das lesões logo após instituída a
terapêutica antimonial. 1, 3, 9,10,11,15
De uma forma geral, os métodos laboratoriais podem ser divididos em dois
grupos: 4,5,9,10,18,22
Métodos diretos ou de demonstração do parasita
a) Exame parasitológico direto (esfregaço de raspado da lesão
tegumentar, de material de punção de gânglios linfáticos ou de
sangue).
b) Cultura em meio de N.N.N. ou similar
c) Exame histopatológico (biópsia da lesão)
d) Inoculação em hamster (isolamento para classificação de leishmanias)
Métodos indiretos ou imunológicos
a) Reação intradérmica de Montenegro (IRM)
b) Reação imunofluorescência indireta (RIFI)
c) Reação de hemaglutinação passiva
d) Reação de fixação do complemento (RFC)
e) Reação de aglutinação direta
f) Reação de ELISA
g) Reação de formol-gel
h) Reação de Brahmacari
9.3.2 Exames diretos ou de demonstração do parasita
São aqueles que procuram evidenciar o próprio parasita em material obtido
através de biópsia, impressão por aposição, punção aspirativa, ou escarificação da
lesão. A partir deste material, pode ser feito o esfregaço, para pesquisa direta do
parasita, o exame histopatológico, cultura e inoculação em cobaia. O sucesso no
achado do parasita é inversamente proporcional ao tempo de evolução da lesão
cutânea, sendo de cerca de 100% no inicio, de até 75% após 6 meses e de 20%
após um ano de doença, mesmo tendo sido os exames realizados em ótimas
condições e com pessoal bem treinado para a análise dos resultados. Na LM é muito
pequena a sensibilidade devido a escassez de parasitas nas lesões, sendo raro
após o primeiro ano de evolução. Lesões muito contaminadas também contribuem
para diminuir a sensibilidade do método. 4,10
9.3.2.1 Exame parasitológico direto
9.3.2.1.1 TÉCNICA DE COLETA DO MATERIAL ATRAVÉS DE ESCARIFICAÇÃO
Material utilizado:
a) Lanceta ou estilete, devidamente esterilizados;
b) Gaze ou algodão;
c) Água destilada ou solução fisiológica;
d) Lâminas novas com ponta fosca;
e) Esparadrapo.
Procedimento:
a) Fazer a limpeza da lesão com água destilada ou solução fisiológica,
usando gaze ou algodão.
b) Se o paciente tiver mais de uma lesão, eleger duas lesões mais
recentes;
c) Enxugar com gaze;
d) Identificar as lâminas;
e) Com auxílio do estilete apropriado, escarificar três regiões diferentes
da borda de cada lesão, de preferência na área eritematosa e de
superfície íntegra.
f) Colher material rico em linfa, tendo o cuidado de comprimir a lesão
para não sangrar;
g) Fazer, em cada lâmina, três esfregaços com movimentos circulares ou
em um só sentido, cuidando em não retornar com o estilete sobre o
material já estendido para não retirá-lo de volta. O estilete deve ficar na
posição horizontal em relação à lâmina.
h) No caso de uma única lesão, fazer duas lâminas com três esfregaços e
se houver mais de uma lesão, fazer uma lâmina de cada lesão (duas),
com três esfregaços;
i) Proteger a lesão com gaze e esparadrapo. 10
9.3.2.1.2 TÉCNICA DE COLETA DE MATERIAL ATRAVÉS DE PUNÇÃO ASPIRATIVA
A punção aspirativa pode ser realizada utilizando-se uma seringa de 5 ml e
agulha de 25 x 8mm, com 3 ml de solução salina estéril. O material coletado por
punção poderá ser submetido a esfregaço, inoculado em meio de cultivo ou cobaia.
Em centros de referência, este procedimento pode ser realizado na investigação de
comprometimento ganglionar primário. 10
9.3.2.1.3 TÉCNICA DE PREPARO DA LÂMINA
São as seguintes:
a) Fixar a lâmina com álcool metílico ou álcool etílico 99% por 2 a 3
minutos;
b) Escorrer o excesso do álcool;
c) Cobrir cada uma das lâminas, com uma média de 2,5 ml de corante.
