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¨...agora é pra matar...é o mata...num bastava o Xingó, meu abençoado...mais uma barragem nessa margem de rio...pois é o mata...e a- inda a tal da transposição...é prá acabá de secar...prá gente beber água de cacimba...mas, com fé em Deus, o homem não faz a obra não... só tem mais 2 anos, e isso é coisa para 10, 12, 15 anos... e quem entrar num vai bolir nisso, não...mas, cê sabe...os poderoso são os homem de gravata...¨ Tonho do Bardo, canoeiro Fotos: via Paulo Paes Andrade Abelhas nativas: alternativa de renda e contribuindo para a preservação. pag.3 A canoa Luzitânia, finalmente, reconhecida como patrimônio nacional pag.8 Primeiro cartaz da coleção “Embarcações Tradicionais do Baixo São Francisco” pags.4/5 E QUEM, AFINAL, PILOTA OS DESTINOS DESSE RIO? pag.7 Informativo da Sociedade Canoa de Tolda e do Baixo São Francisco DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PARA ESCOLAS PÚBLICAS E ASSOCIAÇÕES Mar/Abr de 2009 Ano 4/no. 1 - R$1,00

Mar/Abr 2009

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Informativo bimestral da Canoa de Tolda

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¨...agora é pra matar...é o mata...num bastava o Xingó, meu abençoado...mais uma barragem nessa margem de rio...pois é o mata...e a- inda a tal da transposição...é prá acabá de secar...prá gente beber água de cacimba...mas, com fé em Deus, o homem não faz a obra não... só tem mais 2 anos, e isso é coisa para 10, 12, 15 anos... e quem entrar num vai bolir nisso, não...mas, cê sabe...os poderoso são os homem de gravata...¨

Tonho do Bardo, canoeiro

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Abelhas nativas: alternativa de renda e contribuindo para a preservação. pag.3

A canoa Luzitânia, finalmente, reconhecida como patrimônio nacional pag.8

Primeiro cartaz da coleção “Embarcações Tradicionais do Baixo São Francisco” pags.4/5

E QUEM, AFINAL, PILOTA OS DESTINOS DESSE RIO? pag.7

Informativo da Sociedade Canoa de Tolda e do Baixo São Francisco

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PARA

ESCOLAS PÚBLICAS E ASSOCIAÇÕES

Mar/Abr de 2009

Ano 4/no. 1 - R$1,00

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UM PROJETO

SOCIEDADE SÓCIO-AMBIENTAL DO BAIXO SÃO FRANCISCO

CANOA DE TOLDA

A questão da APA - Área de Proteção Ambienta da Foz do São Francisco continua relegada ao fundoda ga- veta pelo governo de Sergipe. Cresce a pressão especu- lativa na região de Brejo Grande e Pacatuba, sem qual-quer reação preventiva por parte do poder público. Da mesma forma, o MMA - Ministério do Meio Ambiente não se pronuncia: o projeto da APA federal (elaborado pelo IBAMA) está arquivado em Brasília. Enquanto isso, temos uma área de preservação permanente (mangue-zais, remanescentes de mata atlântica, dunas) entregue a diversas atividades altamente impactantes: exploração/transporte de petróleo e criação de camarões em escala.

Em breve não restará grande coisa. Em Nossa Sra.de Lourdes, SE, as capoeiras de mata nativa, onde temosos derradeiros exemplares de pau d`arco do agreste do Baixo São Francisco (em SE) estão cada vez menores, mais isoladas. Vemos hoje grandes áreas que ainda são ou já foram pastagens indevidas ou mal aproveitadas, onde a erosão vem completando a ação do homem edo gado. E os pés de pau floridos, tão bonitos, distan-tes, aguardando a hora final da pancada do machado.

No início do ano passado, o Estado de Sergipe alardeou mais uma solução para o aperreio sócio-econômico do Baixo São Fran- cisco: o incentivo à criação de búfalos - isso mesmo, o búfalo - na região da foz. É interessante lembrar, que mesmo completamente irregular, há uma APA Estadual, que deveria proteger a zona de preservação permanente. Ainda: o búfalo é uma espécie animal exótica - não é nativa -, tem comportamento difícil, é altamente destrutivo, pisoteia o solo, devasta a mata. Podemos compará-lo a um trator vivo, que exige espaços enormes, inexistentes na foz. No Amapá há sérios problemas com esta atividade, com danos ambientais alarmantes. A EMBRAPA da-quele estado está preocupada. Do ponto de vista sócio-econômico, não são disponíveis argumentos co-erentes que justifiquem a sustentabilidade da bubalinocultura (criação de búfalos) na região.

Recentemente o governo de Alagoas anunciou o projeto de uma estrada margeando o São Francis-co, entre Penedo e Piranhas. É algo para ser discuti-do, e muito, antes de qualquer decisão definitiva,com todas as comunidades ribeirinhas. São sedes demunicípios e povoados que ficarão com o acesso li-vre, expostos a situações como em tantos outros lu-gares do Brasil: especulação imobiliária, povo do lo-cal indo para periferias, aumento da violência, insu-ficiência ainda maior de estruturas básicas (sanea-mento, saúde, tratamento de lixo, água potável), e a sobrecarga de uso dos recursos naturais. Se hoje os municípios do Baixo (em Sergipe e Alagoas) não for- necem adequadamente os serviços mínimos para a população local, imaginemos a situação com mais gente chegando de fora. Em Brejo Grande e mesmo Piaçabuçu, na foz, vemos hoje a influência negativa da ponte Aracaju/Barra dos Coqueiros, já prevista há muitos e muitos anos. Ganham as construtoras.

