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RSP

ENAP Escola Nacional de Administração Pública

Brasília – 2008

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Missão da Revista do Serviço PúblicoDisseminar conhecimento sobre a gestãode políticas públicas, estimular a reflexão eo debate e promover o desenvolvimento deservidores e sua interação com a cidadania.

ENAP Escola Nacional de Administração PúblicaPresidente: Helena Kerr do AmaralDiretor de Formação Profissional: Paulo CarvalhoDiretora de Desenv. Gerencial: Margaret BaroniDiretora de Comunicação e Pesquisa: Paula MontagnerDiretor de Gestão Interna: Lino Garcia Borges

Conselho EditorialBarbara Freitag-Rouanet, Fernando Luiz Abrucio,Helena Kerr do Amaral, Hélio Zylberstajn, LúciaMelo, Luiz Henrique Proença Soares, MarcelBursztyn, Marco Aurelio Garcia, Marcus AndréMelo, Maria Paula Dallari Bucci, Maria Rita G.Loureiro Durand, Nelson Machado, Paulo Motta,Reynaldo Fernandes, Silvio Lemos Meira, Sônia

Miriam Draibe, Tarso Fernando Herz Genro,Vicente Carlos Y Plá Trevas, Zairo B. Cheibub

PeriodicidadeA Revista do Serviço Público é uma publicaçãotrimestral da Escola Nacional de AdministraçãoPública.

Comissão EditorialHelena Kerr do Amaral, Paula Montagner, PauloSergio de Carvalho, Natália Massaco Koga,Elisabete Roseli Ferrarezi, Elizabeth Nardelli,Livino Silva Neto.

ExpedienteEdição: Elizabeth Nardelli; Subedição: Leila Ollaik;Projeto gráfico: Livino Silva Neto; Revisão: LucianaBarreto e Roberto Carlos Araújo; Revisão gráfica:Ana Cláudia Borges; Editoração eletrônica: MariaMarta da Rocha Vasconcelos

© ENAP, 2008Tiragem: 1.000 exemplaresAssinatura anual: R$ 40,00 (quatro números)Exemplar avulso: R$ 12,00Os números da RSP Revista do Serviço Público anterioresestão disponíveis na íntegra no sítio da ENAP:www.enap.gov.br

As opiniões expressas nos artigos aqui publicados sãode inteira responsabilidade de seus autores e nãoexpressam, necessariamente, as da RSP.

A reprodução total ou parcial é permitida desde quecitada a fonte.

Revista do Serviço Público. 1937 - . Brasília: ENAP, 1937 - .

v. : il.

ISSN:0034/9240

Editada pelo DASP em nov. de 1937 e publicada no Rio de Janeiro até 1959. A periodicidade varia desde o primeiro ano de circulação, sendo que a partir dos últimosanos teve predominância trimestral (1998/2007). Interrompida no período de 1975/1980 e 1990/1993.

1. Administração Pública – Periódicos. I. Escola Nacional de Administração Pública.

CDD: 350.005

Fundação Escola Nacional de Administração PúblicaSAIS – Área 2-A70610-900 – Brasília - DFTelefone: (61) 3445 7096 / 7092 – Fax: (61) 3445 7178Sítio: www.enap.gov.brEndereço eletrônico: [email protected]

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SumárioContents

Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação:proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores 121Monitoring the National Educational Plan: a proposal to improveIdeb and the panel of indicatorsLeonardo Milhomem de Rezende e Paulo de Martino Jannuzzi

Conselhos Municipais de Políticas Públicas: uma análise exploratória 151Municipal Councils for Public Policies: an exploratory analysisMarcelo Feijó Martins, Simone Martins, Adriel Rodrigues de Oliveira e Jéferson Boechat Soares

Transformando burocracias para financiar os mais pobres:a evolução do Pronaf Crédito Grupo BTransforming bureaucracy to finance the poorest: the evolutionof ‘Pronaf crédito grupo B’ 187Letícia Mendonça

Gestão Pública e Pesquisa Operacional: avaliação de desempenhoem Agências da Previdência SocialPublic Management and Operational Research: performance evaluationof Agencies of Social Security 221Adelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. Thomaz

Legados da professora Ruth Cardoso ao Governo Federal 237Elisabete Ferrarezi

RSP Revisitada: Estado, transnacionalidade e políticas globais 245

Reportagem: A força propulsora do diálogo social 253

Para saber mais 259

Acontece na ENAP 261

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Leonardo Milhomem de Rezende e Paulo de Martino Jannuzzi

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 121-150 Abr/Jun 2008

Monitoramento do Plano deDesenvolvimento da Educação:proposta de aprimoramento do

Ideb e de painel de indicadores*

Leonardo Milhomem de Rezende e Paulo de Martino Jannuzzi

Introdução

A qualidade da educação básica parece ter entrado na agenda formal das

políticas públicas do Estado brasileiro no ano 2000, depois de muito tempo

debatida em círculos acadêmicos e políticos mais restritos. Até então, a pauta

educacional dessa agenda estava claramente focada na necessidade de

promover o ingresso massivo das crianças nas escolas do ensino fundamental,

nas áreas mais pobres do País e, subsidiariamente, na melhoria do desempenho

escolar dos alunos. Tendo logrado nos últimos 15 anos (1992 a 2006) o aumento

significativo das taxas de cobertura no ensino fundamental, de 82% para 96%

entre crianças e jovens de 7 a 14 anos, o esforço governamental (em nível

federal e nos estados) concentra-se agora na busca de soluções para reverter o

quadro pouco alentador revelado pelas avaliações sistemáticas de proficiência

dos estudantes ao longo do ciclo escolar.

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Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 121-150 Abr/Jun 2008

Um fato revelador dessa preocupaçãocom a qualidade de ensino foi a propo-sição, pelo Ministério da Educação(MEC), no âmbito do Plano de Desenvol-vimento da Educação (PDE), de umamedida concreta e objetiva para monito-ramento e avaliação dos resultados dasações e programas voltados a essadimensão educacional: o Índice de Desen-volvimento da Educação Básica (Ideb).O Decreto no 6.094/2007, que dispõesobre o Plano de Metas CompromissoTodos pela Educação, legitima o Idebcomo instrumento de avaliação daqualidade educacional, medido pela profi-ciência dos alunos nos exames padroni-zados, como o Saeb e a Prova Brasil, doMEC, e pelo rendimento escolar, obtidopelo Censo Escolar. O Ideb passa a serconsiderado o indicador de avaliação parao PDE, inclusive com ampla divulgaçãoe o estabelecimento de metas bianuais deelevação de suas cifras para os municípiosde todo o País.

É certo que o acompanhamento daação governamental e da efetividade deseus programas não se resume à propo-sição e ao exame de um ou vários indi-cadores sociais mais gerais, exigindoinstrumentos e pesquisas de monitora-mento e de avaliação muito maiscomplexos e sistemáticos. Contudo, se asmensurações quantitativas propostas seinspirarem, de fato, nos pressupostos deelaboração de indicadores de políticas eguardarem, na sua construção, uma sériede propriedades metodológicas dese-jáveis (JANNUZZI, 2005), certamentepoderão trazer contribuições significativasao processo de avaliação da efetividadedos programas públicos. O uso desistemas de indicadores, ainda que longede ser suficiente para efetividade daspolíticas públicas, potencializa a chance de

sucesso, já que permite, em tese, aavaliação de resultados tecnicamente bemrespaldados e diagnósticos sociais abran-gentes e empiricamente referidos.

Além do respaldo técnico que o usode bons indicadores é capaz de fornecerà avaliação e ao monitoramento de polí-ticas públicas, é importante atentar parao fato de que os indicadores possibilitamum melhor acompanhamento, por parteda sociedade, dos resultados alcançados.Como assinalam Scandar Neto et al.(2006):

É cada vez mais evidente a neces-sidade de implementar um sistema deindicadores para monitoramento eavaliação baseado nas políticas,programas e ações. Tal sistema seriauma ferramenta poderosa de adminis-tração e gestão pública, não somentepara os formuladores de políticas, mastambém para aumentar o controlesocial e transparência das intervençõese das ações do setor público (SCANDAR

NETO et al. 2006 p. 9).

A relevância dos indicadores tem sidocada vez mais reconhecida pelo poderpúblico, como revelam as menções doTribunal de Contas da União (TCU) emseus relatórios de avaliação. Ilustrativas,nesse sentido, são as observações cons-tantes no Relatório de Avaliação dePrograma da Ação de Apoio à FormaçãoContinuada de Professores do EnsinoFundamental, elaborado pelo TCU em20061, em que aparecem trechosreferentes à necessidade de uso de indica-dores em diversas etapas do ciclo dapolítica em análise, como:

Quanto aos indicadores de desem-penho definidos para o gerenciamento

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da ação, analisou-se, preliminarmente,aqueles constantes no PPA 2004/2007....

O modelo da ação lógica não previaavaliação de sua efetividade, tampoucoa construção de outros indicadores....

No sentido de minimizar essasdeficiências, apresenta-se uma sugestãode cesta de indicadores de desem-penho (TCU, 2006 p.73-75).

Nas últimas duas décadas, tem-seobservado um processo cada vez maisintenso de proposição de indicadoresde monitoramento e avaliação da açãogovernamental, assim como de indicadoressociais mais gerais, dentro e fora das orga-nizações públicas. No campo das políticaseducacionais vigoram, na realidade, já háalgum tempo, diversos indicadoresconstruídos para acompanhar e monitorara situação da educação, além de avaliar osresultados de intervenções governamentais.Exemplos são as taxas de analfabetismo,analfabetismo funcional, freqüência escolar,evasão, reprovação, coeficientes de alunospor professor e outras tantas medidasdisponíveis na compilação apresentada emMEC/Inep (2004).

O Ideb é mais uma dessas medidas,com objetivos e propriedades específicas,que, neste trabalho, se busca explorar,entender e discutir. Mais especificamente,o objetivo deste trabalho é analisar ascaracterísticas do Índice de Desenvolvi-mento da Educação Básica, as finalidadesda sua construção, seus usos e limitações etambém propor outros indicadores paraacompanhar os resultados e impactosdo PDE.

Este texto está organizado emcinco seções. Na primeira, discute-se opapel e o uso dos indicadores no ciclo de

políticas públicas, em especial no moni-toramento e na avaliação de programas.A seção seguinte tem caráter maismetodológico, tratando da construção deindicadores sintéticos, seus usos e limi-tações. Apresenta-se, então, o Ideb ese discute tanto suas característicase potencialidades quanto suas restriçõespara o acompanhamento da agenda dapolítica educacional. As duas últimaspartes são dedicadas à apresentação de

propostas alternativas de indicadores – oIdeb+ e o Painel Pideb+ – paramonitoramento do PDE.

O ciclo de políticas públicas,a avaliação de programas e osindicadores

Política pública é, na definiçãode Nascimento (1991), o conjunto de

“O uso de sistemasde indicadores, aindaque longe de sersuficiente paraefetividade daspolíticas públicas,potencializa a chancede sucesso ...”

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Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores

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decisões tomadas por aqueles que detêmcompetência legal para deliberar em nomeda coletividade, visando à solução de umproblema ou redirecionamento de umatendência a fim de orientar sua evolução aum fim estabelecido desejável. Para suaformatação e conseqüente operação, apolítica pública passaria por um ciclo devárias etapas, listadas pela autora comoformulação da política; administração ouimplementação da política e a avaliação.Para a autora, a etapa de formulação podeser subdividida em definição da agendapública, formulação e formalização.

A definição da agenda é a fase em queocorre a filtragem dos problemas ou dedemandas sociais a serem priorizadas, entreas diversas existentes em países com tantosdeficits sociais, como o Brasil. Váriosatores contribuem para a formação dessaagenda, em particular a burocracia pública.O processo é, no entanto, complexo, nãolinear. Certa demanda social pode serreconhecidamente importante para grandeparte da população de um determinadopaís, mas não entrar ou não ser priorizadana agenda por falta de interlocutoresformais com peso político. Fatoresambientais como desastres podem fazercom que alguns temas entrem imedia-tamente na agenda. O processo eleitoral éoutro mecanismo de atualização da agenda,tão mais efetivo quanto mais consistentese factíveis as propostas de ação constantesnas plataformas dos candidatos. Mas, emmuitas situações, as decisões sobre arelevância das questões sociais são avaliadasdentro dos órgãos de governo, com basena análise particular que seus técnicostêm da gravidade e dos reflexos de umdeterminado problema, da conjuntura edas circunstâncias favoráveis e desfavo-ráveis para o processo de implementaçãode um programa ou projeto.

Uma vez que se considera determi-nado objeto como relevante para a agendaformal de governo, passa-se à etapaseguinte: a formulação da política e de seusprogramas. Essa fase corresponde princi-palmente à aquisição de conhecimentossobre o tema a ser abordado e à elabo-ração de proposta(s) capaz(es) de resolvero problema ou atender à demanda que ooriginou.

Segue-se então a etapa de formalizaçãoou tomada de decisão, que corresponde àlegitimação da política pelas autoridadesconstituídas (NASCIMENTO, 1991). Deforma simples, esta pode ser entendidacomo o momento em que se prepara amáquina pública para a execução da polí-tica determinada. É nessa fase que tambémse reúnem tanto informações de inter-venções passadas quanto outras relevantespara determinar o rumo da intervençãoatual. É o momento ainda de decidir comose dará a otimização de recursos de formaa não inviabilizar essa ou outra política.

E é na etapa de implementação que apolítica pública começa a ser executada eos recursos alocados geram ações capazesde agir e mudar certa realidade. Aqui apolítica adquire uma concretude objetivamaior e, por isso, começa a revelar expli-citamente as dificuldades de sua introduçãoe operação pelos agentes encarregados de“pôr a mão na massa”. Essa fase possuialgumas dificuldades inerentes, como aexeqüibilidade teleológica, que respondepela adequação entre os meios e os fins; aadequação técnica dos meios empregadosà produção de resultados desejados; aefetividade econômica que considera adisponibilidade de recursos exigidos pelapolítica; e o apoio do governo e de setoresbeneficiados pela política no início e nodecorrer de sua implementação (JAGUARIBE

apud NASCIMENTO, 1991).

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Seguindo o modelo do ciclo de polí-ticas públicas apresentado por Nascimento(1991), a fase subseqüente consiste naavaliação, quando, em tese, averigua-se nãosomente em que medida os resultadosestão sendo alcançados, mas a que custose executam os programas, seus impactosnegativos e positivos e a conveniência ounão de revisão parcial ou total da política(e sua relevância na agenda). Nas palavrasde Cohen & Franco (1999:76), “a avaliaçãoé uma atividade que tem como objetivomaximizar a eficácia dos programas naobtenção de seus fins e a eficiência naalocação de recursos para a consecuçãodeles”. Corresponde ao exame sistemáticodas intervenções planejadas na realidade,tendo por base procedimentos científicosde coleta e análise de informações sobre oconteúdo, estrutura, processos, resultadose/ou impactos de políticas, programas ouprojetos (RUA, 2004).

Este ciclo de formulação das políticaspúblicas, tal como descrito, é certamente ummodelo idealizado, com aderência bastantelimitada ao cotidiano brasileiro ou de outrospaíses. Ainda assim, ele se presta aos objetivosde evidenciar, ao longo do processo, ênfasesdiferenciadas no planejamento, na operaçãoou na avaliação dos programas. A última fase,por exemplo, não é totalmente destacada dasdemais ou realizada somente alguns anosdepois da implementação dos programas.Pelo contrário, a avaliação deve ser enten-dida como um processo que permeia todoo ciclo de uma política pública, sendoportanto mais adequado denominar esseconjunto de atividades como “Monitora-mento e Avaliação” (RUA, 2004). Como bemexpõe documento do Tribunal de Contasda União:

O monitoramento e avaliaçãodos programas de governo são

ferramentas essenciais para a boaprática gerencial. A avaliação é umprocedimento que deve ocorrer emtodas as etapas, permitindo ao gestorfederal o acompanhamento das açõese sua revisão e redirecionamentoquando necessário. Enquanto omonitoramento é uma atividadegerencial interna, que se realiza duranteo período de execução e operação, aavaliação pode ser realizada antes oudurante a implementação, como aoconcluir uma etapa ou projeto comoum todo, ou mesmo algum tempodepois, devendo se preocupar como impacto provocado pela inter-venção pública em seus beneficiários.(TCU, 2006, p. 75).

Para desenvolvimento adequado dasatividades de monitoramento e avaliação,do grau de cumprimento das metas eobjetivos da política, com objetividadee regularidade, é necessário que o gestordisponha de um sistema de informações epesquisas que lhe ofereça indicações dograu de implementação dos programas, deseus resultados e de eventuais impactos nasociedade, isto é, indicadores de monito-ramento e avaliação dos programas. Comoobservam Cohen e Franco (1999):

Uma instância central do processo deavaliação consiste em determinar emque grau foram alcançadas as finalidadesdo projeto. Isto requer dimensionar oobjetivo geral em subconjuntos deobjetivos específicos, os quais por suavez terão “metas”, cuja obtenção serámedida através de indicadores. Asvariações nos valores que serão veri-ficados nas unidades de análisepermitem quantificar este processo.(COHEN; FRANCO, 1999; p. 152).

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Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores

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Jannuzzi (2005) destaca que nocampo aplicado das políticas públicas, osindicadores sociais são medidas usadas parapermitir a operacionalização de umconceito abstrato ou demanda de interesseprogramático.

Os indicadores apontam, indicam,aproximam, traduzem em termosoperacionais as dimensões sociais deinteresse definidas a partir de escolhasteóricas ou políticas realizadas ante-riormente. Se prestam a subsidiar asatividades de planejamento público eformulação de políticas sociais nasdiferentes esferas de governo, possibi-litam o monitoramento das condiçõesde vida e bem-estar da população porparte do poder público e sociedadecivil e permitem aprofundamentoda investigação acadêmica sobre amudança social e sobre os determi-nantes dos diferentes fenômenossociais (JANNUZZI, 2005, p.138).

A construção de indicadores paramonitoramento e avaliação de programasdeveria ser pautada, segundo o autor, pelaaderência dos mesmos a um conjunto depropriedades desejáveis, ainda que sejadifícil garanti-las simultaneamente. Comoessas propriedades servirão de critérios deavaliação do Ideb mais à frente, é essencialuma exposição detalhada de algumas dessaspropriedades.

Uma propriedade fundamental paraqualquer indicador é a sua validade, isto é,sua capacidade de retratar o conceito ou oobjetivo para o qual a medida foi ideali-zada. Essa parece ser uma tautologia, masa realidade é que existem indicadores –em especial, indicadores sintéticos (discu-tidos mais à frente), nos quais a proxi-midade entre conceito e medida é bastante

discutível (JANNUZZI, 2002; GUIMARÃES &JANNUZZI, 2005).

Para uso na tomada de decisão empolíticas públicas, o indicador deve serconfiável, ou seja, computado a partir dedados de boa qualidade, provenientesde fontes e pesquisas consistentes e sujeitosa controle de qualidade e de tendenciosidade.Devem gozar de inteligibilidade, isto é,a transparência da metodologia de suaconstrução. Igualmente importante é acomunicabilidade do indicador, sua capaci-dade de “passar claramente o recado” porele aportado para diferentes públicos.

A sensibilidade e a especificidade sãopropriedades importantes para indicadoresde monitoramento e avaliação. Sensibilidadedo indicador corresponde à sua capacidadede refletir, de modo tempestivo, asmudanças a que ele se propõe retratar.Especificidade do indicador correspondeà sua propriedade de refletir alteraçõesestritamente decorrentes do programa ouação que ele se propõe a monitorar.

Naturalmente, a periodicidade é outrapropriedade fundamental para que umindicador seja útil no processo de monito-ramento das ações públicas. Afinal,somente com informações regularmenteproduzidas é que se pode avaliar os efeitosdos programas – ou ausência deles – ecorrigir eventuais distorções a tempo. Emalguns casos é extremamente caro realizarpesquisas e coleta de dados, o que remetea outra propriedade: a factibilidade dadisponibilidade do indicador. O custo e otempo para obtenção do indicador têmde ser compatíveis com as necessidades eos usos que se faz dele.

Séries históricas trazidas por um indi-cador são bastante relevantes por permi-tirem acompanhar tendências e comparareventuais efeitos e impactos dos programasao longo do tempo. Isso constitui a

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historicidade de um indicador, outroatributo interessante para indicadores demonitoramento.

Os indicadores usados no monitora-mento e na avaliação de políticas públicaspodem ser classificados de várias formasdiferentes, como mostra o Quadro 1,elaborado por Ottoni (2006). Uma taxo-nomia importante e presente nesse quadroé a que diferencia os indicadores entreindicador-insumo, indicador-processo eindicador-resultado.

Como define Jannuzzi (2004), os indi-cadores-insumo correspondem às medidasassociadas à disponibilidade de recursoshumanos, financeiros ou equipamentosalocados para um processo ou programaque afeta uma das dimensões da realidadesocial. São tipicamente indicadores dealocação de recursos para políticas sociais,como número de escolas com laboratóriode ciências ou quadras de esportes,coeficiente técnico de professores por aluno,biblioteca pública por população de cincoanos ou mais ou, ainda, gasto monetárioper capita nas diversas áreas de política social.

Os indicadores-resultado são aquelespropriamente vinculados aos objetivosfinais dos programas públicos, quepermitem avaliar a eficácia no cumprimentodas metas especificadas, como a taxa deanalfabetismo, cuja diminuição se esperaverificar com a implementação de umprograma como o Educação de Jovens eAdultos (EJA). Parte desses resultados podeter efeitos e desdobramentos gerais, ante-cipados ou não, positivos ou não, quedecorrem da implantação dos programas.Um programa como o EJA, por exemplo,pode levar seus participantes a terem papelmais ativo na comunidade ou a buscaremmelhores empregos, por ampliarem seushorizontes de possibilidades e repertórioscognitivos. Nesses casos, costuma-se

denominar os indicadores que medem essasdimensões de indicadores de impacto.

Já os indicadores-processo ou fluxosão indicadores intermediários, quetraduzem em medidas quantitativas oesforço operacional de alocação derecursos humanos, físicos ou financeiros(indicadores-insumo) para obtençãode melhorias efetivas de bem-estar (indi-cadores-resultado e impacto), como ovolume de merendas escolares distribuídas

diariamente por alunos, os professorescapacitados em uma nova metodologia,ou ainda homens-hora dedicados a umprograma social.

Indicadores sintéticos:construção, usos e limitações

Desses vários tipos de indicadoresdispostos no Quadro 1, interessa destacar,

“... somente cominformaçõesregularmente produzidasé que se pode avaliar osefeitos dos programas –ou ausência deles – ecorrigir eventuaisdistorções a tempo.”

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Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores

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para os objetivos deste trabalho, os indi-cadores sintéticos, também denominadosde indicadores compostos ou índicessociais. A principal característica dos indi-cadores sintéticos é a de aglutinar dois oumais indicadores primários (ou simples),por meio de métodos aritméticos ou esta-tísticos, em uma única medida. Um dosindicadores sintéticos mais conhecidos é oÍndice de Desenvolvimento Humano(IDH), que compila três dimensões bemdistintas, como esperança de vida, PIB

per capita e indicador composto de taxa deanalfabetismo e de taxa bruta de freqüênciaescolar. O Índice de Desenvolvimento daEducação Básica (Ideb) – objeto de análisedeste trabalho – constitui outro exemploque, nesse caso, sintetiza duas dimensões:o desempenho de alunos em testespadronizados e o rendimento escolar(aprovação).

Esses indicadores sintéticos sãoconstruídos a partir de uma operaçãometodológica realizada em várias etapas

Quadro 1: Classificação, descrição e exemplos de indicadores.

Fonte: Ottoni, 2006.

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sucessivas, como pode ser observado naFigura 1, baseada em Scandar Neto et al.(2006). O primeiro passo no processoconsiste em definir o marco ordenador,marco conceitual ou ainda marcoinstitucional, que orientará as demais etapas.Para garantir que a medida sintética finalseja, de fato, útil para o monitoramento ea avaliação dos programas, é fundamentalque os documentos propositivosda política pública específica sejam

exaustivamente usados na montagem dessemarco, explicitando as dimensões maisobjetivas e relevantes de acompanhamento.

Uma vez definido o marco conceituale suas dimensões, é necessário selecionaros indicadores primários que comporãoo índice. Os indicadores primários devemestar em consonância com o marcoordenador, referidos especificamente nasdimensões. Mas nem sempre é possíveldispor de indicadores com a periodicidaderequerida e muito menos com as proprie-dades desejáveis. Essa é uma etapa quetambém exige cuidado, a fim de evitar queo indicador sintético perca ao final suavalidade, especificidade e sensibilidade.

A etapa seguinte envolve o tratamentoquantitativo para combinar as medidas,expressas em diferentes escalas, de modoa produzir o indicador sintético. Existemvários métodos quantitativos – aritméticos,estatísticos, de pesquisa operacional –passíveis de serem empregados, cada umcom suas virtudes e limitações, conforme

se discute em Scandar Neto (2006). Asofisticação do método empregado nãoassegura, necessariamente, que o indicadorsintético produzido tenha maior validadeou sensibilidade que outro computado pormeio de algoritmos muito simples.

Uma vez computado, o índice deveser analisado quanto à sua real capacidadede expressar quantitativamente o que sepropugnava ao se estabelecer o marcoconceitual.

Um exemplo de indicador sintéticoconstruído no campo educacional, queprecedeu, inclusive, o Ideb, foi o IndicadorMunicipal de Desenvolvimentoda Educação (IMDE), proposto porCunha et al. (2001). Conforme ilustradona Figura 2, para construir esse indicadorforam usados diversos indicadores docenso escolar e outros fornecidos peloIBGE. Observa-se a utilização de váriostipos de indicadores com característicasmuito distintas, na tentativa de sintetizar emapenas um indicador a realidade dodesenvolvimento e da qualidade daeducação em nível municipal. No entanto,os próprios autores reconhecem as limi-tações de um indicador sintético nessesmoldes, pois seriam pouco reveladoresdas especificidades dos fenômenos quebuscam mensurar. Esse é um caso no quala medida-síntese parece não ter a utilidadeimaginada.

Há um debate polarizado na literaturaacerca da utilidade e pertinência do uso de

Figura 1: Etapas para a construção de um indicador sintético.

Fonte: Scandar Neto et. al. (2006) com adaptações.

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Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores

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indicadores sintéticos nas políticas públicas.Há quem os defenda, relacionandodiversos argumentos a favor: são medidasinteressantes por sintetizar conceitoscomplexos e multidimensionais e, portanto,auxiliam a tomada de decisões; oferecemuma visão geral do problema ou conceitoque procuram representar; permitem acomparabilidade e ranqueamento entrepaíses (ou municípios), possibilitando acom-panhar o desempenho deles; resumem emuma só medida o impacto de várias açõese programas governamentais; e ajudam achamar a atenção da população e da mídiapara questões sociais e para a efetividadeda ação governamental (como temocorrido com o IDH).

Os autores que criticam os indicadoressintéticos arrolam outros argumentoscontra: se forem construídos sem proce-dimentos metodológicos adequados,podem emitir mensagens políticas equivo-cadas; os gestores podem tomar decisõessimplistas devido à visão geral que oindicador apresenta; o processo de compi-lação dos dados pode fazer com quedados relevantes percam o sentidono cálculo do indicador, diminuindo asua sensibilidade em captar mudanças

importantes em uma de suas dimensões;em muitos casos, a medida acaba adqui-rindo mais importância do que o conceitoque a originou (o fetiche do indicador emdetrimento do constructo).

Guimarães & Jannuzzi (2005), críticosdo uso dos indicadores sintéticos,reconhecem que esses indicadoresacabaram conquistando legitimidadesocial, política, técnica e científica. Pareceser esse o caso do Ideb, analisado emseguida.

O PDE e o Índice de Desenvol-vimento da Educação Básica

O Plano de Desenvolvimento daEducação (PDE) pode ser entendido comoum conjunto de programas que objetivamdar conseqüência às metas quantitativasestabelecidas no Plano Nacional deEducação (PNE). O Plano compreendemais de 40 programas que podem serorganizados em torno de quatro eixosnorteadores: educação básica, educaçãosuperior, educação profissional e alfabeti-zação. No eixo da educação básica, umdocumento que merece destaque paraas finalidades deste trabalho é o Plano de

Figura 2: Variáveis selecionadas para construção do IMDE

Fonte: Cunha et al. (2001) com adaptações.

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Quadro 2: Diretrizes e iniciativas do Plano de Metas Compromisso Todos pelaEducação

Fonte: Elaboração própria com base no Dec. 6.094, de 24 de abril de 2007.

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Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimoramento do Ideb e de painel de indicadores

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Metas Compromisso Todos pela Educação(Dec. no 6.094, de 24 de abril de 2007),doravante denominado de Compromisso.Ao todo são 28 diretrizes (Quadro 2) aserem implementadas, com auxílio daUnião, nos estados, Distrito Federal e mu-nicípios que o assinarem.

Para acompanhar a efetividade dosprogramas, estabelecer metas concretas aperseguir e focalizar ações do MEC, foicriado o Índice de Desenvolvimento daEducação Básica (Ideb). Como citado emdocumento do MEC (2007):

A partir da criação do Ideb, calcula-do por escola, por rede e para o pró-prio país, foi possível fixar metas dedesenvolvimento educacional de médioprazo para cada uma dessas instâncias,como metas intermediárias de curtoprazo que possibilitam visualização eacompanhamento da reforma quali-tativa dos sistemas educacionais.

O Ideb permite identificar as redese as escolas públicas mais frágeis apartir de critérios objetivos e obriga aUnião a dar respostas imediatas paraos casos mais dramáticos ao organizaro repasse de transferências voluntáriascom base em critérios substantivos. Oescopo é atender imediatamente 1.242municípios e as 7.085 escolas com osmais baixos indicadores e, em curtoprazo, todos os que estejam abaixo damédia nacional (p. 22-23).

Sua proposição foi inspirada naconstatação de que a “indústria da apro-vação automática” é tão perniciosa quantoa “indústria da repetência”, o que levou seusproponentes a combinarem os resultadosde desempenho escolar (Prova Brasil) e osde rendimento escolar (fluxo apurado peloCenso Escolar) em um único indicador.

Mais precisamente, como apresentadoem Inep (2007), o Ideb é calculado comoo produto de dois indicadores (fórmula 1abaixo): a) a pontuação média dosestudantes em exames padronizados aofinal de cada etapa da educação básica(exames do Sistema de Avaliação da Edu-cação Básica ou Prova Brasil nas 4a e 8a

séries do ensino fundamental e 3o anodo ensino médio); b) taxa média deaprovação dos estudantes da corres-pondente etapa de ensino.

Onde:i = ano do exame (Saeb e Prova Brasil) e do CensoEscolar; j = unidade de referência (estado, escola, etc.)Nji = média da proficiência em Língua Portuguesae Matemática, padronizada para um indicadorentre 0 e 10, dos alunos da unidade j, obtida emdeterminada edição do exame realizado ao final daetapa de ensino;Pji = indicador de rendimento baseado na taxade aprovação da etapa de ensino dos alunosda unidade j.

A taxa de aprovação é calculada pelafórmula (2), a saber:

Onde:s = série do ensino fundamental ou ensino médio .Aprov = número de aprovados na série ou grupo deséries s;Ms = matrícula inicial na série ou grupo de séries s;AFs = afastados por abandono ou transferência nasérie ou grupo de séries s;ADs = admitidos por transferência na série ou grupode séries s;

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RECs = Reclassificados para a série ou grupode séries s;DESs = alunos que saíram da série ou grupo deséries s, por reclassificação.

A média de proficiência padronizadados estudantes da unidade j, Nji é obtidaa partir das proficiências médias emLíngua Portuguesa e Matemática dosestudantes submetidos a determinadaedição do exame realizado ao final daetapa educacional considerada. Como aescala do Saeb ou Prova Brasil variaentre 0 e 500 pontos, é preciso usar ummétodo para que essa nota seja conver-tida para uma escala entre 0 e 10. No casodo Ideb, essa nota é convertida usandoum método denominado padronização(fórmula 3).

Onde:a = disciplina (Matemática ou Língua Portuguesa);naji = proficiência na disciplina á, obtida pela unidade j,no ano i, padronizada para valores entre 0 e 10;Saji = proficiência média (em Língua Portuguesaou Matemática) não padronizada dos alunos daunidade j obtida no exame do ano i;Sainf = limite inferior da média de proficiência(Língua Portuguesa ou Matemática) do Saeb 1997;Sasup = limite superior da média de proficiência(Língua Portuguesa ou Matemática) do Saeb 1997;

Para garantir a comparabilidade dosindicadores ao longo do tempo foram

adotados os limites inferior e superiorobservados nas provas de 1997, ano dedefinição da escala do Saeb. O limiteinferior considerado para a padronizaçãofoi a média subtraída de três vezes odesvio padrão, e o superior a médiaadicionada de três vezes o desvio padrão,levando à exclusão de notas excepcional-mente boas e ruins. As tabelas 1 e 2mostram a média e o desvio padrão daproficiência dos alunos de 4a e 8a sériesdo ensino fundamental e do 3o ano doensino médio, e os valores usados comolimites inferiores e superiores na padroni-zação, respectivamente.

Com base nessas fórmulas, o Inepcalculou o Ideb para o Brasil, estados, muni-cípios e, até mesmo, por escola, conformedisposto na Tabela 3. Como os dados daTabela 1 já permitiriam deduzir, pelos baixosníveis de proficiência, a escola pública noBrasil não estaria “passando de ano”: o Idebcalculado para 2005 estaria bem abaixo de5 nos diversos níveis de ensino e contextos.O índice médio para as escolas do País seriade 3,8 para os anos iniciais do ensinofundamental, com resultados significati-vamente piores na zona rural (2,7). Nasescolas particulares e federais (em geral,colégios de aplicação vinculados a univer-sidades federais), o desempenho é maisalentador, superior a 5,9.

Apresentado o indicador, passa-seagora à sua análise crítica, a partirdos aspectos descritos nas seçõesanteriores acerca das propriedadesdesejáveis de um indicador de monito-ramento e de avaliação, bem como desuas potencialidades.

Do ponto de vista conceitual, semdúvida, o aspecto mais relevante do Idebé a sua utilidade para o PDE. Por ser umindicador de resultados, pode-se entenderque contempla a sua designação de um

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indicador de “avaliação” de resultadosobtidos pelos municípios que aderirem aoCompromisso. Se é fato que não goza daespecificidade que indicadores referidospara cada uma das 28 iniciativas do PDEdesfrutariam, por outro lado, permite que

o resultado sinérgico das mesmas sejaavaliado conjuntamente.

O indicador é dotado de validade, umavez que considera a combinação de doisindicadores referidos a dimensões asso-ciadas (desempenho no aprendizado e no

Tabela 3: Ideb computado para diversos contextos – Brasil 2005.

Fonte: Inep (2007b).

Tabela 2: Limites inferior e superior das proficiências no Saeb – Brasil 1997

Fonte: Inep (2007b).

Tabela 1: Proficiências médias e desvio padrão no Saeb – Brasil 1997

Fonte: Inep (2007b).

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fluxo escolar). Como se pode observar nosgráficos a seguir (Gráficos 1a e 1b), há umacorrelação alta entre Ideb e taxa deaprovação, e o Ideb e a nota padronizada.Ou seja, o indicador final parece nãoter-se distanciado das dimensões queforam associadas para a sua construção,mantendo assim certa “fidedignidade”

Gráfico 1: Correlação entre o Ideb e seus indicadores componentesBrasil-Rede Estadual – Anos iniciais do ensino fundamental 2005.

com o conceito de qualidade de educaçãoa que ele se propõe a mensurar.

A consistência metodológica do indi-cador é outro fator que deve ser consi-derado como um aspecto positivo. Seusidealizadores tiveram a preocupação de usarduas dimensões com características seme-lhantes, ou seja, indicadores de resultado,

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ao contrário do IMDE já referido. Naproposta de cômputo do IMDE, foramutilizadas dimensões como atendimento,progressão dos alunos, infra-estrutura eformação dos docentes, combinando-se12 indicadores de tipos diferentes, ou seja,de insumos, processos, resultados, o queacabou por gerar um indicador poucointeligível e com pouca consistênciametodológica.

Outra característica interessante noIdeb é a inteligibilidade de sua escala (de 0a 10). O modelo multiplicativo de cons-trução do Ideb facilita esse entendimentoe a análise da contribuição de cada um dosindicadores primários para o cálculo doindicador. Como se pode verificar nafórmula (4), a variação relativa do Idebpode ser decomposta em duas parcelas, avariação relativa da nota e a da aprovação.

IDEB = Nota + Tx Aprov IDEB Nota Tx Aprov

Vale atentar também para o fato de queos indicadores usados no Ideb afetam-semutuamente em sentidos opostos, ou seja,caso as escolas aumentem a taxa de apro-vação, isso poderá reduzir a qualidade doensino. Já o estabelecimento de padrõeselevados para aprovação tende a elevar asnotas nos testes padronizados, mas, porconseqüência, diminuir a taxa de aprovação.

Fernandes (2007) descarta essa carac-terística do Ideb ao afirmar que:

(...) não se pode descartar a possibi-lidade de as escolas e/ou redesde ensino adotarem medidas quemelhorem o fluxo e piorem o desem-penho nos exames padronizados evice-versa. Nesse caso, se a cobrançafor restringida apenas aos indicadoresde f luxo, ela pode incentivar os

professores, diretores de escolas egestores de rede a adotarem medidasque impliquem redução no desem-penho médio dos estudantes nos testespadronizados, como, por exemplo,reduzir o padrão de aprovação. Poroutro lado, se a cobrança for apenassobre os scores dos alunos, o incentivoé o oposto, como, por exemplo, elevaro padrão de aprovação (p.8).

A possibilidade de cômputo do Idebem nível de escolas, que remete à proprie-dade de desagregabilidade de um indi-cador, é outra característica importante damedida. É possível, dessa forma, avaliarem que medida a heterogeneidade socio-econômica estrutural presente nas cidadesbrasileiras afeta o desempenho educacionaldas crianças e adolescentes, mesmo quandosubmetidos, em tese, a iguais condições deoferta de serviços educacionais. Alunos deescolas de periferia mais pobre tenderiama ter desempenho pior do que aqueles deescolas mais centrais, situadas em bairrosde classe média, por não desfrutarem nemde condições materiais – alimentação,moradia etc. – nem do ambientesociocultural dessa classe, medido pelaescolaridade dos pais, pelas oportunida-des de acesso à rede de internet, jornais,cinema, TV a cabo, curso de inglês etc.Conhecer o diferencial do Ideb, entre essasescolas, é certamente importante paragestores públicos, não apenas da Educação,mas os ligados às pastas da Assistência eDesenvolvimento Social, da Cultura eEsportes, da Segurança Pública, já que asolução para a melhoria do desempenhoescolar só seria possível mediante o esforçoarticulado de ações mais específicas dosistema de ensino nessas escolas deperiferia, como aumento da jornadaescolar, promoção de atividades culturais,

(4)

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incentivo para fixação de professores maisexperientes ou qualificados, além deprogramas públicos mais abrangentes e deimpacto do ponto de vista social – maiorcobertura do Bolsa Família, obras de infra-estrutura urbana, policiamento, cursos dequalificação profissional para os pais etc.

Em que pesem os aspectos positivosacima relacionados, como todo indicadorsintético, o Ideb também tem suas limitações.A primeira crítica a se fazer é em relação àpadronização dos escores de proficiência.Entende-se que essa padronização é umatécnica amplamente utilizada, dotada devalidade científica e imprescindível para aconstrução do indicador segundo suafórmula multiplicativa. No entanto, nãodeve passar despercebido que a utilizaçãoda padronização acarreta uma perda relativade comensurabilidade das medidasoriginais, já que as escalas do Saeb e da ProvaBrasil deixam de ser referência para o seuentendimento. Se, por exemplo, a média dasnotas dos alunos de 4a série de uma determi-nada escola é 169,2 pontos em LínguaPortuguesa, pela escala estabelecida do Saebinfere-se que esses estudantes ainda não sãocapazes de “interpretar histórias emquadrinhos mais complexas, reconhecendoa ordem dos fatos” ou “inferir o sentidode uma expressão metafórica ou de umaonomatopéia em anedotas”. Quando essamesma nota é padronizada, transfor-mando-se em uma medida entre 0 e 10,perde-se a possibilidade de fazer taisinferências, ainda que se ganhe eminteligibilidade para a sociedade em geral,como comentado acima.

A combinação das notas padronizadasde Português e Matemática, para o côm-puto de uma nota média, é outra críticaque se pode fazer, pois acarreta perda deespecificidade dos indicadores. Se, porexemplo, a nota padronizada em Português

é 2,5 e a de Matemática é 7,5, a nota média(5,0) não indica em que disciplina se deveinvestir mais especificamente. Obviamenteque os dados básicos podem ser buscadose analisados, mas, de fato, o Ideb, por sisó, não é específico para programas deensino em nenhuma das duas áreas.

Outro ponto que merece atenção é ofato de que não há ponderação explícitados dois indicadores, o que não significaque tenham pesos iguais. Na realidade, a

nota padronizada acaba assumindo umpeso maior na definição do Ideb, comosugere o fato de ter um coeficiente devariação um pouco maior que a taxa deaprovação e uma correlação mais fortecom o Ideb, como se pode verificar nosGráficos 1a e 1b.

Outra limitação a ser apontada, acercadesse índice, não está relacionada à formacomo foi definido, mas ao modo como

“... talvez a maiorlimitação do Ideb sejanão incorporar, em seucômputo, a dimensãodo abandono escolar.”

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está sendo usado. Como já foi mencio-nado, uma das ações do PDE é darassistência, prioritariamente, a 1.242 muni-cípios com os mais baixos Índices deDesenvolvimento da Educação Básica.Entende-se que o Ideb até pode ser usadocomo um dos critérios para a seleção deum determinado público, mas não comoo único. Suponha que um município A, queestá entre os priorizados, possua escolascom uma estrutura física razoável sob umcerto padrão. Pressuponha agora que, foradessas 1.242 localidades, exista outromunicípio B com escolas em condiçõesprecárias de infra-estrutura. Ora, como oIdeb foi o fator preponderante de seleção,não contemplando a dimensão de infra-estrutura, o município B continuará comuma infra-estrutura precária no quedepender de apoio financeiro do MEC,ao menos momentaneamente, se o Idebfor o único indicador de priorização. Porser um indicador essencialmente de resul-tados, pode ser considerado ainda válidopara medir efeitos e impactos de ações eprogramas educacionais. Parece questio-nável, porém, a sua utilização como indi-cador para a priorização de públicos-alvo.

