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O mundo rural no Estado Novo, nas páginas do jornal A Manhã O artigo, que aqui está sendo apresentado, é um resumo da minha monografia de conclusão da graduação em História, que teve como título O mundo rural no Estado Novo nas páginas do jornal A Manhã. Irei apresentar, em algumas laudas, uma prévia dos argumentos abordados, que identificam o lugar do campo, dos trabalhadores rurais, da agricultura, e do mundo rural nas páginas do jornal A Manhã. Este meu trabalho não teve a intenção de encerrar com os assuntos, argumentos e exemplos sobre o tema, entretanto tomei a decisão de explorar uma nova área historiográfica, que tem um grande campo e muito rico para novas pesquisas. A historiografia sobre o assunto, em debate, é seguida de gerações de autores, que trouxeram novos caminhos e novas perspectivas para com o tema, “o campo e o trabalhador no Estado Novo”. Ligado à historiografia tradicional destacam-se Boris Fausto, José Murilo de Carvalho, Alcir Lenharo, entre outros. O primeiro apoia a tese da “Intocabilidade sagrada das relações sociais no campo”, então, o governo não ousava interferir nas relações sociais centenárias que havia no campo, entre latifundiários e os “operários do campo”, pois isto seria consequência de uma “espécie de compromisso tácito entre elas [oligarquias tradicionais], o governo e a burguesia industrial”. 1 Os estudos mais recentes baseiam-se em depoimentos orais dos trabalhadores do campo das décadas de 1930 e 1940, que desconstroem esta postura dos historiadores supracitados; e, cartas de camponeses agradecendo Vargas pelas melhorias nas suas condições de vida. Para servir exemplo será citado o depoimento oral de Álvaro Roldão, trabalhador rural no Rio de Janeiro: 1 DEZEMONE, Marcus. Do Cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987). Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal Fluminense, 2008. p. 140.

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O mundo rural no Estado Novo, nas páginas do jornal A Manhã

O artigo, que aqui está sendo apresentado, é um resumo da minha

monografia de conclusão da graduação em História, que teve como título O

mundo rural no Estado Novo nas páginas do jornal A Manhã. Irei

apresentar, em algumas laudas, uma prévia dos argumentos abordados, que

identificam o lugar do campo, dos trabalhadores rurais, da agricultura, e do

mundo rural nas páginas do jornal A Manhã. Este meu trabalho não teve a

intenção de encerrar com os assuntos, argumentos e exemplos sobre o tema,

entretanto tomei a decisão de explorar uma nova área historiográfica, que tem

um grande campo e muito rico para novas pesquisas.

A historiografia sobre o assunto, em debate, é seguida de gerações de

autores, que trouxeram novos caminhos e novas perspectivas para com o

tema, “o campo e o trabalhador no Estado Novo”.

Ligado à historiografia tradicional destacam-se Boris Fausto, José Murilo

de Carvalho, Alcir Lenharo, entre outros. O primeiro apoia a tese da

“Intocabilidade sagrada das relações sociais no campo”, então, o governo não

ousava interferir nas relações sociais centenárias que havia no campo, entre

latifundiários e os “operários do campo”, pois isto seria consequência de uma

“espécie de compromisso tácito entre elas [oligarquias tradicionais], o governo

e a burguesia industrial”.1

Os estudos mais recentes baseiam-se em depoimentos orais dos

trabalhadores do campo das décadas de 1930 e 1940, que desconstroem esta

postura dos historiadores supracitados; e, cartas de camponeses agradecendo

Vargas pelas melhorias nas suas condições de vida. Para servir exemplo será

citado o depoimento oral de Álvaro Roldão, trabalhador rural no Rio de Janeiro:

1DEZEMONE, Marcus. Do Cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008. p. 140.

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“aí Getúlio começou a resolver...criar aquela lei, a trazer o direito do

trabalhador, que essa lei que nós temos hoje, trabalhista, eu te

confesso, que tudo nós devemos a Getúlio Vargas. Tudo que nós temos

hoje devemos a Getúlio Vargas. Até a aposentadoria. Foi tudo projeto

dele. Então Getúlio foi um leão, foi um homem do maior respeito”2.

Os órgãos criados a partir de 1930, como o Instituto do Açúcar e do Álcool

(IAA) de 1933, e o Conselho Nacional do Café (CNC), foram “criados para

atenuar ou debelar as sucessivas crises atravessadas pelo setor agrícola de

exportação”.3 Esta citação serve para enfatizar os argumentos desenvolvidos

por esta nova historiografia, que demonstra logo após a Revolução de 1930

medidas adotadas para beneficiar o campo. Além desses institutos agrícolas,

decretos, que auxiliaram o cotidiano dos “operários dos campos” foram

elaborados pelo governo. Todavia isto será desenvolvido ao longo do trabalho.

