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190 HARPER’S BAZAAR | JULHO_AGOSTO 2016 CONFORME A TECNOLOGIA inibe a divisão entre vida profissional e pessoal, não surpreende que a moda reflita essa am- biguidade. Da mistura de tendências, o athleisure parece estar preenchendo essa lacuna com facilidade. Mas o que tem de tão es- pecial nesse cruzamento de roupas esportivas e de moda? Será que nos tornamos preguiçosos ou a vida se tornou tão esmaga- dora que a ideia de trocar de calça já é demais? Pode haver, no entanto, uma revolução escondida sob esse exterior confortável e flexível – uma mudança na relação de poder e uma verdadeira rebelião contra a conformidade. Athleisure é uma colisão entre moda e sportswear. É uma ruptura dos códigos de vestuário, em que roupas desenhadas para a prática esportiva deixaram os armários da academia rumo ao cotidiano.A ideia não é nova, é verdade. É o equivalente do com- bo collant fio dental e meias cor de pele dos anos 1980, que se tornou popular quando Jane Fonda decidiu que não tinha pro- blema se nos exercitássemos em público, suando. E assim ganhou as ruas. No fim da mesma década, uma certa editora, conhecida por seu penteado imutável, percebeu os ventos da mudança high-low na moda, na cultura e na sociedade e ganhou manchetes com sua primeira capa, em 1988, com retrato fiel desse novo estilo.As casual fridays vieram logo em seguida. Então, no começo dos anos 2000, conforme nossas realidades mudavam com a evolução da internet e o crescimento da cultura de startup, nossos uniformes mudaram junto. Dress codes profissionais e apropriados para um ambiente de trabalho não tinham mais as mesmas conotações. Quando um dos homens mais poderosos, ricos e influentes do mundo prefere moletons à alfaiataria, é sinal de que o jogo virou. E, apesar das passarelas terem focado no minimalismo sem frescura e em vários itens oversized na última década, a tendência do athleisure persiste como algo totalmente diferente. Por quê? Não é uma moda exatamente esportiva. É, na verdade, uma moda de- senhada para se parecer com ou vestir como algo esportivo, a exemplo das leggings de cashmere e couro da Kova&T. É uma versão atualizada das silhuetas focadas em função e movimento, mas para todos os tipos de corpo. E, ao contrário do bodycon, uma ideia que saiu das passarelas para as ruas, athleisure é o oposto e virou de ponta-cabeça as noções vigentes de influência do design. A coisa mais atraente dessa tendência é a facilidade. Ela responde aos nossos estilos de vida cada vez mais apressados. Não é pre- ciso carregar uma bolsa extra para a academia – ela se move com você, trabalha com você e não contra você.Te leva da noite para o dia com uma versatilidade funcional antes exclusiva às mulheres esportivas. Cabe tranquilamente em nossos guarda-roupas e são aceitas por muitos como vestimentas para o dia todo. De acordo com Mark Parker, CEO da Nike, este é “o novo jeans”. Também nos oferece a ilusão de que nós podemos. Exercício físico é, cada vez mais, algo aspiracional e símbolo de autoesti- ma. Mesmo se você não tiver um estilo de vida ativo, pode se vestir como se tivesse e entrar na onda. Calças que absorvem umi- dade são essenciais para assistir Netflix ou ir ao mercado comprar leite? Hoje em dia, sim. No entanto, é algo que perturba um ideal, especialmente quando se trata do nosso entendimento de uniformes sistemáticos, que estão cada vez mais fora de moda. Estilo tem a ver com interpretação pessoal e não com instituições, e essa mudança nos permite imprimir nossa marca e cumprir a necessidade de identificar nosso lugar no mundo da maneira mais fácil. É nossa ar- madura, o que usamos para enfrentar as interações do dia a dia. Mas, por que nossa interpretação está agora sob investigação? Nossas atitudes, quando se trata de vida pessoal e profissional, mudam constantemente, o que pede uma contínua exploração dos elementos que melhor se adaptam a esse estilo de vida. E, num mundo mediado por tecnologia e, mais ainda, pelas redes sociais, o pé não sai do acelerador. Mídias sociais já são essenciais na definição do que vemos, como vemos – e como consu- mimos. Hoje, não apenas se lê, se compartilha. E instantaneamente. Influenciadores e hashtags oferecem uma lente cultural cres- cente à moda e seus ideais, que nos permite explorar o mundo e descobrir uma tendência em segundos. A conectividade social terá um lugar fundamental no conceito do individualismo e é uma razão importante quando se trata de explicar por que a identidade visual do sportswear está evoluindo sem fazer referências diretas ao esporte. O Instagram alimenta nosso desejo de relevância e torna o #fomo (fear of missing out, o medo de ficar de fora) muito real e a lealdade à marca, menos. É o que nos ajudou a ir do clique de biquíni à selfie #fitspo, mas o sentimento é o mesmo.Trata-se de uma autocelebração e de propa- gar e preservar nossa versão de nós mesmos, quando quisermos.Trata-se de se sentir bem consigo mesmo – de legging e tudo. Com a ascensão do athleisure como tendência, para onde o sportswear nos levará depois? por Joy Yoon | fotos Chris Hornbecker | edição de moda Tasha Green NO RITMO DO ESPORTE JULHO_AGOSTO 2016 | HARPER’S BAZAAR 191 MOÇAMBIQUE Clarke Flowers (Option Model) veste top, shorts e tênis Adidas; paletó de tweed floral Giorgio Armani; calças e bomber jacket de lã Diane von Furstenberg; e calças de batik de algodão africanas. Brinco de latão fulani africano; bracelete de fios trançados tailandês; e chapéu juju de penas tingidas camaronês Cargo Inc of Portland Beleza: Ailsa Hopper Set design: Kristin Lane Agradecimentos: Cargo Inc. pelos móveis e acessórios, Pro Photo Supply, Pacific Grip & Lighting, Option Model and Media e Heffner Management

