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1 Isabel Nobre Vargues Universidade de Coimbra/CEIS20 Espaço público e história da comunicação contemporânea: os casos Dreyfus, “Guerra dos Mundos”e Watergate Resumo: Na história da comunicação e dos media na época contemporânea três acontecimentos e seus desenvolvimentos, o caso Dreyfus, entre 1894 e 1906, a “Guerra dos Mundos”, entre 1938 e 2005, e o caso Watergate, entre 1972 e 2005, estão associados ao aparecimento e ao aprofundamento da cultura política democrática. Ao longo do século XX foram tratados e amplificados na imprensa periódica, na edição, no cinema, na rádio, na televisão de forma quase exaustiva. Esses casos definiram a construção de um novo espaço público, nos dois últimos séculos, em vários países e também com importantes repercussões em Portugal. Neles se pode verificar como o acontecimento se sobrepõe ao argumento, e o espectáculo se sobrepõe ao debate. O novo espaço público é indiscutivelmente mediatizado. Palavras-chave: Espaço público História da comunicação Dreyfus Guerra dos Mundos Watergate O espaço público contemporâneo transformou-se graças à evolução dos media e ao peso cada vez maior da opinião pública nas sociedades. A tradição clássica associou desde cedo a existência de um espaço público aos valores fundamentais da cultura política democrática, à ideia de indivíduos livres construindo as suas opiniões racionalmente e desenvolvendo o pensamento graças à existência de uma imprensa livre. A invenção da imprensa foi revolucionária em muitos aspectos e também o foi na sua contribuição para a construção do conceito de cultura política e de opinião pública, em particular, nos dois últimos séculos. Recorde-se que é a partir dos Ensaios de Montaigne (1533-1592), começados a publicar em 1580, que se esboça um conceito moderno de opinião pública, como uma forma de sentir comum, baseada na imprensa que então era emergente. No

Media, Os Casos Que Mudaram o Espaço Publico

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Historia resumida dos media

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    Isabel Nobre Vargues

    Universidade de Coimbra/CEIS20

    Espao pblico e histria da comunicao contempornea: os casos

    Dreyfus, Guerra dos Mundose Watergate

    Resumo: Na histria da comunicao e dos media na poca contempornea trs

    acontecimentos e seus desenvolvimentos, o caso Dreyfus, entre 1894 e 1906, a Guerra dos Mundos, entre 1938 e 2005, e o caso Watergate, entre 1972 e 2005, esto associados ao aparecimento e ao aprofundamento da cultura poltica democrtica. Ao

    longo do sculo XX foram tratados e amplificados na imprensa peridica, na edio, no

    cinema, na rdio, na televiso de forma quase exaustiva. Esses casos definiram a

    construo de um novo espao pblico, nos dois ltimos sculos, em vrios pases e

    tambm com importantes repercusses em Portugal. Neles se pode verificar como o

    acontecimento se sobrepe ao argumento, e o espectculo se sobrepe ao debate. O

    novo espao pblico indiscutivelmente mediatizado.

    Palavras-chave: Espao pblico Histria da comunicao Dreyfus Guerra dos Mundos Watergate

    O espao pblico contemporneo transformou-se graas evoluo dos media e

    ao peso cada vez maior da opinio pblica nas sociedades. A tradio clssica

    associou desde cedo a existncia de um espao pblico aos valores fundamentais da

    cultura poltica democrtica, ideia de indivduos livres construindo as suas

    opinies racionalmente e desenvolvendo o pensamento graas existncia de uma

    imprensa livre.

    A inveno da imprensa foi revolucionria em muitos aspectos e tambm o foi

    na sua contribuio para a construo do conceito de cultura poltica e de opinio

    pblica, em particular, nos dois ltimos sculos.

    Recorde-se que a partir dos Ensaios de Montaigne (1533-1592), comeados a

    publicar em 1580, que se esboa um conceito moderno de opinio pblica, como

    uma forma de sentir comum, baseada na imprensa que ento era emergente. No

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    sculo XVII as primeiras reflexes em torno desse conceito foram esboadas por

    dois filsofos ingleses, Thomas Hobbes (1588-1679) e John Locke (1632-1704).

    Nos sculos seguintes foram grandes as transformaes polticas na Europa e na

    Amrica sobressaindo o que escreveu Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) sobre a

    opinio popular, a vontade geral no seu Contrato Social; Thomas Jefferson

    (1743-1826) sobre a importncia que atribua aos jornais ( Se me obrigarem a

    decidir entre governar sem jornais ou ter jornais sem governo no hesitaria em

    preferir o ltimo) ou Alexis de Tocqueville (1805-1859), que no livro Da

    Democracia na Amrica, publicado no sculo XIX, consagra a opinio pblica

    como uma fora tirnica e em LAncien Regime et la Rvolution mostrou como o

    desprezo pela religio se desenvolveu e tornou dominante. No se esquea que nos

    sculos XVII e XVIII os jornais e os livros foram vitais para a evoluo de novos

    espaos de opinio, os cafs e os sales, que constituram verdadeiros fruns de

    debate poltico.

