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Do aspecto político e constitucional. No nosso Direito Penal temos uma mescla de políticas criminais que vai desde o princípio da intervenção mínima, em que limita ao cerceamento da liberdade do criminoso a crimes desprezíveis à sociedade, não deixando que sejam isolados aquele que podem produzir em favor da sociedade pagando ao mesmo tempo o crime cometido; até políticas criada em meio a alta carga emocional vivida pela sociedade de determinado momento como o caso da ideologia repressiva da Lei e Ordem. O movimento da “Lei e da Ordem” que surgiu nos EUA na década de 70 (setenta), como um reforço do Direito Penal Simbólico, tendo como um dos seus criadores o alemão Ralf Dahrendorf, representa o uso de uma resposta penal absurdamente severa como medida de eficácia preventiva e intimidatória à criminalidade violenta, se assentando na tentativa de empulhação: transformar em realidade a ficção de que leis e ações mais severas e em maior número são o caminho através do qual se alcança segurança e bem estar.

Material de apoio à lei 8072 e 11343

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Do aspecto político e constitucional.

No nosso Direito Penal temos uma mescla de políticas criminais que vai desde o

princípio da intervenção mínima, em que limita ao cerceamento da liberdade do criminoso a

crimes desprezíveis à sociedade, não deixando que sejam isolados aquele que podem produzir

em favor da sociedade pagando ao mesmo tempo o crime cometido; até políticas criada em

meio a alta carga emocional vivida pela sociedade de determinado momento como o caso da

ideologia repressiva da Lei e Ordem.

O movimento da “Lei e da Ordem” que surgiu nos EUA na década de 70

(setenta), como um reforço do Direito Penal Simbólico, tendo como um dos seus criadores o

alemão Ralf Dahrendorf, representa o uso de uma resposta penal absurdamente severa como

medida de eficácia preventiva e intimidatória à criminalidade violenta, se assentando na

tentativa de empulhação: transformar em realidade a ficção de que leis e ações mais severas e

em maior número são o caminho através do qual se alcança segurança e bem estar.

Segundo Damásio E. de Jesus, in Sistema Penal Brasileiro: execução das penas no

Brasil1, “Um dos princípios do "Movimento de Lei e Ordem" separa a sociedade em dois

grupos: o primeiro, composto de pessoas de bem, merecedoras de proteção legal; o segundo,

de homens maus, os delinquentes, aos quais se endereça toda a rudeza e severidade da lei

penal. Adotando essas regras, o Projeto Alternativo alemão de 1966 dizia que a pena criminal

era "uma amarga necessidade numa comunidade de seres imperfeitos".

É o que está acontecendo no Brasil. Cristalizou-se o pensamento de que o Direito

Penal pode resolver todos os males que afligem os homens bons, exigindo-se a definição de

novos delitos e o agravamento das penas cominadas aos já descritos, tendo como destinatários

os homens maus (criminosos). Para tanto, os meios de comunicação tiveram grande influência

(Raul Cervini, Incidencia de la "mass media" en la expansión del control penal en

Latinoamérica, Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, Editora Revista dos

Tribunais, 1994, 5: 36, dando enorme valor aos delitos de maior gravidade, como assaltos,

latrocínios, sequestros, homicídios, estupros, etc. A insistência do noticiário desses crimes

criou a síndrome da vitimização. A população passou a crer que a qualquer momento o

cidadão poderia ser vítima de um ataque criminoso, gerando a idéia da urgente necessidade da

agravação das penas e da definição de novos tipos penais, garantindo-lhe a tranquilidade”.1 http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7938#_ftn3, consultado em 07/02/2012, e também disponível em: http://campus.fortunecity.com/clemson/493/jus/m01-003.htm, consultado em 07/02/2012.

Os adeptos do Movimento de Lei e Ordem vêm neste a única solução para

diminuir crimes como os terrorismos, homicídios, torturas, tráfico de drogas, etc., é com o

endurecimento das penas, e a melhor das penas para eles é a de morte e a prisão perpetua.

Pois assim, além de está tirando do meio do convivo social das “pessoas de bem”, estará

também fazendo justiça à vitima.

Essa doutrina sofreu uma ramificação, em meado de 1991, e ficou conhecida

também como Tolerância Zero. Originou-se em Nova York, no governo do então prefeito

Rudolph Giuliani, e assim como o Movimento de Lei e Ordem é também político-criminal.

Nesta época adotou-se a “teoria das janelas quebradas”, que consiste em punir as condutas

mais leves, como a de pular por cima da catraca do ônibus para apresentar exemplos e

sensação de autoridade.

O movimento de Lei e Ordem, altamente repressivo, preconiza um maior número

de leis incriminadoras com o escopo de reduzir a criminalidade e intensificar a utilização do

Sistema Penal. É adotado pela Carta Magna conforme se constata pela leitura dos incisos

XLII, XLIII e XLIV do art. 5º, em temas de pena, graça, anistia, prescritibilidade e

afiançabilidade. O cenário fica ainda pior com a edição da legislação infraconstitucional, a

qual objetiva responder a situações excepcionais que causam comoção à opinião pública.

Concomitante a onde de crimes e ao movimento da Lei e da Ordem nos Estados

Unidos, em meados de 1990 se instalou no Brasil um surto de seqüestros, em que a maioria

das vítimas eram de classes bem favorecida economicamente da sociedade, dentre esses o

empresário Abílio Diniz e o publicitário Roberto Medina que ficou no poder dos

seqüestradores cerca de 16 dias. Em meio a atmosfera de insegurança a sociedade brasileira

começou a clamar por leis e penas mais severas, até pena de morte e prisão perpétua, para

quem cometesse estes tipos de crimes.

O governo brasileiro vendo a comoção social, para satisfazer as expectativas, a

paz social e a pseudo-segurança da sociedade, editou de imediato a Lei dos Crimes Hediondos

– Lei n. 8.072/90, retirando das pessoas processadas ou condenadas, por algum dos

dispositivos contidos na Lei, benefícios agregados ao direito penal, direito processual penal e

à execução penal, sem analisar as particularidades de cada caso e pessoa.

Analisando o movimento, argutamente observa Alberto Silva Franco, que o

legislador, “em nome do movimento da ‘Lei e da Ordem’, além de criar uma categoria nova

de delitos (os crimes hediondos), equiparou-a a outras espécies criminosas (tortura, tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo), eliminou garantia processual de alta valia

(fiança), vedou causas extintivas da punibilidade expressivas (anistia e graça) e, afinal,

atribuiu ao legislador ordinário a incumbência de formular tipos e cominar penas, numa luta

contra o crime, sem descanso, mas fadada ao insucesso, por seu irracionalismo,

passionalidade e unilateralidade”.

A Lei nº 8.072 de 25 de junho de 1990, nasceu, pois, dos reclamos dos defensores

da ideologia do “law and order”, objetivando especificar e tornar aplicável as medidas

restritivas de direitos e garantias fundamentais determinados pela Constituição Federal.

Um estudo aprofundado sobre o tema deixa claro, que maximizar o sistema penal

e minimizar o sistema social de nada adiantará no combate da criminalidade, já que é

flagrante um problema estrutural, e assim, se estará combatendo somente o efeito, e não a

causa.

CRIMES HEDIONDOS: CONCEITO E APLICAÇÃO

Do Conceito

De um ponto de vista da dogmática, uma das primeiras questões que emerge é a

de saber o que pode ser considerado como crime hediondo. A Lei nº 8.072/90, em vez de

fazer uma definição do que é hediondo, acertadamente, preferiu catalogar as infrações penais

assim consideradas no seu artigo 1º. Dessa forma, evitou-se uma possível ofensa ao princípio

da legalidade que, entre os seus principais corolários, tem o da "lex certa"3. De fato, se

hediondo, como aponta Alberto Silva Franco,4 é o delito que se mostra "repugnante",

"asqueroso", "sórdido", "depravado", "abjeto", "horroroso" ou "horrível", uma possível

definição, dada a elasticidade do significado da expressão, tornaria possível, ao sabor da

formação ideológica ou cultural do juiz, considerar como tal aquilo que assim lhe parecesse.

Dessa maneira, um juiz de "esquerda" poderia considerar hediondo o roubo do salário de um

operário humilde que trabalhou o mês inteiro para ganhá-lo. Já o de "direita" poderia

considerar sórdido o sujeito que teve o desplante de, em artigo de imprensa, atacar as Forças

Armadas ou o Judiciário.

As dificuldades de se fazer uma definição legal de crime hediondo dizem com a

própria dificuldade de se proceder a uma definição material de delito, ancoradas no caráter

danoso do ato ou "no antagonismo da conduta com a moral". Não basta a particularidade de a

conduta representar um mal ou ser ofensiva a um bem jurídico se não houver expressa

previsão legal de pena. Admitir o contrário, daria azo a uma indefinição, quando não a um

desmedido arbítrio das autoridades policiais e judiciais que, ao seu talante, poderiam tratar

penal e processualmente com maior severidade o indiciado ou acusado. Não se esqueça que a

expressão "crimes hediondos" é portadora de evidente carga emocional, cujo significado real

depende de fungíveis critérios axiológicos ou ideológicos. Tanto assim, que para diminuir esta

carga emocional já há um Projeto de Lei com vistas à edição dos "Crimes de Especial

Gravidade".

