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O BRINCAR NO AMBIENTE DE CRECHE PÚBLICA E A INTENCI ONALIDADE
PEDAGÓGICA
Manuela Cristina Souza Mendes1
Pollyanna Barreto Linhares Bastos de Nazaré2
Santana Moura3
RESUMO
O principal objetivo desta pesquisa foi verificar se haveria articulação ou desarticulação entre o conhecimento teórico e a prática, em relação ao brincar, das educadoras que atuam com crianças com faixa etária entre um e dois anos em Grupo Infantil 1, de creche pública municipal. O tema conta com a contribuição teórica de autores da Psicologia como Piaget e Vygostsky, entre outros, e tem destaque no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI). Foram utilizados como procedimentos para coleta de dados: observações in loco e questionários, aplicados com 12 educadoras. Os resultados obtidos indicam a existência de uma disparidade entre os conhecimentos demonstrados pelas educadoras e a aplicação destes na realidade de espaços educativos.
PALAVRAS-CHAVE: Brincar, Educação Infantil, Planejamento.
1 INTRODUÇÃO
O interesse em pesquisar o brincar surgiu, principalmente, por conta da
vivência de duas das autoras na função de Auxiliar de Desenvolvimento Infantil
(ADI), em Creches públicas da região metropolitana do Recife, lugar em que,
constantemente, verificam-se diversas situações onde o brincar se faz presente,
com ou sem o propósito de estimular o desenvolvimento das crianças beneficiárias
deste serviço.
1 Graduanda do curso de Licenciatura em Pedagogia – Centro de Educação/UFPE. Email: [email protected] 2 Graduanda do curso de Licenciatura em Pedagogia – Centro de Educação/UFPE. Email: [email protected] 3 Mestra em Psicologia Cognitiva; Especialista em Administração Escolar e Planejamento Educacional; Especialista em Psicologia do Esporte; Psicóloga e Docente no Ensino Superior. Email: [email protected]
2
Vislumbra-se a relevância deste estudo pela possibilidade de chamar a
atenção de educadores e demais interessados sobre as implicações sócio-
educacionais do brincar, no ambiente coletivo de creche pública, no qual crianças
ficam separadas dos familiares sob os cuidados de pessoas estranhas, cuja
convivência passa a ter grande importância para o seu desenvolvimento como ser
humano. A exigüidade do tempo destinado à elaboração de um Trabalho de
Conclusão de Curso não permitiu uma inserção mais profunda na questão teórica do
brincar, no entanto, alguns autores foram chamados ao diálogo para se
compreender melhor as implicações práticas deste fenômeno tão presente na vida
das crianças, especialmente as mais jovens, num ambiente dito educacional.
Como objeto de estudo elegemos o brincar no “Grupo Infantil 1” que é
atendido em creche, sendo composto por crianças na faixa etária entre um e dois
anos de idade, em média, onde a prática de brincadeiras se faz presente em sua
rotina. Este grupo foi escolhido, porque a partir do olhar cotidiano em sala de aula,
percebermos que quanto menor a criança, mais distanciados pareciam estar alguns
profissionais da educação do reconhecimento sobre a importância desta atividade
para a constituição do ser humano e construção da cidadania. Provavelmente, por
conta disso, percebia-se alguma desvalorização ou pouco investimento pessoal de
educadores desta faixa etária, na elaboração de propostas didáticas que incluíssem
o brincar com intencionalidade pedagógica.
No dia a dia escolar os profissionais podem se reportar a diversas
informações para realizar esta atividade. Estas podem ser adquiridas de diferentes
maneiras: através de conhecimentos prévios, da formação profissional ou ainda
através da construção realizada pelo seu aprendizado diário neste ambiente.
A investigação permitiu responder a uma das questões que motivou o estudo.
Queríamos confirmar cientificamente se existiria ou não orientação com
intencionalidade pedagógica quando as educadoras, no ambiente de Grupo Infantil 1
em creche pública, observavam ou brincavam com as crianças. Além da busca de
respostas para esta indagação procurou-se, também, verificar se haveria articulação
ou desarticulação entre o conhecimento teórico (anunciado verbalmente mediante
respostas às perguntas do questionário aplicado) e a prática dessas educadoras em
relação ao brincar.
Averiguou-se, por outro lado, se as participantes reconheciam o valor
pedagógico dessa atividade e se elas a introduziam no planejamento pedagógico. O
3
questionário e as observações realizadas permitiram verificar de que maneira ele se
fazia presente no ambiente estudado. Foram levantadas hipóteses a serem
confirmadas ou refutadas.
A primeira delas presumia que o brincar desenvolvido com as crianças de um
a dois anos de idade, de duas creches municipais da região metropolitana do Recife
acontecia de forma aleatória, sem planejamento e sem intencionalidade pedagógica.
A segunda supunha que, o brincar desenvolvido por educadoras com essas
crianças, na maioria das vezes, era utilizado para preencher o tempo vago e não
com o intuito de favorecer o desenvolvimento e a aprendizagem dos aprendizes.
