O Soldado de El Alamein

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  • 7/25/2019 O Soldado de El Alamein

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    O soldado de El Alamein

    O soldado de El Alamein

    General-de-Brigada (R1) Flvio Oscar MaurerParticipou do ltimo grupo (20 Contingente), que foi enviado

    em Misso de Paz ao Suez (gito),durante a d!cada de "0# $s refle%&es de um 'ovem oficial ao visitar

    um dos importantes campos de atala da Segunda *uerra Mundial, l $lamein#

    O Egito um pas especial. Os problemas polticos internos e externos com que

    convive h milnios so questes que jamais lhe tiraram o charme e o mistrio deser o guardio de um dos maiores patrimnios hist!ricos da civili"a#o humana.$pesar das di%iculdades decorrentes de seu subdesenvolvimento& onde pontuambaixos ndices econmicos e sociais& o Egito pode se orgulhar& mesmo assim& de tersido um dos pases do Oriente 'dio onde a pa" e a tranq(ilidade reinaram porperodos relativa)mente longos.

    *os +ltimos anos& porm& nuvens negras da a#o expansionista dos%undamentalismo isl,mico tm perturbado a estabilidade poltica do pas& de %ormamais contundente. -or esta ra"o& vem crescendo a incidncia de atos de terrorismocontra o stablisment religioso& cuja caracterstica maior a de& tradicionalmente&

    seguir uma linha moderada no culto da % isl,mica. $ ra"o hist!rica desta posturacomedida& quali%icada de permissiva pelos %undamentalistas& tem origem nacaracterstica cosmopolita que o pas adquiriu ao longo de sua hist!ria.

    $ posi#o geogr%ica e o privilgio de ser um dos principais elos de liga#o entrecivili"a#es antigas e modernas& %oram as principais causas que temperaram a%orma#o da ndole do seu povo. $ssim& a povo egpcio& originrio de um caldocultural extraordinariamente rico& coloca)se acima das querelas ocasionais eoportunistas& como o caso do %undamentalismo em voga no momento.

    omo sabido& o Egito j %oi o centro do mundo& dois mil anos antes de risto. $t

    hoje& a civili"a#o egpcia daquela poca encanta o mundo por seus mistrios&muitos ainda no desvendados& bem como pela vanguarda que ocupou empraticamente todos os campos do conhecimento humano.

    /esde de ento& o Egito desempenhou papel importante em todas as pocas dahist!ria da humanidade. O povo judeu e o pr!prio cristianismo encontram no Egito&vnculos importantes de suas respectivas hist!rias. $ conhecida epopia bblica datravessia do mar 0ermelho por 'oiss e seus seguidores& em %uga da escravido noEgito& na busca da terra prometida& vista pelos judeus como a mo de /eus emde%esa do povo por ele escolhido. /o mesmo modo& a estrada de 1eric!& na atual2aixa de 3a"a& %oi palmilhada pela %amlia sagrada na sua %uga de 4erodes. 5o

    apenas alguns& entre muitos outros& %atos emblemticos& verdadeiros elos de unioentre o Egito antigo e as origens da civili"a#o moderna ocidental.

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    omo ponto de convergncia entre o ocidente e o oriente& o Egito sempre %oi&tambm& o objetivo da cobi#a dos grandes soldados que %i"eram as guerras dahist!ria do mundo. 6& por exemplo& 'arco $ntnio& ap!s conquistar o pas pela%or#a de suas legies& sucumbiu aos encantos de le!patra. 6& tambm& *apoleo

    depois de ter conquistado a Europa& expressou sua perplexidade diante dagrandiosidade das pir,mides.

    *este sculo& o domnio do canal de 5ue" tem sido um objetivo econmicoconstante& buscado pelos conquistadores modernos. *ele j se envolveram& nestes+ltimos tempos& praticamente todos as potncias com objetivos hegemnicos nomundo.

    $ssim& nas +ltimas dcadas o Egito acabou sendo o pio do jogo de xadre" dosacontecimentos do oriente mdio. /a porque o pas teve participa#o ativa emtodas as guerras que 7srael promoveu contra seus vi"inhos& na busca de consolidar)

    se como pas soberano.'as o passado grandioso& das pir,mides& dos %ara!s& continua sendo o principalmotivo para atrair anualmente ao Egito milhes de turistas do mundo inteiro& adespeito dos momentos de crise. O encanto& o sentimento de misticismo& a magia eo poder de atra#o que o Egito trans%ere aos que o visitam& %a" transport)los paraum passado milenar. Esta sedu#o natural sempre esteve acima das eventuaisguerras e con%litos.