No porto da Marinha, em Brejo Grande, permanece o impasse provocado pelo início da construção de um cais destinado às operações de embarcações de turis- mo. Obra (de acordo com a placa do governo federal) a ser feita com verba do MTur - Ministério do Turismo. Valor: R$184. 848,04. Na placa não há prazo da obra, dados da licitação, empresa e engenheiro responsá- veis. Pois. Os trabalhos estão paralisados, após os con- flitos de uso do local terem surgido com o surgimento da construção. O espaço, pouco, tem usos diversos pe-la comunidade: porto de pesca, lavagem de roupas, manutenção de embarcações de trabalho, captação de água, lazer e banho das pessoas, lavagem (irregular) de veículos, animais, vísceras de animais para a feira, embarque/desembarque de pessoas e veículos nas embarcações e balsas de travessia para Alagoas, etc. A obra foi iniciada sem realização de audiênias públicas para a discussão do projeto com a comuni-dade. Esta, mais uma vez, fica sem a indispensável participação nas decisões de uso de dinheiro público em iniciativas que influenciam o viver de cada dia.

Prosa com o leitor

A foto da capa

Expediente

Apoio Cultural

Pronto. Cá estamos nós aqui da margem, de novocom o nosso informativo, mas agora de forma defini-tiva, impressa, para que possamos distribui-lo gra-tuitamente para escolas públicas e comunidades do beiço do rio. A nossa intenção é tratar de temas do interesse das pessoas aqui do Baixo, como Meio Ambiente, Ci-dadania, Cultura e Saúde Pública, entre os principais.Não podemos, por enquanto, falar de tudo, mas comcalma esperamos que o A Margem cresça e seja útil. Este projeto foi feito através do MinC - Ministério da Cultura, pela Lei Rouanet, de incentivo a iniciati-vas culturais. O que significa que outras associações, entidades, grupos culturais, tanto aqui do Baixo São Francisco como de outras brenhas do Brasil, podem e devem ir atrás de oportunidades semelhantes. É pensar bem no projeto, com princípio, meio e fim - óia a questão da contabilidade, coisa séria - e apre-sentar ao MinC, dentro dos formulários próprios. Quem sabe o Baixo São Francisco não produz uma aparição de bons projetos que valorizem esse lugar? Pois. Gostaríamos também, desde já, de deixar a-berto o espaço para que as pessoas interessadas pos-sam se manifestar. Escrevam, ora com artigos, suges-tões, críticas e idéias ora denúncias sobre problemas de nossa região. São participações que podem con-tribuir para a melhoria do A Margem. Desta forma estaremos todos, também, possibilitando mais uma forma de comunicação entre as pessoas aqui no Bai-xo São Francisco.

Não foi fácil, é vero, mas está saindo.

Esta bela foto, que a-parenta ser antiga, na verdade é de 2007, pelo colega da Canoa, Paulo Andrade. Foi a bordo da Luzitânia, em sua viagem de apresentação, duranteuma manobra difícil, que é a passagem dos panos, nas pedras, já acima do Entremontes. O piloto é o amigo S. Aurélio de Janjão, de Piranhas, hoje o res-ponsável pela canoa Piranhas, antiga Daniella, do finado Zé Pezão, adquirida pela Prefeitura Municipal de Piranhas. A foto dá a deixa para o artigo especial desta edi-ção. Seu Aurélio conhece o que pilota, e sabe para on-de vai e a melhor carreira. Mas, o que dizer dos pilotosdos destinos do rio São Francisco?

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Canoa de Tolda - Sociedade Socioambiental do Baixo São FranciscoCNPJ 02.597.836/0001-40Sede - R. Jackson Figueiredo, 09 - Mercado - 49995-000 Brejo Grande SETel/Fax (79) 3366 1246Alagoas - R. Mestre Francelino, 255 - Centro - 57210-000 Piaçabuçu ALTel (82) 3552 1570End. eletr.l [email protected] e [email protected] www.canoadetolda.org.br

COORDENAÇÃO PROJETO JORNAL A MARGEMCarlos Eduardo Ribeiro JuniorREDAÇÃO E REVISÃO: Carlos Eduardo RibeiroJunior, Paulo Paes de AndradeCONCEPÇÃO GRÁFICA: Canoa de ToldaCORRESPONDENTES: Danieire F. de Medeiros, An-tonio Felix NetoAPOIO DE SEDE: Daiane Fausto dos SantosIMPRESSÃO: Inforgraph, Gráfica e EditoraTIRAGEM: 3.000 exemplares

O informativo A Margem é uma iniciativa da Sociedade Canoa de Tolda. Cartas, sugestões, contribuições de interesse das questões do São Francisco são bem vindas - podendo ou não ter publicação integral. A reprodução de textos e imagens é permitida e incentivada, desde que sejam citados a fonte e o autor. Artigos com autoria não exprimem necessaria-mente a posição da editoria, da entidade ou do Projeto A Margem.