NO RITMO DO ESPORTE - kncproductions.com · fio dental e meias cor de pele dos anos 1980, ... Flores de papel feitas a mão ... Nata usa vestido de seda e colete de algodão com detalhes

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190 HARPER’S BAZAAR | JULHO_AGOSTO 2016

CONFORME A TECNOLOGIA inibe a divisão entre vida profissional e pessoal, não surpreende que a moda reflita essa am-biguidade. Da mistura de tendências, o athleisure parece estar preenchendo essa lacuna com facilidade. Mas o que tem de tão es-pecial nesse cruzamento de roupas esportivas e de moda? Será que nos tornamos preguiçosos ou a vida se tornou tão esmaga-dora que a ideia de trocar de calça já é demais? Pode haver, no entanto, uma revolução escondida sob esse exterior confortável e flexível – uma mudança na relação de poder e uma verdadeira rebelião contra a conformidade.

Athleisure é uma colisão entre moda e sportswear. É uma ruptura dos códigos de vestuário, em que roupas desenhadas para a prática esportiva deixaram os armários da academia rumo ao cotidiano. A ideia não é nova, é verdade. É o equivalente do com-bo collant fio dental e meias cor de pele dos anos 1980, que se tornou popular quando Jane Fonda decidiu que não tinha pro-blema se nos exercitássemos em público, suando. E assim ganhou as ruas.

No fim da mesma década, uma certa editora, conhecida por seu penteado imutável, percebeu os ventos da mudança high-low na moda, na cultura e na sociedade e ganhou manchetes com sua primeira capa, em 1988, com retrato fiel desse novo estilo. As casual fridays vieram logo em seguida. Então, no começo dos anos 2000, conforme nossas realidades mudavam com a evolução da internet e o crescimento da cultura de startup, nossos uniformes mudaram junto. Dress codes profissionais e apropriados para um ambiente de trabalho não tinham mais as mesmas conotações. Quando um dos homens mais poderosos, ricos e influentes do mundo prefere moletons à alfaiataria, é sinal de que o jogo virou.

E, apesar das passarelas terem focado no minimalismo sem frescura e em vários itens oversized na última década, a tendência do athleisure persiste como algo totalmente diferente. Por quê? Não é uma moda exatamente esportiva. É, na verdade, uma moda de-senhada para se parecer com ou vestir como algo esportivo, a exemplo das leggings de cashmere e couro da Kova&T. É uma versão atualizada das silhuetas focadas em função e movimento, mas para todos os tipos de corpo. E, ao contrário do bodycon, uma ideia que saiu das passarelas para as ruas, athleisure é o oposto e virou de ponta-cabeça as noções vigentes de influência do design.

A coisa mais atraente dessa tendência é a facilidade. Ela responde aos nossos estilos de vida cada vez mais apressados. Não é pre-ciso carregar uma bolsa extra para a academia – ela se move com você, trabalha com você e não contra você. Te leva da noite para o dia com uma versatilidade funcional antes exclusiva às mulheres esportivas. Cabe tranquilamente em nossos guarda-roupas e são aceitas por muitos como vestimentas para o dia todo. De acordo com Mark Parker, CEO da Nike, este é “o novo jeans”.

Também nos oferece a ilusão de que nós podemos. Exercício físico é, cada vez mais, algo aspiracional e símbolo de autoesti-ma. Mesmo se você não tiver um estilo de vida ativo, pode se vestir como se tivesse e entrar na onda. Calças que absorvem umi-dade são essenciais para assistir Netflix ou ir ao mercado comprar leite? Hoje em dia, sim.

No entanto, é algo que perturba um ideal, especialmente quando se trata do nosso entendimento de uniformes sistemáticos, que estão cada vez mais fora de moda. Estilo tem a ver com interpretação pessoal e não com instituições, e essa mudança nos permite imprimir nossa marca e cumprir a necessidade de identificar nosso lugar no mundo da maneira mais fácil. É nossa ar-madura, o que usamos para enfrentar as interações do dia a dia. Mas, por que nossa interpretação está agora sob investigação?