Por isso, ainda que sujeito a críticas pela eventual omissão na elaboração do rol

dos crimes que deveriam ter sido qualificados como hediondos ou, por outra, por indevida

inclusão, o melhor caminho foi mesmo o seguido pelo legislador que se aproveitou do caráter

indeterminado da expressão "crimes hediondos" contida na Constituição para fazer escolhas

amplamente discricionais.

Talvez, para mitigar o rigor legal, poder-se-ia pensar numa cláusula salvatória em

que o caráter hediondo, a critério do juiz, pudesse ser arredado. É que em face da garantia da

legalidade, que se destina aos acusados, não é possível admitir-se a inclusão de crimes por

critério judicial. No entanto, visando alcançar exceções não tão infreqüentes, como a do pai

que, por exemplo, para vingar o estupro da filha, de emboscada, mata o estuprador, parece

viável uma espécie de cláusula de modo a permitir que o julgador exclua a incidência da

qualificação hedionda.

Por força de casos como o acima descrito é que Rogégio Sanches Cunha, in

Legislação Criminal Especial, coleção ciências criminais volume 6, Revista dos Tribunais,

São Paulo: 2009, p. 385, diz que apesar de existirem três critérios para definição sobre o que

seja crime hediondo, quais sejam o legal, o judicial e o misto,, entende , o referido autor, que:

“Diante deste quadro, sugerimos um quarto sistema, mais justo (e seguro), no qual o legislador,

num primeiro momento, enuncia num rol taxativo (portanto, sem possibilidade de ampliação) os

crimes hediondos, cabendo o juiz apenas confirmar, na análise do caso concreto, a hediondez do

fato praticado (assim, por exemplo, nem todo homicídio qualificado será, em concreto,

hediondo).”

Seja como for, o diploma em questão considerou como hediondos os seguintes

crimes (tentados ou consumados): latrocínio (art. 157, §3º, in fine); extorsão qualificada pela

morte (art. 158, §2º); extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput);

estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º) estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e

4º, ambos, em combinação com o art. 223, caput e parágrafo único) epidemia com resultado

morte (art. 267, §1º); todos do Código Penal e o genocídio (arts. 1º, 2º e 3º da Lei 2.889/56).

Além do homicídio praticado em atividade típica de extermínio e o qualificado na forma da

lei 8.930/94.

A lei 9.677/98 incluiu na classificação dos delitos considerados hediondos a

vulgarmente chamada "falsificação de remédios". Embora se possa questionar o critério para

a inclusão, que mais parece ser o de dar uma satisfação ao público, soa ridículo que condutas

culposas sejam rotuladas como tal. De fato, uma tal situação briga com o significado da

expressão hediondo e reclamará do interprete um exercício que exclua os ilícitos culposos do

catálogo do que é hediondo. Seria isto possível em face do princípio da legalidade e da

tripartição dos poderes?

A resposta há de ser afirmativa. Primeiro porque dentro de uma interpretação

sistemática não se pode tolerar que condutas apenadas com detenção, sanção tradicionalmente

reservada para as infrações mais leves, possa conviver com o rótulo de hediondo e, o que é

mais grave, com as conseqüências jurídicas previstas tanto na Constituição (art. 5º, inc. XLIII)

que impede a concessão da fiança, quanto na Lei 8.072/90, restringe excludentes de

culpabilidade e torna mais rigorosa a progressão no regime prisional. Afora a coerência e a

racionalidade do sistema penal, está em jogo a observância do princípio constitucional da

proporcionalidade como decorrência da garantia do devido processo legal em sentido

material, “substantive due processo of law”.

Na esteira da precisa lição do Prof. e Procurador da República Carlos Roberto de

Siqueira Castro, é forçoso observar que "o papel da cláusula due process of law, considerada

sob o prisma isonômico, é justamente o de impedir o abuso do poder normativo

governamental, isto em todas as suas exteriorizações, de maneira a repelir os males da

"irrazoabilidade" e da "irracionalidade", ou seja, do destempero das instituições governativas,

de que não está livre a atividade de criação ou de concreção das regras jurídicas nas

gigantescas burocracias contemporâneas"11.

Dissertando sobre o devido processo legal, como fundamento para permitir ao

Judiciário o controle do regular exercício do Poder Legislativo, a Profª. Ada Pellegrini

Grinover acentua: "Malgrado o nítido sentido processual que à clausula se imprimia, em sua

tradição histórica, foi-se impondo um conceito substantivo de “due process of law”,

emergente do amplo significado por ela subsumido, quando foi reconduzida a um critério de

razoabilidade (reasonableness)".

Diferente não é o magistério do Prof. Rogério Lauria Tucci para quem, num

denominado Estado de Direito, o devido processo legal "determina a imperiosidade" de: "a)

Elaboração correta e regular da lei, bem como de sua razoabilidade, senso de justiça e

enquadramento nas preceituações constitucionais (substantive due process of law, segundo o

desdobramento da concepção norte-americana)".

Mais recentemente, o ilustre Prof. Nelson Nery Jr., peremptoriamente, sentencia

que toda lei irrazoável "é contrária ao direito e deve ser controlada pelo poder judiciário".

Aliás, já nos fins dos anos 40 o saudoso Santiago Dantas escrevia que "... abre-se ao Poder

Judiciário a porta por onde lhe vai se dado examinar o próprio mérito da disposição

legislativa; repelindo como undue process of law, a lei caprichosa, arbitrária ...."15.

Se assim é, quando for corrigida a omissão da lei 9.677/98, que se limitou a

estampar na ementa que incluía os crimes catalogados no rol dos hediondos, deixando de

fazer a alteração no corpo do próprio diploma, mesmo que condutas culposas sejam

enquadradas como tal, pode e deve o juiz fazer a referida exclusão. Mesmo porque, como

advertiu o Min. Cernicchiaro em acórdão unânime da 6ª Turma do Superior Tribunal de

Justiça, "adaptar axiologicamente a lei não é repudiar a lei"16.

Da Aplicação

O legislador optou por um critério objetivo (sistema legal), fazendo uma

enumeração taxativa dos tipos penais tidos como hediondos, ao invés de definir o que seja

crime hediondo e atribuir ao juiz a aplicação da norma penal (sistema judicial). Com efeito, de

acordo com o art. 1º da mencionada lei: · 

Art. 1º - São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no

Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados:

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda

que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I, II, III, IV e V);

II - latrocínio (art. 157, § 3º, in fine);

III - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2º);

IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput e §§ 1º, 2º e 3º);

V - estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º);

VI – estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º, ambos, em combinação com

o art. 223, caput e parágrafo único);

VII - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos

ou medicinais (art. 273, caput e § 1°, § 1°-A e § 1°-B, com a redação dada pela Lei n° 9.677,

de 2 de julho de 1998).

Parágrafo único - Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1º,

2º e 3º da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956, tentado ou consumado.

O ministro Francisco de Assis Toledo, mencionado por Silva Franco,

considerando elogiável a adoção de tal critério, percebeu que uma conceituação genérica de

hediondez “ofereceria margem para debates intermináveis, sem previsão de uma solução

satisfatória, a curto ou médio prazo”.

Alberto Silva Franco, crítico ao sistema adotado, afirma que “o texto legal pecou,

desde logo, por sua indefinição a respeito da locução ‘crime hediondo’, contida na regra

constitucional. Em vez de fornecer uma noção, tanto quanto explícita, do que entendia ser a

hediondez do crime (o projeto de lei enviado ao Congresso sugeria uma definição a esse

respeito), o legislador preferiu adotar um sistema bem mais simples, ou seja, o de “etiquetar”

ou “colar (copiar-colar)”, com a expressão ‘hediondo’, tipos já descritos no Código Penal ou

em leis especiais. Desta forma não é ‘hediondo’ o delito que se mostre ‘repugnante,

asqueroso, sórdido, depravado, abjecto, horroroso, horrível’, por sua gravidade objetiva, ou

por seu modo ou meio de execução, ou pela finalidade que presidiu ou iluminou a ação

criminosa, ou pela adoção de qualquer outro critério válido, mas sim aquele crime que, por

um verdadeiro processo de colagem, foi rotulado como tal pelo legislador” .

Originalmente, a Lei 8.072/90 considerou oito tipos penais como hediondos, deu

prioridade à tutela patrimonial, dos costumes e à alguns delitos de perigo comum. Com a Lei

8.930/94, o homicídio foi acrescentado ao rol e desaparece a figura do art. 270 combinado

com o art. 285 do CP, envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou

medicinal, qualificado pela morte.

