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Ocupação Grupo Corpo 40 Anos

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A publicação impressa aborda o processo criativo e a trajetória da companhia de dança mineira Grupo Corpo.

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capa: Bach (1996) | foto: José Luiz Pederneiras

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Realização

São Paulo, 2015

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foto: acervo Grupo Corpo

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Em quatro décadas de história, o Grupo Corpo produ-ziu mais de 35 espetáculos, visitou mais de 40 países e contou com a participação de mais de cem baila-rinos. No entanto, neste caso, os números dão uma indicação vaga do que é a companhia. Talvez porque o mais correto seja não apenas descrevê-la por meio da precisão dos dígitos, mas também defini-la pelo que ela tem de indescritível.

Uma sensação – entre tantas outras – que se pode experimentar ao assistir a um espetáculo do grupo é de plena harmonia. Música, coreografia, cenografia, luz e figurino parecem ter sido criados e executados por uma única pessoa. Mas essa impressão é reflexo do equilíbrio das relações entre aqueles que estão na coxia. Bailarinos, técnicos e produção artística desenvolvem um trabalho que, além de profissionalismo, inclui afeto e respeito.

A companhia mineira comemora em 2015 seu 40º aniversário e o instituto marca a data com a Ocupação Grupo Corpo 40 Anos. A mostra apresenta mais

de mil fotos que revelam o cotidiano da equipe – via-gens, ensaios e momentos de lazer. Todas as imagens foram capturadas pelos próprios integrantes durante o tempo em que permaneceram no grupo.

Se a exposição prefere os bastidores, esta publicação foca o palco. Os textos a seguir abordam o processo de criação de alguns métodos e conceitos que dão identidade ao grupo, como o vocabulário coreográ-fico particular e o uso de trilhas compostas especial-mente para cada espetáculo.

Um calendário de 2016 finaliza esta edição. Nele, 12 peças, identificadas mês a mês, assinalam momentos importantes da trajetória do coletivo.

Acesse itaucultural.org.br/ocupacao e descubra mais sobre o Grupo Corpo.

Itaú Cultural

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Santagustin (2002) | foto: José Luiz Pederneiras

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o princípio é a música. E o quadril. Assim começam o processo de criação e os movi-

mentos de origem inconfundível. Eles vêm do Corpo, a companhia que tomou como nome a estrutura física humana para – nestes 40 anos – criar uma linguagem única de dançar estruturas corporais, musicais, visuais, motoras, emocionais, brasileiras e universais.

“Minha ideia é fazer com que música e dança se tor-nem uma coisa só. Às vezes eu consigo”, diz Rodrigo Pederneiras, há 35 anos o nome e o sobrenome das coreografias do Grupo Corpo. Segundo Paulo Pe-derneiras, diretor artístico da companhia mineira, esse

foi o foco do trabalho de Rodrigo desde que ele se tornou o coreógrafo residente do coletivo em 1981. “Primeiro convidamos o músico. Damos a ele liber-dade total e não sugerimos referência alguma, a não ser a duração da trilha sonora, cerca de 40 minutos. Preferimos ser influenciados a influenciar. É a partir da música que começamos a criar. Não temos uma ideia a priori”, conta Paulo.

A primeira fase do Grupo Corpo – entre 1975 e 1980 – foi marcada por coreografias narrativas ainda muito fundamentadas no balé clássico. A autonomia de criação da companhia veio justamente quando

A mente e o coração do Corpo

por Iara Biderman

A trilha sonora original e a construção de um vocabulário coreográfico próprio são algumas das características que marcam a singularidade da companhia mineira

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Rodrigo passou a comandar definitivamente o corpo de bailarinos. Nesse período, apesar de ele ouvir ainda muita música clássica, o que se reflete na trilha sonora dos espetáculos – depois de Último Trem (1980), durante praticamente uma década o grupo se valeu de compo-sições de grandes músicos, como Heitor Villa-Lobos, Robert Schumann e Frédéric Chopin –, suas pesquisas já avançavam em direção às criações de compositores brasileiros que combinavam referências populares e eru-ditas para formar uma música brasileira contemporânea.

