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PIBID, FORMAÇÃO E SABERES DOCENTES
Giseli Barreto da Cruz
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Resumo
O painel articula três pesquisas sobre formação de professores adotando como contexto
investigativo o PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência –
financiado pela CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior. A proposta consiste em discutir resultados de pesquisas sobre formação e
saberes docentes através das contribuições do PIBID na perspectiva da parceria
Universidade-Escola Básica. O primeiro trabalho, ancorado na pesquisa nos/dos/com os
cotidianos focaliza os saberesfazeres dos sujeitos praticantes de uma sala de aula de
alfabetização – estudantes de Pedagogia de uma Universidade Pública Federal. O estudo
pretendeu caçar pistas, rastros, indícios de que a travessia de formação docente se dá em
múltiplos contextos, em diferentes redes, em diversos espaçostempos. O segundo
trabalho apresenta alguns dos resultados de uma pesquisa com foco nos diferenciais da
parceria universidade-escola básica para a formação inicial de pedagogos docentes no
contexto do PIBID Pedagogia de uma Universidade Pública Federal. Seu foco
investigativo são as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas
parceiras no processo de formação de futuros professores. O terceiro trabalho, voltado
para os egressos, analisa os saberes docentes mobilizados pelos investigados no seu
cotidiano escolar, compreendendo quais estratégias de ensino-aprendizagem se baseiam
para ensinar e relacionando-as com suas concepções de ensino. Com essa estrutura, o
painel articula a iniciação à docência no tempo da formação inicial e no espaço/tempo
da Universidade e da Escola; e a iniciação à docência no tempo da inserção profissional
e no espaço/tempo da escola de atuação. Articula ainda a dinâmica de trabalho dos
sujeitos protagonistas do projeto: o licenciando, o professor supervisor e o egresso. Os
resultados indicam a potência do PIBID na formação e no trabalho de professores.
Palavras-chave: PIBID – Formação de professores – Saberes Docentes
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
3411ISSN 2177-336X
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UNIVERSIDADE X ESCOLA-BÁSICA: NARRATIVAS COMPARTILHADAS
NOS/DOS/COM OS COTIDIANOS ESCOLARES
Viviane Lontra Teixeira
Colégio de Aplicação da UFRJ
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO
Resumo:
O presente trabalho apresenta investigações de uma pesquisa no Mestrado em Educação
de uma universidade pública federal acerca dos saberesfazeres dos professores em
formação do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid) da
Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) formado por
estudantes da licenciatura em pedagogia, professores da escola básica e da universidade
pública. Norteado por algumas questões: como nos tornamos professores; qual o papel
do estudante da escola básica na formação do futuro profissional docente; qual o lugar
da Universidade e da escola básica na formação do futuro profissional da educação, a
pesquisa pretendeu, através de uma investigação indiciária (GINZBURG, 1989) seguir
as pistas, rastros, indícios de que a travessia de formação docente se dá em múltiplos
contextos, em diferentes redes, em diversos espaçostempos que nos formam,
desformam, nos constituem professores. Traz algumas narrativas e relatos
coletivossingulares, potencializados nas discussões na universidade e nas salas de aula,
propondo uma formação de professores na/da/com a prática, tecendo reflexões que nos
possibilitam (re)pensar a formação docente para além das lógicas dominantes
cientificistas e colonialistas. Longe da ideia de que há um momento em que a formação
se cristaliza, as narrativas e relatos dos encontros de formação sugerem que aprendemos
a ser professores no ineditismo, nas redes que tecemos nos cotidianos das escolas e salas
de aula, na não-linearidade, na surpresa, na incerteza, na circulação entre diferentes
saberes e nãosaberes. Discute o movimento práticateoriaprática, apontado por Alves
(2001) propondo a possibilidade de pensar a formação numa perspectiva de
horizontalização de saberes, onde todos aprendem e ensinam.
Palavras-chave: Formação de professores - Narrativas - Estudos do cotidiano
XVIII ENDIPE
Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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UNIVERSIDADE X ESCOLA-BÁSICA: NARRATIVAS COMPARTILHADAS
NOS/DOS/COM OS COTIDIANOS ESCOLARES
Viviane Lontra Teixeira
Colégio de Aplicação da UFRJ
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO
Introdução
O presente trabalho apresenta investigações realizadas durante o Mestrado em
Educação acerca dos saberesfazeres dos sujeitos praticantes (CERTEAU, 2013) de uma
sala de aula de alfabetização e do Pibid (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência) da Capes (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior)
formada por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental, estudantes da Pedagogia,
professores da escola básica e da universidade pública.
O sujeito praticante de Certeau (2013, p.55) é o homem ordinário, herói comum,
personagem disseminada, caminhante inumerável que bricola, cria, desvia, inventa
maneiras de fazer, dada a impossibilidade do consumo supostamente passivo dos
produtos culturais oferecidos. Dessa forma, a opção por chamar os envolvidos nesse
estudo de praticantes se dá por entender que os processos de formação se desenham na
trajetória e pela ação do sujeito em múltiplos contextos com os quais se tecem
experiências e sentidos para se fazer professor.
O texto desdobra-se em três partes sucintas. Na primeira, traz a perspectiva
teoricoepistemológica que se fundamenta, na segunda discute as experiências de
formação que acontecem a partir das vivências, das lembranças, das escritas, relatos de
encontros que nos ensinam, nos constituem professorxs. Por fim, à guisa de conclusão,
traz alguns resultados das investigações.
Atravessado por algumas questões: como nos tornamos professorxs? Qual o
papel dx estudante da escola básica na formação docente? Qual o lugar da Universidade
e da escola básica na formação dx profissional de educação? O estudo pretendeu,
através de uma investigação indiciária (GINZBURG, 1989), caçar pistas, rastros,
indícios de que a travessia de formação docente se dá em múltiplos contextos, em
diferentes redes, em diversos espaçostemposi que nos formam, desformam, nos
constituem professorxs.
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A escolha pela grafia com X possibilita pensar a diversidade de gêneros
ressaltada ao longo desse texto. É uma opção epistemológica que faz referência aos
estudos queer que privilegiam estratégias desconstrutivas das normas, das lógicas e dos
arranjos sociais vigentes (LOURO, 2012, p. 367) entendendo que o universo de
construção das identidades é amplo e não cabe nos esquemas binários que estamos
acostumados a classificar gênero e sexo.
São os seguintes fatores e circunstâncias que mais contribuíram para essa
pesquisa: em primeiro lugar, implicou um mergulho nos/dos/com os cotidianos
(ALVES, 2003) de salas de aula do 1º ano do Ensino Fundamental e reuniões semanais
com professorxs em formação no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência, em segundo lugar, debruçou-se no estudo de narrativas e relatos
coletivossingulares que eram potencializados nas discussões na universidade e nas salas
de aula, desinvisibilizando, na formação docente, “o que acontece” (PAIS, 2003, p. 28,
29) cotidianamente e de forma permanente indo além dos documentos curriculares. Em
terceiro lugar, a pesquisa implicou trocas de experiências numa relação apoiada no
movimento práticateoriaprática (ALVES, 2001, p. 15) em que percebemos homens
comuns (CERTEAU, 1994) criando conhecimentos em situações de formação que
valorizam o dissenso, a copresença e as práticas orientadas para justiça cognitiva
(SANTOS, 2010, p. 40).
Os aspectos acima descritos levaram à compreensão de que a formação pode ser
tecida cotidianamente no entrelugar universidade-escola onde partilhamos fragilidades,
dúvidas e cogitações, aprendendoensinando uns com outros.
Caminhos da pesquisa
Porque são os passos que fazem os caminhos!
Mario Quintana
Nesse caminho de pesquisa procuramos seguir os passos de Alves, Certeau,
Ferraço, Oliveira, Santos e Süssekind, pequenos aliados, que auxiliam pensar a
formação de professorxs na perspectiva dos estudos nos/dos/com os cotidianos
escolares, tendo este caminho de pesquisa uma possibilidade de pensar a formação
docente no cotidiano e com o cotidiano de salas de aula, erguendo o que vivenciamos
nas escolas à condição de espaçostempos privilegiados de produção dos conhecimentos,
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crenças e valores que dão sentido e direção à relação práticateoriaprática (ALVES,
2008).
Essas pesquisas têm o compromisso político e epistemológico de buscar um
modo de convivência pesquisador-universo pesquisado em que haja respeito mútuo,
desenvolvendo relações horizontais com professorxs das escolas pesquisadas,
“institucionalizando, nessa relação, a ideia da validade dos diversos saberes e do
necessário diálogo entre eles, para além da hierarquia atuante nos modos dominantes de
fazer pesquisa.” (OLIVEIRA, 2005, p.100-101)
Inserida no contexto dessas pesquisas e trabalhando como professora da escola
básica, com professorxs em formação e crianças na alfabetização, a pesquisadora
buscou ouvir as camadas de vozes (AOKI apud SÜSSEKIND, 2012, p.6) que se
entrecruzavam, se entrelaçavam nas salas de aula, nos encontros de formação e nas
reuniões pedagógicas utilizando relatos e narrativas orais e escritas dos professorxs em
formação em diferentes espaçostempos, propondo uma formação de professoxs
na/da/com a prática.