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FARÓIS

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O Prof. Fernando Zane-lla é docente da Unidade Acadêmica de Ciências Bi-ológicas do Centro de Sa-úde e Tecnologia Rural da UFCG, em Patos, PB. Dou-tor em Entomologia pela USP-Ribeirão Preto, coordena o Laboratório de Eco-logia e Biogeografia de Insetos da Caatinga, e tem trabalhado com sistemática, ecologia e biogeografia de abelhas, especialmente da Caatinga. O grupo depesquisa que participa inclui os Profs. Clemens Sch-lindwein (UFPE) e Celso Martins (UFPB) e colabora-dores, tem várias propostas de manejo, que podem ser obtidas pelo e-mail ([email protected]) ou escrevendo para Prof. Zanella, UACB/UFCG, CP 64, CEP 58700-970, Patos, PB.

Prof. Fernando Zanella

VEJA MAIS SOBRE ABELHAS NATIVAS NA INTERNET:

www.webbee.org.br/jandaira/ www.abelhaebonsai.com.br/abelhas/www.projetoabelhasnativas.org/www.rts.org.br/publicacoes/arquivos/cartilha_manejo.pdf

A entrevista completa em www.canoadetolda.org.br

rápido, se espalham facilmente. Mas as abelhas nati-vas sem ferrão são um caso especial, a conservação é mais difícil do que a de muitos mamíferos. Há pe-lo menos três razões para isso:a)Uma colônia tem muitas abelhas, mas só uma se re-produz, a rainha. b)Uma nova colônia deste grupo de abelhas só se for-ma a menos de 300 m de distância da colônia origi-nal, o que significa uma dispersão muita lenta. Zonas de desmatamento e falta de abrigos para as novas colônias podem criar um isolamento de áreas e u-ma vez exterminada uma determinada espécie numa área, ela não pode voltar vinda de uma área mais dis-tante. Por isso, a re-colonização pode ser muito difícil e algumas vezes impossível.c)Muitas espécies destas abelhas precisam de ocos de árvores para fazer seus ninhos, é preciso que exi-tam árvores velhas. Uma floresta recuperada com 30 ou 40 anos pode ainda ser inabitável paramuitas espécies!

Andar pelos sertões de Alagoas e Sergipe nos faz, a todo o instante, deparar com cenas como esta da foto de fundo. Brocar, arrancar os tocos, “limpar” oterreno, queimar... É o processo mais comum de sepreparar a terra. E no sentido, tantas e tantas per-guntas: como pode um cidadão tratar a terra de tal maneira? O que ele espera com isso? Onde estão os órgãos de fiscalização (município, estado, gover-no federal)? Até quanto isto se repetirá? Sobrará al-go para as gerações futuras? Permanece a prática secular da troca da vegeta-

ção nativa, que é vista como algo nocivo, que des-valoriza a terra. Para a grande maioria dos proprie-tários, terreno bom é terreno limpo, pelado. Como disse o Prof. Zanella, na entrevista acima,técnicas de uso sustentáveis da natureza ou não sãoempregadas ou não chegam a maior parte de nos-sos interiores. No caso particular do Baixo São Fran-cisco, é visível o avanço das áreas em processo de desertificação. Como o extrativismo vegetal (sobre-tudo madeira e carvão) é parte da economia de vá-rias comunidades mais pobres, a recuperação ambi-

ambiental é também um problema sócio-econômico, além de socioambiental. Trata-se de uma situação grave, pois ela atinge os fundos das margens do rio, a parte que não se vê, porém da maior im-portância, pois ali está a maioria dos afluentes (intermitentes) do Baixo São Francisco. Podemos julgar, pelas paisagens desoladoras,nos “fundos” do Baixo, que aqui também faltam as indispensáveis políticas públicas para um fu-turo de fato melhor, farto, para a nossa região.

CT Daria para evitar esta destruição?FZ Sim, há técnicas para isso, mas os meleiros não as conhecem ou não as praticam.

CT Por que esta técnica não alcança os meleiros?FZ Há iniciativas de extensão rural em várias partes do país, mas tímidas. As EMATER e órgãos equivalen-tes nos estados estão muito enfraquecidos e o repas- se desta e de outras tecnologias é pequeno.

CT Para o meleiro seria economicamente viável colher de forma sustentável?FZ O trabalho do meleiro, em geral, reforça a renda, sendo ocasional e cada vez mais raro, porque estas abelhas estão desaparecendo. Além disso, a baixa qualidade do mel e a impossibilidade de comprovar uma origem reduzem o preço do produto. O ideal se-ria criar as abelhas em caixas (formando o melipo-ário). Como são abelhas mansas, é possível criar per-to das casas, junto de gente, ao contrário do que a-contece com a africanizada, que é braba.

CT A região do baixo São Francisco tem potencial para desenvolver essa atividade?FZ Essas abelhas ocorrem de forma geral em todo o país, com diferentes espécies em cada região. Por e-xemplo, na mata, próximo à foz do São Francisco,de-vem existir várias espécies que não ocorrem na caa-tinga. Assim, para favorecer a sua conservação, é in-teressante que as pessoas busquem criar as que o-correm ou já ocorreram na região. Importante: para manter as abelhas e garantir a produção de mel deve-se ter plantas que forneçam néctar e pólen. Áreas com florestas nativas são em geral boas para as abe-lhas, e também plantas frutíferas e de jardim.

