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O BRock. O BRock, sigla criada pelo jornalista Arthur Dapieve para designar o período em que o rock brasileiro se consolida e adquire visibilidade: os anos 1980. O BRock está associado a uma parcela da juventude, que desponta do meio cultural, no contexto da transição para a democracia aos primeiros anos da Nova República. Segundo Paul Friendlander, os primeiros marcos identificáveis e divisórios da história do rock internacional são: primeiro, 1954-1955, com a explosão do rock and roll clássico; segundo, 1963-1964, a invasão inglesa; terceiro, 1967-1972, conhecido como a era de ouro (o amaduramento sincrônico de artistas de vários gêneros, incluindo a primeira invasão inglesa e a ascensão dos reis da guitarra); quarto 1968-1969, com a explosão hard rock; e quinto, 1975-1977, com a explosão punk. Em parte, a grande influência vem do movimento punk anglo- americano e suas derivações surgidas em meados dos anos 1970, denominadas pós-punk ou new wave. O movimento exerceu grande influência sobre os jovens da geração de 1980, pois propõe a composição de uma música por acordes simples, sem a necessidade de grandes aparatos e virtuosismo, característicos do rock progressivo. O punk trouxe as questões do cotidiano social em suas letras carregadas de crítica à opressão do capitalismo. Nos Estados Unidos, a história do punk começou com Iggy Pop, artista que chocava a crítica por conta de suas aparições marcantes. As letras falavam sobre a vida nas ruas, ligada às experiências dos jovens. O som era barulhento e sem aprimoramento técnico, por isso muitos grupos tiveram um breve percurso de existência. Os Ramones, grupo estadunidense, influenciou as bandas que surgiram depois e tornou-se uma referência para o gênero. Na Inglaterra, de meados a final dos anos 1970, num outro cenário econômico, o desemprego e a falta de esperança desencadearam o movimento, o punk inglês, exemplificado aqui pelo grupo Sex Pistols, que expunham em suas canções a insatisfação entre os jovens. O grupo compunha com apenas três acordes e os fãs, em sua maioria jovens moradores da periferia, tinham a possibilidade de fazer suas próprias músicas e formarem novos grupos de rock. Apesar das dificuldades na divulgação, surge no cenário no ano de 1977.

O BRock

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O BRock.

O BRock, sigla criada pelo jornalista Arthur Dapieve para designar o período em que o rock brasileiro se consolida e adquire visibilidade: os anos 1980. O BRock está associado a uma parcela da juventude, que desponta do meio cultural, no contexto da transição para a democracia aos primeiros anos da Nova República.

Segundo Paul Friendlander, os primeiros marcos identificáveis e divisórios da história do rock internacional são: primeiro, 1954-1955, com a explosão do rock and roll clássico; segundo, 1963-1964, a invasão inglesa; terceiro, 1967-1972, conhecido como a era de ouro (o amaduramento sincrônico de artistas de vários gêneros, incluindo a primeira invasão inglesa e a ascensão dos reis da guitarra); quarto 1968-1969, com a explosão hard rock; e quinto, 1975-1977, com a explosão punk.

Em parte, a grande influência vem do movimento punk anglo-americano e suas derivações surgidas em meados dos anos 1970, denominadas pós-punk ou new wave. O movimento exerceu grande influência sobre os jovens da geração de 1980, pois propõe a composição de uma música por acordes simples, sem a necessidade de grandes aparatos e virtuosismo, característicos do rock progressivo. O punk trouxe as questões do cotidiano social em suas letras carregadas de crítica à opressão do capitalismo.

Nos Estados Unidos, a história do punk começou com Iggy Pop, artista que chocava a crítica por conta de suas aparições marcantes. As letras falavam sobre a vida nas ruas, ligada às experiências dos jovens. O som era barulhento e sem aprimoramento técnico, por isso muitos grupos tiveram um breve percurso de existência. Os Ramones, grupo estadunidense, influenciou as bandas que surgiram depois e tornou-se uma referência para o gênero.

Na Inglaterra, de meados a final dos anos 1970, num outro cenário econômico, o desemprego e a falta de esperança desencadearam o movimento, o punk inglês, exemplificado aqui pelo grupo Sex Pistols, que expunham em suas canções a insatisfação entre os jovens. O grupo compunha com apenas três acordes e os fãs, em sua maioria jovens moradores da periferia, tinham a possibilidade de fazer suas próprias músicas e formarem novos grupos de rock. Apesar das dificuldades na divulgação, surge no cenário no ano de 1977.

