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125 O Impacto do Tempo de Pendência das Patentes na Trajetória de Crescimento: Uma Análise com Base no Modelo Schumpeteriano de Crescimento Endógeno com Avanço de Qualidade Fábio Rodrigues de Moura * , Nelson Leitão Paes , Tácito Augusto Farias Conteúdo: 1. Introdução; 2. O Modelo Econômico; 3. Calibração e Análise dos Resultados; 4. Considerações Finais. Palavras-chave: Patentes, Tempo de Pendência, Crescimento Endógeno, Modelo Schumpeteriano. Códigos JEL: O31 O34 O43. O objetivo deste trabalho é analisar o impacto do tempo de pendência das patentes sobre a trajetória de crescimento equilibrado da economia. Trabalhamos com a hipótese de que o tempo de pendência representa um período de incerteza para os agentes inovativos, o que afeta os esforços de P&D. Para operacionalizar nossas hipóteses utilizamos o modelo schumpeteriano de crescimento endógeno com avanço de qualidade, baseado em Grossman e Helpman (1991a,b) e Aghion e Howitt (1992). Nossos resultados mostram que o tempo de pendência tem um impacto negativo sobre o crescimento e o bem-estar da economia, de forma que períodos mais longos de espera pela decisão da patente geram uma maior perda em termos de crescimento. Isto sugere a necessidade de políticas que visem a reduzir, de forma eficiente, o tempo de exame das patentes. This study aims to analyze the impact of the patent pendency time on the Balanced Growth Path (BGP). We assume that during the pendency time the innovative agents face an uncertainty period, which affects the R&D efforts. To operate our assumptions we use the schumpeterian endogenous * Doutorando em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo (ESALQ/USP). E-mail: [email protected] Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia (PIMES) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: [email protected] Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS). E-mail: [email protected] RBE Rio de Janeiro v. 68 n. 1 / p. 125–145 Jan-Mar 2014

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O Impacto do Tempo de Pendência dasPatentes na Trajetória de Crescimento:Uma Análise com Base no ModeloSchumpeteriano de CrescimentoEndógeno com Avanço de Qualidade

Fábio Rodrigues de Moura∗, Nelson Leitão Paes†, Tácito AugustoFarias‡

Conteúdo: 1. Introdução; 2. O Modelo Econômico; 3. Calibração e Análise dos Resultados;4. Considerações Finais.

Palavras-chave: Patentes, Tempo de Pendência, Crescimento Endógeno, Modelo Schumpeteriano.

Códigos JEL: O31 O34 O43.

O objetivo deste trabalho é analisar o impacto do tempo de

pendência das patentes sobre a trajetória de crescimento equilibrado da

economia. Trabalhamos com a hipótese de que o tempo de pendência

representa um período de incerteza para os agentes inovativos, o

que afeta os esforços de P&D. Para operacionalizar nossas hipóteses

utilizamos o modelo schumpeteriano de crescimento endógeno com

avanço de qualidade, baseado em Grossman e Helpman (1991a,b) e

Aghion e Howitt (1992). Nossos resultados mostram que o tempo de

pendência tem um impacto negativo sobre o crescimento e o bem-estar

da economia, de forma que períodos mais longos de espera pela

decisão da patente geram uma maior perda em termos de crescimento.

Isto sugere a necessidade de políticas que visem a reduzir, de forma

eficiente, o tempo de exame das patentes.

This study aims to analyze the impact of the patent pendency time on

the Balanced Growth Path (BGP). We assume that during the pendency time

the innovative agents face an uncertainty period, which affects the R&D

efforts. To operate our assumptions we use the schumpeterian endogenous

∗Doutorando em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo (ESALQ/USP). E-mail: [email protected]†Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia (PIMES) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail:[email protected]‡Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de Sergipe (UFS). E-mail: [email protected]

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Fábio Rodrigues de Moura, Nelson Leitão Paes e Tácito Augusto Farias

growth model based in Grossman e Helpman (1991a,b) and Aghion e Howitt

(1992). Our results show that the pendency time has a negative impact on

growth and welfare, so that a longer delay for the patent decision increases

the growth loss. This suggests the implementation of policies to reduce

efficiently the patent examination time.

1. INTRODUÇÃO

A literatura sobre crescimento econômico amplamente reconhece que o fluxo de inovaçõestecnológicas é uma das principais fontes de crescimento persistente no longo prazo. O progressotecnológico endógeno é gerado através da aplicação do conhecimento, dado este ser um bem diferentedos demais devido a sua capacidade de apresentar produtividade marginal não decrescente Romer(1986). Entretanto, os avanços tecnológicos estão fortemente ligados aos incentivos econômicos.Conforme atestam Grossman e Helpman (1994), em geral os indivíduos investem recursos na produçãode novas tecnologias quando visualizam a oportunidade de obter um retorno significativo com suascriações. A lucratividade oriunda de uma invenção, por sua vez, depende do ambiente institucional,legal e econômico da sociedade. Juntos, estes ambientes determinam o chamado sistema depropriedade intelectual, que afeta fortemente o ritmo e a direção do progresso tecnológico.

A patente é o principal mecanismo que garante os direitos de propriedade intelectual a um agenteinovador. Uma patente confere ao seu detentor um direito de propriedade sobre um produto ou processodurante um determinado número de anos, traduzindo-se em um instrumento de recompensa pelaatividade inventiva. A proteção através de patentes justifica-se, dentre outros motivos, pelo fato deque os custos da descoberta são bem mais altos se comparados aos custos da imitação (Helpman, 1993).Se uma criação puder ser rapidamente imitada, o retorno econômico do inventor é reduzido, o que geraum desincentivo ao investimento em pesquisa. A patente permite ao inventor, na forma de um poderde monopólio, se apropriar de um benefício econômico exclusivo, em virtude de sua contribuição aoestoque tecnológico da sociedade, o que contribui para evitar sub-investimentos na atividade inventiva.

A literatura recente que analisa o crescimento endógeno foi desenvolvida supondo-se um ambienteinstitucional onde os direitos de propriedade intelectual são bem estabelecidos. Em Romer (1990),Grossman e Helpman (1991a,b), Aghion e Howitt (1992), Kortum (1997), Aghion et alii (2001) e Aghionet alii (2005) há uma forte conexão entre a atividade inventiva e o estabelecimento do poder demonopólio. Nestes modelos os novos bens e as novas tecnologias são introduzidos no mercado graças àbusca dos inventores por oportunidades de lucro. Tais oportunidades surgem ao se obter uma patenteque garante o direito de monopólio sobre as invenções.

Entretanto, os modelos de crescimento costumam abstrair um importante aspecto do sistema depropriedade intelectual: o tempo de espera pela decisão da patente. Geralmente trabalha-se com ahipótese de que uma patente é instantaneamente concedida no momento em que um novo produtoé criado, o que permite aos inventores extrair os lucros do monopólio a partir do instante em quedesenvolvem com sucesso um novo design.

Na prática, o inventor que deseja receber uma patente pela sua criação deve requisitá-la junto aum escritório de patentes, instituição responsável por analisar e conceder uma patente ao produtocaso cumpra com os pré-requisitos legais de inovação e atividade inventiva. O processo de examedo pedido de patente consome um período de tempo, denominado tempo de pendência, que englobadesde o depósito do pedido até a decisão final, e que pode vir a ser bastante considerável a dependerda operacionalização e estrutura do escritório de patentes em cada país. Ao final do ano de 2011,por exemplo, o United States Patent and Trademark Office (USPTO), o escritório de patentes dos EstadosUnidos, decidia sobre os pedidos de patente em um tempo médio de 2,8 anos. Já o Instituto Nacionalde Propriedade Industrial (INPI), órgão responsável pela concessão das patentes no Brasil, divulgou noinício de 2012 que o tempo médio de espera foi reduzido de 8,3 anos em 2010 para 5,4 anos em 2011.

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Isto representou, em apenas um ano, uma redução significativa de 35% no tempo médio de espera peladecisão das patentes no Brasil. Ainda assim, a diferença entre o tempo médio de pendência no Brasil enos Estados Unidos era de quase 93% na época.

O tempo gasto pelos escritórios de patentes para analisar e decidir quanto à concessão do direitolegal de monopólio pode influenciar significativamente no montante destinado e no tipo de pesquisarealizada pelos agentes econômicos. Primeiramente, cada ano adicional de espera reduz o tempo de vidaefetivo da patente, tendo em vista que esta é um título de propriedade temporária e, em geral, o tempode duração da patente é contado a partir da data de depósito do pedido e não da data de concessão.Ademais, durante o tempo de espera pelo resultado da patente o inventor tem apenas uma expectativade direito de monopólio. Este direito somente se confirma no momento da decisão, caso o escritóriode patentes entenda que o produto atende aos pré-requisitos legais de patentabilidade. E embora alegislação que regulamenta a concessão de patentes permita ao inventor requisitar indenização porperdas e danos caso o seu produto venha a ser imitado durante o período de pendência, esse direitosó pode ser exercido se a patente vier de fato a ser concedida. Em países onde o tempo de espera peladecisão da patente é curto essa proteção pode se mostrar bastante efetiva. Por outro lado, em paísescomo o Brasil, onde o tempo de espera pela decisão da patente ainda é relativamente longo, há umaumento no nível de incerteza enfrentado pelo agentes criadores de tecnologia.