O Referencial Curricular para a Educação Infantil (RCNEI) de 1998 é um
documento norteador para os profissionais e unidades educacionais desta área e
destaca a relevância do brincar como atividade que contribui para a evolução da
autonomia e da identidade da criança. Pode ser considerado como importante
instrumento pedagógico para o desenvolvimento infantil, na medida em que tem o
intuito de desenvolver algo na criança, indo além de um simples passatempo quando
não utilizado apenas como preenchimento do tempo livre das mesmas e sem levar
em consideração o que nelas está sendo desenvolvido. Oliveira et. al, (2005, p.53)
ressalta que “as brincadeiras infantis nem sempre são bem entendidas por certas
pessoas, incluindo alguns educadores que costumam dizer: ‘as crianças estão só
brincando’, como se ali nada acontecesse” (grifo da autora). Desta forma, verifica-se
que, embora o brincar seja um recurso de grande valor para a educação infantil,
nem sempre é reconhecido como desta forma. Esperava-se que esta pesquisa
pudesse somar-se a outras já existentes, vindo a colaborar com os conhecimentos
sobre o brincar no espaço escolar, destacando seu caráter mais prático e mais
próximo da realidade, dentro da sala de aula, no âmbito de creche pública.
2 EDUCAÇÃO NO AMBIENTE DE CRECHE
O termo creche vem da palavra francesa crèche que significa “manjedoura”,
tendo o sentido de acolhimento. Ela revela o olhar assistencialista com o qual
apareceu há cerca de 200 anos, na França. Na época, era instituição que cuidava de
crianças baseando-se na idéia de infância existente naquele período. Alguns fatores
contribuíram para o seu surgimento, entre eles, se destacam o processo de
4
fabricação em massa introduzida pela Revolução Industrial na segunda metade do
século XVIII, que encerrou a transição entre o feudalismo e o capitalismo e a
conseqüente saída da mulher do seio familiar para o mercado de trabalho. O ato de
uma criança ser deixada na creche era visto como um abandono das mesmas por
suas mães.
No Brasil, com a chegada da Industrialização, as creches tornaram-se
necessárias pelo fato das mulheres não terem onde deixar seus filhos durante o dia,
para poderem trabalhar nas indústrias. Na década de 50, com a expansão das
indústrias, estas instituições passaram a ser defendidas também por médicos, pelo
fato de estarem preocupados com as freqüentes doenças que acometiam as
crianças pobres que viviam em péssimas condições de higiene. De acordo com
Oliveira (2007), embora fosse um problema criado pelas transformações econômicas
e sociais, o governo não via a creche como sua obrigação, mas como um favor
prestado à população mais pobre, tendo em vista que, nesta época, não existia uma
legislação que o obrigasse a prestar assistência à população através das creches.
Na segunda metade do século XX, percebe-se uma grande preocupação da
sociedade com o aumento da marginalidade entre as crianças e adolescentes das
classes pobres, por isso, a educação passou a ter um caráter compensatório que
visava suprir as necessidades culturais e intelectuais destas população.
Em 1988, com a Constituição Federal, a educação infantil foi reconhecida
como direito da criança e dever do Estado pelo artigo 208, inciso IV. Nos anos
subseqüentes, houve inúmeras negociações entre diversos setores da sociedade e
do governo, até que em 1996 foi aprovada a Lei nº 9394/96 de Diretrizes e Bases da
Educação (LDB), onde a educação infantil, na qual as creches estão inseridas, é
considerada como o início da educação básica, o que dá à mesma um caráter
também educativo.
Mais adiante, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
(RCNEI) apresenta o brincar como uma base para a constituição do ato de educar
neste nível educacional e neste sentido
Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidado, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, ao conhecimento mais amplo da realidade social e cultural. (BRASIL: RCNEI, 1998, p23, vol.1)
5
Portanto, depreende-se deste referencial que através da brincadeira a criança
pode explorar e reproduzir as situações sociais com as quais convive diariamente,
possibilitando, assim, assumir diferentes papéis em diferentes situações além de
interagir com seus pares. Por intermédio da brincadeira, ela pode demonstrar como
percebe o mundo em que vive e elaborar suas próprias regras de convivência como
reconhecido por Wajskop (1997), quando diz que a brincadeira é uma atividade na
qual as crianças pensam e experimentam o seu cotidiano. Ao contextualizar as
brincadeiras, o educador pode utilizar as vivências do dia a dia das mesmas em
favor do crescimento pessoal e da aprendizagem.
O brincar na educação infantil é relevante, pois ele “fornece à criança a
possibilidade de construir uma identidade autônoma, cooperativa e criativa”
(ABRAMOWICZ; WAJSKOP, 1999, p. 56). Além do mais, a brincadeira permite que
a criança expresse espontaneamente seus desejos, sentimentos e dificuldades.
Vários teóricos conceituam o brincar em seus estudos, inclusive, porque esta
atividade tem a faculdade de trazer o jogo em seu bojo, dentre eles Piaget e
Vygotsky.
Para Piaget (1981, apud AROEIRA; SOARES; MENDES, 1996, p.69) “o jogo
representa a predominância da assimilação sobre a acomodação. É uma
transposição simbólica que sujeita as coisas à atividade da criança sem limitações”.
Assim, através do brincar a criança pode incorporar situações e objetos ao seu eu,
permitindo o surgimento de comportamentos espontâneos e facilitando a
compreensão da realidade em que vive.
Note-se, também que Piaget (1974) se refere à assimilação como sendo a
relação que une elementos da organização interna com os elementos do meio,
explicando que o funcionamento do organismo não destrói, mas conserva o ciclo de
organização e coordena os dados do meio de modo a incorporá-lo a este ciclo.
