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ABRIL DE 2008 - PÁGINA 5 CULTURA Falta conscientização quanto à cultura Apesar da falta de apoio, a própria comunidade pouco se envolve com setor DEDICAÇÂO – Grupo de teatro mantém a cultura viva na Avenida Margarete Dantas Eduardo Oliveira Tão grande quanto sua exten- são é a defasagem cultural que mar- ca a maior avenida do país: a Sapo- pemba. Num percurso de mais de 45 km, que abriga mais de 500 mil pessoas, a cultura fica apagada e muitas vezes é deixada de lado. Para a líder comunitária da Fa- zenda da Juta, na altura do 12.700 da Sapopemba, Maria Bezerra de Menezes, 46 anos, o maior proble- ma está na falta de conscientização das pessoas com relação à impor- tância da cultura. “Precisamos tra- balhar muito na conscientização da população de que a educação está junto com a cultura, o lazer e o es- porte”, afirma. Em contraponto, o Centro de Educação Unificado (CEU) São Ra- fael que faz esquina com a Avenida, desponta como alternativa de cul- tura para a população em seu en- torno. Lá, a ênfase maior é no lazer, mas há espaço também para ativi- dades educacionais e culturais. Dividido em três núcleos – edu- cação, cultura e esporte –, com dois coordenadores cada um, o CEU funciona desde março de 2004 e possui uma extensa área com pro- gramação de vários cursos: panifi- cação, teatro vocacional, capoeira, dança etc. Todos são gratuitos e con- Sâmela Silva Cristiane Vellozo Moradores não encontram opção para lazer Cristiane Vellozo DISTRAÇÃO – Dominó na praça é uma das poucas alternativas ESPORTE Apesar dos 45 km de extensão da Avenida Sapopemba, o espaço reservado para a qualidade de vida pública por meio do esporte e do lazer é pequeno. O comércio é do- minante e quem faz parte da comu- nidade carente tem de buscar diver- são e suporte para atividades físicas em outros bairros, muitas vezes distantes da Avenida. Aos sábados, a população é abordada pela prática de compra e venda como se fosse a atividade comum do fim de semana. Não há muitas opções além de passear en- tre as lojas e aproveitar as ofertas dos ambulantes, levando o públi- co a adquirir bens não só pela ne- cessidade, mas também pela ocio- sidade que a Sapopemba traz. O sorveteiro José Francisco San- tos, 53 anos, afirma que o movi- mento é bom. Quando questiona- do sobre o que os vizinhos da Ave- nida fazem para se distrair, diz: “É... é isso que você está vendo. A gente aqui não tem muita opção, o que salva é o dominó.” Ele se refere ao grupo de senhores que joga domi- nó na Praça Geraldo Mendes, na al- tura do Jardim Grimaldi, um dos únicos locais do gênero na via. O espaço, entretanto, está aban- donado. A sujeira toma conta dos bancos e mesas e quase invade a pis- ta de skate, esquecida pela maioria dos adolescentes. O sol incide dire- tamente na pista, revelando que o projeto inicial era pobre de planeja- mento e infra-estrutura. Com isso, os jovens fogem na luz do dia e freqüentam o local nos períodos da tarde e noite, onde são acompanha- dos pela guarita da Guarda Munici- pal Metropolitana situada na praça. O panfleteiro Felipe Costa Ne- ves, 16 anos, trabalha na Sapopem- ba e joga dominó na praça. Em meio a senhores com idade de seu pai ou avô, se entretém com a na- morada. “Ela também joga e é aqui que nos divertimos. Para fazer um programa diferente temos que ir ao centro da cidade ou nos bairros vi- zinhos. Na Avenida mesmo, não tem nada.” A Avenida carece de divertimen- to aberto aos moradores, mas há pequenas atrações privadas, como escolas de futebol de salão e casas de show. O alcance desses locais é mínimo, já que a parte Leste de São Paulo comporta o maior número de pessoas na zona de pobreza da cidade, e a renda familiar é destina- da prioritariamente à moradia, ali- mentação e saúde. Adolescentes dependem das atividades escolares e brincadeiras de rua; adultos e ido- sos se distraem com atividades em família como assistir televisão. Ainda na praça, há a Associação de Idosos Vida Nova, destinada à terceira idade, mas que se mostra pequena comparada ao público que freqüenta e habita a Avenida. São ministradas aulas, atividades físicas e educacionais, mas crianças e jovens não usufruem das ações. tam com professores especializados e pré-aprovados pela Secretaria Mu- nicipal de Educação. Há também voluntários, como a vendedora Gei- se Meire de Lima, 32 anos, que, aos domingos, se propõe a ensinar a dança do ventre em conjunto com mais algumas professoras. Para a coordenadora