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NOTA AO E-LEITOR: . Nesta versão o e-leitor poderá lisboa.pdf · e o Tratado de Lisboa 21 2 O que há de novo em termos das competências 24 3 O que há de novo ao nível das Instituições

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Ín

dice

Introdução 6

Políticas Comunitárias 9

Outros Marcos Comunitários 12

o que o projecto de constItuIção

e o tratado de LIsboa trouxeram de novo 19

1 Principais diferenças entre o Projecto de Constituição

e o Tratado de Lisboa 21

2 O que há de novo em termos das competências 24

3 O que há de novo ao nível das Instituições

e do Processo de Decisão 25

4 O que há de novo em relação às Cooperações Reforçadas 33

5 As Finanças da União 34

o Futuro da europa 36

1 O Futuro da Europa visto por Jean Monnet 37

2 O Tratado de Lisboa e o Futuro da Europa 40

3 A “Crise” e o Futuro da Europa 48

4 O Futuro que desejamos 59

Pal

avra

s-C

have

A

-KaActo Único Europeu (AUE) 10, 12, 13, 15 Alargamento 7, 13,16, 17, 37 Alcide de Gasperi 7, 8, 38

bBanco Central Europeu 15, 25

cCarta dos Direitos fundamentais 17, 22CECA 7, 11, 14, 36Comissão Europeia 11, 14, 17, 25, 31, 32, 34Comité das Regiões 25Comité Económico e Social 25Competência de apoio, de coordenação ou de complemento 23, 24Competência exclusiva 23, 24Competência partilhada 23, 24Comunidade Económica Europeia (CEE) 7, 9, 10, 11, 14, 21Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA, Eurátomo) 7, 14, 31Comunidade Europeia de Defesa (CED) 7Conselho de Ministros 11, 14, 17, 23, 25, 28, 29, 30, 31, 34Conselho Europeu 17, 25, 27, 41, 43, 44

eEstratégia de Lisboa 55, 56Euro 59, 60Eurojust 26Europol 26

FFundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) 10

jJAI 14Jean Monnet 7, 8, 36, 37, 38, 39

KKonrad Adenauer 7, 8

Pal

avra

s-C

have

M

-UmMaioria qualificada 29Marcos Comunitários 7, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20Método Comunitário 14

pParlamento Europeu 11, 14, 15, 17, 22, 23, 25, 26, 29, 31, 34 Paul-Henri Spaak 7, 8, 38Política Agrícola (PAC) 10, 26Política Externa e de Segurança Comum (PESC) 14, 27, 28, 29, 31, 33, 41Políticas Comunitárias 9, 10, 11Procedimento legislativo ordinário 23Projecto de Constituição europeia 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 33, 36, 41, 54, 59Projecto de Parceria Oriental 44, 45

rRobert Schuman 7, 8, 38Ronda de Doha 46, 50, 58

sSistema Europeu de Bancos Centrais 15Subsidiariedade 14, 22, 24

tTratado de Amesterdão 16, 34, 40Tratado de Lisboa 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 40, 41, 47, 54Tratado de Maastricht sobre a União Europeia (TUE) 14, 15, 23, 25, 54, 55Tratado de Nice 17, 30, 33Tratado de Roma 7, 9, 10, 11, 21Tribunal de Contas 25Tribunal de Justiça 11, 14, 25, 31

uUnião Económica e Monetária (UEM) 15União para o Mediterrâneo 42, 43

ÍNDICE6

Passados 50 anos da criação de uma comunidade dita europeia, foi assinado, em 13 de Dezembro de 2007, sob a Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia (UE), pelos Chefes de Estado e de Governo dos 27 Estados-Membros da União, o Tratado de Lisboa.

Caracterizado pela reflexão, debate e procura de consensos, este Tratado exemplifica, uma vez mais, o desafio de um caminho percorrido em conjunto, e que com altos e baixos, com avanços e recuos, se tem realizado ao longo de uma história tão rica como tem sido a da construção europeia.

Tendo por objectivo principal a informação e o esclarecimento do cidadão, esta publicação pretende dar a conhecer, de forma o mais sucinta e clara possível, este Tratado, delineando os desafios que coloca à construção europeia.

Para tal, façamos um ponto de situação dos nossos conhecimentos actuais sobre a história da construção europeia tal como esta teve lugar desde o termo do segundo conflito mundial, inspirada por uma ideia de base que se sobrepunha a todas as outras – preservar a paz entre as nações da Europa.

Introdução

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE7

Comecemos assim por evocar a opção de Jean Monnet, claramente assumida em Argel, em 1943, num momento em que se desenhava já a vitória dos aliados no segundo conflito mundial.1 Esta opção, totalmente oposta à dos vencedores da guerra de 1914-18, tinha por base a reconciliação dos inimigos da guerra de 1939-45, a renúncia a pretensões de hegemonia e, mais importante ainda, a partilha das respectivas soberanias em favor de uma soberania comum.

A primeira concretização desta opção de base, que contou desde o início com o apoio do então Ministro dos Negócios Estrangeiros francês Robert Schuman e, logo a seguir, do chanceler alemão Konrad Adenauer, foi a criação de um dispositivo, a CECA2, destinado a pôr em comum a produção das mais importantes matérias estratégicas de base que eram então o carvão e o aço.

Segundo o projecto inicial, a Comunidade assim criada deveria, por etapas sucessivas, transformar-se numa verdadeira Comunidade Política. O primeiro passo foi, em 1952, o de fundar uma Comunidade Europeia de Defesa (CED).Todavia, e muito embora o Tratado de Paris que deveria criar esta Comunidade tivesse sido assinado pelos governos dos Estados-Membros da CECA, a recusa da sua ratificação, em 1954, pela Assembleia Nacional francesa, levou ao abandono deste projecto político cuja viabilidade se considerava, aliás, difícil, poucos anos depois de um conflito em que os participantes tinham lutado em campos opostos.

O realismo dos “Seis” levou-os a considerar que o prosseguimento da realização do projecto europeu teria maiores probabilidades de êxito se assentasse no domínio estritamente económico. Esta opção foi coroada de êxito na conferência de Messina, realizada em 1955 e animada, sobretudo, pelo político belga Paul-Henri Spaak, que conduziu à criação da Comunidade Económica Europeia (CEE) e à assinatura do Tratado de Roma em 25 de Março de 1957. Foi na mesma data assinado, também em Roma, o Tratado criando a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA, Eurátomo).

Sublinha-se que uma ideia subjacente à criação das Comunidades Europeias era a ideia de abertura, oposta à que por vezes tinha sido avançada de criação de uma “fortaleza Europa”. Tal viria a ser confirmado pela realização dos sucessivos alargamentos, sendo o mais expressivo em 2004, o alargamento aos países do Leste Europeu.

A Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, criada pelo Tratado de Paris de 18 de Abril de 1951, teve por objectivo unificar a indústria europeia destas duas produções. O seu tratado foi assinado por seis países (França, Alemanha, Bélgica, Luxemburgo, Países Baixos e Itália), dando origem ao processo de integração europeia.Tendo cumprido a sua missão histórica, foi extinta em 2002.

2

Roma, 1957: Assinatura do Tratado que cria a CEE.

CECA:http://europa.eu/legislation_summaries/institutional_affairs/treaties/treaties_ecsc_pt.htmhttp://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/index.htm#founding+

info

“A prosperidade e os progressos sociais serão impossíveis enquanto os Estados da Europa não se integrarem numa unidade económica comum.”Jean Monnet, 1943.

1

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE8

Jean Monnet:

Político francês e pai da Europa, dedicou a sua vida à construção europeia.

Robert Schuman:

MNE francês, elaborou o plano Schuman que deu origem à CECA. Presidente do Parlamento Europeu (1958-1960).

Konrad Adenauer:

Primeiro Chanceler da RFA (1949-1963).

Paul-Henri Spaak:

Primeiro Ministro (PM) e MNE belga. Presidente do grupo de trabalho responsável pela elaboração do Tratado de Roma.

Alcide de Gasperi:

PM e MNE italiano (1945-1953).

Robert Schuman

Paul-Henri Spaak

Konrad Adenauer

Alcide de Gasperi

Fundadores do processo europeu

Jean Monnet

Tratado de Roma: http://europa.eu/legislation_summaries/institutional_affairs/treaties/treaties_eec_pt.htm | http://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/index.htm#founding Fundadores da União: http://europa.eu/abc/history/index_pt.htm+

info

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE9

poLÍtIcas comunItÁrIas

Desde a sua criação, a União actua através da implementação de políticas em vários domínios (económico, social, regulamentar e financeiro) que melhoram a vida dos cidadãos dos seus Estados-Membros.

Ao longo da sua história, a intervenção da União nos domínios políticos tem sido crescente. Actualmente divide-se em dois grandes conjuntos de políticas:

Políticas de coesão/solidariedade: dizem respeito aos domínios regionais, agrícolas e sociais, apoiando a realização do mercado interno.

Políticas de inovação: remetem para os desafios concretos que se colocam no dia-a-dia dos cidadãos europeus aos níveis do desenvolvimento tecnológico, da investigação, do ambiente, da energia, da saúde, etc.

Políticas Comunitárias:http://europa.eu/abc/12lessons/index_pt.htm+

info

O quadro das políticas comunitárias, numa estrutura ainda relativamente rudimentar quando comparada com a actual e traduzindo as grandes preocupações de então, compreendia, segundo o Tratado de Roma, as políticas:

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE10

Nos termos do Tratado de Roma, a CEE assentava numa união aduaneira complementada por uma política comercial comum.3 Tal política tomou por base as regras de concorrência4, na medida em que estas asseguram o bom funcionamento do princípio das vantagens comparativas (base do comércio internacional) segundo o qual cada país deve especializar-se naquilo que pode produzir em melhores condições.

Mas é necessário ter em mente que ao pôr em contacto economias de peso diferente se poderiam agravar as disparidades existentes à partida. Para evitar este desequilíbrio foram autorizadas ajudas para o desenvolvimento de regiões onde o nível de vida fosse mais baixo ou onde existisse uma situação de grave subemprego. Este tipo de auxílio conduziu a uma política regional, concretizada muito mais tarde, em 1975, através da criação de um Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), e que só foi incluída no texto do Tratado da Roma pelo Acto Único Europeu em 1986.

Para além da política regional, a política social, estabelecida no Tratado de Roma, logo em 1957, através de um Fundo, pode ser considerada como um contraponto da política de concorrência, por numa larga medida permitir fazer face às eventuais consequências negativas de uma maior racionalidade económica, sobretudo no que toca à protecção social e ao emprego.

A política agrícola (PAC), por seu lado, foi concebida para assegurar a auto-suficiência alimentar e constituiu durante muitos anos uma excepção no contexto das relações da Comunidade com países terceiros, dado que estabelecia esquemas de protecção aos seus agricultores. A partir da década de 90 começou a desenhar-se um movimento no sentido de submeter a agricultura comunitária às leis do mercado, muito embora persistam questões não resolvidas no que diz respeito às negociações internacionais.

Ainda respeitante aos fundamentos da Comunidade, na sua versão da 1957, o Tratado da Roma estabelecia já a livre circulação das pessoas, dos serviços e dos capitais e comportava um título relativo aos transportes, que não eram ainda considerados política comunitária.

Tal como numa zona de comércio livre, uma união aduaneira implementa a livre circulação de mercadorias entre os Estados-Membros. A união aduaneira estabelece ainda uma “pauta aduaneira comum”, i.e. uma lista única de direitos aplicáveis às importações originárias de países terceiros.

