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MINISTÉRIO DA FAZENDA GABINETE DO MINISTRO ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL Programa de Ação Imediata Somente quatro países no mundo tiveram inflação superior a 1.000 por cento em 1992: a Rússia, a Ucrânia, o Zaire e o Brasil. A diferença é que nos outros três países a superinflação é o resultado de uma economia destroçada. No Brasil, não. Apesar de combatida pela longa recessão, a economia brasileira continua vigorosa, como demonstram o crescimento das exportações, o aumento da produtividade da indústria, a expansão da fronteira agrícola e a retomada do crescimento do PIB nos últimos meses. A economia brasileira está sadia, mas o governo está enfermo. O diagnóstico sobre a causa fundamental da doença inflacionária já foi feito. É a desordem financeira e administrativa do setor público, com seus múltiplos sintomas: - penúria de recursos para o custeio dos serviços básicos e para os investimentos o governo que são indispensáveis ao desenvolvimento do país; - vazamento dos parcos recursos da República pelos ralos do desperdício, da ineficiência, da corrupção, da sonegação e da inadimplência; - endividamento descontrolado dos Estados, Municípios e bancos estaduais; - exacerbação dos conflitos distributivos em todos os níveis. A desordem financeira acaba por comprometer uma faculdade absolutamente essencial do Poder Público, que é interpretar as prioridades da Nação na ordenação do gasto público. Se o governo não consegue praticar uma política fiscal voltada para o futuro, o Banco Central, por seu lado, se vê impossibilitado de praticar uma política monetária ativa. A prescrição essencial do tratamento também é conhecida. O governo precisa arrumar sua própria casa e pôr as contas em ordem.

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MINISTÉRIO DA FAZENDA

GABINETE DO MINISTRO

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

Programa de Ação Imediata

Somente quatro países no mundo tiveram inflação superior a 1.000

por cento em 1992: a Rússia, a Ucrânia, o Zaire e o Brasil. A diferença é

que nos outros três países a superinflação é o resultado de uma economia

destroçada. No Brasil, não. Apesar de combatida pela longa recessão, a

economia brasileira continua vigorosa, como demonstram o crescimento

das exportações, o aumento da produtividade da indústria, a expansão da

fronteira agrícola e a retomada do crescimento do PIB nos últimos meses.

A economia brasileira está sadia, mas o governo está enfermo. O

diagnóstico sobre a causa fundamental da doença inflacionária já foi feito.

É a desordem financeira e administrativa do setor público, com seus

múltiplos sintomas:

- penúria de recursos para o custeio dos serviços básicos e para os

investimentos o governo que são indispensáveis ao desenvolvimento do

país;

- vazamento dos parcos recursos da República pelos ralos do

desperdício, da ineficiência, da corrupção, da sonegação e da

inadimplência;

- endividamento descontrolado dos Estados, Municípios e bancos

estaduais;

- exacerbação dos conflitos distributivos em todos os níveis.

A desordem financeira acaba por comprometer uma faculdade

absolutamente essencial do Poder Público, que é interpretar as prioridades

da Nação na ordenação do gasto público.

Se o governo não consegue praticar uma política fiscal voltada para o

futuro, o Banco Central, por seu lado, se vê impossibilitado de praticar uma

política monetária ativa. A prescrição essencial do tratamento também é

conhecida. O governo precisa arrumar sua própria casa e pôr as contas em

ordem.

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A reorganização financeira e administrativa do setor público tem

implicações que vão muito além do econômico. É uma tarefa de salvação

nacional e um desafio político que pode ser resumido nos seguintes termos:

- O Brasil só consolidará sua democracia e reafirmará sua unidade

como Nação soberana se superar as carências agudas e os desequilíbrios

sociais que infernizam o dia-a-dia da população;

- A dívida social só será resgatada se houver ao mesmo tempo a

retomada do crescimento auto-sustentado da economia;

- A economia brasileira só voltará a crescer de forma duradoura se o

país derrotar a superinflação que paralisa os investimentos e desorganiza a

atividade produtiva;

- A superinflação só será definitivamente afastada do horizonte

quando o governo acertar a desordem de suas contas, tanto na esfera da

União como dos Estados e Municípios;

- E as contas públicas só serão acertadas se as forças políticas

decidirem caminhar com firmeza nessa direção, deixando de lado interesses

menores.

