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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11& 13thWomen’s Worlds Congress(Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017,ISSN 2179-510X
O QUE É JUSTIÇA? DIÁLOGOS COM MULHERES SOBRE A LEI MARIA DA
PENHA
Aline Lemos da Cunha Della Libera1
Resumo: Com base na necessidade de alternativas em rede para o atendimento e proteção de mulheres em
situação de violência racial e de gênero em diversos âmbitos (doméstico, no trabalho, no ambiente de estudos,
etc.) e ao encontro de propostas que primam pela efetivação dos Direitos Humanos das Mulheres (Teles, 2006), a
pesquisa aqui apresentada teve como objetivo compreender “o que é justiça?” para um grupo de mulheres
residentes em bairros populares na cidade de Porto Alegre (RS - Brasil), as quais apresentavam demandas em
que os limites da/na legislação dificultavam o encaminhamento da denúncia ou uma análise dos fatos. O
caminho metodológico adotado foram os grupos de discussão (Weller, 2006), com o objetivo de contribuir na
busca por alternativas para a superação da opressão vivida, com vistas ao empoderamento das mulheres, partindo
do seu conceito de justiça e analisando-o criticamente. Uma das questões que nos parecem fundamentais para
uma compreensão crítica quanto aos Direitos Humanos das Mulheres é que as situações de violência
vivenciadas, em muitos casos, não são reconhecidas, por elas mesmas, como tal. Várias questões sociais,
culturais e religiosas podem contribuir para esta recorrência, em que se justificam as violências de forma a
obscurecê-las, atentando para o fato de que as formas de opressão, que algumas mulheres vivenciam, são muito
sutis e constantes.
Palavras-chave: Direitos Humanos das Mulheres, Lei Maria da Penha, justiça, processos educativos não
escolares.
Neste artigosão apresentados alguns dos resultados de uma pesquisa2 realizada com
mulheres residentes em bairros da periferia da cidade de Porto Alegre (RS – Brasil).
Observamos de modo participativo um grupo de artesanato3 no qual as mulheres de uma
comunidade se reuniam para confeccionar flores de fuxico, juntamente com estudantes de
graduação4. Durante os encontros, em meio aos trabalhos manuais, as mulheres e as
estudantes relatavam situações vivenciadas em seu cotidiano. O artesanato, portanto, tornou-
se contexto e pretexto para o diálogo com as integrantes do grupo, a fim de encontrar
elementos que possibilitassem compreender qual o conceito de justiça que elas possuíam,
levando em consideração os aspectos vinculados à Lei Maria da Penha. A curiosidade sobre
estes temas surgiu das inquietações oriundas do contato da pesquisadora com mulheres em
1Doutora em Educação. Professora do Departamento de Estudos Especializados da Faculdade de Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil. 2Pesquisa financiada pelo CNPq (Edital nº 20/2010), realizada de 2010 a 2012. Título: Justiça com as próprias
mãos: grupos de discussão e trabalhos manuais com mulheres negras atendidas pela Maria Mulher - os limites
da/na legislação e a possibilidade de construir coletivamente alternativas viáveis para a superação de situações
de opressão. 3 Este grupo foi constituído, a partir de uma ação de extensão ofertada pela Faculdade de Educação da UFRGS,
denominada “Justiça com as próprias mãos”, a qual objetivou acompanhar e, de acordo com a necessidade,
fomentar grupos de artesanato para mulheres em situação de violência familiar e doméstica, explícita ou não,
buscando rever conceitos de justiça, violência contra mulher e empoderamento. Os encontros foram realizados
na OnG Maria Mulher – organização de mulheres negras. A pesquisa foi iniciada em concomitância com a
formação do grupo de artesanato. 4 Participavam do grupo, bolsistas de iniciação científica e de extensão.
