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12/5/2014 Memorando de entendimento: efeitos jurídicos - Jus Navigandi - O site com tudo de Direito http://jus.com.br/artigos/25097/os-efeitos-juridicos-do-memorando-de-entendimento-no-brasil 1/8 Este texto foi publicado no site Jus Navigandi no endereço http://jus.com.br/artigos/25097 Para ver outras publicações como esta, acesse http://jus.com.br Você está imprimindo a página 1 de 4 desta publicação. Caso queira imprimir o texto completo acesse: http://jus.com.br/imprimir/25097 Os efeitos jurídicos do memorando de entendimento no Brasil Angela Lima Rocha Cristofaro Publicado em 08/2013. Elaborado em 10/2012. Sob a ótica do direito civil brasileiro, toda fase preliminar de negociações contratuais, na qual, normalmente, se insere o memorando de entendimento, deve ser regida pelos princípios de probidade e boa-fé objetiva. O memorandum of understanding (MoU) abrange documentos intitulados de gentlemen’s agreement, heads of agreement, carta de intenção e letter of understanding, assim como as cartas de confidencialidade e as cartas de exclusividade, em razão da troca de informação, tecnologia e expertise entre as partes. Resumo: O presente trabalho visa analisar os efeitos jurídicos do memorando de entendimento segundo a lei brasileira. Nesse sentido, demonstraremos que, do ponto de vista prático, independentemente da forma adotada pelas partes e dos efeitos por elas determinados no documento, o memorando de entendimento poderá gerar controvérsias acerca de seus efeitos jurídicos. Para isso, realizaremos a análise do conceito do memorando de entendimento, em seguida, analisaremos as definições das fases pré-contratual e contratual, previstas no Código Civil Brasileiro, abrangendo as obrigações pré-contratuais e o contrato preliminar, respectivamente, a fim de demonstrar que os efeitos jurídicos do memorando de entendimento no Brasil dependerão não somente dos termos adotados no referido documento, mas também de condutas e deveres de boa-fé objetiva e probidade das partes antes e depois de sua celebração.

Memorando de Entendimento_ Efeitos Jurídicos - Jus Navigandi

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Efeitos jurídicos dos memorandos de entendimentos

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    Os efeitos jurdicos do memorando de entendimento no Brasil

    Angela Lima Rocha Cristofaro

    Publicado em 08/2013. Elaborado em 10/2012.

    Sob a tica do direito civil brasileiro, toda fase preliminar de

    negociaes contratuais, na qual, normalmente, se insere o

    memorando de entendimento, deve ser regida pelos princpios de

    probidade e boa-f objetiva. O memorandum of understanding (MoU)

    abrange documentos intitulados de gentlemens agreement, heads of

    agreement, carta de inteno e letter of understanding, assim como as

    cartas de confidencialidade e as cartas de exclusividade, em razo da

    troca de informao, tecnologia e expertise entre as partes.

    Resumo: O presente trabalho visa analisar os efeitos jurdicos do memorando de

    entendimento segundo a lei brasileira. Nesse sentido, demonstraremos que, do ponto de vista

    prtico, independentemente da forma adotada pelas partes e dos efeitos por elas

    determinados no documento, o memorando de entendimento poder gerar controvrsias

    acerca de seus efeitos jurdicos. Para isso, realizaremos a anlise do conceito do memorando de

    entendimento, em seguida, analisaremos as definies das fases pr-contratual e contratual,

    previstas no Cdigo Civil Brasileiro, abrangendo as obrigaes pr-contratuais e o contrato

    preliminar, respectivamente, a fim de demonstrar que os efeitos jurdicos do memorando de

    entendimento no Brasil dependero no somente dos termos adotados no referido documento,

    mas tambm de condutas e deveres de boa-f objetiva e probidade das partes antes e depois

    de sua celebrao.

