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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA …€¦ · de nossos próprios ―fios‖ podem ser recuperadas de nossa história de leituras externas à escola (GERALDI, 1991, p

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

DIRETORIA DE POLÍTICAS E PROGRAMAS EDUCACIONAIS

COORDENAÇÃO ESTADUAL DO PDE

LEITURA E ANÁLISE LINGUÍSTICA COM FOCO NA PRESSUPOSIÇÃO

LINGUÍSTICA

Iône Aparecida Bresola Rocha1

Alcione Tereza Corbari2

RESUMO: Por meio da implementação de uma proposta de intervenção pedagógica, relata-se, no presente artigo, a experiência obtida no PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional/PR em 2014. A proposta pautou-se na leitura com foco na pressuposição linguística para a formação de leitor mais atento aos diversos níveis de significação da língua. O público alvo do projeto foi a 1ª série do curso do Ensino Médio do Colégio Estadual Princesa Izabel - Ensino Fundamental Médio e Normal, de Três Barras do Paraná/PR, tendo sido implementado durante o 1º semestre de 2014. Optou-se pelo trabalho com o gênero textual notícia (títulos, fragmentos e textos na íntegra), por ser de ampla circulação social. As atividades propostas na Produção Didática tiveram como aporte teórico Geraldi (1991), Cabral (2010), Koch (2009), além de outros teóricos. Também pautaram-se nas orientações apresentadas nas DCEs (PARANÁ, 2008). Obtiveram-se excelentes resultados na implementação da proposta pedagógica, uma vez que, de forma geral, alcançou-se o objetivo de levar os estudantes a refletir sobre os diversos níveis de significado de um texto, focando, sobretudo, a estratégia da pressuposição linguística. PALAVRAS-CHAVE: Leitura; Análise linguística; Pressuposição linguística; Notícias.

1 Professora de Língua Portuguesa da Rede Pública Estadual/Núcleo Regional de

Educação/Cascavel/PR. Professora do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE /SSED/IES – PR/2013-2014. Especialista em Ensino de Língua Portuguesa de 1º e 2º graus. E-mail: [email protected]. 2 Professora orientadora. Doutora em Letras e Linguística pela UFBA. Docente do Curso de

Letras da Unioeste, campus de Cascavel. E-mail: [email protected].

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INTRODUÇÃO

Este artigo pretende apresentar o resultado de uma prática com a leitura

em sala de aula, tendo como foco o conteúdo ―pressuposição linguística‖.

Trata-se da implementação da Proposta de Intervenção Pedagógica produzida

durante o curso PDE (2012-2014), implementada no 1º semestre de 2014,

tendo como público alvo alunos da 1ª série do Ensino Médio do Colégio

Estadual Princesa Izabel - Ensino Fundamental Médio e Normal, de Três

Barras do Paraná/PR. A Produção Didático-Pedagógica intitula-se ―Leitura e

análise linguística com foco na estratégia de pressuposição‖, e apresenta uma

série de sugestões de atividades de leitura com base em notícias (títulos,

fragmentos ou textos na íntegra).

O projeto proposto seguiu o objetivo de proporcionar práticas

significativas de leitura que pudessem contribuir para a formação de leitores

mais atentos aos recursos linguísticos usados por jornalistas, quando da

interação por meio do gênero notícia. A opção por enfocar a pressuposição

linguística levou em conta uma necessidade de formar leitores mais atento aos

diversos níveis de significação da língua.

Neste artigo, além do relato da experiência pedagógica, faz-se uma

retomada de questões teóricas que nortearam a produção do material didático

e sua implementação. Assim, primeiramente, são apresentadas considerações

sobre leitura, análise linguística, gênero notícia e pressuposição linguística. Na

sequência, apresenta-se relato reflexivo sobre a implementação pedagógica.

