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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE
I
COMUNIDADE QUILOMBOLA JOÃO SURÁ – ADRIANÓPOLIS – PR
AUTORA: Maria Luiza da Silveira Silva ORIENTADOR: Dr. Luiz Carlos Ribeiro
RESUMO
O presente artigo teve como objeto de estudo os afrodescendentes da Comunidade
Quilombola João Surá do Município de Adrianópolis – Paraná. Um estudo da história da comunidade,
cultura, posse das terras ocupadas por eles, atividades econômicas, como se organizaram em
comunidades quilombolas, como se relacionavam com os homens brancos no espaço rural. Diante
do clamor do Movimento Negro no Brasil, trabalhar a temática étnico racial tornou-se uma demanda
cultural e uma exigência pedagógica, agilizada em especial a partir da lei nº 10.639/03. De todo
modo, quebrar o estereótipo da escravidão que resulta no preconceito não é uma tarefa fácil, já que
as produções que prevalecem nos livros didáticos continuam sendo eurocêntricas. O projeto foi
desenvolvido com 32 alunos do 8º ano. A implementação do projeto foi iniciada com questões
diagnósticas visando ter um conhecimento prévio sobre o tema trabalhado. A maioria dos alunos não
sabia o que era quilombo, alguns associaram a Quilombo dos Palmares. Após o desenvolvimento de
todas as atividades propostas, os alunos mudaram sua concepção de quilombo. O objetivo do projeto
foi cumprido, os alunos demonstraram por meio das atividades aplicadas que compreenderam o
processo de formação dos quilombos, a importância da cultura africana e o respeito às diferenças
culturais.
Palavras-chave : Comunidade Quilombola, Afrodescendente, Cultura.
INTRODUÇÃO
O presente artigo mostra como a comunidade remanescente do Quilombo
João Surá, manifesta no cotidiano seus valores culturais, hábitos e atitudes em
relação à pluralidade étnica dos quilombolas. Para estabelecer uma relação entre
teoria e prática, se faz necessário a contribuição de diferentes autores.
A escolha do tema surgiu a partir da minha experiência profissional como
professora de história da Rede Pública estadual do Paraná, visando contemplar a
importância do ensino da cultura afro- brasileira. Após a aprovação da Lei 10.639/03,
percebe-se que a sociedade escolar está voltada aos pressupostos das políticas
públicas, muitos sabem da luta pela valorização da população afrodescendente por
seus direitos, por uma sociedade igualitária. A abordagem dessa lei inclui no
currículo oficial das redes de ensino a temática “História e Cultura Afro-brasileira”, a
qual possibilita a prática em sala de aula com debates e informações sobre as
comunidades remanescentes do Estado do Paraná. O projeto mostra a importância
do legado africano na formação da História do Brasil e sua contribuição no
desenvolvimento bem como sua luta para sair da invisibilidade.
Com o assunto inserido no currículo escolar contribui para a valorização da
cultura negra em nossa sociedade, incentivando instituições escolares, alunos,
professores e comunidade compreenderem a cultura africana, dando-lhes
importância da desmistificação de uma imagem eurocêntrica de que o africano foi
um povo explorado, oprimido e sem atitude. Nesse contexto, o governo federal
sancionou, em março de 2003, a Lei nº 10.639/03-MEC, que altera a LDB (Lei de
Diretrizes e Bases), e estabelece as Diretrizes Curriculares para a implementação da
mesma. A lei 10.639 instituiu a obrigatoriedade do ensino da História da África e dos
africanos no currículo escolar do Ensino Fundamental e Médio. Essa decisão
procura recuperar historicamente a contribuição dos negros na construção e
formação da sociedade brasileira. (BRASIL. 2004 p.8).
O estudo da história da cultura afro-brasileira é essencial para desmistificar o
imaginário do aluno. É função da instituição escolar, incentivar a abordagem em sala
de aula dos valores socioculturais construídos, pela visão dos negros e de seus
descendentes, deixando de ter somente a visão eurocêntrica. Incentivar essa
abordagem em sala de aula favorece os alunos, por meio de pesquisas
bibliográficas, a reconstrução da história brasileira através da visão dos
afrodescendentes.
DESENVOLVIMENTO
Através das Diretrizes Curriculares da Educação Básica das relações étnicos
raciais para o ensino da História e cultura Afro-Brasileira e Africana garante políticas
de reparação, de reconhecimento e valorização de ações afirmativas.