CT A atividade do meleiro ajuda no processo deredução das populações de abelhas nativas?FZ Não há ainda uma avaliação sobre isso. A destrui-ção das matas pode ser mais importante do que a a-ção dos meleiros. A preocupação das pessoas com a preservação de insetos é pequena. Elas muitas vezes não os conhecem e pensam que eles se multipllicam

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Fonte complementar do artigo: Revista Manuelzão/no. 43/ quadro pág. 06 - autor: Humberto Santos

Faz algum tempo, sobretudo no alto sertão alago-ano aqui do Baixo, a apicultura vem crescendo. Hoje, naquela região, há um bem sucedido Arranjo Produ-tivo Local de Apicultura (APL) organizado pelo SE-BRAE e estado. Porém a atividade na região é voltada apenas para a conhecida abelha “europa”, que não é nativa destas bandas. Pois. E as abelhas nativas, on-de ficam nesta história? Atrás de conhecimento, fomos bater na Paraíba, atrás do Prof. Fernando Zanella, da UFCG - Universi-dade Federal de Campina Grande, que nos deu infor- mações interessantes tanto para o pessoal da apicul-tura, quanto para todos que vêem a importância dapreservação de nosso patrimônio natural.

Canoa de Tolda Das abelhas que estão por aí nas caa-tingas e em outras áreas, o que é brasileiro e o que é in-troduzido?Fernando Zanella Na caatinga a espécie de abelha mais abundante é introduzida, a Apis mellifera, co-nhecida como europa, italiana, africana, que é a abe-lha que todo mundo tem como referência. Esta abe-lha deveria ser chamada africanizada, porque é uma mistura de sub-espécies de abelhas da Europa com uma sub-espécie africana, introduzida no Brasil há muitos anos. Foi acidentalmente liberada, e cruzou com as que já estavam aqui, gerando as atuais linha-gens de Apis. Na caatinga e nos campos abertos, 50% das abelhas podem ser da africanizada, mas numa mata fechada e úmida, como as da Amazônia, por e-xemplo, elas não se estabelecem.

CT E as nativas, quais são?FZ Há um grupo que todos conhecem, são as abe-lhas sem ferrão: arapuá, jandaíra, uruçu, mandassaia,jataí, mirim, etc. Elas vivem em colônias, produzemmel e cera e a maioria faz seus ninhos em troncos. São exploradas há tempos pela população.

CT Esta exploração é equilibrada, sustentável?FZ No Nordeste temos o meleiro, que acha a colô-nia na mata, colhe o mel, destruindo a colméia.

ABELHAS NATIVAS, PRESERVAÇÃO E RENDA entrevista com o prof. Fernando Zanella

ENQUANTO ISSO, NOS SERTÕES DO BAIXO SÃO FRANCISCO... A terra torrada em Nossa Sra. de Lourdes, SE, não é uma exceção, é a regra do trato do solo nas bandas de SE e AL

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“LUZITÂNIA”canoa de tolda de 200 sacos

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Silenciou a enxó de Mestre Nivaldo, mas sua arte ficaCom as mudanças de vida, também a arte naval tradicional perde seu valor e razão de existir

Pela boca da noite, a canoa ainda no estaleiro do Mato da Onça, lá no sertão, era a hora que pes-cadores que subiam para a Boca do Saco davam u-ma parada, fazer uma hora, escutar o Mestre. O homem raramente se alterava. Mesmo quan-do gente que sem ter o que fazer, vinha curiar o seu trabalho: “...Nivardo, se essa canoa fosse mi-nha...tá, tô que eu não abria ela mais uns dois par-mos...mas Nivardo, não assentava melhor se vocêviesse mais com essa embonação acolá naquela ca-verna...?” E Mestre Nivaldo, olhava, fazia cantar aenxó, ou o macête, e deixava o infeliz gastar a sa-liva. Mais tarde, já desafogado, sem ninguém porperto, dava as suas lições. Esculhambando, mas mangando do sujeito. Era bom ouvi-lo, não haviaquem não achasse graça. Em tantas de suas prosas, longas, que deixavamtodos muito atentos, contava: ...¨ onde tinha trabalho, seja de rio abaixo, seja de rio arriba, ajeitava o caixão com os ferro, e ia...num tinha mau tempo, domingo, feriado...só volta-va pra casa com o serviço terminado...ficava por a-li mesmo, no beiço do rio...fazia uma latada por ri-ba da canoa...tinha um fogo, botava um feijão, u-

peça que era

e inesquecível: além do conhe-cimento de seu ofício, Mestre Nivaldo, sujeito an-dejo, de rio de cima e de baixo, era grande conta- dor de histórias, com muito senso de humor. Pilhéria, pulha, era com ele, que animava as noites de conversa, de junto ao foguinho do estaleiro. Os cavacos de madeira eram juntados, no fi- nal do dia, iam para o fogo do café e alu- miavam ao de redor da canoa. O Mestre ali, enrolando o cigarro, entre um assunto e ou- tro, nós esperan- do a histó- ria.

recuperada, feita novamente, e insta-lada na embarcação. A convivência com este ho-mem foi coisa rara

ma charque...um café...assava um piau, pilombeta,uma xira gorda, uma criação que se arranjava...iase vivendo...pense como era bom. Trabalhei muito nos Escuriais, pra Tonho Carmelo, pai dos menino lá da balsa de Piaçabuçu, na Jordânia...também pra Tonho Caboco, da Oriente, em Traipu...o povo co-nhece ele por Tonho da Lancha, que foi vendida

para Antero, lá em Penedo...” Além de carpinteiro naval, Mes-tre Nivaldo também era escultortor de santos e bichos e o quedesse vontade, nas horas forade estaleiro. Só com seus ferros, oacabamento que dava na madeiraera dos melhores, chegava a luzir.E seguindo sua prosa:...”

