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Pedagogia 2010
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho monográfico apresenta como tema “ A percepção que a criança
negra tem de si : marcas de uma história. Neste estudo é analisado como a criança negra se
percebe ou se vê representada no ambiente escolar, e quais fatores implicam ou auxiliam na
formação da sua percepção. Buscando no processo histórico a compreensão das relações
estabelecidas quanto às questões étnicas raciais, que definiram e refletem a representação do
negro na sociedade brasileira.
A proposta hora apresentada, é de fundamental importância, numa sociedade que tem
gerado e excluído pessoas pelo tom da pele, que tem dissimulado um discurso de igualdade,
numa tentativa de mascarar a realidade. Adentramos o período chamado de pós-moderno
ecoando discursos de igualdade, liberdade e fraternidade oriundos de ideais revolucionários
franceses. E sobre essa égide se tem constituído os princípios e relações em todos os espaços
sociais, onde podemos perceber através dos mecanismos socializador o efeito
homogeneizador que vem se delineado neste cenário. E esta tentativa acaba por segregar o
diferente, o não “padrão”.
Portanto, no atual contexto, se faz necessário discutir a questão étnico-racial, falar do
negro, da cultura afro-brasileira, em meio ao complexo de negação que viveram, nesse
enfoque a criança negra vê sua imagem refletida e ancorada num panorama de submissão e
inferioridade, e conseqüentemente de exclusão, e principalmente as possíveis marcas que
podem carregar, oriundas dos complexos de baixo-estima em que são vitimadas.
Tendo em vista que o fruto da pesquisa nos dá um entendimento sobre dada realidade,
a escolha da temática é alimentada através das experiências como professora durante os
estágios no decorrer do curso de Pedagogia, onde propusemos trabalhar com a cultura afro-
brasileira, na qual pudemos perceber a baixo-estima das crianças negras, a busca é também
intimamente relacionada com o fato de ser mãe de uma criança negra, preocupada com os
estereótipos proferidos na escola, e com as possíveis interferências na construção identitária
das crianças negras.
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Nesse intuito, trazemos como objetivo analisar e identificar a percepção que a criança
negra tem de si na convivência escola, vislumbrando como a escola tem projetado a imagem
do negro neste espaço. Apresentadas as primeiras considerações como elemento
impulsionador, a pesquisa trilhará caminhos que nos leve a fomentar discussões maiores sobre
a abordagem proposta.
No capítulo I, traçamos um esboço sobre a história da formação da sociedade
brasileira, trazendo uma breve retrospectiva dos grupos que constituíram o povo brasileiro,
enfocando os elementos, políticos, econômicos, sociais e culturais desta constituição.
No capítulo II, apresentamos os conceitos chaves, abordando a contribuição de
teóricos que discutem o modelo de sociedade e a questão étnico-racial, desde a análise sob o
ponto de vista histórico à presença atual do referencial de negro que a escola e a sociedade
tem transmitido.
No capítulo III, discorremos a metodologia, subsidiados em autores para a realização
da pesquisa. Conhecemos mais detalhadamente o lócus e os sujeitos da pesquisa. procurou-se
a aplicação da metodologia que melhor se adequou ao objetivo pré-determinado.
No capítulo IV, apresentamos as análises e interpretações dos resultados, utilizamos
como instrumentos a observação participante e a entrevista semi-estruturada. Onde, foram
analisados e identificados as percepções que os sujeitos tem sobre si, fazendo uma circulação
desses discursos com a fudamentação teórica, nos permitindo ampliar a visão dessas
percepções.
Nas considerações finais enfatizamos nossas indagações sobre a percepção que a
criança negra tem de si. Acreditamos que esse estudo possa fornecer a todos, informações que
os levem a uma reflexão sobre as questões étnico-raciais, sobre a criança negra, sobretudo a
responsabilidade dos sujeitos em fomentar maiores reflexões acerca da problemática, da
valorização do ser humano, da cultura afro-brasileira, como ferramenta facilitadora na
diminuição de barreiras existentes entre ser negro e ser branco no Brasil. Esperamos que esta
pesquisa possa contribuir de sobremaneira como fonte para outras pesquisas na área.
11
CAPÍTULO I
1.PROBLEMÁTICA – UM RÁPIDO MERGULHO: MARCAS DE UMA
HISTÓRIA
Numa sociedade de base escravocrata como a nossa, falar de diversidade cultural, de
identidades, de ser negro, é relembrar os processos nos quais essa sociedade foi gerada. É
relembrar a crueldade e desumanização que este sistema impôs a população negra.
É comum conceber o século XVIII como um grande marco de descobertas e
conquistas, nesta ênfase, destacamos as grandes navegações. Os europeus como pioneiros
nessa empreitada, narram as grandes conquistas, que além de interesses políticos e
econômicos, destacou-se uma soberania eurocêntrica e etnocêntrica. Neste cenário, o Brasil é
palco de “impressões” negativistas. Os que aqui chegaram subjugam os nativos como
primitivos. Inicia-se assim a escravidão no Brasil, primeiramente com os índios. Visando
obter mais lucros os portugueses utilizam-se do tráfico de africanos. Capturados, homens,
mulheres e até crianças, tratados como mercadorias e transportados em péssimas condições
nos porões dos navios. Desta forma os negros são inseridos nas terras brasileiras, como
escravos. Dentre outros discursos para “justificar” tal barbárie, a cor da pele foi estigma
utilizado, por mais de três séculos de escravidão no nosso país.
Portanto, as características raciais tornam-se fator determinante, para o domínio de
alguns sobre outros. A partir de então, a figura do negro é desconfigurada e o negro torna-se,
assim, sinônimo de ser primitivo, inferior, dotado de uma mentalidade pré-lógica
(MUNANGA, 1986).
Nesse viés, vidas e culturas foram massacradas, sufocadas e subvertidas, e ainda hoje
respiramos infelizmente os resquícios desse sistema, onde percebemos a caricaturização da
figura do negro associado ao escravo, atribuídos preconceitos que de certa forma,
“naturalizou-se” mesmo quando não são percebidos na prática, ainda é saliente no imaginário
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da sociedade pós-abolição. Tais imagens negativas produzidas desse longo processo histórico
afetaram não somente a vida dos que foram escravizados, mas a geração de afro descendentes.
Dessa maneira, adentramos o período chamado de pós-moderno ecoando discursos de
igualdade Chauí (1984) relaciona que a sociedade atual, capitalista, baseia-se nos princípios
da burguesia – liberdade, igualdade e fraternidade, para construir sua base do discurso
ideológico. Assim, o “novo mundo,” abriu suas janelas propondo rupturas e transformações
com os acontecimentos passados, o que vale agora é pensar pela razão.
Questionamentos que até então foram negados e invisibilizados, colocam-se em
evidência. A própria concepção de homem, a valorização da criança, a diversidade cultural, a
construção de novas perspectivas no processo de organização social e de formação humana, a
reflexão do novo modelo, fincado na racionalidade torna-se, dessa forma, uma busca
incessante por uma sociedade mais humana e igualitária. Nesse enfoque Santos (2001) faz o
seguinte comentário:
Agora que estamos descobrindo o sentido de nossa presença no planeta,
pode-se dizer que uma historia universal verdadeiramente humana esta,
finalmente começando. A mesma materialidade, atualmente utilizada para
construir um mundo confuso e perverso, pode vir a ser uma condição da
construção de um mundo mais humano ( p. 174).
Com isso, somos levados à apagar as mazelas de outrora, perspectivando o futuro
numa base globalizada, que ecoa discursos de igualdade, numa desigualdade, que prima por
uma diversidade, segregando o diferente, que inclui excluindo, que sacia os desejos de alguns,
matando de fome outros tantos. Dentre outros, esses fatores demarcam nitidamente as
extremidades existentes entre os homens. Analisando a pseudo liberdade igualitária Baumam
(2000) tece o seguinte comentário:
Livre de rédeas políticas e das restrições locais, a economia em rápida
globalização e cada vez mais extraterritorial produz sabidamente diferenças
sempre maiores de riqueza e de renda entre os setores abastados e
depauperados da população mundial e em cada sociedade. É também sabido
que relega parcelas cada vez mais amplas da população não apenas a uma
vida de pobreza, miséria e destituição, mas também a uma permanente
exclusão de todo trabalho reconhecido como economicamente racional e
socialmente útil, de modo que essas camadas populacionais se tornam
econômica e socialmente supérfluas (p. 177).
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É sobre essa égide que se tem constituído os princípios e relações em todos os espaços
sociais, onde percebemos através dos mecanismos socializador o efeito homogeneizador que é
traçado nesta trama. No qual o modelo educacional tem servido de pano de fundo ao modelo
de sociedade. Nesse sentido a escola entra nesta lógica como uma das instituições que dará
“sustentabilidade” ao projeto de modernidade, ou ainda, que filtrará e /ou incorporará os
mecanismos difusores dos ideários desse sistema.
Percebemos que na educação da contemporaneidade, os discursos envolvendo a
identidade negra vêm ganhando espaço, sobretudo com as políticas afirmativas. O que
durante muito tempo foi traçando um olhar uniformizador, em que só é legitimado o que vem
da classe que domina, a escola encontra-se em xeque, diante da necessidade de trabalhar um
currículo na perspectiva da diversidade. Por outro lado consideramos que a educação tem
servido como instrumento sócio-cultural ideológico, onde são legitimados e perpassados
valores, numa visão homogeneizadora da cultura branca. É nessa complexa rede que as
identidades dos sujeitos são tecidas. Neste aspecto, salientamos a contribuição de Dayrell (
1996):
Surge à necessidade de se compreender melhor a teia de relações que se
estabelece dentro da escola, a partir do reconhecimento de que esta, como
uma instituição social, é construída por sujeitos sócio-culturais e,
consequentemente, é um espaço de diversidades étnico-cultural (p.85).
Em outras palavras, sobre a escola recai uma gama infindável de expectativas, pois, é
onde os grupos sociais interagem numa relação de diálogos e conflitos. Nesse enfoque,
encontram-se vestígios de que a cultura negra sempre esteve negada e silenciada, onde o povo
negro é sempre estigmatizado, estereotipado, visto como inferior, muitos estudiosos buscam
na ciência a explicação para a manutenção de um grupo sobre outro de dominação racial.
Produzindo, dessa forma discursos ideológicos.
Essa dominação ideológica perdurou e infelizmente ainda hoje, encontramos discursos
nesse sentido, tais falácias, tem introjetado idéias de inferiorização do negro, esse mecanismo
é enfatizado por Chiavenato (1987) quando diz:
Agora o escravo assume a sua feição definitiva na sociedade brasileira:
estigmatizado como NEGRO. Negro é marca, é sinal de inferioridade que
aumenta na medida do embranquecimento do país, diminuindo o número de
homens e mulheres pretos e aumentando o número de mulatos que aspiram à
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branquidão. A mistificação ideológica, a partir da abolição, toma rumos
menos retóricos, porque já não é preciso estimular teoricamente o
embranquecimento do país, que se faz “naturalmente” na medida em que se
fecham as portas da sociedade de classes para a participação do negro,
mantido inferiorizado pela herança da escravidão. Agora fala-se em
democracia racial, o novo mito que pretende esconder os conflitos em que se
envolvem negros e mulatos, criando barreiras imperceptíveis às vezes para as
próprias vítimas. (p.234)
Por outro lado, somos levados a crêr, sobretudo pela mídia, que os critérios eleitos
para eleger os ditos “padrões de beleza” é sempre o branco, sugerindo a imagem do negro
estereotipada e esvaziada dos conceitos de beleza estética. Nesse viés as crianças negras vê
sua imagem de forma depreciativa e inferior.
Além disso, a compreensão da história na constituição do povo brasileiro que
aprendemos na escola quer sejam através dos livros, dos professores, sempre foi movido por
um patriotismo e certo tom de heroísmo, os conhecimentos que nos foi passado na figura dos
Bandeirantes, Pedro Alvares Cabral, Tiradentes, D. Pedro I, por exemplo, constitui uma classe
dominante e conseqüentemente branca; por outro lado encontramos a figura do índio e do
negro inferiorizados e marginalizados. Segundo Silva (2005) a educação, a escola e os
sujeitos envolvidos neste contexto têm a função de superar o que por muito tempo foi
“naturalizado”:
A presença do negro nos livros, freqüentemente como escravo, sem
referência ao seu passado de homem livre antes da escravidão e às lutas de
libertação que desenvolveu no período da escravidão e desenvolve hoje por
direitos de cidadania, pode ser corrigida se o professor contar a história de
Zumbi dos palmares, dos quilombos, das revoltas e insurreições ocorridas
durante a escravidão; contar algo do que foi a organização sócio-política-
econômica e cultural da África pré-colonial; e também sobre a luta das
organizações negras, hoje, no Brasil e nas Américas. (p.25)
Percebemos que mais de cem anos da abolição, fato que deveria significar uma vitória
para os descendentes de escravos, torna-se uma farsa. Há a constatação de que a esta
população lhes foram negados, moradia, trabalho, saúde e educação. Cunha Jr (1992) ressalta:
“esquecido, marginalizado e ignorado, sofrendo constantes preconceitos e discriminações,
mesmo após tantos séculos de trabalhos árduos sem remuneração e tendo seu reconhecimento
totalmente negado”. (p.17).
