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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
QUESTÕES DE MEDIDAS AGRÁRIAS NA TRIBO "TERRA INDÍGENA IVAÍ"
Sonia da Silva Schenekemberg1
Eliandro Rodrigues Cirilo2
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo auxiliar os educandos no processo de conversão de medidas agrárias em medidas consideradas comerciais, como parte da pesquisa do Programa de Desenvolvimento Educacional, da Secretaria do Estado do Paraná, PDE/2014. Este projeto pretende fazer uma intervenção, no âmbito da Educação Matemática junto à aldeia Terra Indígena Ivaí, onde vivem índios de etnia KAINGANG, os quais buscam o sustento da prática de artesanato e do cultivo de lavouras, há duas formas de exploração agrícola: a que é realizada em micro cultivos local, dentro da reserva; e a realizada pela prestação de serviços a fazendeiros locais, fora da reserva. Nesses dois casos, para receberem o pagamento de seus serviços, os grupos de indígenas, de certo lote de terra precisam efetuar a medição da terra trabalhada, o que fazem utilizando medidas agrárias como corda, braças e litro. Tornou-se explícita a necessidade de desenvolver um trabalho em prol da aldeia Terra Indígena Ivaí, donde surgiu este projeto: Questões de Medidas Agrárias na Tribo "Terra Indígena Ivaí”. Como resultados foram observados uma melhora significativa na compreensão das medidas agrárias utilizadas pela comunidade indígena da Tribo Terra Indígena Ivaí, assim como evidenciou a real necessidade de um trabalho que aborde a etnomatemática.
Palavras-chaves: Educação Indígena. Etnomatemática. Ensino da Matemática Cultura.
INTRODUÇÃO
Ao vivenciar a realidade de sua cultura local e perceber a necessidade que os
indígenas têm ao realizarem cálculos de matemática usuais, como os relacionados
com a medição de terras. Paralelamente a esta necessidade, existe a dificuldade na
conversão destas medidas, uma vez que a etnia Kaingang ainda utiliza métodos
desenvolvidos com os saberes da comunidade, utilizações de medidas agrárias
1 Professora de Matemática do Ensino Fundamental e Ensino Médio da rede pública do Estado do Paraná. Graduada em Matemática, habilitação em matemática pela Faculdades Integradas do Vale do Ivaí UNIVALE /PR. Especialista em Gestão escolar e Educação Especial pela Faculdades Integradas do Vale do Ivaí UNIVALE /PR e Faculdade Integrada de Curitiba FACINTER /PR Aluna do Programa de Desenvolvimento Educacional, da Secretaria do Estado do Paraná, PDE/20142 Orientador/Professor Prf. Dr. Eliandro Rodrigues Cirilo Adjunta da Universidade Estadual de Londrina/UEL.
antigas como cordas, braças e litros são muito utilizadas como instrumento de
medida.
Os próprios agricultores indígenas que realizam este trabalho utilizando esses
sistemas de medição sentem dificuldade ao realizarem as conversões, pois tais
sistemas não são explorados nos existentes nos livros de ensino fundamental e
médio. Assim, meu interesse com este projeto fica pautado na realização de
atividades que serão úteis, não somente para os alunos, mas em prol de toda
comunidade indígena.
A cultura Kaingang vem perdendo muitos elementos próprios ao longo do
tempo, como a própria língua, as crenças, a religião, os costumes e os valores.
Ainda mantendo forte predominância no artesanato e na agricultura, apresenta
dificuldades para o manejo destas conversões de medida, logo, intervir neste
aspecto pode trazer benefícios para toda a comunidade.
O ensino da matemática pode ser utilizado de maneira a ser uma ferramenta
que auxilie a prática cotidiana, que acrescente sentido à realidade, de forma
construtiva. Para ensinar matemática, podemos levar em consideração à realidade
sócio cultural do aluno, o ambiente que ele vive e o conhecimento que ele traz de
casa. Sabe-se que, desde pequenas, muitas crianças encontram-se num ambiente
no qual a ideia de que a matemática é complicada é muito difundido, o que causa
grandes dificuldades para romper barreiras entre a matemática e o cotidiano.