3

Uma das regras de concorrência essenciais é a de não admitir ajudas estatais às empresas, a não ser que a situação em termos regionais ou de emprego o exija.

4

A PAC visava:- assegurar à população agrícola um nível de vida justo;- estabilizar os mercados;- assegurar preços razoáveis ao consumidor;- modernizar a agricultura.

poLÍtIcas comunItÁrIas (continuação)

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE11

Como foram implementadas estas políticas?

Para desenvolver as políticas nos domínios acima evidenciados, bem como o funcionamento da própria União, eram necessários órgãos institucionais. Assim, logo em 1957, foram pensadas e criadas quatro instituições:

a Assembleia (mais tarde Parlamento Europeu) que, na altura, era constituída por delegados designados pelos Parlamentos dos Estados-Membros, e tinha como poderes principais o de dar parecer sobre o projecto de Orçamento e o de adoptar uma moção de censura em relação à gestão da Comissão.

o Conselho que era o principal órgão de decisão pois qualquer disposição de carácter geral ou minimamente importante teria de ser por ele decidida, mesmo se, num pequeno número de casos, só se pudesse pronunciar com base numa proposta da Comissão.

a Comissão, guardiã dos tratados, tinha também como competência a aprovação de regulamentos e directivas, a tomada de decisões e a formulação de recomendações e pareceres, assegurando a gestão do quotidiano da União.

o Tribunal de Justiça que, criado em 1952, pelo Tratado da CECA, garantiria que em todos os Estados-Membros a legislação europeia fosse seguida e aplicada.

Em 1979 os deputados do Parlamento Europeu passaram a ser eleitos pelos cidadãos que representam.

O Conselho continua a ser o principal órgão de tomada de decisões na UE, representando os Estados-Membros.

Walter HallsteinPrimeiro Presidente da Comissão (1958-1969).

poLÍtIcas comunItÁrIas (continuação)

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE12

outros marcos comunItÁrIos

acto ÚnIco europeu (aue)

Com o objectivo de relançar o processo de construção europeia e de concluir o estabelecimento de um mercado interno, este Acto, assinado em Fevereiro de 1986, pelos representantes dos então 12 Estados-Membros, constituiu a primeira grande modificação ao Tratado de Roma, da qual se destacam:5

O reforço do poder do Parlamento Europeu, com a instituição de uma maior cooperação entre este e o Conselho em termos de tomada de decisão, sem por tal ainda se dar um verdadeiro processo de co-decisão uma vez que o Conselho continuaria a ter a última palavra.

A introdução de medidas precisas tendo em vista a realização de um mercado interno, ou seja, um espaço interior sem fronteiras no qual a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais seria assegurada.

A substituição da decisão por unanimidade pela decisão por maioria qualificada, na maior parte dos casos relativos ao estabelecimento do mercado interno, o que facilitaria o consenso a 12.

A dinamização da política social, autorizando o Conselho a adoptar prescrições mínimas para melhorar as condições de trabalho dos europeus, protegendo-os ao nível da sua segurança e da sua saúde.

O AUE deve a sua designação ao facto de rever e alterar os Tratados anteriores, e de abordar, pela primeira vez, a cooperação europeia em matéria de política externa.

5

Acto Único:http://europa.eu/legislation_summaries/institutional_affairs/treaties/treaties_singleact_pt.htmhttp://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/index.htm#other+

info

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE13

A criação, no âmbito da política económica, de um capítulo especial relativo à política monetária que será depois desenvolvido pelo Tratado de Maastricht, em 1993.

A introdução, no contexto das políticas da Comunidade, de todo um título sobre a coesão económica e social, constituído por cinco novos artigos respeitantes ao funcionamento dos Fundos Estruturais: Secção Orientação do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola (FEOGA), Fundo Social Europeu e FEDER.

A promoção de um compromisso entre os 12 em relação a uma política externa comum, implicando uma consulta sistemática entre os diferentes países membros sobre qualquer questão de política externa com interesse para a segurança dos Estados-Membros.

A definição de novas competências comunitárias, tais como a investigação, o desenvolvimento tecnológico e o ambiente.

Aos 6 países fundadores já se tinham juntado em 1973 a Dinamarca, a Irlanda e o Reino Unido. Em 1981, a Grécia passa também a fazer parte da CEE.1986 marca a entrada de Espanha e Portugal.

acto ÚnIco europeu (continuação)

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE14

o tratado de maastrIcHt sobre a unIão europeIa (tue)

Na sequência da queda do Muro de Berlim (1989) e consequente reunificação da Alemanha (1990), com o colapso do Comunismo na Europa de Leste, e tendo em conta a vontade dos Estados-Membros em reforçar a sua união, este Tratado que entrou em vigor em 1993, criou uma União Europeia assente sobre três pilares.

O primeiro pilar assenta nas três Comunidades Europeias: a CECA, a CEE e a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA-Eurátomo) e refere-se às áreas nas quais os Estados- -Membros agem em conjunto através das instituições comunitárias. Neste pilar aplica-se o método comunitário, ou seja o processo através do qual a Comissão Europeia propõe uma medida que é adoptada pelo Conselho (por maioria qualificada) e pelo Parlamento Europeu e cuja legalidade comunitária é assegurada pelo Tribunal de Justiça.

O segundo pilar é constituído pela Política Externa e de Segurança Comum (PESC), segundo a qual os Estados-Membros podem levar a cabo acções comuns em termos de política externa. Neste pilar aplica-se o método intergovernamental, sendo as decisões tomadas por unanimidade ao nível do Conselho, tendo a Comissão e o Parlamento um papel limitado.

O terceiro pilar é composto pela cooperação nos domínios da justiça e dos assuntos internos (JAI) com vista a garantir aos cidadãos europeus alta protecção num espaço de liberdade, segurança e justiça. O processo de decisão, tal como no segundo pilar, é intergovernamental.

O método comunitário garante a defesa do interesse geral dos cidadãos europeus.

O Tratado da União Europeia, assinado em 1992 pelos então 12 Estados- -Membros, alterou a designação da CEE que passou a ser denominada por Comunidade Europeia.

Criou uma nova estrutura política e económica: a União Europeia.

A União adquiriu uma dimensão política.

Tratado de Maastricht: http://europa.eu/legislation_summaries/economic_and_monetary_affairs/institutional_and_economic_framework/treaties_maastricht_pt.htmhttp://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/dat/11992M/htm/11992M.html+

info

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE15

Alguns dos aspectos mais importantes do TUE foram os que introduziram novas disposições no Tratado de Roma, nomeadamente:

A introdução do conceito de cidadania europeia. Qualquer cidadão que tenha a nacionalidade de um Estado-Membro é também cidadão da União.

O estabelecimento de condições de protecção mínimas em matéria social, e de promoção da melhoria das condições de vida e trabalho na Europa (Protocolo Social, anexo ao Tratado).

A criação de uma União Económica e Monetária (UEM).

A criação de um Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.

A definição de novos sectores onde a UE pode desenvolver acções de complemento, coordenação ou apoio, como sejam a saúde, a indústria, a cultura e a educação.

A determinação de áreas onde a intervenção da UE pode ser fundamental, como as redes transeuropeias, cuja implementação implica meios especiais de financiamento (Fundo de Coesão), ou ainda a defesa dos consumidores, e a juventude.

A inclusão de um verdadeiro processo de co-decisão por parte do Conselho e do Parlamento que ultrapassa, em muito, o procedimento de cooperação do Acto Único.

Objectivos principais:

1. Reforçar a legitimidade democrática das instituições.

2. Melhorar a eficácia das instituições.

3. Instaurar uma UEM.

4. Desenvolver a vertente social da Comunidade.

5. Instituir a PESC.

o tratado de maastrIcHt sobre a unIão europeIa (continuação)

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE16

o tratado de amesterdão

Este Tratado que entrou em vigor em 1999 introduziu no Tratado de Roma um título relativo à política de vistos, asilo e emigração, que assumiu especial relevo pelo facto de passar a ser da competência comunitária quando anteriormente era matéria de competência intergovernamental.

Criou também um título especial relativo ao emprego, completando as disposições já existentes em matéria de política social.

Tendo em conta as várias formas (mais ou menos ambiciosas) com que os diferentes Estados-Membros encaram o seu nível de integração na União, este tratado introduziu um sistema de cooperações reforçadas entre diversos Estados-Membros, permitindo-lhes um avanço mais rápido durante um período em princípio limitado.

Aos 12 Estados-Membros juntaram-se, em 1995, mais 3 países (Áustria, Finlândia e Suécia). A União dos 15 assinou dois anos mais tarde, em 1997, o Tratado de Amesterdão que alterou o TUE e o Tratado que instituiu a Comunidade Europeia e atribuiu uma nova numeração às suas disposições.

Tratado de Amesterdão: http://europa.eu/legislation_summaries/institutional_affairs/treaties/amsterdam_treaty/index_pt.htmhttp://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/index.htm#other+

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O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE17

o tratado de nIce

A contribuição deste Tratado, assinado em 2001 e em vigor desde Fevereiro de 2003, foi muito mais modesta consistindo, sobretudo, na reforma das instituições comunitárias com vista a assegurar o seu funcionamento após a entrada de mais dez Estados-Membros em 2004 e mais dois em 2007, perfazendo uma União a 27.

É importante registar que, em Dezembro de 2000, aquando da realização do Conselho Europeu de Nice, o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão proclamaram solenemente uma Carta dos Direitos Fundamentais da União que se desejou depois integrar no texto da Constituição, o que não foi possível dado esta não ter sido ratificada.

O Tratado de Lisboa não retomou a ideia de integrar esta Carta no seu texto. Todavia, embora não faça parte de um texto fundamental, o que em termos concretos pode reduzir o alcance de algumas de suas garantias, a Carta mantém-se plenamente em vigor.

Em 2004 deu-se o grande alargamento aos países da Europa Central e Oriental (Estónia, Eslováquia, Eslovénia, Hungria, Letónia, Lituânia, Polónia, República Checa), completado pela entrada de Chipre e de Malta, e a Bulgária e a Roménia em 2007.

Tratado de Nice: http://europa.eu/legislation_summaries/institutional_affairs/treaties/nice_treaty/index_pt.htmhttp://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/dat/12001C/htm/12001C.html +

info

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE18

Após esta incursão sintética por mais de 50 anos de construção europeia, analisemos o presente, focando a atenção no Tratado de Lisboa e no projecto de Constituição que o antecedeu, e procuremos perspectivar as suas implicações em relação ao futuro da Europa.

vários problemas poderão afectar o futuro da União.

É hoje certo que o aumento da esperança de vida e envelhecimento das populações europeias influirão a médio prazo sobre o sistema de pensões de aposentação e reforma, colocando um sério desafio ao modelo social europeu.

Tem-se evocado a necessidade de um maior recurso a seguros independentes e de um alargamento dos períodos contributivos, bem como a perspectiva de, com base no progresso científico e tecnológico, conseguir acréscimos de produtividade que promovam o aumento das contribuições para a segurança social.

Tem-se evocado menos, ou mesmo criticado, a redução dos tempos de trabalho, que permitiria conjuntamente acrescer o número de contribuintes e reduzir o desemprego, em última análise o direito a essa “ociosidade, mãe das artes e das nobres virtudes, bálsamo das angústias humanas” de que há mais de um século nos falava Paul Lafargue no seu sempre actual “Droit à la Paresse”.