É isto que a sociedade brasileira espera de suas autoridades

legitimamente constituídas. Não há como adiar as decisões nem simular

uma normalidade que não existe sob pena de comprometer a crença na

democracia e o próprio futuro do País. Trata-se portanto de agir, e agir de

imediato.

A recuperação das finanças públicas não é uma mera questão de

gastar menos e arrecadar mais. Ela envolve uma ampla reorganização do

setor público e de suas relações com a economia privada, incluindo:

I) corte e maior eficiência de gastos;

II) recuperação da receita tributária;

III) fim da inadimplência de Estados e Municípios em relação as

dívidas com a União;

IV) controle e rígida fiscalização dos bancos estaduais;

V) saneamento dos bancos federais;

VI) privatização.

O conjunto de medidas que se apresenta a seguir enfrenta esse

desafio a partir da sua vertente mais árdua: o estabelecimento da verdade

orçamentária nas contas da União, tanto pelo lado da despesa como da

receita.

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Nesse ponto cabe um alerta: assumir a reorganização do setor

público como missão fundamental das forças políticas não isenta as elites

econômicas da sua parcela de responsabilidade.

As empresas - sobretudo as grandes - não podem continuar

apostando na redução dos níveis de produção e no aumento das margens de

lucro via elevação dos preços, enquanto os trabalhadores dão provas de

maturidade na defesa do nível de emprego.

Se o governo é um grande responsável pela inflação, os bancos, têm

sido sócios privilegiados desta. Muitos bancos têm lucros elevados, não

porque sejam eficientes, mas graças as altas taxas de juros do mercado.

Quando a inflação cair, permitindo a redução dos juros, muitas instituições

terão que recorrer ao Banco Central para sobreviver. Para que o sistema

bancário funcione a contento em uma situação de inflação baixa, é

essencial que se realize um processo de saneamento que inclua bancos

públicos e privados.

Por fim, a evasão fiscal não pode continuar transferindo para os

assalariados uma parcela desproporcional da carga tributária, nem

proporcionando a certas empresas uma vantagem competitiva espúria em

relação àquelas que cumprem suas obrigações.

Corte de gastos

O orçamento do governo, em qualquer democracia madura, é o

instrumento básico através do qual os poderes constituídos arbitram a

competição dos diferentes setores da sociedade pelos recursos públicos

existentes. No Brasil não tem sido assim.

Nos últimos anos o orçamento da União tem autorizado gastos muito

acima das receitas possíveis de serem arrecadadas. As tentativas de

aumentar a arrecadação através de pacotes tributários têm dado resultados

medíocres em face da exaustão dos contribuintes. Uma parte dos gastos

passa então a ser financiada através de endividamento público adicional,

pressionando os juros e a inflação. Outra parte deixa de ser executada

mediante contingenciamentos, calotes ou atrasos de pagamentos decididos

de forma arbitrária e irracional. Uma terceira parte é simplesmente corroída

pela inflação efetiva, sempre muito maior do que a estimada na elaboração

da lei orçamentária. Assim o governo de algum modo acaba utilizando a

inflação para fazer empatar a despesa com a receita disponível.

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Em 1993, não foi diferente. Ninguém que tenha noção da realidade

das finanças públicas acredita que será possível realizar a totalidade da

despesa prevista no orçamento da União deste ano. Essa é uma ficção que

precisa ser abolida em nome do respeito recíproco dos poderes Executivo e

Legislativo e da credibilidade de ambos perante a opinião pública.

Mas não basta o Executivo reprimir precariamente o déficit

orçamentário através do corte de despesas na boca do cofre do tesouro. Isso

apenas adia despesas. Além disto, tem sido uma tremenda fonte de

fisiologismo e corrupção na corrida pela liberação de verbas, fato aliás

salientado no relatório final da CPI do Senado sobre a atuação do senhor

Paulo César Farias no governo Collor de Mello.

A verdade orçamentária supõe que o Executivo e o Legislativo atuem

juntos com transparência e realismo para eliminar o déficit público, não

pela repressão, mas pela supressão de fontes de gastos. Essa é uma tarefa

espinhosa, mas incontornável para sairmos da ficção e elaborarmos um

orçamento que seja o retrato fiel das prioridades do País e que seja efetiva e

inteiramente executado.