Dessa forma, em se tratando da importância do brincar na vida do infante,
Lima (1986, p.33) enfatiza que “não existe nada que a criança precise saber que não
possa ser ensinado brincando (...). Se alguma coisa não é passível de se
transformar em um jogo (problema, desafio), certamente não será útil para a criança
neste momento.” Assim, através do brincar a criança pode incorporar situações e
objetos ao seu eu, permitindo o surgimento de comportamentos espontâneos e
facilitando a compreensão da realidade em que vive.
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Por sua vez, Vygotsky ([ ? ] apud AROEIRA; SOARES; MENDES, 1996, p.68)
enfatiza que no brincar a criança expõe a realidade e as regras comportamentais
que advém do contexto cultural.
A cultura e suas diferenciações inspiram a perspectiva vygotskiana que
preconiza a origem das funções complexas do pensamento a partir das trocas
sociais, sendo que nesta interação os signos, especialmente a linguagem, bem
como a utilização dos instrumentos, teria relevante papel. Provavelmente nenhum
outro contexto é tão rico para estas trocas do que a brincadeira, espontânea ou não,
pois
No ato de brincar ocorrem trocas, as crianças convivem com suas diferenças, se dá o desenvolvimento da imaginação e da linguagem, da compreensão e apropriação de conhecimentos e sentimentos, do exercício da iniciativa e da decisão. (ABRAMOWICZ ; WAJSKOP, 1999, p.59)
Assim sendo, quando se utiliza o brincar como instrumento pedagógico,
mediado pela intervenção do profissional, procura-se manter o caráter lúdico e
prazeroso para os envolvidos e abre-se a possibilidade de todos estes ganhos, seja
para o desenvolvimento ou para a aprendizagem.
Neste âmbito, vale ressaltar a importância da brincadeira livre que pode
ajudar o educador a diagnosticar diversas características das crianças através de
observações realizadas. Tais características podem ser valores, necessidades,
idéias, cognição, comportamento, conflitos e eventuais problemas que a criança
possa vir a apresentar.
É por meio das brincadeiras que os professores podem observar e construir uma visão dos processos de desenvolvimento das crianças em conjunto e de cada uma em particular, registrando suas capacidades de uso de linguagens, assim como de suas capacidades sociais e dos recursos afetivos e emocionais que dispõem. (BRASIL: RCNEI, 1998, p.28, vol.1)
Desta forma, o acompanhamento realizado por quem educa também pode ser
importante para que se possa intervir de forma contextualizada nas brincadeiras das
crianças. Para tanto, torna-se válido que o professor planeje suas intervenções com
base nas observações obtidas e posteriormente faça o acompanhamento para
avaliá-las. Quando a intervenção baseia-se neste procedimento, o educador pode
disponibilizar os materiais adequados e também proporcionar aos seus alunos
situações que desenvolvam muitas de suas competências.
7
Ressalte-se que num planejamento não é obrigatório que a atividade proposta
seja seguida à risca, é possível haver modificações; por outro lado, não quer dizer
que ele deva ser usado para controlar ou podar as ações das crianças. Vivenciar
experiências prazerosas pode vir a ser mais importante e mais eficiente do que
executar o planejamento elaborado numa perspectiva antecipatória.
Esta ferramenta pedagógica pode ser elaborada e utilizada coletivamente, de
modo que todos os educadores responsáveis pelos aprendizes tenham consciência
do que vai ser realizado e que possam dar suas contribuições, já que também os
observam em seu cotidiano.
Pais e educadores estão sempre em busca do melhor para suas crianças, e
procuram desenvolver nelas a responsabilidade, o equilíbrio, a inteligência, suas
relações sociais, enfim, prepará-las para o mundo. Contudo, muitas vezes,
esquecem-se que no brincar todas essas habilidades podem ser desenvolvidas.
Oliveira (2007) destaca a brincadeira como um importante recurso para a educação
infantil:
A brincadeira é o recurso privilegiado de desenvolvimento da criança pequena por acionar e desenvolver processos psicológicos – particularmente a memória e a capacidade de expressar elementos com diferentes linguagens, de representar o mundo por imagens, de tomar o ponto de vista de um interlocutor e ajustar seus próprios argumentos por meio do confronto de papéis que nele se estabelece, de ter prazer e de partilhar situações plenas de emoção e afetividade. (OLIVEIRA, 2007, p.231)
Para educadores que atuam na educação infantil e anseiam desenvolver um
trabalho de qualidade com seus alunos, o brincar constitui um elemento importante
no ensino-aprendizagem, levando-o a fazer parte do plano de aula e de outros
projetos a serem desenvolvidos.
3 MÉTODO
Os participantes da pesquisa foram: 12 educadoras atuantes em turmas de
Grupo Infantil 1 de duas creches municipais de uma cidade da região metropolitana
do Recife. Entre elas: uma professora da rede, uma estagiária regente, cinco
auxiliares de desenvolvimento infantil (ADI’s) e cinco estagiárias.
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Os instrumentos usados para coleta de dados foram observações in loco (Ver
apêndice A) e aplicação de questionários com perguntas abertas e fechadas,
incluindo as de múltipla escolha (Ver apêndice B) com o intuito de conhecer as
participantes da pesquisa e seus posicionamentos em relação ao brincar. Eles foram
entregues para as educadoras com um limite de dois dias para a devolução dos
mesmos. Após este prazo, os questionários foram recolhidos e analisados; as
respostas abertas foram categorizadas, as informações tabuladas com a utilização
de gráficos e quadros, e, por fim, os dados foram interpretados.