Reis (2014) ajuda a pensar que toda formação é autoformação, não existindo
momento fixo que nos torna “preparados” para a docência, porque ela se tece nas
interações, no arquipélago de subjetividades (SANTOS, 1996) que somos e que nos
vemos envolvidos desde que nascemos, por isso, optamos pelo termo professorxs em
formação que utilizamos ora para designar os licenciandxs da graduação, ora para
designar os profissionais da educação que já possuem diploma, porque, com Pérez
(2004, p.80 e 81) compreendemos que:
cada um de nós é uma rede de subjetividades, tecida nas múltiplas e
diferentes relações que estabelecemos nos múltiplos contextos
cotidianos em que vivemos. Formamo-nos e somos formados nestas e
por estas redes e nas relações múltiplas e complexas que existem entre
elas.
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência como entrelugar de formação
De acordo com os documentos oficiais, o Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência – Pibidii, voltado para professorxs em formação das diversas
licenciaturas, foi criado para:
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melhorar o ensino nas escolas públicas em que o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) esteja abaixo da média
nacional, de 4,4. [...] O IDEB também é importante por ser condutor
de política pública em prol da qualidade da educação. É a ferramenta
para acompanhamento das metas de qualidade do PDE para a
educação básica. O Plano de Desenvolvimento da Educação
estabelece, como meta, que em 2022 o IDEB do Brasil seja 6,0 –
média que corresponde a um sistema educacional de qualidade
comparável a dos países desenvolvidos.iii
Apesar da proposta se apresentar com o entendimento subjacente de
conhecimento como um objeto impessoal e descontextualizado que busca a
padronização com resultados verificáveis por meio de testes, percebemos que o
diferencial dessa política está em como cada projeto vai encarar o diálogo escola básica
x universidade. Da mesma forma que a Universidade, através dxs licenciandxs, precisa
entrar na escola para “melhorar o ensino”, é no cotidiano das escolas que xs
licenciandxs aprendem o exercício da docência, numa proposta que possibilita a
horizontalização de saberes.
De acordo com o Presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior – Capes, Jorge Almeida Guimarães:
o Pibid não é simplesmente um programa de bolsas. É uma proposta
de incentivo e valorização do magistério e de aprimoramento do
processo de formação de docentes para a educação básica. Os alunos
de licenciatura exercem atividades pedagógicas em escolas públicas
de educação básica, contribuindo para a integração entre teoria e
prática, para a aproximação entre universidades e escolas e para a
melhoria de qualidade da educação brasileira. Para assegurar os
resultados educacionais, os bolsistas são orientados por
coordenadores de área – docentes das licenciaturas – e por
supervisores – docentes das escolas públicas onde exercem suas
atividades.iv (grifo meu)
A ideia de que resultados educacionais podem ser assegurados traz a concepção
de “controle” do processo de ensino-aprendizagem e soa como se a universidade tivesse
posse do “saber” necessário à escola básica. Endossando o que vem sendo discutido a
respeito da (im)possibilidade das políticas serem aplicadas tal como foram pensadas
(SÜSSEKIND; LONTRA; PELLEGRINI, 2015), o que vivenciávamos no programa era
uma formação com infinitas possibilidades de troca entre diversos
aprendentesensinantes, superando a dicotomização e a hierarquia entre os diferentes
saberesfazeres por meio da discussão em torno dos processos de aprendizagemensino
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(OLIVEIRA, 2013) e da valorização do saber da práticateoriaprática (ALVES, 2008)
compartilhado na escola (diariamente) e na universidade (semanalmente).
Recorremos a Oliveira (2012, p.8 e 9) para ressaltar a compreensão de prática e
teoria como “instâncias complementares e indissociáveis do fazerpensar dos sujeitos
das escolas e que se interpenetram permanentemente, não devendo ser percebidas como
elementos dissociáveis de uma realidade ou reflexão qualquer”, por isso,
práticateoriaprática.
A pesquisadora, professora supervisora do PIBID, compartilhava diariamente a
sala de aula do 1º ano do Ensino Fundamental de uma escola básica pública com sete
licenciandxs de uma universidade federal. Semanalmente todos os praticantepensantes
(OLIVEIRA, 2012) do projeto, em suas multiplicidades, se encontravam na
universidade para trocar experiências, negociar sentidos, partilhar informações e
saberes, (re)pensando, (re)formando e ressignificando ações, práticas e olhares sobre o
cotidiano escolar. Muitos relatos foram produzidos nesses encontros e a pesquisa traz a
discussão dessas trocas que foram tecendo um bordado composto de diversos fios: o fio
da criança, da prática, da dúvida, das leituras, das (des)orientações, das
(des)construções, os fios... vividoscompartilhados antes/durante a pesquisa que, no
exercício de (re)pensar, de captar sentidos e de pesquisar a nossa prática, nos oferece
indícios (GINZBURG, 1989) do quanto fomos nos desvelando para aprender com.
Deslocando a visão de professorxs “transmissorxs” de conhecimentos já elaborados para
a de “professorxs-autorxs” das próprias práticas, abrimo-nos para a possibilidade de
criar, de inventar, de construir novas formas de aprenderensinar.
Longe da ideia de que há um momento em que a formação se cristaliza, as
narrativas e relatos, potencializados a partir dos encontros com as crianças, sugerem que
aprendemos a ser professor no cotidiano das salas de aula, no ineditismo, no
acontecimento (GERALDI, 2010), na surpresa, na incerteza, nas situações reais onde é
preciso usar mais do que aprendemos na formação docente, na circulação entre
diferentes saberes e nãosaberes, no entendimento de que em todo conhecimento há uma
ignorância e de que em toda ignorância há um conhecimento (SANTOS, 2011), na
(des)formação, possibilitada através da (re)invenção, (re)descoberta de práticas, de nós
mesmos e dos “outros”, não como um “outro eu”, e sim o outro enquanto tal, o outro
que está, inclusive, no eu (GALLO, 2010, p.239). Uma formação em que ora somos
aprendentesensinantes, ora somos ensinantesaprendentes, onde é preciso usar “fatores
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que não podem ser mensurados – um cheiro, um olhar, uma intuição” (GINZBURG,
1989), bricolagens, astúcias, táticas, diferentes modos de fazer (CERTEAU, 2013).
Sobre a autoria desse estudo, Ferraço (2003, p.168) ajuda a compreender a
importância de dialogar não só com autores reconhecidos academicamente, como
também com os sujeitos cotidianos que “vivem, convivem, inventam, usam, praticam,
habitam, ocupam nesses cotidianos [...]. Trata-se de entender que também aqueles que
vivem, de fato, esses cotidianos são os legítimos autores/autoras dos discursos “com”
os cotidianos”.
Dessa forma, as narrativas além de darem visibilidade aos autores do cotidiano
da escola básica e da universidade, também os afirmam como protagonistas desse
estudo, fazendo “valer as dimensões de autoria, autonomia, legitimidade, beleza e
pluralidade de estéticas dos discursos dos sujeitos cotidianos” (Ibid, grifo do autor). Os
afirmam como heróis comuns (CERTEAU, 2013) e anônimos, no anonimato.
Relatos de (des)formação: construindo novas formas de aprenderensinar
Nas salas de aula, com as crianças do 1º ano do EF, fazíamos junto, aprendíamos
na relação que acontece no/do/com o cotidiano da turma. Na mesma perspectiva, nos
encontros sem as crianças, planejávamos, conversávamos, trocávamos impressões
percebendo que estamos “sempre contínua e permanentemente em estado de mudança”
(PÉREZ, 2002). Bricoladas no cotidiano de aulas e reuniões, as narrativas e relatos
selecionados abaixo apresentam algumas trocas, aprendizagens, conhecimentos
partilhados diariamente na escola e, semanalmente, nas reuniões.
Estou gostando muito de observar uma turma de alfabetização, tudo
que tenho percebido tem sido muito novo para mim. O ambiente é
bom. Alguns alunos são mais agitados, mas isso não impede a
professora de realizar seu trabalho. Hoje foi um dia marcante porque
foi minha primeira experiência, acredito que é o começo de uma longa
caminhada. Me chamou atenção quando estava escrevendo meu
relatório e L., uma aluna de 6 anos, pediu para ler o que eu tanto
escrevia. Não soube o que fazer. Fechei o caderno e vi que precisava
interagir. (Narrativa de A., 2015)v
Hoje me aproximei um pouco mais das crianças. Vi que elas são
muito carinhosas e receptivas. Precisei ficar com a turma 10 minutos
após o recreio porque a professora precisou resolver um problema e
fiquei muito nervosa, não tinha planejado nada, não tinha nada em
mente, não tinha ainda o domínio da turma. Deu pânico! Nem sei
como, mas aconteceu de todo mundo ficar junto e a gente começou a
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conversar sobre o recreio, sobre a greve dos funcionários da limpeza e
nem percebi quando a professora chegou. Ela não interferiu. Eu parei
de falar, disse que a professora tinha chegado, mas ela disse que
estava ótimo, que devia continuar, que as crianças estavam
envolvidas, aí a gente aproveitou e produziu um texto de apoio aos
funcionários. Quero mais dias assim! (Narrativa de B., 2015)
Hoje foi um dia diferente, as crianças estavam fazendo um relato
escrito sobre o passeio ao Parque Lage. Percebi que algumas estavam
escrevendo errado, mas venho percebendo que a professora não
corrige os erros de todas as crianças. Às vezes ela conversa com um
ou com outro. Eu não sabia como devia agir, para mim elas só deviam
escrever quando soubessem para não ficarem errando tanto. A
professora percebeu minha angústia, conversou comigo e disse que o
mais importante era o que a criança estava escrevendo e não como ela
escrevia e então percebi que tenho que parar de olhar de cima.
