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Neurose 1 “O neurótico é aquele que não vê o óbvio” (Fritz Perls, 1973) A neurose é resultado da rigidez na definição do limite de contato em relação às outras pessoas e de uma inabilidade em encontrar e manter o equilíbrio com eles. Os neuróticos são aqueles que interrompem seu próprio crescimento, não enxergando claramente suas necessidades ou fazendo uma distinção entre eles e o resto do mundo de forma apropriada. Através do desequilíbrio estabelecido, a pessoa passa a sentir que os limites sociais e ambientais penetram fortemente em si. As funções de contato e afastamento num indivíduo neurótico, de acordo se encontram perturbadas, eles são incapazes de viver no presente além de se encontrar frente a um aglomerado de gestalts inacabadas do passado. “A neurose está vinculada ao acúmulo de gestalts inacabadas, de necessidades não satisfeitas, ou seja, de repetidas dificuldades de ajustamento entre organismo e seu meio”. (GINGER e GINGER, 1995, p.125) Resistências : (ou disfunções de contato ou mecanismos neuróticos) 1 Texto elaborado pela professora Josiane Prado para a disciplina Abordagem Psicoterápica: Gestalt-Terapia

Neurose

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Neurose desde Gestalt Terapia

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Page 1: Neurose

Neurose1

“O neurótico é aquele que não vê o óbvio” (Fritz Perls, 1973)

A neurose é resultado da rigidez na definição do limite de contato em

relação às outras pessoas e de uma inabilidade em encontrar e manter o

equilíbrio com eles. Os neuróticos são aqueles que interrompem seu próprio

crescimento, não enxergando claramente suas necessidades ou fazendo uma

distinção entre eles e o resto do mundo de forma apropriada. Através do

desequilíbrio estabelecido, a pessoa passa a sentir que os limites sociais e

ambientais penetram fortemente em si.

As funções de contato e afastamento num indivíduo neurótico, de acordo

se encontram perturbadas, eles são incapazes de viver no presente além de se

encontrar frente a um aglomerado de gestalts inacabadas do passado.

“A neurose está vinculada ao acúmulo de gestalts inacabadas, de

necessidades não satisfeitas, ou seja, de repetidas dificuldades de ajustamento

entre organismo e seu meio”. (GINGER e GINGER, 1995, p.125)

Resistências: (ou disfunções de contato ou mecanismos neuróticos)

“A resistência é em si um mecanismo de defesa da angústia e da ansiedade experienciadas como insuportáveis pelo indivíduo. Não é um termo unívoco, como se fosse um processo global e independente, entendido igualmente pelas pessoas. Ela tem muitos significados, enquanto considerada em si e enquanto considerada na sua relação com diferentes situações vividas pelas pessoas. Considerada tradicionalmente como um mecanismo de defesa, apresenta vários nomes ou divisões didáticas de uma única realidade e, nesse caso, é chamada projeção, introjeção, etc.”. (RIBEIRO, 2007, p.75)

O autor acima citado aponta que, como na física, a resistência psicológica

assume um papel controlador e protetor, passando a ser um instrumento de

vital importância na regulação do objeto com seu meio circundante, a

1 Texto elaborado pela professora Josiane Prado para a disciplina

Abordagem Psicoterápica: Gestalt-Terapia

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resistência é a expressão do sistema interno de relações estabelecidas com o

mundo. A resistência nos fornece as informações necessárias para se entender

como a pessoa estrutura uma percepção de si e de como compreende a sua

realidade. “A experiência da resistência ocorre no campo físico-existencial da

pessoa, intensificando-se na fronteira na qual o contato entre pessoa e meio se

torna mais claro e, às vezes, premente, porque aí forças opostas se debatem

na tentativa de vencer uma à outra” (p.76).

As resistências ou disfunções de contato são mecanismos neuróticos

que surgem da incapacidade do indivíduo manter equilíbrio entre ele e o seu

meio, que inclui o outro. (PERLS, 1988)

O contato faz o indivíduo discriminar a si mesmo do meio ou do outro,

assim, ele se diferencia e passa a se relacionar num ritmo fluido de

aproximação e retraimento, entretanto, quando a pessoa não consegue

estabelecer contato ela utiliza mecanismos de evitação denominados

disfunções de contato, levando o individuo a se confundir ou a se isolar do

ambiente.

