Parecer-CCJC-14-09-2011 (1)

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  • 8/2/2019 Parecer-CCJC-14-09-2011 (1)

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    COMISSO DE CONSTITUIO E JUSTIA E DE CIDADANIA

    PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO N 480, DE 2008

    Susta os efeitos da Portaria n 1.128de 13 de agosto de 2003, do Ministrio daJustia, que homologa a demarcao daTerra Indgena Ibirama LA-Klan ou Duquede Caxias, nos Municpios de Vitor Meireles,Jos Boiteux, Itaipolis e Doutor Pedrinho,

    Estado de Santa Catarina.

    Autor: Deputados VALDIR COLATTO e

    JOO MATOS

    Relator: Deputado LUIZ COUTO

    I RELATRIO

    O projeto de decreto legislativo em epgrafe visa a sustaros efeitos da Portaria n 1.128 de 13 de agosto de 2003, do Ministrio da

    Justia, que homologa a demarcao da Terra Indgena Ibirama LA-Klan ou

    Duque de Caxias, nos Municpios de Vitor Meireles, Jos Boiteux, Itaipolis e

    Doutor Pedrinho, Estado de Santa Catarina.

    Segundo o autor, com a eventual homologao dessa

    demarcao, a utilizao dessas reas estaria fortemente comprometida,

    causando significativos prejuzos econmicos ao Estado, s populaes

    interessadas e toda coletividade que estaria impedida de usar e gozar dessepatrimnio.

    Considera que tal demarcao compromete o princpio

    da legalidade, da moralidade e impe prejuzos econmicos ao Estado de

    Santa Catarina, no s pelo valor do patrimnio imobilirio subtrado de forma

    inconstitucional pela Unio e pela Funai, mas tambm, por causa dos prejuzos

    com os tributos que o Estado deixar de arrecadar, ante a retirada de

    pequenos agricultores j instalados nas reas demarcadas nos Municpios de

    Vitor Meireles, Jos Boiteux, Itaipolis e Doutor Pedrinho, Estado de Santa

    Catarina.

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    Afirma que a Portaria n 1.128/2003, foi editada em total

    desconformidade com os trabalhos tcnicos desenvolvidos e defendidos pelo

    prprio Governo e com a legislao que rege o procedimento de demarcaode terras indgenas.

    A proposio foi aprovada pela Comisso de Agricultura,

    Pecuria, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; e rejeitada pela Comisso

    de Direitos Humanos e Minorias.

    Esgotado o prazo regimental, no foram apresentadas

    emendas ao projeto nesta Comisso.

    II VOTO DO RELATOR

    Nos termos regimentais, o projeto foi distribudo a esta

    Comisso para anlise da constitucionalidade, juridicidade, tcnica legislativa e

    tambm de seu mrito.

    No que toca constitucionalidade, da competncia do

    Congresso Nacional sustar atos normativos do Poder Executivo que exorbitemde seu poder regulamentar, nos termos do art. 49, V da Constituio Federal.

    Cumpre ento determinar se a portaria objeto do presente projeto de decreto

    legislativo constitui ato normativo e, em caso afirmativo, se excede os limites

    estabelecidos em lei.

    O projeto em anlise similar aos PDCs n 48 e 49,

    ambos de 2007, de nossa relatoria, que tambm pretende sustar portaria de

    demarcao de terras indgenas. Empregamos, portanto, os mesmos

    argumentos. A legislao aplicvel ao caso em anlise o Estatuto do ndio(Lei n 6.001, de 19/12/73), que, com fundamento no art. 231 da Constituio

    Federal, outorga ao Poder Executivo da Unio a atribuio de executar, por

    meio de rgo prprio, a demarcao de reas destinadas aos silvcolas,

    mediante procedimento disposto em decreto. O Decreto n 1.775, de 08/01/96,

    regulamenta o citado Estatuto, estabelecendo um procedimento administrativo

    demarcatrio, homologado ao final pelo Presidente da Repblica. A portaria

    que deu origem ao projeto em anlise constitui fase intermediria desse

    procedimento, sendo expedida pelo Ministro da Justia para declarar os limitesda terra indgena e determinar sua demarcao.