A pesquisa tem a finalidade de somar com as novas visões trazidas por

estes historiadores, que abriram novas trilhas a serem desbravadas. Eu escolhi

o periódico A Manhã para conhecer este mundo e utilizei os “tempos festivos”4

para localizar os rastros deixados. Contudo, por que utilizei este periódico? E

por que os “tempos festivos”? Então, estas são as primeiras perguntas a serem

respondidas neste trabalho.

O A Manhã se tornou o jornal oficial do Estado Novo e responsável por

divulgar, perante a sociedade brasileira da época, as suas ações políticas e

econômicas, na cidade do Rio de Janeiro. É de extrema importância deixar

esclarecido que inúmeros periódicos, ao longo da história brasileira, receberam

este nome em várias regiões do Brasil. A Manhã pesquisado por mim foi criado

em 1941 – por este motivo o ano de 1941 é o primeiro ano a ser estudado

2DEZEMONE, Marcus. Do Cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008;p. 138.

3 Ibidem.

4 GOMES, Angela Castro; A Invenção do Trabalhismo. 3º ed. Rio de Janeiro: FVG, 2005.

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neste trabalho – e encerrou as suas funções em 1953. A principal razão para a

sua instalação foi a necessidade identificada pelo governo de ter um meio de

comunicação ligado às ideologias da política getulista, pois segundo Marieta

Morais Ferreira “embora mantida sob o controle da censura, a imprensa nunca

foi verdadeiramente favorável ao governo”.5

O cargo de Editor Chefe do jornal foi ocupado pelo escritor Cassiano

Ricardo, que ficou no cargo até meados de 1945. Membro da Academia

Brasileira de Letras, bacharel em Direito, ocupou cargos de chefia em diversos

jornais da época, entretanto foi por causa da sua obra O Brasil original, de

1937, que proporcionou-lhe um maior destaque do seu nome em relação aos

outros candidatos, isto ocorreu, porque esta obra trazia a ideia da “democracia

social como a terceira solução, sem o comunismo e fascismo”.6 A função do

seu cargo gerava reponsabilidades como, organização do conteúdo do jornal e

a coordenação de todo processo de formação do mesmo.

Além disso, Cassiano Ricardo, controlando os funcionários para que,

através das páginas do A Manhã, fossem transmitidas didaticamente os ideais

das Constituição de 1937, entre a sociedade carioca da década de 40.

Portanto, este periódico funcionava como ferramenta para difundir a

mentalidade dos donos do jornal, que enxergavam o Estado Novo como “um

regime forte (não ditatorial) para se colocar a democracia em estado de

legitima defesa”7.

A capitalização do jornal era ligada ao banco governamental. Por esta

razão suas crises foram devidas às instabilidades sofridas pelo governo. Sua

primeira crise, segundo a historiadora Marieta Ferreira, foi no ano de 1943 com

o Manifesto dos Mineiros, que acabou gerando o desligamento de vários

5 FERREIRA, Marieta de Morais. A Manhã (1941). Centro de Pesquisa e Documentação de História

Contemporânea do Brasil (CPDOC). Disponível

em:<http://www.fgv.br/cpdoc/busca/Pasta/PastaPesquisaConsultar.aspx>.

6 Ibidem.

7 Ibidem.

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funcionários do jornal. Todavia, a principal causa do problema financeiro era

causada pela má administração e do ideal do empreguismo8. Por isto,

Cassiano Ricardo pediu demissão do seu cargo, que foi ocupado pelo Coronel

Luís Carlos Costa Netto; o nome de Cassiano, como diretor, está presente no

periódico até o dia primeiro de julho de 1945 e já no dia três, uma terça-feira,

no lugar do seu nome já aparece o do Coronel Netto. Finalmente, o A Manhã

foi obrigado a encerrar os seus trabalhos no ano de 1953.

Respondendo agora a segunda pergunta, por que os “tempos festivos”?

Foi idealizado pelo governo um calendário de comemorações que tinha a

função de durar o ano todo, as datas analisadas no jornal, ao longo dos anos

de 1941 até 1945, foram: 1) Dezenove de Abril, aniversário do líder Vargas; 2)

Primeiro de Maio, Dia do Trabalhador; 3) Sete de Setembro, Dia da

Independência; 4) Dez de Novembro, aniversário do Estado Novo. Também

foram analisados os dia anterior e o posterior, a data comemorativa, o que

daria 12 datas ao ano, com um total de sessenta dias ao longo dos cinco anos,

mas isto não ocorreu, porquanto o jornal não era impresso às segundas-feiras

e muitos dos dias analisados caíram neste dia da semana. Esta minha

metodologia foi inspirada no mesmo critério adotado na tese de doutorado de

José Roberto Franco Reis, que entende estes eventos como responsáveis por

“divulgar os valores do Estado Novo e realçar a personalidade e o gênio

político de Getúlio Vargas”9. É de suma importância destacar que este

periódico, influenciado pela ideologia do Departamento de Imprensa e

Propaganda (DIP), buscou fortalecer e difundir um projeto de mitificação

varguista, que teve a sua origem no dia dezenove de Abril de 194110.