Há dois potenciais riscos envolvidos caso um agente deseje fornecer a sua tecnologia ao mercadoantes de se obter uma patente. Uma empresa pode pagar royalties ao inventor pelo uso de um produtoque, após o período de pendência, pode vir a ser constatado como já pertencente ao domínio público,situação na qual a patente é negada e o direito de exclusividade não se confirma. Há também o riscode um agente concorrente não aceitar a expectativa de direito e copiar o produto durante o tempo deexame. Neste caso, o agente poderá ser processado por perdas e danos se a patente vier a ser concedida.Mas se o tempo de julgamento da patente for longo a incerteza de todos os agentes envolvidos se eleva.Por conseguinte, isto torna pouco atrativo o aproveitamento da tecnologia candidata à patente. Aincerteza sobre os direitos de propriedade pode forçar os inventores a reter a sua tecnologia, em termosde produção e licenciamento, enquanto o resultado da patente não for conhecido.

Em particular, há dois importantes estudos que buscam estimar o impacto do tempo de pendênciasobre o valor da patente. Um deles, realizado pela consultoria London Economics a pedido do escritóriode patentes do Reino Unido, estimou que um ano adicional de pendência gera um custo de 6 bilhõesde libras por ano na forma de perda de inovações (London Economics, 2010). Este custo foi estimadocom base nos dados disponíveis para os escritórios dos Estados Unidos, da Europa e do Japão, e sob ahipótese de que um aumento do tempo de espera reduz o período no qual o agente pode se beneficiarda proteção patentária, o que consequentemente reduz o valor da patente e a quantidade de pedidosaplicados. O estudo conclui que o custo do aumento da pendência é significativo e acaba por reduzir osincentivos à inovação e o bem-estar.

Outro estudo realizado pelo USPTO buscou estimar os ganhos monetários advindos de uma reduçãono tempo médio de pendência do órgão, que seria possível através de uma mudança na política deencargos cobrados sobre as patentes. O novo esquema proposto prevê um decréscimo de 12 mesesno tempo médio de pendência ao longo do período 2013-2017, o que resultaria em um ganho totalpara os requisitantes domésticos de patentes e para a sociedade de aproximadamente 7,7 bilhões dedólares ao fim de 2017 (UNITED STATES PATENT AND TRADEMARK OFFICE, 2012). Para os requisitantesestrangeiros o ganho total estimado é de 8,7 bilhões de dólares ao longo dos cinco anos. Estes valoresforam calculados considerando-se o aumento gerado no valor privado das patentes devido à reduçãodo tempo de pendência. Ademais, o estudo faz uma importante relação entre o tempo de pendência,os incentivos à inovação e o crescimento econômico, ao afirmar que a redução no tempo de espera“significantly reduces uncertainty regarding the scope of patent rights, which fosters innovation and has apositive effect on economic growth” (UNITED STATES PATENT AND TRADEMARK OFFICE, 2012, p. 40).

Sob a hipótese de que a espera pelo resultado da patente influencia na formação das expectativasdos inventores, o presente trabalho tem por objetivo analisar o impacto do tempo de pendência sobre

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o crescimento de longo prazo da economia. Para tanto, consideramos um ambiente de equilíbrio geraldinâmico baseado no modelo schumpeteriano de crescimento endógeno com avanço de qualidade,desenvolvido originalmente por Grossman e Helpman (1991a,b) e Aghion e Howitt (1992). O processocompetitivo entre os agentes inovadores e a mudança tecnológica descrita pelo modelo schumpeterianoconstitui um importante avanço sobre o arcabouço teórico proposto pelo modelo de variedades deRomer (1990). O progresso tecnológico via inovação vertical (o avanço da qualidade dos bens jáexistentes), o efeito de captura dos lucros de monopólio (o efeito business-stealing, ou a “destruiçãocriativa”) e a endogeneização da taxa de ocorrência das novas tecnologias são exemplos dos aspectospresentes no modelo schumpeteriano que permitem analisar com uma maior acuidade questõesrelacionadas aos direitos de propriedade, à organização industrial, às instituições e às políticas deincentivo à inovação, se comparado ao modelo de Paul Romer.

Nossos resultados mostram que há uma relação negativa entre o crescimento e o tempo médio dependência das patentes, de forma que períodos mais longos de espera geram uma perda social na formade redução no consumo, no processo de inovação e no crescimento. Ao calibrar o modelo com os dadosda economia brasileira para o ano de 2011 avaliamos que uma redução no tempo médio de pendência de5,4 para 2,8 anos, considerando o tempo médio dos EUA como benchmark, elevaria a taxa de crescimentode longo prazo em 0,101 pontos percentuais, reduziria o tempo de surgimento de novas tecnologias de8,02 para 7,24 anos e promoveria um ganho de bem-estar de 1,63% na forma de aumento do consumo.Estes resultados contribuem para a discussão sobre o impacto da pendência das patentes, e como umaredução eficiente no tempo de espera pode elevar o crescimento da economia.

Quanto à estrutura, este artigo é composto por mais três seções. Na segunda seção apresentamosas hipóteses e desenvolvemos o modelo schumpeteriano. A terceira seção destina-se à análise dosresultados, onde calibramos o modelo e comparamos o equilíbrio descentralizado com a solução doplanejador social. A última seção traz as considerações finais e em seguida temos as referênciasbibliográficas.

2. O MODELO ECONÔMICO

Há três classes de agentes na nossa economia: os produtores do bem final, os inventores eas famílias. Para se gerar o produto final os produtores utilizam, além do trabalho, os insumosintermediários ofertados pelo setor de P&D. A quantidade de bens intermediários é fixa, e o progressotecnológico emerge na forma de avanços na qualidade de cada um dos intermediários existentes. Osbens intermediários de diferentes qualidades são substitutos perfeitos entre si, isto é, estamos em umambiente de inovações drásticas (Aghion e Howitt, 1992). Os produtores do bem final demandam apenasa versão de maior qualidade de cada intermediário, o que incentiva os inventores a investir seus recursosvisando evoluir a tecnologia e assim tornarem-se os únicos ofertantes do bem no mercado. No entanto,para se exercer o direito de monopólio sobre uma invenção é necessário obter uma patente junto aoescritório de patentes da economia. Como as patentes somente são concedidas após um tempo tomadocomo aleatório pelos pesquisadores, gera-se uma incerteza quanto à data a partir da qual o inventorpoderá extrair seu lucro de monopólio, o que influencia na formação das expectativas do setor de P&D.Por fim, temos as famílias, que ofertam trabalho e buscam maximizar sua utilidade ao longo de umhorizonte temporal infinito, sujeitos a uma restrição orçamentária intertemporal. Por suposição, não hácrescimento populacional.

2.1. Os Produtores do Bem Final

Nesta economia há um conjunto de firmas indexadas por i ∈ [0, 1] que produzem um bem finalhomogêneo. Cada produtor do bem final detém uma tecnologia de produção dada por:

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O Impacto do Tempo de Pendência das Patentes na Trajetória de Crescimento: Uma Análisecom Base no Modelo Schumpeteriano de Crescimento Endógeno com Avanço de Qualidade

Yi(t) = AL1−αi ·

∫ 1

0

[qkj(t)Xij(t)]αdj (1)

Suponha que há um contínuo de bens intermediários indexados por j ∈ [0, 1] cuja variedade é fixano tempo. As firmas pertencentes ao setor do bem final utilizam na sua produção uma quantidadede trabalho Li e uma quantidade Xij(t) de cada bem intermediário existente, com 0 < α < 1 eeficiência produtiva medida pelo parâmetro A. Como o número de intermediários é fixo, sua medidapode ser normalizada para 1. Supondo que a massa de produtores do bem final também é constante,sua medida ser normalizada para 1 sem perda de generalidade. Com isto, temos que

∫ 1

0Lidi = L

é a quantidade total de trabalho empregado, constante por não haver crescimento populacional, e∫ 1

0Xij(t)di = Xj(t) é a quantidade total demandada de cada bem intermediário no tempo t. O

produto final agregado, dado por∫ 1

0Yi(t)di = Y (t), é o numerário da economia.

O setor de P&D é o responsável pelo progresso tecnológico da sociedade, que ocorre através demelhorias no nível de qualidade dos bens intermediários. A qualidade avança de forma proporcional aum fator q, q > 1. Se k inovações ocorreram com um intermediário ao longo do tempo, k ∈ N, a suaqualidade atual mede qk, onde k = 0 é o instante em que o bem surge pela primeira vez no mercado(qualidade normalizada para 1) e k = kj é o avanço mais recente realizado sobre a qualidade do bem j.