CONSIDERAÇÕES SOBRE LEITURA E ANÁLISE LINGUÍSTICA

De início, vale observar que o projeto elaborado levou em conta que as

atividades de leitura propostas na escola precisam valorizar as histórias de

leitura que os alunos trazem de suas vivências fora da escola, conforme

defende Geraldi (1991):

Não se creia que estou a defender um ―pragmatismo‖ como inspiração da leitura a se fazer em sala de aula. Estou defendendo, isto sim, que não participamos gratuitamente e emotivamente de relações interlocutivas, e que são os tipos de

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relações interlocutivas em que nos engajamos que melhor pode inspirar a ação pedagógica a se empreender. Assim, atitudes produtivas na leitura e que fazem da leitura uma produção de sentidos pela mobilização dos ―fios‖ dos textos e de nossos próprios ―fios‖ podem ser recuperadas de nossa história de leituras externas à escola (GERALDI, 1991, p. 171).

De acordo com o fragmento citado acima, a prática da leitura não

acontece por acaso, mas com ―reciprocidade‖ (entre o leitor e o texto), em

relação ao que o texto traz de informações e ao que o leitor já conhece,

produzindo, dessa forma, um conhecimento mais elaborado, em relação à

bagagem já adquirida pelo leitor.

Também se levou em conta a orientação apresentada nas Diretrizes

Curriculares da Educação Básica (DCEs) em relação à leitura:

Praticar a leitura em diferentes contextos requer que se compreendam as esferas discursivas em que os textos são produzidos e circulam, bem como se reconheçam as intenções e os interlocutores do discurso (PARANÁ, 2008, p. 57).

Na concepção de linguagem assumida pelas DCEs, ―a leitura é vista

como um ato dialógico, interlocutivo‖ (PARANÁ, 2008. p. 71). Com essa

análise, entende-se que a leitura envolve demandas sociais, históricas,

políticas, econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado momento,

pois o leitor faz sua interpretação com suas experiências, os seus

conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as

várias vozes que o constituem.

[...] a prática de leitura é um princípio de cidadania, ou seja, o leitor cidadão, pelas diferentes práticas de leitura, pode ficar sabendo quais são suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar aberto às conquistas de outros direitos necessários para uma sociedade justa, democrática e feliz (SILVA, 2005, p. 24 apud PARANÁ, 2008, p. 57).

Nessa perspectiva teórica, este trabalho visa a uma reflexão maior

sobre a leitura que vai além da informação estritamente textual, que é, sem

dúvida, uma das formas de ajudar o aluno a inter-relacionar-se com o texto,

saber interpretar de forma mais eficaz e interferir nas informações explícitas e

implícitas.

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Para a leitura se efetivar no caráter individual, é preciso que o estudante

a pratique e tenha conhecimento sobre os apoios linguísticos. Toda leitura

consiste na compreensão de informações explícitas e implícitas no texto para

levar à compreensão do que está posto e do que está nas entrelinhas. Deve-se

buscar práticas de leituras que possibilitem ao aluno conhecimentos

linguísticos para compreender os discursos que o cercam. Com isso, busca-se

formar um aluno que desempenhe o papel de um leitor crítico, capaz de

dialogar com o texto, com condições de interagir com o mundo que o cerca,

conforme orientam as DCEs:

Trata-se de propiciar o desenvolvimento de uma atitude crítica que leva o aluno a perceber o sujeito presente nos textos e, ainda, tomar uma atitude responsiva diante deles. Sob esse ponto de vista, o professor precisa atuar como mediador, provocando os alunos a realizarem leituras significativas. Assim, o professor deve dar condições para que o aluno atribua-se sentidos a sua leitura, visando a um sujeito crítico e atuante nas práticas de letramento da sociedade (PARANÁ, 2008, p. 71).

Cabe aos professores, no entanto, direcionar essas leituras, pelo menos

no início do percurso, até que os educandos alcancem um nível de análise

linguística capaz de levar à análise de discursos.

A proposta em questão foi direcionar leituras possíveis por meio de

exercícios de análise linguística, buscando levar o aluno a uma análise

minuciosa no que se refere às informações que estão explícitas e implícitas em

textos do gênero notícia.

Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação Básica,

A análise linguística é uma prática didática complementar às práticas de leitura, oralidade e escrita, faz parte do letramento escolar, visto que possibilita ―a reflexão consciente sobre fenômenos gramaticais e textual-discursivos que perpassam os usos linguísticos, seja no momento de ler/escutar, de produzir textos ou de refletir sobre esses mesmos usos da língua‖ (MENDONÇA, 2006, p. 204) (PARANÁ, 2008, p. 77).

