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1 Outros Quinhentos de Antonio Luiz M. C. Costa

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Outros Quinhentos de Antonio Luiz M. C. Costa

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Outros Quinhentos

Antonio Luiz M. C. Costa

São Paulo, abril de 2000

Este trabalho está licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso Não-

Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 2.5 Brasil. Para ver uma cópia desta

licença, visite http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.5/br/ ou envie uma

carta para Creative Commons, 171 Second Street, Suite 300, San Francisco, California

94105, USA.

Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor

original (você deve citar a autoria de Antonio Luiz M. C. Costa). Você não pode fazer

uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas.

Esta é uma versão modificada de artigo originalmente publicado na revista

CartaCapital, na edição comemorativa dos 500 anos do descobrimento.

Capa, revisão e edição de Antonio Luiz M. C. Costa

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Caros Leitores:

Por algum desses mistérios da Internet, meu computador parece ter acessado momentaneamente a rede de computadores de um universo paralelo. Caiu no portal de um jornal infantil, com versões em tupi e português, que ainda guardava um texto muito interessante sobre as comemorações dos 500 anos do Descobrimento. Transcrevo-o abaixo por pensar que isto talvez seja do seu interesse.

Atenciosamente,

Antonio Luiz Monteiro Coelho da Costa

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porandutepé mirim Piratininga, sábado, 15 de abril de 2000

História

Podia ser Diferente

Nós viveríamos em um mundo inteiramente outro se...

POTYRA TAPIRAPÉ PATAXÓ COLABORAÇÃO PARA PORANDUTEPÉ

(tradução do tupi para o português por Severino dos Santos)

Não só os leitores deste jornal eletrônico infantil, como todas as crianças do

Brasil e do mundo estão louquinhas pelos fogos e festejos que vão marcar

os 500 anos do descobrimento na linda cidade de Nhoesembé (conhecida,

em português, como Porto Seguro – N.T.). Divertir-se com os espetáculos

programados é bom e importante, mas será ainda mais emocionante se

souberem toda a história da aventura dos Descobrimentos e de seus

resultados. Se houvesse sido de outra forma, o mundo seria hoje muito

diferente e, talvez, não tão feliz.

Tudo poderia ter sido muito diferente se Afonso V não se houvesse

enamorado de uma bela fidalga portuguesa, D. Ana, secretamente

convertida à heresia dos cátaros – que sobrevivia na clandestinidade depois

de reprimida pela Cruzada Albigense do século XIII – e desistiu de seu

plano de desposar a herdeira do trono de Castela e juntar a coroa de Castela

à de Portugal.

Em vez disso, concentrou seus esforços em fortalecer as finanças do reino e

em apoiar e continuar as explorações iniciadas por seu irmão. Influenciado

pela esposa, encetou uma política de tolerância religiosa e, apesar de

permanecer fiel ao catolicismo, abrandou a tratamento dado a mouros e

judeus e permitiu que o catarismo voltasse a ser praticado à luz do dia, para

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irritação do clero e do papado. Discretamente instigado pelo papa, em 1476

o rei de Castela lançou um ataque a Portugal, mas foi derrotado na batalha

de Toro pelo exército comandado pelo infante D. João, herdeiro de D.

Afonso V.

As viagens de Colombo

Seu sucessor, D. João II, deu novo e poderoso impulso às navegações. Por

sua ordem, Diogo de Azambuja funda na Costa da Mina o castelo de São

Jorge. Salvador Fernandes Zarco, que por razões numerológicas se fazia

chamar pelo pseudônimo de Colombo, retomou um antigo projeto de

travessia do Atlântico e em 12 de outubro de 1482 descobriu as Antilhas.

Em 1483, Colombo fez sua segunda expedição, descobriu as costas do

continente que se estende a oeste das Antilhas e o poderoso Império

Asteca, governado então pelo tlatoani Ahuízotl. Em 1487, enquanto outros

navegadores começavam a estabelecer missões comerciais e diplomáticas

junto a Ahuízotl, sua terceira missão explorou as costas atlânticas do novo

continente até chegar à Patagônia, no extremo Sul. Após esse extenso

mapeamento, o novo mundo passou a ser conhecido com o nome de

Colômbia.