Particularmente, em se tratando de educação Indígena, leva-se aqui em
consideração, que perpassando o tempo e a história, e chegando aos dias atuais, a
educação e a cultura indígena vêm lutando para eliminar seu status de inferioridade
que foram impostas ao longo dos conflitos sociais e para que se fortaleça
independente do contato constante com a cultura dos brancos. Dessa forma, surgiu
problemática deste artigo. Na aldeia Terra Indígena Ivaí, onde vivem
aproximadamente índios de etnia Kaingang, os quais buscam o sustento da prática
de artesanato e do cultivo de lavouras.
Há duas formas de exploração agrícola, a realizada em micro cultivos local,
dentro da reserva e a realizada pela prestação de serviços a fazendeiros locais, fora
da reserva. Nesses casos, os indígenas, para receberem o pagamento de seus
serviços, precisam realizar a medição da terra trabalhada, e o fazem por medidas
como agrárias como corda, braças e litro para realizarem os cálculos de
pagamentos. Considera-se ainda que trabalhem em grupos num mesmo lote de
terra. Os próprios índios fazem a medida do quadro de terras que cada um
trabalhou. Num desses acertos de contas que um ex-aluno indígena, procurou esta
professora PDE para que o ajudasse urgentemente a realizar os cálculos de
conversão de medidas – por exemplo, de braça para metros quadrados, para efetuar
o pagamento dos trabalhadores.
Nesse momento, tornou-se explícita a necessidade de desenvolver um
trabalho em prol da aldeia Terra Indígena Ivaí, donde surgiu este projeto: Questões
de Medidas Agrárias na Tribo "Terra Indígena Ivaí". Assim sendo, delimitou-se a
investigação e intervenção deste artigo em como desenvolver estratégias de ensino
para alunos da Aldeia Tribo Terra Indígena Ivaí para que realizem cálculos de
conversão com medidas agrárias, corda, braça e litro, sem dependerem de
conhecimentos alheios aos que eles próprios dominam e sem desvalorizar a cultura
indígena que trazem?
O objetivo geral deste artigo é propiciar aos alunos instrumentos lógicos
matemáticos que lhes possibilitem ampliar seu patamar de conhecimento em
cálculos de conversão de medida e criar possibilidades de aplicá-los em prol da
valorização cultural e utilidade própria na sociedade que integram, ou seja, na Tribo
Indígena Ivaí. Especificamente busca: possibilitar aos educandos o acesso aos
cálculos matemáticos que os rodeiam; desenvolver nos educandos o raciocínio
lógico matemático aplicado em seu cotidiano; desenvolver a autonomia de
compreensão dos educandos através da matemática; valorizar e se apropriar da
cultura existente na Tribo "Terra Indígena Ivaí".
Este projeto fora implementado no primeiro semestre de 2014, com alunos do
1º ano de um colégio Indígena do interior do Paraná. Onde foram utilizados cálculos
matemáticos, instrumentos de medidas como ferramenta principal para atingir
objetivo proposto, qual seja, como dissemos, propiciar aos alunos de 1º ano,
diferentes maneiras de abordagens de conteúdos matemáticos e desenvolvimento
do raciocínio lógico.
A ETNOMATEMÁTICA E A MATEMÁTICA ACADÊMICA
O ensino da matemática pode ser democrático ao mesmo tempo em que
Valorize o contexto no qual está inserido, sendo assim, a Etnomatemática tem seu
papel fundamental contextualizado na apropriação dos conhecimentos e
comportamentos regionais. D'Ambrósio (2003) afirma que,
Etnomatemática e etnociência resultam de um entendimento transdisciplinar [...] da construção de conhecimentos e comportamentos, e repousam sobre métodos e resultados de cognição, antropologia e dinâmica cultural, epistemologia, história e política. Etnopedagogia é a realização do processo de transmissão e difusão dos conhecimentos e comportamentos gerados e organizados num determinado ambiente natural e social. Uma fragmentação da palavra etnomatemática, com um apelo etimológico aproximado, sintetiza as tentativas de definição. Etno+matema+tica são as técnicas ou artes (ticas) de ensinar, entender, explicar, lidar com o ambiente natural (matema), social e imaginário (Etno). Daí estende-se esta definição à Etnociência e Etnopedagogia. (D'AMBROSIO, 2003, s/p).