    Walter Lippmann (1889-1974) foi o autor de um estudo clssico Public Opinion,

    publicado em 1922. Considerado, por muitos, o mais influente jornalista poltico

    americano do sculo XX, pois ao longo da sua vida os seus escritos editoriais,

    artigos, livros e colunas de opinio influenciaram e afectaram correntes de

    pensamento nacionais e mundiais, a ele se ficou a dever a noo de esteretipo.

    Jrgen Habermas, um dos mais importantes filsofos do sculo XX definiu, em

    1989, a noo de esfera pblica como um frum para a discusso poltica fora do

    espao privado mas tambm fora dos crculos governamentais.

    Elisabeth Nolle-Neuman tem produzido vrias reflexes, desde 1974, sobre a

    influncia dos mass media e, em particular, a ela se ficou a dever um importante

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    conceito operatrio na definio posterior de opinio pblica, a tese da espiral do

    silnciosegundo a qual os media so os criadores da opinio pblica.

    Mona Ozouf, a estudiosa da Revoluo Francesa, acentuou no artigo Esprit

    public, publicado em 1992, no Dictionaire Critique de la Rvolution Franaise, a

    formao do espao pblico burgus e a gnese do esprito pblico e da opinio

    pblica.

    Sobre o novo paradigma da comunicao foi publicado em 1989 um nmero da

    revista Hermes 4. Cognition Communication Politique intitulado Le nouvel espace

    public onde colaboraram, entre outros, Dominique Wolton e Rmy Rieffel.

    Dominique Reyni, o politlogo e professor de Cincia Poltica em Nice

    publicou, em 1998, o estudo Le Triomphe de lopinion publique. Lespace public

    franais du XVI au XX sicle e Carol J. Glynn et allii o livro Public Opinion, em

    1999.

    Nos meados do sculo XIX o aparecimento das democracias de massas define a

    grande alterao do espao pblico poltico e no sculo XX, em 1979, o socilogo

    Pierre Bourdieu (1930-2002) escreveu que a opinio pblica no existena crtica

    que fez ao processo das sondagens, consideradas como uma forma de aferio da

    opinio pblica contempornea tal como defendera, em 1940, George Horace

    Gallup (1901-1984), no livro The Pulse of Democracy: The Public Opinion Poll and

    How It Works . A ele se deve a fundao, em 1935, do American Institut of Public

    Opinion

    Porque nos importante fazer hoje a histria desse novo espao pblico onde a

    comunicao e a cultura poltica adquirem uma nova dimenso? Naturalmente por

    duas razes essenciais: a histria permite-nos a compreenso do presente e

    possibilita-nos perceber, nesse novo espao, o triunfo da opinio pblica, expresso

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    que tomo de emprstimo a partir do ttulo do livro de Dominique Reyni, publicado

    em 1998, e cujo contedo , em meu entender, uma das mais importantes reflexes

    sobre essa temtica que importa ter presente.

    No novo espao pblico a comunicao e, em particular, a comunicao poltica

    (no seu contedo, na sua forma e na imagem que lhe associada) assume um papel

    ainda mais relevante do que tivera no passado na definio de uma cultura poltica.

    No demais acentuar a ideia de que um novo paradigma, o da comunicao,

    mobiliza hoje todos quantos investigam a natureza do espao pblico.

    O advento da ordem democrtica na sociedade de massas contempornea pois

    inseparvel da vontade de conter essas mesmas massas, consideradas perigosas. Para

    tal contriburam algumas mudanas que foram decisivas no sentido de uma

    domesticao da sociedade civil: a passagem da multido ao pblico; a evoluo

    da aco opinio; a transformao da praa pblica no espao pblico e, mais

    recentemente, o aparecimento das sondagens de opinio, sobrepondo-se s

    manifestaes.

    Nesse sentido Dominique Wolton considera que os media, os polticos e as

    sondagens so os trs actores do espao poltico contemporneo e Remy Rieffel

    define a existncia de um vedetismo meditico, assente cada vez mais na

    notoriedade, na teatralizao e na rotulagem das personalidades.

    O poder poltico, econmico ou meditico, no ignora a fora da opinio pblica

    nem a importncia da comunicao (opinio publicada) e, por isso, com o advento

    da sociedade de massas, com a existncia de um sufrgio universal igualitrio e com

    o crescente peso e transformao dos media, verificaram-se necessariamente

    significativas mudanas no espao poltico e pblico tal como podemos concluir dos

    estudos que acabei de citar e que permitem ancorar o tema que aqui desenvolvo

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    recordando os mais interessantes casos da histria da comunicao contempornea

    reveladores do poder da comunicao em diversos media e da sua relao com as

    massas.