D. João II era justo, perspicaz e tolerante, como bem o demonstrou,

permitindo que entrassem em Portugal milhares de judeus e mouros que o

fanatismo religioso de Fernando e Isabel expulsara de Espanha.

Filho de D. João II e de D. Leonor, D. Manuel I continuou a bem-sucedida

política de tolerância religiosa de seu avô e de seu pai, bem como as

explorações marítimas cada vez mais rendosas. Foram tantos os

acontecimentos felizes e gloriosos para Portugal, durante o reinado de D.

Manuel I, que este ficou sendo chamado o Venturoso.

Em 1498, Vasco da gama aportou a Calicute, tendo descoberto o caminho

marítimo da Índia, enquanto a quarta expedição de Salvador Zarco,

seguindo indicações de indígenas da costa sul-colombiana que falavam da

existência de um grande império no interior, subiu os rios Paraná e

Paraguai, até encontrar, à beira deste rio, uma excelente estrada de pedra.

Seguindo por terra à frente de um pequeno destacamento, encontrou a

cidade incaica de Samaipata e e lá foi conduzido a Cusco, a capital, onde

foi recebido pelo próprio Sapan Inca, Huayna Cápac. Em sua viagem de

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volta, Zarco foi ferido de morte pela picada de uma jararaca, mas a notícia

do novo descobrimento foi devidamente conduzida a Portugal por seu

lugar-tenente, Aleixo Garcia.

A idade de ouro portuguesa

Foi dois anos depois que Pedro Álvares Cabral comandou a maior frota até

então já armada, com uma dupla missão colonizadora. Em 22 de abril de

1500 tomou posse, oficialmente, da costa da Colômbia do Sul para o rei de

Portugal. A região foi oficialmente denominada Terra de Santa Cruz, mas

logo conhecida como Brasil – e nela deixou centenas de homens, fundou

uma cidade a que deu o nome de Salvador em homenagem ao descobridor

do Novo Mundo.

Lá deixou parte de sua frota sob o comando do primeiro vice-rei do Brasil,

Pero Vaz de Caminha, para defender o litoral de piratas e de possíveis

invasões e dar apoio ao trabalho de colonização. Com o restante dos

navios, prossegue rumo à Índia, onde estabelece outra colônia portuguesa,

que D. Francisco de Almeida e Duarte Pacheco ampliam e consolidam.

Enquanto isso, Gaspar Corte Real explorava a costa da Colômbia do Norte

e chegava ao Canadá e o vice-rei da Índia D. Afonso de Albuquerque

(1453-1515) conquistava Ormuz, Goa, Málaca e Áden, fundando um

imenso império português na Ásia. No final de seu reinado, de 1519 a

1521, uma frota capitaneada por Fernão de Magalhães completou, a serviço

de Portugal, a primeira circunavegação do globo terrestre.

O sucessor de D. Manuel, João III, continuou a resistir com habilidade e

firmeza às tentativas da Igreja de estabelecer a Inquisição em Portugal para

perseguir judeus, mouros, cátaros e protestantes. Reformou a Universidade

de Coimbra, mandou fundar novas universidades em Lisboa, Salvador e

Goa e empenhou-se na colonização das Índias, do Brasil e da África.

Mandou vir do estrangeiro destacados mestres para reger suas cátedras e

estimular as letras, a arquitetura, as ciências e as artes, incluindo Leonardo

da Vinci e Miguel Ângelo Buonarotti.

D. João III promoveu o desenvolvimento das manufaturas na metrópole e

nas colônias e fez de Portugal não só um rico entreposto comercial, como

também um produtor de riquezas à altura de competir com os holandeses.

Em 1535 ofereceu asilo a Tomás Moro, chanceler do rei da Inglaterra

7

Henrique VIII que caíra em desgraça por se recusar a reconhecer o poder

espiritual do rei. Fez dele um dos seus principais conselheiros.