No entanto, longe de valorizarmos a cultura regional, a prática em sala de
aula tem nos demonstrado um distanciamento do conteúdo trabalhado com a
realidade de nossos educandos.
Na Educação Indígena, esse distanciamento se acentua ao trabalharmos
questões como o sistema métrico, essencial para o desenvolvimento acadêmico dos
alunos, e se nos detemos somente às medidas consideradas „oficias , presentes‟
nos livros didáticos, sem observarmos que as medidas utilizadas no cotidiano dos
educandos indígenas podem ser outras.
De acordo com o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas –
RCNEI (BRASIL, 1998), a constante ausência de pesquisas relacionadas aos
saberes matemáticos nas escolas indígenas prejudicou o processo de ensino
aprendizagem desses povos. Além disso, a matemática foi mistificada como um
saber não pertencente ao índio. Todavia, o que ocorre é um confronto entre a
matemática formal, escolar e uma matemática particular, uma etnomatemática,
como por exemplo, esta entre meios de manejar as quantidades e medidas
agrícolas, caso onde calculamos (na escola formal) a medida de produção agrícola
através de hectares ou alqueires enquanto os educandos (indígenas) utilizam
medidas como braça ou litro.
Longe de caracterizar motivo de conflitos dentro da sala de aula, reconhecer a
existência de diversos saberes matemáticos e compreender a possível manipulação
desses saberes de acordo com o seu contexto, valoriza e qualifica o processo de
aquisição e construção de conhecimentos próprios da Educação Indígena.
Neste contexto, D'Ambrósio (2007) partilha da visão de que a função de um
professor é associar-se aos seus educandos na consecução de tarefas,
consequentemente, na busca de novos conhecimentos. Os educandos e
professores devem buscar crescimento social e intelectual no desenvolvimento
deste processo. É papel de o professor procurar intervir na qualidade do ensino,
visando desenvolver habilidades no aluno, tornando-o competente na leitura, na fala
e na comunicação, uma vez que é bilíngüe, analisando e resolvendo conflitos dentro
e fora da escola.
As escolas indígenas são diferentes das escolas não-indígenas porque possuem características de ensino próprias. Essas são grandes diferenças. Os regimentos escolares também diferem em vários pontos, como: calendário escolar, carga horária, conteúdos, metodologias de ensino, etc. É diferente porque trabalha respeitando as maneiras tradicionais dos velhos passarem os conhecimentos para os jovens. É diferente porque o professor é o principal autor de seus próprios materiais didáticos usados na escola e usa tanto o conhecimento na escrita quanto o conhecimento oral. A aproximação com a escola não-indígena é pelo caráter de ensino que fazem em busca de seus conhecimentos sociais e da cidadania. Professor Joaquim Maná Kaxinawá, T.I. Praia do Carapanã, 1999 (GRUPIONI, 2005, p.25).
Para tanto, independentemente da área de atuação do professor, este passa
a figurar num novo cenário educativo, cujo papel do professor é interferir no
processo de aprendizagem, respeitando as culturalidades já existentes
(D'AMBRÓSIO, 2007, p.80).
O modo de vida de um povo, as suas manifestações artísticas e sociais, a sua
expressão oral são formas de cultura, são expressões de conhecimento acumulado
e adquirido ao longo de gerações. O conhecimento da tribo, muitas vezes, é apenas
mantido na memória, transmitido por oralidade, não sendo utilizada a escrita para
assegurar a permanência de tradições, fato este presenciado em diversos contos
indígenas que são fonte de regras de vida para determinadas tribos.