A trajetória da qualidade dos bens intermediários é uma variável aleatória que se assemelha a umaescada (quality ladder), onde a altura dos degraus é proporcional a q e a distância entre os degraus,isto é, o intervalo de tempo entre as qualidades qk e qk+1, é estocástica. Logo, ao longo do tempo aqualidade de um intermediário permanece constante ou salta discretamente um degrau a uma razãoq. O momento no tempo em que ocorre o salto de qualidade é aleatório, pois depende das incertezasenfrentadas pelo setor de P&D. Como se observa pela equação (1), os produtores do bem final utilizamapenas os intermediários de maior qualidade em cada ponto no tempo.

As firmas produtoras do bem final são competitivas e tomam o preço dos bens intermediários e dotrabalho como dados. Cada produtor maximiza seu lucro, dado pela diferença entre o valor da produçãoe os custos totais:

maxXij(t), Li

AL1−αi ·

∫ 1

0

[qkj(t)Xij(t)]αdj − w(t)Li −

∫ 1

0

Pj(t)Xij(t)dj (2)

onde w(t) é o salário pago, Pj(t) é o preço do intermediário j e o produto Yi(t) é vendido ao preçonormalizado de uma unidade. Assumindo-se que os bens intermediários são depreciados totalmenteapós o uso e que os trabalhadores são contratados de forma instantânea (spot market), o problema demaximização dos lucros do setor do bem final pode ser resolvido de forma separada para cada ponto notempo. A condição de primeira ordem com relação a Xij(t) ∀ j ∈ [0, 1] nos dá a função demanda dointermediário j para o i-ésimo produtor de bem final:

Xij(t) = Li · [Aαqαkj(t)Pj(t)−1] 1/(1−α) (3)

A condição de primeira ordem com relação a Li nos dá o valor do salário pago:

w(t) = (1− α) · (Yi(t)L−1i ) (4)

Utilizando a equação (3) a demanda total pelo bem j é dada por:

Xj(t) = L · [Aαqαkj(t)Pj(t)−1] 1/(1−α) (5)

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2.2. O Setor de Pesquisa e Desenvolvimento

Cada bem intermediário é criado e produzido em um diferente setor de pesquisa, cujo agregadocompõe o setor de P&D da economia. Os agentes que integram os j setores de pesquisa enfrentamum processo de decisão composto por dois estágios. No primeiro os potenciais inventores decidemse investem seus recursos na tentativa de melhorar o nível de qualidade de um determinado bemintermediário. A decisão de entrar no mercado depende da condição de livre entrada do setor, ondea firma de pesquisa compara suas expectativas de lucro com os custos de P&D.

Caso decida investir em pesquisa o inventor entra no segundo estágio de decisão, no qual submeteum pedido de patente para seu produto. Se a patente for concedida, o inventor define o preço ótimo a sercobrado pelo uso de sua invenção, e calcula o valor presente do fluxo de lucros que irá receber enquantomonopolista. O valor presente dos lucros de um inventor depende não apenas do tempo de pendênciade sua patente, mas também dos esforços de pesquisa e do tempo de pendência da patente dos seusconcorrentes. Para a solução dos estágios seguiremos o princípio de resolução retroativa, começandopelo segundo estágio, onde se supõe que o inventor obterá com sucesso uma patente relativa a umavanço de qualidade no setor.

2.2.1. Tempo de Pendência, Preço Ótimo de Monopólio e o Valor Esperado da Patente

Seja tkj o momento no tempo em que o k-ésimo inventor eleva com sucesso a qualidade do bem jde qkj−1 para qkj . A partir deste instante o inventor submete um pedido de patente para seu produto,que será avaliado pelo escritório de patentes.

O escritório de patentes é capaz de avaliar, sem erro, se um avanço de qualidade foi de fato realizadosobre um determinado bem intermediário. Contudo, o tempo gasto para analisar e julgar qualquerpedido de patente é incerto. A variável aleatória τkj , τkj ∼ Exp(λ), expressa o tempo de espera peloresultado da patente de degrau de qualidade kj . O tempo médio de pendência, dado por E[τkj ] = λ−1,é um parâmetro exógeno suposto constante no tempo e idêntico para todos os j setores intermediários,cujo valor é fornecido à sociedade pelo escritório de patentes.

A hipótese de que o tempo de pendência segue uma distribuição exponencial traz uma importantevantagem do ponto de vista da resolução analítica do modelo, pois através dela conseguimos obter umasolução final fechada. Ademais, se o tempo de pendência é exponencialmente distribuído, períodos deespera mais curtos são mais prováveis de ocorrer do que períodos de espera mais longos. Isto representao comportamento que iremos assumir para a atuação do escritório de patentes dentro da economia.

O intervalo [tkj , tkj + τkj ] corresponde ao período de incerteza enfrentado pelo inventor durantea pendência de seu pedido de patente. Ao longo deste período o pesquisador detém apenas umaexpectativa de direito sobre seu produto, que somente se configura quando a patente é concedida.Dado que as firmas de P&D não estão dispostas a correr o risco da imitação e que as mesmas não sãocapazes de cobrar o preço de monopólio sem a proteção dos direitos de propriedade, o inventor nãooferta sua tecnologia no mercado até que a patente lhe seja concedida. Portanto, não há lucro geradodurante o período de pendência.

Os pedidos de patente são, por suposição, publicados no mesmo instante em que são depositados noescritório de patentes, o que torna seu conteúdo disponível para a consulta de qualquer agente do setorde P&D. Isto permite aos inventores concorrentes, a partir de tkj , investir seus recursos em pesquisabaseados na qualidade qkj , com o intuito de produzir uma linha de qualidade superior.

Todos os bens intermediários possuem um custo marginal unitário de produção, independente donível de qualidade do bem. Ou seja, o inventor da qualidade mais recente possui uma vantagem emcomparação aos inventores anteriores, pois produz o bem intermediário de forma mais eficiente doque as gerações menos avançadas. As patentes não têm data de expiração, todavia os produtores dobem final demandam apenas o insumo de maior qualidade em cada um dos j setores, o que incentiva

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os inventores a investir seus recursos visando evoluir o estado da arte e assim tornarem-se os únicosofertantes do bem no mercado, expulsando as linhas de qualidade inferior.

Uma vez concedida, a patente confere ao inventor o direito de exclusividade sobre a produção evenda de sua criação. Seja v, v ≥ tkj + τkj , cada instante no tempo após o k-ésimo inventor obter suapatente e colocar o seu produto no mercado. O fluxo de lucros recebido a partir de v é dado por:

π(kj) = Xj(v) · [Pj(v)− 1] = L · [Aαqαkj(v)Pj(v)−1] 1/(1−α)[Pj(v)− 1] (6)

A condição de primeira ordem para a maximização dos lucros fornece o preço ótimo:

Pj(v) = α−1 (7)

O preço ótimo de monopólio é um markup sobre o custo marginal, sendo constante no tempo eentre os setores. Ao substituir a equação (7) na equação (5) encontra-se a quantidade total produzida dointermediário j:

Xj(v) = A1/(1−α)α2/(1−α)L · qαkj(v)/(1−α) (8)

A quantidade Xj(v) e o preço Pj(v) determinam o fluxo de lucros do monopólio, que dependepositivamente do nível de qualidade:

π(kj) = π · qαkj(v)/(1−α)

π ≡ A1/(1−α)α2/(1−α)(1− α)α−1L

(9)

O k-ésimo inventor extrai os lucros de seu produto até o instante em que outro pesquisador obtém apatente para um novo avanço no degrau de qualidade, de kj para kj +1. Seja tkj+1 o momento em queum inventor concorrente submete o pedido de patente para a qualidade qkj+1. O tempo de pendênciaenfrentado pelo k-ésimo + 1 inventor é dado pela variável aleatória τkj+1, τkj+1 ∼ Exp(λ).1 Aduração do poder de monopólio do k-ésimo inventor pode então ser expressa da seguinte forma:

Ψ(kj) = tkj+1 + τkj+1 − (tkj + τkj ) = T (kj) + τkj+1 − τkj (10)

onde T (kj) = tkj+1 − tkj . Em cada um dos j setores desta economia os pedidos de patente quedescrevem avanços no nível de qualidade são depositados no escritório de patentes segundo umprocesso estocástico de Poisson com intensidade pj . Isto significa que, em um intervalo de tempo ∆t,a quantidade de inovações realizadas sobre o bem j segue uma distribuição de Poisson com parâmetropj∆t. Como a chegada dos pedidos de patente é governada por um processo de Poisson, o momentotkj+1 ocorre com probabilidade pj por unidade de tempo e o intervalo T (kj) segue uma distribuiçãoexponencial com parâmetro pj . Admite-se que o intervalo T (kj) e o tempo de pendência das patentessão variáveis aleatórias independentes.