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Essa realidade constitui um entrave para o não reconhecimento de si, para a negação
de sua história, e conseqüentemente a diferença como fator diminutivo entre os grupos. Nesse
sentido, Silva (1999) discorre o processo de inculcamento da cultura branca abordando que :
O processo de dominação, na medida em que ia além da fase de exterminação
e subjugação física, precisava afirmar-se culturalmente. Aqui, o que se
tornava importante era a transmissão, ao Outro subjugado, de uma
determinada forma de conhecimento. A cosmovisão „primitiva‟ dos povos
nativos precisava ser convertida à visão européia e „civilizada‟ do mundo,
expressa através da religião, da ciência, das artes e da linguagem e
convenientemente adaptada ao estágio de „desenvolvimento „ das populações
submetidas ao poder colonial. O projeto colonial teve, desde o início, uma
importante dimensão educacional e pedagógica” (p. 128).
Desde então, o homem branco, julgando-se superior, subjuga o homem preto pela
epiderme. Todavia, é interessante destacar que tal acontecimento não se deu de forma
passiva, os que estavam na condição de escravos, resistiram, através de lutas, assassinatos e
fugas. Sobre este aspecto, Cunha Jr (1992) afirma que “o negro nunca aceitou as condições
que lhes eram impostas, ele se rebelava, quando podia, fugia e se organizava em quilombos”
(p.16). A existência de quilombos é um marco da resistência do negro à condição de escravo.
Diante disso, reconhecer-se e compreender a identidade é também compreender os
processos, as origens, a cultura, a aceitação de si e do outro, sendo também atribuída valores,
conceitos e representatividade do grupo pertencente. Nesse sentido, o universo escolar poderá
corroborar para esse reconhecimento e aceitabilidade dos sujeitos com a reconstrução do
processo histórico, se desvencilhado de pré-conceitos. Entendemos que na escola são
estabelecidos laços e marcas que as crianças carregam por toda a vida, construídos por
relações e interações sociais e culturais. Segundo Cerqueira (2005) “a construção da auto-
estima da criança negra depende muito do ambiente escolar, porque lá vivencia parte do seu
dia-a-dia”. (p.107). Desse modo, é inadmissível considerar a escola como local de pluralidade
e confrontações, e ainda assim, encontrar exclusões e silenciamentos.
Todavia, não podemos esquecer que perceber-se negro e afirmar a identidade negra
num panorama ao qual ela sempre esteve subordinada não é tão fácil. Uma vez que traz no
bojo uma ideologia construída historicamente por um viés negativista, impositivista, castrador
e inferiorizador em relação à propagada cultura branca. Todos esses elementos são
enfatizados na fala de Cavaleiro (2000), quando diz que:
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Não há como negar que o preconceito e a discriminação racial constituem um
problema que afeta em maior grau a criança negra, visto que ela sofre direta e
cotidianamente humilhações, maus tratos, agressões e injustiças que afetam a
sua infância e comprometem todo o seu desenvolvimento futuro. (...) não
podemos perder de vista que atitudes magoam e marcam, provavelmente, a
criança pela vida afora (p. 217).
Hoje o estudo sobre a cultura africana tem sido muito discutido na sociedade
brasileira, sobretudo com as lutas e reivindicações do movimento social negro. Advogando a
este respeito Nascimento (1993) declara:
É antiga a preocupação dos movimentos negros com a integração dos
assuntos africanos e afro-brasileiros ao currículo escolar. Talvez a mais
contundente das razões esteja nas conseqüências psicológicas para a criança
afro-brasileira de um processo pedagógico que não reflete a sua face e de sua
família, com sua história e cultura própria, impedindo-a de se identificar com
o processo educativo. Erroneamente seus antepassados são retratados apenas
como escravos que nada contribuíram ao processo histórico e civilizatório,
universal do ser humano. Essa distorção resulta em complexos de
inferioridade da criança negra, minando o desempenho e o desenvolvimento
de sua personalidade criativa e capacidade de reflexão, contribuindo
sensivelmente para os altos índices de evasão e repetência. (p.11)
Nesse viés, presenciamos nas instituições de ensino a implementação da Lei
10.639/03, a qual foi substituída pela Lei 11.645/08. Tornando obrigatório no currículo
escolar o ensino da cultura afro-brasileira, e também da África e dos africanos, trazendo em
acréscimo o estudo do povo indígena. A lei traz como objetivo resgatar a história da
população negra, bem como o reconhecimento da cultura, assim como de outras para a
formação da identidade cultural do país, sugerindo que alguns termos sejam abolidos com
intuito de amenizar o preconceito. Contudo, consideramos recente a reelaboração, de material
com essa nova perspectiva, além disso, o professor encontra-se despreparando para abordar
tais questões, justamente por ser um tema “novo” e por ter em sua “formação” a omissão
destes conteúdos, quando não, lacunas sobre a questão.
Dentro desta perspectiva, se a escola tem por finalidade a formação integral da pessoa,
nesse sentido, são considerados, formação social, cultural, profissional, moral, política, ética,
etc. Enfim, se a escola é o espaço de reprodução das relações sociais, também poderá ser
espaço de transformação. Necessitando para isto, a preocupação com uma postura crítica, em
relação à sociedade que os cerca.
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Nesta ênfase, analisando o município de Senhor do Bonfim, em que há um número
expressivo de comunidades remanescentes de quilombos tais como: Tijuaçu, Lages dos
Negros, Bananeira dos Negros, etc, e conseqüentemente de crianças negras em fase escolar, a
escolha da temática foi alimentada através das experiências como professora durante os
estágios no decorrer do curso de Pedagogia, onde propusemos trabalhar com a cultura afro-
brasileira, na qual pudemos perceber a baixo-estima das crianças negras, quando solicitadas
tarefas nas quais se auto-retratassem, verificamos a negação ao executar as atividades, muitas
dessas crianças nos seus discursos, julgavam-se feias. Aliada a isto, a busca é também
intimamente relacionada com o papel de ser mãe de criança negra, dessa maneira, preocupada
com os estereótipos proferidos nas escolas, e as possíveis interferências na construção
identitária das crianças negras, nos instigou o interesse em saber: Qual a percepção que a
criança negra tem de si no convívio escolar?
Neste sentido, trazemos como objetivo desta pesquisa: identificar e analisar a
percepção que a criança negra têm de si no convívio escolar.
A relevância deste trabalho se dá por apresentar uma reflexão crítica sobre as práticas
e posturas diante das relações étnicas, em especial a das crianças, percorrendo os vestígios e
discursos que desencadearam os estigmas e a negação do negro. Portanto, no atual contexto,
se faz necessário discutir a questão étnico-racial, falar do negro, da criança negra, da cultura
afro-brasileira, da exclusão, das marcas em meio ao silenciamento que viveram.
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CAPÍTULO II
2.QUADRO TEÓRICO: AMPLIANDO OLHARES E DISCUTINDO
CONCEITOS
A partir do nosso problema, cuja a pesquisa, traz por objetivo: identificar a percepção
que a criança negra têm de si no convívio escolar, buscamos alguns aportes teóricos para
embasar e subsidiar nossas relexões e discussões. Nesta perspectiva, a problemática tratada
e o objetivo nos permitiram discutir neste capítulo os seguintes conceitos chave: Percepção,
Convívio Escolar e Criança Negra.
2.1 A percepção e suas várias faces
Várias teorias se ocupam em buscar um conceito de percepção, os estudos indicam
explicações filosóficas, sociológicas, psicológicas, semióticas entre outros. Tais reflexões
atribuem a percepção como um ato interno que se utiliza de elementos físicos, subjetivando-
os, ou seja, há uma integração dos processos biológicos e psicológicos, que perpassam pela
memória e outros aspectos, tais como: o social e cultural. Sobre isto, Aranha (1992) afirma
“Perceber e cogitar são operações que nos aproximam da essência da experiência. Esses atos
conscientes realizam-se no corpo operante e atual” (p.8).
Dessa forma, compreendemos que tais experiências nos remetem ao processo social no
qual nos relacionamos no contato do individuo com a realidade vivenciada, Chauí (2000)
comenta que a percepção “é sempre uma experiência dotada de significação, isto é, o
percebido é dotado de sentido e tem sentido em nossa história de vida, fazendo parte de nosso
mundo e de nossas vivências” (p.153). Isso significa que ao longo de nossas vida
estabelecemos associações com o meio. Merleau-Ponty (1971) a esse respeito diz o seguinte:
Enquanto sou no mundo, ele se manifesta em minhas experiências. Vivo
minhas experiências sempre a partir de meu corpo, que é histórico e cuja
história carrega os invariantes dessas experiências. Minha experiência é
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multiperspectival e não se reduz a nenhum momento efetivo. As coisas me
oferecem suas faces e eu as percebo de diversos pontos de vista espaciais e
temporais, e "seu presente não apaga seu passado, seu futuro não apagará seu
presente” (p.83).
Nesse sentido, podemos dizer que, a percepção se dá de acordo com as experiências
vivenciadas através da cultura, do contexto, dos repertórios, que todo ser humano traz
consigo. Aqui ressaltamos, “carregamos” marcas e lembranças que nos acompanham por toda
vida, nesse aspecto, atentamos para os inculcamentos que nos foi sobrepostos a respeito da
inferioridade do negro, os estigmas disseminados pelo branco, que ainda cerceiam no
imaginário da população.
Tais fatores nos indicam que a percepção acontece na nossa maneira de pensar e
refletir no mundo, ou ainda parafraseado Freire a forma como o sujeito lê e relê o mundo.
Em consonância com Santos (1988) "o homem vai impondo à natureza suas próprias formas,
a que podemos chamar de formas ou objetos culturais, artificiais, históricos” (p. 89). Sendo
assim, podemos considerar que através da cultura, partilhamos imitações, afetos, desejos,
ideologias, repúdios entre outros, como elementos do desenvolvimento humano. De acordo
com Vasconcellos (2002) isso ocorre de “forma permanente e indeterminável, do nascimento
à morte, dando-se em todo ciclo vital, em ambientes estruturados pela cultura, regulados pelos
meios sociais e marcados pela história da humanidade, na singularidade de cada sujeito”
(p.47-48).
Acompanhando o raciocínio de percepção em Chauí (2000), ela considera que “ a
“percepção é uma conduta vital, uma comunicação, uma interpretação e uma valoração do
mundo, a partir da estrutura de relações entre nosso corpo e o mundo” (p.154) Nesse
contexto, entedemos que percebemos a partir do convivio social, com as pessoas e as coisas.
A autora esclarece o seguinte:
A percepção envolve toda nossa personalidade, nossa história pessoal, nossa
afetividade, nossos desejos e paixões, isto é, a percepção é uma maneira
fundamental de os seres humanos estarem no mundo. Percebemos as coisas e
os outros de modo positivo ou negativo, percebemos as coisas como
instrumentos ou como valores, reagimos positiva ou negativamente a cores,
odores, sabores, texturas, distâncias, tamanhos. (CHAUÌ, 2000, p.155).
Desse modo, acreditamos que todo o universo perceptual, envolve os modos como
cada indivíduo cada sociedade atribuem aos sentidos, aos valores, as funções em relação ao
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mundo que os cercam. Chauí (2000) coaduna dessa idéia referindo-se, “a percepção envolve
nossa vida social, isto é, os significados e os valores das coisas percebidas decorrem de nossa
sociedade e do modo como nela as coisas e as pessoas recebem sentido, valor ou função”
(p.155).
Para Piaget (1973) na teoria sobre a aprendizagem e desenvolvimento, é estabelecida
uma relação direta do indivíduo com o meio sócio-ambiental, a partir da análise cognitiva, na
sua concepção “a percepção está sempre agindo nos estágios elementares de formação dos
conhecimentos, mas jamais age sozinha e o que se lhe acompanha é pelo menos, tão
importante quanto ela em tal elaboração”. (71). Ou seja, dessa forma o pensamento não ocorre
tão somente isolado há uma ação sobre o que se conhece. Isto para Piaget (1973) “São então
as ações e não apenas as percepções que constituem as fontes de nossos conhecimentos
científicos”. (73).
Buscando aprofundar um pouco mais o conceito de percepção pelo viés filosófico,
encontramos em Japiassu (1996) o seguinte: o termo vem do latim perceptio. É ato de
perceber, ação de formar mentalmente representações sobre objetos externos a partir dos
dados sensoriais. A sensação seria assim a matéria da percepção. Para os empiristas, a
percepção é fonte de todo o conhecimento. Além disso, Japiassu (1996) nos esclarece que
“todas as percepções de mente humana se incluem em dois tipos distintos quem chamarei de
impressões e idéias.” Dessa forma, podemos considerar o conceito de percepção, pelo viés
filosófico muito próximo com o conceito de significado.
Através de uma abordagem fenomenológica, que lida com os fenômenos da
consciência, pela sua significação, encontramos o conceito de percepção em Merleau-Ponty
(1998) como:
O momento dialético vivo de um sujeito concreto, a consciência é a dialética
do meio-ambiente-ação do sujeito e as movimentações do cogito
fenomenológico nos aproximam de um mundo pré-científico, habitado por
fenômenos que se tecem no solo da dimensão perceptiva da consciência (p.
19).
Tradicionalmente considera-se a percepção como o processo com qual entramos em
contato com a realidade, percebemos, a partir das informações com as quais nos
relacionamos, ou ainda, com as práticas sociais que estabelecemos e internalizamos, nessas
21
interações, podemos considerar o ambiente escolar, em especial, como um canal
imprescindível para as relações intersubjetivas, sobretudo para as crianças, considerando que
lá vivenciam boa parte do seu dia, participando, produzindo e reproduzindo conceitos e por
que não dizer também preconceitos, de uma sociedade, marcada por uma ideologia de
branquitude, como bem afirma Carone e Bento (2002):
Forjada pelas elites brancas tal ideologia proferida simbolicamente com intuito de
projetar no negro uma identificação com o branco, como subterfúgio para “superar”
sua condição inferior de ser negro. É um tipo de discurso que atribui aos negros o
desejo de branquear ou de alcançar os privilégios da branquitude por inveja,
imitação e falta de identidade étnica positiva. (p.17).