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situação de violência familiar e doméstica e outras violações (CUNHA, 2005; 2010). As
matrizes metodológicas encontram-se na pesquisa e na observação participantes (Brandão e
Streck, 2006), bem como na pesquisa-formação (Josso, 2004). Como forma de coleta das
informações, buscamos o referencial dos grupos de discussão (Weller, 2006), os quais são
próximos aos “círculos de cultura” descritos por Paulo Freire. De forma visível, ninguém
ocupa um lugar proeminente e por isso “o diálogo deixa de ser uma simples metodologia ou
uma técnica de ação grupal e passa a ser a própria diretriz (...)” (Brandão, 2008, p. 77).Por
esta mesma via, os grupos de discussão, surgidos na pesquisa social empírica realizada pelos
integrantes da Escola de Frankfurt a partir dos anos 1950, “constituem uma ferramenta
importante para a reconstrução dos contextos sociais e dos modelos que orientam as ações dos
sujeitos” (Weller, 2006, p. 246). Isso se dá porque estes grupos “representam um instrumento
por meio do qual o pesquisador estabelece uma via de acesso que permite a reconstrução dos
diferentes meios sociais e do habituscoletivo do grupo” (Weller, 2006, p. 247). Para este
texto, considerando o tema central, apresentam-se as situações vivenciadas nos encontros, as
quais envolveram quatro mulheres: Dona Florisbela, Dona Josi, Dona Cristina e Silvana5.
“Sou um livro aberto, com algumas páginas arrancadas”6: a dificuldade em reconhecer
situações de violência e os ensinamentos de Dona Josi.
Uma das questões que nos parecem fundamentais para uma compreensão crítica
quanto aos Direitos Humanos das Mulheres é que as situações de violência, em muitos casos,
não são reconhecidas, por elas mesmas, como tal. Várias questões podem contribuir para esta
recorrência, em que se justificam as violências de forma a obscurecê-las. O fato de estarem
presentes em nosso cotidiano, bem como imbricadas na cultura paternalista, machista e
androcêntrica que vivenciamos na sociedade gaúcha, por exemplo, a qual é corroborada por
elementos do patrimônio material e imaterial que ainda subalternizam práticas e
conhecimentos atribuídos às mulheres, pode ser uma das justificativas. Sendo assim, também
podemos considerar que as formas de opressão são muito sutis e constantes.
Outra questão a ser destacada é que, mesmo reconhecendo as situações de violência,
muitas mulheres não logram o apoio necessário para enfrentá-la, seja porque suas possíveis
interlocutoras as veem como “coitadas” que estão fadadas ao infortúnio, seja porque as
5 Nomes fictícios escolhidos pelas mulheres. Todas elas eram adultas ou idosas. 6 Baseada na declaração de Dona Josi, durante um dos encontros do grupo sobre a necessidade de esquecer ou
não falar sobre algumas situações vivenciadas.
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consideram “merecedoras” ou “culpadas” pela situação. Além disso, a morosidade e a
ineficácia dos aparatos públicos no julgamento destes casos, para a comprovação dos crimes
no caso de violência psicológica e assédio ou para reduzir os trâmites nos casos de agressões
com lesão corporal, também condicionam as mulheres a permanecerem na situação de
violência, pois do ponto de vista prático, são realizadas conciliações sem conciliação, muitas
vezes. Mais ainda, muitas mulheres dos grupos populares ainda se sentem desprotegidas,
tendo em vista o número restrito de abrigos, casas de passagem, dentre outros suportes
necessários para o enfrentamento à violência.
E o que propomos diante deste quadro? É necessário pensar “educativamente” sobre a
Lei Maria da Penha. Isto quer dizer que, não basta divulgá-la, no intuito de que as mulheres a
conheçam, pois elas já a conhecem e têm conceitos de justiça bem peculiares. WâniaPasinato
(2010, p.225) salienta que
o que se sabe através das pesquisas de opinião é que a Lei Maria da Penha atingiu
uma popularidade nunca visa na sociedade brasileira: pesquisa nacional realizada
pelo IBOPE e o Instituto AVON, em 2009, mostrou que 78% das pessoas entrevistas
(homens e mulheres) conhecem a Lei. A pesquisa de opinião realizada em Belo
Horizonte encontrou que 94,7% das entrevistadas disseram saber que existe uma
legislação específica para o enfrentamento da violência contra a mulher, sendo que
43% entendem que a lei serve para a proteção das mulheres.
Pesquisa realizada em 2008 pela Themis7 mostrou que em torno de 68% das mulheres
conheciam a Lei Maria da Penha (Pasinato, 2010). Portanto, sugerimos que os coletivos de
mulheres, com diferentes propostas (já que o artesanato não pode ser considerado como
relevante para todas as mulheres) sejam fomentados e passem a compor de forma mais
recorrente, as iniciativas para efetivação dos Direitos Humanos das Mulheres, conforme
previsto na Lei Maria da Penha. Poderíamos aqui elencar ainda outros elementos a serem
considerados nessa luta pelo fim da violência, mas opta-se por destacar a necessidade de que
as mulheres logrem empoderar-se em seu cotidiano, atentando para a reprodução do
androcentrismo e do machismo em seu dia-a-dia. No âmbito das propostas educativas,
fomentar espaços de diálogo e reflexão é uma tentativa de provocar outros sentidos para a
compreensão da justiça e do feminismo, até então concebidos com base na dureza da vida.