A demanda por reparações visa que o Estado e a sociedade tomem medidas
para ressarcir os descendentes de africanos, dos danos psicológicos, materiais,
sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em
virtude das políticas explícitas ou tácitas de branqueamento da população, de
manutenção de privilégios exclusivos para grupos com poder de governar e de influir
na formulação de políticas, no pós- abolição. Visa também que tais medidas se
concretizem em iniciativas de combate ao racismo e a toda sorte de discriminação. (
Brasil, 2004, p. 11).
Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que
cumpre ao dispositivo na Constituição Federal, Art.205, que assinala o dever do
Estado de garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o
pleno desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão
profissional. Sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-
brasileiros, dificilmente, romperão o sistema meritocrático que agrava as
desigualdades e gera injustiças, ao rege-se por critérios de exclusão, fundados em
preconceitos e manutenção de privilégios para os sempre privilegiados. Essas
políticas devem garantir ingresso, permanência e sucesso na educação escolar de
valorização do patrimônio histórico cultural afro-brasileiro. (Brasil, 2004, p.11).
Assim sendo, as políticas de reparações de reconhecimento de ações
afirmativas, devem contemplar as relações étnico-raciais com adoção de políticas
educacionais e estratégias pedagógicas de valorização da diversidade, para superar
as desigualdades presentes, e respeitar o processo histórico de resistência negra,
desencadeadas pelos africanos escravizados no Brasil e por seus descendentes na
contemporaneidade, em suas formas, tanto individuais como na coletividade.
Para obter êxito, a escola e seus professores não podem improvisar têm
que desfazer mentalidade racista e discriminadora secular, superando o
etnocentrismo europeu, reestruturando relações étnico-raciais e sociais,
processos pedagógicos. Isto não pode ficar reduzido a palavras e a
raciocínios desvinculados da experiência de ser inferiorizados vividos pelos
negros, tampouco das baixas classificações que lhe são atribuídas nas
escalas de desigualdades sociais, econômicas, educativas e políticas.
(BRASIL,2004,p.15)
Percebe-se que nos livros de História os professores trabalham os
conteúdos didáticos centrados nos povos europeus, o que torna uma realidade muito
distante do cotidiano dos alunos, pois convivemos com a diversidade em nossas
escolas. Muitas vezes desconhecem que a Comunidade Quilombola tem sua
importância cultural e econômica.
A relevância da inclusão de História e Cultura Afro-brasileira e Africana nos
currículos da Educação Básica trata-se de decisão política, com fortes
repercussões pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com esta
medida, reconhece-se que, além de garantir vagas para negros nos bancos
escolares, é preciso valorizar devidamente a história e cultura de seu povo,
buscando reparar danos, que se repetem há cinco séculos, à sua identidade
e a seus direitos. A relevância do estudo de temas decorrentes da história e
cultura afro-brasileira e africana não se restringe à população negra, ao
contrário, diz respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se
enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multicultural e
pluriétnica, capazes de construir uma nação democrática. (BRASIL, 2004,
p.17).
O currículo escolar deve ser reconstruído por todos os segmentos
pertencentes à instituição escolar, de forma a construir um processo educacional
democrático que esclareça aos alunos a importância de ver e reconhecer ao outro
como semelhante.
A promulgação da Lei 11.645, de 2008, veio alterar a Lei nº 9394, de 20 de
dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10639, de 09 de janeiro de 2003, que
estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, visando incluir no currículo
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da Temática História e Cultura Afro-
brasileira e Indígena.
O que esta Lei altera no conteúdo programático da educação básica é a
inclusão dos diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação
da população brasileira, a partir dos dois grupos étnicos: africana e indígena. A Lei
enfatiza o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos
indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na
formação da sociedade nacional. Resgata assim as suas contribuições nas áreas
sociais, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.
Para compreendermos o universo da pesquisa e dos sujeitos estudados, será
preciso entender como se deu o processo de formação de Quilombos, que ocorreu a
partir do fim do século XVI no Brasil escravagista.
Ao se falar em quilombo, que na língua Banto significa “povoação”, vem logo
à mente o Quilombo dos Palmares, que realmente foi o mais conhecido do Brasil e é
hoje o símbolo da luta do Movimento Negro. Sabe-se que este foi um núcleo de
resistência formado por volta de 1600 na Serra da Barriga, em Alagoas; ao longo
dos anos se fortificou, chegando a reunir quase 30 mil pessoas, que em
aproximadamente 100 anos sofreram constantes ataques de holandeses e
portugueses.