8Ibidem.

9 REIS, José Roberto Franco; Não existem mais intermediários entre o governo e o povo:

correspondências de Getúlio Vargas – o mito e a versão (1937-1945). Tese (Doutorado em História) -

Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de

Campinas, 2002. p.36.

10 Ibidem. p.34

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Uma breve passagem pela economia e política da década de 30.

Antes de citar as matérias do jornal é, preciso desenvolver as grandes

rupturas na história do Brasil geradas pelo ano de 1930. Marcado pela “dupla

crise”11, como Dezemone denomina a Crise de 1929 e a Revolução de 30,

muitas modificações políticas e econômicas ocorreram no Brasil.

Quanto ao ambiente político após a dupla crise, a Revolução de 30 o

tornava instável. Vargas e seus aliados, membros da Aliança Liberal e

militares, buscavam as modificações nas estruturas políticas, que tinham criado

suas profundas raízes nos governos oligárquicos, ao longo de toda Primeira

República (1889-1930). Devido a isto muitos políticos tiveram seus cargos

cassados pelo estado e interventores estaduais foram colocados à frente do

comando de inúmeros governos estaduais.

Nos aspecto econômico, a dupla crise “gerou acentuada queda no preço

dos gêneros agrícolas em escala mundial”12, afetando principalmente a

produção do açúcar, no Nordeste, e de café, no Sudeste. “As áreas voltadas à

lavoura de exportação foram seriamente atingidas [por exemplo] a Zona da

11

DEZEMONE, Marcus. Do cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História)- Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008.p.129.

12 Ibidem.

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Mata de Pernambuco, dedicada à produção canavieira (...) o setor cafeeiro,

responsável pelo principal produto de exportação do país, atravessou grave

crise quando muitas fazendas foram à falência”.13

O receio para os políticos que chegaram, logo após a crise, eram as

consequências nocivas da crise econômica. O deslocamento dos lavradores e

de suas famílias em direção à cidade e os problemas sociais, que isto

poderiam causar, eram os temores principais dos burocratas varguistas da

época. O êxodo rural, naquela época, eram causados por alguns fatores, entre

eles: 1) a crise agrícola acabou a acarretando uma substituição da produção do

café e cana-de-açúcar pela criação do gado, contudo este novo

empreendimento demanda menor quantidade de mão-de-obra, o que gerou o

deslocamento de inúmeros trabalhadores das fazendas em direção às cidades

mais próximas; 2) a ilusão no imaginário, da população rural da época, que a

cidade era um centro para a realização do sucesso pessoal, graças aos

melhores salários e condições de trabalho; 3) agitação social e o descontrole

da suposta ordem dos centros urbanos, poderiam facilitar a expansão das

propostas dos ideias “subversivos” dos comunistas.14

Sobre este segundo fator pode ser discorrido ainda outros comentários.

As tais melhorias de trabalho eram as consequências da implementação da

legislação social no meio urbano. Adalberto Cardoso, sociólogo, analisa esta

legislação como um projeto civilizacional desenvolvido por Vargas que nunca

chegou a ocorrer, pois o raquitismo do Estado Novo “foi um dos elementos

responsáveis por minar o berço das possibilidades de sucesso do

13

DEZEMONE, Marcus. Do cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008.p.129.

14 RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. A roça y La campana: A questão agrária sob o Varguismo e o

Peronismo em perspectiva comparada. Tese (Doutorado em História). Programa de Pós- Graduação em

História, Universidade Federal Fluminense. 2006. p.36.

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empreendimento estado-novista”,15 ou seja, foi uma medida burocrática que se

tornou uma “promessa utópica”16.

O inchaço das cidades, gerada pela “descontinuidade entre a legislação

aplicada ao trabalho urbano e ao trabalho rural” 17, era a grande aflição de

Vargas. Por esta razão, o líder do Estado Novo, auxiliado pelos burocratas da

época, juntos desenvolveram uma política agrária básica, que para Vanderlei

Ribeiro consistia em “incorporar ao modelo de desenvolvimento capitalista (...)

os trabalhadores rurais, fosse através da extensão de direitos trabalhistas já

existentes nas cidades, fosse pelo reforço em facilitar o acesso à terra aos

trabalhadores”.18

Todavia, qual seria a solução -ou soluções- encontrada para solucionar

esta tremenda crise econômica, que geravam consequências tão

desagradáveis para os políticos da época? O discurso proferido por Vargas, em

1930, esclarece quais são as suas propostas e intenções para o projeto de

reerguimento econômico brasileiro:

“O problema econômico pode-se resumir numa palavra: produzir,

produzir muito, produzir barato o maior número aconselhável de artigos

para abastecer os mercados internos, e exportar os excedentes das

nossas necessidades. Só assim poderemos dar sólida base econômica

ao nosso equilíbrio monetário, libertando-nos, não só dos perigos da

monocultura sujeita a crises espasmódicas, como também das

15

CARDOSO, Adalberto Moreira. A construção da sociedade do trabalho no Brasil; Uma nova

investigação sobre a persistência secular das desigualdades. Rio de Janeiro Ed: FGV,2009. p.206.

