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Ciências Humanas e suas Tecnologias Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais PCN Ensino Médio

PCN História Ensino Médio

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  • Cincias Humanase suas Tecnologias

    O r i e n t a e s E d u c a c i o n a i s C o m p l e m e n t a r e sa o s P a r m e t r o s C u r r i c u l a r e s N a c i o n a i s

    PCNE n s i n o M d i o

  • A reformulao do ensino mdioe as reas do conhecimento 7

    A natureza do ensino mdio e as razes da reformaComo rever o projeto pedaggico da escolaA escola como cenrio real da reforma educacionalNovas orientaes para o ensinoConhecimentos, competncias, disciplinas e seus conceitos estruturadoresA articulao entre as reasA articulao entre as disciplinas em cada uma das reas

    A rea de Cincias Humanas e suas Tecnologias 21O trabalho interdisciplinar e contextualizadoOs conceitos estruturadores da reaO significado das competncias da reaA articulao dos conceitos estruturadores com as competncias geraisCritrios para a organizao dos contedos programticos no mbito

    das disciplinas que compem a reaBibliografia

    Filosofia 41Os conceitos estruturadores da FilosofiaO significado das competncias especficas da FilosofiaA articulao dos conceitos estruturadores com as competncias

    especficas da FilosofiaSugestes de organizao de eixos temticos em FilosofiaBibliografia

    Geografia 55Os conceitos estruturadores da GeografiaO significado das competncias especficas da GeografiaA articulao dos conceitos estruturadores com as competncias

    especficas da GeografiaSugestes de organizao de eixos temticos em GeografiaBibliografia

    Sumrio

  • Histria 69Os conceitos estruturadores da HistriaO significado das competncias especficas da HistriaA articulao dos conceitos estruturadores com as competncias

    especficas da HistriaSugestes de organizao de eixos temticos em HistriaBibliografia

    Sociologia 87Os conceitos estruturadores da SociologiaO significado das competncias especficas da SociologiaA articulao dos conceitos estruturadores com as competncias

    especficas da SociologiaSugestes de organizao de eixos temticos em SociologiaBibliografia

    Formao profissional permanente dos professores 99A escola como espao de formao docenteAs prticas do professor em permanente formao

  • A reformulao do ensino mdioe as reas do conhecimento

    Este texto dirigido ao professor, ao coordenador ou dirigente escolar do

    ensino mdio e aos responsveis pelas redes de educao bsica e pela formao

    profissional permanente de seus professores. Pretende discutir a conduo do

    aprendizado, nos diferentes contextos e condies de trabalho das escolas

    brasileiras, de forma a responder s transformaes sociais e culturais da

    sociedade contempornea, levando em conta as leis e diretrizes que redirecionam

    a educao bsica. Procura estabelecer um dilogo direto com professores e

    demais educadores que atuam na escola, reconhecendo seu papel central e

    insubstituvel na conduo e no aperfeioamento da educao bsica. Sem

    pretenso normativa e de forma complementar aos Parmetros Curriculares

    Nacionais para o Ensino Mdio, as orientaes educacionais aqui apresentadas

    tm em vista a escola em sua totalidade, ainda que este volume se concentre nas

    disciplinas da rea de Cincias Humanas e suas Tecnologias.

    Buscando contribuir para a implementao das reformas educacionais, definidas

    pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional e regulamentadas por

    Diretrizes do Conselho Nacional de Educao, a presente publicao tem como meta,

    entre seus objetivos centrais, facilitar a organizao do trabalho da escola, em termos

    desta rea de conhecimento. Para isso, explicita a articulao entre os conceitos

    estruturadores e as competncias gerais que se desejam promover e apresenta um

    conjunto de sugestes que, coerentes com aquela articulao, prope temas do ensino

    disciplinar na rea. Alm de abrir um dilogo sobre o projeto pedaggico escolar e

    de apoiar o professor das disciplinas em seu trabalho, o texto traz elementos para a

    continuidade da formao profissional docente na escola.

    A natureza do ensino mdio e as razes da reformaA reformulao do ensino mdio no Brasil , estabelecida pela Lei de

    Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN) de 1996, regulamentada em

  • 81998 pelas Diretrizes do Conselho Nacional de Educao e pelos Parmetros

    Curriculares Nacionais, procurou atender a uma reconhecida necessidade de

    atualizao da educao brasileira, tanto para impulsionar uma demo-

    cratizao social e cultural mais efetiva, pela ampliao da parcela da

    juventude brasileira que completa a educao bsica, como para responder a

    desafios impostos por processos globais, que tm excludo da vida econmica

    os trabalhadores no qualificados, por causa da formao exigida de todos os

    partcipes do sistema de produo e de servios.

    A expanso do ensino mdio brasileiro, que cresce exponencialmente, outra

    razo pela qual esse nvel de escolarizao demanda transformaes de

    qualidade, para adequar-se promoo humana de seu pblico atual, diferente

    daquele de h trinta anos, quando suas antigas diretrizes foram elaboradas. A

    idia central expressa na nova Lei, e que orienta a transformao, estabelece o

    ensino mdio como a etapa conclusiva da educao bsica de toda a populao

    estudantil e no mais somente como etapa preparatria de outra etapa escolar

    ou do exerccio profissional. Isso desafia a comunidade educacional a pr em

    prtica propostas que superem as limitaes do antigo ensino mdio, organizado

    em termos de duas principais tradies formativas: a pr-universitria e a

    profissionalizante.

    Especialmente em sua verso pr-universitria, o ensino mdio tem-se

    caracterizado por uma nfase na estrita diviso disciplinar do aprendizado. Seus

    objetivos educacionais se expressavam e, usualmente, ainda se expressam

    em termos de listas de tpicos, dos quais a escola mdia deveria tratar, a partir

    da premissa de que o domnio de cada disciplina era requisito necessrio e

    suficiente para o prosseguimento dos estudos. Dessa forma, parecia aceitvel

    que s em uma etapa superior tais conhecimentos disciplinares adquirissem, de

    fato, sua amplitude cultural ou seu sentido prtico. Por isso, essa natureza

    estritamente propedutica no era contestada ou questionada, mas hoje

    inaceitvel.

    Em contrapartida, em sua verso profissionalizante, o ensino mdio era, ou

    , caracterizado por uma nfase no treinamento para fazeres prticos, associados

    por vezes a algumas disciplinas gerais, mas sobretudo voltados a atividades

    produtivas ou de servios. Treinava-se para uma especialidade laboral, razo

    pela qual se promovia um certo aprofundamento ou uma certa especializao

    de carter tcnico, em detrimento de uma formao mais geral, ou seja,

    promoviam-se competncias especficas dissociadas de uma formao cultural

    mais ampla. importante que continuem existindo e se disseminem escolas que

    promovam especial izao prof iss ional em nvel mdio, mas que essa

    especializao no comprometa uma formao geral para a vida pessoal e

    cultural, em qualquer tipo de atividade.

    O novo ensino mdio, nos termos da le i , de sua regulamentao e

    encaminhamento, deixa de ser, portanto, simplesmente preparatrio para o

    ensino superior ou estritamente profissionalizante, para assumir neces-

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    sariamente a responsabilidade de completar a educao bsica. Em qualquer de

    suas modalidades, isso significa preparar para a vida, qualificar para a cidadania

    e capacitar para o aprendizado permanente, em eventual prosseguimento dos

    estudos ou diretamente no mundo do trabalho.

    As transformaes de carter econmico, social ou cultural, no Brasil e no

    mundo, que levaram modificao dessa escola, no tornaram o conhecimento

    humano menos disciplinar em nenhuma das trs reas em que se decidiu

    organizar o novo ensino mdio, ou seja, na de Cincias da Natureza e da

    Matemtica, na de Cincias Humanas e na de Linguagens e Cdigos. Essas

    reas, portanto, organizam e articulam as disciplinas, mas no as diluem nem

    as eliminam. No entanto, a inteno de completar uma formao geral nessa

    escola implica uma ao articulada, no interior de cada rea e no conjunto das

    reas, que no compatvel com um trabalho solitrio, definido indepen-

    dentemente no interior de cada disciplina, como acontecia no antigo ensino

    de segundo grau, para o qual haveria outra etapa formativa que articularia os

    saberes e, eventualmente, lhes daria sentido. No havendo necessariamente

    essa outra etapa, a articulao e o sentido devem ser garantidos j no ensino

    mdio.

    Mais do que reproduzir dados, denominar classificaes ou identificar

    smbolos, estar formado para a vida, num mundo como o atual, de to

    rpidas transformaes e de to difceis contradies, significa saber se

    informar, se comunicar, argumentar, compreender e agir, enfrentar

    problemas de qualquer natureza, participar socialmente, de forma prtica

    e solidria, ser capaz de elaborar crticas ou propostas e, especialmente,

    adquirir uma atitude de permanente aprendizado.

    Uma formao com tal ambio exige mtodos de aprendizado compatveis,

    ou seja, condies efetivas para que os alunos possam comunicar-se e

    argumentar, deparar-se com problemas, compreend-los e enfrent-los,

    participar de um convvio social que lhes d oportunidade de se realizarem

    como c idados , fazerem escolhas e proposies , tomarem gosto pelo

    conhecimento, aprenderem a aprender.

    Diferentemente das caractersticas necessrias para a nova escola, esboadas

    anteriormente, nossa tradio escolar tem sido, de um lado, a de compartimentar

    disciplinas, em ementas estanques, em atividades padronizadas, no referidas

    a contextos reais e, de outro lado, de passividade imposta ao conjunto dos alunos,

    em funo dos mtodos adotados e tambm da prpria configurao fsica dos

    espaos e condies de aprendizado que, em parte, refletem a pouca participao

    do aluno ou mesmo do professor na definio das atividades formativas. As

    perspectivas profissional, social ou pessoal dos alunos no tm feito parte das

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    preocupaes escolares, assim como as questes e problemas da comunidade,

    da cidade, do pas ou do mundo s tm recebido ateno marginal no ensino

    mdio que, tambm por isso, precisaria ser reformulado.