Disfunções de contato:

Introjeção:

Esse mecanismo é descrito por Spangernberg (2004, p. 28) como

“tomar algo que pertence ao meio ambiente e introduzi-lo dentro de nossa

identidade, sem que se realize o processo de assimilação à mesma”. A

introjeção significa “engolir inteiro” sejam as idéias, hábitos ou os princípios,

sem ter o cuidado de os transformar para assimilá-los.

Dessa forma, ela envolve a incorporação de atitudes e pensamentos do

meio externo, que são assimilados de forma com que parecem pertencer ao

individuo, as introjeções são uma forma de erguer uma barreira entre individuo

e o mundo. O excesso de introjeção leva a pessoa a se autodesvalorizar,

conduzindo-a à auto-alienação favorecendo o aparecimento de outro

mecanismo, denominado projeção (CARDELLA, 1994).

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A tarefa para se desfazer desse mecanismo é, aponta Polster e Polster

(2001), procurar estabelecer um senso de escolhas disponíveis para o

indivíduo, em possibilita o mesmo a diferenciar “eu” e “eles”.

Projeção:

É o inverso da introjeção, enquanto que a introjeção é a tendência a

tornar o self responsável pelo que, de fato, cabe ao meio, a projeção é a

tendência a atribuir ao meio a responsabilidade por aquilo que tem origem no

self.

Na projeção, conforme Cardella (1994) o individuo projeta conteúdos

seus ao meio, nesse sentido, ela se revela nas expectativas da pessoa em

relação ao outro, como por exemplo, que ele possa dar sentido a vida da

pessoa e fazê-la feliz, para que o outro satisfaça suas exigências. A pessoa

atribui ao outro características que são suas. “Quem usa a projeção é um

indivíduo que não pode aceitar seus sentimentos e ações porque não “deveria”

sentir ou agir deste modo”. (POLSTER; POLSTER, 2001, p. 98)

Spangernberg (2004, p.27) considera que “projetar é, em seu aspecto

limitador (resistência), desapropriar-se ou alienar-se de uma parte de nossa

totalidade, pela via de depositá-la fora de nossa identidade: seja em outros, ou

no ambiente em geral”

A dinâmica terapeuta acredita que nós somos criadores das nossas

próprias vidas e ao recuperar mossas criações, nos motivamos a mudar nosso

próprio mundo.

Retroflexão:

Na retroflexão o individuo faz consigo o que gostaria de fazer com outra

pessoa e pode ter dificuldades em dizer não, já que já o disse a si mesmo,

exige exageradamente de si mesmo, se cobrando uma espécie de perfeição, o

retroflexor se cobra, culpa, persegue-se demais ao invés de aceitar-se como é

(CARDELLA, 1994).

É necessário, conforme Polster e Polster (2001) voltar para a

autoconsciência que acompanhou o início desse processo para se desfazer

dele já que quando ela sabe o que está acontecendo internamente, sua energia

é mobilizada para buscar saída na fantasia ou na ação.

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Deflexão:

É a maneira de evitar o contato direto com o outro, através da recusa de

se envolver com os outros de modo inteiro e pessoal. O parceiro de um

deflexor tem a tendência de se sentir isolado, não visto e não ouvido

(CARDELLA, 1994).

É como se a pessoa que deflete possuísse uma espécie de escudo

invisível, o calor é retirado ao se recorrer a falar em rodeios, pela linguagem

excessiva, quando ri daquilo que a pessoa diz, a não se olhar pra pessoa com

que está conversando, por não ir direto ao ponto, por dar exemplos ruins ou

nenhum exemplo, por exprimir emoções brandas ao invés de intensas, falar

mais sobre o passado do que sobre o presente, por conversar sobre ao invés

de com, por desconsiderar a importância daquilo que acabou de ser dito, a

pessoa não colhe os frutos de sua atividade porque as coisas simplesmente

não acontecem (POLSTER & POLSTER, 2001).

Confluência:

O indivíduo ressalta Cardella (1994), sente-se indiferenciado entre si e o

meio, confundindo o que é seu com o que é do outro, nos relacionamentos

afetivos a confluência se mostra quando um ou ambos os parceiros exigem

semelhanças e não toleram diferenças, passam a depender muito uma da

outra, como uma simbiose e o afastamento é sentido como uma ameaça,

existe uma exigência de que o parceiro só seja feliz com o outro, com pouco

contato com outras pessoas, assim ela não cresce e não permite que o

parceiro cresça.