    Com efeito o papel dos media e do seu poder sobre as sociedades e sobre o pblico

    pode ser estudado a partir do acontecimento e da forma como o acontecimento foi

    analisado. O acontecimento sobrepe-se ao argumento e o espectculo ao debate como

    iremos analisar nos trs paradigmticos exemplos da histria da comunicao

    contempornea que a seguir apresento, ocorridos em tempos e em contextos diferentes.

    Neles, o livro, o panfleto, a caricatura, o jornal, a rdio, o filme ou o documentrio no

    cinema e na televiso desempenharam um papel detonador ou amplificador de algumas

    questes que so hoje objecto de estudo e anlise no espao pblico como a questo do

    poder, da credibilidade ou da manipulao dos media.

    O caso Dreyfus (1894 - 1906)

    O caso Dreyfus originou uma extraordinria exploso social e poltica com

    enormes reflexos no espao pblico. Em que consistiu? Em breve sntese pode afirmar-

    se que foi o clebre caso de injustia judicial, ocorrido em Frana, que condenou um

    oficial Alfred Dreyfus (1859-1935). O caso, da condenao de Dreyfus aos movimentos

    dreyfusista e anti dreyfusista gerados, apaixonou a Frana e o mundo, e o caso

    paradigma numa histria da comunicao, tais as repercusses que teve na opinio

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    pblica francesa e mundial e no desenvolvimento da cultura poltica com o

    aparecimento de um novo personagem, o intelectual, comprometido numa causa.

    Com efeito nasce em 1898 o termo intelectual devido ao papel de Emile Zola

    (1840-1902), o escritor e de Georges Clemenceau (1841-1929), o editor poltico do

    jornal Aurore, onde foi publicada, em 23 de Janeiro de 1898, uma lista de

    personalidades, escritores, sbios e universitrios franceses que assim apoiaram

    publicamente Alfred Dreyfus. Os sectores conservadores, o exrcito e a igreja catlica

    apoiaram a deciso do tribunal militar e os liberais e intelectuais, liderados por Anatole

    France, pseudnimo de Anatole Thibault (1844-1924), que definiu o caso como um

    momento da conscincia humana, e Charles Pguy denunciaram essa deciso. O caso,

    mais do que um erro judicirio, representou o desejo de condenao do Judeu,

    entendido em sentido lato, no espao pblico daquele tempo.

    Alfred Dreyfus era, em 1894, um oficial judeu do Estado-maior do exrcito

    francs que foi condenado, por um tribunal cujas sesses em Novembro e Dezembro de

    1894 decorreram porta fechada e em que foi vedada a presena de jornalistas, por ter

    sido considerado um espio que fornecera informaes aos Alemes pela descoberta de

    um rascunho (bordereau) na delegao diplomtica em Paris.

    O processo desenvolveu-se em vrios momentos: em 1895, Bernard Lazare

    (1865-1903) o jornalista libertrio defensor da causa de Dreyfus apelou reviso da

    pena mas isso s aconteceu em 1906; em 1898 e 1899,o advogado, conhecido pela sua

    forma de arguncia, Fernand Labori (1860-1917) defendeu Zola e Dreyfus nos

    processos em tribunal; e no segundo julgamento, em Rennes, graas ao papel de Zola

    anulou-se o julgamento de 1894 e Zola, condenado priso e obrigado ao exlio em

    Inglaterra de onde regressa em Junho de 1899, morreu acidentalmente, em 1902, sem

    assistir ao fim deste caso.

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    A sociedade francesa dividiu-se extraordinariamente mesmo na esfera mais

    ntima e privada, no seio das famlias, como nos deu conta o celebre caricaturista

    poltico e desenhador de imprensa Caran dAche (1858-1909), pseudnimo de

    Emmanuel Poir, nas pginas do jornal Fgaro, entre 1894 a 1906, aps a 1condenao

    e a priso de Alfred Dreyfus.

    Caricatura de Caran dAche no jornal Le Figaro em 14 de Fevereiro de 1899 alusiva ao caso Dreyfus

    Entre 1894 e 1906 registaram-se doze anos de intrigas, duelos, suicdios,

    manifestaes pblicas, debates nos tribunais e discursos inflamados no Parlamento.

    Outros momentos foram decisivos no desenrolar deste caso tais como em 1898 e em

    1899 com o impacto de um texto do escritor Emile Zola, um texto de interveno, uma

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    carta panfleto intitulada JAccuse, publicada no jornal Aurore, dirigida ao Presidente

    da Repblica, Flix Faure (1841-1899) conhecido como le President soleil e um anti-

    dreifusista.