D'Ambrosio (2003), ao conceder uma entrevista à Folha Dirigida, abordou
diverso assunto da Educação Indígena retratou a questão das demandas existentes
na atualidade. Este autor destacou como prioritárias as questões relativas do
formar cidadãos ativos na sociedade que acompanhem a atuação de empresários e
políticos e a participação ativa na gestão, produção e trabalho nas diversas
modalidades, às quais solicitam nossa ação e intervenção docente. Sendo
necessária, por parte do docente indígena, a capacidade de compreensão e analise
crítica das situações ou problemas propostos aos educandos, buscando novas
opções para solução dos problemas, fazendo uso de todos os recursos tecnológicos
disponíveis. O sistema educacional deve fornecer ao educando e ao professor em
formação as capacidades que segundo D'Ambrósio (2003) são chamadas de
"instrumentos comunicativos, instrumentos analíticos e instrumentos tecnológicos"
(D'AMBRÓSIO, 2003, s/p).
Segundo o RECNEI (PARANÁ, 1998) pesquisar como diferentes sociedades
realizam seus processos de mensuração de medidas é uma atividade que auxilia
educandos e professores na compreensão das relações entre as medidas oficiais e
as medidas que utilizam em seu cotidiano. O desenvolvimento dos conceitos
matemáticos pode ser percebido por meio do estudo de padrões medidos tidos
como antigos ou, como nesse caso, regionais, o que proporciona uma maior
compreensão da utilização dos preceitos da etnomatemática.
A educação propicia ao educador a chance de trabalhar o ser humano em sua
totalidade, sendo desenvolvidas e compartilhadas com seus educandos as
dimensões "sensorial, emotiva, intuitiva, simbólica e racional”, como defendido por
D'Ambrósio (2003).
Em sua totalidade a educação inclui o aprendizado de diversas
especialidades, como matemática, gramática, história, geografia. Neste intercâmbio
de informações é essencial acrescer o conhecimento das especialidades como
sociologia, filosofia e psicologia, que fundamentam a interação social de cada
educando ou educador.
Além disso, seguindo Freire (2002), o considerar o humano como ser
biopsicossocial dá-lhe a dimensão necessária para o desenvolvimento de uma
plenitude crítica, aspecto a ser valorizado pela educação e pelos educadores, o que
pode possibilitar a intervenção nas realidades presentes no cotidiano dos mesmos.
O melhor ponto de partida para estas reflexões é a inconclusão do ser humano de que se tornou consciente. Como vimos, aí radica a nossa educabilidade bem como a nossa inserção num permanente movimento de busca em que, curiosos e indagadores, não apenas nos damos conta das coisas, mas também delas podemos ter um conhecimento cabal. A capacidade de aprender, não apenas para nos adaptar, mas, sobretudo para transformar a realidade, para nela intervir, recriando-a, fala de nossa educabilidade a um nível distinto do nível do adestramento dos outros animais ou do cultivo das plantas (FREIRE, 2002, p. 28)
Adequar à prática docente com a realidade do mundo atual é fundamental
para adquirir desenvoltura, sendo a disciplina de Matemática um mecanismo útil no
momento de busca por explicações de situações do cotidiano, fato este enfrentado
em sala de aula quando os alunos indígenas expõem a dificuldade em compreender
o sistema de medidas ensinado na escola, visto que em seu cotidiano as medidas
utilizadas são diferentes.
Para Freire (2002), os conteúdos curriculares terão compreensão se
elaborados na prática formadora, sendo necessário que o formando, desde o
princípio de sua experiência, assuma-se um produtor de saber e que o formador
passe a reconhecer que ensinar não é transferir conhecimentos, mas sim criar as
mais diversas possibilidades para a produção e construção do conhecimento. Para
este autor, o professor e a escola devem não apenas respeitar os saberes dos
educandos, mas sim ir além, passando a levantar discussões entre os educandos
sobre a razão de alguns dos saberes, levando os a encontrar similaridades a
conteúdos existentes no currículo escolar.