Ainda por três gerações depois da descoberta do Brasil, Portugal continuou

a ser um oásis de paz e prosperidade numa Europa assolada pelas guerras

religiosas e seduziu empreendedores, artistas e pensadores de todo o

continente. A opulenta corte de Lisboa atraiu a seu serviço talentos como

Leonardo da Vinci, Ambroise Paré, Michelangelo Buonarotti e Galileu

Galilei; dissidentes perseguidos pela intolerância católica ou protestante,

como Giordano Bruno e Thomas More, ali encontraram abrigo seguro.

A vinda da Família Real

A idade de ouro portuguesa, hoje

lembrada como o ponto

culminante do Renascimento,

atraiu a inveja dos demais reinos

europeus. Em 1590 veio o

desastre: França, Áustria e a

recém-unificada Espanha

atenderam ao apelo da quarta

sessão do Concílio de Trento por

uma cruzada contra os relapsos

portugueses e os protestantes do

norte da Europa, em troca da

promessa de partilha de suas

riquezas e colônias. Portugal já

dominava os mares, mas como

seu exército de terra dificilmente

poderia resistir às tropas reunidas

dos reis católicos, D. Sebastião,

experiente e realista, organizou

uma colossal evacuação em

massa.

Protegida pela maior e mais moderna esquadra do mundo, a corte

portuguesa, junto com grandes mercadores e seus protegidos, refugiou-se

na jovem capital da florescente colônia do Brasil. Portugal foi invadido,

mas em Salvador da Bahia a dinastia de Avis celebrou com os refugiados

Experiente, realista e prudente, D. Sebastião deixou Portugal para fundar um Império no

Brasil, onde faleceu aos 76 anos

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um novo pacto, proclamando o novo Império de Portugal, Brasil e Algarves

e, pela primeira vez no Ocidente, a total liberdade de culto. Parcela

expressiva da Igreja luso-brasileira, liderada por jesuítas dissidentes,

rompeu com Roma e colaborou com o Imperador. Em aliança com judeus

sefaraditas, cátaros e mouros portugueses que haviam acompanhado D.

Sebastião a Salvador, fundaram a Igreja Ecumênica, também conhecida

como Sebastianista.

Carente de homens e necessitando garantir as costas americanas contra

piratas e eventuais invasores, Sebastião I assinou duradouras alianças com

o inca Túpac Amaru e o tlatoani Cuautémoc e seu chanceler Fernão Moro –

fascinado pelas idéias de seu avô Tomás Moro – concebeu um plano

grandioso para incorporar tupis e guaranis à causa portuguesa, sob o lema

"morrer se preciso for, matar um indígena nunca!". Foi implementado por

ex-jesuítas que, em colaboração com sertanistas como Brás Cubas e João

Ramalho, partiram de Piratininga e do Maranhão para fundar missões ao

longo das bacias do Paraná, Paraguai e Amazonas, onde oferecem aos tupis

os benefícios da civilização lusa, mas os alfabetizaram em sua própria

língua e os educaram no trabalho regular, na cooperação e no desprezo pelo

luxo.

O império tropical

Sertanistas descobrem enormes jazidas de ouro e ferro nas serras de Sabará

e dos Carajás (que passam a ser conhecidas como Minas Gerais do Sul e do

Norte) e a serviço dos aliados incas e astecas, descobrem imensas jazidas

de prata em seus domínios. A abundância de metais preciosos provocou

forte inflação nos domínios portugueses, mas também abriu o caminho para

um rápido crescimento da economia. D. Sebastião mandou cunhar com o

ouro das Minas Gerais uma nova moeda com o valor de mil réis, que por

ser marcada com a constelação do Cruzeiro do Sul, passou a ser conhecida

como cruzeiro.

Essa fabulosa riqueza acelerou o rearmamento do Império e estimula o

desenvolvimento da manufatura nas industriosas missões tupi-guaranis que,

através da intermediação dos mercadores portugueses, importam metais dos

novos centros mineiros, açúcar e algodão das plantações da Bahia e de

Pernambuco e lã de alpaca e cereais dos Andes, enquanto exportam

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artesanato, armas, tecidos, bebidas e

conservas para mineiros do norte e do

sul e para as opulentas cortes de

Salvador, Cusco e Tenochtítlan.