Com base na duração do monopólio, o valor presente dos fluxos de lucro da qualidade qkj é dadopor:

V =

∫ tkj+1+ τkj+1

tkj+ τkj

π(kj) · e−∫ vtkj

r(ω)dωdv (11)

1Ou seja, os pedidos de patente para níveis de qualidade mais avançados não necessariamente demoram mais para seremanalisados do que os pedidos de qualidade inferior. Não há qualquer suposição neste modelo quanto à dificuldade do escritóriode patentes em analisar e julgar os pedidos de diferentes tecnologias, exceto no que toca à aleatoriedade do tempo de exame.Para todos os níveis de qualidade, e em todos os j setores, os períodos de pendência das patentes são variáveis aleatórias i.i.d.com distribuição exponencial de parâmetro λ.

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Fábio Rodrigues de Moura, Nelson Leitão Paes e Tácito Augusto Farias

O inventor obtém o montante π(kj) em cada ponto do intervalo Ψ(kj), que corresponde ao seutempo de monopólio. Todo o fluxo futuro de lucros é trazido para o momento tkj utilizando como fatorde desconto a taxa de juros da economia. Observe que enquanto o fluxo de lucros é calculado a partirde tkj + τkj , o fator de desconto presente é aplicado desde a data do pedido da patente. Esta estruturapermite captar o custo gerado pelo tempo de pendência, uma vez que durante este período o inventornão obtém lucro.

No equilíbrio de longo prazo a taxa de juros é constante no tempo. Utilizando esta condição naequação (11) e resolvendo a integral encontra-se:

V [τkj ,τkj+1,T (kj)] = (π(kj)/r) · [e−rτkj − e−r(T (kj) + τkj+1)] (12)

O valor presente dos lucros do k-ésimo inventor é uma variável aleatória que depende positivamentedo fluxo π(kj), do intervalo de tempo T (kj) até outro pesquisador depositar um pedido de patente parauma qualidade superior e do tempo de pendência da patente do concorrente, τkj+1. Por outro lado, Vé uma função decrescente em τkj . O valor esperado da patente de degrau de qualidade kj é dado pelaesperança matemática da equação (12):

E[V (kj)] = [π(kj)/(r + pj)] · [λ/(r + λ)] (13)

O valor da patente é função decrescente do tempo médio de pendência, da taxa de inovação e dataxa de juros. O termo λ/(r + λ) é o fator de desconto sobre o valor privado da patente devido aotempo de espera pela sua concessão. Como se observa, este fator depende da taxa de retorno, sendoendogenamente determinado no modelo.

A partir da equação (13) podemos expressar a taxa de retorno do mercado em função dos demaisparâmetros:

r = {[(pj + λ)/2]2 + λ(π(kj)− pjE[V (kj)])/E[V (kj)]}1/2 − (pj + λ)/2 (14)

Para se determinar a taxa de juros de equilíbrio é necessário especificar a lei de formação da taxapj , que é endógena, e o valor de E[V (kj)] a partir das condições de entrada no setor inovativo. Nestemodelo suporemos livre entrada no setor de P&D.

2.2.2. A Decisão de Entrar no Setor de P&D

Seja Z(kj) o fluxo de recursos investido em pesquisa por todos os inventores que buscam obter umapatente para o degrau de qualidade kj + 1. Assuma que a taxa de inovação do bem j é proporcionala Z(kj), isto é, quanto maior a quantidade total de recursos gastos em P&D visando elevar o nível dequalidade do intermediário, maior é a probabilidade por unidade de tempo de um entrante inovar esubmeter o seu pedido de patente.

Suponha também que o processo de avanço tecnológico torna-se cada vez mais difícil à medida que onível de qualidade aumenta. Uma especificação que facilita a solução analítica do modelo é determinarque pj se reduz em proporção ao produto que será gerado ao se atingir um novo padrão de qualidadepara o bem j. O produto final da economia pode ser obtido agregando-se a equação (1) sobre todos osprodutores do bem final e substituindo Xj(t) pela equação (8):

Y (t) = A1/(1−α)α2α/(1−α)L ·∫ 1

0

qαkj(t)/(1−α)dj (15)

Observe que ao ocorrer um salto no degrau de qualidade do intermediário j, de kj para kj + 1, oproduto será proporcional ao termo qα(kj+1)/(1−α). Logo, uma forma funcional admissível para a taxade inovação é dada por:

pj = Z(kj)/(qα(kj+1)/(1−α) · η) (16)

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onde η é um parâmetro que representa o custo fixo da pesquisa, η > 0. A taxa pj é proporcionalao gasto total em P&D com o bem j e inversamente proporcional à contribuição do intermediário noproduto da economia ao se atingir o nível subsequente de qualidade.

As firmas que estão na corrida pela patente kj + 1 possuem uma expectativa de lucro igual aE[V (kj + 1)], que ocorre com probabilidade pj por unidade de tempo. Supondo que a recompensalíquida esperada do projeto de P&D pode não ser suficientemente lucrativa, a livre entrada no setorimplica:

pj · E[V (kj + 1)]− Z(kj) ≤ 0 (17)

Entretanto, se a desigualdade for estrita não há estímulos para a entrada de novos inventores, oque estancaria o progresso tecnológico. Estamos interessados em um espaço de parâmetros onde hajainvestimento positivo em P&D, tal que Z(kj) > 0, o que é essencial para o crescimento econômico. Istorequer que a condição de livre entrada seja atendida na igualdade:

pj · E[V (kj + 1)]− Z(kj) = 0 (18)

As equações (18) e (16) determinam a condição de não arbitragem para haver investimento positivoem P&D:

(1/qα(kj+1)/(1−α)) · E[V (kj + 1)] = η (19)

Ao se investir η unidades do produto final em pesquisa no intermediário com degrau de qualidadekj há uma probabilidade igual a 1/qα(kj+1)/(1−α) por unidade de tempo de ocorrer uma inovação parao degrau kj + 1. Por sua vez, a patente para a nova qualidade tem valor igual a E[V (kj + 1)].

Utilizando a equação (13) para kj + 1 e substituindo-a na equação (19) obtemos:

pj = p = λπ/[η(r + λ)]− r (20)

No equilíbrio pj depende apenas de parâmetros constantes e da taxa de juros, que também éconstante no longo prazo. Logo, a taxa em que surgem os pedidos de patente para avanços no nível dequalidade dos intermediários é idêntica para todos os j setores da economia, e não depende do nível dequalidade.

Além disso, observa-se que o progresso tecnológico desta economia pode ser descrito em termosde um sistema de filas. Em notação de Kendall (1953), temos que o processo de requisição e concessãode patentes segue uma fila do tipo M/M/∞: a chegada dos pedidos de patente é governada porum processo de Poisson com parâmetro p, o tempo de atendimento, ou o tempo de pendência, éexponencialmente distribuído com parâmetro λ e há infinitos atendentes independentes, isto é, todopedido de patente tem sua análise iniciada de forma independente a partir do instante em que ocorre odepósito no escritório de patentes. Em um sistema de filas deste tipo não há, efetivamente, a formaçãode filas, tendo em vista que existe sempre um atendente disponível para analisar o pedido de patente deum inventor proveniente de qualquer um dos j setores. O único tempo de espera existente no sistemaé o tempo em que o pedido de patente está sob pendência de julgamento.

No contexto da teoria das filas há um importante teorema atribuído a Burke (1956). O teorema deBurke nos diz que em uma fila do tipoM/M/∞ o processo de saída do sistema é Poisson com o mesmoparâmetro do processo de chegada. Isso significa que, na nossa economia, as novas qualidades chegamao mercado na mesma taxa p em que chegam os pedidos no escritório de patentes. O teorema de Burkegarante, deste modo, que p é taxa em que as inovações são incorporadas no produto final da economia,assim como p é a taxa em que ocorre a substituição do monopolista atual por um entrante.

Através das equações (20) e (16) encontra-se o volume total de recursos destinado à pesquisa nosetor j:

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Z(kj) = qα(kj+1)/(1−α)[λπ/(r + λ)− rη] (21)

O investimento em P&D no setor j aumenta ao longo do tempo, conforme o nível de qualidade seeleva. No entanto, a condição de livre entrada nos diz que a espera pelas patentes influencia a formaçãoda taxa p que baliza o processo inovativo. Consequentemente, o investimento em pesquisa torna-sefunção do tempo médio de pendência.

A equação (20) implica que a taxa de juros assume a forma:

r = {[(p+ λ)/2]2 + λ(π/η − p)}1/2 − (p+ λ)/2 (22)

2.3. As Famílias

As famílias desejam maximizar sua utilidade agregada ao longo de um horizonte de tempo infinito,restritas ao orçamento disponível em cada instante. Assumimos um contínuo de famílias com massanormalizada para 1 que apresentam as mesmas preferências intertemporais: sua utilidade u[C(t)]depende da quantidade consumida e por suposição assume a forma funcional CIES (elasticidade desubstituição intertemporal constante).