Pressionado pelo sensacionalismo tripudiado sobre alguns casos de crimes contra

a saúde pública (como se só agora estivessem ocorrendo...), o legislador, às pressas, dada a

proximidade das eleições, redigiu a Lei nº 9.695, de 20 de agosto de 1998, alterando o inciso

VII do art 1º. Sai do rol dos crimes hediondos o crime de epidemia com resultado morte, que

segundo Dyrceu Aguiar Dias Cintra Júnior, “há décadas fora do repertório e cujas

transferências conduzem apenas ao imaginário, à manipulação ideológica que justificou até

prisões arbitrárias em 1964”, e em seu lugar entra a falsificação, corrupção, adulteração ou

alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais , condutas tipificadas no art.

273, caput e §§, do CP, também modificados pela Lei. 9.677, de 2 de julho de 1998.

OS EFEITOS PENAIS E PROCESSUAIS PENAIS DA LEI 8.072/90

Sucintamente podemos destacar os efeitos principais penais e processuais da Lei 8.072, de 21

de junho de 1990:

1.   Proibição dos benefícios da Anistia, Graça ou Indulto (art. 2º, I);

2. Impossibilidade da concessão de fiança (art. 2º, II). A liberdade provisória era

proibida, porém esta norma foi revogada pela lei 11.464/07, donde se conclui que

agora é admissível a liberdade provisória para os crimes hediondos;

3. Necessidade de cumprimento de 2/3 da pena para concessão de livramento

condicional; Vedação do benefício quando o apenado for reincidente específico em

crimes dessa natureza. (art. 5º e CP, art. 83, V);

4. Aumento das penas dos crimes de latrocínio (CP, art. 157, § 3º), extorsão mediante

seqüestro (CP, art. 159, caput e seus §§ 1º a 3º), estupro (CP, art. 213, caput), atentado

violento ao pudor (CP, art. 214, caput) e suas formas qualificadas (CP, art. 223),

epidemia (CP, art. 267) e envenenamento de água potável ou substância alimentícia

medicinal (CP, art. 270, caput);

5. Causa de aumento da pena, acrescendo de metade, nos crimes de latrocínio (CP, art.

157, § 3º), extorsão qualificada pela morte(CP, art. 158, § 2º), extorsão mediante

seqüestro (CP, art. 159, caput e seus §§ 1º a 3º), estupro (CP, art. 213, caput), atentado

violento ao pudor (CP, art. 214, caput) ) e suas formas qualificadas (CP, art. 223),

quando a vítima: não for maior de 14 anos; é alienada ou débil mental, e o agente

conhecia esta circunstância; não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência

(art. 9º e CP, art. 224);

6. Criação da “Delação Premiada” (art. 8º, p. único e CP, art. 159, § 7º);

7. Aumento da pena do crime de quadrilha ou bando (CP, art, 288) quando objetivarem a

prática de crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas

afins ou terrorismo (art. 8º); Com a atual lei de drogas as penas para a associação para

fins de tráfico a que aludo o art. 8º da Lei 8072/20 deixou de ter controvérsias,

passando a prevalecer a pena do art. 35 da Lei 11.343/06

8. Decretação de prisão temporária, com prazo de 30 dias prorrogáveis por igual período

em caso de extrema e comprovada necessidade (Lei 7.960/89, arts. 2º c/c Lei 8.072/90,

art. 2º, § 3º);

Em razão destas questões sucessivamente sendo levadas aos tribunais foi editada a

Súmula Vinculante nº. 26, do STF para fazer valer a amplitude dos efeitos de sua decisão

originária (HC 82.959-SP) e o Verbete de Súmula nº. 471 do STJ, bem como como fonte de

decisões esclarecedoras sobre o tema em casos concretos, temos o HC 83.799MS, do Superior

Tribunal de Justiça e Apelação Crime Nº 70044052942, disponível em: http://www.tjrs.jus.br, do

Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Com relação a súmula 471 do STJ, veio para afirmar entendimento de que a

norma sobre a progressão de regime não é processual e sim penal, ou como a doutrina

preleciona, trata-se de uma norma de natureza mista, ou seja, está no âmbito de dispositivo

legal (art. 2º da lei 8.072/90) que tem conteúdo de natureza processual e penal, como ocorre

no art. 366 do CPP.

Neste caso a súmula veio a firmar entendimento controvertido sobre a natureza

jurídica da norma que trata da progressão de regime, se de natureza processual ou penal, tendo

siso optado pelo entendimento de que o requisito objetivo para progressão de regime para os

condenados por crime hediondo e equiparado somente obedecerá o patamar de 2/5 para os

primários e 3/5 para os reincidentes se o fato foi praticado depois da vigência da Lei

11.464/07, do contrário, a regra a ser aplicada continua sendo a genérica prevista na Lei de

Execução Penal, qual seja que o réu tenha cumprido ao menos 1/6 da pena.

Isto significa dizer que a norma é de conteúdo penal e, portanto, não poderá

retroagir para prejudicar réu por fatos praticados antes da sua vigência. Em sentido oposto,

alguns doutrinadores entendem que se trata de norma de conteúdo processual e portanto

aplicar-se-ia a regra do art. 3º do CPP, ou seja, da imediatidade, ou seja, a regra atingiria aos

processo em curso.

No que tange a súmula vinculante nº 26 do STF, a redação aprovada reza:

Para efeito de progressão de regime de cumprimento de pena, por crime hediondo ou equiparado, praticado antes de 29 de março de 2007 , o juiz da execução, ante a inconstitucionalidade do artigo 2º, parágrafo 1º da Lei 8.072/90 , aplicará o artigo 112 da Lei de Execuções Penais , na redação original, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.

Após serem feitas algumas retificações, a redação final da Súmula Vinculante, que

ganhou o número sequencial 26, ficou desta forma:

26. Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.

Em 29 de março de 2007 é a data em que a Lei 11.464/2007 entrou em vigor, ou

seja, pelos moldes do que foi explicado acima, quem cometeu crime depois dessa data, pode

progredir de regime, mas com os novos patamares de 2/5 e 3/5.

Antes dessa data, estava valendo o patamar de 1/6 do art. 112 da Lei de Execuções

Penais, regra geral que passou a abarcar também os hediondos com a declaração de

inconstitucionalidade da vedação à progressão de regime, prevista no artigo 2.º, 1.º da Lei

8.072/90.

Se algum magistrado inobservar a regra, compete ao causídico apresentar

Reclamação diretamente no Supremo Tribunal Federal para o restabelecimento da ordem

jurídico-constitucional. Desta forma, pacificou-se perante toda a Administração Pública a

questão.

A partir da edição da SV n. 26, consolidou-se o entendimento de o STF poder

afastar a regra geral constitucional da Resolução do Senado para as decisões tomadas pelo

Supremo em controle difuso de constitucionalidade. Essa questão de relevante interesse aos

constitucionalistas nacionais, diz respeito ao quórum da decisão de efeitos abstratos em

controle concreto de constitucionalidade no HC 82.959- 7: deu-se por maioria simples , em

votação apertada (6x5).

Concluindo, temos uma nova realidade constitucional consolidada no país e a

questão da quantidade de pena cumprida para progressão de regime de pena de crimes

hediondos e equiparados resolvida, para os delitos praticados entre 23 de fevereiro de 2006

(quando o STF, pelo sistema difuso de constitucionalidade analisou o Habeas Corpus 82959 e

reconheceu a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072/90) e 29 de março de 2007 (Lei

11464/07) a progressão de regime será com 1/ 6 da pena efetivamente cumprida.

Anistia, Graça e Indulto

A anistia, forma de extinção da punibilidade, exclui o crime, ex tunc, extinguindo

a punibilidade e demais conseqüências de natureza penal. Por sua vez, a graça, destina-se a

pessoa determinada e não a fato, como a anistia. O indulto, forma de graça coletiva, abrange

sempre um grupo de sentenciados. Tanto um como outro extinguem a punibilidade,

substituindo o crime, a condenação irrecorrível e seus efeitos secundários;

A Constituição Federal determinou que a lei considerará crimes inafiançáveis e

insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas

afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. A Lei 9.455/97, em seu art. 1º, § 6º,

superfluamente repetiu a ordem constitucional sobre a inafiançabilidade e insusceptibilidade

de graça ou anistia.

Neste aspecto a Lei 8.072/90 não caminhou bem. Na sua ânsia repressora,

mencionou também o indulto, fazendo surgir duas correntes:

1ª Corrente - A primeira, tomando a graça em sentido estrito, a menção é de

flagrante inconstitucionalidade, pois o legislador ordinário não poderia, indo além do disposto

na Constituição Federal, restringir a competência discricionária do Presidente da República de

conceder a indulgência coletiva. Enfileiram nesta corrente Alberto Silva Franco, Francisco de

Assis Toledo e Antônio Scarance Fernandes;

2ª Corrente - A segunda, considerando a graça em sentido amplo. Entende que

não há inconstitucionalidade no dispositivo, pois finalisticamente, se um indivíduo não pode

ser beneficiado, muito menos um grupo de pessoas o será. Para estes, a determinação

constitucional compreende tanto o indulto individual quanto o coletivo. É defendida por

Damásio, Vicente Cernicchiaro e Mirabete.