Mas talvez a maior limitação do Idebseja não incorporar, em seu cômputo, adimensão do abandono escolar. Emboraconsiderado como um problema jásolucionado em estados do Sul e Sudeste,o abandono ainda está presente em estadosmais pobres. Enquanto que, por exemplo,a taxa de abandono para a primeiraetapa do ensino fundamental da redeestadual de Santa Catarina situava-se abaixode 1%, no Piauí alcançava a cifra de 13,5%em 2005.

Fernandes (2007) justifica a ausência dadimensão “abandono escolar” no Idebexplicando que, por um lado, a presençade evasão durante a etapa de ensino2

elevaria a nota padronizada, uma vez queaqueles que abandonam tendem a possuirum desempenho inferior. Por outro, comoo exame padronizado é geralmenteaplicado antes de se determinar quem é,ou não, aprovado naquele ano, haveriauma subestimação da proficiência média,pois se estaria aplicando o exame paraalunos que não serão concluintes daquelaetapa de ensino, por terem sido repro-vados. Na realidade, pelo fato de os examesserem aplicados entre o final de outubro eo começo de novembro, muitos daquelesque seriam reprovados talvez não maisfreqüentassem as aulas, não prejudicandotanto assim a proficiência média. A hipó-tese apresentada por Fernandes (2007) éque esses vieses acabam compensando-se,garantindo que o Ideb, tal como compu-tado, constitua uma boa medida.

A hipótese é interessante, mas há dese ponderar que, na sua forma atual, oIdeb não captaria situações em que ossistemas de ensino estivessem elevando ospadrões de aprovação e mantendo aproficiência média, mas gerando tambémabandono dos alunos com dificuldadesde aprendizado durante o ano letivo. Emtese, um gestor diligente com as metasdo Ideb, mas mal intencionado emtermos dos compromissos educacionaismais abrangentes do PDE, poderia atépromover a dispensa de alunos commaiores dificuldades de aprendizadodevido a problemas associados à pobreza,ao trabalho infantil etc., para garantir quenão viessem a ser reprovados e/ou obterum mau desempenho no exame deproficiência.

Entendendo a necessidade de seenglobar a taxa de abandono no cômputode um indicador sintético do PDE,apresenta-se na seção seguinte uma medidaalternativa, o IDEB+.

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Ideb+, uma proposta deaprimoramento do Ideb paraconsiderar os efeitos da taxade abandono

É inquestionável a pertinência dos doisindicadores que compõem o Ideb, poissão capazes de sinalizar aos gestoreseducacionais a necessidade de garantir aprogressividade dos alunos no sistemaescolar segundo a idade esperada, semprejuízo de que estes dominem osconhecimentos e habilidades requeridos.No entanto, como preconiza a quintadiretriz do Plano de Metas CompromissoTodos pela Educação, apresentado noQuadro 2, os gestores de escolas nosmunicípios e estados devem também“combater a evasão pelo acompanhamentoindividual das razões da não-freqüênciado educando3 e sua superação”. Assim,considera-se fundamental que a dimensão“abandono” também seja abordadaao se avaliar o desenvolvimento daeducação. Afinal, o abandono parece serainda mais prejudicial para o aluno,para sua família e para o País, do que areprovação ou uma nota baixa emexames padronizados.

Dessa forma, propõe-se um aprimo-ramento do Ideb, o Ideb+, com a incor-poração de mais um indicador de rendi-mento, a Taxa de Permanência (M), medidacomplementar da taxa de abandono, nafórmula original da medida (5).

IDEB+ji = Nji x Pji x Mji (5)

Com

M = 100 - Afasts Ms – AFs + ADs + RECs - DESs

Onde:

s = série do ensino fundamental ou ensino médio.Afast = número de afastados por abandono na

série ou grupo de séries s;Ms = matrícula inicial na série ou grupo de

séries s;AFs = afastados por abandono ou transferência

na série ou grupo de séries s;ADs = admitidos por transferência na série ou

grupo de séries s;RECs = Reclassificados para a série ou grupo

de séries s;DESs = alunos que saíram da série ou grupo de

séries s, por reclassificação.

Vale observar que o uso da Taxa dePermanência, tal como definida acima nocômputo do Ideb+, é uma opção meto-dológica pragmática para inserir o grau deatendimento escolar nos municípios ou nasáreas de abrangência das escolas. Ao seadotar as fórmulas – (5) e (6) – o que seacompanha no Ideb+ é o abandono dealunos já integrados ao sistema escolar, enão a falta de atendimento ou a nãofreqüência escolar de crianças em uma dadaregião ou localidade. Para tanto, idealmente,a cobertura e o esforço da universalizaçãodo ensino deveriam ser medidos pela taxade atendimento escolar ou taxa deescolarização líquida. Contudo, comoapresentado em Inep (2004), essas medidasrequerem, no denominador, estimativas depúblico-alvo nas idades normativas paraos níveis de ensino, algo extremamentecomplexo para se computar em nível deescola para áreas de abrangência dasmesmas se for desejável que o Ideb+, talcomo o indicador original, seja calculadopara esse nível de detalhamento de unidadede prestação de serviço. Certamente que,em nível municipal, é possível dispor dessasestimativas, mas a precisão delas tende apiorar quanto mais distantes estão doscensos demográficos4.

(6)

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Assim, em detrimento da validade doIdeb+ de captar, de fato, o grau deatendimento escolar, mas procurandopreservar sua desagregabilidade em nívelde escolas e garantir maior confiabilidade(de modo a não carregar possíveis errossistemáticos de medida, decorrentes dasestimativas menos precisas de populaçãoem idade escolar no período intercensitário),optou-se por usar a taxa de permanênciadefinida em (6)5. Como observado ante-riormente, nem sempre é possível garantirtodas as propriedades desejáveis parao indicador construído. Em situaçõesconcretas, talvez mais valha dispor de umindicador imperfeito com bom grau deconfiabilidade e comparabilidade no tempoe no território do que um supostamenteperfeito, com maior validade de constructo,mas com problemas de mensuração, cujodimensionamento nem se sabe precisar.

Um dos aspectos interessantes doIdeb+ é que, tendo preservado o modelomultiplicativo na sua construção, o aumentoou a diminuição do indicador pode serinterpretado a partir da variação relativados seus componentes (9), assim como noIdeb original.

IDEB = Nota + Tx Aprov + Tx Perm IDEB Nota Tx Aprov Tx Perm

O cômputo do Ideb+ de 1999 a 2005revela que, embora seja menor que o Ideboriginal, já que M < 100%, ele aponta umaevolução mais positiva para o ensinofundamental no período – Tabela 4 eGráficos 2a e 2b. Enquanto o aumentodo Ideb entre 1999 e 2005 foi de 5,9%, ado Ideb+ foi de 11,2%, como conse-qüência do aumento de 5,0 pontospercentuais da taxa de permanência, alémdo aumento da taxa de aprovação de 4,6pp no período, o que afetou os dois indi-cadores indistintamente. Isso mostra aimportância da inclusão do abandonoescolar como mais uma dimensão a seravaliada. Assim, com base no Ideb+,poderia-se dizer que houve uma melhorasignificativa da educação básica nasprimeiras séries do ensino fundamental,como resultado do aumento da taxa depermanência e da taxa de aprovação e,de maneira tímida, do aumento dodesempenho dos alunos no Saeb.

Como era de se esperar, assim comoa medida original, o Ideb+ está fortementecorrelacionado com seus indicadorescomponentes. Também no Ideb+acorrelação mais intensa é com a notapadronizada (0,85), seguida da taxa deaprovação (0,78) e, por fim, a taxa depermanência (0,74) – Gráfico 3.

(9)

Tabela 4: Evolução do Ideb+ e seus componentesBrasil – Rede Estadual – Anos iniciais do ensino fundamental – 1999 a 2005.

Fonte: Elaboração própria com informações de Inep (2007a) e Edudata Brasil.

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Mesmo considerando que o Ideb+represente melhor a agenda de programase ações do PDE, o fato é que elecompartilha das limitações apontadasanteriormente para o Ideb. Além disso,as duas medidas só podem oferecer umavisão geral e sumária dos resultados eimpactos das 28 iniciativas do Plano deMetas Compromisso Todos pela Edu-cação. Para se obter uma visão mais com-pleta e importante do PDE, e poderacompanhar seus programas, é preciso

dispor não apenas de um indicador-síntese, mas de um painel de indicadoresde monitoramento e avaliação, queretratem dimensões de como os insumosda política se processam em resultados eimpactos, isto é, de como os programas-meio e iniciativas de natureza político-organizacional ou didático-pedagógicaestão se desenvolvendo e, eventualmente,produzindo efeitos de médio alcance,captáveis por indicadores de processos.É o que se procura ilustrar a seguir.

Gráfico 2: Evolução do Ideb e Ideb+ e seus componentes segundo níveis deensino – Brasil – Rede Estadual - 1999 a 2005.

Gráfico 3: Correlação entre o Ideb+ e seus componentesBrasil – Rede Estadual - Anos iniciais do ensino fundamental 2005.

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Para além de um indicador-síntese, um Painel de Indicadoresde Monitoramento doDesenvolvimento da EducaçãoBásica – Pideb+

Como o PDE abrange uma série deprogramas, que vão da educação infantil àeducação superior, seu monitoramento nãopode ser realizado apenas com base emum indicador. Monitorar ou avaliar oestágio de “desenvolvimento da educação”requer indicadores de outras dimensões daeducação, como indicadores de oferta,de atendimento, de acesso e participação,de eficiência, de rendimento e até mesmode financiamento.

Para atender a essa necessidade,propõe-se, nesta seção do trabalho, a cons-trução de um Painel de Indicadores deMonitoramento do Desenvolvimento daEducação Básica – (Pideb+), comodemonstrado no Quadro 3. Optou-se pornão propor um sistema exaustivo deindicadores, mas um conjunto reduzido demedidas de acompanhamento, quepermitisse monitorar as ações maisimportantes nas distintas fases do ciclo deimplementação dos programas. Ou seja, oPainel de Indicadores é uma propostaintermediária entre o “caos informacional”de um sistema exaustivo de medidasde acompanhamento e a “pobreza infor-macional” trazida por apenas uma medida-síntese. A idéia é que o Painel seja umaproposta mais efetiva de monitoramentoao priorizar as dimensões de importânciagerencial ao gestor, para quem foi ideali-zado. No caso em questão, o painelproposto tem como foco os gestoresfederais, mais especificamente os doMinistério da Educação. Naturalmente, essepainel deve ser ajustado às necessidades deacompanhamento para outros gestores, de

acordo com o escopo de sua função e deseu papel dentro do conjunto de ações eprogramas do PDE.

Para a construção do Pideb+ foramutilizados indicadores com característicascomo inteligibilidade, validade, relevância,confiabilidade, sensibilidade, desagrega-bilidade e, também, historicidade. Asinformações utilizadas foram basicamenteas do censo escolar, disponibilizadasanualmente pelo Inep, e outras disponi-bilizadas pelo IBGE. É desejável que sepossa dispor de alguns indicadores em basesemestral (abandono, por exemplo),trimestral (professores capacitados) ou, atémesmo, mensal (como recursos financeirosalocados ou transferidos). Para isso, seránecessário desenvolver rotinas de coleta dedados primários ou, em alguns casos,disponibilizar informações de controle jáexistentes em departamentos e programas.

Foi realizada uma seleção de umconjunto manejável de indicadores, referidosaos compromissos e ações do PDE – paraa educação básica e, em especial, para oensino fundamental – segundo uma lógicade insumo, processo, resultado e impacto.Na dimensão insumo deu-se prioridade aosindicadores voltados para o financiamentoda educação, já que no PDE é mencionadoo apoio financeiro, além do técnico, doGoverno Federal aos estados e municípiosque assinarem o termo do Compromisso.Além disso, o PDE prevê o aumento derecursos do PDDE6 para as escolas quecumprirem as metas do Ideb.

Para a dimensão “processo” foramdefinidos indicadores que pudessem serproduzidos com certa regularidade e queestivessem relacionados ao processo deensino-aprendizagem, principalmente nafigura do professor. Justifica-se o usode indicadores com foco nos docentespor causa da preocupação do PDE com

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questões como a formação continuada deprofessores, implementação de planosde carreira e piso salarial dos profissionaisdo magistério. A inclusão de indicadoresde acesso de alunos a laboratórios deinformática se justifica pela necessidadede monitorar uma ação, presente no PDE,de instalar um laboratório de informáticaem todas as escolas públicas do Brasil.

Para a escolha dos indicadores deresultado foram selecionados indicadoresmencionados no PDE, assim como outrosdiscutidos anteriormente, como a taxa deabandono e o Ideb+. Já os indicadoresde impacto devem ser entendidos comoalguns dos exemplos dos impactos que aeducação tem na vida dos estudantes amédio e longo prazos. Vale ressaltar que

Quadro 3: Painel de indicadores sugeridos para Monitoramentodo Desenvolvimento da Educação Básica, definidos para gestoresdo MEC

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estes não dependem exclusivamente dasações, programas ou projetos do PDE,mas também de outras ações governa-mentais, como programas de transferênciade renda, investimentos em infra-estruturaurbana, crescimento econômico e doemprego etc.

Na Figura 3, descreve-se um dospossíveis formatos de apresentação e deorganização dos indicadores do PIdeb+,passível de implementação em softwaresespecíficos de DataWarehouse e aplicativosmais simples, como o Monit 7.

Considerações finais

A criação do Índice de Desenvol-vimento da Educação Básica (Ideb) paraavaliar as ações do PDE constitui,certamente, uma proposta inovadora,vindo ao encontro de uma tendência nosetor público de utilização de indicadorespara auxílio de gestores na tomada de de-cisões. Os indicadores auxiliam a tomadade decisões nas diversas fases do ciclo daspolíticas públicas, assim como asseguram,em muitos casos, maior transparência eaccountability das ações do governo.

O Ideb foi construído com umametodologia consistente que usa duasdimensões semelhantes, compostas porindicadores de resultado que se afetammutuamente em sentidos opostos. Esseíndice é de alta relevância para o PDEpor ser constituído por dimensões queintegram o foco do Plano, ou seja, a qua-lidade da educação básica. Sua escala demensuração é de fácil compreensão nãosomente para os gestores, como paratoda a população. Por ser elaboradono Brasil, esse instrumento se adéqua àrealidade nacional, contemplando asdimensões consideradas relevantes parao desenvolvimento da educação. O Ideb

goza tanto de forte legitimidade política,devido aos decretos que o colocam naagenda formal de governo, quanto delegitimidade técnica a partir das caracte-rísticas metodológicas de sua construçãoe fontes de dados usadas.

Como todo indicador, o Idebtambém possui limitações, como a perdade referência provocada pela padronizaçãodas notas dos exames padronizados e abaixa especificidade para programas dedeterminadas áreas, como Português ouMatemática.Também deixa de considerar,em seu cômputo, uma relevante dimensão:o abandono escolar.

A alternativa apresentada neste estudo,que considera a dimensão do abandonoescolar, mantendo o modelo multiplicativo(Ideb+), parece configurar uma propostapromissora, ao revelar, pela série histórica,os efeitos da redução do abandono comouma das dimensões importantes dodesenvolvimento educacional nos últimos10 anos. Devido à multiplicidade deprogramas e ações do PDE, a propostade painel de indicadores que considere asdimensões mais relevantes e convergentesde seus programas e ações é certamente aalternativa mais consistente para omonitoramento e avaliação do Plano.

Há muito por fazer para que o PDEpossa produzir os efeitos esperados namelhoria da qualidade da educação noBrasil. A proposta de indicadores aquiapresentada é uma modesta contribuiçãopara que os técnicos e gestores encarre-gados dos programas possam desenvolverseus sistemas de acompanhamento,indicadores de monitoramento e medidasde desempenho organizacional que asse-gurem maior objetividade, transparência eefetividade às suas ações.

(Artigo recebido em de junho de 2008. Versãofinal em de julho de 2008).

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Figura 3: Ilustração de um Painel de Indicadores de Monitoramento do PDE

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Notas

* Este texto corresponde a uma extração revisada da monografia “Índice de Desenvolvimentoda Educação Básica – IDEB: usos, limitações e alternativas”, apresentada ao Curso de Especializaçãoem Políticas Públicas da Educação com Ênfase em Monitoramento e Avaliação – MPA, em fevereirode 2008 (REZENDE, 2008).

1 TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Relatório de avaliação de programas: Ação Apoio à FormaçãoContinuada de Professores do Ensino Fundamental. Brasília: TCU, 2006.

2 A expressão “evasão durante a etapa” deve ser entendida como abandono, pois para o Dicio-nário de Indicadores Educacionais (MEC/INEP, 2004) a evasão é quando um aluno, antes matricu-lado em um determinado ano, não aparece nas matrículas do ano seguinte; já o abandono ocorredurante um mesmo ano letivo (etapa de ensino).

3 Note-se que a não freqüência do educando está mais relacionada a abandono do que à evasãoescolar.

4 O IBGE não disponibiliza ainda estimativas de população por faixas etárias ou em idadeescolar em nível municipal para os anos intercensitários, mas somente os totais populacionais. ODatasus (www.datasus.gov.br) dispõe de informações populacionais dessa natureza, mas há proble-mas de precisão para anos afastados do censo demográfico.

5 Tal como definido, a taxa de permanência poderia ser a soma da taxa de aprovação e da taxa derepetência. Assim, quanto menor for a variabilidade das taxas de evasão escolar, por construção,maior a correlação entre a taxa de permanência e suas duas parcelas.

6 Programa Dinheiro Direto na Escola do MEC/FNDE.7 Aplicativo desenvolvido como plataforma de disseminação dos resultados do Projeto de

Indicadores de Direitos Humanos, ENCE/IBGE, 2008.8 Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissi-

onais da Educação.9 Avaliação de alfabetização que avaliará alunos de seis a oito anos de idade.10 Acredita-se que são inúmeros os impactos que podem ser produzidos pelo PDE, no entanto,

selecionamos apenas algumas dimensões mensuráveis periodicamente.

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Resumo – Resumen – Abstract

Monitoramento do Plano de Desenvolvimento da Educação: proposta de aprimora-mento do Ideb e de painel de indicadoresLeonardo Milhomem de Rezende e Paulo de Martino JannuzziNas últimas duas décadas, tem-se observado um processo cada vez mais intenso de proposição

de indicadores de monitoramento e avaliação da ação governamental, assim como de indicadoressociais gerais, dentro e fora das organizações públicas. No campo das políticas educacionais, especi-ficamente, sob os auspícios do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), propôs-se maisuma dessas medidas, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). O objetivo destetrabalho é analisar seus usos, características e limitações, além de propor medidas alternativas ecomplementares para acompanhar os resultados e impactos do PDE. O texto está organizado emcinco seções. Na primeira seção discute-se o papel e o uso dos indicadores no ciclo de políticaspúblicas, em especial no monitoramento e avaliação de programas. A seção seguinte tem caráter maismetodológico, tratando da construção de indicadores sintéticos, seus usos e limitações. Apresenta-se, então, o Ideb e se discute suas características, potencialidades e restrições para acompanhamentoda agenda da política educacional. As duas últimas seções são dedicadas à apresentação de umaproposta de indicador alternativo – o Ideb+ e o Painel PIdeb+ – para monitoramento do PDE.

Palavras-chave: Indicadores educacionais, Ideb, Plano de Desenvolvimento da Educação.

Monitorización del Plan de Desarrollo de la Educación: propuesta de perfeccionamientodel Ideb y el panel de indicadoresLeonardo Milhomen de Rezende y Paulo de Martino JannuzziEn las dos últimas décadas se ha observado un proceso, cada vez más intenso, de proposición

de indicadores de monitorización y evaluación de la acción gubernamental, y también de indicadoressociales generales que hay en las organizaciones públicas e fuera de ellas. En el campo de las políticaseducacionales, específicamente bajo los auspicios del Plan de Desarrollo de la Educación (PDE), seha propuesto una más de estas medidas: el Índice de Desarrollo de la Educación Básica (Ideb). Elobjeto de este trabajo es hacer el análisis de sus características, usos y limitaciones; incluso proponermedidas alternativas y complementarias para seguir los resultados y los impactos del PDE. El textoestá compaginado en cinco secciones. En la primera de ellas, se discuten el papel y los usos deindicadores en el ciclo de políticas públicas, especialmente la monitorización y evaluación de progra-mas. La sección siguiente tiene un carácter metodológico al tratar de la construcción de indicadoressintéticos, sus usos y limitaciones. Entonces, se presenta el Ideb y se discute sus características,potencialidades y restricciones para seguir la agenda de política educacional. Las dos últimas seccionesse dedican a la presentación de una propuesta de indicador alternativo ( Ideb+) y el panel (PIDEB+)para monitorización del PDE.

Palabras clave: Indicadores Educacionales, Ideb, Plan de Desarrollo de la Educación

Monitoring the National Educational Plan: a proposal to improve Ideb and the panel ofindicatorsLeonardo Milhomem de Rezende and Paulo de Martino JannuzziIn the last two decades there has been a growing interest on monitoring and evaluation indicators

of governmental programs and also on broad social indicators, in and outside public agencies. Oneducational matters, more precisely, moved by the National Education Plan (PDE), it has been

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proposed the Ideb – Indicator of basic Education Development. This paper aims to analyze itsmain aspects, its uses and limitations and also propose other different measures to follow up thePDE´s results and impacts. The paper is divided in five sections. In the first section it is discussedthe role and application of indicators in the policy cycle, more precisely on program monitoring andevaluation. The next section is concerned on methodological matters of building composite indicators,its uses and weakness. Then, Ideb is presented and discussed as a tool to follow up the educationalagenda. The last sections are dedicated to the presentation of Ideb+ and PIdeb+ panel, differentindicators that can be used to evaluate PDE.

Key words: Educational Indicators, Ideb, National Education Plan.

Leonardo Milhomem de RezendeServidor do Ministério da Educação, Especialista em Políticas Públicas da Educação com Ênfase em Monitoramentoe Avaliação pela ENAP.Contato: [email protected]

Paulo de Martino JannuzziProfessor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE e colaborador da Escola Nacional de AdministraçãoPública e PUC– Campinas. Pesquisador do CNPq no Projeto “Informação estatística no ciclo de formulação,monitoramento e avaliação de políticas públicas no Brasil” (Proc. 307101/2004-5).Contato: [email protected]

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Conselhos Municipaisde Políticas Públicas: uma

análise exploratória

Marcelo Feijó Martins, Simone Martins,Adriel Rodrigues de Oliveira e Jéferson Boechat Soares

Introdução

As demandas da sociedade moderna têm imposto desafios cada vez maiores

ao poder público no que concerne à qualidade dos serviços públicos e à produção

de políticas para setores essenciais e vitais à população. Essas exigências levam

à necessidade de modernização dos processos operacionais e administrativos

da gestão pública, de modo a oferecer aos cidadãos serviços com qualidade

e presteza.

As reivindicações dos movimentos sociais, dos trabalhadores, da igreja e de

outros setores da sociedade, durante o período de luta pela redemocratização,

foram responsáveis pela mudança comportamental da sociedade brasileira

observada nos anos 80. O conjunto dessas forças deram legitimidade às propostas

de descentralização do poder estatal e de democratização da participação no

aparato do Estado, contempladas na Constituição de 1988. Começa-se, a partir

de então, a construção de uma cultura democrática que prima pela transparência

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da gestão pública, pelo exercício dacidadania e pela inclusão de setores menosfavorecidos da população (GOHN, 1997).

As propostas de reforma do Estadotrouxeram à tona necessidades urgentes dereformulação da gestão das políticaspúblicas, objetivando maior eficiência daação estatal no atendimento das demandasda população. Essa perspectiva exigiu orompimento com velhas estruturas dapolítica tradicional e a incorporação denovos conceitos e processos de gestão queenvolvam a sociedade como um todo. Daísurge a importância da construção dasestruturas de governança, da capacidadede governar e da efetividade da accountabilitypara o processo.

A Constituição de 1988, tida como amais cidadã de todas as Constituiçõesbrasileiras, regulamentou diversas formasde participação popular. Entre essas estáa institucionalização dos ConselhosGestores de Políticas Públicas, que seráobjeto de estudo neste trabalho.

Os Conselhos Gestores se apresentamcomo uma das formas de participaçãoefetiva da sociedade civil e consistem emum espaço no qual se concretiza uma novarelação entre Estado e sociedade na gestãodo aparelho público. De acordo com Fukset al (2004), os Conselhos Gestores dePolíticas Públicas representam uma dasprincipais experiências de democraciaparticipativa no Brasil contemporâneo.Presentes na maioria dos municípiosbrasileiros, articulados desde o nível federale cobrindo uma ampla gama de temas –saúde, educação, moradia, meio ambiente,transporte, cultura, entre outros – osconselhos são uma conquista inegável doponto de vista da construção de umainstitucionalidade democrática. Suanovidade histórica consiste em apostar naintensificação e na institucionalização do

diálogo entre governo e sociedade – emcanais públicos e plurais – como condiçãopara uma alocação mais justa e eficiente dosrecursos públicos. Os Conselhos apontampara o fato de que a dinâmica social deveexercer uma influência significativa sobre asexperiências de formulação e implemen-tação de políticas públicas.

A criação e a atuação dos ConselhosGestores nos municípios adquire, nessesentido, uma importância fundamental,tanto pela sua potencialidade, enquantomecanismo de controle público, quantopela sua função de compor um novomodelo de gestão das políticas (LUBAMBO,2002). O governo local é a unidade político-administrativa que oferece melhorescondições para a prática da participaçãopopular na gestão da vida pública.A responsabilidade deliberativa, aliada asituações normativas e controladoras,possibilita aos Conselhos Municipais umsignificativo papel na construção do desen-volvimento social e econômico local.

Considerando a importância dosConselhos Gestores no contexto dademocratização, da participação e naconstrução de um novo modelo de gestãodas políticas públicas, o presente trabalhobusca analisar como eles estão desempe-nhando suas atribuições precípuas de gestãoparticipativa, transparência, controle público,compromissos com os princípios demo-cráticos e o exercício da cidadania. Paratanto, foi realizada uma análise exploratóriados Conselhos Gestores de Políticas Públicasinstituídos na cidade de Viçosa (MG),apresentando resultados baseados napercepção dos presidentes dos Conselhos,e, complementarmente, nos dados secun-dários coletados nas sínteses dos relatóriosde fiscalização de municípios do estado deMinas Gerais, realizadas pela ControladoriaGeral da União (CGU), disponibilizadas no

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site da instituição, correspondendo aoperíodo de 2003 a 2006.

Referencial teórico

Reforma do Estado: sob a conotaçãoda gestão democrática

A dinâmica do mundo moderno trazconsigo grandes mudanças na sociedade,fazendo-se necessário repensar o papel doEstado, principalmente em um cenárioonde os avanços da tecnologia são forte-mente destacados. As novas demandas dasociedade exigem do Estado maiorqualidade nos serviços prestados, moderni-zação das práticas de gestão pública e umanova concepção da relação do Estado coma sociedade civil.

Este novo cenário exige gestorespúblicos capacitados na arte de administrardemocraticamente e gerenciar a partici-pação da comunidade. A competênciapolítica para conciliar demandas sociais econviver com as relações de poder entreEstado e sociedade precisa ser aliada àcapacidade técnica para definir prioridadese metas, formular estratégias e gerir recur-sos escassos (KEINERT, 1994, p.46).

É exigível que uma nova filosofia degestão possibilite a afirmação dessasmudanças, introduzindo valores demo-cráticos e atualizando os mecanismos degestão, e, por intermédio de aspectos éticos,da participação da sociedade e da democra-tização da informação, também criar esugerir novas alternativas (KEINERT, 1994).

Por meio de novos desenhos institu-cionais, novos mecanismos de gestão,como os Conselhos Gestores, e novasformas de controle, a reforma tendea contribuir não apenas para oaumento da eficiência do aparato públi-co, como para sua maior transparência edemocratização.

A crise dos anos 80 levou às propostasde reforma do Estado, que deixavamclaras as necessidades de se reformular opapel estatal. O Estado, então, volta-se paraa satisfação de necessidades básicas ede novas demandas da sociedade, abando-nando definitivamente o modelo interven-cionista e permitindo-se maior agilidade eeficiência em suas ações (GUIMARÃES, 2000).

Essa reforma tem múltiplas conotações,alcançando, porém, consensos nos pontos

que tratam da necessidade de o Estadorenovar sua própria institucionalidade parapoder atender aos anseios da sociedade,bem como naqueles que tangem à publi-cização do aparato estatal. Publicizar deveimplicar nível de incremento da participaçãoda sociedade para um exercício efetivo dacidadania, de maneira a se implementar umEstado reformado que seja realmentedemocrático. No espaço da reformulação

“As novasdemandas dasociedade exigemdo Estado maiorqualidade nos serviçosprestados,modernizaçãodas práticas degestão pública euma nova concepçãoda relação doEstado com asociedade civil.”

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das relações Estado-sociedade se faznecessário reestruturar o nexo de relações,de modo a induzir que a sociedade civilparticipe e exerça, a partir de mecanismosinstitucionalizados, a gestão comparti-lhada das políticas públicas e o controleno nível de accountability. Caso contrário,se estará sob o discurso de propostas dereforma pouco efetivas (BRESSER PEREIRA,2007).

Uma reforma do Estado não significadesmantelá-lo, pelo contrário, “a reformajamais poderia significar uma desorga-nização do sistema administrativo e dosistema político de decisões e, muitomenos, é claro, levar à diminuição do seupoder de liderar o processo de mudanças,definindo o seu rumo” (PEREIRA & SPINK,2005, p.15).

A complexificação cada vez maior dasociedade é um fator relevante para oobsoletismo de formas tradicionais degestão dos interesses e dos serviçospúblicos pelo Estado. A eficiência e aqualidade na prestação de serviçospúblicos são, muitas vezes, alcançadas portentativas de inovação na administraçãopública, ficando claro que as regras defuncionamento democrático da sociedadee das instituições públicas devem serprofundamente reformuladas. Para Bento(2003), governos que asseguram a partici-pação dos cidadãos na elaboração,implementação e avaliação de políticaspúblicas angariam sustentabilidade políticae legitimidade para seus projetos eprogramas de governo, tornando suasgestões muito mais eficientes do quepoderiam ser, se confinadas apenas aequipes de burocratas especializados.

A consolidação do conceito de cida-dania e da noção de direitos contribuiu parao fortalecimento da cultura democrática.A corrupção, tida como ação lesiva aos

interesses da coletividade em favor dointeresse privado, encontra na cidadania umsentimento de repulsa e indignação. Acultura democrática admite o surgimentode propostas de participação da sociedadecivil na gestão pública, com o objetivo dealcançar melhor controle sobre a coisapública (KEINERT, 1994).

Não há dúvidas de que, nos dias atuais,o Estado deve concentrar-se na prestaçãode serviços básicos – saúde, educação,segurança pública, saneamento – bemcomo no estabelecimento conjunto, comos cidadãos, das prioridades de atendi-mento. Mas, para bem realizar esse trabalhoe efetivamente estar capacitado a atenderàs necessidades cada vez maiores dapopulação, o Estado precisa estabelecercanais amplos de interlocução com asociedade, viabilizando a democratizaçãoda participação na gestão das políticas e ocontrole público das mesmas.

A construção da participaçãopopular

Na década de 90, houve uma genera-lização do tema da “participação”. Os maisdiversos atores sociais, públicos ou dasociedade reivindicavam e apoiavama participação social, a democracia partici-pativa, o controle público sobre o Estadoe a realização de parcerias entre o poderpúblico e a sociedade civil.

Participação, democracia, controlepúblico, parceria, porém, são conceitoscom significado diferente para os diversosatores que têm, para cada um deles, umaconstrução histórica diferente. A genera-lização e essa divergência de significadosimpõem a necessidade de se refazer algunspercursos que construíram conceitos epráticas de participação social no País.Inicialmente, pode-se dizer, no entanto, quea participação democrática nas arenas

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públicas que definem os interesses dasociedade brasileira tem sido conquistadaa duras penas por esta mesma sociedade(DOIMO,1995).

O Estado brasileiro constituiu-se dentrode uma tradição patrimonialista, cultivandorelações corporativas com gruposprivilegiados e excluindo a grande maioriadas pessoas. Desde os primórdios da nossahistória política, o povo é mantido àmargem do sistema político. Essa exclusão,fruto de uma cultura autoritária e privatistaenraizada na tradição política do Brasil,não ocorre, porém, sem a resistênciade grupos mobilizados da sociedade e demovimentos sociais que lutam em prol daparticipação política popular e da inclusãode setores menos favorecidos da sociedade(CARVALHO, 1987).

A participação conquistada, ao longodo tempo, pelos diversos tipos de movi-mentos que marcaram a história de lutapolítica pela democratização e inclusãono País evidenciou em seus respectivoscontextos, como protagonista dasconquistas, o seu próprio povo. Assimocorreu com as primeiras resistênciasindígenas e negras, passando pelas lutasabolicionistas, pela Independência, pelaguerra de Canudos, pelas revoltas urbanascontra a miséria e pelos movimentosoperários.

A década de 70 foi um períodomarcado por profundas mudanças econô-micas e políticas que provocaram aemergência vigorosa de novas demandassociais. O Estado autoritário, que seestabeleceu com o regime militar, extinguiuos espaços de expressão e de negociaçãode interesses e conflitos existentes até então(O’DONNELL, 1976). Nesse ambiente deausência de canais de interlocução e deinsatisfação com o regime político insta-lado surgem novas mobilizações, como a

dos metalúrgicos do ABC paulista, osmovimentos estudantis e os ligados àspastorais da Igreja Católica e à classeartística e intelectual do País.

Diante da ausência de espaços legítimosde negociação de interesses e conflitos,esses movimentos tiveram como reivin-dicação comum a abertura de novosespaços ou arenas para a ação política(SADER, 1988). Desse modo, nos anos 70 e80 vivenciou-se uma fase de irrupçãomuito vigorosa de novos movimentossociais organizados como espaços reivindi-cativos, de oposição às relações desubordinação, de tutela ou de cooptaçãopelo regime instituído (SADER, 1988).A partir desses movimentos, constrói-seuma nova cultura de participação popularque se multiplica abrangendo as maisvariadas formas de organizações populares.

A emergência dos chamados novosmovimentos sociais, que se caracterizoupela colocação de novos temas na agendapolítica, pela conquista do direito a terdireitos e do direito a participar da gestãoda sociedade, culminou com o reconheci-mento, na Constituição de 1988, noparágrafo único do seu artigo 1o, de que“todo o poder emana do povo, que oexerce por meio de representantes eleitosou diretamente, nos termos desta Consti-tuição” (CONSTITUIÇÃO/1988, 2000).A Constituição prevê a participação diretados cidadãos pelos chamados institutos dedemocracia direta ou semidireta, como oplebiscito, o referendo, a iniciativa popularde lei, os Conselhos e outros canaisinstitucionais de participação popular.

A democratização da participaçãoA partir da promulgação da Consti-

tuição de 1988, e ao longo da década de90, as reivindicações dos movimentossociais pela participação na gestão pública

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ficam cada vez mais evidentes. Passam aobjetivar a ampliação de direitos já defi-nidos, a participação na gestão de direitose interesses, a definição do tipo desociedade em que se querem incluídos e aconstrução de uma nova relação dasociedade com o Estado (DAGNINO, 1994).

Passam a fazer parte do reordena-mento institucional, que se segue à Cons-tituição e à própria Constituinte, diversasreivindicações das lutas dos movimentossociais. Destacam-se a descentralização dosistema de saúde no País, com a gestãocompartilhada e o controle público daspolíticas do setor, que se articulam desdeos Conselhos Gestores locais até oConselho Nacional de Saúde (CARVALHO,1995). Também mereceu atenção daAssembléia Constituinte a questão dareforma urbana, objeto de luta de movi-mentos pela função social da propriedadee da cidade, regulamentada em capítuloconstitucional que prevê o planejamentoe a gestão participativa das políticasurbanas, abrindo espaços de co-gestão nasesferas governamentais (SOMARRIBA, 1996).A mobilização da sociedade organizada nasáreas de assistência social, de defesa dosdireitos da criança e do adolescente, redefi-nindo de maneira mais universal e demo-crática essas políticas e possibilitando ocontrole a partir de mecanismos departicipação institucionalizados, como osConselhos Gestores, foi também umaconquista que merece destaque (BOSCHETTI,2003). É preciso salientar ainda os orça-mentos participativos – que trazem à tonao debate do orçamento municipal, provo-cado por movimentos sociais – quepassaram a ser adotados por dirigentescomprometidos com a eficácia na aplicaçãodos recursos públicos, com a transparênciada gestão orçamentária e com a legitimaçãoe a democratização do governo.

Participar da gestão das questões quedizem respeito ao destino da sociedade éuma conquista que se efetiva a passos lentos.O Estado brasileiro, tradicionalmentecaracterizado pelas relações de vínculo comas elites, começa timidamente a cederespaços, tornando-se mais permeável auma sociedade civil organizada, articulada,que constitui espaços públicos nos quaisreivindica opinar e interferir sobre a políticae sobre a gestão do destino comum dasociedade.

A participação na gestão dos interessescoletivos passa, então, a adquirir o signifi-cado de participação da sociedadeno governo, disputando espaço tanto noaparato governamental quanto na definiçãodas políticas públicas. Significa pôr emquestionamento o monopólio do Estadocomo gestor da coisa pública. Significaainda construir espaços públicos nãoestatais, afirmando a importância docontrole público sobre o Estado, da gestãoparticipativa, da co-gestão, dos espaços deinteração de Estado e sociedade (GENRO,1995). Essa é a proposta de participaçãosocial que se consolida no Brasil na décadade 90.

A ampliação da cidadania para além doslimites dos direitos regulamentados, o exer-cício da cidadania ativa, permitindo bemmais que o exercício do sufrágio universaldo voto, a disseminação de novos canaisdemocráticos, viabilizando a possibilidadede participação da sociedade, são conquistasdos movimentos sociais que quebram umacultura de exclusão e abrem caminho paraa democratização e a participação nas arenaspúblicas (BONFIM, 2000).

O aumento das possibilidades degestão participativa das políticas públicasnão estagna, porém, o sentido da partici-pação, embora talvez seja sua dimensãoprincipal nos anos 90. A participação

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na gestão dos interesses públicosda sociedade representa tambéma explicitação de diferenças e conflitos, adisputa na sociedade pelos critérios devalidade e legitimidade dos interesses emquestão, os parâmetros sobre o que é justoe injusto, certo e errado, permitido eproibido, o razoável e o não razoável,mostrando que é possível superar posturasprivatistas e corporativas arraigadas econstruir uma visão plural de bem público.Participar da gestão dos interesses dasociedade é participar da edificação daesfera pública, é consolidar novos espaçosde poder (TELLES, 1994).

Tão importante quanto a construçãodos espaços de gestão participativa foi aconstrução de uma cultura participativa,que admite, reivindica e valoriza a partici-pação direta e o controle público por partedos usuários e outros segmentos interes-sados nas políticas públicas.

Conselhos GestoresOs Conselhos de Gestão de Políticas

Públicas são órgãos colegiados e paritáriosentre governo e sociedade. Disseminaram-se pelo Brasil na década de 90, a partir desua regulamentação constitucional, mate-rializando a ampliação da participação dasociedade nos espaços públicos. Suaimportância para o debate sobre oaprofundamento do processo democrá-tico aumenta na medida em que se observaa sua presença nos três níveis de governo ede forma especial no âmbito dos muni-cípios (SANTOS, 2000). A pressão exercidapelos movimentos organizados da socie-dade em busca de uma participação nosistema político gerou uma demanda(input) por uma política pública queatendesse a essa necessidade. O ConselhoGestor foi um output resultante da ativi-dade política, materializado e institucio-

nalizado por meio dos mecanismos legaisvigentes pós-ditadura militar.

Os Conselhos Gestores possibilitam aparticipação da sociedade civil nasdiscussões sobre o planejamento e na gestãodas diversas políticas estatais responsáveispela promoção de direitos fundamentaiscentrados em diferentes áreas: saúde,assistência social, educação, trabalho,moradia, entre outros.

De acordo com Gohn (1997) apudSantos (2000, p.137-138), “o escopo dedeliberações dos Conselhos é bastanteamplo. Suas decisões devem incidir sobreo formato das políticas públicas e sobreas estratégias e diretrizes para implemen-tação das mesmas”. Por isso, devem, alémde definir metas e diretrizes políticas emrelação à universalização de direitos e àspolíticas de atendimento estabelecidas nos

“O Estadobrasileiro,tradicionalmentecaracterizado pelasrelações de vínculocom as elites, começatimidamente a cederespaços, tornando-semais permeável auma sociedade civilorganizada ...”

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direitos sociais, deliberar sobre o formatode gestão de maneira a garantir o controlepúblico sobre o governo (SANTOS, 2000).

Nesse sentido, o Conselho tem aprerrogativa de aprovar ou não a realizaçãode convênios, impedir a prestação deserviço de determinada instituição que nãoobedecer aos requisitos previstos emlei, aceitar ou rejeitar as prestações de contasdos gastos orçamentários, definirprocedimentos de democratização deinformações e das decisões por meioda universalidade do acesso às atividadese ações do governo (SANTOS, 2000). Elesainda fortalecem o processo descentrali-zador das políticas sociais, na medida emque viabilizam a produção, o acompanha-mento e o controle das políticas pelospróprios cidadãos.

A competência de cada ConselhoGestor reserva a tais órgãos a prerroga-tiva de intervir na promoção, defesa edivulgação dos direitos e interessescoletivos relacionados às suas áreas deatuação, conforme os moldes previstos nalegislação que os constituiu. Dessa forma,os temas discutidos por um Conselhodevem ser todos voltados ou interligadosà sua área específica, conforme o setorpúblico objeto de seu funcionamento, nãoobstante a possibilidade de interface comoutros Conselhos no caso de discussõesde políticas intersetoriais.

As leis que criam os Conselhossinalizam alguns elementos importantespara analisar a representação social, poisestipulam normas que definem quem podeparticipar, sobre o que se delibera e qual otipo de relação existente entre o Conselhoe a administração pública. Os Conselhossão mecanismos nos quais os cidadãosparticipam por meio de instituições ouorganizações. Eles são compostos parita-riamente por membros governamentais e

não-governamentais, à exceção dosConselhos de Saúde e de Emprego, quesão tripartites (SANTOS, 2000).

As instituições e organizações não-governamentais devem ser eleitas emfórum próprio do segmento social querepresentam, sem a interferência doEstado. A autonomia da sociedade civilpara escolher seus representantes é umprincípio básico para a garantia darepresentação social. A legitimidade dasinstituições e organizações da sociedade dese candidatarem a uma vaga no Conselhocoloca outros aspectos para a questão darepresentatividade: o tipo do trabalhorealizado, a contribuição no debate políticoou até mesmo a disposição de participarde articulações com outras organizações einstituições. A eleição das entidadesrepresentativas em fórum próprio apontapara um tipo de representação que vaialém da própria instituição do conselheiro,assumindo a noção de que este precisa selegitimar diante de um segmento socialespecífico para representá-lo como tal(SANTOS, 2000).