Tudo isto são questões que, pela sua própria natureza, respeitam ao futuro mas que, nas condições actuais e numa situação que no espaço de poucos meses evoluiu rapidamente, e com a possibilidade de prolongamentos afectando o médio prazo, não poderão ter aqui o desenvolvimento que se desejaria nem permitir muito mais que sublinhar tratarem-se de problemas em relação aos quais a União terá de assumir uma enorme responsabilidade no sentido de fazer face aos que, no essencial, são ainda tratados no contexto de 27 modelos nacionais.

Neste quadro, a existência do Tratado de Lisboa talvez pudesse contribuir indirectamente para o reforço de um modelo social europeu com cujo enfraquecimento não nos poderemos conformar.

A partir de 2015, prevê-se que o número total de falecimentos na UE27 ultrapasse o número total de nascimentos, marcando o fim do crescimento demográfico por factores naturais.

A população com mais de 65 anos em 2008 era de 17,1%. Prevê-se que em 2060 ronde os 30% da população europeia, e que os demais de 80 anos tripliquem até lá, de 4,4% para 12,1%.

Para manter a população ao mesmo nível, as mulheres europeias deveriam ter em média, e no mínimo, 2 filhos. Ora cada mulher tem de facto em média 1 a 2 filhos.

Fonte: Eurostat

Estatísticas sobre a população europeia: http://epp.eurostat.ec.europa.eu+

info

ÍNDICE19

Compreender o Tratado de Lisboa e identificar o que trouxe de novo implica tomar por base o que o antecedeu. Para além dos marcos fundamentais anteriormente revisitados, é importante realçar o projecto de Constituição. Este último teve a sua origem na Cimeira de Laeken (sob presidência belga), onde, em 2001, foi adoptada uma Declaração sobre o futuro da UE na qual eram apontados os seus grandes desafios, nomeadamente:

No plano interno, o desafio democrático.

No plano externo, o seu novo papel num contexto globalizado, no qual deveria assumir as suas responsabilidades no domínio do controlo da globalização.

No projecto de Constituição decorrente exigia-se uma maior intervenção da UE nos domínios das relações externas, da defesa e da segurança. Era ainda crucial estabelecer uma clara distinção entre as competências exclusivas da União face às dos Estados-Membros e as competências partilhadas.

o que o projecto de constItuIção

e o tratado de LIsboa trouxeram de novo

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE20

Conscientes de que após Maastricht, onde tinha sido possível progredir em várias áreas, o aprofundamento da União tinha entrado em perda de velocidade, os Chefes de Estado e de Governo presentes em Laeken decidiram convocar uma Convenção reunindo representantes dos Estados- -Membros e dos então 12 países candidatos. Esta reunião intergovernamental tinha por objectivos principais examinar os desafios que se colocavam ao futuro da UE e aprovar um projecto de Constituição Europeia.

A Acta Final da Conferência Intergovernamental que aprovou o projecto foi assinada em Outubro de 2004, mas a sua ratificação foi recusada em referendo por dois Estados-Membros (França e Holanda), o que invalidou todo o processo de aprovação da Constituição.

Muito se debateu sobre as motivações dos eleitores, defendendo-se que estas pouco tinham a ver com os aspectos desenvolvidos pela Constituição que, aliás, em diversos casos, eram favoráveis a todos, como a Carta dos Direitos Fundamentais. Mas o facto é que esta recusa provocou um receio de que tivesse sido posto em causa o processo de construção europeia, esquecendo-se que no passado tinha havido crises mais graves comportando o risco de interromper todo o processo de integração.1

A solução para este problema foi encontrada no Conselho Europeu de Junho de 2007 que estabeleceu um mandato conferido à futura Presidência Portuguesa de elaborar um Tratado Reformador, menos ambicioso que o projecto de Constituição, sobretudo quanto à sua natureza, mas que respondesse aos desafios que se colocavam.

A este respeito não nos esqueçamos do problema da “cadeira vazia”, nas reuniões do Conselho, provocado pela França nos anos 60, aquando da mudança de sistema de tomada de decisão, que passava da unanimidade à maioria qualificada.Em alguns casos a França reservar-se-iao direito de não aceitar tal decisão, por razões de interesse vital.

1

Projecto de Constituição: http://europa.eu/scadplus/constitution/index_pt.htmTratado de Lisboa: http://europa.eu/lisbon_treaty/glance/index_pt.htm | http://www.consilium.europa.eu/showPage.aspx?id=1296&lang=pt+

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O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE21

1 | prIncIpaIs dIFerenças entre o projecto de constItuIção e o tratado de LIsboa

O projecto de Constituição previa a fusão do Tratado da União Europeia (TUE) com o Tratado da Comunidade Europeia (TCE), cobrindo assim num instrumento único todo o direito primário da União. O Tratado Reformador, assinado em Dezembro de 2007 em Lisboa, procedeu sobretudo a uma revisão dos dois tratados em vigor, mantendo a sua autonomia.2

Assim, o texto do Tratado Reformador, que passou a ser conhecido como Tratado de Lisboa, é constituído por dois conjuntos de emendas aos tratados anteriores, consistindo numa revisão parcial da estrutura da União, ao contrário da revisão total prevista pelo projecto de Constituição.

Neste quadro, à semelhança do projecto de Constituição, o Tratado de Lisboa teve como principais objectivos:

aumentar a democracia na Europa;

aumentar a eficácia da actuação da UE;

aumentar a capacidade da União de fazer face aos desafios globais, tais como as alterações climáticas, a segurança e o desenvolvimento sustentável.

O Tratado da Comunidade Europeia (Roma) passa a ser designado por Tratado sobre o Funcionamento da União, o que, na prática, o subordina ao Tratado da União Europeia (Maastricht) que define os grandes princípios e as opções fundamentais.

2

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Quais foram realmente as grandes diferenças e semelhanças entre o Tratado de Lisboa e o projecto de Constituição?

Quadro 1Diferenças e semelhanças entre o Tratado de Lisboa e o projecto de Constituição

Conheca a história da bandeira da Europa.

Curiosidade:

Todos os cidadãos são iguais perante as instituições.

3

O Parlamento Europeu tem um papel mais importante e haverá um maior envolvimento dos Parlamentos nacionais.

4

Um grupo de, pelo menos, 1 milhão de cidadãos de um número significativo de Estados-Membros poderá solicitar à Comissão que apresente novas propostas.

5

3

45

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Tal como ao nível nacional ou local, o Direito Comunitário estabelece um quadro jurídico que compreende actos legislativos e não legislativos, de acordo com o carácter mais ou menos geral dos assuntos que cobrem.

Para assegurar o bom funcionamento da UE e das suas instituições, o Direito Comunitário compreende actos jurídicos: as directivas, os regulamentos, as decisões, as recomendações e os pareceres.

Numa perspectiva constitucional, o projecto de Constituição introduzia, como já foi referido no quadro anterior, uma alteração importante. Substituía a designação de Directiva pela de Lei Europeia. O Tratado de Lisboa não retomou esta alteração, tida por muitos como demasiado constitucional. Manteve o termo directiva e apresenta uma versão mais moderada de medidas.

No entanto, o Tratado de Lisboa mantém o termo “procedimento legislativo ordinário” introduzido pelo projecto de Constituição. Quer isto dizer que o Parlamento Europeu e o Conselho adoptam em conjunto actos legislativos. Esta expressão confere à UE uma imagem de dupla legitimidade consagrando como “ordinário” aquilo que antes de Maastricht era excepcional: a adopção de um acto jurídico pelos Estados--Membros (Conselho) e pelo povo europeu (Parlamento Europeu).

Novidades trazidas pelo Projecto de Constituição e retomadas pelo Tratado de Lisboa em resumo:

A UE poderá pronunciar-se e agir como entidade única (personalidade jurídica).

A tomada de decisão na UE passa a assumir uma dupla legitimidade (co-decisão: procedimento legislativo ordinário).

Realizou-se um esforço de clarificação em relação às competências da União:

- competências exclusivas

- competências de apoio, coordenação e complemento

- competências partilhadas

com os Estados-Membros.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE24

2 | o que HÁ de novo em termos das competêncIas

Para dotar a UE e o seu funcionamento de maior transparência, o projecto de Constituição e o Tratado de Lisboa realizaram um trabalho de clarificação onde as competências da União e dos Estados- -Membros são definidas de forma mais precisa.

Nos domínios da investigação e do desenvolvimento tecnológico e dos assuntos espaciais, bem como nos domínios da cooperação para o desenvolvimento e da ajuda humanitária, a União tem competência para agir sem todavia poder impedir os Estados-Membros de o fazer.

A UE assegura ainda a coordenação das políticas económicas, sociais e de emprego dos Estados--Membros, assumindo uma acção de apoio ou complemento em relação à indústria, à saúde, à educação, à cultura, à protecção civil, ao turismo e à cooperação administrativa.

Quadro 2Competências:

Para cada domínio de actividade, o Tratado de Lisboa indica quem faz o quê na União.

- Competência exclusiva: o poder legislativo está todo nas mãos da UE.

- Competência de apoio, de coordenação ou de complemento: a UE apenas pode apoiar a acção dos Estados-Membros, por exemplo, através de intervenções financeiras (cultura, educação ou indústria).

- Competência partilhada: abrange todos os outros domínios, tendo-se referido uma certa perda de eficácia da UE provocada pela quantidade de competências partilhadas.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE25

3 | o que HÁ de novo ao nÍveL das InstItuIções e do processo de decIsão

Nos termos da legislação actual as instituições da UE são o Parlamento Europeu, o Conselho, a Comissão, o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Contas.6 O Parlamento, o Conselho e a Comissão são assistidos por um Comité Económico e Social e por um Comité das Regiões que exercem funções consultivas.

Neste quadro, o Conselho Europeu (que reúne ao nível de Chefes de Estado ou de Governo) não é uma instituição da União.

O projecto de Constituição e, posteriormente, o Tratado de Lisboa propuseram modificações importantes, apresentando um novo quadro institucional e alterações nos processos de decisão.

Segundo o Tratado de Lisboa, o quadro institucional da União compreende:

O Tribunal de Contas tornou-se uma instituição comunitária com o Tratado de Maastricht.

6

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3 | 1 | parLamento europeu (pe)

O Parlamento Europeu é o único órgão da UE eleito directamente pelos cidadãos europeus. É composto por deputados, de todos os 27 Estados-Membros, que representam 492 milhões de cidadãos e são escolhidos todos os cinco anos.

O Tratado de Lisboa altera a composição do PE aplicando a regra da “proporcionalidade degressiva”, quer isto dizer que a partir da sua aprovação haverá um número total de 751 deputados (750 mais o presidente) repartidos com base na dimensão da população de cada Estado-Membro. Assim, os países com mais habitantes serão representados por um maior número de deputados (máximo de 96), enquanto que os países com uma população menor terão menos deputados (mínimo de 6).

O PE exerce essencialmente as funções:

legislativa: tem um papel activo na redacção de actos legislativos que se reflectem no dia-a-dia dos cidadãos europeus, por exemplo, em relação à protecção do ambiente, dos direitos dos consumidores, da igualdade de oportunidades, etc.

orçamental: em conjunto com o Conselho aprova o orçamento anual da UE.

O alargamento do campo de aplicação do procedimento de co-decisão instituído pelo Tratado de Lisboa tem consequências directas no funcionamento do PE que adquire um verdadeiro poder legislativo (ao mesmo nível que o Conselho) relativamente a determinados domínios políticos como, por exemplo, em matérias sobre a imigração legal, a cooperação judiciária penal (Eurojust), a cooperação policial (Europol), a política comercial e agrícola.