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    Sumrio: 1. INTRODUO. 2. O CONCEITO DO MEMORANDO DE ENTENDIMENTO

    (MOU). 3. A FASE PR-CONTRATUAL E AS OBRIGAES PR-CONTRATUAIS NO

    MBITO DO MEMORANDO DE ENTENDIMENTO. 4. A RESPONSABILIDADE CIVIL PR-

    CONTRATUAL: DA NEGOCIAO EXECUO DO MEMORANDO DE

    ENTENDIMENTO. 5. A FASE CONTRATUAL, O CONTRATO PRELIMINAR E O

    MEMORANDO DE ENTENDIMENTO. 6. A RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL

    PELO DESCUMPRIMENTO DE PREVISO ESTABELECIDA NO MEMORANDO DE

    ENTENDIMENTO. 7.CONCLUSO. 8. BIBLIOGRAFIA

    1. INTRODUO

    O presente trabalho visa identificar o conceito do memorando de entendimento ou

    memorandum of understanding (MoU) e, a partir do mesmo, os efeitos jurdicos esperados

    pelas partes quando da celebrao do memorando de entendimento, no mbito do direito

    internacional.

    Do ponto de vista prtico, demonstraremos que, o memorando de entendimento,

    independentemente da forma e dos efeitos determinados pelas partes, poder gerar

    controvrsias quanto aos seus efeitos jurdicos, haja vista algumas posies e manifestaes

    adotadas pelas partes.

    Nesse sentido, demonstraremos as implicaes dessas controvrsias quanto possvel

    responsabilizao e obrigao de reparao de danos.

    Frise-se que, no presente estudo no pretendemos focar na indagao sobre o direito aplicvel

    ao memorando de entendimento. Faremos a anlise especfica do memorando de

    entendimento luz da lei brasileira, tanto na formao, quanto na execuo e extino do

    referido documento.

    Veremos que, sob a tica do direito civil brasileiro, toda fase preliminar de negociaes

    contratuais, na qual, normalmente, se insere o memorando de entendimento, deve ser regida

    pelos princpios de probidade e boa-f objetiva.

    Nessa linha de raciocnio, ainda que o documento preliminar, que estabelece apenas condies

    bsicas para um acordo, no crie obrigaes entre partes, poder gerar responsabilizao civil

    e obrigao de reparao de danos, conforme preleciona o Prof. Caio Mrio:

    Enquanto se mantiverem tais, as conversaes preliminares no obrigam. H uma distino

    bastante precisa entre esta fase, que ainda no contratual, e a seguinte, em que j existe algo

    preciso e obrigatrio. No obstante faltar-lhe obrigatoriedade, pode surgir responsabilidade

    civil para os que participam das negociaes preliminares, no no campo da culpa contratual,

    porm da aquiliana.

    Em seguida, faremos uma abordagem das obrigaes pr-contratuais, que, segundo o Cdigo

    Civil Brasileiro, so manifestadas na fase pr-contratual, com fundamento nos deveres de

    conduta provenientes dos princpios da boa-f objetiva e probidade, positivados no art. 422 do

    Cdigo Civil Brasileiro.

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    A fase pr-contratual dura at a formao do contrato, quando h o encontro de no mnimo

    duas declaraes de vontade relativamente ao mesmo objeto, atravs das figuras jurdicas

    da proposta e da aceitao, ou quando as partes, no mesmo momento, concordam em

    estabelecer o contrato.

    A simples manifestao unilateral de vontade do proponente, porm, efetivada atravs da

    proposta, tem relevncia jurdica no Direito brasileiro.

    A proposta de contrato tem carter vinculante obrigando em princpio o proponente a

    contratar . Caso no haja a contratao, o oblato no dispe, porm, de tutela jurdica

    especfica para que o contrato seja considerado como estabelecido, mas somente de tutela

    reparatria, de natureza pr-contratual. Outrossim, na hiptese de no ser mais possvel o

    estabelecimento do contrato e o cumprimento do seu objeto, passaro a incidir tambm as

    regras que estabelecem a responsabilidade pr-contratual pelo no estabelecimento do

    contrato, as quais iro conceder ao oblato a tutela reparatria.