Essa difusão, tem sido para os negros um entrave para o seu reconhecimento na
convivência de numa sociedade injusta e desigual. Portanto, considerando a percepção como
fruto de interações, é também enviesada pela Psicologia Histórico Social, buscamos em
Vygotsky (1988) um conceito. Para ele "toda percepção humana é feita de percepções
generalizadas e não isoladas” (p.129). O que significa dizer que a percepção se dá através das
interações/internalizações de um conjunto maior que os sujeitos estabelecem com o meio
social e cultural.
2.1.1 A percepção na construção da auto-imagem
Fazendo uma análise dos estudos, através da Psicologia Histórico Cultural, é
salientado que o conhecimento que possuimos sobre o mundo, está intimamente relacionado
com as práticas culturais, com o convívio com o outro, através das interações sociais que
estabelecemos, sobretudo pela linguagem, atributo pelo qual classificamos, significamos,
representamos e percebemos o mundo que nos cerca.
Nos escritos Vygotskianos o desenvolvimento congnitivo da criança está imbricado no
desenvolvimento da fala, “assim, durante os períodos iniciais, a fala apenas acompanha os
atos da criança. Esse acompanhamento diz respeito à percepção, análise e acumulação da
experiência e, na sua forma pura, se expressa na fala da pessoa que está representando suas
ações”. (VYGOTSKY, 1981, p. 295). Dessa forma o conceito é apreendido a partir de
palavras e dos seus significados. Tal procedimento é retratado por Vygostky (1987) “O
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significado da palavra é inconstante. Ela modifica-se durante o desenvolvimento da criança e
com os diferentes modos de funcionamento do pensamento. Ela não é uma forma estática,
mas dinâmica” ( p. 249).
Nesse sentido, compreendemos que além da palavra que sofre alterações com a
evolução histórica, outros fatores também permeiam no processo de desenvolvimento da
criança, contribuindo na formação e transformação do ser. O autor vem ancunciando isto
Vigotsky (1994):
Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades
adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e,
sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do
ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto
passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto
de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações
entre história individual e história social”. (p. 40)
Complementando este raciocínio, Vasconcellos (2002) tece que a “funções mentais
superiores”. Este meio, “que não é só físico, mas é, principalmente, carregado de significados
e é, portanto, prenhe de ideologia, de história, de cultura”. (p.60). Nesses termos, entendemos
que a percepção nos remete a um contexto, dentro de uma estrutura que nos é posta ou até
mesmo imposta, onde vamos apreendendo, compartilhando e formando nossas idéias e
reflexões sobre os objetos, as pessoas e o mundo.
Para Silva (2007) "a nossa relação perceptual com o mundo não acontece através de
elementos físicos isolados, mas através de eventos, objetos e situações trazidos pela
linguagem e pela cultura". (p.60). Dessa maneira, inferimos que o ato de perceber transcende
as funções sensoriais, ele “depende” das interações, de conhecimento já adquiridos, das
vivências.
Ainda em Silva (2007, p. 59) "o ser humano, ao nascer, possui possibilidades de
percepção definidas pelas características do sistema sensorial humano. Ou seja, são
características biológicas" .(p.59). Porém, ao longo da sua existência o indivíduo vai
agregando outros atributos, tais como: conceitos construídos historicamente, pensamentos e
idéias que de certa forma constitui e modifica o sistema de percepção.
23
Podemos, pois, compreender que a percepção não é algo apreendido de maneira
simples, ela é fruto de um processo complexo, uma vez que víncula-se também a fatores
externos. Nesse sentido, como seres conviventes em ambientes sociais, família, escola, entre
outros, significa dizer que ao longo desse processo de experiências atribuimos diversas
percepções destes contextos.
Ao considerarmos, que depois da família, a escola é um espaço que propícia o
desenvolvimento dos sujeitos, tanto afetivamente, quanto cognitivamente, pois lida com
linguagens diversas, portanto, poderiamos dizer é um “palco” onde apresenta e exerce
influências sociais, econômicas e políticas. Neste contexto destacamos a criança, que passa
grande parte da sua vida no universo escolar, como absorve tais linguagens? Como as
interpretam? Como as percebem? Todos esses questionamentos fazem parte ou interferem na
construção subjetiva dos indivíduos. Isso, de certa forma, contribui para a criação de um auto-
conceito e consequentemente a formação da auto-imagem, através das interações,
comparações e julgamentos.
Assim, tais fatores, fazendo parte do ambiente escolar, permeiam nas identificações
das crianças, e ainda, se levarmos em conta o contato que a criança negra, se depara no
processo histórico do negro, cuja imagem foi construida de maneira caricatural, com
estereotipos negativistas e inferiorizados. Dessa forma, não é díficil visualizar a percepção
que estas crianças tem construido da auto-imagem e inevitavelmente da sua auto-estima.
2.2 Escola dupla face: a perspectiva reprodutivista/ Transformadora
Até o aparecimento da instituição escolar, foram diversos segmentos que se ocuparam
na função de educar. Portanto, essa instituição nem sempre existiu e nem tampouco atendeu a
todos. De acordo com Aranha (1996) " a instituição escolar não existiu sempre, e sua natureza
e importância variaram no tempo, dependendo das necessidades socioeconômicas dos grupos
em que esteve inserida". (p.72).
Isso nos leva a pensar, outro comentário da autora " não se compreende a escola fora
do contexto social e econômico em que está inserida" (ibdem, p.174). Nesse aspecto, a
24
instituição escolar corresponde a uma organização ou mecanismo social, que participa do
controle, desenvolvimento e do funcionamento da estrutura social. Ou seja, a classe
dominante, de acordo com a autora " a escola é politíca e, como tal, reflete inevitavemente os
confrontos de força existentes na sociedade" (ibdem, p.33). E ainda, Althusser (1980)
considera como um dos aparelhos ideólogicos do estado mais eficaz quando aborda que:
Nenhum Aparelho Ideológico do Estado dispõe durante tanto tempo de tanta
audiência obrigatória (e ainda por cima gratuita), 5 a 6 dias em 7 que tem a
semana, à razão de 8 horas por dia, da totalidade das crianças da formação
social capitalista. Ora, é através de alguns saberes práticos (savoirfaire) [...]
que são em grande parte produzidas as relações de produção de uma
formação social capitalista [...] Os mecanismos que reproduzem este
resultado vital para o regime capitalista são naturalmente envolvidos e
dissimulados por uma ideologia da Escola universalmente reinante, visto que
é uma das formas essenciais da ideologia burguesa dominante: uma ideologia
que representa a escola como um meio neutro, desprovido de ideologia. ( 66)
Dessa forma, o sistema educacional, transmite a ideologia da elite, ou seja, da classe
dominante. Isso porque, segundo Gentilli (1995) "os beneficiários da ordem educacional
vigente são, numa perspectiva geral, os grupos com maior poder econômico e institucional,
acesso aos meios de persuasão e melhor representação no governo e nas categorias
profissionais" (p.37) . Poderiamos dizer que, a cultura escolar está repleta de idéias, hábitos
que influenciam e são compartilhados com os sujeitos, no qual comungam os modos de
pensar, perceber e agir. Tais influências retratam e disseminam a ideologia hegemônica, esse
mecanismo, poderiamos dizer que age nas mentes dos sujeitos, controlando-os e dominando-
os. Desse modo encontramos na análise de Servan citado por Foucalt (1987) essa imposição:
Quando tiverdes conseguido formar assim a cadeia das idéias na cabeça de
vossos cidadãos, podereis então vos gabar de conduzi-los e de ser seus
senhores. Um déspota imbecil pode coagir escravos com correntes de ferro;
mas um verdadeiro político os amarra bem mais fortemente com a corrente
de suas próprias idéias; é no plano fixo da razão que ele ata a primeira ponta;
laço tanto mais forte quanto ignoramos sua tecitura e pensamos que é obra
nossa; o desespero e o tempo roem os laços de ferro e de aço, mas são
impotentes contra a união habitual das idéias, apenas conseguem estreitá-la
ainda mais; e sobre as fibras moles do cérebro, funda-se a base inabalável dos
mais 'sólidos impérios. (p.93).
Portanto, compreendemos o quanto eficaz é a reprodução ideológica, esse processo
tem sido ao longo dos tempos difundidos pela instituição escolar, onde são perpassados
valores e culturas, que se distanciam da maioria da população sem acesso aos meios, detidos
pela minoria elitista. Para Mclaren (1991) " a cultura da escola é informada por determinantes
25
especificos de classe social, ideologias e estruturas da sociedade maior" (p.33). Nesse
sentido, o autor concebe a escola como pertencente a um setor especifico, ou seja, a cultura
hegemônica dominante. Nesse viés, Bourdieu (1970) salienta que a escola, ao privilegiar a
cultura domiante, estaria assim agravando as desigualdades, tendo origem nas posições
ocupadas pelos individuos no espaço social. Argumentando que a instituição escolar
transforma as desigualdades socias prévias em desigualdades naturais. Isso é justificado em
sua abordagem quando fala que:
A ideologia que poderiamos chamar carismatica ( porque valoriza a "graça ou
"dom" constitui, para as classes privilegiadas, uma legitimação de seus
privilegios culturais, que sofrem assim uma transformação da herança social
em graça individual ou mérito pessoal. Desta forma disfarçada, pode-se
implantar o "racismo de classes" sem que se torne obvio. Esta alquimia dá tão
bons resultados que, longe de opor a ela outra ideia do êxito escolar, as
classes populares assimilam, por sua vez, o essencialismo das classes altas e
vivem sua desvantagem como uma sina pessoal. Bourdieu e Passeron, ( apud
ENGUITA, 1979 ,p. 193).
É pertinente, fazermos um contraponto dessas idéias com a ideologia do
branqueamento, uma vez, que age por uma mistificação ideológica, pois como afirma
Munanga (2005) "o embranquecimento do negro realiza-se-á principalmente pela assimilação
dos valores culturais do branco" (p.27). Acrescentamos valores do colonizador, do
dominante, do capitalista, do opressor.
Para Veiga Neto (2001) “a escola moderna é local onde age com mais eficácia a
junção do poder e o ideal da modernidade funcionando, assim, como uma máquina de
governamentalização que consegue ser mais poderosa e ampla do que a prisão, o manicômio,
o quartel, o hospital” (p. 109) Este autor ainda assinala que “a partir do século XVII a escola
constituiu-se como a mais eficiente maquinaria encarregada de fabricar as subjetividades”(
p.34). Dessa forma, entedemos que através destas subjetividades são também formadas as
percepções dos sujeitos, idéias e conceitos a respeito das relações que estabelecemos na
convivência social. Enfocando esse argumento Ianni (2004) postula:
Nesse percurso atravessado por vivências, o estigmatizado desenvolve a sua
percepção, sensibilidade, compreensão; construindo e reconstruindo a sua
consciência no contraponto do "eu" e do "outro", do "nós" e do "eles", dos
"subalternos", dos "dominantes". Assim, aos poucos, ou de repente, realiza
um entendimento mais amplo e vivo de qual é a sua real situação, quais são
os nexos do tecido social no qual está emaranhado, de como essa sua situação
implica decisivamente a ideologia e a prática dos que discriminam. Esse o
percurso em que se desenvolve a consciência crítica, a autoconsciência ou a
26
consciência para si, reconhecendo que é desde essa autoconsciência crítica
que nasce a transformação, a ruptura ou a transfiguração.
Assim, ao valorizar relações associadas ao padrão da elite, ao transmitir tal ideologia,
a escola contribui para que os indivíduos interiorizem seu destino, sua posição e
consequentemente suas oportunidades sociais, tornando-se responsáveis por seus méritos ou
fracassos pessoais. E isto, é circunscrito por Eguita (1989) "as determinaçoes sociais são
ocultadas por detrás de diagnósticos individualizados, legitimados e sacralizados pela
autoridade escolar".( p.193).
Compreendemos que pela escola a classe dominante transmite suas idéias, seus
valores, interesses, sua concepção de mundo e de homem, dessa maneira o trajeto escolar é
permeado de violência simbólica, pois, este espaço pode contribuir ativamente para a
desconstrução da identidade negra, uma vez que se reproduz valores, crenças, ideologias e
atitudes da cultura dominante, ou seja, branca, que de certa forma acaba impregnando nos
alunos a falsa superioridade sobre a cultura negra. Fazendo acreditarem que os símbolos e
valores dominantes, neste caso, dos brancos, são os bons, os corretos e também os almejados.
Mas, acreditamos que se a escola é o espaço de reprodução das relaçõees sociais,
também poderá ser o espaço de transformação, necessitando para isto, a preocupação com
uma postura crítica, uma vez que esta instituição é vista como um espaço social e cultural.
Diante disso, Sacristán e Gomez (2009) retratam sobre a percepção da cultura
institucionalizada da escola, sugerindo que através das interações sociais, há uma dinâmica
cultural, com "trocas" de conhecimentos, valores que contribuem para que os individuos
reconstruam suas interpretações, numa dicotomia, ou seja, ao mesmo tempo que transformam
a cultura, são também por ela transformados. Nessa linha de raciocínio Rodrigues (1991) faz
uma análise da escola assinalando que:
A escola está inserida numa certa realidade da qual sofre e exerce influencia.