Os poderes do PE têm vindo a ser a pouco e pouco alargados com a adopção dos sucessivos tratados. O Tratado de Lisboa confirma esta evolução, reforçando os poderes do PE em matéria legislativa, orçamental e de acordos internacionais.

Parlamento Europeu: http://www.europarl.europa.eu/news/public/default_pt.htm+

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3 | 2 | conseLHo europeu (ce)

Actualmente o Conselho Europeu, que reúne ao mais alto nível os representantes dos Estados- -Membros e o Presidente da Comissão, não é uma instituição da UE, embora lhe seja reconhecido um potencial político importante.

Com o Tratado de Lisboa, o CE é considerado uma instituição da União que tem como principais funções:

Dar à União o impulso político necessário ao seu desenvolvimento;

Definir as orientações e prioridades políticas gerais.

Embora este Conselho não receba novas atribuições, a sua composição é alvo de uma reestruturação importante, surgindo uma nova figura na arquitectura institucional da UE: o Presidente do Conselho Europeu.

Presentemente o Conselho Europeu é presidido pelo Estado-Membro que exerce semestralmente a presidência da União. O Tratado de Lisboa modificou este sistema, criando um posto permanente que preside a este conselho. Assim, o Presidente do Conselho Europeu é eleito pelo CE com um mandato de dois anos e meio renovável uma vez.

O papel do Presidente do Conselho Europeu eleito nestas condições tem, deste modo, sido comparado ao de um Chefe de Estado sem funções executivas, enquanto o Presidente da Comissão, eleito também para um posto permanente de cinco anos, renovável uma vez (situação que se verifica desde a criação da CEE em 1957), exerce funções comparáveis às de um Primeiro-ministro, com uma interferência mais directa nos assuntos e na realização das políticas da União. Só a prática poderá dizer se, por exemplo, nos conflitos internacionais, o papel do Presidente do Conselho Europeu poderá ultrapassar o de simples representação assumindo-se então como um elemento de importância fundamental no campo da política externa. E seria altamente desejável que assim fosse.

De qualquer modo, no contexto da PESC, o Presidente do Conselho Europeu poderá aparecer dotado de poderes de que, de momento, ninguém dispõe no seio da UE e influenciar o papel da Europa no Mundo, o que poderá não ser o caso se o Tratado de Lisboa não vier a ser ratificado.

Conselho Europeu: http://europa.eu/european-council/index_pt.htm +

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O facto do CE não ser actualmente uma instituição da União indicia uma menorização da UE em relação aos Estados-Membros.

A duração do mandato do novo Presidente do CE deu origem a numerosas críticas, nomeadamente a de que poderia desvalorizar o papel do Presidente da Comissão.

Esta crítica tem sido rebatida com o argumento de que as funções do Presidente do CE são as de animar os trabalhos do CE, de facilitar o consenso e de representar a UE, ao mais alto nível, no domínio da PESC.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE28

3 | 3 | conseLHo de mInIstros (cm)

O Conselho representa os Governos dos Estados-Membros. Consoante os assuntos a tratar, o Conselho toma diferentes designações7 e acolhe os ministros com responsabilidades nessas áreas:

De acordo com o Tratado de Lisboa, o papel do Conselho não sofre alterações significativas:

continuará a partilhar as funções legislativas e orçamentais com o Parlamento Europeu.

conservará o seu papel em relação à PESC8 e à coordenação das políticas económicas.

Actualmente, todas estas formações do Conselho são presididas semestralmente, por rotação entre os Estados-Membros. O Tratado de Lisboa mantém esta rotatividade, que passa a ser definida pelo Conselho Europeu, com excepção para o Conselho dedicado às relações externas.

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O CM é actualmente a instituição principal no domínio da tomada de decisão em matéria de política externa e de segurança comum. O Tratado de Lisboa mantém este papel prevendo um conselho dedicado exclusivamente às relações externas e que é o único presidido permanentemente por uma nova figura: o Alto Representante para os Negócios Estrangeiros que, simultaneamente, ocupará o cargo de Vice-Presidente da Comissão.

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Conselho da União Europeia: http://europa.eu/institutions/inst/council/index_pt.htm+

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A principal alteração introduzida pelo Tratado Lisboa refere-se ao processo de decisão.

As decisões do Conselho são adoptadas por votação. Para a maior parte dos domínios é aplicado o sistema da maioria qualificada que implica uma aprovação da maioria dos Estados-Membros e um mínimo de 255 votos (73,9% dos votos). Assim, quanto maior for a população de um país, mais votos tem no Conselho. Mas, para favorecer a representatividade dos países com uma população menor, os números de voto são ponderados.

Em domínios mais sensíveis como é o caso da PESC, da fiscalidade ou da política de asilo e imigração, as decisões do Conselho só podem ser tomadas, actualmente, por unanimidade, o que faz com que todos os Estados-Membros tenham nestas matérias direito de veto.

O Tratado de Lisboa mantém a maioria qualificada como sistema de base de tomada de decisão do Conselho, mas alarga os domínios da sua aplicação. Por exemplo, a ser aprovado o Tratado de Lisboa, a imigração ou a cultura passarão a ser votadas por maioria qualificada.

Por outro lado, o Tratado de Lisboa prevê que, a partir do dia 1 de Novembro de 2014, a maioria qualificada passe a ser definida como sistema de dupla maioria de Estados e de população. Quer isto dizer que, para ser aprovada, uma decisão deverá obter o voto de 55% do número de Estados-Membros (pelo menos 15), e deverá representar pelo menos 65% da população europeia. Esta alteração, introduzida também pelo projecto de Constituição, constitui a primeira modificação do conceito de maioria qualificada em toda a história da UE, evitando que o poder de decisão fique nas mãos dos países maiores9, uma vez que um grupo de países mais pequenos pode bloquear uma decisão.

Quadro 3Distribuição actual de votos no Conselho.

Alguns especialistas têm proposto outras soluções:

- Supressão total da decisão por unanimidade para evitar que uma decisão seja bloqueada por apenas um Estado-Membro.

- Alargamento dos poderes do Parlamento Europeu, o que é conseguido com o Tratado de Lisboa.

- Criação de uma segunda câmara de representação paritária, composta por representantes directamente eleitos, onde cada Estado-Membro tivesse um voto.

9

conseLHo de mInIstros (continuação)

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A título ilustrativo, e para uma visão de conjunto da evolução da repartição de votos ao longo da construção europeia, observemos o seguinte quadro:

Definida no projecto de Constituição, versão de 2003 Idem, versão de 2004

Quadro 4Comparação dos sistemas de votação

no ConselhoFonte: Tratado de Roma

e Tratado de Nice.

Com o Tratado de Lisboa, os cidadãos europeus poderão conhecer directamente as decisões tomadas pelos membros do Conselho de cada Estado-Membro. Todos os debates e deliberações do Conselho em matéria legislativa serão públicos.

conseLHo de mInIstros (continuação)

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3 | 4 | comIssão europeIa

A Comissão Europeia é um órgão independente dos governos nacionais que tem como principal missão assegurar os interesses da UE. Para esse efeito, a Comissão tem como principais funções:

elaborar e apresentar ao Parlamento e ao Conselho novas propostas de legislação europeia;

executar as decisões do Parlamento e do Conselho, aplicando as políticas, implementando os programas e gerindo os fundos;

garantir o respeito pelo direito comunitário a par com o Tribunal de Justiça;

representar a UE ao nível internacional.

O Tratado de Lisboa não modifica os poderes da Comissão que mantém, no essencial, as mesmas funções. Com excepção da PESC cuja representação passa a ser assegurada pelo Presidente do Conselho Europeu, a Comissão assegura a representação externa da UE10.

Se o Tratado de Lisboa não altera substancialmente as funções da Comissão, o mesmo não se pode dizer em relação à sua composição.

A Comissão actual é o fruto da unificação da CEE e da Comissão do Eurátomo (1965-1967).

O Vice-Presidente da Comissão: o Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (figura nova) assume um papel semelhante ao de um Ministro dos Negócios Estrangeiros, que na Comissão assegura a coordenação da acção externa da União, e no Conselho assume a condução e execução da PESC.

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Comissão Europeia: http://ec.europa.eu/index_pt.htm +

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Actualmente, a Comissão é composta por 27 membros: os comissários. Cada comissário é nacional de cada um dos 27 Estados-Membros. Esta composição nem sempre seguiu a mesma regra. Por exemplo, durante uma década (durante a qual se deram o alargamento a 15, em 1995 e o alargamento a 25, em 2004), a Comissão era composta por 20 comissários, sendo que alguns Estados, como a Alemanha, a França, a Itália, o Reino Unido e a Espanha que eram então os cinco maiores países, tinham respectivamente dois comissários.

O Tratado de Lisboa, por seu lado, reforma a composição da Comissão. A partir de 201411, e a manter-se uma União a 27, a Comissão passará a ser composta por 18 comissários, correspondendo a dois terços do número de Estados-Membros. Este número inclui o Presidente da Comissão e o novo cargo criado de vice-Presidente da Comissão: o Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança.

Com vista a evitar a situação verificada no passado e garantir uma total representatividade dos Estados-Membros na Comissão, o Tratado de Lisboa instaura o princípio da “rotação paritária” que será definida por unanimidade no Conselho.

Por outro lado, o Tratado prevê ainda que este número de comissários possa ser modificado pelo Conselho Europeu por decisão unânime.

Outra novidade importante que o Tratado de Lisboa estabelece diz respeito ao próprio Presidente da Comissão12, sendo o seu papel reforçado com a possiblidade de poder conduzir um membro da comissão a demitir-se das suas funções.

Esta reforma promovida pelo Tratado de Lisboa não é totalmente nova. Em 2003, o Tratado de Nice, que instaurou o sistema (aplicado desde 2005) de para cada Estado-Membro um comissário, previa que, quando a UE contasse 27 Estados-Membros, o número de comissários passaria a ser inferior, recaindo a escolha num sistema de rotatividade equitativa.

11

O Presidente da Comissão é eleito para um mandato de cinco anos (renovável uma vez). É escolhido pelo conjunto dos Estados-Membros e aprovado pelo Parlamento Europeu.

12

comIssão europeIa (continuação)

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4 | o que HÁ de novo em reLação às cooperações reForçadas?

Respeitando as diferenças entre os Estados-Membros, e tendo em conta a forma mais ou menos ambiciosa como encaram o seu nível de integração na União, o Tratado de Amesterdão introduziu um sistema de cooperações reforçadas entre os Estados-Membros.

Este sistema permitia a um grupo de países agirem juntos no sentido de uma maior e mais rápida integração num dado domínio, durante um período de tempo em princípio limitado. No entanto, este sistema era de díficil aplicação, na medida em que deveria seguir condições muito rigorosas.

O Tratado de Nice veio reforçar o avanço do sistema de cooperações reforçadas, permitindo que um grupo de, pelo menos, oito Estados-Membros pudesse ir mais além na integração em algumas matérias, desde que não implicassem questões militares e de defesa. Qualquer Estado-Membro poderia juntar--se a este grupo de países desde que cumprisse os requisitos estabelecidos.

No projecto de Constituição, este aspecto foi tratado no quadro geral do exercício das competências da União e com maior pormenor no quadro do funcionamento da União.