Os Conselhos Gestores estão presentesnas três esferas de governo. No âmbitofederal, as áreas básicas em que atuamsão emprego, educação, saúde, criança eadolescente, assistência social e habitação. Noâmbito dos estados e municípios, sãocontemplados, ainda, outros setores, comopolítica urbana, política agrícola, cultura,população negra, portadores de deficiênciasfísicas, idosos, meio ambiente e direitos dasmulheres (GOHN, 2003).

A instituição dos Conselhos Gestoresé importante porque há repasses de verbasdo governo federal para estados e muni-cípios, e também dos estados para osmunicípios, que estão atreladas à existênciadesses mecanismos nos respectivos entesgovernamentais.

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Quanto ao seu poder de decisão, osConselhos podem ser deliberativos ouconsultivos. O Conselho deliberativo éaquele que possui o poder de discutire decidir sobre os rumos das políticaspúblicas executadas pelo governo, e oconsultivo tem como função emitir pare-ceres e dar sugestões sobre as políticas, nãopossuindo poder decisório. A prerroga-tiva deliberativa de um Conselho Gestorlhe concede a capacidade de sustentar umpapel ainda mais eficaz no auxílio do PoderLegislativo, em sua função de controle daAdministração Pública, do que umConselho de caráter meramente consultivo,não obstante as pressões que este pode gerare a sua relevância como instância participativa.Complementa-se, ainda, que a impera-tividade resguardada pela força da lei nosConselhos deliberativos qualifica, em tese,o resultado, baseado nas suas decisõesdiscutidas e consumadas (NORONHA, 2000).Desse modo é que se identificam comomecanismos de controle tanto da óticapolítica, como da pública.

O controle público apresenta umaconotação mais pragmática quanto aosassuntos que devem compor a pauta dediscussão dos Conselhos, objetivando aprodução de resultados que convergemno encontro dos interesses públicos defato. No tocante ao controle político, acontribuição que a participação popularnesses Conselhos promove se dá nosentido de atuar no campo da fiscalização,buscando a probidade na gestão pública,atendendo-se ao princípio da moralidadeadministrativa conforme explicitado naConstituição Federal.

Os Conselhos são fundamentais paraque a sociedade possa identificar e expressarquais são seus reais interesses e quais aspolíticas identificadoras do bem comum,pela prestação de serviços públicos. Esses

mecanismos de fortalecimento do controlee de cooperação na gestão das políticasnão significam o engessamento da adminis-tração pública, mas a ampliação do debatea partir desses canais de comunicação, paraa concretização dos aspectos democráticose republicanos, nos padrões da democraciaparticipativa.

A participação nos Conselhos:limites e potencialidades

A participação democrática, para finsdeste trabalho, será analisada sob osaspectos das práticas participativas nas quaishá um compartilhamento da gestãopública entre o Estado e a sociedade.

De todos os mecanismos de parti-cipação social e controle público, talvez sepossa afirmar que o Conselho Gestor é omais enraizado na reivindicação dosmovimentos sociais.

O enraizamento dos Conselhos nas lutaspopulares e democráticas lhe dá umaqualidade especial como um dos mecanis-mos de participação mais permanente, queresiste às mudanças e aos diferentes grausde abertura dos governos à participaçãosocial. Há Conselhos sólidos e democráticosinstituídos a partir de iniciativas sociais, quepersistem na sua atividade, mesmo semcontar com apoio significativo de governos.Mesmo assim, esses Conselhos vêm conse-guindo pressionar governos contra atitudescorporativas e excludentes, dispor defuncionários públicos para a realização desuas tarefas administrativas e utilizar imóveise equipamentos públicos. Essas “conquistas”não passam de direitos legais, mas,especialmente quando se relacionam comgovernos conservadores, somente sãoobtidas pela ação de conselheiros muitofortes, articulados e competentes. Os Conse-lhos, evidentemente, dependem de umamínima resposta da parte governamental.

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Desprovidos da participação dos represen-tantes governamentais e sem um acessomínimo às informações do governo, elesdeixam de ser espaços de discussão ede co-gestão dos interesses públicos,passando a espaços de luta socialreivindicativa, como os demais movimentossociais (TEIXEIRA, 2000).

Atualmente existem nos municípiosbrasileiros mais conselheiros que vereadores,o que nos dá a dimensão de uma forma departicipação popular muito mais acessívelaos cidadãos do que a tradicional represen-tação parlamentar. Os Conselhos Gestoressão instâncias de formulação de políticas quepossuem um alto conceito de respeitabi-lidade enquanto espaços transparentes ecomprometidos com o interesse público.Eles tornam a política mais pública, pelomenos aqueles onde há participação derepresentações de segmentos comprome-tidos com a democratização da gestão dosnegócios públicos.

Existem pesados embates travadosdentro dos Conselhos por causa da práticada defesa de interesses privados. Quandose pretende tomar decisões corporativas,clientelistas, costuradas com base emnegociatas políticas escusas, trata-se deboicotar, obstruir e desqualificar oConselho. Esse comportamento privatistaocorre quando estão em jogo interesses degrupos de medicina privada, da construçãocivil, do transporte público, da indústria edo comércio, das escolas particulares oudas grandes entidades assistenciais.

Para que os interesses públicos preva-leçam exige-se tanto transparência quantolivre acesso às informações da gestãoestatal e do que se passa no governo. Aindaque não acumule poder para enfrentaras distorções da política, essa transparênciarelativa e esse conhecimento da máquina edos caminhos da política já são importantes

conquistas democráticas da sociedade.A publicização da arena política e o forta-lecimento de um sentido de interessepúblico, tanto na sociedade civil quanto nosgovernantes, são das mais importantespotencialidades dos Conselhos comodemocratizadores da participação política(GOHN, 2003).

Um requisito fundamental para aeficácia dos Conselhos é a capacitação deseus membros com vista ao exercício maisqualificado da gestão das políticas sociais.Embora os Conselhos sejam frutos dasreivindicações dos movimentos pelaampliação da participação e democrati-zação do campo público, é notórioque grande parte das representações demovimentos e de outras entidades inte-grantes dos Conselhos carece de melhorqualificação para exercer a contento asfunções de conselheiro (GOHN, 2003).

Os conselheiros não-governamentais,principalmente aqueles que representamentidades populares, têm grandes dificul-dades de acesso às informações, aosrecursos materiais e ainda ficam na depen-dência de “favores” do governo. Portanto,é grande a capacidade dos governos deesvaziá-los, seja tomando decisões nosbastidores, seja desprestigiando-os,afastando-se desses espaços ou indicandopara os Conselhos membros governa-mentais pouco representativos, comgrande rotatividade e pouca capacidadepara discutir e deliberar.

Como conseqüência dessa depen-dência, há o perigo de ver os conselheiroslimitados a assuntos secundários, princi-palmente face à adoção, por governos, depolíticas neoliberais, que têm reduzidoconsideravelmente os recursos orçamen-tários e os gastos públicos com políticassociais (DRAIBE, 1993). Essa política dedesobrigar-se do social assenta-se numa

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postura sistemática de deslegitimaçãodos espaços de controle público, como osConselhos Gestores das áreas socioassis-tenciais, inviabilizando a participação socialna definição dos orçamentos dessas áreas.

Outro fator que limita a força dos Con-selhos é a falta de mobilização da sociedade.É indispensável aos atores que participamdesses espaços públicos contar com o respaldosocial de suas bases representativas. Sem amobilização da sociedade e de segmentosorganizados, fragiliza-se a capacidade depressão social que garantiria força, legitimidadee representatividade nas negociações deinteresse público.

Também a grande proliferaçãode Conselhos acaba segmentando aparticipação social, setorizando oencaminhamento de políticas, reduzindo acapacidade da sociedade de ocupá-lostodos com qualidade e, portanto,tornando-os mais eficazes (TEIXEIRA, 2000).Escolher e priorizar os espaços quepermitem uma participação mais efetivapode garantir maior qualidade nessa partici-pação. O aperfeiçoamento dos Conselhoscomo espaço de gestão participativa develevar também à superação dessa multipli-cação de espaços estanques, construindo-seespaços de intersetorialidade nos Conselhos.

A análise dos limites e potenciais dosConselhos aponta alguns desafios, comoa qualificação dos atores envolvidos, tantodo governo quanto o da sociedade, bemcomo a ampliação e a consolidação de umacultura democrática e sua tradução emmétodos e procedimentos concretos quepotencializem a gestão compartilhada dasociedade.

A ampliação da eficiência e da eficáciados espaços de gestão participativasupõe ainda romper a burocracia estatal edisseminar o saber técnico, centralizadorde poder no aparato estatal. É necessário

também romper a tendência de limitara participação aos assuntos secundários,deixando de fora do debate democráticoassuntos fundamentais (TEIXEIRA, 2000).

O clientelismo e o corporativismo, noâmago dos Conselhos, também nãopodem ser considerados como traços deuma cultura política do passado, pois elesocorrem e se insinuam mesmo entre osnovos espaços de democracia participativa.

Para assegurar a continuidade, apermanência e o aperfeiçoamentoda democracia participativa é precisopriorizar práticas menos dependentes dainiciativa governamental, promover ofortalecimento do tecido social, identifi-cando e capacitando as representaçõessociais e outros setores da sociedade, comoassociações profissionais, igrejas, sindicatose clubes de serviços sociais, que são atores

“É indispensávelaos atores queparticipam dessesespaços públicos contarcom o respaldo socialde suas basesrepresentativas.”

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promovedores da cidadania. Contudo, oaperfeiçoamento e a continuidade dosprocessos de gestão democrática eparticipativa também passam pelascontribuições que acabam acontecendo narelação de conflito entre Estado e socie-dade nos espaços de deliberação política(GOHN, 2003).

Descentralização do poder estatalA partir dos anos 80, o debate sobre a

eficácia da gestão das políticas sociais deudestaque à descentralização como instru-mento que permite tornar o poder maistransparente e suscetível ao controle público.

A descentralização é entendida comoum processo de transferência de poderdos níveis centrais para os periféricos. Nãoé um conceito novo na literatura especiali-zada e, especificamente no caso do Brasil,surge como reivindicação dos movi-mentos sociais pela democratização ereforma da estrutura de poder (ARRETCHE,1999).

Não se deve confundir democrati-zação e participação com descentralização.Esta é um “processo de redistribuição dopoder decisório estatal em suas dimensõesfuncionais ou territoriais”, mas não terásentido se não vier acompanhada pelapresença da sociedade civil (ROFMAN, 1990).

A descentralização como um processoque se define de maneira dialética emrelação à centralização é a possibilidade delevar a decisão sobre as políticas públicaspara o âmbito local, para próximo de seusdestinatários.

Nos Conselhos Gestores locais visua-liza-se como se dá a descentralização dagestão das políticas públicas na esferamunicipal. Em nosso país, o município éum ente da federação e, como tal, possuicompetências definidas pela Constituiçãopara gerenciar essas políticas e as demandas

de interesse local (CONSTITUIÇÃO FEDERAL/1988, 2000).

Desse modo, o município passa adesempenhar um novo papel, nãodependendo de transferência de poder dosoutros níveis de governo, o que agiliza aadministração local e impulsiona o seudesenvolvimento. Entretanto, apenas opoder formal não é o bastante se osmunicípios não dispõem dos recursosfinanceiros necessários à implementaçãodas políticas, os quais estão, na maioria dasvezes, nos níveis federal e estadual.

A perspectiva progressista aborda adescentralização como uma estratégia parareestruturar o aparato estatal, tornando-omais ágil e eficaz, democratizando a gestãopela criação de novas instâncias de podere redefinindo as relações Estado/socieda-de (ARRETCHE, 1996). Os novos canais deinterlocução entre população e Estadopassam a constituir um importante instru-mento da gestão pública, evidenciandosurpreendentes aspectos da dinâmicapolítica da sociedade.

Com o processo de descentralização,a prestação de serviços públicos locais ficaa cargo das ações municipais. Esse novocenário aponta para a necessidade de sereformular as tradicionais formas daadministração pública, compartilhandocom a sociedade civil a gestão dosnegócios públicos. A descentralizaçãopromove a inclusão de segmentos repre-sentativos da população, nos espaços dedeliberação pública onde os interesses dacomunidade são discutidos, de modo quea sociedade passa a compartilhar com opoder público as responsabilidades pelagestão das políticas. Essa nova estruturade gestão possibilita uma ação governa-mental mais eficiente, uma relaçãointersetorial mais coordenada nas áreasde atuação pública, com o objetivo de

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proporcionar melhor qualidade de vidaà população.

Desse modo, o processo de descen-tralização passa a contribuir não apenas paramelhorar a eficácia da gestão das políticaspúblicas, mas também para a consolidaçãoda cidadania, da transparência e dademocracia.

Governança e governabilidadeA governança é um termo discutido

sob diferentes perspectivas por váriosautores. De certa forma, isso é um poucoprejudicial para a análise científica, poisacarreta a imprecisão do termo. Nasopiniões de alguns autores, a ampliação doconceito de governança tem dificultado suadistinção do conceito de governabilidade.É de suma relevância, portanto, precisar oseu significado no contexto em que éutilizada.

Para atender às finalidades destetrabalho, faz-se necessário situar e apro-ximar as concepções de governabilidade ede governança com o contexto dademocratização dos espaços públicos e dagestão participativa, de modo que se possavisualizar, com clareza, a inter-relação daparte conceitual e da parte empírica.

A governabilidade está situada noplano do Estado e representa um conjuntode atributos essenciais ao exercício dogoverno, sem os quais nenhum poder seráexercido (DINIZ, 1995). Isto é, governabi-lidade refere-se à capacidade de umgoverno obter apoios e articular aliançascom os vários segmentos sociais, com ointuito de viabilizar a implantação de seuprograma. A capacidade política degovernar ou governabilidade deriva, então,da relação de legitimidade do Estado e doseu governo com a sociedade.

Quanto à governança, comecemospela proposição disseminada pelo Banco

Mundial, que introduziu a expressão“governança local”, nos anos 90, originadado termo inglês local governance, que erautilizado pelas Agências Internacionais paradesignar preocupações com o desenvolvi-mento sustentável das localidades urbanas(BANCO MUNDIAL, 2002). O objetivo ébuscar “os bons resultados” nas adminis-trações públicas locais para postular ageração de melhores práticas pela inovação,participação, eficácia e sustentabilidade.Outro aspecto a ser considerado são osinstrumentos mediadores da políticadistributiva e da necessidade de umprocesso de descentralização de poder.O que se espera é que as localidadespossam e devam ser as principais respon-sáveis pela transformação e fomento dasustentabilidade urbana (BANCO MUNDIAL,2002). Para tanto, é importante o apro-fundamento da utilização de mecanismosde intermediação da sociedade civil como Estado como saídas à crise do Estado,em especial no que tange à esfera local, pelofato de os municípios encontrarem maioresdificuldades financeiras.

A proposição propagada pelo BancoMundial surge como condição para seconstituir um Estado eficiente que contemplea construção do desenvolvimento auto-sustentável pelo estímulo à inovação,participação social e descentralização daspolíticas. Ao adquirir, portanto, um caráterde regulação social com vistas à governabi-lidade, aproxima-se da perspectiva normativade “bom governo”. Nessa linha de pensa-mento, o Banco Mundial prevê que a loca-lidade, ou seja, o município, será o granderesponsável pela convergência das aplicaçõesdos modelos de governança das políticaspúblicas para lidar com o aumento dasexigências de novas demandas da população.

Uma segunda proposição é a chamada“governança democrática”. Essa concepção

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abrange toda tentativa de radicalizaçãodos mecanismos e instrumentos dedemocracia local (SANTOS JR., RIBEIRO &AZEVEDO, 2004). São padrões de interaçãode governos locais com atores sociais, queestabelecem diretrizes, diagnosticam ecoordenam ações públicas a partir defóruns híbridos, instalados na estruturade Estado. Esses fóruns são formados emparte por representantes do Estado eem parte por representantes da sociedadecivil com poderes consultivos e/ou delibe-rativos. Eles possibilitam aos diversossegmentos organizados da sociedade oacesso aos espaços de decisão política emque os interesses da comunidade são alvosde discussão. Esses mecanismos partici-pativos vêm, portanto, redefinindo osespaços de gestão das políticas públicas coma adoção do controle público e da gestãocompartilhada. Na prática, os ConselhosGestores, regulamentados na Constituiçãode 1988 e em leis federais, deram grandevisibilidade a essa proposição.

A adoção de estruturas de gestãodescentralizadas, como é o caso das admi-nistrações regionalizadas e de subpre-feituras instituídas em cidades de grandeporte, também compõem a governançademocrática.

Outro tema que aparece comoelemento da governança democrática é aintersetorialidade. Ela é vista como umaarticulação de saberes e experiências noplanejamento, realização e avaliação deações para alcançar efeito sinérgico emsituações complexas, visando ao desenvol-vimento social. A intersetorialidade não éum conceito que engloba apenas osaspectos das políticas sociais, mas tambéma sua inter-relação com outros aspectos dacidade, como sua infra-estrutura eambiente, que também determinam a suaorganização e regulam o modo como se

dão as relações entre os diversos setoresda sociedade. Esse elemento estabeleceuma nova maneira de administrar a cidade,que passa pela identificação dos problemase pela solução integrada, buscando garantiraos cidadãos seus direitos sociais.

No contexto da governança demo-crática, propõe-se entender governançacomo uma nova geração de reformasadministrativas e de Estado, que têm comoobjeto a ação conjunta, levada a efeito deforma eficaz, transparente e compartilhada,pelo Estado, pelas organizações e pelasociedade civil, objetivando uma soluçãoinovadora dos problemas sociais e criandopossibilidades e chances de um desenvol-vimento futuro vigoroso para todos osparticipantes (LÖFFER, 2001:212). Asestratégias de ações no campo público têmprocurado desenvolver e regulamentarnovos mecanismos de governança quepossibilitam uma participação maior dasociedade nos assuntos públicos.

A prática da governança contemplamecanismos de democracia direta, meca-nismos de gestão pública participativa e oterceiro setor. Regulamentados em nossaConstituição, os mecanismos de democraciadireta – referendo, plebiscito e iniciativapopular de lei – são utilizados em situaçõesespeciais, nas quais a sociedade devemanifestar-se sobre determinado assuntoou, ainda, iniciar o processo legislativo(CONSTITUIÇÃO/1988, 2000). Quando se tratade aplicar os mecanismos de governançano âmbito da gestão pública participativa,objeto de análise deste trabalho, tem-se umaforte tendência a adotar o formato docontrole público na administração. Com ainstitucionalização dos Conselhos Gestores,cria-se uma nova concepção de controle egestão das políticas públicas, que passam aser exercidos com o auxílio de segmentosorganizados da sociedade. A participação,

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por meio dos Conselhos, tem agrande vantagem de conseguir agregaras necessidades, experiências, prioridadese proximidade dos cidadãos à formulaçãoe execução das políticas públicas,principalmente na esfera municipal (SANTOS

JR., Ribeiro & AZEVEDO, 2004). No terceirosetor, a perspectiva da governança seestabelece quando da assunção, pelasOrganizações da Sociedade Civil deInteresse Público (Oscip), da respon-sabilidade pela execução dos serviçospúblicos, que se dá a partir do contrato degestão com o Estado (NOVELLI, 2004).

Em relação à esfera local, a governançasignifica que as cidades fortalecem cada vezmais a cooperação com os cidadãos,as organizações e as entidades sem finslucrativos na condução de suas ações. Acooperação engloba tanto o trabalhoconjunto de atores governamentais e não-governamentais quanto novas formas detransferência de serviços para gruposprivados e comunitários. A governança, noâmbito municipal, é assim “uma formaautônoma de coordenação e cooperação,por meio de redes interorganizacionais, quepodem ser formadas por representantesde organizações políticas e administrativas,associações, poder público, empresas esegmentos organizados da sociedade”(JANN, 2003:449).

Se o conceito de governabilidaderemete às condições sistêmicas sob as quaisse dá o exercício do poder, ou seja, aoscondicionantes do exercício da autoridadepolítica, a governança qualifica o modode uso dessa autoridade. Compreende,portanto, além das questões político-institucionais de tomada de decisões, oscanais de interlocução do Estado com asociedade, no que diz respeito ao processode definição, acompanhamento e imple-mentação de políticas públicas (MELO, 1995;

COELHO & DINIZ, 1995). Sendo assim,a natureza da relação entre Estado esociedade afeta, ao mesmo tempo, os níveise as formas de governança do Estado e degovernabilidade da sociedade.

Controle públicoO controle público deve pressupor

uma forma de governar na qual oscidadãos possam atuar como sujeitospolíticos capazes de orientar e fiscalizar aação estatal. Dessa forma, a participaçãoda sociedade no controle público pode serexercida por meio do acompanhamentoe verificação das ações governamentais,pela avaliação dos processos, objetivos eresultados de programas de governo, e apartir da execução das políticas públicas(CARVALHO, 1995).

Com o controle público, há um avançoem direção à construção de uma sociedadedemocrática que determina transfor-mações profundas nas formas de relaçãodo aparelho de Estado com o cidadão.A partir da reforma e modernização doaparelho estatal, foi possível criar mecanis-mos capazes de viabilizar a integração doscidadãos no processo de definição,implementação e avaliação da ação pública(BANCO MUNDIAL, 1999). Desse modo, areforma contribuiu para o fortalecimentogradual de mecanismos participativosvoltados à formulação e avaliação depolíticas públicas, viabilizando o controlepúblico dessas políticas.

O incremento do controle públicopossibilita um aumento crescente da quali-dade dos serviços públicos prestados àsociedade. Além disso, é uma maneira dese estabelecer uma parceria eficaz egerar, a partir dela, um compromisso entrepoder público e população capaz degarantir condições para o desenvolvimentoeconômico e social.

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Os Conselhos Gestores, institucio-nalizados a partir da Constituição Federalde 1988, constituem um importanteinstrumento de controle público. OsConselhos são fóruns de exercício da gestãoparticipativa e da democracia. A partir delesviabiliza-se a participação popularno desenho das políticas públicas, nasnegociações de interesses da coletividade,na elaboração de programas e projetossociais, bem como na fiscalização das açõesgovernamentais (GOHN, 2003). O controlepúblico tem como pressuposto a parti-cipação da sociedade na gestão pública,inclusive com atribuições fiscalizatórias dasinstituições e das ações governamentais emprol dos interesses da população. Umasociedade organizada exerce inúmerosmeios de controle, entre outras possibi-lidades capazes de promover maiortransparência à gestão pública e melhoriada qualidade dos serviços oferecidosaos cidadãos.

O exercício do controle público, enfim,nada mais é do que governar de modointerativo, equilibrando forças e interesses,e transformando o aparelho de Estado emum efetivo instrumento do exercício e darealização da cidadania.

AccountabilityA accountability se manifesta segundo

mecanismos de cobrança e de controlerecíprocos que constituem fator favorávelao êxito da gestão pública, impedindo aapropriação da máquina por interessesprivados, o desperdício, além da alocaçãode recursos para fins não previstos (DINIZ

& AZEVEDO, 1995).A accountability pode situar-se em termo

das políticas públicas implementadas, dequestões administrativas, profissionais,financeiras, morais, legais e constitucionais.Cada uma dessas áreas da accountability

dispõe de diferentes mecanismos eobjetivos específicos para o controle a serexercido.

O termo accountability apresentauma conceituação multidimensional.A definição dada por O´Donnell (2000)enfatiza que a noção de accountabilityvertical pressupõe uma ação entredesiguais, seja sob a forma do mecanismodo voto, seja sob a forma do controleburocrático. A dimensão de accountabilityhorizontal, por sua vez, presume umarelação entre iguais, por meio do instru-mento de checks and balances (freios econtrapesos), do mútuo controle entre ostrês poderes independentes do Estado.

Todavia, os mecanismos das eleiçõese do voto são insuficientes para o controleda ação governamental, assim como anoção de accountability horizontal é tambéminsuficiente para garantir a legitimidadenecessária ao exercício da democracia,apesar de necessária para o tema dagovernança. A expressão conceitual desoberania popular implicíta na concepçãoda democracia requer uma base de legitimi-dade que vai além da existência demecanismos de checks and balances entre ospoderes e também dos tradicionaismecanismos de controle por meio daseleições (CARNEIRO & COSTA, 2001).

Uma terceira dimensão da noção deaccountability, e que se alinha estreitamentecom o objeto de análise deste trabalho, é aaccountability societal. Sua concepção partede uma matriz teórica que enfatizaa dicotomia Estado e sociedade civil,comungando dos ideais de que a vigilânciada sociedade sobre o governo constituiuma especificidade e merece um destaqueà parte das noções de accountability verticalou horizontal (GRAU, 2000).

Sinteticamente, a essência da accountabilityestá na questão da republicanização do

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espaço público, na consolidação dasdiretrizes democráticas de soberania populare no controle da ação governamental.

Os Conselhos Gestores municipais,estaduais e nacionais constituem expe-riências de inovação institucional quesinalizam para ampliação dos espaços dedeliberação pública e consagram-se comomecanismos de atuação participativa quevão muito além das atuações dos demaisinstrumentos de participação vigentes, umavez que são estruturas jurídico-constitu-cionais, de caráter permanente, comrepresentação paritária entre Estado esociedade civil e com amplos poderes decontrole sobre a política. Portanto, mais doque expressão e mecanismo de mobilizaçãosocial, os Conselhos acenam para umanova forma de atuação de instrumentosde accountability societal, visto queapresentam a capacidade de colocar temasna agenda pública, de controlar seudesenvolvimento e de fiscalizar processosde implementação de políticas e direitos,por intermédio de um fórum híbrido,composto de representantes governa-mentais e não-governamentais.

A prática da boa governança exige,sobretudo, a vigência de instrumentos deaccountability que ampliem a abrangência docontrole público sobre as açõesdo governo e solidifiquem os preceitosbásicos da democracia e da legitimidadepolítica. Aponta-se ainda a centralidade daparticipação social no tocante à construçãode uma nova governabilidade democrá-tica, haja vista que esta confere maiorlegitimidade à ação governamental e ampliao espaço público, enfatizando umaperspectiva sociocêntrica, imprescindível nacomposição das bases de governabilidade(BANCO MUNDIAL, 2002).

A eficiência estatal, tarefa básica dareconstrução do Estado, depende também

dos instrumentos de accountability, espe-cialmente no que concerne à necessidadede os governos prestarem contas àpopulação a respeito do desempenho deseus programas de ação (BANCO MUNDIAL,2002). Os instrumentos de accountabilitysocietal têm o propósito, dessa maneira, noâmbito do desempenho governamental, deromper com a lógica auto-referenciada daburocracia estatal, criando possibilidadesde controle do Estado pela sociedade civil.Os conceitos de democracia e de eficiênciapassam a se inter-relacionar de maneiramuito mais estreita a partir da perspectivade um novo modelo de gestão pública quepressupõe ser o Estado tão mais eficientequanto mais democrática for a suaadministração.

Visto que a accountability tem noçõesmultidimensionais, fica claro que suaefetividade requer a combinação dosdiversos modos de responsabilização,entendidos como instrumentos que secomplementam para o exercício docontrole governamental.

Assim, a efetividade da accountabilitysocietal depende de uma sociedade civilorganizada e capaz de exercer influênciasobre o sistema político e sobre as buro-cracias públicas, demandando e viabili-zando a dimensão associativa da cidadaniae da democracia participativa.

Procedimentos metodológicos

O estudo foi realizado em marçode 2007, em Viçosa (MG), cidade univer-sitária localizada na Zona da Mata, com73.121 habitantes residentes, de acordocom o censo do IBGE de 2005 (IBGE,2007). Somando-se esse número a mais 12mil pessoas da população flutuanteconstituída de estudantes universitários degraduação e pós-graduação, técnicos em

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treinamento na Universidade Federal deViçosa, participantes de congressos eeventos técnico-científicos e culturais eoutros, chega-se a uma população de maisde 85 mil pessoas (CÂMARA MUNICIPAL DE

VIÇOSA, 2007).Para a análise empírica, foram identi-

ficados 17 Conselhos Gestores municipais,dos quais 12 se encontram em funciona-mento e os demais tiveram sua formaçãoinviabilizada pela indisposição das entidadesem se fazerem representar.

Para a classificação da pesquisa foiconsiderado o critério adotadopor Vergara (1997), que a qualifica emrelação a dois aspectos: quanto aos finse quanto aos meios. A pesquisa caracte-riza-se quanto aos fins como exploratóriae descritiva. Exploratória porque foirealizada em uma área onde existe poucoconhecimento acumulado. Descritivaporque expõe características de determi-nada população ou de determinadofenômeno. Quanto aos meios, a pesquisafoi bibliográfica, documental e de campo.

A coleta de dados primários foi reali-zada por meio da aplicação de questionáriossemi-estruturados com o objetivo deidentificar as características dos ConselhosGestores no município de Viçosa/MG efazer uma avaliação sobre seu desempenho,com base na percepção de seus presidentes.Os questionários foram divididos emquatro partes, sendo: 1) Identificação doperfil do presidente; 2) Característicasdo Conselho, como número de compo-nentes, tempo de funcionamento, sedeliberativos ou consultivos, proporçãode membros governamentais e não gover-namentais, se possuem ou não regimentointerno etc., 3) Questões específicas atinentesaos Conselhos relacionadas à Governançae à Governabilidade locais; 4) Espaço abertopara opiniões dos presidentes. As questões

relativas ao item 3 estão associadas a umaescala Likert de seis pontos, cuja pontuaçãocorresponde ao seguinte: 1 (discordototalmente); 2 (discordo muito); 3 (discordopouco); 4 (concordo pouco); 5 (concordomuito) e 6 (concordo totalmente).

Foi utilizado o programa SPSSversão 15.0 para análise de freqüência dasquestões objetivas dos questionários. Para asquestões abertas, recorreu-se à técnica deanálise de conteúdo que objetiva identificaro que está sendo expresso sobre determi-nado assunto (VERGARA, 2005). Trata-se deum método de pesquisa que parte de umconjunto de procedimentos específicos aptosa realizar inferências válidas de textos. Asrespostas tabuladas e apresentadas em formaestruturada para análise, posteriormenteforam interpretadas. Buscou-se identificar, napercepção dos presidentes, como osConselhos Gestores estão efetivamentedesempenhando suas atribuições enquantomecanismos de controle e de gestão daspolíticas públicas. Terminada essa etaparealizou-se um workshop com os presidentes,dando-lhes retorno dos resultados apuradose promovendo um debate entre os mesmos.Essa iniciativa permitiu a realização de novasperguntas e obtenção de outros dados einformações que foram úteis para a avaliaçãodo desempenho dos Conselhos.

Os dados secundários, de carátercomplementar para essa avaliação, foramcoletados nas sínteses dos relatórios defiscalização de municípios do Estado deMinas Gerais, realizadas pela ControladoriaGeral da União (CGU), disponibilizadasno site da instituição (www.cgu.gov.br),correspondendo ao período de 2003 a2006, quando foram realizados 18 sorteios.Esse Programa de Sorteios Públicos,inovador no governo brasileiro e desen-volvido pela CGU (órgão responsávelpelo Sistema de Controle Interno do

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Poder Executivo Federal), tem comoobjetivos garantir a observância do prin-cípio constitucional da impessoalidade;conscientizar e estimular a sociedade parao controle dos gastos públicos; inibir edissuadir a corrupção; e coletar dados queindiquem tendências a respeito da execuçãodos programas de governo.

O universo da pesquisa foicomposto pelos 12 Conselhos Gestoresmunicipais que se encontram em ativi-dade na Cidade de Viçosa (MG), nasáreas de Assistência Social; Cultura ePatrimônio Cultural e Ambiental; Defesae Conservação do Meio Ambiente;Desenvolvimento Rural Sustentável;Educação; Saúde; Segurança Alimentare Nutricional; Segurança Pública;Trabalho, Emprego e Geração deRenda; Direitos da Criança e do Adoles-cente; Portadores de NecessidadesEspeciais; e Planejamento Municipal.

Resultados e discussão

Identificação do Perfil dosPresidentes dos Conselhos

Como primeiro esforço de pesquisa,buscou-se identificar o perfil dos presi-dentes. Nessa análise foi possível verificarque 83% têm formação universitária, sendoque 50% são mestres e/ou doutores e 16%fizeram especialização. Os presidentes têmidade média de 50 anos, sendo que a idademínima registrada é de 29 anos e amáxima, de 69 anos.

Parte significativa dos presidentes,58%, são servidores públicos da Uniãoou do Município. Entre esses, 71% sãoservidores ativos. Três presidentes sãotambém secretários municipais, sendo quedois destes, o da Saúde e o da Educação,dispõem da prerrogativa privativa doexercício da presidência dos Conselhos

Municipais da Saúde e da Educação,conforme estabelecido nos própriosregimentos dos Conselhos.

Há maior incidência de presidentes dosexo masculino, correspondendo a 75%.No que se refere ao estado civil, foi verifi-cado que 75% dos presidentes são casadose os demais são solteiros.

Com a análise do perfil foi possívelconstatar que os Conselhos contam compresidentes capacitados e qualificados parao exercício do cargo, pois são pessoas quegozam de experiência na administraçãopública, possuem conhecimento técnicorelacionado às respectivas áreas e capaci-dade política para coordenar e mediar asnegociações e conflitos de interesses quesurgem no interior dos Conselhos.

Características dos ConselhosOs Conselhos Gestores do município

de Viçosa possuem, em média, 12 inte-grantes, sendo que o número mínimoobservado foi de seis e o máximo de24 membros, com uma média de 11 enti-dades sendo representadas junto aosmesmos. As reuniões, abertas ao público,são realizadas mensalmente para 75% dosConselhos; para os demais ocorremreuniões bimestrais ou trimestrais. Apenasum Conselho não define previamenteagenda para as reuniões. A representaçãonos assentos dos Conselhos segue aproporção de 50% para membros gover-namentais e 50% para membros não-governamentais. Uma exceção é o Con-selho Municipal de Saúde (CMS) compostopelos seguintes percentuais: 50% de repre-sentantes de entidades dos usuários, 25%de representantes de entidades dos traba-lhadores de saúde e 25% de representaçãodo governo municipal, conforme aresolução 33/92 do Conselho Nacional deSaúde. Outra exceção é o Conselho

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Municipal do Trabalho, Emprego eGeração de Renda, também tripartite ecomposto por 1/3 de membros governa-mentais, 1/3 por entidades representativasda classe dos empregados e 1/3 por enti-dades representativas dos empregadores.

Verificou-se que 100% dos ConselhosMunicipais exercem o papel consultivo, masapenas 67% dos mesmos praticam,concomitantemente, o papel deliberativo.Entre estes estão Conselhos como o daSaúde, Meio-Ambiente, Assistência Social,Trabalho, Emprego e Geração de Renda,Criança e Adolescente, Cultura e doPatrimônio Cultural e Ambiental, Desen-volvimento Rural Sustentável e SegurançaAlimentar e Nutricional. A prerrogativapara exercerem a função deliberativa deveestar regulamentada na lei que cria oConselho ou em seu regimento interno.

Os Conselhos têm tempo defuncionamento distintos, mas em médiafuncionam há 10 anos. Os Conselhos daSaúde, e da Criança e do Adolescente sãoos mais antigos - foram criados em 1991.À exceção dos Conselhos de SegurançaPública, Trabalho, Emprego e Geração deRenda, e Planejamento Municipal, criadosna década de 2000, todos os demais foramconstituídos nos anos 90.

Nos Conselhos Gestores do municípiode Viçosa, verificou-sea existência deregimento interno que regulamenta ofuncionamento e as atribuições dos respec-tivos Conselhos. Observou-se também ofiel cumprimento dos mandatos dosconselheiros, com convocações de fórunspróprios nos períodos de novas eleições.

Os Conselhos de Assistência Social,de Saúde e da Criança e do Adolescenterealizam a cada dois anos convençãomunicipal, na qual são verificadas se asmetas planejadas para o período foramalcançadas, se os planos traçados obtiveram

êxito e se as ações implementadas surtiramo efeito desejado nas respectivas áreas deatuação.

Notou-se que 92% dos Conselhos deViçosa não dispõem de sede própria efuncionam nas instalações do PoderExecutivo. Isso foi considerado por50% dos presidentes como “fator queinfluencia negativamente no desempenhodo Conselho”. Para solucionar a questão,dois presidentes propuseram a criação dauma “Casa dos Conselheiros”, ou seja, umlocal onde toda infra-estrutura podeser otimizada, assim como a força detrabalho. No que se refere ao funciona-lismo, verificou-se que nenhum Conselhopossui um quadro de pessoal próprio,sendo que a força de trabalho utilizada éformada por voluntários, conselheiros oufuncionários do Poder Executivo. Para75% dos entrevistados, esse fator tambémprejudica o desempenho dos Conselhos.Tais constatações nos levam a inferir que afalta de suporte estrutural afeta a atuaçãodos Conselhos, assim como sua própriaindependência em relação ao PoderExecutivo.

Análise do desempenho dosConselhos

Na primeira etapa da análise dodesempenho dos Conselhos, destacaram-se as variáveis democratização, descentra-lização e legitimidade da representação,dimensões fundamentais da discussãosobre os Conselhos.

Conforme demonstrado na Tabela 1,83% dos entrevistados concordam muitoe/ou totalmente com a afirmação de quea criação dos Conselhos Gestores emViçosa possibilitou a democratização dosespaços públicos. Os presidentes ressaltamcomo importantes mudanças ocorridasnesse sentido: a participação da sociedade

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na formulação das políticas sociaismarcadas tradicionalmente pelo paterna-lismo e clientelismo, redefinindo de maneiramais universal e democrática a suaabrangência; a capacidade de iniciativapolítica, entendida como capacidade deiniciar na agenda política proposições quecorrespondem às prioridades e/ouinteresses da coletividade; o controlepúblico exercido sobre os atos eprogramas governamentais; o direito depropor, iniciar ou modificar legislaçãoespecífica, enfim, a publicização e ademocratização do acesso ao processopolítico decisório.

Uma ação prática relatada porpresidentes, e que pode ratificar a afirmaçãofeita pelos mesmos quanto à democra-tização dos espaços com a instituciona-lização dos Conselhos em Viçosa, foi acriação dos Fundos Municipais dosDireitos da Criança e do Adolescente, daAssistência Social e da Saúde. Esses fundostêm por objetivo facilitar a captação, orepasse e as aplicações dos recursos desti-nados ao desenvolvimento das ações nessasáreas. Os recursos dos Fundos sãoadministrados segundo a política definidapelos respectivos Conselhos que integramo orçamento do município. Estão entre as

Fonte: Dados da Pesquisa

Nota: (1) Discordo totalmente (2) Discordo muito (3) Discordo pouco (4) Concordo pouco(5) Concordo muito (6) Concordo totalmente

Tabela 1: Variáveis que compõem a análise: a primeira etapa

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atribuições dos Conselhos em relação aosFundos: elaboração do plano de aplicaçãodos recursos, o qual será submetido peloprefeito à apreciação do Poder Legislativo;estabelecimento dos parâmetros técnicose as diretrizes para a aplicação dos recursos;acompanhamento e avaliação da execução,desempenho e resultados financeiros doFundo; mobilização dos diversossegmentos da sociedade no planejamento,execução e controle das ações do Fundo;fiscalização dos programas desenvolvidoscom recursos do Fundo; e publicação detodas as resoluções do Conselho referentesao Fundo em periódicos de grande circu-lação no município ou afixação em localde fácil acesso à população. Verificou-setambém que 92% dos presidentes de Con-selhos entrevistados concordam muito e/ou totalmente com o fato de quea descentralização contribui para odesenvolvimento local. Segundo eles, amunicipalização como um processo dedescentralização colabora para melhorar aeficácia da gestão pública das políticassociais. Citaram o Programa de Saúde daFamília (PSF), o Programa de AlimentaçãoEscolar e vários Programas de AssistênciaSocial como exemplos de descentralizaçãonas áreas de saúde, educação e assistênciasocial que viabilizam a universalidade doatendimento e a melhoria da qualidade devida da população.

Para que os Conselhos Gestorespossam contribuir para a governabilidadeé necessário que estes tenham a sua legiti-midade reconhecida pelo Estado e pelasociedade.

Apesar de Souza (2004) inferir que tantoo Poder Executivo quanto o Legislativotendem a não reconhecer a legitimidade dosConselhos, invocando uma representaçãonão instituída via sufrágio universal, nomunicípio de Viçosa isso parece não

ocorrer, pois a grande maioria dospresidentes concorda muito e/outotalmente que o Executivo reconhece alegitimidade do Conselho Gestor enquantoinstância decisória e de controle social.

Outro aspecto importante da legiti-midade diz respeito à escolha independentee democrática dos membros de cadaentidade representada no Conselho. Essaquestão está relacionada aos quesitosbásicos da autonomia da sociedadeem relação ao poder público. No muni-cípio de Viçosa, conforme apurado, osmembros não-governamentais são eleitospelo voto das entidades da sociedade civilrepresentadas nos respectivos Conselhos,reunidas em assembléias convocadas peloConselho, mediante edital publicado naimprensa local, no prazo de 15 dias dotérmino do mandato vigente. Assim,verifica-se de fato que o Poder ExecutivoMunicipal não exerce influência na escolhados membros que representam asentidades, garantindo a independência dasociedade, o exercício da democracia e atransparência no processo de eleição dosrepresentantes da sociedade civil.

Observa-se ainda, na Tabela 1, que osconselheiros têm sua legitimidade reco-nhecida pelas entidades que representam,conforme opinaram 100% dos presidentesentrevistados, dos quais 83% concordamtotalmente e 17% concordam muito.Tal fato expressa a identidade dos conse-lheiros com suas bases sociais e, conseqüen-temente, o grau da representatividade paradiscutir e negociar em nome de seusegmento representativo.

Desse modo, o grau de legitimidadeapurado nos Conselhos permite inferir queesses mecanismos vêm contribuindo paraa governabilidade em Viçosa.

Na segunda etapa da análise dodesempenho dos Conselhos, deu-se ênfase

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aos aspectos da qualificação dos conse-lheiros e da participação. Conjuntamente aessas dimensões da análise do desempenho,foram focados os temas da governança,governabilidade e accountability – categoriascentrais da parte empírica, sobre as quaisos Conselhos têm papel fundamental paraa prática.

Dos presidentes entrevistados, 92%concordam muito e/ou totalmente com aafirmação de que a avaliação de desem-penho dos conselheiros é uma medida desuma importância para a eficiência produ-tiva dos Conselhos. Para os presidentes, aidentificação dos pontos fortes e fracosapurados na avaliação do desempenhode cada conselheiro permitiria uma

intervenção precisa em pontos conside-rados estratégicos para a eficácia do desem-penho coletivo dos Conselhos.