    O JAcuse de Zola chegou a ser considerado o maior acto revolucionrio do

    sculo (pelo dirigente socialista Jules Guesde) mas o affaire fizera tambm de Zola o

    objecto de inextinguveis dios anti-semitas e a bte noire da extrema-direita

    nacionalista (Medina, 1994:207). O papel de Zola, depois tambm ele processado,

    condenado e exilado, foi determinante na reabilitao de Dreyfus que v ser anulado o

    anterior julgamento de 1894 permitindo o regresso a Frana desde a Ilha do Diabo, na

    Guiana francesa, com um novo julgamento em Rennes, em 1899, que se pronunciou

    pela reabilitao.

    O acto de perdo e o indulto foi concedido a Dreyfus pelo Presidente da

    Repblica Emile Loubet (1838-1929), um republicano moderado foi eleito em 1899

    aps a sbita morte de Faure e que visitou Portugal em Outubro de 1905.Assim, em

    1906, Dreyfus reabilitado com a reintegrao social e poltica definitiva. Uma

    primeira histria do caso Dreyfus, a Histoire de laffaire Dreyfus, publicada em Paris,

    em sete volumes, entre 1901 e 1911, deve-se a Joseph Reinach (1856-1921).

    Foram importantes as principais consequncias deste caso: a reviso de um erro

    judicirio; a vitria dos republicanos e o recrudescimento no espao pblico

    comtemporneo de uma atitude anticlerical profunda e dum forte sentimento

    antimilitarista. Em Frana facilmente conduziu lei de separao da igreja e do estado,

    em 1905.De Frana a todo o mundo houve um enorme impacto deste caso na opinio e

    no espao pblicos e em Portugal foi notvel o nmero de publicaes surgidas e

    noticiadas na imprensa.

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    Deve-se a Joo Medina, em 1994, um dos mais recentes contributos para a

    reflexo sobre o impacto do caso em Portugal o qual inclui ainda importantes anexos e

    uma referncia aos estudos sobre o caso, o anti-semitismo e o anti -clericalismo em

    outros pases. O estudo d ainda conta do tratamento do clebre caso em alguns jornais

    de tendncia republicana e em semanrios de caricaturas de Lisboa como, Marselhesa.

    Suplemento de caricaturas, dirigido por Joo Chagas, e A Carantonha. Jornal

    illustrado, onde Celso Hermnio incluiu algumas caricaturas alusivas a Zola, a Labori e

    a Dreyfus, com o sugestivo ttulo Grandes Carantonhas. Analisa ainda os seis

    opsculos, de uma coleco intitulada Bibliotheca da Elite Social, traduzidos e

    editados no Porto, entre 1898 e 1899, alguns reeditados posteriormente, justamente

    intitulados Questo Zola-Dreyfus: o 1 Emlio Zola, Eu Acuso, Porto, 1898;o 2

    Emlio Zola, Carta Frana, Porto, 1898; o 3 Emlio Zola,Carta

    Mocidade,Porto,1898; o 4 Joseph Reinach, Na Ilha do Diabo, Porto, 1898; o 5

    Bernard Lazare, Como se condena um inocente, Porto, 1899 e o 6 Emlio Zola,O 5

    Acto,Porto,1899.

    O eco deste caso na opinio e no espao pblico portugus colheu apoio dos

    republicanos e a causa de Dreyfus foi defendida ainda entre ns por nomes como Ea de

    Queiroz, Joo Chagas, Cristvo Aires e Francisco Mayer Garo. Como lembra Joo

    Medina e cito o essencial do caso Dreyfus era coevo do gabinete ditatorial

    Hintze/Franco tambm conhecido por primeira ditadura de Joo Franco que durou

    de 1893 a 1897, e durante o qual, alm da aprovao da liberticida lei dos anarquistas

    (13-2-1896), se fez uma reviso constitucional antiliberal e se tomaram outras medidas

    que marcaram de modo claro o intuito de desmantelar o sistema liberal representativo

    portugus; e isso numa altura em que os humanitarismos e as fainas progressistas do

    liberalismo caseiro (antigo ou republicanizado) e do mais recente setentismo

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    comeavam a dar lugar aos nacionalismos e nativismos tribalistas e retrgrados da

    gerao noventista, neo-garretista ou contra-revolucionria, onde a questo religiosa,

    herdada dos primeiros tempos da implantao do regime liberal entre ns,

    periodicamente aflorando em quezlias pontuais envolvendo o regresso de algumas

    ordens religiosas ao arrepio da legislao do Mata-Frades, se reacendia com

    progressivo furor, sobretudo desde o centenrio de Pombal (1882) questo Calmon

    (1901), passando pelo caso Sara de Matos (1891), pelas contra manifestaes do

    centenrio antonino de 1895 e ainda, j depois de dobrado o sculo dezanove, por um

    interminvel brotar de querelas ideolgicas entre clericais e anticlericais, catlicos e

    republicanos (Medina, 1994: 127-128).