Os artigos propostos pelo Tratado de Lisboa foram fundamentalmente os mesmos que os do projecto de Constituição, estendendo a aplicação deste mecanismo à PESC. Com a ratificação do Tratado de Lisboa será possível a criação de grupos de Estados que queiram aprofundar a sua cooperação num determinado domínio, nomeadamente em relação à segurança e à defesa.

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5 | as FInanças da unIão

O Tratado de Lisboa insere as disposições financeiras no Tratado sobre o Funcionamento da União (nova designação para o Tratado da Comunidade Europeia).

Estas disposições são apresentadas numa linguagem diferente daquela que se encontra presentemente em vigor, mas inserem-se na mesma filosofia de base.

Assim, o orçamento da UE continuará a ser financiado na sua totalidade por recursos próprios da União, embora o Tratado de Lisboa reformule o artigo já existente (269.º na numeração do Tratado de Amesterdão) segundo o qual “o orçamento é integralmente financiado por recursos próprios, sem prejuízo de outras receitas” e “o Conselho deliberando por unanimidade sobre proposta da Comissão e após consulta do Parlamento Europeu, aprova as disposições relativas ao sistema de recursos próprios da Comunidade cuja adopção recomendará aos Estados-Membros de acordo com as respectivas normas constitucionais.”.

O Tratado de Lisboa substitui este segundo parágrafo pelos dois parágrafos seguintes:

“O Conselho deliberando em conformidade com um procedimento legislativo especial, por unanimidade e após consulta ao Parlamento Europeu adopta uma decisão fixando as disposições aplicáveis ao sistema de recursos próprios da União. É possível neste quadro estabelecer novas categorias de recursos próprios ou revogar uma categoria existente. Esta decisão só entra em vigor após a sua aprovação pelos Estados-Membros, de acordo com as respectivas normas constitucionais.

O Conselho, deliberando em conformidade com um procedimento legislativo especial fixa as medidas de execução do sistema de recursos próprios da União na medida em que a decisão adoptada com base no parágrafo precedente o prevê. O Conselho delibera após aprovação do Parlamento Europeu.”

Embora o Tratado de Lisboa utilize, como vimos no artigo anterior, uma linguagem diferente daquela que actualmente se encontra em vigor, persiste a lógica intergovernamental13, o que se explica pelo facto de não se ter desejado contrariar os interesses dos países mais ricos que poderiam opor-se e vetar uma formulação onde um Conselho e um Parlamento, deliberando em conjunto no quadro de um procedimento legislativo ordinário, poderiam anunciar a realização de um verdadeiro federalismo financeiro.

Esta opção pela lógica intergovernamental tem provocado grande descontentamento em alguns países menos desenvolvidos da UE.

13

Em conformidade com o artigo 272.º (modificado) do Tratado sobre o Funcionamento da União que substitui o actual texto do artigo 272.º, o orçamento da UE é estabelecido pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho.

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“ virá um dia em que todas as nações do continente, sem perderem a sua qualidade distintiva e a sua gloriosa individualidade, se fundirão estreitamente numa unidade superior e constituirão a fraternidade europeia.

virá um dia em que não haverá outros campos de batalha para além dos mercados abrindo-se às ideias.

virá um dia em que todas as balas e as bombas serão substituídas por votos.”

victor Hugo, 1849 aa

Ao longo de meio século a União tem dado resposta aos desafios que se lhe foram colocando.

A ser aprovado, o Tratado de Lisboa permitirá, como vimos anteriormente, actualizar as regras de funcionamento da UE, do seu relacionamento com os seus Estados-Membros e com os cidadãos europeus, através de dois aspectos essenciais:

modernização das instituições comunitárias;

aumento da capacidade dos métodos de trabalho comunitários.

Assim, a União continuará a responder eficazmente aos desafios actuais e futuros, enquanto potência económica e comercial que em cinco décadas alcançou a estabilidade política tendo por base a ideia de um pacto entre Estados soberanos que decidiram partilhar um destino comum assente nos princípios e valores da paz, do bem-estar, da segurança, da democracia, da justiça e da solidariedade.

ÍNDICE36

o Futuro da europa

“O futuro já não é o que era”. Com esta afirmação em forma de paradoxo tem- -se procurado, sobretudo, evidenciar alguns fenómenos que em certos momentos históricos tiveram o poder de alterar, no bom e no mau sentido, as nossas formas de encarar a evolução da economia e da vida em sociedade que nos tínhamos habituado a considerar previsível.

Do ponto de vista que aqui mais nos interessa, podemos apontar a revolução que teve lugar na Europa com:

a criação da CECA em 1951,

o alargamento a Leste na sequência da queda do muro de Berlim e do desmantelamento da União Soviética,

a tentativa de aprovação de um projecto de Constituição Europeia,

e mais recentemente:

a crise financeira mundial, transformada rapidamente em crise económica, entendida numa primeira fase como um fenómeno conjuntural, mas que comporta o risco de provocar gravíssimos problemas de natureza estrutural se vier a afectar uma união monetária ainda não totalmente realizada.

Assim, pensar a Europa numa perspectiva futura implica considerarmos eventos internos e externos à própria União, que influenciam o caminho a percorrer.

Da concepção de futuro de Jean Monnet até ao Tratado de Lisboa, impossível é, hoje, encarar o futuro da Europa sem analisar a crise mundial instalada.

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1 | o Futuro da europa vIsto por jean monnet

Ao falar da sua concepção sobre o futuro da Europa, Jean Monnet tinha em mente, de maneira muito clara, a ideia de uma comunidade de destino. Esta poderia resultar, simultaneamente, do melhor e do pior realizado e pensado pelos povos e políticos europeus neste pequeno continente que tinha visto nascer filósofos, artistas e poetas mas também todos aqueles que na destruição do “outro” tinham pensado encontrar a sua mais completa e suprema forma de realização.

A partir da sua opção tão claramente expressa no final da II Guerra Mundial, a concepção de Jean Monnet assentava, como vimos, nas ideias de paz, liberdade e democracia. O esforço comum deveria ser realizado a partir de escolhas livremente concebidas e aceites por todos, e jamais imposto pelos mais fortes aos mais fracos. Esta opção era também dominada pela ideia de abertura, segundo a qual ninguém poderia ser excluído do projecto que se pretendia levar a cabo.

Jean Monnet:http://www.jean-monnet.ch+

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Jean Monnet

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE38

Embora durante as quatro décadas que se seguiram à criação da CECA os países de Leste não tivessem podido participar num projecto de partilha de um destino comum, orientado no sentido da paz e da prosperidade, da cultura e de um conhecimento ao alcance de todos, parece hoje clara a vontade sempre existente de que todos participassem nesse projecto:

Desde que em finais da década de 80 do século passado, se dissiparam as razões de natureza política que impediam essa participação, os países que dela se encontravam excluídos pediram uma adesão plena e não apenas um simples dispositivo de cooperação económica promotor do comércio e do investimento.

A UE correspondeu rapidamente aos desejos dos seus vizinhos de leste.

A futura integração na UE das Repúblicas da Ex-Jugoslávia e, mais ainda, de uma Turquia capaz de demonstrar a compatibilidade da democracia com a religião islâmica, oportunidade histórica ímpar, porventura irrepetível, poderá ainda prová-lo.

Tudo isto, quase totalmente realizado hoje, em termos formais, faz parte daquilo que era ainda não há muito o “futuro” de Jean Monnet, desejado por todos os “Pais de Europa” fossem eles Robert Schuman, Konrad Adenauer, Paul-Henri Spaak ou Alcide de Gasperi. Desejado, mas talvez difícil de prever a um ritmo tão rápido.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE39

Quem pensaria há 20 anos que a União Europeia englobaria hoje três Repúblicas da antiga União Soviética?

Recorde-se, aliás, que os anti-europeístas de finais dos anos 80 do século XX tinham detectado, como consequência do desmantelamento do Bloco de Leste e da própria União Soviética, um sinal de que a partir do momento em que esses blocos se tinham desmoronado, a Comunidade Europeia tinha por seu lado deixado de ser “necessária”, razão pela qual também se desmantelaria.

Ora isto era ignorar ou esquecer que o problema era outro.

O projecto de Jean Monnet e Robert Schuman não tinha sido concebido para responder a qualquer ameaça externa, para a qual existiam outros dispositivos e se contava com a participação dos Estados Unidos, mas sim para pôr um termo às querelas intra-europeias e aos jogos de influência dos Estados--Membros mais poderosos, entre eles e com o exterior, nomeadamente também no quadro da política colonial.

Mas em tudo isto, o “futuro de Jean Monnet” revelou-se fecundo e mantém-se ainda promissor. Verificou-se, assim, que era ele que tinha razão.

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2 | o tratado de LIsboa e o Futuro da europa

Recordando o capítulo anterior, e de um ponto de vista puramente formal, o alargamento da UE encontra-se, hoje, quase realizado. Contudo, muitos dos novos Estados-Membros “beneficiam” ainda de derrogações especiais, nomeadamente no que toca à moeda única.

Por outro lado, não é certo que o mecanismo das cooperações reforçadas (já mencionado atrás), não se tornará uma regra de uso frequente e sem limites no tempo, independentemente do texto do Tratado de Amesterdão indicar que este tipo de cooperação tem, pela sua própria natureza, carácter temporário.

A via da cooperação reforçada tem sido criticada, argumentando-se que teremos criado um meio de, consciente ou inconscientemente, diluir um projecto, que deveria tendencialmente evoluir para a realização de um objectivo de integração política, em algo que se arrisca a assemelhar-se progressivamente a uma zona de comércio livre.

Se bem que, mesmo de um ponto de vista puramente comercial, haja um certo exagero em evocar uma opção que de qualquer modo se encontra ultrapassada, muitos políticos influentes têm, a partir destes receios, retirado uma conclusão, ou seja, que para garantir tudo o que em termos institucionais foi adquirido ao longo das últimas décadas, a Europa necessitaria, pelo menos, de um Tratado que lhe assegurasse que esse adquirido “era mesmo para ficar”.

Nestes termos, e tendo em conta a natureza e o título desta publicação, será legítimo colocar aqui uma questão fundamental.

“Nada é possível

sem as pessoas, nada é

duradouro sem as instituições.”

Jean Monnet

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE41

vai o futuro da Europa depender de dispormos ou não de um Tratado com as características do Tratado de Lisboa, uma vez que nas condições actuais a aprovação de uma Constituição se afigura totalmente inviável?

Embora não tendo sido possível realizar os progressos que, porventura, se poderiam esperar com o projecto de Constituição, o Tratado de Lisboa, se for aprovado sem grandes modificações, poderá constituir um quadro capaz de desenvolver uma verdadeira vocação europeia.

Numa Comunidade a 27 membros, iríamos, mesmo com a Constituição, encontrar-nos, como agora, numa situação em que a “defesa do interesse nacional” não poderia deixar de conduzir a um enfraquecimento geral da UE perante o mundo exterior.

Restar-nos-ia, e não seria pouco, o reforço da integração a nível interno e aqui, para além de tudo o que tem sido realizado no contexto do primeiro pilar, o êxito do espaço de liberdade, segurança e justiça seria indispensável.

Aliás a nível externo, tudo o que tem sido e continua a ser realizado no plano económico é muito importante.

Nada mudou, portanto, quanto ao carácter intergovernamental da Política Externa e de Segurança Comum (PESC) onde as decisões continuam a ser tomadas por unanimidade excepto nos casos em que se destinem a dar execução a outras medidas, tomadas elas por unanimidade.