D'Ambrósio (2003) levantou a questão de que os professores de
determinadas disciplinas buscam sempre melhorar a metodologia de trabalhar com
seus educandos, mas acredita que somente através da integração entre educandos
e as várias dimensões da educação que o professor poderá alcançar o papel de
educador em sua sala de aula. Neste contexto, a interação entre profissionais da
educação e sociólogos, antropólogos e psicólogos proporciona o aprimoramento dos
conhecimentos das várias áreas do conhecimento trabalho este essencial na
Educação Indígena, em razão das diversas espeficidades presentes na comunidade
indígena, em virtude de suas formações sociais, históricas e culturais.
Dessa forma, a proposta de ensinar em concordância com a realidade,
permeia a Etnomatemática. D'Ambrósio (2001) afirma ainda que, ao nos
aprofundarmos nas raízes culturais de cada educando, o professor pratica a
dinâmica cultural, passando a reconhecer a importância que a diversidade cultural
representa na formação de uma “nova civilização, transcultural e transdisciplinar"
(D'AMBRÓSIO, 2001, p.46-47).
O professor precisa ter em mente que seus velhos métodos, que os velhos
paradigmas podem ser esquecidos e substituídos, de maneira a tornar a escola um
local de trocas, de inovação, atualizado. O educador possui um papel construído ao
longo da educação, como "mestre curioso" (D'AMBRÓSIO, 2007), ou seja, como o
ser pensamente que busca sempre ampliar seus conhecimentos, não deixando se
ausentar o papel de "amigo" que se dedica a seus educandos através do interesse
em seus questionamentos.
O Currículo Básico para Escola Pública do Paraná (PARANÁ, 1990) retrata o
aprender de matemática como uma área do conhecimento que não pode ficar retido
às questões como o simples manejar de fórmulas ou somente conhecer como
realizar os cálculos e então marcar a resposta correta com um "x". Ensinar
matemática envolve o ato de interpretar o que esta sendo questionado e então criar
significados reais de cada problema, oportunizando a cada educando a chance de
construir serem instrumentos para resolução do problema e consequentemente
desenvolvendo seu raciocínio lógico, ou seja, "a capacidade de conceber, projetar e
transcender o imediatamente sensível" (PARANÁ, 1990, p.66).
As escolas não são instituições estáticas, sendo assim, o currículo escolar
também dever ser dinâmico, reconhecendo as variações existentes na Sociedade.
Particularmente, na Educação Indígena, a homogeneidade populacional é tida
como certa, porém é reconhecia a inserção cultural realizada pelo "homem branco"
que ampliou as metodologias educacionais. Por outro lado, a sala de aula não pode
estar "descolada" da realidade de fora da aldeia.
Contudo, o caminho do conhecimento é permeado de desafios, transpomos é
uma vitória que deve ser buscada diariamente. Freire (2002) defendeu que ser
professor era assumir suas convicções e estar sempre em busca pelo saber,
estando interada a beleza da prática educativa em si, sendo motivado pelos
desafios, assumindo os limites educacionais e desenvolvendo o esforço para
superá-los, sem esquecer que como educadores somos passíveis a limites e assim
como os educandos devemos buscar caminhos para superá-los.
Para educar é preciso o reconhecimento de que somos seres inacabados. O
grande desafio enfrentado na educação atual é apontado por D'Ambrósio (2007)
como o "pôr em prática hoje o que vai servir para o amanhã", neste sentido, o ato de
por em prática é subentendido como: quais os pressupostos teóricos (o currículo) a
ser trabalhado em sala de aula para que durante o desenvolvimento de cada
educasse, ele possa tomar decisões baseadas em conhecimentos científicos e
estruturadas? Na Educação Indígena essa preocupação se acentua.
O professor atua como principal idealizador e defensor das prerrogativas da
Etnomatemática, levando em consideração os fatos e os conhecimentos que fazem
parte do ambiente cultural no qual os alunos vivem, mas adequando estes
conhecimentos à educação formal, escolar.
A questão do currículo da disciplina de Matemática tem sido fonte de diversas
críticas, na Educação Indígena isso se acentua, ao reconhecermos que existe
ensino de diversos conteúdos que não fazem parte de cotidiano das aldeias de
modo direto e que dificilmente farão parte futuramente. Este, felizmente, não é o
caso da Geometria, inserida na realidade da tribo de diversas maneiras, como na
confecção de peças artesanais, onde predominam as simetrias.
