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metamorfismo deposito

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Bernardino Ribeiro Figueiredo 265

nas fraturas da pirita e esfalerita. Mantida a pressão de 550 bar e elevando-se a temperatura,a calco sita começaria a se recristalizar (T :::::465°C), bem como a calcopirita (:::::565°C)e a pirrotita (:::::525-666 CC). Se essa recristalização é completa, os efeitos anteriores defluxo mecânico não poderão mais ser observados.

A pressões mais altas até o limite de fraturamento da pirita, a seqüência acima semantém, embora a temperaturas menores. O mesmo pode ser esperado se a taxa de defor-mação (strain rate) diminui, apesar de não ser possível, para velocidades de deformaçãovigorantes na crosta, prever o comportamento relativo dos sulfetos com segurança. Nessascondições mais drásticas, pode-se esperar que agregados de pirita e esfalerita sejam atétransportados numa corrente de galena, pirrotita e calcopirita em estado plástico. Comfreqüência observam-se grandes quantidades de sulfeto maciço, contendo fragmentos eblocos das hospedeiras e encaixantes, concentradas em zonas antiformais ou sinformaisdevido a esse efeito de transporte mecânico em direção a zonas de alívio de pressão.

O comportamento relativo de vários sulfetos e óxidos pode ser analisado no diagramatensão versus temperatura (Figura 14.1), construído com base em dados experimentaisobtidos por vários autores. As curvas representam os limites acima dos quais os mineraisassumem comportamento dúctil. Observa-se que, mesmo em condições amenas de tensãoe temperatura, os sulfetos, com exceção da pirita, são bastante móveis nos minérios. Já osóxidos como magnetita e hematita requerem condições mais severas para adotar um compor-tamento dúctil (Foto 69).

O uso do diagrama da Figura 14.1 na interpretação dos efeitos de deformação emminérios deve ser cuidadoso no sentido de levar em conta que

1) a diferença de velocidade de deformação entre os experimentos de laboratório eos processos naturais pode ser significativa;

2) a maioria dos experimentos foi realizada em agregados monominerálicos, en-quanto os minérios são poliminerálicos;

3) na natureza, os minerais reagem entre si formando novos minerais, e muitas vezeso sistema é aberto para a entrada ou perda de voláteis e outros elementos.

O comportamento diferenciado de sulfetos, óxidos e silicatos pode também ser ob-servado nas fotomicrografias (fotos 58-63) de alguns minérios comentados neste volume.

Os estudos petrográficos de minérios oferecem importantes informações sobre ahistória deformacional do depósito. Para isso é necessário o entendimento dos fatores quepromovem a deformação dos minérios e o conhecimento dos principais mecanismos dedeformação dos minerais.

Para Cox (1987), os parâmetros controladores dos mecanismos de fluxo são: oesforço diferencial, a temperatura, a granulometria, a pressão de confinamento efetiva e asatividades dos vários componentes.

Os principais mecanismos de deformação, segundo Marshall e Gilligan (1987), sãoos seguintes:

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Figura 14.1 - Transição rúptil-dúctil de algunssulfetos, óxidos e rochas, mais comuns, em fun-ção da tensão e temperatura (fonte: vários auto-res citados em Siemes e Hennig-Michaeli, 1985).

1300

1100

900'-

700~

500-

100 300 500 700

Temperatura CC)900

1) fluxo cataclástico - microfraturamento inter e intragranular, deslizamento e rota-ção dos fragmentos;

2) fluxo de deslocamento (dis location glide) - deslocamento ao longo de planoscristalográficos (Figura 14.2);

3) kinking - desenvolvimento de bandas de deformação oblíquas aos planos dedeslizamento dos cristais;

4) geminação - cisalhamento paralelo a determinados planos cristalográficos (pla-nos de macIas);

5) fluxo mecânico (weertman creep) - deslocamento contínuo como resultado deum comportamento plástico do mineral. A deformação plástica de altas temperaturas édenominada power-law creep;

6) transferência de massa difusa (Nabarro-Herring creep ou lattice-diffusion creep)_ transferência de massa por difusão atômica no estado sólido entre sítios com diferentesestados de deformação;

7) tranferência de massa intragranular (coble creep) - difusão atômica através demassa ao longo dos contatos dos grãos entre diferentes sítios de deformação;

8) dissolução por pressão (solution-precipitation creep) - transferência de massaem presença de fluidos devido à diferença de potencial químico entre diferentes sítios dedeformação;

9) deslizamento nos contatos dos grãos - superplasticidade, deslizamento dos grãossem perda de coesão.