Para tanto, as seguintes medidas estão sendo desde logo submetidas

ao presidente Itamar Franco:

1. Corte do equivalente a 6 bilhões de dólares das despesas no

orçamento de 1993, abrangendo todos os ministérios. Caberá a cada

ministério, dentro das prioridades definidas pelo presidente Itamar Franco,

e ouvido o Congresso Nacional, definir onde e o que cortar na respectiva

área. Um projeto de lei de reprogramação orçamentária, fruto desse

entendimento, será submetido ao Congresso até o dia 30 de junho próximo.

2. Enquanto a nova lei não for sancionada, esse corte será

implementado através de cotas trimestrais de despesa por ministério, para

compatibilizar o fluxo de despesas com a receita efetivamente arrecadada.

3. Elaboração de uma proposta orçamentária para 1994 baseada

numa previsão realista da receita. Isto permitirá ao Executivo se

comprometer com a execução efetiva da despesa autorizada, definida

também de forma realista e transparente.

4. Fazer gestões junto ao Senado para a rápida tramitação do projeto

de lei, já aprovado pela Câmara, que limita em 60 por cento a participação

dos salários do funcionalismo na receita corrente da União, assim como dos

Estados e Municípios.

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5. Envio ao Congresso de projeto de lei complementar prevista no

parágrafo único do artigo 23 da Constituição, fixando as normas de

cooperação da União com os Estados e Municípios. Essa lei definiria

claramente os programas em que o Governo Federal não pode atuar direta

ou indiretamente, por caracterizarem ações típicas de responsabilidade dos

outros níveis de governo, bem como, os limites da participação da União

nas áreas em que a competência constitucional e concorrente. Nesses casos

só receberão ajuda os Estados e Municípios que estejam adimplentes com a

União e suas entidades.

Recuperação da receita

Mesmo com cortes drásticos de gastos, a aprovação da lei de

regulamentação do IPMF pelo Congresso até o final de junho é

imprescindível para o esforço de equilibrar as contas do Governo Federal

em 1993/94.

O IPMF é uma solução precária, embora imprescindível diante da

dramaticidade da crise fiscal. A verdade tributária, contrapartida do

orçamento realista, só se estabelecerá a partir de uma ampla reforma dentro

da revisão constitucional. O governo se empenhará em agilizar esse

processo municiando o Congresso de informações e sugestões que

permitam votar um novo sistema fiscal e tributário ainda neste ano para

vigorar já em 1994.

A evasão fiscal no Brasil atingiu níveis dramáticos. Os dados

levantados pela Secretaria da Receita e pela CPI do Senado indicam que,

para cada cruzeiro arrecadado, um outro cruzeiro é sonegado. Desde logo,

impõe-se um esforço de recuperação da receita através do combate à

sonegação, com a mobilização da opinião pública e pleno uso dos

instrumentos de fiscalização que a lei faculta a Receita Federal.

Seguem-se algumas das medidas que estão sendo tomadas nesse

sentido:

1. A Receita Federal acompanhará diretamente o cumprimento das

obrigações tributárias das 30.000 maiores empresas do país, que têm

faturamento acima de 150.000 dólares por mês. Esse acompanhamento,

hoje feito sobre 3.000 empresas, até agosto cobrirá as 7.000 maiores

empresas, que tem faturamento mensal acima de 500.000 dólares.

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2. A Receita Federal iniciará imediatamente o processo de cobrança

das dívidas das 115.000 pessoas físicas que não recolheram o imposto

sobre os valores por elas declarados em 1992.

3. A Receita Federal notificará mais de 300.000 pessoas que

deixaram de apresentar sua declaração de imposto.

4. A Receita Federal vai fiscalizar 600 empresas, selecionadas em

função do seu porte e do setor de atividade que tenha sido identificado

como de maior nível de inadimplência.

5. O Sistema Integrado de Administração Financeira repassará

obrigatoriamente para a Receita Federal as informações relativas a

pagamentos efetuados, para fins de conferência, pelo Fisco, do pagamento

das obrigações tributárias e da coerência de outras informações prestadas

pelos contratantes com o Governo, no âmbito tributário.

6. A Receita Federal lançará,de ofício, imposto suplementar para as

15.000 pessoas que já foram identificadas pelos sistemas de computação,

como tendo tido renda acima da informada na declaração de 1992/1991.

7. Será proposta revisão da Lei nº8.383/91 para ampliar a

possibilidade de compensação de créditos tributários, beneficiando o fisco

e o contribuinte cumpridor de suas obrigações.