16 Ibidem.

17 LENHARO, Alcir. Colonização e Trabalho no Brasil. 2º edição. Campinas. Editora da UNICAMP,

1986. p.80.

18 RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. A roça y La campana: A questão agrária sob o Varguismo e o

Peronismo em perspectiva comparada. Tese (Doutorado em História). Programa de Pós- Graduação em

História, Universidade Federal Fluminense. 2006. p.36.

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valorizações artificiais, que sobrecarregam o lavrador em benefício dos

intermédios”19.

Este trecho deixa evidente que as principais reformas econômicas

estariam em garantir o desenvolvimento industrial e aumentar a diversificação

agrícola, tendo como base o mercado consumidor brasileiro, então, o

trabalhador do campo, haja vista, que a maior concentração demográfica

nacional está localizada no espaço rural. Era preciso fugir das crises

econômicas ocasionadas pela falta de consumo do mercado estrangeiro e,

consequentemente, transformar o lavrador rural em um consumidor.

Logo, foi através do A Manhã que eu identifiquei as inúmeras políticas

agrárias implementadas no Estado Novo e as medidas que buscaram pela

transformação do campesinato em um agente consumidor do mercado

nacional.

Uma prévia de exemplos do A Manhã

O primeiro exemplo retirado do A Manhã é, a ocupação de novas

regiões nacionais, que antes eram desabitadas, tal processo recebeu o nome

de “Marcha para Oeste”. Este serve para demonstrar, não somente, a

preocupação, mas toda a plataforma política voltada para beneficiar o campo e

concomitantemente o lavrador.

Segundo Vanderlei Ribeiro, a ocupação ocorreria sobre as terras

devolutas e latifúndios improdutivos, esta estratégia era defendida pelo Clube 3

de Outubro (grupo formado por militares e elite burocrática) e, segundo o

historiador, “colonizar em terra devoluta parecia ser o caminho ideal para fugir-

19

RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. Um novo olhar para a roça: o projeto agrário do Estado Novo e a

reação dos proprietários de terra (1937-1945). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio

de Janeiro. Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Programa de Pós-Graduação em História Social.

2002.p.31

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se ao confronto com o setor latifundista”.20 Contudo, para os autores de Terra

Prometida “toda ação colonizadora (...) buscada por Vargas irá chocar-se (...)

com um ordenamento fundiário caótico, desigual e concentrador”.21

Além disso, analisando as matérias, sobre este projeto governamental, é

possível constatar duas propostas ideológicas, a primeira é, legitimar a

ocupação utilizando a nostalgia histórica, já a segunda é, que a “refacção do

desenho cartográfico, permitia a propaganda ideológica criação de um especial

clima de participação política, emotiva e ilusória”.22

O trecho que será citado permite constatar estas duas afirmações.

“Caracteriza-se o espírito gaúcho pelo amor à vida simples do campo

(...) Foi a estância, montado a cavalo e pastoreando o gado, que o

homem escreveu a história da terra. E a terra, ampla, descoberta,

infinita, criou o homem desassombrado, forte, confiante em si mesmo

(...) Podem as cidades crescer e apresentar todas as atrações, mas o

espírito gaúcho não esquece a serenidade do campo onde nasceu (...)

Ideias de liberdade que exaltaram os combates da Revolução

Farroupilha (...)23.

A estatização de latifúndios improdutivos24 ocorreu efetivamente no

Brasil, por que

“as múltiplas empresas incorporadas ao patrimônio da União, em 1940, pelos

decretos 2073 e 2436 enfeixaram, sob uma só administração (...). Um surto

20

RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. A roça y La campana: A questão agrária sob o Varguismo e o

Peronismo em perspectiva comparada. Tese (Doutorado em História). Programa de Pós-Graduação em

História, Universidade Federal Fluminense. 2006.p.66.

21 LINHARES, Maria Yedda Leite e TEXEIRA DA SILVA, Francisco Carlos. Terra prometida: uma

história da questão agrária no Brasil. Rio de Janeiro: Campus, 1999. p.108.