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••••••• • • • • • • •••0000000000

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0000000000 -Estrutura indeformada Translação

Kinking Geminação

Figura 14.2 - Mudanças na estrutura interna dos minerais produzidas por diferentes mecanismosde deformação (fonte: C1ark e Kelly, 1976).

Os produtos e texturas esperados nos materiais submetidos às diferentes combina-ções de mecanismos de deformação são os seguintes:

1) sob esforço diferencial alto, e P e T baixas: fragmentação e fluxo cataclástico(brecha cataclástica);

2) à pressão mais alta: deslocamento suave (dislocation glide) e aparecimento demaclas de deformação superando o fluxo cataclástico;

3) sob esforço diferencial decrescente e T alta: deslocamento suave e recristalizaçãodinâmica com desenvolvimentro de microfábrica e orientação cristalográfica preferencial;

4) sob esforço diferencial baixo: deformação por difusão atômica dependendo dagranulometria;

5) em presença de fluido, em ambiente metamórfico de graus baixo a médio: pro-cessos de fluxo mecânico e solução-precipitação (dissolução por pressão);

6) na ausência de fluidos: difusão de matéria ao longo dos contatos dos grãos (coblecreep);

7) à temperatura alta e difusão intragranular rápida: o processo dominante será adifusão atômica segundo a rede cristalina;

8) à temperatura alta e granulometria fina: o processo dominante será o de desloca-mento suave ao longo dos contatos dos grãos (superplasticidade).

Uma estimativa qualitativa dos mecanismos de deformação que prevaleceram nos di-ferentes estágios de evolução de um depósito mineral pode ser realizada por meio do examedos mapas de mecanismos de deformação disponíveis na literatura (figuras 14.3 e 14.4).Esses mapas apresentam em um diagrama tensão versus temperatura os diferentes comporta-mentos adotados por agregados monominerálicos com diferentes granulometrias. Para efeito

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Pbs 10 mm

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9

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Nabarro-Herring creep

1000

Figura 14.3 - Mapa de mecanismos de deformação mostrando o comportamento de agregado de galena comgranulometria de 10 11mem função da tensão e temperatura. Os números nas curvas representam estimativas

de taxas de deformação em -loglQ(s-l) (fonte: modificado de Atkinson, 1977, apud Siemes et al. 1991).

~ 67

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transição rúptil/dúctil FeS,100mm

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743

Figura 14.4 - Mapa de mecanismos de deformação mostrando o comportamento de agregado de pirita comgranulometria de 100 11mem função da tensão e temperatura. Os números nas curvas representam estimativasde taxas de deformação em -Iog., (s') (fonte: modificado de McClay e Ellis, 1983, apud Siemes et al. 1991).

o 200 400 600Temperatura CC)

800

de simplificação, omitiu-se no eixo das ordenadas a representação de outras escalas derivadasdas medições dos esforços usados nos experimentos. Nas figuras, é possível verificar oscomportamentos contrastantes adotados pelos sulfetos, galena e pirita, para as mesmas con-dições de esforço tectônico, temperatura e taxas de deformação. Evidentemente, os minériosconstituem materiais muito diferentes e, portanto, esses mapas devem ser usados com muita

fluxo cataclástico

dissolução por pressão

<:: creep

I ~. _

Coble creeptransicional

14

Nabarro-Herringcreep ~

600o 200 400

Temperatura CC)

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cautela, talvez apenas como apoio para as observações texturais realizadas ao microscópio.Para aprofundamento dessa matéria, consultar as fontes bibliográficas.