Igualmente importante para a eficáciados Conselhos, e ainda podendo seridentificada na própria avaliação de desem-penho dos conselheiros, está a questão daqualificação, aqui entendida como capaci-tação. Nota-se, na Tabela 2, que dos 12presidentes entrevistados seis apontaram anecessidade de uma melhor capacitaçãopara os conselheiros, pois nem todos seencontram suficientemente preparadospara discutir e avaliar os interesses envol-vidos ou, ainda, para as negociações deconflitos, prioridades e decisões. Alémdisso, as assimetrias de saber colocam os

Tabela 2: Variáveis que compõem a análise: a segunda etapa

Nota: (1) Discordo totalmente (2) Discordo muito (3) Discordo pouco (4) Concordo pouco(5) Concordo muito (6) Concordo totalmenteFonte: Dados da Pesquisa

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conselheiros menos preparados numagrande dependência de informações,consultas e recursos de toda ordem.

Verifica-se, segundo os presidentes, anecessidade de capacitação técnica dosconselheiros para a formulação e análisedas políticas públicas e, também, acapacitação política para melhor avaliar osinteresses envolvidos e realizar as aliançaseventuais ou estratégicas necessárias ànegociação de prioridades e decisões. Essadupla necessidade de capacitação provocaum salto de qualidade nas representaçõessociais e, conseqüentemente, na produçãodos Conselhos. O exercício da argumen-tação, a fundamentação de suas demandasem critérios de racionalidade pública, aexplicitação de conflitos geram uma novaforma de lidar com diferenças e antago-nismos dentro desses canais de interlocução,elevando a eficácia dos resultados alcançadosna gestão das políticas públicas.

Trata-se de uma questão de extremaimportância, haja vista que a capacitaçãoauxilia no desenvolvimento do senso críticocontribui para o melhor atendimento dasdemandas que surgem da sociedade,permite ao conselheiro ter um maiorconhecimento de suas atribuições, além deminimizar as possibilidades de manipu-lação e cooptação. A capacitação podeestar, também, relacionada aos fatoresmotivacionais, estimulando a participaçãopolítica. Acredita-se que o indivíduo politi-camente motivado pode dar grandescontribuições para a administração demo-crática. Já a ausência de capacitaçãopara os conselheiros pode resultar nadiminuição da capacidade de controle dosmecanismos e critérios de uso dos recursospúblicos, bem como inibir a capacidadede questionamento e reivindicações.Pode, ainda, desfocar a percepção doconselheiro em relação à importância

do Conselho e seu verdadeiro papel nasociedade, além de prejudicar o exercíciodo pensar coletivo.

Os presidentes entrevistados semostraram sensíveis a essa questão.Observou-se que três Conselhos já intro-duziram a prática de capacitação paraseus integrantes. A título de exemplo,a presidente do Conselho de AssistênciaSocial relatou que, após a introdução deum programa de capacitação, ocorrerammelhorias quanto à assiduidade às reuniõese a aspectos qualitativos da participação, oque, conseqüentemente, demonstra oefeito positivo da realização de cursos decapacitação. Vale ressaltar que, entre ospresidentes entrevistados, 25% apontarama capacitação permanente como sugestãopara tornar os Conselhos mais efetivos.

Pesquisas revelaram que universidadese organizações não-governamentais têm-se empenhado em promover oficinas,seminários e cursos de capacitação paramembros de Conselhos Gestores emvárias regiões do País, viabilizando aaplicação dos próprios conhecimentosadvindos de pesquisas acadêmicas e deprogramas especiais de treinamentorealizados na área dos Conselhos.

Quanto ao interesse participativo dacomunidade no que tange aos assuntos eatuação dos Conselhos Gestores,de acordo com a opinião de 90% dospresidentes, a população de Viçosa aindanão foi despertada para a importância deseu papel na vigilância desses mecanismosde gestão das políticas públicas. Segundoos presidentes, percebe-se infelizmente nacultura política brasileira a predominânciade um comportamento acomodado doscidadãos, que se dão por satisfeitos aotransferir a responsabilidade da gestãodos bens públicos para os políticos eburocratas, não se importando em

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permanecer distantes das arenas dedecisões políticas. Essa situação refletenegativamente no desenvolvimento depadrões de cidadania ativa, reforçando afalta de interesse da sociedade em semostrar vigilante quanto às deliberaçõese ações desse mecanismo participativo,podendo torná-lo inerte.

Na percepção dos presidentes,apenas 34% concordam muito e/outotalmente com a afirmação de que osconselheiros são assíduos às reuniões(Tabela 2). Para 66% dos dos presidentes,ainda falta maior engajamento dosconselheiros. Segundo eles, isso pode serconseqüência da ausência de capacitação,do incipiente desenvolvimento socio-político de alguns segmentos, da carênciade moral cívica e de espírito público dealguns membros, entre outros fatores.

A falta de engajamento reflete certodescompromisso com as causas comuni-tárias. Alterar essa realidade implicamudança de cultura e conscientizaçãopolítica para a necessidade do exercício dacidadania ativa, o que requer tempo.Entretanto, acredita-se que algumassoluções podem ser implementadas paraminimizar o problema, tais como desen-volver um programa ou de um plano deincentivos para os conselheiros; dar statusà função de conselheiro; estimular o inter-câmbio de informações; premiar idéiasinovadoras para tornar os Conselhos maisefetivos etc.

Foi observado, ainda, que na formação/constituição de Conselhos é importante quehaja mais mobilização da sociedade civil emse fazer representar e exercer a democraciaparticipativa tão desejada, pois se verificou,junto aos presidentes, certa indisposição paraisso por parte de algumas entidades e orga-nizações. Ademais, cinco Conselhos criadosno município de Viçosa não estão em

atividade devido à indisposição de insti-tuições em se fazerem representar. Torna-se indispensável conscientizar as entidadesde que o Conselho é um mecanismofundamental no controle público e talvezseja uma das maiores inovações no processode democratização dos espaços dedeliberação pública. A representação dasentidades precisa, a qualquer custo, serefetivada; caso contrário, não teríamos nosConselhos a participação de castas impor-tantes e necessárias da sociedade civil nadiscussão e deliberação de assuntosrelevantes para a população. É importantenão perder de vista que os Conselhos têmna sua composição a representação deentidades, e não de pessoas.

Conforme verificado na tabela 2, para75% dos presidentes os Conselhos têmcontribuído com a gestão ao propor novaspolíticas, projetos inovadores e programasde desenvolvimento para os respectivossetores. Nesse sentido, foram observadasvárias ações no município de Viçosa quevêm contribuindo para as práticas dagovernança e da governabilidade.

Na prática, como se realiza a gover-nança? No caso em análise, ela foi verifi-cada em programas municipais detrabalho, profissionalização e desenvol-vimento econômico; em articulações noplanejamento e realização de ações entreáreas municipais com interface de atuação;em criação de meios para arrecadação fiscalvisando ao fortalecimento de Fundos deatendimento dos direitos da criança e doadolescente; em projetos na educação,compreendendo diversos atores sociais; ena implementação de programas muni-cipais de assistência social conduzidos pelasociedade e pelo poder público.

A partir do exemplo dos programasmunicipais de trabalho, profissionalizaçãoe desenvolvimento econômico, pode-se

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demonstrar o quanto é promissor, mastambém repleto de obstáculos, o caminhopara uma governança pública digna dessenome. Em Viçosa, a política municipal detrabalho, emprego e renda é adequada parase avaliar as estruturas de governança porqueé desenvolvida pelo Centro VocacionalTecnológico (CVT), um projeto deincubação de empresas, no qual váriasentidades da sociedade civil participamcomo parceiras do poder públicona promoção do desenvolvimentoeconômico e da geração de empregoslocais. O CVT realiza também cursosprofissionalizantes, dando qualificação àmão-de-obra local por meio de parceriascom a Universidade Federal de Viçosa,a Casa do Empresário e a AssociaçãoComercial. A política de trabalho e empregoé atribuição tradicional da União e não dascidades, mas estas há muito tempo têm sidoas principais empregadoras. Acima de tudo,precisam superar as conseqüências dodesemprego, desastrosas para as cidades.

A intersetorialidade entre as políticastambém nos permite avaliar estruturasde governança. As políticas de meioambiente e de planejamento municipal, emViçosa, têm-se articulado para melhorexercer o controle e a fiscalização dosempreendimentos imobiliários. A cidadevem crescendo rapidamente e há um fortelobby político da construção civil, que, porvezes, segundo relato de presidentes deConselhos, tentam sobrepujar a próprialegislação ambiental e as leis de edificação.Essa articulação entre as políticas propiciaum efeito sinérgico no enfrentamento deproblemas complexos e estabelece umaforma de administrar que visa à soluçãointegrada dos problemas.

Também se verificou, em entrevistascom os presidentes de Conselhos, açõesarticuladas entre as políticas de segurança

alimentar e nutricional e de desenvolvi-mento rural sustentável, no que se refereao planejamento da produção de alimentospor produtores rurais do município emconformidade com a demanda deprogramas de alimentação de criançasinstituídos no município em creches, escolas,pastorais e associações comunitárias.

O Conselho Municipal dos Direitos daCriança e do Adolescente, utilizando-se deprerrogativas dispostas no Estatuto daCriança e do Adolescente (ECA), lançou,em 2003, uma campanha de arrecadaçãovia renúncia fiscal do imposto de renda depessoas físicas e jurídicas. A campanhavisava ao incremento de novas fontes dereceitas para o Fundo Municipal quefinancia as políticas voltadas ao atendimentodos direitos da criança e do adolescente,em Viçosa.

A viabilização e o crescimento daarrecadação vêm-se dando ano após anograças a ações de uma rede de coope-ração composta por diversos atoressociais. Nesse exemplo, a governança sesitua na cooperação por intermédio deredes que podem ser formadas porassociações, cidadãos, empresas esegmentos da sociedade na condução deações para a consecução das políticas. Naeducação, também se observam bonsexemplos de governança, fazendo jus aoslogan utilizado pela gestão: “Viçosa,cidade educadora”. Há vários projetos dereforço escolar e de cursos de preparaçãopara o vestibular no município, condu-zidos por professores voluntários,por pastorais, por universitários e porassociações comunitárias em cooperaçãocom o poder público municipal. Essasações têm impacto direto em questõescomo evasão escolar, qualidade do ensinoe inclusão, aspectos estratégicos dequalquer política educacional.

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Na avaliação das estruturas de gover-nança relacionadas às políticas de assis-tência social, vislumbraram-se práticas decaráter simples, mas inovadoras eeficientes. Dois programas da política, emViçosa, chamaram a atenção pela fácilimplementação e pelo caráter poucoassistencialista: são o Bolsa Trabalho e oFamília Viva.

O Bolsa Trabalho visa a atender quemprocura a assistência social do municípiocom dificuldades financeiras para suprirdeterminadas necessidades. Essas pessoassão encaminhadas para executar pequenosserviços avulsos em associações, escolas,empresas, clubes e residências cadastradasno programa e, assim, recebem remune-ração. Já o Programa Família Viva oferececursos que possibilitam à família gerar umarenda extra com a produção artesanal ecaseira de vários produtos ou, até mesmo,fazer dessa atividade a base do seu sustento.Segmentos da sociedade são parceirosdesta iniciativa, fornecendo matéria-primae know-how técnico. A ação conjunta, levadaa efeito de forma eficaz e compartilhadapelo Estado e pela sociedade civil, alme-jando uma solução inovadora dasdemandas e problemas sociais, edificaformas de governança.

No processo de construção dagovernança, o papel dos Conselhos locaisde Viçosa se dá de forma direta, em algunscasos, e indireta, em outros. Não se deveesquecer que os Conselhos compartilhama produção das políticas públicas e suaexecução com o Estado. Assim, tanto aresponsabilidade pelas políticas quanto oslouros colhidos pelos bons resultados queapresentam pertencem a ambos. Sendogovernança definida como uma açãoconjunta via rede de todos os stakeholdersem prol do bem da coletividade, obser-vou-se em Viçosa a prática da boa

governança, para a qual os Conselhos locaisderam importantes contribuições.

As redes sociais e as alianças municipais,que se formam a partir de organizações,associações, sindicatos, cidadãos esegmentos da sociedade civil, vão dandosustentabilidade e legitimidade a muitaspolíticas implementadas no municípiomineiro. Essas entidades que compõem asredes sociais, na maioria das vezes, estãorepresentadas nos assentos dos diversosConselhos Municipais, conforme obser-vado no estudo, criando uma vasta e ricarelação intra e interinstitucionais. As arti-culações e os apoios formalizados nocontexto das políticas públicas em Viçosasugeriram o alcance de um nível degovernabilidade bastante satisfatório, vistoque a essência da governabilidade está nacapacidade de obter apoios e alianças comos diversos setores da sociedade paralegitimar e viabilizar as políticas de umdeterminado programa de governo.

É notório que a grande força dosConselhos reside no controle que essesmecanismos podem exercer sobre a açãogovernamental e a gestão das políticaspúblicas. Nesse sentido, eles se constituemem um importante instrumento deaccountability societal. É pelas entidades dasociedade civil representadas nos Conse-lhos que são exercidas as influências sobreo sistema político e sobre a burocraciapública, viabilizando, assim, um efetivocontrole público do Estado. Para 75%dos presidentes de Conselhos de Viçosa(Tabela 2), a existência desses mecanismospropiciou melhor aplicação dos recursospúblicos e melhor desempenho das polí-ticas, ou seja, o controle exercido pelosConselhos resultou em maiores benefíciospara a sociedade. Entre os benefícios docontrole, os presidentes destacam a fisca-lização da execução orçamentária, com

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vista à eficiência e à racionalização naaplicação dos recursos; o acompanha-mento e a fiscalização de processos licita-tórios; a verificação das parcerias e/ouconvênios estabelecidos para execução deserviços públicos; e a realização deprocedimentos que visam a apurar aprobidade e a moralidade de atos naadministração.

Para complementar a avaliação dodesempenho dos Conselhos em Viçosaforam utilizadas as sínteses dos relatóriosde fiscalização de municípios da CGU.Nessas sínteses foram identificados todosos registros pertinentes à atuação dosConselhos locais em Minas Gerais noperíodo de 2003 a 2006. Verificou-se queos maiores problemas se referem aosConselhos Municipais de Saúde e Assis-tência Social. Essa situação pode serexplicada pelo fato de esses Conselhosestarem presentes na maioria dos muni-cípios devido ao repasse de verbas daUnião e dos Estados a essas áreas estarvinculado à existência dos mesmos. Entreas inúmeras falhas apontadas, destacam-seproblemas graves na constituição eoperacionalização dos Conselhos, taiscomo emissão de documentos públicosfalsos, omissões na atuação dos Conselhos,irregularidades na formação, ausência dereuniões, cooptação de membros peloExecutivo, não realização de eleições pararenovação dos mandatos dos conselheiros,entre outros. Tais problemas resultam nainoperância desses mecanismos nosmunicípios fiscalizados.

Considerações finais

Com base na literatura apresentada,verifica-se que o processo de redemocra-tização do País possibilitou a construçãodas propostas de democracia participativa

e que a criação e a disseminação dosConselhos Gestores municipais são reflexosda necessidade de se reformar as instituiçõesde governo local no Brasil, cujo aspectocentral requer maior participação direta dasociedade na gestão dos municípios e naformulação das políticas públicas.

O estágio de desenvolvimento dasdiversas políticas públicas é distinto porqueo processo de municipalização não vemocorrendo de modo uniforme para todaselas. A transferência de equipamentos erecursos federais e estaduais para o muni-cípio é feita de maneira isolada, de acordocom cada política. Isso tem repercussõesna gestão, pois o município acaba repro-duzindo tal fragmentação na gestão decada política setorial, refletindo, assim, ascondições em que se encontram, indivi-dualmente. Partindo do pressuposto deque as necessidades dos cidadãos não sãosatisfeitas apenas pela intervenção de umapolítica, é preciso promover a interaçãodas diversas ações setoriais para resolveros problemas na sua totalidade e permitirao cidadão melhor qualidade de vida.

A conclusão de efeitos mais imediatosdos Conselhos depende da natureza comque os mesmos se revestem, conforme ocaráter que lhes dá a lei responsável porsua criação. Desse modo, quanto mais auto-nomia dispuserem para deliberar sobre osetor da gestão pública de sua competência,maior será a sua eficácia enquanto canaisde instrumentalização de poder popular.Assim, a natureza deliberativa dos Conse-lhos figura como relevante para que suasdecisões e orientações possam culminar emresultados democráticos mais efetivos.

A democracia participativa significabem mais que pleitear o direito de assentonos espaços de negociação dos interessespúblicos. Significa construir uma culturapolítica democrática fortalecida, em

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especial, pelo exercício da cidadania ativa.Nesse sentido, há dois aspectos que vêm àtona quanto à participação: entidades econselheiros. Muitas vezes os Conselhostêm seu funcionamento inviabilizadoporque as entidades que deveriam compô-los não apresentam seus respectivosrepresentantes. Surgem diante desseepisódio duas possibilidades de taldesinteresse: ou há poucas entidades paramuitos Conselhos ou as entidades prio-rizam determinados Conselhos de acordocom seus interesses. Essa dúvida pode serum bom incentivo para realização deoutros trabalhos na área. No que se refereà participação dos conselheiros, a dificul-dade de quórum em reuniões é uma reali-dade não muito rara. Existe a necessidadede se instituir alguns incentivos para afunção como forma de reconhecimentode sua importância no processo de gestãodas políticas públicas.

Os Conselhos são estruturas jurídico-constitucionais, de caráter permanente, quefazem parte da estrutura orgânica do poderpúblico. Possuem atribuições políticas, mastambém administrativas. Para realizar commaior autonomia suas funções adminis-trativas, sugere-se tanto a construção deinfra-estrutura própria para os Conselhosquanto a contratação de mão-de-obra,propiciando-lhes um formato de órgão,não estatal, integrado ao aparato público.

As cidades são as maiores responsáveispela convergência de aplicações dosmodelos de governança das políticaspúblicas para lidar com a demanda cadavez maior de novas exigências dos cidadãos.As parcerias e alianças, realizadas no âmbitomunicipal, dão substância às estruturas degovernança e legitimidade às políticaspúblicas intentadas, fortalecendo tambéma capacidade de governar. As políticaspúblicas sempre terão melhores chances de

alcançar suas finalidades quando geridaspor um modelo de gestão pública quepressupõe que o Estado é tão mais eficientequanto mais democrática for a sua admi-nistração. O tema da accountability por meiodos seus instrumentos de aplicação, entreos quais os próprios Conselhos Gestores,viabilizam não apenas o controle das açõesgovernamentais, mas também a eficiênciaestatal e a democratização das relaçõesentre Estado e sociedade. A governança, agovernabilidade e a accountability formamum tripé estratégico que faz a diferença parao êxito das políticas públicas.

Os Conselhos locais analisados nesteestudo nos revelaram resultados quedemonstraram poucas distorções entre ateoria aplicada ao tema dos Conselhos e asua efetiva prática no campo público.Com isso, pôde-se constatar que essesmecanismos de participação instituídosno município de Viçosa têm galgadoimportantes degraus de desenvolvimentoe aperfeiçoamento. A pesquisa demons-trou, porém, que o grau de desenvol-vimento institucional dos Conselhos não éhomogêneo. Há Conselhos melhoresgestores que outros, e isso se deve a umconjunto de fatores, como naturezadeliberativa, capital social, descentralizaçãoda política, conectividade da políticasetorial com programas de governo eestruturas de governança implantadas.

Vimos, no decorrer deste trabalho, queos Conselhos em Viçosa têm possibilitadoa democratização dos espaços públicos viainclusão de segmentos da sociedade,outrora excluídos da arena pública.

A escolha independente e democráticados membros não-governamentais dosConselhos revela a condição essencial parasua independência do Poder Executivo.Os Conselhos em Viçosa têm-se legiti-mado perante a sociedade e aos poderes

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instituídos como mecanismos inde-pendentes, não servindo de correias detransmissão das decisões do Executivo.

Contudo, a capacitação de conselheirosprecisa ser implementada, pois nem todosse encontram plenamente preparados parao exercício da função com a qualidadedesejada. Essa assimetria da qualificação éprejudicial para o interesse público, poisdesequilibra as discussões e negociações nointerior dos Conselhos, podendo desfigurarsua característica colegiada, colocando-os àmercê de prejuízos e riscos desnecessários.

O grau e a forma de governançaverificada na gestão de várias políticaspúblicas em Viçosa merecem destaque. Asredes sociais formadas por Conselhos,

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associações, cidadãos, organizações e insti-tuições públicas dão conta não apenas dasestruturas de governança, mas também donível de governabilidade e da efetividadeda accountability.

A realização deste balanço nospermitiu avaliar que o desempenho dosConselhos Gestores de Viçosa é bemsatisfatório. Para ratificarmos a presenteconclusão, fizemos ainda uma comparação,baseada nos mesmos critérios de avaliação,com Conselhos de várias cidades mineirasque compõem as sínteses dos relatórios defiscalização de municípios do Estado,realizadas pela CGU.

(Artigo recebido em maio de 2007. Versão finalem julho de 2008).

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Marcelo Feijó Martins, Simone Martins, Adriel Rodrigues de Oliveira e Jéferson Boechat Soares

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Resumo – Resumen – Abstract

Conselhos Municipais de Políticas Públicas: uma análise exploratóriaMarcelo Feijó Martins, Simone Martins, Adriel Rodrigues de Oliveira e Jéferson Boechat SoaresOs Conselhos Gestores são fóruns híbridos onde se viabiliza a participação popular no desenho

das políticas públicas, nas negociações de interesses da coletividade, na elaboração de programas eprojetos sociais e na fiscalização das ações governamentais. O significado e a dimensão dos Conselhospara a democracia participativa são enormes, justificando a importância da realização deste estudo,que se baseou na análise exploratória de 12 Conselhos locais do município mineiro de Viçosa, como objetivo de avaliar o desempenho dos mesmos. A avaliação do desempenho levou em considera-ção os mesmos parâmetros dimensionais, tanto para a coleta de dados primários quanto para acoleta secundária. A coleta de dados primários foi realizada a partir da aplicação de questionáriossemi-estruturados aos presidentes dos Conselhos em análise. Utilizou-se o programa SPSS, versão15.0, para análise estatística das questões objetivas dos questionários e a técnica de análise de conteúdopara exame das questões abertas. Após essa etapa, realizou-se um workshop com os presidentes dosConselhos, visando à obtenção de novos dados e informações. Os Conselhos municipais analisadosapresentaram resultados pouco discrepantes entre a teoria aplicada ao tema e a sua efetiva prática nocampo público. Contudo, a pesquisa revelou que o grau de desenvolvimento institucional dosConselhos não é homogêneo, ou seja, há alguns melhores gestores que outros. A escolhaindependente e democrática dos membros não-governamentais dos Conselhos em Viçosa revelouo seu grau de independência do Poder Executivo. Porém, a capacitação de conselheiros precisa serimplementada para evitar uma desfiguração dos Conselhos. No que tange à governança, destacou-se em Viçosa o seu grau e formas de aplicabilidade observadas na gestão de várias políticas. Damesma forma, foi observado um nível de governabilidade que confere legitimidade às políticasimplementadas. Por fim, verificou-se que a efetividade da accountability societal tem sidoinstrumentalizada pelos Conselhos no âmbito das diversas políticas setoriais. Já os dados secun-dários da análise foram obtidos por meio das sínteses dos relatórios de fiscalização de municípiosdo Estado de Minas Gerais, realizadas pela Controladoria Geral da União. Foram identificadostodos os registros pertinentes aos Conselhos Gestores Municipais do Estado de Minas Gerais, noperíodo de 2003 a 2006. Verificou-se que os maiores problemas se referem aos Conselhos Municipaisde Saúde e Assistência Social. Entre as inúmeras falhas apontadas, destacam-se problemas graves naconstituição e operacionalização dos Conselhos, resultando na inoperância desses mecanismos nosmunicípios fiscalizados. A avaliação do desempenho dos Conselhos locais de Viçosa possibilitouconcluir que esses mecanismos apresentaram um desempenho bem satisfatório na gestão e controledas políticas públicas no município.

Palavras-chave: Conselhos Gestores; Governança; Governabilidade

Consejos municipales de políticas públicasMarcelo Feijó Martins, Simone Martins, Adriel Rodrigues de Oliveira y Jéferson Boechat SoaresLos consejos gestores son foros híbridos donde se viabiliza la participación popular en: el

dibujo de políticas públicas, en las negociaciones que interesan a la colectividad, en la elaboración deprogramas y proyectos sociales, y en la fiscalización de las acciones de gobierno. El significado y laimportancia de los consejos es muy grande para la democracia participativa, lo cual justifica la realizaciónde este trabajo que se basó en el análisis de 12 consejos municipales del município de Viçosa enMinas Gerais. El referido trabajo calificó el desempeño de los consejos. La evaluación de desempeñollevó en cuenta los mismos parámetros dimensionales para recoger los datos primários y secundários.La recogida de datos primários fue realizada aplicando cuestionarios semi estructurados a los

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Conselhos Municipais de Políticas Públicas: uma análise exploratória

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presidentes de los consejos. Fue usado el programa SPSS, versión 15.0 para el análisis estatístico delas preguntas directas del cuestionario, y la técnica de análisis de contenido para el análisis de laspreguntas “ abiertas”. Después de esa etapa se hizo un “ workshop” con los presidentes de losconsejos para obtener nuevos datos e informaciones. Los consejos municipales evaluados mostraronresultados semejantes entre la teoria y la práctica. Aun así la investigación mostró que el desarrolloinstitucional de los consejos no es homogéneo, o sea, hay consejos que son mejores gestores queotros. La elección democrática e independiente de los representantes no gubernamentales de losconsejos de Viçosa mostró la independencia de estos ante el poder ejecutivo. Apesar de esto, esnecesário que los consejeros sean entrenados para evitar la desfiguración de los consejos. En lo quese refiere a la gobernanza, se ha destacado en Viçosa la aplicabilidad de esta en la gestión de diferentespolíticas. También se há observado una gobernabilidad que dá legitimación a las políticas públicas.Por último se ha verificado que la efectividad del accountability societal se ha llevado a cabo en losconsejos en el ámbito de políticas sectoriales. Los datos secundários del análisis se obtuvieron por lasíntesis de informes de fiscalización de los municipios del estado de Minas Gerais hechos por la“Controladoria Geral da União”. Fueron identificados todos los registros que se refieren a losconsejos gestores municipales del estado de Minas Gerais en los años de 2003 a 2006. Se ha verificadoque los más grandes problemas son los consejos municipales de salud y de asistencia social. Entrelos errores señalados se destacan los problemas en la formación y funcionamiento de los consejos,lo que resulta en el no-funcionamiento de esos consejos en los municípios fiscalizados. La evaluaciónde desempeño de los consejos de Viçosa concluyó que estos tienen um buen desempeño en lagestión y en el control de las políticas públicas en el municipio.

Palabras clave: consejos gestores, gobernanza, gobernabilidad

Municipal Councils for Public Policies: an exploratory analysisMarcelo Feijó Martins, Simone Martins, Adriel Rodrigues de Oliveira and Jéferson Boechat SoaresManagement Councils are hybrid forums where popular participants get involved with the

design of public policies, with negotiations of collective interests, with the elaboration of programsand social projects, and with the supervision of governmental actions. The meaning and dimensionof Councils to participatory democracy are enormous, justifying the importance of this study, basedon an exploratory analysis of 12 local Councils on the municipality of Viçosa (in Minas Gerais state,Brazil). The goal is to evaluate the performance of these Councils. The performance evaluation tookinto consideration the same dimensional parameters, to both collecting primary data and to secondarydata. Primary data collection was through the application of semi-structured questionnaires, toCouncil presidents of the Councils under research. Program SPSS was used (version 15.0) to thestatistical analyses of the multiple-choice questions, and the technique of content analyses was usedto the open questions. After this phase, a workshop took place with the Council presidents, aimingat obtaining new data and information. The Municipal Councils researched showed results withlittle discrepancies between the theory applied to the issue and the effective practice in the publicarena. However, research showed a not-homogeneous institutional development levels councils.That is, there are councils which are better than others. The independent and democratic choice ofCouncil non-governmental members revealed its independence level from the Executive Brach. Inspite of that, it is necessary to capacitate the counselors in order to avoid the disfiguration of thecouncils. As to governance, Viçosa highlighted the degree and forms of applicability observed in themanagement of several policies. Similarly, a level of governability was observed, which conferslegitimacy to the policies implemented. It was in the end verified that the effectiveness of societalaccountability has been used by Councils in the arena of several sector-specific policies. As for thesecondary data of analyses, they were obtained through a synthesis of supervisory reports by theGeneral Controlling Office, on the Minas Gerais State’s municipalities. All records related to municipal

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councils were identified, in Minas Gerais state from the year 2003 to the year 2006. The mainproblems refer to the municipal councils on health and social assistance. Among the many faultsappointed, the gravest problems are in the constitution and operational routines of councils, resultingon the non-function of these mechanisms in the supervised municipalities. The performanceevaluation of Viçosa local councils led to the conclusion that those mechanisms present a reasonablegood performance for management and control of public policies in the municipality.

Key words: Management councils, governance, governability

Marcelo Feijó MartinsGraduado e Mestrando em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Viçosa (UFV).Contato: [email protected]

Simone MartinsProfessora Assistente da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Graduada emCiências Contábeis na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Mestre em Administração pela Universi-dade Federal de Viçosa (UFV)Contato: simonemartins_yahoo.com.br

Adriel Rodrigues de OliveiraDoutor em Administração pela Universidade de São Paulo. Professor Adjunto do Departamento de Adminis-tração da Universidade Federal de Viçosa (UFV).Contato: [email protected]

Jéferson Boechat SoaresDoutor em Sociologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor Adjunto do Departamento deEconomia da Universidade Federal de Viçosa (UFV).Contato: [email protected]

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Imagem gerada a partir de foto in www.mds.gov.br

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Letícia Mendonça

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Transformandoburocracias para financiar os

mais pobres: a evolução doPronaf Crédito Grupo B

Letícia Mendonça

Introdução

Instituições financeiras, públicas ou privadas, não oferecem, tradicional-

mente, serviços financeiros, principalmente crédito aos pobres. Essa aversão

está relacionada aos riscos envolvidos nas operações, à falta de garantias, aos

custos considerados elevados para a elaboração de contratos e projetos, às

dificuldades de monitoramento e gestão das operações. No entanto, o crédito

produtivo tem sido considerado um instrumento importante para a redução da

pobreza, à medida que aumenta a liquidez financeira das famílias, propicia o

capital indispensável para investimentos que podem aumentar a produção e

reduzir riscos e, de certa forma, impulsiona a inserção dos produtores em

mercados.

Considerando-se verdadeira a rigidez do sistema financeiro em trabalhar

com os grupos mais descapitalizados, a criação do Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), dentro da institucionalidade

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do Sistema Nacional de Crédito Rural(SNCR), é por si só um grande desafio.Com seus parâmetros e instrumentosbaseados em um modelo de agriculturamonocultora e de grande porte, diferen-ciado, portanto, das realidades da agricul-tura familiar, a iniciativa de criação doPronaf, segundo o arcabouço legaldo SNCR, faz com que deixe de ser apenasum programa de governo para assumir acondição de uma política pública deEstado, que apóia o desenvolvimentoprodutivo de famílias do campo de maisbaixa renda.

Fundamentando-se na experiência de10 anos de criação do Pronaf pode-seafirmar que, no âmbito dos seus gestorese implementadores, a construção e oaperfeiçoamento dessa política públicapodem ser resumidos à difícil tarefa debuscar uma situação de recorrente equilí-brio entre o fim público, social e econô-mico do Programa e as lógicas de merca-do das diferentes instituições financeirasque operam o crédito rural no País (bancospúblicos comerciais e de investimento,bancos privados e cooperativas de crédito).

Mais concretamente, o aperfeiçoa-mento do Pronaf ao longo desses anos sedá por uma permanente dinâmica em prolde alterações normativas e adequação dearranjos operacionais com o objetivo degarantir acesso da agricultura familiar, emespecial, dos mais pobres, ao créditoprodutivo rural, sem que isso signifiqueabrir mão de agentes financeiros públicose privados e de um aparato institucionaltípico da burocracia de Estado que regulao crédito rural no País. Se, por vezes, odesenho do SNCR se apresenta bastanteestreito e pouco flexível para os finspretendidos pelo Pronaf, por outras é umaconquista importante, sob vários aspectos(garantia de fontes de recursos, agentes

operadores definidos com obrigatoriedadede aplicação, instituições normativasestabelecidas em lei) indispensável para oalcance e a continuidade do Programaenquanto uma política pública instituídapelos instrumentos de Estado.

Mais especificamente, no que condiz àcriação e ao aperfeiçoamento da linha demicrocrédito rural Pronaf Grupo B, focodeste artigo, o desafio é ainda maior. Emuma analogia, a criação dessa espécie de“inovação”, quase considerada como“ousadia”, situa o Pronaf no arcabouçolegal rígido que estrutura o crédito ruralno Brasil. Operacionalmente, o aperfei-çoamento dessa linha de crédito exigeadaptações sucessivas e cumulativas emuma estrutura maior e mais pesada comoa do SNCR. Substituir a obrigatoriedadedo projeto técnico pela adoção daproposta simplificada, instituir ou não osConselhos Municipais e Estaduais deDesenvolvimento Rural Sustentável(CMDRS e CEDRS)1 – como mediadoresobrigatórios do acesso ao crédito –,assumir os riscos das operações ou trans-feri-las aos agentes financeiros, isentar osbancos das garantias ou deixá-las de livrenegociação entre as partes são questõessurgidas durante o processo de construçãodo Pronaf Grupo B. E todas vão sendoenfrentadas, com seus ônus e bônus, aolongo da concretização de uma políticapública de microcrédito produtivo quealcance as famílias mais pobres da agricul-tura familiar do meio rural brasileiro e, aomesmo tempo, não abra mão de ser reco-nhecida pelos instrumentos que estruturame regulam o crédito rural no País.

Em face do exposto, este artigo temcomo objetivo central apresentar o desen-volvimento institucional do MicrocréditoProdutivo Rural Pronaf Grupo B, de suacriação, em 2000, até o momento atual.

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Espera-se, com isso, recuperar a visão dessalinha de crédito enquanto política públicaem processo de aperfeiçoamento,trazendo, assim, elementos que permitamqualificar e situar melhor a discussão sobreos avanços desde a sua criação, além deidentificar os atuais pontos de fragilidade.Pela forma como vai-se redesenhando,para onde caminha o microcréditoprodutivo Grupo B? O que foi perdido eo que se ganhou nessa trajetória? Quais sãoos desafios atuais e quais os pontos jásuperados? Em suma, espera-se que estetrabalho possa trazer a visão de como oPronaf Grupo B está sendo construído evem-se desenvolvendo como políticapública de microcrédito rural no aparatoestatal. Essa construção institucional doPronaf Grupo B adquire especial impor-tância, pois, longe de ser um meroemaranhado de normas que findam em simesmas, a institucionalidade reflete-se naponta, potencializando e limitandocomportamentos dos agentes operadorese das famílias agricultoras.

O presente artigo encontra-se estrutu-rado da seguinte forma. Na primeira parteé feito um breve resumo histórico doPronaf, enfatizando as mudanças ocorridasna política de crédito diante do progres-sivo reconhecimento, pelo Programa,da diversidade da agricultura familiar.Destaca-se também o papel dos Grupossegundo a lógica do Pronaf, mostra-seonde está situado o Pronaf Grupo B naestrutura maior, e como se dá a distribuiçãodessas famílias agricultoras nas cinco regiõesdo País. Em seguida, faz-se um resgate doprocesso de criação da linha de créditoPronaf B, sua evolução nos normativos dopróprio Pronaf e a gradual transformação,ainda em curso, numa linha de microcréditoprodutivo orientado por meio do ProgramaAgroamigo, desenvolvido em parceria com

o Banco do Nordeste. Na terceira parte sãoapresentados dados sobre o desempenhodo crédito Grupo B, como número deoperações e montantes aplicados por Planode Safra. Por fim, são discutidas as liçõesaprendidas nessa trajetória, bem comopontuados os desafios a serem enfrentadospelo Pronaf Grupo B, para que este possacontribuir na promoção da geração de rendae de maior qualidade de vida às famílias debaixa renda do meio rural.

Vale destacar que o objetivo defornecer um referencial descritivo de cadapasso e da mudança institucional exigidapara avançar com a linha Pronaf GrupoB junto ao público mais descapitalizadode agricultores familiares foi auxiliar acaminhada de outros formuladores depolíticas públicas que buscam soluções paraa operacionalização em maior escala deações de microcrédito produtivo. Soluções

“Longe de ser ummero emaranhado denormas que findamem si mesmas, ainstitucionalidadereflete-se na ponta,potencializando elimitandocomportamentos dosagentes operadores edas famíliasagricultoras.”

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essas que envolvem, geralmente, discussõessobre riscos, garantias, agentes operadorese metodologia de oferta de crédito. Aosque optarem por uma leitura com menosdetalhes, a última parte do artigo buscasistematizar a trajetória de implantação doPronaf Grupo B, identificar tendências,aprendizados consolidados com relação aalguns temas e também pontuar diretrizespara futuros avanços.

Diversidade da agriculturafamiliar no Brasil, o Pronaf e opúblico do Grupo B

Como resultado das mobilizações dosagricultores familiares no II Grito da TerraBrasil2, o Pronaf Crédito nasceu um poucoantes de o Pronaf surgir como programa,na safra 1995/1996, por meio da Reso-lução no 2.191 do Conselho MonetárioNacional (CMN), de agosto de 1995. Naépoca, o crédito Pronaf resumia-se a umalinha única de financiamento com duasmodalidades: custeio e investimento. Apartir de então, pelo menos o segmentomais capitalizado da agricultura familiarcomeçava a contar com crédito rural parafinanciar suas atividades produtivas. Partesignificativa dos estabelecimentos familiaresrurais, por sua vez, continuava excluída doacesso ao crédito.

O Pronaf tem sido apontado comoum marco na história das políticas públicaspara o campo, pois, pela primeira vez,houve tanto um reconhecimento por partedo Estado da especificidade da agriculturafamiliar3 quanto a implementação de umconjunto coerente de medidas para apoiara atividade produtiva e o desenvolvimentodessas famílias.

Na sua criação em 1996, por meio doDecreto Presidencial no 1.946, e comoresultado de inúmeras mobilizações sociais

desde 19924, definiu-se como objetivo doPronaf “estimular o desenvolvimento ruraltendo como fundamento o fortalecimentoda agricultura familiar como segmentogerador de emprego e renda, de modo aestabelecer um padrão de desenvolvimentosustentável que vise ao alcance de níveis desatisfação e bem-estar de agricultores econsumidores, no que se refere às questõeseconômicas, sociais e ambientais, de formaa produzir um novo modelo agrícolanacional.” (MAA, 1996). Apesar de outrasações5 terem sido promovidas naqueleperíodo, o Pronaf Crédito sempre foi alinha de atuação do Programa que sedesenvolveu mais rapidamente e, conse-qüentemente, tornou-se a mais visível aopúblico em geral.

Em 1997 ocorrem mudanças signifi-cativas no sentido de maior diversificaçãodas políticas de crédito e de inclusão denovos segmentos da agricultura familiar.Uma greve de fome do Movimento dosPequenos Agricultores do Rio Grande doSul resultou no Pronaf Especial, linha decusteio destinada aos agricultoresfamiliares de menor renda, a qual contavacom subsídios na forma de desconto emvalor fixo no pagamento em dia. Atual-mente essa linha é conhecida como PronafGrupo C. Teve início, assim, noPronaf Crédito, um processo de diferen-ciação das linhas de crédito, de reconhe-cimento da diversidade do público daagricultura familiar e da necessidadede construção de diferentes modalidadesde financiamento e de distribuição desubsídios como forma de efetivamentealcançar as famílias produtivas do meiorural, de mais baixa renda.

A criação dos vários Grupos doCrédito Pronaf surgiu em 1999. No planotécnico, essa segmentação se apoiou emuma série de estudos no âmbito do Projeto

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de Cooperação Técnica da Organizaçãodas Nações Unidas para a Agricultura e aAlimentação (FAO)/Instituto Nacional deColonização e Reforma Agrária (Incra),alguns dos quais tomaram por base osdados do Censo Agropecuário 1995/1996. Esses trabalhos identificaram4,1 milhões de estabelecimentos familiaresno País e expuseram a diversidade dessesempreendimentos em relação ao tamanhoda propriedade, à tecnologia empregadae à renda. Apontaram ainda a existênciade distribuição diferenciada no meio ruralbrasileiro, destacando-se a concentração deuma agricultura familiar mais capitalizadae estruturada nas regiões Sul e Sudeste, bemcomo uma agricultura descapitalizada epróxima aos níveis de pobreza nas regiõesNorte e Nordeste do País.

Reconhecida e mensurada a diversi-dade de situações vivenciadas pela agricul-tura familiar no Brasil, os Grupos doCrédito Pronaf foram criados comoforma de garantir tratamento diferenciadoaos diferentes, tanto na canalização dossubsídios quanto na composição dos riscosdas operações.

Os Grupos têm como critério defi-nidor o nível de renda familiar bruta anual6e, assim, a cada nível são oferecidascondições de financiamento diferenciadas7.(prazos, juros, limites, descontos poradimplência). Dessa forma, os subsídiosno crédito são distribuídos inversamente aonível de renda, para que as famílias maispobres possam receber condições definanciamento mais favoráveis. Com isso,os Grupos de renda mais elevada acessamo crédito Pronaf apenas nas condiçõespróximas ao crédito rural da agriculturade maior escala.

Uma engenharia também específicarelacionada aos Grupos se dá com o riscodas operações. Nos Grupos de mais baixa

renda (Grupos A, A/C e B), o risco dasoperações não é bancário, mas sim doTesouro Nacional8. À medida que essasfamílias vão construindo uma relação como sistema financeiro, justamente por meiodas operações Pronaf anteriores sem risco,se capitalizam e passam mais facilmentepara os Grupos com risco bancário,acessando maiores valores e inserindo-seautonomamente no mercado de créditorural. Assumir os riscos das operaçõesiniciais sem dispensar a relação com oagente financeiro é uma estratégia impor-tante do crédito Pronaf. Ao mesmotempo que permite, de modo imediato,empréstimos para as famílias de maisbaixa renda e alcança a pobreza,gradativamente, com a construção de umhistórico de experiências positivas dessaordem, possibilita a superação da“assimetria de informação” típicade situações de exclusão social e insere nosistema financeiro uma outra percepçãosobre as possibilidades de negócios comesse público.