Prosseguiam, enquanto isso, as guerras

religiosas, nas quais a Santa Aliança dos

reinos europeus colhera importantes

vitórias. Em vez de enfrentar a marinha

portuguesa ocupada com a evacuação, a

"Invencível Armada" franco-espanhola

desembarcou para depor Elizabeth I.

Subiu ao trono sua prisioneira escocesa,

a católica Mary Stuart, mas ela esgotou

os recursos do seu reino combatendo

Portugal.

Pouco depois, com apoio francês, os

austríacos obtiveram uma vitória

decisiva sobre os prussianos e anexaram

os ducados protestantes do norte da

Alemanha. Isto fez do Sacro Império Romano-Germânico uma poderosa

realidade política e encurralou os protestantes no extremo norte da Europa,

onde resistiram sob a liderança do brilhante estrategista sueco Gustavo

Adolfo. A Aliança não conseguiu, porém, arranhar a hegemonia portuguesa

no ultramar, nem obter uma vitória definitiva no continente: em Portugal e

na Holanda uma intrépida resistência popular foi alimentada por ouro e

suprimentos sul-americanos.

Enquanto isso, os chineses, invadidos por bárbaros, pediam socorro aos

japoneses, que destroçaram facilmente os arqueiros manchus com canhões

e mosquetes importados das fundições tupi-guaranis. Os mandarins,

agradecidos, proclamaram que o Mandato do Céu havia caído sobre a

dinastia Yamato, que permaneceu em Quioto mas enviou o xógum

Tokugawa Ieyasu para reger o império sino-japonês.

A Revolução Industrial

Acontecimento ainda mais importante ocorreu em Sabará, onde o

engenheiro de minas Tibiriçá Tamoio e seu jovem aprendiz Manuel Borba

As industriosas missões tupi-guaranis desenvolveram a economia

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Gato construíram em 1649 uma máquina a vapor, invenção que

rapidamente se difundiu pelas cooperativas tupi-guaranis e desencadeou a

Revolução Industrial.

Pouco depois, os mercadores Raposo Tavares e Fernão Dias Pais, a serviço

da Cooperativa Agroindustrial de Piratininga, instalaram máquinas a vapor

em navios fluviais, fundam uma companhia de navegação e convenceram o

governo imperial a construir canais que interligassem os grandes rios do

continente e permitissem cruzar o continente do Prata ao Orenoco.

Araribóia Tupiniquim construiu a primeira locomotiva e pouco depois a

primeira estrada de ferro une Piratininga ao porto de Santos, logo sucedida

por outras que complementam a rede hidroviária e estendem rotas

comerciais aos domínios incas e astecas.

Enquanto isso, os filósofos Uriel da Costa e Bento Espinosa lançaram as

fundações de um novo racionalismo que a história viria reconhecer como o

Iluminismo Baiano, ao qual se juntaram muitos novos refugiados da

Inquisição européia, como Descartes. A partir da Ética espinosista, os

ideais de liberdade, igualdade e fraternidade conquistaram a brilhante

intelectualidade tropical.

Essa filosofia, vulgarizada pela elaboração teológica da sincrética e

progressista igreja sebastianista, alcançou as massas indígenas e mestiças,

entre as quais a escravidão começou a ser seriamente questionada. O

parlamento imperial promulgou leis trabalhistas garantindo aos escravos o

direito de comprar a própria liberdade e a alforria automática das vítimas

de excessos e dos escravos oferecidos para o serviço no Exército ou na

Armada.

A reconquista de Portugal

A guerra européia foi retomada em 1670, quando o almirante Domingos

Calabar esmagou a "Invencível Armada" e desembarcou dezenas de

milhares de guerreiros brasileiros, incas e astecas na Península Ibérica.

Com a morte em batalha do general Domingos Jorge Velho, seu imediato

Ganga Zumba assumiu o comando das forças de terra e obtém em

Bragança uma vitória decisiva sobre a Santa Aliança, cujo negociador, o

cardeal Mazarino, aceita não só a paz com Portugal, Holanda e Suécia,

como a entrega de Castela aos incas e astecas e das colônias francesas e

11

inglesas da Colômbia do Norte aos holandeses. Madri passou a se chamar

Caxtlitítlan e um templo do Sol foi erguido sobre as ruínas da catedral de

Sevilha, capital da nova província inca de Wantallusuyu, mas os

portugueses, contentes por disporem de aliados fiéis entre eles e os

rancorosos reis europeus, fecharam os olhos a tais excessos.