De outra parte, as observações foram realizadas durante cinco dias, em duas
salas do Grupo Infantil 1 com crianças entre um e dois anos de idade, nas mesmas
creches municipais de uma cidade da região metropolitana do Recife, nas quais foi
aplicado o questionário. Utilizou-se um período de oito horas diárias perfazendo, ao
todo, quarenta horas em cada unidade. Os horários selecionados foram de 7hs às
12hs e de 14hs às 17hs. O período das 12hs às 14hs não foi observado, pois as
crianças estavam dormindo.
As creches observadas foram denominadas de creche “A” e creche “B”. A
primeira (A) possui cerca de 80 crianças com idades entre zero e três anos, sendo
utilizadas nesta pesquisa apenas as atividades que envolveram as 20 crianças do
Grupo Infantil 1. Ela é composta por cinco salas, um pátio onde as crianças fazem
as refeições, um parque com areia e brinquedos de ferro e plástico, cozinha,
banheiro das crianças, sala de coordenação, uma sala pequena utilizada pelas
professoras para se reunirem, banheiro para funcionários e lavanderia.
A segunda creche (B) recebe diariamente cerca de 120 crianças com idade
que vai de zero a cinco anos, levando-se em consideração para esta pesquisa
apenas as atividades onde as 20 crianças do Grupo Infantil 1 encontraram-se
envolvidas. Ela é composta por cinco salas, um pátio onde as crianças fazem as
refeições e uma área a céu aberto destinada ao parque, que é composta por vários
brinquedos de ferro e de plástico. Há também cozinha, banheiros das crianças, sala
de vídeo que todas as turmas podem usar; sala de coordenação, banheiro para
funcionários e uma área na frente da creche que deveria ser um campinho e futebol,
mas está coberto pela vegetação. Esta pesquisa configura-se como estudo de caso,
pois
9
(...) refere-se a uma situação, entidade ou conjunto de entidades que têm um mesmo comportamento ou são do mesmo perfil. Ele tem uma profundidade bem maior que os estudos de campo e uma reduzida amplitude em função do baixo número de elementos de pesquisas. Não se podem generalizar as conclusões do estudo de caso, pois são particulares. As conclusões de um estudo de caso geram hipóteses para pesquisas de fenômenos que envolvam um maior contingente de pesquisa. Os estudos de campo envolvem um número razoável de elementos pesquisa, ou seja, têm uma amplitude maior que os estudos de casos, aceitam hipóteses, mas têm menos profundidade que os estudos de casos, e resultam em generalizações com certas restrições. (FORTE, 2006, p.9)
Portanto, o estudo consistiu em uma investigação específica focada em duas
instituições que atendem petizes de um a dois anos de idade. Procurou-se descobrir
o que havia de característico nos casos averiguados, tentando relacionar ações e
comportamentos com o problema estudado, verificando-se a existência ou não de
intencionalidade pedagógica quando os educadores, no ambiente de Grupo Infantil 1
em creche pública, brincavam com as crianças. A abordagem para análise dos
dados é de natureza qualitativa e quantitativa, pois quantifica, descreve e interpreta
os fenômenos que ocorrem e que são coletados em seu ambiente natural.
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
4.1 Características dos participantes
Através da análise dos questionários aplicados e das observações realizadas
verificamos que todos os participantes são do sexo feminino, com faixa etária
variando de 17 anos a 43 anos de idade. Na rotina da sala vimos que a idade não
exerce influência sobre o trabalho desenvolvido, uma vez que todas as educadoras
exercem suas atribuições tal qual o exigido pelas instituições onde trabalham.
Quanto à formação, cinco participantes tem curso superior em Pedagogia,
seis estão cursando o magistério e uma tem apenas o ensino médio. Entre as
respondentes existe uma professora da rede e uma estagiária regente, que exercem
as mesmas funções docentes. Registra-se, ainda, a presença de cinco Auxiliares de
Desenvolvimento Infantil (ADI’s) e cinco estagiárias que, embora executem as
mesmas atribuições, se diferenciam pelo vínculo empregatício: efetivo e temporário.
Enquanto as ADI’s são funcionárias públicas municipais estatutárias e trabalham oito
10
horas por dia, as estagiárias tem contrato temporário de um ano, podendo ser
renovado por mais outro ano e trabalham quatro horas por dia.
Das 12 participantes do questionário, três trabalham há menos de um ano
com a educação infantil; cinco trabalham de um a três anos; três trabalham de três a
cinco anos; e apenas uma trabalha de cinco a dez anos neste nível de ensino.
4.2 Conhecimentos e postura das educadoras em relaç ão ao brincar
No que se refere à importância do brincar para as crianças do Grupo Infantil
1, as participantes elencaram várias vantagens da utilização do brincar, como vemos
no Quadro 1:
Pergunta 6: Qual a importância do brincar para as c rianças do grupo 1? Respostas que remetem a: Nº % Desenvolvimento 4 36,36 Aprendizagem 4 36,36 Diversão 2 18,18 Ensino 1 9,09 TOTAL: 11 99,99
Quadro 1 - Categorização das respostas sobre a im portância do brincar *A porcentagem não soma 100% por haver dízimas periódicas arredondadas.