e ferramentata era a enxó, martelo, goiva, formão, o serrote, e tinha o machado, prá des-drobrá a madeira...hoje carpinteiro quer tudo na máquina...naquele tempo era abrir furo pra cavi-lha de meia, de cinco oitavo, no pranchão de três, quatro polegada, caverna de braúna...tudo na mão, no trado...haja sebo pra fazer o furo...a tora do pau era aberta no serrotão...vupo, vupo...quero ver ho-je um carpinteiro encarar um serviço deste...inda

mais um cabra novo...aí é que não aguenta a peleja não...era lenha, viu...mais era arte que hoje já não se faz, de canoa rombeada...agora ,é tudo na táboa e pense num trabalho feio, tudo quadrado, torto...¨ Mestre Nivaldo tinha a fama de macio, demo-roso. Mas, como se diz, trabalho bom, durativo, com acabamento, tem o seu tempo certo de ser.

No final do ano passado foi-se o amigo Mestre Nivaldo, que foi um dos principais personagens da recuperação da canoa Luzitânia. O velho Nivaldo Lessa era da Ilha do Ferro, povoado acima de Pão de Açúcar, AL, tendo já feito serviços em embarca-ções ao longo de todo o Baixo São Francisco. Onde tinha obra, lá ia o homem: juntava os ferros no caixão, um saco com poucas coisas, uma chaleira, panela, prato de flandres, colher, faca, se enfiava em seu bote e viajava para seu destino. No caso da Luzitânia, não foi de outra forma. Otempo que a canoa passou no Mato da Onça, lá es-tava o mestre, vivendo a bordo, mas em terra. A-pós a inundação do local em 2005 - com abertura das comportas de Xingó, o que obrigou a mudança do estaleiro para Brejo Grande, lá veio Mestre Ni-valdo, para finalizar sua derradeira grande obra. Diferentemente do costume de guardar os segre-dos de sua arte, a carpintaria naval do Baixo São Francisco, o mestre dividiu sua sabedoria durante toda a obra da canoa - por coincidência, esta cano-a já pertencera ao tio de M. Nivaldo, o conhecido Luiz Martins, da Ilha do Ferro. Pois. O Mestre ia contando suas expe

riências, os detalhes de cada

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Foi lenha. E Mestre Nivaldo garantiu: eu acabo essa canoa. E aí está.

E não tem carga, quem vai querer fazero movimento em canoa? É perdido. Após as grandes barragens, com as mudanças no modo de vida da região, pouco a pouco, sem carga para transpor-tar, as grandes canoas foram sendo desativadas. Ao mesmo tempo, além da economia localem crise, havia a concorrên-cia do transporte rodoviário, pela abertura de novas roda-gens e pistas. Algumas canoas, em tentativa de sobrevida da parte de seus proprietários, foram levadas para o rio de cima, onde foram acabar seu tempo. Assim, gradativamen-te a canoa deixou de ser um objeto de necessidade, o que atingiu, também, as pessoas que viviam em torno da ativi-dade: canoeiros, proeiros, vergueiros, calafates, calungas e, claro, os mestres carpinteiros navais. Não podemos esque-cer, que para a construção naval (e para as caldeiras tanto dos vapores que faziam as linhas na margem como das lo-comotivas que ligavam Piranhas a Petrolandia), as madeiras boas (braúna, cedros, paus d´arco, etc.) foram eliminadasdas matas do Baixo São Francisco. Fora estacas para cercas,dormentes, e construção em geral.

A técnica da construção naval tradicional teve que se adap-tar às mudanças: as embarcações feitas com casco rombeado (onde há o uso de peças curvas, cavadas na enxó, chamadasna corrente, cavernas lavradas a partir de raízes de braúnas), foram substituídas por outras feitas com tábuas de madeira vinda de fora. Esta nova forma de construção é vista hoje com mais força na região da praia (de Penedo abaixo), onde as ma-tas foram as primeiras a desapacer. E, sem uso de canoas, sem madeira para construi-las, a ar-te dos mestres também foi-se indo. Não tinha mais serventia.Poucos foram os filhos destes artistas que seguiram o belo ofí-cio - mas sem futuro - de seus pais. Da geração de Mestre Nivaldo, que viveu a época de ouro do Baixo São Francisco, são poucos os que restam, como Pedro de Aristides (faz panos, em Penedo), Luis Carlos (carpinteiro, em Traipu), Avelardo (no Mato da Onça), Mestre Adail (na ilha do A-crim, na praia),M. Lula (ferreiro de forja e fogo, em Piaçabuçu), por exemplo, que ainda nos dão o testemunho desta grande arte que se vai. Fi-ca toda esta história apenasno sentido de quem viveu.