    Em sntese: o caso Dreyfus relanou a questo judaica na Europa ocidental,

    despoletou a construo do estado Judaico na Palestina e marcou a histria da

    comunicao e do espao pblico contemporneos. A agitao comunicacional foi

    grande e na imprensa multiplicaram-se os processos. No admira pois que sobre ele, as

    personagens, seus discursos e actuaes, tenham incidido mltiplos estudos no sculo

    XX e em vrias lnguas com vrias adaptaes ao cinema. O primeiro filme sobre

    Dreyfus, uma longa-metragem de 240 metros, foi realizado em 1900 por um dos

    pioneiros do cinema, Georges Mlis (1861-1938). O filme LAffaire Dreyfus (1899) foi

    contemporneo do caso e dreyfusista. Outros filmes sobre outras personagens ligadas

    ao caso como, por exemplo, Zola tambm foram realizados ao longo do sculo XX.

    Abundam na Internet vrios recursos associados a este tema mas permito-me

    salientar de entre todos a Biblioteca Nacional de Frana que disponibiliza on line muitos

    textos, imagens e caricaturas alusivos ao caso. Por exemplo: em Gallica LAffaire

    Dreyfus, expression de lantisemitisme e de John Grand-Carteret LAffaire Dreyfus et

    limage: 266 caricatures franaises et trangres. Em 1996, fundou-se a Socit

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    Internationale dhistoire de laffaire Dreyfus cujo objectivo continua a ser o

    aprofundamento do estudo deste caso tendo j publicado alguns trabalhos mais

    recentemente.

    A Guerra dos Mundos (1938-2005)

    Herbert George Wells (1866-1946), o ingls que se auto-proclamava um

    divulgador da cincia foi considerado por muitos historiadores da literatura como um

    dos criadores de fico cientfica. Escreveu, nos fins do sculo XIX, em 1898, o texto

    The War of the Worlds, traduzido em vrios pases, ficcionando nele uma invaso de

    marcianos ao planeta Terra. Dificilmente imaginamos hoje como era ento encarada

    cientificamente a possibilidade de existncia de vida em Marte.

    O que escreveu Wells? Actualizou um tema cientfico sobre a noo de espao e

    demonstrou que no s estava a par do conhecimento cientfico da sua poca, como

    tambm vemos que, nesse seu livro, antecipou algumas tecnologias que hoje no nos

    so estranhas tais como a utilizao de mquinas voadoras, de mquinas de guerra, de

    robots, de armas qumicas e de raios laser.Recorde-se aqui que tais antecipaes no

    deixam de ser importantes num tempo em que a iluminao nocturna ainda era feita

    com a utilizao de gs e em que os meios de transporte terrestres eram dominados pela

    utilizao da traco animal, e s depois o comboio.

    O que conta a histria ficcionada por Wells em The War of the Worlds? a histria

    de uma invaso marciana ao planeta Terra com o objectivo de destruir a vida humana. O

    autor utilizou um estilo especfico com recurso a muitos artifcios para dotar a sua

    histria de grande realismo tendo ento esse livro sido considerado uma obra perigosa

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    pois, ao ficcionar uma guerra entre espcies, Wells fez uma forte crtica social

    combinando nela uma stira poltica com uma advertncia aos perigos do progresso

    cientfico. Muitos consideram esta obra de Wells como uma metfora aos horrores do

    colonialismo europeu no continente americano e uma crtica ao racismo e s atrocidades

    cometidas com a escravatura.

    A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells, romance publicado em 1898, o seu terceiro

    livro de uma trilogia que comeou em 1895 com o livro A mquina do tempo e em 1896

    com O homem invisvel.

    O fin de sicle em que Wells escreveu tem, como bem o salientou Nilson Lage, no

    prefcio do livro organizado por Eduardo Meditsch, Rdio e Pnico. A Guerra dos

    Mundos, 60 anos depois, uma imagem ambivalente: de um lado, a perspectiva de um

    avano sem fim do conhecimento cientfico e fantsticas realizaes da tecnologia; de

    outro, a recesso que tanto lucro d aos banqueiros, o recuo das conquistas sociais, a

    pobreza e a migrao macia de trabalhadores. Esse clima de deslumbramentos,

    angstias e temores indefinidos em que se armou o clima para as guerras mundiais e o

    surgimento do nazismo era o ideal para histrias fantsticas (Lage apud Meditsch,

    1998:13)

    Quarenta anos depois o estilo singular de Wells e a sua maneira de contar inspirou a

    verso radiofnica, em 1938, quando um locutor e artista norte-americano Orson Welles

    (1915-1985) e um roteirista, Howard Koch, decidiram adaptar o texto para um programa

    radiofnico emitido na noite de 30 de Outubro, noite das bruxas, na apresentao que

    ocorreu no Mercury Theatre on the Air da Columbia Broadcasting System (CBS).