Para 2 lâminas, colocar em uma proveta 5 ml de água tamponada e
adicionar, com o auxílio de uma pipeta de 1 ml, 0,25 ml de solução
corante GIEMSA de estoque, após intensa agitação. Também pode ser
usada a coloração pelo Leishman.
d) Marcar em cronômetro, 60 minutos;
e) Lavar com água corrente (pequenos jatos);
f) Deixar secar 10
9.3.2.1.4 OBSERVAÇÃO MICROSCÓPICA
A leitura deve ser feita em objetiva de imersão. Devem ser procuradas
formas amastigotas, isoladas, ou intracelularmente, que se apresentam
arredondadas ou de forma ovóide, com citoplasma azul pálido, núcleo excêntrico
violeta, e cinetoplasto em forma de bastonete de cor idêntica à do núcleo. Pode-se
observar também, que as amastigotas podem apresentar-se no esfregaço sob
formas típicas e atípicas (sem núcleo, sem cinetoplasto, com núcleo mas sem
cinetoplasto visível, sem núcleo mas com cinetoplasto, arrebentamento de núcleo,
arrebentamento de membrana citoplasmática - forma em ponta de lança). Podem
também apresentar alterações em tamanho, estando maiores ou menores; o
cinetoplasto pode estar sob a forma de bastão, arredondadas ou puntiformes. No
microscópio, formas atípicas são achados freqüentes e em caso de dúvidas, deve-se
procurar a observação de formas típicas. De acordo com a espécie, o tamanho da
forma amastigota pode variar, sendo maior na Leishmania (L) amazonensis. 10
9.3.2.1.5 ERROS DE TÉCNICA
São os seguintes:
a) Deve-se evitar a coleta do material com muito sangue, porque o
sangue dilui o material diminuindo a concentração de leishmanias.
b) A presença de muitos leucócitos pode significar lesão contaminada,
geralmente por bactérias. Pode também indicar falha na escolha do
local de coleta, uma vez que os leucócitos vão se concentrar mais no
centro da lesão, lugar inadequado para a pesquisa de formas
amastigotas.
c) Corante forte: geralmente o aspecto das estruturas morfológicas fica
com um azul intenso, o que atrapalha uma boa visualização.
d) Corante fraco ou pouco tempo de coloração: as estruturas morfológicas
ficam avermelhadas, o que leva a uma difícil observação do
citoplasma, núcleo e cinetoplasto do parasito.
e) Uso de água destilada (não tamponada): a água destilada tem um pH
ácido e se usada para a coloração, as estruturas morfológicas tendem
a ficar muito acidófilas.
f) Corante instável: leva a formação de grumos, gerando dificuldade de
observação das estruturas à microscopia eletrônica. Quando em
demasia, não é possível observar qualquer estrutura contida no
esfregaço. 10
9.3.2.2 Exame histopatológico
A biópsia pode ser feita com “punch” de 4 mm de diâmetro, ou em cunha, com
o uso de bisturi. Nas lesões ulceradas deve-se preferir a borda íntegra da lesão que,
em geral, mostra aspecto tumefeito e hiperêmico. O local a ser biopsiado deve ser
limpo com água e sabão, a seguir, infiltra-se lidocaína ou xilocaína a 2%, para
anestesiar o local. O material retirado por biópsia deve ser fixado em formol a 10%,
em quantidade, aproximadamente, 20 vezes maior que o volume do fragmento. Os
cortes histológicos são corados pela hematoxilina-eosina ou pelo método de
Giemsa. Os problemas de sensibilidade se assemelham aos do exame direto. Na
LM a sensibilidade estaria em torno de 28 a 30% se a pesquisa é feita por um
patologista experimentado. Na Leishmaniose Visceral, na forma plenamente
manifesta da doença a sensibilidade do exame é de 100%, todavia nas formas
oligossintomáticas tal não se verifica. 5,10,18,22
Diversos autores já tentaram classificar os achados histopatológicos da
leishmaniose tegumentar. De fato, os achados podem variar em biópsias obtidas
simultaneamente, em diferentes pontos da mesma lesão. Qualquer que seja o
quadro histológico observado, somente o encontro do parasita confirma a doença,
caso contrário, as alterações histopatológicas podem ser consideradas, no máximo,
sugestivas do diagnóstico. 21
O exame histopatológico não apresenta alta sensibilidade segundo a
experiência brasileira sendo, entretanto, importante para o diagnóstico diferencial
com outras patologias. Os parasitas, quando presentes, são encontrados em
vacúolos intracitoplasmáticos dos macrófagos ou nos espaços intercelulares,
geralmente isolados observando-se que o sítio principal de reação é a derme. 10
Em relação à pesquisa de parasitas em cortes histológicos, a análise
comparativa das alterações histopatológicas de quatro grupos geograficamente
distintos de leishmaniose cutânea, em um total de 147 pacientes, evidenciou os
seguintes resultados. No grupo brasileiro, onde a pesquisa do parasitas nos cortes
histológicos foi quase sempre negativa, a agressão máxima ocorreu no tecido
conjuntivo. No grupo da América Central, onde as formas amastigotas foram
detectadas em pequeno número de casos, o dano ao tecido conjuntivo foi moderado
e aparentemente associado à lise dos macrófagos parasitados e liberação de
parasita para o meio extracelular. Em dois grupos do Velho Mundo, ambos com
encontro de numerosos parasitas, a necrose dos macrófagos não ocorreu de forma
isolada, mas sim como uma massa localizada, não havendo dispersão extracelular
da Leishmania. O dano tissular, com raras exceções, foi mínimo. Em extenso e
clássico estudo de LTA no Brasil, foram analisadas 378 biópsias de pacientes
infectados com L. braziliensis que, através das alterações dérmicas ou do córion da
mucosa, permitiram identificar a existência de cinco padrões histopatológicos:
1-reação exsudativa celular;
2-reação exsudativa e necrótica;
3-reação exsudativa e necrótica-granulomatosa;
4-reação exsudativa e granulomatosa;
5-reação exsudativa e tuberculóide.