Fiança e Liberdade Provisória (Lei 8072/90 X 11.343/06)

Sobre a LIBERDADE PROVISÓRIA, convém salientar, não se confunde com fiança,

nem com crime afiançável. De acordo com o CPP, a liberdade provisória sem fiança pode ser

concedida a qualquer delito afiançável ou não, quando faltar os requisitos da prisão

provisória.

CPP, Art. 310 p. único Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. (Redação dada ao artigo pela Lei nº 12.403, de 04.05.2011, DOU 05.05.2011)

A Constituição Federal também identifica esta diferença no art. 5º, inciso LXVI

[...] liberdade provisória, com ou sem fiança. A Lei 8.072/90 avançou o dispositivo

constitucional trazendo dúvidas e discussões, uma vez que a Constituição Federal não

menciona a vedação da liberdade provisória, apenas afirma a inafiançabilidade daqueles

crimes.

Antes da lei 11.464/07 o art. 2º da lei 8072/90 possuía no inciso II deste

dispositivo, vedação expressa à liberdade provisória e a fiança. Após 2007 há vedação

somente à fiança.

Tal alteração foi em razão do posicionamento do STF a despeito da possibilidade

da progressão de regime prisional como dito acima, e no mesmo plano da doutrina o

legislador considera inconstitucional a proibição da liberdade provisória.

Argumentam que além da Constituição Federal não mencionar este efeito, ela

consagra o direito à liberdade provisória, pois, de acordo com o art. 5º, inciso LXVI, ninguém

será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou

sem fiança, Odone Sanguiné aponta que a vedação da liberdade provisória “eqüivale à

privação de liberdade obrigatória infligida como pena antecipada, sem prévio e regular

processo e julgamento” (Inconstitucionalidade da Proibição da Liberdade Provisória, in

Fascículos de Ciências Penais, nº 4, pp. 20-21).

Luiz Flávio Gomes declara que “não pode o legislador, com critério abstrato,

substituir o juiz na tarefa de prender ou mandar soltar, que é eminentemente concreta. O

legislador não pode, a pretexto de atualizar a concretização dos direitos fundamentais, instituir

a legalização de tais direitos” (Crime Organizado, 2ª Ed., 1997, Ed. RT, p. 17).

Também seguem este entendimento Alberto Silva Franco, Rogério L. Tucci e

Magalhães Gomes Filho entre outros. Esses entendimentos sobre a inconstitucionalidade

sobre vedação à liberdade provisória era majoritária na doutrina porém na jurisprudência era

minoritário até 2006 e 2007 pelas razões acima aduzidas.

Outrossim, é o mesmo argumento doutrinário que hoje se sustenta em razão da

proibição da liberdade provisória na lei de drogas em seu art. 44:

Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.

A título de exemplo por apego ao estudo histórico do tema, trazemos a baila jurisprudência

que impedia a liberdade provisória, antes da lei 11.464/07

STF HABEAS CORPUS. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ALEGAÇÃO DE QUE A PRISÃO CAUTELAR FOI DECRETADA SEM FUNDAMENTAÇÃO - NÃO COMETEU QUALQUER ILEGALIDADE O ACÓRDÃO ORA ATACADO, QUANDO, POR TER PRONUNCIADO O ORA PACIENTE, "SUBMETENDO-O A JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI PELA PRÁTICA DOS CRIMES DE HOMICÍDIO E DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES", LHE IMPÔS QUE AGUARDE PRESO ESTE SEU JULGAMENTO NOS TERMOS DO QUE ESTABELECE A LEI 8.072/90 PARA OS CRIMES ENTRE OS QUAIS SE ENCONTRA UM DOS QUE LHE SÃO IMPUTADOS, E, POR ISSO, DETERMINOU A EXPEDIÇÃO CONTRA ELE DO COMPETENTE MANDADO DE PRISÃO. DE FEITO, AO ASSIM PROCEDER, CUMPRIU O DISPOSTO NA CITADA LEI QUE, COM BASE NO INCISO LXVI DO ARTIGO 5º DA CONSTITUIÇÃO, NÃO ADMITE A LIBERDADE PROVISÓRIA. HABEAS CORPUS INDEFERIDO. (HC-73657 / SP, Publicado no DJ de 16-05-97, p. 19950, 1ª Turma, Rel. Min. MOREIRA ALVES).

Jurisprudência: STJ PROCESSUAL PENAL. CRIME HEDIONDO. INCONSTITUCIONALIDADE. LIBERDADE PROVISORIA. REUS PRIMARIOS. I. OS PACIENTES, PRESOS EM FLAGRANTE, PELA PRATICA DE CRIME HEDIONDOS, NÃO TEM DIREITO A LIBERDADE PROVISORIA, EMBORA SEJAM PRIMARIOS. TRATA-SE DE BENEFICIO CUJA REGULAMENTAÇÃO OU ADMISSIBILIDADE ESTA RESERVADA AO LEGISLADOR ORDINARIO. (RHC 3969/SP, 94/0031260-1, publicado no DJ de 24/10/1994, Pg. 28769, Rel. Min. JESUS COSTA LIMA).

PROCESSUAL PENAL. CRIME HEDIONDO. TRAFICO DE ENTORPECENTES. LIBERDADE PROVISORIA. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME. A VEDAÇÃO CONTIDA NO INCISO II DO ART. 2. DA LEI 8.072/90, SOBRE CONCESSÃO DE FIANÇA E LIBERDADE PROVISORIA AOS DENUNCIADOS PELA PRATICA DE CRIMES HEDIONDOS, NÃO APRESENTA VICIO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR SE TRATAR DE BENEFICIO CUJA REGULAMENTAÇÃO OU ADMISSÃO E DEFERIDA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL A LEI ORDINARIA (ART. 5., LXVI). (RHC 5180/SP, 95/0071175-3, publicado no DJ de 01/04/1996, p. 09921, Rel. Min. ASSIS TOLEDO).

Direito de Apelar em Liberdade (Lei 8072/90 X 11.343/06)

A Constituição Federal consagrou o princípio da presunção de inocência no art.

5º, inciso LXVI. Garantiu que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei

admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.

O Código de Processo Penal, no art. 594, determinava que: “o réu não poderá

apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons

antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se

livre solto”, no entanto este dispositivo foi revogado pela lei 12.403/11 dada sua

incompatibilidade com o princípio da presunção de inocência.

Na lei anterior a 11.343/06, a Lei 6.368/76, elevou a prisão provisória a requisito

necessário para o recebimento do recurso em seu art. 35: “O réu condenado por infração dos

art. 12 ou 13 desta lei não poderá apelar sem recolher-se à prisão”.

Na atual legislação, seu art. 59 assim dispõe: “Nos crimes previstos nos arts. 33,

caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se

for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória.

A doutrina a época, antes da revogação da lei 6.368/76 e do art. 594 do CPP, no

entanto, o art. 59 da lei 11.343/06 coloca restrições que o art. 2º, §3º da lei 8078/90, após a lei

11.464/07 não colocou o que mantém a pertinência do questionamento sobre a

constitucionalidade da vedação à liberdade provisória ante o princípio do estado de inocência.

Assim, uns entendiam que esses artigos tornaram-se inconstitucionais e, portanto,

revogados pelo mesmo motivo, v.g., Fernando da Costa Tourinho Filho e Alberto Silva

Franco que fundamentam o entendimento de que se o réu permaneceu livre durante toda a

instrução e julgamento em primeira instância, não haveria razão para ele necessitar de se

recolher à prisão para que a matéria seja apreciada em grau de recurso.

Outra corrente, mais (in)feliz, argumentando que o dispositivo constitucional não

alcançava a prisão provisória, fez-se vencedora e adotada pelo STJ culminou na Súmula 9, “a

exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção

de inocência”.

A Lei 8.072/90 despertou novas discussões, sendo muito criticado o § 3º do art.

2º. Determina que: “em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se

o réu se o réu poderá apelar em liberdade”.

A época, para fazer um confronto histórico entre as correntes doutrinárias, o art.

2º, §2º (atual §3º) da lei 8072/90, por contrariar o disposto no art. 35 da Lei 6.368/90. Surgem

três posições doutrinárias:

O art. 35 FOI REVOGADO pela Lei 8.072/90. É defendida por, entre outros

Mirabete . Alberto Silva Franco argumenta que o mencionado dispositivo já

havia sido revogado desde a Constituição Federal por ser incompatível com o

princípio da presunção da inocência;

Transmudando-se para o art. 59 da lei de drogas o STF vem entendendo que a lei

11434/06 é especial em ralação a lei de crimes hediondos.