“Eu ouvia falar em dança brasileira em relação aos te-mas, às músicas, mas não à forma de dançar. A década de 1980 foi um grande aprendizado nesse sentido”, comenta o coreógrafo. Essa provocação fez com que a companhia iniciasse a construção de um vocabulário próprio – no que diz respeito à textura, à cor e ao chei-ro do Brasil –, muito embora, como Rodrigo enfatiza, as questões que mais tarde formariam realmente a identidade do Corpo já estivessem presentes desde a primeira montagem.

Inês Bogéa, atual diretora da São Paulo Companhia de Dança e ex-bailarina da companhia mineira, exemplifi-ca: “A trilha sonora original de um compositor brasileiro de ponta; a união dos vários elementos, todos em bus-ca de uma unidade para a obra; a dramaturgia calcada na música; o arrojo e a determinação de dialogar com o seu tempo de forma direta e sem concessão; tudo isso já esta va em Maria Maria [1976], por exemplo”. Inês dançou no grupo durante 12 anos – de 1989 a 2001, ano em que organizou o livro Oito ou Nove Ensaios sobre o Grupo Corpo (Cosac Naify).

Linha do EquadorHá, no Grupo Corpo, um jeito muito particular de os bailarinos se movimentarem, o qual, como afirma Paulo, “não se parece com o jeito de nenhuma outra companhia”. “Em cima de cada nota o Rodrigo cria um movimento. É como se os bailarinos fossem instru-mentos”, completa Cassi Abranches, ex-bailarina do grupo e para quem Rodrigo pretende passar o bastão.

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Ela assinou o espetáculo Suíte Branca, que, ao lado de Dança Sinfônica, comandado por Rodrigo, comemora os 40 anos do grupo.

A partir de uma observação atenta dos espetáculos é possível perceber que a completa harmonia entre dan-ça e música levou a uma forma pouco usual de contar os tempos e os contratempos. “É uma contagem difícil. O que os outros fariam em dois movimentos, o Rodri-go faz em quatro – a agilidade do bailarino tem de ser outra. E ainda tem de ter a ginga. No momento em que tudo se coordena a coisa sai”, diz Cassi.

A ginga, que pode parecer um movimento óbvio, na verdade no Corpo é resultado de um processo ela-borado. Segundo Rodrigo, foi fundamental para seu processo criativo perceber que o brasileiro tem um jeito sensual particular. “Comecei a pensar como seria trabalhar com o movimento partindo da bacia. Todo o corpo responde a partir disso”, conta o coreógrafo, que ao mesmo tempo faz a ressalva de que esse “toque sensual” pode ser um risco. “Quando você fala que tudo começa na bacia, pensam que é rebolado. É mil vezes mais que isso. Bacia é a linha do Equador do corpo. Quando ela mexe, o resto do corpo responde.”

A companhia é conhecida por mesclar o popular e o erudito, o que realmente lhe confere movimentos mui-to característicos. No entanto, em uma conversa com Rodrigo, é possível perceber que esse foi apenas o início: “Eu fui pegando as danças populares brasileiras e mesclando-as com a técnica clássica, e misturando o clássico com o contemporâneo. Depois, as técnicas foram sumindo e as formas foram se diluindo, dando

“Quando você fala que tudo começa na bacia, pensam que é rebolado. É mil vezes mais que isso. Bacia é a linha do Equador do corpo. Quando ela mexe, o resto do corpo responde.”

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lugar à dinâmica, em que penso mais na intenção do movimento do que na forma”, conta.

Segundo a ex-bailarina Bogéa, Rodrigo é capaz de traduzir visualmente a partitura musical com seu vocabulário, encadeando as frases de movimento de maneira que os impulsos, o ritmo e a dinâmica da música sejam percebidos no corpo de cada intérpre-te. “Ele se vale da gravidade, mas desafia os limites pela possibilidade de articulação das diferentes dinâ-micas em distintas partes do corpo.”

A também ex-bailarina Abranches chama a atenção para outra característica marcante da companhia: os deslocamentos e os desenhos que os bailarinos realizam no espaço. “Ninguém coreografa como o Rodrigo. Sob o comando dele, o palco está sempre pulsando, cheio, torna-se um grande jogo de xadrez”, comenta. Rodrigo emenda e explica que isso aconte-ce porque ele nunca vê uma cena separada da outra. “Nunca é apenas um caminhar ou correr. É uma linha

contínua, frases coreográficas que se complementam e criam esse desenho espacial se fundindo umas nas outras”, explica o coreógrafo.