Em 1740, reportando-se ao rei de Portugal, o Conselho Ultramarino valeu-se
da seguinte definição de quilombo: “toda habitação de negros fugidos, que passem
de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e nem
se achem pilões nele”. Os grupos considerados atualmente como remanescentes de
comunidades de quilombos se constituíram a partir de uma grande diversidade de
processos, como dissolução de fazendas por enfraquecimento da atividade
econômica, heranças, doações, recebimento de terras como pagamento de serviços
prestados ao Estado, prestação de serviços em períodos de guerras, compra de
terra (tanto durante a vigência do sistema escravocrata quanto após a sua extinção)
ou a simples permanência nas terras que ocupavam e cultivavam no interior das
grandes propriedades. Estes historiadores acreditam que apenas a minoria é
resultado de agrupamentos criados após a abolição da escravatura no Brasil
(ÉPOCA, 2006; SCHMITT, TURATTI, CARVALHO; 2002).
A crítica ao conceito reducionista de quilombo estabelecido pelo Conselho
Ultramarino, para ALMEIDA (1999), fica evidente na citação: “se pode reinterpretar
criticamente o conceito e asseverar que a situação de quilombo existe onde há
autonomia, existe onde há uma produção autônoma que não passa pelo grande
proprietário ou pelo senhor de escravos como mediador efetivo, embora
simbolicamente tal mediação possa ser estrategicamente mantida numa
reapropriação do mito do 'bom senhor', tal como se detecta hoje em algumas
situações de aforamento”.
Esta visão reduzida que se tinha das comunidades rurais negras refletia a
“invisibilidade” produzida pela história oficial, cuja ideologia ignora propositadamente
os efeitos da escravidão na sociedade brasileira, assim como os efeitos da
inexistência de uma política governamental que regularizasse as posses de terras,
extremamente comuns à época, de grupos e/ou famílias negras após a abolição
(GOMES, 1996).
Assim, o termo remanescente de quilombo ou quilombolas, como se divulga
popularmente, indica “a situação presente dos segmentos negros em diferentes
regiões e contextos e é utilizado para designar um legado, uma herança cultural e
material que lhe confere uma referência presencial no sentimento de ser e pertencer
a um lugar específico”. Isso expressa a identidade étnica e a territoriedade, num
espaço de não submissão e dependência dos grupos negros em relação à
sociedade inclusiva dos brancos. (GUSMÃO, 1995; Schmitt, TURATTI, CARVALHO;
2002).
Atualmente, há no país cerca de 2000 áreas remanescentes de quilombos,
sendo que destas, 659 têm registro e apenas 67 possuem título de propriedade. A
população de quilombolas, segundo estimativas do Governo Federal, está em torno
de 2 milhões, ocupando cerca de 30 milhões de hectares nos estados de São Paulo,
Rio de Janeiro, Pará, Maranhão, Pernambuco, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,
Bahia, Sergipe, Goiás e Amapá (ÉPOCA, 2006).
A luta dessas populações negras pelo direito de continuar ocupando e
transmitindo às gerações vindouras o território formado por diversas gerações de
seus antepassados, encontra barreiras desfavoráveis, pois sofrem o preconceito
historicamente traçado no que diz respeito às relações de poder. Em tal situação de
desigualdade, passam a valorar positivamente seus traços culturais e suas relações
coletivas como forma de ajustar-se às pressões sofridas, construindo sua relação
com a terra, tornando-a um território impregnado de significações relacionadas à
resistência cultural, salientando que não é qualquer terra, mas a terra na qual
mantiveram alguma autonomia cultural, social e, consequentemente, a autoestima
(SCHMITT, TURATTI, CARVALHO; 2002).
Segundo os pressupostos das políticas públicas relacionadas aos quilombolas:
Uma comunidade remanescente não é apenas um grupo humano unido,
assentado sobre um pedaço de terra, no qual produz para sua subsistência
ou, em alguns casos, com a produção de excedentes que podem ser
comercializados. Seu território configura-se como um espaço econômico,
mas também cultural. (SILVA, 2008, p18)
Sendo assim, é justo o significado da expressão quilombola, palavra de
origem africana, o movimento identitário que emergiu nos anos 70, legislação
brasileira que reconhece os direitos, a história da formação, as ações e suas
medidas junto à comunidade João Surá no Município de Adrianópolis.