O art. 35 NÃO FOI REVOGADO pela Lei 8.072/90, permanece intacto, como

exceção à regra do art. 2º, § 2º da Lei 8.072/90. Damásio E. de Jesus adotou esta

posição sobre os seguintes argumentos: Não seria admissível uma lei que vindo

punir mais severamente o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins pudesse

beneficiar o traficante; A Lei 8.072/90 acrescentou um parágrafo ao art. 35,

mantendo o caput intacto; A revogação do art. 35 da Lei 6.368/76 constitui uma

contradição jurídica, durante a formação da culpa permanece preso, reconhecida

pelo juiz monocrático, é colocado em liberdade provisória. Assim, se o réu,

incurso nos arts. 12 ou 13 da Lei 6.368/76, se estiver em liberdade, deverá

recolher-se a prisão para poder apelar, nas demais hipóteses, crimes hediondos,

tortura e terrorismo, aplica-se o art. 2º, § 2º da Lei 8.072/90;

Este é o raciocínio atual do STF a despeito da lei 11.343/06 por ser especial a lei 8072/90,

não sendo o réu primário e de bons antecedentes, se condenado deverá recolher-se a prisão

para apelar, criando uma pena antecipada e não dando o caráter cautelar da prisão,

analisando-o à luz dos requisitos da prisão preventiva.

POR FIM, TAMBÉM É INCONSTITUCIONAL A PROIBIÇÃO PEREMPTÓRIA DA

SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA E DO INDULTO, POIS NEM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

O FEZ CONFORME ART. 5º, XLIII.

CUMPRIMENTO DA PENA EM REGIME INICIALMENTE FECHADO

Com o intuito de exemplificar sobre a natureza jurídica da norma contida no art.

2º, §1º da Lei 8.072/90 vale a pena voltarmos no tempo antes de 2006 para mencionarmos a

discussão sobre o tema.

Estabeleceu-se no § 1º, do art. 2º, antes de lei 11.464/07 que: A pena por crime

previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado. Questionou-se sobre

a retroatividade do dispositivo. Seria aplicável aos crimes abrangidos pela Lei 8.072/90,

praticados antes de sua vigência? Não se aplica. A matéria referente ao cumprimento é de

natureza penal, não retroagindo salvo se beneficiar o réu. A doutrina e a jurisprudência

são assentes neste entendimento.

Cabe mencionar a posição de J. F. Mirabete. Para ele, regime de cumprimento de

pena é assunto de direito processual, portanto de aplicação imediata e irrestrita (Crimes

Hediondos: Aplicação e Imperfeições da Lei, RT 663/268). Antônio Scarance Fernandes

também compartilha deste entendimento, para ele “as normas sobre progressão são próprias

de execução penal, e não interferem no quantum da pena a ser cumprida, não a reduzem, não

a alteram. Cuidam do local em que o preso cumprirá a pena imposta. Têm aplicação imediata,

resguardando-se situações já definidas, acobertadas pela coisa julgada”. Contudo, são

posições isoladas e não foram aceitas pelos tribunais.

Ademais às críticas feitas ao dispositivo, por romper com a finalidade

ressocializadora da pena e desestimular o condenado a possuir um bom comportamento em

nome de alguma benevolência, o § 1º do art. 2º, antes de 2006, vinha sendo criticado e

arguido de inconstitucionalidade por afronta ao princípio constitucional da individualização

da pena. Dois entendimentos dividam a questão:

1. § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 é INCONSTITUCIONAL por força do art. 5º,

XLVI. O dispositivo afronta o princípio da individualização da pena, posição

francamente majoritária na doutrina;

2. § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 é CONSTITUCIONAL. O dispositivo não

contradiz a Constituição Federal, devendo ser regularmente aplicado. Era o

entendimento do STF até 2006;

A individualização da pena compreende três fases distintas e seqüenciais:

cominação, aplicação e execução. A cominação é feita abstratamente pelo Legislador. Ao

Judiciário compete, em conformidade com os critérios legais, aplicar a pena ao caso concreto.

Segue-se a execução da pena.

Nesta última fase também cabe ao Judiciário aplicar a cada caso concreto as

disposições penais e processuais atinentes à execução, v.g., as disposições relativas ao regime

de cumprimento da pena.

A questão da constitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8072/90, por violação

do princípio da individualização da pena, foi provocada pelo fato do legislador atropelar a

fase de aplicação da pena e dispor sobre assunto, que por sua natureza, compete

exclusivamente ao Poder Judiciário. Conclui Luiz Flávio Gomes que “ao proibir a progressão,

destruiu o conteúdo essencial da individualização da pena na fase de execução. Nenhuma

norma regulamentadora de direitos fundamentais pode, a pretexto de regulamentá-la, eliminar

o conteúdo do direito”.

Desde a edição da lei dos crimes hediondos até fevereiro 2006, O STF vinha se

manifestando pela constitucionalidade do dispositivo, como por exemplo dos julgados

abaixo:.

Jurisprudência: STF "HABEAS-CORPUS". CRIME HEDIONDO. CONDENAÇÃO POR INFRAÇÃO DO ART. 12, PAR. 2. II, DA LEI N. 6.368/76. CARACTERIZAÇÃO. REGIME PRISIONAL. CRIMES HEDIONDOS. CUMPRIMENTO DA PENA EM REGIME FECHADO. ART. 2. PAR. 1., DA LEI 8.072/90. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5., XLVI,

DA CONSTITUIÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE NÃO CARACTERIZADA. INDIVIDUALIZACAO DA PENA. REGULAMENTAÇÃO DEFERIDA, PELA PRÓPRIA NORMA CONSTITUCIONAL, AO LEGISLADOR ORDINÁRIO. A LEI ORDINÁRIA COMPETE FIXAR OS PARÂMETROS DENTRO DOS QUAIS O JULGADOR PODERÁ EFETIVAR OU A CONCREÇÃO OU A INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. SE O LEGISLADOR ORDINÁRIO DISPÔS, NO USO DA PRERROGATIVA QUE LHE FOI DEFERIDA PELA NORMA CONSTITUCIONAL, QUE NOS CRIME HEDIONDOS O CUMPRIMENTO DA PENA SERÁ NO REGIME FECHADO, SIGNIFICA QUE NÃO QUIS ELE DEIXAR, EM RELAÇÃO AOS CRIMES DESSA NATUREZA, QUALQUER DISCRICIONARIEDADE AO JUIZ NA FIXAÇÃO DO REGIME PRISIONAL. (HC-69603 / SP, Publicado no DJ de 23-04-93, p. 06922, TRIBUNAL PLENO, Rel. Min. PAULO BROSSARD).

Jurisprudência: STJ CONSTITUCIONAL E PENAL. CRIME HEDIONDO. TRAFICO DE ENTORPECENTES. PENA. REGIME FECHADO. 1 - A PENA PELO CRIME DE TRAFICO DE ENTORPECENTES (ART. 12, DA LEI 6.368/1976) DEVE SER CUMPRIDA INTEGRALMENTE EM REGIME FECHADO, A TEOR DO ART. 2., PAR. 1., DA LEI 8.072/1990, DECLARADO CONSTITUCIONAL PELO STF (PLENO), "UT" HC 69.603/SP (RISTJ 146/611) E HC 69.657/SP (DJU 18/06/1992). 2 - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (RESP 62105/SP, 95/0011771-1, publicado no DJ de 03/03/1997, p. 04715, Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO).

HC - CRIMES HEDIONDOS - DELITO PREVISTO NO ART. 12 DA LEI 6.368/76 - PENA CUMPRIDA EM REGIME FECHADO - APLICAÇÃO DA LEI 8.072/90. - DISPONDO O LEGISLADOR QUE NOS CRIMES HEDIONDOS O CUMPRIMENTO DA PENA SERA NO REGIME FECHADO, NÃO SE PERMITE AO JUIZ QUALQUER DISCRICIONARIEDADE NA SUA FIXAÇÃO, TAL QUAL ESTABELECER NA FORMA PROGRESSIVA DA EXECUÇÃO. - INEXISTE QUALQUER INCONSTITUCIONALIDADE DO RIGORISMO LEGAL EM APLICAR-SE O ART. 2., PARAGRAFO 1., DA LEI 8.072/90, ANTE O CARATER DE HEDIONDEZ PELA PRATICA DO DELITO PREVISTO NO ART. 12, DA LEI 6.368/76. - ORDEM DENEGADA. (HC 6659/SP 97/0090889-5, 5ª Turma, Rel. Min. CID FLAQUER SCARTEZZINI, publicado no DJ em 15/06/1998).

Em 23 de fevereiro de 2006, por seis votos a cinco (sendo vencidos os Ministros

Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de Mello e Nelson Jobim), por maioria,

os ministros do STF, em meio a gama de princípios constitucionais achou no princípio da

individualização da pena o argumento ideal para decidir pela inconstitucionalidade do

parágrafo 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, que proibia a progressão de regime de cumprimento

de pena nos crimes hediondos. Em que, de acordo com o inciso XLVI, do artigo 5º, da

Constituição da República:

“A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: privação ou

restrição de liberdade; perda de bens; multa; prestação social alternativa; suspensão ou

interdição de direitos”.

Apesar de a decisão do STF tenha sido proferida em controle difuso de

constitucionalidade, sem força vinculante, o entendimento predominante foi alterado.

