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I II III IV V VI linho...... vidro laminado...... 200x240x12 cm vidro...... vidro laminado...... espelho...... 220x120x20 cm fotografia...... vidro laminado...... espelho laminado......165x420x12 cm 5 obras...... vidro...... vidro laminado...... espelho...... madeira...... 50x100x12cm espelho laminado...... ferro...... 220x510x510 organdi de seda...... vidro laminado...... espelho laminado...... 200x240x12cm design henrique p. xavier carlos fajardo no aberto CARLOS FAJARDO inauguração 31 maio 11h

No Aberto, Carlos Fajardo, Henrique Xavier, Galeria Raquel, 2014

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No aberto, Exposição de Carlos Fajardo, texto Henrique Xavier

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Page 1: No Aberto, Carlos Fajardo, Henrique Xavier, Galeria Raquel, 2014

I II III IV V VI

linho......vidro laminado......200x240x12 cm

vidro......vidro laminado......espelho......220x120x20 cm

fotografia......vidro laminado......espelho laminado......165x420x12 cm

5 obras......vidro......vidro laminado......espelho......madeira......50x100x12cm

espelho laminado......ferro......220x510x510

organdi de seda......vidro laminado......espelho laminado......200x240x12cm

design henrique p. xavier carlos fajardo

no aberto

CARLOS FAJARDO

inauguração 31 maio 11h

Page 2: No Aberto, Carlos Fajardo, Henrique Xavier, Galeria Raquel, 2014

o que o espaço interno do espelho reflete em sua totalidade; de-pois de trincado, também é refletido por seus estilhaços?......assim, em cada um de seus pequenos cacos, um e o mesmo leão avan-çam?......sem me perguntar, sem palavras.......dizer no espelho, sem pensar.......não chamar isso de perguntas, nem de hipóteses, mas de reflexões?......reflexões no outro lado do espelho.......no outro lado, onde não há som, não há palavras, apenas refle-xões?......raro uma reflexão se sentir impelida a se projetar sobre o tema dos espelhos.......“quando dois espelhos se refletem, sata-nás prega sua peça preferida, abrindo aqui à sua maneira (como seu parceiro o faz nos olhares dos amantes) a perspectiva do infi-nito.”......habilidosamente, o interior dos espelhos é capaz de exe-cutar ou refletir ao infinito todos os objetos.......pegue um espelho e ande com ele por todo o lado.......em breve cairão o sol e os astros do céu, em breve a terra, em breve tu mesmo e os demais seres animados, os utensílios, as plantas e tudo quanto pode se refletir.......mas, como o velho grego em sua caverna, me pergunto se não são apenas aparências desprovidas de existência?......é uma pergunta inevitável?......ao multiplicar o mundo, espelhos pro-duzem algo de invertido, de irreal, de monstruoso?......há testemu-nhas que afirmam que, frente a um espelho, um dos heresiarcas de Uqbar certa vez declarou que “os espelhos e a cópula são abomi-náveis, porque multiplicam o número de homens”.......precisamen-te nesse ponto, vou refletir sobre algumas imagens que, penso do lado de cá, podem conter a essência dessa multiplicação.......pri-meiro, está certa a teoria da associação da psyché às imagens dos espelhos, ao sustentar que toda reflexão pertence a um impulso emocional?......a associação da psyché às imagens dos espelhos tem em vista identificá-la ao princípio inteligente e incorpóreo da

tradição dualística que distingue alma do corpo?......ou deve ser pensada apenas como uma duplicação, uma sombra do que está no homem?......algo semelhante à vida é reproduzido pela imagem no espelho?......por isso, o morto em várias tradições populares não se reflete em um espelho ou está privado de sombra.......ele mesmo é já sombra ou reflexo do homem que estava vivo?......essa particularidade dos espelhos une o mundo dos vivos ao reino dos mortos, o segundo é uma imagem do primeiro.......“às vezes sinto-me como uma sombra que caminha pela noite e acredita em fantas-mas; cada esquina é uma reflexão cheia de terrores.”......o que interessa é descobrir como, entre os diferentes matizes de significa-do de reflexão, existe o assombro que exibe o um idêntico ao seu oposto?......em geral, a palavra reflexão deixa de ser ambígua quando somos lembrados de que ela pertence a dois conjuntos de imagens que, sem serem contraditórias, ainda assim são muito dife-rentes?......por um lado ela figura a reprodução infinita do que é familiar e, por outro, ela desvela o que está oculto e se mantém fora da vista.......há nas reflexões sempre algo que deveria ter per-manecido secreto, mas veio à luz.......tenho em vista essa desco-berta, embora ainda não posso compreendê-la corretamente, do lado de cá, o que é refletido sempre vem a ser invertido mais uma vez....... talvez, se examinar exemplos históricos de sombras e su-as reproduções, essas reflexões tornar-se-ão imagens inteligí-veis?......na idade média era comum a imagem de que, por meio da anunciação pronunciada pelos lábios do anjo Gabriel, Jesus penetrou pelo ouvido esquerdo e se tornou uma sombra no ventre de Maria.......a explicação mais convincente que encontrei nesses anos de reflexão baseia-se em uma leitura neo-platônica (previa-mente proposta por Teofilacto da Búlgaria e, também, por Fílon de