    Esta falta de sintonia entre realidade escolar e necessidades formativas se

    reflete nos projetos pedaggicos das escolas, freqentemente inadequados e

    raramente explicitados, como objeto de reflexo consciente da comunidade

    escolar. Quando essa reflexo ocorre, cada professor conhece por que razes

    a escola optou por promover quais atividades para os alunos, em funo do

    desenvolvimento de que competncias, em nome de que prioridades os

    recursos materiais foram utilizados e a carga horria foi distribuda e,

    sobretudo, qual sentido e relevncia tem seu trabalho, em sua disciplina, para

    se alcanarem as metas formativas gerais definidas para os alunos da escola.

    Sem isso, pode faltar clareza sobre como conduzir o aprendizado, no sentido

    de promover no conjunto dos alunos as qualificaes humanas pretendidas

    pelo novo ensino mdio.

    Como rever o projeto pedaggico da escola

    Independentemente das reformas a implementar em decorrncia da nova

    legislao, outras transformaes esto ocorrendo na quase totalidade das

    escolas, como resultado de processos sociais e culturais mais amplos. Quem vive

    o cotidiano escolar percebe que velhos paradigmas educacionais, com seus

    currculos estritamente disciplinares, revelam-se cada vez menos adequados,

    com reflexos no aprendizado e no prprio convvio, mudanas que a escola nem

    sempre consegue administrar ou sabe como tratar. Por isso, a transformao de

    qualidade que se procura promover na formao dos jovens ir conviver com

    outras modificaes, quantitativas e qualitativas, que precisam ser consideradas

    e compreendidas.

    Talvez a mais importante transformao pela qual tem passado a escola

    brasileira sua enorme ampliao numrica. O ensino bsico no Brasil j

    ultrapassou cinqenta milhes de matrculas, das quais cerca de dez milhes

    no ensino mdio, que dobrou de tamanho em uma dcada. Por conta desse

    processo, boa parte dos alunos desse ensino mdio vem de famlias em que

    poucos completaram sua educao fundamental, ou seja, a escola precisa se

    preparar para receber adequadamente um contingente realmente novo de

    estudantes.

    Em passado no muito distante, a quase totalidade dos que freqentavam a

    escola regular de ensino mdio estavam ali de passagem para o ensino superior.

    Essa parcela corresponde, na atualidade, a no mais do que um em cada quatro

    alunos, frao fcil de calcular, quando se compara o nmero de matrculas em

    todo o ensino superior cerca de dois e meio milhes com as de cerca de dez

    milhes de matrculas no ensino mdio. Assim, mais freqentemente, a

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    perspectiva dos jovens brasileiros que hoje esto nessa escola obter qualificao

    mais ampla para a vida e para o trabalho, j ao longo de sua escolarizao bsica

    e imediatamente depois. Isso exige a reviso de uma escola que era sobretudo

    preparatria para a educao superior.

    Adequar a escola para receber seu pblico atual torn-la capaz de

    promover a realizao pessoal, a qualificao para um trabalho digno, para

    a participao social e poltica, enfim, para uma cidadania plena da totalidade

    de seus alunos e alunas, fato que conduz necessidade de se rever o projeto

    pedaggico de muitas escolas que no se renovam h dcadas, tendo sido

    criadas em outras circunstncias, para outro pblico e para um mundo

    diferente do de nossos dias.

    Com essa perspectiva, preciso identificar os pontos de partida para construir

    essa nova escola, e reconhecer os obstculos que dificultam sua implementao,

    para aprender a contorn-los ou para super-los. Um ponto de partida a

    conscincia crescente da importncia da educao, que tem resultado em

    permanente crescimento quantitativo, de forma que no mais ser preciso trazer

    o povo para a escola, mas sim adequar a escola a esse povo. A rede escolar

    existente, mesmo com instalaes e pessoal ainda insuficientes, tambm

    certamente constitui outro ponto de partida.

    Esses bons pontos de partida, no entanto, esto cercados de obstculos

    difceis, como a tradio de ensino estritamente disciplinar do ensino mdio, de

    transmisso de informaes desprovidas de contexto, ou de resoluo de

    exerccios padronizados, heranas do ensino conduzido em funo de exames

    de ingresso no ensino superior. Outro obstculo a expectativa dos alunos,

    quando no de suas famlias e das prprias instituies escolares, de que os

    agentes no processo educacional sejam os professores, transmissores de

    conhecimento, de que os alunos sejam os pacientes, receptores, e de que escola

    seja simplesmente o local em que ocorre essa transmisso. Essas expectativas

    equivocadas, somadas ao ensino sem contexto, acabam resultando em

    desinteresse, em baixo desempenho e em um ciclo de desentendimentos, no qual

    os alunos ou seus pais consideram os professores fracos ou desinteressados, no

    qual professores pensam exatamente o mesmo de seus alunos, numa escola em

    que o bom desafio do aprendizado e a alegria do convvio do lugar apatia,

    tenso, displ icncia ou violncia , em propores que var iam com as

    circunstncias.

    Identificar pontos de partida e obstculos facilita o desenvolvimento de

    estratgias e a mobilizao de recursos para empreender a construo da nova

    escola de nvel mdio que no h de ser mais um prdio, com professores

    agentes e com alunos pacientes, mas um projeto de realizao humana, recproca

    e dinmica, de alunos e professores, em que o aprendizado esteja prximo das

    questes reais, apresentadas pela vida comunitria ou pelas circunstncias

    econmicas, sociais e ambientais. Mais do que tudo, quando fundada numa

    prtica mais solidria, essa nova escola estar atenta s perspectivas de vida de

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    seus partcipes, ao desenvolvimento de suas competncias gerais, de suas

    habilidades pessoais, de suas preferncias culturais.

    A escola como cenrio real da reforma educacional

    As reformas educacionais tiveram incio h pouco mais de meia dcada e

    pode ser que leve mais uma dcada para promover as transformaes

    pretendidas, em escala nacional. Mas j se percebem experincias importantes

    em muitas escolas brasileiras, que desenvolvem novos projetos pedaggicos e

    novas prticas educacionais, nas quais leituras, investigaes, discusses e

    projetos, realizados por alunos, superam ou complementam a didtica da

    transmisso e a pedagogia do discurso. Essas novas prticas, usualmente, so

    resultado de um trabalho de toda a comunidade, em cooperao com a direo

    escolar, em apoio transio entre o velho e o novo modelo de escola.

    As escolas que, em diferentes ambientes e condies, esto construindo novos

    e bem-sucedidos paradigmas educacionais, no so necessariamente as mais

    ricas ou mais bem equipadas. O que as distingue a sintonia entre professores,

    alunos e sua comunidade, a ateno solidria dada s metas de diferentes

    conjuntos de alunos, como a orientao profissional para alguns, o preparo pr-

    universitrio para outros, e a realizao cultural e social, feita no prprio

    convvio escolar, e no adiada para um futuro distante.

    Ao identificar propsitos e necessidades diferentes entre os estudantes, essas

    escolas associam ao trabalho de promoo do aprendizado geral, comum, atividades

    complementares, de interesse amplo ou particular. Nessas atividades, a presena

    da comunidade tem sido essencial, pela participao em conselhos, em parcerias

    com diferentes organizaes da sociedade civil e pelo uso de outros espaos e

    equipamentos sociais alm daqueles disponveis na escola. Em contrapartida,

    freqentemente, essas escolas se interessam por problemas da comunidade, usando

    seus conhecimentos e recursos humanos para diagnostic-los e encaminh-los.

    Os objetivos da nova educao pretendida so certamente mais amplos do

    que os do velho projeto pedaggico. Antes se desejava transmitir conhecimentos

    disciplinares padronizados, na forma de informaes e procedimentos estanques;

    agora se deseja promover competncias gerais, que articulem conhecimentos

    disciplinares ou no. Essas competncias dependem da compreenso de

    processos e do desenvolvimento de linguagens, a cargo das disciplinas, e estas

    devem, por sua vez, ser tratadas como campos dinmicos de conhecimento e de

    interesses, e no como listas de saberes oficiais.

    Ao lidar com as Cincias Humanas, este volume estar enfatizando propostas

    re lat ivas s disc ipl inas dessa rea , mas grande parte das anl ises e

    recomendaes envolvem todo o projeto pedaggico da escola, transcendendo

    o trabalho das disciplinas e mesmo aquele que deve ser conduzido estritamente

    por professores. Por exemplo, especialmente para jovens, cujas famlias estejam

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    marginalizadas economicamente ou apartadas de participao social, a escola

    de ensino mdio pode constituir uma oportunidade nica de orientao para a

    vida comunitria e poltica, econmica e financeira, cultural e desportiva.

    Boa parte desses temas e atividades no eram reconhecidos como funes da

    escola, no tempo em que ela s atendia a um pblico que, por meios e iniciativas

    prprios, se informava desses assuntos fora do ambiente escolar. Mesmo hoje,

    esses outros papis da escola sociais, cvicos e comunitrios podem ser

    essenciais para algumas escolas, mas menos relevantes para outras. preciso,

    enfim, considerar a realidade do aluno e da escola, e evitar sugerir novas

    disciplinas ou complicar o trabalho das j existentes, at porque esse tipo de

    aprendizado no se desenvolve necessariamente assistindo a aulas, mas

    sobretudo em outras prticas. O que motiva essas sugestes lembrar a primeira

    finalidade da educao bsica, de acordo com o artigo 22 da LDBEN 96, a

    formao comum indispensvel para o exerccio da cidadania... e, diante da obrigao

    do cumprimento dessa finalidade, o educador no tem direito de ignorar a

    condio extra-escolar do educando.

    A disseminao de um conceito mais generoso de educao depende de

    toda a sociedade, e no s de medidas oficiais.

    Constitui um alento perceber que muitas escolas brasileiras j esto realizando

    esse trabalho de forma exemplar, conscientes de que devem promover todos os

    seus alunos e no selecionar alguns; que devem emancip-los para a participao

    e no domestic-los para a obedincia; que devem valoriz-los em suas

    diferenas individuais e no nivel-los por baixo ou pela mdia. Parte do que

    foi sintetizado acima e tambm do que ser exposto a seguir resume um

    aprendizado da nova escola brasileira, no como receita para ser seguida sem

    esprito crtico, e sim como sugesto do que fazer, de como criar o novo.

    Novas orientaes para o ensinoNo sentido de encaminhar um ensino compatvel com as novas pretenses

    educativas e ampliar as orientaes contidas nos PCN para o ensino mdio,

    adiantando elementos que ainda no estavam explicitados, este volume dedicado

    especialmente s Cincias Humanas procura trazer elementos de utilidade para

    o professor de cada disciplina, na articulao entre competncias e conceitos da

    qual emergem sugestes temticas que sejam facilitadoras para a construo

    dos processos de ensino e de aprendizagem.