    Assim, ao longo das negociaes e da celebrao de um memorando de entendimento, importa

    a verificao: (i) dos termos escritos constantes da referida negociao e do prprio

    memorandum of understanding; alm (ii) da observncia dos deveres provenientes dos

    princpios-regras de probidade e de boa-f objetiva, a fim de se definir a natureza jurdica de

    tal documento: se trata-se de um documento preliminar ou de um contrato. Veremos que,

    geralmente, no mbito de um memorando de entendimento, a fase pr-contratual

    normalmente se perpetua mesmo aps a celebrao do referido documento, haja vista sua

    caracterstica de documento preliminar, sem efeito vinculante para as partes. Desse modo, em

    geral, por no se tratar de um contrato, tanto o descumprimento dos deveres de conduta

    afetos boa-f objetiva no mbito da negociao e da celebrao do memorando de

    entendimento, bem como o descumprimento de clusula especfica do memorando de

    entendimento, ensejar responsabilizao pr-contratual, como veremos detidamente mais

    adiante no presente estudo.

    Nesse sentido, na seara da responsabilidade civil pr-contratual, analisaremos a possvel

    responsabilizao e obrigao de reparao de danos no processo de negociao, celebrao e

    execuo do memorando de entendimento.

    Ato contnuo, abordaremos a fase contratual e o contrato preliminar de acordo com o Cdigo

    Civil Brasileiro, bem como a responsabilidade civil contratual e sua aplicao ao memorando

    de entendimento.

    Por fim, concluindo, demonstraremos que, os documentos preliminares, como, in casu, o

    memorando de entendimento, em geral, no so vinculantes, eis que representam os termos

    preliminares da negociao e no criam compromissos para os envolvidos, apesar de poderem

    gerar responsabilizao civil pr-contratual. J os documentos vinculantes geram obrigaes

    entre as partes e j espelham a estrutura preliminar de um contrato futuro, como o caso do

    contrato preliminar previsto no Cdigo Civil Brasileiro, cujo descumprimento ensejar

    responsabilizao civil contratual. Seus termos devem ser refletidos no documento definitivo

    (contrato definitivo) a ser firmado para a formalizao de determinado negcio jurdico.

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    H casos em que o memorando de entendimento apresenta caractersticas de um contrato, na

    medida em que estipula obrigaes para uma ou todas as partes. Essas obrigaes podero

    atribuir-lhe a natureza de contrato preliminar ou at mesmo definitivo.

    Alm disso, veremos que os efeitos jurdicos do memorando de entendimento no Brasil,

    independentemente da forma adotada e dos efeitos determinados pelas partes, depender no

    somente dos termos previstos no referido documento, mas tambm das condutas das partes

    envolvidas, levando-se em considerao os deveres de boa-f objetiva e probidade, na

    realizao da negociao, na formao e na execuo do memorando de entendimento.

    2. O CONCEITO DO MEMORANDO DE ENTENDIMENTO (MOU)

    Em sentido lato, o memorando de entendimento ou memorandum of understanding (MoU)[5]

    abrange documentos intitulados de gentlemens agreement, heads of agreement, carta de

    inteno e letter of understanding, assim como tambm abrange documentos como as cartas

    de confidencialidade e as cartas de exclusividade, em razo da troca de informao, tecnologia

    e expertise entre as partes.

    O memorando de entendimento documento bastante utilizado no mbito do direito

    internacional pblico, com o fim de traar diretrizes para um acordo de cooperao entre

    diferentes pases em determinadas reas de interesse mundial, tais como, o meio ambiente, a

    agricultura etc., bem como no mbito do direito internacional privado, quando, p.ex.,

    celebrado por partes domiciliadas em diferentes pases , com o fim de traar diretrizes para

    um acordo de cooperao em rea de interesse comum privativo das referidas partes. De

    forma geral, trata-se de instrumento de Direito Internacional, no vinculante entre as partes,

    que tem sido utilizado para atos com menor formalidade, destinados a registrar princpios

    gerais, diretrizes, que orientaro as relaes entre as partes, seja no plano poltico, econmico,

    jurdico, cultural ou em outros.