Tanto nos EUA quanto na Inglaterra, a música punk surge como uma reação ao estrelismo do rock progressivo dos anos de 1970: uma música que faz sentido para os jovens e suas experiências reais.

O movimento punk brasileiro surgiu no final da década de 1970 e início de 1980 dos subúrbios de São Paulo e posteriormente Rio de Janeiro. Tanto punk paulista quanto os cariocas tratavam de temáticas sócias criticando o modelo político de sua época, em destaque o imperialismo do presidente estadunidense Ronald Reagan. No Brasil, o movimento primeiro repercutiu no segmento social no qual nascera na Inglaterra: no proletário, a crise econômica e os índices de desemprego atingem duramente os jovens proletários que, ao saírem do ciclo básico, não encontram emprego. Assim, transforma-se num “movimento de revolta adolescente” de “uma geração que, insatisfeita com tudo, invoca o espírito da mudança.

A partir dos anos 1980, mais precisamente 1982, a imprensa começa a divulgar o movimento punk. Neste período os grupos punks existentes já tinham conquistado um público fiel, códigos próprios, letras e roupas. Nessa época, existiam mais de 20 bandas na periferia de São Paulo, várias outras no Rio e em Brasília. É a partir desse

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período que alguns grupos, como “Inocentes”, “Cólera”, “Ratos de Porão”, “Olho Seco”, dentre outros, conseguem gravar seus primeiros discos.

Segundo o jornalista Dapieve, uma das caraterísticas mais importantes do BRock eram as letras em português, isso é uma característica importante, não que houvesse letras de rock português antes, mas era como se o rock só pudesse ser cantado em inglês. O instrumental tosco, a princípio como proposta estética mesmo, derivada do punk. E num segundo momento, como realidade de quem estava tocando. Com o tempo as pessoas foram melhorando. Todos estavam começando, aprendendo a tocar.

O BRock, realizado e consumido por jovens, estabelece uma relação de percepção de mundo, no processo de transição política pelo qual o pais atravessava. Grupos que desfrutavam do bom humor, em tempos tão rígidos, esboçava o rock que estava surgindo. Estes jovens começam a ingressar na vida pública por seus próprios meios de expressão, sendo um deles, o fazer e ouvir rock. No início, formar uma banda era apenas uma forma de diversão, porem os grupos formados amadurecendo ao longo da década, como músicos profissionais.

Uma parte deste BRock, influenciado pelo “faça você mesmo” do punk-rock, sinalizava uma forma de expressão artística e original, simbolizado a quebra entre um modelo de repressão aos meios fonográficos e a livre expressão. Em seu processo, o jovem BRock logo foi alvo de críticas, que se posicionavam de maneiras diferentes. Durante os primeiros anos da década de 1980, registram-se nos jornais brasileiros as críticas de jornalistas, que não viam o rock como um movimento positivo, tendo-o como produto auge do processo de americanização da cultura brasileira.

Musicas

A composição das letras se fez no período de abertura política. O conteúdo transgressor, nesta nova abordagem do rock, é percebido partir de temas polêmicos como sexo, drogas e violência.

A letra “Será”, letra de Renato Russo de Legião Urbana expressa essa inquietação a qualquer forma de dominação.

A letra “Geração Coca-Cola”, letra de Renato Russo de Legião Urbana, na qual, de certa forma, imprimiu a imagem da juventude do período, mostrando a contradição da sociedade que, durante os anos de repressão, mantinha os mios de informação e formação dos jovens fechados ao mesmo tempo em que lhes exigia um determinado posicionamento político.

O Distrito Federal, conhecido como uma cidade sem entretenimento, fazia com que o sonho da maioria dos adolescentes fosse montar uma banda para tocar nos círculos alternativos, a letra de “Tedio”, letra de Renato Russo de Legião Urbana, marca o vazio e a falta de opção para o jovem na cidade.

Sem opção de lazer e de um espaço para a juventude, poucos bares e nenhuma boate, as festas improvisadas era o único lugar onde se podia dançar. Mas havia sempre a possibilidade de serem invadidas pela polícia. Uma das mais famosas ficou conhecida como “Rockonha”, a maioria dos jovens que frequentava era menor de idade, o nome “Rockonha”, rock o maconha, explicita a intenção dos participantes. A música “Veraneio Vascaína”, letra de Renato Russo, gravada posteriormente pela banda Capital Inicial foi inspirada neste episódio.

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A crítica ás instituições repressora, que sustentavam o sistema na realidade urbana, é um dos temas centrais da banda Plebe Rude, que aborda a cidade de Brasília, explorando indícios de violência e abandono em suas representações.