(Narrativa de C., 2015)
Refletindo sobre os encontros com as crianças, xs professorxs em formação
revelam momentos de aprendizagem que precisam dos sentidos, das intuições, dos
improvisos, do olhar cuidadoso. Desinvibilizam situações que revelam que no/com o
cotidiano das salas de aula se dá a relação com o outro, consigo mesmo, com o saber,
com o nãosaber por isso ele se constitui como espaçotempo de descobertas, de
aprendizagem, de formação significativa do ser professor.
Em sua narrativa, A. descreve o quanto aprendeu com a curiosidade da
pequenina aluna de 6 anos: “vi que precisava interagir” sugere que refletiu a respeito de
sua postura em sala de aula.
O pânico inicial de B. parece ter sido dissipado ao se abrir para aprenderensinar
com as crianças. O “não tinha planejado nada” me faz refletir na crença de que um
professor deve ter sempre tudo planejado e de que o “domínio” dos procedimentos,
objetivos e conteúdos de ensino poderia garantir o controle do que acontece nas salas de
aula. Por outro lado, seu relato vai desvelando o quanto a abertura para o acontecimento
possibilitou novas possibilidades de ensinaraprender e aprenderensinar. A narrativa de
C. parece trazer marcas de um modelo de linearidade e hierarquização do ensinar e
aprender: “para mim elas só deviam escrever quando soubessem para não ficarem
errando tanto” e, como a retirada de uma venda que só faz olhar por cima, ao longo de
sua narrativa, C. percebe que pode olhar de frente para, também, aprender. Podemos
perceber que as narrativas revelam a importância das trocas, da parceria do/com o
professor que está em sala de aula há mais tempo, mas que também aprendeensina.
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Com Süssekind (2014, p.12) é possível compreender os relatos como vestígios
de momentos de aprendizagem que acontecem no/com o cotidiano e “se constituem
como arte de fazerpensarfazer”. Cada narrativa pode trazer um conjunto de referências
que nos permitem estabelecer diálogos teóricos, políticos e educacionais porque são
artes de formação, de pensarfazer de forma única e reflexiva porque “quando alguém
nos faz um relato, ambos passamos por uma experiência única de conhecimento,
pensamos e transformamos a nós mesmos e o mundo” (SÜSSEKIND, 2012, p.17).
Utilizá-las como uma prática curricular emancipatória é um caminho para a luta pela
justiça cognitiva, para apagar as linhas abissais (SANTOS, 2010) traçadas nas salas de
aula, tanto no sentido literal como no metafórico.
Considerações finais
A escrita não é um veículo para se chegar a uma essência, a uma
verdade. A escrita é a viagem interminável. A escrita é a descoberta de
outras dimensões, o desvendar de mistérios que estão para além das
aparências. (COUTO, 2009, p. 104)
O estudo pretendeu trazer escritas que parte e se tecemvi
nos/dos/com os
cotidianos das aulas. Seus usos nos possibilitam refletir acerca dos saberesfazeres dxs
professorxs em formação, tecendo práticas que são (com)partilhadas, (re)pensadas,
(re)inventadas. No exercício de narrar-se, de inscrever-se no escrito, deixamos
registradas as vivências, as experiências coletivassingulares. Na dimensão de ator e
autor de nossas próprias narrativas, aprendemos sobre nós e sobre o outro. Como a mão
do oleiro na argila do vaso (BENJAMIN, 1994, p.205), imprimimos a nossa marca nos
inscrevendo no escrito.
Escrevendo livremente, lendo/relendo narrativas e relatos, nos tornamos co-
autores/co-enunciadores dos textos uns dos outros, numa relação que não vê hierarquia,
mas se constitui horizontalmente com aprendentesensinantes e ensinantesaprendentes,
todos entendidxs/respeitadxs como protagonizantes da pesquisa, cada um como uma
“rede de sujeitos gerada pelo enredamento das diferentes formas de inserção social.”
(OLIVEIRA, 2008, p.13)
Mergulhando com todos os sentidos (ALVES, 2008) nos/dos/com os cotidianos
escolares o estudo possibilita pensar o Pibid como espaçotempo de multiplicidade de
práticas, de táticas, ensinando-nos a aceitar, como dignas de interesse, de análise e
registro, as práticas comuns (CERTEAU, 2013), tidas como insignificantes, e que são
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potencializadas através dos relatos e das narrativas que contribuem para a superação da
cegueira epistemológica (OLIVEIRA e SGARBI, 2007, p.19) desinvisibilizando
práticas emancipatórias presentes quando entramos nas escolas.
A respeito da cegueira epistemológica, aprendemos, com Oliveira e Sgarbi
(2007), que é culturalmente desenvolvida pelos sujeitos sociais em virtude dos
processos de socialização e dos saberes que nesses processos se tecem:
Esta cegueira pode ser superada – desaprendida – a partir de processos
cotidianos de desestabilização do já-sabido, que dariam origem tanto a
novas possibilidades quanto a impossibilidades, derivadas de novas e
diferentes cegueiras ou, ainda, de um impedimento à repetição. Ou
seja, a partir do questionamento e da desnaturalização dos valores e
saberes socialmente tecidos. (p.19)
Entendendo que faz-se necessário (re)pensar o conhecimento para além das
lógicas dominantes cientificistas e colonialistas, propomos a possibilidade de pensar
alunos e professores numa perspectiva de horizontalização de saberes, onde todos
aprendem e ensinam. Ao produzirem suas narrativas, professorxs em formação trazem
(suas) formas de enxergar o mundo e, ao compartilhar as impressões, tecem novas
possibilidades de currículo, possibilidades de emancipação, indo na contramão da
concepção hegemônica de educação, de formação e de currículo.
Os encontros semanais do PIBID promovem estratégias e abrem um campo de
possibilidades táticas de formação onde percebemos que, de certo modo, as hierarquias
e papéis preestabelecidos na relação escola-universidade se dissolvem, num entrelugar
pautado por práticas horizontais, ecológicas (SANTOS, 2010), e aprendem/ensinam
numa perspectiva de copresença de saberes (ibidem). As narrativas, produzidas como
forma de valorização das subjetividades e conhecimentos tecidos em rede, constituem-
se como instrumento para (re)pensar o currículo para além das normas formuladas pelas
autoridades educacionais, em tentativas cotidianas de reinventar a escola.
Reinventar a escola e horizontalizar as relações tem sido o caminho que
encontramos para enxergar que, além das cegueiras, há outras possibilidades.
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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
3423ISSN 2177-336X
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ATUAÇÃO DE PROFESSORES DA ESCOLA BÁSICA NA FORMAÇÃO DE
PEDAGOGOS DOCENTES: APRENDIZAGEM SOBRE A DOCÊNCIA NO
CONTEXTO DO PIBID
Talita da Silva Campelo
Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias/RJ
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Resumo
O presente trabalho apresenta alguns dos resultados de uma pesquisa com foco nos
diferenciais da parceria universidade - escola básica para a formação inicial de
pedagogos docentes no contexto do PIBID Pedagogia de uma universidade federal do
Rio de Janeiro. Cuida de analisar as ações desenvolvidas nesse projeto, adotando como
foco investigativo as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas
parceiras. Para conduzir o estudo foi formulada a seguinte questão: quais as
contribuições do papel desenvolvido pelas professoras supervisoras do PIBID
Pedagogia investigado para a formação inicial do pedagogo docente na perspectiva da
parceria universidade - escola básica? Para tanto, foram propostos os seguintes
objetivos: analisar o trabalho desenvolvido pelas professoras supervisoras com os
licenciandos participantes do programa e compreender como se constituem as
intervenções das professoras supervisoras investigadas no processo de formação
docente desses licenciandos. Metodologicamente, foi desenvolvido um estudo de caso a
partir das contribuições de André (2005 e 2013) e Yin (2010). Optamos por além de
observações, realizar entrevistas e análise documental tanto de documentos oficiais
quanto daqueles produzidos pelos sujeitos no contexto do programa. Vários autores
contribuíram para o embasamento teórico do estudo no que se refere a compreensão da
escola como lugar proeminente de construção de conhecimento sobre a docência, bem
como o lugar desses saberes oriundos da experiência em sala de aula na formação inicial
docente e, finalmente, o papel do professor da escola básica como co-formador de
licenciandos. Entretanto, situam-se como referências principais Cochran-Smith e Lytle
(1999) e Zeichner (2010). Quanto a aprendizagem da docência nos licenciandos,
identificamos que a ação das professoras supervisores contribui com a familiaridade
com as especificidades do ofício; o favorecimento da relação teoria e prática; e o
desenvolvimento de uma postura investigativa.
Palavras-chave: Pedagogos docentes - PIBID - Parceria universidade-escola básica.
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3424ISSN 2177-336X
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ATUAÇÃO DE PROFESSORES DA ESCOLA BÁSICA NA FORMAÇÃO DE
PEDAGOGOS DOCENTES: APRENDIZAGEM SOBRE A DOCÊNCIA NO
CONTEXTO DO PIBID
Talita da Silva Campelo
Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias/RJ
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Introdução
Este trabalho apresenta os resultados de um estudo de caso que analisa os
diferenciais da parceria universidade - escola básica para a formação inicial de
pedagogos docentes no contexto do PIBID (Programa Institucional de Bolsas para
Iniciação à Docência). Nosso interesse são as relações de ensino/aprendizagem sobre a
docência que se estabelecem, no contexto do programa, entre professores experientes na
escola básica e professores em formação inicial. Nesse sentido, está centrada nas ações
do programa que se desenvolvem a partir das mediações e intervenções das professoras
supervisoras.