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    Considerando a legislao de regncia, temos que a

    Portaria n 1.128/03 constitui ato administrativo individual, pois, segundo lio

    de Hely Lopes Meirelles, no possui a abstrao e a generalidade prprias dosatos normativos. Ao contrrio, a portaria prov sobre situao concreta,

    conferindo direitos e impondo encargos a destinatrios especficos, ainda que

    mltiplos, como fase do procedimento administrativo destinado a identificar e

    demarcar terras indgenas pertencentes tribo Ibirama La-Klan. Como tal, se

    editada ilegalmente ou com leso a direitos, sujeita-se ao controle do Poder

    Judicirio, no caracterizando ato normativo geral e impessoal para os fins do

    art. 49, V da Constituio Federal, sob pena de usurpao da funo

    jurisdicional pelo Congresso Nacional.1

    Destacamos que a jurisprudncia do Supremo Tribunal

    Federal admite que uma portaria seja considerada ato normativo notadamente

    para sujeit-la ao controle de constitucionalidade, desde que respeitados os

    requisitos de autonomia, generalidade e abstrao.2 No o caso da portaria

    em anlise, que, como j dito, prov para situao concreta e individualizada,

    ainda que com mltiplos destinatrios, em cumprimento ao Decreto n 1.775/96

    - esse sim, um ato normativo sujeito ao controle do Congresso Nacional (CF,

    art. 49, V). Tal entendimento foi confirmado expressamente pelo STF na ADI710-RR, abaixo transcrita:

    AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - ATOSMATERIALMENTE ADMINISTRATIVOS. A AO DIRETA DEINCONSTITUCIONALIDADE E MEIO IMPROPRIO AO ATAQUE DEATOS MERAMENTE ADMINISTRATIVOS. ISTO OCORREQUANDO SE IMPUGNA DECRETO DO CHEFE DO PODEREXECUTIVO E PORTARIA DE MINISTRO DE ESTADO QUEDISCIPLINAM A DEMARCAO DE TERRAS INDIGENAS,TRACANDO PARAMETROS PARA A ATIVIDADEADMINISTRATIVA A SER DESENVOLVIDA. POSSIVELEXTRAVASAMENTO DE REA CONTIDO NA PORTARIARESOLVE-SE NO MBITO DA ILEGALIDADE.3

    No caso em anlise, entretanto, lembramos que a

    ampliao de reservas indgenas j existentes foi expressamente vedada pelo

    Supremo Tribunal Federal no julgamento da Petio n 3388, conforme o voto

    do Ministro Carlos Alberto Direito. Segundo o Ministro, a ampliao trar

    consequncias gravosas para aqueles que, uma vez feita e executada a

    1 Cfe. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29 ed. So Paulo: Malheiros,

    2004, p. 161-2.2 ADI 3691, Relator Min. GILMAR MENDES, DJe-083 09-05-2008; ADI 2398 AgR, Relator Min.CEZAR PELUSO, DJe-092 31-08-2007, DJ 31-08-2007, PP-00029.3 ADI 710, Relator Min. MARCO AURLIO, DJ 20-10-1995, PP-35255.

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    demarcao, possam adquirir direitos em funo dos limites ali fixados para

    uma dada terra indgena.4 Vale ressaltar que o caso est sob anlise do

    Supremo Tribunal Federal que, no Agravo Regimental na Reclamao 3205AgR / SC, estabeleceu a competncia da Corte para julgar a ao que

    contesta a Portaria 1.128/2003, do Ministrio da Justia, que demarcou terras

    indgenas.5

    Na ocasio, o relator mencionou que em questo

    anloga, o Ministro Carlos Ayres de Britto, ao admitir a competncia do STF

    para julg-la pronunciou-se no seguinte sentido:

    No fluxo dessa compreenso das coisas, de sereconhecer que a impugnao da validade jurdica dacitada Portaria n 534/05, do Ministrio da Justiaacarreta:

    a) uma peculiar situao de menoscabo da competnciaconstitucional que detm a Unio para efetuar osprocedimentos de demarcao de reas indgenas(CF, art. 231); e

    b) leso ao princpio da homogeneidade federativa, este

    a significar a costura da conciliao possvel deinteresses entre pessoas estatais que se dotam deautonomia poltica.

    Ante o exposto, manifestamo-nos pela

    inconstitucionalidade do Projeto de Decreto Legislativo n 480, de 2008,

    prejudicados os demais aspectos a serem analisados por esta Comisso.

    Sala da Comisso, em 14 de setembro de 2011.

    Deputado LUIZ COUTO

    Relator

    2011_12958

    4Supremo Tribunal Federal. Supremo define que terra demarcada no poder ser ampliada,

    19/03/09. Disponvel emhttp://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=105039&caixaBusca=N[acesso em 28/04/09].5 Rcl 3205 AgR / SC, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI DJe-157 07-12-2007