7Themis Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero é uma organização feminista sediada em Porto Alegre. A
referida pesquisa está registrada no site da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SEPM – PR). Disponível
em: <http://www.sepm.gov.br/subsecretaria-de-enfrentamento-a-violencia-contra-as- mulheres/ lei-maria-da-
penha/2008-pesquisa-ibope-themis.-dois-anos-de-lei.pdf>
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Silvana não é culpada, nem coitada: é mulher.
Uma das maiores dificuldades narradas pelas mulheres para superação da violência
vivida, como vimos, é a falta de apoio. Bandeira (2002) apresenta uma reflexão sobre a
atuação das Delegacias Especializadas no Atendimento às Mulheres (DEAM).Destaca alguns
elementos, dentre eles a
Importância das organizações de mulheres em processos grupais; o grupo de apoio
às mulheres agredidas, como uma experiência inicial de apoio e estímulo, ajudava-
as nas escolhas, seja em busca de coragem e autonomia, seja da necessidade de
realizar a denúncia, incentivando-as a procurar a DEAM. Em outras palavras, ao
estimular as capacidades de autoestima dessas mulheres, a atuação desses grupos
dava-lhes, condição de autonomia para enfrentarem o medo e a perseguição,
tornando-se mais livres. (SUÁREZ e BANDEIRA, 2002 apud BANDEIRA, 2009,
p. 414)
Certa vez, uma das mulheres do grupo apresentou quadros de depressão e ausentou-se
por um tempo. Dona Josi tinha dúvidas sobre a depressão da colega de grupo, apontando que
a mesma ia para bailes e outras festas sem apresentar este quadro e que, se a filha desta
mulher era usuária de drogas, a culpa era da mãe que batia ao invés de conversar. Por outro
lado, outra mulher manifestou pena, sempre se referindo à colega como: “Coitada da Fulana”.
As opiniões também eram divididas no caso de Silvana. Esta integrante narrava situações de
tensão e conflitos: um ex-marido violento que residia no mesmo pátio, um filho
desempregado e com graves problemas de saúde, além das suas atribuições no cuidado de
ambos, dando conta da sua própria fragilidade diante da falta de assistência médica para as
doenças que tinha.
Com estes dois posicionamentos presentes no grupo, os quais se manifestavam de
diferentes formas, refletimos que nenhum deles, de fato, contribuía para a superação da
situação vivenciada pelasmulheres. Ser a culpada ou a coitada, não problematiza a opressão
vivida. Qualquer uma das duas posturas, de vítimas ou de algozes, não contribui para a sua
emancipação. A vítima está fadada a vivenciar suas mazelas. A culpada deve continuar
vivenciando-as porque as merece. Sendo assim, estas posturas mantêm a situação como está,
impossibilitando um olhar que a complexifique.
Num primeiro momento, ao ingressarmos no debate sobre este tema, víamos que
quando referida a Lei Maria da Penha, o termo “vítimas” era associado a elas. Esta forma
jurídica de abordagem, onde existe réu e vítima, nestes casos, coloca as mulheres em situação
de passividade, onde o empoderamento fica prejudicado ou se torna tardio. Da mesma forma,
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se são vistas como culpadas e se mereciam o que receberam, tal ideia contribui para a
perpetuação de uma lógica, oriunda do pensamento judaico-cristão, onde a penitência, o
sofrimento e o castigo são decorrentes de atos de infração. As mulheres, por serem pecadoras,
devassas, malcriadas ou por provocarem, merecem que os homens as controlem com palavras
ou atos, se adotados estes princípios. Duplamente subjugadas, o são pelos homens e pelas
próprias mulheres. A cisão entre elas, apontada por Lagarde y de Los Ríos (2005), mais uma
vez surge corroborando que o machismo, o androcentrismo e o sexismo se perpetuem, já que
não se solidarizam com as causas das companheiras para além de julgá-las como isto ou
aquilo.
“Meus buracos, cravadas e fincões...”: Dona Cristina, as vivências do corpo e da
sexualidade.