É deste modo que, ao caracterizar a noção de sujeito como identidade que
implica o “novo” e o “coletivo”, deve-se privilegiar, numa pluralidade de
sujeitos, os movimentos sociais recentes, como os campesinos, indígenas,
negros, mulheres, minorias étnicas e outros. Os movimentos sociais são,
hoje, os sujeitos de nova cidadania, revelando-se autênticas fontes de uma
legitimidade.
( VOLKMER.,2006. P.193).
A partir do entendimento do processo de estruturação das comunidades
remanescentes de quilombos ao longo dos anos, busca-se compreender a realidade
vivida por centenas destas, espalhadas pelo território brasileiro, em busca de uma
identidade quilombola, construída a partir da necessidade de lutar pela terra, pelo
direito de propriedade consagrada pela Constituição Federal desde 1988. Dentre
estas comunidades remanescentes de Quilombolas em particular, o estudo da
Comunidade Quilombola João Surá, que está localizada a 50 quilômetros do
município de Adrianópolis, fronteira entre o Paraná e São Paulo, mantendo sua
cultura há 200 anos.
.
De acordo com a lei Nº 10.639/2003, a questão relacionada à cultura
africana deve estar presente no Projeto Político Pedagógico da escola. Porém, o que
se percebe é que a cultura africana é trabalhada somente em datas específicas, tais
como: o treze de maio limitando às leis abolicionistas e o Dia da Consciência Negra,
não levando em consideração as contribuições culturais e econômicas para o
desenvolvimento do país, não existindo a preocupação em conhecer o cotidiano
dessas comunidades, seus interesses e práticas sociais, etc..
No Paraná, somente a partir das pesquisas realizadas pelo Grupo de
Trabalho Clóvis Moura, através de pesquisa intersecretarial, a partir de 2004, que
essas comunidades se tornaram evidentes. Ocorreu o mapeamento dessas
comunidades negras tradicionais, destacando as principais características culturais
dos quilombos Paranaenses.
Entre os importantes intelectuais que no século XX, que se propuseram a
repensar o Brasil, temos Clóvis Moura, que refletiu principalmente sobre a questão
do negro na formação da nação.
O que sempre o preocupou foram as indagações sobre os dilemas da
constituição da nação, evidenciando a marginalização de negros e mestiços, tendo
como um dos muitos resultados um racismo à brasileira, baseado mais na cor da
pele do que na origem racial. Moura buscou valorizar a resistência dos negros e seu
importante papel na transformação da condição de escravo, portanto, seu caráter
dinâmico na história do país. Estabeleceu, através da análise dos quilombos e das
numerosas insurreições escravas, uma nova interpretação da sociedade brasileira.
O conceito de luta de classes foi usado como chave para a interpretação desses
movimentos, que representariam o processo mais agudo da luta de classes no
tempo da escravidão.
Enfatiza, que em nenhum momento, os donos do poder estiveram voltados
para atender as necessidades do conjunto, da sociedade composta por uma
A Comunidade existe há 200 anos. Os pioneiros chegaram ao local
fugindo da escravidão de uma mina de ouro existente no Município de
Apiaí , em São Paulo. No início, o quilombo era uma vasta área, que
com o tempo foi reduzida. Por isso vários núcleos hoje formam
comunidades separadas. Consta-se que o quilombo recebeu este
nome por conta da existência de uma cachoeira no Rio Pardo, na qual
teria morrido, em naufrágio, o garimpeiro francês conhecido na região
como João Surá, face ao peso do ouro na sua mochila. (JUNIOR;
SILVA; COSTA, 2008. p 24)
população majoritariamente não-branca, que se encontra nas camadas sociais mais
baixas, ou se acham excluídas dos benefícios do processo econômico, formando a
categoria sempre crescente dos marginalizados sociais.
Outra questão importante para Clóvis Moura era a condição do negro
durante e depois da escravidão, no que diz respeito ao acesso à terra. A Lei de
Terras de 1850, seria um momento fundamental, pois obrigava o registro de todas as
terras efetivamente ocupadas por sesmeiros e descendentes, via herança ou
compra.
Na análise de Moura, a Lei de Terras foi excludente principalmente para os
negros, uma vez, que os já libertos, saíam do cativeiro sem a oportunidade de
ocupar terra e se tornar lavradores independentes. Isso os obrigaria a continuar
trabalhando para terceiros. Portanto, essa lei veio contribuir para a manutenção das
hierarquias sociais e raciais.
Logicamente, se a abolição tivesse ocorrido antes da Lei de Terras, a história
do negro brasileiro teria possivelmente sido bem diferente.