22 LENHARO, Alcir. Colonização e Trabalho no Brasil. 2º edição. Campinas. Editora da UNICAMP,

1986. P.13

23 A Manhã. Rio de Janeiro, p:28. 9 de novembro de 1941.

24 LENHARO, Alcir. Colonização e Trabalho no Brasil. 2º edição. Campinas. Editora da UNICAMP,

1986. p.29

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novo foi se imprimindo nos inúmeros setores da atividade produtora daquelas

empresas, cujo espírito de unidade e de entrosagem constituiu, desde logo,

uma garantia de sucesso”.25

Estas, que foram desapropriadas, eram divididas em fragmentos menores e

depois seriam distribuídas entre os pequenos lavradores, que quisessem e

preenchessem os pré-requisitos desenvolvidos e exigidos pela cúpula

burocrática do Estado Novo. As exigências do Estado eram muitas como,

“brasileiros maior de 18 anos; estrangeiro somente se qualificado; funcionários

públicos, federais, estaduais e municipais não recebiam (...)”.26 Estes pré-

requisitos demonstram o caráter autoritário das medidas estatais27.

Mas qual seria a origem deste pequeno lavrador, que colonizara as

terras desapropriadas? Alcir Lenharo afirma que os nordestinos foram os

principais a serem utilizados neste processo de ocupação territorial (Rio de

Janeiro e Amazônia), segundo o mesmo autor isto ocorria, pois era uma

estratégia para diminuir as tensões sócias existentes naquela região28, haja

vista os anos anteriores da República Velha, com as suas conflagrações entre

os coronéis e os sertanejos (Canudos e Cangaço).

Outra propaganda governamental, que tinha a finalidade de incentivar a

ocupação de regiões com pouca densidade demográfica, era, a “Batalha da

Borracha”.

“Com advento da guerra, e a posterior intervenção nipônica, no conflito,

ressentiram-se os aliados das grandes reservas asiáticas de borracha. Em

consequência disto, voltaram-se as atenções para o Brasil, em cujas terras

25

A Manhã. Rio de Janeiro, p13 19 de novembro de 1941.

26 LENHARO, Alcir. Colonização e Trabalho no Brasil. 2º edição. Campinas. Editora da UNICAMP,

1986. p.53

27 RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. A roça y La campana: A questão agrária sob o Varguismo e o

Peronismo em perspectiva comparada. Tese (Doutorado em História). Programa de Pós-Graduação em

História, Universidade Federal Fluminense. 2006. p.67.

28 LENHARO, Alcir. Colonização e Trabalho no Brasil. 2º edição. Campinas. Editora da UNICAMP,

1986. p.20.

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setentrionais se acumulam reservas inesgotáveis daquele produto. E o governo

brasileiro deflagrou, de pronto, a batalha da borracha, no sentido de atender a

uma necessidade dos nossos grandes aliados. E o Amazonas, particularmente,

tornou-se o centro de uma atividade soberba”29

Segundo o ponto de vista de Vanderlei Ribeiro, ambas as propagandas,

“Marcha para o Oeste”30 e “Batalha da Borracha”31, foram um fracasso,

porquanto não conseguiram realizar as suas propostas.

Quando é feito uma análise histórica do processo de colonização nas

terras brasileiras chega-se a conclusão que esta apenas ampliou o poder dor

grandes fazendeiros. Para isto não ocorrer, os políticos estadonovistas

deveriam investir numa infraestrutura, sendo a rede de transporte a principal,

pois facilitaria o deslocamento da produção até os mercados consumidores

mais próximos32. Esta visão foi desenvolvida por Caio Prado Junior em um

artigo chamado: Problemas de povoamento e a pequena propriedade.

As novas citações do jornal irão seguir este raciocínio, pois é de

fundamental importância a conquista territorial e expansão da fronteira

brasileira estarem atreladas à proposta de instalação de infraestrutura no

campo, para facilitar na permanência do colono nos “espaços vazios” e, além

disso, no escoamento da produção para abastecer o grande mercado

consumidor, localizado no litoral, e no mercado externo.

O prefeito do Distrito Federal, Henrique Dodswoth, foi citado pelo

periódico, no dia 9 de novembro de 1941, como responsável pela

29

A Manhã. Rio de Janeiro, p 20, 19 de abril de 1944.

30 RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. Um novo olhar para a roça: o projeto agrário do Estado Novo e a

reação dos proprietários de terra (1937-1945). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio

de Janeiro. Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Programa de Pós-Graduação em História Social.