de cultura Silene Massari, há um grande retor- no da comunidade ao centro. No entanto, ainda é pequena a procura da população pelas atividades cul- turais. A divulgação ainda é precária e insuficiente. A assistente de recur- sos humanos Caiane Mello, 18 anos, iniciou o grupo de teatro logo após a inauguração do CEU. Ela lamenta a gradativa perda de inte- resse das pessoas pelo teatro e até mesmo pela falta de um sistema de divulgação mais engajado, como acontecera no início com a gestão do PT – agora quem está a frente é o PSDB. Mas há também a questão do próprio desinteresse da comunida- de. O artista-orientador Regis San- tos, 37 anos, que trabalha com os grupos de teatro vocacional, acredi- ta na necessidade de estimular as pessoas. Para ele, “o estímulo e as estratégias muitas vezes não são fei- tos da forma certa, assim como se chegar à comunidade, como abran- ger esse público de forma mais di- reta, mais estimulante, não aconte- cem como deveria e poderia ser”. Santos, que começou a fazer tea- tro aos 13 anos, realiza um traba- lho de orientação artística tanto aos grupos que já possuem alguma ex- periência na área, mesmo amador, como aos iniciantes sem qualquer experiência. “O teatro vocacional é um projeto que tem um cunho só- cio-cultural. Trabalha com as pes- soas da comunidade, sustentando um anseio artístico ou uma capaci- dade de fomentar um possível ar- tista, que antes do projeto não exis- tia, não era desenvolvido”, analisa. Para atender os grupos o CEU con- ta também com o trabalho da orientadora Mariana Leite. Mesmo tendo o foco no lazer, o CEU ainda é uma das poucas op- ções de cultura para os moradores da extensa Sapopemba. Segundo a líder comunitária Maria Bezerra Menezes, há um projeto de se ins- talar nas proximidades da Fazenda da Juta, uma Fábrica de Cultura (pro- jeto em estudo pela Secretaria Esta- dual de Cultura) em que se realiza- riam várias atividades. Mas ainda é apenas uma reivindicação, sem pre- visão de construção. O CEU São Rafael fica na rua Cinira Polônio, 100, esquina com a Avenida Sapopemba. Telefone 6752-1064 ou 6752-1066. E-mail: [email protected]. Escola técnica é referência para Sapopemba Jucielly Gonçalves A Escola Técnica Estadual (Etec) de Sapopemba foi inaugura- da oficialmente no início de outu- bro do ano passado, mas já funcio- nava desde o mês de julho. A uni- dade foi construída após um proje- to que teve base em dados econô- micos, culturais e sociais da região, estabelecendo a necessidade de uma escola técnica na avenida e os quatro cursos técnicos que fariam parte da grade: Assessoria Empresarial, Mar- keting e Vendas, Alimentos e In- formática. Os cursos são oferecidos gratuitamente e os alunos só pa- gam pela taxa de inscrição para par- ticipar do processo seletivo. Atualmente a Etec tem 120 alu- nos que são moradores da região de Sapopemba e de São Mateus. No período da tarde acontece o curso de informática e há alunos que fa- zem o ensino médio durante a manhã e o curso técnico à tarde. Também são atendidos jovens que já terminaram o 2º grau e trabalham no setor comercial ou estão à pro- cura de emprego. Já no período da noite predo- mina os estudantes que já concluí- ram o ensino médio e estão fazen- do o curso técnico para obter uma melhor colocação no mercado de trabalho. No período noturno a maioria dos alunos ou está fora do mercado de trabalho ou faz parte do setor informal. Como ainda está sendo implan- tada, a Etec de Sapopemba encon- tra algumas dificuldades para o fun- cionamento integral, porque os ma- teriais ainda estão chegando. Como se trata de instituição pública, todo o processo de compra passa por pre- gões ou licitações causando demo- ra. Além disso, as contratações de pessoal dependem de concursos públicos. Para a diretora da Etec de Sa- popemba, Sandra Regina Ferraz de Campos Reis, existem muitas ra- zões para que as pessoas procurem as escolas técnicas. Por exemplo, a falta de dinheiro para pagar uma faculdade. Muitas vezes a qualifica- ção técnica gratuita acaba ajudando os alunos a entrarem no mercado de trabalho porque a formação é mais rápida. “A Etec de Sapopemba é de grande importância para os bairros da região. Sua localização facilita o acesso, além de favorecer a região de Sapopemba, São Mateus e de ou- tras que estão próximas”, afirma a diretora Sandra. A unidade da Etec de Sapopem- ba fica na rua Benjamin de Tudela, 155, esquina com a Avenida Sapo- pemba, na altura do 12.760. Telefo- ne: 6119-1519. Margarete Dantas