Integrante do Plano Nacional de Formação de Professores (2009), o PIBID é um
programa brasileiro de iniciação à docência que visa a participação de licenciandos em
atividades de ensino-aprendizagem desenvolvidas na escola pública. O programa é
desenvolvido por meio da concessão de bolsas de iniciação à docência para estudantes,
bolsas de coordenação para professores coordenadores (Instituições de Ensino Superior)
e bolsas de supervisão para professores supervisores (Escola Básica). Seu lançamento
ocorreu em dezembro de 2007, mediante Edital MEC/CAPES/FNDE 01/2007vii
.
Os licenciandos são envolvidos, ao longo de sua participação no programa, no
processo de planejamento e desenvolvimento de atividades de aula, materiais didáticos e
projetos interdisciplinares em ciclos contínuos (não há limitações de tempo para
permanência dos licenciandos no programa). Tudo isto é feito coletivamente com
professores supervisores (da escola básica) e professores coordenadores (da
universidade). Estas características distintas do programa certamente imprimem
mudanças na formação dos licenciandos que dele participam.
Concentrando-nos no PIBID Pedagogia de uma universidade federal do Rio de
Janeiro nos interessa analisar as ações desenvolvidas nesse projeto, adotando como foco
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investigativo as intervenções e mediações das professoras supervisoras das escolas
parceiras: quais as contribuições do papel desenvolvido pelas professoras supervisoras
do PIBID Pedagogia para a formação inicial do pedagogo docente na perspectiva da
parceria universidade - escola básica?
Aspectos teóricos e metodológicos
Metodologicamente, desenvolvemos um estudo de caso único (holístico), com
base nos pressupostos de André (2005 e 2013) e Yin (2010). O caso se forja na
especificidade do PIBID Pedagogia da instituição investigada, cuja prática requer que os
bolsistas façam etnografia da prática escolar, se inserindo na turma semanalmente como
coparticipe dela, indo além da proposta de desenvolver atividade de ensino em tempo
específico, o que requer um convívio prolongado de aprendizagem sobre a docência sob
a intervenção da professora supervisora.
André (2005) sinaliza que o estudo de caso ressurge na pesquisa educacional
com um sentido mais abrangente: o de focalizar um fenômeno particular, levando em
conta seu contexto e suas múltiplas dimensões. Valoriza-se o aspecto unitário, mas
ressalta-se a necessidade da análise situada e em profundidade. Assim, o mundo do
sujeito, os significados que atribui às suas experiências cotidianas, sua linguagem, suas
produções culturais e suas formas de interações sociais constituem os núcleos centrais
de preocupação dos pesquisadores. Se a visão de realidade é construída pelos sujeitos,
nas interações sociais vivenciadas em seu cotidiano, torna-se fundamental uma
aproximação do pesquisador a essas situações (ANDRÉ, 2005).
Preocupados com isto optamos por uma imersão em campo de um ano. Neste
período construimos evidências no contato direto com os sujeitos envolvidos no projeto:
1 professora coordenadora (universidade), 5 professoras supervisoras (escolas parceiras)
e 14 licenciandos bolsistas. Foram feitas observações, entrevistas e análise documental.
O material coletado reúne atas de reuniões, escritas dos bolsistas (caderno de
campo, diário de campo, portifólio, comunicação oral, relato de experiência e escrita
etnográfica), propostas de atividades de ensino, análise reflexiva das práticas, filmagem
de aulas, apresentações de trabalhos em eventos da área e relatórios. A observação se
deu em duas fases: a primeira fase, desenvolvida nos encontros semanais do PIBID
Pedagogia na universidade. A segunda fase ocorreu na sala de aula do professor
supervisor de uma das escolas parceiras, onde aconteciam encontros semanais entre ele
e licenciandos do PIBID.
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Para análise e interpretação dos dados nos utilizamos de uma estratégica
analítica geral (YIN, 2010) voltada para o exame, a categorização, a tabulação, o teste
ou nas evidências recombinadas de outra forma, para tirar conclusões baseadas
empiricamente. Para isso foram usados um dos quatro eixos propostos por Yin (2010): o
exame dos dados a partir das proposições teóricas. Foram usadas também técnicas
específicas da análise dos estudos de caso propostas pelo autor, como a combinação de
padrão, a construção da explanação e a síntese cruzada dos dados.
Para fundamentar nosso estudo, nos apoiamos em dois autores: Zeichner (2010)
e Cochran-Smith & Lytle (1999). Nossas proposições teóricas decorrem do estudo sobre
dois eixos: relação teoria-prática e parceria universidade - escola básica. Direcionamo-
nos ao desenvolvimento de terceiros espaços como facilitadores da articulação entre as
dimensões teóricas e práticas do conhecimento sobre a docência (ZEICHNER, 2010), e
de igual modo, às concepções de formação de professores que preveem a troca de
saberes entre docentes experientes e em formação inicial (COCHRAN-SMITH e
LYTLE, 1999).
Com base nesse conjunto de ideias e proposições e com foco nas intervenções e
mediações dos professores supervisores das escolas parceiras sobre os licenciandos do
PIBID, estabelecemos como objetivos de nossa pesquisa: analisar o trabalho
desenvolvido pelas professoras supervisoras com os licenciandos participantes do
programa e compreender como se desenvolvem as intervenções das professoras
supervisoras investigadas no processo de formação docente desses licenciandos.
Neste trabalho trazemos os dados no que se refere às implicações da participação
de professores da escola básica como co-formadores de pedagogos docentes no contexto
do PIBID Pedagogia investigado. Os resultados que aqui trazemos se referem a
totalidade da análise dos dados colhidos ao longo de toda a imersão em campo, no
entanto, neste recorte trazemos o foco para os depoimentos dos licenciandos. Conforme
o termo de consentimento assinado pelos sujeitos da pesquisa, a identidade de todos os
envolvidos será preservada. Para fins de organização foram utilizados codinomes para
os licenciandos bolsistas – PIB seguido de número.
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Aprendizagem da docência na relação entre professoras supervisoras e
pibidianosviii
Ao analisar o trabalho desenvolvido pelos professoras supervisoras com os
licenciandos participantes do PIBID Pedagogia investigado, percebemos como
professoras da escola básica e licenciandos podem compartilhar e desenvolver saberes.
Os dados nos mostram que pela via da desprivatização da prática (COCHRAN-SMITH,
2012), os pibidianos constroem conhecimentos sobre a docência quando podem indagar
- participar, interferir - suas supervisoras sobre os processos (intelectuais, reflexivos,
organizacionais) que acompanham seu trabalho.
Constatamos que muito além de permitir que sua prática seja investigada, o que
vemos, por exemplo, no estágio curricular, no PIBID investigado as professores da
escola-básica expõem constantemente a escrutínio, julgamento e análise o que ensinam,
porque ensinam e como ensinam. Percebemos que quando licenciandos podem dialogar
sobre o trabalho docente e experimenta-lo com o apoio de professores experientes, a
aprendizagem sobre o oficio de ensinar é potencializada.
Quando o professor da escola básica compartilha seus saberes sobre a docência
em movimentos de auxiliar o desenvolvimento/planejamento de ações de licenciandos
na sala de aula, instigando a reflexão (a partir do que faz e do que os licenciandos
fazem), passa a contribuir significativamente na formação docente dos licenciandos.
Este movimento, intensificado pela ausência de limites de tempo, imprime
diferenciais importantes para a formação de professores. As implicações para os
licenciandos que se expressam na possibilidade de pensar/experimentar a docência com
professores que já a exercem na escola básica, se revelaram em três aspectos:
familiaridade com as especificidades do ofício; favorecimento da relação teoria e
prática; e desenvolvimento de uma postura investigativa.
Os dados nos mostram que os pibidianos se familiarizaram com aspectos da
docência que muitas vezes se ocultam nos fazeres dos professores por conviverem tão
de perto (e por tanto tempo) com as professoras supervisoras, não apenas as observando,
mas as questionando e desenvolvendo ações sob sua orientação. O trabalho
desenvolvido no PIBID Pedagogia investigado proporciona a antecipação de
experiências que apenas seriam vividas no exercício do trabalho, como acompanhar
uma turma, planejar e desenvolver atividades, fazer avaliações de aprendizagem. A
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despeito de outros modelos formativos, a grande diferença está em fazer isso em um
ciclo contínuo não pré-determinado temporalmente.
Ao relatar sobre a oportunidade de desenvolver atividades com os alunos, Pib 1
afirmou que “nessas horas eu me sinto professora [risos] eu estou me formando
professora”(comunicação oral Pib 1). A oportunidade de entrada precoce na escola e de
vivenciar nela experiências de trabalho já seria de muita relevância para a formação
docente desses licenciandos, pois tal como afirma Zeichner (2010) “muito do que os
professores precisam aprender deve ser aprendido na e a partir da prática, ao invés de na
preparação para a prática”. No contexto do PIBID, o estudo deste caso nos mostra o
quanto vivenciar este processo na companhia de professores que já atuam na escola
básica potencializa seus efeitos.
O acompanhamento das ações do PIBID Pedagogia deste caso nos mostrou o
quanto “viver a docência” junto com professores que já atuam na escola contribui para a
aprendizagem docente dos pibidianos. Nesse sentido experimentar a docência, sem as
responsabilidades de um professor, sob a supervisão de quem já a exerce possibilitou
que os licenciandos bolsistas investigados se familiarizassem com as especificidades do
ofício docente. Pensar o trabalho docente com as professoras supervisoras, a partir da
observação dos seus fazeres em sala e do planejamento e desenvolvimento de atividades
com a contribuição dos seus saberes, aproxima os pibidianos da escola e do que de fato
os professores fazem lá.