Percebemos que na luta contra a violência familiar e doméstica, cabe pensar nestes
corpos subjugados e presos que todas as mulheres possuem em uma sociedade patriarcal.
Conforme nos sugere Lagarde y de Los Ríos (2005), vivenciamos nossos cativeiros de alguma
forma e aprendemos com eles. Certamenteestas prisões referem-se ao trato do corpo como
“dos outros” (do marido, dos filhos...) e à forma, por vezes violenta, com que as mulheres se
relacionam com ele ou permitem, por seus condicionamentos, que ele seja visto e tratado. Os
casos de estupro e a forma como as mulheres lidam com as relações sexuais, como obrigação
diante do seu parceiro, sugerem que isto se materializa no cotidiano.
Durante o grupo de artesanato, após alguns meses de convívio, as mulheres passaram a
manifestar conotações sexualizadas aos diferentes objetos que manipulavam. Contudo, é
importante ressaltar que esta conotação, de forma direta ou indireta, remete à relação sexual
entre homem e mulher e, raramente, vincula-se ao conhecimento mais aprofundado de seu
próprio corpo. Também, pelo uso de alguns termos como “meu buraco”, “cravada”, “fincão”,
reproduziam ideias que centralizam no homem a relação sexual. A compreensão da partilha,
que poderia ser um elemento importante para a superação de situações de violência em que a
relação sexual é praticada a contragosto e por obrigação, não apareceu nas conversas do
grupo.
Certa vez, Dona Florisbela, ao confeccionar flores de fuxico, declarou: “Não sei por
que meus buraco tão ficando tudo aberto.” Esta declaração, em seguida foi complementada:
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“Meu buraco tá muito aberto” – o que ocasionou risadas no grupo e a repreensão de Dona
Cristina: “Dona Florisbela, o gravador está ligado.”
A risada das mulheres e a declaração de Dona Florisbela suscitam algumas
considerações. Ela, integrante de uma igreja evangélica, falava frequentemente sobre este
tema. Ao tratá-lo, talvez por ser um tema proibido, o faz com frases de duplo sentido que são
facilmente acolhidas pelas demais. Não aprofundou estes temas e a risada foi o desfecho das
conversas, que rapidamente foram finalizadas com as repreensões. Estas situações se
repetiram em outros momentos, já que toda a vez que Dona Florisbela se referia aos “buracos
das flores”, o que subliminarmente remetia a ela, alguma companheira de grupo intervinha
complementando ou repreendendo-a. Em uma destas vezes, ela retrucou: “Não! Esse aqui tá
ficando fechadinho.” – ao querer encerrar o assunto.
Houve uma situação em que Dona Cristina conta a experiência de frequentar o que
chamou de “Igreja dos Mórmons”. Salientou que, por indicação de um amigo, foi até esta
igreja buscar ajuda, já que estava aposentada e queria voltar a trabalhar. Ao frequentá-la ficou
sabendo que precisaria deixar de fumar e tomar café, bem como “casar para fazer sexo”, o que
considerou “muita exigência”. Ao contar a situação, em meio a risadas, destacava o fato de ter
que estar casada para manter relações sexuais e, quando uma das companheiras do grupo
comenta: “Ah! Não”, visivelmente concordando com o seu posicionamento, Dona Josi já
repreende: “É melhor mudar de assunto”. Dona Florisbela, visivelmente incomodada com os
comentários, salienta: “Bah! Até desmanchou o meu bagulho aqui” e, mais tarde, em meio à
discussão sobre sexo antes ou depois do casamento e o fato de deixar de tomar café e fumar, a
fim de se tornar membro da “Igreja dos Mórmons”, salientou: “E como fica aaaa... fucfuc,
daí?” Parecendo não ter escutado as discussões anteriores, retoma o assunto e logo as
mulheres do grupo a repreendem dizendo que: “Não faz fucfuc porque não dá.”
Em decorrência deste assunto, as mulheres lembraram-se de outra situação, a qual
remeteu, em diferentes momentos, a esta cisão que existe entre as mulheres salientada por
Lagarde y de Los Ríos (2005). Uma das participantes lembrou-se de uma história contada por
Dona Cristina: a história do fincão. Enquanto retornavamao assunto Dona Josi, sem saber
bem do que se tratava, destacou que “sabia da cravada, mas não do fincão”.
