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Umberto Eco; Eugenio Cami Os três astronautas Lisboa, Quetzal Editores, 1989 Os três astronautas

Os três astronautas - Umberto Eco; Eugenio Cami

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U

mbe

rto

Eco;

Eug

enio

Cam

i O

s trê

s astr

onau

tas

Lisb

oa, Q

uetz

al E

dito

res,

1989

Os

trê

s a

stro

nau

tas

ra u

ma

vez

a Te

rra.

E er

a um

a ve

z M

arte

.

Fica

vam

mui

to lo

nge

um d

o ou

tro,

no

mei

o do

céu

, e à

vo

lta h

avia

milh

ões d

e pl

anet

as e

de

galá

xias

.

Os

hom

ens

que

esta

vam

na

Terr

a qu

eria

m ir

a M

arte

e

aos o

utro

s pla

neta

s: m

as e

stav

am tã

o lo

nge!

Poré

m n

ão d

esca

nsar

am.

Prim

eiro

lan

çara

m s

atél

ites

que

anda

vam

à r

oda

da T

erra

por

doi

s di

as e

dep

ois

vinh

am

de n

ovo.

Dep

ois

lanç

aram

fogu

etõe

s qu

e da

vam

alg

umas

vol

tas

à Te

rra

mas

, em

vez

de

regr

essa

rem

, aca

bava

m p

or e

scap

ar à

at

racç

ão te

rres

tre

e se

guia

m p

ara

o es

paço

.

Prim

eiro

, pus

eram

cãe

s no

s fo

guet

ões:

mas

os

cães

não

sa

biam

fal

ar,

e pe

la r

ádio

tran

smiti

am “

béu

béu”

. E

os

hom

ens

não

perc

ebia

m o

que

ele

s tin

ham

vist

o e

até

onde

ch

egav

am.

Por

fim, a

rran

jara

m h

omen

s cor

ajos

os q

ue q

uise

ram

ser

cosm

onau

tas.

Os

cosm

onau

tas

tinha

m e

ste

nom

e po

rque

ia

m e

xplo

rar

o co

smos

, qu

e é

o es

paço

inf

inito

com

os

plan

etas

, as g

aláx

ias e

tudo

o q

ue tê

m à

sua

volta

.

met

eu o

nar

iz n

a ga

rraf

a, a

spir

ou e

dis

se q

ue g

osta

ra m

uito

da

quel

a be

bida

, se

bem

que

lhe

fiz

esse

and

ar a

cab

eça

à ro

da. M

as a

gora

os

terr

estr

es já

não

se

espa

ntav

am. T

inha

m

conc

luíd

o qu

e na

Ter

ra, t

al c

omo

nos

outr

os p

lane

tas,

cada

um

tem

os s

eus g

osto

s, e

é só

que

stão

de

se c

ompr

eend

erem

un

s aos

out

ros.

E

mar

cian

os.

Dep

ois v

iram

-no

baix

ar-s

e pa

ra o

pas

sari

nho

e se

gurá

--l

o no

s seu

s sei

s bra

ços,

tent

ando

aqu

ecê-

lo.

O c

hinê

s vol

tou-

se e

ntão

par

a os

doi

s am

igos

terr

estr

es.

– C

ompr

eend

eram

? –

diss

e. –

Nós

julg

ávam

os q

ue e

ste

mon

stro

era

dife

rent

e de

nós

, e a

final

ele

tam

bém

am

a os

an

imai

s, po

de c

omov

er-s

e, t

em u

m c

oraç

ão e

cer

tam

ente

um

cér

ebro

! Ain

da a

cham

que

dev

emos

mat

á-lo

?

Nem

era

per

gunt

a qu

e se

fize

sse.

Os

terr

estr

es a

gora

tin

ham

com

pree

ndid

o a

lição

: nã

o ba

sta

que

duas

cri

atur

as s

ejam

dife

rent

es p

ara

que

tenh

am d

e se

r ini

mig

as.

Por

isso

, apr

oxim

aram

-se

do m

arci

ano

e es

tend

eram

--l

he a

s m

ãos.