A emoção“Vejo muitos duos que são lindos, mas falta huma-nização. Tem de ter sexo, amor, ódio. É do que sinto falta na dança contemporânea. Tento humanizar. Algumas vezes acerto”, afirma Rodrigo. Para o públi-co, esse acerto vem se repetindo e se multiplicando nestes 40 anos. Mas Rodrigo insiste que mexer com a emoção é raríssimo e efêmero, assim como a dança.

O que vai tocar as pessoas, segundo o coreógrafo, não é a beleza, no sentido da precisão. “O movimen-to pode ser feito de milhões de formas: brusco, cor-tado etc. Mas é a escolha da dinâmica correta para aquele tema musical ou para aquela ideia que vai fazer com que o público se emocione. E quando isso acontece é muito legal”, ressalta.

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E acontece por uma combinação única de todos os elementos que compõem o espetáculo. “O que se vê na cena é resultado de uma decantação de ideias que perpassam todas as áreas do grupo, da produção à criação”, afirma Bogéa. Paulo é quem coordena esse arremate. “Minha função maior é conceituar a obra, dar um título e conseguir uma unidade entre todas as áreas: coreografia, música, figurino e cenário. E daí vem o espetáculo”, diz.

É desse processo que Paulo mais gosta. “Eu tenho quase o dever de entender por onde o processo criativo do Rodrigo está indo. Ele não tem uma ideia pressuposta, mas é claro que algum sentido a obra tem. Para mim, o mais custoso é conseguir ver nesse processo um conceito que reúna tudo para dar um direcionamento”, afirma o diretor artístico.

A partir da multiplicidade de elementos, torna-se possível filtrar a estética própria do Corpo: “Minha maneira de trabalhar é enxugar, dar limpeza à parte

visual, não atrapalhar com efeitos especiais”, diz Paulo. A experiência proporcionada pelo equilíbrio de todos esses elementos – música, dança, luz, cená-rio, figurino – “desafia a ideia do que é ser brasileiro, sem exotismo ou caricatura, transformando certas matérias brutas do Brasil em dança”, aponta Bogéa.

“Hoje nem penso nisso, em criar uma dança brasileira; ela já está incorporada inclusive no corpo dos bailari-nos. A brasilidade e a universalidade estão na dança”, afirma Rodrigo. Ou, como disse o poeta e teórico modernista Mário de Andrade em uma carta ao compositor Camargo Guarnieri, em 1934, lembrada por Bogéa: “O papel do artista criador não é figurar uma nacionalidade, mas transfigurá-la”.

Iara Biderman é jornalista, autora do blog Deu Baile e colabora-dora da Folha de S.Paulo. No mesmo jornal, foi repórter de cultura, com ênfase em dança e teatro. Formada em jornalismo pela PUC/SP, especializou-se em história da arte e análise crítica do jornalismo na Universidade George Washington, Estados Unidos, e na Universidade de Cardiff, Reino Unido.

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Nazareth (1993 ) | foto: José Luiz Pederneiras

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esde os anos 1990, o Grupo Corpo vem enco-mendando de compositores da música popular

brasileira as trilhas originais para seus espetáculos. Marco Antonio Guimarães, Arnaldo Antunes, Tom Zé, João Bosco, + 2, Caetano, Lenine, Samuel Rosa fizeram, para dança, experiências que certamente não fariam no rumo central de suas carreiras. Uma trilha de mais de 40 mi-nutos, toda voltada para a cena dançante, predominan-temente instrumental, e guiada por um fio condutor, é muito diferente do costumeiro álbum de canções a que quase todos estão acostumados. Atraindo-os para esse campo inabitual, o Grupo Corpo acumula já uma gran-de contribuição para a música brasileira contemporânea.