Esta história, contada por Dona Cristina, apresentou o caso do dono de um armazém
do bairro (a quem chamaremos de Manuel) que mantinha um relacionamento extraconjugal
com uma das freguesas (a quem chamaremos de Mercedes). Sua companheira (neste caso,
chamada de Maria) enviou para a suposta amante, sem saber, uma listagem com a conta
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referente ao débito da mesma no estabelecimento. Mercedes, ao receber a conta, devolveu-a
com algumas ressalvas, dentre elas, descontos a que teria direito pelos “fincões”, nitidamente
referindo-se às vezes que manteve relações sexuais com Manuel. Dona Josi, ao ouvir a
história, apoiou Mercedes. Outras mulheres, sem dar enfoque ao caso, mas ao fato de ter
ocorrido “o fincão”, destacaram: “Eu não esqueci do fincão/ Não dá pra esquecer do fincão
(risadas)/A gente não esquece, porque é um sarro.” Seja pelo fato de fazer referência a uma
relação sexual e ao seu pagamento ou à briga entre Mercedes e Maria, a história provocou
discussões e posicionamentos diferentes no grupo (ora favoráveis à Maria, ora a Mercedes)
tanto que, em outras conversas, este fato era novamente debatido. Quando as mulheres
chamavam os círculos de tecido de “rodela” eram repreendidas por alguém para chamar de
“rodinha”, pois rodela remetia afincão, nas palavras delas. O assunto se tornou polêmico.
Em nenhuma das conversas, mesmo tendo sofrido situações de violência familiar e
doméstica, as mulheres questionam estes padrões. Vivenciar sua sexualidade, partindo de seus
desejos e com mais liberdade, pode contribuir para que as mulheres compreendam outra
forma de lidar com seus corpos, considerando que relações violentas, vinculadas ao perfil do
macho, não contribuem para os processos emancipatórios que almejam. Estas mulheres, nas
conversas, falaram sobre o desejo de serem felizes, de estarem próximas dos que amam e de
serem respeitadas. O grupo de artesanato para elas, segundo seus depoimentos, para além de
um lugar onde “se fala bobagem”, também foi o espaço de convívio onde puderam pensar
sobre si mesmas e sobre as outras, com outro olhar. Falar sobre estes temas e questionar-se, é
um processo necessário para superação destes condicionamentos, indo ao encontro do que
propõe Freire (2006) quando salienta que nos educamos e nos libertamos em comunhão.
Dona Florisbela: Ser violenta para coibir a violência?
Neste convívio com as mulheres, Dona Florisbela foi a primeira integrante do grupo a
falar sobre as situações de violência familiar e doméstica que vivenciou, reconhecendo-as.
Contudo, seu discurso de superação estava atrelado ao fato de que ela poderia e deveria
revidar. Durante a problematização do que declarou, Dona Florisbela destaca que “dá-lhe pau,
não é matar” e quando foi interpelada pelo grupo, o qual ressaltou que algumas mulheres
tornam-se homicidas na intenção de romper com seus companheiros, ela prontamente
destacou que sua prática está em outro nível.
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Ao tratarem sobre as perseguições, ameaças, surras, o desprezo e outras vivências de
mulheres em situação de violência, citaram o fato dos assassinatos cometidos por elas terem
como intenção romper definitivamente com esta realidade. Dona Florisbela, além de fazer
esta distinção, revelou que “apanhou a vida inteira”, sugerindo como legítima defesa sua
prática atual. Concluindo o assunto com a frase “Aí, eu dou-lhe pau, porque mijou fora do
penico, deu!”, Dona Florisbela nos faz refletir sobre a necessidade de romper com o ciclo de
violência e não gerar um novo ciclo.
Bandeira (2009) nos sugere que pensemos sobre o conceito de resistência como
“estratégias e dinâmicas de rejeição e de luta desencadeadas pelas mulheres contra padrões,
papéis e normas de comportamentos culturais e sociais desiguais que lhes foram impostos e
que hierarquizam os sexos” (p. 405). Neste sentido, lutar contra padrões implica justamente
não repeti-los. A violência como padrão precisa ser eliminada das estratégias de emancipação
e da luta pelo fim da opressão. Resistir significa almejar o fim da situação violência, o desejo
de mudança e pelo reconhecimento da mulher como sujeito de direitos e não propriedade de
alguém.