    No presente trabalho, iremos focar nos efeitos jurdicos do memorando de entendimento luz

    da lei brasileira e no mbito do direito internacional privado.

    Quando se trata de grandes negcios entre empresas, a celebrao dos contratos

    frequentemente precedida de longas e complexas negociaes, que por vezes se desenvolvem

    durante meses e at mesmo anos, em numerosas sesses, com a participao de diferentes

    equipes de advogados e tcnicos das empresas envolvidas. Normalmente essas negociaes

    seguem diretrizes previamente traadas pelas partes, que prevem reunies prvias, cada

    uma tendo por objeto a discusso de determinados pontos a serem definidos pelos

    negociadores. Nesse sentido, vai se formando o entendimento em relao a cada ponto das

    tratativas, que iro possibilitar a manifestao de vontades das partes de se vincularem a um

    contrato. Tal manifestao se concretiza pela celebrao de um contrato preliminar ou at

    mesmo definitivo, caso no haja nenhum elemento futuro condicionante da celebrao do

    contrato definitivo.

    Assim, natural que os negociadores tomem a cautela de documentar o entendimento em

    relao a cada ponto da negociao, seja para simples memria, ou para evitar sejam

    revisitados pontos j discutidos e assentados, ou para avaliao futura do comportamento das

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    partes, em vista das respectivas responsabilidades, no caso de no ser celebrado o contrato

    definitivo.

    Os documentos normalmente utilizados para a consignao dos pontos sobre os quais se

    progride na direo do consenso no decorrer das negociaes recebem intitulaes diversas,

    assim como so vrias as formas que assumem, so eles: o memorando de entendimento ou

    memorandum of understanding (MoU), o gentlemens agreement, o heads of agreement, a

    carta de inteno, a letter of understanding. Em geral, a inteno das partes ao firm-los no

    a de se vincularem, mas simplesmente registrar fatos, como demonstrado acima.

    Em alguns casos, verifica-se a criao de obrigaes para as partes, de modo que o documento

    passa a ser vinculante.

    Em outras palavras, esses documentos ora tem por finalidade preponderante: (i) traar regras

    bsicas de negociao para um acordo; (ii) registrar etapas, pontos importantes ou acordos

    parciais da negociao; (iii) retratar a completude da tratativa e subordinao a determinado

    evento do incio da vigncia do contrato.

    Assim, embora o memorando de entendimento seja um documento que, em geral, no criado

    para gerar obrigaes, algumas vezes ele acaba gerando obrigaes para as partes e torna-se

    vinculante. Porm, independentemente dele gerar ou no obrigaes para as partes no afasta

    a possibilidade de ensejar responsabilizao civil, ou seja, a obrigao de reparao do dano

    causado a outrem, como veremos adiante.

    3. A FASE PR-CONTRATUAL E AS OBRIGAES PR-

    CONTRATUAIS PREVISTAS NO CDIGO CIVIL BRASILEIRO NO

    MBITO DO MEMORANDO DE ENTENDIMENTO

    Para que o Direito atue como meio instrumentalizador da Justia, necessria a preservao

    de um equilbrio entre as partes contratantes que subsista em todas as fases da relao

    contratual e no apenas durante o momento de concluso do negcio.

    Nesse sentido, de grande relevncia a tutela jurdica do perodo que antecede a concluso do

    contrato propriamente dito, a que a doutrina tem se referido como fase pr-contratual.

    Segundo o artigo 422, do Cdigo Civil Brasileiro, os contratantes so obrigados a guardar,

    assim na concluso do contrato, como em sua execuo, os princpios de probidade e boa-f.

    Com relao fase de negociao contratual ou fase pr-contratual, o termo concluso do

    contrato, tal como constante do artigo 422, merece uma interpretao igualmente extensiva,

    abrangendo tambm a fase preliminar concluso, ou de pr-concluso. Afinal, a expresso

    concluso do contrato mostra-se indicativa de um processo que culmina com a contratao.