8. O Serviço de Patrimônio da União será instruído a acelerar o

recadastramento dos bens da União e regularizar a sua administração de

maneira a obter o potencial de receita que é estimado em cerca de 1 bilhão

de dólares anuais.

9. Instar o Ministério Público para que conclua o mais rápido

possível as centenas de processos por sonegação já remetidos pela Receita,

apresentando denúncia nos casos em que se configurar crime.

10. Criação e um cadastro geral das pessoas físicas e jurídicas

inadimplentes com o Governo Federal, incluindo a Receita, o Tesouro, o

INSS e o FGTS. Proibição expressa de que os inadimplentes firmem

qualquer contrato com o governo, participem de concorrência pública,

tomem empréstimos dos bancos oficiais e recebam ou mantenham qualquer

tipo de concessão da União (rádio e televisão, faculdades, portos,

aeroportos etc.) (projeto de lei).

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11. Fixar taxas de juros de mora das obrigações fiscais e das dívidas

com o Tesouro, de forma que os encargos pelo inadimplemento para o

Fisco, o Tesouro e o INSS sejam acrescidos de multa compensatória

equivalente às taxas de captação pagas pelo Tesouro nos leilões da dívida

mobiliária.

12. Coibir as operações excepcionais que visam a escapar da

tributação exclusiva na fonte dos ganhos financeiros das pessoas jurídicas

(resolução do Conselho Monetário Nacional)

13. Promoção, em conjunto com os Estados, de campanhas de

conscientização do consumidor /contribuinte contra a sonegação.

Cabe notar que não se deseja diminuir a sonegação para aumentar os gastos

do governo. O que se pretende é fazer justiça tributária, evitando que

poucos espertalhões ganhem às custas do sacrifício da maioria. E, por outro

lado, criar condições para a futura redução das alíquotas e a simplificação

do sistema tributário, melhorando a eficiência e a competitividade da

economia brasileira.

Relacionamento com Estados e Municípios

Para muita gente, governo, no Brasil, significa apenas Governo

Federal. Nada mais falso. Os governos estaduais e municipais detém 45 por

cento da receita tributária disponível. Pagam uma folha salarial três vezes

maior que a da União e investem cinco vezes mais. Devem em cruzeiros o

equivalente a 40 bilhões de dólares a União e não vêm pagando. No

período de setembro de 1991 a dezembro de 1992, deixaram de pagar a

União mais de 2 bilhões de dólares.

Por isso, Estados e Municípios não podem ficar de fora de um

programa de austeridade. Em relação a eles, o Governo Federal atuará com

flexibilidade mas com determinação no sentido de:

1. reduzir as transferências não constitucionais de recursos do

orçamento federal;

2. regularizar os pagamentos da dívida vencida para com a União;

3. impedir o retorno de Estados e Municípios ao endividamento

insolúvel.

Para tanto impõe-se:

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1. Suspender a assinatura de novos convênios e as transferências de

recursos federais (exceto as constitucionais) para os Estados e Municípios

inadimplentes com a União e suas entidades (decreto presidencial).

2. Suspender junto a todas as instituições financeiras a concessão das

excepcionalidades previstas na Resolução nº 1.718 do Conselho Monetário

Nacional, inclusive operações por antecipação de receitas orçamentárias

(ARO). Essa medida será estendida a todas as entidades do setor público e

abrangerá todo tipo de crédito, exceto os de natureza comercial (resolução

do CMN).

3. Concluir a negociação da rolagem da dívida dos Estados de forma

a que estes retomem os pagamentos a União.

4. Reter até 100 por cento dos recursos dos Fundos de Participação

dos Estados e Municípios para os inadimplentes com o INSS e outras

entidades federais (decreto presidencial).

5. Determinar aos bancos federais a imediata execução programada

das garantias contratuais sobre todos os créditos em atraso (decreto

presidencial).

6. Suspender as autorizações para a contratação de operações de

crédito de qualquer natureza com organismos federais por parte dos

governos estaduais e municipais que estiverem inadimplentes com a União

e suas entidades (decreto presidencial).

7. Suspender a concessão de aval do Tesouro Nacional para a

contratação de operações de crédito externo de governos estaduais e

municipais enquanto inadimplentes junto a União e suas entidades (decreto

presidencial).

8. Exigir das concessionárias de energia elétrica o pagamento

integral do suprimento de energia aos fornecedores do sistema elétrico a

partir de 1º de janeiro de 1993, com aplicações de sanções severas, até a

intervenção, nas concessionárias inadimplentes (decreto presidencial).