De acordo com as Diretrizes Curriculares do Paraná (PARANÁ, 2006), é
acentuado que o conhecimento da Geometria é estruturado e construído durante o
nosso aprendizado, sendo algo a ser adquirido com o tempo. A Geometria é uma
ciência exata que objetiva analisar, organizar e sistematizar o conhecimento viso
espacial do aluno.
O ensino de geometria deve se ater às questões que expressem o
pensamento geométrico, ou seja, o ensino precisa permitir que o estudante realize
uma leitura da percepção geométrica, raciocínio geométrico e linguagem geométrica
presentes nas formas que o rodeia, fatores estes que influenciam diretamente na
relação que envolve a construção e apropriação de conceitos abstratos e
aqueles que se referem ao objeto geométrico em si. (PARANÁ, 2006, p. 150).
A observação das formas geométricas presentes na natureza foi fundamental
para o desenvolvimento humano. Segundo o RCNEI (BRASIL, 1998, p.165), "A
leitura, interpretação e construção de plantas e mapas são atividades que exigem a
compreensão de variadas relações geométricas" e os indígenas necessitam desses
conhecimentos. Uma das funções do professor concentra-se em aliar os
conhecimentos pré-formados nos alunos ao saber elaborado da matemática, onde
esses possam ser úteis na vida cotidiana e em comunidade.
O sistema métrico é algo fundamental no ensino da matemática e a escolha
da medida está sempre relacionada ao que realmente pretende-se mensurar.
O RCNEI (BRASIL, 1998, p.167) chama a atenção dos professores de
matemática que atuam na Educação Indígena, no que se refere à questão de como
se trabalhar os sistemas de medidas, já que a tradição indígena propaga suas
próprias unidades de medidas, repassada de geração em geração, o que, de fato, é
o caso da Tribo Indígena Ivaí.
Portanto, esta produção didático-pedagógica irá permitir a aquisição do
conhecimento formal, da escolar regular, e ao mesmo tempo, valorizar as diferentes
formas de medir da Tribo Indígena Ivaí, um conhecimento elaborado e acumulado,
propiciando aos alunos indígenas instrumentos e estratégias lógicas em matemática
que lhes possibilitem ampliar seu patamar de conhecimento em cálculos de
conversão de medida e criando possibilidades de aplicá-los em prol da valorização
cultural e utilidade própria na sociedade que integram.
METODOLOGIAS PARA SE TRABALHAR COM ETNOMATEMÁTICA EM SALA
DE AULA
Os recursos humanos a serem utilizados serão: Professores e Equipe
Pedagógica, Pais ou responsáveis e educandos, e os materiais pedagógicos serão:
Data Show, DVD, Tv-PenDrive e Microsoft Power Point 2007. Nesta atividade os
seguintes conteúdos da disciplina de matemática serão abordados: Regra de Três
Simples; Resolução de problemas; Problemas com situações do cotidiano;
Multiplicação; Divisão; Etnomatemática.
As técnicas propostas nestas atividades envolveram: Estudo dirigido; Grupo
de estudo; Seminários; Dinâmicas de grupo; Trabalho de Campo; Mesa Redonda;
Palestra; Rodas de Conversa; Pesquisas de Campo.
As atividades desenvolvidas buscaram propiciar aos alunos indígenas
instrumentos e estratégias lógicas em matemática que lhes possibilitem ampliar seu
patamar de conhecimento em cálculos de conversão de medida e criar
possibilidades de aplicá-los em prol da valorização cultural e utilidade própria na
sociedade que integram, ou seja, na Tribo Terra Indígena Ivaí, valorizando
simultaneamente a cultural tradicional que já possuem.