Moura, afirmou que “o escravo ao plantar uma parcela de terra pertencente
ao seu senhor, não estabelece outro tipo de relação (feudal ou capitalista) mas esta
relação continua escravista, aumentando o trabalho do escravo e dando lucro
suplementar ao senhor. […] o escravo que trabalha por consentimento do seu
senhor em um pequeno lote de terra, plantando nessa parcela, produtos agrícolas
em pequena escala para uso pessoal, como atividade suplementar às suas
atividades ordinárias, jamais perde a sua condição (essência) de ser alienado da sua
condição humana”.
Moura observou que a Lei de Terras, foi uma estratégia de “modernização” do
campo que tinha por finalidade conservar a grande propriedade e,
concomitantemente, veio a funcionar como uma das maneiras de impedir o acesso
da “plebe negra” à terra, criando assim “os mecanismos de dependência dos sem-
terra que perduraram até hoje”.
O que diz o Grupo do Trabalho Clóvis Moura (GTCM), rompe com o pacto do
silêncio das elites, e em especial com o viés latifundiário, como mecanismo de
invisibilidade das questões étnico raciais do Paraná. Este trabalho trouxe à tona uma
realidade perversa vivenciada pelas etnias que construíram esse Brasil, inclusive o
Paraná, encarando que há um amplo processo de cidadania incompleto e que
anseia por ações e políticas públicas, visando o reconhecimento e a garantia dos
direitos territoriais dos descendentes dos africanos capturados, aprisionados e
escravizados pelo sistema colonial português. As terras dos quilombos foram
consideradas parte do patrimônio cultural desses grupos negros e, enquanto tais
devem ser alvos de proteção por parte do Estado.
O objeto de estudo deste trabalho foi realizado através de uma abordagem
qualitativa que, segundo Minayo (2008), responde a questões muito particulares, isto
é, trabalha com o universo dos significados, dos motivos, aspirações, crenças,
valores e atitudes – elementos que interferem nos fenômenos estudados.
Minayo (2008), divide esse processo de trabalho de pesquisa qualitativa em
três etapas: fase exploratória; trabalho de campo; e análise e tratamento do material
empírico e documental.
Na fase exploratória, foi realizada a definição e delimitação do objeto de
estudo, bem como a seleção de abordagens teóricas e metodológicas.
O trabalho de campo foi o momento de levar para a prática empírica a
construção teórica produzida na etapa anterior, ou seja, na fase exploratória.
Escolhi como trabalho de campo, uma visita à comunidade como
modalidade de comunicação de interlocução e informações orais.
Segundo Minayo (1992), essa etapa é “o recorte que o pesquisador faz em
termos de espaço”, pois é no campo de pesquisa que se encontram as
manifestações intersubjetivas e interações entre o pesquisador e os sujeitos
estudados”.
Na coleta de dados, utilizei também o recurso da fotografia, pois ela contribui
como fonte documental para evidenciar o objeto pesquisado, favorecendo a leitura
na superação das condições que se apresentam no foco ilustrativo; imagens
dialogando com o texto escrito. Assim nos afirma Kossoy (1998, p.44): “resgatando o
ausente da imagem compreendemos o sentido aparente, sua face visível”. A última
etapa foi a análise e tratamento do material empírico e documental.
Trabalhar com o tema no 8º ano, teve por objetivo levar aos alunos a
realidade do local, para que entendam a organização da comunidade
afrodescendente quilombola João Surá, no Município de Adrianópolis -PR
O projeto foi elaborado a partir da constatação da existência de comunidades
quilombolas nas proximidades de Adrianópolis, e também a partir da implementação
lei 10.639/2003 que tornou obrigatório o ensino afro-brasileiro nos currículos
escolares, porque até então era considerada uma história esquecida e desvalorizada
até mesmo por professores.
Devido ao pouco conhecimento dos alunos em relação à história afro-
brasileira, raros trabalhado nos conteúdos escolares, busquei desenvolver esse
trabalho relacionado à Comunidade Quilombola João Surá. Essa pesquisa
possibilitou aos alunos conhecer o modo de vivência das comunidades quilombolas
através de leitura de bibliografias, pesquisas em jornais, revistas, documentários em
vídeos para atender ao que institui a lei 10.639/2003 e ao mesmo tempo,
ressignificar a história afro-brasileira, percebendo que o quilombo tem significado
histórico, político, social, ideológico.
Para a primeira etapa do projeto realizamos leituras sobre o tema escolhido,
posteriormente, o levantamento de dados sobre as comunidades quilombolas
remanescentes nas proximidades de Adrianópolis.