Ou, nas palavras de Geraldi (1991),

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Com a expressão ―análise linguística‖ pretendo referir precisamente este conjunto de atividades que tomam uma das características da linguagem como seu objeto: o fato de ela poder remeter a si própria, ou seja, com a linguagem não só falamos sobre o mundo ou sobre nossa relação com as coisas, mas também falamos sobre como falamos (GERALDI, 1991, p. 189-190).

O trabalho com a análise de recursos linguístico-discursivos busca levar

o estudante a compreender o porquê do uso deste ou daquele apoio linguístico,

com o objetivo de capacitá-lo como sujeito leitor competente, capaz de pensar

e interferir no meio onde ele vive, transformando a realidade que o cerca.

Vale observar que as atividades de análise linguística focando um

expediente linguístico específico não devem se dar em separado da análise do

texto como um todo, considerando os contextos de produção, circulação e

recepção do gênero.

Nessa perspectiva teórica, buscou-se focar um gênero em específico, a

notícia, observando, antes do trabalho com os expedientes linguísticos, foco do

trabalho, a questão do gênero em que tais elementos se concretizam,

orientando sentidos. Na seção seguinte, apresentam-se algumas

considerações sobre esse gênero.

O GÊNERO NOTÍCIA

De acordo com as Diretrizes Curriculares da Educação Básica

(PARANÁ, 2008, p. 71), ―ler é familiarizar-se com diferentes textos produzidos

em diversas esferas sociais: jornalísticas, artística, judiciária, científica,

didático-pedagógica, cotidiana, midiática, literária, publicitária etc.‖.

Entende-se que os gêneros da esfera jornalística – e, mais

especificamente, o gênero notícia – devem ser trabalhados na aula de Língua

Portuguesa, pois se trata de um gênero que está presente na vida do

estudante.

O livro didático Ser protagonista traz a seguinte definição de notícia:

A notícia é um gênero textual da esfera jornalística que circula em diferentes meios de comunicação: Produzida para ser

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consumida rapidamente, tem um ―prazo de validade‖ bastante curto. A notícia apresenta informações sobre o que se passa à nossa volta – seja em nossa cidade, em nosso país ou no mundo – elementos para refletir a respeito da realidade e agir sobre ela (RAMOS, 2013, p. 322).

A notícia, como citada nesse fragmento, é imediata e deve ser absorvida

no contexto histórico em que foi produzida, para que tenha um significado

contextualizado. Daí a importância do contato em primeira mão com a

informação, para que o leitor possa tomar uma postura coerente em relação a

ela e colocá-la em prática para o bem local ou comum.

Estudar o gênero notícia implica uma reflexão sobre sua função, seu

contexto de produção, sua forma mais ou menos estável e as marcas

linguísticas que o constituem. Esse trabalho com o gênero é imprescindível à

formação de sujeitos reflexivos, pois possibilita criar situações que favoreçam a

leitura-responsiva, de acordo com as DCEs (PARANÁ 2008).

Preferencialmente, deve-se trabalhar com notícias diversas, que

proporcione uma visão de forma ampla do que se pretende conhecer, e, para

que isso ocorra, é necessário que o educando tenha contato com vários tipos

de informações textuais, esteja atento a tudo que o rodeia, agregando o

conhecimento prévio que se estende para o mais detalhado. Para tanto, é

preciso que compreenda as formas de dizer por meio das quais tais

informações são apresentadas ao leitor.

O trabalho de análise linguística pode ser feito a partir do título da

notícia. Segundo Pelim (2009),

[...] a leitura que se inicia pelo título do texto e o toma como um ―orientador de leitura‖, como sugere Guimarães (1995), pode propiciar uma compreensão textual mais rica ou até mesmo diversa. Ao substituirmos o título de determinado texto, por exemplo, é possível que tenhamos leituras diferentes para esse mesmo texto (PELIM, 2009, p. 2).

Seguindo essa perspectiva, os exercícios com títulos de notícias devem

estar ―amarrados‖ de tal forma que essa parte do gênero em foco esteja

fundamentada, para direcionar a atenção e a compreensão da informação que

se pretende fornecer ao leitor.