3. Metamorfismo e texturas deformacionais de minérios

Em geral, os efeitos do metamorfismo e da deformação identificados nos minériossão o aumento da granulometria ou a cominuição dos grãos, desenvolvimento de foliação,dobramento de arrasto e rompimentos, espessamento de zonas apicais de dobras, for-mação de brechas e de boundins (Craig e Vaughan, 1981). Os minerais, como mencio-nado acima, irão oferecer respostas diferenciadas à deformação: os silicatos tenderão afraturar-se, enquanto os sulfetos se comportarão de forma mais dúctil, mobilizando-separa preencher os interstícios e fraturas dos outros minerais ou ocupando planos de cli-vagem das micas e zonas de baixa pressão diferencial. Alguns sulfetos, como pirita earsenopirita, tenderão a fraturar-se e, em certas condições, adotar uma textura em mo-saico, granoblástica, com formação de junções tríplices. Outros efeitos de deformaçãopoderão ser observados nos sulfetos em escala de grão como a formação de maclas elamelas curvas, kink-banding e extinção ondulada. Alguns desses efeitos em minériospodem ser vistos nas fotos 58-65. Normalmente as texturas pré-metamórficas tenderãoa ser destruídas, de modo que a presença de lamelas ou de inclusões rotacionadas emporfiroblastos de certos minerais ou de ball textures devem representar texturasmetamórficas ou posteriores ao metamorfismo.

Como foi comentado anteriormente, muitos depósitos minerais brasileiros estiveramsubmetidos ao metamorfismo. O depósito de Cu-Au do Serrote da Laje (AL) aloja-se emum sill estratificado de rochas máficas e ultramáficas, de provável idade paleoproterozóica,intrudindo rochas metas sedimentares do Cinturão Sergipano. É considerado um depósitooriginário de segregação magmática, similar àjazida de cobre de Caraíba (Vale do Curaçá,BA), e, como esta, metamorfizado à fácies granulito. Os efeitos do metamorfismo no de-pósito do Serrote da Laje foram estudados em detalhe por Figueiredo (l992b).

Complementando os estudos petrográficos dos metabasitos e gnaisses, foram usadosdois geotermômetros independentes, botita-granada e cordierita-granada, que indicaram aincidência de dois eventos de retrogressão metamórfica na fácies anfibolito, a temperaturasde 660°C e 570°C e pressões de 6 kbar a 4 kbar. Posteriormente a esses eventos, odepósito foi objeto de cisalhamento e fraturamento, em regime mais rúptil, com formação deveios sulfetados com paragênese da fácies xisto-verde. A trajetória do metamorfismoretrogressivo do depósito Serrote da Laje foi mostrada na Figura 2.8 deste volume.

A mineralização óxido-sulfetada do Serrote da Laje está hospedada emmetapiroxenitos, metagabros, anfibolitos e magnetititos e consiste basicamente de magnetita,ilmenita, pleonasto, bornita, calcopirita e, mais subordinadamente, sulfetos de Ni-Co-Fe (fo-tos 25 e 26) e teluretos de Ni. Os sulfetos de ferro, pirrotita e pirita estão ausentes. A magnetitaporfitoblástica contém até 3% de elementos menores Ti, V, Ni e Cr, no total, e apresenta

269

270 Minérios e ambiente

diversas gerações de lamelas de ilmenita e pleonasto. Essas intricadas texturas dos óxidos deSerrote da Laje encontram-se descritas em Amcoff e Figueiredo (1990). Se, entre os sulfetosdisseminados nas rochas, as fases predominantes são bornita e calcopirita, nos veios comquartzo, carbonato, clorita e epidoto, os sulfetos se restringem às fases exsolvidas de baixatemperatura bornita-calcosita, às quais se associa ouro nativo com até 25% Ag.

Os depósitos magmáticos raramente contêm bornita, a qual deve ser produto dometamorfismo de sulfeto magmático, normalmente rico em pirrotita. Cawthorn e Meyer(1993) propuseram para o depósito de O'Kiep (África do Sul), raro exemplo similar aosSerrote da Laje e Caraíba, um processo de perda de enxofre durante o metamorfismo, queteria sido o responsável pela transformação da paragênese magmática pirrotita+calcopiritaà atual associação bornita+calcopirita+magnetita, mediante a seguinte reação:

Com base nesse raciocínio, o qual é coerente com as altas razões SeiS encontradasnos minérios de Caraíba e O'Kiep, que excedem os valores normais parajazidas magmáticas,Maier et al. (1998) estimaram que esses depósitos devem ter perdido de 30% a 95% doenxofre magmático original por efeito do metamorfismo.