    No mbito de cada disciplina, os conceitos estruturadores com os quais se

    pode organizar o ensino constituem uma composio de elementos curriculares

    da Filosofia, Geografia, Histria e Sociologia, com competncias e habilidades,

    no sentido em que esses termos so utilizados nos PCN do Ensino Mdio ou no

    Exame Nacional do Ensino Mdio (ENEM). Dessa forma, cada disciplina

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    apresenta um conjunto de concei tos es truturadores ar t iculados com

    conhecimentos, que no so s tpicos disciplinares nem s competncias gerais

    ou habilidades, mas sugestes de snteses de ambas as intenes formativas. Ao

    se apresentarem dessa forma, esses conceitos estruturadores do ensino

    disciplinar e de seu aprendizado no mais se restringem, de fato, ao que

    tradicionalmente se considera responsabilidade de uma nica disciplina, pois

    incorporam metas educacionais comuns s vrias disciplinas da rea e s das

    demais reas, o que implica modificaes em procedimentos e mtodos, que j

    sinalizam na direo de uma nova atitude da escola e do professor.

    As sugestes temticas que sero apresentadas derivadas que so dos

    conceitos estruturadores e das competncias sugeridas para a rea em geral e

    para cada disciplina que a compe em particular no devem ser entendidas

    como listas de tpicos que possam ser tomadas por um currculo mnimo, porque

    simplesmente uma proposta, nem obrigatria nem nica, de uma viso ampla

    do trabalho em cada disciplina. Sob tal perspectiva, o aprendizado conduzido

    de forma que os saberes disciplinares, com suas nomenclaturas especficas, no

    se separam do domnio das linguagens de utilidade mais geral, assim como os

    saberes prticos no se apartam de aspectos gerais e abstratos, de valores ticos

    e estticos, ou seja, esto tambm associados a vises de mundo. Nessa proposta,

    portanto, os conceitos, as competncias e os conhecimentos so desenvolvidos

    em conjunto e se reforam reciprocamente.

    Tendo em vista as prticas tradicionalmente adotadas na escola mdia

    brasileira, o que est sendo proposto depende de mudanas de atitude na

    organizao de novas prticas. Por isso, as sugestes de temticas derivadas

    dos conceitos estruturadores e das competncias, que se pretende que os

    educandos venham a construir/desenvolver em cada disciplina, no devem ser

    burocraticamente divididas ao longo de um dado ano letivo, e sim ampliadas

    e/ou reduzidas de acordo com as necessidades locais de cada escola, bem como

    de acordo com as normas institucionais que regulamentam cada sistema de

    ensino. Assim, o nmero de aulas por disciplina, que varia significativamente

    no interior de redes pblicas e privadas de ensino, exige correspondente

    adequao e reduo no conjunto de metas em sua organizao. Importa lembrar,

    no entanto, que possveis redues, mesmo que no desejveis, demandam

    critrios que preservem aspectos disciplinares essenciais, tanto quanto no

    descartem as competncias e conceitos estruturadores centrais.

    Nessa nova compreenso do ensino mdio e da educao bsica, a organizao

    do aprendizado no seria conduzida de forma solitria pelo professor de cada

    disciplina, pois escolhas pedaggicas feitas numa disciplina no seriam

    independentes do tratamento dado s demais disciplinas da rea e mesmo das

    outras duas reas, uma vez que uma ao de cunho interdisciplinar que articula

    o trabalho das disciplinas, no sentido de promoverem competncias. As

    linguagens, as cincias e as humanidades continuam sendo disciplinares, mas

    preciso desenvolver seus conhecimentos de forma a constiturem, a um s tempo,

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    cultura geral e instrumento para a vida, ou seja, desenvolver, em conjunto,

    conhecimentos e competncias. Contudo, assim como a interdisciplinaridade

    surge do contexto e depende da disciplina, a competncia no rivaliza com o

    conhecimento; pelo contrrio, s se funda sobre ele e se desenvolve com ele.

    Conhecimentos, competncias,disciplinas e seus conceitos estruturadores

    O novo ensino mdio deve estar atento para superar contradies reais ou

    aparentes entre conhecimentos e competncias.

    Para quem possa temer que se estejam violando os limites disciplinares,

    quando estes se compem de conhecimentos e competncias, vale lembrar que

    as prprias formas de organizao do conhecimento as disciplinas tm

    passado por contnuos rearranjos. Muitas disciplinas acadmicas e muitos

    campos da cultura so resultados de processos de sistematizao recentes de

    conhecimentos prticos ou tericos, reunindo elementos que, em outra pocas,

    estavam dispersos em distintas especialidades.

    A diviso de territrios entre as distintas cincias humanas um exemplo de

    como, na organizao disciplinar do conhecimento, no h demarcaes

    absolutas, pois h mesmo aspectos comuns da geografia e da sociologia, ou

    tambm da histria e da antropologia, tanto da perspectiva conceitual e/ou

    temtica quanto de instrumentos analticos. A filosofia partilha alguns de seus

    temas centrais com diferentes disciplinas das cincias humanas e com outras

    das cincias da natureza. As linguagens, por sua vez, dos idiomas s artes, tm

    seus recortes temticos e disciplinares em permanente transformao, alm do

    que, em um mesmo local e perodo, convivem vises diferentes ou mesmo

    divergentes sobre quais so seus temas centrais de aprendizado e sobre as forma

    mais recomendveis para seu ensino.

    Ainda que as disciplinas no sejam sacrrios imutveis do saber, no haveria

    nenhum interesse em redefini-las ou fundi-las para objetivos educacionais.

    preciso reconhecer o carter disciplinar do conhecimento e, ao mesmo tempo,

    orientar e organizar o aprendizado, de forma que cada disciplina, na

    especificidade de seu ensino, possa desenvolver competncias gerais. H nisso

    uma contradio aparente, que preciso discutir, pois especfico e geral so

    adjetivos que se contrapem, dando a impresso de que o ensino de cada

    disciplina no possa servir aos objetivos gerais da educao pretendida.

    H habilidades e competncias cujo desenvolvimento no se restringe a

    qualquer tema, por mais amplo que seja, pois implica um domnio conceitual e

    prtico, para alm de temas e de disciplinas. A prpria competncia de dar

    contexto social e histrico a um conhecimento cientfico um exemplo que no

    est restrito a nenhuma disciplina ou rea em particular. O que preciso

    compreender que, precisamente por transcender cada disciplina, o exerccio

  • 16

    dessas competncias e dessas habilidades est presente em todas elas, ainda que

    com diferentes nfases e abrangncias. Por isso, o carter interdisciplinar de um

    currculo escolar no reside nas possveis associaes temticas entre diferentes

    disciplinas, que em verdade, para sermos rigorosos, costumam gerar apenas

    integraes e/ou aes multidisciplinares. O interdisciplinar se obtm por outra

    via, qual seja, por uma prtica docente comum na qual diferentes disciplinas

    mobilizam, por meio da associao ensino-pesquisa, mltiplos conhecimentos e

    competncias, gerais e particulares, de maneira que cada disciplina d a sua

    contribuio para a construo de conhecimentos por parte do educando, com

    vistas a que o mesmo desenvolva plenamente sua autonomia intelectual. Assim,

    o fato de diferentes disciplinas trabalharem com temas tambm diversos no

    implica a inexistncia de trabalho interdisciplinar, desde que competncias e

    habilidades sejam permanentemente mobilizadas no mbito de uma prtica

    docente, como dissemos acima, centrada na associao ensinopesquisa.

    No h receita nem definio nica ou universal para as competncias, que

    so qualificaes humanas amplas, mltiplas e que no se excluem entre si. Por

    exemplo, os PCN para o Ensino Mdio explicitam trs conjuntos de competncias:

    o de comunicar e representar, o de investigar e compreender, assim como o de

    contextualizar social ou historicamente os conhecimentos. Por sua vez, de forma

    semelhante mas no idntica, o Exame Nacional do Ensino Mdio (ENEM) aponta

    cinco competncias gerais: dominar diferentes linguagens, desde idiomas at

    representaes matemticas e artsticas; compreender processos, sejam eles sociais,

    naturais, culturais ou tecnolgicos; diagnosticar e enfrentar problemas reais;

    construir argumentaes; e elaborar proposies solidrias.

    Informar e informar-se, comunicar-se, expressar-se, argumentar logicamente,

    aceitar ou rejeitar argumentos, manifestar preferncias, apontar contradies,

    fazer uso adequado de diferentes nomenclaturas, de diferentes cdigos e de

    diferentes meios de comunicao, so competncias gerais que fazem parte dos

    recursos de todas as disciplinas, e que, por isso, devem se desenvolver no

    aprendizado de cada uma delas. Assim, lado a lado com o aprendizado de

    competncias, que, primeira vista, poderiam parecer mais disciplinares como

    compreender processos naturais, sociais e tecnolgicos, assim como interpretar

    manifestaes culturais e artsticas , podem ser aprendidas competncias

    aparentemente mais gerais como fazer avaliaes quantitativas e qualitativas,

    em termos prticos, ticos e estticos, equacionar e enfrentar problemas pessoais

    ou coletivos, participar socialmente, de forma solidria, ser capaz de elaborar

    crticas ou propostas.

    Algumas dessas competncias podem ter um apelo mais tcnico-cientfico, outras

    mais artstico-cultural, mas h um arco de qualidades humanas que, ainda que em

    doses distintas, tomaro parte nos fazeres de cada aprendizado especfico. H outras

    qualidades como desenvolver apreo pela cultura, respeito pela diversidade e

    atitude de permanente aprendizado, questionamento e disponibilidade para a ao

    que so valores humanos amplos sem qualquer especificidade disciplinar e que,

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    portanto, devem estar integradas a todas as prticas educativas. Mas isso s acontece

    se a formao for concebida como um conjunto, em termos de objetivos e formas de

    aprendizado. Aprende a comunicar, quem se comunica; a argumentar, quem

    argumenta; a resolver problemas reais, quem os resolve; e a participar de um

    convvio social, quem tem essa oportunidade. Disciplina alguma desenvolve tudo

    isso isoladamente, mas a escola as desenvolve nas disciplinas que ensina e nas

    prticas de cada classe e de cada professor.