A música do movimento

por José Miguel Wisnik

Tive a sorte de participar desse processo desde 1993, quando fui convidado pelo diretor artístico Paulo Pederneiras para fazer a música de “Nazareth”. De-pois da franca mineiridade dos seus primórdios, com o enorme sucesso de “Maria Maria”, para o qual Mil-ton Nascimento e Fernando Brant fizeram canções célebres, o Grupo tinha passado por um período pro-batório e autoimposto de convívio com a música de concerto europeia (Chopin, Haydn, Elgar), durante o qual assimilara as técnicas de dança clássicas. Feito isso, parecia pronto para enveredar decididamente pela criação de uma linguagem de dança brasileira contemporânea, dando continuidade à perspectiva

A partir de movimentos muito característicos, os bailarinos do Grupo Corpo são capazes de traduzir visualmente uma partitura musical

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aberta em 1992 pelo espetáculo “21”, com música de Marco Antonio Guimarães interpretada pelo Uakti.

A proposta de criar variações sobre a música de Ernesto Nazareth me pareceu afinada com a trajetó-ria deles e com a minha. O compositor carioca era o pianeiro transcendental que compunha polcas ama-xixadas de olho na música clássica, como se dentro delas existissem sonatas e prelúdios querendo desa-brochar. O trânsito em surdina entre o clássico e o popular em Nazareth ia ao encontro do caminho de ida e volta que o Grupo Corpo também vinha fazen-do entre a música europeia de concerto e a música brasileira. Me lembrei do personagem de Machado de Assis, o Pestana de “Um homem célebre”, dividido entre o desejo de pertencer ao panteão imortal da música de concerto e o sucesso galopante de suas polcas. Apliquei às músicas de Nazareth a antiga técnica polifônica dos espelhos melódicos, tocando-as de trás pra diante, às avessas, com o que elas não perdiam sua elegância e seu encanto inconfundível,

convidando para dançar a dança de “cisne e cabrita” a que se refere outro maravilhoso conto de Machado, “Terpsícore” (não por acaso a musa da dança).

No trabalho do Grupo Corpo a música tem o privi-légio de ser o disparador do espetáculo todo: a partir dela nascem a coreografia, o cenário, a luz, os figurinos. Talvez não se tenha ainda a consciência suficiente de que esse excepcional grupo de dança brasileira, de alcance mundial, resulta da junção de talentos dos dois irmãos Pederneiras – Rodrigo, o coreógrafo, e Paulo, o diretor artístico (pondo ênfase na conjunção “e”). Feita a música, ela passa por um processo de transfiguração em movimentos corpóreos (nós, os músicos, temos então a felicidade única de ver a música acontecer literalmente aos nossos olhos) e de visualização inte-ligente e também transfiguradora do espaço cênico, que integra e multiplica o que se dança.

Graças a isso, todos os estímulos que vão sendo joga-dos pela música são respondidos e correspondidos pe-

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los múltiplos planos do espetáculo, garantidos por uma equipe técnica, humana, por um corpo de bailarinos cada vez melhores como conjunto, nada disso deixando de ser obra da excepcional inteligência estratégica que vem da direção. Quando estive com eles em Austin, a convite da Universidade do Texas, por exemplo, Joe Randel, que fazia a ponte entre a programação cultural e a universidade, dizia que raramente um grupo de dança, entre todos os que passam por lá, e são os principais, oferecia tantos elementos de interesse em todos os níveis da produção e da concepção do espetáculo.

Assim como os espelhos machadianos aplicados à música de Nazareth, também as ideias embutidas na especulação sertaneja do “Parabelo”, para o qual fomos convidados Tom Zé e eu, a conversão do Big Bang em Fla-Flu, que disparou o “Onqotô”, música feita com Caetano Veloso, e as canções medievais galego-por-tuguesas, que fiz com Carlos Nuñez para “Sem mim”, foram incorporados e transformados em dança e luz, espaço e cor. O que havia de potencialmente excessivo

nas intenções literárias subjacentes à música adquiria a naturalidade surpreendente dos desenhos dançantes e dos espaços não poucas vezes extasiantes, como a taba cósmica – o buraco negro penetrável do “Onqotô” – e a rede que pesca os amantes e o nada, em “Sem mim”.

O tom com que tudo isso se faz, em todas as fases do trabalho, é mineiro – sem empostação e sem pose. Logo na entrada da sede do Grupo Corpo em Belo Horizonte há, não uma sala de visitas ou um escritório, mas um espaço para o cafezinho, o bolinho de fubá e o pão de queijo. Acho que é ali que eles testam o convidado, para ver se não é enjoado. Se for, não passa a próxima porta.