Conforme Spangernberg (2004, p.30), confluência significa “confusão,

perder-se no outro, perde-se no ambiente, perder-se dentro de si mesmo”.

Os antídotos para a confluência, conforme Polster e Polster (2001) são o

contato, a diferenciação e a articulação, em que o indivíduo precisa começar a

experienciar suas próprias escolhas, necessidades e sentimentos não

precisando coincidir com os das outras pessoas, chegando à conclusão de que

pode ser separado de outras pessoas e ainda permanecer vivo.

Proflexão:

Para Cardella (1994) esta disfunção de contato consiste em a pessoa

que só faz ao outro o que quer receber de volta, existindo dois tipos de

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proflexão: ativa e passiva. Ativa – proflexor procura descobrir necessidades e

desejos do outro e procura realizá-los esperando o mesmo. Passiva –

submete-se ao outro procurando corresponder as suas expectativas,

esperando obviamente o retorno disso.

O proflexor não ama a si mesmo, ele desrespeita a si e aos outros já que

se relaciona somente através de jogos de controle e manipulação, tenta

desencadear um sentimento de culpa no parceiro, o proflexor muitas vezes

associa amor a desempenho.

Egotismo:

O egotismo pode ser considerado uma hipertrofia do ego (GINGER e

GINGER, 1995), de forma que o cliente se interessa excessivamente por si

mesmo e por seus problemas, em detrimento do meio e das outras pessoas.

isso acontece durante o processo psicoterápico na medida em que o cliente vai

conquistando mais autonomia, assim ele se torna “mais satisfeito consigo”

(p.140).

Camadas de Neurose

A utilização dos mecanismos de evitação e contato impedem a pessoa

experimentar a vida e suas relações, desse modo, o individuo precisa romper

esses mecanismos e confrontar os medos que os mantém. Fritz elaborou como

5 as camadas da neurose: postiça, fóbica, impasse, implosiva e explosiva.

Postiça – ocorre a utilização de papéis e jogos de controle sendo

baseadas em uma imagem que as pessoas têm de si mesmas, evita confrontar

seus próprios medos e angustias responsabilizando os outros por suas

dificuldades.

Fóbica – envolve contato com os medos que mantém os

comportamentos, ter medo de ser o que somos, nos relacionamentos esses

medos podem ser medos de solidão, rejeição, abandono ou medo da perda do

controle, ou seja, da entrega. Podem surgir fantasias “catastróficas” em que a

pessoa não pode expressar o que é, o que pensa ou o que sente, senão corre

o risco de ser repudiada, agredida ou abandonada.

Impasse – o individuo não usa seus recursos pra estabelecer um

contato ou uma fuga, a pessoa não consegue estabelecer conflitos, fica

“atolada” e ignora o como se atolou.

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Implosiva – as energias necessárias à vida se encontram bloqueadas e

investidas inutilmente, essa camada é caracterizada pelo medo da morte, que

leva as pessoas ao desespero, mas trás a possibilidade de compreensão e

experiência sobre novos comportamentos, pois através do sentimento de morte

a pessoa pode se conscientizar de seus modos de ser e com isso se

compreender genuinamente fazendo brotar do vazio a espontaneidade e o

amor a si mesmo.

Explosiva – energias não utilizadas anteriormente são liberadas através

da alegria, dor, colega ou orgasmo e talvez ao ser capaz de liberar isso, a

pessoa possa vivenciar um amor, estando pronta para ver a si e ao outro e

entregar-se à vida e às relações.

REFERÊNCIAS:

CARDELLA, Beatriz Helena Paranhos. O amor na relação terapêutica: uma visão gestáltica. São Paulo: Summus, 1994.

GINGER, Serge; GINGER, Anne. Gestalt: uma terapia do contato. (tradução Sonia de Souza Rangel). 4. ed. São Paulo: Summus, 1995.

PERLS, Frederick Salomon. Gestalt-Terapia explicada. (tradução de George Schlesinger). 2. ed. São Paulo: Summus, 1988.

POLSTER, Erving; POLSTER Miriam. Gestalt-Terapia integrada. (tradução de Sonia Augusto). São Paulo: Summus, 2001.

RIBEIRO, Jorge Ponciano. A Resistência Olha a Resistência! Psicologia: Teoria e Pesquisa 2007, Vol. 23 n. especial, pp. 073-078

SPANGENBERG, Alejandro. Terapia Gestáltica e a inversão da queda. Editora Livro Pleno, 2004. SP.