Os dados indicam que, para as educadoras, o brincar tem um significativo
valor, em especial para o desenvolvimento e aprendizagem das crianças, como
explicitado por uma das participantes: “Dou muita importância ao brincar, pois todo o
aprendizado se utiliza dele. Através do brincar entramos no ‘mundo’ das crianças e
todo o aprendizado se transforma numa grande e prazerosa brincadeira.” (P). Este
discurso alinha-se com autores como Piaget (1974), Oliveira (2005) e o próprio
documento orientador da Educação (RCNEI), construído por vários estudiosos do
processo educativos. Ratifica-se que:
No ato de brincar ocorrem trocas, as crianças convivem com suas diferenças, se dá o desenvolvimento da imaginação e da linguagem, da compreensão e apropriação de conhecimentos e sentimentos, do exercício da iniciativa e da decisão. (ABRAMOWICZ ; WAJSKOP, 1999, p.59)
Em contrapartida, para algumas educadoras o brincar é um momento que
proporciona diversão para as crianças e que ocupa o seu tempo, como observado
na fala da EADI3: “É muito importante porque estão se divertindo ao invés de fazer
11
coisa errada.” A partir da fala desta educadora, percebe-se que o brincar também é
utilizado para preenchimento do tempo vago.
Embora todas as pesquisadas tenham exposto o reconhecimento da
importância do brincar em diversas áreas da educação infantil, nas observações
realizadas notamos que apenas a professora da rede usa o brincar de forma
pedagógica e intencional, através dos planejamentos realizados previamente e na
aplicação das atividades com as crianças.
Isto pôde ser percebido no desenvolvimento de algumas atividades
observadas quando, por exemplo, ela convidou as crianças para formar um
trenzinho e andar em cima da linha amarela (trabalhando com elas o equilíbrio e a
coordenação motora), pediu que as crianças ficassem dentro e fora de um círculo
amarelo pintado no chão da sala (trabalhando o “dentro” e o “fora”), sentou as
crianças em círculo e, apontando, pediu que dissessem o nome do “coleguinha” que
estava ao lado dela, repetindo a mesma pergunta em relação à criança que estava
do lado dessa outra e assim sucessivamente com todas as crianças (trabalhando o
nome das crianças).
Pediu que uma criança deitasse em cima de duas cartolinas unidas com fita
adesiva e fez o contorno do seu corpo solicitando, em seguida, que as crianças
apontassem algumas partes do corpo como cabeça, olhos, boca, nariz, orelha,
bochecha, braço, mão, perna, pé, barriga e peito e, no dia seguinte, deu papel e
lápis de cera para que as crianças pintassem o desenho de um boneco, lembrando
as partes do corpo que foram trabalhadas no dia anterior (trabalhando as partes do
corpo humano). Estas atividades demonstram a organização prévia e a intenção de
desenvolver algo através da elaboração das mesmas, aproveitando o caráter lúdico
da intervenção pedagógica permeada pela brincadeira.
As demais educadoras praticam o brincar apenas em espaços de tempo em
que as crianças estão ociosas, fazendo isso de forma aleatória e muitas vezes
repetindo as mesmas atividades em dias e horários diferentes. Existem atividades
que são, basicamente, rotineiras. Por exemplo: num dia as crianças assistem a um
desenho e depois vão para o parque; no outro elas vão para o parque e, quando
chegam à sala, as educadoras lhes dão os brinquedos disponíveis com os quais
elas brincam até a hora de sair; no dia seguinte elas brincam com os brinquedos na
sala, depois vão para o parque e novamente recebem os brinquedos ao retornarem
para a sala.
12
Quando questionadas a respeito do que é possível observar nas crianças
durante o brincar, as educadoras apontaram vários aspectos, indicados no Quadro
2:
Quadro 2 - Aspectos observáveis durante o brincar *A porcentagem não soma 100% por haver dízimas periódicas arredondadas.
Dentre o que foi listado no Quadro 2, verificou-se que o aspecto
comportamento foi bastante enfatizado, correspondendo a 1/3 das respostas. Além
deste, outros que igualmente se referem à questão da formação da criança,
enquanto ser em constante transformação, como habilidades e personalidade, ainda
foram citados. Talvez isso demonstre a preocupação existente com a formação do
ser humano dentro do espaço educativo. Além disso, foram lembrados fatores que
indicam que as crianças, através do brincar, refletem o que vivem em seu dia a dia,
no lar, na creche e nas suas relações com os adultos e outras crianças. Além disso,
a brincadeira é um meio para estimular o desenvolvimento cognitivo, pois
Quando a criança começa a coordenar seus esquemas, organizando suas ações no espaço e tempo, está surgindo o que Piaget chama de ‘lógica das ações’, que quer dizer, as noções de causalidade, constância de objeto, velocidade, conservação, relatividade e outras, donde deriva a construção do real. (PALANGANA, 2001, p.21).
Esse discurso das educadoras evidencia que estão em consenso com o que
diz Brasil (1998) no RCNEI, que por intermédio das brincadeiras, os profissionais
podem observar aspectos do desenvolvimento, linguagem, capacidades emocionais
e sociais das crianças. Isto reforça a presunção de que as mesmas provavelmente
conheciam os aspectos teóricos sobre a importância do brincar.