Ela não é apenas o local onde se reproduzem os interesses, os valores, a
cultura, a ideologia. Tambem pode influenciar a ideologia, os valores, a
ciência, a politica e a cultura na sociedade em que está inserida. ( p.57).
Diante disso, os problemas da contemporaneidade, apresentam-se cada vez mais
complexos, cabendo à escola responsabilidade acentuada no processo de socialização e
formação do cidadão. Nesse sentido, Candau (2000) diz que “ as escolas estão cada vez mais
27
desafiadas a enfrentar os problemas decorrentes das diferenças e da pluraridade cultural,
étnica, social, religiosa, etc, dos sujeitos e atores” (p.14).
Nesse aspecto, sabemos que o modelo educacional reflete o modelo de sociedade que
temos em que as relações foram constituidas tendo como pano de fundo uma política
unilateral, onde a diversidade etnico-racial que é formada a população brasileira não é
atendida, muitas vezes rejeita-se ou silencia a cultura negra, dando margem a estereotipos
construidos historicamente pelo dominante.
Destacamos, que a escola é também o espaço onde convivem várias culturas e etnias
da sociedade, onde são estabelicidas marcas que as crianças carregam por toda a vida,
construidas nas relações sociais, no convívio cultural. Segundo Cerqueira (2005) “ a
construção da auto-estima da criança negra depende muito do ambiente escolar, porque lá
vivencia parte do seu dia-a-dia”.(p.107) E além disso, a escola é território de pluralidades e
contestações. Nessa ênfase, trazemos a abordagem de Candau ( 2002):
Durante muito tempo a cultura escolar se configurou a partir da ênfase na
questão da igualdade, o que significou, na prática, a afirmação da hegemonia
da cultura ocidental européia e a ausência no currículo e em outras prática
simbólica presentes na escola de outras vozes, particularmente referidas às
culturas originarias do continente, à cultura negra e de outros grupos
marginalizados de nossas sociedades (p.15)
Hoje, a identidade do negro tem sido muito discutida na sociedade brasileira,
sobretudo com as políticas afirmativas, oriunda de muitos debates, consideramos um avanço
significativo, embora ainda muito recente, a discussão e também a legislação, pois
enfatizamos ser impotante a reconstrução do processo histórico, atribuímos ao espaço escolar,
a tarefa no papel de desvencilhamento de negação imposta e este grupo, a valorização da
cultura afro-brasileira, a contribuição do povo negro para o progresso do país, uma vez que é
uma das instiuições com maior poder socializador. Acreditamos ser fundamental um trabalho
comprometido e consciente que possa contribuir para que a criança negra tenha referência de
sua cultura, contada e valorizada e consequentemente sua identidade afirmada, onde a
convivência escolar permita o aprendizado das diferenças não como algo desigual e sim como
um elemento eriquecedor.
28
2.2.1 Convívio Escolar: uma síntese da escola destinada aos negros.
Para falarmos das relações que são estabelecidas no convívio escolar, se faz necessário
entendermos um pouco sobre o histórico dessa instituição, quando ela surgiu e a quem ela
serviu. Há registros de que a escola no Brasil surgiu com a vinda dos jesuítas para a colônia. E
cuja educação no inicio era restrita às elites. Que segundo Romanelli (2001) difundia suas
idéias e culturas. Desde então a instituição escolar torna-se difusora da classe dominante.
Essa educação escolar, nascedora no sistema colonial brasileiro nem sempre atendeu a
todos. Com o advento do Iluminismo 1 a escola passa a execer maiores funções, e no século
XIX e XX, o estudo passa a ser obrigatório em vários países. Porém, esta instituição sempre
teve suas bases fincadas, na e para e elite. De acordo com Manacorda ( 2002):
Historicamente, assim, é exatamente da educação, confiada no interior da
“família” à educadores especialistas, aos filhos dos poderosos (do faraó, dos
“minos”, do anax , do basileu , do pater ) e, em torno dos quais se agregam
os filhos de várias famílias eminentes, que surgem as primeiras “escolas
públicas”, ou seja, abertas aos jovens de várias famílias que se interessavam,
cada vez mais, pela vida pública e se caracterizam por esse conteúdo
específico. Essas escolas, com o apoio da divisão do trabalho existente no
próprio interior das classes dominantes, aparecem, por um lado, como escola
de cultura para os “pensadores de classe”, seus “ideólogos ativos”. e, por
outro, como ginásios ou tribunais onde os cidadãos guerreiros se educavam
para o exercício do poder político e da arte militar. Mas, fossem escolas de
sacerdotes ou de cidadãos-guerreiros, permaneciam como estruturas
específicas e exclusivas para a formação das classes dominantes (p. 117)
Dessa maneira, percebemos que desde muito tempo as escolas sempre estiveram a
serviço da classe dominante. Com a evolução da história, essa instituição passa por diversas
mudanças. O século XVII marcado como século de grandes tranformações, tanto na ordem
politica, quanto econômica e social, é difusor de grandes pensadores, no qual sugerem o
rompimento com o regime antigo, o novo sujeito pensa de acordo com o estado. Na análise
de Cambi (1999) a nova sociedade traz tal perspectiva:
1 Movimento que surgiu na França do século XVII e defendia o domínio da razão sobre a visão teocêntrica que
dominava a Europa desde a Idade Média. Segundo os filósofos iluministas, esta forma de pensamento tinha o
propósito de iluminar as trevas em que se encontrava a sociedade
29
Burguesa, dinâmica, estruturada em torno de muitos centros (econômicos,
políticos, culturais, etc.), cada vez mais participativa e inspirada no princípio-
valor da liberdade. O século XVIII é, a justo título, o divisor de águas entre
mundo moderno e mundo contemporâneo: decanta as estruturas profundas
realiza as instâncias-guia do primeiro, contém os “incunábulos” do segundo.
E a laicização aliada ao reformismo (político e cultural sobretudo) são as
bases que sustentam este papel do século das Luzes (p. 324).
É com essa ideologia que as sociedades desenvolveram seu ensino e também o seu
modelo de escola. É salutar compreendemos a situação na qual o Brasil dispôs sua educação.
Podemos verificar que o país ao longo de sua história, estabeleceu um modelo de
desenvolvimento excludente, e acompanhando a este o seu modelo educacional, que se tornou
inacessivel a muitos sujeitos. Desde o principio da sua criação a Instituição escolar, foi
permeada de intencionalidades, ou seja, sua função nao é e nunca foi neutra.
Considerando o contexto da educação brasileira no período colonial, cuja escola
serviu de instrumento primordial para o suprimento de interesses, políticos, econômicos e
sociais, ficando a cargo da ordem religiosa o oferecimento da educação, nao é díficil
imaginarmos o modelo de educação e de escola vigorados, para os individuos excluidos da
nobreza - índios e negros. Ou ainda, esses modelos reproduziam os interessses da côroa, essa
educação editava qual tipo de “cidadão” se queriam almejar. Nas palavras de Freitag (1980)
encontramos essas evidências. “As escolas jesuitas, especialmente os colégios e seminários
em funcionamento em toda colônia, preenchiam perfeitamente essas funções, ajudando e
assegurando dessa maneira a própria reprodução da sociedade escravocata” (p.47).
Embora, muito tempo tenha se passado desde a escravidão, a idéia do negro associado
a um ser inferior, ainda é perpetuante no imaginário e também em algumas práticas nos
espaços e nas relações sociais. Como relata Chiavenato (1999) “a herança da escravidão se
consolidou nas várias “repúblicas” e no modelo atual”. (p.118). Esse legado é fruto de uma
ideologia difundida e também de uma negação e acesso dos meios sociais aos negros. Em
consonância com esse pensamento Carvalho (1990) assinala que:
A monarquia aboliu a escravidão em 1888. Mas a medida atendeu antes a
uma necessidade política de preservar a ordem pública ameaçada pela fuga
em massa dos escravos e a uma necessidade econômica de atrair mão-de-obra
livre para as regiões cafeeiras. O problema social da escravidão, o problema
da incorporação dos ex-escravos à vida nacional e, mais ainda, à própria
identidade da nação, não foi resolvido e mal começava a ser enfrentado. Os
abolicionistas mais lúcidos, os reformistas monárquicos, tinham proposto
medidas nessa direção, como a reforma agrária e a educação dos libertos.
Mas no curto período de um ano entre a Abolição e a República nada foi
30
feito, pois o governo imperial gastou quase toda sua energia resistindo aos
ataques dos ex-proprietários de escravos que não se conformavam com a
abolição sem indenização. (p. 23)
Dessa forma, percebe-se que o país cumprira a “nova ordem” a libertação de seus
escaravos, porém sem nenhuma política de amparo para este novo segmento da sociedade,
agora mais ainda estigmatizado, além da condição de ex-escravo, na condição de desocupado,
incapaz, inferior e consequentemente marginalizados. De acordo com Hasenbalg (2005) o
legado ao negro foi:
Após a abolição final, o racismo, a discriminação e a segregação geográfica
dos grupos raciais bloquearam os principais canais de mobilidade social
ascendente, de maneira a perpetuar graves desigualdades raciais e a
concentração de negros e mulatos no extremo inferior da hierarquia social.
(233).
Dessa forma o negro foi relegado. Citando tais mazelas Fernandes (1978) traz essa
denúncia:
A sociedade brasileira largou o negro ao seu próprio destino, deitando sobre
seus ombros a responsabilidade de reeducar-se e de transformar-se para
corresponder aos novos padrões e ideais de homem, criado pelo advento do
trabalho livre, do regime republicano e do capitalismo (p. 20).
Dessa maneira, compreendemos que o negro não foi inserido na sociedade, não teve
acesso a educação, permancendo sempre a margem, este viu-se, então obrigado a ocupar
local, posição social consideradas inferiores, dificultando a inclusão no novo processo
capitalista que se apresentava. Desde então, diversos atributos foram agregados aos negros,
segundo Fernandes (1978)
Quando a “vadiagem”, propriamente dita, emergiu como um comportamento
sistemático e apareceu, unida a ela, a figura do “vagabundo costumaz” (ou do
“negro malandro”), processou-se uma condenação formal violenta do
referido padrão de relação, a qual se manteve até hoje. Parecia que se tratava
de um “caso de polícia” e que esta só permanecia indiferente para
“desmoralizar ainda mais o negro” (p. 185)
Deste modo, não é difícil percebermos os estereótipos vinculados aos negros, as
associações que fizeram deste povo. A escola como instituição social educativa, sofreu ao
longo dos tempos algumas mudanças, mas, assim como no passado, ainda hoje a escola
31
carrega um discurso elitista e muitas vezes discriminatório. Nas palavras de Cavaleiro (2005)
em sua pesquisa constatou-se o seguinte:
No espaço escolar há toda uma linguagem não-verbal expressa por meio de
comportamentos sociais e disposições-formas de tratamento, atitudes, gestos,
tons de voz e outras-, que transmite valores marcadamente preconceituosos e
discriminatórios, comprometendo, assim, o conhecimento a respeito do grupo
negro. Como ao negro estão reservados, na sociedade, papel e lugar
inferiores, pode-se afirmar que essa linguagem o condiciona ao fracasso, à
submissão e ao medo, visto que parte das experiências vividas na escola è
marcada por humilhações. (98-99).
Dessa forma, não podemos negar que a convivência escolar é marcada por diferenças,
tanto sociais, quanto culturais que influencia no comportamento dos sujeitos, o não
reconhecimento da história afro-brasileira, constitui um entrave para o não reconhecimento de
si, para a construção e a afirmação da identidade da criança negra. O silêncio no ambiente
escolar quanto à questão racial, sugere uma negação da pessoa negra. Nesse sentido,
argumentamos que a escola tem uma responsabilidade com a socialização dos sujeitos na
desconstrução de mitos que circulou e infelizmente ainda circulam neste ambiente e em outros
ambientes sociais. Candau (2003) na sua reflexão evidencia:
A sociedade brasileira, exclusão, preconceito e discriminação caminham
juntos. A diferença se transforma em desigualdade através de processos sutis
e complexos, presentes em nosso cotidiano nos âmbitos privado e público,
assim como em diferentes espaços sociais. (p.15).
Diante disso, compreendemos que a convivência no âmbito escolar não é algo simples
e fácil, pois, neste ambiente se configuram diversos conceitos, pensamentos e linguagens,
estereótipos que constituem a percepção das crianças. Entendemos que a escola moderna
surge como um convite e também uma necessidade de rupturas, das rédeas e das mordaças
que durante séculos atuaram como imposição de um modelo regido por um poder
hegemônico, que se configura como dominante e discriminatório. Ou, pelo contrário,
concordando com Loureiro (2004):
Se dessas etapas não forem superadas de forma satisfatória, podem bloquear
ou ferir no processo de crescimento humano, trazendo algum tipo de
sofrimento para o indivíduo. Acreditamos que o processo de estigmatização a
que estão submetidas as pessoas negras, os estereótipos com os quais se
deparam, desde pequenos, a respeito de seu grupo de origem, muitas vezes,
interfere de forma negativa no processo de elaboração de algumas etapas. No
entanto, as experiências vividas podem ser melhor compreendidas e
32
elaboradas no processo saudável, a interação da pessoa com ela mesma e com
seu grupo étnico racial. (p.20).