[texto originalmente publicado no jornal O Globo, caderno Prosa e Verso, do dia 5 de setembro de 2015.]

José Miguel Wisnik é músico, compositor e ensaísta, autor de “O som e o sentido”, entre outros, e compôs trilhas de espetáculos do Grupo Corpo, como “Nazareth” e “Sem mim”. O Grupo Corpo apresenta “Suíte branca” e “Dança sinfônica” no Teatro Municipal até segunda-feira.

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Breu (2007) | foto: José Luiz Pederneiras

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Grupo Corpo, 40 anos: “pronqvamos?”

por Thereza Rocha

Questionamentos dançados de um corpo de grupo

alvez possamos dizer que a dança, qualquer dança, fabula composições daquilo que o filóso-

fo italiano Giorgio Agamben chama de “comunidade que vem” – uma comunidade, grosso modo, formada por singularidades, sem ideia ou ideal capazes de con-ferir unidade ao todo. Se isso faz algum sentido, então é necessário destacar logo em seguida que a hipótese se aplica ainda mais quando se têm em mente a dan-ça cênica e, sobretudo, a dança contemporânea.

Afinal, essa dança à qual se atribui um sinal de con-temporaneidade como sobrenome – e cujo conjunto só pode ser enunciado tendo em vista uma noção de multiplicidade – não simplesmente fabula, mas

também e principalmente inquire os meios e os desdobramentos éticos e políticos dessa fabulação. É sempre urgente lembrar que esses trabalhos se desenvolvem como questionamentos dançados: o corpo, no caso, pergunta ao seu tempo: “por que e para que eu me ponho a dançar?”.

Nesse cenário de singularidades, de multiplicidade, destaca-se no campo da dança contemporânea bra-sileira uma companhia que adotou as ideias de grupo e de corpo como nome. Como diz o diretor artístico Paulo Pederneiras no site do coletivo, “o Grupo Corpo não tem nome de ninguém: é como grupo que con-seguimos ter uma identidade”.

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A aposta em uma numerosa companhia centrada na figura de um(a) coreógrafo(a)-diretor(a) que dá a ela seu próprio nome – algo que ocorreu com bastante fre-quência ao longo de 40 anos de dança contemporânea no Brasil – talvez esteja em franco declínio. E o mesmo vale para companhias que atuam como uma espécie de emblema de uma só e mesma língua, uma só e mesma nação, uma só e mesma modernidade. O Grupo Corpo é um emblema de brasilidade – palavra detestável em seu ufanismo e em sua certeza de pertencimento – tão somente por compor a cada obra não um esquema do (nosso) futuro, mas uma suposição dos espaços-tempos ainda e sempre por vir.

A longevidade e a genialidade características da traje-tória da companhia são raras na dança contemporânea brasileira; e o 40º aniversário do coletivo – além de jogar ainda mais luz sobre essa extraordinariedade da “institui-ção” Grupo Corpo – pode ser também uma chance de nos aproximarmos, cautelosa e delicadamente, da ordi-nariedade mais costumeira desse corpo de grupo.

E talvez seja mesmo isso o que diz o título do espetá-culo com o qual a companhia comemorou os 30 anos de atividade. “Onqotô” é uma espécie de tradução para o “mineirês” da expressão “onde é que eu estou” e traz para a palavra escrita a prosódia marota que se esconde na sintaxe complexa das obras desse grupo de dança. Perguntar-se “onqotô?” é ao mesmo tem-po e inevitavelmente perguntar-se “pronqovô?”. E é possível que agora, aos 40 anos de idade, a compa-nhia ainda esteja se questionando: “pronqovô?” Mas, se é como grupo que o Corpo se autodefine e se suas composições são fabulações dançadas de nosso coletivo brasileiro, a pergunta mais acertada talvez fosse: “pronqvamos?”.

Thereza Rocha é pesquisadora de dança e dramaturgista de processos de criação. Doutora em artes cênicas pela Universi-dade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), é professora dos cursos de bacharelado e de licenciatura em dança da Uni-versidade Federal do Ceará (UFC) e autora, com Marcia Tiburi, do livro Diálogo | Dança (Senac, 2012).