O assunto foi analisado no Habeas Corpus 82959 impetrado por Oséas de

Campos, condenado a 12 anos e três meses de reclusão por molestar três crianças entre 6 e 8

anos de idade (atentado violento ao pudor).

Na prática, a decisão do Supremo, que deferiu o HC, se resume a afastar a

proibição da progressão do regime de cumprimento da pena aos réus condenados pela

prática de crimes hediondos. Caberá ao juiz da execução penal, segundo o Plenário, analisar

os pedidos de progressão considerando o comportamento de cada apenado – o que caracteriza

a individualização da pena.

É de bom alvitre mencionar que outros argumentos doutrinários sustentavam a

possibilidade da progressão da pena em razão das Leis 9.034/95 (Lei de combate ao crime

organizado) e 9.455/97 (Lei de Tortura), dispondo diversamente sobre progressão de pena,

assim redigidas:

Lei 9.034/95, art. 10 – “Os condenados por crimes decorrentes de organização

criminosa iniciarão o cumprimento da pena em regime fechado”.

A situação se resolve, segundo lição de Luiz Flávio Gomes, da seguinte maneira:

“se o crime organizado por extensão for de natureza hedionda, a lei nova é mais benéfica e,

portanto retroage; do contrário, a crimes não-hediondos a lei nova é prejudicial, porque fixa

peremptoriamente o regime inicial fechado; é, assim, irretroativa” .

O legislador pecou de maneira capital no dispositivo da Lei 9.034/95, que

pretenciona combater o crime organizado. Queria punir mais severamente a criminalidade

decorrente das organizações criminosas, mas só conseguiu beneficiar a criminalidade

hedionda decorrente destas organizações.

Nestes casos, como exceção à regra do art. 33 do Código Penal, os crimes

decorrentes de organização criminosa, sejam punidos com reclusão ou com detenção

obrigatoriamente tem o cumprimento da pena inicio no regime fechado. Eis a gafe do

legislador, esqueceu-se dos crimes hediondos. Criou-se uma situação no mínimo injusta: O

membro de organização criminosa, que metodicamente comete crimes hediondos ou

equiparados é beneficiado com a progressão de regime, enquanto o outro, criminoso solitário

e ocasional nas mesmas infrações, deve cumprir integralmente a pena em regime fechado.

Com a Lei 9.455/97, o legislador perdeu uma grande oportunidade para reparar os

erros da Lei. 8.072/90. Perdeu e criou mais injustiças. Abriu o benefício da progressão para os

indivíduos condenados por tortura, continuando a proibição para os condenados por crimes

hediondos, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo, salvo se estes forem

praticados por organização criminosa que também tem direito ao benefício.

Lei 9.455/97, art. 1º, § 7º - O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a

hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado. Pergunta-se, foi

revogado o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, pelas leis mencionadas? Como resposta mais dois

entendimentos contrários:

§ 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 NÃO FOI REVOGADO - continua sendo a regra,

os crimes de tortura (art. 1º, § 7º da Lei 9.455/97) e decorrentes de organização

criminosa (art. 10 da Lei 9.034/95) a exceção. É a posição de J. F. Mirabete

(Tortura: Notas sobre a Lei 9.455/97, RT 746/476). Para o ilustre penalista os

dispositivos não foram revogados pela Lei 9.455/97. Neste mesmo sentido, para o

Supremo Tribunal Federal, a Lei de Tortura não revogou o dispositivo da Lei

8.072/90, este continua aplicável, salvo no caso da tortura, onde se aplica o art.

1º, § 7º., mas esse discussão perdeu o sentido em razão da inconstitucionalidade

declarada, pelo próprio STF em 23 de fevereiro de 2006 no HC 82959, bem

como com o advento da lei 11.464/07

§ 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 FOI REVOGADO pelo art. 1º, § 7º da Lei

9.455/97 - os delitos dos arts. 1º e 2º da Lei 8/072/90 são colocados no mesmo

nível, recebendo idêntico tratamento constitucional. Não cabe ao legislador

distingui-los. Em outras palavras, os crimes hediondos, a tortura, o terrorismo e o

tráfico ilícito de drogas foram equiparados pela Constituição Federal, não

podendo a legislação ordinária fazer distinção entre estes, a lei nova, sendo mais

benéfica, revogou tacitamente o § 1º do art 2º da Lei 8.072/90. É adotada pelo

STJ.

Para exemplificar a jurisprudência in verbis:

 Jurisprudência: STF HC - INDEFERIDO PEDIDO DE HABEAS CORPUS EM QUE SE PRETENDIA A APLICAÇÃO DA LEI 9.455/97 — CUJO ART. 1º, § 7º, ASSEGURA AO CONDENADO POR CRIME DE TORTURA O INSTITUTO DA PROGRESSÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA — A RÉU CONDENADO POR CRIME HEDIONDO (ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR). DE ACORDO COM A ORIENTAÇÃO ADOTADA PELO PLENÁRIO NO JULGAMENTO DO HC 76.371-SP (SESSÃO DE 25.3.98, V. INFORMATIVO 104), A TURMA AFIRMOU QUE O REFERIDO ART. 1º, § 7º, DA LEI 9.455/97, NÃO DERROGOU O ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90, QUE IMPÕE AOS CONDENADOS POR CRIME HEDIONDO O CUMPRIMENTO INTEGRAL DA PENA EM REGIME FECHADO. PRECEDENTE CITADO: HC 76.543-SC (DJU DE 17.4.98). HC 76.936-SP, rel. Min. Sydney Sanches, 2.6.98. (Informativo STF, nº 113, 1º a 5 de junho de 1998).

Jurisprudência: STJ HC - PENAL - CRIME HEDIONDO - PENA - EXECUÇÃO - REGIME INTEGRALMENTE FECHADO - RESP - CONSTITUCIONAL - PENAL - EXECUÇÃO DA PENA – CRIMES HEDIONDOS (LEI 8.072/90) - TORTURA (LEI 9.455/97) - EXECUÇÃO - REGIME FECHADO - A Constituição da República (art. 5º, XLIII) fixou regime comum, considerando-os inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. A Lei 8.072/90 conferiu-lhes a disciplina jurídica, dispondo: "a pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado" (art. 2º, § 1º). A Lei 9.455/97 quanto ao crime de tortura registra no art. 1º - 7º: "O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado. A Lei 9.455/97, quanto à execução da pena, é mais favorável do que a Lei 8.072/90. Afetou, portanto, no particular, a disciplina unitária determinada pela Carta Política. Aplica-se incondicionalmente. Assim, modificada, no particular a Lei dos Crimes Hediondos. Permitida, portanto, quanto a esses delitos, a progressão de regimes. Matéria solucionável no âmbito da legislação infraconstitucional. (HC 6809/DF 98/0001143-9, 6ª Turma, Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, publicado no DJ em 17/08/1998).

A partir do julgamento do HC 82959, predominou o entendimento de que,

analisando o caso concreto, a progressão de regime é válida, para os crimes hediondos e

equiparados, nos termos do artigo 112 da Lei de Execuções Penais - Lei 7210/84.

Por derradeiro, após o movimento ocasionado pelo julgamento do Habeas Corpus

n°82959, foi promulgada, em 29 de março de 2007, a Lei n° 11.464/07, a qual alterou o artigo

2° da Lei n° 8.072/90, passando a vigorar a seguinte redação:

“Art. 2º (...)

II- fiança.

§ 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado.

§ 2º A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á

após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três

quintos), se reincidente.

§ 3º Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá

apelar em liberdade.

§ 4º A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos

crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em

caso de extrema e comprovada necessidade.” (NR)

Conforme nova redação, as penas dos crimes hediondos ou equiparados

deverão ser cumpridas em regime inicialmente fechado e será permitida a liberdade

provisória e a progressão de regime, mas não mais nos termos da lei de Execuções Penais, e

sim nos termos desta lei, ou seja, após o cumprimento de 2/5 da pena, se o réu for primário e

3/5 se for reincidente.

Com relação a aplicação da progressão de regimes, o entendimento que

predominante é o de que a lei 11.464/07 deve retroagir em sua parte benéfica, ou seja,

permitir a progressão aos delitos praticados antes de sua publicação.

Entretanto, a nova forma de progressão mostra-se prejudicial em comparação ao

regime estabelecido pela LEP, formando o entendimento de que caberá a progressão de

regime adotada no artigo 112 da Lei 7.210/84 aos delitos praticados antes da nova lei.

Aos delitos praticados a partir do primeiro segundo do dia 29 de março de 2007,

deve-se aplicar a progressão estabelecida na Lei n°11.464/07, inclusive para os crimes de

tortura, previstos na Lei n° 9.455/97.

Livramento Condicional: Reincidência Específica

A lei 8.072/90 alterou as regras do Código Penal sobre a concessão de livramento

condicional. Ampliou o prazo de cumprimento da pena para alcançar o benefício. Nos termos

do CP, com a nova redação, o juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado por

crime hediondo ou equiparado, desde que:

Possua comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom

desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria

subsistência mediante trabalho honesto;

Tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela

infração;

Cumpra mais de dois terços da pena, se não for reincidente específico em crimes

dessa natureza.