A essa altura, o poder em Salvador pertencia a uma geração que não

conhecia Lisboa e cujos poderosos interesses estavam ligados à avalanche

de riquezas mineiras, agrícolas e industriais que jorravam do continente

colombiano. Em vez de voltar a uma Europa depredada por décadas de

guerra, a corte limitou-se a nomear um vice-rei para Portugal (o Marquês

de Montalvão) e enviar os recursos necessários para reconstruir e

industrializar o pequeno país; os portugueses, apesar de um pouco

frustrados, acabam dando-se por satisfeitos com a volta da prosperidade e o

papel de cabeça-de-ponte européia de um império onde o sol nunca se põe.

A abolição da escravatura

O brilho do general negro impulsionou a causa abolicionista, que

inquietava cada vez mais as metrópoles do nordeste brasileiro. Tanto para

fugir das agitações populares como para ficar mais perto do novo centro de

gravidade econômico do Império, a corte decidiu, em 1682, fundar uma

nova capital, Brasília, no Planalto dos Goiases, tornado acessível pelas

novas ferrovias e canais fluviais.

Isso não impediu que o movimento de desobediência civil encabeçado pelo

líder sindical Zumbi, apoiado pelo poder econômico das cooperativas tupi-

guaranis (que desejavam substituir a mão-de-obra escrava pelas suas novas

máquinas agrícolas) organizasse uma série de greves e fugas em massa e

fundasse em Palmares uma grande cooperativa organizada em moldes

semelhantes aos indígenas – e que nas décadas seguintes serviu de modelo

para muitas outras cooperativas afro-brasileiras que surgiram por todo o

Nordeste, ao longo da bacia do São Francisco e nas Minas Gerais do Sul e

do Norte.

Em 1695, a aristocracia foi obrigada a capitular e abolir totalmente a

escravidão e o tráfico escravo em todos os domínios imperiais. Ficou

consolidado um novo modelo econômico: enquanto o governo imperial

implantava a infra-estrutura, planejava o desenvolvimento e provia saúde e

educação, a produção agrícola, industrial e mineira era executada pelas

12

poderosas cooperativas tupi-guaranis (mutirões) e afro-brasileiras

(quilombos).

Nessas cooperativas, engajaram-se trabalhadores da Europa, Ásia e África

atraídos para o Brasil por suas excelentes condições de vida e trabalho –

embora os mais agressivos e aventurosos prefirissem se arriscar nas

companhias capitalistas de comércio e navegação tocadas por descendentes

de portugueses e marranos, que vendiam seus latifúndios às cooperativas

para obter mais capitais para suas atividades. Cidades como Piratininga,

Guaíra, Sabará, Palmares, Canudos e Carajás tornaram-se os maiores

centros industriais do mundo. Santos, Rio de Janeiro, Salvador, Lisboa e

Bons Ares tornaram-se os portos mais movimentados do planeta.

A vez da ciência

O português tornou-se a língua universal da literatura, da ciência, do

direito, da filosofia e do comércio. No prefácio da Encyclopedia Brasilica,

o francês Dinis Diderot, que veio estudar na prestigiosa Universidade

Espinosa – nome tomado pela Universidade Hebraica após a morte de seu

mais brilhante mestre e reitor –, chega a escrever que em seu século só era

possível filosofar em português..

O tupi, porém, pasou a ser a língua da indústria e da tecnologia:

difundiram-se por todo o mundo termos como mboitatá1, itaetetapé

2 e

igatatá3, logo seguidos pelo camburuçu

4, pelo itajerecauim

5 e pelo

uiraguaçu6. Fruto da cooperação do físico Bartolomeu de Gusmão e do

engenheiro Aimberê Tupiniquim, neto do inventor da locomotiva, o

uiraguaçu decolou pela primeira vez, em 1709, do pátio da Escola

Politécnica de Piratininga,.