Os parasitas, embora escassos, foram encontrados em 63,7% dos casos de
forma cutânea e em 37,5% dos casos de forma mucosa. Através desse estudo, foi
possível afirmar que o padrão de reação exsudativa celular constitui o quadro inicial
e final da lesão, com os demais padrões aparecendo interpostos durante a evolução
da doença. 8, 9
9.3.2.3 Microscopia eletrônica
Tem aplicação, especialmente em casos não usuais pauci-paratistários, pois
pode demonstrar as formas amastigotas de leishmanias com seus aspectos
ultraestruturais característicos e sua relação com as células do hospedeiro. 4
9.3.2.4 Imuno-histoquímica
É uma das técnicas que muito auxilia no diagnóstico, pois tem alta
especificidade e sensibilidade de cerca 60 a 70%. Além de detectar material
antigênico do protozoário no local da lesão, permite a detecção das alterações
anatomopatológicas que estão ocorrendo e correlação com o quadro clínico,
ensejando uma avaliação precisa da resposta do hospedeiro. Além do mais é de
utilidade para diagnóstico etiológico de lesões não usuais com escassez de
parasitas. As técnicas de recuperação antigênicas tendem a aumentar a
sensibilidade e intensidade das reações. Deseja-se que sejam selecionados
monoclonais que permitam a diferenciação de espécies e aumento da sensibilidade
da reação nos casos de Leishmaniose Mucosa. 4
9.3.2.5 Cultivo
É um método de confirmação etiológica e permite a definição da espécie da
Leishmania envolvida. O parasita cresce relativamente bem em meios de cultivo,
como o NNN e o LIT entre 24° a 26° C. Após o quinto dia, já podem ser encontradas
formas promastigotas do parasita, devendo-se manter a cultura até um mês. Para
manter o parasita por longo tempo, o meio de escolha é NNN, enriquecido com uma
fase líquida de LIT-BHI. O material pode ser obtido por punção-aspirativa ou por
biópsia. O material obtido através de punção-aspirativa pode ser inoculado
diretamente no meio de cultivo, enquanto que o obtido por biópsia deve ser colocado
em solução salina com antibióticos (5.000.000UI de penicilina e 1g de estreptomicina
ou garamicina 2g, por ml de solução salina) durante 24 horas, à temperatura de 4°
C. Após este procedimento, coloca-se o material no meio de cultivo. A sensibilidade
é baixa especialmente nos casos de LM. A realização da cultura em meio de Feeder
layer LLC-MK2 como é realizada no Laboratório de Protozoologia do Instituto de
Medicina Tropical da FMUSP, eventualmente poderia aumentar a sensibilidade. 4,10
9.3.2.6 Inoculação em animais de laboratório
O animal de escolha é o hamster (Mesocricetus auratus) e os locais de
preferência são as extremidades, principalmente as patas posteriores. O inóculo
deve ser obtido a partir de uma suspensão homogeneizada do material de biópsia
em solução salina estéril. As lesões no hamster desenvolvem-se tardiamente, (a
partir de um mês) sendo este método reservado para pesquisas. 4
9.3.3 Exames Imunológicos
9.3.3.1 Intradermorreação de Montenegro (IRM)
A intradermorreação idealizada por Montenegro em 1926 é o método mais
utilizado no diagnóstico de Leishmaniose e traduz a resposta de hipersensibilidade
celular retardada. Consiste na injeção intradérmica de 0,1 ml do antígeno preparado
com promastigotas de cultura, padronizado em 40 ug N/ml de modo a formar uma
pequena elevação ou pápula, a mais ou menos 2 - 3 cm abaixo da dobra do cotovelo
e serve para avaliar o grau de sensibilização do hospedeiro contra o parasita.