Toda a lógica do crédito segmentadoem Grupos do Pronaf consiste, portanto,em fazer com que as famílias enquadradasnos Grupos de mais baixa renda possam, apartir do acesso ao financiamento e suainversão produtiva, elevar os rendimentos e,conseqüentemente, ascender a um Grupomais capitalizado. Neste Grupo, ainda quepercam em subsídios, via taxas de juros oudescontos de adimplência, terão comoestímulo a possibilidade de acessar umvolume maior de recursos e ainda, em maiorou menor proporção para alguns segmentos,de utilizar outros produtos ofertados pelosagentes financeiros, que passam a ver partedesse público como cliente.

Até a safra 2006/2007, o Pronafconstituía-se de seis Grupos com as carac-terísticas resumidas no quadro a seguir.

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A caracterização geral de agriculturafamiliar e a estratificação em Grupos estãoinstitucionalmente determinadas em reso-luções do Conselho Monetário Nacional(CMN). Essas resoluções também esta-belecem a Declaração de Aptidão aoPronaf (DAP), um documento que classi-fica as famílias como agricultoras, enqua-drando-as nos Grupos do Pronaf. A DAPconstitui instrumento obrigatório paraacesso ao crédito Pronaf, sendo norma-tizada por meio de portaria ministerial eemitida por instituições governamentais enão-governamentais credenciadas peloMinistério do Desenvolvimento Agrário(MDA), em sua maioria sindicatos, movi-mentos rurais9 e empresas de assistênciatécnica. A participação da sociedade civilorganizada no processo de identificaçãodo público do Programa garante maiorlegitimidade, controle e comprometimentosocial da operacionalização do crédito.

Embora na atual segmentação docrédito Pronaf o Grupo B representeapenas uma das seis classificaçõespossíveis, é o grupo ao qual pertence amaior parte dos estabelecimentos fami-liares rurais do País. A Secretaria da Agri-cultura Familiar do Ministério do Desen-volvimento Agrário (SAF/MDA), em199910, realizou a estimativa do públicodo Pronaf B, a partir dos dados dosestudos FAO/Incra. Segundo essas infor-mações, as famílias do Grupo B repre-sentariam cerca de 50% do total deestabelecimentos da agricultura familiardo País, ou seja, um montante próximo adois milhões. Além disso, os dados reve-laram que esse contingente estava presenteem todas as regiões, porém com umaconcentração expressiva em torno de75% na Região Nordeste (Tabela 1).

Considerando-se a expressividadedo público do Grupo B no total de

Quadro 1: Grupos do Pronaf e características de enquadramento Safra 2006/2007

Tabela 1: Estabelecimentos Pronaf B por região do País

Fonte: FAO/INCRA

Região Grupo B

Norte 133.740Nordeste 1.499.537Sul 165.091Sudeste 198.382Centro-Oeste 39.931Total 2.036.681

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estabelecimentos familiares e a situação depobreza e fragilidade social inerente a essasfamílias, torna-se fundamental e estratégicaa necessidade de construção, no âmbito doPronaf, de normas e procedimentosespecíficos para assegurar a esse público oefetivo acesso ao crédito e, ao mesmotempo, estimular o interesse dos diversosagentes operadores da política (bancos,assistência técnica, sindicatos e movimentos)na promoção de ações inclusivas para essasfamílias. A criação do Pronaf Grupo B eo seu desenvolvimento na estruturanormativa do Pronaf, na qual atualmenteconstitui uma seção específica, é o que seráabordado no próximo tópico.

Criação do Pronaf B e oaperfeiçoamento dos normativosao longo dos Planos de Safra

Desde sua criação, o Pronaf Grupo Btem passado por mudanças e aperfeiçoa-mentos significativos em quase todos osPlanos de Safra11. No Anexo 1 há umquadro resumo detalhado sobre a evoluçãodos normativos, das regras de operacio-nalização, das fontes de recursos e dosagentes financeiros operadores do PronafGrupo B em cada Plano de Safra. A seguir,descrevemos e comentamos os princípios,os objetivos e o impacto mais imediatode algumas dessas mudanças.

Da safra 2000/2001 à safra 2002/2003: a criação e consolidação dalinha de crédito Pronaf Grupo B noNordeste

O crédito Pronaf Grupo B surgiu em10 de agosto de 2000, por meio daResolução no 2.766 do Conselho Mone-tário Nacional (CMN), no bojo de umadiscussão interministerial sobre a criaçãode ações não assistencialistas voltadas às

famílias rurais de baixa renda da RegiãoNordeste. Em seu primeiro ano, na safra2000/2001, a linha de investimento tinhaum valor máximo de empréstimo daordem de R$ 500, com juros de 1% aoano e bônus de adimplência de 40% sobrecada parcela paga em dia, sendo destinadaa famílias com renda bruta anual de atéR$ 1,5 mil.

O princípio contido nesse bônus, quesuscita acalorados debates até hoje, era nãoapenas estimular a adimplência, mastambém realizar uma transferência de rendaa essas famílias que empregam bem ofinanciamento. Transferência essa que, nocaso do Pronaf Grupo B, tem comocondicionalidade o emprego dos recursosem uma atividade produtiva, ou seja, arenda transferida pelo bônus se transformaem ativos de produção. Além disso, obônus tornava o crédito de mais fácil

“... torna-sefundamental eestratégica anecessidade deconstrução, no âmbitodo Pronaf, de normas eprocedimentosespecíficos paraassegurar a essepúblico o efetivo acessoao crédito.”

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pagamento. Diante dessa constatação,estimulava o acesso de famílias que jamaishaviam obtido qualquer financiamento eque receavam endividar-se com o banco.

Buscando estimular a ascensão entreos Grupos, havia também a lógica delimitar o número de operações do GrupoB em apenas três. Assim, após esse teto deoperações, a família teria que contar comum incremento de renda que lhe permitissealcançar as linhas de crédito do Grupo C.Posteriormente, como se verá mais à frente,esse entendimento teria de ser revisto emface de uma realidade mais complexa eobstáculos de emancipação de caráter maisestrutural, tal qual a questão fundiária.

Um outro ponto que merece destaqueé a discussão do risco bancário das ope-rações. Por se tratar de um público sujeitoa vulnerabilidades características da situaçãode pobreza e da qual os agentes financeirosnão possuem qualquer informação decomportamento bancário, o risco dasoperações do Pronaf Grupo B é assumidopelo Tesouro Nacional e não pelo agentefinanceiro operador. Essa tem sido, atéhoje, a única forma para estimular osbancos a trabalharem com esse público.Como a lógica do Pronaf é de que asfamílias possam se capitalizar e alcançarGrupos mais elevados (C, D, E), onde orisco das contratações já compete ao banco,a principal função das operações doGrupo B é criar uma relação entre asfamílias e o agente financeiro capaz defacilitar a posterior inserção em tais Grupos.Em outras palavras, espera-se que àmedida que as famílias agricultoras realizemas operações do Pronaf B, passem a serconhecidas do agente financeiro, conquis-tando confiança para crédito de maioresvalores e já com o risco bancário. Contor-na-se assim o problema de “assimetria deinformação”, fazendo com que a transição

dessas famílias para os Grupos C, D e Ese torne uma conseqüência natural dohistórico de adimplência das contrataçõesanteriores, do Pronaf B.

Para a implantação da linha PronafGrupo B foi organizada, em Recife, uma“Oficina de Parceiros”, envolvendo movi-mentos sociais, Banco do Nordeste,Ministério do Desenvolvimento Agrário,Conselhos Municipais de DesenvolvimentoRural Sustentável, empresas estaduais deAssistência Técnica e Secretários executivosdo Pronaf12. Como resultados dessetrabalho surgiram o Manual de Operaçõesde Crédito do Programa Nacional deFortalecimento da Agricultura Familiar(Pronaf Grupo B) e a portaria decredenciamento das instituições para aemissão da Declaração de Aptidão aoPronaf. O Manual Operacional estabeleciao formulário simplificado de “Propostade Crédito”, que futuramente alimentariaum banco de dados para avaliação dasaplicações ocorridas. Pela portaria minis-terial foram atribuídos aos ConselhosMunicipais de Desenvolvimento RuralSustentável (CMDRS) ou ao ConselhoEstadual de Desenvolvimento RuralSustentável (CEDRS) a análise e o encami-nhamento das propostas de crédito doPronaf Grupo B para os bancos.

Definidos os instrumentos de opera-cionalização, o Banco do Nordeste foi oúnico agente financeiro que se interessou,na época, em atuar com a linha. Ascontratações para obtenção do créditocomeçaram a ocorrer em outubro de200013. Um intenso processo de mobili-zação, envolvendo reuniões em váriosEstados e uma forte integração entreFederações de Trabalhadores da Agricul-tura (Fetag), empresas estaduais de Assis-tência Técnica, secretários executivosestaduais do Pronaf e Superintendências

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do Banco do Nordeste garantiu, ainda noano de 2000, a contratação de 48.222operações. Na safra 2000/2001, o períodofoi fechado com 52.442 contratos eR$ 26.076.576,96 aplicados.

A safra 2001/2002 marca um momen-to de consolidação da linha. MuitosCMDRS foram criados e, nesse ambiente,as contratações quase triplicaram, passandopara 154.481 e um total de R$ 77.110.900,13financiados. No Manual de Crédito Rural(MCR), duas únicas alterações ocorreram.O prazo de reembolso da linha foi redu-zido, passando de dois anos, com um anode carência, para um ano, com seis mesesde carência, estimulando-se, dessa forma,um retorno mais rápido dos recursos. Passaa constar também no normativo a auto-rização para utilização de propostasimplificada de crédito em substituição aoprojeto técnico mais complexo e obriga-tório pelo próprio MCR nas demaisoperações de crédito rural.

A safra 2002/2003 retorna com oprazo de dois anos para pagamento do cré-dito, com um ano de carência, e formaliza,no próprio MCR, a obrigatoriedade daparticipação do processo de operacio-nalização do crédito aos Conselhos Muni-cipais de Desenvolvimento Rural Sustentável(CMDRS) ou, no caso desses não existirem,aos Conselhos Estaduais de Desenvolvi-mento Rural Sustentável (CEDRS). A partirde então, tornava-se uma exigência nãoapenas ministerial, mas do normativo docrédito rural e sujeita à fiscalização do BancoCentral , encaminhar à análise do CMDRStodas as propostas do Pronaf Grupo B.Somente após cumprida essa etapa, eramencaminhadas ao agente financeiro paracontratação.

Até a safra 2002/2003 a ampliação docrédito Grupo B estava condicionada aoincremento do número de CMDRS, pois,

na prática, o CEDRS não conseguiafuncionar como seu substituto. Além disso,o prazo de encaminhamento das propostasaté a contratação durava meses devido àexigência da reunião do Conselho, que sóse realizava quando se acumulava umnúmero significativo de propostas.

As aplicações na safra 2002/2003registram, portanto, um leve declínio dequase 15 mil contratos e cerca de R$ 7,2milhões, em comparação à safra anterior.O número de operações passa para 139.760e o valor fica em R$ 69.838.802,76. Por trásdessa queda, pode-se especular algunsfatores, tais como operações em prazo decarência, impossibilitando o acesso damesma família ao crédito, e dificuldadesburocráticas de acesso das famílias doGrupo B, ainda mais empobrecidas;eleições, que no final de 2002 influenciaramas discussões nos Conselhos Municipais; ouaté mesmo a mudança na forma de atuaçãodo MDA, priorizando o fomento e a capa-citação de conselhos de âmbito territorial.

Safra 2003/2004: desburocratizaçãodo acesso, o “boom” das contrataçõese a chegada do Pronaf Grupo B àRegião Norte

Importantes mudanças ocorrem comos normativos do Plano de Safra 2003/2004, determinadas pela priorização doPronaf pelo novo governo. No que serefere ao Grupo B, a renda de enquadra-mento passou de R$ 1,5 mil paraR$ 2 mil, e o limite de financiamentodobrou de valor, passando de R$ 500 paraR$ 1 mil. Era consenso que o valor anteriormuito reduzido do Pronaf B limitavaas possibilidades de aplicação da linha e,dessa forma, inviabilizava inversões quepudessem ter maior impacto na estruturaprodutiva das famílias. O valor do bônusde adimplência também sofreu alterações:

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reduziu-se em termos percentuais, de 40%para 25%, mas em termos absolutos passoude um valor máximo de até R$ 200 paraaté R$ 250.

A safra 2003/2004 tentou avançarsobre o problema da falta de interesse daAssistência Técnica e Extensão Rural(ATER), pública e privada, em trabalharcom o público do Grupo B. Por contadisso foi inserida a possibilidade de finan-ciamento da assistência técnica no própriocrédito. Até 3% do valor financiado passavaa ter a possibilidade de destinação aopagamento de serviços de ATER. Assim,o bônus de adimplência que, em termosabsolutos, passara a alcançar maior valor,funcionaria como um mecanismo indiretode financiamento estatal dos serviços deATER para essas famílias de baixa renda.Uma ferramenta de controle social dasprestadoras de serviço de ATER foitambém instituída. Por meio da Portariada Secretaria da Agricultura Familiar (SAF)atribuiu-se ao CEDRS a competência paracredenciar, descredenciar e monitorar asempresas prestadoras.

A queda no número de contrataçõesna safra 2002/2003 e as crescentes recla-mações por parte das representações dosmovimentos rurais quanto ao excesso deburocracia na operacionalização da linhalevou à criação de um Grupo de Trabalhopara desburocratização do crédito PronafB, no segundo semestre de 2003.Reuniram-se representantes do Ministériodo Desenvolvimento Agrário, Ministérioda Fazenda e Banco do Nordeste parapropor soluções aos principais entraves doacesso ao crédito. Algumas medidas desimplificação exigiam apenas mudanças deprocedimentos internos do banco, outrasprecisariam passar pela aprovaçãodo Conselho Monetário Nacional. Oresultado desse trabalho foi a publicação

da Resolução no 3.150 do CMN, emnovembro de 2003.

Nessa resolução foram quatro ospontos tratados. O primeiro deles foi aautorização aos agentes financeiros paraisentar as operações do Grupo B degarantia de terceiros, passando a sersuficiente a garantia pessoal do tomadorde crédito. Sendo o Tesouro Nacional oresponsável pelo risco da operação, aexigência de garantias das operações doGrupo B tornara-se, na prática, uma meraformalidade. Embora houvesse algunscasos raros de exigência de garantias reais,o aval era majoritariamente o instrumentomais utilizado. Contudo, esses avais emgeral eram feitos entre famílias que não seconheciam, ou ainda com desconhecimentodos mutuários sobre essa relação. Nãoserviam, portanto, para gerar comprometi-mento no bom emprego dos recursos, mastão somente um vínculo que, algumasvezes, resultava na inadimplência de apenasum dos envolvidos, o que colocava emsituação de dívida até mesmo os demaisque pagaram corretamente o seu crédito14.

Uma segunda mudança importantetrazida pela Resolução no 3.150 foi o fimda obrigatoriedade de mediação doCMDRS para encaminhamento daspropostas de crédito. Havia casos deconselhos “prefeiturizados”, em que ocrédito só saía para aqueles que fossemaliados dos grupos no poder. Além disso,alguns municípios não tinham acessoao crédito porque não dispunham deConselhos, os quais só podiam ser criadospor ato do poder municipal. A ausênciade CMDRS, por exemplo, era um dosfatores que impediam a expansão docrédito na Região Norte. Já nessa fase, oBanco da Amazônia e o Banco do Brasilmostravam-se dispostos a começar aoperar a linha. A inexistência de Conselhos

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em algumas regiões do País constituía umfator limitante.

A terceira mudança instituída pelaResolução no 3.150 recaiu sobre o papelda Declaração de Aptidão ao Pronaf(DAP). Esta passa a ser consideradainstrumento suficiente de comprovação darelação da família agricultora com a terra.Antes dessa medida, a exigência de títulode propriedade ou contrato de arrenda-mento formalizado em cartório excluía doacesso ao crédito um número significativode famílias de baixa renda.

Finalmente, a quarta mudança promo-vida pelo Grupo de simplificação facili-tava o acesso das famílias aos recursosfinanciados. Nas operações do PronafGrupo B estava dispensada a apresentaçãodos comprovantes relativos aos bensadquiridos, exceto quando referentes amáquinas, equipamentos, embarcações eveículos financiados nas modalidades decrédito grupal ou coletivo, de valorsuperior a R$ 5 mil. A exigência da entregados comprovantes fazia com que asfamílias assumissem um custo de transaçãoelevado, ao terem que enfrentar os gastosdo deslocamento até as agências.

As medidas de simplificação tiveramefeitos imediatos no total das aplicações.As contratações dobraram, alcançando333.555 famílias atendidas. Um total deR$ 327.010.055,39 foi emprestado. A safra2003/2004 iniciava uma fase de massi-ficação do crédito Pronaf Grupo B.A desburocratização operacional da linhatinha gerado resultados e promovido oacesso de famílias de baixa renda ao créditorural. No âmbito do controle social, inicia-se o processo de emissão de DAP emmodelo eletrônico. As DAPs assimemitidas passam a ser encaminhadas parao site do Pronaf, facilitando a consulta porparte da sociedade.

Tais iniciativas tornaram a operacio-nalização do Grupo B menos onerosa emais simples ao agente financeiro. Emmaio de 2004, o Banco da Amazôniacomeça a operar na Região Norte, e aindana safra 2003/2004 são realizadas 14.535operações, representando R$ 14.448.365,00em recursos aplicados. O Banco do Brasil,por sua vez, realiza algumas operações-teste, operando regularmente apenas emagosto de 2004, já na safra 2004/2005.

Safra 2004/2005: novas fontes derecursos e a expansão do Pronaf Bpara todas as regiões do País

Com o sucesso da simplificação dasregras de acesso ao crédito e agentesfinanceiros dando início às operações, osrecursos do Tesouro Nacional mostravam-se ainda insuficientes para as novasdemandas. A safra 2004/2005 vai,

“Havia casosde conselhos‘prefeiturizados’, emque o crédito só saíapara aqueles quefossem aliados dosgrupos no poder.Além disso, algunsmunicípios não tinhamacesso ao créditoporque não dispunhamde Conselhos, os quaissó podiam ser criadospor ato do podermunicipal.”

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portanto, buscar novas fontes para atenderao incremento da procura. Essas novasfontes de financiamento, porém, teriam quecontinuar a isentar os agentes financeirosdo risco bancário.

Em agosto de 2004, após nego-ciações com os ministérios da Fazenda eda Integração – este último, devido a suaresponsabilidade sobre os FundosConstitucionais de Financiamento15 – foipublicada a Medida Provisória no 20516,que atribuía o risco das operações doPronaf Grupo B não ao agente financeiro,mas ao Fundo Constitucional por eleoperado. Essa mudança legal fez com que,

na prática, fosse criado um funding para alinha em todas as regiões de FundosConstitucionais de Financiamento (Norte,Nordeste e Centro-Oeste), possibilitando,assim, que os recursos do TesouroNacional fossem destinados apenas àsregiões Sul e Sudeste, nas quais os Fundosnão operam.

Como demonstra a Tabela 2, a Leialcançou os resultados esperados, fazendocom que a participação dos recursos doTesouro Nacional no Pronaf B passassede 100% do valor aplicado para menosde 6% do montante na safra 2005/2006.Ao mesmo tempo, o total aplicado

tornava-se crescente e saltava de cerca deR$ 25 milhões, na época da criação dalinha, para, atualmente, mais de R$ 500milhões. Sem precisar arcar com o riscodas operações, os bancos tiveram maisestímulo para trabalhar com operações doGrupo B utilizando recursos dos FundosConstitucionais de Financiamento. EssesFundos, ao longo dos anos anteriores,tinham parte expressiva dos seus recursosnão aplicados em inversões produtivas e,por conseguinte, destinados a operaçõesdo mercado financeiro.

Vale destacar que, mesmo semcontinuar a responder pelos riscos das

operações do Grupo B, existe um estímuloa mais para um bom emprego dessesrecursos quando a fonte é um FundoConstitucional de Financiamento. Uma vezque os bancos gestores desses fundos(Banco do Brasil, Banco do Nordeste,Banco da Amazônia) recebem, a título deremuneração pela administração dosrecursos, um percentual fixo sobre opatrimônio líquido do Fundo, o mauemprego desses valores em aplicações deelevada inadimplência representa umadescapitalização dos Fundos, resultandona diminuição da remuneração auferidapelo banco.

Tabela 2: Pronaf Grupo B: fontes de financiamento em cada Plano de Safra

Fonte: SAF/MDA

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Com recursos sem riscos, garantidospela nova lei, o Banco da Amazônia e oBanco do Nordeste começaram a operaro Grupo B majoritariamente com recursosdos Fundos Constitucionais de Financia-mento. No caso do Banco do Brasil,divergências de interpretação da nova leifrente à Lei do Fundo Constitucional deFinanciamento do Centro-Oeste, ainda semsolução, fez com que a operacionalizaçãoda linha pelo Banco do Brasil se dessesomente em setembro de 2004 eintegralmente com os recursos do TesouroNacional. Com os três agentes operandoem todo o Brasil, ocorria assim a naciona-lização da linha de crédito Pronaf B.

Mudanças no Manual de Crédito Rural(MCR) também ocorreram para o GrupoB na safra 2004/2005. A composição darenda de enquadramento deixava de exigira obrigatoriedade de que fosse provenienteintegralmente das atividades desenvolvidasno estabelecimento rural. De uma rendabruta anual de enquadramento de atéR$ 2 mil, apenas 30% teriam que necessa-riamente provir de atividades rurais agrí-colas ou não agrícolas do estabelecimentorural; o restante poderia ter origem emoutras ocupações. Tratava-se de umamedida de maior adequação dosnormativos à realidade das estratégias desobrevivência dessas famílias, as quaisobtêm parte de sua renda da venda demão-de-obra a terceiros ou pelo desenvol-vimento de atividades temporárias fora domeio rural.

Uma alteração no MCR foi a forma-lização da garantia pessoal como suficientepara operações do Grupo B. Instituída emcaráter sugestivo e autorizativo pelaResolução no 3.150, torna-se obrigatóriano Plano de Safra 2004/2005. Uma outramodificação operacional importante foi adispensa da dupla assinatura (sindicato e

empresa de ATER) para acesso à DAP doGrupo B. Essas famílias não precisavammais arcar com os custos de duas assina-turas de instituições distintas para ter a DAPvalidada. Simplificava-se assim o acesso àDAP para esse Grupo17.

Com mais recursos, novos agentesoperadores em todo o Brasil e algunsavanços no MCR, as aplicações do PronafGrupo B na safra 2004/2005 continuarama crescer. Foram 358.456 contratos reali-zados e R$ 358.593.958,49 em montanteaplicado. Com o aumento expressivo dopúblico atendido pela linha, as propostasde mudanças para aperfeiçoamento docrédito do Grupo B começaram a mudarde enfoque. Passa-se a considerar não tantoa maneira como expandir o acesso aocrédito, mas, principalmente, como quali-ficar e potencializar o emprego dessesrecursos.

Nessa direção, em novembro de 2004foi assinado um Termo de CooperaçãoTécnica entre o Ministério do Desenvolvi-mento Agrário e o Banco do Nordestedo Brasil. O objetivo do termo era desen-volver uma nova metodologia de aplicaçãodo crédito Pronaf Grupo B: começava anascer o Agroamigo e a primeira expe-riência de transformação do PronafGrupo B em uma linha de microcréditoprodutivo orientado.

Safra 2005/2006: O Pronaf Grupo Benquanto microcrédito produtivo rural ea experiência do Agroamigo

As mudanças nos normativos na safra2005/2006 são fortemente influenciadaspelo novo Projeto BNB e MDA. Foicriada uma seção específica para o PronafGrupo B, integrada ao capítulo do Pronafno MCR, e suas regras foram agrupadasem um só trecho, não ficando maisdispersas ao longo das várias seções do

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Pronaf. Adicionalmente, pela primeiravez, a linha de crédito Pronaf B passa aser referida no MCR também pelo termomicrocrédito produtivo rural, o quesinaliza uma importante mudança deconcepção. Vencida a barreira do excessode burocracia no acesso ao crédito, onovo desafio era garantir mais qualidadee assistência na aplicação dos recursos. Atransformação do Pronaf Grupo B emmicrocrédito produtivo orientado dá,portanto, importantes passos nessa safra.

Do ponto de vista teórico, o micro-crédito produtivo é a concessão deempréstimos de pequeno valor para ativi-dade produtiva em geral, realizado com ouso de metodologia específica. Já o créditoprodutivo orientado, segundo Manzon(2006), tem como principal característicao relacionamento capacitado, efetivo,freqüente entre a instituição de micro-crédito e o empreendedor, por meio dafigura do agente de crédito. As infor-mações derivadas dessa interlocuçãodevem subsidiar ainda a decisão sobre ovalor e as condições do empréstimo,aumentando progressivamente os recursosemprestados a cada operação.

A norma anterior do Pronaf B,contudo, criava limitações a esse mecanismomais flexível de aplicação de gestão dosrecursos que caracteriza o microcrédito.Em especial, a regra antiga limitava onúmero de operações em três e fixava umvalor máximo de R$ 1 mil para cada umadelas. Diante dessas regras, havia um estí-mulo para que as operações fossem reali-zadas sempre no teto, o que garantiria oacesso ao valor máximo de R$ 3 mil aofinal dos três financiamentos permitidos.A nova forma de acesso, introduzida peloPlano de Safra 2004/2005, incentivava oacesso ao crédito B em valores menores ede acordo com as reais necessidades das

famílias. Foi mantido o limite máximo deR$ 3 mil a ser acessado por família, emboraa forma de dispor desse limite não sejamais de três operações, mas quantas foremnecessárias até alcançar esse teto.

Para evitar que o resultado dessasmudanças fossem operações únicas deR$ 3 mil, fixou-se em R$ 1 mil um valormáximo por operação. A partir disso, umafamília do Grupo B poderia se valerdo microcrédito produtivo rural de atéR$ 3 mil sem limites no número deoperações e de formas muito variadas, porexemplo, em duas operações de R$ 250,duas de R$ 500 e uma de R$ 1 mil.

Foi ajustado, ainda, de R$ 5 mil paraR$ 10 mil o valor abaixo do qual sedispensava a apresentação ao agentefinanceiro de comprovantes relativos aosbens adquiridos. Essa mudança tinhaimpacto para as operações contratadas deforma coletiva ou grupal, quando essesmontantes eram facilmente alcançados.

Um passo significativo nessa etapa debusca de mais qualidade na aplicação dosrecursos deu-se com a implantação doprojeto de microcrédito rural orientadojunto ao BNB, pelo qual o banco passou aofertar a linha Pronaf Grupo B a partir deassessores de crédito especialmentetreinados e recrutados para esse trabalho.Essa nova metodologia de operaciona-lização do Grupo B tornou-se uma açãoespecífica no banco, recebendo o nomede Programa Agroamigo. Ainda que nemtodas as operações contratadas tenhamsido feitas segundo a metodologia, osassessores treinados e dedicados exclu-sivamente à operacionalização da linhajá provocaram um novo crescimentoexpressivo das contratações do PronafGrupo B nesse período. A safra 2005/2006 registrou 553.555 operações ealcançou o valor de R$ 555.347.460,85

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aplicados, sendo que cerca de 95% dessevalor foi aplicado pelo Banco do Nordeste.

O Banco do Nordeste já possuía umaexperiência exitosa de microcrédito urbanodenominada Crediamigo. O desafio doAgroamigo seria adaptar essa metodologiapara o meio rural onde, além de ser maiora dispersão geográfica dos clientes, o cicloprodutivo das atividades agrícolas é maislongo e, conseqüentemente, o giro dosrecursos. Somados ao risco de mercadoestão os riscos climáticos e de pragas, quecostumam atingir todo um povoado(PARENTE, 2002).

O Programa Agroamigo

O Agroamigo, programa de microcré-dito rural desenvolvido pelo Banco doNordeste em parceria com o MDA e aGTZ, tem como objetivo principalexpandir o atendimento a agricultores demais baixa renda, mediante a concessão demicrocrédito produtivo e orientado. Asprincipais inovações em relação ao trabalhodesenvolvido com o grupo B são:

• Atendimento integral ao cliente porum profissional especializado: o assessorde crédito rural;

• Estudo prévio do mercado a seratendido, com mapeamento de mercadoe estruturação da demanda;

• Orientação e atendimento ao clienteem sua localidade, possibilitando o acessoágil e simplificado ao crédito: busca-sea concessão de crédito em no máximo setedias após o início do processo decontratação;

• Acompanhamento sistemático docliente e do crédito, com contratação decréditos seqüenciais e gradativos, possibi-litando a identificação das dificuldades enecessidades de outros serviços financeirose bancários.

O Agroamigo adota a metodologiautilizada pelo Programa Crediamigo,programa de microcrédito produtivodesenvolvido pelo Banco do Nordeste naárea urbana, com as devidas adaptaçõespara o setor rural. Por meio de uma Or-ganização da Sociedade Civil de InteressePúblico (Oscip), o Instituto NordesteCidadania, que atua na mesma área deabrangência do banco, são adotados osseguintes procedimentos:

• Os assessores de microcrédito ruralexecutam as atividades de concessão decrédito, envolvendo a elaboração decadastro de clientes, elaboração daspropostas, proposta de crédito simpli-ficada, acompanhamento e renovação docrédito;

• As atividades decorrentes do pro-cesso de concessão do crédito – deferi-mento, cadastramento, contabilização eoutros serviços de retaguarda – são deresponsabilidade da Agência do BNB.

O assessor de crédito é um técnicoagrícola (ou outra formação afim) oriundoda área onde vai atuar e que recebe treina-mento específico necessário para trabalharno Programa. Esse profissional realizaum mapeamento dos agricultores de baixarenda de sua área de trabalho, promovepalestras informativas, realiza levantamentossocioeconômico e de mercado, orienta aelaboração de planos de negócios, criandouma relação de proximidade com os agri-cultores familiares que atende. Atualmenteexistem 350 assessores contratados.

A coordenação da execução das ativi-dades desenvolvidas pelo assessor demicrocrédito rural é atribuição do gerentede Suporte a Negócios, com destaque paraas seguintes atividades:

• Selecionar, em conjunto com osassessores de microcrédito rural, os muni-cípios priorizados para atuação;

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• Administrar o provimento decondições logísticas para o trabalho dosassessores: computadores, mesas, telefone,material de expediente, entre outros;

• Acompanhar as rotinas internas doprocesso de contratação das propostasencaminhadas pelos assessores de micro-crédito rural, possibilitando agilidade nacontratação;

• Realizar acompanhamento da produ-tividade da carteira de clientes do assessorde microcrédito rural;

• Participar da elaboração de roteiromensal de deslocamento do assessor demicrocrédito rural no atendimento aosclientes;

• Acompanhar a execução das ativi-dades realizadas pelo assessor de micro-crédito rural, mantendo o InstitutoNordeste Cidadania constantementeinformado de qualquer dificuldade ouproblema na execução das tarefas.

Até julho de 2006, o Agroamigo járespondia por 23% das operações doPronaf B realizadas e já estava implantadoem cerca de 29% dos municípios da áreade atuação do Banco. Ao final de 2007,esperava-se que todas as operações doPronaf B junto ao Banco do Nordeste jáse realizassem sob a metodologia doAgroamigo.

O crescimento do número deoperações da linha de microcréditotambém impôs a necessidade de melhoriasnos processos de gerenciamento dasaplicações pelo próprio ministério. Paratanto, na safra 2005/2006, o MCR estabe-leceu que a linha de crédito do Grupo Bdo Pronaf seria operacionalizada pelosagentes financeiros, em comum acordocom a Secretaria de Agricultura Familiardo Ministério do DesenvolvimentoAgrário (SAF/MDA). Dessa forma, foiassegurado respaldo legal para a SAF obter

com os agentes financeiros operadoresmelhor acesso às informações dasaplicações da linha.

Safra 2006/2007: ampliação daspossibilidades de um microcréditoprodutivo orientado e início daintegração com outros programasfederais

A safra 2006/2007 trouxe em seusnormativos mais mudanças. A renda deenquadramento para o Grupo B, fixadaem R$ 2 mil, desde a safra 2003/2004, foireajustada para R$ 3 mil. A idéia é quehouvesse maior aproximação dessa faixade renda com a utilizada por outrosimportantes programas federais decombate à pobreza18. Nesse período,todos os demais Grupos do Pronafpassam também por reajustes em suasrendas de enquadramento.

O valor máximo por operação fixadodesde a safra 2003/2004 foi novamenteapontado como insuficiente para aplicaçõesprodutivas de efeitos mais estruturantes,passando de R$ 1 mil para R$ 1,5 mil.Constatado que questões estruturais e desolução de mais longo prazo, tal qual aconcentração fundiária, impediam aascensão de algumas famílias do Grupo Bpara o Grupo C, mesmo após ter sidoutilizado todo o limite de financiamento,o microcrédito produtivo Grupo B passoua não ter um teto máximo. Dessa forma,as famílias do Grupo B passaram a terdireito a pleitear financiamento pela linhasempre que necessário, sem limite denúmero de operações, desde que cada umadelas não ultrapasse R$ 1,5 mil.

O bônus de adimplência, por sua vez,ficou restrito ao valor acumulado de atéR$ 4 mil. A família que acessar o Pronaf Bapós já ter financiado esse valor perde odireito ao bônus, mas continua acessando

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a linha. Dessa maneira, o crédito Grupo Bnão exclui mais famílias que alcancem umteto de financiamento, porém, a partir dedeterminado valor, retira o instrumento detransferência de renda implícito no bônus,estimulando essas mesmas famílias abuscarem inversões produtivas capazes degerar mais renda.

Outra mudança na safra 2006/2007foi a maior flexibilização na aplicação dosrecursos. Muitas vezes as famílias de baixarenda, em razão de uma seca, umaepidemia ou outra situação adversa, vêem-se obrigadas a mudar os planos deaplicação do crédito. Em vez de adqui-rirem a vaca, como estava inicialmenteproposto, investem em dois porcos. OMCR possibilitou que a proposta decrédito inclua uma lista de atividades nasquais as famílias poderiam investir osrecursos. Evita-se, assim, que algumaoperação do microcrédito Grupo B quetenha tido os recursos empregados deforma produtiva, e por vezes mais eficientedo que o estipulado inicialmente naproposta de crédito, seja considerada irre-gular ou que se exija a formalização deaditivo ao contrato.

Para que as famílias tenham ciência dodireito aos serviços de ATER para os quaissão destinados 3% do valor financiado,introduziu-se, por meio do MCR, aobrigatoriedade de que o percentual deATER incluído na proposta somente sejafinanciado caso haja concordância explícitados tomadores do crédito.

Duas tentativas de articulações comoutras políticas públicas foram realizadasna safra 2006/2007 e incluídas nosnormativos. A primeira é uma integraçãocom o Programa Nacional de Biodiesel.O microcrédito produtivo rural Grupo B,que sempre fora uma linha de investimento,passou a ser utilizado para financiamento

de custeio da mamona, desde que essasfamílias sigam o zoneamento agrícola eestejam integradas com empresas doPrograma Nacional de Biodiesel.

Uma segunda tentativa de articulaçãodo crédito Grupo B se deu com oPrograma Nacional de MicrocréditoProdutivo Orientado (PNMPO), insti-tuído pela Lei no 11.110, de 2005. Foiautorizado pelo Manual de Crédito Ruralque, na operacionalização dos financia-mentos do microcrédito produtivo ruralorientado, os agentes financeiros, nainteração com o público alvo, pudessematuar por mandato, por intermédio deOrganizações da Sociedade Civil deInteresse Público (Oscip) e de coopera-tivas singulares de crédito com seusassessores de crédito. Essa medida buscouestimular que outros agentes financeiros,além do Banco do Nordeste, que já atuadessa forma com o Agroamigo, desen-volvam parcerias com Oscips e coopera-tivas de crédito para a aplicação do PronafGrupo B, a partir de uma metodologiade crédito orientado.

O Pronaf Grupo B em números

Desde sua criação, as contratações doPronaf Grupo B cresceram quase conti-nuamente a cada ano agrícola (Tabela 3).A partir da safra 2003/2004 alcançou-seum novo patamar de contratações, saindodos cerca de 150 mil para mais de 300 milcontratos, representando um crescimentosuperior a 100%. Uma nova expansão deoperações se deu na última safra. Forammais de 550 mil contratos de PronafGrupo B em todo o Brasil no ano agrícolade 2005/2006, com 95% deles concen-trados no Nordeste.

Desde a criação do Pronaf Grupo B,mais de 1,5 milhão de contratos foram

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firmados, envolvendo R$ 1,4 bilhão. Masainda há um grande número de famíliasque poderiam ser incluídas no crédito,considerando-se que o total de estabele-cimentos com famílias do Grupo B,estimados com base no Estudo FAO/Incrado Censo Agropecuário de 1995/1996,ultrapassava o contingente de dois milhõesde famílias, dois terços destas na RegiãoNordeste.

Como mostra a Tabela 4, para a safra2005/2006, o Banco do Nordeste continuousendo o principal aplicador da linha. Osnúmeros atestam ainda como é bastantetímida a participação do Banco da Amazôniae do Banco do Brasil no total das aplicações.

Ainda assim, todas as regiões regis-traram operações na safra 2005/2006(Tabela 5). Depois do Nordeste, o maiornúmero de contratos estava na Região

Sudeste, especialmente em Minas Gerais,onde tanto o Banco do Brasil quanto oBanco do Nordeste atuam19. Já as regiõesCentro-Oeste e Sul registraram os maisbaixos desempenhos, com uma coberturaestimada de apenas 1% dos estabeleci-mentos Grupo B potenciais.

A ampliação das fontes de recursos doPronaf Grupo B foi fundamental paragarantir a expansão das contratações eatender ao forte crescimento da demandapor esse crédito, após o processo de simpli-ficação do acesso e o início da operação deoutros agentes financeiros. Como mostra aTabela 6, o crescimento das contrataçõesdo Banco do Nordeste somente é possívelcom o maior comprometimento derecursos do Fundo Constitucional deFinanciamento do Nordeste (FNE) comesse crédito. Atualmente, o FNE é a

Bancos Contratos Valor Financiado % contratos % ValorBASA 6.691 R$ 7.318.881,88 1,21% 1,32%BB 20.874 R$ 20.682.212,26 3,77% 3,72%BNB 525.990 R$ 527.346.366,71 95,02% 94,96%Total 553.555 R$ 555.347.460,85 100,00% 100,00%

Tabela 4: Participação dos Bancos nas aplicações – Safra 2005/2006

Fonte: SAF/MDA

Fonte: SAF/MDA

Tabela 3: Aplicações do Pronaf Grupo B por Plano de Safra

Safras Contratos Valor financiado2000/2001 52.442 R$ 26.076.567,962001/2002 154.481 R$ 77.110.900,132002/2003 139.760 R$ 69.838.802,762003/2004 333.555 R$ 327.010.055,392004/2005 358.456 R$ 358.593.958,492005/2006 553.555 R$ 555.347.460,85

Total 1.592.249 R$ 1.413.977.745,57

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principal fonte de recursos do PronafGrupo B, representando 94% dos recursosaplicados na última safra. A participaçãodo Fundo Constitucional de Financiamentodo Norte (FNO) ainda é muito tímida,respondendo por menos de 1% dosrecursos aplicados. Já os recursos doTesouro Nacional, que antes represen-tavam 100% do valor financiado, signifi-caram, na safra 2005/2006, apenas 6% dototal aplicado. Adicionalmente, o MDAcontinua buscando uma solução para oinício da operacionalização da linha comos recursos do Fundo Constitucional deFinanciamento do Centro Oeste (FCO).

O Pronaf Grupo B: liçõesaprendidas e novos desafios

O microcrédito produtivo tem sidoconsiderado um importante instrumentopara a redução da pobreza. Criado em

2000, o crédito Grupo B do Pronaf nasceuda necessidade de se buscar trabalhar deforma diferenciada com a agriculturafamiliar de mais baixa renda do meio rural,a qual se estimava em torno de dois milhõesde estabelecimentos, metade destesconcentrados no Nordeste.

Inicialmente com pouco mais de 50mil operações na safra 2000/2001, essalinha alcançou, na safra 2005/2006, umacumulado de cerca de 1,6 mil contratos eR$ 1,4 bilhão em empréstimos, configu-rando, assim, o maior programa demicrocrédito produtivo rural do País.

Alcançar o público de mais baixa rendado campo, por meio de um programa cujoarranjo institucional se insere no SistemaNacional de Crédito Rural (SNCR), é umaopção que resulta em ganhos e perdas.Integrada ao SNCR, qualquer alteraçãomínima de regras está sujeita a umaformalização e a recorrentes negociações via

Tabela 5: Participação das regiões nas aplicações do Pronaf Grupo B –Safra 2005/2006

* Cobertura, calculada pela divisão do número de contratos na safra 2005/2006 pelo total de estabelecimentosestimados com base no Estudo FAO/Incra.

Tabela 6: Participação de cada fonte do Pronaf Grupo na safra 2005/2006

Fonte: SAF/MDA

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Conselho Monetário Nacional, despen-dendo pelo menos um mês para seraprovada. Adicionalmente, um crédito deR$ 1,5 mil sujeito a um mesmo normativoque rege valores acima de R$ 200 mil, comona agricultura de maior porte, exigeconstante esforço de adaptação e de criação,no Manual de Crédito Rural, de uma sériede procedimentos operacionais específicos,como proposta simplificada em vez deprojetos de crédito, garantia apenas pessoalsuficiente para alguns grupos, possibilidadede aplicação no rural não agrícola,fiscalização por amostragem, laudossimplificados, risco não bancário.

No SNCR, o Grupo B do Pronafintegra parte da política de crédito produ-tivo rural do País, deixando de ser apenasuma ação orçamentária executada poragências especiais de governo com baixacapilaridade. Conseqüentemente, passa apoder disputar as fontes asseguradas aocrédito rural – Fundos Constitucionais deFinanciamento, recursos orçamentários etc.– e, sobretudo, a dispor dos agentesfinanceiros públicos federais como prin-cipais operadores, que, presentes em quasetodos os municípios do Brasil, conferemmaior alcance e porte nacional ao Programa.

Ao longo dos sete anos de história doPronaf Grupo B, muitas foram asmudanças. Inicialmente a linha atuou apenasno Nordeste por empenho do BNB.Nesse período, a operacionalização docrédito incidiu sobre um forte movimentode mobilização da sociedade civil organi-zada, com participação obrigatória dosConselhos Municipais de DesenvolvimentoRural (CMDR), que deliberaram aspropostas apresentadas ao banco. As safras2000/2001 e 2001/2002 constituíram-seem períodos de grande aprendizado paratodos os envolvidos e evidenciaram maisfortemente os principais entraves advindos

de um modelo de operacionalização decrédito com as mesmas exigências buro-cráticas tanto para o financiamento de umaproposta de R$ 1 mil quanto para umfinanciamento cerca de 100 vezes maior.