Um outro exemplo de depósito magmático metamorfizado é representado pelosdepósitos de Fe-Ti-Cr de Bodocó e Floresta (PE) pesquisados por Beurlen et al. (1990 e1992). No caso de Bodocó, foi possível aos autores descrever a trajetória do metamorfismoprogressivo até o estágio eclogito (13±2 kbar e 580±60 CC) e subseqüente retrogressãoaté a fácies xisto-verde, valendo-se de estudos petrográficos de detalhe e aplicações devários geotermômetros e geobarômetros independentes.

A jazida de Pb-Zn do Perau (PR) constitui um bom exemplo de depósito singenético(SEDEX),a qual, segundo Daitx (1996), sofreu metamorfismo em pelo menos dois eventos,que coincidiram com a deformação do depósito em uma tectônica de baixo ângulo queevolui para um regime transpressivo. O metamorfismo principal atingiu temperaturas daordem de 610±50 °C com pressões de 5 kbar a 8 kbar, correspondentes à fácies anfibolitode média pressão, com subseqüente retrogressão à fácies xisto-verde. Feições de defor-mação de regime dúctil evoluindo para um regime progressivamente mais rúptil são reco-nhecíveis no minério, tais como sulfeto acompanhando a foliação e dobramento intrafolial,sulfeto bandado e maciço recristalizado com textura de annealing e texturas em mosaico,brechas com ball texture e deslocamento dos sulfetos para os ápices das dobras, zonasinterboundins e fraturas.

Ajazida Salobo 3A (Carajás, PA) constitui um excelente exemplo de mineralizaçãosulfetada hospedada em formação ferrífera óxido-silicatada do Arqueano. As rochas hos-pedeiras e encaixantes foram objeto de um estudo petrológico de detalhe por Lindenmayer(1990), que demonstrou que essas rochas foram submetidas a um metamorfismo de altatemperatura e baixa pressão em condições de gradiente térmico de 85 °C/km, Pe02 > PH20

e baixa fO2, Subseqüentemente, o depósito esteve sujeito a dois eventos metamórfico-

hidrotermais retrogressivos:

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1) T = 650-550 °C e 2,5 kbar, acompanhado de intenso cisalhamento e plutonismo(Granito Velho Salobo), decomposição de fayalita à hastingsita e grunerita, magnetita equartzo (Foto 52), em presença de fluidos com salinidade alta, ácidos e levemente oxidantes;

2) T = 370°C, com reativação do cisalhamento e cloritização dos minerais ferro-magnesianos na presença de fluidos oxidantes, ácidos e moderadamente salinos (fotos53 e 54).

Inúmeras feições composicionais e texturais podem ser observadas nos minériosdo Salobo 3A como produto do metamorfismo. Os óxidos e sulfetos sofreram annealing ;e nos granoblastos de magnetita ocorrem inclusões de uraninita, molibdenita, ilmenita, fluorita,apatita e alanita, o que sugere que essas fases já estavam presentes à época do metamorfismode alto grau. Os sulfetos podem ocorrer injetados entre os planos de clivagem dosfilossilicatos, preenchendo espaços intersticiais entre os silicatos e magnetita e preenchendoveios contendo magnetita reprecipitada (Foto 9).

Há uma conspícua preferência do par calcopirita-bornita pelas rochas com fayalita,enquanto nos xistos à grunerita os sulfetos presentes são bornita e calcosita (Figueiredo et al.,1994). Esse zoneamento do minério foi interpretado como resultante do retrometamorfismode alta temperatura, durante o qual bornita +magnetita se formaram a expensas de calcopirita,em condições de aumento de f02·

Se, para a jazida de Salobo, a formação da solução sólida calcosita-bornita foidevida ao metamorfismo, segundo a reação análoga à sugerida por Cawthorn e Meyer(1993), então deve também ter ocorrido uma significativa perda de enxofre durante o meta-morfismo do minério do Salobo 3A. Esse enxofre pode ser responsável pela formaçãolocalizada na jazida de zonas mineralizadas a calcopirita, pirita e pirrotita (em anfibolito) esobretudo pela formação de depósitos ricos em calcopirita nas porções estratigraficamentesuperiores do Supergrupo Itacaiúnas, do qual fazem parte as rochas metas sedimentares emetavulcânicas do Grupo Salobo. Finalmente, a presença de quartzo-clorita xistos em al-gumas zonas do depósito do Salobo 3A coincide com o aparecimento de bornita-calcositaassociada a hematita, indicando que o segundo estágio de retrogressão metamórfica à fáciesxisto-verde, a diminuição de temperatura ocorreu em condições de alta f02•

Alguns depósitos de classe mundial, como Broken Hill e Mount Isa (Austrália), odistrito de Skellefte (Suécia), Sullivan (British Columbia, Canadá), Aguilar (Argentina),entre outros, constituem depósitos originários de processos vulcanogênicos ou sedimentar-exalativos, que sofreram efeitos de metamorfismo e deformação subseqüente.