BIGORNAS - arte e tradição naval6 A MARGEM - Mar/Abr 2009

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dades de energia e as operadnoras das barragens (as geradoras) executam para atender ao órgão. E por fim a ANA que dá o tom da música, porque ela gerencia o uso variado das águas, que é mais amplo e mais complexo do que apenas abrir e fechar com-portas. E tem o IBAMA, que ameaça com multas, se algo compromete o meio ambiente. E se alguma co-isa sai errado? Vejam um exemplo concreto no qua-dro da primeira coluna. Sim, o ONS calcula o melhor uso das as águas para gerar energia, e como as ge-radoras devem se comportar. Mas estas podem, e devem, informar restrições de uso, ou seja, quando a água começa a ser um problema além da geração de energia. Em 2007 a CHESF não se manifestou a este respeito, pelo contrário: com a situação no li-mite propôs a redução da vazão para valores abaixo do mínimo permitido. O IBAMA e a própria ANA, a-ceitaram a proposta da CHESF. Porém, o ONS tinha a responsabilidade de prever, considerando La Niña, que as chuvas seriam poucas na sub-bacia do Médio São Francisco. Nem só de estatísticas vive o plane-jador: a realidade do clima tem que ser considerada. Foi erro grave, com graves consequências. O ONS espera que as geradoras indiquem os limites para este uso, mas não poderia ouvir outras fontes? Por lei, não. Mas onde fica o bom senso? É certo que a ANA só supervisiona, mas poderia ser mais atuante, de forma mais coerente defender os outros usuários e seu patrimônio coletivo: a água. O que se vê, con-tudo, é uma total dependência ao ONS. Por fim o I-BAMA deveria (é sua obrigação básica), mesmo por lei, restringir a farra da água mas, lamentavelmente dá-nos o pior exemplo: atropela uma regra, e assina embaixo. Como os outros órgãos seguindo fielmen-te a visão que o governo federal tem de nossa regi-ão. Um grande descaso e desconhecimento da reali-dade local.

Quem pilota os destinos desse rio?PAULO PAES DE ANDRADE - Prof. da UFPECARLOS EDUARDO RIBEIRO JR. - Sociedade Canoa de Tolda

ao contrário dos que estão mais perto do Baixo SãoFrancisco. As chuvas no alto da bacia começam per-to de novembro e vão até abril. Era quando o rio ti-nha suas cheias. Agora, a água fica presa lá em So-bradinho e quando muito, no final deste período, sea represa enche, as comportas são abertas e a água verte pelo vertedouro, dando uma cheia curta e al-gumas vezes imprevista. O rio que corre neste perí-odo de fartura de águas e naqueles de seca é fruto da vazão de água que passa nas turbinas para gerar energia elétrica. Se é necessária mais energia, acio-nam mais turbinas que deixam passar mais água. Se não precisam, fecham mesmo, e o rio seca. Há um limite desta quantidade de água mínima, imposto pelo IBAMA. Ou, provavelmente, o caso seria bempior, a exemplo de como o meio ambiente é tratadoainda hoje em nosso país. Itaparica funciona também assim, mas guarda menos água e seu poder de regular as cheias é mui-to menor. Se vem trovoada no sertão pernambuca-no, a água que chega de repente em Itaparica enche a barragem ligeiro. Daí, uma vez ou outra termos cheia repentina na época das chuvas no sertão, o que já aconteceu em 2003, 2004 e 2005. E Xingó? A represa tem um reservatório pequeno e quase toda a água que chega tem que sair. Mas a operação da hidrelétrica de Xingó tem uma influên-cia importante no baixo São Francisco: faz o “respi-rar”, encher nos dias de semana, secar no final de semana, subir durante o dia, secar pela noite, ape-nas para gerar energia, sem que se veja preocupa-ção com a erosão grave que este movimento da á-gua causa, e nem aos problemas que traz aos beira-deiros.

Uma ruma de pilotos e um leme só: essa car-reira leva para onde? Então vamos esclarecer: e quem comanda o sobee desce, neste segura e larga, na operação das bar-ragens? Há três personagens prinpais nesta novela, onde o final feliz é um só: gerar energia elétrica, a qualquer custo, sobrando a pior parte da conta para as comunidades do Baixo São Francisco. Quem são os três? Primeiro, a CHESF, já conheci-da, que opera diretamente as barragens. É ela que comanda, diariamente, as manobras das comportas. Depois o ONS, sigla que significa Operador Nacio-nal do Sistema (elétrico), que é responsável pela o-peração integrada de todas as usinas geradoras de eletricidade do país. Este órgão calcula o melhor a-proveitamento das águas (acumuladas nas barra-gens) para gerar energia, e informa isso às operado-ras das usinas, como a CHESF. E por fim a ANA, quesignifica Agência Nacional de Águas, e que em prin- cípio deveria cuidar do uso correto das águas para os vários fins que conhecemos: navegação, irriga-ção, abastecimento humano e animal, laser e gera-ção de energia, quando existirem hidrelétricas na bacia. E há ainda um quarto piloto, o IBAMA, que deveria cuidar para que os três primeiros não preju-diquem o ambiente enquanto fazem uso das águas. Uma coisa deve ficar bem clara: todos os pilotos citados são todos órgãos do Governo Federal. Então, afinal, quem manda no rio? A CHESF, a A-NA ou o ONS? Quando está tudo bem e sem recla-mações, é tudo beleza: A CHESF toca a peleja do a-bre e fecha. O ONS, por sua vez, calcula as necessi-

Esta pergunta a gente se faz toda vez que algu-ma coisa anormal acontece nas águas do baixo São Francisco. E tem havido um pouco de tudo: pouca água (a regra), muita água que vem de repente (algu-mas vezes), o rio que sobe e desce todo dia, fins de semana quase sem água, enfim um rio que parece não estar mais sujeito às vontades da Natureza. Que alguém comanda esse rio está bem claro, mas quem tem esse poder? E por que desta forma?