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ABRIL DE 2008 - PÁGINA 5CULTURA

Falta conscientização quanto à culturaApesar da falta de apoio, a própria comunidade pouco se envolve com setor

DEDICAÇÂO – Grupo de teatro mantém a cultura viva na Avenida

Margarete DantasEduardo Oliveira

Tão grande quanto sua exten-são é a defasagem cultural que mar-ca a maior avenida do país: a Sapo-pemba. Num percurso de mais de45 km, que abriga mais de 500 milpessoas, a cultura fica apagada emuitas vezes é deixada de lado.

Para a líder comunitária da Fa-zenda da Juta, na altura do 12.700da Sapopemba, Maria Bezerra deMenezes, 46 anos, o maior proble-ma está na falta de conscientizaçãodas pessoas com relação à impor-tância da cultura. “Precisamos tra-balhar muito na conscientização dapopulação de que a educação estájunto com a cultura, o lazer e o es-porte”, afirma.

Em contraponto, o Centro deEducação Unificado (CEU) São Ra-fael que faz esquina com a Avenida,desponta como alternativa de cul-tura para a população em seu en-torno. Lá, a ênfase maior é no lazer,mas há espaço também para ativi-dades educacionais e culturais.

Dividido em três núcleos – edu-cação, cultura e esporte –, com doiscoordenadores cada um, o CEUfunciona desde março de 2004 epossui uma extensa área com pro-gramação de vários cursos: panifi-cação, teatro vocacional, capoeira,dança etc. Todos são gratuitos e con-

Sâmela SilvaCristiane Vellozo

Moradores não encontram opção para lazer

Cristiane V

ellozo

DISTRAÇÃO – Dominó na praça é uma das poucas alternativas

ESPORTE

Apesar dos 45 km de extensãoda Avenida Sapopemba, o espaçoreservado para a qualidade de vidapública por meio do esporte e dolazer é pequeno. O comércio é do-minante e quem faz parte da comu-nidade carente tem de buscar diver-são e suporte para atividades físicasem outros bairros, muitas vezesdistantes da Avenida.

Aos sábados, a população éabordada pela prática de compra evenda como se fosse a atividadecomum do fim de semana. Não hámuitas opções além de passear en-tre as lojas e aproveitar as ofertasdos ambulantes, levando o públi-co a adquirir bens não só pela ne-cessidade, mas também pela ocio-sidade que a Sapopemba traz.

O sorveteiro José Francisco San-tos, 53 anos, afirma que o movi-mento é bom. Quando questiona-do sobre o que os vizinhos da Ave-nida fazem para se distrair, diz: “É...é isso que você está vendo. A genteaqui não tem muita opção, o que

salva é o dominó.” Ele se refere aogrupo de senhores que joga domi-nó na Praça Geraldo Mendes, na al-tura do Jardim Grimaldi, um dosúnicos locais do gênero na via.

O espaço, entretanto, está aban-donado. A sujeira toma conta dosbancos e mesas e quase invade a pis-ta de skate, esquecida pela maioriados adolescentes. O sol incide dire-tamente na pista, revelando que o

projeto inicial era pobre de planeja-mento e infra-estrutura. Com isso,os jovens fogem na luz do dia efreqüentam o local nos períodos datarde e noite, onde são acompanha-dos pela guarita da Guarda Munici-pal Metropolitana situada na praça.

O panfleteiro Felipe Costa Ne-ves, 16 anos, trabalha na Sapopem-ba e joga dominó na praça. Emmeio a senhores com idade de seu

pai ou avô, se entretém com a na-morada. “Ela também joga e é aquique nos divertimos. Para fazer umprograma diferente temos que ir aocentro da cidade ou nos bairros vi-zinhos. Na Avenida mesmo, nãotem nada.”

A Avenida carece de divertimen-to aberto aos moradores, mas hápequenas atrações privadas, comoescolas de futebol de salão e casasde show. O alcance desses locais émínimo, já que a parte Leste de SãoPaulo comporta o maior númerode pessoas na zona de pobreza dacidade, e a renda familiar é destina-da prioritariamente à moradia, ali-mentação e saúde. Adolescentesdependem das atividades escolarese brincadeiras de rua; adultos e ido-sos se distraem com atividades emfamília como assistir televisão.

Ainda na praça, há a Associaçãode Idosos Vida Nova, destinada àterceira idade, mas que se mostrapequena comparada ao público quefreqüenta e habita a Avenida. Sãoministradas aulas, atividades físicase educacionais, mas crianças e jovensnão usufruem das ações.

tam com professores especializadose pré-aprovados pela Secretaria Mu-nicipal de Educação. Há tambémvoluntários, como a vendedora Gei-se Meire de Lima, 32 anos, que, aosdomingos, se propõe a ensinar adança do ventre em conjunto commais algumas professoras.