E e

le, q

ue t

inha

sei

s, a

pert

ou d

e um

a ve

z só

a

mão

aos

três

, enq

uant

o co

m a

s m

ãos

livre

s fa

zia

gest

os d

e sa

udaç

ão.

E, a

pont

ando

par

a a

Terr

a, l

á em

cim

a no

céu

, de

u a

ente

nder

que

des

ejav

a fa

zer

uma

viag

em p

ara

conh

ecer

os

outr

os h

abita

ntes

e e

stud

ar c

om e

les

a m

anei

ra d

e fu

ndar

um

a gr

ande

rep

úblic

a es

paci

al, e

m q

ue to

dos

vive

ssem

com

am

or e

con

córd

ia.

Os

terr

estr

es d

isser

am q

ue s

im, t

odos

con

tent

es. E

par

a fe

stej

ar o

aco

ntec

imen

to, o

fere

cera

m-l

he u

ma

garr

afin

ha d

e ág

ua f

resq

uíss

ima

traz

ida

da T

erra

. O

mar

cian

o, m

uito

feliz

,

Os

cosm

onau

tas

part

iam

e n

ão s

abia

m s

e vo

ltari

am o

u nã

o. Q

ueri

am c

onqu

ista

r as

est

rela

s pa

ra q

ue u

m d

ia t

odos

pu

dess

em v

iaja

r de

um p

lane

ta p

ara

outr

o, p

orqu

e a

Terr

a se

to

rnar

a de

mas

iado

ape

rtad

a e

os h

omen

s au

men

tava

m d

e di

a pa

ra d

ia.

Num

a be

la m

anhã

, par

tiram

da

Terr

a tr

ês fo

guet

ões

de

três

pon

tos d

ifere

ntes

.

No

prim

eiro

ia

um

am

eric

ano,

qu

e,

todo

al

egre

, as

sobi

ava

uma

ária

de

jazz

.

No

segu

ndo

ia u

m r

usso

que

can

tava

com

voz

pro

fund

a V

olga

, Vol

ga.

No

terc

eiro

ia

um c

hinê

s, qu

e ca

ntav

a um

a be

líssim

a ca

nção

, que

os o

utro

s doi

s ach

avam

des

afin

ada.

Cada

um

que

ria

ser

o pr

imei

ro a

che

gar

a M

arte

, par

a m

ostr

ar q

ue e

ra o

mai

s val

ente

.

Na

verd

ade,

o a

mer

ican

o nã

o go

stav

a do

rus

so e

o r

usso

o go

stav

a do

am

eric

ano,

e o

chi

nês d

esco

nfia

va d

os d

ois.

E ist

o, p

orqu

e o

amer

ican

o, p

ara

dize

r bo

m d

ia, d

izia

: ho

w d

o yo

u do

, o r

usso

diz

ia 3дp

acтв

yйte

e o

chi

nês

dizi

a bo

m

dia

em

chin

ês.

Não

se

pe

rceb

iam

e

julg

avam

-se

dife

rent

es.

Com

o os

trê

s er

am t

odos

val

ente

s, ch

egar

am a

Mar

te

quas

e no

mes

mo

inst

ante

. Des

cera

m d

as s

uas

astr

onav

es, d

e ca

pace

te e

fato

esp

acia

l... E

des

cobr

iram

um

a p

aisa

gem

ma-

ravi

lhos

a e

inqu

ieta

nte:

o t

erre

no e

ra s

ulca

do p

or l

ongo

s ca

nais

chei

os d

e um

a ág

ua d

e co

r ve

rde-

esm

eral

da.

Hav

ia

estr

anha

s ár

vore

s az

uis

com

ave

s nu

nca

vist

as, d

e pe

nas

de

core

s es

tran

híss

imas

. Lá

no

hori

zont

e vi

am-s

e m

onta

nhas

ve

rmel

has q

ue e

miti

am e

stra

nhos

bri

lhos

.

Os c

osm

onau

tas o

lhav

am a

pai

sage

m, o

lhav

am u

ns p

ara

os o

utro

s, e

man

tinha

m-s

e af

asta

dos,

cada

um

des

conf

iado

do

s out

ros.