No caso dajazida de Pb-Zn do Aguilar (Argentina), do Ordoviano Inferior, formadaoriginalmente por processo exalativo de fundo oceânico, foi descrito um outro tipo de me-tamorfismo. °minério é formado de intercrescimentos de sulfetos e sulfossais, de granu-lometria fina a média, hospedado em quartzito e hornfels. Tendo sido submetidos ametamorfismo de contato, provocado pela intrusão do granito cretácico do Aguilar, osminérios distribuem-se na fácies piroxênio-hornblenda, onde os sulfetos sofreram recris-talização e annealing ; e na fácies albita-epidoto, onde os sulfetos recristalizaram apenasparcialmente e podem apresentar texturas framboidais preservadas (Gemmel et al., 1992).

272 Minérios e ambiente

4. A teoria poligenética e as transformações pós-deposicionais

Como já foi comentado em outras partes deste volume, as zonas de cisalhamentopodem representar estruturas muito profundas, nas quais os depósitos hidrotermais, nãonecessariamente, devem ter se formado por meio de um único processo, em um únicoevento mineralizante. É também provável que a deformação principal em uma zona decisalhamento tenha tido uma duração mais longa que o evento mineralizante. Assim, muitosdepósitos minerais têm sido considerados pré-tectônicos devido à falta de uma visão tem-poral e dinâmica de sua formação. Um exemplo é ajazida de ouro de Passagem de Mariana,em que alguns níveis de turmalina são concordantes, sugerindo uma interpretação singenética,embora a maioria das ocorrências de turmalinitos estejam cortando a foliação das rochas,como descreveram Vial (1988b), Oliveira (1998) e Cavalcanti e Schrank (1999), entreoutros autores.

Existem depósitos que se formaram após o pico da deformação, mas continuaramsujeitos às suas fases mais tardias e apresentam os sulfetos parale1izados segundo a foliaçãomilonítica ou cataclasados. Uma boa descrição dessas várias fases de deformação emineralização foi feita por Ribeiro-Rodrigues (1998) para ajazida de Cuiabá (MT).

Vários depósitos de origem mais diversa como os de segregação magmática,sedimentares, vulcanogênicos e sedimentar-exalativos podem ter sido submetidos a umaou mais fases de metamorfismo e deformação e são, obviamente, o resultado das transfor-mações pós-deposicionais que sofreram. Freqüentemente, é difícil distinguir essas fases demetamorfismo pós-deposicional, nas quais sempre intervêm fases fluidas, dos eventos tipi-camente hidrotermais em zonas de cisalhamento, e assim alguns depósitos singenéticosmetamorfizados e sujeitos a processos posteriores de remobilização hidrotermal de fasespassam a ser considerados depósitos epigenéticos de origem hidrotermal. Um exemplodessa dificuldade é ajazida do Salobo 3A (PA), de origem sedimentar-exalativa e posterior-mente afetada por eventos metamórfico-hidrotermais com remobilização parcial de fases,a qual também já foi interpretada como um depósito hidrotermal, associado a zona de cisa-lhamento em formação ferrífera, por Siqueira (1996).

Outros casos ainda mais surpreendentes são os depósitos que se encontram hospe-dados em estruturas que cortam as mesmas rochas (plutônicas, por exemplo) que atuaramcomo fonte subsidiária dos fluidos mineralizantes. Um exemplo é o depósito de ouro doCumaru (PA), alojado em zona de cisalhamento que afeta o granodiorito Cumaru, o mesmoque pode ter servido de fonte adicional de fluidos para a mineralização (Santos, 1995).

Finalmente, deve-se registrar que há muitos aspectos favoráveis à viabilidade eco-nômica de certos depósitos minerais que advêm do fato de terem sido metamorfizados,como, por exemplo, a remobilização e reconcentração de ouro em depósitos de baixosteores em zonas mais ricas, ou o aumento da granulometria dos sulfetos por annealing ;oque torna mais fácil a sua separação na fase de beneficiamento do minério.