Considera-se positiva a reação em que houver, no prazo de 48 a 72 horas, o
aparecimento de uma enduração, perceptível à palpação, com diâmetro igual ou
superior a 5 mm. A positividade indica que o indivíduo já foi sensibilizado, mas não
necessariamente que seja portador da doença. Assim é que, em áreas endêmicas,
podem ser encontradas até 25% ou mais das pessoas sadias, com
intradermorreação positiva, apresentando ou não cicatrizes antigas de
Leishmaniose. Esta é, sem dúvida, uma importante causa de erro na interpretação
do teste, pois em qualquer desses indivíduos, a presença de lesão suspeita mas de
origem não leishmaniótica pode levar a um falso diagnóstico. Por outro lado,
pessoas portadoras de Leishmaniose, às vezes, não reagem ao teste de
Montenegro, especialmente na fase inicial da doença ou nos quadros disseminados.
É comum, no entanto, observar-se a viragem do teste durante o tratamento.
Reações mais intensas, que podem inclusive ulcerar, são observadas em pacientes
com doença de longa evolução, principalmente nas mucosas. Em indivíduos
doentes, a positividade do teste varia de 85% a 97%, segundo diferentes autores,
No entanto, quando se trata de infecção pela L. amazonensis, este índice cai para
51%. As pessoas tratadas apresentam reações positivas durante muitos anos ou
tornam-se negativas com o passar do tempo. 4,9,10
9.3.3.2 Imunofluorescência indireta (IFI) e teste imunoenzimático (ELISA)
Expressam os níveis de anticorpos circulantes e são úteis, principalmente nos
casos com lesões extensas, múltiplas e nas lesões mucosas. São utilizados
geralmente em centros de referência. Não possibilita a diferenciação entre doença
ativa e um contato prévio com o agente e não discrimina a doença clínica de
infecção sub-clínica, não devendo ser utilizada para o controle de cura pós-
tratamento. 4
Nas lesões ulceradas por L. (V.) braziliensis a sensibilidade da IFI está em
torno de 70%; na L. (V.) guyanensis a sensibilidade é menor. A positividade destes
exames está associada ao tempo de evolução da doença, sendo mais freqüente em
presença de lesão mucosa. Geralmente considera-se positiva a reação a partir da
diluição 1:40. Em pacientes com a forma cutânea observa-se anticorpos da classe
IgM, principalmente nos casos com evolução inferior a 4 meses. Títulos elevados de
IgG são encontrados em pacientes com mais de uma lesão. A IFI apresenta reação
cruzada com Leishmania chagasi e com T. cruzi, entre outros, ressaltando-se que a
Doença de Chagas freqüentemente compartilha a mesma área endêmica. Após o
tratamento e cura em ambas as formas de doença, os títulos podem cair ou
desaparecer dentro de alguns meses. O ELISA apresenta sensibilidade entre 67 a
96%. Na LC é negativa no início da infecção até 3 meses de evolução e, após,
atinge positividade de 95%. Na forma mucosa é de 89%. Empregando antígeno de
200 kDa ELISA, Kaul et al relatam que a técnica tem valor prognóstico e é útil para
diferenciar a LV ativa da Leishmaniose dérmica pós Kalazar.4
9.3.3.3 Immuno blot
Usando essa técnica Santos-Gomes et al evidenciaram o comprometimento
da resposta humoral em pacientes HIV+ em contraposição aos pacientes
imunocompetentes cuja sensibilidade e especificidade foi de 100%.4
10 DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
As formas cutâneas devem ser diferenciadas das úlceras traumáticas, úlceras
de estase, úlcera tropical, úlceras de membros inferiores por anemia falciforme,
piodermites, paracoccidioidomicose, neoplasias cutâneas, sífilis e tuberculose
cutânea. A hanseníase virchowiana deverá ser excluída, principalmente no
diagnóstico diferencial da leishmaniose cutânea difusa. Nas lesões mucosas, o
diagnóstico diferencial deve ser feito com a paracoccidioidomicose, hanseníase
virchowiana, rinoscleroma, bouba, sífilis terciária, granuloma médio facial e
neoplasias 36. Nas formas vegetantes, distingue-se a variedade verrucosa, muito
freqüente, que simula a esporotricose verrucosa, a cromomicose, a
paracoccidioidomicose, a piodermite vegetante e a tuberculose verrucosa 9.