É notório que a escola é apresentada como uma instituição de base conservadora e
excludente, para isto basta analisarmos o modelo padrão de educação europeizada, e
conseqüentemente um currículo branco. Neste aspecto, comungamos com a reflexão:
As narrativas constituídas no currículo trazem embutidas noções sobre quais
grupos sociais podem representar a si e aos outros e quais grupos sociais
podem apenas ser representados ou até mesmo serem totalmente excluídos de
qualquer representação. Elas, além disso, representam os diferentes grupos
sociais de forma diferente: enquanto as formas de vida e cultura de alguns
grupos são valorizadas e instituídas como cânon, as de outros são
desvalorizadas e proscritas (ALMEIDA, 2007 apud SANTOS, 2002, p. 195).
Ou ainda, a ausência de conteúdos, em que contemple também os negros, os índios, e
outros segmentos discriminados pela sociedade sob um ponto de vista positivo. Acreditamos
atualmente numa perspectiva de mudanças, diante de novas políticas afirmativas sobre a
questão étnico-racial, na possibilidade de transformação dessa mesma base montada para
atender determinada ordem, poderá também servir de instrumento de reflexão, de resistência,
de crítica.
2.3 Um olhar binário: da criança universal à criança singular
Consideramos criança um ser em desenvolvimento, tanto fisicamente, quanto
psicologicamente, e ainda um ser com particularidades diferentes. Contudo as crianças
historicamente foram excluídas da história e suas vidas sempre foram contadas pelos adultos,
que em cada época e contexto lhe concebeu uma significado diferente. Na idade Média
inexistia o conceito de infância, na idade de seis e sete anos as crianças já faziam parte do
mundo adulto, era considerada um adulto em miniatura. Ariés (1981) demonstra essa visão,
“no mundo das fórmulas românticas, e até o fim do século XIII, não existem crianças
caracterizadas por uma expressão particular, e sim homens de tamanho reduzido” (p.51).
Dessa maneira, as crianças eram introduzidas ao mundo dos adultos, participando de suas
atividades.
33
Nos escritos sobre a história da criança, encontram-se uma alta mortalidade infantil,
provocados muitas vezes pelo infanticídio, era comum, o abandono das crianças, e a falta de
amor materno, a falta de higiene eram características que contribuíram nessa mortandade.
Heywood (2004) traz referência sobre este aspecto:
Pode-se apresentar um argumento contundente para demonstrar que a suposta
indiferença com relação à infância nos períodos medieval e moderno resultou
em uma postura insensível com relação à criação de filhos. Os bebês abaixo
de 2 anos, em particular, sofriam de descaso assustador, com os pais
considerando pouco aconselhável investir muito tempo ou esforço em um “
pobre animal suspirante”, que tinha tantas probabilidades de morrer com
pouca idade. (p.87)
O cuidado com as crianças era feito por criadeiras, ou amas de leite, as quais não
existiam nenhuma preparação para o cuidar das crianças. Entendemos dessa forma que o
universo infantil era negado, Ariés (1981) destaca que:
Contudo, um sentimento superficial da criança – a que chamei de
“paparicação” – era reservado á criancinha em seus primeiros anos de vida,
enquanto ela ainda era uma coisinha engraçadinha. As pessoas se divertiam
com a criança pequena como um animalzinho, um macaquinho impudico. Se
ela morresse então, como muitas vezes acontecia, alguns podiam ficar
desolados, mas a regra geral era não fazer muito caso, pois outra criança logo
a substituiria. A criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato
(p.10).
Com a evolução das relações sociais no decorrer dos tempos, surgem novas
concepções a respeito da infância, a criança passa a ser uma preocupação central tanto na vida
familiar, quanto na sociedade, surgindo a necessidade da instituição escolar com a finalidade
de disciplinar e moralizar, a criança passa a ter a vida separada do adulto como nos descreve
Ariés (1981)
Trata-se um sentimento inteiramente novo: os pais se interessavam pelos
estudos dos seus filhos e os acompanhavam com solicitude habitual nos
séculos XIX e XX, mas outrora desconhecida. (...) A família começou a se
organizar em torno da criança e a lhe dar uma tal importância que a criança
saiu de seu antigo anonimato, que se tornou impossível perdê – la ou substituí
– la sem uma enorme dor, que ela não pôde mais ser reproduzida muitas
vezes, e que se tornou necessário limitar seu número para melhor cuidar dela
(p.12).
Contudo, podemos observar que essas diferenciações da criança e do adulto apenas
significaram o reconhecimento de um adulto imperfeito, ainda não caberia vê a criança como
34
um ser com diferentes necessidades. Heywood (2004) retrata essa situação “Somente em
épocas comparativamente recentes veio a surgir um sentimento de que as crianças são
especiais e diferentes, e, portanto, dignas de ser estudadas por si sós” (p.10)
No entanto, conhecemos a história do nascimento de uma determinada infância
apresentada aqui, oriunda da classe dominante, quando vemos o historiador francês Phillipe
Ariès, trazendo características da sociedade francesa, contando a história de príncipes e reis,
por exemplo, quando cita que “ Luiz XIII tem um pouco mais de um ano quando seu
casamento com a Infanta de Espanha é decidido” (p.75) A criança singular, diferente quer
seja, de classe social, de etnia, de cultura, constituem categorias minoritárias.
Nesse aspecto, ao refletirmos nosso processo histórico, discriminatório e excludente,
no qual ainda sentimos os resquícios de forma latente na nossa sociedade, através da
reprodução ideológica e dos instrumentos mediadores, percebemos que as crianças quando
pertencentes a classes menos favorecida ou quando são negras, são vistas de formas
diferentes, ou muitas vezes ignoradas. É condudente a reflexão que Sarmento ( 2002) tece
quanto a posição social da criança:
O imaginário social é inerente ao processo de formação e desenvolvimento
da personalidade e racionalidade de cada criança concreta, mas isso acontece
no contexto social e cultural que fornece as condições e as possibilidades
desse processo. As condições sociais e culturais são heterogêneas, mas
incidem perante uma condição infantil comum: a de uma geração desprovida
de condições autônomas de sobrevivência e de crescimento e que está sob o
controlo da geração adulta. A condição comum da infância tem a sua
dimensão simbólica nas culturas da infância (p. 3).
Podemos, então, entender que, a criança é vista e analisada em cada contexto de
acordo com a cultura, a classe social, a identidade étnica, principalmente sob a ótica social, a
criança irá ter necessidades de cuidados e direitos universais quando pertencente à classe
dominante, porém a criança singular, muita vezes se quer é notada, ou torna-se um sujeito
indiferente, ou ainda, é apenas digna de pena.
35
2.3.1 A criança negra na história? ou a história da criança negra?
Denominamos crianças negras, as que possuem características etnicos-raciais do
negro. Buscaremos entender como a criança negra aparece no cenário brasileiro. Não
podemos, desconsiderar que a história da criança negra aparece em nosso país, juntamente
com vinda dos escravos africanos.
Há relatos que a infância no Brasil, no século XVIII era comum o abandono de bebês
nas Rodas de Expostos 2, porém tal atitude em relação a criança negra era menos frequente,
uma vez que, os bebês filhos de escravos podiam ser vendidos ainda no cativeiro, há também
quem atribua que as negras deixavam suas crianças como uma forma de resistência na
tentativa de livra-los da escravidão. (Del Priore,2000). De acordo com Mott (1979:57)
A roda recebia crianças de qualquer cor e preservava o anonimato dos pais. A
partir do alvará de 31 de janeiro de 1775 as crianças escravas, colocadas na
roda, eram consideradas livres. Este alvará, no entanto, foi letra morta, e as
crianças escravas eram devolvidas aos seus donos, quando solicitadas,
mediante o pagamento das despesas feitas com a criação. Em 1823, saiu um
Decreto que considerava as crianças da roda como órfãs, e assim, filhos dos
escravos seriam criados como cidadãos, gozando dos privilégios dos homens
livres.
Dessa forma, é notória, a inferiorização da criança negra, desta nação escravagista, que
ainda hoje traz suas mazelas enraizadas nas ideologias da construção de sua história.
Podemos destacar que em 1871, é decretada a Lei do Ventre Livre, por esta lei toda
criança, filho de escrava, que nascesse a partir daquela data não era mais escravo, Porém essa
lei não significou a liberdade para a crriança negra, por volta dos sete anos já começam a ser
inseridas nas atividades. É interessante destacarmos esses textos da lei , onde percebemos a
dicotomia da mesma: Lei Nº 2040 de 28.09.1871 – Lei do Ventre Livre, no seu Art. 1º
2 Entre os séculos XVII e XIX, a sociedade ocidental católica desenvolveu uma forma de assistência infantil
chamada Casa da Roda dos Expostos, que deveria garantir a sobrevivência do enjeitado e preservar oculta a
identidade da pessoa que abandonasse ou encontrasse abandonado um bebê.
36
Os filhos de mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei
serão considerados de condição livre. § 1.º - Os ditos filhos menores ficarão
em poder sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão a
obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos.
Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de
receber do Estado a indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços
do menor até a idade de 21 anos completos. No primeiro caso, o Govêrno
receberá o menor e lhe dará destino,em conformidade da presente lei.
Nestes trechos, ficam evidenciados a contrariedade da lei, primeiro porque, os filhos
podiam ficar sob a autoridade do senhor da mãe, depois poderiam ser vendidos, lógico se o
senhor iria receber uma idenização por isso, no nosso entendimento não significaria liberdade,
e outra “opção” era permanecer prestando serviço ao senhor. Não podemos esquecer o destino
que foi oferecido as pessoas pretas em noso país. Sem contar que em todo o percurso da
história do Brasil as leis foram feitas para manter e poteger a classe dominante. A exemplo
disso, podemos citar o racismo, considerando por lei crime inafiansável, porém
constantemente temos presenciados em noticiários, fatos onde há comprovação do racismo,
mas, os réus são liberados mediante pagamento de fianças.
Numa sociedade marcada pelo domínio do senhor branco, as crianças negras eram
maltratadas, estigmatizadas e ainda, separadas de suas mães biólogicas. Segundo Chiavenato (
1999):
Geralmente, ao nascer, o sinhozinho ganhava um negro da mesma idade.
Cresciam e brincavam juntos, mantendo desde o berço a relação de escravo e
senhor. Mal começava engatinhar, o siozinho ja tinha o seu objeto de tortura:
o pequeno escavo servia para ser amassado, batido, x ingado –sob os olhares
complacentes e divertidos dos senhores. Era o “mané-gostoso”, o leva-
pancadas. (p.53).
Constatamos que a vida das crianças negras não foi fácil, não eram vistas como
crianças, e sim como objetos e brinquedos manipuláveis pelos “sinhorzinhos”. Não
precisamos de muitos detalhes para entendermos a situação na qual os negros foram
submetidos e relegados em nossa sociedade, ademais, ao longo deste trabalho. discorremos
um pouco de sua história.
Não podemos negar, que a discriminação é algo recorrente em nosso país, haja vista,
que se analisarmos todo o processo de negatividade, que foi associado ao negro no decorrer
da história, contada pelo branco/dominador, no qual considerou que o negro não era humano,
37
portanto não possuia direitos, os negros foram submetidos a uma instrução cristã, na qual o
objetivo era “doutrinar” com a a finalidade de levá-lo a “salvação” posteriormente à sua
morte.
Diante disso, é criada toda uma rejeição e negação para este povo, sendo poibido a
entrada de crianças negras na escola, vejamos esse aspecto na Lei nº 14 de 22 de dezembro de
1837: Segundo Bernado (2006, p.10) “Artigo 3º São proibidos de freqüentar as escolas
públicas. Parágrafo1º; Todas as pessoas que padecem de moléstias contagiosas. Parágrafo 2º;
Os escravos e os pretos africanos, ainda que Libertos”.
Neste viés, podemos conceber o quanto o fator pele é determinante, algo que vem
desde muito tempo sendo utilizado para definir as pessoas, ou ainda, para eleger quem merece
e quem tem direitos e acesso aos bens econômicos, políticos, sociais e também educacionais.
Essa vertente é bem posta por Araújo e Silva (2005):
As escolas de „primeiras letras‟, ou primárias eram diferenciadas por gênero e
disciplina: aulas de literatura, escrita, cálculos, história do Brasil, princípios
de moral e doutrina religiosa para os meninos, e aulas de escrita, cálculos
elementares e prendas domésticas para as meninas. A população escrava era
impedida de freqüentar a escola formal [...] (Artigo 6, item 1 da Constituição
de 1824) Coibia o ingresso da população negra escrava, que era em larga
escala africana de nascimento (...) No século XIX, surgiram as primeiras
faculdades de medicina, odontologia, engenharia [...] era destinada quase que
exclusivamente às classes sociais privilegiadas para formação de
profissionais de alto nível que iriam exercer as funções do capital e as
funções políticas do país.( p.68).
Se concordarmos que pela educação, conseguiremos superar tantas desigualdades e
injustiças que foram impostas ao negro, acreditamos que é na escola onde a criança formará
suas percepções, uma vez que lá encontrará um mundo simbólico, em que as coisas já
possuem um significado, dado pelos indivíduos, lá a criança negra vivenciará ralações com
contexto e pessoas diferentes. Segundo Cavaleiro (2000) “aprende atitudes, opiniões, valores
a respeito da sociedade ampla e, mais especificamente, do espaço de inserção de seu grupo
racial e social”. (p.2002)
Entretanto, podemos verificar nas palavras de Souza (2008) uma resistência e
transformação de sua própria condição de negro excluído:
38
Ao longo da história brasileira, negros e negras, resistiram e lutaram contra a
opressão e a discriminação através de uma multiplicidade de formas de
resistência [...] a resistência abarca as várias estratégias empreendidas pelos
povos negros para se manterem vivos e perpetuarem sua memória, valores,
história e cultura. São estratégias presente nos costumes. No corpo, no falar,
nas vestimentas, nas expressões, nas organizações socais, políticas e
religiosas. (p.34)
Porém, ao analisarmos a situação da criança negra na escola brasileira, infelizmente
ainda evidenciamos um distanciamento da instituição, quanto a necessária reversão da
negatividade e estigmatização aos negros. Para isto, verifiquemos o comentário de Cavaleiro
(2000).