Alexandria) de que o verbo assombrar, tanto no grego episkiazo, como o umbrare latino, refere-se a uma atividade semelhante à de produzir imagens.......o anjo estava lá dizendo que no ventre da Virgem, sem desnudá-la, ou melhor, sem desvelar os inúmeros véus que encobriam o seu doce corpo, Deus formaria, isto é, esboçaria a imagem da Sombra de si mesmo: o Cristo.......nesse contexto, seria preciso considerar que a encarnação por meio de uma som-bra espelharia a mais antiga questão candente que confronta a humanidade imatura “de onde vêm os bebês, como se multiplicam os homens?”......como compreender o enigma infantil de se conce-ber a reprodução sem possuir a mais vaga imagem nua de um ato carnal?......sem despir os corpos, o enigma se multiplica em inúme-ros mitos, contos, lendas.......talvez, em primeiro lugar, ele se en-contre no mistério cristão da encarnação?......talvez esse primeiro assombro forme o desejo por conhecimento característico de todas as crianças pequenas?......sim, o seu incansável amor por fazer perguntas que devem permanecer como enigmas que jamais po-dem ter a precisa resposta de um adulto. enigmas da reprodu-ção que fazem com que os corpos sejam substituídos por infinitas sombras, por infinitas imagens.......isso dura o resto de suas vi-das?......as reflexões infantis são desvios, que não visam, ao fim, ter uma resposta definitiva, porque a criança apenas produz ou multiplica imagens para tomar o lugar de corpos desnudos.......uma reflexão que não é nada mais que a sombra de um corpo nu?......sombras, simulacros ou a imagem invertida de coisas nu-as.......o termo usado, há tantos séculos, pelo filósofo grego em sua caverna obscura é eikasia, que sai da mesma raiz de eikón, isto é, imagem, ícone.......a sua famosa alegoria da caverna é lida com muita ironia e humor, no lado de cá.......como pode não ser a

inversão da inversão da inversão, uma engenhosa teoria do conhe-cimento em que o sentido figurado de visão enquanto conhecimen-to vem justamente abandonar o sentido literal da visão enquanto conhecimento?......ao espelhar a conversão da alma fugindo das imagens sensíveis para alcançar as formas inteligíveis e o ideal, o filósofo grego faz das imagens as trevas do mundo.......só ao que-brar os grilhões de sombras e alçar o mundo das ideias é que se começa a ver com os olhos da alma, ou seja, a entender as coi-sas.......assim como na treva não há visibilidade, na ignorância não há verdade; contudo, ironicamente, a visibilidade é a treva da verdade.......quanto engenho, arte e ironia para retoricamente chegar a uma alegoria exemplar em que as imagens, para enxer-gar, buscam sua a cegueira?......mas inversamente, o grego não escolhe a palavra eîdos para designar ideia ou formas inteligí-veis?......e eîdos não significa figuras e formas visíveis?......a ideia, que sai da caverna para o aberto, não é o que o olho educado pelo contraste com as sombras é capaz de ver?......são as sombras que produzem luzes, desvelamentos e velamentos, que por meio das imagens ocultam e revelam a verdade, ou vice versa?......a primeira verdade, a que em grego se diz alethéia, não é o desve-lamento da luz espelhado em um velamento de sombras?......um jogo com cortinas, re-velações?......mais errâncias e reflexões de um portador de sombras?......é impossível não refletir, uma vez que o espelho é um lugar sem lugar algum, ele é apenas uma som-bra que dá visibilidade, que me permite refletir lá precisamente onde sou ausente.......ver-se refletido num espaço de profundidade irreal, que está aberto no lado de cá da superfície.......seria o mes-mo eu, fora do espelho, ou seria uma outra espécie de sombra ca-nhota?......se a realidade exerce uma contra-ação à posição que

ocupo no espelho, seria possível que o eu fora do espelho respon-desse ao toque de meu aperto de mãos?......estou ali onde não estou? seria possível afirmar que a imagem precede a realidade projetada?......por que enunciar perguntas?......não há som dentro do espelho?......sobre as funções de minhas orelhas, não ouvi dizer nada.......se no momento não há nada diante do espelho, onde habita dentro do espelho as reflexões silenciosas de minha som-bra?......as reflexões são carícias infratênues entre imagens silen-ciosas?......é preciso refletir, mas não por meio de palavras, é pre-ciso pensar imagens em silêncio, até que elas me encontrem, até que elas me falem sobre a estranha pena, o estranho pecado da multiplicação.......maldito sejam os homens e os espelhos.......é preciso refletir.......talvez toda imagem já tenha sido projetada, talvez tudo já tenha sido refletido diante do espelho que se abre para a minha pequena história de sombras.......isso me assombra-ria, se ele abrir, vai ser eu, vai ser o silêncio.......penetrar ali onde não estou.......não sei, não saberei nunca, na sombra de uma filo-sofia, no silêncio, desprovido de uma palavra, não se sabe, é pre-ciso refletir, não posso refletir, vou refletir

demais reflexos - empresa xxxii: sempre o mesmo s. fajardo - passagem r w. benjamin - tlön, uqbar, orbis tertius j. l. borges - a imortalidade da alma no fedon de platão b. s. santos - a short history of the shadow v. i. stoichita - a childhood memory by piero dela francesca h. damisch - intr. a hist. da fil., dos pré-socráticos a aristóteles m. chaui - a dou-trina de platão sobre a verdade m. heidegger - o aberto g. agamben - des espace autres m. foucault - inframince m. duchamp - livs. vii e x da república platão - o espelho y sán - o estranho s. freud - o inominável s beckett

henrique p xavier