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Ímã (2009) | foto: José Luiz Pederneiras

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Lista de obras 1976-2015

Maria Maria | 1976 Música: Milton Nascimento Coreografia: Oscar Araiz Cantares | 1978 Música: Marco Antônio Guimarães Coreografia: Rodrigo Pederneiras Último Trem | 1980 Música: Milton Nascimento Coreografia: Oscar Araiz

Tríptico | 1981 Música: Wagner Tiso Coreografia: Rodrigo Pederneiras Interânea | 1981 Música: Marlos Nobre Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Reflexos | 1982 Música: Henrique Oswald/Bruno Kiefer Coreografia: Rodrigo Pederneiras Noturno | 1982 Música: Alberto Nepomuceno Coreografia: Rodrigo Pederneiras Sonata | 1984 Música: Serguei Prokofiev Coreografia: Rodrigo Pederneiras Prelúdios | 1985 Música: Frédéric Chopin Coreografia: Rodrigo Pederneiras Bachiana | 1986 Música: Heitor Villa-Lobos Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Carlos Gomes Sonata | 1986 Música: Antônio Carlos Gomes Coreografia: Rodrigo Pederneiras Canções | 1987 Música: Richard Strauss Coreografia: Rodrigo Pederneiras Duo | 1987 Música: Heitor Villa-Lobos Coreografia: Rodrigo Pederneiras Pas du Pont | 1987 Música: Heitor Villa-Lobos Coreografia: Rodrigo Pederneiras Schumann Ballet | 1988 Música: Robert Schumann Coreografia: Rodrigo Pederneiras

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Rapsódia | 1988 Música: Johannes Brahms Coreografia: Rodrigo Pederneiras Uakti | 1988 Música: Marco Antônio Guimarães Coreografia: Rodrigo Pederneiras Mulheres | 1988 Música: Krzysztof Penderecki Coreografia: Susanne Linke Missa do Orfanato | 1989 Música: Wolfgang Amadeus Mozart Coreografia: Rodrigo Pederneiras A Criação | 1990 Música: Franz Joseph Haydn Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Três Concertos | 1991 Música: Georg Philipp Telemann Coreografia: Rodrigo Pederneiras Variações Enigma | 1991 Música: Edward Elgar Coreografia: Rodrigo Pederneiras 21 | 1992 Música: Marco Antônio Guimarães/Uakti Coreografia: Rodrigo Pederneiras Nazareth | 1993 Música: José Miguel Wisnik (sobre obras de Ernesto Nazareth) Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Sete ou Oito Peças para um Ballet | 1994 Música: Philip Glass/Uakti Coreografia: Rodrigo Pederneiras Bach | 1996 Música: Marco Antônio Guimarães (sobre obra de J. S. Bach) Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Parabelo | 1997 Música: Tom Zé e José Miguel Wisnik Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Benguelê | 1998 Música: João Bosco Coreografia: Rodrigo Pederneiras

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O Corpo | 2000 Música: Arnaldo Antunes Coreografia: Rodrigo Pederneiras Santagustin | 2002 Música: Tom Zé e Gilberto Assis Coreografia: Rodrigo Pederneiras Lecuona | 2004 Música: Ernesto Lecuona Coreografia: Rodrigo Pederneiras Onqotô | 2005 Música: Caetano Veloso e José Miguel Wisnik Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Breu | 2007 Música: Lenine Coreografia: Rodrigo Pederneiras Ímã | 2009 Música: +2 (Moreno, Domenico e Kassin) Coreografia: Rodrigo Pederneiras Sem Mim | 2011 Música: Carlos Núñes e José Miguel Wisnik (sobre obra de Martín Codax) Coreografia: Rodrigo Pederneiras Triz | 2013 Música: Lenine Coreografia: Rodrigo Pederneiras

Suíte Branca | 2015 Música: Samuel Rosa Coreografia: Cassi Abranches Dança Sinfônica | 2015 Música: Marco Antônio Guimarães Coreografia: Rodrigo Pederneiras

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Concepção e realização Itaú Cultural Curadoria Paulo PederneirasProjeto expográfico Paulo Pederneiras Projeto arquitetônico Fernando Maculan Fotos oficiais Grupo Corpo José Luiz Pederneiras Produção Grupo Corpo Michelle DeslandesComunicação Grupo Corpo Cristina Castilho, Mateus Castilho e Cândida BrazEdição e produção de conteúdo audiovisual   JPZ Comunicação – Janaína Patrocínio