A implementação ocorreu no primeiro semestre de 2014, com alunos do 1º
ano de um colégio Indígena do interior do Paraná, sendo aplicado em duas tardes
por semana, com alunos que estudam no período noturno. Onde foram utilizadas as
dependências da escola e da comunidade, livros e apostilas, computador, internet e
projetor de imagens e vídeo. Seguem as atividades a serem desenvolvidas.
A primeira atividade fora a apresentação do projeto "Questões de Medidas
Agrárias na tribo "terra indígena Ivaí", onde por meio fora explanado a necessidade
de se trabalhar esta temática com o intuito de levantar em sala de aula as questões
referentes aos temas que possuam ligações diretas com o cotidiano dos alunos,
sendo mantido o papel principal da escola de preparar os alunos para atuar em
sociedade. Apresentou-se em seguida o texto "A etnomatemática e seus
pressupostos históricos"3, Para finalização da atividade apresentou o filme
"Etnomatemática"4 que realiza uma explanação sobre o tema etnomatemática e
sobre suas várias aplicabilidades durante o ensino de matemática em sala de aula,
sendo entrevistado um dos maiores escritores desta área da matemática o professor
emérito da Unicamp Ubiratan D'Ambrósio. A presente atividade apresentou bons
resultados na questão da compreensão do tema visto que a maioria dos alunos
vivencia as dificuldades apresentadas no projeto.
Na segunda atividade fora apresentado o texto "Medidas Agrárias"5 de Marcos
Noé, onde foi abordado o conceito de medidas agrárias, a conversão de medidas
como hectare em alqueire e vice e versa. Nesta atividade os alunos tiveram a
oportunidade de relacionar as medidas trabalhadas em seu cotidiano com aquelas
desenvolvidas em sala de aula, a dificuldade em se realizar uma conversão fora
atenuada no momento em que se pediu para realizar atividades que envolvessem
conversão, sendo apontada uma necessidade contínua de incentivo a compreensão
do enunciado do exercício e do sistema de medidas agrárias.
Na terceira atividade "Exercitando a conversão de medidas agrárias" fora
apresentadas as "Tabelas de Medidas Agrárias não decimais"6, onde cada aluno
teve a oportunidade de conhecer as medidas agrárias utilizadas em cada estado
brasileiro, sendo que diversos alunos apontaram já conhecer algumas delas. No
segundo momento da atividade os alunos foram encaminhados ao laboratório de
informática, onde cada computador estava no site:
http://www.webcalc.com.br/frame.asp?
pag=http://www.webcalc.com.br/conversoes/area_agri.html, o presente site oferta
3 Disponível em: http://www.infoescola.com/matematica/a-etnomatematica-e-seuspressupostos-historicos/4 Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=cjsOPzwvbYA5 Disponível em http://www.brasilescola.com/matematica/medidas-agrarias.htm6 Disponível em: http://sistemas.mda.gov.br/arquivos/TABELA_MEDIDA_AGRARIA_ NAO_DECIMAL.pdf
uma calculadora que realiza a conversão de medidas agrárias em qualquer unidade
de medida brasileira disponível. Neste momento fora oportunizada aos alunos a
liberdade de descobrir as novas medidas disponíveis no site, assim como, incentivou
a comparação e transformação das mediadas que já estava acostumados utilizar em
dias como aqueles apresentados nos livros de matemática. A liberdade de criação
disponibilizada aos alunos ocasionou uma maior admiração pela matemática, onde
cada aluno pode exercer seu papel criativo durante a atividade.
Na quarta atividade fora apresentado o texto "Regra de Três Simples"7 de
Marcos Nóe, neste texto foram trabalhados com os alunos três tópicos importantes
na etnomatemática que são a regra de três simples, a conversão de medidas e a
multiplicação e cálculos com incógnitas. O texto proporcionou aos alunos a
oportunidade de relacionar situações de seu cotidiano com as aplicações da regra
de três simples, afirmando o posicionamento da grande maioria de que os cálculos
que envolvem a conversão de medidas podem ser resolvidos de maneira simples
através desta metodologia.