Para os pibidianos, trabalhar na escola com professores da escola básica - seus
supervisores - permite “avaliar a minha atuação como futura docente, perceber os
desafios diários, a importância do planejar uma atividade e até mesmo a sensibilidade
para atuar de acordo com a reação da turma e sempre com a ajuda do professor
supervisor” (auto avaliação Pib 5). Sobre isso, Pib 6 diz que com Sup 5 teve “apoio para
o seu desenvolvimento, sobre como se comportar como docente”, além de aprender
como desenvolver atividades e de que maneira avaliar os alunos
em seu processo de desenvolvimento da escrita,(...) a percepção
de dificuldades com as quais os docentes se deparam ao
realizarem suas tarefas, quando o aluno apresenta alguma
dificuldade ao realizar as atividades (auto avaliação Pib 6).
Para professores em formação inicial, este modelo de aprendizagem da docência,
tal como propõem Cochran-Smith e Lytle (2002), substitui noções antigas de
treinamento de professores como um processo que acontece de uma vez, antes do início
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da carreira docente, onde graduandos seriam “equipados” com conteúdos, métodos de
cada área específica, e informações sobre fundamentos educacionais, e então partiriam
para "praticar" o ensino. A seguir, um exemplo de como os pibidianos vivenciaram a
experiência de exercer a docência ainda estando em formação, em uma perspectiva
diferente:
“A experiência que o PIBID têm me proporcionado,de poder
acompanhar o processo de ensino/aprendizagem dos alunos, de
poder participar deste desenvolvimento desde o começo, é uma
grande oportunidade. É ótimo poder ver qual a realidade que as
crianças vivem na escola e como é ser professora.”
(autoavaliaçãoPib 7).
Vivenciar situações de ensino/aprendizagem sob a supervisão de professores da
escola básica permitiu aos licenciandos oportunidades para “ampliar, tornar explícito e
articular o conhecimento tácito entranhado na experiência” (COCHRAN-SMITH e
LYTLE, 2002). Nesse processo a aprendizagem da docência é mais construtivista do
que orientado por uma concepção transmissivista. Para Cochran-Smith e Lytle (2002)
conceber assim o processo de ensino/aprendizagem da docência carrega a ideia de que
ensinantes e aprendentes trazem conhecimentos e experiências prévias específicas, e
que a aprendizagem ativa requer oportunidades de unir conhecimentos prévios com
novas compreensões.
Quanto a estas novas compreensões, os dados revelam também que os
pibidianos perceberam como o trabalho docente é marcado por conexões teórico-
práticas ao serem instigados por suas supervisoras a fazê-las e ao verem nas práticas
delas como elas tomam forma.
Os pibidianos deste caso relatam com muita satisfação o quanto participar do
PIBID Pedagogia tem sido contributivo para ajudá-los na relação teoria-prática. Tanto
em conversas informais, quanto em portfólios, relatos de experiência e autoavaliações,
ideias relacionadas à relação teoria-prática estavam, em maior ou menor proporção,
sempre presentes. Pib 3 relata que “ao decidir participar do projeto, tinha em mente que
seria a oportunidade de aprender coisas que eu acreditava não ter a chance de aprender
na sala de aula da faculdade”. Sobre essa intenção, viu-se realizada porque “após a
minha entrada, vi que realmente seria um aprendizado diferente, pois o PIBID, para
mim, uniu a teoria e a prática com um grande enfoque na nossa formação como futuros
docentes” (autoavaliação Pib 3).
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Sobre isso, Pib 1 também relata como não apenas observar, mas também poder
dialogar com um professor da escola básica sobre o que ele faz em sala de aula é
contributivo para a aprendizagem da docência. Pib 1 nos conta como foi perceber o
papel da leitura funcional na alfabetização:
“(...) e foi aí, que nesse dia, eu percebi que o livro, a história, é
como uma chave pra aula. Sup 3 trabalha todos os outros temas
e eles emergem da história, daquela leitura (...) e eu achei isso
muito diferente porque eu nunca tinha vivenciado isso, nem na
minha formação escolar.” (comunicação oral Pib 1).
Pib 1 faz questão de ressaltar o papel de sua professora supervisora nesse
processo. Para ela,“isso foi uma coisa que eu aprendi com Sup3, vendo ela, gravando
ela, conversando com ela (...), algumas coisas eu percebi, alguns elementos diferentes”
(comunicação oral Pib 1). A seguir outros relatos que seguem nesta direção:
“A gente se inspira muito no que Sup3 faz, na prática dela,
muitas coisas que eu vi, por exemplo, como é que você vai
ensinar uma criança a ler, vai alfabetizar uma criança, eu não
estava preparada pra fazer isso (...) e ela mostrou isso (...) e é
uma coisa muito diferente do que aprendi no estágio e pra mim
está ajudando muito a construir com eles essas „coisas de
escola‟.” (comunicação oral Pib 3).
Quando se trata de estimular conexões teórico-práticas como estratégia de
intervenção adotada pelas professoras supervisoras, os dados mostram o quanto seu uso
era recorrente. Ficou nítido como as professoras supervisoras observadas neste caso
tinham especial interesse em ajudar os pibidianos a superar a desconexão entre teoria e
prática, entre conhecimentos acadêmicos e conhecimentos profissionais. No entanto, ver
muitas vezes nos bolsistas expressões aflitas quando não conseguiam explicar qual a
relação entre o que aprendiam na universidade e o que aprendiam na escola não nos
surpreendeu.
Para Zeichner, esta questão está diretamente ligada ao fato de que a “desconexão
entre o que é ensinado aos estudantes nos cursos acadêmicos e suas oportunidades de
aprendizagem para levar a tais práticas em suas respectivas escolas não raramente é
muito grande, inclusive nas escolas parceiras” (2010, p.484). Os depoimentos dos
pibidianos ilustram como presenciar práticas de professores experientes e poder pensar
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sobre elas - problematizá-las e investigá-las - com esses mesmos professores é
importante para favorecer a relação teoria e prática.
Quanto a isto os dados mostram que a experiência no PIBID é potencializada
com a atuação de professores híbridos (ZEICHNER, 2010): quando as professores
supervisoras se tornam formadoras atuando em um espaço que não é primariamente seu
- a formação docente - e em uma função que não é primariamente sua: formar
professores - se fazem melhor aproximações entre universidade e escola pela via do
trabalho docente, da experiência de quem vive o ensino na escola. Com isso, para as
supervisoras a participação no programa representa a oportunidade de retorno ao espaço
da universidade, em outro papel, na condição de formadoras, o que favorece um novo
olhar sobre a própria prática e sobre a escola. É nessa interface que se mostram as
maiores diferenças que o PIBID traz para a formação de professores.
Ao intervirem junto aos pibidianos compartilhando experiências – e as
colocando sob escrutínio, instigando a reflexão – tomando o ensino e o que acontece
antes, durante e depois dele como problematizável, e estimulando a observação–
permeando-a de análise crítica, as supervisoras contribuem para que os bolsistas
desenvolvam uma postura investigativa. Para além da reflexão como característica
inerente do trabalho doente – enquanto marcado por intelectualidade e racionalidade –
estas intervenções das supervisoras imprimem nos licenciandos o entendimento da
aprendizagem da docência como um processo contínuo que se faz na coletividade
através da busca por respostas a questões que funcionam como lentes para ver e dar
significado à prática construída.
Entrar em contato com o projeto PIBID aumentou o meu desejo
por uma profissionalização mais especializada, qualificada,
diferente e ousada. Ao discutir ideias, próximas ou diferentes
das minhas, meus horizontes se alargam quanto às variadas
possibilidades do ato de ensinar, que para mim é mais que
transmitir conteúdos, é também agregar valores psicológicos,
sociais e morais, despertar interesses e principalmente estimular
o prazer pelo ato de aprender (relato de experiência Pib 13).
Segundo Cochran-Smith e Lytle (1999) a investigação como postura como
construto para entender o aprendizado de professores baseia-se em uma concepção mais
rica de conhecimento que as permitidas pela tradicional distinção conhecimento
formal/conhecimento prático, uma concepção mais rica de prática que a sugerida no
aforismo que a prática é prática, uma concepção mais rica de aprendizado ao longo da
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história de vida profissional que o conhecimento de especialização e uma concepção
mais rica de culturas e propósitos educacionais que as difundidas por muitas reformas
escolares. Nesse sentido, a postura investigativa não segue a distinção entre
conhecimento formal e conhecimento prático; enfatiza, isto sim, a importância do
conhecimento localix
que também pode ser útil em contextos mais amplos.
Nesse sentido, tão importante quanto investigarx a docência é investigar a
docência coletivamente, entendendo que se aprende mais e melhor sobre o trabalho
docente quando os professores - investigadores/investigados - expõem o que fazem
dentro das salas de aula. No que se refere ao PIBID estudado, sobre esse movimento de
problematizar e investigar o trabalho docente em grupos que congregam professores
experientes e em formação inicial, Pib 14 diz que permite o desenvolvimento de ambos
os atores “pois tanto os pibidianos levantam dúvidas e sugestões, quanto os professores
supervisores passam a refletir sobre sua prática docente, trazendo novas formas de
ensinar” (relato de experiência Pib 14). Aqui destaca-se o papel do professor supervisor
como sendo aquele que corporifica o elo entre universidade e escola-básica, como sendo
aquele que aproxima os pibidianos com o trabalho docente pela via da escuta e do
diálogo.
Esta centralidade na figura do professor supervisor nos mostrou algumas
questões que precisam ser ponderadas. Não conseguimos constatar com clareza até que
ponto a familiaridade com as especificidades do oficio docente dos licenciandos eram
influenciadas pela visão da supervisora sobre a sua escola e sua sala de aula.