Quadro 14 - CONTRIBUIÇÃO DA PETROGRAFIA DE

MINÉRIOS À TECNOLOGIA MINERAL

Bernardino Ribeiro Figueiredo 273

Ao lado dos estudos metalogenéticos e exploratórios, a petrografia de minérios ainda podeoferecer subsídios importantes para a seleção de tecnologias de extração do mineral de interesse,objetivo da indústria mineral. Essas tecnologias deverão dar conta do beneficiamento do minério edo refino dos metais nele contidos.

Durante a fase de beneficiamento, o minério é cominuído em britadores e moinhos até umagranulometria que permita a liberação do mineral de interesse, que em seguida é separado do rejeito(minerais não econômicos) graças a uma ou mais propriedades físicas e/ou químicas específicas quepermitam essa separação. O produto útil do beneficiamento mineral é o concentrado que é encami-nhado às fases posteriores de tratamento metalúrgico para a separação final dos metais de interesse.

É fácil entender que a identificação das fases minerais econômicas e não econômicas, a determi-nação de suas composições químicas e o inventário de suas propriedades físicas e químicas (densi-dade, suscetibilidade magnética, propriedades superficiais etc.) constituem informações preciosaspara a tecnologia mineral. Igualmente importantes são as informações sobre as estruturas e texturasdos minérios, o tamanho e forma dos grãos, a natureza dos contatos de grãos, os intercrescimentose arranjos texturais. Todas essas informações podem ser facilmente reunidas durante os trabalhosde petrografia de minérios e refinadas por meio do uso da microscopia eletrônica de varredura eanálise automática de imagens.

Os aspectos relativos ao processamento de minérios assumem importância crescente com oesgotamento das jazidas mais superficiais e mais ricas e o necessário aproveitamento de minérioscom teores cada vez mais baixos, sob condições de uma crescente preocupação com a preservaçãoambiental. Os exemplos seguintes podem ilustrar o amplo espectro de colaboração da petrografia deminérios à tecnologia mineral.

O conhecimento dos tipos de intercrescimento entre minerais de interesse e os não econômicospodem alertar para eventuais diluição dos concentrados, por um lado, ou perda de metal para osrejeitos, por outro. Intercrescimentos mirmequíticos ou gráficos, do tipoflames de pentlandita empirrotita, blebs de calcopirita em esfalerita e outros, representam condições diffcies de separação/liberação mineral, senão insuperáveis.

A presença de filmes de óxido de ferro na superfície de grãos de ouro ou ouro como inclusõesem pirita, tornando difícil a liberação do metal, lamelas de hematita em ilmenita impossíveis deseparar, intercrescimentos com minerais de ganga não suscetíveis a flotação, presença de sulfetosde ferro que consomem oxigênio necessário à cianetação ou presença de sulfetos de cobre, stibinitae arsenopirita que aumentam o consumo de solução de cianeto, presença de arsênio que podeprovocar reprecipitação do ouro a partir do líquido lixiviado ou ainda contaminação atmosféricadurante a metalurgia do cobre e metais nobres podem constituir problemas para o beneficiamentodos minérios. As feições favoráveis e também as menos desejáveis dos minérios podem ser anteci-padas pela petrografia de minérios.

Também podem ser pesquisados certos problemas clássicos para as diferentes fases de trata-mento de minérios como a presença de fósforo em minério de ferro, ocorrência de asbestos naganga, presença de minerais radioativos, fluorita e grafita em minérios sulfetados etc.

Finalmente, as técnicas de petrografia de minérios podem ser aplicadas com igual sucesso noestudo de embutidos de concentrados, os quais podem ser monitorados mediante amostragem emdiferentes estágios de processamento, e no estudo dos produtos siderúrgicos e metalúrgicos.

274 Minérios e ambiente

Os minérios que a natureza consumiu um longo tempo para concentrar representam, na verdade,um desafio à inteligência humana no que corresponde à seleção e desenvolvimento de técnicas deaproveitamento que evitem ou minimizem ao mesmo tempo o desperdício da matéria-prima nãorenovável e os efeitos adversos ao meio ambiente e aos agrupamentos humanos.

Bernardino Ribeiro Figueiredo 275

Bibliografia recomendada

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