Assim, a terceira Safra do PronafGrupo B elegeu o combate à excessivaburocratização do acesso ao crédito comoalvo de atuação, iniciando um processo desimplificação das exigências ao tomador– garantias, títulos de propriedade,comprovantes de aplicação –, o qual incluiuainda a desobrigação da participação dosCMDR, sendo este entendido comoentrave para alcançar outras regiões do Paísonde não haviam sido formados. Todasessas alterações geraram resultados, ascontratações bateram recorde na safra2003/2004 e os custos da aplicação dalinha foram reduzidos, encorajando o inícioda aplicação do Pronaf Grupo B peloBanco da Amazônia e, conseqüentemente,a participação das famílias de baixa rendada Região Norte do País.

Maior facilidade de acesso e possibi-lidade de atuação em todo o meio ruralbrasileiro, com a introdução do Grupo Bna carteira do Banco do Brasil, resultouem contratações crescentes e, por conse-guinte, em pressão por mais recursos parafinanciamento. A safra 2004/2005 assumiucomo principal desafio a busca de novasfontes de recursos. Estas, por sua vez,teriam que dispor de característicasespeciais, como manter a isenção do riscobancário, condição até então fundamentalpara contar com a participação dos bancospúblicos federais na aplicação da linha. Asolução foi encontrada por meio da parti-cipação dos Fundos Constitucionais deFinanciamento, que passaram a constituira principal fonte de recursos da linha,diminuindo a utilização dos recursosorçamentários para essa função.

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Desburocatizado o acesso, conquistadasnovas fontes e novos agentes operadores, asafra 2005/2006 iniciou uma novaabordagem no aperfeiçoamento do PronafGrupo B. Tratou-se, então, de pensar nodesenvolvimento de metodologia específicade oferta desse crédito, capaz de trans-formá-lo de crédito “micro” em “micro-crédito”. As mudanças nas regras de acessoobjetivam conferir maior flexibilidade eadaptabilidade dos valores financiados àsreais necessidades do tomador. Uma expe-riência de oferta orientada dessemicrocrédito tem início no Banco doNordeste, sendo intitulada de Agroamigo.

A safra 2006/2007 dá continuidade aessa transformação do crédito PronafGrupo B em microcrédito rural assistido.Convênios da SAF com empresasestaduais de ATER, no âmbito da políticanacional de ATER, exigem a prestação deserviços junto a esse público comocontrapartida para recebimento de recursos.A parceria com o BNB é reforçada,esperando-se, ao final de 2007, que todasas operações de Grupo B do Pronafpossam ser realizadas segundo a novametodologia. Consolidada a operaciona-lização do Grupo B pelo Agroamigo, aperspectiva de médio prazo indica queesses assessores comecem a atuar com oGrupo C, facilitando, assim, a transição dasfamílias agricultoras entre os dois Grupos.Além disso, busca-se maior articulação dalinha de crédito com outros programas quetêm esse público como alvo, tal qual oPrograma Nacional de Biodiesel e oPrograma Bolsa-Família, iniciando-se, dessamaneira, um esforço de articulação epotencialização de políticas públicas.

Observa-se, então, que a construção deuma política pública de microcrédito produ-tivo para as famílias de mais baixa renda nomeio rural é possível e tem acontecido em

etapas. Ao longo dessa trajetória, nem todosos passos são passíveis de avaliação comprofundidade, mas alguns aprendizadosdessa experiência já poderiam ser sistema-tizados para servir de reflexão à construçãoe ao aprimoramento de outras políticaspúblicas. Diante disso, merecem destaquequatro pontos:

1) Operar microcrédito rural, noâmbito do SNCR, assegura um maiorporte (bancos operando em todo o País)e institucionalidade ao Programa (inseridona política de crédito rural do País econtando, portanto, com uma base legalconsolidada), que deve ser equilibrado comconstantes adaptações do normativo àsespecificidades do público de mais baixarenda;

2) Trabalhar com os grupos maisdescapitalizados de agricultores exigecondições diferenciadas de financiamento(juros, valores, composição do risco) ealgum nível de subsídio capaz de encorajara tomada de financiamento por famíliasque nunca tomaram empréstimos e semotivam com a possibilidade de cumprir,com facilidade, o seu pagamento, oumesmo pela opção de rápida capitalizaçãode sua atividade produtiva por meio dedescontos iniciais no pagamento dasparcelas em dia;

3) Fazer com que agentes financeiros– os quais privilegiam majoritariamente aótica econômica nos critérios de concessãode financiamento – trabalhem com umgrupo da população excluída do sistemafinanceiro bancário exige uma engenhariade risco específica. Isentar os agentesfinanceiros do risco das operações comos Grupos de mais baixa renda, quandoesses primeiros não dispõem demetodologia de acesso não bancário àinformação sobre esse público, tem-semostrado a única forma de fazê-los operar

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a linha de crédito e, ao mesmo tempo,iniciar uma relação desse público com oagente financeiro, permitindo, assim, umainserção posterior em linhas de risco ban-cário;

4) Asseguradas fontes de financia-mento e avançada a simplificação doacesso ao crédito, a metodologia de ofertapassa a ser o elemento fundamental paraque o Pronaf Grupo B seja mais bemaplicado e a relação famílias e agentesfinanceiros fortalecida. A experiência como Agroamigo do BNB tem mostrado que,com orientação, as possibilidades de apli-cação dos recursos se ampliam (atividadesnão agrícolas passam a ser financiadas), otempo das contratações e renovaçõesdiminui, a inadimplência cai, novas famíliassão incluídas, e as possibilidades deascensão ao Pronaf C aumentam.

Em suma, os desafios de transformara linha de crédito Pronaf Grupo B em uminstrumento de microcrédito produtivoorientado capaz de auxiliar no combate àpobreza rural ainda são muitos, e a estra-tégia para superá-los exige etapas. As dificul-

dades, contudo, têm sido vencidas passo apasso. Em um esforço de eleger apenas doisfocos principais de atuação para o PronafGrupo B nas próximas safras, merecem sercitados a expansão das experiências de ofertado crédito de forma orientada e o aperfei-çoamento dos mecanismos de monito-ramento e avaliação da linha. Nesse sentido,diversas conversas foram iniciadas recen-temente com o Banco da Amazônia emprol de uma proposta de nova metodologiade aplicação, e, junto ao Banco do Brasil,atestam-se avanços por meio da metodo-logia do Desenvolvimento Regional Susten-tável (DRS). No campo da melhoria dosinstrumentos de gestão da linha, pode-sedestacar o aperfeiçoamento das trocas deinformações da SAF/MDA com os agentesfinanceiros, assim como o investimento emestudos específicos com informações maisaprofundadas sobre o funcionamento e oimpacto da linha Pronaf Grupo B juntoaos tomadores do crédito. A caminhadacontinua.

(Artigo recebido em novembro de 2008. Versãofinal em junho de 2008).

Notas

1 Instituídos pelo Decreto no 3.508, de junho de 2000, eram condição obrigatória para o recebi-mento dos recursos do Pronaf Infra-Estrutura, repassados aos municípios para construção deobras que promovessem o desenvolvimento rural da localidade. Não se constituíam operações decrédito rural, mas convênios com prefeituras operacionalizados via Caixa Econômica Federal.Atualmente, o que era até então conhecido como Pronaf Infra-Estrutura foi reformulado e atuadentro de uma abordagem de desenvolvimento territorial, estando a cargo da Secretaria de Desenvol-vimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário.

2 Manifestação Nacional coordenada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricul-tura (Contag) e pelo Departamento Nacional dos Trabalhadores Rurais da Central Única dos Traba-lhadores (DNTR/CUT) existente até os dias de hoje e que, anualmente, no mês de maio, é realizadaem Brasília, na Esplanada dos Ministérios. Nessa ocasião são apresentadas, por esse segmento dasociedade civil organizada, as demandas de melhorias nas políticas públicas da agricultura familiarpara a safra seguinte. Adicionalmente, também no primeiro semestre de cada ano, outros movimentos

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da sociedade civil organizada do meio rural apresentam ao Governo, por meio de intensa mobilizaçãona capital federal, suas pautas para próxima safra.

3 Vale lembrar que mesmo o Pronaf tendo sido criado em 1996, somente em 2006, por meio daLei no 11.326, definiu-se o conceito de agricultura familiar e a necessidade de formulação de políticaspúblicas específicas voltadas para esse público.

4 Especial destaque nessa fase deve ser dado a Confederação Nacional dos Trabalhadores naAgricultura (Contag) e ao Departamento Nacional dos Trabalhadores Rurais da Central Única dosTrabalhadores (DNTR-CUT).

5 Em sua concepção original, de 1996, o Pronaf desenvolvia quatro linhas de ação: 1) negociaçãode políticas públicas com órgãos setoriais; 2) financiamento da infra-estrutura e serviços nos muni-cípios; 3) financiamento da produção da agricultura familiar; 4) capacitação e profissionalização deagricultores familiares e suas famílias. Atualmente novas linhas de ação foram adicionadas e outrasredefinidas.

6 Entende-se como renda bruta aquela obtida no ano agrícola anterior, sem os descontos doscustos de produção. Também não é computado, para fins de cálculo de renda de enquadramento, osproventos vinculados a benefícios previdenciários decorrentes de atividades rurais, nem tão pouco astransferências diretas de renda tal qual o Bolsa-Família.

7 Importante mencionar que, no conceito de agricultura familiar empregado para fins deoperacionalização do crédito Pronaf, é comum a todos os Grupos o cumprimento de um conjuntode características gerais: 1) explorar parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário,parceiro ou concessionário do Plano Nacional de Reforma Agrária; 2) residir na propriedade ou emlocal próximo; 3) não dispor, a qualquer título, de área superior a 4 (quatro) módulos fiscais,quantificados segundo a legislação em vigor; 4) ter o trabalho familiar como predominante naexploração do estabelecimento, podendo manter até 2 (dois) empregados permanentes, admitidaainda a eventual ajuda de terceiros, quando a natureza sazonal da atividade o exigir.

8 A partir da safra 2004/2005 os Fundos Constitucionais de Financiamento, quando funcionamcomo fonte para operações com esses grupos, também assumem o risco dessas aplicações, isentan-do os bancos gestores desses fundos do risco.

9 Entre as instituições ligadas aos movimentos rurais atualmente credenciados para emissão deDAP em vigor, estão a Associação Nacional dos Pequenos Agricultores (Anpa), Confederação Naci-onal dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e a Federação dos Trabalhadores na AgriculturaFamiliar (Fetraf).

10 Nessa época, para enquadramento no Grupo B era exigida renda bruta familiar anual de atéR$ 1.500 e não existia o Grupo E do Pronaf. Esses condicionantes da época, entretanto, nãotenderiam a gerar grandes distorções nas informações, constituindo-se o público do grupo B o maisexpressivo da agricultura familiar, especialmente do Nordeste.

11 No crédito agrícola não se trabalha com ano civil, mas sim com o período de safra agrícola, oqual compreende os 12 meses que vão desde a preparação da terra para o plantio até a colheita ecomercialização da produção das principais safras do País. No Brasil, a safra agrícola inicia-se em 1o dejulho de um ano e termina em 30 de junho do ano seguinte. É a partir de julho que se concentra amaior parte do plantio da Região Centro Sul, principal produtora agrícola do País. Anualmente, oMinistério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário lançam, separadamente, osseus Planos de Safra, compostos pelo conjunto de ações, entre elas as linhas de crédito rural, que sãodisponibilizadas pelo Governo para apoio da safra daquele ano. Em razão disso, as principaisalterações nos normativos de crédito são submetidas ao Conselho Monetário Nacional no primeirosemestre do ano.

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12 O Secretário Executivo Estadual do Pronaf era cargo criado e ocupado por pessoas doGoverno Estadual, normalmente vinculado à Secretaria de Agricultura do Estado. Esse secretáriodeveria trabalhar com políticas de desenvolvimento da agricultura familiar. Recebia apoio, inclusivena forma de recursos, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), para poder acompanhare articular as ações do Pronaf no Estado. Muitos Estados ainda mantêm o cargo de SecretárioExecutivo Estadual da Agricultura Familiar. Porém, com a criação das Delegacias Federais do MDAem 2003, estas passaram a ser a principal instância de articulação, monitoramento e coordenação dasações do Pronaf e do Ministério nos Estados.

13 No caso do Norte de Minas Gerais, onde também atua o BNB, as contratações só começarama ocorrer em dezembro de 2000.

14 Essa situação está sendo agora resolvida pela Resolução no 3.405, de 2006, que permite aliberação dos avalistas das operações do Grupo B contratadas até dezembro de 2005.

15 A Constituição Federal de 1988 destinou 3% do produto da arrecadação dos impostos sobrerenda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados para aplicação em progra-mas de financiamento aos setores produtivos das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, criando-se assim os Fundos Constitucionais de Financiamento do Norte (FNO), do Nordeste (FNE) e doCentro-Oeste (FCO), geridos, respectivamente, pelo Banco da Amazônia, Banco do Nordeste eBanco do Brasil.

16 A MP no 205 foi posteriormente convertida na Lei no 11.011.17 Essa foi uma mudança que ocorreu para todos os demais Grupos do Pronaf já na safra 2003/2004.18 No Bolsa Família, por exemplo, a renda máxima familiar permitida na época era de R$ 100,00

per capita mensal, o que em uma família de 4 pessoas significaria algo próximo a R$ 5 mil anuais.Dado que os proventos de benefícios previdenciários rurais não contam para fins de cálculo de rendade enquadramento do Pronaf, mas sim para o caso do Bolsa Família, aceitou-se que o valor de R$ 3mil de renda bruta anual familiar pela metodologia de cálculo do Pronaf pudesse ser uma boaequivalência para a renda familiar anual de R$ 5 mil do Bolsa Família.

19 O BNB atua no Norte de Minas Gerais apenas, área de atuação da Adene – Agência deDesenvolvimento do Nordeste.

Referências bibliográficas

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Anexo

Descrição, para cada safra, das normas operacionais do Pronaf Grupo B e suasmudanças segundo critérios de enquadramento do(a) agricultor(a) familiar, condiçõesde financiamento, operacionalização, fonte de recursos e agente financeiro operador.

Safra 2000/2001

EnquadramentoRenda bruta familiar anual de R$ 1,5 mil proveniente do estabelecimento. Entende-

se como renda bruta aquela obtida no ano agrícola anterior, sem os descontos doscustos de produção. Também não é computado, para fins de cálculo de renda deenquadramento, os proventos vinculados a benefícios previdenciários decorrentes deatividades rurais.

Condições de financiamentoLimite: R$ 500,00 em até 3 operações.Juros: 1% a.aBenefício: bônus de adimplência de 40% sobre cada parcela da dívida paga até a data

de seu vencimento.Prazo: até 2 anos, até 1 ano de carência.Garantias: as do crédito rural, de livre negociação entre mutuário e agente financeiro.

OperacionalizaçãoDAP – Declaração de Aptidão do Pronaf, emitida e assinada, conjunta e obrigato-

riamente, pelo Sindicato e pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural –ATER.

Publicação de Portaria do Ministério do Desenvolvimento Agrário estabelecendomodelo de proposta simplificada de crédito e o manual de operacionalização do PronafGrupo B, o qual atribui aos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável(CMDRS) ou ao Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural (CEDRS), quandoaquele não existir, a atribuição de analisar e encaminhar ao agente financeiro as propos-tas de crédito do Grupo B.

Fonte de RecursosTesouro Nacional.

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste.

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Safra 2001/2002

EnquadramentoRenda bruta familiar anual de R$ 1,5 mil proveniente do estabelecimento. Entende-se

como renda bruta aquela obtida no ano agrícola anterior, sem os descontos dos custos deprodução. Também não é computado, para fins de cálculo de renda de enquadramento,os proventos vinculados a benefícios previdenciários decorrentes de atividades rurais.

Condições de financiamentoAlteração no prazo de reembolso: até 1 (um) ano, incluídos até 6 (seis) meses de carência,

podendo o reembolso estender-se em até dois anos, quando o cronograma da atividadeassim o exigir.

OperacionalizaçãoFormalização, dentro do manual de crédito rural (MCR), da substituição, no caso do

Pronaf B, do projeto técnico pela proposta de crédito simplificada, apresentada em formu-lário específico e padronizado, fornecido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Fonte de RecursosTesouro Nacional.

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste.

Safra 2002/2003

EnquadramentoRenda bruta familiar anual de R$ 1,5 mil proveniente do estabelecimento. Entende-se

como renda bruta aquela obtida no ano agrícola anterior, sem os descontos dos custos deprodução. Também não é computado, para fins de cálculo de renda de enquadramento,os proventos vinculados a benefícios previdenciários decorrentes de atividades rurais.

Condições de financiamentoRetorno ao prazo de até 2 anos com até 1 ano de carência.

OperacionalizaçãoFormalização, dentro do MCR, o mecanismo de gestão social na operacionalização

do crédito, estabelecendo-se que as propostas de crédito devem ser reunidas e encami-nhadas aos agentes financeiros pelo:

a) Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS).b) Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável (CEDRS), quando de

interesse de pescadores artesanais, remanescentes de quilombos e extrativistas, localiza-dos em municípios que ainda não dispõem do CMDRS.

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Fonte de RecursosTesouro Nacional.

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste.

Safra 2003/2004

EnquadramentoAmpliação do valor bruto anual familiar de enquadramento para R$ 2 mil.

Condições de financiamentoAmpliação do limite: R$ 1 mil e máximo de até 3 operações.Alteração do Benefício: bônus de adimplência de 25% sobre cada parcela

da dívida paga até a data de seu vencimento.Inclusão de percentual financiável de ATER: até 3% do valor do financiamento podem

ser destinados à remuneração de assistência técnica.

OperacionalizaçãoPortaria da SAF/MDA institui os CEDRS como credenciadores das empresas de

ATER para o Grupo B.

Fonte de RecursosTesouro Nacional.

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste, Banco da Amazônia (05/2004, após a aprovação das medidas

de simplificação).

Resolução no 3.150, de novembro de 2003 (medidas de simplificação doacesso)

EnquadramentoAmpliação do valor bruto anual familiar de enquadramento para R$ 2 mil.

Condições de financiamentoRespaldo legal aos agentes financeiros operadores no que concerne a Garantias, que

poderá ser apenas a garantia pessoal do proponente.

OperacionalizaçãoFim da obrigatoriedade de mediação dos Conselhos na operacionalização do crédito

mantendo-se o cadastramento da ATER no CEDRS. As propostas de crédito podem serencaminhadas ao agente financeiro sem passar, obrigatoriamente, pelo CEDRS ou CMDRS.

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DAP passa a ser instrumento suficiente para comprovar a relação do beneficiáriocom a terra e a atividade objeto de financiamento, não sendo mais exigido título depropriedade ou contrato de arrendamento registrado em cartório.

Desburocratização do acesso aos recursos com a dispensa de apresentação doscomprovantes relativos aos bens adquiridos, exceto quando referentes a máquinas, equi-pamentos, embarcações e veículos financiados nas modalidades de crédito grupal oucoletivo, de valor superior a R$ 5 mil, situação em que devem ser entregues ao finan-ciador no prazo de até 30 dias a contar da liberação.

Fonte de RecursosTesouro Nacional.

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste, Banco da Amazônia.

Safra 2004/2005

EnquadramentoMínimo de 30% da renda familiar bruta anual de enquadramento, oriunda da ex-

ploração agropecuária e não agropecuária do estabelecimento. Inclui-se assim famíliasque vendem sua mão de obra a terceiros ou desenvolvem atividades geradoras derenda fora do estabelecimento, como estratégia de sobrevivência.

Condições de financiamentoInstituição de que a garantia da operação deverá ser apenas a garantia pessoal do

proponente.

OperacionalizaçãoFacilidade de acesso à DAP e conseqüente diminuição dos custos de transação envol-

vidos na sua obtenção. A DAP do Grupo B exige apenas a assinatura da instituição emitente:sindicato ou empresas de ATER.

Em novembro de 2004 é assinado Termo de Cooperação Técnica entre o Ministériodo Desenvolvimento Agrário (MDA) e Banco do Nordeste do Brasil (BNB), paradesenvolvimento de nova metodologia de oferta de crédito: o Agroamigo.

Fonte de RecursosAmpliação das fontes de recursos, inclusão dos Fundos Constitucionais de

Financiamento (MP 205 de agosto de 2004, convertida na Lei 11.011).

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste, Banco da Amazônia, Banco do Brasil (09/2004).

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Transformando burocracias para financiar os mais pobres: a evolução do Pronaf Crédito Grupo B

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 187-220 Abr/Jun 2008

Safra 2005/2006

EnquadramentoMínimo de 30% da renda familiar bruta anual de enquadramento, oriunda

da exploração agropecuária e não agropecuária do estabelecimento. Inclui-se assimfamílias que vendem sua mão de obra a terceiros ou desenvolvem atividades geradorasde renda fora do estabelecimento, como estratégia de sobrevivência.

Condições de financiamentoÉ criada uma seção específica para o Pronaf Grupo B dentro do capítulo do

Pronaf no Manual de Crédito Rural. Pela primeira vez o Pronaf B passa a ser referidonos normativos como microcrédito produtivo rural.

Nova forma de acesso aos recursos fixa limite máximo a ser acessado por família,mas flexibiliza para além de 3 o número de operações que podem ser realizadas atéatingir esse teto.

Limites: até R$ 3 mil por família beneficiada, independente do número de operações,sendo que:

I) cada financiamento não pode ultrapassar o valor de R$ 1 mil;II) o segundo e demais financiamentos só podem ser realizados caso sejam quitados

os débitos dos financiamentos anteriores;III) o crédito deve ser liberado em parcelas, de acordo com o cronograma de

aplicação dos recursos, facultado ao agente financeiro, independentemente do referidocronograma, efetuar a liberação do crédito em parcela única, objetivando a racionali-zação do processo e a redução de custos para o mutuário.

Prazo: até 2 anos, sem fixação de prazos de carência.Ampliação das finalidades: financiamento das atividades agropecuárias e não-

agropecuárias desenvolvidas no estabelecimento rural ou em áreas comunitárias ruraispróximas, assim como implantação, ampliação ou modernização da infra-estruturade produção e serviços agropecuários e não-agropecuários, observadas as propostasou planos simples específicos, entendendo-se por prestação de serviços as atividadesnão-agropecuárias como, por exemplo, o turismo rural, produção de artesanato ououtras atividades que sejam compatíveis com o melhor emprego da mão-de-obrafamiliar no meio rural, podendo os créditos cobrir qualquer demanda que possagerar renda para a família atendida.

OperacionalizaçãoAmpliação dos valores dispensados para apresentação dos comprovantes relativos

aos bens adquiridos, exigido apenas quando referentes a máquinas, equipamentos,embarcações e veículos financiados nas modalidades de crédito grupal ou coletivo, devalor superior a R$ 10 mil, situação em que devem ser entregues ao financiador noprazo de até 30 dias a contar da liberação.

Instituição de capacidade de gestão e monitoramento do crédito estabelecendo-seque a linha de crédito do Grupo “B” do Pronaf será operacionalizada pelos agentes

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Letícia Mendonça

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 187-220 Abr/Jun 2008

financeiros em comum acordo com a Secretaria de Agricultura Familiar do Ministériodo Desenvolvimento Agrário, no que diz respeito ao estabelecimento de cotas estaduaisde distribuição de recursos, limites municipais de contratação, limites de taxas deinadimplência, para fins de suspensão das operações nos municípios e critérios pararetomada das operações, entre outros.

Fonte de RecursosAmpliação das fontes de recursos, inclusão dos Fundos Constitucionais de

Financiamento (MP no 205 de agosto de 2004, convertida na Lei no 11.011).

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste, Banco da Amazônia, Banco do Brasil (09/2004).

Safra 2006/2007

EnquadramentoElevação da renda familiar bruta anual de enquadramento para até R$ 3 mil.

Condições de financiamentoAmpliação das possibilidades de aplicação produtiva do Crédito.Finalidades: financiamento das atividades agropecuárias e não-agropecuárias desenvol-

vidas no estabelecimento rural ou em áreas comunitárias rurais próximas, assim comoimplantação, ampliação ou modernização da infra-estrutura de produção e serviçosagropecuários e não-agropecuários; observadas as propostas ou planos simples específicos,entendendo-se por prestação de serviços as atividades não-agropecuárias como, porexemplo, o turismo rural, produção de artesanato ou outras atividades que sejam com-patíveis com o melhor emprego da mão-de-obra familiar no meio rural, podendo oscréditos cobrir qualquer demanda que possa gerar renda para a família atendida, sendo:

I) permitida a sua utilização nas diversas atividades listadas na proposta simplificadade crédito;

II) facultado ao mutuário utilizar o financiamento em todas ou em algumas dasatividades listadas na proposta simplificada de crédito sem efetuar aditivo ao contrato.

Ampliação do limite: R$ 1,5 mil, independentemente do número de operações,observado que:

I) o somatório dos financiamentos concedidos a famílias de agricultores desse gru-po, com direito a bônus de adimplência, não excederá R$ 4 mil;

II) alcançado o limite de R$ 1,5 mil a concessão de novos créditos fica condicio-nada à prévia liquidação de financiamento anterior;

III) o crédito deve ser liberado em parcelas, de acordo com o cronograma deaplicação dos recursos.

Maior controle sobre a assistência técnica: até 3% (três por cento) do valor dofinanciamento podem ser destinados à remuneração de assistência técnica, quando julgadanecessária e desde que haja concordância explícita do mutuário.

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Transformando burocracias para financiar os mais pobres: a evolução do Pronaf Crédito Grupo B

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 187-220 Abr/Jun 2008

Garantia de acesso ao crédito B sem limite no número de operações. Os agricul-tores que já atingiram o teto operacional de R$ 4 mil com direito a bônus de adimplência,caso comprovem que continuam enquadrados no Grupo “B”, mediante apresentaçãoda “Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP)” ao agente financeiro, ficam habilitados anovos créditos nesse Grupo, nas mesmas condições dessa seção, exceto quanto ao bônusde adimplência, que nessa hipótese não mais será aplicado.

Inclusão das famílias no Programa de Biodiesel: pode ser concedido financiamento decusteio agrícola, exclusivamente para a cultura da mamona, solteira ou consorciada, aagricultores que explorem a cultura em regime de parceria ou integração com indústriasde biodiesel, desde que observados as datas de plantio e os municípios recomendadosno Zoneamento Agrícola de risco climático divulgado pelo Ministério da Agricultura,Pecuária e Abastecimento.

OperacionalizaçãoAproximação com as políticas públicas de microcrédito orientado autorizando

que na operacionalização dos financiamentos do microcrédito produtivo rural, reali-zados entre os agentes financeiros e os beneficiários finais, quando adotada ametodologia de microcrédito preconizada pelo Programa Nacional de MicrocréditoProdutivo Orientado (PNMPO), instituído pela Lei 11.110, de 25/4/2005, os agentesfinanceiros, mantidas suas responsabilidades, possam atuar por mandato, por inter-médio de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) e coope-rativas singulares de crédito, utilizando as fontes disponíveis e as condições financeirasestabelecidas para o microcrédito produtivo rural.

Fonte de RecursosAmpliação das fontes de recursos, inclusão dos Fundos Constitucionais de

Financiamento (MP 205 de agosto de 2004, convertida na Lei no 11.011).

Agente Financeiro OperadorBanco do Nordeste, Banco da Amazônia, Banco do Brasil (09/2004).

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Letícia Mendonça

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 187-220 Abr/Jun 2008

Resumo – Resumen – Abstract

Transformando burocracias para financiar os mais pobres: a evolução do Pronaf CréditoGrupo BLetícia MendonçaInstituições bancárias tradicionalmente não oferecem serviços financeiros, principalmente crédito

produtivo, aos grupos de mais baixa renda. Considerando-se a rigidez do sistema financeiro emtrabalhar com os mais pobres, o presente artigo descreve o processo de criação e aperfeiçoamento deuma política pública de microcrédito rural dentro do Programa Nacional de Fortalecimento daAgricultura Familiar (Pronaf). São apresentadas as motivações para alterações no desenho da linha decrédito, assim como as mudanças normativas, de fontes e de agentes operadores, efetuadas em cadaano-safra para tornar possível superar os desafios apresentados pela burocracia do Sistema Nacionalde Crédito Rural – SNCR. O texto apresenta ainda o impacto no número de contratações resultantedas diversas medidas tomadas. Finalmente, é feito um balanço das principais lições aprendidasassim como dos desafios atuais de maior qualificação do microcrédito e integração com outraspolíticas públicas.

Palavras-chave: políticas públicas; pobreza rural; microcrédito.

Transformando las burocracias para financiar a los más pobres: la evolución del ‘Pronafcrédito grupo B’Letícia MendonçaLas instituciones bancarias no ofrecen tradicionalmente los servicios financieros a los grupos de

bajo ingreso de la sociedad, especialmente el crédito productivo. Considerando la rigidez del sistemafinanciero en trabajar con los más pobres, el presente artículo describe el proceso de creación yimplementación de una política pública de micro crédito rural del Programa Nacional deFortalecimiento de la Agricultura Familiar (Pronaf). También, presenta las motivaciones para cambiarla línea de crédito, así como sus aspectos normativos, de fuentes y agentes operadores, efectuadas encada año agrícola para tornar posible la superación de los desafíos presentados por la burocracia delSistema Nacional de Crédito Rural. Todavía, el artículo presenta el impacto en el número decontrataciones como resultado de varias medidas realizadas. Finalmente, se hace una evaluaciónde las principales lecciones aprendidas así como de los desafíos actuales de mayor calificación delmicro crédito y su integración con las demás políticas publicas.

Palabras clave: políticas públicas; pobreza rural; micro crédito.

Transforming bureaucracy to finance the poorest: the evolution of ‘Pronaf créditogrupo B’Letícia MendonçaBanking institutions traditionally do not offer financial services, especially productive credit to

the low-income groups of society. Considering the rigid structure of the financial system in workingwith the poor ones, this article describes the process of the creation and the implementation of arural micro credit public policy in the National Program of Assistance to Family Farms (Pronaf). Italso presents motivational aspects to help changing the structure of the credit line, as well as thenormative ones, including sources and operational agents in each agricultural year to make it possibleovercome the challenges presented by the bureaucratic National Rural Credit System – SNCR. This

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Transformando burocracias para financiar os mais pobres: a evolução do Pronaf Crédito Grupo B

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 187-220 Abr/Jun 2008

article shows the impact in number of contracts resulting from various changes taken during theprocess. Finally, it demonstrates a balance of the major lessons learnt as well as updated challengesof major micro credit qualification and integration to other public policies.

Key words: public policies; rural poverty; micro credit

Letícia MendonçaEconomista, Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental e Coordenadora de Crédito da SAF/MDA.Contato: leticia.mendonç[email protected]

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Adelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. Thomaz

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

Gestão Pública e PesquisaOperacional: avaliação de

desempenho em Agências daPrevidência Social

Adelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. Thomaz

Introdução

A Era da Informação, apoiada em Ciência e Tecnologia, vem produzindo

uma extraordinária mutação no sentido de expandir a consciência da sociedade

quanto às suas expectativas e necessidades. A qualidade dos produtos e serviços

deixa de ser uma alternativa organizacional para assumir o papel de demanda

social. Estudiosos afirmam que a competitividade e a sobrevivência de uma

organização dependerão de sua agilidade, flexibilidade e capacidade de inovação.

Mas, segundo Goldbarg e Luna (2000), “sem buscarmos o ideal da otimização

não poderemos criar uma plataforma firme onde a criatividade e a visão

empreendedora possam se sustentar”.

O Estado, por sua vez, não pode ficar indiferente à evolução de seus usuários.

Assim, a busca de qualidade e produtividade chega à Gestão Pública como um

mecanismo de fortalecimento institucional. Contudo, “a gestão pública carece

de instrumentos para implementação de medidas integradas em agendas de

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Gestão Pública e Pesquisa Operacional: avaliação de desempenho em Agências da Previdência Social

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

transformações da gestão que asseguremeficiência e efetividade à ação do Estadona consecução dos serviços públicos”(BRASIL, 2003).

A Previdência Social, segundo França(2004), “reduz as desigualdades sociais eexerce uma influência extraordinária naeconomia de um incontável número demunicípios brasileiros”. França apresentaem seu livro “A Previdência e a Econo-mia dos Municípios” números “revela-dores da magnitude de uma estrutura [...]que precisa ser cada vez mais aperfei-çoada, em benefício de toda a sociedadebrasileira”.

Este artigo trata de avaliação daeficiência de Agências da PrevidênciaSocial (INSS) utilizando a metodologia

DEA (Data Envelopment Analysis). Paraproceder à avaliação, foi implementadoum modelo DEA-CCR utilizando osoftware DEA-Solver© (COOPER,SEIFORD, TONE, 2000). As informaçõesforam obtidas do Suibe – Sistema Únicode Informações de Benefícios da Previ-dência Social, sendo analisado o períodode novembro de 2006, que foi o mês dereferência para implantação da reestru-turação da carreira do servidor. O estudose desenvolveu na Gerência ExecutivaFortaleza que, para o atendimento diretoaos beneficiários, conta com 22 Agênciasda Previdência Social (APS), sendo 10 naregião metropolitana de Fortaleza e 12 emoutros municípios cearenses de sua áreade abrangência (figura 1).

Figura 1: Distribuição Espacial das APS-GEXFOR – Mapa do Ceará

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Adelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. Thomaz

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

Análise de eficiência relativa

A Análise Envoltória de Dados –DEA (Data Envelopment Analisys) – possibi-lita avaliar o grau de eficiência relativa deunidades produtivas as quais realizam umamesma atividade, quanto à utilização dosseus recursos. A análise da eficiência deunidades produtivas, DMU (Decision MakingUnit), nos modelos DEA, gera umafronteira de eficiência sobre a qual estarãosituadas as unidades eficientes, ou seja, asque possuírem a melhor relação “produto/insumo”. As unidades menos eficientesestarão situadas numa região inferior àfronteira, conhecida como envoltória. Osmodelos DEA transformam os inputs(insumos) e outputs (produtos) originais pelaagregação de valores, em combinaçãolinear de inputs e outputs, respectivamente.Os pesos usados nestas combinaçõeslineares são calculados por um problemade programação linear, de forma que cadaDMU obtenha a melhor combinação depesos, maximizando sua eficiência.

Em qualquer modelo DEA:1) Para cada DMU, escolhe-se seu

respectivo conjunto de pesos, de modoque cada DMU apareça o melhor possívelem relação às demais. Dessa forma, cadaDMU pode ter um conjunto de pesos(multiplicadores) diferente;

2) Todos os modelos são invariantescom a escala de medida;

3) A DMU que apresentar a melhorrelação (output j) /(input i ) será sempreeficiente;

4) Há pré-escolha das variáveis, ouseja, identificação de quais variáveispoderão compor o modelo. Poderão serlevados em conta fatores controláveis (degestão) e fatores não controláveis(do ambiente), tanto qualitativos, comoquantitativos.

5) As DMU escolhidas precisamestar alinhadas e desempenhando funçõessemelhantes.

A metodologia DEA apresenta aindaas seguintes vantagens:

• Os dados não necessitam denormalização;

• É uma abordagem não paramétrica,não exigindo uma forma funcionalexplícita relacionando input e output;

• Os índices de eficiência são baseadosem dados reais (e não em fórmulasteóricas);

• Generaliza o método de Farrell,construindo um único input virtual e umúnico output virtual;

• Pode, explicitamente, sinalizar a nãoeficiência do processo de produção etambém apontar possíveis melhoramentosrelacionados aos investimentos;

“O Estado nãopode ficar indiferenteà evolução de seususuários. Assim, abusca de qualidadee produtividade chegaà Gestão Pública comoum mecanismo defortalecimentoinstitucional.”

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Gestão Pública e Pesquisa Operacional: avaliação de desempenho em Agências da Previdência Social

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

• Ao contrário das abordagens para-métricas tradicionais, a DEA otimiza cadaobservação individual com o objetivode determinar uma fronteira linear porpartes (piece-wise linear) (Figura 2), quecompreende o conjunto de DMU Pareto-Eficiente.

Essas características conferem aométodo uma potencialidade de naturezaessencialmente aplicada. DEA é um métodopara apoio à decisão de naturezamulticritério e, portanto, capaz de modelarmelhor a complexidade do mundo real.

O modelo CCR (Charnes, Cooper eRhodes), também conhecido como CRS(Constant Returns to Scale) tem comopropriedade principal a proporcionalidadeentre inputs e outputs na fronteira, ou seja, oaumento (decremento) na quantidade dosinputs provocará acréscimo (redução)proporcional no valor dos outputs. Consi-derando inputs Xi (input X de cada unidadei) e os outputs Yj (output Y de cada unidadej), o índice de eficiência é definido pelacombinação linear dos outputs dividido pelacombinação linear dos inputs dedeterminada DMU k:

Nesta expressão, u e v representam ospesos ou multiplicadores atribuídos aos

outputs (produtos) e inputs (insumos).O método convenciona que todos os

índices devem ser menores ou iguais a 1.Ou seja, quanto maior a relação Y/X maiora eficiência da unidade. A eficiência de umaDMU A será calculada por meio doproblema de programação não-linearseguinte:

tal que

Então o problema consiste em encon-trar os valores dos pesos (ou multipli-cadores) ui e vj, que maximizam a soma

Figura 2: Fronteira linear por partes (piece-wise linear)

Onde:

k = 1, ..., n DMUi = 1, ..., m inputs de cada DMUj = 1, ..., s output de cada DMU

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Adelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. Thomaz

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

ponderada dos outputs (output “virtuais”)dividida pela soma ponderada dos inputs(“inputs virtual”) da DMU em análise,sujeita à restrição de que este quociente sejamenor ou igual a 1, para todas as DMU.Logo, o índice de eficiência varia de 0 a 1,sendo considerada eficiente a unidade queobtiver índice igual a 1, e as demais,ineficientes.

Repetindo-se esse processo para cadaDMU obtêm-se os respectivos pesos ui e vj.

Charnes e Cooper (1962) transfor-maram o Problema de ProgramaçãoFracionária acima, que tem infinitas e ótimassoluções, num Problema de ProgramaçãoLinear (PPL):

tal que

Este modelo assume retornos cons-tantes de escala (CRS), a partir dos pesosatribuídos aos inputs (insumos) e outputs(produtos).

Estudo de Caso: Análise deEficiência das APS-GEXFOR

Uma Agência da Previdência Social ébasicamente uma entidade prestadora deserviços à comunidade, sendo a instânciaorganizacional que lida diretamente comseus usuários. Além dos sistemas corpo-rativos, a instituição conta com sistemas deinformação como: o Sistema Único deInformações de Benefícios – que integra e

concentra, num sistema único, informaçõesgerenciais, originalmente dispersas emvárias fontes, permitindo integração e visãoglobal do negócio cidadão-segurado; oSGA – Sistema de Gestão do Atendimento,que permite o gerenciamento do atendi-mento aos beneficiários nas unidades;e o SAE – Sistema de AgendamentoEletrônico, o mais recente instrumentoda Previdência Social para melhoria doatendimento, que permite aos usuáriosagendar eletronicamente seu atendimento,escolhendo data, hora e unidade que lhesseja mais conveniente, sendo acessado tantopela internet quanto através da central deatendimento, pelo telefone gratuito 135.

Insumos e produtosOs dados relativos aos processos de

benefícios foram obtidos por meio doSuibe, e os dados relativos ao quantitativode servidores nas unidades alcançados apartir dos sistemas da Diretoria deRecursos Humanos. Inicialmente, foramconsideradas as seguintes variáveis: Requer– variável não controlável, que representao quantitativo de requerimentos aguar-dando despacho conclusivo da APS;No Servidores – variável controlável, quedemonstra o quantitativo de servidoreslotados na APS; Despach – constitui oquantitativo de requerimentos que tiveramdespacho conclusivo na unidade: (deferi-mentos e indeferimentos).

As demais variáveis foram definidas apartir de indicadores institucionais, sendoconsiderados (preferencialmente) aquelescom ampla divulgação nas diversasinstâncias gerenciais da instituição e quemelhor representam as atividades-fim. Sãoelas: ICTU – representa o percentualde benefícios despachados na unidade,considerando o grau de complexidade dosmesmos, e de acordo com um padrão

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Gestão Pública e Pesquisa Operacional: avaliação de desempenho em Agências da Previdência Social

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

mínimo estabelecido pela instituição; IPDU– representa ao percentual de benefíciosdespachados por servidor; ICA – repre-senta a quantidade média de requerimentosefetuados por servidor; IDT – representao índice de demanda atendida; DTC –representa a distribuição do tempo de con-cessão; DTR – representa a distribuição dotempo de represamento; IMA – representaa idade média do acervo (no modelousamos a variável IMAr – o indicadorinvertido); e TMC – representa o tempomédio concessório (no modelo usamos avariável TMCr – o indicador invertido).

As variáveis inicialmente listadas foramsubmetidas aos processos recomendadospelos autores da literatura consultada esubmetidas ao método de Norman eStoker (1991), que alia a Análise de Corre-lação Simples à Análise Envoltória deDados para definir aquelas que comporiamo modelo a ser implementado, definindoquais seriam insumos e quais seriamprodutos. Para desenvolvimento da apli-cação, foi utilizado o modelo “DEACCR–O.CCR” orientado a output, que temcomo objetivo maximizar os produtosobtidos com, no máximo, o mesmo níveldos inputs. O modelo foi implementadopelo software DEA-Solver©.

Seleção das variáveis para aplicaçãodo modelo DEA

As variáveis pré-selecionadas foramsubmetidas a procedimentos baseados nométodo de NORMAN e STOKER (apudPaiva, 2000; SILVA, 2000) para que sedefinisse sua inclusão ou não no modelo.A partir desse procedimento é construídauma seqüência de indicadores de eficiênciapara os planos de operação observados.Inicia-se com a classificação das variáveisem input (insumo) e output (produto) deacordo com o desempenho observado.

Para iniciar o método, seleciona-seinicialmente um par: input-output e aplica-seo modelo DEA-CCR, obtendo-se, assim,as medidas de ineficiência dos planos deoperação observados.

Seqüencialmente, novas variáveis sãoincluídas, tomando como base o grau decorrelação entre a medida DEA obtida eos insumos e produtos considerados naanálise de eficiência. Levando-se em contaque a correlação dos produtos com o indi-cador de eficiência deveria ser positiva,um aumento no volume de produtosacarreta um aumento no indicador deeficiência.

O raciocínio oposto deve ser aplicadoaos insumos, implicando correlaçãonegativa com o indicador eficiência.Portanto, se a correlação calculada entre umindicador de eficiência e uma variável deoutput (produto) for negativa, os efeitosdesta variável não estão computados noindicador calculado. Determina-se a neces-sidade de inclusão da variável. O opostoaplica-se aos inputs (insumos).

Dessa forma, novos indicadores daeficiência DEA são obtidos seqüencial-mente pela inclusão de novas variáveis noconjunto de variáveis relevantes.