    Por essa razo, quando forem trabalhadas as vrias disciplinas da rea de

    conhecimento, juntamente com a apresentao das competncias no mbito da

    rea e das disciplinas, sero apresentados conceitos estruturadores do ensino

    dessa rea, assim como das disciplinas que a compem, com vistas a facilitar

    uma organizao do aprendizado compatvel com a ambio formativa expressa

    anteriormente. A partir da, apresentaremos algumas sugestes de organizao

    temtica. claro que os conceitos estruturadores, assim como as sugestes

    temticas, que sero apresentados no so a nica forma possvel de organizao,

    podendo e devendo, portanto, ser modificados de acordo com o ritmo e as

    caractersticas da escola ou da turma. So, enfim, sugestes de trabalho, e no

    modelos fechados. No entanto, a adoo dessas sugestes, ou outras equivalentes

    do mesmo ponto de vista terico-metodolgico, permitem no apenas uma

    organizao disciplinar do aprendizado mas tambm do margem a alternativas

    de organizao do aprendizado na rea e no conjunto das reas. No mbito

    escolar, essa organizao por rea pode tambm contribuir para uma melhor

    estruturao do projeto pedaggico de escola.

    A articulao entre as reas

    A articulao inter-reas uma clara sinalizao para o projeto pedaggico

    da escola. Envolve uma sintonia de tratamentos metodolgicos e, no presente

    caso, pressupe a composio de um aprendizado de conhecimentos disciplinares

    com o desenvolvimento de competncias gerais. S em parte essa integrao de

    metas formativas pode ser realizada por projetos concentrados em determinados

    perodos, nos quais diferentes disciplinas tratem ao mesmo tempo de temas afins.

    Mais importante do que isso o estabelecimento de metas comuns envolvendo

    cada uma das disciplinas de todas as reas, a servio do desenvolvimento

    humano dos alunos (centrado no desenvolvimento de competncias e

    habilidades) e tambm dos professores.

    De forma consciente e clara, disciplinas da rea de linguagens e cdigos

    devem tambm tratar de temticas cientficas e humansticas, assim como

    disciplinas da rea cientfica e matemtica, ou da humanista, devem tambm

    desenvolver o domnio de linguagens. Explicitamente, disciplinas da rea de

    linguagens e cdigos e da rea de cincias da natureza e matemtica devem

    tambm tratar de aspectos histrico-geogrficos e culturais e, vice-versa, as

  • 18

    cincias humanas devem tambm tratar de aspectos cientfico-tecnolgicos e

    das linguagens. No se trata de descaracterizar as disciplinas, confundindo-as

    todas em prticas comuns ou indistintas; o que interessa promover uma ao

    concentrada do seu conjunto e tambm de cada uma delas, a servio do

    desenvolvimento de competncias gerais que dependem do conhecimento

    disciplinar e, portanto, do domnio de seus conceitos estruturadores.

    As sugestes que apresentaremos visam indicar a possibilidade de que uma

    disciplina da rea venha a tratar, com contexto e interdisciplinaridade via

    mobilizao de conceitos e competncias, de um tema que lhe prprio, sem a

    necessidade de que, no mesmo perodo, outras disciplinas estejam tratando dos

    mesmos temas. Isso no significa que projetos integradores coletivos no possam

    ser desenvolvidos nem que cada professor deva ser deixado isolado, na procura

    e no desenvolvimento de temas especficos de sua disciplina. Alm do esforo

    de qualificao docente, para facilitar ou mesmo possibilitar tais desen-

    volvimentos, importante uma at i tude colet iva dos professores e da

    comunidade, estimulada e apoiada pela direo escolar, no sentido de se elaborar

    e desenvolver um projeto pedaggico da escola no qual os objetivos educacionais,

    entre os quais o de promoo de competncias humanas mais amplas, estejam

    traduzidos em prticas formativas de cada uma das disciplinas e de seu conjunto.

    Um dos domnios dessa articulao o que se d entre diferentes reas do

    conhecimento. O outro domnio o da articulao no interior de cada rea.

    A articulao entre as disciplinas em cada uma das reas

    Aparentemente, seria bem mais fcil estabelecer uma articulao entre as

    disciplinas de uma mesma rea do que entre as de reas diferentes, pois h

    elementos de identidade e proximidade no interior de cada rea. H conceitos

    estruturadores comuns decorrentes disso, como as diferentes noes de cultura

    nas Cincias Humanas. H, ainda, procedimentos comuns, como as tcnicas de

    entrevistas e levantamento de dados e informaes de algumas das cincias

    humanas, e h aspectos metodolgicos comuns, como as atividades de anlise e

    interpretao geral de fenmenos sociais.

    A despeito de todas essas convergncias para se compor um programa de

    trabalho articulado em uma rea, h difceis obstculos que precisam ser

    transpostos. Primeiro, preciso encontrar os pontos de contato reais entre as

    disciplinas da rea. Em seguida, a partir desses pontos, preciso estabelecer as

    pontes e o trnsito entre as disciplinas, que nem sempre interligaro da mesma

    forma todas essas disciplinas. Finalmente, preciso identificar, analisar e

    desfazer falsas semelhanas, traduzir linguagens diferentes usadas para o mesmo

    objeto ou distinguir linguagens iguais usadas para identificar conceitos

    diferentes. Em suma, h que se compreender e trabalhar convergncias e

    divergncias, reais ou aparentes, determinar e desenvolver temticas e mtodos

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    comuns e, com esse conhecimento, preparar o trabalho de cada disciplina e de

    seu conjunto.

    Tal articulao intra-rea no deveria ser vista simplesmente como um

    produto novo, a ser apresentado escola, pois, sob certos aspectos, uma dvida

    antiga que se tem com o aluno. Uma parcela dessa dvida poderia ser paga com

    a apresentao de uma linguagem e da nomenclatura realmente comuns entre

    vrias das disciplinas.

    Nas Cincias Humanas, a problemtica da identidade, por exemplo, objeto

    de estudo da Psicologia, da Sociologia, da Filosofia e da Histria e pelo estudo

    da linguagem especfica com que tais reas de conhecimento a definem. Ela vai

    estar presente nas questes de afirmao e auto-estima do jovem estudante, no

    estudo antropolgico das organizaes familiares, das culturas alimentares,

    musicais ou religiosas, nas questes de identidade nacional diante da

    globalizao cultural. Seu tratamento articulado, resultante de um entendimento

    entre professores de uma mesma escola, poderia promover um reforo recproco

    no trabalho dessas e de outras disciplinas da rea.

    Tambm por meio de um trabalho compartilhado, Geografia, Histria,

    Sociologia e Filosofia podem desenvolver um tratamento articulado da questo

    das disparidades econmicas e sociais, em sua atualidade e em sua gnese, a

    partir do estudo de diferentes temticas e no necessariamente de um tema

    comum, visto que o estudo de diferentes temas podem gerar anlises

    relacionadas s questes citadas acima. Ao serem revistas as razes de nossa

    sociedade, paralelamente ao estudo da histria de outros povos, ao se

    compararem evoluo de movimentos sociais e ordens econmicas com a histria

    das idias polticas, possvel desenvolver instrumentos que permitam aos

    estudantes discutir a ainda to pouco compreendida sociedade ps-industrial,

    neste mundo em que Internet, cereais transgnicos e veculos informatizados

    convivem com interminveis guerras tnicas e religiosas, com a extremada

    pobreza qual esto relegadas partes significativas das populaes africanas, a

    reestruturao do Leste Europeu, os conf l i tos do Oriente Mdio etc .

    Compreender o sentido dos grandes blocos econmicos e da velha e da nova

    economia pode ser parte de um mesmo estudo, que permitiria formular

    hipteses, propostas e alternativas de soluo, em torno da possibilidade de se

    superar a excluso social e econmica, dominante em grande parte do mundo.

    So incontveis as propostas de articulao no interior de cada rea ou de

    cruzamento de fronteiras entre as trs reas, a servio do desenvolvimento de

    competncias mais gerais. Os exemplos citados aqui so apenas uma pequena

    amostra de que possvel construir essa articulao, que s uma das dimenses

    em que preciso atuar, para subsidiar a reforma educacional, iniciada h alguns

    anos, e que ainda tem um longo caminho a percorrer para mudar a realidade

    das escolas brasileiras. O trabalho apresentado a seguir com sugestes de

    possveis organizaes curriculares e temticas em cada disciplina pode

    auxiliar a dar passos significativos nessa direo.

  • A rea de Cincias Humanase suas Tecnologias

    O trabalho interdisciplinar e contextualizadoAntes de tratarmos de forma mais particularizada dos conceitos estruturadores

    da rea de Cincias Humanas e suas Tecnologias, bem como da articulao desses

    conceitos com as competncias gerais da referida rea, importante esclarecermos,

    ainda que de forma sinttica, algumas questes que consideramos fundamentais

    para a compreenso da conceituao de interdisciplinaridade de que faremos uso

    neste documento.

    Entendemos que o esclarecimento sobre as questes terico-metodolgicas

    relacionadas conceituao de interdisciplinaridade deve ser processado antes de

    se definir qual tipo de trabalho uma escola pretende realizar. comum o equvoco

    que deixa de lado tal discusso sob a alegao de que temos que ir direto prtica.

    Tal condio inexiste, uma vez que toda e qualquer prtica antecedida por um

    pensar e planejar sobre o que se pretende realizar.

    Esse alerta importante para que no enveredemos por propostas supostamente

    interdisciplinares que, na realidade, costumam apenas integrar diferentes disciplinas

    no mbito de algum projeto curricular. Um trabalho interdisciplinar, antes de garantir

    associao temtica entre diferentes disciplinas ao possvel mas no imprescind-

    vel , deve buscar unidade em termos de prtica docente, ou seja, independentemente

    dos temas/assuntos tratados em cada disciplina isoladamente. Os educadores de

    determinada unidade escolar devem comungar de uma prtica docente comum voltada

    para a construo de conhecimentos e de autonomia intelectual por parte dos

    educandos. Em nossa proposta, essa prtica docente comum est centrada no trabalho

    permanentemente voltado para o desenvolvimento de competncias e habilidades,

    apoiado na associao ensinopesquisa e no trabalho com diferentes fontes expressas

    em diferentes linguagens, que comportem diferentes interpretaes sobre os temas/

    assuntos trabalhados em sala de aula. Portanto, esses so os fatores que do unidade

  • 22

    ao trabalho das diferentes disciplinas, e no a associao das mesmas em torno de

    temas supostamente comuns a todas elas.