11 TRATAMENTO
11.1 ANTIMONIATO N-METIL GLUCAMINA
A droga de primeira escolha é o antimonial pentavalente. Há dois tipos de
antimoniais pentavalentes que podem ser utilizados, o Antimoniato N-metil
glucamina e o Stibogluconato de sódio, sendo que este último não é comercializado
no Brasil. Este antimonial é indicado para o tratamento de todas as formas de
leishmaniose tegumentar, embora as formas mucosas exijam maior cuidado,
podendo apresentar respostas mais lentas e maior possibilidade de recidivas. 10, 11, 15
11.1.2 Apresentações comerciais
O Antimoniato N-metil glucamina apresenta-se comercialmente em frascos de
5ml que contém 1,5g do antimoniato bruto, correspondente a 405mg de Sb+5.
Portanto, uma ampola com 5ml tem 405mg de Sb+5, e cada ml contém 81mg de
Sb+5. 9,10,11, 15
11.1.3 Doses recomendadas
São as seguintes:
a) Lesões cutâneas: nas formas cutânea localizada e disseminada, a
dose recomendada varia entre 10 a 20mg de Sb+5/Kg/dia. Sugere-se
15mg de Sb+5/Kg/dia, tanto para o adulto quanto para crianças,
durante 20 dias seguidos. Nunca deve ser utilizada dose superior a 3
ampolas/dia ou 15ml/dia para o adulto. Se não houver cicatrização
completa no período de três meses (12 semanas) após o término do
tratamento, ou se neste mesmo período houver reativação da lesão, o
esquema deverá ser repetido, prolongando-se, desta vez, a duração da
série para 30 dias. Em caso de falha terapêutica, utilizar uma das
drogas de segunda escolha. 10, 11,15
b) Forma difusa: a dose é de 20mg/Sb+5/Kg/dia, durante 20 dias
seguidos. Na fase inicial pode responder ao antimonial, porém são
freqüentes as múltiplas recidivas, sendo necessário encaminhar o
paciente para serviços especializados. 10, 11,15
c) Lesões mucosas: em todas as formas de acometimento mucoso, a
dose recomendada é de 20mg/Sb+5/Kg/dia, durante 30 dias seguidos,
de preferência em ambiente hospitalar. Se não houver cicatrização
completa no período de três meses (12 semanas) após o término do
tratamento, ou se neste mesmo período houver reativação da lesão o
esquema deverá ser repetido apenas uma vez. Em caso de não
resposta, utilizar uma das drogas de segunda escolha. 10, 11,15
d) No tratamento de crianças, emprega-se o mesmo esquema terapêutico
utilizado para o tratamento de pacientes adultos com a recomendação
da dosagem de 20mg/SbV/Kg/dia devido à melhor tolerância da
criança aos antimoniais. 10, 11,15
11.1.4 Formas de administração
As aplicações devem ser feitas por via parenteral, intramuscular ou
endovenosa, com repouso após a aplicação, e deve ser decidida conforme a
apresentação clínica e as condições operacionais dos serviços. A via intramuscular
apresenta o inconveniente da dor local. Sugere-se, então, alternância dos locais de
aplicação, preferindo-se a região glútea. Por via endovenosa, não há necessidade
de diluição e a aplicação, com agulha fina (calibre 25x8) ou “scalp”, deve ser lenta
(duração de 5 minutos). Esta via permite a aplicação de doses mais adequadas e
não tem o inconveniente da dor local. 10, 11,15
11.1.5 Reações adversas
Podem ocorrer um ou mais efeitos colaterais, na seguinte ordem de
freqüência: artralgia, mialgia, inapetência, náuseas, vômitos, plenitude gástrica,
epigastralgia, pirose, dor abdominal, prurido, febre, fraqueza, cefaléia, tontura,
palpitação, insônia, nervosismo, choque pirogênico, edema e insuficiência renal
aguda (I.R.A.). Essas queixas são, geralmente, discretas ou moderadas, porém, na
dose de 20mg/Sb+5/Kg/dia, o antimonial pode atingir o limiar de toxicidade, podendo
levar a alterações cardíacas ou renais que obriguem a suspensão do tratamento.