Dona Florisbelaconvive em uma comunidade que faz das práticas violentas um mérito,
confundindo-as com coragem e determinação, sugerindo que grosserias e desrespeito são
provas de “macheza”. Nesse contexto, ela assumiu que combater a violência se faz com
atitudes de mesmo teor. Sua vivência na igreja evangélica poderia nos sugerir passividade e
“amor ao próximo como a si mesmo”, mas é fértil em axiomas que regem o seu cotidiano com
uma perspectiva diferente. Em uma das oficinas, com nítida alusão à história de “Davi e
Golias”8, Florisbela declara: “Eu derrubei o gigante!” Ao explicitar o caso que deu origem a
esta associação, narrou o encontro que teve com a ex-cunhada da filha. Esta, ao encontrar
Dona Florisbela e seu marido, cumprimenta-o. Ele, por sua vez, corresponde ao cumprimento,
o que faz com que Dona Florisbela “branqueie os olhos” (expressão que usou), em referência
à indignação diante do fato. Segundo seu relato, interpelou o marido perguntando-lhe se ele
não tinha “vergonha na cara”, pois cumprimentou a ex-cunhada da filha, irmã do ex-marido
da mesma, o qual era violento e desrespeitoso com ela. A ex-cunhada, por sua vez, ao escutar
os comentários de Dona Florisbela, iniciou uma discussão. Dona Florisbela descreve que, para
encerrar o assunto, pegou uma pedra e “zup” atirou na ex-cunhada da filha, fato este que a faz
8 Episódio Bíblico narrado no Antigo Testamento, onde um gigante (Golias) filisteu desafia o exército israelita,
durante uma batalha. Davi, que mais tarde se tornaria o Rei de Israel, imbuído do pensamento de que o “Senhor
dos Exércitos” estava com ele, enfrenta o gigante. Após atingi-lo com pedras e derrubá-lo, corta sua cabeça com
uma espada.
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comentar com o grupo que “derrubou o gigante”. Para justificar o que fez, justificou: “Ela
pensou que eu ia ser trouxa. Ela pensou: Agora eu arrebento ela a pau, mas tomou-lhe...”,
citando novamente a Bíblia. Neste ponto do diálogo, Dona Florisbela visibiliza que, para além
da difusão de conceitos sobre o “lugar da mulher” e o “marido como cabeça”, na convivência
religiosa também há elementos para compreensão de que a violência, quando justificada, é
necessária e consentida. Em sua visão de mundo, o discurso de paz (cristão) dá lugar ao da
vingança e a justiça é sinônimo desta última.
Por fim... Violência, violências, violência contra a mulher
Em discussões sobre a Lei Maria da Penha,Pasinato (2010) eBandeira
(2009)apresentam, como parte de sua argumentação, conceitos de violência o que suspeitamos
que seja fundamental, dentre outros elementos, para analisar criticamente os alcances desta lei
para os grupos populares. Nesta pesquisa, de forma bem abrangente, a violência contra a
mulher pode ser compreendida sob duas formas: a explícita e a implícita.
Pensando na atualidade do tema e na indignação frente às atitudes machistas que
subjugam e oprimem muitas mulheres, é importante ressaltar que sua manutenção cotidiana
depende da violência e da humilhação. Tais atitudes, por serem injustificáveis demandam,
como na escravidão de pessoas, práticas violentas para a contenção daqueles que a sofrem
(violência explícita). Estudos sobre a escravidão no Brasil, bastante conhecidos através dos
bancos escolares, destacam a “chibata” e os “ferros” como forma de coibir as rebeliões e os
protestos contra a condição desumana sob a qual viviam os trabalhadores negros escravizados.
Contudo, outros estudos ainda revelam que a constituição de famílias9, a permissão da
existência de pequenos terrenos e malocas para estes trabalhadores, também se constituíam
como forma de aprisionamento e silenciamento (violência implícita). Pensar que há vantagens
na escravidão e que a condição fora dela poderia ser pior, tendo em vista que a sociedade não
respeitava a condição negra, pode ter sido um bom argumento dos escravagistas para tentar
manter as pessoas no regime.
De certa forma, esta também é uma prática presente no cotidiano das mulheres já que a
frase “ruim com ele, pior sem ele” ainda faz parte dos discursos e se materializa nas práticas.