ITAÚ CULTURAL

Presidente Milú VillelaDiretor-superintendente Eduardo SaronSuperintendente administrativo Sérgio M. Miyazaki

NÚCLEO DE ARTES CÊNICASGerência Galiana BrasilCoordenação Cristina Espirito SantoProdução-executiva Bebel de Barros

NÚCLEO DE AUDIOVISUAL E LITERATURAGerência Claudiney FerreiraCoordenação Kety Fernandes NassarProdução Roberta RoqueCaptação e edição de vídeos Luiza FagáCaptação de vídeos André Seiti

NÚCLEO DE PRODUÇÃO DE EVENTOSGerência Henrique Idoeta SoaresCoordenação Edvaldo Inácio Silva e Vinícius Ramos Produção Carmen Cristina Fajardo Luccas, Daniel Suares (terceirizado), Érica Pedrosa Galante, Fernanda Carnaúba (terceirizada), Laís Silveira (terceirizada) e Wanderley Bispo

NÚCLEO DE EDUCAÇÃO E RELACIONAMENTOGerência Valéria ToloiCoordenação de atendimento educativo Tatiana PradoEquipe Amanda Freitas, Caroline Faro, Danilo Fox, Thays Heleno, Victor Soriano e Vinicius Magnun Estagiários Alan Ximendes, Breno Gomes, Bruna Linndy,

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Centro de Memória, Documentação e Referência Itaú Cultural | Itaú Cultural

Ocupação Grupo Corpo / organização Itaú Cultural. - São Paulo : Itaú Cultural, 2015. 26 p. : il.

ISBN 978-85-7979-078-2

1. Grupo Corpo 2. Dança contemporânea 3. Dança brasileira 4. Exposição de arte – catálogo I. Instituto Itaú Cultural. II. Título.

CDD 792.80981

Daiana Terra, Felipe Nogueira, Gabriela Akel, Giovani Monaco, Giovanna Nardini, Leandro Lima, Lennin de Almeida, Lucas Balioes, Marcus Ecclissi, Maria Luiza Kazi, Marina Moço, Mayra Rocha, Paloma Rodrigues, Rafael Freire, Renan Ortega, Renata Sterchele, Samara Pavlova, Sara Barbosa, Sidnei Santos, Thomas Angelo, Victoria Pinheiro, Vitor Rosa e William MirandaCoordenação de programas de formação Samara FerreiraEducadores Carla Léllis, Claudia Malaco, Edinho Santos, Josiane Cavalcanti, Lucas Takahaschi, Luisa Saavedra, Malu Ramirez, Raphael Giannini, Thiago Borazanian e Viny Rodrigues

NÚCLEO DE COMUNICAÇÃO E RELACIONAMENTOGerência Ana de Fátima SousaCoordenação de conteúdo Carlos CostaProdução e edição de conteúdo Maria Clara MatosRedes sociais Renato CorchSupervisão de revisão Polyana LimaRevisão de texto Rachel Reis (terceirizada)Coordenação de design Jader RosaProjeto gráfico Guilherme Ferreira, Liane Tiemi e Yoshiharu ArakakiDiagramação Guilherme Ferreira Produção editorial Bruna Guerreiro e Raphaella RodriguesComunicação estratégica Melissa Contessoto, Patrícia Recarey e Simoni Barbiellini

Agradecemos a todas as pessoas que fizeram parte destes 40 anos de história e que generosamente contribuíram com seu acervo de fotos.

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Visitação sábado 5 de dezembro de 2015 a domingo 17 de janeiro de 2016 terça a sexta 9h às 20h [permanência até as 20h30] sábado, domingo e feriado 11h às 20h

Entrada gratuitaConfira a programação completa em itaucultural.org.br.

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Alvará de Funcionamento de Local de Reunião – Protocolo: 2012.0.267.202 – Lotação: 742 pessoas. Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) – Número: 121335 – Vencimento 1/9/2017avenida paulista 149 são paulo sp 01311 000 [estação brigadeiro do metrô] itaucultural.org.br [email protected] fone 11 2168 1777

entrada gratuita