Por isso deve-se proceder ao acompanhamento eletrocardiográfico prévio e semanal
assim como avaliação da função renal, especialmente em pacientes acima de 50
anos. Algumas vezes, no início do tratamento, há uma exacerbação do quadro
clínico com o aumento do infiltrado, eritema das lesões, aumento da secreção nasal
e faríngea. Presume-se que isto decorra de uma resposta aos antígenos liberados
com a morte do parasita (reação do tipo Jarich-Herxheimer). Este quadro pode
ocorrer com qualquer tratamento específico. 10, 11,15
Em casos de lesões de laringe e faringe, podem ocorrer edema e insuficiência
respiratória aguda. Por isso, é aconselhável que a medicação seja administrada por
equipe especializada, em paciente hospitalizado, havendo recursos disponíveis para
a realização de uma possível traqueostomia de urgência. Nos casos de
hipersensibilidade, podem ser usados corticóides por via sistêmica. 10, 11,15
As seguintes reações adversas graves ou potencialmente graves, devem ser
notificadas às autoridades sanitárias:
a) Arritmias cardíacas e/ou outras manifestações de cardiotoxicidade
b) Insuficiência renal aguda ou elevação dos níveis séricos de uréia e
creatinina e/ou outras manifestações de nefrotoxicidade
c) Icterícia e/ou elevação de enzimas hepáticas e/ou outras manifestações
de hepatotoxicidade
d) Pancreatite aguda e/ou hiperamilasemia
e) Outras não citadas acima e que não tenham sido descritas anteriormente,
não havendo nenhum impedimento de que se notifiquem casos que não
se encaixem na classificação acima, apenas não sendo imperativo que
tais notificações sejam feitas. Na duvida, notifique! 10, 11,15
11.1.6 Contra-indicações
Não deve ser administrada em gestantes, cujo tratamento consiste em
cuidados locais, observação clínica e sorológica se possível. Nas formas graves,
cutâneas ou mucosas, discutir a possibilidade de tratamento a partir do sexto mês,
com doses de antimônio mais baixas e controle laboratorial. Nos casos em que
exista associação com outras doenças, tais como tuberculose, malária,
esquistossomose, deve ser efetuado o tratamento destas patologias primeiramente.
Há restrições para o tratamento de pacientes com idade acima dos 50 anos,
portadores de cardiopatias, nefropatias, hepatopatias e doença de Chagas. Quando
for necessária a administração nos pacientes portadores de uma dessas doenças,
deverá ser feita rigorosa avaliação clínica, antes do tratamento e reavaliações
clínicas periódicas, com acompanhamento eletrocardiográfico, duas vezes por
semana, e exame bioquímico do sangue para avaliação das funções renal (dosagem
de uréia e creatinina) e hepática (dosagem das transaminases, bilirrubinas e
fosfatase alcalina) e leucograma. Todos esses exames deverão ser realizados
semanalmente, para orientação da conduta quanto à redução da dose ou utilização
de outra opção terapêutica. 10, 11,15
11.1.7 Recomendações
É recomendável a abstinência de bebidas alcoólicas durante o período de
tratamento, devido às alterações hepáticas. Também é recomendável o repouso
físico durante o tratamento. As funções renal, hepática e cardíaca deverão ser
avaliadas antes do início do tratamento e acompanhadas semanalmente,
principalmente nos pacientes com mais de 50 anos. 10, 11,15
11.2 ANFOTERICINA B (FUNGIZON)
É a droga de segunda escolha, empregada quando não se obtém resposta ao
tratamento com antimonial pentavalente ou na impossibilidade de seu uso. É a mais
eficaz nas manifestações mucosas da leishmaniose, sendo as recidivas menos
freqüentes. 10, 11,15
11.2.1 Doses Recomendadas
São as seguintes:
a) Lesões cutâneas: iniciar com 0,5mg/kg/dia, IV, aumentando-se 1mg/kg em
dias alternados (máximo de 50mg/dia), até atingir dose total de 1 a 1,5g.
b) Forma mucosa: conforme esquema para forma cutânea, até completar, se
possível, 2,5 a 3 g de dose total. Se necessário, esta dose total poderá ser
elevada, desde que o paciente esteja sob vigilância clínica rigorosa,
acompanhada das provas laboratoriais (uréia, creatinina e potássio) que
permitam avaliar as funções renal e cardíaca (ECG). Em idosos, esta
reavaliação deve ser feita 2 vezes por semana. 10, 11,15
11.2.2 Forma de administração
Deve ser administrada por via intravenosa, gota a gota, lentamente (4 horas
de infusão), utilizando-se equipo em “Y”, onde a Anfotericina é diluída em 250ml de
soro glicosado a 5%, alternando sua administração com 250ml de soro glicosado a
5% contendo 50 a 100mg de hidrocortisona, para a prevenção de efeitos colaterais.