A atual lei de drogas não trouxe regramento sobre início de cumprimento de pena,

tendo sido omissa a esse respeito como também o foi a lei antiga. Portanto, o juiz deve agir da

mesma forma que o fazia com a lei anterior, ou seja, aplicando a regra de cumprimento de

pena da lei 8072/90 para os crimes hediondos e equiparados a hediondos, ou seja, regime

inicialmente fechado.

A Lei 8.072/90 ressuscitou a chamada “reincidência específica”, fórmula

abandonada há décadas. A redação desastrosa do dispositivo dá margem a outros conflitos

doutrinários. O que queria dizer o legislador com a expressão “reincidente específico em

crimes dessa natureza”. Duas posições sobre a abrangência da expressão fazem-se ouvir:

1. AMPLIATIVA – A expressão crimes dessa natureza engloba os crimes hediondos, e

aqueles previsto no art. 1º da Lei 8.072/90. Não é necessário que o condenado cometa

duas condutas típicas idênticas, v.g., dois homicídios qualificados ou dois estupros

para ser reincidente específico. Damásio defende este entendimento, no qual é seguido

por Antônio Scarance Fernandes e por J. F. Mirabete que arremata: “a referência à

reincidência específica realmente dificulta a interpretação, pois bastaria à lei fazer

menção ao ‘reincidente em crimes dessa natureza’”.

2. RESTRITIVA – Recorrem à noção clássica da reincidência específica. Para esta

corrente, escudada por Alberto Silva Franco , a reincidência específica deve resultar

ora da identidade absoluta, ora da identidade relativa das condutas, esta última

resultante da conjugação dos fatos constitutivos e dos motivos determinantes. Assim

será reincidente específico quem comete dois estupros ou um estupro e um atentado

violento ao pudor, mas não quem comete estupro e latrocínio.

Finalmente, como o dispositivo é mais gravoso e possui natureza penal, é

irretroativo, não se aplica aos mesmos crimes praticados antes da vigência da Lei 8.072/90.

A reincidência específica também não deve ser reconhecida valendo-se de crimes

praticados ou punidos antes da Lei 8.072/90, portanto, não se reconhece a reincidência

específica a quem foi condenado por ter cometido um estupro em 1980 e novamente

condenado pelo mesmo crime, praticado, desta vez, sob a égide da nova redação dada ao art.

83 do Código Penal.

ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E QUADRILHA OU BANDO (ESTA DISCUSSÃO É MERAMENTE

HISTÓRICA. COM A PROMULGAÇÃO DA LEI 11.3434/06 DEIXOU DE TER SENTIDO DISCUTÍ-

LA)

A Lei 8.072/90, pródiga em disposições controvertidas, estabeleceu nova pena para o delito

de Quadrilha ou Bando , art. 288 do Código Penal, quando destinada à pratica de crimes

hediondos ou dos crimes de tortura, de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e de

terrorismo. Eis a redação de seu art. 8º, caput:

Art. 8º - Será de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código

Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes

e drogas afins ou terrorismo.

Acontece que não se aplica às condutas tipificadas nos arts. 12 e 13 da Lei 6.368/90 o art. 288

do CP, mas o art.14 da Lei de Tóxicos, mais gravosa e com elementos distintos da figura do

art. 288 do CP. Dispunha a Lei 6.368/76 que:

Art. 14 - Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente

ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 12 e 13 desta Lei:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360

(trezentos e sessenta) dias-multa.

Novamente a Lei 8.072/90, em sua afoiteza e estouvada repressividade, mais beneficia do que

agrava. Desejou endurecer com as quadrilhas ou bandos, e acabou beneficiando as

associações criminosas destinadas ao tráfico de tóxicos.

E agora? Revogou-se o art. 14? Às associações ou quadrilhas que praticam crimes de tráfico

ilícito de entorpecentes e drogas afins aplica-se o art. 14 da Lei 6.368/90 ou o art. 288 do CP?

A causa de aumento do P.U. do art. 288 (quadrilha ou bando armado) é aplicável a estes

crimes?

Respondemos. Como não poderia deixar de ser, surgiram interpretações antagônicas na

doutrina. Três em princípio:

1. Art. 14 NÃO FOI REVOGADO pelo art. 8º da Lei 8.072/90. O art. 14 foi mantido

íntegro, regulando as hipóteses da Lei 6.368/90. Aos demais casos aplica-se o art. 288

do CP.

2. Art. 14 FOI REVOGADO pelo art. 8º da Lei 8.072/90. É a posição de Alberto Silva

Franco. Para ele, “não bastará a associação de duas ou mais pessoas...,é mister, nos

termos do art. 288 do Código Penal, que a associação criminosa seja constituída, no

mínimo, de quatro pessoas, vinculadas à realização de um programa delinqüencial e

que a organização montada, para a prática de uma série indeterminada de crimes de

tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, apresente um certo grau de estabilidade”

.

3. Art. 14 foi PARCIALMENTE REVOGADO pelo art. 8º da Lei 8.072/90. É A posição

de Damásio, do STF e espelha o melhor entendimento. Mantém-se a figura típica do

art. 14 da Lei 6.368/76, dada sua distinção do art. 288 do CP. Para a associação bastam

duas pessoas, reunidas para a realização das condutas descritas nos art. 12 e 13 da

mesma lei, para o art. 288 do CP, são necessários, pelo menos, quatro delinqüentes,

associados para a prática de qualquer crime. Entretanto, não mais se aplica a pena de

reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e

sessenta) dias-multa cominada pela Lei 6.368/90. Como a Lei 8.072/90 é mais branda,

a pena aplicável é a do art. 8º da Lei 8.072/90: 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão.

Jurisprudência: STF PENAL. PROCESSUAL PENAL. "HABEAS CORPUS".

ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES. Lei 6.368/76, art. 14. Lei

8.072/90, art. 8º. - Tratando-se de associação para o tráfico de drogas, prevalece a tipificação

do art. 14 da Lei 6.368/76, vale dizer, a associação de duas ou mais pessoas, para praticar,

reiteradamente ou não, o tráfico de drogas, tipifica o delito do art. 14 da Lei 6.368/76. A pena

a ser aplicada será a prevista no art. 8º da Lei 8.072/90, isto é, reclusão de três a seis anos.

Precedentes do STF. II - A absolvição de um dos réus do crime de associação para a prática

do tráfico de drogas não modifica a situação dos outros dois réus, que também haviam sido

condenados como incursos no art. 14 da Lei 6.368/76. HC nº 73119-8 Rel.: Min. Carlos

Velloso (Informativo STF, nº 27, de 15 a 19 de abril de 1986).

Jurisprudência: STJ RESP - PENAL - LEI 6368/1976 (ART. 14) E CODIGO PENAL (ART.

288, REDAÇÃO DO ART. 8, DA LEI 8072/1990) - O CRIME DEFINIDO NO ART. 14, DA

LEI 6368/1976 NÃO FOI REVOGADO PELA REDAÇÃO DO ART. 288, DADA PELO

ART. 8, DA LEI 8072/1990. AMBOS OS ILICITOS LEVAM EM CONTA A

PARTICIPAÇÃO PLURAL DE PESSOAS, O QUE FACILITA O AGENTE CONSUMAR

A INFRAÇÃO PENAL. TAIS LEIS CONSIDERAM DUAS SITUAÇÕES JURIDICAS

QUE NÃO SE CONFUNDEM. URGE, POREM, PROMOVER A CRITICA DA

COMINAÇÃO DAS PENAS. O TIPO MAIS GRAVE NÃO PODE CONTEMPLAR

SANÇÃO MENOS RIGOROSA. A INDIVIDUALIZAÇÃO (COMO PRINCIPIO), MESMO

NA PRIMEIRA ETAPA (DEFINIÇÃO LEGAL), PRECISA SER COERENTE. IMPÕE-SE,

ENTÃO, CORRIGIR A ANOMALIA E CONSIDERAR O MAXIMO DA PENA

COMINADA IGUAL AO ART. 288, OU SEJA - RECLUSÃO DE 6 ANOS. PRECEDENTE

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. (RESP 85965/SP, 96/0002582-7, publicado no DJ

de 07/10/1996, p. 37689, Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO).

O art. 288 do Código Penal, em seu parágrafo único, menciona uma causa de aumento de

pena quando se tratar de quadrilha armada. Não houve menção da Lei 8.072/90 sobre esta

causa de aumento. Resultado. Dois outros entendimentos:

1. P.Ú. do art. 288 NÃO É APLICÁVEL aos casos do art. 8º da Lei 8.072/90. Nesse

sentido Alberto Silva Franco argumenta que a “omissão do legislador evidencia que

seu intento não era agravar o de agravar, em particular, a pena reclusiva, caso a

quadrilha ou bando fosse armado. A exacerbação sofrida,...., é suficiente para abarcar

a causa de aumento excluída e compensá-la amplamente” .