Muito mais importante para os povos do Império, porém, foram as

descobertas médicas. A partir de 1700, difunde-se o uso da anestesia e da

assepsia, tornando as cirurgias relativamente seguras. Em 1715, o Dr.

Guaixara Maracajá descobriu o papel das bactérias em muitas doenças e

infecções; nos anos seguintes inventou a primeira vacina e desvendou o

1 Trem,comboio ferroviário

2 Estrada de ferro

3 Navio a vapor

4 Telégrafo

5 Motor a álcool

6 Balão dirigível

13

papel dos mosquitos e de outros insetos na transmissão de doenças

parasitárias.

Nas décadas seguintes, as condições sanitárias do Império são

enormemente melhoradas com a difusão do saneamento público e o

combate aos mosquitos. Em 1736, o Dr. Cotyguara criou o primeiro soro

antiofídico. A função das vitaminas também começou a ser compreendida e

em 1745 a descoberta dos tipos sangüíneos torna seguras as transfusões de

sangue.

Em 1746, a Dra. Na Balam Chan Chel, cientista de origem maia,

naturalizada súdita do Império Luso-Brasileiro, desenvolveu, a partir de

pesquisas sobre a medicina tradicional de seu povo, a penicilina e a pílula

anticoncepcional, logo seguidas pela estreptomicina, descoberta em fungos

do solo andino pelo seu discípulo quéchua, Dr. Amaru Mamani.

A Faculdade de Medicina de Piratininga inicia em poucos anos a

industrialização dessas descobertas, que causam um enorme impacto na

economia e na demografia, ao produzir uma queda dramática nos índices

de mortalidade e ao mesmo tempo oferecer o meio para conter a explosão

demográfica.

O impacto cultural também foi considerável: a difusão dessas descobertas

revolucionárias, junto com a popularização

do preservativo de látex, tornou ainda mais

desembaraçados os tradicionalmente

indulgentes costumes sexuais luso-

brasileiros, ampliando o abismo já

considerável em relação ao moralismo da

Europa e das colônias holandesas.

As reformas sociais

O marquês de Pombal implantou, em parceria

com as cooperativas, os quilombos, os

sindicatos operários e as companhias

privadas, uma ampla rede de assistência

médica e previdência social.

Ao mesmo tempo, preocupado com a ascensão

Pombal investiu no bem-estar social

14

do poderio militar dos holandeses e dos impérios europeus, o ministro do

imperador Pedro II promoveu uma drástica modernização das forças

armadas e, principalmente, da Armada.

As naus e fragatas foram substituídas por couraçados e cruzadores a vapor

que usavam como combustível o petróleo extraído do recôncavo baiano.

Mais tarde, recorreram também às praticamente ilimitadas reservas do vice-

reino da Pérsia e Arábia. Mais uma vez, a marinha luso-brasileira avançou

décadas à frente das suas rivais e, como se não bastasse, constrói os

primeiros piraguaçus7.

Na década de 1770, surgiu também o nheembaé 8. O primeiro serviço

comercial foi inaugurado em Piratininga por D. Pedro II e logo em seguida

estendido a Salvador e Brasília. A maioria das grandes cidades usava então

gás canalizado (produzido por fermentação, de reservas naturais ou a partir

de carvão) na iluminação, na cozinha e em aquecimento de caldeiras.

O puhãembaé9 e a endycuatiara

10

eram as febres do momento e

revolucionavam a música

popular e as artes gráficas.

Os transportes civis também

fizeram amplo uso das novas

tecnologias. Navios a vapor com

cascos de ferro, cada vez

maiores, substituem os veleiros

na maior parte das rotas

marítimas.

Em meados do século, uiraguaçus brasileiros – chamados pelos

portugueses de passarolas – ligavam Brasília a Lisboa, Cusco, Pequim,

Tenochtítlan, Nova Amsterdã e Viena e faziam a volta ao mundo em

inacreditáveis quinze dias, passando pelas colônias asiáticas e africanas do

Império.