No entanto, por outro lado, a partir do que foi observado percebemos que,
muitas vezes, durante o brincar das crianças, as educadoras concentravam suas
Pergunta 7 : O que é possível observar nas crianças durante o brincar? Respostas que remetem a: Nº % Comportamento 6 33,33 Aprendizagem 3 16,67 Educação Doméstica 3 16,67 Personalidade 2 11,11 Vivências 2 11,11 Habilidades 1 5,56 Saberes 1 5,56 TOTAL: 18 100,01
13
atenções em atividades secundárias como conversas entre elas sobre temas
pessoais, pintura de unhas e leituras particulares, apenas intervindo em momentos
de briga entre as crianças ou situações em que as crianças poderiam se machucar.
Nas ocasiões em que as crianças brincavam e que poderiam estar sendo
observadas, existia uma desvalorização deste período de tempo, no qual as
educadoras não colocavam em prática o olhar apropriado para este momento. O que
ratifica o argumento de Oliveira et. al, (2005) de que algumas pessoas pensam que
quando as crianças brincam não há nada de importante acontecendo naquele
momento. Na verdade, o brincar com os pares ou com adultos pode mediar a
apropriação do conhecimento, numa relação dialética, mesmo porque
(...) enquanto sujeito do conhecimento o homem não tem acesso direto aos objetos, mas acesso mediado, através de recortes do real, operado pelos sistemas simbólicos de que dispõe, portanto, enfatiza a construção do conhecimento como uma interação mediada por várias relações, ou seja, o conhecimento não está sendo visto como uma ação do sujeito sobre a realidade, assim como no construtivismo e sim, pela mediação feita por outros sujeitos. (ZACARIAS, 2004, p.2).
De forma esporádica, algumas educadoras davam atenção às brincadeiras
desenvolvidas pelas crianças e comentavam entre si o que era observado. Porém,
não existiam muitos momentos para que estes comentários pudessem ser
socializados. O único momento formalmente reservado para isto é o Conselho de
Ciclo, que acontece a cada três meses e conta com a participação de todas as
educadoras. Nele, as profissionais envolvidas têm a oportunidade de debater sobre
avanços, retrocessos e comportamentos das crianças.
Em relação ao planejamento das atividades, a grande maioria das
participantes respondeu que geralmente não realiza o planejamento, como
representado no gráfico 1:
84%
8%8%
Geralmente não planeja
Sempre planeja
Não planeja, prefere que surjamde forma espontânea
Gráfico 1 - Sobre o planejamento das atividades
14
Analisando as respostas dos questionários, nos deparamos com uma
realidade na qual apenas a professora da rede realiza o seu planejamento de
atividades. Destaque-se que essa professora pertence a creche “A”, onde há
cobrança por parte da gestão em relação as atividades desenvolvidas com as
crianças. Nesta instituição, as atividades diárias são previamente elaboradas pela
coordenação pedagógica, para serem desenvolvidas com as crianças no período da
tarde pelas ADI’s e estagiárias, mas existe relutância das mesmas em cumprir o que
foi preparado, preferindo dar brinquedos as crianças nesse horário. Na creche “B”, o
ato de planejar não é realizado e as atividades são feitas de forma aleatória e sem
finalidade específica.
Ao se programar algo, são traçados objetivos e metas a serem alcançados
através do desenvolvimento do que foi proposto. A participação de todos os
educadores nesta construção pode contribuir para que as atividades sejam
desenvolvidas de forma contextualizada, uma vez que todos vivenciam o dia a dia
das crianças.
Este momento pode se transformar em oportunidade de socialização do que é
observado em sala, permitindo que essas informações sejam levadas em
consideração na elaboração do planejamento, mas não se verificou este tipo de
iniciativa, neste contexto.
O Quadro 3 apresenta as dificuldades encontradas pelas educadoras na
mediação do brincar.
Pergunta 9: Você encontra dificuldades na mediação do brincar? Se sim, quais?
Respostas: Nº % Dispersão das crianças 8 34,78 Falta de pessoal 6 26,09 Falta de material 5 21,74 Falta de tempo 2 8,70 Não existe planejamento 1 4,35 Dificuldades no planejamento 1 4,35 TOTAL: 23 100,01
Quadro 3 - Dificuldades na mediação do brincar *A porcentagem não soma 100% por haver dízimas periódicas arredondadas.
Observamos que, embora haja nas salas três educadoras em cada turno, na
creche “A”, esse número encontra-se defasado com freqüência, pois o banheiro das
crianças é fora da sala, tendo que uma das educadoras se ausentarem,
15
constantemente, do local para levar as crianças ao banheiro. Nestes momentos, as
crianças ficam mais dispersas e a atividade se torna tumultuada. Por esse motivo,
todas aquelas que alegaram falta de pessoal pertencem a creche “A”. Na instituição
“B” esse problema não foi observado, pois o banheiro encontra-se dentro da sala.
Nas duas instituições os brinquedos se encontram em más condições de uso,
sendo, na maioria das vezes, recebidos de doações. Quanto ao material de uso
pedagógico foi observado que, em ambas, existe em boa quantidade e diversidade,
mas é pouco utilizado pelas profissionais apesar de todas terem acesso aos
mesmos.
Outro aspecto bastante citado foi a dispersão das crianças. Durante as
observações percebemos que as crianças concentram-se na atividade, ainda que
por período mínimo. Na rotina da sala existe um espaço de tempo destinado às
atividades pedagógicas, variando entre uma hora a uma hora e trinta minutos, tanto
no período da manhã quanto no período da tarde, onde geralmente é desenvolvida
apenas uma atividade, não levando em consideração o pouco tempo de
concentração das crianças e esperando-se que elas permaneçam atentas ao que foi
proposto durante todo o tempo. Talvez temporalidade em sala de aula possa estar
sendo mal administrada.