Não há como negar que o preconceito e as discriminações raciais constituem
um problema de grande monta para a criança negra, visto que essa sofre
direta e cotidianamente maus tratos, agressões e injustiças, os quais afetam
sua infância e comprometem todo seu desenvolvimento intelectual. A escola
e seus agentes os profissionais da educação em geral, tem demonstrado
omissão quanto ao dever de respeitar a diversidade racial e reconhecer com
dignidade as crianças e a juventude negra (p.12).
Dessa forma, sabemos que na escola é contido todo um repertório da sociedade, e que
ao longo dos tempos vem perpetuando as ideologias da classe dominante. Onde são
difundidos os estereótipos construídos historicamente, todos esses elementos podem interferir
no processo perceptual e identitário da criança negra. De acordo com Oliveira et al ( 2005):
Dessa forma, as crianças negras em seu processo de desenvolvimento têm
diversas possibilidades para internalizar um concepção negativa de seu
pertencimento racial, favorecendo a constituição de uma auto-imagem
depreciativa (...). Podemos concluir que estas crianças, já passaram por
processo de subjetivação que as levaram a concepções muito arraigadas no
nosso imaginário social sobre o branco e o negro e, conseqüentemente, sobre
as positividades e negatividades atribuídas a um e a outro grupo racial. No
entanto, isso pode ter sido favorecido pela instituição a partir das concepções
e dos valores das profissionais envolvidas com essas crianças, e também
pelos pais. É claro que não podemos nos esquecer da mídia que atua de forma
bastante forte na veiculação de imagens e idéias que acabem fortalecendo o
grupo racial branco e estigmatizado o grupo racial do negro. ( p.30).
Portanto, acreditamos que, nas interações que as crianças estabelecem, nos mais
variados espaços sociais constituem suas percepções, salientamos o enfoque de Oliveira
(2001) “a criança é um ser social, o que significa dizer que seu desenvolvimento se dá entre
outros seres humanos, em espaço e tempo determinados”. (p.27). Complementando esta idéia,
Sarmento (2004) afirma que “ as crianças são também seres sociais e, como tais, distribuem-
39
se pelos diversos modos de estratificação social: a classe social, a etnia a que pertencem, a
raça, o gênero, a região do globo onde vivem. Os diferentes espaços estruturais diferenciam
profundamente as crianças” ( p. 10).
Ressaltamos que no convívio escolar as crianças negras se deparam com instrumentos
mediadores da sua etnia, ou seja, nos cartazes dos murais, divulgando o modelo de família,
por exemplo, nas festas comemorativas, na literatura, todos estes aspectos remetem a
exaltação do branco, tornando-o como padrão. Infelizmente a escola ainda mantém uma
representatividade de negro pouco difundida, outrora, traz um referencial caricaturado,
tornando esses elementos no imaginário das crianças, aqui destacamos não somente para as
crianças negras, uma representação inferiorizante do negro. Dessa forma, as idéias vão sendo
difundidas. Inferimos, desta maneira, que a escola não está “preparada”, ou ainda,
preocupada em trabalhar as diferenças. Não como algo segregador, mas respeitoso e
enriquecedor da nossa cultura.
É salutar, entendermos que antes de fazermos referência a criança negra é necessário
vê-la como criança, o olhar ao invés de ser para uma criança universal é antes, para uma
criança singular e múltipla. Portanto é pertinente analisar o discurso de Kramer (2002)
As criança são diferentes e tem especificidades, não só por pertencerem a
classes diversas ou por estarem em momentos diversos em termos do
desenvolvimento psicológico. Também os hábitos, costumes e valores
presentes na sua família e na localidade mais próxima interferem na sua
percepção do mundo e sua inserção. E ainda, também, os hábitos, valores e
costumes dos profissionais que com elas convivem no contexto escolar. (
p.22)
Podemos então, dizer que, na escola, as representações se fazem através dos
currículos, de símbolos, ideologias etc. Todos esses instrumentos mediadores do
conhecimento que circulam no contexto escolar, quando arraigados na ideologia hegemônica,
contribuem, para que se configure o preconceito e a discriminação, onde não somente ao
negro, mas à mulher, ao pobre, ao homossexual, ao índio, ao cigano, ao deficiente, atc.
constituirá em estigmas e rótulos. No qual lhes serão propiciados apenas favores.
40
Neste sentido, a escola precisa desenvolver um trabalho, em que as crianças negras se
reconheçam, aceitando-se e tendo orgulho de si, não apenas por pertencerem a um grupo
étnico, mais acima de tudo, por ser gente, e que todos os sujeitos, possam conhecer e respeitar
o outro, desvencilhando-se de preconceitos, a fim de superarmos, os já insuperáveis atrasos
quanto à questão racial na nossa sociedade.
41
CAPÍTULO III
3. METODOLOGIA – BUSCANDO O CAMINHO: IDAS E VOLTAS.
Compreendemos o conhecimento como fruto da intelectualidade humana, no qual
aproxima o homem para o entedimento do mundo que o cerca, possibilitando dessa forma,
apropriar-se da realidade. Quando tratamos do conhecimento cientifíco, logo, relacionamos
este à pesquisa, pois, entendemos o processo de pesquisa como um movimento, uma busca,
uma investigação para as indagações de problemas, e complexidades existentes nas relações
sociais. De acordo com Minayo (1993) a pesquisa compreende:
Atividade básica das ciências na sua indagação e descoberta da realidade. É
uma atitude e uma prática teórica de constante busca que define um processo
intrinsecamente inacabado e permanente. É uma atividade de aproximação
sucessiva da realidade que nunca se esgota, fazendo uma combinação
particular entre teoria e dados. (p.23)
Nesse sentido, necessitamos, escolher um caminho a ser percorrido, o que implica
muitas vezes, um refazer e reconstruir das etapas até então adotadas, dessa forma, o percurso
é feito com idas e voltas. Sendo a escolha deste caminho, o que denominamos por
metodologia, como o processo pelo qual se pode alcançar um determinado objetivo.
Minayo (1993) destaca “ a metodologia inclui as concepções teóricas de abordagem, o
conjunto de técnicas que possibilita a construção da realidade é o sopro do potencial criativo
do investigador” (p.16). Cientes disso, trilhamos nossas buscas e desafios.
3.1 Tipo de Pesquisa
Buscando compreender a realidade, nas suas complexidades e subjetividades,
produzidas no campo das relações sociais , o pesquisador é incitado a “lançar suas redes”,
trabalhando com fenômenos humanos, que lida com pensamentos, sentimentos, interpretações
42
etc. A construção da pesquisa está alicerçada nas bases qualitativas, através de instrumentos
que possibilitaram ao pesquisador uma compreensão sobre o objetivo da pesquisa. Para
Minayo ( 1994):
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se
preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode se
quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de signiicados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais
profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser
reduzidos à operalizaçoes de variáveis. ( p. 22).
Na visão de Ludke e André ( 1986) “ o material obtido nessa pesquisa é rico em
descriões de pessoas, situações e acontecimentos” (p.12). Dessa maneira, podemos então,
salientar que a pesquisa qualitativa através de instrumentos, nos possibilitaram uma
compreensão sobre o objetivo pesquisado: identificar e analisar a percepção que a criança
negra tem de si no convívio escolar.
Nessa abordagem, ressaltamos que a perspectiva qualitativa adotada na pesquisa
permitiu ao pesquisador uma aproximação maior com a realidade pesquisada, através da
experiência vivenciada, possibilitando um conhecimento além da realidade imaginada,
também através de símbolos e subjetividades. Uma vez que, entendemos que a abordagem
qualitativa se preocupa em evidenciar a perspectiva dos sujeitos participantes.
3.2 O lócus da pesquisa
A pesquisa foi realizada na escola municipal Dr. Luiz Viana Filho na cidade de Senhor
do Bonfim-Ba. A escola atende do 3º ao 8º ano do ensino fundamental, constando no seu
quadro de funcionários 28 (vinte e oito) profissionais. A área da escola é relativamente
grande, possui 08 ( oito) salas e 02 (dois) banheiros, 01 (um) pátio, 01 (uma) cantina, 01 (
uma) secretaria, 01 (um) depósito. Notamos a ausência de biblioteca neste espaço e também a
falta de quadra de esportes. Há também, alguns recursos didáticos disponivéis na escola tais
como: TV, DVD, Retro projetor e aparelho de som. A escola atende a uma clientela de 444 (
quatrocentos e quarenta e quatro) alunos.
43
A escolha do lócus, se deu por pertencer a rede municipal de educação e contar com os
sujeitos que preencheram o perfil das crianças escolhidos, ou ainda, por a escola se encontrar
numa região que conta com um número expressivo de comunidades remanescentes de
quilombos e consequentemente atende crianças negras em fase escolar.
3.3 Os sujeitos participantes
Buscando identificar e analisar a percepção que a criança negra tem de si no convívio
escolar, escolhemos como sujeitos para nossa pesquisa, as crianças negras, do 5º ano do
Ensino Fundamental, com faixa etária entre 10 ( dez) a 13 (treze) anos, em relação ao sexo
foi observado de maneira informal, que num universo de 10 (dez) sujeitos, 70% pertencem ao
sexo feminino e 30% ao sexo masculino. O critério de escolha dos sujeitos se deu pelo tom da
pele, uma vez que entendemos que na nossa sociedade é traço marcante para definir as
pessoas que pertencem ao grupo étnico racial negro. Acreditamos também, que em
decorrência da convivência escolar, e também do estágio de desenvolvimento em que se
encontram, tais crianças já conseguem exteriorizarem com mais clareza suas opiniões e
percepções.
3.4 Instrumentos de coleta de dados
Entendemos que os instumentos de coletas de dados são as ferramentas que
possibilitam ao pesquisador coletar os dados. Portanto, no intuito da escuta dos sujeitos, a
escolha dos instrumentos tornou-se crucial na pesquisa, e ao mesmo tempo delicado, primeiro
por se tratar de crianças, segundo por abordarmos uma questão complexa, o cuidado para não
interferir na opinião desses sujeitos foi de extrema importância. Dessa maneira Rudio (1998)
diz o seguinte:
Chama-se de instumento de pesquisa o que é utilizado para a coleta de dados.
Para que se possa ter confiança em aceitar as informaçoes de um instrumento
de pesquisa, este precisa ter as qualidades de validade e fidedignidade. Diz-se
que um instrumento é válido quando mede o que pretende medir e é
44
fidedigno quando aplicado à amosta ofere contentemete os mesmos
resultados ( p.114).
Desse modo, buscamos contemplar nossa pesquisa com a utilização de dois
instrumentos de coletas de dados: observação participante e entrevista semi-estruturada.
A escolha destes instrumentos, justifica-se, pela adequação e pelo cunho qualitativo do tipo
da pesquisa. A observação participante, possibilitou um contato maior com os sujeitos
pesquisados, uma vez que houve um envolvimento entre o pesquisador e pesquisado,
permitindo acompanhar as experiências diárias. Haguete (1987) Afirma o seguinte:
Definimos a observação participante como um processo no qual a presença
do observador numa situação social é mantida para fins de investigação
científica. O observador está em relação face a face com os observados, e, em
participando com eles em seu ambiente natural de vida, coleta dados. Logo, o
observador é parte do contexto, sendo observado, no qual ele ao mesmo
tempo modifica e é modificado por este contexto. O papel do observador
participante pode ser tanto formal como informal, encoberto ou revelado, o
observador pode dispensar muito ou pouco tempo na situação da pesquisa; o
papel do observador participante pode ser uma parte integral da estrutura
social ou ser simplesmente periférica com relação a ela. (p.163)
Nesse sentido, a observação participante, tornou-se um instrumento primordial para o
pesquisador, pois, oportunizou conhecer e interagir, garantindo assim uma confiança por parte
dos sujeitos pesquisados. Dessa maneira André (1997) sustenta que “Utilizando
principalmente a observação, o pesquisador vai acumulando descrições (...) em função do
qual ele faz suas análises e interpretações”. (p38)
Afim de completar e obter mais informações relevantes referentes as percepções que
as crianças negras tem de si na convivência escolar, foi aplicada e entrevista semi-
estuturada com cada um dos sujeitos, visando a escuta dos mesmos.
De acordo com Triviños (2001, p.146) a entrevista semi-estruturada, em geral, parte
de alguns questionamentos básicos amparados na teoria e, em seguida oferecem amplo campo
de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as
respostas do informante.
A escolha da entrevista semi-estruturada possibilitou as informações fluirem mais
naturalmente, uma vez que o entrevistado não se vê cercado por uma série de quesões
45
fechadas. Assim, utilizamos questões norteadas, sem, contudo, reter a liberdade nem
tampouco a espontaneidade dos sujeitos. A opção por esta técnica se deu pela oportunidade de
ficarmos frente a frente com o entrevistado, observando o que ele diz e como diz, gestos,
expressões sociais, alterações da voz, etc. todos esses elementos constituiram numa riqueza de
detalhes. Como bem afirma Minayo (1994) “ a entrevista não significa uma conversa
despretensiosa e neutra, uma vez que se insere como meio de coleta dos fatos relatados pelos
autores, enquanto sujeito/objeto da pesquisa que vivenciam uma determinada realidade que
esta sendo focalizada” ( p.57). Esse procedimento favoreceu uma maior confiança junto ao
pesquisado.