2. P.Ú. do art. 288 É PLENAMENTE APLICÁVEL aos casos do art. 8º. É a posição do

STF. “BANDO ARMADO E CRIME HEDIONDO - Tratando-se de associação de

mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para a prática de crimes definidos como

hediondos, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e terrorismo (Lei 8072/90, art. 8º),

não é de afastar-se a incidência da qualificadora prevista no par. único do art. 288 do

CP”(HC 73.596-RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 16.04.96. publicado no Informativo STF

nº 27, de 15 a 19 de abril de 1996) .

Jurisprudência: STF QUADRILHA ARMADA E CRIME HEDIONDO - AO

DETERMINAR O AUMENTO DA PENA “PREVISTA NO ART. 288 DO CÓDIGO

PENAL, QUANDO SE TRATAR DE CRIMES HEDIONDOS, PRÁTICA DA TORTURA,

TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E DROGAS AFINS OU TERRORISMO”, O

ART. 8º DA LEI 8072/90 NÃO AFASTOU A QUALIFICADORA DO PARÁGRAFO

ÚNICO DO ART. 288, QUE PRESCREVE A APLICAÇÃO EM DOBRO DA PENA SE A

QUADRILHA OU BANDO É ARMADO. ADMITINDO EMBORA A POSSIBILIDADE

DE CONCURSO DESSAS DUAS CAUSAS DE AUMENTO DE PENA, A TURMA

DEFERIU EM PARTE PEDIDO DE HABEAS CORPUS, TENDO EM VISTA A NÃO

OBSERVÂNCIA, NA ESPÉCIE, DO ART. 68, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP (“NO

CONCURSO DE CAUSAS DE AUMENTO OU DE DIMINUIÇÃO PREVISTAS NA

PARTE ESPECIAL, PODE O JUIZ LIMITAR-SE A UM SÓ AUMENTO OU A UMA SÓ

DIMINUIÇÃO, PREVALECENDO, TODAVIA, A CAUSA QUE MAIS AUMENTE OU

DIMINUA.”). (HC 74.269-RJ, rel. Min. Néri da Silveira, 03.12.96, Informativo STF, nº 56,

de 02 a 06 de dezembro de 1996).

Jurisprudência: STJ - QUADRILHA OU BANDO. CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

PELO EMPREGO DE ARMA (PARAGRAFO UNICO DO ART. 288) E PELO OBJETIVO

DE PRATICA DE CRIMES HEDIONDOS (ART. 8., CAPUT, DA LEI 8.072/90).

POSSIBILIDADE, EM TESE, DO CONCURSO DESSAS DUAS CAUSAS SE AUMENTO.

HIPOTESE, TODAVIA, EM QUE SE IMPÕE A APLICAÇÃO DA REGRA DO

PARAGRAFO UNICO DO ART. 68 DO CODIGO PENAL, OU SEJA, UM SO

AUMENTO, PREVALECENDO A CAUSA QUE MAIS AUMENTE. NÃO SE PODENDO,

CONTUDO, EMPREENDER, NA VIA SUMARISSIMA DO "HABEAS CORPUS",

REEXAME E NOVA DOSIMETRIA DA PENA, RESSALVA-SE AO PACIENTE ESSE

REEXAME NO JULGAMENTO DE RECURSO DE APELAÇÃO OU, SE JA OCORRIDO,

ATRAVES DE REVISÃO CRIMINAL. RECURSO DE "HABEAS CORPUS"

IMPROVIDO. (RHC 3853/RJ , 94/0025599-3, publicado no DJ de 07/11/1994, p. 30026, Rel.

Min. ASSIS TOLEDO).

Não se pode deixar de mencionar que com o advento da Lei 9.034/95, dispondo sobre as

organizações criminosas, novas complicações foram adicionadas à já intrincada e

controvertida questão dos grupos de criminosos. Agora, além dos meros e eventuais

concursos de agentes, com suas regras próprias, das associações criminosas da Lei 6.368/90,

das quadrilhas ou bandos do CP e da Lei 8.072/90, temos ainda as organizações criminosas da

Lei 9.034/95. A Lei de combate ao crime organizado, não conceituou o “crime organizado”,

tão somente remeteu ao art. 288 do Código Penal. Mas é evidente que quadrilha e organização

criminosa não se confundem. A segunda possui um plus em relação à primeira, que a Lei

9.034/90 deixou de mencionar. Cabe à doutrina e à jurisprudência repararem a omissão.

DELAÇÃO PREMIADA

O legislador influenciado principalmente pela legislação italiana, criou uma causa

de diminuição da pena para o associado ou partícipe que entregar seus companheiros, batizada

pela doutrina de “delação premiada”. Reza o Parágrafo Único do art. 8º da Lei 8.072/90, que:

O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha,

possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).

Também aplicou a redução ao crime de extorsão mediante seqüestro, através da

adição do § 4º ao art. 159 do Código Penal, assim redigido:

Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade,

facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

A delação premiada vem sendo severamente criticada. Sob o ponto de vista sócio-

psicológico ela é imoral ou, no mínimo, aética pois estimula a traição, comportamento

insuportável para os padrões morais hodiernos, seja dos homens de bem, seja dos mais vis

criminosos.

Sob o aspecto jurídico ela, por via oblíqua, rompe com o princípio da

proporcionalidade da pena. Se punirá com penas extremamente diferentes pessoas envolvidas

no mesmo fato e com idênticos graus de culpabilidade.

Por fim, questiona-se sua aplicabilidade. A delação premiada se revela um

instrumento inócuo, de rara aplicação. Qual o criminoso, em sua sã consciência, ainda que

tentado pelos benefícios oferecidos, se sujeitará a carregar a pecha de “alcagüete”, de traidor,

ciente que no submundo – incluindo a prisão – receberá a morte pela traição?

Luiz Flávio Gomes, em irretocável lição, revela que ao se “chegar ao ponto de

estabelecer em ‘lei’ prêmios a um criminoso traidor só existe uma explicação: é a prova mais

contundente da pública e notória ineficiência do Estado atual para investigar e punir os crimes

e os criminosos” .

Não basta, entretanto, a mera delação para que o criminoso se beneficie, deve

resultar na efetiva libertação do acusado, ou nos casos de quadrilha, associação criminosa ou

concurso de agentes, na prisão ou desmantelamento do grupo. Conforme revelação de Alberto

Silva Franco, A conduta deve ser objetivamente relevante e subjetivamente voluntária.

CAUSA DE AUMENTO DE PENA

Prosseguiu o legislador com o teratológico caráter repressivo da Lei dos Crimes

Hediondos, criando em seu art. 9º mais uma causa de aumento, aplicável quando o vítima

estiver nas situações onde se presume a violência, previstas pelo art. 224 do Código Penal .

Nestes casos, a pena será acrescida de metade, nos termos do art. 9º, transcrito a seguir:

 Art. 9º - As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º,

158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput

e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, todos do

Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de 30 (trinta) anos de

reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224 também do Código

Penal.

Observe-se que com a edição da lei 12.015/06 não se aplica este dispositivo aos

arts. 213 e 214, ambos do CP, posto que foram revogados e fundidos num único crime do art.

213 e a presunção de violência que era trazida pelo art. 224 do CP hoje é tratada como

vulnerável, pelo art. 217-A e 225, parágrafo único, ambos do CP

Portanto, a pena, por sinal já muito grave, será aumentada de metade, nestas

hipóteses, taxativamente arroladas pelo art. 9º, não se estende aos demais crimes hediondos, o

homicídio simples quando praticado em atividade típica de grupos de extermínio, homicídio

qualificado, falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins

terapêuticos ou medicinais e genocídio, nem ao delitos equiparados, tortura, tráfico ilícito de

entorpecentes e drogas afins o terrorismo. A causa de aumento é aplicável apenas nos

seguintes crimes hediondos: · 

1. Latrocínio

2. Extorsão qualificada pela morte

3. Extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada

Prazos procedimentais

Na Lei 7.960/89, que instituiu a prisão temporária, em seu art. 2º, ficou

estabelecido o prazo de 5 dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e

comprovada necessidade. Este prazo foi dilatado para 30 dias prorrogável por igual período se

presente extrema e comprovada necessidade nas infrações penais previstas na Lei 8.072/90,

conforme redação dada ao § 3º do seu art. 2º:  

§ 3º - A prisão temporária, sobre a qual dispões a Lei n. 7.960/89, de 21 de

dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de trinta dias, prorrogável

por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.

Art. 3º: Norma Programática.

Por fim, devemos mencionar o disposto pelo Lei dos Crimes Hediondos em seu art. 3º:

Art 3º - A União manterá estabelecimentos penais, de segurança máxima, destinados

ao cumprimento de penas impostas a condenados de alta periculosidade, cuja

permanência em presídios estaduais ponha em risco a ordem ou incolumidade

pública.

Trata-se de mera norma de conteúdo programático, repetição supérflua do art. 86,

§§ 1º e 2º da Lei 7.210/84, carente de conteúdo prático e de difícil realização num curto ou

médio prazo.