Embora tenha sido pouco citada, a dificuldade ou falta do planejamento
aparece também como empecilho à mediação do brincar. Ressalta-se que nesta
questão, ao responderam o questionário sobre outras dificuldades, nenhuma das
educadoras reconheceu ter dificuldades pessoais.
Além dos obstáculos citados pelas educadoras, existe ainda outro fator que
pode inibir a utilização do brincar no dia a dia na sala de aula: a própria formação
dessas educadoras. Como podemos verificar no Gráfico 2, no processo formativo da
maioria das participantes, de acordo com seus depoimentos, não houve ênfase
sobre a relevância do brincar.
16
59%33%
8% Não existiu
Existiu em parte
Existiu
Gráfico 2 - Relevância do brincar na formação
Possivelmente, se os cursos de formação na área de educação,
especialmente na área de educação infantil, introduzissem em seus currículos
disciplinas que enfatizassem o brincar, os profissionais poderiam:
(...) compreender o objetivo do brincar, percebendo como ele se manifesta nas diversas faixas etárias, a partir das contribuições teóricas e do ponto de vista conceitual, histórico-cultural e educativo, como recurso de construção da identidade de cada ser humano, de autoconhecimento e como elemento potencializador do trabalho educativo. (MALUF, 2007, p.12)
Portanto, pensar em uma prática educativa permeada pelo uso do brincar
implica em uma formação onde o lúdico seja um tema ressaltado em vários
momentos do curso, associando o que se aprende ao que se aplica.
Como pode um profissional ser mediador de algo sem ter conhecimento
sobre? O processo de formação de um especialista pode ser decisivo para o
desenvolvimento de um bom trabalho em seu campo de atuação. Esse processo
pode ser pautado na práxis, demonstrando uma estreita relação entre teoria e
prática.
A defasagem que parece existir na formação das educadoras com relação ao
brincar, talvez pudesse ser amenizada através de capacitações específicas
ofertadas pelo município. Esta oportunidade existiu para apenas 50% das
participantes, sendo estas a professora da rede e as ADI`s, enquanto que as
estagiárias, que compõem os outros 50%, não tiveram essa oportunidade durante o
tempo em que estão na função.
Quando questionadas a respeito de temas importantes a serem abordados
sobre o brincar, as sugestões das partícipes parecem ter ligação direta com as
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dificuldades encontradas pelas educadoras na mediação do brincar, o que é
retratado no Quadro 4:
Sugestão de conteúdos para curso sobre o brincar: Nº % Brincadeiras direcionadas para o grupo 1 4 28,57 Brincar e desenvolvimento 2 14,29 Relevância do brincar para a Educação Infantil 2 14,29 Sem sugestão 2 14,29 Brincadeira e ensino 1 7,14 Brincadeiras específicas para cada idade 1 7,14 Planejar e executar atividades contendo o brincar 1 7,14 Por que as crianças gostam de brincar? 1 7,14 TOTAL: 14 100
Quadro 4 - Sugestões dos participantes de conteúdos para cu rsos sobre o brincar
O alto percentual de sugestões que englobam brincadeiras direcionadas para
o Grupo Infantil 1 pode indicar uma necessidade das educadoras em planejar e
executar atividades que possam ser adequadas para a faixa etária das crianças com
as quais elas convivem diariamente.
A análise do Quadro 4 torna perceptível que a maioria das respostas, de certa
forma, está diretamente ligada à relação entre o brincar, a criança e a educação, o
que pode indicar algum interesse por parte das educadoras em se aprofundarem no
tema para utilizá-lo da forma mais adequada no exercício da sua função.
Diante da discussão dos dados coletados, verifica-se que os objetivos
específicos foram contemplados, pois, através dos questionários aplicados foi
possível realizar um levantamento acerca dos conhecimentos das educadoras no
ambiente de Grupo Infantil 1; a respeito do valor pedagógico do brincar, também foi
constatado que este não faz parte do planejamento pedagógico das participantes da
pesquisa.
A partir da comparação das respostas dos questionários com as observações
realizadas em sala de aula, verificou-se a existência de desarticulação entre a teoria
(discurso apresentado pelas educadoras) e a prática em relação ao brincar nas
instituições pesquisadas. Em suas repostas depreende-se que conhecem e
reconhecem a importância do brincar, do ponto de vista teórico, mas não
manifestam atitudes ou verbalizações que indiquem competência para utilizá-lo com
intencionalidade pedagógica.
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Os dados colhidos durante o estudo confirmaram as hipóteses inicialmente
levantadas neste trabalho. A visualização do Gráfico 1, onde 84% das educadoras
afirmam que, geralmente, não planejam as atividades que são desenvolvidas, deixa
claro que, nas turmas de Grupo Infantil 1 das creches municipais pesquisadas, o
brincar é desenvolvido de forma aleatória, sem planejamento pedagógico. Nas
observações realizadas, como já foi exposto, pôde-se perceber que as brincadeiras
desenvolvidas por essas educadoras, na maioria das vezes, são utilizadas para
preencher o tempo vago e não com o intuito de favorecer o desenvolvimento e a
aprendizagem da criança.
Desta forma as oportunidades que podem potencializar os aspectos
cognitivos e afetivos propiciados pelo brincar, seja como atividade simbólica
representativa ou como forma de internalizar a realidade, ficam desperdiçadas.