Dep

ois v

eio

a no

ite.

Hav

ia à

rod

a um

est

ranh

o sil

ênci

o, e

a T

erra

bri

lhav

a no

céu

com

o se

foss

e um

a lo

ngín

qua

estr

ela.

Os

cosm

onau

tas

sent

iam

-se

trist

es

e pe

rdid

os

e o

amer

ican

o, n

a es

curi

dão,

cha

mou

pel

a m

ãe. D

isse

Mom

my.

..

E o

russ

o di

sse:

Mam

a.

E o

chin

ês d

isse:

Ma-

ma.

Mas

com

pree

nder

am lo

go q

ue e

stav

am a

diz

er a

mes

ma

coisa

e

tinha

m

os

mes

mos

se

ntim

ento

s. E

sorr

iram

, ap

roxi

mar

am-s

e, a

cend

eram

jun

tos

uma

bela

fog

ueir

a, e

ca

da u

m c

anto

u ca

nçõe

s do

seu

país.

Entã

o en

cher

am-s

e de

cor

agem

e, à

esp

era

da m

anhã

, ap

rend

eram

a c

onhe

cer-

se.

Por

fim,

veio

a m

anhã

e f

azia

mui

to f

rio.

E,

de

repe

nte,

de

um t

ufo

de á

rvor

es s

aiu

um m

arci

ano.

Tin

ha

um a

spec

to h

orrí

vel!

Era

todo

ver

de, t

inha

dua

s ant

enas

no

sítio

das

ore

lhas

, um

a tr

omba

, e s

eis

braç

os.

Olh

ou p

ara

eles

e d

isse

: Grr

r!

Na

sua

língu

a qu

eria

diz

er:

“Mãe

zinh

a, o

que

são

est

es

sere

s hor

rívei

s?”

Mas

os

terr

estr

es n

ão o

com

pree

nder

am e

jul

gara

m

que

era

um r

ugid

o de

gue

rra.

Era

tão

dife

rent

e de

les

que

não

fora

m c

apaz

es d

e o

com

pree

nder

e d

e o

amar

. Os

três

se

ntir

am-s

e lo

go ig

uais

e u

nira

m-s

e co

ntra

ele

.

Pera

nte

aque

le m

onst

ro, a

s su

as p

eque

nas

dife

renç

as

desa

pare

ciam

. Que

im

port

ava

se f

alav

am u

ma

lingu

agem

di

fere

nte?

C

ompr

eend

eram

qu

e er

am

os

três

se

res

hum

anos

. O o

utro

não

. Era

dem

asia

do f

eio,

e o

s te

rres

tres

pe

nsav

am

que

quem

é

feio

ta

mbé

m

é m

au.

Por

isso

re

solv

eram

mat

á-lo

com

os s

eus d

esin

tegr

ador

es a

tóm

icos

.

Mas

, de

rep

ente

, na

gra

nde

gead

a da

man

hã,

um

pass

arin

ho

mar

cian

o,

que,

ev

iden

tem

ente

, fu

gira

do

ni

nho,

cai

u no

chã

o, t

rem

endo

de

frio

e d

e m

edo.

Pia

va

dese

sper

adam

ente

, m

ais

ou m

enos

com

o um

pas

sari

nho

terr

estr

e. F

azia

mes

mo

pena

. O

am

eric

ano,

o r

usso

e o

ch

inês

olh

aram

-no

e nã

o co

nseg

uira

m r

eter

um

a lá

grim

a de

com

paix

ão.

E en

tão

acon

tece

u um

a co

isa

estr

anha

. Ta

mbé

m o

m

arci

ano

se a

prox

imou

do

pass

arin

ho,

olho

u pa

ra e

le,

e de

ixou

esc

apar

da

trom

ba d

ois f

ios d

e fu

mo.

E os

ter

rest

res,

de r

epen

te,

com

pree

nder

am q

ue o

m

arci

ano

est

ava

a c

hora

r à

sua

man

eira

, com

o fa

zem

os