Percebemos várias vezes nas falas dos pibidianos reproduções quase ipsis litteris de
falas das professoras supervisoras no que se refere ao trabalho docente e as escolas
parceiras.
Está claro que para pibidianos e para professoras supervisoras a relação teoria e
prática foi favorecida nos processo formativos que envolvem o PIBID UFRJ Pedagogia.
Os dados, no entanto, não nos mostram nitidamente a “teoria” da relação teoria e
prática. Quanto a isso, as observações nos mostraram que os pibidianos ainda não têm
aporte nem teórico e nem prático para se posicionarem com/contra as conexões entre os
conhecimentos acadêmicos e profissionais que as supervisoras fazem. Percebemos que
este aporte está sendo construído (ampliado e consolidado) pelas ações do PIBID
Pedagogia investigado principalmente pelo movimento de problematizar o trabalho
docente. Estimular os licenciandos a desnaturalizar o que veem na escola e no trabalho
da professora supervisora é importante neste processo.
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Quanto a isto, ainda que percebamos nos pibidianos o desenvolvimento de uma
postura investigativa, de fato ela se mostrou muito ligado aos questionamentos que eles
faziam as professoras supervisoras. Assim as supervisoras se configuram como os
suscitadores das perguntas e das respostas dos pibidianos, que ainda não têm condições
plenas para fazerem conexões mais amplas entre o que acontece na sala de aula onde
estão alocados e a escola como um todo (menos ainda quando se fala de escolas).
Acreditamos que o desenvolvimento de uma postura investigativa apenas começou, não
temos certeza se será consolidado em todos os sujeitos envolvidos, mas cremos que se
assim o for será especialmente bom para o futuro exercício profissional dos pibidianos
quando enfim forem professores (COCHRAN-SMITH 1999, 2001 e 2002).
Conclusões
Tal qual Cochran-Smith e Lytle (1999), acreditamos que aprender a docência é
algo que acontece com o tempo, e isso acontece quando novos professores trabalham na
companhia de professores mais experientes, que também continuam aprendendo a
ensinar. No entanto, defendemos que já na formação inicial deve se possibilitar aos
licenciandos situações em que possam construir conhecimentos sobre a docência, a
partir da troca com professores que já atuem na escola básica.
Os dados nos mostram que a tríade de familiarizar-se com as especificidades do
oficio docente, favorecer a compreensão da indissociabilidade entre teoria e prática
presente no trabalho do professor e o desenvolvimento de uma postura investigativa
(questionadora e problematizadora) é contributiva para a aprendizagem da docência nos
licenciandos observados no PIBID investigado. No entanto, ainda que estas
contribuições sejam notórias, os dados nos mostram também o quanto isto é um
processo em construção cujas consequências começam a se consolidar em um
movimento vivo que avança e retrocede nos sujeitos envolvidos pelas próprias ações
deles, pelos significados que se forjam diante das experiências vividas.
Os aspectos aqui listados estão profundamente ligados ao relacionamento
supervisor & licenciandos bolsistas, no entanto não negamos que compõem parte
significativa de um processo formativo mais amplo. Os conhecimentos construídos
sobre a docência no PIBID não se traduzem necessariamente em ineditismo, mas sim
em arrumações com novas significações de saberes e fazeres que muitas vezes não se
comunicam ao longo da trajetória curricular.
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Consideramos também que as ações das supervisoras sobre os pibidianos se
mostram eficazes pela estrutura do programa. Nesse sentido, o diálogo, a coletividade, a
parceria e principalmente tempo e espaço propícios são fundamentais para que este
relacionamento produza de fato bons frutos.
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DIFERENCIAIS DO PIBID PEDAGOGIA NA DOCÊNCIA DE DOIS
PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Fernanda Lahtermaher Oliveira
Giseli Barreto da Cruz
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Resumo
Este trabalho trata dos resultados de uma pesquisa sobre os diferenciais do PIBID,
subprojeto Pedagogia de uma universidade pública federal localizada no Rio de Janeiro,
na atuação de dois professores da Educação Básica. Analisa os saberes docentes
mobilizados pelos investigados no seu cotidiano escolar, compreendendo quais
estratégias de ensino-aprendizagem se baseiam para ensinar e relacionando-as com suas
concepções de ensino. Foi construído segundo a fundamentação teórica de Tardif
(2002), que situa os saberes docentes a partir da origem social dos saberes, entendendo
que são próprios dos professores, fazendo-se necessário levar em consideração o que
dizem a respeito da sua prática e a relação com o campo de atuação; Cochran-Smith &
Lytle (1999), que auxiliam no entendimento do que significa ensinar no contexto da
prática. Metodologicamente, trabalhou-se com os recursos da entrevista semiestruturada
visando compreender as razões pelas quais os professores ensinam da forma que
ensinam e da análise de documentos, como fotos e registros de campo do ano de 2013,
fase em que os professores investigados estavam no PIBID. O estudo revela que a
participação no PIBID proporcionou uma maior segurança em sala de aula; autonomia
para buscar novos conhecimentos; estratégias de ensino-aprendizagem desenvolvidas
em parceria com os alunos nas escolas; pensamento crítico sobre as concepções de
ensino e, deste modo, os depoimentos ratificam uma racionalidade, demonstrando que
esses professores sabem as razões de suas práticas pedagógicas.
Palavras-chave: Formação de Professores; Educação Básica; Pibid.
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DIFERENCIAIS DO PIBID PEDAGOGIA NA DOCÊNCIA DE DOIS
PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Fernanda Lahtermaher Oliveira
Giseli Barreto da Cruz
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Introdução
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID - é uma
iniciativa importante que, embora tenha um impacto parcial, pois não atende a toda
demanda da formação inicial, tem possibilitado resultados positivos no que tange a
iniciação à docência. Ao oferecer bolsas para os licenciandos atuarem no contexto das
escolas públicas ao mesmo tempo que são orientados por professores supervisores nas
escolas e professores coordenadores na universidade, o programa estimula uma parceria
entre as duas instituições formadoras. Essa parceria corrobora com a ideia de que teoria
e prática são indissociáveis e os saberes produzidos pela universidade, assim como pela
escola, contribuem para uma formação teórico-prática contextualizada com as
realidades locais.
Por conseguinte, o PIBID se configura como uma importante iniciativa de
mudança nas licenciaturas no que se refere a própria visão que os futuros professores
têm da sua profissão, já que encaram a realidade escolar com profundidade, elaborando
materiais didáticos, acompanhando o professor e analisando seu planejamento,
conforme apontam as pesquisas e avaliações na área (GATTI, 2013).
O presente trabalho tem como objetivo expor os resultados de uma investigação
que apresenta os diferenciais da formação através do PIBID, subprojeto Pedagogia, na
atuação de dois professores da Educação Básica. Para isso, são analisados os saberes
docentes que mobilizam com mais recorrência no cotidiano escolar, suas estratégias de
ensino-aprendizagem e concepções de ensino. Afinal, quais são os conhecimentos que os
professores investigados mobilizam cotidianamente nas salas de aula?
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Aspectos teóricos e metodológicos
Adota-se como referencial teórico Tardif (2002), que situa os saberes docentes a
partir da origem social dos saberes, entendendo que são próprios dos professores,
fazendo-se necessário levar em consideração o que dizem a respeito da sua prática e a
relação com o campo de atuação; e Cochran-Smith & Lytle (1999), que auxiliam no
entendimento do que significa ensinar no contexto da prática.
Tardif nos ajuda a entender que o saber do professor não se separa das outras
dimensões do ensino, nem como do trabalho que realiza diariamente. Portanto, o saber é
inserido em um sentido mais amplo da profissão docente, que também está situada em
um contexto histórico e social. Segundo Tardif (2002, p.11) “o saber é sempre o saber
de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer”. Deste
modo, falar em saber dos professores é legitimar um saber que é próprio deles, que está
relacionado com a sua identidade, trajetória de vida e experiências pessoais e
profissionais.
Para o autor podemos denominar este saber como social, já que é compartilhado
por um grupo de professores que, apesar de possuírem a mesma categoria profissional,
tem trajetórias de formação e atuação diferentes. Além disso, os produtos dos seus
saberes são coletivamente discutidos e definidos, como currículos, planos de ensino, o
que deve ser ensinado, etc. De modo que a legitimação também é social e se distancia
de afirmações unicamente cognitivas ou epistemológicas.
O professor trabalha com práticas sociais já que ensina a sujeitos que estão
inseridos em um contexto político e que, portanto, atuam diretamente nele, sendo
influenciados e influenciando o mundo a sua volta, o que revela que o saber não é algo
estático, está em constante mudança e adaptação. É possível perceber que a própria
importância que é dada a determinados saberes é diferente de outros em determinados
momentos históricos.
Tardif (2002) afirma:
Noutras palavras, a Pedagogia, a Didática, a Aprendizagem e o Ensino
são construções sociais cujos conteúdos, formas e modalidades
dependem intimamente da história de uma sociedade, de sua cultura
legítima e de suas culturas (técnicas, humanistas, científicas,
populares, etc.), de seus poderes e contrapoderes, das hierarquias que
predominam na educação formal e informal, etc. (TARDIF, 2002.
p.14).
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Portanto, o saber dos professores é sempre situado, pois está em constante
relação com sujeitos, sejam os alunos, diretores, pais, de uma instituição de ensino e em
uma relação de trabalho que exige tarefas complexas, tendo em vista que ensinar
depende de uma série de artifícios. Além disso, exige tempo, pois o saber do professor
irá se modificar ao longo da sua carreira, suas experiências e vivências de modo que a
cada mudança (seja de escola, turma, bairro) haja novos aprendizados.