    O programa teve ento uma extraordinria repercusso, a partir dos Estados Unidos,

    em parte porque era o prenncio de uma nova guerra que todos sentiam eminente e

    tambm porque ento no se ps em causa a credibilidade do meio. De facto, como nota

  • 13

    o autor que citamos, Nilson Lage a dcada de 30 foi rica em informaes

    surpreendentes: a grande depresso que se seguiu ao crash da bolsa de Nova Iorque, em

    1929; os gangsters e o new deal; o apogeu do rdio e do cinema falado; os xitos

    espectaculares do fascismo e seus produtos promocionais; a ameaa comunista, que j

    era exaltada como uma espcie de demnio oficial, antecipando o discurso da guerra

    fria; a guerra civil espanhola; as novas armas tanques pesados, bombardeiros e caas

    e seu uso, por exemplo, em Guernica ou na ocupao da Tcheco-Eslovquia; as inteis

    conversaes de paz. O radiojornalismo dava conta disso tudo, com seu estilo conciso e

    sensacional e dizia a verdade. Por que mentiria, exactamente tratando de uma coisa

    to grave quanto a invaso marciana? (Lage apud Meditsch:14-15).

    O novo meio, a rdio, consolidou-se nessa dcada de 30 tornando-se o grande

    fenmeno de comunicao de massas. Explicita Rogrio Santos: a rdio um meio

    electrnico de comunicao que associa em si vrias expresses artsticas e de

    informao, tais como o jornalismo, o teatro, a msica e o espectculo. Trata-se da

    primeira indstria cultural, no sentido global do conceito; por isso o filsofo alemo

    Theodor Adorno deu-lhe particular ateno, o mesmo acontecendo com toda a corrente

    americana dos efeitos mediticos (Santos, 2005:18).

    Com efeito, os intelectuais de ento como Bertolt Brecht, Rudolf Arnheim e

    Theodor Adorno dividiram-se entre o fascnio, a preocupao com a sua utilizao

    poltica e o desprezo pelo seu valor cultural. Surgiram novas descobertas sobre o poder

    de mobilizao poltica da rdio, da recepo do meio e da sua influncia vista

    sobretudo ao nvel dos pnicos que ento se verificaram e na sua capacidade de criar

    efeitos. Foi enorme a repercusso no mundo deste programa, com pnicos e suicdios

    tambm, em outros momentos do sculo XX, nos pases em que o episdio radiofnico

    tem sido recriado.

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    A experincia de Orson Welles no programa A Guerra dos Mundos tornou-se um

    mito mas foi ela que possibilitou que vrias caractersticas da rdio pudessem vir a ser

    melhor analisadas. Em alguns pases realizaram-se emisses semelhantes sempre com

    os mesmos efeitos.

    Em Portugal a recriao radiofnica do programa de Orson Welles foi realizada pela

    primeira vez, em plena ditadura, por um jornalista, realizador e apresentador, um

    pioneiro da rdio, Jos de Matos Maia, em 1958 e tal, como acontecera em outros

    locais, causou pnico (o guio pode ser consultado em www.classicosdaradio.com). A

    transmisso da pea intitulada A invaso dos marcianos, na recm criada Emissora

    Catlica Rdio Renascena, em 25 de Junho de 1958, iniciou-se s 20 horas com a

    queda de um enorme objecto em chamas em Carcavelos. Seguiu-se a reportagem e os

    embates em directo durante uma hora at ser interrompida pela PSP e Matos Maia

    conduzido ao Governo Civil e mais tarde interrogado pela PIDE.

    Acentua Dina Cristo: O impacto deste programa efectuou-se quer no pblico

    (alguns ouvintes chamaram os bombeiros) quer na ruptura que representou em relao

    rdio que ento se realizava Era a primeira manifestao de inconformismo em

    relao letargia e ao cinzentismo radiofnico (Cristo, 2005:20.

    Acrescente-se tambm o impacto na sociedade portuguesa ento em plena crise do

    regime salazarista. Decorreram nesse ano e nesse ms as eleies presidenciais de 1958

    e a candidatura de Humberto Delgado o general sem medo tinha sido apresentada

    oficialmente em 19 de Abril. O efeito Humberto Delgado na sua campanha, um

    terramoto, com as visitas apoteticas a algumas cidades, as manifestaes reprimidas

    pela polcia, os comcios, em breve iria abalar o regime.

    A transmisso da pea e as suas consequncias tornaram-se notcia de primeira

    pgina, em Junho de 1958, em muitos jornais que titularam: Um programa radiofnico

  • 15

    perturbou a tranquilidade de muitos lares portugueses e foi interrompido por ordem da

    polcia( Dirio de Notcias); Um programa que fez alarme (Dirio de Lisboa);

    Milhares de pessoas aterrorizaram-se (Dirio Popular); Um programa radiofnico

    estabelece o pnico na populao e origina graves aborrecimentos (A Voz); Uma

    emisso radiofnica que causa alarme (O Sculo); Um romance de fico cientfica

    transmitido por uma emissora provocou o pnico (Primeiro de Janeiro) e Brincadeira

    radiofnica de graves efeitos (Jornal de Noticias).