Para a coordenadora de culturaSilene Massari, há um grande retor-no da comunidade ao centro. Noentanto, ainda é pequena a procurada população pelas atividades cul-turais. A divulgação ainda é precáriae insuficiente. A assistente de recur-sos humanos Caiane Mello, 18anos, iniciou o grupo de teatro logoapós a inauguração do CEU. Ela

lamenta a gradativa perda de inte-resse das pessoas pelo teatro e atémesmo pela falta de um sistema dedivulgação mais engajado, comoacontecera no início com a gestãodo PT – agora quem está a frente éo PSDB.

Mas há também a questão dopróprio desinteresse da comunida-de. O artista-orientador Regis San-tos, 37 anos, que trabalha com osgrupos de teatro vocacional, acredi-ta na necessidade de estimular aspessoas. Para ele, “o estímulo e asestratégias muitas vezes não são fei-tos da forma certa, assim como sechegar à comunidade, como abran-ger esse público de forma mais di-

reta, mais estimulante, não aconte-cem como deveria e poderia ser”.

Santos, que começou a fazer tea-tro aos 13 anos, realiza um traba-lho de orientação artística tanto aosgrupos que já possuem alguma ex-periência na área, mesmo amador,como aos iniciantes sem qualquerexperiência. “O teatro vocacional éum projeto que tem um cunho só-cio-cultural. Trabalha com as pes-soas da comunidade, sustentandoum anseio artístico ou uma capaci-dade de fomentar um possível ar-tista, que antes do projeto não exis-tia, não era desenvolvido”, analisa.Para atender os grupos o CEU con-ta também com o trabalho daorientadora Mariana Leite.

Mesmo tendo o foco no lazer,o CEU ainda é uma das poucas op-ções de cultura para os moradoresda extensa Sapopemba. Segundo alíder comunitária Maria BezerraMenezes, há um projeto de se ins-talar nas proximidades da Fazendada Juta, uma Fábrica de Cultura (pro-jeto em estudo pela Secretaria Esta-dual de Cultura) em que se realiza-riam várias atividades. Mas ainda éapenas uma reivindicação, sem pre-visão de construção.

O CEU São Rafael fica na ruaCinira Polônio, 100, esquina com aAvenida Sapopemba. Telefone6752-1064 ou 6752-1066. E-mail:[email protected].

Escola técnicaé referência para

Sapopemba

Jucielly Gonçalves

A Escola Técnica Estadual(Etec) de Sapopemba foi inaugura-da oficialmente no início de outu-bro do ano passado, mas já funcio-nava desde o mês de julho. A uni-dade foi construída após um proje-to que teve base em dados econô-micos, culturais e sociais da região,estabelecendo a necessidade de umaescola técnica na avenida e os quatrocursos técnicos que fariam parte dagrade: Assessoria Empresarial, Mar-keting e Vendas, Alimentos e In-formática. Os cursos são oferecidosgratuitamente e os alunos só pa-gam pela taxa de inscrição para par-ticipar do processo seletivo.

Atualmente a Etec tem 120 alu-nos que são moradores da regiãode Sapopemba e de São Mateus. Noperíodo da tarde acontece o cursode informática e há alunos que fa-zem o ensino médio durante amanhã e o curso técnico à tarde.Também são atendidos jovens quejá terminaram o 2º grau e trabalhamno setor comercial ou estão à pro-cura de emprego.

Já no período da noite predo-mina os estudantes que já concluí-ram o ensino médio e estão fazen-do o curso técnico para obter umamelhor colocação no mercado detrabalho. No período noturno amaioria dos alunos ou está fora domercado de trabalho ou faz partedo setor informal.

Como ainda está sendo implan-tada, a Etec de Sapopemba encon-tra algumas dificuldades para o fun-cionamento integral, porque os ma-teriais ainda estão chegando. Comose trata de instituição pública, todoo processo de compra passa por pre-gões ou licitações causando demo-ra. Além disso, as contratações depessoal dependem de concursospúblicos.

Para a diretora da Etec de Sa-popemba, Sandra Regina Ferraz deCampos Reis, existem muitas ra-zões para que as pessoas procuremas escolas técnicas. Por exemplo, afalta de dinheiro para pagar umafaculdade. Muitas vezes a qualifica-ção técnica gratuita acaba ajudandoos alunos a entrarem no mercadode trabalho porque a formação émais rápida.

“A Etec de Sapopemba é degrande importância para os bairrosda região. Sua localização facilita oacesso, além de favorecer a região deSapopemba, São Mateus e de ou-tras que estão próximas”, afirma adiretora Sandra.

A unidade da Etec de Sapopem-ba fica na rua Benjamin de Tudela,155, esquina com a Avenida Sapo-pemba, na altura do 12.760. Telefo-ne: 6119-1519.

Margarete D

antas