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Em outras palavras, sugere-se que a leitura seja efetivada de maneira a

contemplar elementos linguísticos em específicos, mas tendo em conta a

leitura global do texto. Por exemplo, conforme se apresentam os conteúdos, no

nível do posto e pressuposto, direcionam-se os sentidos a que se quer que o

leitor chegue.

Vale observar que alguns exercícios propostos tomaram por base títulos

de notícia ou fragmentos de notícia. Observa-se, porém, que, em trabalho

paralelo a tais exercícios, explorou-se o texto na íntegra, inclusive explorando

outros recursos linguísticos que não apenas o posto e o pressuposto.

TRABALHANDO COM A PRESSUPOSIÇÃO LINGUÍSTICA

Por meio das atividades desenvolvidas em sala de aula sobre a

pressuposição linguística, espera-se do aluno o entendimento da

análise dos elementos linguísticos gramaticais dentro do texto com sua coesão

e coerência.

Para apreender um conteúdo pressuposto, é necessário recorrer à significação

linguística. É por isso que Ducrot (1997 apud CABRAL, 2010, p. 63) afirma que: ―o

pressuposto está inscrito na língua. Desse ponto de vista, todos os pressupostos que

o sentido de um enunciado traz já estão previstos na significação da frase‖.

Koch também cita a pressuposição segundo Ducrot:

Chamarei pressuposto de um enunciado às indicações que ele traz, mas sobre as quais o enunciador não quer (ou faz como se não quisesse) fazer recair o encadeamento Trata-se de indicações que se dá como estando à margem da linha argumentativa do discurso (DUCROT, 1978, p. 39 apud KOCH, 2009, p. 65).

Koch toma como exemplo de Ducrot o seguinte enunciado: ―Pedro

deixou de fumar‖. Nesse enunciado, informa-se que Pedro não fuma; esse é o

conteúdo posto. Porém, é possível recuperar também um conteúdo

pressuposto.

Conforme Koch (2009), o conteúdo pressuposto constitui o que o locutor

assume como verdadeiro e sobre o qual não quer ser questionado. Para aceitar

o que foi afirmado no exemplo (o fato de Pedro ter deixado de fumar), é preciso

que tomemos como certa outra informação que, embora não fique em

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evidência no enunciado, está também dita. E qual seria o pressuposto desse

exemplo de Koch (2009)? Se está posto que Pedro ―deixou ‖ de fumar, a partir

daí temos o pressuposto de que antes Pedro fumava. Ou seja, o verbo ―deixar‖

é responsável por explicitar um conteúdo pressuposto.

Analisando o pressuposto a partir de uma perspectiva pragmática,

Cabral (2010) afirma:

Entretanto, muitas vezes, nos encontramos em situações nas quais não nos interessa dizer tudo abertamente. Há situações nas quais precisamos ou desejamos dizer e, ao mesmo tempo, fazer como se não tivéssemos dito, ou melhor, há situações nas quais desejamos ter a possibilidade de recusar a responsabilidade de ter dito; isso é possível por meio de formas implícitas (CABRAL, 2010, p. 60).

Muitas vezes, o produtor do texto tem medo de ofender o interlocutor ou

gerar constrangimento. Às vezes, ao imitir uma opinião contrária à do

interlocutor, o produtor o faz de forma indireta. Outras vezes, recorre a

conteúdos pressupostos por questão de ―economia‖, porque dizer tudo no nível

do pressuposto pode deixar o texto denso e pouco claro. Tome-se por exemplo

o seguinte enunciado: ―Minha amiga de Buenos Aires voltou do Japão hoje‖.

Nesse enunciado, há um conteúdo posto, que fica em evidência: a amiga (de

quem produziu o enunciado) voltou do Japão. No nível do pressuposto, tem-se:

l. A pessoa que fala tem uma amiga; ll. A amiga mora em Buenos Aires (ou é

originária dessa localidade); lll. A amiga viajou para o Japão. Colocar toda

essas informações no nível do posto deixaria o texto com muita

informatividade, o que poderia prejudicar sua coerência.

Considerando os objetivos que o produtor tem em mente, muitas

informações podem ficar no nível do pressuposto, conforme vemos neste título

de uma notícia: ―Novas notas ainda não chegaram à região‖ (NOVAS..., 2013,

Jornal Correio do Povo. p.1.).