    Gerou-se o pnico e o alarme e apontaram-se os efeitos. Em 1968 e em 1998, j num

    outro contexto poltico em Portugal mas de novo ocasionando atitudes de medo e de

    novas interrogaes sobre os efeitos e a manipulao dos media, como foi observado em

    colquios, novas emisses radiofnicas da Guerra dos Mundos/A invaso dos

    marcianos aconteceram na Rdio Comercial, em Coimbra na RUC e na Antena 3

    Em sntese: o romance cientfico Guerra dos Mundos, um livro publicado nos

    finais do sculo XIX, foi traduzido em vrias lnguas e em vrias edies, deu origem a

    um programa radiofnico que marcou a histria da comunicao no sculo XX (em

    1938, e em Portugal em 1958,1968 e 1998) e foi adaptado ao cinema e televiso: em

    1953, sendo o produtor George Pal, em 2005, sendo realizador Steven Spielberg e em

    1988, numa srie televisiva. O caso Guerra dos Mundos revelou como o poder da

    comunicao podia ser utilizado para criar iluso e manipulao. Alguns estudiosos tm

    acentuado o facto de que esta emisso radiofnica contribuiu para fazer diminuir a

    confiana nos media.

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    O caso Watergate (1972-2005)

    O caso Watergate, que se desenvolveu desde 1972 a 2005, foi determinante para

    a definio do papel da imprensa, da reportagem e do jornalismo de investigao no

    espao pblico contemporneo. Em que consistiu? Fundamentalmente designa um

    trabalho pioneiro de investigao sobre a corrupo e o suborno, associados a uma

    campanha presidencial, concretizado por dois jornalistas norte americanos, um trabalho

    que veio a ter importantes consequncias polticas.

    Com efeito, as informaes de um espio secreto, e fonte fundamental neste caso, na

    altura conhecido como Garganta Funda e que hoje trinta anos depois, por confisso do

    prprio, em Maio de 2005, se sabe ter sido um ex-agente do FBI, Mark Felt, chegaram

    at dois jornalistas do Whashington Post, Bob Woodward e Carl Bernstein.

    Tais informaes permitiram uma importante investigao posterior sobre a

    corrupo, o suborno e a rede de espionagem, associadas campanha presidencial de

    1972, de Richard Nixon. (follow the money-frase de Mark Felt- e um uso exagerado

    de off the record caracterizaram o caso). A investigao iniciou-se aps a invaso de

    cinco homens ao edifcio comercial Watergate, em Whashington, onde se situava a sede

    do partido democrata, para colher mais elementos.

    O caso Watergate projectou o jornal Whashington Post como um jornal

    comprometido com a causa da verdade, saindo da influncia do New York Times e

    mostrando at onde se pode chegar numa luta sem trguas pelo poder. Perante os

  • 17

    resultados da investigao, durante dois anos, o 37 Presidente norte-americano Richard

    Nixon resignou, em 8 de Agosto de 1974, num desfecho at a impensvel.

    Os reprteres do jornal Washington Post, Bob Woodward e Carl Bernstein, foram

    distinguidos por essa sua reportagem, com o Prmio Pullitzer e editaram um livro, em

    1974, com o ttulo Todos os homens do Presidente. O livro tambm foi adaptado ao

    cinema, em 1976, no filme de Alan Pakula com o mesmo ttulo. (consulte-se, por

    exemplo,Revisiting Watergate www.whashingtonpost.com).

    De novo um acontecimento se sobreps a um argumento e um espectculo ao

    debate.

    Em sntese:

    Nos trs casos excepcionais da histria da comunicao que aqui recordei, ocorridos

    em contextos nacionais e internacionais especficos e diferentes, ficou claro o papel e a

    evoluo do poder da opinio pblica, alimentada pelos vrios media (livro, jornal,

    rdio, filme, internet) que recriaram o (s) acontecimento (s) e a (s) histria (s)

    redefinindo o espao pblico contemporneo.