A violência é representada como um dado quase indissociável à vida das metrópoles. A convivência com o medo, pelo aumento da violência urbana, traz consequências negativas para o indivíduo. Estes elementos permeiam o cotidiano destes jovens roqueiros e aparecem em letras como “Musica Urbana 2”, letra de Renato Russo de Legião Urbana.

A polícia representou uma ameaça constante e uma fonte potencial de humilhações. Os jovens criticavam a ação policial e faziam das canções a sua própria linguagem. Os jovens da banda Titãs, na letra da canção “Polícia”, letra de Tony Belloto, traduzem a aversão à suposta proteção oferecida. Outro exemplo desta temática está registrado na letra de “Patrulha Noturna”, letra de Herbert Vianna dos Paralamas do Sucesso.

A banda Titãs descreve a violência, como ato do cidadão comum, mas que poderia ser evitado, descrito na canção “Violência”, letra de Sérgio Britto e Charles Gavin.

A vida transgressora destes artistas foi marcada pela presença das drogas, não apenas as ilícitas, como maconha e cocaína, mas também aquelas socialmente aceitadas, como o álcool e o cigarro. As festas estavam associadas ao uso delas, e tal prática, a princípio, parecia propiciar a vitalidade e emoção para alguns jovens. A canção “Diversão”, letra de Sérgio Britto e Nando Reis dos Titãs mostra isso. No Brasil, durante a transição política da década de 1980, as letras que traziam referência as drogas eram proibidas. A letra de “Conexão Amazônica”, letra de Renato Russo, por conta de esta temática, ficou proibida pela censura ate 1987.

No movimento urbano do Rio de Janeiro, a linguagem coloquial inteiramente voltada pra situações banais do “cotidiano dos jovens cariocas”, como as referências a botecos, namoros, “chopes e batatas fritas”, é caraterística das letras da banda Blitz. A letra “Você não soube me amar”, letra de Evandro Mesquina, trazia a novidade do canto falado e a narrativa sobre o passeio de um casal.

Os Paralamas do Sucesso registram seus primeiros ensaios numa atmosfera de família atípica, visto que os ensaios erram incentivados pela avó de Bi Ribeiro, a letra “Vovó Ondina”, letra de Helbert Vianna, uma homenagem à avó de Bi Ribeiro.

Atitudes desafiadoras que ansiavam pela liberdade da vida doméstica e o universo escolar estavam presentes nas composições. As letras traçam episódios da vida adolescente, nos quais o comportamento empunha uma vontade própria. A letra “Autonomia”, letra de Marcelo Fromer, Armando Antunes e Paulo Miklos, dos Titãs descreve esses episódios.

Como já visto, a geração que cresceu nesta circunstancias foi educada num momento de desarticulação política, desconhecendo o que se passava no pais. A escola é alvo de críticas na imagem do adolescente indisciplinado, que foge às regras impostas. Expressado na letra de “Química” de Renato Russo, gravada pelos Paralamas do Sucesso.

O Estado de rejeição à vida doméstica rotineira é mapeado também na canção dos Titãs intitulada “Família”, letra de Tony Belloto e Arnaldo Antunes. Considerada conservadora, a instituição não desfruta de reconhecimento na autoconstrução da maturidade do jovem.

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Na relação com a religião, o processo de recusa volta a ser identificada. A linha de conduta adotada pela instituição religiosa divergia dos valores almejados pelos jovens letristas. A canção “Igreja”, letra de Tony Belloto e Armando Antunes dos Titãs expressa essa ideia.

Nas letras, a busca por uma forma de viver de maneira autentica demostra certa autonomia e autoconfiança, diante das dificuldades impostas pela vida. A percepção da dinâmica do tempo, a intenção de superar os próprios limites é evidenciada na letra de “Tempo Perdido”, letra de Renato Russo de Legião Urbana. Desfrutar da juventude significa traçar perspectivas no futuro, sem desperdiçar o tempo presente.

Uma música que ganho cunho político foi “Pro dia nascer feliz”, letra de Cazuza e Fregat, de Barão Vermelho. No mesmo dia das eleições diretas para presidente, durante o “Rock in Rio”, Cazuza a contou em comemoração à eleição de Tancredo Neves, o novo presidente da República. A canção, entoada por 30 mil pessoas, perdeu no episódio caráter erótico e passou a ter um novo significado.

Mas cedo ou mais tarde nos tornamos naquilo o que Tyler queria.