Aplica-se em dias alternados. 10, 11,15
11.2.3 Reações adversas
São de ocorrência muito freqüente: febre, anorexia, náuseas, vômitos e
flebite, que podem ser atenuados ou evitados usando-se antipiréticos, antieméticos,
ou 50 a 100mg de hidrocortisona, acrescentados ao soro. A presença dos sintomas
descritos não contra-indica a administração do medicamento. Outros efeitos
colaterais importantes que geralmente surgem no decorrer do tratamento são:
hipopotassemia, insuficiência renal, anemia, leucopenia, alterações cardíacas. 10, 11,15
11.2.4 Contra-indicações
É contra-indicada a administração da anfotericina B em cardiopatas,
nefropatas e hepatopatas. 10, 11,15
11.2.5 Recomendações
É importante esclarecer que a medicação deve ser feita sob vigilância, em
serviços especializados, com o paciente hospitalizado. Devem ser feitas, ao iniciar o
tratamento, avaliação clínica, eletrocardiográfica e laboratorial, para verificação da
função renal (uréia, creatinina, potássio) e hepática (dosagem de bilirrubinas,
transaminases e fosfatase alcalina) e hemograma, seguindo-se reavaliações
semanais durante o tratamento, devendo-se fazer a reposição do potássio por via
oral quando necessário. 10, 11,15
11.3 ISOTIONATO DE PENTAMIDINA
Tem-se obtido bons resultados, com baixas doses, na LTA causada pela L. V.
guyanensis. 10
11.3.1 Doses recomendadas
Lesões cutâneas ou mucosas: 4mg/kg/dia, IM profunda, a cada 2 dias, até
completar no máximo 2g de dose total. 10,11,15
11.3.2 Apresentação e administração
A droga pode ser encontrada sob a forma de dois sais: isotionato de
pentamidina e mesilato de pentamidina. No Brasil é comercializado apenas o
isotionato de pentamidina que se apresenta em frasco-ampola contendo 300mg do
sal. Um frasco deve ser diluído em 3ml de água destilada para uso clínico em
aplicações intramusculares profundas.
Devido ao medicamento ter ação no metabolismo da glicose, pode haver
hipoglicemia seguida de hiperglicemia, quando do seu uso. O paciente deve ser
orientado a alimentar-se anteriormente e permanecer em repouso quinze minutos
antes e após as injeções. 10, 11,15
11.3.3 Reações adversas
As reações adversas mais freqüentes são: dor, induração e abscessos
estéreis no local da aplicação, além de náuseas, vômitos, tontura, adinamia,
mialgias, cefaléia, hipotensão, lipotímias, síncope, hipoglicemia e hiperglicemia. O
diabetes mellitus pode se manifestar a partir da administração da dose total de 1g. O
efeito diabetogênico pode ser cumulativo e dose dependente. 10, 11,15
11.3.4 Contra-indicações
Não deve ser usado por gestantes, portadores de diabetes, insuficiência
renal, insuficiência hepática, doenças cardíacas e em crianças com peso inferior a
8kg. 10,11,15
11.3.5 Recomendações
O paciente deve ser avaliado clinica e laboratorialmente com determinação da
função renal (dosagem de uréia e creatinina), hepática (dosagem das
transaminases, bilirrubinas e fosfatase alcalina), cardíaca (ECG) e glicemia, antes,
durante e no final do tratamento.