Na quinta atividade fora oferecido aos alunos uma palestra com o tema
Etnomatemática, onde fora repassada a importância do conhecimento tradicional ou
tácito, aquele que por meio de avós são repassados de geração por geração, os
educandos participaram ativamente da palestra levantando diversos
questionamentos referentes ao qual o motivo de tal área da matemática não estar
mais presente nos livros de matemática, a curiosidade em se ampliar os
conhecimentos nesta área representou um passo importante no desenvolvido dos
alunos.
A sexta atividade fora a realização de visita de campo a comunidade indígena
localizada na Tribo Terra Indígena do Ivaí, localizada no município de Manoel Ribas
estado do Paraná. A visita teve como motivação a observação das divisas utilizadas
para dimensionar os territórios da localidade, sendo essencial que cada aluno
observa-se as variantes utilizadas como medidas para a produção agrícola, que é a
principal fonte de renda da região. Os educandos observaram por meio de
questionamento espontâneo que as medidas mais utilizadas são alqueire, braça e
saca. Durante a visita fora notável o quanto os alunos se admiravam pela
diversidade cultural existente na comunidade, foram levantados diversos
questionamentos referentes à como se realiza a comercialização de seus produtos,
7 Disponível em http://www.brasilescola.com/matematica/regra-tres-simples.htm.
onde a questão da conversão das medidas fora apontada como sendo um grande
problema no momento da negociação. A finalização da atividade ocorreu por meio
de uma amostragem das informações obtidas durante a visitação, sendo
demonstradas aos seus colegas de escola como é a realidade da escola indígena.
A sétima atividade fora uma aplicação de atividades que envolvem
porcentagem, sendo todos exercícios baseados em situações do cotidiano dos
alunos, os exercícios dedicaram-se na resolução de problemas do cotidiano dos
alunos da zona rural e indígena, na conversão de medidas agrárias em medidas
utilizadas normalmente e por fim a regra de três simples. Os resultados alcançados
pelos educandos foram ótimos, em sua grande maioria as respostas estavam
corretas e nos casos onde erraram observou-se que somente ocorrera uma
dificuldade no momento de montar o exercício, fato que com orientação poderá ser
resolvido facilmente.
A última atividade fora composta com a apresentação a comunidade escolar
de todas as atividades elaboradas durante o projeto, em conjunto com os alunos
foram coletados todos os textos desenvolvidos nas atividades, as fotos e relatos da
visitação a comunidade indígena, diversos alunos produziram cartazes para expor
atividades que trabalhasse a conversão de medidas agrárias. Durante a semana de
visitação ocorrerá à apresentação da etnomatemática a comunidade escolar, onde
os alunos e professores se sentiram incentivados a buscar a ampliação do
conhecimento através de todos os meios possíveis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A etnomatemática é uma área da matemática que poucos professores
utilizam em sua prática docente, sendo motivada às vezes, pelo fato que são poucos
escritores que abordam a temática em livros didáticos, sendo assim, somente a pró-
atividade de um professor poderá proporcionar o bom uso da etnomatemática.
A inserção desta temática ocorrerá no município de Manoel Ribas estado
Paraná, onde o objetivo de incentivar os educandos ao conhecimento das medidas
agrárias utilizadas na região, onde cada aluno teve a oportunidade de conhecer com
mais afinco todas as possibilidades do uso da matemática na conversão de
medidas.
O presente artigo buscou realizar uma mudança de pensamento e atitudes
dos alunos frente às diversidades étnicas culturais presentes no seu cotidiano local,
abrangendo aos conceitos mundiais que por eles são sentidos globalmente. Por fim,
acredito que durante o desenvolvimento deste projeto for possível alcançar o
desenvolvimento de idéias norteadoras que servirão como fundamentação aos
professores, sendo flexível e aberta ao dialogo e a avaliação constante.
REFERÊNCIAS
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D`AMBRÓSIO, Ubiratan. Etnomatematica: elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte: Autentica, 2001.
____________, Ubiratan. Educação Matemática da teoria à prática. Campinas: Papirus, 2007.
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____________. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa / Paulo Freire. – São Paulo: Paz e Terra, 1996. – (Coleção Leitura)
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