    Outro aspecto a ser lembrado que, sob tal perspectiva, o trabalho docente deve

    fazer com que as chamadas aulas meramente discursivas ou expositivas se

    tornem coadjuvantes e secundrias em relao s posturas de mediao que o

    educador deve assumir em relao aos trabalhos realizados pelos educandos

    (individualmente, em grupos ou coletivamente). O subproduto natural dessa opo

    ser a reduo drstica dos chamados contedos programticos, que no podem ser

    vistos como um fim em si, mas apenas como meios para que os educandos construam

    conhecimentos. Afinal, no se deve pretender formar jovens historiadores; jovens

    gegrafos; jovens filsofos; jovens socilogos etc., na escola de Ensino Mdio.

    No so essas as finalidades desse segmento de ensino.

    Ter discernimento para perceber as fronteiras existentes entre os chamados

    conhecimentos e saberes acadmicos e os conhecimentos e saberes escolares

    , portanto, um pressuposto fundamental e uma competncia profissional

    que necessita ser desenvolvida e aplicada no fazer didtico e pedaggico de

    nossos educadores.

    Alm disso, tambm devemos deter nossa ateno em um outro aspecto: a

    contextualizao. A tradio existente, seno em todas mas ao menos na maioria

    das propostas de trabalho que envolvem as disciplinas da rea de Cincias Humanas

    e suas Tecnologias, costuma vincular a noo de contexto condio de conjunto de

    aspectos gerais, que supostamente fazem as vezes de pano de fundo ou cenrio

    no qual se desdobram os acontecimentos sociais apresentados como relevantes por

    essa mesma tradio. No entanto, quando aqui nos referimos noo de

    contextualizao como parte necessria da prtica docente comum, que alicera um

    trabalho efetivamente interdisciplinar, estamos apontando para uma outra direo,

    qual seja, a da significao dos temas/assuntos a serem estudados pelos educandos,

    no mbito do viver em sociedade amplo e particular dos mesmos.

    Nesse sentido, a noo de contextualizao deixa de ser ditada por tradies

    externas e mesmo estranhas aos educandos e passa a ser compreendida como a soma

    de espaos de vivncias sociais diretas e indiretas, nas quais os educandos identificam

    e constroem/reconstroem conhecimentos a partir da mobilizao de conceitos,

    competncias e habilidades prprios de uma determinada rea e/ou disciplina

    escolar. Dessa forma, as escolhas de temas/assuntos, que sero motivo de estudo e

    estruturao de atividades problematizadoras frente realidade social, no ficam

    sujeitas s determinaes meramente acadmicas, que circundam e conferem

    supostas escalas de rigor analtico aos conhecimentos construdos/reconstrudos

    pelos educandos no fazer cotidiano das atividades escolares.

    Para que a contextualizao seja de fato alcanada, devemos nos desvencilhar

    das amarras ditadas pela tradio e repensar as noes de contedo curricular.

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    Para alm simplesmente dos contedos programticos, que se traduzem quase

    sempre pelos temas e assuntos existentes em um dado programa escolar, devemos

    lembrar que contedo curricular todo e qualquer aspecto e/ou varivel que de

    alguma maneira interfere na construo de conhecimentos por parte dos educandos.

    Assim, se temos como certo que os conceitos de determinada disciplina, os materiais

    utilizados em sala de aula, as atividades propostas para os educandos, os

    procedimentos utilizados, as competncias e habilidades a serem desenvolvidas

    e/ou mobilizadas, alm dos prprios temas e assuntos selecionados, entre outros,

    so aspectos e/ou variveis que interferem na construo/reconstruo de

    conhecimentos por parte dos educandos, todos esses elementos devem ser

    considerados como sendo contedo curricular, e no nos limitarmos, como

    dissemos acima, a acreditar que apenas os ditos contedos programticos que

    merecem tal definio.

    Assim, uma prtica docente centrada no desenvolvimento de competncias e

    habilidades e na realizao de atividades escolares significativas e contextualizadas

    que mobilizem e auxiliem na construo/reconstruo de diferentes conhecimentos

    por parte dos educandos, no mbito dos trabalhos de uma dada disciplina associa-se,

    necessariamente, a uma nova postura do educador. Uma postura centrada na

    mediao dos processos de construo/reconstruo dos conhecimentos escolares

    por parte dos educandos, e no na condio de mero retransmissor desses

    conhecimentos para os mesmos.

    Se tais premissas forem desenvolvidas e praticadas por educadores de diferentes

    disciplinas concomitantemente, inclusive no que se refere prtica de processos de

    avaliao centrados na observao do desenvolvimento dos educandos em relao

    s competncias, habilidades e conceitos que estes mobilizam, constroem e

    reconstroem ao longo dos processos de ensino e de aprendizagem, a teremos um

    trabalho efetivamente interdisciplinar, independentemente do fato de disciplinas

    diversas trabalharem com temas/assuntos diferenciados entre si. Isso porque teremos

    diferentes disciplinas contribuindo, cada qual no mbito dos objetos de estudos,

    conceitos, procedimentos, competncias e habilidades que lhes so prprios, para

    que os educandos construam/reconstruam conhecimentos e desenvolvam autonomia

    intelectual. A ao conjugada e planejada de diferentes disciplinas em tal direo

    somente ocorre pela comunho de prticas e no de temas. Vem da que a primeira

    situao cria uma perspectiva de trabalho interdisciplinar, enquanto a segunda

    confere aos trabalhos escolares to somente um carter integrador numa perspectiva

    multidisciplinar. Uma perspectiva que, como j dissemos, pode ser facilitadora para

    que algumas questes relacionadas aos processos de ensino e de aprendizagem

    venham a ser equacionadas, mas que no se constitui, por si s, em uma prtica

    escolar, docente e curricular efetivamente interdisciplinar.

    Mais adiante, retomaremos as questes sobre as quais acabamos de nos deter.

    Antes, porm, vejamos quais so os conceitos que estruturam a rea de Cincias

    Humanas e suas Tecnologias e de que maneira esses conceitos se articulam com as

    competncias gerais da rea.

  • 24

    Os conceitos estruturadores da rea

    Em termos gerais, o que um conceito? A pergunta em si pode nos revelar

    muitas e complexas respostas, mas fiquemos com uma das possibilidades, aquela

    que nos diz que um conceito a representao das caractersticas gerais de

    determinado objeto pelo pensamento. Nesse sentido, conceituar significa a ao

    de formular uma idia que permita, por meio de palavras, estabelecer uma

    definio, uma caracterizao do objeto a ser conceituado. Tal condio implica

    reconhecer que um conceito no o real em si, e sim uma representao desse real,

    construda por meio do intelecto humano.

    Dessa forma, o conceito construdo pelo intelecto com base na anlise que

    realizamos da realidade. Sua finalidade maior , digamos, servir de ferramenta

    intelectual que possa ser reutilizada para que novas anlises sejam processadas.

    No entanto, nem toda anlise gera novos conceitos, na medida em que muitas

    das atividades analticas lanam mo de conceitos j construdos e que, como j

    dissemos, so reutilizados para que o percurso humano de construo/

    reconstruo de conhecimentos seja ampliado em escalas cada vez mais

    complexas e abrangentes.

    Embora, em termos gerais, esses aspectos amplos presentes na construo de

    conceitos possam ser identificados em diferentes reas de conhecimento, cada

    uma dessas reas bem como as disciplinas que as compem apresentam quadros

    conceituais que lhes conferem identidade e as caracterizam de modo a que se

    consiga diferenciar umas das outras. Assim, para que possamos identificar as

    peculiaridades conceituais de diferentes reas, e tambm de diferentes

    disciplinas, necessrio identificarmos, mesmo que de forma parcial e, portanto,

    incompleta, os aspectos que caracterizam os objetos de estudo e de conhecimento

    dessas reas e disciplinas.

    Em termos globais, a rea sobre a qual nos detemos aqui, ou seja, a rea de

    Cincias Humanas, tem por objeto amplo o estudo das aes humanas no mbito

    das relaes sociais, que so construdas entre diferentes indivduos, grupos,

    segmentos e classes sociais, bem como as construes intelectuais que estes

    elaboram nos processos de construo dos conhecimentos que, em cada momento,

    se mostram necessrios para o viver em sociedade, em termos individuais ou

    coletivos.

    Dessa forma, reafirmamos que, quando falamos em conceitos estruturadores

    de uma determinada rea, estamos nos referindo aos conjuntos de repre-

    sentaes do real que caracterizam, em termos bsicos, determinada rea e a

    diferencia de outras. E para que possamos identificar quais conceitos so

    estruturadores de uma dada rea, necessrio, como fizemos acima, estabelecer

    qual o seu objeto central. Dele derivam as demarcaes que iro nos fornecer

    as referncias para determinar, ainda que de forma incompleta, os pilares

    conceituais de uma rea.

    No entanto, convm lembrar que uma rea de conhecimento s pode ser

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    caracterizada a partir das partes que a compem, em um processo de anlise

    que, ao desmontar o objeto central da rea, nos conduz percepo de outros

    objetos que caracterizam os segmentos da rea. Tais segmentos so as disciplinas,

    com seus objetos prprios, que trazem em seu bojo aspectos que formam a rea

    como um todo.

    Por causa dessa condio, os conceitos estruturadores de uma rea esto

    presentes de forma transversal, portanto, de maneira explcita e/ou implcita, em

    todas as disciplinas que a compe, embora no mbito de cada disciplina possam

    ser percebidos conceitos mais particulares, que no fazem parte das representaes

    do real presentes em outras disciplinas da mesma rea. Assim, demarcar os

    conceitos estruturadores de uma rea implica identificar quais representaes do

    real so suficientemente amplas para servirem de ferramentas intelectuais que

    podem ser utilizadas/reutilizadas de forma global nos processos de anlise que

    envolvem os objetos centrais das diferentes disciplinas de uma dada rea, mesmo

    que no sejam particulares a nenhuma delas.