Na segunda etapa foi produzido material didático-pedagógico sobre o tema
abordado.
Já, na terceira etapa foi apresentado aos alunos slides sobre o que são
comunidades remanescentes quilombolas, com fotos das mesmas.
Realizada a apresentação do Projeto de Intervenção Pedagógica aos alunos de
forma expositiva e dialogada, levando-os a valorizar o tema, pois não poderíamos
entender a diversidade cultural brasileira se não focalizássemos a importância da
contribuição das etnias africanas que compõem com muitas outras a miscigenada
feição brasileira, a riqueza cultural, hábitos e modos de vida presente nas
comunidades quilombolas do Estado do Paraná, especialmente a Comunidade
Quilombola de João Surá – Adrianópolis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com este projeto realizou-se um referencial sobre as comunidades
remanescentes Quilombola, especificamente a Comunidade João Surá em
Adrianópolis, Paraná.
Foi enfatizado a importância da cultura negra, demonstrando o modo de viver
desta comunidade remanescente, como estas comunidades passaram a ser
percebidas e mapeadas pelo grupo de trabalho Intersecretarial do Governo do
Paraná - Clóvis Moura, contextualizando o movimento negro no Paraná e Brasil.
A compreensão das áreas remanescentes de quilombos do Paraná como
patrimônio cultural, inserida em um processo educativo significa, enfim, compreendê-
las como fontes materiais e imateriais de conhecimento crítico, individual e coletivo.
Significa, na prática, o aluno vivenciar, se apropriar e valorizar a herança
sociocultural dos ancestrais, ao aprender a trajetória histórico-temporal-espacial do
mundo que o cerca, da realidade na qual está inserido.
Também foi enfatizado o cumprimento da Lei nº10639/03, que inclui no
Currículo oficial a obrigatoriedade da História e Cultura Afro – Brasileira, seguidas
das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das relações étnico-raciais e
para o Ensino de História e Cultura Afro Brasileira e Africana.
Ao iniciar o Projeto PDE, observei que os educandos desconheciam a
existência de comunidades negras no Brasil e no Paraná. Alguns alunos
relacionavam “quilombolas” a comunidades indígenas ou região povoada por tribos
indígenas. Após análises, discussões e apresentações do Projeto, compreenderam a
forma de organização política e econômica, e a importância desse processo para
que os remanescentes permanecessem durante tantos anos, atingindo uma
população numerosa.
Os educandos entenderam que a diversidade faz parte do nosso estado e
elaboraram conceitos sobre os povos que formaram o Estado do Paraná,
respeitando as comunidades quilombolas e reconhecendo-os como cidadãos de
direitos.
Após apresentação dos vídeos, os quais retratam o modo de vida dos
quilombolas, compreenderam que as terras, as quais, as comunidades ocupam são
de pouco valor tanto monetário, quanto produtivo, ficam em regiões de difícil acesso,
não despertando interesse de grandes proprietários na região e que este é um dos
motivos pelos quais eles ainda não foram expulsos.
Houve a reflexão sobre “apego aos costumes”, tentativa de sobreviver da
terra, necessidade de vida em conjunto, falta de oportunidades, entre outros; o
trabalho com mapas chamou a atenção no que diz respeito ao número de
comunidades existentes no estado do Paraná, sendo 86, das quais 37 reconhecidas
pela Fundação Palmares, as demais em processo de reconhecimento.
A inserção da temática contribuiu para uma melhor aproximação entre a
cultura negra e a compreensão da grande importância dos negros na construção e
formação da sociedade brasileira.
O desenvolvimento do trabalho teve como foco a comunidade já citada, no
entanto não podemos deixar de observar a grande importância dos negros
contribuindo desde os primórdios com mão de obra na produção de açúcar, tanto
que em 1711, um jesuíta italiano os chamou de “as mãos e os pés do senhor do
engenho”.
Os alunos compreenderam que apesar de tanta colaboração e exploração
quando eram escravos, sempre sofreram discriminação, mesmo assim contribuíram
e contribuem para as glórias do País, no esporte, na arte, na música, nas atividades
sociais e econômicas, felizmente há trabalhos conscientes por parte da sociedade e
das autoridades para que as injustiças sejam corrigidas, muito já mudou e muito
ainda deve mudar.
Foi possível explanar sobre as condições de vida no passado e na atualidade
levando-os, a um maior conhecimento a respeito da cultura remanescente da cultura
quilombola, especialmente a comunidade de João Surá Paraná.
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