Considerando o título da notícia, que fala de cédulas de reais, temos os

seguintes conteúdos:

Posto: As novas notas ainda não chegaram à região.

Pressuposto: Já existiam notas circulando no mercado; Foram lançadas

novas notas; As novas notas chegarão à região.

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Se todo esse conteúdo estivesse no nível do posto, haveria uma carga

informacional muito grande, que poderia prejudicar a interpretação do texto:

―Há notas circulando no mercado. Outras notas foram lançadas. Essas notas

não chegaram à região. Essas notas chegarão à região‖. Essa reescrita

desconfigura o padrão de ―título‖ de notícia, por conta da carga informacional

que carrega.

Há outro nível de implícito a que Ducrot (apud CABRAL, 2010; KOCH,

2009) chama de subentendido, que é aquilo ―que se deixa para o interlocutor

concluir, está nas entrelinhas, serve para o falante proteger-se, para não se

comprometer‖ (CABRAL, 2010, p. 80).

Tome-se como exemplo o seguinte enunciado, apresentado por Cabral (2010, p.

62): ―— Pedro, você chegou cedo‖. Pedro, sabendo que está constantemente

em atraso, pode entender que o estamos acusando de estar sempre atrasado e

responder: ―— Você está dizendo que eu costumo me atrasar?‖ (CABRAL,

2010, p. 62). Cabral (2010) explica que, diante dessa pergunta, o produtor pode

negar que tenha desejado dizer isso, uma vez que foi por meio de um

raciocínio que Pedro chegou a tal conclusão. Como o enunciado não continha

de fato essa informação, ela pode ser negada. No nível pragmático, o

subentendido é uma categoria relevante, uma vez que direciona leituras

possíveis.

Tendo sido exposto, ainda que de forma rápida, a abordagem teórica

que sustenta o projeto proposto, passa-se, na sequência, ao relato reflexivo da

experiência pedagógica.

RELATO REFLEXIVO DA IMPLEMENTAÇÃO PEDAGÓGICA

Conforme exposto na introdução deste artigo, a implementação do

projeto teve como público alvo os alunos da turma da 1ª série ―A‖ do Ensino

Médio do Colégio Estadual Princesa Izabel, na cidade de Três Barras do

Paraná, região Oeste do Estado do Paraná. Conforme já explicitado, focou-se o

conteúdo pressuposição linguística (posto, pressuposto e, de forma marginal,

subentendidos), oportunizando aos alunos atividades de análise linguística.

Foram selecionados alguns títulos, fragmentos e textos na íntegra do gênero

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notícia, considerando que esse gênero traz temas que estão dentro da

realidade dos educandos e apresenta uma linguagem bastante clara e objetiva.

Vale observar que foram promovidos debates sobre os assuntos abordados

nos textos antes de serem propostas atividades orais e escritas sobre a

pressuposição linguística, preparando o aluno para a leitura dos diversos níveis

de significação do texto.

Entende-se que a proposta foi pertinente e passível ao ser desenvolvida.

Sempre que se apresenta um programa de ensino voltado para a leitura e

análise de textos, acredita-se que tal atividade propicie ao aluno o

desenvolvimento de sua competência linguística. No caso da proposta em

pauta sobre a pressuposição, foi possível, no geral, um melhoramento no que

diz respeito ao entendimento do assunto em estudo.

Para a realização das leituras, foram feitas pesquisas na internet do

colégio e coletados textos para que pudesse ser implementado o projeto.

Oralmente, discutiu-se a estrutura sintática, semântica e estilística dos textos e

afinando-se a atenção para a presença de explícitos, implícitos, postos,

pressupostos e subentendidos.

Num primeiro momento, as atividades escritas envolveram títulos de

notícias tiradas de fontes diversas (jornais). Após uma análise linguística geral,

a partir de exercícios orais, apresentaram-se atividades de reconhecimento do

conteúdo posto e pressuposto.

Num segundo momento, foi apresentado texto intitulado

Concessionárias admitem reduzir preço do pedágio, com elementos linguísticos

destacados para que o aluno indicasse o pressuposto nestes elementos

envolvido. Na sequência, os alunos foram instigados a encontrar elementos

que carregasse pressuposto no texto intitulado Denúncias de violência contra a

mulher crescem. Em alguns momentos, houve necessidade de retomar alguns

conceitos para que os exercícios fossem efetivados de forma a alcançar os

objetivos propostos.