    A identificao desses conceitos gerais, no entanto, no significa afirmar que

    determinados conceitos no possam apresentar a dupla condio de serem, ao

    mesmo tempo, conceitos estruturadores gerais de uma rea e tambm assumirem

    formas particulares no mbito do objeto de disciplinas especficas que compem

    essa rea, tornando-se, assim, conceitos estruturadores tambm dessas disciplinas.

    Tal o caso, por exemplo, do conceito de cultura: em termos gerais esse um

    conceito estruturador da rea de Cincias Humanas, mas, tambm, quando

    formulado de forma especfica, identificado como um conceito estruturador tanto

    da disciplina Histria quanto da disciplina Sociologia.

    No sentido inverso, temos conceitos que s podem ser identificados como

    estruturadores de uma dada disciplina. Um exemplo dessa condio o conceito

    de territrio que, embora seja utilizado por emprstimo por diferentes

    disciplinas, um conceito estruturador especfico de uma disciplina em particular,

    qual seja, a Geografia.

    J dissemos antes que o objeto central da rea de Cincias Humanas o

    estudo das aes e das elaboraes intelectuais que os seres humanos constroem

    no mbito das relaes sociais que travam entre si. Tambm afirmamos que

    dessa condio primeira derivam as representaes gerais do real que

    caracterizam a rea de Cincias Humanas, e que, portanto, daro origem a um

    conjunto de conceitos que, por permearem transversalmente todas as disciplinas

    que fazem parte dessa rea, sero definidos como sendo os conceitos

    estruturadores da mesma.

    Observemos, ento, o seguinte: admitir que as aes e elaboraes intelectuais

    humanas so construdas no mbito de relaes sociais variadas, implica reconhecer

    que tais relaes se desenvolvem em escalas de similaridade e/ou igualdade e/ou

    subordinao entre diferentes indivduos, tanto em termos propriamente

    individuais quanto coletivos, e, tambm, que envolvem conflitos de interesses e

    formas de persuaso variadas. Assim, independentemente de tais variaes, uma

  • 26

    situao geral est sempre presente nas relaes sociais: a existncia de dominao,

    que por sua vez implica o exerccio de algum tipo de poder.

    Devemos compreender tambm que qualquer exerccio de poder que efetiva

    alguma forma de dominao no se d de maneira aleatria, e sim como parte de

    um conjunto de valores, atitudes e aes, que, mesmo em estado de conflito e tenso

    individual e/ou coletiva, so de alguma maneira aceitos e/ou praticados por parte

    significativa dos membros de determinada comunidade e/ou sociedade. Esse

    conjunto de valores, atitudes e aes compe o campo da tica dominante em uma

    comunidade e/ou sociedade. Mas a tica dominante no a nica forma de

    representao e justificao dos valores, atitudes e aes praticados por

    determinada comunidade e/ou sociedade, j que as mesmas esto inseridas em

    um universo ainda mais amplo, qual seja, o das representaes e construes da

    cultura entendida aqui como sendo todas as formas de manifestao simblica e

    de comunicao (como a escrita, as artes, e, em termos mais recentes, os meios de

    comunicao de massa, como o rdio, a TV e a internet), bem como os hbitos e

    ritos construdos/reconstrudos por determinada comunidade ou sociedade

    (PCNEM, 1999, p. 301).

    Dessas representaes culturais e ticas derivam diferentes formas de

    aproximao e de aceitao que os seres humanos se utilizam para conseguir se

    situar socialmente frente s relaes sociais amplas e/ou particulares. no mbito

    desse processo que se desenvolvem os sentimentos de ser e de pertencer, traduzidos

    pela identidade social que cada indivduo constri para si. Convm lembrar, no

    entanto, que essa construo da identidade no est submetida apenas s escolhas

    individuais, mas tambm, e talvez sobretudo, s diferentes influncias coletivas

    s quais cada indivduo est submetido. De qualquer modo, essa soma de escolhas

    individuais e influncias coletivas molda indivduos nicos, apesar de serem,

    pertencerem e se identificarem com a cultura e a tica que prevalecem em dada

    comunidade e/ou sociedade. Enfim, so sujeitos sociais semelhantes no plano

    coletivo mas diferentes no plano individual.

    A esses contextos construdos como desdobramentos das relaes sociais que

    os seres humanos contraem entre si, no cotidiano de suas vidas em sociedade,

    soma-se um outro em relao ao qual no podemos deixar de voltar nossas atenes:

    o contexto da sobrevivncia fsica e material.

    Sem pretendermos estabelecer escalas de subordinao, j que as relaes

    sociais no derivam to somente das formas como os seres humanos buscam

    satisfazer suas necessidades de sobrevivncia, devemos, no entanto, perceber

    que todas as sociedades humanas trazem em seu bojo essa necessidade. Dela

    deriva a existncia de atividades que visam supri-la. E tais atividades, por sua

    vez, implicam a realizao de alguma forma de trabalho. No importa se o

    trabalho manual de um tipo mais simples, tal qual a coleta de frutos em estado

    natural, ou o trabalho que envolve a aplicao ampla e/ou particular de

    conhecimentos sofisticados. Essas formas de trabalho vm se juntar a outras,

    nem sempre reconhecidas ou mesmo identificadas como sendo trabalho, como,

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    por exemplo, o trabalho de um artista. Portanto, o trabalho, seja nas atividades

    de satisfao das necessidades de sobrevivncia, seja nas atividades relacionadas

    s diversas construes intelectuais e culturais, outro contexto sempre presente

    nas sociedades de diferentes pocas e lugares.

    Com isso completamos o quadro que nos fornece a parte mais substancial das

    referncias indicativas que, a nosso ver, iro nos auxiliar a definir em termos gerais

    quais contextos reais esto sempre presentes, no importa em qual sociedade.

    Enfim, esse o quadro que estabelece os indicativos bsicos que em determinada

    poca puderam ser agrupados para que se definisse qual o campo de anlise das

    Cincias Humanas de forma geral e, por conseguinte, qual o objeto que caracteriza

    essa rea de conhecimento.

    J dissemos que os conceitos so representaes do real. Por isso, devemos

    observar que a existncia de relaes sociais, dominao, poder, tica, cultura,

    identidade e trabalho, como contextos amplos presentes em toda e qualquer

    sociedade, no implica necessariamente a conceituao dos mesmos desde o

    momento em que esses contextos passaram a existir, no importa se em escalas

    mais simples ou mais complexas.

    A escala conceitual de tais contextos acompanha o prprio desenvolvimento

    do conhecimento humano acerca do meio social e natural. Como representaes

    do real que so, os conceitos foram construdos gradativamente, vindo a ser

    definidos como instrumentos de anlise apenas a partir do advento da demarcao

    do conhecimento humano em reas e disciplinas especficas, fato esse recente na

    histria da humanidade.

    Assim, a existncia de relaes sociais, dominao, poder, tica, cultura,

    identidade e trabalho foi por muito tempo um conjunto de contextos presentes

    em todas as sociedades sem, no entanto, serem representados por meio de

    alguma construo do inte lec to humano. Eram contextos prat icados

    socialmente, embora no existissem representaes intelectuais dos mesmos com

    a finalidade de servir de ferramentas intelectuais para serem aplicadas a

    qualquer tipo de anlise, a fim de compreender de que maneira as sociedades

    se organizam e so construdas/reconstrudas em funo das aes de diferentes

    sujeitos sociais.

    Foi, portanto, com desenvolvimento de conhecimentos e, posteriormente, com

    o agrupamento destes em diferentes campos de saber, entre os quais aquele que

    veio a ser denominado de cincias humanas, que os seres humanos lapidaram e

    deram forma s representaes intelectuais a serem aplicadas nas anlises

    relacionadas aos estudos sobre os meios naturais e sociais reais.

    Assim, identificar o objeto que caracteriza uma rea tambm identificar as

    representaes intelectuais, logo, conceituais, que derivam desse objeto e que se

    fazem presentes, de forma geral, em toda e qualquer disciplina que compe essa

    rea. Mas a mobilizao desses instrumentos de anlise que so os conceitos no

    se faz por meio da simples aplicao mecnica dos mesmos. Complexos esquemas

    de pensamento so mobilizados para aplic-los, em conjunto com conhecimentos

  • 28

    j apreendidos, em variados processos de resoluo de problemas. Esses esquemas

    de pensamento so as competncias que caracterizam uma dada rea de

    conhecimento. E para selecionar/formular de maneira no aleatria quais delas

    assumem uma condio central, em termos de trabalho pedaggico escolar,

    necessrio identificar, como fizemos, o objeto da rea, bem como seus conceitos

    estruturadores.

    No entanto, antes de identificar quais so as articulaes existentes entre os

    conceitos estruturadores da rea de Cincias Humanas e suas Tecnologias e as

    competncias centrais da mesma, da forma como esto expressas nos Parmetros

    Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio/MEC, vejamos, ainda que brevemente,

    qual o significado de cada uma dessas competncias.

    O significado das competncias da reaAs indicaes oferecidas aqui buscam esclarecer o significado das diversas

    competncias que se pretende que o educando venha desenvolver ao longo dos

    processos de ensino e de aprendizagem que envolvem os trabalhos didtico-

    pedaggicos das diferentes disciplinas que compem a rea de Cincias Humanas e

    suas Tecnologias. No item seguinte deste documento buscaremos identificar algumas

    das articulaes existentes entre os conceitos estruturadores, sobre os quais

    discorremos no item anterior, e as competncias gerais da rea de Cincias Humanas

    e suas Tecnologias.

    As competncias sobre as quais iremos nos deter agora esto agrupadas em trs

    campos de competncias gerais: representao e comunicao;

    investigao e compreenso;

    contextualizao sociocultural.

    Vejamos, portanto, quais significados podemos atribuir a cada uma das

    competncias no interior de cada um dos campos citados acima.

    Representao e comunicao

    Esse campo de competncias relaciona-se com as linguagens, entendidas aqui

    como instrumentos de produo de sentido para toda e qualquer formulao do

    intelecto humano, alm de referir-se tambm s diferentes formas de acesso,

    organizao e sistematizao de conhecimentos. (PCNEM, 1999, p.296).

    Entender a importncia das tecnologias contemporneas de comunicao e informao para

    planejamento, gesto, organizao e fortalecimento do trabalho de equipe.