9. Estabelecimento de critérios para a concessão de garantias do

Tesouro Nacional a Estados e Municípios. A concessão para inadimplentes

junto à União e suas entidades será vedada explicitamente e sem

excepcionalidades, e exigida em qualquer caso a prestação de contra-

garantias com base nas receitas próprias dos avalizados (projeto de lei).

Page 9: PAI - Programa de Ação Imediata

10. A Procuradoria Geral da Fazenda Nacional agilizará os processos

de dívida ativa relativos às entidades da administração indireta estadual e

municipal, dando tratamento idêntico ao dos devedores privados (medida

administrativa).

11. Definição de condições globais para o endividamento público,

abrangendo todas as dívidas fundadas e flutuantes. Será exigido como pré-

requisito o pleno exercício da competência tributária, vedada a concessão

de extra-limites de endividamento e aprimorada a apuração da poupança

futura e da capacidade de pagamento (projeto de lei complementar e

resolução do Senado).

Bancos estaduais

Salvo raras exceções, no passado recente, os bancos estaduais têm

servido de agências financiadoras dos Tesouros dos seus Estados, abusado

da emissão de títulos mobiliários e mantido reservas insuficientes

relativamente aos seus depósitos. Dispondo de uma fonte financiadora

como essa, os governos estaduais foram induzidos a não enfrentar a

necessidade de ajuste fiscal. De sua parte, os bancos estaduais, devido à

ingerência de seus controladores, provocam o estouro das metas monetárias

e fiscais da União e acabam indo bater às portas do Banco Central. A conta

dos desajustes é apresentada, em última análise, ao Tesouro Nacional.

Por essas razões, e para incorporar os bancos estaduais ao esforço de

ajuste do Governo Federal:

1. O Banco Central exercerá com autonomia as funções de executar,

prevenir ou intervir, se necessário, na atuação dos bancos estaduais. Será

reforçada a aplicação das regras que estabelecem os montantes mínimos de

capital dessas instituições e os limites de concessão de seus empréstimos

para entidades do setor público, inclusive na forma de carregamento de

títulos mobiliários dos respectivos Tesouros.

2. Será determinada a aplicação ao sistema financeiro oficial do

dispositivo da Lei do Colarinho Branco que pune com dois a seis anos de

reclusão o administrador de instituição financeira que conceder empréstimo

a seu acionista controlador ou empresa por ele controlada. Isso impede os

bancos estaduais de emprestar aos respectivos Estados ou a suas empresas

(resolução do Conselho Monetário Nacional).

Page 10: PAI - Programa de Ação Imediata

3. O Banco Central cumprirá rigorosamente sua obrigação de

comunicar ao Ministério Público as infrações a Lei do Colarinho Branco,

para efeito das punições previstas.

4. Será vedada a concessão de "socorros" financeiros por parte do

Banco Central ou do Tesouro Nacional para atender programas de

saneamento de bancos estaduais (decreto presidencial).

5. Promover programa de restruturação dos bancos estaduais de

modo a:

a) transformar os bancos de desenvolvimento em carteira dos bancos

estaduais respectivos;

b) reduzir o número de agências eliminando aquelas que forem

deficitárias;

6. Serão descredenciados como agentes financeiros do BNDES,

CEF, fundos e programas do orçamento das operações oficiais de crédito,

os bancos estaduais cujos governos estejam inadimplentes com a União e

suas entidades.

Bancos Federais

Os bancos e entidades financeiras do âmbito federal têm problemas

comuns:

- superposição de atuação, concorrendo nas mesmas praças e

oferecendo produtos idênticos ou semelhantes;

- dependência de fluxos de recursos do governo federal ;

- uso de critérios políticos para abertura de agências, implicando em

competição autofágica e déficit operacional das agências em

funcionamento;

- influência política na concessão de empréstimos e financiamentos ;

- forte pressão sobre o Ministério da Fazenda, Conselho Monetário

Nacional e Banco Central para concessão de tratamentos privilegiados, que

excedam a legislação do sistema financeiro;

- tendência a fugir da fiscalização do Banco Central e de normas do

acionista controlador, que é o Tesouro Nacional.

Page 11: PAI - Programa de Ação Imediata

Por tudo isso, as seguintes providências serão adotadas:

1. Aplicação da Lei do Colarinho Branco também aos

administradores dos bancos federais.