Nossas atitudes, quando se trata de vida pessoal e profissional, mudam constantemente, o que pede uma contínua exploração dos elementos que melhor se adaptam a esse estilo de vida. E, num mundo mediado por tecnologia e, mais ainda, pelas redes sociais, o pé não sai do acelerador. Mídias sociais já são essenciais na definição do que vemos, como vemos – e como consu-mimos. Hoje, não apenas se lê, se compartilha. E instantaneamente. Influenciadores e hashtags oferecem uma lente cultural cres-cente à moda e seus ideais, que nos permite explorar o mundo e descobrir uma tendência em segundos.

A conectividade social terá um lugar fundamental no conceito do individualismo e é uma razão importante quando se trata de explicar por que a identidade visual do sportswear está evoluindo sem fazer referências diretas ao esporte. O Instagram alimenta nosso desejo de relevância e torna o #fomo (fear of missing out, o medo de ficar de fora) muito real e a lealdade à marca, menos. É o que nos ajudou a ir do clique de biquíni à selfie #fitspo, mas o sentimento é o mesmo. Trata-se de uma autocelebração e de propa-gar e preservar nossa versão de nós mesmos, quando quisermos. Trata-se de se sentir bem consigo mesmo – de legging e tudo.

Com a ascensão do athleisure como tendência, para onde o sportswear nos levará depois?por Joy Yoon | fotos Chris Hornbecker | edição de moda Tasha Green

NO RITMO DO ESPORTE

JULHO_AGOSTO 2016 | HARPER’S BAZAAR 191

MOÇAMBIQUE Clarke Flowers (Option Model) veste top, shorts e tênis Adidas; paletó de tweed f loral Giorgio Armani; calças e bomber jacket de lã Diane von Furstenberg; e calças de batik de algodão africanas. Brinco de latão fulani africano; bracelete de fios trançados tailandês; e chapéu juju de penas tingidas camaronês Cargo Inc of Portland

Beleza: Ailsa Hopper Set design: Kristin Lane Agradecimentos: Cargo Inc. pelos móveis e acessórios, Pro Photo Supply, Pacific Grip & Lighting, Option Model and Media e Heffner Management

192 HARPER’S BAZAAR | JULHO_AGOSTO 2016 JULHO_AGOSTO 2016 | HARPER’S BAZAAR 193

DINAMARCA Jessica Smith (Option Model) veste camisa polo e saia de jérsei revestida de borracha Lacoste; calça de cetim de seda Giorgio Armani; e tênis Adidas

BRASIL Courtney Johnson (Option Model) veste tênis e top Nike; bustiê de algodão, bolsa de couro (na cintura) e coroa Dolce & Gabbana; e saia de rumba com nó lateral de jérsei de poliéster Norma Kamali. Braceletes e brincos Dior

194 HARPER’S BAZAAR | JULHO_AGOSTO 2016 JULHO_AGOSTO 2016 | HARPER’S BAZAAR 195

RÚSSIA Nata Sarafinchan (Option Model) usa vestido de seda e colete de algodão com detalhes em pérolas Etro ÍNDIA Zarah Manju (Heffner Management) usa vestido de algodão e luvas de couro Missoni; e legging Nike. Falso anel de nariz de prata indiano Cargo Inc of Portland

196 HARPER’S BAZAAR | JULHO_AGOSTO 2016

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EUA Jada Morrison (Heffner Management) veste camiseta Nike; saia envelope de brim Alexa Stark; sutiã de amarrar, saia-lápis, boxer shorts e gargantilha de algodão atoalhado FENTY PUMA by Rihanna Collection

CHINA Arlene Peng (Heffner Management) usa vestido de cupro craquelado e arnês Kenzo; tênis e calças Adidas; bomber jacket de seda Alexa Stark. Flores de papel feitas a mão (nos cabelos) da boutique Bella Flora, de Portland

JULHO_AGOSTO 2016 | HARPER’S BAZAAR 197

198 HARPER’S BAZAAR | JULHO_AGOSTO 2016 JULHO_AGOSTO 2016 | HARPER’S BAZAAR 199

Nata usa vestido de seda e colete de algodão com detalhes em pérolas Etro; e tênis Nike. Colar de âmbar, acervo da stylist. Clark veste camiseta manga longa Supernova, meio-zíper de malha e tênis Adidas; macacão sem mangas Norma Kamali; e colete de mescla de viscose-lã Giorgio Armani. Colar de conchas cowrie malinês Cargo Inc of Portland. Arlene usa jaqueta Nike; jaqueta de couro trançado em camadas Giorgio Armani; e calça-envelope de seda Alexa Stark. Colar miao, do Laos, Cargo Inc of Portland

Zarah veste top Nike; bomber jacket de couro com apliques f lorais e saia plissada de couro Gucci. Cinto bordado hmong tailandês e colar de contas de vidro malal indiano Cargo Inc of Portland. Jessica usa vestido e calças de algodão Marni. Bracelete tribal de prata do Rajastão Cargo Inc of Portland. Jada veste calças de corrida, top e gargantilha de algodão atoalhado FENTY PUMA by Rihanna Collection