7 Submarinos

8 Telefone

9 Gramofone

10 Fotografia

A endycuatiara foi a febre da década de 1770

15

Os serviços de tupãjeré11

começaram a operar em Piratininga em 1775 e em

Salvador em 1779. A maioria das grandes cidades do Império já possuíam

serviços de bombeiros, hospitais, policiais. Os mais ricos usavam veículos

a vapor, a álcool ou, mais raramente, a itacauim12

ou itauguí13

, chamados

moá14

e moamirim15

.

A proclamação da República

O imperador João VI, porém, não se adaptou aos novos tempos e tentou

mobilizar o Império para uma guerra

de conquista ao mundo árabe. Iniciou-

se um período de crescentes atritos

entre a monarquia e o povo que

rapidamente dilapida o capital de

simpatia popular que sua dinastia

havia acumulado em duzentos anos.

Cresceu rapidamente a popularidade

do Partido Republicano. Em 1796,

sentindo o poder escapar de suas

mãos, o Imperador tentou dissolver o

parlamento e provocou uma

incontrolável revolta popular. O

marechal Joaquim José da Silva

Xavier o convenceu a abdicar e

proclamou a República Federativa do

Brasil.

Logo após sua proclamação, a nova República Federativa do Brasil

ofereceu a independência a Portugal e às colônias da África e da Ásia. O

exemplo brasileiro, num mundo já agitado por crescentes tensões políticas

e sociais, iniciou uma onda de movimentos republicanos e nacionalistas

que varreu o mundo. Caíram os tronos de todo o mundo, de Tenochtítlan a

Bangkok, com duas exceções: o inca de Cusco e o imperador de Quioto,

11

Bonde elétrico 12

Gasolina 13

Diesel 14

Caminhão 15

Automóvel

O fanatismo de João VI pela conquista dos infiéis levou à República

16

graças à imemorial tradição que os reputava Filhos do Sol e à sua renúncia

ao poder político efetivo.

As eleições brasileiras levaram à Presidência Tomás Antonio Gonzaga, que

convidou as demais nações do mundo a unir-se ao Brasil na Comunidade

das Nações. As ex-colônias do Império Luso-Brasileiro, o México e o

Tahuantinsuyu aderiram rapidamente, assim como muitas outras nações

menores. Ficaram de fora, porém, duas grandes potências: a nova

Federação Européia e o Império Sino-Japonês.

O filósofo Jorge Hegel, catedrático de filosofia na Universidade Espinosa,

proclamou que a Comunidade representa a síntese final das civilizações do

planeta e a culminação do desenvolvimento do Espírito Absoluto - em

suma, o fim da História.

Anos mais tarde, seu sucessor e discípulo Carlos Marx fundou o

materialismo histórico com sua trilogia O Capital, A Cooperativa e A

Democracia Socialista e criticou a Fundação David Ricardo, financiada

pelo megaempresário Irineu Evangelista de Sousa para promover as idéias

do controvertido economista carioca que havia defendido o liberalismo e a

famosa teoria das vantagens comparativas.

Para Ricardo, todos ganhariam se países de vocação obviamente

agropecuária, como a Inglaterra, se especializassem em exportar produtos

primários para países industriais, como o Brasil.

A Guerra Mundial

Apesar de Hegel, a História se recusou a acabar. A Comunidade das

Nações foi desafiada pelo surgimento de um poderoso movimento

reacionário na Federação Européia, que chega ao poder proclamando o II

Reich e o direito da raça ariana a governar o planeta.

Em 1865, sob a liderança do Führer Richard Wagner e de seu ministro da

propaganda Gobineau, o Reich invadiu a Colômbia do Norte pelo Alasca,

ameaçando Nova Amsterdã e Tenochtítlan, onde havia se refugiado o

dissidente Friedrich Nietzsche, ex-companheiro de Wagner que se tornou

seu mais figadal inimigo.

Bombardeiros brasileiros e incas detiveram o avanço europeu na Colômbia

do Norte e sobrevoaram Viena, Roma e Bayreuth, enquanto submarinos

17

brasileiros e astecas interrompiam o abastecimento das tropas do Reich. No

quarto ano da guerra, os brasileiros testaram a primeira bomba atômica

sobre a frota européia ancorada em Scapa Flow, que se imaginava fora do

alcance da aviação aliada. Os resultados devastadores abalaram seriamente

a moral das massas e dos generais do Reich, mas Wagner insistiu na guerra.