Contudo, a existência de um verdadeiro Presidente do Conselho Europeu apresenta maiores garantias de uma política unida.

Assim, e em matéria de relações da União com o exterior, que através dos mais variados modelos cobrem hoje quase todos os países do mundo, centrar-nos-emos naquelas que, independentemente dos progressos que tenham sido realizados, apresentam maiores perspectivas de futuro, ou em relação às quais essas perspectivas assumem para a UE maior importância.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE42

crIação da unIão para o medIterrâneo

Embora os progressos realizados não tenham aqui registado ainda uma evolução satisfatória, importa saudar o processo da criação, em 2008, de uma União para o Mediterrâneo, que consagra a importância da região como elemento essencial da estabilidade e segurança da UE e que embora com laços institucionais mais ténues revela objectivos que vão para além dos acordos existentes com os países da margem sul.

Em que consiste a União para o Mediterrâneo e em que é que pode ser importante?

A União para o Mediterrâneo é uma comunidade de países que circundam o Mar Mediterrâneo. Contudo, como tudo o que diz respeito à UE, para além dos países europeus situados na bacia mediterrânica, todos os Estados-Membros da União foram incluídos. Assim, os países da UE juntam-se aos países do sul e aos Estados potencialmente candidatos à UE, totalizando 44 países ou territórios.

A União para o Mediterrâneo foi criada através de uma declaração política e não de um Tratado, mantendo-se em vigor toda a base jurídica, que é o processo de Barcelona que, já desde 1995, aproxima os Estados-Membros da União dos Estados parceiros do Sul, numa cooperação multilateral, e traduz um esforço conjunto pela paz, pela prosperidade e pelo diálogo na região.

Países fundadores:

- Estados-Membros da UE27.

- Membros e observadores do Processo de Barcelona:

Albânia, Argélia, Autoridade Palestiniana, Egipto, Israel, Jordânia, Líbano, Líbia, Marrocos, Mauritânia, Síria, Tunísia e Turquia.

- Outros países ribeirinhos do Mediterrâneo:

Bósnia-Herzegovina, Croácia, Mónaco e Montenegro.

União para o Mediterrâneo: http://www.eurocid.pt/pls/wsd/wsdwcot0.detalhe?p_cot_id=4296&p_est_id=9749+

info

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE43

Segundo a Comissão Europeia muito já foi realizado no sentido de abordar numerosas questões regionais e estratégicas, mas ainda persistem grandes desafios comuns, nomeadamente no que toca:

à segurança,

à protecção do ambiente,

ao abastecimento energético,

à luta contra o crime organizado,

ao controlo dos fluxos migratórios.

A Comissão tem ainda sublinhado que a Comunidade que agora se pretende criar deve assentar em projectos concretos, não constituindo nem uma alternativa a um qualquer alargamento nem a base para uma qualquer adesão.

O que se pretende é que os países mediterrânicos tenham a possibilidade de se pronunciar a uma só voz sobre questões de uma importância estratégica fundamental como as que neste contexto se lhes colocam.

A Comissão tenciona, neste quadro, promover projectos de cooperação e desenvolvimento, que deverão ser analisados e implementados.

A contribuição para fornecer soluções ao conflito israelo-palestiniano deveria ser um dos principais objectivos desta União mas é, também, um daqueles em que têm de se enfrentar maiores dificuldades e neste momento aquele que pode impedir alguns países árabes de participar neste novo projecto dada a situação ser muito mais desfavorável que no momento em que foi desencadeado o processo de Barcelona (1995).

A região mediterrânea é um dos 25 “pontos quentes” do planeta. Possui das mais raras zonas biogeográficas no mundo e uma biodiversidade de primeira importância.

Fonte: Eurostat

Em síntese, e citando a Comissária Ferrero Waldner, impõe-se-nos acreditar que berço da Europa o Mediterrâneo é hoje o seu futuro.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE44

desenvoLvImento do projecto de parcerIa orIentaL

A Comissão Europeia propôs no final de 2008 um projecto de Parceria Oriental que visa o estreitamento das relações da UE com os países orientais. Este projecto, apresentado pela comissária responsável pelas Relações Externas e pela Política Europeia de vizinhança, Benita Ferrero-Waldner, como elemento fundamental da política externa europeia do século XXI, é bem representativo do interesse que a UE manifesta pelas mudanças que têm continuado a ocorrer nos países situados para além das suas fronteiras de Leste.

Na sequência de acontecimentos graves como o corte efectuado pela Rússia do fornecimento de gás à Ucrânia, que na altura afectou o aprovisionamento da União em energia, e mais ainda, o conflito entre a Rússia e a Geórgia que a UE procurou resolver pacificamente, a Parceria Oriental pretende o estreitamento das relações da UE com a Arménia, o Azerbaijão, a Bielorrússia, a Geórgia, a Moldávia e a Ucrânia.

Parceria Oriental:http://ec.europa.eu/external_relations/eastern/docs/index_en.htm+

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O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE45

Este projecto permitirá:

Fornecer um maior apoio às reformas desejadas por esses países como também contribuir para a paz, a prosperidade e a segurança da região numa base de interesse mútuo.

Criar uma alternativa a iniciativas aventurosas que precipitadamente se tem por vezes procurado acelerar, ao consolidar as mudanças ocorridas após o desmantelamento da União Soviética.

Progredir na consolidação das relações com a Rússia, cuja evolução é difícil de prever dado que se trata de um país, que é também um continente, e que autonomamente tem progressivamente, com Putin e Medvedev, readquirido o seu estatuto de grande potência mundial.

Colmatar a ausência de uma política energética comum relativamente à qual os Estados-Membros da União coordenam as suas políticas nacionais no seio da OCDE, e que tem sido uma das grandes deficiências da UE.

A Parceria Oriental poderá constituir indirectamente um elemento dessa política com vista a melhorar a segurança energética da União e de toda a região.

O facto de quase tudo estar por construir no que toca ao estabelecimento de relações com países com os quais o relacionamento é muito longínquo ou não existe qualquer tradição de cooperação põe em evidência a ambição de um projecto que - como foi recentemente sublinhado pela Comissão - seja fonte de estabilidade e de prosperidade para os cidadãos das gerações vindouras.

Parceria Oriental: http://ec.europa.eu/external_relations/armenia/index_en.htm | http://ec.europa.eu/external_relations/azerbaijan/index_en.htmhttp://ec.europa.eu/external_relations/belarus/index_en.htm | http://ec.europa.eu/external_relations/georgia/index_en.htmhttp://ec.europa.eu/external_relations/moldova/index_en.htm | http://ec.europa.eu/external_relations/ukraine/index_en.htm+

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Não nos podemos esquecer de que esta Parceria engloba um importante país produtor de energia: o Azerbaijão, e países de trânsito como a Ucrânia e a Geórgia, onde se têm dado problemas particularmente delicados.

desenvoLvImento do projecto de parcerIa orIentaL (continuação)

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE46

contrIbuIção para o desFecHo posItIvo da ronda de doHa

Em 2001, a Organização Mundial do Comércio (OMC) deu início, no Qatar, a um ciclo de negociações (ronda) que visava atenuar as barreiras comerciais a nível mundial, em particular, procurando tornar as regras de comércio mais livres para os países em desenvolvimento. Este ciclo designado como Ronda de Doha, e ainda em curso, tem sido palco de numerosas controvérsias, sendo o seu desfecho adiado sucessivamente.

Seria fundamental que a UE pudesse dar também uma contribuição para se chegar a uma conclusão positiva do ciclo de Doha no domínio da agricultura e da propriedade intelectual (produção de genéricos) o que, por sua vez, poderia facilitar a obtenção de resultados nos restantes dossiers onde numerosos Estados-Membros têm consideráveis interesses “activos” e não apenas de defesa comercial.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE47

Qual a contribuição do Tratado de Lisboa no domínio das relações externas, caso venha, de facto, a ser adoptado no decurso dos próximos meses?

A resposta aqui pode ser muito clara e mais definitiva que as que resultam de uma análise dos dispositivos existentes no plano interno: a contribuição do Tratado de Lisboa para a realização dos objectivos da União no plano externo pode ser muito eficaz e a sua não aprovação poderá trazer prejuízos para o futuro da Europa.

Com efeito, é no plano das relações externas que o papel do Presidente do Conselho Europeu assume maior importância, podendo mudar de maneira altamente significativa o papel da UE, no Mundo, nomeadamente nas duas grandes regiões acima evocadas, Mediterrâneo e o Leste.

Tal não significa minimizar a importância das outras regiões do Mundo como os países do Acordo de Cotonu, o Mercosul, a China, o Japão e os Estados Unidos, relações estas há muito estabelecidas em esquemas tradicionais.

Sublinha-se ainda que, no caso das relações entre a UE e os países em desenvolvimento, tem-se verificado uma tendência para serem progressivamente estabelecidas numa base global entre os países da União e o conjunto de países em desenvolvimento. A este respeito, não poderemos esquecer que o Tratado de Roma previa, já em 1957, o estreitamento das relações entre a Europa e os países em desenvolvimento (reduzidos nessa altura aos Países e Territórios do Ultramar), defendendo que estas relações deveriam estabelecer-se com a Comunidade, no seu todo, e não entre os países colonizadores e as respectivas colónias.

Acordo de Cotonu: http://europa.eu/legislation_summaries/development/african_caribbean_pacific_states/r12101_pt.htm Mercosul: http://www.mercosur.int/+

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3 | a “crIse” e o Futuro da europa

Uma crise é o primeiro sintoma de uma mudança, o sinal de que os equilíbrios automáticos que permitiam uma evolução normal da economia e da sociedade deixaram de ter lugar.

É também um desafio: o de conseguirmos encontrar os meios de intervenção que permitam corrigir os desvios sem destruir os fundamentos.

Para perspectivar o futuro é, assim, necessário saber analisar o passado distinguindo aquilo que apenas traduz uma evolução normal e exige a nossa adaptação a situações novas, daquilo que é um elemento perturbador que é preciso eliminar.

Recordemos que a luta pelo acesso às matérias-primas – alimentares e outras provenientes da agricultura, produtos de indústrias extractivas, especialmente metais e produtos energéticos – constituiu uma actividade fundamental dos países desenvolvidos durante os dois últimos séculos.

Esta luta traduziu-se por uma fácil apropriação, numa base colonial, de produtos primários originários dos países menos desenvolvidos, africanos, asiáticos e latino--americanos, na melhor das hipóteses pagos a baixo preço, ou seja, em última análise, através de produtos manufacturados de fraco valor acrescentado.

Embora os países industrializados dispusessem de uma reserva importante de matérias-primas, era-lhes mais fácil, em muitos casos, importá-las a baixo custo em proveniência dos países menos desenvolvidos, deslocalizando ao mesmo tempo para esses países as actividades relativas a produções de menor valor acrescentado que foram sendo (às vezes lentamente) abandonadas ou sofriam um processo de reestruturação.

“As pessoas só aceitam a mudança

quando se encontram face à necessidade,

e só reconhecem a necessidade

quando há uma crise.”

Jean Monnet

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE49

Contudo, muitos países, considerados ainda há relativamente poucas dezenas de anos como simplesmente “em desenvolvimento”, sobretudo a China, a Índia, o Brasil e a Coreia, têm atingido taxas de crescimento que permitem que o nível do respectivo PIB possa duplicar de sete em sete anos. Este crescimento tem consequências sobre a procura e põe em evidência um fenómeno totalmente novo na estrutura da economia mundial: a posse de matérias-primas deixou de constituir um exclusivo dos mais antigos países desenvolvidos ou das respectivas multinacionais.