    Essa competncia relaciona-se diretamente com a possibilidade de que os

    educandos venham a ser capazes de processar e comunicar informaes e

    conhecimentos de forma ampla, alm de compreender que no h saber sem

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    aplicao e transposio para situaes inditas.

    Outro aspecto a ser destacado refere-se perspectiva de que os educandos venham

    a ser capazes de desenvolver diferentes habilidades de comunicao (oral, escrita,

    grfica, pictrica etc.). Essa competncia tambm se relaciona de maneira

    fundamental para o desenvolvimento de atitudes e valores que reconheam que o

    conhecimento humano no se constri pelo esforo meramente individual e isolado,

    e sim pela soma, pela ao coletiva. Tal condio um fundamento bsico para que

    o indivduo possa se situar socialmente, bem como valorizar suas produes e a de

    outros, aspectos essenciais para a construo de sua identidade social.

    Investigao e compreenso

    Esse campo de competncias refere-se aos diferentes procedimentos, mtodos,

    conceitos e conhecimentos que so mobilizados e/ou construdos/reconstrudos nos

    variados processos de interveno no real, que so sistematizados a partir da

    resoluo de problemas relacionados s anlises acerca da realidade social. (PCNEM,

    1999, p.296).

    Compreender os elementos cognitivos, afetivos, sociais e culturais que constituem a identidade

    prpria e a dos outros.

    Essa competncia refere-se s possibilidades dos educandos virem a reconhecer

    e aceitar diferenas, mantendo e/ou transformando a prpria identidade, no mbito

    das diferentes relaes sociais e representaes da cultura das quais so participantes

    e construtores, no cotidiano do viver em sociedade geral e particular.

    Compreender a sociedade, sua gnese e transformao, e os mltiplos fatores que nela intervm,

    como produtos da ao humana; a si mesmo como agente social; e os processos sociais como

    orientadores da dinmica dos diferentes grupos de indivduos.

    Essa competncia refere-se possibilidade de que os educandos venham a

    compreender que as sociedades so produtos das aes de diferentes sujeitos sociais

    sendo, portanto, construdas e transformadas em razo da interveno de vrias

    aes e vrios fatores. Nesse sentido, o desenvolvimento e a mobilizao desta

    competncia contribuem para que seja percebida parte das diferentes formas como

    as relaes sociais so construdas/reconstrudas, bem como os processos de

    dominao e de relaes de poder existentes no interior das relaes sociais.

    Entender os princpios das tecnologias associadas ao conhecimento do indivduo, da sociedade

    e da cultura, entre as quais as de planejamento, organizao, gesto, trabalho de equipe, e

    associ-las aos problemas que se propem resolver.

    Essa competncia, que aponta para a necessidade de os educandos virem a

    desenvolver capacidades relacionadas obteno e organizao de informaes

  • 30

    contidas em diferentes fontes e expressas em diferentes linguagens, associando-as

    resoluo de situaes-problema de natureza variada, permeia toda e qualquer

    ao voltada para a anlise e a compreenso dos diferentes contextos nos quais

    so construdas/reconstrudas as relaes sociais, entre os quais, a ttulo de

    exemplo, podemos lembrar: as relaes de dominao, as relaes de poder e os

    valores ticos e culturais presentes nas mesmas.

    Contextualizao sociocultural

    Esse campo de competncias refere-se diversidade e, portanto, constituio

    dos diferentes significados que saberes de ordem variada podem assumir em

    diversos contextos sociais. (PCNEM, 1999, p.296).

    Compreender o desenvolvimento da sociedade como processo de ocupao de espaos fsicos e

    das relaes da vida humana com a paisagem, em seus desdobramentos polticos, culturais,

    econmicos e humanos.

    Essa competncia indica que os educandos podero desenvolver conhe-

    cimentos que lhes permitam perceber e compreender que as aes humanas so

    construdas/reconstrudas em tempos e espaos diversos, que se manifestam no

    mbito das relaes sociais de que so fruto e, ao mesmo tempo, promovem

    desdobramentos variados motivados por fatores diversos, o que significa dizer

    que no so condicionados de forma determinista por algum aspecto em

    particular. Outra questo relacionada a essa competncia diz respeito s mltiplas

    relaes que os seres humanos travam com os meios social e natural, de maneira

    a definir as formas como, entre outras, as construes culturais e as relaes de

    trabalho sero estabelecidas no interior de uma dada comunidade e/ou

    sociedade.

    Compreender a produo e o papel histrico das instituies sociais, polticas e econmicas,

    associando-as s prticas dos diferentes grupos e atores sociais, aos princpios que regulam a

    convivncia em sociedade, aos direitos e deveres da cidadania, justia e distribuio dos

    benefcios econmicos.

    Essa competncia aponta para a compreenso de que as instituies sociais,

    polticas e econmicas so historicamente construdas/reconstrudas por diferentes

    sujeitos sociais, em processos influenciados por fatores variados, que so produto

    de diferentes projetos sociais. Tal compreenso implica perceber/reconhecer que

    as relaes sociais, os valores ticos, as relaes de dominao e de poder, as

    representaes culturais e as formas de trabalho, que contribuem para a construo

    da identidade social de um indivduo, no so imutveis ou ausentes de conflitos

    nem tampouco decorrentes de um nico fator bsico, que supostamente determine

    as formas como diferentes sociedades se organizaram no passado ou se organizam

    no presente.

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    Traduzir os conhecimentos sobre a pessoa, a sociedade, a economia, as prticas sociais e

    culturais em condutas de indagao, anlise, problematizao e protagonismo diante de

    situaes novas, problemas ou questes da vida pessoal, social, poltica, econmica e

    cultural.

    Essa competncia aponta para a necessidade de os educandos virem a reconhecer

    que so agentes e protagonistas da construo/reconstruo dos processos sociais,

    e no meros espectadores passivos dos mesmos. Nesse sentido, preciso que, a partir

    da problematizao de situaes novas baseadas em referncias concretas e diversas,

    rompendo-se, portanto, com posturas imobilistas e/ou deterministas, os educandos

    possam ser de fato agentes da construo de sua autonomia intelectual, que a

    forma mais aperfeioada daquilo que o senso comum denomina de senso crtico.

    Perceber-se como sujeito produtor de cultura e que atua socialmente no mbito de

    relaes sociais conflitantes, portanto, diversas, e em contextos variados, como, por

    exemplo, o do trabalho, um fundamento das Cincias Humanas que no pode ser

    deixado de lado ao longo do percurso escolar dos educandos.

    Entender o impacto das tecnologias associadas s Cincias Humanas sobre sua vida pessoal, os

    processos de produo, o desenvolvimento do conhecimento e a vida social.

    Essa competncia aponta para a possibilidade de que os educandos venham a

    ser capazes de trabalhar com diferentes interpretaes acerca de uma mesma

    situao-problema, relacionando o desenvolvimento dos conhecimentos com os

    sujeitos sociais que os produzem, de forma a saber: quem se apropria dos

    conhecimentos. Mas como se apropriar dos conhecimentos? Quais os impactos sociais

    provocados pelos diferentes conhecimentos produzidos pelos seres humanos? Nesses

    termos, compreender quais relaes de poder e de dominao se estabelecem no

    mbito da produo e da apropriao dos conhecimentos, entre os quais os

    tecnolgicos, tambm uma maneira de perceber quais padres ticos e culturais

    aliceram tais relaes ou servem de justificadores para a constituio de outras,

    como, por exemplo, as relaes de trabalho.

    Aplicar as tecnologias das Cincias Humanas e Sociais na escola, no trabalho e em outros

    contextos relevantes para sua vida.

    Essa competncia aponta para a perspectiva de que os educandos venham a se

    apropriar de diferentes linguagens e instrumentais de anlise e ao, para aplicar

    na sociedade, de forma autnoma e cooperativa, os conhecimentos que construram/

    reconstruram ao longo dos processos de ensino e de aprendizagem. Esse processo

    de transposio tanto implica protagonismo frente s relaes sociais amplas e

    particulares nas quais os educandos esto imersos, quanto se constitui em

    fundamento essencial que contribui para que os mesmos construam/reconstruam

    suas identidades sociais.

  • 32

    Ao longo das consideraes que acabamos de mostrar na seqncia da enunciao

    das competncias indicadas no PCNEM para a rea de Cincias Humanas e suas

    Tecnologias, apresentamos vrios destaques que indicam alguns dos conceitos

    estruturadores da rea que esto explcitos na significao de cada uma dessas

    competncias. Isso nos mostra, preliminarmente, que as competncias e os conceitos

    guardam uma estreita relao entre si, razo pela qual, embora outras competncias

    pudessem ser enunciadas para a rea, privilegiou-se parte daquelas que esto

    relacionadas de forma mais ampla com o quadro conceitual que d forma e define

    de maneira estrutural a rea de Cincias Humanas.

    No entanto, como conceitos e competncias esto articulados entre si, e no

    so, portanto, formulaes aleatrias, vamos agora nos deter um pouco sobre como

    essa articulao ocorre. Tambm veremos, mais adiante, que conceitos e

    competncias so uma das faces de uma moeda que inexiste sem a outra, na qual

    esto os conhecimentos. Assim, no h construo/reconstruo de conhecimentos

    sem a mobilizao/desenvolvimento de competncias e a construo/reconstruo

    de conceitos.

    A articulao dos conceitos estruturadorescom as competncias gerais

    Vimos, anteriormente, que o trabalho interdisciplinar aqui proposto centra-se

    no desenvolvimento de competncias e habilidades, na associao ensino-pesquisa

    como prtica docente permanente e na realizao de atividades escolares

    contextualizadas, que contribuam de forma efetiva para que os educandos

    construam/reconstruam conhecimentos e desenvolvam autonomia intelectual.

    Tambm observamos que os conceitos estruturadores da rea e as competncias

    gerais da mesma guardam estreita relao entre si, particularmente graas ao fato

    de que as competncias indicadas nos PCNEM no so sugestes aleatrias, e sim

    derivadas dos fundamentos bsicos que caracterizam a rea de Cincias Humanas

    representados por seu objeto e por seus conceitos estruturadores.