    Por isso, o processo de concluso do contrato, ao longo do qual as partes devem, nos termos do

    dispositivo em tela, guardar os princpios da probidade e da boa-f, alcana as tratativas

    preliminares efetiva celebrao do acordo.

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    Uma das crticas que Antnio Junqueira de Azevedo faz acerca do modo como o novo

    Cdigo Civil trata a boa-f contratual reside, justamente, na falta de previso expressa quanto

    fase de negociao.

    Sendo assim, faz-se necessrio demonstrar de que modo o princpio da boa-f, mais

    propriamente o da boa-f objetiva, passou a figurar no rol das diretrizes que norteiam as

    relaes contratuais e, in casu, pr-contratuais de acordo com o ordenamento jurdico

    nacional.

    A noo de boa-f ambivalente, comportando a boa-f subjetiva e a boa-f objetiva. Como

    princpio aplicvel ao direito contratual, o preceito em anlise cuida da boa-f objetiva. A

    distino entre a boa-f objetiva e a boa-f subjetiva no suscita divergncia. A boa-f

    subjetiva relaciona-se com o estado de conscincia do agente por ocasio de um dado

    comportamento. Referida em diversos dispositivos legais, como o caso do art. 1.201 do C.C.,

    consiste nos desconhecimento de um vcio, relativamente ao ato jurdico que se pratica ou

    posse que se exerce.

    J a boa-f objetiva consiste em um dever de conduta. Obriga as partes a terem

    comportamento compatvel com os fins econmicos e sociais pretendidos objetivamente pela

    operao negocial. No mbito contratual, portanto, o princpio da boa-f impe um padro de

    conduta a ambos os contratantes no sentido da recproca cooperao, com considerao aos

    interesses comuns, em vista de se alcanar o efeito prtico que justifica a prpria existncia do

    contrato.

    importante destacar que, sob a perspectiva constitucional, a boa-f objetiva encontra

    fundamento na dignidade da pessoa humana (art. 1, III, CF), na solidariedade social (art. 3,

    I, CF), no valor social da livre-iniciativa (art. 1, IV, CF), bem como na condio de princpio

    componente da ordem econmica constitucional (art. 170 e ss., CF), da qual a ordem

    contratual parte integrante.

    Nesse sentido, a incidncia da boa-f objetiva sobre a disciplina obrigacional determina uma

    valorizao da dignidade da pessoa, em substituio autonomia do indivduo, na medida em

    que se passa a encarar as relaes obrigacionais como um espao de cooperao e

    solidariedade entre as partes e, sobretudo, de desenvolvimento da personalidade humana.

    Na promoo de uma tica de solidariedade contratual, o princpio da boa-f opera de diversas

    formas e em todos os momentos da relao, desde a fase de negociao fase posterior sua

    execuo, constituindo-se em fonte de deveres e de limitao de direitos de ambos os

    contratantes.

    Nesse sentido, a autonomia privada, o princpio da obrigatoriedade dos pactos, ou da

    intangibilidade do contedo do contrato (pacta sunt servanda) e a relatividade de seus efeitos

    devem conciliar-se com o conjunto de novos princpios, atualmente previstos no Cdigo Civil

    Brasileiro: boa-f objetiva, equilbrio econmico entre as prestaes e funo social do

    contrato.

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    Na fase de negociao, a boa-f atua como fundamento de deveres cuja violao enseja a

    chamada responsabilidade pr-contratual. Como norma de criao de deveres jurdicos, a boa-

    f d origem aos chamados deveres laterais, tambm conhecidos como acessrios, ou ainda

    secundrios, em razo de no se referirem direta e primordialmente ao objeto central da

    obrigao.

    Antnio Menezes Cordeiro divide tais deveres em deveres de lealdade, deveres de

    proteo e deveres de esclarecimento ou informao.