O procedimento tem continuidade atéque se obtenha um indicador DEA que nãose altere com a inclusão de novas variáveis.Isto é, quando a correlação desse indicadorcom todos os produtos for positiva, e comtodos os insumos for negativa. “Apesar denão haver evidências desse raciocínio notexto original de Normam e Stoker,diversos trabalhos referenciam-se aoprocedimento (KASSAI, 2000)”.

Assim, a maior correlação entreinsumos e produtos ocorreu entre asvariáveis Requer e Despach (0,9316). Essefoi, portanto, o par inicial input-output domodelo. As demais variáveis de output

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(produtos) foram inseridas no modeloconforme procedimento anteriormentedescrito. ICTU, IPDU e ICA apresentamforte relacionamento entre si, o que indicaque são redundantes, explicam o mesmofenômeno. Optamos por incluir nomodelo a variável ICTU, cujo conceitopermite aos gestores interpretações maiselaboradas da produtividade na unidadee assume maior peso na avaliação porpontos, adotada pela instituição. Entra-ram também no modelo, sucessivamen-te, as variáveis NoServidores, IDT, TMC,IMA . Dessa forma, obtivemos os

insumos Requer e No Servidores. As demaisvariáveis foram inseridas no modelocomo produtos.

Análise dos resultados

As DMU: APS – Aracati, APS – BoaViagem, APS – Canindé, APS – Maran-guape, APS – Pacatuba, APS – Quixera-mobim, APS – Redenção – Ce e APS –Russas atingiram a fronteira de eficiência.São consideradas, portanto, unidades dereferência e definem a fronteira de eficiênciado conjunto observado. A tabela 1, abaixo,

Tabela 1: Classificação das APS-GEXFOR

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Gestão Pública e Pesquisa Operacional: avaliação de desempenho em Agências da Previdência Social

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 221-236 Abr/Jun 2008

mostra a classificação das APS-GEXFOR,segundo os escores obtidos.

Os demais resultados disponibilizadospelo DEA serão discutidos a seguir:

A tabela 2, abaixo, identifica as origense quantidades de ineficiência em cadaAPS-GEXFOR. Isto é, mostra os excessosem cada input e a escassez em cada outputque tornaram a DMU relativamenteineficiente. Por conseguinte as DMUeficientes têm as colunas excessos e escasseziguais a zero.

É importante observar que o métodonão encontrou nenhuma unidade comexcesso na variável Requer. Embora tenhaencontrado 8 unidades com excesso navariável NoServidores, todas em Fortaleza.Apesar disso, observa-se os pequenos valoresnas colunas do IMAr e TMCr corroborados

pela escassez apresentada na coluna da variávelICTU das unidades ineficientes. Isso indicaque as unidades não estão devidamente ca-pacitadas para dar resolver processos e queapresentam baixa produtividade.

O Software DEA-Solver© disponi-biliza ainda as projeções de cada DMUineficiente na fronteira de eficiênciasegundo cada variável estudada. Estabele-cendo metas e relacionando o potencial deotimização de cada variável da unidade emrelação às melhores práticas observadas.Os valores precedidos de sinal negativorepresentam o excesso que deve serretirado para tornar a APS eficiente; osvalores positivos representam a escassez aser suprida; e a coluna % representa opercentual que estes valores têm em relaçãoaos seus resultados.

Tabela 2: Excesso e Escassez que tornam a unidade ineficiente nomodelo DEA-CCR

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Portanto, as DMU eficientes nãoapresentam diferenças. Deve-se semprelembrar que a eficiência DEA é relativa aoconjunto das DMU observadas.Encontram-se nesta situação: APS-Aracati(tabela 3), APS-BoaViagem, APS-Canindé,APS-Maranguape, APS-Pacatuba, APS-Quixeramobim, APS-Redenção e APS-Russas, que têm interpretação semelhante.

A seguir, será analisada cada uma dasunidades pela ordem decrescente queaparecem no rank de scores de eficiência doconjunto das 22 DMU estudadas.

A tabela 4 apresenta as projeções daAPS-Messejana na fronteira de eficiência,segundo cada variável estudada. Neste arti-go, foram omitidas as demais tabelas deprojeções, sem prejuízo de informações,

uma vez que aquelas decorrem das infor-mações disponibilizadas na tabela 2. A aná-lise dessas informações possibilita que asAPS ineficientes definam metas a seremalcançadas para atingir a eficiência relati-vamente ao conjunto observado.

A APS-Messejana apresenta baixopercentual necessário para a variável Despachatingir a fronteira de eficiência, comparadoao elevado percentual de diferença dasvariáveis IMAr e TMCr, o que aponta paraa necessidade de melhorar o gerenciamentodos processos na unidade e a capacidaderesolutiva.

A APS-Baturité apresenta baixopercentual de diferença para Despach e IMArem contraste com os altos percentuais dediferença nas variáveis ICTU e IDT, o que

Tabela 3: Projeção – APS - Aracati segundo cada variável estudada

Tabela 4: Projeção – APS Fort-Messejana segundo cada variável estudada

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pode indicar que um número reduzido deservidores está apto a despachar processosde maior grau de complexidade, o quecontribui com reduzido TMCr.

A APS-Parquelândia revela altopercentual de diferença a corrigir na variávelNo Servidores, comparado ao relativamentebaixo percentual da variável Despach eelevados percentuais para ICTU, IMAre TMCr; o que indica baixa capacidaderesolutiva e dificuldade em atenderprocesso de maior grau de complexidade,além de apontar para a necessidade demelhoria no gerenciamento do estoque.

A APS-Aldeota, 12a no ranking, consi-derada pelos servidores como uma agênciaprivilegiada por ter sido beneficiada emsucessivos programas institucionais demelhoria do atendimento aos usuários,surpreende por todos os percentuaisapresentados. Com alto percentual de IMAre IDT a atingir, embora numericamentepróximo do projetado, aparece defasadaem relação ao conjunto observado. Alte-rando a variável No Servidores da APS-Aldeota para 19 e fazendo nova simulação,encontramos que a unidade, embora nãotenha excessos a corrigir, ainda se mantémna mesma posição no ranking, devido aosresultados obtidos pelas APS-Aracati, APS-Redenção e APS-Boa Viagem. As duasprimeiras já figuravam como referênciadesta unidade no modelo anterior.

A APS-Jacarecanga apresenta altospercentuais para IDT e IMAr, o que indicadificuldades a vencer quanto à capacitaçãode servidores. Além disso, apresentagerenciamento inadequado do estoque,considerando o percentual de TMCr emrelação ao IMAr.

A APS-Fort-Centro-Oeste mostradificuldades no gerenciamento do estoque,além de baixa capacidade resolutiva eprodutiva. Apresenta também altos

percentuais a atingir pelas variáveis IDT,TMCr e IMAr , cujos reflexos são percep-tíveis pelos usuários (prejuízo social), e pelaInstituição (prejuízo financeiro).

A APS-Fortaleza-Sul, com altos percen-tuais de ICTU e IDT a atingir, demonstracapacidade resolutiva aquém do seu porte.Além disso, IMAr e TMCr na avaliação rela-tiva também deixam a desejar. Isso significaque outras unidades, possivelmente as APS-Aracati e APS-Redenção suas unidades dereferência, obtiveram melhor relação insumo-produto. Procedeu-se à nova simulação,alterando o quantitativo de servidores para25. As constatações foram equivalentes às quese obteve na segunda simulação da APS-Aldeota. Numa terceira simulação, manten-do-se a variável original No Servidores (73) eaumentando a variável Despach para 730(mesmo valor da variável Requer), a APS saltada 15a para a 11a posição no ranking, dimi-nuem os percentuais de Despach, IDT e TMCra, incrementar nos produtos, mas aumentao excesso de servidores. Isso sugere que,efetivamente, um número reduzido deservidores atua nas atividades-fim.

A APS-Quixadá expõe capacidaderesolutiva inferior a seu porte. Os percen-tuais de diferença a atingir muito próximosentre IMAr e TMCr apontam para baixacapacidade resolutiva.

A APS-Pacajus apresenta percentuaisa atingir relativamente próximos para asvariáveis Despach, ICTU, IDT, IMAr e TMCr– o que pode indicar uma certa equiparaçãona qualificação dos servidores – porémapontam para a necessidade de aumentar aprodutividade. O percentual IMAr e TMCra alcançar podem revelar a necessidade demelhorar o gerenciamento do estoque.

A APS-Jangada mostra altos percen-tuais a atingir em IDT e IMAr. Umbaixíssimo resultado obtido pela variávelICTU demonstra que a unidade enfrenta

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problemas na capacitação resolutiva e naprodutividade. Pode indicar também queum número reduzido de servidores atuanas atividades-fim.

A APS-Fort-Parangaba apresenta altospercentuais a alcançar pelas variáveis IDT,IMAr e TMCr , apontando baixa capaci-dade resolutiva e baixa produtividade daunidade, além das questões de gerencia-mento do estoque. Os altos percentuais dediferença a atingir pelas variáveis ICTU,IDT, IMAr e TMCr reforçam a indicaçãode baixa capacidade resolutiva e produ-tiva, possivelmente, agravando e dificul-tando as questões de gerenciamento doestoque. Esta unidade acumula prejuízossociais (estoque acima de 30 dias) e prejuízofinanceiro (estoque acima de 45dias).

A APS Caucaia evidencia um quadrodifícil. Os altos percentuais de diferença aatingir pelas variáveis ICTU, IDT, IMAr eTMCr apontam capacidade resolutivae produtiva muito inferiores ao porte daunidade, o que se agrava pela ineficiênciano gerenciamento do estoque. Já a APSCascavel apresenta o mesmo percentual aatingir para IDT, IMAr e Despach. As dife-renças maiores a incrementar nos produtossão relativas às variáveis ICTU e TMCr. Issodenota capacidade resolutiva e produti-vidade aquém em 103,85% e 148,12%,respectivamente, das melhores práticasobservadas no conjunto. A APS-Maracanau,além da baixa capacidade resolutiva e pro-dutiva, apresenta alto índice de IMAr aalcançar, o que aponta, principalmente, paraa ineficiência no gerenciamento dosprocessos, acarretando prejuízo financeiroà instituição, bem como prejuízo social.

Conclusões

A avaliação de eficiência das APS-GEXFOR, segundo a metodologia DEA,

permitiu identificar as melhores práticas,mensurar a participação de cada variávelenvolvida na avaliação da unidade eprojetar as unidades ineficientes na fronteirade eficiência, estabelecendo metas a partirda identificação de percentuais de acrésci-mos e/ou decréscimos a serem aplicadosnos inputs e/ou outputs para torná-laseficientes.

Nesse sentido cabe ressaltar a eficiênciada APS-Redenção, referenciada 13 vezes

no conjunto observado. Com oito servi-dores efetivamente no quadro (um servidorcedido), sendo dois agentes administrativos,dois técnicos previdenciários, um agentede portaria e três peritos médicos,atenderam, em novembro de 2006, 97,55%da demanda; e a unidade tem o IMAe o TMC em torno de 35 e 23 dias, respecti-vamente. A APS-Russas, a segunda maiorunidade no interior, atendeu 97,75%

“A avaliação deeficiência nas APS,utilizando ametodologia DEA,poderá contribuircom o processo, jáem curso nainstituição, de buscapor uma gestãopública mais ética,participativa,descentralizada,orientada porresultados.”

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da demanda com o IMA e o TMC emtorno de 54 e 15 dias, respectivamente.

Ressalta-se ainda que a metodologiaDEA analisa a eficiência de unidades relati-vamente ao conjunto observado. Significadizer que, incluindo-se ou excluindo-seunidades nesse conjunto, poderíamos obterscores diferentes. Uma unidade eficiente emum conjunto poderia não ser eficiente emoutro. Reside também nesse conceito aforça da metodologia, que possibilitaavaliar o grau de eficiência relativa deunidades produtivas que realizam umamesma atividade quanto à utilizaçãodos seus recursos. Neste trabalho,estudamos as 22 APS da GerênciaExecutiva Fortaleza – CE.

Nenhuma unidade da capital atingiu aeficiência relativa, não obstante o reconhe-cido perfil dos servidores em algumasunidades e a proximidade à Divisão deBenefício, aos Serviços de Benefício e aoServiço de Atendimento. Em simulaçõessubseqüentes realizadas para as APS-Fortaleza Aldeota e APS-Fortaleza-Sul,onde se reduziu o quantitativo deservidores aos números projetados pelametodologia DEA, não se observoumudança significativa nos scores de eficiênciadestas unidades, que se mantiveram comas mesmas classificações no ranking. Essasclassificações foram, no entanto, significa-tivamente alteradas quando mantido oúltimo quantitativo de servidores e aumen-tando os [outputs] Despach e IDT.

A utilização da metodologia DEA,instrumento de apoio à decisão de naturezamulticritério, permitiu definir a eficiênciade cada APS de forma individualizada,considerando a atuação das demais unida-des em estudo. A metodologia tambémpropôs melhorias com o estabelecimentode metas de atuação, possibilitou ainda oestudo dos fatores que mais contribuíram

para a obtenção da eficiência relativa.Diferentemente dos sistemas de atribuiçãode pontos, mais de uma unidade pôde serclassificada como eficiente, compondo afronteira de eficiência relativa e servindocomo referência às demais unidades. Issopermite identificação das melhorespráticas, importante aliada no processo degestão participativa e contribui para aaprendizagem organizacional.

A identificação do perfil dos servidoresdas APS-GEXFOR poderia colaborarsignificativamente para aumentar do poderdiscricionário do modelo, permitindoidentificar as reais necessidades de treina-mento, o quantitativo de servidores queefetivamente desenvolvem as atividades-fim e a lotação eficientemente adequadade servidores nas unidades.

O software DEA-Solver© utilizadopara implementar a aplicação mostrou-seextremamente amigável para o usuário ede fácil utilização.

A avaliação de eficiência nas Agênciasda Previdência Social, utilizando ametodologia DEA, poderá contribuir como processo, já em curso na instituição, debusca por uma gestão pública mais ética,participativa, descentralizada, orientada porresultados. A inserção nesse contexto deferramentas científicas e tecnológicas, comoa Pesquisa Operacional e os métodos deApoio à Decisão Multicritérios –metodologia DEA, oferece instrumentosde avaliação continuada de gestão, possi-bilitando a condução da implementaçãode ações para assegurar a melhoria dagestão dos serviços públicos prestados aocidadão.

A utilização da metodologia DEApara avaliação de eficiência em unidadesde atendimento pode atender à demandados administradores do setor público que,segundo Machado(2005), “necessitam de

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um conjunto de informações gerenciaispara cumprir, com eficiência, eficácia eefetividade, as políticas públicas”. Corro-bora também com Trosa(2001), queargumenta que “a busca do desempenhopode simultaneamente definir as margensde manobra financeira ou de eficiência eatender à preocupação dos servidores emter um trabalho mais valorizado”, uma vezque permite a avaliação continuada das

ações implementadas, o que possibilita,também, a ampliação da visão do pro-cesso. Isso poderá contribuir significati-vamente com a modernização da gestãopública pela implementação de medidasque assegurem a eficiência, redução decustos operacionais e melhoria na qualidadedo atendimento aos cidadãos.

(Artigo recebido em setembro de 2007. Versãofinal em junho de 2008).

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Adelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. Thomaz

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Resumo – Resumen – Abstract

Gestão Pública e Pesquisa Operacional: avaliação de desempenho em Agências daPrevidência SocialAdelina Cristina A. Chaves e A. Clecio F. ThomazO presente trabalho utiliza a metodologia DEA (Data Envelopment Analysis ), para avaliar a

eficiência das 22 Agências da Previdência Social – Gerência Executiva Fortaleza (APS-GEXFOR).DEA utiliza programação linear cujo núcleo das estruturas analíticas é formado a partir do modelooriginal CCR (Charnes, Cooper, e Rhodes). Aplicada às DMU (Decision Making Units), define umaFronteira de Eficiência identificando Unidades Eficientes e Ineficientes. Foi utilizado o modeloDEA-CCR implementado pelo software DEA Solver©. A Previdência Social (INSS) dispõe de indica-dores de desempenho. Algumas variáveis utilizadas no modelo implementado derivam dessesindicadores, outras informações foram disponibilizadas pelos sistemas de informação da insti-tuição. A avaliação de eficiência DEA das APS-GEXFOR permitiu identificar as melhores práticas,mensurar a participação de cada variável envolvida na avaliação da unidade e projetar as unidadesineficientes na fronteira de eficiência, identificando metas a serem atingidas para torná-las eficientesno conjunto observado.

Palavras-chave: DEA (Análise Envoltória de Dados), Eficiência, Gestão Pública por resultados,INSS–Agências da Previdência Social.

Gestión Pública e Investigación Operacional: evaluación de desempeño en Agencias dela Previdencia SocialAdelina Cristina A. Chaves y A. Clecio F. ThomazEl presente trabajo utiliza la metodología DEA (Data Envelopment Analysis), para evaluar la

eficiencia de las 22 Agencias de la Previdencia Social - Gerencia Ejecutiva Fortaleza (APS-GEXFOR).DEA utiliza programación linear cuyo núcleo son las estructuras analíticas y el modelo original CCR(Charnes, Cooper, e Rhodes). Aplicada a las DMU (Decision Making Units), define una Frontera deEficiencia identificando Unidades Eficientes e Ineficientes. Fue utilizado el modelo DEA-CCRimplementado por el software DEA Solver©. La Previdencia Social (INSS) dispone de indicadores dedesempeño. Algunas variables utilizadas en el modelo implementado derivan de estos indicadores.Otras de las informaciones también fueron disponibilizadas por el sistema de información de laInstitución. La evaluación de eficiencia DEA de las APS-GEXFOR, permitió identificar las mejoresprácticas, medir la participación de cada variable envuelta en la evaluación de la unidad y proyectar lasunidades ineficientes en la frontera de eficiencia, identificando metas a ser alcanzadas para tornarlaseficiente en el conjunto observado.

Palabras-clave: DEA (Análisis Envoltorio de Datos), Eficiencia, Gestión Pública por resultados,INSS– Agencias de la Previdencia Social.

Public Management and Operational Research: performance evaluation of Agenciesof Social SecurityAdelina Cristina A. Chaves and A. Clecio F. ThomazThis work utilizes DEA (Data Envelopment Analysis) methodology to evaluate the efficiency

of the 22 Agencies of Social Security in Fortaleza-BRAZIL (APS-GEXFOR). DEA utilizes linearprogramming whose analytic structures nucleus is formed from the original model CCR (Charnes,Cooper, Rhodes). When applied to DMU (Decision Making Units), it defined inefficient and efficient

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units, drawing an Efficiency Border. In the application, the model DEA-CCR was used and itimplemented by the software DEA-Solver©. The Social Security agency (INSS) has an indicator ofperformance. Some variables in the model implemented derive from these indicators. Others derivefrom information disposed by the Information Systems Corporation. DEA evaluation of efficiencyof the APS-GEXFOR permitted: to identify the best practices, to measure the participation of eachvariable involved in the unit evaluation, and to project the inefficient units in the border of efficiency,identifying goals to be reached in order to become efficient among the units observed.

Key words: DEA(Data Envelopment Analysis), Efficiency, Results-Oriented PublicManagement, Agencies of the Social Security – INSS (National Institute of Social Security of theBrazil).

Adelina Cristina A. ChavesINSS – Gerência Executiva Fortaleza.Contato: [email protected]

A. Clecio F. ThomazUniversidade Estadual do Ceará – LOGIN Laboratório de Otimização e Gestão Industrial.Contato: [email protected]

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Elisabete Ferrarezi

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Legados daprofessora Ruth Cardoso

ao Governo Federal

Elisabete Ferrarezi

No dia 24 de junho de 2008, a nação se comoveu com a morte repentina de

Dona Ruth Cardoso. Homenagens partiram de todos os lados, destacando a

multiplicidade de contribuições dessa mulher discreta e atuante, bem como o

reconhecimento alcançado em todos os setores dos quais participou.

Este texto presta especial homenagem à cientista, ativista social e servidora

pública Ruth Cardoso, que criou e presidiu o Conselho da Comunidade Soli-

dária no Governo Federal, no período 1995-2002, momento em que se arriscou

a propor o novo, enfrentou a polêmica e introduziu questionamentos em torno

das antigas formas de relação do Estado com a sociedade. Reconhecer seu pa-

pel é valorizar as pessoas que acreditam ser possível fazer a diferença na admi-

nistração pública brasileira.

Tive o privilégio de testemunhar essa trajetória. Como assessora, pude

perceber a dedicação de Dona Ruth para colocar em prática seus sonhos e

projetos. Minha admiração passa pelo modo como ela enfrentava as resistências,

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Legados da Professora Ruth Cardoso ao Governo Federal

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pela ousadia em inovar e trazer questõespolêmicas para o debate público, pela auto-nomia que exercia e que nos conferia nosprojetos. Pela confiança que depositounuma equipe, em sua maioria, cedida poroutros órgãos do governo. Passa tambémpor ter conhecido sua solidariedade inata,sincera, revelada pela preocupação com obem-estar das pessoas com as quais traba-lhava direta ou indiretamente.

Tive a oportunidade de dialogar comela, especialmente durante a elaboração deminha tese de doutorado sobre a reformado marco legal do terceiro setor, quandoa entrevistei. Trago aqui alguns trechos doseu depoimento sobre a concepção e aexperiência do Conselho e resumo as açõesda Comunidade Solidária, esperando comisso contribuir para que o legado possa vira ser pesquisado e se torne conhecimentoe memória.

O Conselho da Comunidade Solidária(chamado de braço da sociedade civil)pretendia constituir-se em “um novoinstrumento de diálogo político e depromoção de parcerias entre Estado esociedade para o enfrentamento dapobreza e da exclusão por intermédio deiniciativas inovadoras de desenvolvimentosocial” (CONSELHO DA COMUNIDADE

SOLIDÁRIA, 1999: 4).A expectativa de que o Conselho, por

ser dirigido pela primeira-dama, assumiriaa área social, não se cumpriu. Na realidade,o projeto tinha uma visão crítica do padrãohistórico da política social brasileira.Segundo Ruth Cardoso, não havia sentidoem criar outra instituição como a LegiãoBrasileira de Assistência (1942-2005), quefoi extinta no início do governo, nemtampouco criar um fundo para o combateà pobreza para competir com as políticasdos ministérios – o que faria com que as

pessoas se organizassem em função dasdiretrizes desse Fundo do governo paraobter os recursos. Ela não queria criar umainstituição que perdurasse, mas queprogramas fossem criados por meio deparcerias, aproveitando os recursosexistentes na sociedade, além de trazer“questões” que o Estado não estavaenxergando. Foi assim que criou oConselho, que, tal como os programas,deveria acabar quando atingisse suas metas1

(CARDOSO, entrevista à autora, 6/11/06).O pano de fundo dessa proposta

originou-se na experiência pregressa daprofessora Ruth Cardoso, que foi militantedo movimento feminista, apoiou a açãode outros movimentos – como o dosnegros e o dos direitos humanos – e entrouem contato com novas formas de organi-zação e mobilização social, nos anos 70,quando realizou pesquisas em bairros deSão Paulo. Também de sua experiênciaorientando alunos: “Eu tinha esse conheci-mento sobre a organização de base dasociedade, tinha muita gente discutindo issocomigo e explorei o assunto nos anos 80”.Ela considerou que toda essa experiênciafoi importante porque se diferenciava davisão corrente na esquerda, nas décadas de70 e 80, visão segundo a qual a mudançasocial ocorreria por meio da ação parti-dária. Suas pesquisas indicavam que asociedade era mais informada e mobili-zada do que se imaginava à época, o queseria percebido depois, por exemplo, namobilização de atores sociais na Consti-tuinte em 1988 (CARDOSO, entrevista àautora, 6/11/06).

“Tinha uma mobilização [eleiçõespara os governos locais na década de80, movimentos populares], coisas quesurgiam da própria realidade, e osintelectuais mais atentos perceberam

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esse fenômeno, as organizações de baseda sociedade” (CARDOSO, entrevista àautora, 6/11/06).

Quando Dona Ruth estava fazendoum pós-doutorado nos Estados Unidos,estudando um novo tema – a juventude –,seu marido, o sociólogo FernandoHenrique Cardoso, ganhou as eleições àPresidência da República. Ela entãocomeçou a pensar no que iria fazer. Tinhaalgumas convicções e havia feito consta-tações, mas como colocaria isso emprática? Sua experiência e conhecimento depesquisadora do Centro Brasileirode Análise e Planejamento – Cebrap, e dedocência na Universidade de São Paulo –USP, ajudariam-na a desenhar o projeto erenderiam algumas práticas diferenciadasno setor público.

“Levei comigo a certeza de que asociedade brasileira tinha uma teia decomunicação no nível local, as grassroots, e isso era o resultado do que eutinha visto, pesquisado, conversado.Acho que foi isso que me levou à idéiado Comunidade Solidária. O tema eraa parceria Estado-sociedade. Mas oEstado era alheio aos novos atores.As políticas públicas tinham queencontrar um novo caminho dediálogo com a sociedade, e a parceriaficou a briga maior” (CARDOSO,entrevista à autora, 6/11/06).

A agenda do Conselho da Comuni-dade Solidária traduzia propostas desetores progressistas que atuaram naConstituinte, que pretendiam, diferente-mente da proposta neoliberal de reduziro papel do Estado, incluir formas com-plementares de provisão, por meio doterceiro setor, e reformar e fortalecer a

ação do Estado. Era imprescindível lidarcom os desafios advindos das mudançasdo capitalismo, da globalização e demo-cratização e resolver os aspectos críticosdo sistema de políticas sociais, como acentralização, fragmentação, burocra-tização e apropriação do aparelho estatalpor interesses privados e corporativos, odistanciamento das necessidades dacomunidade, a má qualidade e exclusãode segmentos de mais baixa renda por

parte do Estado. Já nos anos 90, sob ajustefiscal e escassez de recursos, figuravamna agenda a descentralização, a necessi-dade de estabelecer prioridades de ação,a busca de novas formas de articulaçãocom a sociedade civil e com o mercado,a participação e a introdução de novasformas de gestão nas organizações estatais.

Havia, assim, uma tentativa de confi-gurar políticas públicas em que o Estado

“Parceria não éentrar em programasde governo. Parceria éter diagnóstico desetores que não estãocobertos e não podemser suficientementeofertados por partedo governo.”

Ruth Cardoso

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Legados da Professora Ruth Cardoso ao Governo Federal

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não fosse o único a gerar solidariedade eofertar serviços, mas que assumisse aarticulação de políticas públicas prota-gonizadas pelos novos atores.

Dona Ruth acreditava na realização deparcerias, com metas e controle de resul-tados, usando recursos existentes nasociedade. Citou a atuação das ONGs que,no processo de democratização, assu-miram tarefas, prestaram serviços muitoparticulares, e não suficiente e eficiente-mente ofertados pelo Estado, tais como otrabalho com crianças em situação de rua,atendimento a portadores de deficiênciase a idosos. À sociedade civil caberiacomplementar a ação do Estado ematividades específicas, nas quais eradiagnosticada como mais eficiente e eficaz.“Parceria não é entrar em programas degoverno. Parceria é ter diagnóstico desetores que não estão cobertos e nãopodem ser suficientemente ofertados porparte do governo” (CARDOSO, entrevista àautora, 6/11/06).

Segundo Ruth Cardoso, o Estado devecumprir seu papel universalista, definirprioridades das políticas públicas, e paradispor de recursos públicos tem queobedecer às regras e submeter-se a controlesno uso do dinheiro público nas parcerias.

Quando perguntada sobre uma dascríticas que recebia, que estaria terceirizandoos serviços sociais do Estado, elarespondeu: “Não é terceirização porque éa sociedade que está criando. (...) Perce-bemos a nova posição da sociedade civilque passou a não só advogar, mas prestarserviços inovadores e por isso parceria,porque a sociedade é capaz de inovar”.

A dirigente do Conselho, à época,também percebeu que havia um novodiscurso dos empresários (responsabili-dade social) e estava aberta à participaçãodeles. O novo papel consistia em articular

parceiros e coordenar ações. “Não fomosnós que mudamos as cabeças, foi a socie-dade que mudou. (...) Eram novos atores[que estavam] disponíveis, e o governo nãoreconhecia nenhum desses atores”.

Foi assim que deu início ao Conselho,levando algumas constatações que foramtraduzindo-se em práticas e programas,apontando formas alternativas de provisãode serviços públicos.

O Conselho dispunha de uma Secre-taria Executiva, responsável pelo ProgramaComunidade Solidária que articulava efocalizava as ações governamentais emmunicípios selecionados, coordenava arede de gestores dos ministérios setoriais,dos Estados e municípios, que conduziamprogramas prioritários de combate à fomee à pobreza. Os programas eramexecutados pelos ministérios em muni-cípios mais carentes de cada Estado, e eramselecionados em função de sua capacidadede melhorar as condições de vida daspopulações mais pobres. Apesar deformalmente existir essa Secretaria-Executiva (chamada de braço governa-mental), ela de fato nunca exerceu o papelde Secretaria-Executiva do Conselho,atuando basicamente na gestão doPrograma Comunidade Solidária.

À medida que o ideário do Conselhoacumulava conhecimento e tornava-se maisfortalecido, resolveu mudar seu braçogovernamental, articulando oferta deprogramas públicos com a demanda, pormeio da mobilização do capital social,de modo que os beneficiários e atorespolíticos locais pudessem opinar e tomardecisões sobre seus destinos, participandoda formulação e implementação das açõespropostas em um plano de desenvol-vimento.

Deste modo, a partir de 1999, oPrograma Comunidade Solidária da

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Elisabete Ferrarezi

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Secretaria-Executiva foi substituído peloPrograma Comunidade Ativa, que pro-movia uma estratégia de DesenvolvimentoLocal Integrado e Sustentável, de baseparticipativa. À Secretaria Executivacaberia então auxiliar os Fóruns deDesenvolvimento locais na negociaçãocom órgãos do Governo Federal, estaduale municipal para viabilizar seus planos dedesenvolvimento.

A opção pela constituição de umConselho implicou limitações na estrutura,em relação a recursos financeiros ehumanos. Mas Dona Ruth tinha preferênciapelos programas que tivessem parcerias.“Demonstramos que essa idéia não erasonho, era possível”, referindo-se aosprogramas gerenciados por associaçõescivis que criou e que existem até hoje.“Fazíamos ação coordenada entreparceiros com diagnóstico, planejamento,metas, objetivos. (...) Era uma lição quequeríamos dar [os programas], agora estádifícil [fazer parcerias] porque as empresastêm suas próprias ações.”

Como empreendedora que era,Dona Ruth conseguiu unir ONGs, empre-sários e Governo Federal colocando emprática novos arranjos institucionais queenvolviam articulação de parceiros públicose privados com diferentes tipos de recursospara viabilizar programas.

O primeiro foi criado em 1995, coma Associação de Apoio ao ProgramaCapacitação Solidária, que articulavaparcerias e captava recursos de empresaspara a realização de capacitação profis-sional de jovens. Isso era feito por meiode seleção de projetos de ONGs, commonitoramento e avaliação de resultados.Os objetivos eram treinar os jovens emuma habilidade específica; promover asociabilidade, comunicação, auto-estima ecidadania; incentivar o interesse em ampliar

seus conhecimentos e retomar ou reforçara relação com a escola; e estimular soluçõescriativas e inovadoras de geração de rendae de identificação de novos nichos nomercado de trabalho.

O Programa Universidade Solidária(1996) atuava mobilizando jovens univer-sitários, permitindo-lhes conhecer a reali-dade do País e participar de um exercíciode responsabilidade social, em visitas amunicípios com altos índices de pobreza.O Programa Alfabetização Solidária(1997) identificava os municípios, mobi-lizava e articulava parcerias para executá-lo. Seu objetivo era reduzir o índice deanalfabetismo entre jovens e adultos edesencadear a oferta pública de educaçãoa esse segmento.

O Programa Voluntários (1997)promovia o voluntariado no País, a parti-cipação responsável e solidária doscidadãos em iniciativas de combate àexclusão social e busca da melhoria daqualidade de vida em comum. O Artesa-nato Solidário (1998) auxiliava as comu-nidades artesanais a viabilizar planos detrabalho para apoiar o que já fazem eampliar o número de pessoas envolvidas.O Projeto Rede Jovem promovia o acessoà internet a jovens.

Em 1997, o Conselho deu origem aoPrograma Voluntários, à Rede de Infor-mações para o terceiro setor na internet –RITS e à reforma do marco legal do terceirosetor para viabilizar a proposta de forta-lecimento da sociedade civil. Também abriuum processo de construção de consensosem torno dos temas considerados funda-mentais de uma agenda social, com aschamadas rodadas de interlocução política,que envolvia a participação de atoresgovernamentais e não-governamentais nadiscussão e implementação das propostasacordadas2.

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Legados da Professora Ruth Cardoso ao Governo Federal

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A concepção favorável à promoçãode relações de cooperação entre o Estadoe a OSC constituiu uma mudança consi-derável se comparada à relação antagônicapredominante desde a ditadura militar, eao padrão clientelista e assistencialistaprevalecente nas políticas sociais. Opressuposto da disseminação de novosarranjos institucionais era que a reconstruçãodo Estado passava pelo fortalecimento epela publicização de suas ações e, por isso,envolvia também a redefinição de suasrelações com a sociedade civil.

A presidente do Conselho desem-penhou papel fundamental na fase em queo tema terceiro setor passou a compor aagenda de governo, por meio dosprogramas e discursos, e quando a reformado marco legal do terceiro setor conseguiuchegar à agenda decisória, congregandoministros importantes no processo.Segundo ela, nas conversas com as ONGs,elas falavam da dificuldade de criarparcerias, da burocracia. O marco legal eramuito fragmentado, disperso, desestru-turado. Falar em parceria com esse marcolegal não era possível. “ONG não é nadaem termos jurídicos, havia a necessidadede uma categoria específica” (CARDOSO,entrevista à autora, 6/11/06).

Deu-se início, em 1997, a um espaçodialógico entre governo e OSC, paradiscussão da reforma do marco legal doterceiro setor. “Conseguimos colocar atoresmuito diferenciados que não estavamacostumados a entrar em diálogo dessetipo. Nós ampliamos o debate com áreasnovas do terceiro setor, que não tinhamvoz” (CARDOSO, entrevista à autora,6/11/06).

O principal produto da reforma foi aLei 9.790/99 que criou a qualificação(título) de Oscip (Organização da Socie-dade Civil de Interesse Público). Seu

arcabouço conceitual foi influenciado poralguns dos princípios da reforma gerencialproposta pelo Governo Federal, pelasmudanças nos papéis do Estado e dasociedade e pelo projeto político daComunidade Solidária. Além disso, contoucom apoio da comunidade de política dasONGs que estava debatendo a inade-quação da legislação, considerada antiga edesatualizada (de 1935 e 1950), e era restritaa algumas áreas e a alguns tipos de orga-nização tradicionais. A nova lei pretendiainstitucionalizar uma prática antiga, masinsuficientemente regulamentada, até então,que era a atuação pública de atoresprivados sem fins lucrativos.

O formato institucional do títulopretendia incentivar a gestão mais transpa-rente e eficiente, e incentivar a participaçãodas OSC por meio do termo de parceria,que buscava flexibilizar o controle dosmeios tendo como contrapartida transpa-rência, mecanismos de avaliação de resul-tados, de controle público e social maisrigorosos, com sanções no caso de usoindevido de recursos.

Os empreendedores Dona Ruth e oConselheiro Augusto de Franco, mentorda interlocução política e coordenador dareforma da legislação, esforçaram-se paraconvencer as autoridades sobre suasconcepções acerca do problema: o nãoreconhecimento institucional e legal dasONGs de novo tipo, com fins públicos,que surgiram durante a democratização, ea importância de seu fortalecimento,enquanto meio para gerar capital social nascomunidades, sem o qual não haveriadesenvolvimento social.

A Lei no 9.790/99 foi produto dadiscussão democrática e persuasão recíprocade atores políticos governamentais, nãogovernamentais, participantes em grausdiferenciados de suas decisões. A formação

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Elisabete Ferrarezi

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do consenso na sua elaboração ocorreumediante processamento de conflitos enegociação de interesses contraditórios,gerando um espaço público em que tantoos opositores quanto os defensores da leiestiveram dispostos a realizar negociaçõese sacrifícios, que ocorreram tanto no poderexecutivo, quanto no legislativo.

Esse pequeno resumo da experiênciada Comunidade Solidária permite-nosidentificar Dona Ruth Cardoso como umaempreendedora de destaque desse pro-cesso, pelo menos em dois sentidos. Umdeles, com base em Kingdon, (1995), emque se destaca seu papel na transformaçãode algumas idéias em programas ino-vadores, aproveitando a janela de oportu-nidade política que se abriu com a Presi-dência do Conselho e com o ambientefavorável a mudanças, principalmente àreestruturação do papel do Estado e àrevitalização do papel das organizações dasociedade civil na esfera pública.

O segundo sentido diz respeitoao comportamento empreendedor, àautonomia, inovação, autenticidade,

assunção de riscos, criatividade e aos valoresque a motivaram, aos seus objetivos políti-cos democráticos, cooperação, solidarie-dade, ética pública. Seu trabalho não foi criaruma grande instituição, nem desenhargrandes projetos, mas foi o de vagarosa-mente demonstrar que programas emparceria eram possíveis de serem feitos, eaumentavam o valor público das ações.E com essa influência na agenda pública,Ruth Cardoso gerou projetos e mudançasque foram sendo disseminadas lentamente.

Talvez ela não concordasse com essaopinião, e talvez ela própria não tivesse adimensão de seu papel e de suas contri-buições para a geração de novos arranjosinstitucionais nas políticas públicas noGoverno Federal. Cabe agora aos pesqui-sadores investigar o legado deixado, aspropostas, os programas, os resultados eimpactos para que as contribuições e ascríticas sobre o modelo possam serdebatidas na esfera pública, tal como o fezDona Ruth.

(Artigo recebido em junho de 2008. Versãofinal em julho de 2008).

Notas

1 Após sair do governo, Dona Ruth criou a ONG Comunitas, que herdou alguns dos progra-mas criados pelo Conselho da Comunidade Solidária.

2 As principais rodadas de interlocução foram: Reforma Agrária, Renda Mínima e EducaçãoFundamental, Segurança Alimentar e Nutricional, Criança e Adolescente, Alternativas de Ocupaçãoe Renda, Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável, Marco Legal do Terceiro Setor e a Expansãodo Microcrédito no Brasil.

Referências bibliográficas

BRASIL. Conselho Comunidade Solidária. O Conselho da Comunidade Solidária. Textopara novos conselheiros. Brasília: março 1999 (mimeo).

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Legados da Professora Ruth Cardoso ao Governo Federal

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 237-244 Abr/Jun 2008

CARDOSO, Ruth. Entrevista à autora (Elisabete Ferrarezi), São Paulo, 6/11/2006. 2 fitas cassetes.CARDOSO, Ruth. DE FRANCO, Augusto. DARCY, Miguel. Um novo referencial para a ação doEstado e da Sociedade – Sete lições da experiência da Comunidade Solidária, Brasília: PNUD/Comunidade Solidária, 2000.FERRAREZI, Elisabete. A Reforma do Marco Legal do Terceiro Setor: A criação da Leidas OSCIP (Lei 9.790/99). Tese de doutorado apresentada ao Departamento deSociologia da Universidade de Brasília, Brasília, 2007.KINGDON, John W. Agendas, alternatives and public policies. 2a ed. EUA: Longman, 1995.

Elisabete FerrareziDoutora em Sociologia pela Universidade de Brasília, mestre em Administração Pública pela FGV/SP. É atualmenteCoordenadora Geral de Pesquisa da ENAP. Pertence à carreira do Governo Federal de Especialista em PolíticasPúblicas e Gestão Governamental desde 1996. Foi assessora do Conselho da Comunidade Solidária (1997-2002).Contato: [email protected]

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Estado, transnacionalidade e políticas globais

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RSP Revisitada

Estado, transnacionalidade epolíticas globais

Texto publicado na RSP de Set/Dez de 1994 (vol. 118, ano 45, n.3)

Alexandrina Sobreira de Moura

Transnacionalidade e grupos de pressão

Repensar o Estado significa cada vez mais abandonar as perspectivas

internalistas centradas no mero funcionamento da máquina administrativa e

partir para analisar os processos de gestão da sociedade fortemente permeados

pelo contexto internacional. Não se pode mais, por outro lado, discutir o Estado

dentro de uma visão dicotômica defendida pela corrente do realismo político ao

distinguir com nitidez a esfera doméstica da esfera internacional. Nesta linha,

autores como Mansbach, Rosenau e Keohane and Nye enfatizam o papel da

comunicação global que, ao abrir espaço para o desenvolvimento de organi-

zações não-governamentais e intergovernamentais, possibilita o surgimento de

grupos de pressão em escala transnacional. Esta corrente, de cunho eminen-

temente pluralista, corporificou, ainda na década de 70, a expressão crítica das

teorias que colocavam o Estado no centro de todo o processo decisório e

propunham a criação de um paradigma voltado para políticas globais.

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Alexandrina Sobreira de Moura

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Uma abordagem beyond the state privi-legia o desempenho de atores transnacionais,muitas vezes identificados como grupos depressão que, segundo Peter Willetts (1982),podem ser classificados em grupos setoriaisque procuram proteger um interesse espe-cífico na sociedade (sindicatos, associaçõesprofissionais, clubes recreativos) e grupospromocionais que se voltam para causasmais amplas, tais como aliviar a pobreza,promover o desarmamento nuclear,defender as minorias etc1. Importante frisarcom o autor que, sob este ângulo, a natu-reza da ação de certos grupos promocionaisnão pode ser entendida em termos políticoscomo assunto de um único país, ou mesmocomo tema restrito a dois países (1982: 21).E embora o conceito de transnacionalidaderefira-se às relações entre organizações forado Estado, o autor entende que o conceitode política global deva ser visto sob a óticado exercício do poder (entendida comouma possível esfera coercitiva), da disponi-bilidade de recursos econômicos e damobilização de legitimidade2 entre diversosgovernos, organizações intergovernamentaise grupos de pressão. Isto quer dizer queembora o Estado integre o âmbito dapolítica global, não deve ser visto como oator dominante, daí a importância de analisaro papel de atores não-governamentais,minimizando a centralidade com que oEstado tem sido analisado.

A rede que se tece tentacularmente emtorno de temas como poluição e meioambiente permite dizer que há atividadestransnacionais que conectam diferentesgrupos de pressão. Neste aspecto, deve-se ressaltar que não é a integração viaburocracia que explica a transnacio-nalidade, mas a integração temática evalorativa que embasa a ação dos diversosgrupos. A tendência, portanto, é de quenovas questões modelem o caráter desta

transnacionalidade e que o encami-nhamento de problemas específicos,principalmente os de cunho social, sejamarticulados por atores de diferentes países,sem que se recorra à esfera do Estado.Isto não equivale dizer, todavia, que osdesafios e novas ações não venham ainfluir na agenda estatal, na ação dosgovernos e, em escala mais concreta, naprestação de serviços pela administraçãopública3.