No entendimento que o saber do professor é próprio, mas ao mesmo tempo
social, temporal e situado faz-se necessário pontuar que esse conhecimento advém da
sua prática de ensino. Assim, os saberes são mobilizados a partir da, na e para a
prática, como apontam as autoras Cochran-Smith & Lytle (1999).
Segundo essas autoras, é através da ação docente que de fato é possível perceber
como manifestam seus conhecimentos. É possível inferir que o conhecimento para a
prática é aquele que ocorre no contexto das instituições formais de ensino, ou seja, é o
“conhecimento formal”, como as teorias gerais e pesquisas na área da educação. Nesta
perspectiva, esses conhecimentos servirão como base para os saberes docentes.
O conhecimento na prática é o conhecimento em ação, o que os professores
sabem e refletem no contexto da prática, mas que ocorre no momento em que é
expressado ou articulado os seus saberes docentes. Nesse sentido, o conhecimento é
entendido como situado e incerto, pois acontece por meio das particularidades
cotidianas da sala de aula.
O interesse neste estudo envolve a problemática dos saberes docentes
mobilizados com mais recorrência por professores egressos do PIBID que atualmente
atuam na Educação Básica e o que eles pensam e fazem para ensinar. Para isso, buscou-
se compreender de que forma o PIBID contribuiu para serem os professores que são
hoje. Para atender a essas questões foram realizadas entrevistas semiestruturadas,
análise de documentos, imagens e planos de aula, para uma posterior análise de
conteúdo. Os dados se referem tanto ao período de participação dos sujeitos no PIBID,
quanto ao posterior a este em que começam a carreira docente.
No âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência, a
Universidade Federal do Rio de Janeiro atendeu a chamada pública de dezembro de
2007, apresentada conjuntamente pelos Ministério da Educação - MEC, Fundação
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, e Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE.
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A pedagogia é inserida como subprojeto conforme edital nº 11/2012. Foi através
da ampliação deste edital que o subprojeto deu início as suas atividades, tendo como
foco os anos iniciais do Ensino Fundamental. No edital seguinte, de 2013, foi também
incorporada a área de educação infantil. Deste modo, o PIBID UFRJ Pedagogia passou
a ter duas coordenadoras de área com dois grupos diferenciados de bolsistas, escolas e
professores supervisores. O presente trabalho se detém a investigar somente a área dos
anos iniciais do Ensino Fundamental.
O primeiro projeto contou com a parceria do CAp UFRJ, colégio de aplicação da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, e coube aos estudantes acompanhar, subsidiar e
refletir sobre o trabalho desenvolvido nesta escola. Iniciou com uma professora
coordenadora, uma professora supervisora e cinco estudantes. As reuniões semanais do
grupo ocorriam, majoritariamente, na Faculdade de Educação e havia mais um encontro
na escola onde os estudantes realizavam a observação participante.
Tendo em vista que o PIBID Pedagogia contemplado neste estudo iniciou em
2013 e desde então, dois licenciandos do grupo se graduaram e exercem a docência
profissionalmente, a atual pesquisa abarca 100% dos casos elegíveis para análise. Nesse
sentido, a investigação abarca 100% dos egressos até o presente momento,
proporcionando possibilidades exequíveis de análise para o entendimento dos saberes
docentes que estes professores vêm mobilizando com mais recorrência em sala de aula.
Os dados são apresentados trazendo os relatos desses dois professores,
apresentando sua visão sobre a participação enquanto integrantes de um projeto PIBID e
suas argumentações referentes às práticas em sala de aula. Deste modo, nos interessa
saber quais estratégias os professores investigados mobilizam em suas práticas docentes
e a partir de quais concepções de ensino. Entende-se que a partir dessas questões será
possível perceber com mais clareza os saberes que têm movimentado com mais
recorrência de modo que seja possível refletir sobre os diferenciais do PIBID na
formação desses sujeitos.
Três características se destacam na ação pedagógica atual desses dois
professores: uma visão crítica sobre as concepções de ensino; a importância de
escutar os alunos; e autonomia pedagógica. A partir destes elementos, neste trabalho
nos deteremos na análise somente da racionalidade discursiva, como aponta TARDIF
(2002). Os nomes dos professores foram trocados e suas falas apresentam a codificação
da primeira letra do nome fictício mais a indicação do material e a ordem.
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Os diferencias do PIBID na docência de dois professores da escola-básica
O PIBID Pedagogia do qual os sujeitos investigados participaram, se caracteriza
como um projeto que visa à inserção do estudante em um contexto profissional e, neste
caso, no primeiro ano do ensino fundamental, pois o projeto tem como foco a
alfabetização. Essa parceria entre escola e universidade facilita que o estudante conheça
a realidade que irá enfrentar, contextualizando seus saberes docentes, criticando o
contexto escolar e vivenciando dilemas reais do cotidiano docente.
Sendo assim, não é um projeto de pesquisa, porém se inspira nos estudos
etnográficos para realizar suas atividades. Estratégias como os diários de campo,
registros etnográficos, observação participante são utilizadas para favorecer essa
imersão.
Os professores acompanhados neste estudo participaram do PIBID até 2013 e
hoje atuam como docentes em escolas do Rio de Janeiro. João trabalha em uma escola
no centro do Rio com os primeiros anos do Ensino Fundamental, enquanto Thamara
atua em duas escolas públicas de educação infantil. São jovens recém-inseridos no
campo profissional e que ao mesmo tempo em que possuem uma trajetória profissional
muito parecida, passaram por experiências diversificadas ao longo das suas vidas.
Os dois professores sinalizam aspectos parecidos ao longo da sua trajetória no
que se refere a escolha pelo magistério e as dúvidas que antecederam seu interesse ao
ingressar no PIBID, e as razões pelas quais ficaram, mas, principalmente, aproximam-se
quando justificam as suas ações em sala de aula. Thamara e João relatam que hoje se
sentem mais seguros na escola, tentam ao máximo ouvir os alunos, realizando
atividades que vão ao encontro dos seus interesses. Apresentam uma visão crítica sobre
as concepções de ensino e as estratégias que devem escolher em sala de aula.
Ao relatar sua experiência no PIBID, João afirma que
O PIBID era um sonho para mim. (...). Eu poder fazer a faculdade e
ter um auxílio de orientação e financeiro para poder me empenhar na
atividade de prática ensino. Começar numa escola como aprendiz,
observando o dia-a-dia em sala de aula, vendo um profissional
experiente atuando, e depois dialogar com ele, interagir com as
crianças, ter essa aproximação, ainda mais eu que não vinha de um
ambiente com crianças. Então, esse contato para mim era necessário.
Desenvolver isso para conhecer melhor as crianças, saber como
chegar, desenvolver uma linguagem adequada a compreensão. (J. E1).
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João disserta que a contribuição financeira foi de grande ajuda e reforça a
necessidade de aproximação entre escola e universidade, já que coloca o estudante em
uma posição de ter de refletir sobre o desenvolvimento infantil, uma linguagem e
comportamento próprios a essa idade e atividades.
Atualmente, ele é professor em uma escola que trabalho na perspectiva
montessoriana e valoriza muito a autonomia dos alunos. O professor disserta com
segurança sobre a concepção de ensino da escola, sobre a necessidade de escutar os
alunos, a boa relação que estabeleceu com eles e como se sente preparado para ensinar,
mesmo entendendo que precisará sempre contar com a ajuda de outros profissionais e
materiais. Ele atribui boa parcela do que aprendeu no PIBID à sua prática docente atual,
quando diz:
A gente estudou sobre o estudo etnográfico que foi fundamental para
esse sistema Montessoriano que eu faço parte atualmente (...) As
semelhanças do que a Montessori fala sobre a observação da criança,
porque como você vai proporcionar uma aprendizagem para alguém
que você não sabe como é, que tipos de conhecimento possuí, etc.
Então você precisa ter um bom espírito observador, analisar as
informações e saber o que fazer, como tratá-las para desenvolver
práticas mais satisfatórias para aprendizagem daquela pessoa (J. E1).
Já Thamara ao falar sobre sua experiência no PIBID, relata que este
complementou o conhecimento desenvolvido através das disciplinas da universidade e
também aponta que a aproximação entre escola e universidade favoreceu uma melhor
compreensão da realidade escolar, como no trecho:
Desde que nos inserimos como bolsistas no Programa Institucional de
Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID UFRJ Pedagogia), percebemos,
assim como os demais acadêmicos bolsistas, que fazer parte do
Programa solidifica os estudos realizados nas disciplinas do curso de
Pedagogia (T. TR1).
As estratégias e ações cotidianas do contexto do trabalho desses professores
aparecem de modo a revelar seus saberes e compondo um repertório próprio de
conhecimentos profissionais. Percebe-se através de suas falas que os professores são
atores que possuem seus próprios saber-fazer. (GIDDEND, 1987 apud TARDIF, 2002).
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Com relação as suas ações em sala de aula, João se define numa perspectiva
humanista da educação, apostando na empatia para com os seus alunos e acreditando
que estes devem ser os protagonistas do aprendizado. Sobre a sua prática, ele afirma:
Tento identificar a linguagem que seja mais familiar aquela pessoa e
identificar qual o nível de conhecimento que ela está, e o que ela
precisa trabalhar mais, o que ela tem de talentos, conhecimentos,
habilidades que eu possa aproveitar e incentivá-la naquilo, e também
para ela se apropriar de outros conhecimentos, de outros saberes. (J.