Perdem-se, também, com isso, as chances de se trabalhar os aspectos afetivos que
a relação entre pares e entre adultos e crianças pode proporcionar, relegando a
possibilidade de se trabalhar a formação moral que as atividades compartilhadas,
cooperadas podem fomentar, tanto entre crianças quanto entre adultos. Caso estes
profissionais debatessem o assunto entre si, num processo dialético, por certo
avançariam nas idéias e fazeres.
5 CONCLUSÃO
Quando surgiu o interesse na investigação sobre o brincar, pensamos em
algo prático e real, que pudesse ser confrontado com as teorias existentes na área.
Embora, em nossa formação (autoras) tenha havido ênfase sobre o brincar das
crianças, no dia a dia do nosso trabalho, não nos parecia que procedimento
semelhante houvesse acontecido no processo formativo de parte dos profissionais
que atuam na educação infantil, no contexto estudado, de modo que esta atividade
não recebia a atenção devida quando de seu planejamento ou operacionalização.
Assim, buscou-se saber se existia orientação com intencionalidade
pedagógica quando as educadoras, no ambiente de Grupo Infantil 1 em creche
pública, observavam ou brincavam com as crianças. A partir dos dados obtidos,
constatamos que as educadoras demonstram conhecer o valor pedagógico do
brincar na teoria, mas isto não é colocado em prática.
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Essa situação ocorre por diversos fatores, alguns citados pelas próprias
participantes da pesquisa, dentre eles: a formação do educador; o desconhecimento
de atividades específicas para brincar com crianças desta faixa etária (identificados
pela sugestão de cursos sobre brincadeiras no questionário); o planejamento (ou a
falta dele); as más condições dos brinquedos e ainda a falta de interesse por parte
de algumas profissionais, nos momentos em que as crianças estão brincando.
Ao término dessa pesquisa verifica-se a contemplação dos objetivos, pois, por
meio das observações e dos questionários aplicados, conseguiu-se levantar os
conhecimentos das participantes a respeito do valor pedagógico do brincar e
constatar que ele não faz parte do planejamento de aula das mesmas. Há fortes
indícios de desarticulação entre o conhecimento teórico anunciado pelas
pesquisadas e sua aplicação na prática pedagógica.
Além disso, percebeu-se que há indicadores suficientes para demonstrar a
existência de lacunas na formação dos profissionais da educação infantil, no que diz
respeito ao brincar, o que pode estar se refletindo nos aspectos práticos do fazer
pedagógico, no espaço educacional, uma vez que nas respostas registradas nos
questionários, as educadoras demonstraram que reconhecem o valor pedagógico do
brincar como instrumento de aprendizagem e estimulador do desenvolvimento das
crianças, porém não lhe dedicam espaço de relevância, nem no planejamento nem
no cotidiano. Isto parece ocorrer tanto por dificuldades externas às educadoras
quanto por dificuldades internas, como desmotivação, desinteresse e falta de
compromisso das mesmas em buscar extrair o melhor no trabalho desenvolvido com
as crianças.
Portanto, a pesquisa demonstrou que a maioria das participantes, geralmente,
não inclui o brincar com intencionalidade pedagógica em sua prática docente,
mesmo porque nem o próprio planejamento está presente no seu cotidiano
profissional e, por diversas vezes, atividades relacionadas ao brincar são repetidas
em dias e horários diferentes. Isto talvez contribua para que os momentos lúdicos
aconteçam de forma despercebida por parte de quem, em tese, deveria aproveitar a
riqueza simbólica e desenvolvimental do brincar, porque provavelmente ainda não
tenha reconhecido o seu devido mérito.
No contexto das creches estudadas, pessoas que trabalham na área parecem
considerar a brincadeira livre como o período de tempo em que as crianças brincam
de forma espontânea, não sendo necessária sua intervenção, por não envolver,
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formalmente, nenhuma aprendizagem de conteúdos. Dessa forma, enquanto os
educandos brincam, as educadoras mantêm-se distraídas em outras atividades que
não possuem caráter pedagógico, denotando, assim, falta de compromisso com as
crianças e com elas próprias.
Acreditamos que a introdução do brincar na rotina de atividades de uma
creche possa possibilitar às crianças um desenvolvimento pleno e prazeroso,
enquanto seres humanos, além de contribuir para a melhoria na qualidade da
educação pública oferecida nestes espaços, principalmente, por auxiliar no processo
de ensino e aprendizagem.
Espera-se que este trabalho de conclusão de curso possa acrescentar
subsídios à discussão sobre o brincar, uma vez que se baseia não apenas na teoria,
mas também na prática cotidiana do mesmo, contribuindo para que outros
educadores ampliem o olhar sobre esta atividade humana e que a percebam como
um importante meio de desenvolvimento cognitivo, social e afetivo.
A questão da formação dos educadores poderia ser aprofundada através de
uma outra pesquisa que abordasse o currículo dos cursos de formação de
profissionais da educação e da relação existente entre o que é ensinado a esses
profissionais e o que eles vivenciam em seu dia a dia no espaço educacional.
Seria proveitoso buscar meios para despertar a conscientização das
educadoras sobre a questão atitudinal e a importância do compromisso pessoal com
o ofício que desempenham, além de se pensar na ampliação de ocasiões para
discussão e socialização do brincar entre profissionais de educação, dentro das
próprias instituições educacionais, como forma de preencher, mesmo parcialmente,
estas lacunas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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