2. Redefinição das funções dos bancos federais para enxugar sua

estrutura e evitar a duplicidade e a concorrência recíproca e predatória,

consolidando a posição do Banco do Brasil como conglomerado financeiro

e como principal agente financeiro do tesouro Nacional.

3. Firmar a vocação agrícola do Banco do Brasil, definindo fontes de

financiamento e formas de atuação que o tornem independente de recursos

de capital providos pelo tesouro ou de financiamentos extraordinários do

Banco Central.

4. Até 16 de julho, os ministérios da Agricultura e da Fazenda

definirão com o Banco do Brasil as condições de financiamento da próxima

safra, tornando totalmente claras as regras de política agrícola, tendo em

vista as metas do governo Itamar Franco de modernização tecnológica da

agricultura, diminuição do êxodo rural e aumento da oferta de alimentos

básicos.

5. Enxugamento da rede de agências dos bancos federais, fechando

as que forem desnecessárias, de acordo com os respectivos programas de

restruturação (decreto presidencial).

6. Serão reforçadas as condições legais de autonomia ao Banco

Central para controlar e fiscalizar a atuação dos bancos federais, podendo

inclusive intervir e liquidar (projeto de lei complementar).

7. Privatizar o Banco Meridional.

Privatização

As empresas públicas criadas no Brasil a partir do pós-guerra

cumpriram um papel fundamental na industrialização do país. Hoje cabe ao

governo reestruturar-se para potencializar sua ação em outras áreas: os

programas de saúde, educação, alimentação, habitação de que o país carece

para resgatar sua dívida social: infra-estrutura, ciência e tecnologia, justiça

e segurança, defesa da moeda nacional e do equilíbrio dos mercados,

expansão do comércio exterior.

Page 12: PAI - Programa de Ação Imediata

A privatização é um passo necessário nessa mudança de ramo do

Governo Federal. Mas é também um imperativo do equilíbrio financeiro.

De 1982 a 1992, o Tesouro Nacional aportou recursos no equivalente a 21

bilhões de dólares às empresas incluídas no atual programa de privatização.

Só no setor siderúrgico foram perdidos 12 bilhões de dólares. E, mesmo

depois de saneadas, em 1987, praticamente todas as empresas desse setor

voltaram a se endividar.

O fato é que a maioria das empresas públicas foi presa de um

verdadeiro conluio entre interesses corporativos, políticos e econômicos.

De público só lhes restou o nome e o ônus para o Erário, que não suporta

mais a conta do descalabro nem tem, por outro lado, como bancar os

investimentos necessários em muitas dessas empresas.

As diretrizes a seguir obedecem ao propósito geral de acelerar e

ampliar as fronteiras do processo de privatização.

1. Concluir rapidamente a privatização de empresas dos setores

siderúrgicos, petroquímico e de fertilizantes, conforme o programa já

definido;

2. Dar início à privatização dos setores elétrico e de transporte

ferroviário;

3. Simplificar e acelerar o processo de venda das pequenas

participações do governo em empresas, que estão concentradas no Banco

do Brasil e no BNDES;

4. No caso das empresas com perspectivas de rentabilidade, vender o

controle acionário mas preservar em mãos do Tesouro parcela das ações

preferenciais, para que o patrimônio público se beneficie com a valorização

da empresa graças a gestão privada;

5. Permitir que os créditos dos trabalhadores em fundos socias sejam

usados como moedas de privatização;

6. Reafirmar o empenho do governo na rápida aprovação pelo

Congresso do projeto de lei que amplia a possibilidade de participação do

capital estrangeiro nas privatizações, eliminando os entraves ainda

existentes;

7. Permitir a troca de parte da dívida vencida e não paga das

empresas estaduais e municipais de energia elétrica e saneamento para com

Page 13: PAI - Programa de Ação Imediata

a União por participações em seu capital, que depois poderão ser vendidas

em programas estaduais de desestatização (projeto de lei);

8. Promover a troca dos títulos recebidos pelo alienante ou sucessor

na venda de suas participações acionárias, por títulos públicos especiais de

longo prazo, a fim de equacionar o problema patrimonial decorrente do

aceite daqueles títulos por parte das controladoras (projeto de lei);

9. Transferir as empresas a serem privatizadas da esfera de controle

dos respectivos ministérios para o Ministério da Fazenda, de modo a

facilitar o processo de privatização (projeto de lei);