Deve todavia sublinhar-se que estamos agora perante uma transformação fundamental da vida moderna onde somos obrigados a reconhecer que todos os recursos naturais podem acabar.

Esta tomada de consciência ocorreu a partir do momento em que muitos países em desenvolvimento se tornaram verdadeiramente países emergentes.

Nestas condições vamos ser obrigados a partilhar esses recursos, o que aliás não é mais que inteira justiça. E começam a avançar-se números sobre quantos planetas Terra suplementares teríamos de ter à nossa disposição para produzirmos e consumirmos tudo o que desejássemos.

Sabendo que a descida dos preços da energia verificada após as subidas de 2008 é puramente transitória e sintoma aliás de uma situação particularmente grave a nível mundial, tem de reconhecer--se que a possibilidade de dispor de energia e de matérias-primas baratas é, no quadro da actual estrutura dos recursos mundiais, praticamente impossível.

É preciso não esquecer que partilhar os recursos mundiais através do mecanismo dos preços, mesmo sabendo que tal não é feito da maneira mais justa, é preferível a excluir pura e simplesmente dessa partilha dois terços da Humanidade, como no passado, ou a resolver querelas entre os países da minoria mais favorecida através de conflitos armados.

Entre 1997 e 2006:

- a produção de energia da União recuou 9%

- o consumo da energia cresceu 7%

- as importações de energia aumentaram 29%.

A dependência energética da UE27 era em 2006 de 54%.

Fonte: Eurostat

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE50

Quanto ao impacto da subida dos preços da energia e das matérias-primas agrícolas na economia dos países menos desenvolvidos, sublinha-se que, se essa subida, quase sempre desfavorável no caso da energia, pode no caso das matérias-primas alimentares ser favorável aos agricultores mais pobres e com menos recursos, as consequências para as populações mais pobres das zonas urbanas são altamente desfavoráveis. Este aspecto tem sido aliás evidenciado, desde há muito, no Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT)1 e, mais recentemente, na OMC pelos pequenos países em desenvolvimento, importadores líquidos.

Assim, se a actual situação é favorável para os países emergentes e para algumas populações dos países menos desenvolvidos, isto significa igualmente que é necessário intensificar a ajuda a estes últimos, tendo nomeadamente em vista proporcionar-lhes um maior grau de auto-suficiência.

Neste contexto, as negociações sobre a agricultura no quadro do ciclo de Doha assumem importância fundamental, mas forçoso é reconhecer que os progressos têm sido praticamente nulos e a posição da União continua a situar-se abaixo do que seria desejável.

OMC: http://www.wto.org+

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Criado em 1947 com o objectivo de harmonizar as políticas aduaneiras e regular o comércio internacional, o GATT foi incorporado em 1994 na OMC.

1

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE51

Procurando perspectivar o futuro a médio e longo prazo, não nos deteremos excessivamente:

sobre as origens e os efeitos negativos sobre a economia dos movimentos especulativos;

numa análise da crise do subprime e da proliferação de produtos “tóxicos” resultante da titularização ilegal de activos de um valor real muito inferior ao do valor nominal pelo qual têm sido negociados, implicando graves prejuízos para os que inadvertidamente os têm adquirido;

nos problemas da falta de liquidez e da crise do crédito, na medida em que esta é essencialmente uma crise de confiança num sistema bancário que, consciente ou inconscientemente, se tem mostrado incapaz de a restabelecer, por aparentemente não conhecer sequer o valor real dos seus activos;

nas consequências da crise económica, gerada pela crise de confiança, e que se traduz por uma ausência de crescimento ou por taxas negativas de crescimento económico nos países mais desenvolvidos;

nos efeitos da crise social em que já se transformou a crise económica e que tende a avolumar-se com um aumento das taxas de desemprego de efeitos devastadores.

Tudo isto são aspectos graves de uma situação gerada por actividades ilícitas cujos efeitos não tem sido ainda possível avaliar totalmente.

Mas trata-se também de uma situação em que todos temos de realizar um esforço de compreensão no sentido de definir claramente o que terá de ser feito para sair de uma crise cujos detalhes já conhecemos e que todos os dias nos é desveladamente explicada sem que isso acrescente algo de significativo ao que desejamos saber.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE52

Numa economia globalizada, criada a partir dos anos 90 do século passado, por uma progressiva liberalização dos movimentos de capitais é normal que tudo o que se passasse na maior, mais rica e mais pujante economia do mundo – os Estados Unidos – tivesse importantes repercussões nas outras economias, desenvolvidas, emergentes ou subdesenvolvidas.

Por outro lado, deve sublinhar-se aqui um aspecto particularmente importante da evolução da economia mundial, ou seja a rápida passagem da China de uma situação de país subdesenvolvido, que era a sua no auge da “revolução cultural”, a uma situação de país emergente com taxas anuais de crescimento superiores a 7% e uma subida espectacular das exportações, facilitadas pelos níveis salariais mantidos artificialmente baixos e uma moeda deliberadamente subavaliada em relação às dos grandes países industrializados.

Dada a dimensão do país credor, e o nível do comércio entre e China e os Estados Unidos, verifica- -se que a economia americana tem sido financiada pelo défice externo, principalmente pela poupança chinesa, constituindo a acumulação de créditos em dólares realizada pela China uma espada de Dâmocles2 que, de há muito (mesmo muito antes da crise), preocupava os economistas e os políticos ocidentais.

Existe presentemente, na Administração americana, uma preocupação de que o auxílio à mobilização da liquidez do sistema bancário que, de momento, se encontra dificultada por uma desconfiança generalizada entre os bancos e entre estes e os utilizadores do crédito, seja susceptível de promover um crescimento real capaz de reduzir a dependência da economia americana em relação ao resto do mundo.

Encontramo-nos paradoxalmente numa situação em que, existindo riqueza, capacidade produtiva e alta tecnologia, o sistema se encontra parcialmente paralisado por uma desconfiança que não permite desencadear ao nível pretendido uma procura susceptível de fazer funcionar um sistema que para tal dispõe de todos os meios materiais mas que sofre de uma grande dificuldade em os pôr em marcha.

É nisto que se traduz a crise de liquidez devida ao facto de que aqueles que a podem criar não saberem ao certo quais os meios de que dispõem para o fazer.

E, nesta matéria, o Estado através de uma iniciativa autónoma, pode sem dúvida fazer muito, mas não pode obviamente fazer tudo.

A expressão “A espada de Dâmocles” vem de um episódio da História da Grécia Antiga.

Dâmocles era um cortesão da corte de Dionísio I de Siracusa (século IV a.C., Sicília) e invejava bastante o tirano.

Dionísio propôs que Dâmocles tomasse o seu lugar por um dia. À noite, durante um banquete, Dâmocles levantou a cabeça e viu uma espada suspensa por cima dele, presa a apenas um fio da cauda de um cavalo.

Dâmocles percebeu assim que o papel do tirano tinha duas faces: havia por um lado um sentimento de poder, mas por outro o receio da morte.

É assim que desde o século XIX falamos da espada de Dâmocles para descrever uma situação de perigo iminente.

2

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Ao procurar compreender o funcionamento do actual sistema de relações económicas internacionais, deparamo-nos com dois aspectos de natureza diferente, de que se apontam algumas das principais características:

1. A situação da economia mundial com uma divisão tradicional em países desenvolvidos, emergentes e subdesenvolvidos onde a rápida evolução registada pelos países emergentes e a sua capacidade concorrencial têm criado uma situação que desvaloriza progressivamente a posição relativa dos países desenvolvidos tradicionais que a consideravam como um adquirido. Os países industrializados, e entre estes a UE, defrontam-se com problemas de médio e longo prazo porventura ainda não convenientemente estudados e cuja solução vai exigir enormes progressos nas áreas científica e tecnológica, nomeadamente quanto às energias renováveis.

2. No domínio financeiro apontam-se alguns problemas, dos quais interessa destacar os de natureza psicológica mas que, embora se considerem como de curto prazo, provocam enormes estragos e poderão ter prolongamentos graves a médio e longo prazo. É sobre esses que temos de nos deter ao abordar o futuro da Europa.

Para a economia europeia, a recuperação da economia americana, objectivo que, desde Janeiro de 2009, ganhou nova credibilidade, é fundamental e constitui mesmo o único ponto de partida pois dada a interdependência destas duas economias, as mais importantes do mundo, dificilmente se poderia prever uma recuperação na Europa se as relações desta com os EUA continuassem a acusar a degradação registada com a precedente Administração.

Por outras palavras, dado o carácter global da crise, só a recuperação da economia americana pode constituir o motor da passagem a uma velocidade de cruzeiro que todos desejamos, condição que não sendo suficiente é, sem dúvida, necessária pois uma recuperação da economia mundial num futuro previsível não pode ser desencadeada nem pela União Europeia, nem pela China, nem pelo conjunto dos países emergentes que para tal não dispõem, ou não dispõem ainda, da necessária capacidade e onde não é possível evitar movimentos que se anulem uns aos outros.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE54

Assim, em que medida poderia a entrada em vigor do Tratado de Lisboa constituir um elemento, pelo menos, dinamizador de uma saída da crise?

Poderíamos responder com outra questão. Por falta de outros estímulos, seremos obrigados a constatar que se trata de um esforço inútil com vista à obtenção de quaisquer resultados mesmo que modestos?

Encontramo-nos perante situações de tal complexidade que seria temerário dizer que tal ou tal dispositivo institucional poderia ser fundamental ou, pelo contrário, irrelevante para a realização de tal ou tal fim.

Deve, contudo, sempre sublinhar-se que na União Europeia os dispositivos apropriados para o combate à crise existem, mas são, sobretudo, os que já tinham sido criados antes de se falar em Constituição ou em Tratado de Lisboa, nomeadamente os que resultam do Tratado da União Europeia na parte relativa à moeda única.

Com efeito, nem o projecto de Constituição nem o Tratado de Lisboa acrescentaram nada de fundamental ao que já existia no Direito Comunitário em matéria de união económica e monetária, e, contrariamente ao que se possa pensar, a UE, mesmo com os novos Tratados, poderia continuar a ver a sua política monetária reduzida a uma simples política anti-inflacionista (e a inflação não é de momento aquilo que mais nos preocupa) e a possibilidade de estabelecer, de maneira concertada, medidas de combate à crise continuaria a ser relativamente problemática.

De qualquer modo, com as suas virtudes e as suas insuficiências, o dispositivo resultante do Tratado de Maastricht é aquele com que podemos contar.

Tratado de Lisboa, 13 de Dezembro de 2008. Assinatura dos Chefes de Estado e de Governo dos 27 Estados-Membros.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE55

No entanto, é importante notar que, sem ter previsto a crise financeira e económica de 2008, que aliás assumiu contornos que ninguém previu, a UE tem estabelecido dispositivos susceptíveis de procurar fazer face a problemas que pudessem ter efeitos de desaceleração do crescimento económico, tomando inclusivamente medidas destinadas a diversificar os objectivos da União, nomeadamente:

a liberalização dos serviços;

a criação de uma sociedade do conhecimento e da informação.

No cumprimento destes esforços, assumiu particular relevo a definição da chamada Estratégia de Lisboa que não se traduziu pela aplicação de nenhum texto fundamental, mas muito mais simplesmente por um conjunto de conclusões da Presidência Portuguesa do Conselho Europeu (primeiro semestre de 2000).