2002.p.66

31 Ibidem. p.64

32 RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. A roça y La campana: A questão agrária sob o Varguismo e o

Peronismo em perspectiva comparada. Tese (Doutorado em História). Programa de Pós-Graduação em

História, Universidade Federal Fluminense. 2006. p.71

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pavimentação de rodovias na intenção de desenvolver o projeto, “Rumo ao

Subúrbio”, que consistia na ocupação da zona rural carioca, proporcionando

melhoria para o pequeno lavrador carioca. Por esta razão foi desenvolvida

“a construção das estradas Pica-Pau-Muzema, e a da Tijuca, fazendo

ligação com Itanhagá Golf Clube, e a Avenida Geremário Dantas,em

Jacarepaguá (...) toda faixa terá 72.000 metros quadrados [que já estão]

concluídos. A estrada ligando Jacarepaguá a Grajaú, numa extensão de

5 quilômetros e com 20 metros de largura (...) Rio-Petrópolis, aterrando

a zona pantanosa de Manguinhos, cortando Bonsucesso (...) essa

estrada já está com um magnífico trecho de pavimentação concluído,

medindo 3 quilômetros e 200 metros, numa área de 32 mil metros

quadrados”.33

Estas obras seguiam a estratégia que “a roça [deveria estar] a dois

passos da cidade, ligadas ambas, nessa simbiose perfeita, porque uma e outra

se exigem, se permutam em benefícios”.34 Portanto, através desta reportagem,

é possível compreender que estas obras buscavam solucionar um, possível,

problema de escoamento de produção.35

Todavia não foram construídas somente estradas. Em uma série de

reportagens, chamada Flagrantes de uma excursão por um mundo sem fim, é

possível comprovar a criação da estrada de ferro Santos-Santa Cruz de La

Sierra, que faria a ligação entre o Brasil e a Bolívia, e também é possível

visualizar os benefícios trazidos para região da cidade de Corumbá: as “obras

da ferrovia [proporcionou] o aumento da população, a alta do gado e o

desenvolvimento considerável da indústria extrativista, proporcionando visível

prosperidade a Corumbá”. 36

33

A Manhã. Rio de Janeiro, p.30, 9 de novembro de 1941.

34Ibidem.

35 A Manhã. Rio de Janeiro, p.30, 9 de novembro de 1941

36 A Manhã. Rio de Janeiro, p3, 6 de setembro de 1944

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Na tese de doutorado de Vanderlei Ribeiro, A roça y la campana, tem

um espaço, intitulado Agricultura e a Indústria: uma relação de

complementariedade, onde este traz informações e argumentos que

comprovam que, ao longo do Estado Novo, foi feita uma política pública voltada

para efetivar esta associação. Logo, para um desenvolvimento sólido da

economia brasileira, ambas as atividades devem caminhar juntas, pois sabe-se

que os recursos para as matérias primas da indústrias estão no meio rural.

Com as reportagens foi possível validar esta visão.

Como já foi citado anteriormente, no ano de 1940, foram criados os

decretos 2073 e 2436, que incorporaram múltiplas empresas em uma só

administração, esta nova empresa ganhou o nome de Acervo da Brasil Railway

Co. e Empresas Incorporadas.37 Segundo o periódico, eram cinco as empresas

que mais se destacavam dentro desta administração: a Companhia Indústrias

Brasileiras (localizada no estado do Paraná e era a maior fábrica de papel do

Brasil); Southern Brasil Lumber ; Colozination Company Incorporada (ambas

localizada no estado de Santa Catarina e elaboravam caixas de madeira) Brasil

Land Cattle e Packing Co. Inc (ambas controlavam fazendas de gado, nos

estados de Mato Grosso, Minas Gerais e São Paulo, para o desenvolvimento

de charque e manteiga)38. Um maior detalhamento, sobre estas empresas, é

encontrado no dia 9 de setembro de 1941.

Em outra matéria, que leva o título “O aproveitamento da racional da

laranja e a sua industrialização”39 é um exemplo fidedigno que legitima a

proposta trazida, por Vanderlei Ribeiro, de complementariedade entre indústria

e agricultura.

37

A Manhã. Rio de Janeiro, p4, 9 de setembro de 1941.

38 A Manhã. Rio de Janeiro, p13, 9 de setembro de 1941.

39 A Manhã. Rio de Janeiro, p8, 9 de novembro de 1941.

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O contexto internacional de Segunda Guerra Mundial (1939-1945) levou

o Brasil buscar matrizes energéticas para diminuir a dependência econômica

perante o petróleo, que, segundo o A Manhã, passava por uma crise40.