    Referncias bibliogrficas:

    Sobre o espao e a opinio pblica:

    - AA VV Comunicao e Poltica, Revista de Comunicao e Linguagens, 21-22, (1995), organizao de Mrio Mesquita, em particular o tema II O novo espao pblico, pp.129-270

    - Alves, Jos Augusto dos Santos (2000), A opinio pblica em Portugal (1780-1820),

    particularmente a Introduo, pp.15-56,Lisboa,UAL

    - Bourdieu, Pierre (1989) O poder simblico, Lisboa, Difel

    - Cascais, Fernando (2001) Opinio pblica, Dicionrio de jornalismo, Lisboa, Verbo, pp.146-147

  • 18

    - Crosley, Nick e Robert, John M. (2004) After Habermas.New perspectives on the

    public sphere,Oxford, Blackwell Publishers

    - Esteves,Joo Pissarra (2003) Espao pblico e Democracia. Comunicao, Processos

    de sentido e Identidades Sociais, Lisboa, Edies Colibri

    - Ferry, Jean-Marc (1998) Les transformations de la Publicit Politique Hermes 4,

    pp.15-26

    - Gallup, George e Rae,Saul Forbes (1940) The Pulse of Democracy: The Public

    Opinion Poll and how it Works, New York, Simon and Shuster

    - Glynn, Carrol J. et allii (1999) Public Opinion (em particular o segundo captulo

    The History of Public Opinion , pp.31-63

    - Habermas, Jurgen (1993) LEspace public : archologie de la publicit comme dimension configurative de socit bourgeoise, Paris, Payot

    - Kellner,Douglas (2001) A cultura da mdia. Estudos culturais: identidade e poltica

    entre o moderno e o s-moderno, traduo de Ivone Castilho Benedetti, . Paulo,EDUSC

    - Lippmann, Walter (1922 e 1960) Public opinion, New York, The Macmillan

    Company, edio de 1990 publicada por Transaction Publishers e traduo espanhola de

    2003 com o ttulo, La opinion publica, Madrid, Langre

    - Martins, Carla (2005) Espao pblico em Hannah Arendt, Coimbra, MinervaCoimbra

    - Noelle-Neuman, Elizabeth (1989) La spirale du silence/une thorie de lopinion publique , Hermes 4, pp.181-189

    - Ozouf, Mona (1989) Esprit Public, Dictionnaire de la Rvolution Franaise, pp.711-719

    - Reyni, Dominique (1998) Le Triomphe de lOpinion Publiqu .Lespace public franais du XVI au XX sicle, Paris, Editions Odile Jacob

    - Rieffel, Rmy (1989) Du vedettariat mediatique, Hermes 4, pp.215-222 - Tocqueville, Alexis de (2001) Da Democracia na Amrica, Cascais, Principia

    - Tocqueville, Alexis de (1989) O Antigo Regime e a Revoluo, Lisboa,Fragmentos

    - Thompson, J. B., O Escndalo poltico. Poder e visibilidade na era da mdia

    - Wolton, Dominique, dir. (1989) Le nouvel espace public, Hermes, 4, Cognition Communication Politique, Paris, CNRS

    Sobre o caso Dreyfus :

    - AA VV Dreyfus e a responsabilidade intelectual , (1999) Cadernos de Cultura

    2,Suplemento da Revista Cultura, Lisboa, Centro de Histria da Cultura

    - LAffaire Dreyfus : la verit en marche. Chronologie et prface de Colette Becker (1994), Paris, Flammarion

    - Birbaum, Pierre (1994) LAffaire Dreyfus : la Rpublique en pril, Paris, Dcouverte Gallimard

    - Drouin, Michel dir. (1994) LAffaire Dreyfus de A a Z, Paris, Flammarion - Gervereau, Laurent e Prochasson, Christophe dir. (1994) LAffaire Dreyfus et le tournant du sicle (1894-1910), Paris, BDIC

    - Martins, Jorge O caso Dreyfus (1894-1906) , Revista Histria, n.70,Outubro de 2004,pp.24-35

    - Medina, Joo (1994) O caso Dreyfus em Portugal, Revista da Faculdade de Letras, Lisboa 16/17,pp.115-131

  • 19

    Sobre o caso Guerra dos Mundos:

    - Cristo, Dina (2005) A Rdio em Portugal e o declnio do regime de Salazar e Caetano

    (1958-1974), Coimbra, MinervaCoimbra

    - Meditsch, Eduardo org.(1998) Rdio e Pnico. A Guerra dos Mundos, 60 anos depois,

    Florianpolis, Editora Insular

    - Santos, Rogrio (2005) As vozes da Rdio, 1924-1939.Lisboa, Caminho

    - H.G.Wells A Guerra dos Mundos, traduo de Maria Adelaide Namorado Freire, Mem

    Martins Publicaes Europa-Amrica, 1992 e traduo de H. da Silva Letra, Lisboa,

    Ulisseia, 2002

    Sobre o caso Watergate:

    - Jaworski, Jon (1977), The right and the power, the prosecution of Watergate, New

    York, Pocket Book

    - Schudson, Michael (1992), Watergate in American Memory: how we remember, forget

    and reconstruct the past, New York, BasicBooks

    - Woodward,Bob (2006), O homem secreto: a histria do Garganta Funda do caso

    Watergate, Lisboa, QuidNovi