Destaca-se a necessidade de realizar exame de glicose semanalmente,
sendo que, após a administração de 1g da medicação, o paciente deve ser
monitorado mensalmente durante um período de seis meses, com rigor. 10, 11,15
11.4 CRITÉRIOS DE CURA
O critério de cura é clínico e recomenda-se que seja feito o acompanhamento
mensal do paciente, por um período de 12 meses após o término do tratamento. O
paciente deve retornar mensalmente à consulta, durante três meses consecutivos
após o término do esquema terapêutico, para ser avaliada a cura clínica. Uma vez
curado, o mesmo deverá ser acompanhado de 2 em 2 meses até completar 12
meses após o tratamento. 10, 11,15
11.4.1 Forma cutânea
Definido pelo aspecto clínico das lesões: reepitelização das lesões ulceradas
ou não, regressão total da infiltração e eritema, até 3 meses após a conclusão do
esquema terapêutico. 10, 11,15
11.4.2 Forma mucosa
É também clínico, definido pela regressão de todos os sinais e comprovado
pelo exame otorrinolaringológico, até 6 meses após a conclusão do esquema
terapêutico. Na ausência do especialista, o clínico deve ser treinado para realizar
pelo menos rinoscopia anterior. Nos locais onde não há clínico, o paciente deve ser
encaminhado para o serviço de referência, para a avaliação de cura. 10, 11,15
11.5 SITUAÇÕES QUE PODEM SER OBSERVADAS
11.5.1 Tratamento regular da forma cutânea
Definido como aquele caso que utilizou 10 a 20mg Sb+5/Kg/dia entre 20 a 30
dias, não ocorrendo intervalo superior a 72 hs entre as doses. 10, 11,15
11.5.2 Tratamento regular da forma mucosa
Caso que utilizou 20mg Sb+5/Kg/dia entre 30 a 40 dias, não ocorrendo
intervalo superior a 72 horas entre as doses. 10, 11,15
11.5.3 Falha terapêutica
Caso que, mesmo tendo realizado dois esquemas terapêuticos regulares, não
apresentou remissão clínica. 10, 11,15
11.5.4 Recidiva
Reaparecimento de lesão no mesmo local do processo anterior, a menos de
um ano, após a cura clínica deste. 10, 11,15
11.5.5 Tratamento irregular da forma cutânea e mucosa
Caso que ultrapassou o tempo previsto para um tratamento regular ou que
tenha ocorrido um intervalo superior a 72 horas entre as doses.
Caso o paciente tenha utilizado menos de 50% das doses prescritas, iniciar
de imediato o esquema terapêutico completo, a não ser que se apresente
clinicamente curado. 10, 11,15
11.5.6 Abandono
Caso que não tendo recebido alta, não compareceu até 30 dias após o
terceiro agendamento para avaliação da cura. O terceiro agendamento se refere ao
3º mês após o término do esquema terapêutico, período destinado ao
acompanhamento do caso e à avaliação de cura. 10, 11,15
11.6 CONDUTA APÓS TRATAMENTO REGULAR
O paciente deverá retornar mensalmente à consulta, durante três meses após
o término do esquema terapêutico, para ser avaliado. Conforme os resultados
observados, poderá receber alta no transcorrer deste período ou ser iniciado o re-
tratamento, durante ou ao final dos 3 meses de observação. 10, 11,15
11.7 CONDUTA APÓS TRATAMENTO IRREGULAR
Quando o paciente utilizou mais de 50% das doses preconizadas, observam-
se as seguintes condutas:
a) Cura clínica: alta;
b) Melhora clínica: observação por até 3 meses, quando será reavaliado
para alta, ou ao final deste período, dar início ao esquema terapêutico
completo;
c) Sem melhora clínica: reiniciar de imediato o esquema terapêutico; 10,
11,15
11.8 CONDUTA APÓS ABANDONO DE TRATAMENTO
Início do esquema terapêutico com antimonial pentavalente, a não ser que se
apresente clinicamente curado. 10, 11,15
12 PROFILAXIA
Conhecer a população afetada pela LTA em nosso País é de fundamental
importância para o estabelecimento de medidas eficazes de controle da doença. As
diferenças na morbidade, resposta ao tratamento e prognóstico, relacionadas em
parte à espécie de Leishmania, evidenciam a importância da caracterização do
parasita prevalente em determinada região. No seu conjunto, estes estudos são
muito importantes para se compreender a eco-epidemiologia da doença,
diagnosticá-la, tratá-la, determinar os mecanismos envolvidos e assim definir
estratégias e medidas eficientes de profilaxia e controle. A imunoterapia e a
imunoprofilaxia, embora com resultados ainda preliminares, representam
possibilidade futura promissora. 9
13 CONCLUSÃO
A leishmaniose Tegumentar Americana representa ainda um grande problema
de saúde pública, e com incidência em elevação, apesar de todos os esforços e
medidas de controle adotados pelos órgãos do governo. Diante de tal quadro, o
profissional de saúde deve estar sempre atento ao diagnóstico, minimizando assim o
tempo de morbidade e o surgimento de complicações.