9 SLENES, Robert. Na senzala uma flor: Esperanças e recordações na formação da família escrava. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
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Nestes casos, compreendemos que a violência implícita se instaura, até mesmo sob a forma de
supostos cuidados e das limitações que visam “proteger”10. As mulheres não percebem os
seus cativeiros ou refazem-nos na tentativa de viver melhor. Consideram que os xingamentos
e as humilhações, fazem parte da “natureza masculina”, já que os homens são naturalmente
agressivos, traidores e demarcam território. Por outro lado, reconhecem que mulheres
independentes são admiráveis, mas sobre elas recai o estigma de mal-amadas, feias, brabas ou
ainda, incompletas, porque tem sorte na carreira e azar no amor. A condição subjugada
obscurece ou altera a imagem das mulheres sobre si mesmas, o que as faz pensar que não
podem viver sem aquele homem ou que não terão condição de superar a dor da perda, nem
galgar suas conquistas de forma autônoma empoderando-se. A condição de corpo para outros,
salientada por Lagarde y de Los Ríos (2005), contribui para que as mulheres se percebam
desta forma, considerando até mesmo que pensar em si é uma postura equivocada.
Aceitar as cravadas e os fincões faz parte da tentativa de manter um companheiro para
que, mais dia ou menos dia, ele mude.Os anos de violência e as tentativas frustradas de espera
das mudanças,provocaram em algumas mulheres o desejo de vingança e a adoção de práticas
violentas, tão comuns em sociedades machistas e patriarcais, em resposta aos seus
companheiros, como exemplificado no caso de Dona Florisbela. Nosso entendimento é de que
este “troco” resolve problemas bem específicos (ou, quase sempre, não resolve problema
algum), mas deixa de eliminar as formas de discriminação e violência contra as mulheres,
objetivo precípuo das lutas feministas. Mais uma vez, percebe-se que o individualismo
prejudica esta conquista, consolidando o germe do opressor na oprimida (Freire, 2006). A
tentativa de estabelecer este diálogo, por meio de um grupo que se reunia para criar junto,
buscou superar esta lógica.
Referências
BANDEIRA, Lourdes. Três décadas de resistência feminista contra o sexismo e a violência
feminina no Brasil: 1976 a 2006. Sociedade e Estado, Brasília, v.24, n.2, maio/ago. 2009,
p.401-438. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/se/v24n2/04.pdf>Acesso em: 01 jun.
2017.
10Jane Felipe de Souza (2015), professora da Faculdade de Educação da UFRGS e coordenadora do GEERGE
(Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero) denomina estas práticas como violência
benévola.<http://agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/violencia-contra-a-mulher-pode-se-disfarcar-de-
protecao/>
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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11& 13thWomen’s Worlds Congress(Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017,ISSN 2179-510X
BRANDÃO, Carlos Rodrigues, STRECK, Danilo R. Pesquisa Participante: o saber da
partilha. Aparecida: SP, Idéias e Letras, 2006. 295p.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Círculos de Cultura. In: STRECK, Danilo R., REDIN,
Euclides, ZITKOSKI, Jaime José. Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
p.76-78.
BRASIL. Lei Maria da Penha. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Dispõe sobre
mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Brasília: Câmara
dos Deputados, Edições Câmara, 2010. 34p.
CUNHA, Aline Lemos da.NARRATIVAS ENTRELAÇADAS: conversando sobre
leituras e lembranças de escola com mulheres que se “encontram” em um Salão de
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What is justice? Dialogues with women about the Maria da Penha Law
Astract: Based on the need for network alternatives for the care and protection of women in
situations of racial and gender violence in various domains (domestic, work, study
environment, etc.) and meeting proposals for the implementation of Women's Human Rights
(TELES, 2006), the research presented here aimed to understand "what is justice?" for a
group of women living in popular neighborhoods in the city of Porto Alegre (RS- Brasil),
which limits of the legislation made it difficult to send the complaint or an analysis of the
facts. The methodological approach adopted was the discussion groups (WELLER, 2006),
with the objective of contributing to the search for alternatives to overcoming oppression
experienced, with a view to empowering women, starting from their concept of justice and
analyzing it critically. One of the issues that seems fundamental to a critical understanding of
women's human rights is that the situations of violence experienced in many cases are not
recognized by themselves as such. Various social, cultural and religious issues can contribute
to this recurrence, in which violence is justified in order to obscure them, considering the
forms of oppression that some women experience are very subtle and constant.
Keywords: Human Rights of Women. Maria da Penha Law. Justice. Non-school educational
processes.