Em seguida, foram apresentados outros apoios linguísticos (verbos e

marcadores aspectuais ou interativos), de pressuposição, conforme exposto

por Cabral (2010). Mediante exemplos, propuseram-se atividades de

identificação do pressuposto.

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Numa análise geral, ao realizar os exercícios, os educandos mostraram

interesse e curiosidade pelo conteúdo abordado, o que também facilitou a sua

compreensão dos conteúdos. Entende-se que as atividades propostas

contribuíram para melhorar o desenvolvimento da competência leitora dos

alunos.

Na sequência, estimulou-se a capacidade de leitura compreensiva, com

pesquisa de títulos de notícias, fragmentos de notícias e textos de notícias na

íntegra, em várias fontes, como jornais impressos e publicados na internet,

atentando para a construção de significados, identificando o posto, pressuposto

e subtendido. Esse conhecimento permitiu ao aluno conhecer aspectos

importantes na construção da notícia, possibilitando-lhe uma reflexão maior

sobre a leitura que vai além da informação estritamente textual. Essa é uma

das formas de ajudar o aluno a relacionar-se ativamente com o texto, saber

interpretar de forma mais eficaz, identificando informações explícitas e

implícitas.

Ao concluir as atividades de leitura com os alunos, percebeu-se que,

além de proporcionar a ampliação do conhecimento sobre leitura, elas também

contribuíram para que os alunos tivessem maior segurança para discutir os

diversos assuntos abordados.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na experiência apresentada, verificou-se, no desenvolver do projeto de

leitura com foco na pressuposição linguística, que o conteúdo abordado é

relevante para alcançar o objetivo de transformar social e culturalmente o aluno

e de capacitá-lo a descobrir sentido na leitura, tendo uma postura ativa ante o

mundo em que está inserido.

Essa experiência, a qual deve ser vista como uma possível proposta de

ensino de leitura com foco na pressuposição linguística, objetivou formar

leitores competentes. Por isso, o importante é que o professor tenha o

conhecimento teórico e, com base em uma metodologia de ensino, possa

desenvolver estratégias que motive o aluno a ler.

Obtiveram-se excelentes resultados na implementação da proposta

pedagógica, uma vez que se pôde contar com a participação ativa dos alunos

em cada atividade sugerida. Ao chegar ao final da implementação da produção

didática, desenvolvidas as atividades de leitura, percebeu-se que os alunos, no

geral, foram capazes de identificar conteúdos postos, pressupostos e

subentendidos em títulos e fragmentos de notícias ou notícias na íntegra.

A experiência aqui relatada possibilita concluir que toda prática

pedagógica intencional, diferenciada da prática tradicional de trabalho com

leitura, traz bons resultados e contribui decisivamente para desenvolver a

proficiência da leitura, e, consequentemente, para formar leitores mais críticos

e atuantes, no sentido de interagir com o texto.

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REFERÊNCIAS

CABRAL, Ana Lúcia Tinoco. A força das palavras: dizer e argumentar. São

Paulo: Contexto, 2010.

GERALDI, João Wanderlei. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes,

1991.

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça. Argumentação e linguagem. 12. ed. São

Paulo: Cortez, 2009.

NOVAS notas ainda não chegaram à região. Correio do povo do Paraná,

Laranjeiras do Sul, 31 jul. 2013. Disponível em: <http://www.jcorreiodopovo.

com.br/exibenoticia.php?id=novas-notas-ainda-nao-chegaram-a-regiao>.

Acesso em: 15 ago. 2013.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação/Superintendência da Educação.

Diretrizes curriculares da educação básica: Língua Portuguesa. Curitiba:

SEED, 2008. Disponível em: <http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/

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PELIM, Tiago. Análise textual de títulos jornalísticos: um estudo comparativo

entre as seções. Vertentes, São João Del-Rei, n. 34, p. 1-13, jul./dez. 2009.

Disponível em: <http://www.ufsj.edu.br/portal-repositorio/File/Vertentes34/Tiago

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RAMOS, Rogério de Araújo. Livro Didático ―Ser protagonista”, p. 322. São

Paulo: Editora SM, 2ª edição 2013.