    8odos estes componentes& sem d+vida& exercem uma signi%icativa in%luncia sobre andole do seu povo. 9astante di%erente das demais povos rabes& o egpcio & muitoprovavelmente por essas ra"es& um tipo aberto ao contato externo. : alegre&

    independente e comunicativo. Estas caractersticas identi%icam)no muito com obrasileiro.

    5o& tambm& as ra"es mais provveis pelas quais os milhares de brasileiros quepertenceram aos ;< contingentes do 9atalho 5ue"& com que o nosso pascolaborou por de" anos com a manuten#o da pa" na %ronteira entre o Egito e 7srael&sob os auspcios da O*=& ainda guardam as melhores lembran#as daquele pas ede seu povo& mesmo passados mais de >< anos do trmino da misso.

    2oi assim com um jovem o%icial do 9atalho 5ue". *a dcada de ?

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    O que %a" o soldado lutar numa guerraB $ grande verdade que ele mesmo nosabe bem. *a maioria dos casos ele assimila a doutrina#o que lhe %oi incutida& masa sua pr!pria conscincia& quando cho treme e as balas espoucam ao seu lado&quase sempre no lhe d plena convic#o da verdade que o colocou naquela

    situa#o.$o viver a guerra& ele logo descobre que& ao %inal dela& restaro apenas duascategorias de soldadosC vencedores e vencidos. $os vencedores a gl!ria. $osvencidos& o despre"o e a culpa por todos os erros& ainda que& como soldados&tenham no campo de batalha sido bravos& dando o que tm de melhor e maispreciosoC as suas pr!prias vidas.

    $ssim& o jovem soldado que& pela experincia recm vivida& passou a terconscincia do seu papel na guerra. 0iu que a %erocidade com que homens lutam& opouco valor da vida humana naquele momento& %a" com que a guerra nada tenha daimagem her!ica tra"ida das escolas de %orma#o. O tenente j %ora tomado& tambm

    no Egito& pouco antes da guerra& por pro%undo arrebatamento existencial. -or outromotivo. 2oi pela %eli" oportunidade de ter visitado& numa rpida viagem ao airo& umlugar muito especial& desconhecido pela maioria dos que visitam o Egito& por noestar includo nos roteiros tursticos.

    El $lamein %ica a mais ou menos D< anosde idade.

    -or que lutaram e por que morreram todos elesB O visitante que observa o campo

    de batalha de El $lamein %ica estupe%ato. Olhando em %rente e para a esquerda&oeste e sul& apenas o deserto& areia pura e pedras& at onde a vista alcan#ar. 1olhando para a direita& norte& apenas o 'ar 'editerr,neo& com seu a"ul pro%undo&

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    caracterstico& at o hori"onte. E pensar que todos eles& naquela batalha e em todasas demais no norte da I%rica& estavam a milhares de quilmetros de suas ptrias& desuas casas& de suas %amlias.

    'orreram pelas pedras e pelos gros de areia do deserto. ertamente no %oram osideais da liberdade ou do na"ismo que %i"eram ambos os lados lutarem como %eras.$ssim& tambm& pensou o tenente& ser que os expedicionrios brasileiros na 7tliaestavam convictos de estarem se batendo pela democracia& a qual nem sequerconheciam em seu pr!prio pasB

    Os dois epis!dios& o de viver a brutalidade da guerra e o de ter se sensibili"adopro%undamente pelas suas conseq(ncias no silncio de um longnquo cemitrio nodeserto& marcaram o jovem tenente pro%undamente. $li ele despiu& de%initivamente& acapa de romantismo que at ento vinha vestindo no exerccio da sua pro%isso epassou a encar)la de %orma muito mais realista e pragmtica.

    O sonho de gl!rias e de aventuras empolgantes esto distantes da realidade dosoldado.

    Kuando %or empregado em opera#es de combate& sua competncia e seu preparopro%issional& a%inal de contas& devem direcionar)se muito mais J sua pr!priasobrevivncia& a de seu grupo ou& ainda& aos homens sob seu comando& do que Jde%esa muitas ve"es vaga de causas polticas ou ideol!gicas. Elas sempre so%ortuitas& passageiras e atendem muito mais aos interesses dos grupos que ospatrocinam& do que J ptria propriamente dita. 'esmo porque& olhando para trs& nanossa hist!ria recente& as verdades de hoje& so muito di%erentes das de ontem.

    Nota DefesaNet

    Este texto %oi publicado originalmente em ;