    Dessa forma, pretender articular conceitos e competncias no mbito das

    atividades escolares uma ao intimamente vinculada aos procedimentos que

    envolvem tais atividades, visto que na interao sujeito/objeto, realizada no

    mbito de atividades diversas, que as competncias e conceitos so mobilizados

    e/ou construdos/reconstrudos, com a finalidade de servirem de ferramentas

    intelectuais que permitam aos educandos construir/reconstruir saberes e

    conhecimentos. Assim, atuar de forma intencional e permanente nesse sentido

    tambm reconhecer que conceitos e competncias so parte fundamental dos

    processos de construo/reconstruo de conhecimentos por parte dos educandos.

    No item anterior deste documento, destacamos que diferentes conceitos

    estruturadores da rea de Cincias Humanas e suas Tecnologias so explicitados

    na significao das diversas competncias da mesma. Sinteticamente, essas

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    explicitaes de conceitos estruturadores frente significao das competncias

    podem ser retomadas a partir do quadro:

    Processar e comunicar de forma ampla informaes econhecimentos, entendendo que no h saber semaplicao, transposio e comunicao, valorizando etrabalhando com as diferentes habilidades decomunicao (oral, escrita, grfica e pictrica).

    Valorizar as produes coletivas, compreendendo que oconhecimento no se constri pelo esforo meramenteindividual e isolado.

    Reconhecer e aceitar diferenas, mantendo e/outransformando a prpria identidade, percebendo-secomo sujeito social construtor da histria.

    Compreender que as sociedades so produtos dasaes de diferentes sujeitos sociais, sendoconstrudas e transformadas em razo da intervenode diferentes fatores.

    Obter informaes contidas em diferentes fontes eexpressas em diferentes linguagens, associando-ass solues possveis para situaes-problemadiversas.

    Compreender que as aes dos sujeitos sociais sorealizadas no tempo e no espao, criando relaes edesdobramentos variados, sem determinismos.

    Compreender que as instituies sociais, polticas eeconmicas so historicamente construdas/reconstrudas por diferentes sujeitos sociais, emprocessos influenciados por fatores variados e a partirde diferentes projetos sociais.

    Construir a autonomia intelectual (senso crtico) apartir da problematizao de situaes baseadas emreferncias concretas e diversas, rompendo comverdades absolutas ou deterministas.

    Ser capaz de trabalhar com diferentes interpretaes,relacionando o desenvolvimento dos conhecimentoscom os sujeitos sociais que os produzem, de modo quese saiba quem se apropria dos conhecimentos, comoos sujeitos sociais se apropriam dos conhecimentos equais os impactos sociais provocados pelos diferentesconhecimentos produzidos pelos seres humanos.

    Apropriar-se de diferentes linguagens e instrumentaisde anlise e ao para aplicar na vida social osconhecimentos que construiu de forma autnoma ecooperativa (isso significa conceber as CinciasHumanas enquanto conhecimento e prtica social).

    Identidade

    Significao das competncias

    rea de Cincias Humanas e suas TecnologiasConceitos estruturadores

    explicitados

    Relaes sociaisIdentidade

    DominaoPoderticaCulturaTrabalho

    Relaes sociaisCulturaTrabalho

    Relaes sociaisDominaoPoderticaCulturaIdentidadeTrabalho

    Relaes sociaisCulturaTrabalho

    Relaes sociaisDominaoPoderticaCultura

    Relaes sociaisDominaoPoder

    Relaes sociaisCulturaIdentidade

  • 34

    Os procedimentos didticos que envolvem os processos de ensino e de aprendizagem,

    que facilitaro a construo do encontro entre conceitos e competncias, esto

    intimamente relacionados com aspectos metodolgicos que indicam os perfis de

    atividades escolares que permitiro que tal encontro seja efetivado.

    Para tanto, preciso relembrar o que foi dito em item anterior deste documento,

    no momento em que discorremos sobre a natureza de uma prtica pedaggica

    efetivamente interdisciplinar, quando nos referimos necessidade de que as aulas

    ditas discursivas ou expositivas deixem de assumir o papel central que ainda

    ocupam nas atuais prticas docentes. A manuteno dessas prticas deve ser em carter

    de coadjuvante em relao a outras prticas, nas quais a atuao do docente se d em

    funo da mediao dos processos de construo/reconstruo de conhecimentos por

    parte dos educandos. Essa transformao de prticas docentes implicar a construo

    de um novo papel para o educador, j que ele no mais atuar como mero retransmissor

    de conhecimentos ditados pela tradio escolar.

    Essa condio um pressuposto fundamental para que o espao de trabalho escolar

    venha a ser ocupado pela ao efetiva dos educandos, no mbito de atividades

    centradas na resoluo de problemas. Nesses termos, a prpria maneira como as

    atividades so formuladas para os alunos deve passar por mudanas qualitativas. No

    lugar de questes fechadas, para as quais o docente espera que os educandos

    apresentem uma determinada resposta, tida supostamente como correta e, portanto,

    a nica possvel para a questo apresentada, deve-se buscar a efetivao de formulaes

    nas quais o prprio enunciado da questo seja um convite reflexo, instigando-se,

    assim, a capacidade criadora e a curiosidade dos educandos.

    Outro aspecto a ser perseguido permanentemente refere-se ao fato de que as

    atividades propostas no devem visar to somente reproduzir, na forma de

    interrogativas, as afirmaes contidas na fala do professor, no livro texto ou em uma

    outra fonte qualquer. Tambm necessrio que as atividades sejam formuladas de

    maneira a tornar significativas e, portanto contextualizadas, as situaes-problema a

    serem apresentadas para os educandos, de maneira que tambm os conhecimentos a

    serem construdos/reconstrudos por esses educandos ganhem significado e sejam

    contextualizados em seus espaos de vivncias sociais amplas e particulares.

    Atividades com esses perfis, diferentemente do caso anterior das questes fechadas,

    que nada mais so do que exerccios fundamentados em uma perspectiva meramente

    memorstica, permitem que os educandos venham a buscar diferentes formas de

    resoluo e tambm de soluo para uma mesma situao-problema. Nesse processo,

    os educandos viro a mobilizar instrumentos de anlise, conceitos, e diferentes esquemas

    de pensamento, competncias, para, juntamente com conhecimentos que j possuam e

    das informaes que estejam expressas nas fontes disponveis para que a atividade

    proposta possa ser realizada, chegarem a uma concluso plausvel entre as muitas

    possveis que so sugeridas por uma dada situao-problema.

    No entanto, como a ao do docente, ao propor uma atividade para os educandos,

    deve ser intencional e planejada, em se dar, portanto, ao sabor do improviso, no se

    deve imaginar que os educandos iro formular ou construir por si mesmos, com base

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    na mera especulao, os conceitos necessrios para servir de instrumental de anlise.

    Esses conceitos, mesmo quando no nomeados de forma explcita, devem estar

    presentes nas fontes que o docente apresenta para seus alunos utilizarem como base

    de pesquisa para realizar um dada atividade. Vale lembrar que essas fontes devem

    ser diversificadas, comportando diferentes interpretaes acerca da situao-problema

    em estudo, ao mesmo tempo em que devem ser expressas em diferentes linguagens

    (escrita, grfica, pictrica etc.). Essa condio, na qual toda e qualquer atividade

    realizada mediante a obteno e o processamento de informaes contidas em fontes

    diversas, deve ser uma prtica permanente, e no episdica em sala de aula, uma vez

    que ela que nos permite explicitar a expresso mais completa daquilo que

    denominamos associao ensino-pesquisa.

    Nos termos at aqui colocados, podemos perceber que antecipar pr-definies de

    conceitos para os educandos um obstculo de ordem semelhante quele j comentado

    em relao s questes fechadas, visto que em tais situaes os educandos apenas

    memorizam uma definio que invariavelmente se perder to logo a aplicao

    imediata em um exerccio seja efetivada. Nesse momento, portanto, necessrio que

    retomemos a relao entre conceitos estruturadores e competncias.

    Ao observarmos o quadro-sntese apresentado anteriormente, podemos perceber

    que, por exemplo, os conceitos de relaes sociais, dominao, poder, tica, cultura,

    identidade e trabalho sempre esto vinculados s situaes-problema que envolvem

    a mobilizao de competncias relacionadas com a compreenso de que as instituies

    sociais so historicamente construdas/reconstrudas por diferentes sujeitos sociais.

    claro que esses conceitos no se vinculam apenas s situaes-problema relacionadas

    competncia citada, o que perceptvel por si mesmo pela observao do quadro-

    sntese ao qual nos referimos. No entanto, o que nos importa aqui perceber que se os

    conceitos e as competncias citadas permeiam todas as disciplinas que compem a rea

    de Cincias Humanas e suas Tecnologias, as atividades escolares desenvolvidas no

    mbito dessas disciplinas devero, em diferentes momentos, e no apenas em um ou

    outro caso isolado, estar centradas em situaes-problema que permitam aos educandos

    perceberem que, conforme afirmamos anteriormente, as relaes sociais, os valores ticos,

    as relaes de dominao e de poder, as representaes culturais e as formas de trabalho,

    que contribuem para a construo da identidade social de um indivduo, no so

    imutveis ou ausentes de conflitos nem tampouco decorrentes de um nico fator bsico,

    que supostamente determine ao modo como diferentes sociedades se organizaram no

    passado ou se organizam no presente.

    Para tanto, os educandos devero ser confrontados com fontes de natureza diversa,

    tanto em termos de linguagem quanto de interpretao, para que de fato mobilizem

    diferentes esquemas de raciocnio que lhes permitam compreender, por exemplo, como

    ocorrem as relaes sociais no interior de determinada comunidade e/ou sociedade.

    Nesse tipo de processo, mediado e articulado intencionalmente pelo docente, o conceito

    de relaes sociais no ser construdo pela memorizao de uma definio qualquer,

    e sim a partir da compreenso dos aspectos gerais da vida em sociedade, que permeiam

    a existncia de todos os seres humanos.

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    Atividades escolares que envolvem essa gama de situaes apresentam a

    peculiaridade de serem desenvolvidas ao longo de diversas aulas. Tal condio, associada

    quela sobre a qual j nos reportamos em item anterior deste documento, qual seja, a de

    que os educadores necessitam perceber claramente as diferenas entre os conhecimentos

    acadmicos e os conhecimentos escolares, ir nos impor uma nova questo.

    As condies concretas citadas acima nos levam a perceber que se faz necessrio

    reorganizar os contedos curriculares, particularmente os contedos curriculares