U =

∫ ∞0

u[C(t)] · e−ρtdt =

∫ ∞0

[C(t)1−θ − 1][1− θ]−1 · e−ρtdt (23)

A elasticidade de substituição intertemporal é dada pela constante 1/θ, θ > 0, e o parâmetro ρ,ρ > 0, representa a taxa de preferência temporal.

As famílias são competitivas e não há heterogeneidade entre os indivíduos. Isto nos permite utilizaro princípio da família representativa, a qual captura o comportamento médio do consumo de todas asfamílias da economia. A família representativa está sujeita à seguinte restrição orçamentária:

S(t) = w(t) · L+ r(t) · S(t)− C(t) (24)

Cada pessoa oferta inelasticamente uma unidade de trabalho por unidade de tempo, recebendo osalário w(t) pelos serviços oferecidos. A renda total da família representativa é composta pela rendaagregada do trabalho, w(t) · L, e pela renda derivada da posse de um portfólio balanceado de ativos,S(t), na forma de direitos sobre o valor de mercado de todas as firmas de P&D, as quais pagam a taxareal de retorno r(t). Os ativos são a riqueza das famílias, e a renda não consumida é utilizada paraacumular mais ativos. Há equilíbrio no mercado de trabalho.

A partir das condições de primeira ordem do problema de otimização dinâmica das famílias obtemosa equação de Euler, que estipula a regra de crescimento do consumo:

C(t)/C(t) = [r(t)− ρ]θ−1 (25)

A cada ponto no tempo os consumidores satisfazem a equação de Euler e assintoticamente atendemà condição de transversalidade:

limt→∞

S(t) · e−∫ t

0r(ω)dω = 0 (26)

2.4. A Trajetória de Crescimento Balanceado

Ao longo do tempo a economia está sujeita à restrição de recursos:

Y (t) ≥ C(t) +X(t) + Z(t) (27)

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onde X(t) é a produção total de bens intermediários, C(t) é o consumo e Z(t) é o gasto total empesquisa e desenvolvimento. Seja o índice médio de qualidade dado por:

Q(t) ≡∫ 1

0

qαkj(t)/(1−α)dj (28)

O índice Q(t) é uma média dos níveis de qualidade de todos os bens intermediários produzidos naeconomia. Através da equação (15) vemos que o produto final é proporcional a Q(t):

Y (t) = A1/(1−α)α2α/(1−α)L ·Q(t) (29)

Um aumento na qualidade de qualquer bem intermediário eleva o índice Q(t), e por sua vezpromove uma expansão do produto agregado.

A quantidade total de intermediários produzidos na economia é encontrada ao se agregar a equação(8) sobre todos os j setores:∫ 1

0

Xj(t)dj = X(t) = A1/(1−α)α2/(1−α)L ·Q(t) (30)

O mesmo raciocínio aplicado sobre Z(kj) nos dá o gasto total em P&D, cujo resultado também éproporcional ao índice Q(t):∫ 1

0

Z(kj)dj = Z(t) = qα/(1−α) [λπ/(r + λ)− rη] ·Q(t) (31)

A partir da equação (4) o salário de equilíbrio é dado por:

w(t) = (1− α)A1/(1−α)α2α/(1−α) ·Q(t) (32)

Apesar de os níveis de qualidade evoluírem de forma discreta e aleatória, sua média Q(t) édeterminística. Isto porque se assume que os j setores são pequenos, suficientemente numerosos e queas inovações são independentes entre os setores. Assim, utilizando como princípio a lei dos grandesnúmeros, a média dos níveis de qualidade de todos os diferentes setores é estável, o que permite umatrajetória suave e não estocástica paraQ(t), bem como para o produto e demais variáveis cuja trajetóriaé função do índice médio de qualidade.

Um equilíbrio nesta economia é definido pelas sequências [C(t),X(t),Z(t)]∞t=0 que são consistentes

com a maximização da utilidade das famílias, sequências [Pj(t),Xj(t)]∞t=0 que maximizam o valor

presente esperado do fluxo de lucros dos inventores que detêm uma patente para o intermediário demaior qualidade em cada setor, sequência [Q(t)]

∞t=0 que é determinada pela condição de livre entrada,

sequências [r(t),w(t)]∞t=0 que são consistentes com o market clearing e sequência [S(t)]

∞t=0 que atenda

à restrição de recursos da economia.Uma trajetória de crescimento balanceado, ou BGP (Balanced Growth Path), é definida como uma

trajetória de equilíbrio de longo prazo onde o consumo C(t) e o produto Y (t) crescem a uma mesmataxa constante. Pela equação de Euler, para que o consumo cresça a uma taxa constante é necessárioque a taxa de juros também seja constante. Estamos interessados em uma situação onde r(t) = r∗ ∀ t,onde r∗ é a taxa de juros no BGP.

A suposição de uma taxa de juros constante no equilíbrio foi utilizada anteriormente para encontraro valor presente esperado dos lucros dos inventores. Ao substituir na equação de Euler a taxa de jurosdada em (22), chega-se à seguinte equação para a taxa de crescimento do consumo:

C(t)/C(t) = {{[(p+ λ)/2]2 + λ(π/η − p)}1/2 − (p+ λ)/2− ρ}θ−1 (33)

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Como o produto, a produção total de bens intermediários e o gasto agregado em P&D sãoproporcionais a Q(t), todos crescem à mesma taxa. Segue-se que no BGP o consumo também cresceà mesma taxa do índice médio de qualidade, e assim:

Y (t)/Y (t) = Z(t)/Z(t) = X(t)/X(t) = C(t)/C(t) = Q(t)/Q(t) = γ∗ (34)

Contudo, como a probabilidade inovação é endógena, a taxa de crescimento ainda não estácompletamente especificada. A fim de encontrar a solução final do modelo é necessário antesavaliar o comportamento do índice médio de qualidade ao longo do tempo. Para tanto, utilizamosas propriedades do processo de Poisson e o fato de que a medida de setores produtores de bensintermediários foi normalizada para 1. A variação no índice médio de qualidade em um intervalo detempo ∆t é dada por:

Q(t+ ∆t)−Q(t) = e−p∆tQ(t) + (p∆t)e−p∆tqα

(1−α)Q(t)+

+∑∞n=2

(p∆t)ne−p∆t

n! qnα

(1−α)Q(t)−Q(t)

(35)

O primeiro termo do lado direito da equação (35) nos dá a probabilidade de não haver inovação nosj setores no intervalo ∆t. O segundo termo refere-se à probabilidade de haver uma inovação em todosos setores, o que eleva a produtividade dos mesmos pelo fator qα/(1−α). O terceiro termo nos dá aprobabilidade de que ocorra mais de uma inovação em todos os intermediários durante este intervalode tempo. Dividindo ambos os lados da equação por ∆t e tomando os limites para ∆t → 0 chegamosao seguinte resultado:

Q(t)/Q(t) = p · [qα/(1−α) − 1] (36)

Como a taxa de inovação é função do tempo de pendência, o mesmo ocorre com o crescimento doíndice médio de qualidade. Substituindo a taxa p pela equação (20) tem-se:

Q(t)/Q(t) = {λπ/[η(r + λ)]− r} · [qα/(1−α) − 1] (37)

Em equilíbrio com plena utilização de recursos, o portfólio de ativos das famílias assume o valor:

S(t) =

∫ 1

0

(Z(t)[πQ(t)]−1 − 1

Z(t)[πQ(t)]−1 − λ(r + λ)−1

)E[V (kj)]dj <

∫ 1

0

E[V (kj)]dj (38)

O valor agregado dos ativos é determinado com base na restrição orçamentária da famíliarepresentativa e nas equações (9), (13), (20), (29), (30), (31), (32) e (37). Neste ambiente, o tempo de esperaincerto pela concessão das patentes reduz a riqueza das famílias, tendo em vista que, no equilíbrio, ovalor do portfólio de ativos é inferior ao valor agregado das patentes.

Observa-se que muito embora a taxa de crescimento do índice médio de qualidade e do consumosejam iguais no BGP, C(t)/C(t) é uma função positiva da taxa de juros, ao contrário de Q(t)/Q(t).Portanto, a taxa de juros de longo prazo resulta do ponto de equilíbrio onde Q(t)/Q(t) = C(t)/C(t).