A matéria do dia 18 de abril de 1942 traz, na manchete do jornal, a

informação do óleo de rícino, derivado da mamona, que servia de lubrificante

para motores aéreos. Todavia, seria com o “carburante nacional”, o álcool, que

o Estado Novo tentaria buscar soluções para a crise de abastecimento de

petróleo. Por isto, o governo elaborou “a política do álcool-motor no Brasil [que]

só poderia alicerçar-se numa planificada ação financeira, movida direta e

exclusivamente pelo IAA (Instituto do Açúcar e do Alcool)”.41

Ao longo das páginas do jornal são possíveis serem encontrados

inúmeros exemplos de projetos governamentais desenvolvidos, que buscam

melhorar a condição do trabalhador e da sua família, ambos localizados no

campo. A Comissão Brasileira-Americana de Produção de Gêneros

Alimentícios (C.B.A) era uma entidade estatal responsável pelo combate contra

a desnutrição, chegando a informar que o suprimento total agrícola brasileiro é

insuficiente para alimentar toda a nação;42 ademais há um estratégia para

disseminar o ensino agrícola nas escolas primárias, localizadas em todo meio

rural brasileiro e, segundo o A Manhã, a função destas escolas é, ajudar no

“levantamento do nível econômico, moral e social da terra”;43 informações que

enumeram os diversos açudes construídos no Nordeste44, para luta contra seca

da região; o envio da Assistência Social para regiões do Nordeste e Norte que

têm um nível muito elevado de mortalidade, por causa da falta de saneamento

40

A Manhã. Rio de Janeiro, p22, 10 de novembro de 1942.

41 Ibidem.

42 A Manhã. Rio de Janeiro, p3, 11 de novembro de 1943.

43 A Manhã. Rio de Janeiro, p12, 7 de setembro de 1941.

44 A Manhã. Rio de Janeiro, p4, 18 de abril de 1942.

Page 15: O mundo rural no Estado Novo, nas páginas do jornal A ... · 4 GOMES, Angela Castro; ... social como a terceira solução, ... muitas modificações políticas e econômicas ocorreram

básico45. Mais informações sobre este exemplos são possíveis serem

encontrados na minha monografia.

Não poderia finalizar o raciocínio e deixar de citar o processo de

extensão das leis trabalhistas para o meio rural, sendo que, este é o clímax do

meu artigo. Como já apresentado, a historiografia, que ainda é hegemônica,

principalmente, dentro, de quase todos, os livros didáticos do Brasil, afirmam

que não ocorreu a incorporação do benefício legislativo, por parte dos

trabalhadores rurais. A minha proposta é comprovar o inverso, demonstrando

argumentos e exemplos validados, graças à uma investigação científica e

citações de historiadores, que estimularam todo o estudo.

Para começar citar-nos-emos um objeto que é pouco estudado, o

processo de sindicalização rural. Esta matéria, de 9 de setembro de 1941,

demonstra notoriamente as intenções do regime estadonovista perante estas

organizações de trabalhadores:

“A sindicalização das classes rurais é um dos problemas atualmente em

maior evidência no país (...) compreende a imperiosidade da solução do

problema da sindicalização das classes rurais, não somente para que

estas possam afinal gozar de benefícios de uma legislação social

adequada, como também, e principalmente, para que a própria nação

posso completar o seu quadro de organização constitucional. O carinho

com que o senhor Getúlio Vargas vem se dedicando ao assunto diz

bem de sua importância social e jurídica”.46

Uma peculiaridade, que pode ser destacada é, o jornal transmite a ideia

que o benefício jurídico é uma “benevolência” varguista. Contudo a tese de

Vanderlei Ribeiro traz o relato da reivindicação dos Trabalhadores Agrícolas

45

A Manhã. Rio de Janeiro, p7, 19 de abril de 1942.

46 A Manhã. Rio de Janeiro, p3, 9 de setembro de 1941.

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em Campos, que aspiravam o direito da greve, estender a legislação para o

campo e a luta contra a pobreza no campo.47

No 10 de novembro de 1944, o decreto lei 7038 entrou em vigor e

implementou a Lei de Sindicalização Rural, intensificando a proposta de

organização dos trabalhadores em sindicato. Precisa ser levado em

consideração que “nada melhor do que sindicalizar o trabalhador rural, pô-lo

em contato com a burocracia do Ministério do Trabalho e conceder-lhe alguns

benefícios, por mais superficiais que fossem”,48 resultando no aumento da

popularidade de Vargas e favorecendo lhe em futuras eleições, após o término

do Estado Novo. A sindicalização rural seguiu as mesmas bases das leis de

1931 e 1939, que promoveram a sindicalização dos trabalhadores urbanos.49

A fim de que possa compreender a tamanha importância desta lei, no dia

seguinte, o jornal trouxe o anúncio desta lei estampada, em letras garrafais, na

primeira página e em outras duas, porque a lei foi escrita por completa.