Atualmente, a despeito de grupos depressão serem considerados largamentecomo “uma característica dos sistemaspolíticos democráticos do Ocidente, elesestão presentes em todos os países”(WILLETTS, 1982: 9). Ao atuarem, coorde-nando programas internacionais e açõesespecíficas que ultrapassam fronteiras,abrem espaço para o surgimento de“organizações ponte” a que se refere DavidBrown (1991). Estas organizações podemdesempenhar o papel de facilitadoras derecursos, mediadoras de conflitos e, porse encontrarem na rede de intermediação,catalizam o surgimento de novos arranjosinstitucionais, embora estejam, por outrolado, sujeitas à demanda de atores interes-sados na questão do desenvolvimento. Aarticulação internacional e transnacionalvem, por incontáveis razões, sendofortalecida no meio das organizações não-governamentais4 e intergovernamentais, nosentido de:

1) reiterar o papel da sociedade comoprincipal agente promotor do desenvol-vimento,

2) criar uma “cidadania global paradefinir e implementar uma agenda paratransformações sociais”,

3) repensar o conceito convencional desoberania que torna o Estado-naçãovulnerável às tendências de interde-pendência global (Korten, 1990: 160-61).

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Estado, transnacionalidade e políticas globais

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Políticas globais, instâncias locais

Analisar as políticas globais como umanova tendência cooperativa, sem se restringira uma base territorial definida, sugere que opoder na arena transnacional se caracterizapela criação de um consenso entre os gruposque interagem coletivamente para respondera demandas comuns. Pautadas por um sensopós-burocrático, as organizações globaispara mudanças sociais (OGMS), como

intitulam os grupos de pressão trans-nacionais Cooperrider e Pasmore (1991),tendem a criar uma visão societal e desimbiose de estratégias que apontam parauma sociedade menos hierarquizada(conforme Pelmutter, 1986, citado porCooperrider e Pasmore, 1991:772) e derelações simétricas.

De um modo geral, assiste razão aCooperrider e Pasmore quanto à ênfasemagnificada da existência de um consensoentre os grupos transnacionais. Para osautores, uma mudança global pode serviabilizada, menos pelo consenso do que

pelo dissenso. A ausência de oponentespode destruir o dinamismo das OGMS,obstaculizando a força criativa da comuni-dade transnacional (1991:784-85). Nesteaspecto, é preciso ver em que dimensão,para além do papel articular, estas organi-zações têm aberto espaços para realizarparcerias e criar um (processo participativoque conduza segmentos da sociedadea influenciar nos processos de mudança(empowerment). Permeando esta arquitetura

organizacional, está a heterogeneidade e acomplexidade de relações que, se por umlado, instigam a interação, por outroimpõem desafios à bandeira transnacional.Como, por exemplo, levar até as últimasconseqüências a abordagem beyond the state,se é nas instâncias locais que as políticasglobais se corporificam? Por que excluir, apriori, o Estado de uma possível parceria,se há coincidência ou possibilidade deajustes entre as diversas pautas de ação? Omovimento transnacional não deveria seconstituir numa via de mão única entre asOGMSs e o Estado, até porque um dos

Repensar o Estado requer a compreensão do processo deglobalização que se consubstancia por meios de atores transnacionais.Neste aspecto, é importante discutir a forma de interação entre oEstado e o setor não-governamental que, atuando como grupos depressão, cria políticas globais que debilitam gradualmente acentralidade do Estado e geram uma crise de governabilidade. Como,todavia, as políticas globais se realizam em instâncias locais, aabordagem “beyond the state” torna-se vulnerável na medida em que oEstado é agente, senão definidor, implementador dessas políticas. Paratanto, torna-se oportuna uma parceria entre o Estado e o setor não-governamental, possibilitando que um processo descentralizador eparticipativo enseje elementos para redesenhar o Estado.

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Alexandrina Sobreira de Moura

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papéis dessas organizações deveria ser ode monitorar a implementação de políticasque, de algum modo, conseguiram,enquanto grupos de pressão, inserir naagenda estatal. À medida que esse fato seconfigurasse, o Estado tenderia, portanto,a adensar as políticas globais.

Ao questionar a perspectiva prática daspolíticas globais, Chadwick Alger (1990)argumenta que a implementação dessaspolíticas requer um grau de legitimidadeexpressa na concordância de milhares decomunidades. Nessa linha, o autor, aodefender que a análise de políticas globaisdeve ser estendida das comunidades locaisàs organizações de ação global, enfatiza queo desenho dessas políticas requer dos seuselaboradores um conhecimento consi-derável das instâncias locais (of. 1990:155).Ocorre, todavia, salienta o autor, que apreocupação em atuar dentro da perspec-tiva beyond the state termina colocando asorganizações não- governamentais interna-cionais distantes do público-meta, namedida em que elas se concentramem elaborar declarações, participar decomissões e eventos, e em alguns casoschegam a assumir uma postura estatal, emtermos de representação, para influir nadiscussão das políticas. Dessa forma, asorganizações passam a demonstrar mais“afinidade com o mundo beyond the statedo que com as comunidades” (1990:157).

Embora fuja ao escopo deste trabalhoanalisar a atuação das organizações não-governamentais nacionais ou locais, épreciso ressaltar que elas têm contribuídopara estabelecer o elo perdido entrealgumas organizações não-governamentaisinternacionais e as comunidades. Nesteaspecto, o entendimento das políticasglobais amplia o espectro de atores quelidam principalmente com as questões dedesenvolvimento em países pobres. Vale

ressaltar que o surgimento quase explosivodestas organizações tem tido um impactopolítico considerável na esfera estatal. ParaJulie Fisher, estabeleceu-se “um processointerativo de tomadas de decisão e deaprendizado dentro e entre o Estado eas organizações não-governamentais,baseado na criação e dispersão de poder”(1992:71). Registre-se, todavia, que àsemelhança de algumas organizações não-governamentais internacionais, as nacionaisse inclinam para um nível de burocratizaçãoque lembra a trajetória das organizaçõesgovernamentais; por outro lado, o caráteralternativo dos seus projetos, em algunscasos, assemelha-se àqueles desenvolvidospelo Estado. Estas considerações, entre-tanto, não eliminam o papel que as não-governamentais vêm desempenhando naredefinição de políticas, eminentemente asde caráter social, estejam elas contex-tualizadas ou não no bojo das políticasglobais. Noutro quadrante, pode-se dizerque a agilidade, flexibilidade, capacidadede inovar e de mobilizar legitimidade,características que credenciaram as organi-zações não-governamentais como atoresimportantes no cenário mundial, servempara indicar alguns pontos de estrangula-mento do Estado moderno.

Estado e o setor não-governa-mental: a caminho de uma parceria

A articulação internacional e o encami-nhamento de políticas globais por organi-zações não-governamentais (ou grupos depressão promocionais temáticos, ou, ainda,OGMS) oferecem um locus privilegiadopara repensar o papel do Estado, na medidaem que ele perde a sua centralidade políticaem detrimento da consolidação do espaçosocietal. Este processo, todavia, não se dáde forma coerente. Se a tendência à

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Estado, transnacionalidade e políticas globais

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transnacionalidade desfigura, por um lado,os limites do Estado nacional, por outro,não consegue concretizar as políticasglobalizantes sem que estas se configuremdentro da esfera estatal. Os liames neces-sários à integração do global ao local seencontram não apenas na sociedadearticulada transnacionalmente. A despeito dehaver uma vaga recusa à idéia de parceria, éinsustentável, como foi dito anteriormente,que o Estado seja alijado de um processoem que possa cooperar. Isto não significa,entretanto, advogar a presença incondicionaldo Estado em todas as causas encaminhadaspelo setor não-governamental (tambémchamado de terceiro setor ou setor inde-pendente). O que não se pode perder é aoportunidade para que o Estado reavalieas suas estratégias, inclusive da administraçãopública, quando do contato com outrasformas de agir e pensar o social. Estabe-lecer parcerias é partir para uma descentra-lização, ainda que momentânea e casuística,mas que a longo prazo possa viabilizar umainterconexão de ações e valores entre oEstado e o setor não-governamental(MOURA, 1994). Com isto não se quer inferirque o Estado teria que ser redesenhado

apenas a partir de forças exógenas e quenada mais poderia ser resgatado do seuinterior para a criação de um novo modelo.Afinal, como frisa Sanyal (1993), nem oEstado é completamente fracassado, nemas organizações não-governamentais sãototalmente exitosas.

O fato é que hoje não se pode maisrepensar o Estado sem uma referência aosetor não-governamental que, na esferatransnacional, flexibiliza as fronteiras doEstado nacional, sem poder, entretanto,ignorar que as bases sociais em que atuamtrazem de volta, com todo o vigor, oEstado para o cenário das políticas globais.Neste quadro globalizante, todavia, atendência é que o Estado, para nãoenfrentar maiores ameaças à sua governa-bilidade, passe a privilegiar um processode cooperação autônoma, onde aarticulação e a parceria lastreariam a defi-nição de suas políticas. Entre este caminhoe o da cristalização do Estado nacional,mas francamente em colapso, talvez sejamais instigante optar pela the road not taken,the road less traveled by. E num futuropróximo, certamente, esta escolha repre-sente uma grande diferença.

Notas

1 O autor analisa cinco categorias de grupos de pressão promocionais: agências para o bem-estare alívio da pobreza, organizações religiosas, grupos comunitários, partidos políticos e especific-issuegrupos. Este último concentra-se em implementar mudanças sociais, através de uma mudançaespecífica nas políticas públicas.

2 A mobilização de legitimidade, segundo Willets, deve ser vista como um vetor da capacidadepara o exercício do poder. Assim, por exemplo, o Movimento pela Anistia Internacional é maispoderoso do que um único governo, na medida em que se torna mundialmente reconhecido pelovalor moral de suas ações (of. 1982:25).

3 Embora não caiba detalhar neste texto as diferenças conceituais entre Estado, governo eadministração é importante frisar que não há uma identificação total de Estado e governo, na medida

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em que este, historicamente, antecedeu ao Estado, podendo, inclusive, existir sem ele. Quanto àadministração, o conceito está vinculado à prestação de serviços públicos. Segundo Andrew Vincent,a administração está mais próxima da idéia de governo, em sentido estrito, porque viabiliza aexecução de políticas, embora este não seja o seu motivo. (of. 1987:29-32).

4 O Union of International Associations ‘Yearbook of International Organizations vol. 1, 1989 apresentauma lista de 20 mil organizações não-governamentais transnacionais. (COOPERRIDER e PASMORE,1991: 765).

Referências bibliográficas

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Resumo – Resumen – Abstract

Estado, transnacionalidade e políticas globaisAlexandrina Sobreira de MouraRefletir sobre o Estado moderno requer a compreensão do processo de globalização, que se

consolida por meio de atores transnacionais. Dessa maneira, é importante discutir a forma de interaçãoentre o Estado e o setor não-governamental que, atuando como grupos de pressão, cria políticasglobais que debilitam gradualmente a centralidade do Estado e geram uma crise de governabilidade.Como as políticas globais são realizadas em instâncias locais, a abordagem beyond the state se tornavunerável na medida em que o Estado é agente, se não definidor, implementador dessas políticas. Paratanto, faz-se oportuna uma associação entre o Estado e o setor não-governamental, permitindo queum processo descentralizador e participativo favoreça os elementos para o redesenho do Estado.

Estado, transnacionalidad y políticas globalesAlexandrina Sobreira de MouraReflexionar sobre el Estado moderno requiere la comprensión del proceso de globalización que

se consolida por intermedio de actores transnacionales. En este aspecto es importante discutir laforma de interacción entre el Estado y el sector no gubernamental que, actuando como grupos depresión, cría políticas globales que debilitan gradualmente la centralidad del Estado y generan unacrisis de gobernabilidad. Como, sin embargo, las políticas globales se realizan en instancias locales, elabordaje “beyond the state” se vuelve vulnerable en la medida en que el Estado es agente, si nodefinidor, implementador de esas políticas. Para tanto, se hace oportuna una sociedad entre elEstado y el sector no gubernamental, permitiendo que un proceso descentralizador y participativofavorezca elementos para rediseñar el Estado.

The State, transnationality and global policiesAlexandrina Sobreira de MouraRethinking the modern State requires comprehension of the globalization process being carried

out by transnational agents. In that aspect, it is important to discuss the form of integrationbetween the State and the non-governamental sector, which – acting as pressure groups. createsglobal policies that gradually debilitate the centralization of the State and generate a crisis in theability to govern. However, since the global policies are carried out in local instances, the “beyond theState” approach becomes vulnerable since the State is the agent, if not the defining agent then theimplementing agent, of those policies. Therefore, a partnership between the State and the non-governmental sector becomes opportune to make possible a decentralizing and participation processwhich includes elements to redesing the State.

Alexandrina Sobreira de MouraPesquisadora do Departamento de Ciências Políticas da Fundação Joaquim Nabuco e professora titular de CiênciaPolítica da UFPE.Contato: [email protected]

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Alexandrina Sobreira de Moura

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 245-252 Abr/jun 2008

Imagem criada a partir de foto Arquivo CDES.

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Revista do Serviço Público Brasília 58 (2): 253-258 Abr/Jun 2008 253

A força propulsora do diálogo social

Reportagem

A força propulsora dodiálogo social

Lideranças sindicais, empresariais,sociais, além de intelectuais, acadêmicos erepresentantes de variados setores, têmtrabalhado desde 2003 em uma propostainovadora: pensar o Brasil que se deseja e,a partir daí, apresentar ao presidente daRepública indicações do rumo para tornaro País socialmente justo e economicamentesustentável.

Essa é a tarefa do Conselho de Desen-volvimento Econômico e Social (CDES),composto por 90 pessoas da sociedade civile 13 ministros, que se constitui em espaçode diálogo no qual a diversidade dos atoressociais, mais do que revelar a hetero-geneidade da população de um paíscontinental, possibilita ampliar os pontos devista e os argumentos sobre temas daagenda nacional, enriquecendo o debate equalificando as sugestões para um projetode desenvolvimento de longo prazo.

Com o surgimento do CDES, adiscussão de grandes temas deixou de seruma conversa de pequenos grupos, comacesso ao presidente, para ser um exercíciopleno de representação dos diversosgrupos, a maior parte dos quais não tinhacanal para seus pleitos e demandas aogoverno. “Não há mais vanguarda.O acesso e o f luxo de informaçãotornaram-se produtos de todos. Acaboua demanda de balcão, a visão tradicional

de um Conselho, que cooptava as pessoaspara a defesa de determinadas idéias. Agorao diálogo é sem rupturas. É um modode trazer governança, criar consenso,estabelecer espaço de convergência”, diz aresponsável pela Secretaria do Conselhode Desenvolvimento Econômico e Social(Sedes), Esther Bemerguy Albuquerque.

Agenda

O processo da construção de consensospassa hoje pela Agenda Nacional deDesenvolvimento (AND), cuja versãopreliminar foi elaborada por um Grupo deTrabalho (GT) integrado por, aproxima-damente, 50 conselheiros. Tal versão,apresentada na reunião plenária de maio de

CDES, espaço em que se discute a reforma tributária

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2005, resultou de estudos, debates, semi-nários realizados por especialistas sobre osprincipais problemas nacionais e elementospara uma visão de futuro do País.

Isso resultou na escolha de seis “âmbitosproblemáticos”, que incluem: 1) a extremadesigualdade social, já considerados osdiferenciais de gênero e raça; 2) a falta dedinâmica da economia para promover aincorporação do mercado interno potenciale a competição internacional; 3) a degra-dação da infra-estrutura logística; 4) a inexis-tência de um eficaz sistema nacionalpúblico/privado de financiamento doinvestimento e a irracionalidade da estru-tura tributária; 5) a insegurança pública ecidadã, bem como uma justiça poucodemocrática; e 6) a baixa capacidadeoperativa do Estado.

Durante um ano e meio, a AgendaNacional de Desenvolvimento foi cuida-dosamente construída, possibilitando aelaboração pelo CDES de documento queelegeu 27 estratégias essenciais ao cresci-mento do País, com eqüidade, e a seisobjetivos, decorrentes dos maioresproblemas identificados. Todos os conse-lheiros participaram da etapa de ajuste dodocumento, fundamental para a aprovaçãopor consenso da versão final, na plenáriade agosto de 2005.

A Agenda Nacional de Desenvol-vimento compreende, assim, uma perspec-tiva permanente de visão de futuro do Paíssob a ótica dos conselheiros, contribuindonão apenas com a descrição dos problemasque devem ser enfrentados, mas comsugestões para objetivos a serem alcan-çados e as diretrizes estratégicas paranortear as ações do governo e da socie-dade. Essa é uma importante novidade nocenário brasileiro por se tratar de umaconstrução coletiva, que envolve múltiplossegmentos da sociedade – com eixo nasuperação das desigualdades – e aposta na

eqüidade como critério para alcançar essepropósito.

Observatório

A criação do Observatório da Eqüi-dade, em março de 2006, surgiu danecessidade de o CDES ter instrumentospara monitorar o processo de desenvolvi-mento nacional, uma vez que não existia,até então, uma metodologia definida paraisso. A equipe técnica é formada pelo IPEA,IBGE, Dieese e pela Secretaria do Conselhode Desenvolvimento Econômico e Social.A gestão do Observatório está a cargodo Conselho Diretor, constituído por12 conselheiros do CDES.

“No começo, o diálogo interinsti-tucional era difícil, já que não haviaprecedente. As entidades nunca tinhamconstruído nada juntas. Em 2007, entre-tanto, a soma dos esforços fortaleceu aintegração”, explica a secretária EstherBemerguy Albuquerque.

O Observatório tem a finalidadede acompanhar o enfrentamento doproblema e apoiar a proposição de polí-ticas públicas e ações sociais capazesefetivamente de promover maioreqüidade. É responsável por produzirinformação e conhecimento, de modo asubsidiar o CDES e propor estratégias einstrumentos para o desenvolvimentodo País. Sua produção deve, ainda, ampli-ar o conhecimento e a capacidade dea sociedade debater, avaliar e cobrarresultados das políticas governamentais edas ações dos demais atores sociais.

Para o conselheiro e integrante daExecutiva Nacional da Associação Brasi-leira de Organizações Não-Governa-mentais (Abong), José Antonio Moroni, oObservatório é um instrumento doConselho que, em sua formatação, não selimita à atuação interna. “Tanto é que existe

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a Rede de Observação. Ela envolve organi-zações que não integram o CDES. Há umconvite permanentemente aberto para queoutras organizações e pesquisadoresvenham para a Rede, de modo a tornar oObservatório um amplo instrumento dedebate da sociedade”, diz.

O primeiro problema trabalhado peloObservatório da Eqüidade foi a desi-gualdade no acesso e na qualidade daeducação, tema imprescindível porque nãose imagina um país na rota do desenvol-vimento sem contemplar a qualidade e auniversalização do ensino. Ao Observatóriocaberia apontar as causas dessa situaçãode desigualdade e definir indicadores deacompanhamento do desempenho dasações para elevar a escolaridade da popu-lação em todo o território nacional.

Missão cumprida. Em pouco menosde um ano, um Grupo de Trabalho cons-truiu a metodologia, democratizou omodelo explicativo da Educação com todaa rede social ligada aos conselheiros, erealizou a primeira rodada de produçãode indicadores. O diretor técnico do Dieesee conselheiro do CDES, Clemente GanzLúcio, fala da importância desse trabalho:“A partir dos desafios e problemas que oConselho seleciona, o Observatórioorganiza uma abordagem técnica queproporcione à diversidade de opiniões umdiferencial comum para a discussão polí-tica”. Ele explica que, ao apontar causas eselecionar indicadores, o Observatóriopossibilita maior objetividade e agilidadeao debate. “Daqui a um ano, quando oConselho voltar a analisar a Educação,utilizará as informações geradas peloObservatório e terá condições de ver aevolução histórica, saber como caminhoua universalização, se melhorou a qualidadedo ensino”, comenta.

Mais dois temas foram indicados epossuem grupos de trabalho constituídos.

Um para avaliar a questão da reformatributária e, outro, para analisar a bioenergia.

Reforma

Percebida como eixo estratégico parao desenvolvimento com eqüidade, areforma tributária tem sido um dos temasmais importantes na pauta de discussões edeliberações do CDES, desde 2003. Sãodaquele ano as primeiras recomendaçõesdo Conselho ao projeto de lei que seriaencaminhado ao Congresso Nacional,entre as quais se destacam a adoção deimposto estadual unificado com legislaçãoe normatização uniformes, reduzindo eeliminando as 27 legislações diferentes; adesoneração da folha de pagamento; e aincidência não-cumulativa das contribuições.

Ainda em 2003, foi assinado peloConselho o “Acordo sobre a CargaTributária”, no qual era destacado ocompromisso, na elaboração da Propostade Emenda Constitucional (PEC), de nãoelevar a carga tributária.

A Agenda Nacional de Desenvol-vimento, aprovada em 2005, tambémabordou o assunto. Entre seus objetivos,havia o de “.. construir uma estruturatributária simplificada e racional, comtributos de qualidade, progressiva eestimuladora da produção e do emprego”.

Oficina realizada em 2008 debate os indicadoresde qualidade do sistema tributário

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Em 2006, quando o CDES elaboroudiretrizes, tendo como horizonte de longoprazo o ano de 2022, entre os 24 enun-ciados consensuais, envolvendo diversostemas, destacava-se a necessidade dareforma tributária. Naquele documento,os conselheiros pactuaram a necessidadede redução da carga fiscal para um patamarem torno de 33% no prazo máximo decinco anos, bem como de garantia dascondições necessárias para que os estadospratiquem uma política tributária querespeite os princípios de neutralidade ejustiça social. “Para isso, a reforma tribu-tária deve isentar de ICMS os alimentos eremédios e implementar o princípio dodestino para o ICMS por meio da elimi-nação gradual do imposto interestadual,como forma de acabar com a guerra fiscale as fraudes”, relata o documento.

Em 2007, com a conjuntura econô-mica e política do País mostrando-sefavorável ao debate da reforma tribu-tária, o CDES formou um novo grupode trabalho para apoiar o tema. Naatuação do Observatório, estava apossibilidade de aprofundar o assunto edefinir indicadores que ajudem a acom-panhar os efeitos das mudanças propostas.As contribuições do CDES estão reunidasno documento “Reforma tributária: umeixo estratégico para o desenvolvimentocom eqüidade”, divulgado no final de2007, após seis reuniões com dirigentes doMinistério da Fazenda para discutir eesclarecer pontos de convergência e dedivergência entre as propostas do Exe-cutivo e as do Conselho.

Pluralidade

O CDES entende como urgente enecessária a reforma por considerar omodelo atual um desestímulo aos investi-mentos produtivos, mas não concorda

integralmente com a proposta do governo.Para o Conselho, a reforma deve ir alémda simplificação de impostos indiretos:“Os impostos indiretos, cobrados sobreo consumo – de modo uniforme de ricose pobres – constituem a maior parcela dosimpostos arrecadados, fazendo com queo ônus da contribuição recaia sobre os maispobres. Promover uma distribuição socialmais justa da carga tributária deve ser oobjeto da reforma”.

Clemente Ganz Lúcio, que compõe abancada dos trabalhadores no Conselho,diz que o governo tem discutido areforma, mas o Observatório não quer serestringir a ela. Pretende analisar o sistematributário e criar demandas para umasegunda geração de reformas, que visema atacar o problema da justiça e daeqüidade.

“O Grupo de Trabalho já analisou areforma apresentada pelo governo econcluiu que ela melhora o que existe hojeporque simplifica tributos e enfrenta oproblema da guerra fiscal. Entretanto, éuma proposta que apresenta muitas falhas,ao não tratar da regressividade do sistema,da desvinculação de receitas que até entãotinham destino certo...”, diz o diretortécnico do Dieese.

O representante da Abong no CDES,José Antonio Moroni, também se preo-cupa com a desvinculação das receitas. Eleressalta que “o principal nó dessa reformaestá relacionado ao orçamento daseguridade ou contas vinculadas às políticassociais: seguridade, saúde, previdência,assistência, educação e trabalho, FAT, PIS”.Para ele, está havendo um desmonte doque foi conquistado como proteção socialna Constituição de 1988. “A proteçãoestará assegurada porque é um direito, masnão haverá recurso para garantir o finan-ciamento das ações associadas a essaspolíticas”, explica, ressaltando que a

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observação estará presente na construçãodos indicadores, para que se possa tentarevitar perdas à sociedade.

Moroni lembra ainda que a primeiraproposta de reforma do presidente Lula,em 2003, tinha como princípio a justiçatributária: quem mais tem, mais contribui;quem menos tem, menos contribui. “Eexatamente quem menos contribui é quedeve ter mais acesso ao serviço público –o inverso do que ocorre hoje”, comenta.

Nem todos concordam com essadefinição de justiça tributária. O empresárioAntoninho Trevisan critica a idéia doimposto progressivo e diz que o mundotodo caminhou de modo diferente. “Cadapaís buscou simplificar a forma de agir, ouseja, buscou ter menos alíquotas para fazera justiça fiscal na aplicação. Eu, inclusive,cobro a tendência de haver uma alíquotaúnica em todo o mundo. Arrecada-se umpercentual igual e aplica-se de forma dife-renciada: quem ganha muito, recebe 0,5%;quem ganha pouco, recebe 95,5%”.

Para o empresário do ramo contábil,que trabalha há quase quatro décadas como tema, é inócua e frustrante a tentativa de

arrecadar e distribuir a renda, ao mesmotempo. Ele defende um sistema tributáriosimples, fala da importância de uma fisca-lização atuante, mas, especialmente, de umarigorosa aplicação dos recursos – naspalavras de Trevisan, é necessário um olharmuito mais claro sobre como dividimoso que é arrecadado.

“O tributo no Brasil sempre foi geradoem um ambiente fiscal deficitário e, assim,não se cuidou da justiça tributária e fiscal.Agora podemos pensar nisso porque oBrasil está muito bem, do ponto de vistaeconômico. Mas entendemos que é precisodiscutir o sistema tributário (receita) e osistema fiscal (receita e despesa). Só assim,pensando na alocação do gasto, é quepodemos suprir de maneira eficaz as defi-ciências na distribuição de renda”, diz oempresário.

Todas essas questões foram analisadasno seminário Reforma Tributária, reali-zado no dia 15 de maio, em Brasília, quereuniu representantes do Executivo, doLegislativo, do empresariado, das organi-zações sociais e do meio sindical. Entre ospresentes, o ministro das Relações

Proposta do Executivo

O governo apresentou este ano, ao Congresso Nacional, a PEC 233/08, que traz suasproposições para a reforma tributária. Entre as mudanças previstas para corrigir distorções,destacam-se a simplificação na cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Pres-tação de Serviços (ICMS), que passaria a ter alíquotas unificadas nacionalmente; a eliminaçãoda guerra fiscal, a partir da transição, ao longo de oito anos, da cobrança na origem para acobrança no destino; a desoneração da folha salarial, com a extinção da contribuição social doSalário-Educação e com a redução de 20% para 14% da contribuição dos empregadores paraa Previdência.

O Executivo propõe ainda a extinção dos tributos vinculados ao financiamento da seguridadesocial (Cofins, CSLL), ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e ao BNDES, e à infra-estrutura de transportes e outras finalidades (Cide-Combustíveis).

Está prevista também a criação do Fundo de Equalização de Receitas (FER), cujos recursosseriam utilizados de forma decrescente para a compensação dos estados pela desoneração dasexportações, e de forma crescente para a equalização dos efeitos da reforma.

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Institucionais da Presidência da República,José Múcio Monteiro Filho; os presidentesdo Congresso Nacional e da Câmara dosDeputados, senador Garibaldi Alves edeputado Arlindo Chinaglia; o relator daComissão Especial da Reforma Tributária,deputado Sandro Mabel; o secretário dePolítica Econômica do Ministério daFazenda, Bernard Appy; e o secretárioda Receita Federal do Brasil, Jorge Rachid.

Paralelamente ao seminário, o Obser-vatório da Eqüidade realizou duas oficinas:“Justiça Fiscal: Reforma Tributária eDistribuição de Riqueza”, que teve comopalestrante o presidente do Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea),Márcio Pochmann, e “Indicadores deQualidade do Sistema Tributário”, quandoforam discutidos os indicadores que oConselho gostaria de acompanhar paraavaliar os rumos da reforma e sua capaci-dade de alcançar efetivamente os objetivosde maior eqüidade fiscal.

O compromisso político assumidopelo Conselho de DesenvolvimentoEconômico e Social configura um impor-tante passo para se alcançar um pródigohorizonte social a partir de uma estraté-gica e progressiva rota de produção,eqüidade e justiça tributária.

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RSPPara saber mais

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Sobre Políticas Públicas

SARAVIA, Enrique; FERRAREZI, Elisabe-te (Organ.). Coletânea Políticas Públicas.Brasília: ENAP, 2006. 2 v. Artigos autori-zados pelos autores estão disponíveis paradownload em www.enap.gov.br

• www.unb.br/ceam/np3/• www.lpp-uerj.net/• www.anesp.org.br/

Sobre Conselhos Municipais

SANTOS JUNIOR, Orlando Alvesdos. Democracia e governo local: dilemasda reforma municipal no Brasil. Rio deJaneiro: Revan, 2001. 246 p.

• web.observatoriodas metropoles.net

Sobre Governança

PETERS, Guy. The future ofgoverning: four emerging models. Kansas:University Press of Kansas, 1996. 179 p.

LA Gobernanza Hoy: 10 textos dereferencia / Coordenado por: AugustíCerrillo i Martínez. Madrid: INAP, 2005.262 p. (Estudios Goberna). ISBN8473512391.

Para saber mais

Sobre Educação

LUCK, Heloisa; PARENTE, Marta.Correção do fluxo escolar: o caso doParaná. Brasília: IPEA, 2002. 42 p. (Textopara Discussão, 925).

• www.mec.gov.br• portalideb.inep.gov.br

Sobre Agricultura e FinanciamentoAgrícola

SCHNEIDER, Sergio; SILVA, MarceloKunrath; e MARQUES, Paulo EduardoMoruzzi (Organ.). Políticas Públicas e Partici-pação Social no Brasil Rural. Porto Alegre:UFRGS, 2004. 252 p. (Estudos Rurais).

• www.embrapa.br/• www.mda.gov.br/saf/index.php• www.bndes.gov.br/index.asp

Comentários, observações e sugestões sobre a RSP devem ser encaminhados à editoria darevista, para o e-mail [email protected] ou por carta, para o endereçoSAIS Área 2-A – Sala 116 – CEP: 70610-900 – Brasília, DF, a/c Editora da RSP.

Fale com a RSP

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RSP Para saber mais

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RSPAcontece na ENAP

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13º Concurso Inovação está com inscrições abertas

Estão abertas até o dia 15 de agosto as inscrições para a13ª edição do Concurso Inovação na Gestão Pública Federal.Podem concorrer ações e projetos inovadores implementadoshá pelo menos um ano em órgãos públicos e entidades dogoverno federal. Em 2008, entre os prêmios que serão con-cedidos às 10 experiências selecionadas, estão visitas técnicaspara a França, para a Espanha e, a novidade desta edição, para o Canadá. Tambémserão oferecidas vagas em cursos de especialização e gerenciamento da ENAP, assina-turas da Revista do Serviço Público (RSP), além da publicação de um livro com osrelatos das iniciativas.

Promovido pela ENAP em parceria com o Ministério do Planejamento, Orçamentoe Gestão, o Concurso conta com o apoio da Embaixada da França, da CooperaçãoEspanhola, da Escola Canadense do Serviço Público (CSPS) e da Agência Canadensepara o Desenvolvimento Internacional (CIDA). O Prêmio busca valorizar os servidoresque atuam de forma criativa em suas atividades e contribuem para a melhoria dosserviços públicos prestados ao cidadão pelo governo federal.

Outras informações em http://inovacao.enap.gov.br

Júri de notáveis seleciona vencedores do Prêmio ODM Brasil 2007

No dia 15 de abril, um júri formado por 13 conceituadosprofissionais da administração pública, de organismos internacionais,de movimentos sociais, de grupos empresariais e de universidades sereuniu na ENAP para escolher as 20 iniciativas vencedoras da segundaedição do Prêmio ODM Brasil – Objetivos de Desenvolvimento doMilênio (www.odmbrasil.org.br).

O Prêmio tem o propósito de destacar projetos que colaboremcom o desenvolvimento sustentável, por meio de ações economi-camente viáveis, socialmente justas e ambientalmente corretas.

A edição de 2007 recebeu 1.062 inscrições de programas e projetos. Forampré-selecionados 161, que responderam a um questionário. Em seguida, foram escolhidas42 iniciativas – 20 de prefeituras e 22 de organizações da sociedade civil –, que rece-beram visitas “in loco” do comitê técnico integrado pela ENAP e pelo Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

O Prêmio ODM Brasil é uma iniciativa pioneira no mundo e foi proposta peloGoverno Federal durante a abertura da I Semana Nacional pela Cidadania e Solidarie-dade, em 2004. Ele é coordenado pela Secretaria-Geral da Presidência da República, emparceria com o Programa Nacional das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

Acontece na ENAP

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RSP Acontece na ENAP

Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 261-262 Abr/Jun 2008262

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio foram estabelecidos durante a reuniãoda Cúpula do Milênio, realizada em 2000, em Nova Iorque (EUA). Líderes de 191nações oficializaram um pacto para tornar o mundo mais justo e mais solidário até 2015e, para isso, definiram oito iniciativas: erradicar a pobreza e a fome; atingir o ensinoprimário universal; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres;reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, amalária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental; e estabelecer uma parceriamundial para o desenvolvimento.

Projeto reúne informações sobre capacitação em Escolas de Governo

No dia 29 de maio, a ENAP apresentou a dirigentes da RedeNacional de Escolas de Governo o projeto de pesquisa “Mapada Oferta de Capacitação”. A iniciativa, realizada em uma pers-pectiva participativa, vai coletar e organizar dados sobre ostrabalhos dessa área produzidos nas instituições que integram aRede, além de sistematizar e disponibilizar as informações gerenciaisaos dirigentes encarregados de promover o aperfeiçoamento dosservidores públicos.

O banco de dados – que poderá ser constantemente acessado e atualizado pelasescolas parceiras – procura fortalecer a construção coletiva da proposta da Rede, bemcomo facilitar os meios de integração do trabalho realizado por ela. Busca tambémfornecer aos gestores os meios para planejar e realizar processos de capacitação, melhorara coordenação das atividades dessa área, incentivar a complementaridade, reduzir aduplicidade e ampliar a comunicação.

O “Mapa da Oferta” foi criado a partir da identificação, pelo Comitê Gestor dePolítica Nacional de Desenvolvimento de Pessoal (PNDP), da necessidade demapeamento dos dados sobre as demandas de capacitação no Brasil, essenciais para aelaboração de estratégias e de programas de aperfeiçoamento.

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Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 263-266 Abr./Jun. 2008 263

Normas para oscolaboradores

A Revista do Serviço Público aceita trabalhos sempre inéditos no Brasil, na formade artigos, ensaios e resenhas, sobre os seguintes eixos temáticos: 1. Estado e Sociedade,2. Políticas Públicas e Desenvolvimento e 3. Administração Pública.

1. Artigos: deverão ter até 25 páginas e um total de 30 mil a 35 mil caracteres, acompanhados de um resumoanalítico do artigo em português, espanhol e inglês, de cerca de 150 palavras, que permita uma visão global eantecipada do assunto tratado, e de 3 palavras-chaves (descritores) em português, espanhol e inglês queidentifiquem o seu conteúdo. Tabelas, quadros e gráficos, bem como notas devem limitar-se a ilustrarconteúdo substantivo do texto. Notas devem ser devidamente numeradas e constar no final do trabalho e nãono pé da página. Referências de autores no corpo do texto deverão seguir a forma (AUTOR, data). Referênciasbibliográficas devem ser listadas ao final do trabalho, em ordem alfabética, e observar as normas da ABNT.Exemplos:Referências no corpo do texto(ABRUCIO, 1998)Referências bibliográficas

LivroCASTRO, José. Direito municipal positivo. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.Artigo em coletâneaGONDIM, Linda. Os ‘Governos das Mudanças’ (1987-1994). In: SOUZA, Simone (org.), Uma nova históriado Ceará. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2000.Artigo em periódicoBOVO, José. Gastos sociais dos municípios e desequilíbrio financeiro. Revista de Administração Pública,Rio de Janeiro, 35(1), p. 93-117, jan/fev, 2001.Monografia, dissertação ou tese acadêmicaCOMASSETTO, Vilmar. Conselhos municipais e democracia participativa sob o contexto dodesenvolvimento sustentável na percepção dos prefeitos municipais. 2000. Dissertação. (Mestrado) –Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina.

2. Ensaios e resenhas: deverão ter até 10 páginas e um total de 15 mil a 17 mil caracteres.3. Vinculação institucional: Artigos, ensaios e resenhas devem vir acompanhados de uma breve informação

sobre a formação, vinculação institucional do autor (em até duas linhas) e e-mail para contato.4. Avaliação: a publicação dos textos está sujeita à análise prévia de adequação pela editoria da revista e avaliação por

sistema de “blind review” de 2 a 3 pareceristas, os quais se reservam o direito de sugerir modificações ao autor.5. Encaminhamento: Os originais de todos os trabalhos devem ser encaminhados em arquivo digital, em

formato de uso universal (.doc, .rtf ou .txt) e enviados para [email protected]. Os originais enviados à ENAPnão serão devolvidos. A ENAP compromete-se a informar os autores sobre a publicação ou não de seustrabalhos.

Para mais informações acesse www.enap.gov.br

ENAP Escola Nacional de Administração PúblicaDiretoria de Comunicação e PesquisaSAIS Área 2-A Brasília, DF – CEP 70610-900Tel: (61) 3445 7438 – Fax: (61) 3445 7178E-mail: [email protected]

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Gestão Social:como obtereficiência eimpacto naspolíticassociais?

Ernesto Cohen e Rolando Franco demons-tram neste livro a importância das políti-cas sociais como fator de promoção daeqüidade. Eles entendem que a eqüidadeultrapassa o conceito de igualdade perantea lei e está relacionada à superação dasdesigualdades pela compensação das barreiraseconômicas e sociais que dificultam a reali-zação do potencial de cada indivíduo.A linguagem fluida, de fácil entendimento,faz com que o leitor se aproxime doconteúdo apresentado, entendendo evisualizando com clareza o que são aspolíticas sociais.

Estudos de Caso:O licenciamentoambiental parahidrelétricas doRio Madeira(Santo Antônioe Jirau)

Com o propósito de ampliar o acesso dasescolas de governo a recursos pedagógicosteórico-aplicados, a ENAP criou uma linhade pesquisa para a elaboração de estudos

de caso. O primeiro deles aborda olicenciamento ambiental para hidrelétricasdo rio Madeira e foi elaborado, por solici-tação da Coordenação de Pesquisa daENAP, pelos pesquisadores AmâncioOliveira, João Paulo Cândia Veiga e JaninaOnuki, do Centro de Estudos dasNegociações Internacionais da USP. O casofoi escolhido por evidenciar negociaçõesmultilaterais de representantes das esferaspública e privada, com interesses diversos.Embora destinado a cursos de negocia-ção, constitui material didático flexível,passível de ajustes para outros usos.

Açõespremiadas no12o ConcursoInovação naGestão PúblicaFederal

As dez experiênciaspremiadas na 12a edição do ConcursoInovação estão descritas neste livro. A obrapretende, além de divulgar os trabalhos,estimular a geração de iniciativas inovadorasna administração federal de modo acontribuir para que o Estado brasileiroaumente a qualidade do atendimento emelhore a eficácia e eficiência dos serviçosprestados aos cidadãos. O concurso épromovido pela ENAP e pelo Ministériodo Planejamento, Orçamento e Gestão, comapoio da embaixada da França e daCooperação Espanhola.

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Revista do Serviço Público Brasília 59 (2): 263-266 Abr./Jun. 2008

RSP

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Formas de pagamento

Os interessados em adquirir as publicações ENAP poderão dirigir-se diretamente à sede da Escolaem Brasília ou solicitá-las por fax ou pelos Correios, informando os títulos das publicações eendereço completo para entrega.O pagamento pode ser realizado por meio de uma das formas a seguir:1. Nas agências do Banco do Brasil:

• Compareça ao caixa e solicite o depósito do valor das publicações na Conta Única do Tesouro Nacional, Agência 1607-1 Conta 170.500-8, informe seu CPF ou o CNPJ de sua instituição e o código identificador 11470211401288187.• Posteriormente, encaminhe o comprovante de depósito juntamente com o Cartão de Aquisição para a ENAP.

2. No sítio do Banco do Brasil (www.bb.com.br), por meio de transferência entre contas correntes(para clientes do Banco do Brasil):• Acesse sua conta.• Na guia “Transferências”, clique em “para Conta Única do Tesouro”.• Digite o valor total das publicações solicitadas.• No campo “UG Gestão finalidade”, digite o código identificador: 11470211401288187.• No campo CPF/CNPJ, digite o seu CPF ou o CNPJ de sua instituição.• Em seguida, prossiga com a transação normalmente, como se fosse uma transferência comum entre contas correntes.• Imprima o comprovante e encaminhe-o para a ENAP juntamente com o Cartão de Aquisição.

3. Nos terminais de Auto-Atendimento do Banco do Brasil (para clientes do Banco do Brasil):• Na tela principal, selecione a opção “Transferência”;• Na próxima tela, selecione a opção “Conta corrente para Conta Única do Tesouro”;• Em seguida, digite o valor total das publicações solicitadas e tecle Ok;• Na próxima tela, digite no campo Identificador 1 o código 1147021140128818-7 e no campo Identificador 2 o seu CPF ou o CNPJ de sua instituição.• Prossiga normalmente com a transação, como uma transferência comum.• Encaminhe posteriormente o comprovante de transferência juntamente com o Cartão de Aquisição para a ENAP.

4. Enviar nota de empenho (com original anexado) em nome de: ENAP Escola Nacional deAdministração Pública – CNPJ: 00.627.612/0001-09, UG: 114702, Gestão: 11401

5. Enviar por fax ou pelos Correios, a Guia de Recolhimento da União (GRU Simples) paga noBanco do Brasil com o valor das publicações. Acesse o link “Como adquirir” na página da ENAPpara maiores informações.

ENAP Escola Nacional de Administração PúblicaDiretoria de Comunicação e PesquisaSAIS – Área 2-A70610-900 – Brasília, DFTel: (61) 3445 7096 / 3445 7102 – Fax: (61) 3445 7178CNPJ: 00 627 612/0001-09Site: www.enap.gov.brE-mail: [email protected]