Ao igualar a equação de Euler à equação (37) encontramos o valor final para a taxa de juros no BGP:

r∗ = {{(λϕ− ρ)2 + 4λϕ[ρ+ (π/ζ)(ϕ− 1)]}1/2 − (λϕ− ρ)} · (2ϕ)−1 (39)

Tal que ϕ ≡ [1 + θ(qα/(1−α) − 1)]. A solução final para a taxa de crescimento da economia édeterminada com o uso da equação de r∗:

γ∗ = {{(λϕ− ρ)2 + 4λϕ[ρ+ (π/ζ)(ϕ− 1)]}1/2 − [λϕ− ρ(1− 2ϕ)]} · (2ϕθ)−1 (40)

Com base na equação (36) o valor de equilíbrio da taxa de inovação é dado por:

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p∗ = γ∗/(qα/(1−α) − 1) =

= {{(λϕ− ρ)2 + 4λϕ[ρ+ (π/ζ)(ϕ− 1)]}1/2 − [λϕ− ρ(1− 2ϕ)]} · 1[2ϕ(ϕ−1)]−1

(41)

Assumimos que os parâmetros obedecem à restrição r∗ > ρ, o que garante uma taxa positiva decrescimento. De acordo com a equação (39) essa restrição é dada por:

ρ < [(λ/2)2 + λ(π/η)]1/2 − λ/2 (42)

A condição de transversalidade implica r∗ > γ∗. Isto requer que os parâmetros atendam também aseguinte restrição:

ρ > {[λ(1− θ)/2]2 + (π/η)[λ(1− θ)2(ϕ− 1)]/(ϕ− 1 + θ)}1/2 − λ(1− θ)/2 (43)

Neste modelo não há dinâmica de transição. No tempo t = 0 os valores iniciais do consumo,do produto agregado, da quantidade total de intermediários produzida e do gasto total em P&D sãoproporcionais a Q(0), um ponto de partida suposto conhecido para o índice médio de qualidade. Apartir de então todas estas variáveis entram no BGP e crescem à taxa γ∗.

Diferentemente do modelo schumpeteriano tradicional, os potenciais agentes inovativos estãoagora sujeitos a um nível mais elevado de incerteza. Os pesquisadores internalizam não apenas aincerteza quanto à capacidade inventiva sua e de seus concorrentes, mas também a incerteza quantoao momento em que os pedidos de patente (seu e de seus competidores) serão julgados. Isto influenciana formação das expectativas do setor de pesquisa, que por sua vez determinam a taxa de retorno eo processo de chegada dos pedidos de patente. É por meio da taxa de juros e da taxa inovação que otempo de pendência influencia o crescimento da economia, dado que γ∗ depende de r∗ e p∗.

Na próxima seção analisamos os resultados obtidos com o modelo schumpeteriano, com o intuitode avaliar o impacto do tempo médio de pendência das patentes sobre a trajetória de crescimento daeconomia.

3. CALIBRAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Com base na solução final para a taxa de juros no BGP, e dada sua relação com a taxa de crescimentoe com a taxa de inovação, temos que r∗, γ∗ e p∗ são funções monotônicas crescentes e estritamentecôncavas em λ:

r∗λ = (λϕ−ρ)+2[ρ+(π/η)(ϕ−1)]2{(λϕ−ρ)2+4λϕ[ρ+(π/η)(ϕ−1)]}1/2 − 1

2 > 0

r∗λλ = − 2ϕ(π/η)(ϕ−1)[ρ+(π/η)(ϕ−1)]{(λϕ−ρ)2+4λϕ[ρ+(π/η)(ϕ−1)]}3/2 < 0

γ∗λ =r∗λθ > 0 p∗λ =

r∗λ(ϕ−1) > 0

γ∗λλ =r∗λλθ < 0 p∗λλ =

r∗λλ(ϕ−1) < 0

(44)

Como o parâmetro λ responde pelo recíproco do tempo médio de pendência, conclui-se queeconomias onde as patentes são concedidas mais rapidamente apresentam uma taxa de crescimentomais elevada. Neste modelo, um maior período de espera pelas patentes desestimula a atividadeinventiva, reduzindo o investimento em pesquisa e elevando o tempo médio com que surgem as novastecnologias.

Analisando a condição de não arbitragem expressa na equação (19) vemos que um aumento no custoda pesquisa deve vir acompanhado de um aumento nas expectativas de lucro da invenção. O aumento

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do custo por sua vez reduz a taxa de retorno e a taxa de inovação, o que é necessário para que hajaum aumento no valor esperado da patente de acordo com a equação (13). Este é o motivo pelo qual,neste arcabouço schumpeteriano, os agentes produtores de tecnologia podem suportar distorções queaumentem o custo da pesquisa em detrimento de uma redução no crescimento da economia. É possível,por exemplo, que uma empresa com elevado poder político influencie o sistema de forma a fortalecerseus direitos de propriedade, o que representaria um aumento nos custos de entrada dos concorrentes.Isto reduziria a taxa de juros, a taxa de inovação e o crescimento, mas elevaria o valor esperado dapatente do monopolista.

Por outro lado, se diferenciarmos a equação (13) com relação a λ obtemos:

∂E[V ∗(kj)]

∂λ=π(kj){(r∗ϕ− ρ)r∗ − r∗λ[2r∗ϕ+ λϕ− ρ]λ}

{[(r∗ + p∗)(r∗ + λ)]2(ϕ− 1)}= 0 (45)

Conforme o parâmetro λ aumenta o fator de desconto λ/(r∗ + λ) presente na equação (13) tende aunidade, o que eleva o valor esperado do invento. Mas uma redução no tempo médio de pendênciapromove um ajuste na taxa de juros e na taxa de inovação, elevando r∗ e p∗ e, por conseguinte,reduzindo o valor presente esperado dos lucros. Com o sistema em equilíbrio estes efeitos se cancelame a expectativa dos lucros não se altera.

Isto ocorre pois supusemos que todos os potenciais inventores, independentemente de sua posiçãona linha de qualidade, estão sujeitos à mesma distribuição exponencial para o tempo de pendência daspatentes. Não só inventor contemporâneo que submete seu pedido de patente se beneficia de umaredução no tempo médio de pendência, mas também toda a geração seguinte de potenciais entrantes.Portanto, na modelagem aqui aplicada uma redução no tempo médio de pendência não altera o valoresperado da patente, mas globalmente a sociedade experimenta uma maior taxa retorno, um maiorprocesso inovativo e uma maior taxa de crescimento.

Supondo uma situação em que o tempo médio de pendência tende a zero, a taxa de juros, a taxa decrescimento e a taxa de inovação tendem assintoticamente para os seguintes valores:

limλ→∞

r∗(λ) = [ρ+ (π/η)(ϕ− 1)]ϕ−1 = r∗∗

limλ→∞

γ∗(λ) = [(ϕ− 1)/θ](π/η − ρ)ϕ−1 = γ∗∗

limλ→∞

p∗(λ) = (π/η − ρ)ϕ−1 = p∗∗

(46)

As taxas r∗∗, γ∗∗ e p∗∗ correspondem aos resultados encontrados quando a patente éinstantaneamente concedida ao inventor no momento em que um avanço de qualidade é atingido. Paraqualquer conjunto admissível de parâmetros temos sempre r∗∗ > r∗, γ∗∗ > γ∗ e p∗∗ > p∗. Nossashipóteses relativas ao funcionamento do sistema de concessão de patentes, bem como as relativas aocomportamento dos inventores perante este ambiente, acabam por generalizar os resultados do modeloschumpeteriano. No caso particular em que o tempo médio de pendência é suposto infinitesimal, astaxas r∗∗, γ∗∗ e p∗∗ são encontradas.

Com base nestes resultados calibramos o modelo com os dados da economia brasileira para o ano de2011, com o objetivo de calcular a variação na trajetória de crescimento e no bem-estar gerada por umamudança no tempo médio de pendência das patentes. O Quadro 1 apresenta os parâmetros calibradose a fonte utilizada para a obtenção dos seus valores.

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Quadro 1 – Valores dos parâmetros e calibração do modelo

Parâmetros Valores Fonte

Inverso do tempo médio de pendência (λ) 0,1852 INPI

Probabilidade de aprovação no BGP (p∗)2 0,1246 INPI

Taxa de preferência temporal (ρ)3 0,0208 Lledo (2005)

Elasticidade de substituição intertemporal (1/θ)4 0,4 Lledo (2005)

Participação dos bens intermediários no produto final (α) 0,5 Cavalcanti e Silva (2010)

Relação consumo/produto (C(0)/Y (0)) 0,6033 IBGE

Taxa real de juros no BGP (r∗)5 0,0440 BACEN e IBGE

Relação lucro/custo da pesquisa (π/η) 0,2087 Calibrado

Fator de avanço de qualidade (q) 1,0745 Calibrado

Taxa de crescimento de longo prazo (γ∗) 0,00928 Calibrado

Fonte: Elaboração própria dos autores.

A variação de bem-estar foi calculada com base na metodologia adotada por Ferreira e Araújo (1999)e Paes e Bugarin (2006), que utilizam a variação compensada do consumo para avaliar a perda ou ganhode bem-estar. Através desta abordagem calcula-se a quantidade de consumo que deve ser destinadaou retirada das famílias a fim de que, dado uma mudança de cenário, mantenham o mesmo nível deutilidade de que dispunham anteriormente.

Supondo-se dois cenários diferentes, um inicial (0) e outro final (1), a variação de bem-estar entre oscenários é dada por:

VBE = [C(0)/Y (0)] [1− (r∗1 − γ∗1 )/(r∗1 − γ∗1)] (47)

onde γ∗0 e γ∗1 são, respectivamente, as taxas de crescimento no cenário inicial e final, r∗1 é a taxa dejuros no cenário final e C(0)/Y (0) é a relação entre o consumo e o produto agregado da economia nocenário inicial. Se γ∗0 < γ∗1 então VBE > 0, significando que no cenário final há um ganho de bem-estarem termos de aumento do consumo como proporção do PIB.