3.5 Desenvolvimento da pesquisa
Para chegarmos ao nosso objetivo, além de leituras, utilizamos e aplicamos os
instrumentos, este processo ocorreu por etapas, primeiramente buscamos conhecer os sujeitos
e também o contexto no qual estavam inseridos. Inicialmente foram feitas visitas periódicas à
escola escolhida, a fim de apresentar nosso projeto e posteriormente a socialização com os
sujeitos sobre a nossa proposta de estudo.
As observações foram feitas através de anotações e também de participação em
algumas atividades que propusemos para os sujeitos, na qual através destas, pudemos
perceber os sentimentos e também opiniões dos sujeitos em relação à temática exposta, dado
esse primeiro passo, posteriormente aplicamos a entrevista semi-estruturada, nesta etapa,
encontramos algumas dificuldades, pelo fato de lidarmos com crianças. No intuito de garantir
uma maior aproximação, não desprezando nenhum detalhe relevante, facilitando dessa
maneira, a transcrição para uma melhor interpretação as entrevistas foram gravadas, essa
opção, gerou em algumas crianças, uma certa resitência. Porém, o contato anterior com a
observação, possibilitou a confiança, fazendo com que as crianças se expressasem de maneira
satisfatória nos instumentos.
No desenvolvimento desta pesquisa, uma etapa foi detalhadamente cautelosa, a análise
e interpretação dos dados. Pois, esta etapa é fundamentalmente importante no andameto da
pesquisa.
46
Visando uma melhor compreensão, fizemos associações dos resultados das
observações com as entrevistas . A partir da posse dos dados, de uma amostra de 20 crianças,
foram selecionados 10 sujeitos a serem pesquisados, por se encaixarem no perfil almejado da
pesquisa, ou seja, necessariamente crianças negras. Diante dos elementos pré-definidos,
foram elencadas as categorias. Esse evento na opinião de Franco (2003) corresponde:
Formular categorias, em análise de conteúdo, é, via de regra, um processo
longo, dificil e desafiante. Mesmo quando o problema está claramente
definido e as hipóteses (explicitas ou implicitas) satisfatoriamente delineadas,
a criação das categoria de análise exige grande esforço por parte do
pesquisador. (p.51).
Sem dúvida, essa etapa constitiu um desgaste na elaboração das categorias, tivemos
dificuldades e preocupações em lançá-las, uma vez que o fenômeno analisado, é circunscrito
numa complexidade, fazendo com que em alguns momentos as crianças pesquisadas,
revelassem suas percepções assemelhando-se umas das outras. Contamos, então, além da
contribuição dos sujeitos, com o alinhamento na base epistemológica, que nos permitiram
uma interpretação mais clara sobre as percepções das crianças negras sobre si.
47
CAPÍTULO IV
4. ANALISANDO OS DADOS E INTERPRETANDO OS RESULTADOS
Neste capítulo, apresentaremos os dados coletados, com seus respectivos resultados.
Diante da busca em saber a percepção que a criança negra tem de si no convívio escolar, e
ancorado nos instrumentos de coletas de dados, obtivemos informações importantes, a partir
do contexto e das revelações dos sujeitos.
Sem a pretensão de encontrarmos respostas únicas ou verdadeiras nos nossos estudos,
o nosso olhar foi buscar respostas possíveis, que auxiliassem nosso entendimento frente ao
problema levantado. Porque, compreendemos que a pesquisa não é um fim de um
questionamento, mas sempre uma possibilidade de novos olhares, de novas indagações e
novos desafios.
E foi esse sentimento, que nos instigou a conhecer a percepção que a criança negra
tem de si no convívio escolar, a preocupação em saber o que pensam e como pensam sobre si,
numa sociedade marcada por preconceito racial. Nesse intuito, utilizamos como instrumentos
de coleta de dados a observação participante e a entrevista semi-estruturada.
Com a finalidade de identificar e analisar a percepção que a criança negra tem de si no
convívio escolar, apresentamos as percepções dos sujeitos através das identificações que
coletamos nas observações participantes e na entrevista semi-estruturada. Optamos fazer essas
análises e interpretações simultaneamente, por verificarmos que em muitos momentos as
falas eram semelhantes e/ou complementares. Dessa maneira, compreendemos que um
instrumento possibilitou a complementação das informações a respeito do nosso objeto de
estudo.
Desse modo, elencamos as categorias, criadas a partir das observações participantes e
da entrevista semi-estruturada, optamos por estabelecer duas categorias que em alguns
momentos geraram outras subcategorias dentro destas.
48
4.1 Resultados da observação participante e entrevista semi-estruturada.
4.1.1 A negritude negada: negações adquiridas a partir dos estereótipos circulantes no meio
social
Nesta categoria colocamos as percepções dos sujeitos referentes à sua negritude a
partir das negações que emergiram nos discursos e nas reações observadas. Elegemos outras
subcategorias dentro desta, a fim de subsidiarem e complementarem nossas análises.
Tento em vista os dados coletados e as análises e interpretações desenvolvidas na
pesquisa foram reveladas nas afirmações, de um total de 10 (dez) sujeitos que 60% das
crianças negras reconheceram-se como pertencentes ao grupo étnico racial negro, 20% se
declararam brancas e outras 20% morenas e índios. O mais instigante nessas análises é que
mesmo tendo escolhido crianças negras como sujeitos, 20% se declararam brancas e outras
20% morenas e índios.
4.1.2 A percepção da negritude amenizada: o “moreno” substituindo a negritude.
Analisando alguns pontos, salientamos que das crianças que se declararam negras,
atribuíram este pertencimento aos traços genéticos, como a cor da pele e cabelo crespo.
Nessas revelações, a cor “morena” soou como uma amenização do ser negro. Vejamos
algumas falas:
- pertenço aos negros. Porque sou muito morena (c7)
- acho que a dos índios, é índio. Porque somos morenos, e tenho cabelo liso
(c8)
- ao branco. Não sei por quê. (c1).
- aos morenos, né? Porque a minha pele é morena. (c9).
Neste viés, notamos a dificuldade de algumas crianças, quanto ao reconhecimento de
sua cor, atribuindo este pertencimento somente aos traços genéticos, como a cor da pele e
cabelo crespo. Essa dificuldade é entendida por Cavaleiro (2002) como:
Fonte: Observação participante com os sujeitos pesquisados.
49
As crianças negras nesta faixa etária se sentem desconfortáveis quando da
necessidade de verbalizar ou assumir a sua condição racial. Tendencialmente
as crianças demonstram uma interiorização de sua diferença racial,
procurando assemelhar-se ao branco (p.2001).
Desse modo, a revelação de ser negro veio caracterizada pelo tom da pele; a percepção
de si acontece através do fator biológico que nas suas falas ficaram acentuados. Notamos que,
o sou moreno substitui o sou negro, tais verbalizações aconteceram com uma voz tímida, sem
muita expressividade.
4.1.3 Ser ou não ser? A percepção do orgulho de ser negro para as crianças negras.
Para tentarmos entender e discutir esse aspecto verificamos que das crianças que
afirmaram ser negras, constando o percentual de 60%, atribuíram o orgulho em ser negro os
40% disseram ser brancos e índios. Eis os discursos:
- tenho orgulho, pela cor da minha pele (c4)
- porque sou muito morena, tenho porque sim (c2)
- porque eu nasci assim, tenho orgulho, porque eu não sei (c6)
- por causa da cor, eu gosto ( c3)
Através desses discursos, foi evidenciado o orgulho apenas pela cor da pele, havendo a
negação do legado cultural deste povo, inferimos, desta maneira, a influência que a ideologia
dominante difundiu sobre as identidades dessas crianças. Como bem afirma Munanga (1988)
“a memória que lhe inculcam não é a de seu povo, a história que lhe ensinam é outra, os
ancestrais africanos são substituídos por gauleses e francos de cabelos loiros e olhos azuis”
(p.23).
Podemos identificar o papel da educação nesse inculcamento, uma vez que tem
transmitido os valores da cultura branca como sendo a superior, ou ainda, a verdadeira. As
crianças não atribuem em momento algum, orgulho por ser um povo com uma história, de
participação no desenvolvimento do país, uma história de lutas e resistências, um povo com
história de homens livres antes da escravidão, o orgulho por ter um legado cultural rico, quer
seja, na dança, na música, na culinária, na religião, etc.
50
Também, podemos verificar a influência da escola, por meio dos conteúdos
programáticos e dos livros didáticos, nas histórias infantis, reforçando a imagem do branco,
enfatizando o padrão europeu em detrimento do negro. Bem citado por Cavaleiro (2002) “nas
escolas, o racismo se expressa de múltiplas formas: negação das tradições africanas, dos
costumes, da nossa filosofia de vida, da nossa posição no mundo” (p.07).
Nesta ênfase, percebe-se que o orgulho em ser negro, é desvinculado da história, das
raízes, as crianças expressaram este orgulho com pouco entusiasmo, meio apáticos ou até
mesmo alheios a questão, tal posição ao nosso entendimento resulta de uma falta de discussão
sobre o negro nestes espaços, e justamente quando se referem apenas ao tom da pele, é
compreendido o significado de ser negro que vem se perpetuando ao longo dos tempos.
4.1.4 A percepção de beleza para criança negra: a criança branca como modelo.
Refletindo mais sobre a questão, trazemos aqui um aspecto que foi identificado por
algumas crianças, na qual mesmo reconhecendo-se negras, muitas crianças revelaram através
da proposta de um quadro comparativo com imagens de crianças negras e crianças brancas, a
preferência pela criança branca. Das 10 (dez), quando questionadas com qual das crianças elas
se pareciam, 80% dos sujeitos pesquisados apontaram para a criança negra, os outros 20% se
referiram a criança branca. Porém quando perguntamos qual das crianças era a mais bonita
70% afirmaram ser a criança branca mais bonita que a negra, apenas 30%, declararam ser a
criança negra mais bonita. Eis algumas de suas falas:
- a criança branca, porque é mais branquinha (c3)
- porque acho o branco mais bonito do que o preto (c5)
-porque o branco é bonito (c8)
Esses discursos evidenciam a negação da cor negra, mesmo as que afirmaram ser
negra, acharam a criança branca mais bonita, as crianças negras expuseram uma percepção
depreciativa de si, ou seja, não se acham bonitos, por causa da cor. A cor aqui expressa em
nosso entendimento denota significados, subjacentes de um contexto maior e especifico.
Nessa perspectiva, podemos dizer que os referenciais de beleza propagandas nas diversas
51
interações sociais, e nos meios de comunicação veiculam a imagem do branco como padrão
estético de beleza em detrimento da imagem do negro. Ciente disso, Munanga (1988) diz o
seguinte:
Bem divulgado, o retrato degradante acaba por ser aceito pelo negro, e
contribuirá para torná-lo realidade, e, portanto, uma mitificação. Podemos
comparar esta situação com a ideologia de classe dirigente, que é adotada
freqüentemente pelas dominadas. Ao concordarem com ela, os submissos
confirmam o papel que lhes foi atribuído. (...) ora para nisso chegarem,
pressupunha-se a admiração da cor do outro, o amor ao branco, a aceitação
da colonização e a auto-recusa. E os dois componentes desta tentativa de
libertação estão estreitamente ligados: subjacente ao amor pelo colonizador
há um complexo de sentimentos que vão da vergonha ao ódio de si próprio
(p.26-27).
Assim, podemos visualizar o legado de negatividade que estas crianças trazem consigo
oriundas das internalizações, propagadas ao longo da história, difundindo a imagem
estigmatizada do negro, no qual reforçam no imaginário da criança negra sentimentos de
inferioridade e também de rejeição.
Outro fator foi identificado nos discursos de algumas crianças. Durante a coleta de
dados, foi questionado sobre o que mais apreciavam em si, o que mais gostavam fisicamente,
das 10 (dez) crianças pesquisadas cerca de 50% declararam que o corpo era bonito, e 30%
afirmaram gostar dos cabelos, 10% se referiram à pele e outros 10% aos dentes. Eis algumas
falas:
- o corpo é bonito. (c6).
- o cabelo, acho ele bonito (c7)
- meu rosto, ah! também o corpo (c5).
A percepção da beleza está fortemente arraigada ao corpo, ao cabelo, aos dentes, essas
crianças, em alguns momentos exaltam sua beleza referente ao corpo, notamos que
ultimamente na nossa sociedade o negro é visto como exótico, que está na moda,
principalmente na mídia tem propagado esse “tipo” de beleza. Ao fazerem essas afirmações,
as crianças demonstram um conflito de suas idéias sobre o ser bonito, pois revelaram
anteriormente considerar o branco mais bonito, referindo-se a cor da pele, mas quando se
referiam ao corpo viam o negro como beleza. Esses discursos ao longo dos tempos vêem
sendo propagados, basta pensarmos no carnaval, por exemplo, em que são desnudados o
52
corpo das mulheres negras, tidas como mulatas símbolos do carnaval, no qual foram e ainda
são associadas estas imagens a exploração sexual da mulher e do negro.