O rio não é mais liberto É preciso primeiro lembrar que o rio não corre mais livre na calha, da nascente lá em Minas até a foz. Ele está barrado em vários lugares, a começar ainda lá em cima, pela represa de Três Marias (norio das Velhas, afluente do São Francisco) seguida, já no sub-médio São Francisco, pela gigantesca re-presa de Sobradinho e por várias outras. A última é Xingó. De todas estas represas a que mais influencia o regime de vazão do rio (a quantidade de água que corre) é a represa de Sobradinho, seguida de Itapa-rica. Mas Xingó também faz parte dessa história. Primeiro vamos olhar Sobradinho, a barragem que segura a água que vem das nascentes do São

Francisco e da maior parte dos afluentes perenes,

Janeiro de 2008: mas que peste fizeram com a água do rio?! A geração de energia durante 2007 foi ótima, as va-zões em Xingó chegaram a 4.000 m3/s, o que pode ser muita água numa época normal de seca, como junho e julho. Ao final do ano o reservatório de Sobradinho esta-va quase seco, e ainda assim as águas corriam a rodo pelas turbinas. Mas as chuvas de fim de ano em Minas e na Bahia não vieram. O Mundo estava na fase climática chamada La Niña. Sobradinho secou. A CHESF solicita à ANA para diminuir a vazão do rio a um valor ainda abai-xo do mínimo autorizado por lei. Em plena época das cheias naturais, da piracema. O IBAMA, consultado pela ANA, autorizou. E o rio correu, no início de 2008, tal um fiapo de água no baixo São Francisco. Foi um desastre, mas os relatórios oficiais não admi-tem. A reação veio de Petrolina a praia, atrás de respon-sáveis pela calamidade. O primeiro, em geral, é o mais próximo: a CHESF. Procurada por vários prejudicados, a-firmou que atendia ao ONS, que tudo calculara. Que a ú-nica alternativa era segurar a água. E, se o IBAMA disse sim, não era um problema ambiental. Ou seja, a CHESF, que vinha pilotando, agora apenas obedecia instruções. O próximo culpado seria o ONS, que alegou ter calculado tudo em função de estatísticas e de equações estabeleci-das por

outras instituições. A ANA, criticada por ter au-torizado a redução da vazão para valores abaixo do míni-mo, alegou a geração de energia como prioridade: evitar o apagão. Quanto ao IBAMA, emitiu a autorização, deu no que vimos e nunca foi responsabilizado. Nesta análise não há responsáveis. E o rio corre co-mo bem se sabe.

E as pessoas da margem entramonde, nessa canoa? Infelizmente as comunidades ribeirinhas ficam fora do processo da gestão das águas do rio. O Governo Federal e os pilotos já citados aqui dizem que não. Alegam que atra-vés do CBHSF - Comitê da Bacia Hidrográfica do São Fran-cisco a sociedade civil está presente no comando dos des-tinos do rio. Vamos lembrar que o CBHSF, criado pelo Governo Fede-ral, formado por vários setores da sociedade em geral, tem como membros uma parte boa do próprio Governo. E, além disso não tem poder de decisões. É uma entidade apenas consultiva, e freqüentemente ignorada pelos pilotos, como na decisão de diminuir as águas do rio. Indo mais longe: o CBHSF não tem personalidade jurídica (não tem o famoso CNPJ, bem conhecido cobrado quando fazemos uma associ-ação de moradores, por exemplo) e não pode, se for o ca-so, fazer uma ação judicial contra a transposição do São Francisco. Aliás, não pode comprar uma garrafa de água mineral na bodega do povoado: não tem recursos para tan-to. Quem libera a verba é a ANA, já apresentada com os outros pilotos no artigo. Os ditos, quando questionados sobre a completa falta de contato e diálogo dos órgãos com as comunidades ribei-rinhas, apreciam de mencionar que o melhor fórum de de-bates é o CBHSF. Por que seria, perguntamos a vocês? De fato, a intenção fica desassombrada: nenhum dos três órgãos tem um escritório e pessoal aqui na margem, para atendimento ao povo do Baixo,e muito menos um te-lefone 0800 para contatos, reclamações, e, quem sabe um dia, elogios. Ficam todos arranchados em Brasília ou no Re-cife, onde são as sedes dos órgãos. Para as pessoas aqui da margem restam as visões dos sobrevôos (”visitas”, no falar dos técnicos) dos aviões, dos helicópteros... E, como bem diz Seu João Isidoro, sentado em sua cal-çada: “pense num andar cabuloso deste tal helicope...isso é lá movimento de povo de bem...que avoa por aí e numfala com o povo...”