A Tabela 1 contém valores calculados para r∗, γ∗, p∗ e para a variação do bem-estar. Supomosuma redução contínua no tempo médio de pendência das patentes, com ponto inicial em 5,4 anos,que corresponde ao tempo médio de decisão do INPI registrado em 2011, e ponto final em 2,8 anos,que corresponde ao encontrado nos EUA em 2011. Para os demais parâmetros fixamos os valores

2Como proxy para a taxa de inovação utilizamos a taxa de concessão dos pedidos de patentes no INPI. O UnitedStates Trademark Office (USPTO), o escritório norte-americano de patentes, calcula a taxa de concessão dos pedidosde patentes como a relação entre a quantidade de pedidos concedidos e o total de decisões de patentes emum determinado período. No fim de 2011 a taxa de concessão do USPTO era de 48%, conforme consta em<http://www.uspto.gov/dashboards/patents/kpis/kpiAllowed.kpixml>. Apesar de no portal do INPI não constar nenhumainformação relativa à sua taxa de concessão, utilizamos aqui o mesmo conceito adotado pelo USPTO. Dado que em 2011 foramconcedidos 3.801 pedidos de patentes no INPI e houve um total de 30.492 decisões, a taxa de concessão foi de 12,46%.

3O valor da taxa de preferência temporal foi obtido transformando-se para o caso contínuo o valor em tempo discreto dado emLledo (2005).

4A elasticidade de substituição intertemporal também foi adaptada para o nosso modelo, sendo igual ao inverso daquelaapresentada em Lledo (2005).

5A taxa real de juros no BGP foi calculada pela diferença entre a Taxa Selic em dezembro de 2011 e o IPCA acumulado no mesmoano. O IPCA acumulado em 2011 atingiu o valor de 6,5% e a Taxa Selic ao final do ano foi de 10,90%.

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apresentados no Quadro 1. Observa-se que um tempo médio de espera menor pelas patentes contribuipara elevar a taxa de retorno, a taxa de inovação e a taxa de crescimento da economia, conformedemonstrado anteriormente.

Tabela 1: Tempo médio de pendência das patentes, variação de bem-estar e as taxas de longo prazo

Tempo médio de p∗ r∗ γ∗ VBE

pendência, em anos

5,4 0,12460 0,04400 0,00928 0,01629

5,2 0,12551 0,04417 0,00935 0,01522

5,0 0,12645 0,04434 0,00942 0,01412

4,8 0,12740 0,04452 0,00949 0,01299

4,6 0,12837 0,04470 0,00956 0,01183

4,4 0,12936 0,04489 0,00963 0,01065

4,2 0,13037 0,04507 0,00971 0,00944

4,0 0,13140 0,04527 0,00979 0,00819

3,8 0,13246 0,04546 0,00987 0,00692

3,6 0,13354 0,04566 0,00995 0,00561

3,4 0,13464 0,04587 0,01003 0,00426

3,2 0,13577 0,04608 0,01011 0,00288

3,0 0,13692 0,04629 0,01020 0,00146

2,8 0,13810 0,04651 0,01029 0,00000

Fonte: Elaboração própria dos autores.

Ao atingir o benchmark de 2,8 anos para o tempo médio de pendência há um aumento de 0,101pontos percentuais na taxa de crescimento, além de uma redução de 9,72% no tempo médio desurgimento de novas tecnologias, de 8,02 para 7,24 anos. As taxas limite do modelo calibrado sãodadas por p∗∗ = 0,15837, r∗∗ = 0,05029 e γ∗∗ = 0,01180. A Figura 1 ilustra o comportamento dastaxas de longo prazo para valores crescentes do parâmetro λ:

Infere-se também a partir da calibração do modelo que uma redução de 5,4 para 2,8 anos no tempomédio de pendência gera no longo prazo um ganho de bem-estar de 1,629% na forma de aumentodo consumo. Estes resultados corroboram a importância de se criar políticas e mecanismos para sereduzir de forma eficiente o tempo gasto na análise e julgamento dos pedidos de patente na nossaeconomia. Isto reduziria a incerteza dos potenciais inventores e ampliaria o fluxo de recursos investidosem pesquisa e desenvolvimento, aumentando a probabilidade de se produzir inovações tecnológicas. Oresultado é um aumento do consumo, da taxa de retorno e do crescimento no longo prazo.

De todo modo, a discussão de uma programação eficiente de políticas exige a comparação doequilíbrio descentralizado com a alocação pareto ótima resultante da solução do problema do planejadorsocial. O equilíbrio descentralizado neste modelo schumpeteriano não é pareto ótimo devido àsdistorções causadas pelo preço de monopólio, pelo espalhamento do conhecimento acumulado, pelotempo de pendência e pelo efeito business stealing. As três primeiras distorções tendem a reduzir ataxa de crescimento da economia competitiva em relação ao ótimo social. Porém, a possibilidade deexpropriação dos lucros de monopólio pelos entrantes pode estimular demasiadamente a competiçãono setor de P&D, gerando um investimento excessivo em inovação. Por conseguinte, o efeito business

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Figura 1: Relação entre o parâmentro λ e as taxas de longo prazo

0,1 0,2 0,3 0,4

Taxa

s de

Lon

go P

razo

γ*r*p*

0,0118

0,0503

0,1584

γ**

r**

p**

λ

stealing pode fazer com que a taxa de crescimento da economia competitiva seja muito elevada secomparada à taxa socialmente ótima.

O planejador social busca maximizar a utilidade das famílias utilizando a tecnologia deprodução Y (t) = AL1−α ∫ 1

0[qkj(t)Xj(t)]

αdj, sujeito à restrição de recursos Y (t) = C(t) +∫ 1

0Xj(t)dj +

∫ 1

0Z(kj)dj. O planejador também está sujeito à restrição tecnológica de P&D, dada por

qα(kj+1)/(1−α)pj = Z(kj)η−1PS , onde se supõe ηPS ≤ η uma vez que o planejador concede a atividade

de pesquisa ao inventor que apresenta o menor custo de P&D. A utilidade das famílias continua sendorepresentada pela equação (23).

A condição de primeira ordem para a maximização da utilidade com relação à quantidadeproduzida de bens intermediários, supondo um ambiente estático, nos fornece: Xj(t)PS =(Aα)1/(1−α)qαkj/(1−α)L. Substituindo Xj(t)PS em Y (t) encontramos o produto agregado daeconomia: Y (t)PS = A1/(1−α)αα/(1−α)LQ(t). Integrando ambos os lados da restrição tecnológicade P&D com relação à medida dos setores de bens intermediários, e dado que pj é constante, obtemos:qα/(1−α)Q(t)p = Z(t)η−1

PS . Utilizando o mesmo raciocínio aplicado na equação (35) encontramosa equação de acumulação de Q(t): Q = Z(t)[1 − q−α/(1−α)]η−1

PS . Através destes resultados oHamiltoniano do problema do planejador social pode ser escrito da seguinte forma:

H = [C(t)1−θ − 1](1− θ)−1e−ρt+

+µ(t) · [A1/(1−α)α1/(1−α)(1− α)α−1LQ(t)− Z(t)− C(t)]+

+φ(t) · Z(t)[1− q−α/(1−α)]η−1PS

(48)

As condições de primeira ordem nos fornecem a seguinte solução ótima:

γ∗PS = [(πPS/ηPS)(ϕ− 1)/(θ + ϕ− 1)− ρ]θ−1

r∗PS = (πPS/ηPS)(ϕ− 1)/(θ + ϕ− 1)

(49)

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onde πPS ≡ A1/(1−α)α1/(1−α)(1 − α)α−1L ≡ α−1/(1−α)π > π e r∗PS é a taxa de retorno implícitano ótimo social. Além do custo η há três distorções presentes na economia descentralizada quereduzem a taxa de crescimento em relação ao socialmente ótimo: a distorção estática causada pelopreço de monopólio, a distorção gerada pelo spillover das invenções e a distorção devido ao tempode espera pelas patentes. Quanto à primeira, vimos que o monopolista cobra um markup sobreo custo marginal do intermediário. O markup de monopólio provoca uma redução na quantidadedemandada de intermediários, gerando uma perda de eficiência estática na economia. O planejadorsocial elimina esta distorção, uma vez que cobra pelo uso dos bens intermediários o seu custo marginalde produção. Como a economia planejada aloca mais recursos na produção dos bens intermediários,temos Xj(t)PS > Xj(t) para um dado nível de qualidade. Isto gera um ganho estático no produtoagregado Y (t)PS e resulta em πPS > π na taxa ótima.