E1)
O relato dos professores aponta para a reflexão acerca das concepções de ensino
de ambos. As suas compreensões sobre as práticas pedagógicas são mobilizadas por um
discurso que é permeado de saberes docentes, indicando o que deve ser ensinado. As
vivências de ambos revelam que, enquanto estudantes, passaram por escolas que
marcaram a sua trajetória e certamente influenciaram as suas práticas enquanto
professores.
Entende-se que os saberes dos professores são temporais, como aponta Tardif
(2002), pois são adquiridos ao longo do tempo. Muito do que sabem hoje, sobre o papel
do professor, como ensinar e a melhor concepção de ensino, advém da sua própria
história de vida, especialmente, da sua história de vida escolar.
Portanto, para o professor iniciante planejar uma aula é pensar as
potencialidades de cada aluno, preservando a autonomia de cada um. Na escola, eles
têm a liberdade de pegar materiais nas estantes, observar, analisar, fazer pesquisas e é a
partir dali que o conhecimento será estimulado, já que o aluno poderá fazer suas
próprias inferências sobre os objetos, tirar dúvidas e pesquisar sobre as suas
curiosidades.
Essa estratégia revela o quanto Thamara e João sabem a respeito do seu trabalho.
Como aponta Tardif (2002) a respeito dos saberes docentes serem sobre seres humanos,
e, por consequência, os seus saberes carregarem marcas profundas do ser humano.
Quando professores reconhecem a importância do ato de ensinar àqueles que aprendem
percebem a dupla transitividade que está implícita neste processo.
Thamara ao contar sua rotina, expõe diversos momentos em que senta em roda
com os alunos e pergunta o que eles querem fazer. Também revela que considera
essencial explorar todos os espaços da escola, como o parquinho, para que brinquem
com diferentes objetos. Além disso, sempre dispõe de um horário livre de modo que as
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crianças tenham autonomia e possam fazer o que desejarem. Thamara atua numa escola
de educação infantil Montessoriana, assim como João ela também atua em uma escola
cuja concepção de educação se baseia nos princípios montessorianos.
Atualmente ela trabalha em duas escolas de educação infantil, um espaço de
desenvolvimento infantil – EDI e um CIEP. Nesta segunda, tais práticas já ocorrem no
momento em que vão às estantes escolher brinquedos livremente, como conta nas duas
passagens:
A atividade é planejada sempre junto com alguma proposta de um
projeto e, como é uma escola Montessoriana, também se reserva um
tempo para que eles peguem as atividades que estão expostas nas
prateleiras e que são da altura deles e assim eles podem fazer. Então as
atividades que são jogos, eles pegam, fazem as atividades, colocam na
prateleira de novo e se agora querem desenhar eles pegam o papel
desenham e então eles ficam em torno de uma hora e meia fazendo
essas atividades de livre escolha (T. E1, grifo nosso)
Eu acho que é essa proposta também de ir para fora de sala e de muita
escuta deles. Eles chegam e falam: “Vamos lá para fora”. E por que a
gente acha que este é um espaço onde eles vão aprender, não é só
entro da sala e ir para fora, pegar uma corda, uma bola, um bambolê,
esquematizar um circuito e deixar eles livres muitas vezes tem mais
significado do que deixar eles sentados.(ibdem, grifo nosso).
Por meio dessas falas, é possível perceber que esses professores parecem saber
as razões das suas práticas de ensino. Thamara justifica sua ida para outros espaços da
escola porque sabe que neles as crianças também vão aprender, às vezes, até mais do
que dentro de sala de aula. Também explica que por mais que os alunos tenham tempo
livre e explorem os brinquedos de forma espontânea, as atividades estão relacionadas a
um projeto de trabalho, e, portanto, têm uma razão para acontecer naquele momento e
daquela forma.
No que se refere ao conhecimento que adquiriram sobre as suas próprias práticas
docentes e consequentemente sobre si, Thamara e João apontam que se sentem seguros
e confiantes para ensinar. As experiências que vivenciaram ao longo da sua vida e da
formação universitária contribuíram significativamente para que hoje tenham autonomia
para buscar novos conhecimentos.
Com relação a isso, eles sinalizam que se sentem mais confiantes em sala de
aula, mais à vontade para buscar novas fontes de informação e que por isso não têm
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tanto medo de errar. Sabem por onde devem caminhar e que nem sempre vão encontrar
colegas de profissão que pensam como eles.
Essas características são resultados do trabalho docente, que envolve interações
humanas e que se dá num contexto ativo de trabalho. Revelam como o conhecimento da
prática, proposto por Cochran-Smith &Lytle (1999) é fundamental para a produção do
conhecimento, levando em consideração que o sujeito não se separa daquilo que visa
conhecer. A ideia do conhecimento da prática é que, através da investigação, os
professores ao longo de sua vida profissional problematizam seu próprio conhecimento,
bem como o conhecimento e a prática de outros, assim se colocando em uma relação
diferente com os saberes docentes.
Por conseguinte, revela o papel central que os professores têm na geração de
conhecimento sobre a sua prática. Na medida em que sabem as razões de ensinar,
produzem saberes docentes que servem de repertório para ser compartilhado com seus
pares e revisto ao longo da sua trajetória profissional.
Nesse sentido, vale destacar que um dos fatores que proporcionou uma reflexão
consistente na mobilização dos saberes profissionais desses dois professores foi a sua
passagem pelo PIBID. Essa questão deixa de ser uma suposição e passa a ser uma
afirmação tendo em vista que ambos os recém professores revelam em seus saberes e
fazeres aspectos estimulados em sua participação no referido Programa. Quanto a isso
destacamos o repertório de conhecimento construído por meio das atividades de ensino,
encontros de reflexão e elaboração de materiais com o grupo, preparação e construção
de trabalhos científicos.
Ambos os investigados afirmam que a reflexão atenta e curiosa sobre o fazer
docente desenvolvida no PIBID favoreceu com que conhecessem o caminho para
ensinar, mas reconhecendo a sua incompletude e sabendo onde procurar formas de
complementa-lo. Assim, reconhecem a autonomia pedagógica que conquistaram.
Conclusões
A pesquisa indicou que os professores apresentam um repertório próprio de
conhecimentos profissionais docentes, revelados através das suas falas sobre as suas
ações diárias e as razões pelas quais ensinam da forma que ensinam. Os seus saberes são
oriundos, como aponta Tardif (2002), da experiência profissional, curricular, dos
saberes experienciais e disciplinares, formando um amálgama.
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Ambos sinalizam aspectos muito parecidos quanto a sua prática docente, no que
se refere as concepções de ensino que possuem, a necessidade de ouvir os alunos e a
importância da autonomia pedagógica. Essas caraterísticas situam os saberes docentes
enquanto temporais, pois são adquiridos ao longo do tempo, plurais, pois apresentam
diversas fontes, heterogêneos, já que não apresentam um repertório único e um processo
humanizado, tendo em vista que se trata de serem humanos.
Deste modo, entende-se que o PIBID foi de fato um diferencial na formação
desses sujeitos, contribuindo com experiências, materiais e situações de ensino que
possibilitaram uma vivência em sala de aula, uma reflexão sobre o processo de ensino-
aprendizagem e também enquanto professores que refletem criticamente sobre seu
trabalho.
Os dados demonstram como o PIBID vem se configurando como um aliado
potente na formação de professores. Essa formação, que necessita seguir sendo
analisada e discutida, sendo repensada, na sua esfera curricular e didática, ganha um
aliado, que ainda que apresente uma série de questões, vem demonstrando ser
fundamental no que ser refere a unir prática e teoria, escola e universidade, escola e
pesquisa, entre outros fatores fundamentais para iniciação à docência.
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i Aprendemos com os estudiosos do cotidiano a juntas palavras na intenção de inventar novos
significados: “princípio da juntabilidade” que concede sentido e significado diferentes dos usuais, quando
de sua separação (Alves, 2001).
ii Criado em 2007 pelo Ministério da Educação por intermédio da Secretaria de Educação Superior da
Capes e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
iii Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=233:pibid-
apresentacao&catid=155:pibid&Itemid=467>. Acesso em: 14.Jul.2015.
iv Cf. em “Um estudo avaliativo do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid).”
Disponível em: <http://www.capes.gov.br/images/stories/download/bolsas/24112014-pibid-
arquivoAnexado.pdf>. Acesso em: 14.Jul.2015.
v No sentido de proteger e valorizar as vozes dos professores e estudantes que tecem as redes e as
conversas que produziram as narrativas utilizadas guardamos as autorias de modo a indicá-las, mas sem
personalizá-las.
vi Apesar de trazer referências já (com)partilhadas, optamos pela escrita no tempo presente para marcar a
potência das narrativas que não se encerram, mas têm a possibilidade de desencadear novos/diferentes
olhares.
vii
MEC – Ministério da Educação. CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior. FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
viii Os licenciandos bolsistas do PIBID investigado se autodenominam assim e por ser este termo bem
aceito por todos os membros do grupo, optamos por usa-lo para designá-los.
ix Para Cochran-Smith e Lytle (1999, 2002) o “conhecimento local” nasce na prática e a partir dela. É o
conhecimento gerado pelos professores através de sua artesania, assim se relaciona ao saber-em-ação.
x Investigar aqui neste contexto - tanto no que defendemos quanto no que observamos - não se relaciona
necessariamente a pesquisa sistemática, no sentido de cientificidade e rigor acadêmico. Está muito mais
próximo ao esforço coletivo (em pares) de responder a problemas intrínsecos à realidade do trabalho, pelo
trabalho e para o trabalho.
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