Esta observação é bem posta por Gomes (2002) quando diz que “o corpo fala a
respeito do nosso estar no mundo, pois a nossa localização na sociedade dá-se pela sua
mediação no espaço e no tempo. Estamos diante de uma realidade dupla e dialética: ao
mesmo tempo em que é natural, o corpo é também simbólico”. Tais atributos são frutos,
podemos dizer de uma cultura pré-determinanda utilizada como demarcador das coisas e das
pessoas. Nesse sentido, (GOMES, 2002, apud MARTINS, 1999) Diz que o corpo é:
"referência revolucionária da universalidade do homem no contraponto crítico e contestador à
coisificação da pessoa e à exploração do homem pelo homem na mediação das coisas".Dessa
maneira, entendemos que ainda continuamos a utilizar simbolicamente estereotipos que
trazem consigo aspectos ideológicos carregados de valores e singnificados inferiores em
realção ao negro.
Nesse contexto, procuramos analisar também como as crianças negras percebem esses
significados, como se vêem nessa malha de referências pautados no padrão branco. Nesse
aspecto, foram reveladas nas vozes de 50% das crianças, o desejo de mudança, quando
questionadas o que menos gostavam em si, ou que mudariam fisicamente, outras 50%
afirmaram que não mudariam nada em si fisicamente. Nas características citadas, os desejos
de mudança das crianças aproximam-se do paradigma de beleza estética associado ao branco
europeu. Tais falas nos apontam as seguintes percepções:
- mudaria o meu nariz, deixaria mais fino, porque ele é feio. (c8)
- eu mudaria meu cabelo, ele dá trabalho, é muito cacheado. (c6)
- eu? Minha boca, meus lábios são grossos demais. (c1).
Desse modo, o desejo de mudança está ancorado nos traços do branco, quando falam
do nariz mais fino, dos lábios, denotam não gostar desses atributos característicos do povo
negro. E todos esses elementos foram incutidos nas nossas mentes há muito tempo, o bonito é
ter cabelo liso, nariz afilado etc. valores estéticos, que foram propagados pela ideologia
dominadora. Isso de acordo com Gomes (2002) “durante séculos de escravidão, a
perversidade do regime escravista se materializou na forma como o corpo negro era visto e
tratado”. Essa concepção, foi e infelizmente ainda é difundida, nos diversos espaços sociais.
53
A autora citada ainda argumenta que “foi a comparação dos sinais do corpo negro
como o nariz, a boca, a cor da pele e tipo de cabelo em relação ao branco europeu e
colonizador que, naquele contexto, serviu de argumento para a formulação de um padrão de
beleza e de fealdade que nos persegue até os dias atuais”. Todos esses fatores, perpassam na
nossa sociedade, através dos diversos canais sociais, aqui destacamos a convivência escolar,
pois neste ambiente a criança passa grande parte do seu tempo, além disso, nessa convivência
permeia-se e difundi-se símbolos e valores ditados por uma ideologia hegemônica, que
reflete negativamente na vida das criança negras.
Essa classificação, na nossa sociedade tem servido de parametro para distiguir o belo e
o feio, o inculcamento de um padrão de beleza, acaba comprometendo a estima das crianças
negras, uma vez que não se vêem representada, tampouo se reconhecem ditado por este, a
angústia em querer assemelhar-se a criança branca, em ser vista e valorizada, nesses aspectos,
poderá comprometer o reconhecimento de si, sua identidade e consequentemente levando as
crianças negras a uma baixa-estima.
4.2 A negritude utilizada como agressão: a partir dos estereótipos circulantes no meio
escolar.
Nesta outra categoria, buscamos analisar como a negritude é utilizada e refletida no
ambiente escolar. Para as crianças a convivência escolar é, depois da família, o ambiente em
que ela permanecerá por mais tempo. Talvez a escola seja para estas crianças a primeira
experiência pública de rejeição ao corpo (GOMES, 2002).
Nesse sentido, foram ressaltadas nas vozes das crianças negras, quando questionadas
se já sofreram alguma brincadeira, piada ou apelido na escola, por causa da sua cor. Dos 10
(dez) entrevistados, 50% dizem já ter recebido apelidos, e 50% revelaram que não. Vejamos:
54
-já, me chamaram de neguinha. (c1)
- que me lembre, não (c9)
- nigrinha (c5)
- amarela pombada ( c6)
- negão. (c10)
Nessa perspectiva, percebemos que as crianças que expuseram suas falas, denotavam
uma percepção de desqualificação, quando recebido esses estereótipos, que foram criados
para diminuir e desqualificar o negro, e como esse sentimento é soado como acusador para
muitos. Esse argumento é apontado por Gomes (2002) “os sinais diacríticos operam como
demarcadores da diferença. Quanto mais aumentam as vivências da criança negra fora do
universo familiar, quanto mais essa criança ou adolescente insere-se em círculos sociais mais
amplos, como é o caso da escola, mais manifesta-se a tensão vivida pelos negros”.
Vemos aqui, que estes estereotipos, traduzidos em apelidos, tornam-se em agressões,
tanto quem recebe quanto quem agride, utilizam-se da negritude como um fator diminutivo e
também discriminatório. Sendo assim, acreditamos que na escola tanto pode reforçar essas
manifestações , como pode também transformá-las, uma vez que se configura como um canal
mais amplo de inserção social.
Nessa perspectiva, concordamos com Munanga (1988) quando diz “é preciso
desembaraçar-se desta imagem acusatória e destruidora, atacar de frente a opressão, já que é
impossível contorná-la” (p.32) Compreendemos que nas interações sociais, sobretudo na
escola, as crianças adquirem internalizações como marcas que podem carregar para o resto da
vida, porém este mesmo espaço pode atuar também para superar essas marcas e agressões.
4.3.A percepção dos estereótipos pelas crianças negras: o sentimento ao serem
estereotipadas.
Outras revelações dos sujeitos frente à agressão da negritude foram evidenciadas, 50%
disseram não ter recebido nenhum apelido em relação a sua cor, e das que responderam ter
sofrido com apelidos relacionados à cor, 30% confessaram ter se sentido mal, e 20% ficaram
indiferente. Dessa forma ao manifestarem um sentimento de repudio, as crianças negras
55
pesquisadas, demonstraram não gostar dos apelidos, gerando nas mesmas sentimentos de
vergonha, humilhação e agressão. Eis as revelações:
- eu não gostei, achei ruim. (c6)
- ruim, eu não gostei de ser chamada de nega. (c8)
Nesse sentido, entendemos que essas atitudes geram para a criança negra um
desconforto, pois ser negro, tem significado no nosso país, carregar estereótipos e estigmas,
que soam como indicativo de negação e rejeição. Nesse termos as crianças, percebem uma
imagem de si caricaturada e depreciativa. Ciente disso, Cerqueira (2005) tece o seguinte
comentário:
O processo de reação à inferiorização de que são vitimas grande parte no
âmbito escolar, leva essas crianças a construir formas de resistência que
resultam em relações tensas e conduzem a maior exclusão, uma vez que elas
podem responder com atitudes agressivas ou de desinteresse pela escola e
aprendizagem como uma maneira de resistir e insurgir contra a agressão
simbólica ou explicita que são vitimas. (p.107).
Notamos que tais atitudes, repercutem como um complexo de baixa-estima,
apreendidas pelas crianças negras, trazendo nas mesmas o sentimento de marginalização.
Como diz Cavaleiro (2002) “não podemos perder de vista que atitudes magoam e marcam,
provavelmente, a criança pela vida afora” (p.217). Consideramos que a convivência escolar, é
marcada por diversos conceitos, idéias e preconceitos, que se configuram na formação do
cidadão, essa vivência são frutos, como bem afirma Gomes (2006) de “comportamentos,
rituais, tradições e heranças e todo um contexto histórico e político que interferem no
processo de construção da identidade étnico-racial de qualquer grupo humano”. Além disso, a
escola é um espaço necessário para a legitimação do sujeito, portanto, deve trabalhar no
sentido de desconstruir a imagem negativa que foi associada ao negro, valorizando,
integrando e ressignificando, acima de tudo, a valorização humana.
56
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho de pesquisa cujo objetivo foi saber a percepção que a criança negra tem
de si na convivência escolar, nos possibilitou tecer algumas considerações a partir das análises
e reflexões. Nesta perspectiva, foi considerado o processo histórico, político, econômico,
social e cultural, no qual o negro foi visto e representado em nossa sociedade, gerando dessa
conjuntura sua etnia racial. Todos esses elementos serviram como base, para entendermos as
conseqüências que tal sistema deixou na vida do povo negro e, sobretudo como tem
repercutido e constituído na percepção da criança negra.
Esses aspectos nos remeteram aos longos anos de um regime cruel e desumano de
escravidão no qual a população negra fora submetida, cujos resquícios, ainda continuam
afligindo sua descendência. Parametrizados, por uma ideologia dominadora, que por muito
tempo tem divulgado um discurso negativista em relação ao negro, e para isto, utiliza-se de
mecanismos ideologizadores através de instrumentos de controle, no qual o modelo
educacional é um dos pilares sustentador dessa base montada e forjada para manter o poder
hegemônico da elite branca. Nessa ênfase, a escola torna-se local privilegiado para garantir
esta supremacia, pois conta com uma série de “artifícios”, hora velados, outras vezes nem
tanto, difusores desse sistema, desde um currículo embranquecido, o livro didático, os
símbolos, enfim os discursos que circulam neste espaço, são subjacentes à ideologia
dominadora.
Entendemos que esta convivência escolar, através destes mecanismos conduz e induz a
percepção da criança negra para uma imagem depreciativa de si, apropriando-se dos ideais e
valores da cultura maior, ou seja, a branca. Reforçando dessa maneira, os estereótipos
difundidos do negro.
Diante disso, nos questionamentos realizados com sujeitos e as análises, nos
trouxeram elementos significativos sobre a percepção que a criança negra tem de si, onde,
mesmo demonstrando um reconhecimento de pertencimento ao grupo étnico-racial negro,
através da cor da pele como um dos fatores fortemente elaborados nos discursos dos sujeitos.
Há ao mesmo tempo, uma não aceitabilidade de si, como a negação de traços característicos
57
da sua etnicidade, como o nariz, o cabelo, os lábios, e nestes discursos evidenciaram o desejo
de assemelhar-se ao branco, reforçando as ideologias propagadas do padrão de beleza estética
na nossa sociedade, em que o branco é referencial e sinônimo de beleza, gerando para a
criança negra uma depreciação e desqualificação da sua auto-imagem.
As nossas análises também nos possibilitaram visualizar um conflito nas percepções
das crianças, referentes à beleza, hora consideravam o branco como bonito, por ter a pele
clara, hora atribuíam a beleza ao corpo do negro. Aqui, entendemos haver não uma
contradição nos discursos das crianças, e sim um referencial a ser seguido e aceito,
propagados com o mito da democracia racial, no qual as crianças absorvem discursos
relacionados a ser negro é ser exótico, é está na moda, exaltando o corpo do negro, esses
argumentos, não foram utilizados no sentido de promover a igualdade e aceitabilidade dos
negros, ou tampouco de significarem o reconhecimento de uma sociedade multirracial, o que
se criou de fato foram estratégias para manter a dominação.
Em suma, mesmo cientes do nosso amadorismo, enquanto pesquisador e dos possíveis
espaços vazios que hora possam apresentar esta pesquisa, compreendemos que este trabalho,
pôde contribuir no reconhecimento da percepção que as crianças negras têm sobre si, a partir
dos discursos circulantes na convivência escolar. Diante disso, acreditamos que estes
resultados nos revelaram que há dentro desta sociedade, especialmente dentro deste universo
escolar, muitos questionamentos, dúvidas, fatos e relatos dentre outros, relacionados à
negritude da criança. Tendo como convicções que uma sociedade será mais justa, através de
realizações coletivas, nesse intuito, consideramos o quanto é necessário efetivamente afunilar
essas questões, no sentido de valorização do negro para que floresça nestas crianças o orgulho
e aceitabilidade de si, não somente por pertencerem a esta ou aquela etnia, mas, sobretudo por
ser gente.
58
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64
ANEXOS
65
OBSERVAÇÃO PARTICIANTE ATIVIDADE APLICADA AOS SUJEITOS
1- Com qual desenho você se parece?
Menino Rosa Menino Marrom
2- Para você qual o desenho mais bonito? Por quê?
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3- Qual dessas crianças você acha mais bonita?
4- Você gostaria de parecer com qual delas? Criança A ou criança B? Por quê?
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O menino Rosa (Ziraldo)
O menino Marrom ( Ziraldo)
A B
O menino Rosa ( Ziraldo)
Imagem da internet Imagem da internet
66
ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
Caro aluno, estamos realizando esta pesquisa para elaboração do trabalho de conclusão
de curso relativo ao curso de Pedagogia da Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Por
isso, gostaríamoss de contar com a sua disponibilidade e colaboração para realização da nossa
pesquisa. Lebramos que a sua identidade será mantida em sigilo na apresentação dos
resultados.
1- Qual o grupo étnico-racial você pertence?
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2- Você tem orgulho de pertencer a este grupo? Por que ?
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3- Se você não pertencesse a este grupo ao qual você gostaria de pertencer? Por
quê?
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4- Quando você se olha no espelho o que você vê? Ou como você se vê? Você gosta?
Por quê?
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67
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5- Você já recebeu algum apelido, piada ou brincadeira? Por pertencer a Este
grupo étnico- racial? Qual?
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6- Como você se sentiu?
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7- Qual o seu maior sonho? Você acha que conseguirá realizar? Por quê?
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8- O que você mais gosta em você? Fisicamente, por quê?
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9- O que você menos gosta em você? Fisicamente por quê -----------------------------
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