Bombardeiros brasileiros detiveram o avanço do Reich e bombardearam Viena, Roma e Bayreuth

O governo brasileiro não aceitou a sugestão dos aliados de usar a bomba

em alvos civis, mas negociou o decisivo apoio sino-japonês. Em 1870, os

brasileiros estavam às portas de Viena e os sino-japoneses se aproximavam

de Moscou. Finalmente convencido da inevitabilidade da derrota, Wagner

assinou uma rendição incondicional, poupando seu povo e o que restava de

seus fanáticos. Graças a isso, sua pena de morte foi comutada para prisão

perpétua pela Presidenta Anita Garibaldi, comandante suprema dos aliados.

A democracia foi restaurada na Europa e em 1905 o agradecido Max

Weber escreveu A Ética Espinosista e o Espírito do Cooperativismo.

18

A era espacial

No ano seguinte, o gigantesco foguete inca-brasileiro Illapa-Tupã 5 partiu

de Alcântara e o mundo assiste pela sambiri16

quando os astronautas

Alberto Santos-Dumont e Sinchi Yupanqui desceram do módulo Jacy 14bis

para se tornarem os primeiros homens a pisar a superfície da Lua.

O inventor brasileiro Landell de Moura desenvolveu o itapehemirin17

,

permitindo que, em 1930, o Presidente João Cândido inaugurasse a

Porandutepé18

e anunciasse a decifração do código genético logo depois de

receber, ao lado do inca Manco Cápac IV e da Presidenta européia Rosa

Luxemburgo, a missão trinacional Kuntur, que voltava de Marte sob a

liderança do astronauta Luís Carlos Prestes. No mesmo ano, o português

Egas Muniz realizou o primeiro

transplante de cérebro e o brasileiro

Manuel de Abreu anunciou a cura do

câncer.

Em 1964, graças aos avanços da

robótica, a Comunidade das Nações

proclamou a semana de trabalho de 24

horas em todo o planeta.

Foi nesse mesmo ano que a astronave

multinacional Apytuupoty, comandada

pela astronauta Carolina Maria de

Jesus, a Bitita, partiu da estação

espacial inca Tumi rumo a Alfa

Centauri, onde quatro anos antes o

radiotelescópio de Arecibo havia

detectado os sinais de uma civilização

misteriosa.

De acordo com a programação da viagem, a tripulação, mantida em

animação suspensa por 36 anos, foi reanimada há poucas semanas. Hoje,

neste 22 de abril de 2000, desembarcará no planeta Xochiquetzal no

mesmo exato momento em que nosso planeta Terra abrirá as

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televisão 17

microchip 18

Internet

Em 1906, Alberto Santos-Dumont partiu de Alcântara para ser o

primeiro homem na Lua

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comemorações dos 500 anos de um descobrimento que não só o Brasil,

como toda a humanidade, se une para comemorar.

Só saberemos os resultados deste novo descobrimento, porém, em 9 de

agosto de 2004, devido à distância de mais de 4 anos-luz entre

Xochiquetzal e a Terra. Até lá, poderá ter sido votada e aprovada a mais

profunda reforma da estrutura

governamental da Comunidade

das Nações desde sua fundação.

Se tudo correr conforme o

previsto, no ano que vem a

Constituinte Mundial aprovará a

transformação da Comunidade

das Nações na Federação da

Terra, a abolição dos Estados

nacionais e sua substituição por

uma confederação

descentralizada de cooperativas

e comunidades. Se aprovada em

plebiscito em 2003, entrará em vigor em 2005. Esta é uma outra história,

cuja importância vamos discutir na edição da semana que vem – mas que,

como nossos amiguinhos devem ter entendido, tem muito a ver com a deste

22 de abril.

A Apytuupoty chega a Xochiquetzal hoje, 22 de abril de 2000, 500º aniversário do

Descobrimento do Brasil