Foto: Via CBHSF/2008

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PHAN, significa que a canoa fica, oficialmente, na lista de bens culturais nacionais, sem contudo qualquer impedimento para que permaneça nave-gando no Baixo São Francisco. Como há quase cem anos, quando foi construí-da, a Luzitânia está na margem, descendo e subin- do com sua carga atual: projetos culturais, pesqui-sas e acompanhamento da situação do rio, passa-geiros viajando pelo Projeto Rota das Canoas, den-tre várias atividades. E olha aí: podemos considerar que a Luzitânia é um elemento remanescente ativo do cangaço. Os estudos efetuados na bibliografia do tema confir-mam todos os depoimentos sobre o uso da canoa por Lampião e seus cabras. Isso não é coisa pouca. Pelo fundo dessa canoa muita águapassou, assim como parte da história do Baixo São Francisco.

escritório de apoio ao CEAV). O Rio de Baixo é mais um projeto integrado a outras iniciativas. Assim, com os filmes produzidospelo CEAV, poderemos fortalecer as exibições do Ci-ne Beira Rio - Cinema Itinerante do Baixo São Fran-cisco, que por sua vez utiliza a canoa Luzitânia (a-poiada hoje pelo Projeto Luzitânia, também através da Lei Rouanet). O Rio de Baixo também fornece i-magens e material documental para este jornal, e possibilita a estrutura de monitoramento socioam-biental do Baixo São Francisco. A estrutura disponível hoje em Brejo Grande ésemelhante a de boas produtoras em grandes cen-tros do Brasil, e se encontra aberta a parcerias com outras entidades.

em HDV (câmeras e acessórios para a produção de vídeos em alta definição; 2- a aquisição e montagem de equipamentos e acessórios para a pós-produção (computadores, monitores e programas específicos para a edição de filmes em alta definição); 3- a melhoria das estruturas físicas do local de funcionamento do Rio de Baixo (sala da ilha de edi-ção e

Luzitânia: reconhecida como patrimônio nacional imento pelo IPHAN, um órgão do MinC - Mi- nistério da Cultura, é álgo inédito, pois através da Luzitânia, uma embarcação de trabalho, fei- ta por gente simples da margem, temos um pouco mais de atenção voltada para a nossa região. Como um dos dois últimos exempla- res navegando da tradicional canoa de tolda, a Luzitânia, fielmente restaurada (pelo do Pro- jeto Canoa de Tolda) ao longo de quase dez a- nos, é um bom exemplo do que talvez seja um dos mais fortes símbolos afetivos e culturais do Baixo São Francisco. Apesar das trans- formações irreversíveis que esta região sofreu, provocadas principalmente pela re- gularização do rio, que liquidou com a na- vegação de longo curso aqui no Baixo, a canoa aí está. O tombamento da Luzitâni- a, que é o nome desta qualificação do I-

Após cerca de oito anos de espera, desde a entra-da da documentação no IPHAN - Instituto do Patri-mônio Histórico e Artístico Nacional - finalmente, em setembro de 2008, a canoa de tolda Luzi tânia foi notificada como patrimônio cultural e histórico do país. O reconheci-

Já está operacional, em Brejo Grande, SE, o Rio de Baixo - Centro de Audiovisual (CEAV) do Baixo São Francisco, projeto implantado pela Canoa de Tolda através do MinC - Ministério da Cultura, pela Lei Roua-net de incentivo à cultura. A idéia do projeto surgiu ainda em 1998, quando sen-timos a necessidade urgente de registrar em filmes e gravações, o dia-a-dia das pessoas da mar-gem do

Baixo São Francisco. Naquele ano teve início

ma produtora no Rio de Janeiro, situação que nem sempre seria possível no futuro. Era impor- tante termos independência. Em 2004, através do edital do DOCTV I, rea- lizamos “O Rio das Mulheres - Pelo Olhar de I- vaneide”. Mais uma vez, usou-se equipamento alu- gado. Para a edição, foi possível mais uma parceria com uma produtora em Aracaju. Foi menos difícil, mas ainda não era o ideal. Finalmente, em 2008, conseguimos aprovar o projeto Rio de Baixo - CEAV do Baixo São Francisco no MinC, e assim obter o patrocí- nio (pela Lei Rouanet, de isen- ção fiscal para o patrocinador) que garantiria os recursos para o projeto, que tinha co- mo objetivos: 1- a aquisição de equipamentos e acessórios de produção digital

a pre-paração de nosso primeiro documentário, o ”Na Ve-ia do Rio”, que viria a ser rodado em 2001, dirigido pela colega Ana Rieper. Neste projeto sentimos difi-culdade por não dispormos de nosso equipamento para a produção (as filmagens), e para a pós-produ-ção (a montagem do filme). Parte do material foi a- lugada, significando custos elevados. Para fazer a montagem do filme, conseguiu-se parceria com u

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Pelas carreiras do Baixo São Francisco com o documentário “De Barra a Barra” Não podia ser melhor: o Rio de Baixo possibilitoua filmagem do documentário “De Barra a Barra - Pe-las Carreiras do Sentido Deixado”, realizada em no-vembro e dezembro passados. É um projeto realiza-do através do edital nacional do DOCTV, do MinC - Ministério da Cultura, através da TV Cultura e TV A-peripê, em Sergipe. Este novo filme trata de uma viagem a bordo da canoa Luzitânia, da foz do São Francisco ao sertão, nas pedras, pilotada por S. Aurélio de Janjão, de Pi-ranhas. Nas paradas, a prosa na popa da canoa vai acontecendo: S. Eduardo Tamborim, Hélcio Jacaré, S. Valdemar, causos de quando Lampião andava na canoa, e muito mais. O “De Barra a Barra” já está quase pronto para

lançamento através do Cine Beira Rio, nos povoados de Sergipe e Alagoas, sempre a bordo da Luzitânia.

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Vida e história do rio virando filme