A sindicalização visualizada nas matérias do periódico buscam legitimar

as teses dos historiadores Marcus Dezemone e Vanderlei Ribeiro. O discurso

declamado pelo, então Ministro do Trabalhado, Marcondes Filho demonstra a

importância e a autenticidade do decreto 7038: “a quinta parte da nossa

população total trabalha e vive nas lavouras (...) torna-se inadiável estabelecer

com clareza e força de lei e obrigações de cada um (...) [além disso] os

benefícios devem ser ampliados aos operários rurais (...). É imprescindível

47

RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. A roça y La campana: A questão agrária sob o Varguismo e o

Peronismo em perspectiva comparada. Tese (Doutorado em História). Programa de Pós-Graduação em

História, Universidade Federal Fluminense. 2006. p.207

48RIBEIRO, Vanderlei Vazelesk. Um novo olhar para a roça: o projeto agrário do Estado Novo e a

reação dos proprietários de terra (1937-1945). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio

de Janeiro. Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Programa de Pós-Graduação em História Social.

2002.p.45

49 DEZEMONE, Marcus. Do cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008.p.148

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elevar a capacidade aquisitiva de todos brasileiros.50 Mais trechos dos

discursos, que seguem esta ideologia, podem ser encontrados em outros dias

no A manhã.

O Estatuto da Lavoura Canavieira, que entrou em vigor no dia 21 de

novembro de 1941, foi colocado na íntegra na edição do dia 27 de novembro

de 1941. O benefício abrangia vários setores sociais, entre os auxílios

estavam: “garantias de salários, moradia, assistência médica e educacional,

além de indenizações por demissão sem justa causa para os moradores,

equiparados a fornecedores, desde que no sistema de colonato, parceria ou

renda”.51

A importância é tamanha desde benefício, que no dia 9 de dezembro

1941, citado, pelo A Manhã dois telegramas enviados ao interventor Amaral

Peixoto. O primeiro é do Sr. Anísio Pereira, que se diz lavrador e membro do

Sindicato Agrícola:

“ com os meus melhores votos de regresso ao país, queira

aceitar as minhas felicitações e agradecimentos pela reforma da lei 178.

Vossa Excelência concorreu com grande prestigio para a alforria de

milhares de homens que viviam na escravidão. Os lavradores campistas

patentearão oportunamente seu reconhecimento e sua gratidão e ao

super-homem, o nosso grande chefe, Dr. Getúlio Vargas”.52

O trecho da missiva que relata que o Estatuto libertaria milhares de homens da

escravidão é algo muito importante, que legitima a visão desenvolvida pela

historiadora Hebe Mattos e Ana Rios que afirma que o fim do cativeiro, para os

50

Discurso de Getúlio Varas proferido por Marcondes Filho. A Manhã. Rio de Janeiro, p7, 16 de

novembro de 1944.

51 DEZEMONE, Marcus. Do Cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008. p.148

52 A Manhã. Rio de Janeiro, p2, 9 de dezembro de 1941.

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descendentes de escravos ocorreu no governo do Getúlio Vargas.53 Em outra

edição do mesmo ano, mas de 7 de setembro, a primeira página do periódico

informa sobre um ex-escravo, chamado Chico Preto que escreve uma carta

para Vargas,

“existe no município de São João da Boa Vista, neste estado [São Paulo], um

antigo escravo que chefia hoje uma família de 19 filhos e numerosos netos. O velho

Chico Preto dirigiu um pedido ao presidente Vargas, para que seja facilitada a

aquisição legal de uma casinha que lhe deram e onde pretende passar o resto dos

seus dias”.54

A Lei de Sindicalização Rural e o Estatuto da Lavoura Canavieira foram

apresentadas como a conclusão da chegada das leis trabalhistas ao meio rural,

favorecendo o campesinato brasileiro. Porém, com o fim do Estado Novo e o

começo da instalação de uma democracia de cunho liberal, as leis que

beneficiavam o campo “ não foram regulamentadas e tampouco integraram o

novo ordenamento jurídico democrático. O decreto-lei da sindicalização rural,

por exemplo, sofreu forte oposição da poderosa Sociedade Rural Brasileira que

usava os (...) adjetivos para desqualificar a medida considerada ‘fascista e

autoritária’”.55

Conclusão

Então, diante, deste inúmeros relatos trazidos do periódico A Manhã, é

possível constatar que o “mundo rural” tinha o seu espaço dentro do projeto

governamental do líder Getúlio Vargas. Este trabalho é, apenas, mais uma

conclusão, de uma pesquisa científica, que utilizou as novas abordagens

historiográfica para estruturar um novo caminho, sobre uma história há muito

53

RIOS, Ana Lugão e MATTOS, Hebe. Memórias do Cativeiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,

2005.

54A Manhã. Rio de Janeiro, p1, 7 de setembro de 1941.

55 DEZEMONE, Marcus. Do Cativeiro à Reforma Agrária: colonato, direitos e conflitos (1872-1987).

Tese (Doutorado em História) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal

Fluminense, 2008. p.156.

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tempo conhecida. É importante ratificar que minha intenção não é encerrar com

o assunto, muito pelo contrário, tenho a convicção que muita pesquisa ainda

precisa ser feita sobre este tema, que aqui foi explanado.

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