Estas conclusões apresentaram métodos com vista à definição de políticas destinadas à prossecução dos objectivos da União, em particular no que toca ao emprego e à criação de uma sociedade do conhecimento e da informação.

Estes métodos comportariam, entre outros, o estabelecimento de orientações e calendários específicos para a consecução dos objectivos fixados, e de indicadores quantitativos e qualitativos adequados às necessidades dos diferentes Estados-Membros.

A Estratégia de Lisboa apresentada na viragem para o século XXIapresentou uma nova estratégia para odesenvolvimento social e económico da UE, colocando um novo objectivo estratégico: fazer da UE o espaço económico mais dinâmico e competitivo do Mundo, passando a ser um modelo deprogresso económico, social e ambiental.

Estratégia de Lisboa: http://www.estrategiadelisboa.pt/+

info

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE56

Talvez por se encontrar estabelecida em termos considerados por alguns como excessivamente vagos, a Estratégia de Lisboa não tem sido recordada com o interesse que deveria merecer, mas deve sublinhar-se que já em 2000:

traduzia uma preocupação de fazer face a problemas que pudessem surgir relativamente a objectivos de crescimento sustentado;

definia novos objectivos em matéria de emprego;

procurava incentivar a liberalização do comércio de serviços, cada vez mais importante em relação ao comércio de mercadorias;

procurava consolidar o caminho no sentido da criação de uma sociedade do conhecimento onde o papel da União deveria ser preponderante a nível mundial.

Com o desencadear da actual crise, verificou-se a necessidade de, em termos concretos e quantitativos, se intensificar a cooperação entre todos os países que participam na economia mundial.

Em 2005, a Estratégia de Lisboa foi relançada pela Comissão Europeia, focando a atenção em duas metas concretas:

- garantir o crescimento económico;

- criar mais e melhores empregos.

Por essa razão, a Estratégia de Lisboapassou também a ser designada: Estratégia para o Crescimento e o Emprego.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE57

Neste quadro, a reunião dos países economicamente mais importantes no mundo3 realizada em Londres, em 2 de Abril de 2009, constituía um desafio mas também, à partida, uma fonte de receio na medida em que poderia conduzir a graves resultados caso os diferentes países participantes se manifestassem intransigentes na defesa exclusiva dos seus interesses nacionais esquecendo a necessidade de estabelecer compromissos de natureza global que da maneira mais justa cobrissem os interesses de todos.

Os Estados Unidos estavam sobretudo preocupados em assegurar a expansão da procura enquanto a União Europeia colocava a ênfase na necessidade de reformar as medidas de regulação dos mercados financeiros.

O simples facto de todos os participantes terem procurado agir na busca de soluções comuns, mesmo que a satisfação do interesse global não tivesse permitido ir tão longe quanto alguns desejavam, foi considerado como uma importante viragem no quadro das relações internacionais.

O G-20 é um grupo criado em 1999,constituído pelas 19 maiores economias do mundo (África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul,Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, ReinoUnido, Rússia e Turquia) e pela UE.

Representa:

- 85% do PNB mundial

- 80% do comércio mundial

- Dois terços da população mundial.

3

G20: http://www.g20.org

+in

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O comunicado desta cimeira sublinha a necessidade de restaurar o crédito, o crescimento, e os empregos na economia. Neste sentido, foi decidido:

aumentar os recursos do Fundo Monetário Internacional (FMI) de 250 para 750 mil milhões de dólares;

emitir 250 mil milhões de direitos de saque especiais, utilizáveis pelos países membros do FMI.

Todas as entidades que possam representar um risco para o sistema deverão ser supervisionadas.

Encontramos aqui o desejo de dar conjuntamente satisfação às preocupações dos Estados Unidos e da União Europeia que, sendo naturalmente diferentes, não são necessariamente contraditórias.

A preocupação de evitar novas barreiras ao comércio e ao investimento ficou claramente afirmado, tal como a decisão de finalizar o ciclo de Doha. Encontramo-nos aqui numa situação oposta à que caracterizou a desastrosa década de 30 do século passado.

É certo que não obstante a reafirmação dos objectivos do Milénio no sentido de melhorar a ajuda aos países em desenvolvimento, esses objectivos se encontram ainda longe de ser atingidos.

Todavia, através dos direitos de saque especiais e da venda de ouro por parte do FMI, vai ser possível incrementar a ajuda do Fundo aos países em desenvolvimento, o que constitui outro avanço para a resolução da crise.

FMI: http://www.imf.org/external/index.htm

+in

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4 | o Futuro que desejamos

Muito tem sido realizado na União para assegurar aos povos Europeus um futuro de paz, prosperidade, liberdade e democracia, num contexto de abertura ao exterior, havendo sempre uma tentação de estabelecer uma lista exaustiva de tudo quanto foi feito e conseguido.

Com os riscos que tal lista implica poderíamos interrogar-nos:

De tudo quanto foi realizado4, qual o domínio em que, se falharmos ou voltarmos atrás, os nossos netos nos condenariam irremediavelmente?

No plano interno, a resposta só pode ser uma: a Moeda Única.

Deve aliás sublinhar-se que, na actual situação de crise, a existência do euro e do Banco Central Europeu evita um agravamento dos problemas associados a uma maior rarefacção do crédito.

Por outro lado, não podemos esquecer que a moeda única é ainda um exercício incompleto pois, para além de não compreender a libra, a derrogação de que “beneficiam” quase todos os novos Estados-Membros, por não terem à partida possibilidade de satisfazer os critérios de convergência de Maastricht, constitui uma séria deficiência e uma das fontes de preocupação que tinham levado os Chefes de Estado e de Governo reunidos em Laeken a lançar as bases para a elaboração de um projecto de Constituição.

É verdade que com a integração no sistema do euro se perde o recurso à desvalorização. Este último tem sido apontado como responsável pela perda da possibilidade, para países menos desenvolvidos e mais frágeis em termos de relações internacionais, de restabelecer automaticamente o equilíbrio das suas transacções externas, colocando-os em situações de dívida externa que poderão tornar-se incomportáveis (o que até é verdade).5

Mas seria mais justo e sobretudo mais operacional ver a questão sob um ângulo oposto e sublinhar que são os países que não pertencem ao euro que perdem o recurso a algo de mais importante.

- Criação de um mercado único.

- Implementação de uma política de coesão interna.

- Estabelecimento de uma moeda única.

- Consagração de uma cooperação política progressivamente mais estreita.

- Promoção de relações com o mundo exterior.

4

Este argumento conduz à defesa de um princípio de competitividade pelo empobrecimento que pode ser invocado transitoriamente em condições externas normais e em situações onde se pretende desencadear um processo de crescimento económico com base na procura externa.

5

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Com efeito, a pertença ao euro traduz-se numa protecção quase automática resultante da possibilidade de utilizar um maior recurso ao endividamento externo através do crédito interbancário. E é isso que falta neste momento e que muitos governos têm procurado remediar.

Para além de certos limites, essa possibilidade encontrar-se-á evidentemente reduzida e acaba por poder constituir um risco, mas deve reconhecer-se que as consequências da desvalorização, sobretudo, se utilizadas repetidamente, constituem uma forma grave de empobrecimento, sendo em geral mais graves que as de um endividamento externo. Isto, sobretudo, se este for aproveitado no sentido de favorecer o investimento, que não implica aliás necessariamente uma transferência de responsabilidades das gerações actuais para gerações futuras, tudo dependendo do crescimento económico que pode promover.

Sublinha-se a este respeito um aspecto extremamente grave que afecta os novos Estados-Membros. Com excepção da Eslovénia e da Eslováquia que já aderiram à moeda única, o facto de outros Estados--Membros ainda não beneficiarem da protecção do euro, coloca-os numa situação particularmente difícil, mesmo ao ter em conta que apresentam taxas de crescimento real consideravelmente superiores às dos Estados-Membros mais antigos da União.

Temos aqui mais um problema que alguns consideram ainda como conjuntural mas que, pela sua gravidade, pelo número de países afectados e pela sua previsível duração pode apresentar efeitos negativos sobre o futuro da Europa.

O TRATADO DE LISBOA E O FUTURO DA EUROPA PEDRO ÁLvARESÍNDICE61

Ao longo de pouco mais de meio século de existência, a Europa que conhecemos parece não ter esquecido os erros trágicos que se cometeram após o termo do conflito 1914-18:

Afrontou dificuldades;

Assistiu ao malogro de muitos projectos;

Conseguiu sempre encontrar para todos os seus problemas a melhor solução.

O refúgio no nacionalismo e no proteccionismo, que tinham precipitado a tragédia de 1939, nunca teve lugar.

Saibamos não esquecer as lições deste passado recente e ter bem presente tudo quanto perderíamos se, por razões obscuras, tentássemos um regresso ao clima de um período de “entre duas guerras” que pensávamos pertencesse já ao passado.

em resumo:

pedro Álvares

Especialista em matérias europeias, é licenciado em Economia pelo ISCEF, actual Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), e especializou-se em Altos Estudos Europeus no Colégio da Europa (Bruges).

Ao longo de 10 anos, foi responsável no Secretariado da Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) pelos assuntos relativos à economia portuguesa.

Participou, desde 1974, na então Missão de Portugal junto das Comunidades Europeias, nas negociações que haveriam de conduzir à assinatura do Acordo de Comércio Livre Portugal/CEE e nas negociações de adesão desde o seu início, sendo responsável, a nível da Missão, pelos dossiers relativos ao Sector Industrial.

Assumiu, durante uma década, a função de Conselheiro Técnico Principal na Representação de Portugal junto da União Europeia, tendo sido responsável directo pela Ronda do Uruguay, e pelas relações bilaterais com a China, Macau e a Mongólia.

Durante os primeiros semestres de 1992 e 2000, presidiu a numerosas reuniões no âmbito do Comité 113 (Bruxelas e Genebra), nomeadamente no contexto do Sector de Serviços.

Participou em missões oficiais na Europa, na América do Norte e do Sul, na Ásia Central e no Extremo Oriente.

Em Portugal foi Assessor Principal no Ministério da Economia e professor universitário, regendo as cadeiras de Integração Económica na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) e de Políticas da União Europeia na Universidade Moderna.

É autor dos livros Portugal na CEE, A Europa e o Mundo, Maastricht e a Europa e o Futuro, O GATT de Punta del Este a Marraquexe (Publicações Europa-América), L’élargissement de l’Union Européenne et l’expérience des Négociations d’Adhésion du Portugal, Uma Sebenta Europeia - Roteiro da Europa do Futuro, Compreender o Tratado de Lisboa (INA), e co-autor da obra Portugal e o Mercado Comum (Moraes Editores e Editorial Pórtico).

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Copyright © Comissão Europeia

Título: O Tratado de Lisboa e o futuro da Europa

Autor: Pedro Álvares

Fotografias: © European Community, 2009 | © Ricardo Oliveira, GPM (Capa)

Direcção editorial: Christelle Rodrigues

Design e Adaptação gráfica: Anja Wartig

Revisão linguística: Helena Romão

Quaisquer resultados ou direitos sobre os mesmos, incluindo direitos de autor ou outros direitos de propriedade industrial ou intelectual, obtidos no âmbito da execução do Contrato, serão da exclusiva propriedade da Comissão Europeia que os pode utilizar, publicar, atribuir ou transferir conforme entender, sem limites geográficos ou outros, excepto nos casos em que existam direitos de propriedade industrial ou intelectual anteriores ao Contrato.

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