O fato de os inventores enxergarem o benefício de sua invenção como temporário também faz a taxade crescimento da economia competitiva cair em relação à taxa ótima. Quando ocorre um avanço dequalidade a produtividade de um setor aumenta permanentemente no fator qα/(1−α), porém o retornoque o inventor obtém devido à sua contribuição na melhoria do estoque tecnológico é temporário. Opróximo entrante obterá um ganho baseado em um nível de produtividade superior, sem que com issotenha que compensar o seu antecessor pelos esforços realizados. O planejador, por sua vez, enxergaque cada melhoria na qualidade gera um beneficio social permanente, isto é, ele internaliza os spilloversde produtividade das invenções, o que tende a elevar a taxa de crescimento da economia planejada.

O tempo de espera pelas patentes é a terceira distorção presente neste modelo que tende a reduzira taxa de crescimento em relação ao ótimo social. O tempo de pendência provoca dois efeitos: osinventores descontam mais o seu fluxo de lucros, o que reduz o valor privado da patente, e há umaredução na taxa de retorno e na taxa de inovação, o que eleva o valor da patente. O efeito líquido é amanutenção do retorno esperado associado a uma perda social na forma de redução no crescimento. Naeconomia planejada esta distorção é eliminada, pois o planejador não internaliza o tempo de pendênciana decisão social do processo inovativo. Por este motivo a alocação pareto-ótima não é afetada pelotempo de espera e a taxa de crescimento γ∗PS não se torna função do tempo médio de pendência daspatentes.

Por outro lado, o efeito de captura dos lucros de monopólio, ou efeito business stealing, tende a elevara taxa de crescimento em relação à taxa ótima, podendo provocar uma situação em que o processocompetitivo torna-se excessivo se comparado ao socialmente desejado. Como se observa neste modelo,os inventores buscam melhorar o nível de qualidade com o intuito de capturar os lucros de monopóliodo líder, mas ao fazê-lo acabam por destruir o fluxo de renda que motivou a criação anterior. Esteefeito, que não tem valor social, tende a incentivar de forma excessiva os investimentos em P&D. Equanto maior o volume de recursos destinado à pesquisa, menor é o retorno esperado das invenções. Naeconomia planejada esta distorção deixa de existir, pois o planejador identifica que cada nova tecnologiadestrói o retorno social das invenções anteriores.

Se a desigualdade πPS/ηPS > [(θ + ϕ− 1)/ϕ][π/η + ρ/(ϕ− 1)] for observada, as taxas decrescimento resultam em γ∗ < γ∗∗ < γ∗PS e a distorção causada pelo efeito de captura não é capazsobrepujar o crescimento ótimo. Caso contrário, a economia pode experimentar competição excessiva.Por exemplo, considerando-se os parâmetros calibrados para a economia brasileira e supondo ηPS = ηtemos γ∗ = 0,928%, γ∗∗ = 1,180% e γ∗PS = 1,482%. Neste caso, γ∗ < γ∗∗ < γ∗PS e a taxa decrescimento de longo prazo da economia brasileira encontra-se abaixo da socialmente ótima. Agorasuponha ηPS = η e que há um aumento nos custos da pesquisa de forma que a relação π/η cai de0,2087 para 0,14. Isto resultaria nas taxas γ∗ = 0,606%, γ∗∗ = 0,748% e γ∗PS = 0,721%. Apesar de ataxa γ∗ ainda ser inferior à taxa de crescimento social, a taxa γ∗∗ torna-se agora superior. Neste cenário,a magnitude da distorção do tempo de pendência tende a ser superior ao efeito de captura, tornandoa taxa de crescimento descentralizada inferior à taxa ótima. Porém, se o tempo médio de exame daspatentes for suficientemente baixo, a sua distorção negativa acaba não superando a distorção para cima

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do efeito de captura. A taxa de crescimento torna-se então superior à taxa ótima, evidenciando os gastosexcessivos em P&D e uma corrida pelas patentes além do socialmente desejado.6

Na hipótese de haver crescimento insuficiente na economia descentralizada, de sorte que γ∗ <γ∗PS < γ∗∗, uma redução eficiente no tempo de análise e julgamento dos pedidos de patente podecontribuir para elevar a taxa de crescimento em direção à taxa socialmente ótima. Uma política deredução do tempo médio de pendência apresenta uma vantagem sobre uma política de subsídio oucompensação, pois o tomador de políticas não precisa identificar aqueles que devem ser corretamentebeneficiados, o que geralmente se mostra um desafio.7 De um modo geral, os escritórios de patentestêm como uma de suas principais metas a redução do tempo médio de pendência. No caso do Brasil,o INPI planeja reduzir o tempo médio de análise para 4 anos, visando com isso se enquadrar nopadrão internacional. Para este fim, o órgão conta com diversos projetos, como a contratação de novosexaminadores (455 examinadores até janeiro de 2014), a introdução de um novo sistema on-line, oe-patentes, e a opinião preliminar sobre patentabilidade.8 Segundo declarações da presidência do INPI, oórgão espera que as melhorias implantadas estimulem a inovação tecnológica, aumentando os pedidosde patente em 20%.9 Em consonância com os nossos resultados, podemos concluir que estes esforços doINPI contribuem para melhorar a eficiência do sistema de propriedade intelectual no Brasil, reduzindoa incerteza dos agentes e fomentando o progresso tecnológico.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho procuramos analisar a influência do tempo de pendência das patentes sobreo crescimento de longo prazo da economia, utilizando como base o modelo schumpeteriano decrescimento endógeno com avanço de qualidade. Nossos resultados mostram que há uma relaçãonegativa entre o tempo médio de pendência e as taxas de longo prazo, de forma que períodos de esperamais longos pela decisão da patente provocam uma redução no crescimento, na taxa de retorno, noprocesso de avanço tecnológico e no bem-estar da sociedade via perda de consumo no longo prazo.

As hipóteses aqui empregadas podem ser estendidas de diversas formas. Pode-se, por exemplo,admitir que o tempo de pendência é formado tanto por um componente aleatório como por umcomponente endógeno, o que permitiria avaliar os fatores responsáveis pelo aumento ou redução dotempo de espera pelas patentes. Pode-se supor também que as patentes requisitadas pelos setores maisavançados da economia são mais rapidamente concedidas devido ao acúmulo de conhecimento geradono escritório de patentes, na linha do que sugere Régibeau e Rockett (2010). Outro ponto relevanteseria considerar, a exemplo do que discute King (2003), que uma redução no tempo de pendência sem

6Se π/η = 0,1 teríamos γ∗∗ = 0,497% > γ∗ = 0,407% > γ∗PS = 0,227%. Neste caso a distorção gerada por um tempomédio de pendência de 5,4 anos não seria suficiente para trazer a taxa de crescimento abaixo da ótima, evidenciando umamaior magnitude do efeito business stealing.

7O governo também poderia contornar a distorção gerada pelo tempo de pendência através de um subsídio à pesquisa, deforma a compensar os pesquisadores pelo tempo em que esperam pela patente. Um subsídio à pesquisa reduziria os custos deentrada, elevando a taxa de inovação e a taxa de retorno. Porém, isto intensificaria o efeito business stealing, provocando umaredução no retorno esperado das invenções. Ademais, entre os principais problemas do subsídio à pesquisa estão a forma definanciamento do subsídio, que não pode ser distorciva, e a dificuldade em identificar corretamente os agentes que precisamser subsidiados.

8O sistema on-line e-patentes entrou em plena operação a partir de 20 de março de 2013 e permite que os inventores submetame acompanhem seus pedidos pela internet. Mais detalhes sobre o sistema podem ser obtidos em http://epatentes.inpi.gov.br. Já a opinião preliminar sobre patentabilidade, cujo programa piloto foi iniciado em 2012, consiste em um relatórioemitido por um examinador de patentes onde consta uma avaliação preliminar sobre a possibilidade do pedido de patente seraprovado. O objetivo é que o depositante obtenha uma opinião prévia do seu pedido de patente de forma mais rápida, em cercade três meses, o que garante mais segurança e agilidade na negociação da tecnologia. Informações adicionais sobre o processode opinião preliminar podem ser obtidas em http://www.inpi.gov.br/portal/artigo/opiniao_preliminar.

9Sobre a matéria do lançamento do e-patentes e a declaração do presidente do INPI, ver http://www.inpi.gov.br/portal/artigo/pedidos_de_patentes_ja_podem_ser_feitos_pela_internet.

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um correspondente aumento na eficiência dos exames pode distorcer o sistema, tendo em vista queos avaliadores do escritório de patentes poderiam não ter tempo hábil suficiente para realizar umexame minucioso de cada pedido, aumentando a probabilidade de ser concedida inapropriadamenteuma patente a uma invenção que não atende em sua totalidade os requisitos de patentabilidade. Estashipóteses, dentre outras, contribuiriam para enriquecer o modelo e permitiriam aprofundar a discussãosobre a importância da pendência das patentes para a formação das expectativas dos inventores e comoisto influencia na mudança tecnológica e no crescimento econômico.

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