    J Judith Martins-Costa traz uma lista de tais deveres, enumerando-os, exemplificando-

    os e, desta forma, elucidando-os. So eles:

    a) os deveres de cuidado, previdncia e segurana, como o dever do depositrio de no apenas

    guardar a coisa, mas tambm de bem acondicionar o objeto deixado em depsito; b) os

    deveres de aviso e esclarecimento, como o do advogado, de aconselhar o seu cliente acerca das

    melhores possibilidades de cada via judicial passvel de escolha para a satisfao de seu

    desideratum, o do consultor financeiro de avisar a contraparte sobre os riscos que corre, ou o

    do mdico, de esclarecer ao paciente sobre a relao custo-benefcio do tratamento escolhido,

    ou dos efeitos colaterais do medicamento indicado, ou ainda, na fase pr-contratual, o do

    sujeito que entra em negociaes, de avisar o futuro contratante sobre os fatos que podem ter

    relevo na formao da declarao negocial; c) os deveres de informao, de exponencial

    relevncia no mbito das relaes jurdicas de consumo, seja por expressa disposio legal

    (CDC, arts. 12, in fine, 14, 18, 20, 30 e 31, entre outros), seja em ateno ao mandamento da

    boa-f objetiva; d) o dever de prestar contas, que incumbe aos gestores e mandatrios, em

    sentido amplo; e) os deveres de colaborao e cooperao, como o de colaborar para o correto

    adimplemento da prestao principal, ao qual se liga, pela negativa, o de no dificultar o

    pagamento, por parte do devedor; f) os deveres de proteo e cuidado com a pessoa e o

    patrimnio da contraparte, como, v.g., o dever do proprietrio de uma sala de espetculos ou

    de um estabelecimento comercial de planejar arquitetonicamente o prdio, a fim de diminuir

    os riscos de acidentes; g) os deveres de omisso e de segredo, como o dever de guardar sigilo

    sobre atos ou fatos dos quais se teve conhecimento em razo do contrato ou de negociaes

    preliminares (...)

    Assim, tendo em vista que o memorando de entendimento, em tese, se insere na fase pr-

    contratual prevista no Cdigo Civil Brasileiro, eis que, normalmente, documento celebrado

    durante o processo de negociao entre duas ou mais empresas e se presta a ser um

    documento preliminar, que no cria obrigaes para as partes, como j dito, os efeitos jurdicos

    dele esperados esto associados ao reforo das acima mencionadas obrigaes pr-contratuais,

    decorrentes do princpio da boa-f objetiva, resguardando as partes de um eventual

    rompimento injustificado das tratativas, que ensejar a responsabilidade civil pr-contratual.

    O registro das tratativas facilita a eventual demonstrao de que uma parte estava

    negociando em contrariedade a esse princpio.

    Porm, importante frisarmos que os efeitos jurdicos do memorando de entendimento so

    incertos, dependendo da anlise de seu contedo e do comportamento das partes para sua

    correta determinao. Isso porque, o memorando de entendimento alm de reforar deveres

    que j poderiam decorrer do princpio da boa-f objetiva, tais como, o dever de manter o sigilo

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    Angela Lima Rocha Cristofaro

    Advogada formada pela PUC/RIO, com ps-graduao em advocacia

    pblica pela Escola Superior da Advocacia Pblica (convnio UERJ/PGE-

    RJ) e ps-graduao em direito empresarial, com concentrao em

    negociao e negcios de petrleo e gs, pela FGV-RIO.

    das informaes trocadas durante as tratativas, pode estabelecer outros tipos de obrigao,

    determinando, p.ex., que uma das partes antecipe o cumprimento de determinados pontos do

    acordo. Nesse caso, restar descaracterizada a natureza jurdica do memorandum of

    understanding como documento preliminar, passando a ter caracterstica contratual, saindo

    da fase pr-contratual para a fase contratual.

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    Informaes sobre o texto

    Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)

    CRISTOFARO, Angela Lima Rocha. Os efeitos jurdicos do memorando de entendimento no

    Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3701, 19 ago. 2013. Disponvel em:

    . Acesso em: 10 maio 2014.