10. Fortalecer os mecanismos de defesa da concorrência de modo a

evitar que sejam criados oligopólios ou monopólios em setores em que a

concentração excessiva do capital é indesejável do ponto e vista econômico

social (projeto de lei);

11. Publicação na imprensa oficial das avaliações feitas por

consultorias independentes;

12. O produto da venda de ações de estatais constará

obrigatoriamente do orçamento e dos demonstrativos do Tesouro (projeto

de lei);

13. Criação de um Fundo de Privatização com os recursos em

cruzeiros da venda de empresas estatais arrecadados pelo Tesouro (projeto

de lei). As empresas estatais que permanecerem em mãos do governo serão

enquadradas em critérios estritos de realismo orçamentário e austeridade.

Terão suas justas tarifas e preços, mas deverão dar conta de sua política

salarial, de sua eficiência operacional, e terão de ajustar seus programas de

investimentos às prioridades do governo.

14. Retomar e fortalecer em conjunto com o Ministério do

Planejamento a ação normatizadora da Sest, para que coordene de forma

efetiva o cumprimento das determinações do governo no que se refere a

política salarial, contribuições aos fundos de pensão, distribuição de

dividendos e prioridades de investimentos;

15. Determinar ao tesouro o bloqueio das contas das estatais

inadimplentes que não estejam tomando providências para pôr em dia suas

obrigações.

Observações Finais

Page 14: PAI - Programa de Ação Imediata

O governo entende que, com efetiva implantação deste Programa de

Ação Imediata e a progressiva melhora das contas públicas, o adicional de

risco atualmente cobrado pelos mercados financeiros cairá, e por isso o

Banco Central deverá praticar taxas de juros internas que cada vez mais se

aproximem das taxas internacionais para prazos equivalentes de aplicação.

Do mesmo modo, o Banco Central evitará que a supervalorização

cambial afete negativamente as exportações brasileiras. A desvalorização

cambial deve, em princípio, seguir a inflação e cair junto com ela, na

medida em que aumenta a confiança do público na aplicação efetiva do

programa de ação do governo.

O governo está determinando ao Banco Central e ao Tesouro que

prossigam no trabalho de dar mais transparência às suas relações com a

consolidação e publicação de suas contas, de forma a tornar claro que as

necessidades agregadas de financiamento do setor público estão sendo

mantidas dentro dos limites ditados pela demanda por moeda e por títulos

públicos. Esse processo fortalece a autonomia de ambas as instituições,

permitindo que cada uma exerça suas funções clássicas: o Banco Central, a

manutenção da estabilidade interna e externa da moeda, a regulação

prudencial do sistema financeiro e o controle da liquidez do sistema de

pagamentos; o Tesouro, a manutenção do equilíbrio entre receita e despesa

pública, a liberação tempestiva de recursos para os programas do governo,

a administração dos haveres financeiros e mobiliários e das obrigações da

União e a gerência da dívida pública.

O governo dará prosseguimento à definição da segunda fase do

processo de abertura do comércio exterior brasileiro. Quer assim encerrar

um período de nossa história marcado pelo controle do estado, fechamento

ao mundo exterior, exclusão social e instabilidade monetária. Quer também

abrir as portas de uma nova etapa para o desenvolvimento do País em que

se mantém o poder da regulação governamental e se passa a liderança para

a iniciativa privada, aberta a competição global, voltada para a integração

social e a estabilidade econômica.

Nosso objetivo fundamental é assegurar a retomada do crescimento

econômico em bases sustentáveis, e com o claro propósito de construir-se

uma sociedade mais justa.

Até agora a inflação desorganizou as finanças públicas e a gestão do

estado, incentivou a especulação financeira, tornou os pobres miseráveis,

esmagou a classe média e sufocou empresas produtivas brasileiras.

Page 15: PAI - Programa de Ação Imediata

O governo Itamar Franco tem um Programa de Combate à Fome que

deverá ser ampliado, e uma política econômica que tem por objetivo a

expansão do emprego pela retomada do crescimento. Essas diretrizes são

inegociáveis. É chegada a hora, portanto, de reafirmar esses compromissos

do governo, dizendo não à inflação e não à recessão.

Para isso é imperativo recuperar o crédito público. Isso só se fará

com o apoio do Congresso e do País.

É este o desafio. Vamos enfrentá-lo.